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As Mil e Uma Missangas da LínguaReflexões sobre o Português

Armando Jorge LopesProfessor Catedrático Jubilado

Universidade Eduardo Mondlane, Maputo, Moçambique

RESUMO

Nesta comunicação apresentam-se reflexões que incidem sobre a língua portuguesa e os seus enquadramentos em Moçambique, mas que são potencialmente úteis e válidas para outros contextos de língua segunda, de língua estrangeira e mesmo de língua primeira.

Ao longo das próximas gerações, prevê-se que o multilinguismo e o multiculturalismo venham a constituir-se práticas cada vez mais enraizadas e assumidas um pouco por todo o mundo. Por essa razão, achou-se importante discutir aqui temas associados à educação, cultura e pesquisa, que contribuam para entender melhor o funcionamento do Português, sobretudo no âmbito da diversidade linguístico-cultural de um país e no âmbito da renovação e recriação permanente da língua.

Palavras-chave: língua portuguesa, Moçambique, educação bilingue, multiculturalismo, inovações lexicais.

Comunicação apresentada ao Instituto Politécnico de Macau em 23 de Outubro de 2013

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21. Introdução

Há bastante tempo, mais precisamente a 25 de Abril de 1993 apresentei uma comunicação ao simpósio ‘Portugal e a Época dos Descobrimentos’ na Universidade da Califórnia em Los Angeles (UCLA), que se intitulava “The Age of Re-discovery: The Portuguese language in Mozambique” [A Época dos Re-Descobrimentos: A língua portuguesa em Moçambique], e de que agora, com a vossa permissão, extraio a seguinte passagem:

O facto de toda a gente estar ansiosa por aprender a desenhar um mapa de convivência, através do re-descobrir um novo papel para a língua portuguesa como língua de unidade entre nações e comunidades e como língua de interacção dinâmica em contextos multilingues é um sinal necessário e inescapável da nossa nova Época. E em honra da língua portuguesa do passado, presente e futuro deveriamos erigir o Monumento esquecido.1 (Lopes, 1995: 85)

Na esteira do que acabei de citar, e num contexto mais recente, refiro a homenagem à língua portuguesa feita pelo pedagogo e académico Carlos André que, através da análise da literatura humanista dos Descobrimentos no seu fascinante livro do poeta no miradouro do mundo (de 2008), nos acompanha, com o olhar e a sua arte de bem escrever, na luz e na penumbra das questões discutidas na presente comunicação. Agradeço-lhe igualmente a oportunidade que me proporciona de poder partilhar com todos aqui presentes estas reflexões sobre questões da língua portuguesa, que se apresentam em forma de contas de vidro coloridas e de outros materiais—as missangas moçambicanas—que são também missangas do mundo.

2. Perfil linguístico-social de Moçambique

Moçambique é considerado um país multilingue, multicultural, multiétnico, multireligioso e de elevada diversidade linguística média (Lopes, 2013a). Como línguas maternas dos moçambicanos, falam-se 22 línguas bantu, o Português (5% da população de 22 milhões falam-na como L1 e 40% como L2) que é língua oficial e língua veicular, línguas de origem asiática (Guzerati e Memane, entre outras) e o Árabe. Durante o período colonial, a coabitação do Português com as línguas bantu, com o Árabe e com as línguas asiáticas foi extremamente difícil, o que acabou por resultar na hegemonia da língua portuguesa e na desvalorização das outras línguas indígenas. Aliás, o contexto foi ainda mais dramático, porque mesmo em relação ao conhecimento do Português as populações de Moçambique foram deixadas analfabetas, numa taxa de analfabetismo que, à altura da Independência do país, no ano de 1975, era de 92%.

Em Moçambique, como nos outros países africanos que falam e usam o Português, a esmagadora maioria das crianças—sobretudo nas zonas rurais—que tem oportunidade de acesso à escola, só entra em contacto efectivo com a língua portuguesa a partir dos 6 anos de idade, aquando do início do seu ciclo escolar. Em termos psico-pedagógicos e sócio-culturais, trata-se de um verdadeiro processo de aquisição de uma língua segunda. No que diz respeito a adolescentes, são inúmeros os que iniciam o seu desenvolvimento na língua portuguesa apenas a

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3partir da puberdade. Em termos educacionais, estes deveriam requerer acções didácticas que se enquadrassem no âmbito do processo de aquisição de uma língua segunda como adultos.

Há várias maneiras diferentes de definir o termo língua materna, dependendo dos critérios usados para o definir (Lopes, 1997: 16-9), que basicamente são a origem (a língua adquirida em primeiro lugar), a identificação (a língua com que o falante se identifica) e a proficiência (a língua em que o falante é proficiente). Do meu ponto de vista, a melhor definição é a que utiliza o critério de origem em associação com o critério de identificação. Assim, a língua materna é a língua materna original com que o falante se identifica.

Quanto ao conceito de língua segunda (L2), há múltiplas definições, mas eu defino-o do seguinte modo: é a língua que, não sendo a língua materna (L1) do falante, é utilizada como língua oficial e língua franca no seu país, e/ou na região em que ela se insere, e que também coexiste com a língua materna e, em certos casos, com outras línguas. Tipicamente, uma língua segunda é adquirida num ambiente em que é realmente falada, como acontece com o Português em diferentes partes de Moçambique. A linha divisória entre o processo de aquisição de língua primeira e o processo de aquisição de língua segunda não é nítida, porque a aquisição de uma língua segunda se inicia, muitas vezes, antes da aquisição de uma língua primeira ter chegado ao fim. Mas regra geral, tende-se a utilizar a expressão aquisição de língua segunda se a aquisição se iniciar a partir dos 4 ou 5 anos de idade, ou seja, numa altura em que a aquisição da língua primeira ainda está realmente em curso. Para a situação moçambicana e situações similares, defino o conceito de falante bilingue ‘equilibrado’ para o caso em que, a nível do seu domínio, não existe desequilíbrio aparente entre o domínio da língua materna original e o domínio do Português ou de outra língua.

Por outro lado, aprender uma língua como língua estrangeira (Le) requer preocupações ideológicas e metodológicas distintas, do ponto de vista do seu ensino. Apesar de alguns linguistas em partes diferentes do mundo utilizarem os conceitos de L2 e Le de forma indistinta, sugiro a seguinte definição para o conceito de língua estrangeira (Le): é uma língua que o falante não usa na sua vida diária e que é apenas aprendida na escola como disciplina. O Inglês é um exemplo de língua estrangeira em Moçambique. Por outro lado, uma pessoa pode falar uma língua materna como ‘língua primeira’ ou uma língua materna como ‘língua segunda’. Este tipo de terminologia indica que existe uma ordem de aquisição, no sentido social, e que não há qualquer implicação pelo facto de uma determinada língua ter sido adquirida em segundo lugar. Dependendo de vários factores, em particular o social, essa língua pode tornar-se na língua principal do falante. Por vezes, e independentemente da ordem de aquisição, a criança de idade compreendida entre um e três anos desenvolve duas línguas a um nível de domínio idêntico, cabendo a este falante, quando for mais velho, e à sociedade que o envolve sancionar o que o falante assume como sua língua materna: se é apenas uma língua, se são duas, se é a que adquiriu em primeiro lugar ou a que adquiriu posteriormente. As definições educacionais ocorrem por via do sector educativo, responsável pela planificação e ensino das várias línguas e das pedagogias apropriadas. São comuns termos como língua primeira, língua materna, língua segunda, língua

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estrangeira, variedade padrão e variedade não-padrão. Embora haja uma certa sobreposição entre a terminologia que é usada no âmbito da categoria das definições sociais e a terminologia no seio da categoria das definições educacionais, deve ficar claro que estas últimas são distintas porque se baseiam em propósitos educativos e comportam elementos de metodologia pedagógica. Em geral, as expectativas em relação às capacidades de um aprendente de uma língua como língua segunda apontam para a capacidade de comunicação oral fluente sobre qualquer tópico ao seu nível intelectual, a capacidade de leitura e de escrita prática (mais do que literária), e a capacidade de funcionar linguisticamente no seio de uma ampla comunidade de falantes. A competência comunicativa é, normalmente, uma exigência central no âmbito da metodologia de ensino de uma língua segunda. Naturalmente que deve caber ao sistema educacional de cada país determinar a sua tipologia linguística, bem como definir o nível e os objectivos pretendidos para uma determinada língua, uma vez ponderadas e equacionadas circunstâncias de natureza diversa.

Pela sua composição, Moçambique é essencialmente multicultural. Deve-se, no entanto, sublinhar que a diversidade não é apenas referente a grupos étnicos, raciais, linguísticos e religiosos. Há indivíduos num determinado grupo étnico ou racial que diferem de modo relevante uns dos outros, devido a factores como origem geográfica, classe social, económica, género e qualidades pessoais como a personalidade e aptidões, a orientação sexual, a deficiência física, as preferências na aprendizagem, nacionalidade, nível educacional, idade, estado civil, etc.

Compreender a experiência da diversidade linguística é, por um lado, fazer com que todas as línguas faladas nativamente por moçambicanos gozem de direitos idênticos através de uma política linguística oficial democrática e mais justa (Lopes, 1997:26; 2013c [2004]), erguendo-se, deste modo, um importante baluarte da liberdade e dignidade humana e, por outro, assumir a vivência e prática do multilinguismo e multiculturalismo, como seu suporte. Várias reflexões são necessárias sobre este discurso, em que acredito em considerável medida, e que está articulado a considerandos em torno da cultura e da linguagem, da ideologia, raça, credo, grupo étnico, e identidade, entre outros.

A questão do estatuto oficial para as línguas não pode ser ignorada em nenhum estudo de revitalização linguística em África. Uma verdadeira revitalização linguística requer caminhar-se em direcção à solução deste problema, sendo o objectivo último satisfazer as necessidades humanas básicas para o desenvolvimento, e que devem incluir o direito dos cidadãos ao uso das suas línguas maternas também em situações oficiais.

As línguas nativas sem estatuto oficial ou sem um estatuto co-oficial num contexto plurilingue são línguas que tendem a desaparecer, que tendem a morrer, como defende Lopes (2001:264-5) ou Maalouf (2009), ao discutir os direitos humanos e a indissociável articulação entre a cultura e a língua:

…Não aceito a ideia de que deverão existir uns direitos humanos para os europeus e outros para os povos islâmicos, africanos, asiáticos. Têm que ser os mesmos. Mas depois deverá existir uma grande diversidade de expressões culturais. A principal é a linguagem. Cada povo deverá sentir que o seu idioma não é marginalizado. Toda a cultura associada à língua deverá tornar-se conhecida, mesmo para lá das fronteiras dessa cultura.

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5Não é difícil de compreender o status quo da política linguística moçambicana, que apenas tem a idade da Independência (1975) e que é envolvida por receios de diferente natureza, a saber: o receio de que uma política multilingue oficial prejudique o processo de construção da nação, em curso, pondo em causa a unidade nacional; o receio de oficializar línguas que se considera não estarem ainda suficientemente desenvolvidas; e o receio de que uma política oficial multilingue se revele de difícil gestão, incorrendo-se, pois, em cenários dispendiosos.

Tais receios não têm razão de ser, a meu ver. O argumento de que a unidade nacional num país multilingue requer uma planificação e política monolingue é, em minha opinião, um mito, pois que do mesmo modo que a ecologia mostra que a sobrevivência biológica é essencialmente possível através da variedade e multiplicidade de formas, porque é que políticas multilingues oficiais (incluindo o Árabe e as línguas de origem asiática faladas originariamente por moçambicanos) tornariam as nações necessariamente mais vulneráveis e mais facilmente destrutíveis? O argumento de que a introdução de um tipo de política multilingue oficial seria prematura porque as línguas bantu não estão ainda suficientemente desenvolvidas é outro mito. O Kiswahili na Tanzania e o Afrikaans na África do Sul não eram línguas particularmente desenvolvidas quando adquiriram o estatuto de língua oficial nos seus respectivos países. O Krio na Serra Leoa, que era originariamente uma língua pequena em termos do número de falantes, tornou-se, por via de acções de promoção, uma língua franca grande e desenvolvida. Quanto ao argumento dos custos económicos, ele parece-me também pouco defensável, porque cada língua é igualmente económica para o grupo populacional que a fala.

É óbvio que é impossível conceber e procurar materializar um programa em que todas as línguas bantu e outras sejam contempladas ao mesmo tempo. Se os planificadores não forem realistas e se, acima de tudo, não estiver assegurada a qualidade da planificação, todo e qualquer programa estará, à partida, condenado ao fracasso. Tal como poderia certamente acontecer com outros países da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), uma política multilingue oficial para Moçambique teria de ser concebida e implementada de modo pragmático, faseado e com funções claras para cada língua ou grupos de línguas. Seria necessário fazer-se uma planificação gradual e cuidadosa, não só por necessidades de comunicação, mas também por motivos que se prendem com a racionalização de recursos.

3. Nível de elevada diversidade linguística de um país

Para melhor compreender a situação da língua portuguesa num dado país, é fundamental determinar-se o nível de diversidade linguística do país em que o Português opera. No passado, classificava-se o nível de diversidade linguística de um país com base no número de línguas aí faladas. Em tempos mais recentes, passou-se a adoptar o critério de Robinson (1993: 52-5)2 para o tratamento da diversidade linguística, em que uma hierarquização do grau de diversidade linguística não deve ter por base o número total das línguas num dado país, mas sim a percentagem da população que fala uma língua tomada singularmente. Adicionalmente, o autor

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criou o conceito de elevada diversidade linguística, tendo estabelecido que se trata dos casos em que uma percentagem não superior a 50% da população fala a mesma língua.

Em África, continente de 54 países, cerca de metade destes cai nesta classificação. A Costa do Marfim é o país africano de maior diversidade linguística. Tem 75 línguas e o Baule, que é a língua com mais falantes, regista cerca de 1 milhão e meio de falantes, representando, assim, 13% da população total do país, que é estimada em cerca de 12 milhões de habitantes. É, pois, o país do continente com a diversidade linguística mais elevada. Assim, a comparação entre diferentes países revela que o país em que a língua com o maior número de falantes representar a proporção mais baixa em termos numéricos da população é considerado o país com a mais elevada diversidade linguística.

Moçambique, em que o Emakhuwa representa 25% da população total, situa-se sensivelmente a meio da tabela dos países com a diversidade linguística mais elevada em África. Assim, Moçambique, em que a sua língua com mais falantes (Emakhuwa com 25% da população do país) se situa entre os 13% e os 50%, pode ser definido como um país de elevada diversidade linguística média.

Isto significa que, numa base numérica, nenhuma língua bantu moçambicana pode reivindicar, a nível nacional, o estatuto de língua maioritária. Mas é claro que a língua Emakhuwa é numericamente a língua principal porque nenhuma outra língua se aproxima desta em expressão numérica, nem é tão amplamente falada como o Emakhuwa o é, em pelo menos três das onze Províncias do país. Os laços linguísticos e culturais com os diferentes grupos étnicos nas áreas rurais de origem caracterizam individual e colectivamente a aliança dos membros que constitui a elite dominante. A elite, que é, em geral, constituída por indivíduos oriundos da mais variada proveniência revela, por força do exercício do poder, muitos traços de uma verdadeira maioria, a qual se alimenta e se reforça constantemente através de laços com as minorias, entendidas, neste sentido, como minorias em termos de poder—a referida não-elite. É claro que há também membros da elite que se decidem a abandonar ou a refrear laços étnicos em troca do reforço da sua identificação com a urbanidade e o cosmopolitismo. Neste caso, a língua portuguesa funciona no seio do grupo como marca privilegiada de identificação. Mas a tendência por parte da maioria dos membros da elite (que fala a língua) é, a meu ver, a de adoptar a língua portuguesa como instrumento pragmático, e ao mesmo tempo manter as afinidades étnicas e linguísticas como principais símbolos de identidade. Por outro lado, devemos também tomar em consideração a dimensão da cobertura linguística para além das fronteiras nacionais. Na verdade, quando aplicada a um país como Moçambique que partilha grupos linguísticos que atravessam seis fronteiras geográficas, a noção de língua minoritária torna-se, no mínimo, controversa e, do ponto de vista dos direitos linguísticos, acrecenta pouco ao debate línguas ‘maioritárias-minoritárias’. As línguas Kiswahili e Shimakonde difundem-se a norte em direcção ao estado vizinho da Tanzania. O Ciyao expande-se para as Repúblicas do Malawi e da Tanzania. O Cinyanja estende-se para o Malawi, Tanzania e República da Zâmbia. O Elomwe e o Cisena são também línguas do Malawi. O Cishona difunde-se para a República do Zimbabwe. A língua

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Xichangana é partilhada pela República da África do Sul, onde é conhecida por Shangaan (ou também Tsonga). O mesmo é verdade para o Zulu. Quanto ao Swazi, é partilhado pelo Reino da Suazilândia, onde tem a designação de siSwati. A comunicação de Moçambique com o mundo exterior é realizada sobretudo através de duas línguas, o Português e o Inglês. Através do Português o país comunica-se principalmente com os outros quatro países africanos de língua oficial portuguesa (Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau e São Tomé e Príncipe), com Portugal, Brasil, República de Timor-Leste, as regiões de Macau, Goa, Damão, Diu, povoamentos no Estreito de Malaca e outras grandes comunidades no mundo. A língua portuguesa é partilhada por cerca de 200 milhões de falantes. Esta é actualmente a sétima língua mais falada das 6,000 línguas existentes no mundo, das quais cerca de duas dúzias são utilizadas como meio de comunicação internacional. Com grande parte do mundo, os moçambicanos comunicam-se através do Inglês, que é também lingua franca em cada um dos países que fazem fronteira com Moçambique e língua comum de inter-comunicação entre esses países. Tanto o Português como o Inglês são as duas línguas oficiais da Comunidade do Desenvolvimento da África Austral (SADC) que congrega 15 países, mas que na prática têm utilizado entre si o Inglês como principal língua de trabalho. Dos quinze países constituintes da SADC, treze têm a língua inglesa como língua oficial ou co-oficial.

4. O Português substituído pelo Inglês como língua oficial?

Quanto ao Inglês, e como já o reafirmei (Lopes, 2013b: 141-2), não vejo como esta língua poderia substituir o Português como língua oficial em Moçambique, enquanto registos-chave como, por exemplo, a linguagem da escola, da administração, da justiça e da religião se mantiverem na língua portuguesa ou, como advogo, na língua portuguesa e nas línguas bantu.

Seria desejável que a criança se tornasse bilingue e biliterata numa língua bantu e no Português e que, gradualmente, adquirisse ainda proficiência numa língua estrangeira como é o caso do Inglês, ou também no Francês, dadas as relações de Moçambique particularmente com o hinterland e os países da região do Oceano Índico.

Qualquer tentativa de substituição do Português pelo Inglês como meio de comunicação e/ou meio de ensino em Moçambique criaria mais problemas que benefícios ao país. O argumento a favor do uso do Inglês em vez do Português com a justificação de que a nação se comunicaria mais efectivamente através do Inglês com os seis estados vizinhos com que faz fronteira, e com o mundo, em geral, é indefensável. É verdade que o Inglês é a língua franca da região da Comunidade do Desenvolvimento da África Austral (SADC) e que, sendo a língua mais internacional usada no comércio, tecnologia e intercâmbio académico, se revele importante para o desenvolvimento de Moçambique.

Nos últimos anos, o futuro em Moçambique da língua portuguesa, que também é língua oficial da SADC conjuntamente com o Inglês e Francês, e a possibilidade desta língua ser substituída pelo Inglês têm merecido atenção na imprensa, tanto nacional como internacional

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(Lopes, 1999:477-8). Para além disto, a adesão de Moçambique à Commonwealth renovou o interesse por este assunto. Parece que há alguma dificuldade em compreender como é que uma antiga colónia portuguesa aderiu a uma comunidade anglófona. Na essência, receia-se que a decisão moçambicana possa, a longo prazo, fazer perigar o papel da língua portuguesa no país. Mas há, naturalmente, várias facetas de natureza histórica, política e linguística, que mostram que a influência anglófona e a influência do Afrikaans tem raízes antigas em Moçambique.

No domínio da língua—o domínio que mais interessa nesta passagem—são evidentes as marcas do Inglês em todas as línguas faladas em Moçambique, incluindo no Português. Cabral (1975) registou muitas palavras por via do empréstimo e adaptadas do Inglês para as línguas bantu de Moçambique. Por exemplo, eis adaptações em algumas línguas bantu, como ‘txuquela’ (Xironga) a partir de sugar; ‘lokichi’ (Xichangana) de location; ‘impondo’ (Cicopi) de pound; ‘fremu’ (Cinyanja) de frame; ‘foloko’ (Xitshwa) de fork; ‘pukhu’ (Emakhuwa) de ‘book’; ‘futi’ (Kiswahili) de foot; ‘afukaste’ (Ciyao) de half-cast; ‘boora’ (Cinyungwe) de ‘to bore’; ‘xitimela’ (Cisena) de ‘steamer’; ‘xelini’ (Gitonga) de shilling. E é claro que há bastantes palavras que as línguas bantu receberam por empréstimo da língua portuguesa. Por vezes, registaram-se dois empréstimos, um do Inglês e o outro do Português para o mesmo item: ‘esokisi’ e ‘emeya’ em Emakhuwa de ‘socks’ e ‘meias’, respectivamente; e é também interessante notar a evolução do significado de uma palavra ao longo do tempo: ‘steamer’ deu origem a ‘xitimela’ (‘comboio’), porque os primeiros comboios eram conduzidos a vapor; ‘gas’ resultou em ‘guesi’ (electricidade), porque a primeira iluminação pública ocorreu por meio do gás.

Interagir com diferentes línguas e culturas, e do mesmo modo, interagir com a mesma língua e diferentes culturas é muito útil porque estas interacções fornecem perspectivas diferentes da nossa e nos libertam de preconceitos que, muitas vezes, são condicionados culturalmente. A língua portuguesa nunca foi um problema em Moçambique. Nem a língua inglesa. Neste contexto, é fundamental estudar os processos históricos que moldaram e continuam a moldar os contextos linguísticos, sociais e culturais de Moçambique. O papel complementar do Português e das línguas bantu é bastante bem compreendido e aceite pela sociedade, em geral, mas esse papel ainda não foi bem formulado pelos teorizadores. Há que dar passos mais arrojados, no que toca ao Governo, às universidades e outras agências, porque a planificação linguística permanece inadequada (Lopes, 2002:24-5).

No mundo, cerca de duzentos milhões de falantes tornaram a língua portuguesa numa língua pluricêntrica e dinâmica, criando pressões que actuam em todas as direcções no seio do amplo sistema ecológico do Português. A língua portuguesa em Moçambique ou a língua portuguesa em Macau não é uma parte isolada desse sistema ecológico, em que se estabelecem e se reforçam alianças e relações entre os falantes e o mundo envolvente. O Português é, sim, necessariamente parte de um sistema ecológico complexo, que se amplifica através dos estados e comunidades que falam a língua portuguesa, em África, na Ásia, na Europa e na América.

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5. O modelo de bilinguismo inicial na educação

Num passado recente realizaram-se em Moçambique projectos-piloto na educação primária e na alfabetização de adultos sobre a utilização de línguas bantu como meio de ensino. Nestas experiências foi utilizado o modelo de ‘transição gradual’, isto é, a utilização de uma língua bantu como meio de ensino durante as primeiras classes da instrução primária e posterior transição para o Português como língua de ensino nos anos escolares seguintes. Em 1997 tive a oportunidade de discutir as devantagens inerentes ao modelo de transição gradual que, na época, o Instituto Nacional do Desenvolvimento da Educação (INDE) previa utilizar nas suas experimentações durante os últimos anos da década de noventa.

Em minha opinião, o modelo então proposto era problemático, porque ao mesmo tempo que eu defendia e continuo a defender a possibilidade de uso das línguas bantu como línguas de ensino para as crianças moçambicanas que falam línguas bantu como línguas maternas, igualmente defendia e defendo o direito do uso do Português como língua de ensino para o número (que cresce) de crianças falantes desta língua como língua materna. Por outro lado, e uma vez que o Português viria a ser o meio de ensino em classes mais avançadas, o modelo de transição gradual poderia vir a gerar competência empobrecida nessa língua e criar dificuldades às crianças que não têm o Português como língua materna quando fossem confrontadas com outras para quem o Português é língua materna.

Assim, aventei então a possibilidade de uma opção diferente, defendendo que um modelo melhor seria o de bilinguismo inicial, isto é, um modelo que previsse a utilização, desde o início, de uma língua bantu e do Português como línguas de ensino. Nesta óptica, proteger-se-ia o direito da criança à educação através da sua língua materna e reduzir-se-iam futuros riscos de abaixamento de nível, em classes mais adiantadas, no que diz respeito à proficiência na língua portuguesa e evitar-se-iam ainda potenciais desencontros no domínio do Português por parte de crianças que não tivessem usado esta língua na escola logo à partida. O problema em torno da língua portuguesa é suficientemente sério em si próprio, assim como no enquadramento que deve ser indissociável da língua portuguesa às línguas bantu. O modelo de bilinguismo inicial promove o uso das línguas bantu de uma forma mais humana, justa e harmoniosa porque a lógica subjacente a este modelo reside no fomento da proficiência não só em Português mas também e crescentemente nas línguas bantu.

Em 2004 entrou em funcionamento um modelo educacional bilingue com contornos e características semelhantes aos que acabo de descrever, o que obviamente me traz pessoalmente satisfação, ao mesmo tempo que vem colocando novos desafios no âmbito da planificação curricular, linguística e cultural. Em relação ao projecto em curso, que já abrange 70 mil alunos das três primeiras classes da educação primária em 490 escolas, o coordenador do Ensino Bilingue no Instituto Nacional do Desenvolvimento da Educação (INDE) Rafael Sendela disse recentemente o seguinte:

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os resultados são animadores porque o projecto colheu muita simpatia nas comunidades. Pretendíamos iniciar o projecto em sete línguas maternas mas tivémos que aumentar para dezasseis, por causa da pressão das comunidades. (In semanário SOL, edição no.369, de 27/09/2013.)

6. O multiculturalismo no contexto de uma pedagogia da equidade

Quanto aos novos desafios no âmbito da planificação, um deles continua a ser como maximizar o funcionamento do modelo educacional bilingue no contexto multicultural de Moçambique. O conceito de multiculturalismo tem-se prestado a interpretações variadas (Lopes, 2006:39), incluindo a de Honwana (2011)3 que o enquadra num contexto contemporâneo e específico, ao mesmo tempo que o associa à noção de política linguística. Por outro lado, em certas sociedades do mundo pós-colonial, o conceito de sociedade multicultural tem significado a manutenção de uma cultura dominante sobre as outras culturas, regra geral culturas das ‘minorias’, e a aceitação dessas mesmas culturas. Esta aceitação das outras culturas é, por outro lado, questionada, reivindicando-se um projecto cultural plural assente no princípio de que nenhuma cultura é superior a outra, nenhuma cultura é mais verdadeira ou tem mais valor do que outra e que, por isso, vale o esforço de tentar pôr juntas, num todo heterogéneo, formas culturais diversas sem perda e sem grande conflito. Julgo importante manter-se este enfoque no contexto educacional e sobretudo no âmbito do que designaria de pedagogia da equidade.

Em termos amplos, a pedagogia da equidade reveste-se de características tão relevantes como reconhecer o direito à existência de diferentes grupos culturais, considerar a diversidade linguística e cultural como um bem e não uma desvantagem, reconhecer os direitos de todos os grupos culturais da sociedade como direitos iguais e promover a igualdade de oportunidades educacionais.

Em termos mais específicos, a pedagogia da equidade não tem lugar apenas num único curso ou programa mas, sim, através de uma variedade de programas e práticas. É claro que também pode ter significados diferentes em diferentes escolas e com diferentes grupos de indivíduos, segundo as suas necessidades e circunstâncias. O sucesso do professor relativamente ao desenvolvimento académico de alunos oriundos de diferentes grupos culturais e sociais constitui o cerne da pedagogia da equidade, que deve ter propósito e ser planificada. Atenção especial é dada à integração ao nível dos conteúdos, o que significa que os conteúdos de algumas disciplinas devem ser retrabalhados de molde a representar e experiências diversas e perspectivas diferentes, sobretudo daqueles que habitualmente são sub-representados ou omitidos. Promove-se a interacção e cooperação mútuas, incentiva-se a preservação de todas as culturas e reforça-se o poder dos chamados grupos étnicos minoritários. O processo de construção do conhecimento numa pedagogia da equidade tende a enfatizar os métodos, as actividades e as questões de que os professores se servem para ajudar os aprendentes a compreender como é que os pressupostos, perspectivas e inclinações numa dada disciplina influenciam o modo de construir o conhecimento. Em última instância, os professores ajudam os aprendentes a desenvolver atitudes

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positivas em relação a diferentes grupos raciais, étnicos e culturais, e ao proceder assim, reduzindo ou mesmo eliminando o nível de preconceito. Mas a educação multicultural não é alcançada apenas através de mudanças do currículo. A escola precisa de ser reestruturada para que todos os aprendentes adquiram conhecimento, atitudes e habilidades necessárias de molde a aprenderem a funcionar em comunidades e nações plurais étnica, religiosa, linguística e culturalmente. A abordagem multicultural na educação, que relaciona a raça, a língua, a cultura, o género, a deficiência física e a classe social deve fazer com que toda a escola celebre a diversidade humana e a igualdade de oportunidades. Deve fornecer competências transculturais que visem assegurar que os aprendentes adquirem o conhecimento e as habilidades necessárias para funcionarem na sua própria cultura, aquilo a que eu chamaria de intraculturalismo, e na cultura dos outros, que poderia ser referido como interculturalismo.

A educação multicultural é uma abordagem educacional multidimensional que atribui igual reconhecimento a todos os grupos culturais e que proporciona a todos os aprendentes uma experiência educacional relevante e profunda de significado. Contudo há diferentes abordagens ao modo de implementação da educação multicultural. Por exemplo, diferentes abordagens à problemática da integração que podem ocorrer em diferentes escolas, mas também no seio da mesma instituição. Em algumas turmas a abordagem poderá procurar incorporar aprendentes culturalmente diferentes de modo mais efectivo na cultura e sociedade mainstream enquanto noutras a abordagem poderá ser mais no sentido de educação para a acção social, que requer que os aprendentes actuem de molde a influenciar a mudança social. Obviamente, abordagens diferentes materializam objectivos diferentes. É pois importante que os professores se decidam sobre o que o que se pretende com a educação multicultural e assim trabalhar em direcção aos objectivos estabelecidos.

Em Moçambique, a construção da nação e da moçambicanidade, que tem sido um processo complexo, lento e difícil, vem incluindo este debate. Algumas vozes, talvez com mais propriedade do que a minha, têm intervido e opinado sobre o que pode significar a multiculturalidade no contexto histórico particular de Moçambique. Mais reflexões são necessárias sobre esta problemática, um envolvimento de todos os intervenientes—pais, crianças, professores, diferentes comunidades com diferentes interesses sociais—na aplicação do modelo educacional que há pouco tempo se iniciou, para que programas, manuais e resultados deste processo respondam cada vez melhor aos anseios de todos os moçambicanos.

7. A quinta habilidade no processo de ensino-aprendizagem do Português

Para tratarmos da quinta habilidade, parece-me fundamental sublinhar primeiramente a importância da inter-relação entre as áreas associadas da cultura e educação.

O termo cultura adquiriu importância, especialmente no campo da educação em que os professores ensinam turmas que são diversas. A cultura é um fenómeno humano complexo e, em

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muitos aspectos, um conceito que se presta a equívocos. A cultura está, muitas vezes, associada a bens materiais e artefactos, à alimentação, indumentária e às artes. Digamos que a cultura é um conjunto complexo que inclui o conhecimento, a linguagem (i.é, a língua, os padrões não-verbais de comunicação e o estilo de comunicação), as crenças, as percepções, as atitudes, os valores (como a dignidade humana, igualdade, justiça), a arte, a moral, a lei, os costumes e outras capacidades que o ser humano adquire como membro de uma sociedade.

Há uma relação dupla entre educação e cultura, porque a educação é moldada pela cultura e é um poderoso agente de transmissão e preservação cultural. O professor deve, pois, transmitir e interpretar o conhecimento da cultura dominante e o conhecimento das micro-culturas, proporcionando, assim, uma educação que seja multicultural. Eis quatro factores que ilustram a influência da cultura na educação. Primeiramente, a socialização através da qual o indivíduo adquire o conhecimento, os valores, a língua e as aptidões sociais, permitindo-lhe a integração na sociedade. Em segundo lugar, a comunicação que dá a oportunidade a crianças de diferentes grupos culturais de aprenderem a falar várias línguas e aprenderem a importância da comunicação não-verbal. Em terceiro lugar, os valores sociais, que são adquiridos a partir do sistema social e da cultura em que o indivíduo cresce e que podem ser diferentes de cultura para cultura, precisam de ser compreendidos e partilhados; e em quarto lugar, o factor relacionado com as estruturas do conhecimento e com a visão do mundo, isto é, o modo como um determinado grupo cultural ou comunidade vê as pessoas, os acontecimentos, o mundo, em geral. Importante compreender que diferentes visões do mundo podem, por vezes, criar conflito e incompreensão e que essas diferentes visões existem na sala de aulas. Às vezes, o professor não considera o ponto de vista de um aprendente, porque aceita a visão dominante como verdadeira e assume que todos vêem a realidade da mesma maneira.

Assim, desenvolver habilidades comunicativas é algo mais do que exercitar os aprendentes no uso apropriado da língua. Os aprendentes precisam de se tornar mais conscientes e tolerantes em relação a diferenças culturais, as quais vão sendo mais visíveis no processo de aprendizagem de princípios pragmáticos e nas formas linguísticas de os expressar na nova língua, como sejam o tacto, o respeito, a cortesia e outros. Esta interacção entre as habilidades linguísticas e o desenvolvimento da consciência para as diferenças culturais é relevante para a política e planificação linguística na educação e na sociedade, em geral.

Aos aprendentes de uma língua hoje em dia, deve-se, pois, também ensinar o que já há tempos designei por quinta habilidade (1997:74)4. À medida que vão aprendendo a processar a língua falada e a língua escrita, tanto a nível da percepção (compreensão oral e leitura) como a nível da produção (fala e escrita), os aprendentes devem também adquirir a capacidade para se identificarem, compreenderem e aceitarem os outros e as suas culturas. As tradições, os costumes e as situações do quotidiano não devem ser usados apenas como pano de fundo e como recurso para a aquisição de capacidades linguísticas e comunicativas.

O professor deve partilhar com o aluno os seus contextos sócio-culturais e cognitivos, reduzindo-se assim a possibilidade de interpretações erróneas sobre a produção do aluno, e

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evitando-se que a produção seja erradamente avaliada como ilógica ou inadequada. Por outro lado, determinada produção pode, por vezes, ser avaliada como inadequada não necessariamente por razões linguísticas e textuais, mas por motivos que se prendem com a falta de conhecimento sobre um certo tópico por parte de um dos intervenientes (aluno ou professor) neste processo, ou por motivos que se prendem com a falta de compreensão da consciência cultural de cada uma das partes. Por exemplo, uma composição produzida por um aluno sobre o tema ‘poluição de água’ foi considerada ilógica pelo seu professor. Reflectindo à posteriori, o que parece ter acontecido foi um desencontro entre as expectativas e suposições sobre o assunto por parte do professor e as expectativas e suposições por parte do aluno expressas na composição. Enquanto o professor antevia que o aluno associasse a poluição de água a áreas industriais urbanas, o aluno pensava na poluição da água em zonas rurais. Obviamente, cada uma das partes abordava o tópico com base na sua própria estrutura cognitiva e cultural. O professor pensava na água quimicamente contaminada no espaço industrial por oposição à existência de água limpa e livre de impurezas nas áreas não urbanas; e o aluno associava a poluição à inexistência de condições sanitárias adequadas no meio rural por oposição ao abastecimento canalizado de água potável nas áreas urbanas. A ilustração mostra que é fundamental que um professor tenha acesso a variados e distintos contextos socio-culturais e acesso a possíveis processos cognitivos porque isso o auxiliará tanto a interpretar os significados do texto nos seus pressupostos culturais e cognitivos como a avaliar o grau de adequação dos padrões gramaticais e retóricos utilizados para a transmissão de uma dada mensagem. Assim, o professor pode utilizar estratégias que encoragem o aluno a desenvolver o esquema experiencial e conceptual da sua própria vivência, a fazê-lo progredir gradualmente em direcção ao conhecimento de esquemas diferentes do seu, e ensinando-lhe que estes são igualmente importantes. Este tipo de acção permitirá, certamente, desenvolver no aluno sensibilidade para as diferenças entre as suas próprias estruturas cognitivas e as estruturas dos outros, incluindo as do professor, se for o caso.

8. Naturalização da língua portuguesa

A língua portuguesa pertence a cada um dos oito estados e a cada uma das regiões e comunidades que a falam. Muitos falantes nativos orgulham-se, com naturalidade, do facto do Português ser reconhecido no mundo como uma língua internacional e em expansão. Mas na verdade, o Português perde o seu estatuto mais localizado, digamos o seu paroquialismo, e adquire a internacionalidade e intercontinentalidade, pela simples razão desta língua não ser propriedade de nenhum estado e povo. A língua portuguesa é uma língua internacional porque nenhum país, singularmente, pode ou deve reivindicar a sua custódia. A língua portuguesa pertence a todos os falantes que a usam para a sua comunicação diária e a todos os que gostam de se expressar nessa língua.

Sabe-se que muitas pessoas em contextos plurilingues aprenderam línguas segundas e línguas estrangeiras com elevado sucesso. Com muita frequência, em Moçambique e em muitos

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outros países africanos, as crianças crescem com duas ou três línguas em simultâneo, embora, algumas vezes, com certas limitações em diferentes áreas da competência linguística e comunicativa. Assim, e dependendo dos contextos, alternamos em termos do código e, por vezes, em termos de cultura. Mudamos de várias práticas e hábitos culturais, como por exemplo, no que comemos e como comemos. Algumas vezes, e conforme as necessidades da ocasião, ocorrem situações em que o falante muda de um código A (p.ex., Português) para um código B (p.ex., Xichangana), do código A ou do código B para um código C (p.ex., Inglês) e, ao dirigir-se para as minas do Rand na África do Sul, do código C para um código D (p.ex., o Fanagaló, que é um pidgin) produzindo-se, deste modo, uma cadeia de códigos.

Continuo a achar válida e útil a formulação sobre o conceito a que chamei de naturalização de língua, designadamente, “…a aceitação por parte de uma comunidade de indígenas de uma língua que lhe é alheia e à qual concedeu estatuto de cidadania”. (Lopes, 1997: 39). Digamos que, ao tornar-se a língua oficial de Moçambique à altura da Independência em 1975, a língua portuguesa foi oficialmente naturalizada, com direito a um novo passaporte. Ao reconhecer que a mudança é natural e inevitável, o realismo, por oposição ao purismo, assenta no princípio de que a naturalização deve ser vista como processo, relembrando as origens e as transformações por que o Português passou através do tempo, enriquecendo-se por influências de várias línguas. A naturalização do Português Moçambicano vai-se desenvolvendo de modo localizado, mas entendida como diferença, não como deficiência.

À altura da Independência Nacional de Moçambique decorria no Departamento de Letras Modernas da Universidade Eduardo Mondlane um projecto designado de Português Fundamental que, entre outros objectivos, aspirava à construção de uma matriz de 2000 vocábulos. Muito embora reconhecesse a sua relevância na altura, em que a taxa de analfabetismo era elevada, tal projecto não faria muito sentido nos dias de hoje, porque a população juvenil vai à escola, na ordem dos milhões, e as campanhas de alfabetização para adultos têm acontecido ao longo do tempo (a taxa actual de analfabetismo situa-se em 39%). Não pretendo, pois, discutir, aqui e agora, o projecto de elaboração local do Português Fundamental que, em minha opinião, partilhou muitos dos traços caracterizantes da abordagem metodológica de experiências precursoras, em particular a francesa. Pretendo apenas recordar alguns antecedentes de ordem histórica.

O primeiro exercício de simplificação, por meio de uma língua artificial humana, foi ensaiado com o Esperanto, língua constituida em 1878 por Zamenhof, que usava o pseudónimo de Dr. Esperanto. O Esperanto, criado a partir de bases românicas, germânicas e eslavas, gozava e goza (ainda há actualmente cerca de dois milhões de pessoas que compreendem a língua) de um elevado grau de previsibilidade devido sobretudo ao recurso frequente e constante a sufixos e infixos.5 Mas nem todos os linguistas da altura sonhavam com a invenção e consequente imposição de um idioma universal fabricado. Alguns propunham a adopção de uma língua já existente—naturalmente a sua própria—habitual referência ao Inglês ou, em caso de impossibilidade, até mesmo o Francês.

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Argumentava-se que a base greco-latina do vocabulário do Inglês (cerca de 900 vocábulos básicos) a tornara numa língua rica, abrangente e relativamente fácil de aprender por parte de aprendentes ocidentais, e que sendo a gramática isenta de conjugações verbais complicadas se tornava relativamente acessível para aprendentes asiáticos e africanos. E ainda uma coisa boa com que todos concordavam: o facto do Inglês não ter acentos, til ou cedilhas, o que certamente facilitaria o seu uso na escrita e sua utilização tipográfica.

Mas como em todas as coisas há também características mais complexas e que se constituem em dificuldade para aprendentes do Inglês que falem outra língua como língua materna. É a questão da ortografia e a sua relação, por vezes pouco sistemática, com as dezenas e dezenas de sons nessa língua, é a questão da idiomaticidade que requer o conhecimento de uma quantidade enorme de construções idiomáticas. Simplificar a língua inglesa foi a tarefa a que se impôs o linguista Ogden que fez publicar em 1930 a obra Basic English, apresentando um conjunto de cerca de 850 vocábulos e 18 verbos.

E a ideia de uma forma simplificada do Francês para uso internacional? De onde parte? Em 1951 uma comissão francesa da UNESCO, que incluia Gougenheim, começou por elaborar um projecto que foi chamado de Francês de Base, designação que não agradaria e que por isso viria depois a ser alterada para Francês Elementar, e acabando mesmo por desembocar na designação definitiva de Francês Fundamental.

Como aconteceu de modo natural com praticamente todas as línguas, conhecemos também um pouco do processo de simplificação por que passou a língua chinesa, que é uma língua de ideogramas ou caracteres que foram constituídos originariamente a partir dos símbolos. Em geral, um caracter ou sinal chinês comporta dois símbolos: um é a chave ou radical que dá o sentido da palavra e o outro a pronúncia. Com estes dois elementos formam-se os caracteres simbólicos da língua chinesa. Os mais antigos e conhecidos caracteres ou ideogramas chineses remontam ao século XIV antes da era cristã. Foram gravados primeiramente em ossos e em escamas, os quais se referem às divindades. Originalmente, os ideogramas foram uma representação figurativa das coisas designadas. Mas, no curso da evolução que se seguiu, e sobretudo durante os 18 primeiros séculos, sofreram inúmeras transformações.

Em suma e para encerrarmos a questão da simplificação. Tal como já havia acontecido com o Basic English, nem o Francês nem o Inglês, como grandes línguas de comunicação mais ampla resolviam à época o problema de existência de uma língua universal, depois de goradas, para o mesmo fim de comunicação, as tentativas de introdução e uso de línguas artificiais como línguas universais.

9. As inovações do Português: uma pesquisa permanente

Os factores sociais e culturais em Moçambique têm requerido o uso de novas palavras e expressões a que chamámos de moçambicanismos (Lopes et al.,2013:21 [2002:4). Há um sabor

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mais ou menos indígena acerca do Português Moçambicano (PM). No nosso imaginário, na nossa escolha de palavras, nas nuances de significado que atribuímos a certas palavras, verificamos que somos diferentes de outros. Mas, embora não haja dúvida de que o PM existe, não é fácil defini-lo linguisticamente. A complexidade da situação moçambicana torna qualquer descrição linguística do PM uma tarefa extremamente árdua, densa e complexa, requerendo sempre, naturalmente, indispensáveis contributos por parte de pesquisas sociológicas, históricas e antropológicas.

Sou de opinião que é sobretudo no léxico que as mudanças do PM são mais aceleradas, e que a moçambicanidade do Português está, de imediato, mais fixa e visível.

O principal objectivo da obra Moçambicanismos foi registar determinados traços formais e funcionais do Português Moçambicano (PM), cuja moçambicanidade torna esta variedade distinta da variedade do Português, na sua dimensão europeia (PE) e brasileira (PB). O segundo objectivo foi considerar o impacto de factores diversos, sobretudo culturais e sociológicos nos traços formais e funcionais do PM. Considerou-se que a variedade do PM é realmente moçambicana, porque há traços, características e realizações formais e contextuais de moçambicanidade na fala e na escrita, e há ainda o pano de fundo moçambicano que define e identifica o contexto em que funciona essa variedade.

A produção do primeiro Léxico de Usos do PM, intitulado Moçambicanismos, reforçou as seguintes convicções: (i) que o Português é uma língua de múltiplas tradições e que, por isso, há que desenvolver percepções e reflexões contrastivas entre o PM e o Português Europeu (PE), e também entre o PM e o Português Brasileiro (PB) e outras variedades nativas e não-nativas, a nível dos traços de que são portadores os usos constantes do Léxico; (ii) que o PM é uma variedade em rápida evolução, alimentando-se, em grande medida, do substrato bantu e da forma como a juventude, em particular, a vem moldando nos últimos anos; e (iii) que, em relação ao tratamento funcional das entradas, seria necessário continuar a sofisticar a análise macro-linguística, de molde a melhorar a compreensão da relação estabelecida entre a dimensão funcional e a realização formal do idiomatismo. Com o apoio dos Índices, na parte final da obra, foi o que procurámos fazer com o novo Léxico de Usos idiomáticos, em vias de conclusão.

Há uma necessidade crescente de se desenvolverem técnicas que permitam comparar e contrastar as línguas tanto translinguística como transculturalmente. E ao relacionar o domínio da língua com o da cultura, qual é a área que é de tradução mais difícil? Precisamente, a área da idiomaticidade. E porquê?

Porque é a área da linguagem que está mais próxima da cultura. O idiomatismo numa cultura é muitas vezes expresso de forma diferente noutra cultura. A semelhança do significado (isto é, o significado do idiomatismo) é frequentemente o critério principal das análises contrastivas, ou seja, a base para a comparação interlingue, o tertium comparationis, como é conhecida essa base. Muito embora o idiomatismo em Português partilhe a categoria animal com o idiomatismo em Inglês em, por exemplo, nem quando as galinhas tiverem dentes!=when pigs fly!, o que é certo é que o significado comum “nunca”, “nem pensar” tem expressão formal muito

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diferente nas duas línguas (uma língua com os dentes do animal, outra com um voo estranho de outro animal). E prosseguindo exactamente com o mesmo significado, através de um equivalente na língua bantu moçambicana Xichangana, obtemos uma realização formal que aponta para outra coisa bastante diferente, i.é, hambi xodzindza xihatima [literalmente: mesmo se trovejar e relampejar].

Depois da experiência com o ‘Léxico de Usos do PM’ (Moçambicanismos, Lopes et al.), na década passada, lançámos mãos à obra a um segundo empreendimento desta natureza, que consistiu em preparar um ‘Léxico multilingue de Usos idiomáticos’ entre o Português, Inglês e Xichangana (Lopes et al., no prelo). Colocámos, assim, a ênfase nas formações idiomáticas em línguas pertinentes para o moçambicano: o Português, como língua oficial do país, o Inglês, que juntamente com o Português, é a co-língua oficial da região da SADC e a primeira língua estrangeira aprendida no país, e o Xichangana, a segunda maior língua nacional em termos do número de falantes e de ampla cobertura na parte sul do país. No sul, as três realidades linguístico-culturais são importantes para falantes, em geral, profissionais de negócios, do turismo e da interpretação-tradução, entre outros, e para estudantes, aos mais variados níveis.

O objecto do projecto assenta na comunicação translinguística e transcultural, com enfoque no uso idiomático formal e funcional da língua. Desenvolvemos técnicas que permitem comparar e contrastar idiomatismos translinguística e transculturalmente, e em que a semelhança de significado (significado do idiomatismo) constitui o principal critério para o estudo contrastivo. Por outras palavras, o principal critério é o tertium comparationis (TC)—a base para a comparação interlingue, sendo que a semelhança de significado (a chamada constante ou TC) na L1 (bantu), L2 (português) e L3 (inglês) é acompanhada de diferenças ao nível dos engenhos formais e expressão cultural. O Léxico de Usos constituído, a partir do estudo contrastivo realizado, em termos de traços salientes e distintos, poderá auxiliar o docente e o aluno a prever, diagnosticar e evitar várias infelicidades discursivas que normalmente são produzidas durante a aprendizagem de cada uma das diferentes línguas em contraste.

10. Conclusão

Reflectir sobre as inúmeras questões que as contas e contos no interior de cada uma delas relatam não é tarefa simples. Sem serem os contos de Mia Couto (2008), as questões da língua e da cultura são também questões que entendo como contos. São ilimitadas as contas do colar moçambicano e universal da língua portuguesa por tratar. Mas talvez possamos apontar para as mil e uma missangas, cada uma encerrando uma história sobre a sobrevivência e revitalização da língua, num contexto de progresso, harmonia e coabitação multilinguística e multicultural, que a longa noite colonial tinha tornado extremamente difícil. Foi essa a inteligência e argúcia de Scheherazade na sua relação com o rei persa.

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Argumentei sobre a diversidade linguística e diversidade cultural como suportes importantes do enquadramento e desenvolvimento da língua portuguesa. Na verdade, como

18baluartes da liberdade e da forma contemporânea de vida. Na verdadeira acepção dos conceitos, o mundo de hoje já começa a ser bilingue e, de modo ainda ténue, multilingue e multicultural; a condição monolingue e monocultural do amanhã poderá vir a ser idêntica à do analfabeto de hoje.

Tal como aconteceu com a fragmentação do latim nas línguas românicas, todo o processo de heterogeneização parece gerar sempre outros processos simultâneos de homogeneização e heterogeneização no seu seio. No caso de Moçambique e dos outros países da CPLP é essencial que se faça o estudo das forças que produzem mudanças na história, de molde a compreendermos melhor a natureza do poder que faz funcionar a língua portuguesa como língua do mundo e, assim, também termos melhor capacidade analítica e descritiva relativamente às novas variedades do Português.

É claro que noções como aldeia global e cultura mundial não significam muito para as pessoas que têm a cultura de subsistência como única cultura. Teremos, pois, vontade de vencer a prática da sobrevivência do mais forte? Ou os cidadãos do mundo continuarão a fingir que estão apaixonadamente interessados pelo Outro, e a imaginar o mundo do outro de um modo em que o outro já não é mais o Outro? É óbvio que o Ocidente não é absolutamente nada monolítico, mas também não é menos verdade que tendemos a esquecer onde é que o sol nasce.Muito obrigado.

Notas1.The fact that everyone is eager to learn how to draw a map of camaraderie by re-discovering a new role for Portuguese as a language of unity among nations and communities and as a language of dynamic interaction in multilingual contexts is a necessary and inescapable sign of our new Age. And in honour of the Portuguese language past, present and future, the monument we forgot should be erected.2.“…a situation where no more than fifty per cent of the population speak the same language”; “…a ranking of degree of linguistic diversity should not be based on the absolute number of languages in a country, but rather on the percentage of the population speaking any single language”.3. “O estado é simultaneamente o objectivo final do movimento nacionalista e o instrumento para a construção da nação que, consequentemente, deve ter uma natureza multicultural. A política linguística vem assim substituir os processos violentos que levaram à formação das actuais línguas universais e línguas eurásicas. Ela é um elemento fundamental na validação e defesa do multiculturalismo como alternativa nacional.” 4. “À medida que aprendem a processar (percepção e produção) a lingua falada e escrita, os aprendentes deverão também adquirir a capacidade para se identificarem, compreenderem e aceitarem os outros e as suas culturas.” 5.Sobre a previsibilidade do Esperanto, diz Abley (2003: 93) o seguinte: Todos os substantivos terminam em -o, todos os adjectivos em -a, todos os advérbios em -e...Uma árvore é arbo; uma árvore pequena é arbeto; uma árvore grande arbego; uma floresta é arbaro...O homem é viro; a mulher vir’ino. O marido é edzo; a esposa edzino. A base da língua assenta na masculinidade, tudo o que é feminino é criação posterior. [All its nouns end in -o, all its adjectives in -a, all its adverbs in -e... A tree is arbo; a small tree is arbeto; a big tree is arbego; a forest is arbaro...Man is viro; woman is vir’ino. A husband is edzo; a wife is edzino. At the base of the language is maleness, anything female is an afterthought].

Bibliografia

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