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Seminário A Tributação das Telecomunicações na Era da Economia Digital
Realização: Secretaria Estadual de Fazenda
Patrocínio: Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID
Painel II: “A tributação das Telecomunicações – Visão Empresarial
Moderação: Flávia Oliveira
Participantes:
Diretor do SindiTelebrasil – Carlos Duprat
Especialista em Tributação da Oi – Ana Carolina Magliano Romano
Diretor Tributário da TIM – Gustavo Alves
Gerente Tributário da Vivo – Maurício Lima
Carlos Duprat, diretor do SindiTelebrasil. Boa tarde a todos. O SindTelebrasil
representa as operadoras de telefonia fixa, móvel e banda larga. Uma questão
importante, neste exato momento, é o investimento. Nós estamos fazendo agora,
no Ministério das Telecomunicações, uma revisão na Lei Geral de
Telecomunicações para aumentar, nesse cenário tenebroso que o país está
vivendo, os investimentos do setor. Nós temos conseguido. Apesar disso, muitos
vão dizer que a qualidade não chegou. Isso acontece porque estamos crescendo
56% ao ano. Vai dizer que é venda de chips? Não é venda de chips, é a troca de
voz por vídeo e dados, que trafegam na mesma rede. Cada foto corresponde a 12
ligações de voz; cada vídeo a 120 ligações de voz. Então, toda vez que alguém
baixa um vídeo, está ocupando o lugar de 120 ligações de voz. Isso acontece a
cada instante.
Então, em prol da qualidade, vamos parar a comercialização? Isso não faz a
mínima diferença. O que faz diferença é a troca do telefone fixo pelo smartphone,
em que o sujeito troca o tipo de aplicação. Infelizmente, a situação para a
atratividade de investimentos é tenebrosa. Hoje a queda do negócio de
telecomunicações, no Brasil, é sensível. É muito arriscado investir em
telecomunicações no Brasil hoje. E com essa carga fiscal que nós temos... É
preciso mudar alguma coisa para que, de fato, se mantenha aquele ciclo de
investimentos que a gente está tentando.
Hoje o Brasil tem a pior margem do mundo em telecomunicações. E ninguém joga
para perder dinheiro. Nós temos vários tipos de impostos e o caso do Fust (Fundo
de Universalização dos Serviços de Telecomunicações), é gravíssimo: nós
recolhemos R$ 89 bilhões e apenas 7% foram aplicados, especificamente na
Anatel, na fiscalização da Anatel. Então, é muito dinheiro que se joga fora, ou
melhor, vai para o Tesouro. E essa teta vai secar.
Nós temos diversas ameaças. Eu diria para os senhores que estão pensando em
aumentar tributos, que a nossa situação é semelhante à do taxista. Imagina, nesse
momento em que várias cidades estão enfrentando a chegada do UBER, se a
decisão das prefeituras fosse aumentar a licença de táxi. É o contrário: isso faria
com que o UBER se instalasse mais rapidamente e cadê o aumento da receita? O
Uber não paga absolutamente nada hoje. E essa guerra nós estamos enfrentando
com as OTTs (Over The Top), empresas que usam os serviços de banda larga e
oferecem serviços gratuitamente ou não.
Uma TV por assinatura hoje tem obrigações de carregar canais abertos, levar
conteúdo nacional, tem de ter call center. E compete com o Netflix, que não tem
obrigação absolutamente nenhuma. Onde é tarifado e onde há base tributária? Na
TV por assinatura. O Netflix vai ganhar de goelada essa guerra. O mundo perdeu
bilhões de dólares de serviços de mensagens porque o WhatsApp ganhou.
Quanto foi arrecado de impostos com SMS no passado? Uma quantia muito
significativa. Hoje, quanto se arrecada? Nada, acabou o serviço.
A mesma guerra estamos enfrentando hoje com o serviço de voz com as ligações
por WhatsApp. Tem call center? Tem qualidade de serviço assegurada? Não tem
absolutamente nada. É muito mais fácil usar WhatsApp. Minha mãe tem 80 anos e
ela já consegue fazer ligação pelo WhatsApp. Eu falei para ela: não faz isso que
você está arrebentando a vida do seu filho!
Então, quando a gente discute essa questão se aumentamos ou não a tributação,
eu digo: só se vocês não dependerem de telecomunicações. Na medida em que o
estado depende das telecomunicações, tem que fazer com que ela sobreviva. Nós
estamos em guerra e este é o ponto que eu gostaria de colocar aqui.
Outro ponto que eu gostaria de destacar é que, cada vez que um estado aumenta
o ICMS, o bolso do consumidor não é elástico. Dona Maria coloca R$ 10 no pré-
pago e se desses R$ 10 ela puder consumir R$ 6, se aumentar o imposto ela vai
passar a consumir R$ 4, porque vai continuar colocando R$ 10, isso se tiver os R$
10. Então aqui, nós estamos excluindo gente. E é gente pobre.
Então, se alguém tem dúvida com relação a telecomunicações e desenvolvimento,
eu vou mostrar agora. Vemos aqui a carga tributária extremamente elevada. Ao
todo são R$ 60 bilhões por ano em impostos. Nós investimos R$30 bilhões e
pagamos o dobro desse valor em impostos. Só em ICMS é mais da metade.
Nós hoje temos 1400 pessoas só nessas atividades fiscais e de legislação
tributária. Nós somos campeões de carga tributária, atrás apenas da Argentina.
Então, eu fico me perguntando se um estado, que depende de telecomunicações,
vai nos levar à mingua? É fácil arrecadar? Sim, não tem a menor dúvida. Mas não
tem justificativa do ponto de vista do desenvolvimento do país.
Isso aqui é uma ameaça também: 43% de carga tributária. Hoje temos um
arcabouço de leis que diz que esse serviço é essencial, e a essencialidade taxada
em 43% é uma fragilidade que ninguém deve deixar de levar em conta. Então, se
você depende dessa arrecadação, preste atenção: esse é um serviço essencial.
O que está nos ameaçando hoje pode nos levar a R$ 8,4 bilhões de aumento de
tributação, tudo o que está sendo falado no festival de maldades do Joaquim Levy,
somado com os estaduais inclusive. Isso é duas vezes o lucro das empresas em
2014. Isso é assustador. Para quem quer investir hoje no país é complicado.
Temos a mesma tributação de fumo, perfumes, motocicletas. Isso é uma
fragilidade. Na hora em que se aumenta tributação e se coloca com o que se está
comparando telecomunicações, legalmente é fraco. Todos têm justificativa, que o
estado está quebrado, não interessa: legalmente é fraco.
Sem contar que, diversos estudos mostram que investindo principalmente em
banda larga existe um incremento no PIB equivalente. Ou seja, cada vez que se
interioriza o serviço de informação. Estamos longe de atender as áreas rurais, os
distritos, os povoados as demandas crescentes de prefeituras: o povoado tal não
tem torre, precisa colocar torre de celular. Mas eu vou colocar torre lá e o sujeito
não consegue pagar o serviço porque só de imposto é mais de 60% da conta, não
vai dar. Nós temos situações desse tipo.
Sem contar também com o emprego. Nós temos estudos demonstrando que a
capacidade de geração de empregos do setor de telecomunicações é muito maior
que o do setor automotivo. E nem sempre temos os mesmos benefícios.
Eu queria destacar este aspecto: nós temos uma balança que mostra, de um lado,
aumento da receita tributária no curto prazo. De outro a erosão da base tributária.
Então, a gente pode arrecadar mais, mas de alguma forma alguém vai ganhar
essa guerra e, no longo prazo, essa teta seca.
A política tributária deveria servir para incluir mais brasileiros e não criar mais
exclusão. Nós estamos na contramão do desenvolvimento social. Menos imposto
é igual a mais telecomunicações e mais desenvolvimento. Então, aumentar
imposto em telecom hoje, com a guerra que nós estamos sofrendo hoje,
principalmente das OTTs, é dar um tiro no pé. Obrigada.
Flávia Oliveira chama os participantes do painel para ocupar os acentos da mesa de debates:
Diretor Tributário da TIM – Gustavo Alves
Gerente Tributário da Vivo – Maurício Lima
Especialista em Tributação da Oi – Ana Carolina Magliano Romano
Gustavo Alves, diretor tributário da TIM. Bom dia a todos, gostaria de
agradecer o convite e a oportunidade. Para a área empresarial é extremamente
importante termos essa oportunidade para mostrarmos nossa visão. Poder dispor
de diferentes visões vem sendo uma característica desse governo, do contato que
temos com a secretaria de Fazenda. Já não é a primeira vez que temos essa
possibilidade de colocarmos as nossas preocupações, os nossos problemas, as
nossas dificuldades. E escutar também, compreender as necessidades da
Fazenda e tentarmos chegar ao que é melhor e adequado para ambas as partes.
A minha apresentação será breve, e temo que seja até um pouco repetitiva com o
que já falaram. Estamos procurando, nesse debate, que a gente espera que se
converta em algo pragmático, para que a gente tenha uma tributação justa. Justa
ao permitir que o estado tenha recursos para cumprir seus compromissos. E justa
para permitir que a empresa se mantenha num nível de atratividade para o
mercado adequada para o setor. Não há nada que se busque que seja diferente
disso, e que tenha como objetivo único o ganho de qualquer uma das partes.
Eu não tive como não plagiar o último gráfico do Duprat, porque ele é bastante
emblemático do que a gente tem hoje como cenário: 43% sobre a receita é algo
praticamente impossível de se sustentar. A gente viu numa série de
apresentações uma quantidade de dados que mostram a pressão de dois lados.
Existe a pressão tributária, que aperta a margem. Existe a pressão de mercado
que não sustenta uma aquisição maior, principalmente com os indicadores
econômicos que temos hoje no país. E a metade desse caminho é exatamente a
margem das empresas, que não tem como não ficar espremida.
Exceto por um processo de eficiência - que, certamente, é a busca de todos nós,
não só eficiência operacional, mas também financeira, mas que também tem seu
limite -, exceto por essa busca de eficiência, não há muita saída, a não ser uma
re-visualização de tudo que a gente tem, seja pela questão tributária, seja pelo
mercado como um todo. E também o mercado como um todo, acho que o alvo do
que se discute aqui é não só a justiça da tributação sobre os serviços específicos
de telecom, mas sobretudo o que o permeia, para que haja uma possibilidade
também de um equilíbrio nesse sentido.
O Brasil hoje, com a sua tributação, impõe uma barreira ao crescimento. Falar em
aumento de tributação pura e simples - eu ouvi hoje pela manhã algo que é
música para os nossos ouvidos - não é o intuito, mas poderá chegar num
momento de insustentabilidade do próprio estado.
Vou passar agora um vídeo sobre a famosa curva de Laffer. (Nota: Trata-se de
uma representação teórica da relação entre o valor arrecadado com um imposto a
diferentes taxas. É usada para ilustrar o conceito de "elasticidade da receita
tachável.). O que eu queria mostrar é que maior tributação não significa maior
arrecadação, porque existe um nível possível de se suportar a carga tributária. Até
porque, se essa carga não é suportada pelo mercado ela tem de ser suportada
pela empresa e nós não conseguimos suportar; não por má vontade, mas porque
temos nossos acionistas e uma bomba interna absolutamente insustentável.
O cenário econômico, já foi falado aqui, todos conhecem, todos sentem no dia a
dia. As margens estão apertadas. E aqui vou ousar discordar um pouco sobre o
que disse o presidente da Anatel de que a questão das OTTs não deveria
impactar na tributação porque já existe um fornecimento de serviço de dados e,
como tal, o serviço de dados já é tributado e, supostamente, ela pagaria de
alguma maneira e corrigiria esse problema. Não se corrige porque o mercado não
aceita, quem dá o preço, de uma certa maneira, são os nossos maiores chefes: os
nossos clientes, seja da TIM, da Oi, da Vivo, da Claro. Não podemos dizer: vamos
melhorar o preço, vamos melhorar a margem. Isso não é possível porque o
mercado não aceita.
Então a questão das OTT impacta sim a questão da arrecadação. O que a gente
fala, sob uma série de pontos de vista, é que o grande ponto de ponderação seria
termos as mesmas obrigações. Se existe uma percepção de que uma receita de
uma empresa se baseia num serviço prestado pelas operadoras, que essa
percepção tenha também a sua carga tributária justa e adequada. Talvez essa
possa ser a melhor forma de se achar um equilíbrio para o mercado como um todo
e esse novo cenário digital.
Infelizmente, 2015, obviamente devido à pressão que existe nas contas públicas,
tivemos um enorme retrocesso no cenário tributário, principalmente considerando-
se que tributar impacta no desenvolvimento que se pretende ter como um cenário
digital ou como um cenário de telecomunicações avançada e com difusão ampla
para todas as classes e para toda a sociedade.
Aqui tem uma série de exemplos, alguns já realizados, outros são preocupações
como a gente ouve falar da nova CSS, que seria uma contribuição em formato
alternativo do que hoje temos para PIS e Cofins. No caso das empresas de
telecomunicações, o impacto seria muito maior visto que hoje as receitas de
telecomunicações estão sujeitas a incidência ainda cumulativa de PIS e Cofins.
Isso tem bastante sentido a partir do momento em que há a possibilidade de se
creditar, se fosse aplicado ao nosso caso seria nula. A partir do momento que se
muda para um formato provável de CSS, é muito provável um aumento da
alíquota, mesmo com a possibilidade de desconto desses créditos. E, com a ajuda
das margens de lucro que decrescem, não vamos ter um aumento bastante
significativo da carga tributária. Novamente, algo que seria de dificílima
sustentação para qualquer plano de projeção de resultados para qualquer
operadora nos próximos meses.
Temos, sim, desafios tributários para ambas as partes e para o órgão regulador.
Trazemos aqui exemplos como o Fust que é um fundo que onera de forma
absurda as nossas contribuições. É um fundo que arrecada, e já tem mais de R$
80 bilhões arrecadados e com um retorno muito pequeno para o setor. Menos de
6% do que se arrecada tem retorno. Foi citado aqui que um cliente de planos pré-
pagos, só em relação a tributos de encargos regulatórios, custa, por ano, R$ 40
para uma operadora, com uma receita média mensal de R$ 9. Só para isso se
trabalha mais de quatro meses com pouquíssimo retorno do que se pagou. Esses
são os maiores desafios e as maiores necessidades.
A palavra-chave, no nosso entendimento, é que não existe a intenção de não
recolher. Todas as operadoras têm um compromisso social sério e uma vontade
de ser comply, posso falar como participante de todos os grupos técnicos do setor.
O problema é que ser comply, hoje em dia, se acrescermos a estas obrigações a
questão das obrigações acessórias, que nos levam a ter custos operacionais
enormes, obrigações duplicadas, em que em cada estado se modifica e nos obriga
a ajustar sistemas. Nós emitimos mais de 300 milhões de notas fiscais por mês.
Ser complay com isso, uma das obrigações acessórias, é uma tarefa hercúlea.
Tivemos, sim, algumas evoluções regulatórias. Um exemplo foi a redução das
tributações do segmento de machine to machine, o que, sem dúvida nenhuma é
razão do seu sucesso. Sempre que há uma racionalização da carga tributária, o
efeito é multiplicador. Temos experiências internacionais que mostram que,
quando há redução tributária, o crescimento é inegável. Por outro lado, temos
exemplos de países que aumentaram a carga tributária e sofreram, não só com a
queda da arrecadação, como com uma redução drástica do desenvolvimento do
setor. Obrigada.
Flávia chama Maurício Lima, gerente tributário da Vivo.
Maurício Lima, gerente tributário da Vivo – Boa tarde a todos. Quero fazer coro
a todas as palavras elogiosas ao evento. É muito importante, é uma evolução na
relação do governo com o contribuinte. Espaços como esse precisamos cultivar
para que a gente possa debater as questões que tanto nos afligem e que foram
colocadas aqui. Bom, vamos falar um pouco sobre a nossa visão de tributação,
nessa época de economia digital, e o que conseguimos enxergar pela frente.
Vamos falar um pouco de BEPS, que já foi mencionado e acho que é um caminho
que a gente pode trilhar para chegarmos a bom termo.
Quando a gente fala em olhar para frente e em como alcançar o mundo digital,
como tributar, nós temos certa dificuldade, porque são muitas questões que ainda
nos prendem ao passado. Ainda há muitas coisas relacionadas à telefonia fixa,
celulares, televisão, banda larga. A nossa constituição é de 1988, são 27 anos e a
gente e ainda discute conceito de comunicação. A Lei Kandir é de 1996 e a gente
ainda discute crédito, o que uma empresa pode tomar de crédito ou não. A Lei
Geral de Telecomunicações é de 1997. Isso gera todo um cenário de insegurança
jurídica, um contencioso gigantesco e uma série de obrigações acessórias com
um custo elevadíssimo de compliance.
Já foi falado sobre a carga tributária elevada. Eu quero enxergar um pouco para
frente e ver esse desafio de como se consegue trazer essas empresas para esse
mundo tributário que a gente enfrenta hoje. Essas operadoras OTTs. O desafio de
se tributar os negócios digitais hoje é global. O superintendente da Receita
Federal comentou hoje sobre os esforços do BEPS (Base Erosion and Profit
Shifting - Erosão da Base Tributária e Transferência de Lucros). Enfim, tributar o
mundo digital é uma prioridade para a OCDE (Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Económico), que é um órgão que contempla países de
economia livre. E as ações BEPS são feitas para combater essa erosão da base
tributária e transferência de lucros.
O grande ponto é: como alcançar essas empresas, porque, hoje em dia, podem
operar em qualquer país. Por meio de plataformas se consegue prestar serviços e,
por meio de pagamento por cartão de crédito, você chega nos clientes. Esse é um
desafio global, não é só do Rio de Janeiro, de São Paulo. É global e temos
discutido isso muito internamente na Telefonica, que é uma empresa espanhola.
Falando um pouco do BEPS, o Brasil não faz parte da OCDE, mas foi convidado,
por fazer parte do G-20. E lembrando que as discussões sobre as OTTs envolvem
questões regulatórias, se tributa ou não. Só para se ter uma noção da importância
dessa tributação tem na esfera digital, são 15 ações BEPS. Em algumas, o Brasil
já avançou, tem medidas análogas; em outras, tem medidas concretas, mas não
implementas e como o país está estudando.
A primeira ação do BEPS fala do desafio de se tributar a economia digital.
Algumas ações, o Brasil evoluiu nessa discussão como, por exemplo, troca de
informações entre os países; questões de transfer prize, teve agora o debate que
é a declaração de planejamento tributário, que foi rechaçada agora no congresso.
Eu quero focar no primeiro tópico que é o desafio da tributação na economia
digital. Eu acho que aqui há um caminho que a gente pode trilhar e chegar a um
bom termo. O grande ponto que nós temos - que é o objetivo que se tem, quando
se fala em BEPS - é como ter jurisdição sobre essas empresas. Como se faz para
que, tendo negócios no Brasil, ela seja tributada e seja sujeita às mesmas regras.
Eu não estou aqui, longe de mim, avaliando se a empresa tem de pagar ICMS. O
ponto dessa discussão é como ela ficaria, dentro de um contexto de uma
jurisdição local, como nós estamos, para que a competitividade seja preservada.
Então, super resumindo o que falou o BEPS, essa primeira ação e pegando
apenas alguns itens, sem entrar em muitos detalhes. Definição de serviços
digitais: como se consegue caracterizar que esses serviços digitais têm presença
relevante no país. Assim sendo, como se compara isso ao estabelecimento
permanente no país e aí, sim, poderia se comparar com o contribuinte local.
Qual o conceito de serviço digital? O BEPS elenca uma série de serviços, por
meio de vários elementos que podem caracterizar um serviço digital, como, por
exemplo, se o core business da empresa é ligado parcial ou totalmente aos
serviços digitais; se para prestar o serviço não tem elementos físicos nos bens e
serviços prestados; se os contratos são firmados remotamente pela internet; se as
vendas são por meio de cartão de crédito ou outros meios eletrônicos; se o
relacionamento entre as empresas e seus clientes se dá por website, sem
atendimento físico. Se você quer comprar um jogo, baixa da internet, paga com
cartão de crédito e isso facilita muito a vida. O local do estabelecimento da
empresa é irrelevante ao cliente e não influencia suas escolhas. A pessoa está
comprando um jogo, pouco importa de que país ele é. E a atividade da empresa
não requer elementos físicos, a não ser equipamentos de TI.
Então, tendo essas características, e outras que não foram citadas, dá para
conceituar quais seriam os serviços digitais. Uma vez conceituado serviços
digitais, eu vejo que haveria o segundo passo, que é ver se tem presença
relevante no país. O BEPS dá dicas para isso. Por exemplo, pelo número de
contratos entre a empresa e seus clientes; se o serviço é largamente consumido
no pais; se tem remessa de valores; se tem filiais no Brasil que não vendem o
serviço, mas prestam assistência técnica; se o relacionamento com o usuário, no
período acima de seis anos, é combinado com alguma prestação física ou por
meio de agentes locais; se há website em língua local; se há o uso de bancos e
outras facilidades para os fornecedores locais para pagamento de serviços; e se
muitas vezes usam dados coletados para gerar receitas.
Se conseguimos conceituar serviços digitais e conseguimos caracterizar presença
digital no Brasil, o passo seguinte, seria, por exemplo, ver a obrigatoriedade de ter
um representante no país, ter um CNPJ e inscrição estadual, quando aplicável.
Como já disse, não vou entrar no mérito se deve ser contribuinte de ICMS pois é
caso a caso, empresa a empresa, serviço a serviço e eu não seria nem leviano de
falar, sem conhecer detalhadamente o serviço das empresas para chegar uma
conclusão tributária. Então tem de ter representante, tem de ter CNPJ, a empresa
tem de ter um meio de cumprir, de forma simplificada, suas obrigações acessórias.
E para que tudo isso seja feito e esse conceito de estabelecimento permanente –
e hoje o superintendente da Receita Federal comentou que os tratados serão
adaptados para isso, porque é uma necessidade pois hoje os tratados contêm o
conceito de estabelecimento permanente. Isso tem que ser mudado, pois uma
empresa que não tenha nada no brasil, mas tenha essa significativa presença
digital, deveria ter seu estabelecimento aqui constituindo e cumprindo com as
demais obrigações como todos nós aqui estamos.
Enfim, uma vez tendo estabelecimento permanente, as empresas se equipararia
ao contribuinte local, sujeita às mesmas regras sobre os mesmos serviços:
inscrição estadual, regime especial para facilitar o cumprimento das obrigações
acessórias. Para isso, tem te haver o consenso entre os estados. Nós penamos
demais com isso, como o Gustavo comentou, qualquer obrigação nova como em
TV, como dividir o ICMS, vem a Lei Complementar 87 com diversas discussões
que a gente está tendo. Para que isso vire realidade, tem que ser algo
consensuado entre os estados. Se não esse é o caminho para tributar essas
empresas, mas vai gerar mais obrigações tanto para elas quanto para nós. Esse é
sempre o nosso receio. Mudanças sempre nos deixam preocupados porque,
normalmente, aumenta a carga tributária e o tempo para cumprirmos as nossas
obrigações acessórias.
Enfim, eu acho que, cumprindo esses passos, e nesse caminho de BEPS – já
estou finalizando – há um caminho a trilhar que a gente pode fazer para que tais
empresas se equiparem aos contribuintes locais. Então, olhando para frente, o
que a gente precisa é solucionar área antigas, há uma quantidade de passivos
que precisamos resolver o mais rápido possível. Com base nas experiências
internacionais, há um caminho a trilhar em negócios digitais.
O que a gente busca, e é premente, é um cenário de segurança jurídica. Como
multinacional, o que mais os nossos acionistas temem é o cenário de insegurança
jurídica. Esse é o principal ponto que nos afeta, e é o nosso grande dilema. É
muito difícil explicar para o nosso acionista espanhol como é o sistema tributário
no Brasil. Por que a gente tem um contencioso grande, mesmo arrecadando tanto.
Por que precisamos ter tantas pessoas nas áreas tributárias. A gente precisa de
uma carga tributária que mantenha a competitividade e não sufoque o setor como
a que temos hoje. E como eu disse, maior simplicidade no cumprimento das
obrigações tributárias e acessórias.
Esses eram os pontos que eu gostaria de compartilhar. São só alguns extratos
desse capítulo que eu mencionei de BEPS. Acho que há algo que a gente possa
fazer. O futuro, apesar de todos os dilemas, a gente vai conseguir chegar a bom
termo, se estivermos aptos e com maturidade. Com os mesmos objetivos, a gente
consegue chegar. Há um caminho a trilhar para que esses objetivos sejam
alcançados. Obrigada novamente e uma boa tarde a todos.
Flávia Oliveira convoca a especialista em tributação da Oi, Ana Carolina Magliano Romano. E informa que, na sequência, abrirá para perguntas.
Ana Carolina Magliano Romano, especialista em tributação da Oi - Obrigada
pelo convite. Vou falar o que todo mundo já falou, que a tributação hoje
corresponde a 43% da receita líquida das empresas. A gente pode concluir, então,
que o estado é um sócio que a gente tem e que tem interesse que a nossa
atividade produza. Então, é um contrassenso a gente discutir aumento de alíquota
agora, ainda mais num ano de crise que a gente está vivendo. Seria desacelerar
todo o desenvolvimento que a gente tem buscado.
Os desafios que nosso mercado enfrenta são diversos. Primeiro, a concorrência
entre as empresas de telecomunicações, que são sempre muito agressivas, muito
fortes, a gente tem sempre que buscar o preço mais atrativo. Temos de buscar
planos alternativos para os usuários. Nossas ofertas estão com preços cada vez
mais em conta. O consumo acaba que aumenta. Aqui nesse slide, um mostro o
quanto a gente teve de reajuste na tarifa de telecomunicações, abaixo de todos os
índices de correção da economia.
A concorrência entre as empresas já é um desafio para a gente manter atrativo o
serviço para o usuário. Além disso, como todos já falaram aqui, há os novos
players que são as OTTs, que, justamente por não sofrerem uma tributação tão
agressiva como a gente sofre, e mais, por não terem nenhum tipo de custo de
infraestrutura de redes de telecomunicações - elas usam e abusam da nossa
infraestrutura -, é muito difícil competir. Eu até discordo um pouco do que o que
alguém falou que com a evolução do mercado o pager foi destruído pelo celular.
Só que o celular não usa a rede do pager. A gente investe e desenvolve a nossa
infraestrutura para estimular a concorrência.
Então, é muito complicado a gente competir com esses players novos do
mercado. A gente tem o WhatsApp, Facebook que você acessa e conversa. Então
é complicado, a nossa capacidade aumenta e a receita reduz. E como investir, se
a nossa receita reduz e a nossa infraestrutura está cada vez mais precisando de
investimentos?
Para completar, outro desafio é a carga tributária super agressiva. Em tempos de
crise, nove estados aumentaram a alíquota, fora a carga efetiva de TV. Como?
Foram 27? Então, até o final de março, a gente ainda pode ter aumento de
alíquota. Cada dia a gente abre e-mail e vê a publicação de uma nova alíquota.
Então está complicado acompanhar essa fúria dos fiscos e justamente quando a
discussão em voga no Supremo é sobre a essencialidade e a seletividade do
tributo, quando o contribuinte, de fato, está reclamando da carga tributária que é
passada para ele.
Então, um serviço tão essencial, que é um pilar da economia moderna, ser
tributado, como colocaram aqui anteriormente, como armas, lanchas, motos é um
absurdo. Realmente, o contribuinte, de fato, reclama e é difícil dizer que ele não
tem o direito de reclamar. Esse aumento de alíquota eu acho super fora de hora,
embora os estados estejam precisando de receita. Acho que muitos fatores e
muitos critérios precisam ser pensados antes desse aumento de alíquota.
Aqui demonstra como o nosso faturamento vem caindo. Não é nem do Rio de
Janeiro, é outro estado onde atuamos, mas mostra como o faturamento e a base
de clientes da telefonia fixa vêm caindo. É muito complicado a gente acompanhar
e competir, com essa carga tributária tão elevada, com esses novos concorrentes.
Além desses desafios que todo mundo colocou, de uma certa forma, o que a
gente tem enfrentado, outra perda de receita que as empresas acabam tendo é
com o custo do contencioso. A gente ainda recebe autuação de matérias que já
estão pacificadas. Não sei se essa mentalidade de praticidade chega a todos os
fiscais, mas a gente ainda recebe autuações de matérias que já são pacificadas
como crédito de energia elétrica, habilitação de planta. São teses já pacificadas e
o setor de telecomunicações ainda tem de ficar discutindo isso.
A gente tem alto custo de defesa. A gente tem custo de R$ 120 milhões por ano
de garantia judicial para poder ficar discutindo. E a gente acredita em muitas
dessas teses e por isso a gente acaba tendo pouca adesão às anistias estaduais.
Pouca coisa, no nosso contencioso, seria pagável em acordo, porque a gente
acredita nas teses que a gente tem tratado, com exceção de alguma coisa ou
outra. A gente tem interesse em algumas anistias principalmente para pagamento
de autos parciais. No Rio, a gente ainda não consegui fazer isso, mas acredito que
depois de hoje a gente possa caminhar para um acordo. O estado tem interesse e
a gente também tem.
Então são custos que a gente tem. Como todo mundo falou, as obrigações
acessórias são extremamente volumosas, tanto na esfera federal, estadual e
municipal, nosso corpo de funcionários é muito grande. E somos sujeitos às mais
variadas penalidades, porque é muito fácil errar. Além disso, a gente tem as
obrigações regulatórias, principalmente para as concessionárias, chegam quase a
ser cruéis.
E a inadimplência, temos um índice muito elevado de inadimplência e o ICMS
desses clientes que não pagam tem de ser pago. É muito difícil a gente ter sobra
de receita para investir. A nossa proposta, como todo mundo colocou, é que
quanto menos investimento, menos vamos oferecer serviços de qualidade, menos
receitas a gente vai ter, menos base tributária vamos ter. A consequência é
aumento de alíquota e aí temos uma bola de neve. A gente nunca vai ter aquela
folga para investir melhor no nosso serviço. Quando na verdade se a gente tivesse
um cenário de desoneração, seria muito mais atrativo para investir, melhorar a
qualidade, melhorar a rede, oferecer um serviço melhor, aumentar a base
tributável, aumentar a receita do estado que é meu sócio. Assim seria uma forma
mais feliz para todo mundo. É isso.
Flavia convidou para voltar à mesa de debates João Resende, presidente da Anatel, e Leonardo Costa, auditor fiscal do estado do Rio de Janeiro, para 20 minutos de debates.
Pergunta de Renata Ribeiro, auditora da Secretaria de Fazenda, dirigida ao presidente da Anatel, João Resende, mas que Flávia Oliveira considerou que poderia caber a todos:
“Considerando que os serviços OTT - Voz sobre IP, Vídeo Netflix, WhatsApp – são prejudiciais à concorrência e têm promovido migrações de usuários, queda na arrecadação dos estados, não seria o caso de se criar regras mais rígidas?
João Resende – Bom, a Anatel não tributa ninguém. A questão que considero
importante dizer, é que as empresas muitas vezes apresentam um quadro que
muitas vezes a gente olha e vê que muitas vezes o problema não está só no lado
externo, está no interno também. Nós precisamos ser um pouco objetivos nessa
questão. O que nós temos de fato, é uma tendência de competição com esses
atores, mas eu prefiro dizer que eu prefiro desamarrar os atores atuais do que
amarra os outros.
Nós temos uma realidade que já é complexa na prestação de serviços, a Ana
apresentou um gráfico da telefonia fixa, mas isso não é um problema da regulação
o fato da telefonia fixa estar caindo. É o cidadão que não quer falar no telefone
fixo. Então eu tentar tirar uma foto do cenário atual do mercado tradicional e levar
para o mundo digital seria um erro, falando objetivamente.
O ideal seria diminuir a carga tributária e regulatória da economia tradicional, tanto
que o Ministério das Telecomunicações, junto com a Anatel, está pensando numa
proposta de uma reformulação do marco regulatório da telefonia fixa.
É importante dizer isso. Em primeiro lugar, a Anatel não cuida de direito autoral.
Nós não cuidamos de regras tributárias, é a segunda questão. O que nós
cuidamos é da regulação do setor e, neste momento, tarifa e preço só é regulada
na telefonia fixa. Então, quando eu vejo as empresas reclamando da concorrência
das OTTs, é importante dizer que o WhatsApp usa dados, usa rede das
operadoras, mas o usuário está pagando pelo uso de dados.
Aí a empresa diz que não tem condições de atender a demanda de dados. Mas
isso não é problema do órgão regulador e sim das empresas, que têm de saber
como monetizar e rentabilizar o tráfego de dado da sua rede. Eu já vi outro
(executivo) da Telefonica dizer que seria interessante reduzir o número de
competidores. Ora, isso não cabe à Anatel escolher quem é que sai do mercado.
Não posso chegar e dizer “Telefonica, se vende para a TIM”. Isso não tem
cabimento.
Então, a discussão fundamental é: existe muita coisa de regulação que atrapalha.
Existe a questão tributária, mas também tem a questão interna das empresas.
Muitas empresas poderiam, por exemplo, ter um aplicativo como o WhatsApp, por
que não? É importante dizer que há também um certo acomodamento da situação.
Existe uma infraestrutura para ser feita, existe pressão sobre o tráfego de dados,
mas existe um longo caminho e uma longa demanda também: máquina a
máquina, setor público que não é atendido.
Eu acho que é um setor dinâmico e o que mais atende às questões de
infraestrutura. Mas, muitas vezes, as empresas são extremamente conservadoras
e não acompanham o desenvolvimento que exige esse mercado tecnológico. Eu
vou dizer uma coisa que vai parecer absurda: eu olhei para o Leonardo e disse
“você vai ter que brigar com a TV aberta, porque você vai cobrar ICMS da
radiodifusão. Não sei se você vai conseguir cobrar ICMS de mídia, isso daria uma
confusão terrível. Você já tem solução para isso, mas quero ver, na prática, como
você implementa isso, porque a TV aberta também está num processo de queda
de receita”.
Bom, a internet é irreversível, ou alguém acredita que não é? Quando a internet
chegar a um sistema, em que é um serviço essencial, esse debate que nós
estamos iniciando aqui vai se aprofundar. E tem uma coisa que eu sempre falo
quando encontro os amantes da internet livre, que dizem que a internet não se
paga - porque as empresas também criaram esse slogam de “internet ilimitada” e
isso criou um problema, porque não há nada ilimitado, tudo tem que ser pago:
energia elétrica, água, internet também tem de ser. E a Internet vai se tornar
irreversível e os Estados nacionais vão ter de achar formas de tributação para
isso. Agora, o risco é errar na forma de se fazer. Se nós formos pegar todo os
riscos que nós temos hoje na economia tradicional e levar para a economia da
internet, isso pode significar um atraso muito grande para o desenvolvimento
tecnológico do país.
Flávia Oliveira: Eu vou fazer um pouco o papel do advogado do diabo. Você falou sobre os novos negócios com uma clara intenção de pensar novos modelos de rentabilidade, faturamento e novas receitas para as empresas. Mas a discussão aqui é muito objetiva na direção de um setor público
necessitado de receitas e que está prestes a aumentar a tributação sobre os negócios vigentes.
E o outro ponto é um comentário que o Duprat fez em relação à sua sugestão de rentabilização dos serviços de dados, de que não há espaço para aumentos no valor dos serviços no cenário atual de economia em recessão.
O secretário Júlio quer falar um pouquinho, depois eu vou democratizar passando para os outros membros da mesa.
Júlio Bueno, secretário estadual de Fazenda – Eu só queria trazer aqui uma
mensagem do governador que me pediu para falar isso para as empresas. A
gente topa reduzir as alíquotas no Rio de Janeiro, fazer um acordo colocando
junto todos os autos. Fazer um grande acordo que permita - ele acredita e o
secretário de desenvolvimento também, eu não acredito – um aumento de receita.
Ele topa fazer essa discussão com a proposta de vocês, incluindo todas as
questões e as querelas que a gente tem, olhando todo o quadro, inclusive os
autos de inflação, as questões colocadas na dívida ativa. O governador mandou
falar isso, embora eu não seja completamente a favor.
Flavia Oliveira: Alguém gostaria de comentar? Leonardo, por favor.
Leonardo Costa, auditor Fiscal da Receita Estadual do Rio de Janeiro – Dois
comentários apenas. Primeiro que eu sou técnico, então me passaram uma
missão técnica. Então eu tenho duas observações apenas. Sob o ponto de vista
técnico, o mundo vivia fundamentado em Estados nacionais, em que cada país
fixava as suas regras, impunha os seus tributos, definia a sua carga tributária e as
atividades econômicas não eram movidas, eram mais fixas. Os substratos
econômicos de incidência de tributos são: capital, renda, trabalho, tecnologia.
Quais são os fatores mais facilmente movíveis? O dinheiro, a patente, a
tecnologia. O trabalho é o menos móvel, em especial num país grande como o
Brasil, que não tem uma comunidade local em que haja a migração de trabalho
como fator. Então, a tendência é a carga tributária, no fator de produção que não
tem mobilidade, que a carga tributária suba e reduza naqueles fatores que têm
facilidade de movimentação.
E a Internet veio potencializando esse fenômeno. Ela potencializa essa quebra de
barreiras e de fronteiras. Eu fui convidado uma vez para participar de um evento,
em Brasilia, do Conselho Federal da Ordem dos Advogados sobre o direito no
século XXI. Eu escrevi um artigo e, nesse dia, estavam presentes o Ministro da
Fazenda, o presidente da república, o secretário da Receita Federal. E a minha
conclusão foi muito simples e eles me olharam com uma cara de surpresos.
Talvez hoje não ficassem tão surpresos.
A identificação do problema é muito simples, sob o ponto de vista técnico. Trata-se
de um problema multilateral. Não é um problema unilateral. Você só tem soluções
de problemas multilaterais, no plano multilateral. Não há como resolver esse tipo
de problema de forma individualizada por cada país, a não ser que se faça como a
China ou corte os cabos submarinos, ou bloquei o seu satélite ou faça um
monitoramento integral da internet. Agora, se quiser participar da comunidade
global – e esse é o caminho que o país deve seguir -, o diálogo tem de ser aberto.
O meu pessimismo até certo ponto é que eu não vejo, até hoje, nas autoridades
brasileiras, a preocupação de se planejar para o médio e longo prazo. Trata-se de
uma questão de sustentabilidade. No Brasil, a mentalidade do brasileiro – isso não
é um problema só do político, se não houver política, não há país, isso não é um
problema técnico e sim cultural – é pensar muito no curto prazo. Estamos sempre
querendo resolver o problema de hoje e de amanhã. Nós não planejamos o futuro.
Daí vem o meu pessimismo, com esperança que a comunidade global ou pessoas
– e aqui vai um elogio ao secretário, que eu não conhecia, estou conhecendo hoje
– de levantar esse tipo de abordagem, que revela uma preocupação não apenas
no curto prazo, mas também de médio e longo prazo, porque esse é um problema
de natureza multilateral. Se revela não apenas para o setor público, mas também
para o setor privado. Essa dicotomia setor privado x setor público é uma falácia.
Não existe preponderância. Ou há um compartilhamento de visões e interesses ou
todos estaremos fadados a ir a lugar nenhum.
Flávia abre para perguntas.
1 - A pessoa não se identificou e fez uma pergunta dirigida ao presidente da Anatel: “No âmbito da reformulação dos modelos de negócio, há simpatia pela Anatel para que os recursos do FUST e Funttel sejam utilizados para investimentos em redes de telecomunicações?
João Resende, presidente da Anatel – Vou responder rápido: nenhum usuário
compra internet seca Então, a expansão que nós tivemos nas telecomunicações
se deve também à produção de conteúdo. Essa é uma questão que tem de ser
colocada em relevo.
A outra questão que você colocou: a operadora não monetiza os dados porque
não pode. Bom, mas aí é uma questão do mercado, aí ninguém vai salvar. O
mercado tem de encontrar uma saída. Os jornalistas me perguntam quando sai a
consolidação. O desejo do regulador é que sempre haja competição.
E a questão do Fust (Fundo de Universalização dos Serviços de
Telecomunicações) seria desejável que ele fosse utilizado em benefício das redes
de telecomunicações. Mas nós temos uma incongruência: o Fust nasceu vinculado
à telefonia fixa. Nem isso, até hoje, conseguimos mudar. Os projetos são para a
expansão da telefônica fixa e o usuário não quer telefonia fixa. Então temos de
mudar a lei para que o Fust seja utilizado para outras finalidades, como a banda
larga.
E aí temos outro problema que também atinge os estados, que é o problema
fiscal. Há um contingenciamento dessas verbas. Inclusive, a Anatel também está
passando por um contingenciamento. No ano passado, a Anatel arrecadou R$ 12
bilhões, incluindo o leilão da faixa de frequência de 700 Mhz, que rendeu R$ 5
bilhões. Esse ano, arrecadamos R$ 8 bilhões e o nosso orçamento é R$ 400
milhões. É uma diferença enorme. Mas temos de entender que o Estado brasileiro,
assim como o estado do Rio de Janeiro, também tem outras prioridades.
Saneamento básico é prioritário em relação à Internet. Eu acho que é. Se não
vamos ter crianças com barriga d´água acessando a internet.
Então eu acho que essa é uma questão de configuração do Estado brasileiro. Há
uma discussão de que temos um excesso de arrecadação dos fundos. Se eles
não estão sendo aplicados, é preciso reduzir a carga tributária. Agora, nós
sabemos qual a situação fiscal do país.
Leonardo Costa, auditor Fiscal da Receita Estadual do Rio de Janeiro, pediu para falar novamente – Sem querer ser deselegante com a representante da Oi,
e aproveitando os três temas. Você falou sobre a jurisprudência, por que não se
pacificaram determinados assuntos, por exemplo, decisões reiteradas do STJ. O
STJ não tem efeito vinculante. Vou te dar um exemplo: tenho aqui a súmula do
STJ sobre provedores de internet. Pela tese majoritária jurídica brasileira, (...) em
tese o conceito sobre o que seria telecomunicações, seria fixado pela Anatel. Pelo
conceito fixado pela Anatel, vários desses serviços estariam fora do conceito de
telecomunicações e seriam serviços de valor adicionado, razão pela qual, em
função de inexigibilidade de autorização ou outorga, eles estariam afastados do
campo de incidência.
Há dois problemas aí. Em primeiro lugar, essa é uma visão jurídica brasileira e aí
vem mais uma crítica sobre a formação dos advogados brasileiros. Nos EUA,
quem vai se formar como advogado já é graduado em engenharia, economia, ou
já foi à guerra, e tem uma experiência de vida. No Brasil, a formação é o direito e a
nossa grande influência do direito, em especial o português, nós temos uma
mentalidade, em relação a como o direito se forma e como ele deve ser aplicado,
muito ideal. E essas atividades, de uma hora para outra, a Anatel, não mais
qualificou como de serviço de valor adicionado e qualificou como serviço de
telecomunicações. A súmula do STJ foi revogada? Essa é a primeira dificuldade
Segundo ponto de dificuldade, são visões distintas da formação da base de
cálculo. No caso da energia, que é semelhante à questão dos serviços de
habilitação, muitas vezes o contribuinte tem um entendimento e o fisco tem um
entendimento um pouquinho diferente. Porque se você fragmenta a sua atividade,
não é um contrato jurídico, a forma de um contrato, se é um leasing ou
arrendamento mercantil que vai qualificar a natureza do evento econômico
subjacente.
Então, o fisco tem uma tendência, natural, de se diferenciar um pouco do
advogado do mercado e do conceito do mercado que é se fixar na forma jurídica.
O fisco tem uma visão um pouco mais vinculada à materialidade, o evento
econômico que está por trás, coisa que ainda não chegou ao Brasil, mas que, nos
EUA, ocorre desde a década de 1950: substância sobre a forma, step by step
translation.
Em relação à regulamentação por parte do Brasil do preço de transferência, no
que se refere aos intangíveis, na minha concepção, isso é falacioso. Nós não
conseguimos chegar aos intangíveis no Brasil. Nós só temos margens arbitradas e
os intangíveis estão completamente fora. E todo problema de preço de
transferência está no intangível.
Flavia encerra o II Painel e chama para o almoço.