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REGIÃO METROPOLITANA INTERFEDERATIVA: UMA ALTERNATIVA À RIDE DF E ENTORNO?
RESUMOBrasília, idealizada como centro do poder político e administrativo federal – a metrópole terciária – mesmo que contra o planejamento inicial, reproduziu o padrão de exclusão observado nas metrópoles industriais. Em volta da Capital Federal, surgiram núcleos urbanos periféricos como consequência do avanço de Brasília para fora do DF. Nota-se que desde a década de 1960 foram utilizadas diversas estratégias para promover o desenvolvimento desta região, que culmina na Região Integrada de Desenvolvimento – RIDE. A RIDE não conseguiu articular a ação e planejamento de seus participantes. O Estatuto da Metrópole1 inova a política urbana nacional quando prevê a criação de regiões metropolitanas entre municípios de unidades da federação distintas, sob o sistema de Governança Interfederativa, que será analisado como uma alternativa para o atual modelo de planejamento e gestão do Espaço Metropolitano de Brasília.
PALAVRAS-CHAVEBrasília, Espaço Metropolitano de Brasília, RIDE, Região Metropolitana, Governança Interfederativa.
1 Lei Nº 13.089, de 12 de janeiro de 2015. Institui o Estatuto da Metrópole e dá outras providências.
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INTERFEDERATIVE METROPOLITAN REGION: AN ALTERNATIVE TO RIDE DF?
ABSTRACTBrasília, idealized as the center of federal political and administrative power - the tertiary metropolis - even against initial planning, reproduced the pattern of exclusion observed in industrial metropolises. Around the Federal Capital, peripheral urban nuclei arose as consequence of the advance of Brasilia outside the Federal District. It is noteworthy that since the 1960s various strategies were used to promote the development of this region, culminating in the Integrated Development Region (RIDE). The RIDE was unable to articulate the action and planning of its participants. The Metropolis Statute2 innovates the national urban policy when it foresees the creation of metropolitan regions between municipalities of different federation units, under the Interfederative Governance System, which will be analyzed as alternative to the current model of planning and management of the Brasilia Metropolitan Space.
KEYWORDSBrasilia, Brasilia Metropolitan Space, RIDE, Metropolitan Region, Interfederative Governance.
2 Law Nº 13.089, of January 12, 2015. Establishes the Statute of the Metropolis and makes other provisions.
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INTRODUÇÃOA metrópole não pode ser entendida como uma unidade isolada. Sua existência,
pressupõe uma interconexão, seja na escala regional ou na escala metropolitana, criando
uma área de influência que abarca diversas outras unidades administrativas distintas do
núcleo, porém estritamente ligadas pelas ações cotidianas. Desta forma, a metrópole não
pode ser vivida, pensada e planejada ignorando as características da região ao seu redor.
Criada como intuito de cumprir exclusivamente as funções de capital política e
administrava do Brasil, a realidade de Brasília aponta para a existência de uma grande
metrópole, onde os limites administrativos entre as unidades da federação (DF e GO) pouco
são observados por aqueles que vivem em constante movimento entre suas fronteiras.
Por ser a Capital Federal, Brasília goza de uma série peculiaridades que tornam a
gestão do seu espaço metropolitano e regional ainda mais complexo do que em outras
metrópoles nacionais. Apesar da realização de esforços, nota-se que o modelo de
articulação da ação administrativa atual deste espaço é limitado, assim é necessário refletir
e apresentar alternativas para promover o desenvolvimento desta região.
A METROPOLIZAÇÃO DO ESPAÇO
O atual estágio da urbanização no Brasil tem como uma das suas principais
características a metropolização. Mesmo com o ganho gradativo de relevância das
atividades das cidades médias, as metrópoles permanecem sendo o palco principal das
dinâmicas sociais e econômicas do país.
A metropolização não pode ser entendida como um superlativo da urbanização,
mas como um processo extremo, radical da divisão territorial do trabalho “atravessado por
complexas formas de cooperação entre agentes de desigual grau de capital, tecnologia e
organização” (SILVEIRA, 2015, p. 99).
O processo de metropolização ainda pode ser percebido como um estágio mais
avançado da urbanização. Uma de suas principais características é o fluxo de pessoas,
mercadorias e informações, além da conurbação, onde pouco se observa os limites
administrativos entre as cidades englobadas pelo fenômeno (LENCIONI, 2011).
A metropolização do espaço é uma fase do desenvolvimento urbano na medida que
é uma continuidade, uma sucessão do processo de urbanização, porém, possui
características distintas. Segundo Lencioni “é como se a metropolização do espaço se
constituísse em uma segunda natureza da urbanização, no sentido de uma urbanização
com nova essência e substância” (2017, p. 150).
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A metrópole contemporânea, segundo Lencioni (2011, p. 135) “apresenta uma
forma territorial nova, que pode ser descrita como uma ampliação da metrópole moderna,
herdada do processo de urbanização e industrialização”.
Anteriormente forjada sob a tutela do regime de acumulação fordista, que exigia
uma grande cidade que abrigasse todas as etapas da produção industrial, hoje, a metrópole,
é o cerne das atividades de gestão da informação, dos capitais e dos processos produtivos
que agora estão desconcentrados em diversos pontos do globo. Neste sentido, Sposito
(2015, p. 134) destaca que as metrópoles têm diminuído progressivamente sua participação
na produção industrial, em contraponto, tem aumentado seu papel de comando e gestão do
capital.
Da perspectiva institucional, a metropolização avança sobre fronteiras
administrativas e “produz um aglomerado metropolitano com alta densidade de área
construída apresentando áreas bastante conurbadas e interrompidas, aqui e acolá”
(LENCIONI, 2003, p. 36).
Assim, é possível afirmar que a metrópole não pode ser encarada numa
perspectiva que abarque somente sua estrutura intra-urbana, o espaço circunscrito aos seus
limites oficiais e institucionais. A metrópole não respeita limites administrativos, avança
sobre espaços que lhe são alheios e sua dinâmica impacta diretamente os espaços
contíguos que ao participar dessa dinâmica, passam a constituir uma parte da metrópole.
Pensar a metrópole, a região metropolitana ou o entorno metropolitano é pensar uma região. Mesmo examinando apenas a metrópole, o espectro da região aparece, porque ela em si não é mais uma cidade isolada, mas uma cidade-região (LENCIONI, 2017, p. 189).
A espacialidade metropolitana é caracterizada como processo socioespacial que
está fora do alcance dos atores políticos, surgindo historicamente, não dependendo,
exclusivamente, do interesse dos governantes, mas sim da inter-relação entre atores sociais
distintos. Já, a institucionalidade metropolitana, é revestida, “por vezes, de caráter político,
da frágil compreensão do fenômeno metropolitano e da ausência de uma política regional
consistente que faz da região metropolitana a única instância regional prevista na legislação”
(FIROWSKI, 2012, p. 35).
Para Costa (2013, p. 326) a institucionalização de uma Região Metropolitana, pode
ser entendida pelo prisma do desenvolvimento regional, de forma a promover o
desenvolvimento da região em torno do município polo, ou então, sob a perspectiva do
reconhecimento de sua dinâmica e da necessidade de propor alternativas de gestão destes
espaços, devido à dificuldade político-institucional de gerir territórios fragmentados.
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O PROCESSO DE METROPOLIZAÇÃO DE BRASÍLIA
Brasília deve ser entendida como a sede do governo federal, a cidade idealizada, o
núcleo metropolitano onde se agrupam as atividades do circuito superior da economia e
onde os órgãos de governo, tanto federal como distrital, estão instalados e exercem seu
comando. Com o intuito de preservar a “pureza” de Brasília, foi estabelecida uma área
geometricamente delimitada na forma de quadrilátero que circunda a Capital Federal e que
a inclui: o Distrito Federal. Desta forma, a gestão deste espaço possui especificidades que a
tornam um caso ímpar e impacta diretamente a região a seu redor.
O processo de construção da Brasília idealizada por Lúcio Costa – o Plano Piloto –
é paralelo à precarização do lugar de moradia dos mais pobres, neste momento, os
imigrantes que trabalhavam nos canteiros de obras. Devido ao interesse de afastá-los do
centro do poder federal, antes mesmo da inauguração da Nova Capital, foi criada a cidade
satélite de Taguatinga, em 1958, a uma distância de 30 km do centro, com o intuito de
refugiar esta mão-de-obra.
Entre a década de 1960 e 1970, a população do Distrito Federal passou de 140 mil
habitantes para 537 mil habitantes, crescendo a uma taxa média anual de 14,4% ao ano,
contrastando com sua periferia que registrou saldos migratórios negativos neste período
(GUIMARÃES & LEME, 2000). Na década seguinte, vários municípios limítrofes ao Distrito
Federal cresceram vertiginosamente baseados na expansão da área de influência de
Brasília, do seu mercado consumidor e do setor de serviços.
O crescimento de Brasília para fora dos limites do quadrilátero do DF, a partir da
segunda metade da década de 1970, é determinante para o processo de formação do
Espaço Metropolitano de Brasília e pode ser explicado, em parte, pela indisponibilidade
política da terra. Essa indisponibilidade política é caracterizada pela propriedade pública da
terra que estava sob a tutela do Governo do Distrito Federal que mesmo com a farta
existência de terrenos desocupados, não teve iniciativa e interesse em promover uma
política habitacional, renegando o acesso à terra urbana, principalmente a população mais
pobre que se estabeleceu em invasões e favelas, a contragosto do poder público. Em suma,
havia grande disponibilidade de espaços para acomodar a população mais necessitada,
mas também havia interesse político em mantê-los longe de Brasília.
O rígido processo de controle da terra urbana imposto pelo Estado, pressionou a
ação do setor imobiliário e impulsionou a exploração de espaços alternativos, neste caso, no
estado de Goiás. Um dos principais exemplos deste processo aconteceu no município de
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Luziânia, onde a terra agrícola foi destinada a loteamentos, conjuntos e vilas operárias
funcionalmente dependentes de Brasília (PAVIANI, 2010).
Silveira (1999) também destaca que o avanço de Brasília sobre os municípios
goianos do entorno foi devido a especulação imobiliária, uma vez que não existia restrições
para o parcelamento do solo em Goiás e a ausência uma política habitacional no âmbito do
GDF.
Soma-se a ação do setor imobiliário o que Ferreira (1999) chama de “duplo
processo expulsivo” ao qual eram submetidos os mais pobres, uma vez que eram removidos
do seu local original – favelas e invasões dentro de Brasília – e eram enviados para novos
espaços sem infra-estrutura urbana, porém dentro do DF: as cidades satélites. A medida
que as melhorias chegavam, a valorização do preço dos imóveis novamente os deslocava
para espaços cada vez mais distantes, concentrando-os nos municípios que circundam o
Distrito Federal.
A primeira etapa do “duplo processo expulsivo” foi responsável por consolidar a
periferia distrital de Brasília, aquela restrita ao quadrilátero do DF. A segunda fase é aquela
que expande a Capital Federal para fora de sua delimitação oficial, o “Entorno de Brasília”.
Os municípios do EMB recebem migrantes de todas as partes do Brasil que
inicialmente se instalam no DF e ainda moradores que já estão radicados há vários anos em
no quadrilátero distrital, porém, à procura de moradia a preços mais baratos, acabam por
migrar para esta região. Devido à distância do núcleo metropolitano, a maior disponibilidade
de terras privadas e a precariedade da infraestrutura urbana, o preço do solo na periferia
goiana é menor e estes municípios se tornam uma alternativa mais acessível para parte da
população – principalmente de baixa renda. Neste sentido, os municípios do Estado de
Goiás limítrofes ao DF, tornaram-se uma extensão informal – uma vez que estão fora do
quadrilátero – da Capital Federal.
Observa-se que os municípios goianos que tem seu processo de urbanização
diretamente ligados à Brasília contém características próprias de uma periferia
metropolitana: infraestrutura básica precária, baixa oferta de serviços e equipamentos
públicos, além de dependência econômica do núcleo da metrópole onde estão as melhores
ofertas de emprego. O deslocamento pendular – realizado diariamente para trabalho e
estudo pelos moradores dos municípios do EMB em direção ao núcleo – é outro sinal da
simbiose entre as diferentes unidades da federação.
Outra característica do Espaço Metropolitano de Brasília é a ação de dois
movimentos: polarização e periferização, considerando que, por um lado, pela aglomeração
de oportunidades, emprego, renda e equipamentos urbanos, Brasília – aqui entendida como
Plano Piloto – atrai um alto contingente demográfico cotidianamente, e por outro lado, exclui
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e empurra os mais pobres para longe da zona central planejada, reproduzindo na cidade
idealizada o padrão de exclusão e segregação observado em outros centros metropolitanos.
A Capital Federal exerce tamanha influência nos municípios goianos vizinhos que a
migração dos moradores destas localidades em direção ao DF corresponde ao maior fluxo
de migração metropolitana do Estado de Goiás, superando inclusive a migração em direção
à Capital do Estado – Goiânia, conforme a Tabela 1, abaixo:
Tabela 1. Goiás: Localidades que recebem os maiores índices de pessoas - 2010.
Município Número de pessoas %Brasília 198.906 36,6Goiânia 191.163 35,1Aparecida de Goiânia 15.597 2,9Anápolis 10.477 1,9Total 416.144 76,5%
Fonte: Elaborado a partir dos microdados do Censo Demográfico IBGE 2010Elaboração: Segplan-GO/IMB – Gerência de Estudos Socioeconômicos e Especiais - 2012
Segundo Ferreira (1999) enquanto as principais atividades geradoras de renda se
concentram no núcleo da metrópole, a periferia surge “não como oposição, mas como
complementação, como parte necessário de um todo: a cidade segmentada em classes e
fragmentada espacialmente”.
Ferreira e Penna fazem um apanhado do processo de metropolização de Brasília:
A metrópole brasiliense desenvolveu-se com um tecido urbano socialmente fragmentado e espacialmente polarizado, formando um mosaico multinucleado, no qual o aspecto mais preocupante são os resíduos de inércia ao desenvolvimento, constituídos por espaços cuja função é apenas residencial de população pobre segregada, no interior do espaço metropolitano e em sua periferia externa, fora do Distrito Federal (FERREIRA; PENNA, 1996, p. 190).
Paviani (2007, p. 13) afirma que uma das principais características metropolitanas
de Brasília é o fato de ser uma metrópole incompleta. As metrópoles completas seriam
aquelas que possuem estrutura complexa, incluindo um grande parque industrial capaz de
organizar o espaço nacional. Por outro lado, as metrópoles incompletas comandariam
somente o espaço regional à sua volta.
Para Ferreira o fato de abrigar a sede do poder público federal se impõe sobre a
falta de diversificação de atividades econômicas, não diminuindo a característica
metropolitana da cidade:
Brasília não poderia ser considerada uma metrópole a partir do critério de diversificação de funções, que ela não tem, nem mesmo pela acumulação de capital, e muito menos pela centralidade urbana de uma área de influência contígua. É o poder de decisão que encerra e as relações
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complexas, que a partir daí se desencadeiam, que permitem atribuir-lhe a classificação de metrópole, e é como tal que seu espaço metropolitano se desenvolve (FERREIRA, 1999, p. 137).
Considerando a falta de uma indústria forte, principalmente pelos esforços voltados
à manutenção da capital como centro administrativo do país, Brasília se apresenta como
metrópole terciária.
O PLANEJAMENTO REGIONAL NO ESPAÇO METROPOLITANO DE BRASÍLIA
Logo nos primeiros anos de existência da nova capital, foi constatada a
necessidade de planejar o desenvolvimento da região que a circunda. Estas ações foram
inauguradas com a criação do Fundo de Desenvolvimento do Distrito Federal – FUNDEFE
por meio do Decreto-Lei n° 82, de 26 de dezembro de 1966. Segundo a Secretaria de
Fazenda do Distrito Federal (2017), este fundo teve como objetivo “viabilizar obras de infra-
estrutura para suporte das atividades econômicas e sociais do Distrito Federal e região
geoeconômica, como forma de contrabalançar os vultosos investimentos aplicados com a
interiorização da capital”.
Nesta primeira ação, houve a previsão de que 20% da receita tributária anual
efetivamente arrecadada e os dividendos percebidos devido a suas ações nas empresas
que possuam capital do DF, fossem aplicados em programas de desenvolvimento
econômico e social da região geo-econômica do Distrito Federal.
Neste sentido, havia uma preocupação em promover o desenvolvimento da região
geo-econômica do Distrito Federal, porém, naquele momento, não há a delimitação desta
região, nem tampouco uma orientação que aponte prioridades para a aplicação destes
recursos.
Em meio as dificuldades encontradas para delimitar a região geo-econômica do
Distrito Federal, segundo Freitag (2012), houve um esforço conjunto entre o IBGE e o IPEA
que culminou com a delimitação da microrregião de Brasília, definindo sua área de influência
no processo de polarização regional. Para aquela autora, a região geo-econômica de
Brasília recebe um destaque do Plano Nacional de Desenvolvimento I – PND I (1972-1974)
devido a dois motivos principais, sendo o primeiro o grande potencial em termos de mercado
e infraestrutura que a região possuía e os problemas que começam a surgir no panorama
urbano brasileiro.
No âmbito do II PND (1975-1978) surge o Programa Especial da Região
Geoeconômica de Brasília - PERGEB. Segundo Freitag,
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Nesse sentido, o PERGEB, acolhendo as estratégias do II PND, foi formulado com objetivo de oferecer à região de influência de Brasília condições de desenvolvimento mais equilibrado e consentâneo com o da Capital da República, visando a integração da região periférica ao DF ao processo de desenvolvimento regional (FREITAG, 2012, p. 133).
Catalão (2010) destaca que o principal objetivo do programa era diminuir a
dependência das cidades contíguas em relação ao DF, de forma que as estratégias
pudessem estar voltadas ao desenvolvimento da região sob influência de Brasília, além de
manter a Capital Federal como centro político-administrativo, evitando o processo de
metropolização do seu espaço.
Os recursos que financiariam as ações do programa eram provenientes dos
governos dos estados de Minas Gerais, Goiás e DF e tinha como objetivo fortalecer núcleos
urbanos de forma a ampliar a infraestrutura física através da hierarquização dos centros sob
influência regional por meio da ampliação das comunicações e dos transportes. Neste
programa foram planejadas três escalas de intervenção:
a escala local, área de contenção, compreendendo o DF – Plano Piloto, Cidades-Satélites e área do quadrilátero da Capital; a escala de transição, área de controle, que compreende dez municípios do entorno de Brasília, todos em Goiás – Planaltina, Padre Bernardo, Alexânia, Luziânia, Cristalina, Formosa, Cabeceiras, Pirenópolis, Abadiânia e Corumbá de Goiás; e a escala regional, abrangia as demais cidades dos estados de Goiás e Minas Gerais inseridos no programa. Essa escala foi definida como zona de dinamização, com intuito de formação de infraestrutura de apoio aos setores produtivos e estruturação de um sistema de cidades, priorizando os centros com efeito potencial econômico e maior noção polarizadora (FREITAG, 2012, p. 135).
Paralelo ao arrefecimento da política urbana nacional, o PERGEB se prolongou até
1984 e ficou reconhecido pela relevância no processo de estruturação do centro do Brasil,
apesar do caráter centralizador de suas ações que eram definidas no âmbito do governo
federal, em contraposição às necessidades intrínsecas de cada localidade.
Outra tentativa de promover a integração e estabelecer um planejamento regional
para o Distrito Federal e os municípios que estão sob a influência de sua espacialidade
metropolitana, nasce com a Associação dos Municípios Adjacentes de Brasília – AMAB, em
1979. A criação deste ente pouco contribuiu para a discussão ou para a solução das
dificuldades enfrentadas por estes municípios, tornando-se uma entidade de pouca
expressividade, pequena representatividade e baixo grau de articulação e decisão.
Como resposta a política urbana centralizadora, executada pela União, que
impunha de forma vertical e hierarquizada os programas de planejamento e gestão regional,
a Constituição Federal de 1988, delegou aos estados da federação a prerrogativa de instituir
suas próprias regiões metropolitanas e aglomeração urbanas (apesar de não definir suas
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características), de maneira que assume a necessidade de integração da organização,
planejamento e execução de funções públicas de interesse comum. Essas “funções públicas
de uso comum” rotineiramente são interpretadas como transporte coletivo, destinação de
resíduos sólidos, saneamento básico e, em poucos casos, política urbana e habitacional
(SOARES, 2015).
Segundo Firowski (2012, p. 26) a aplicação prática do instituto da aglomeração
urbana foi quase nula, uma vez que os Estados, em muitos casos, optaram por utilizar o
arranjo institucional de região metropolitana quando a realidade socioespacial apontava para
uma aglomeração urbana. Nesse sentido Firowski afirma:
A discussão da região metropolitana como institucionalidade significa, no Brasil, atribuir ao termo um caráter mais relacionado a uma perspectiva de desenvolvimento regional do que urbano-metropolitano. Nesse sentido, sua formação não prioriza o processo socioespacial, mas sim o político-institucional, ou seja, sua definição é legalmente atribuída, por força de uma Lei (FIROWSKI, 2012, p. 37).
No caso de Brasília, a Constituição Federal de 1988, afirma que ela é a sede do
governo federal e, ao Distrito Federal, são atribuídas as competências legislativas de
estados e municípios (unidade da federação híbrida), vedada sua divisão em municípios.
Outra peculiaridade de Brasília é o fato de ser a única metrópole do Brasil situada
no limite entre dois entes federativos distintos, dessa forma, sua espacialidade metropolitana
(FIROWSKI, 2012) avança para fora de sua competência administrativa e legal.
Para as figuras de municípios não limítrofes e não pertencentes ao mesmo estado,
a Constituição previu a articulação no mesmo complexo geoeconômico e social. Em 1998,
foi promulgada a Lei Federal Complementar nº 94 que autorizou a União a criar a Região
Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno – RIDE do Distrito Federal e
Entorno. Esta RIDE é formada pelo Distrito Federal, e mais 19 municípios goianos e 2
municípios pertencentes ao Estado de Minas Gerais. A RIDE DF e Entorno foi a primeira
efetivada e hoje existem outras duas mais3.
Figura 1. Municípios da Região Integrada de Desenvolvimento do Distrito Federal e Entorno
– RIDE DF
3RIDE Petrolina/PE e Juazeiro/BA foi criada pela Lei Complementar nº 113, de 19 de setembro de 2001, e regulamentada pelo Decreto nº 4.366, de 9 de setembro de 2002. RIDE Polo Grande Teresina foi criada pela Lei Complementar nº 112, de 19 de setembro de 2001, e regulamentada pelo Decreto nº 4.367, de 9 de setembro de 2002.
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Fonte: http://www.sudeco.gov.br/municipios-ride-df
São de interesse da RIDE DF e Entorno os serviços comuns ao Distrito Federal e
aos municípios daquela região, com atenção especial aqueles relacionados às áreas de
infraestrutura e de geração de empregos.
Segundo Schvasberg (2010), não existe diálogo eficaz entre os planos diretores
dos municípios da RIDE DF e Entorno, que apenas anunciam genericamente intenções de
integração regional, são vazios de conteúdo e trazem parâmetros urbanísticos similares,
evidenciando uma operação de “corte e cola”. Para ele, apesar da criação da figura
institucional, pouquíssimas ações se efetivaram no sentido de integrar a gestão e
planejamento urbano. O autor conclui que as políticas públicas voltadas ao ordenamento do
território não dialogam com as políticas públicas setoriais que seriam para ele –
desenvolvimento econômico, meio ambiente, turismo, urbanização, saneamento e
transporte.
Outro indicativo da falta de articulação entre os municípios da RIDE DF e Entorno é
o fato de que o Espaço Metropolitano de Brasília não conta com um sistema de transporte
público integrado. São Paulo, Rio de Janeiro, Curitiba e Belo Horizonte são exemplos onde
ocorre essa integração, que no caso de Brasília acontece apenas dentro dos limites do
Distrito Federal, entre as concessionárias do serviço público Distrital, desprezando aquelas
de origem externa ao DF.
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Assim, evidencia-se que o modelo de RIDE não necessariamente foi decisivo para
a articulação entre os municípios participantes, que historicamente não tem tradição de
trabalho conjunto, tendo o aspecto político e interinstitucional gerado obstáculos ao
desenvolvimento deste modelo de gestão.
A RIDE DF e Entorno não privilegia o contexto metropolitano no qual se inserem os
municípios mais próximos e vinculados ao DF, agrupando no mesmo rol realidades
socioespaciais distintas, de forma genérica e globalizante. Após 20 anos da sua criação, é
possível afirmar que a RIDE DF e Entorno não proporcionou ações efetivas de planejamento
e gestão conjunto entre os diferentes participantes deste arranjo institucional.
Esta constatação é compartilhada pela Companhia de Planejamento do Distrito
Federal – CODEPLAN – quando afirma que a abrangência da RIDE DF não foi
suficientemente debatida. Para a CODEPLAN, a RIDE DF “terminou por englobar em uma
mesma região de planejamento, municípios que mantêm com o Distrito Federal relações de
natureza nitidamente metropolitanas com outros que estabelecem relações de natureza
regional” (CODEPLAN, 2013).
Entendendo que a institucionalidade se distingue da espacialidade metropolitana,
com foco na influência de Brasília nos processos de ocupação e crescimento demográfico
dos municípios da RIDE DF, Caiado (2005) propõe uma classificação onde destaca os
municípios que são diretamente relacionados à expansão urbana da Capital Federal, e os
identifica como “Entorno Imediato”: Luziânia, Cidade Ocidental, Novo Gama, Valparaíso de
Goiás, Santo Antônio do Descoberto, Águas Lindas de Goiás e ainda Planaltina de Goiás.
Seguindo a classificação de Caiado (2005) e incorporando o Distrito Federal,
Catalão (2010) defende a existência do Espaço Metropolitano de Brasília, que engloba
Brasília como núcleo e as sete cidades goianas do Entorno Imediato.
Figura 2. O Espaço Metropolitano de Brasília
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Fonte: Mapa rodoviário do Distrito Federal DER/DF, (GDF/ST/DER-DF), 2007. Organização: Paula Lindo e Igor Catalão (UNESP, Presidente Prudente), 2008 In CATALÃO (2010).
A criação de um ente metropolitano para gerir este espaço é incisivamente
defendida por Paviani (2007), afim de: estreitar a colaboração de Brasília, integrar e
maximizar os equipamentos públicos, afastar duplicidades, reduzir desperdícios, aumentar a
eficiência do setor público, maximizar os grandes eixos de transporte, gerar riqueza para a
implantação do tratamento de água, esgoto, lixo urbano de forma a promover a qualidade
ambiental.
A GOVERNANÇA INTERFEDERATIVA: UMA ALTERNATIVA POSSÍVEL PARA O PLANEJAMENTO E GESTÃO REGIONAL METROPOLITANO DE BRASÍLIA?
Com a promulgação do Estatuto da Metrópole, surge uma alternativa ao modelo de
gestão metropolitano de municípios que pertencem a unidades da federação distintos: a
região metropolitana sob o sistema de Governança Interfederativa. Dentre outras
características, esta nova configuração de região metropolitana, depende de um processo
de formalização complexo, uma vez que envolve uma diversidade de agentes.
A lei que institui uma RIDE é ato unilateral executado no âmbito da esfera federal
de poder. Dessa forma, o planejamento é realizado de forma centralizada, e os municípios e
estados que serão impactados, tanto como sua população, podem não ser consultados
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quanto o interesse de efetivar essa política de integração regional. No âmbito da
Governança Interfederativa, para a formalização da região metropolitana com municípios
pertencentes a mais de um estado, é necessário a aprovação de lei pelas assembleias
estaduais, logo há participação – de forma indireta – da população e dos gestores
diretamente interessados.
Enquanto o modelo de RIDE tem como responsável pela coordenação das
atividades desenvolvidas pela região um Conselho Administrativo com representantes dos
estados e municípios representados na RIDE, o Estatuto da Metrópole incentiva à
Governança Interfederativa mediante a participação de pelo menos quatro instâncias: 1)
instância executiva, composta representantes do poder executivo; 2) instância colegiada
deliberativa, com a participação da sociedade civil; 3) instância pública, com a colaboração
técnico-consultivas; e ainda 4) instância de sistema integrado de alocação de recursos e
prestação de contas.
Quanto à finalidade da formalização, também são distintos o modelo de RIDE e da
Governança Interfederativa. Enquanto na primeira o foco são os serviços públicos comuns –
que não são definidos – havendo uma menção a condição especial dos serviços de
infraestrutura e geração de empregos, no segundo modelo o foco são as funções públicas
de interesse comum, que são definidas como “política pública ou ação nela inserida cuja
realização por parte de um Município, isoladamente, seja inviável ou cause impacto em
municípios limítrofes” (BRASIL, 2015).
No que diz respeito aos recursos que serão investidos na execução das ações
previstas pelas funções públicas de interesse comum a novidade trazida pelo Estatuto da
Metrópole diz respeito à participação da União somente com a efetivação da “gestão plena”,
que seria a formalização e delimitação dos municípios da região, estrutura de Governança
Interfederativa própria e plano de desenvolvimento urbano integrado. Desta forma sem a
“gestão plena” os recursos para efetivação das ações ficarão a cargo dos estados e
municípios, com a vedação da União, enquanto no modelo de RIDE não havia esta
vedação.
Assim, as principais diferenças entre o modelo de RIDE e a alternativa proposta
pelo Estatuto da Metrópole podem ser assim categorizadas:
Tabela 2. Principais diferenças entre a RIDE e a Governança InterfederativaRIDE Governança Interfederativa
Criação Lei Federal Lei EstadualAdministração Conselho Instâncias: executiva, colegiada,
pública e integrada.Finalidade Serviços públicos comuns, especialmente
infraestrutura e geração de empregos.Função pública de interesse comum
Recursos União, estados, municípios e operações de crédito internas e externas.
União (desde exista gestão plena) e estados, municípios.
15
Fonte: o autor, 2018.
Desta forma, o sistema de Governança Interfederativa se propõe como um modelo
de planejamento e gestão metropolitano alternativo à RIDE. No caso específico da RIDE DF
e Entorno, este novo modelo tem sua aplicação limitada, devido a uma interpretação de
caráter estritamente limitada, em detrimento da espacialidade metropolitana no qual se
inserem os municípios que circundam o DF.
No texto original, aprovado pelo Congresso Nacional, da Lei nº 13.089 de 2015,
havia a previsão de que o DF poderia integrar região metropolitana ou aglomeração urbana,
inclusive aquelas que envolvam municípios pertencentes a mais de um Estado. Devido a um
veto da então Presidente da República, e seu argumento de que o arranjo cabível para este
tipo de organização já foi efetivado por meio da RIDE, essa alternativa não deve ser
implantada como ferramenta de planejamento e gestão do Espaço Metropolitano de Brasília,
não havendo, em tese, impedimentos para a consolidação de região metropolitana ou
aglomeração urbana, no formato previsto pela Governança Interfederativa, para as RIDEs
Petrolina/PE e Juazeiro/BA e Polo Grande Teresina.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Apesar de não possuir relevante atividade industrial, Brasília se destaca no rol das
maiores metrópoles brasileiras. O processo de planejamento e gestão do seu espaço foi
executado de forma a manter sua estrutura terciária, como centro do poder político nacional
além de empurrar para longe da “cidade planejada” – o Plano Piloto – a população pobre,
criando, em um primeiro momento, as cidades satélites e, posteriormente, a periferia goiana
com precária infraestrutura básica, baixa oferta de serviços e equipamentos públicos.
Ainda na década de 1960, foi criado o FUNDEFE com o intuito de desenvolver a
região geo-econômica do Distrito Federal, porém, como a administração deste fundo estava
a cargo do GDF, os recursos foram investidos nos limites do Distrito Federal, em detrimento
de sua “região”. Essa realidade fica evidente ao analisarmos o Decreto 24.594, de 14 de
maio de 2004, onde o Governador do Distrito Federal declara que o fundo passa a ter o
objetivo de “promover o desenvolvimento econômico e social do Distrito Federal”, ignorando
e excluindo propositalmente a “região geo-econômica do Distrito Federal”.
Apesar de atualmente vigente, a regulamentação do FUNDEFE, desvirtuou seu
caráter de agente de promoção do desenvolvimento da “região geo-econômica do Distrito
Federal”, tornando-o um fundo financeiro de atuação diversa, abarcando desde o
financiamento de películas cinematográficas até aportes financeiros a entidades da
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administração pública indireta do DF, mitigando as possibilidades de atuação como indutor
do desenvolvimento econômico e social da “região”.
Outra ação de planejamento e gestão foi materializada, em 1975, por meio do
PERGEB e suas escalas local, de transição e regional. Esta ação foi gerida diretamente pela
União e este seu caráter centralizador não privilegiava os interesses dos agentes locais,
mitigando as possibilidades de maior sucesso do programa. Para Ferreira e Steinberger
(2005) o PERGEB foi um modelo de gestão que na prática visou preservar a função da
“Brasília-capital”, em detrimento de um papel de integração nacional.
Apesar de sua existência formal permanecer até os dias atuais, a atuação da AMAB
pouco tem se destacado na consecução de atendimento as demandas dos municípios
envolvidos neste arranjo associativo.
Atualmente a RIDE é a ferramenta de planejamento e gestão do Espaço
Metropolitano de Brasília, porém apesar de sua implementação em 1998, sua intervenção
na realidade é praticamente nula. O fato de englobar municípios que estão inseridos em
dinâmicas espaciais completamente distintas, em relação ao DF, contribui para o pouco
engajamento e organização destes. Este fato pode ser constatado quando refletimos acerca
da consecução dos serviços públicos comuns que pouco possuem integração regional.
Uma alternativa possível a esta realidade seria a implementação de uma região
metropolitana gerida pelo sistema de Governança Interfederativa previsto pelo Estatuto da
Metrópole. Assim, sem descartar o caráter regional da RIDE DF, o reconhecimento formal
de uma região metropolitana em volta de Brasília privilegiaria os municípios abarcados por
sua espacialidade metropolitana e poderia ser um marco para as ações de planejamento e
gestão do EMB.
Longe de ser o ideal, o sistema de planejamento e gestão no modelo de
Governança Interfederativa possui uma série de características que burocratizam sua
implantação e torna sua execução bastante complexa. Por outro lado, sua simples
proposição, representa um avanço, tímido, porém um avanço, no sentido de que a
participação democrática é reforçada e há o reconhecimento formal de que os modelos de
gestão e planejamento metropolitanos atuais precisam ser melhor debatidos, propostos e
efetivados.
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