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S2: função de verdade Diana Lidia Mariscai A tríade que se produz em conseqüência da incidência da estrutura simbólica é o sujeito, o saber e o sexo. Sendo que o sujeito comporta um certeza do impossível, o sexo, uma impossibilidade de saber, e o saber, um "que saber?". É em torno da relação entre estes três termos que o discurso analítico se instaura na direção da cura. A sexualidade articulada à linguagem comporta então algo da ordem da impossibilidade, isto é lógico. Lacan vai demonstrá-lo. O saber articulado ao impossível da relação sexual tem a função de verdade, já a indicação da função nos remete a questões da lógica e da matemática dos conjuntos, onde função, tem uma específica e precisa articulação. De maneira geral, é a correspondência entre os elementos de dois conjuntos, é uma fórmula pela qual tal correspondência pode ser calculada e tem uma escrita. O fundamental para Lacan é demonstrar os efeitos que a incidência da linguagem produz, e que comporta a impossibilidade do sexo como real, como condição lógica. Há aí uma verdade; o saber deverá terá função dessa verdade, marcando a correspon- dência entre o sujeito e o sexo através de uma escrita. Demonstrar no sentido matemático tem uma série de implicações mas a partir de nomes como Peano, Russell, Hilbert emerge um ramo das matemáticas que é chamado axiomática e que liga a demonstração cada vez mais à questão de lógica, afastando-se dos métodos empíricos e de observação que são os chamados indutivos, os quais partiam do particular ao geral. O método indutivo básico nas ciências experimentais foi banido da matemática rigorosa. "Para provar uma proposição matemática, a evidência de qualquer número de casos seria insuficiente, enquanto que, para contradizer uma afirmação, um exemplo será suficiente. Uma proposição matemática é verdadeira se não leva nenhuma contradição lógica, e falsa em caso contrário ". (Número -A linguagem da Ciência - Tobias Dantzig) A demonstração parte de axiomas e está baseada no princípio da contradição e de identidade ao terceiro excluído. Frege, que se interroga sobre a lógica do número, nos diz no livro Osfundamentos da matemática: "Os números não se formam de maneira mecânica, mais ou menos como um monte de areia, éformado de grãos de quartzo. (...) A aritmética não tem nada a ver com sensações. Nem tampouco com imagens mentais LETRA FREUDIANA - A n o XI -D' 10/11/12 217

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S2: função de verdadeDiana Lidia Mariscai

A tríade que se produz em conseqüência da incidência da estrutura simbólica éo sujeito, o saber e o sexo. Sendo que o sujeito comporta um certeza doimpossível, o sexo, uma impossibilidade de saber, e o saber, um "que

saber?".É em torno da relação entre estes três termos que o discurso analítico se instaura

na direção da cura. A sexualidade articulada à linguagem comporta então algo da ordemda impossibilidade, isto é lógico. Lacan vai demonstrá-lo. O saber articulado aoimpossível da relação sexual tem a função de verdade, já a indicação da função nosremete a questões da lógica e da matemática dos conjuntos, onde função, tem umaespecífica e precisa articulação. De maneira geral, é a correspondência entre oselementos de dois conjuntos, é uma fórmula pela qual tal correspondência pode sercalculada e tem uma escrita.

O fundamental para Lacan é demonstrar os efeitos que a incidência da linguagemproduz, e que comporta a impossibilidade do sexo como real, como condição lógica.Há aí uma verdade; o saber deverá terá função dessa verdade, marcando a correspon-dência entre o sujeito e o sexo através de uma escrita.

Demonstrar no sentido matemático tem uma série de implicações mas a partir denomes como Peano, Russell, Hilbert emerge um ramo das matemáticas que é chamadoaxiomática e que liga a demonstração cada vez mais à questão de lógica, afastando-sedos métodos empíricos e de observação que são os chamados indutivos, os quaispartiam do particular ao geral.

O método indutivo básico nas ciências experimentais foi banido da matemáticarigorosa.

"Para provar uma proposição matemática, a evidência de qualquer número decasos seria insuficiente, enquanto que, para contradizer uma afirmação, um exemploserá suficiente. Uma proposição matemática é verdadeira se não leva nenhumacontradição lógica, e falsa em caso contrário ". (Número -A linguagem da Ciência- Tobias Dantzig)

A demonstração parte de axiomas e está baseada no princípio da contradição e deidentidade ao terceiro excluído. Frege, que se interroga sobre a lógica do número, nosdiz no livro Os fundamentos da matemática: "Os números não se formam de maneiramecânica, mais ou menos como um monte de areia, é formado de grãos de quartzo. (...)A aritmética não tem nada a ver com sensações. Nem tampouco com imagens mentais

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formadas a partir dos vestígios deixados por impressões sensíveis anteriores. Ainstabilidade e a indeterminação de todas estas configurações opõem-se firmementeà determinação e estabilidade dos objetos e conceitos matemáticos". Ele tambémafirma que às vezes se apela a descrições para se explicar o conceito, que para finsdidáticos pode ser aceitável, mas que se deve diferenciar de uma definição. Concluique toda investigação acerca da cogência de uma demonstração ou da legitimidade deuma definição deve ser lógica.

Diz que:"Hoje exige-se demonstração para muito do que antes valia como auto-vidente. (...) Está fundado na essência da matemática que sempre que uma demons-tração for possível deve-se preferi-la a uma verificação por indução". (Frege -Fundamentos da Aritmética, Os pensadores)

É a procura da demonstração no sentido matemático que leva Lacan à topologia eà lógica matemática, mas não como modelos a serem aplicados para a compreensão.No escrito "L 'Étourdit", é contundente neste sentido:

"O toro é a estrutura da neurose "."(...) o final da análise do toro neurótico "."A topologia não tem a finalidade de orientar na estrutura.Ela é estrutura "."O materna se profere do único real reconhecido primeiro na linguagem: a saber,

o número ".No Seminário... Ou Pire diz: a "estrutura é lógica ".No mesmo Seminário define a lógica como "a arte de produzir uma necessidade

de discurso ". Isso vai contra o que alguns analistas imaginaram, que, por se desprenderdo inconsciente o princípio de contradição, a lógica nada teria a ver com a elucidaçãodo inconsciente, mas, pelo contrário, é justamente porque há discurso, e discursoanalítico, que há uma lógica - ciência do real - que o sustenta e deve ser demonstrada.

Dizer que a lógica produz a necessidade do discurso é assinalar que a necessidadecomeça com o ser falante. Por isso, tudo o que se produz é um fato de discurso. Nãohá necessidade anterior à fala. A tragédia revela isto na medida em que se concretizacomo necessidade lógica de se dizer algo da própria estrutura.

Produzir está no sentido de demonstrar o que estava aí antes, mas, até que não sejademonstrado, é considerado inexistente. A inexistência é a condição para a existência.

O que se examina pela via da lógica são as conseqüências que produz o fato de alinguagem se interrogar sobre o que ela mesma funda como discurso.

É dessa maneira que aparece inevitavelmente o impossível. Isto tem referência noTeorema de Godel, que demonstra que, se a aritmética é consistente, então é incom-pleta, haverá sempre verdades aritméticas que não poderão ser demonstradas comoteoremas a partir dos axiomas do sistema. Isto fundamenta o dizer de Lacan de que osimbólico não recobre o real. Como Godel, Lacan não parte de critérios de verdadeiroou falso, correspondentes a princípios semânticos, mas procede à demonstração, quefaz da aritmética algo enunciável, deixa os critérios de verdadeiro e falso em suspenso.A questão é que nenhum sistema axiomático demonstra tudo da aritmética. Isso é

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impossível. Produz-se o que Lacan denomina "buraco no sistema ", abertura lógicaque se opõe ao completo apresamento do discurso. Não há universo de discurso. Esseimpossível, que não é impotência, já que esta marca o não poder do signif icante quandoé chamado a advir ao lugar do Si. O real é impossível de se escrever no sistema lógico,de se escrever se anularia. Essa condição lógica é a que dá a consistência e Lacan nosdiz a este respeito: "(...) no reconhecimento do inconsciente mesmo, está a noção doque faz a consistência, que seria falando com propriedade, o real, um ponto deopacidade. É um ponto infranqueável, é um ponto impossível. É aí, me parece, que setem que situar a noção do impossível de uma forma totalmente central, de certaimpossibilidade que está ligado, que é coerente que permitiria especificar na cadeiados seres vivos, como Freud o sublinhou, o ser humano como sendo não a obra primada criação ou o despertar do conhecimento, e sim, pelo contrário, o lugar, de umaespecial unerkennung quer dizer não só um não reconhecimento, e sim uma impos-sibilidade de conhecer o concernente ao sexo, uma unmõglich, não pode nem se dizernem se escrever".

Neste parágrafo Lacan coloca claramente a razão por que o buraco, o impossível,é lógico. Porque é a condição da consistência do inconsciente. Freud, já na "Interpre-tação dos Sonhos", quando está fundando o estatuto do Inconsciente, fala do umbigodo sonho, esse ponto de desconhecimento, esse unerkannt, mas que Lacan diz sermais que isto, é uma unmõglich, impossível de se conhecer. Essa é a lógica quecomanda a estruturação do sujeito, a lógica significante.

Então vemos que a estrutura do Inconsciente se caracteriza em tomo do real(buraco) do sexo.

O Inconsciente estruturado como linguagem se redefine a partir da formulação"não há relação sexual" que se articula a esse buraco, impossível, que é lógico. É apartir deste postulado que o Inconsciente se redefine como "alingua", "lalangue",avançando no sentido de o real ir encontrando um lugar na estrutura simbólica.

Alingua se articula ao não todo, sua condição é lógica. A negação é sobre a funçãofálica, é o que indica a mulher como não toda. Nisso se diferencia da linguagem que,através da gramática, tenta transformar a língua num todo. Essa negação se formulacomo "não há Outro do Outro", ou bem que o Outro é barrado, falha na linguagemonde não existe a última palavra.

Por isso não há metalinguagem que fale como o todo. Alingua se refere à particu-laridade de cada um, ao recalcado inconsciente, que se expressa pela via do equívocoou do engano, introduzindo outra dimensão da verdade a do meio dizer, não toda.

O saber deverá conferir no discurso analítico a função da verdade, que não é omesmo que verdade do saber, já que a verdade como função estabelece a relação dosujeito ao sexo, coordenação que implica a impossibilidade de se produzir um sabersobre o mesmo, posição que a histérica trata de sustentar.

É a partir da maternatização que Lacan aborda este novo estatuto do saber, que nãose produz nem se acumula como seria no discurso científico.

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No entanto, há um saber que não pode ser iludido pelo analista, a questão é quesaber é esse. Fundamental para a análise no sentido de que é o que vai determinar olugar que ele ocupará na direção da cura, aí o analista não pode se fazer de tolo.

Abordaremos algumas questões que implicam as fórmulas da sexuação, escrita quese desenvolve em torno do "UM" e do "não todo", para abordar a impossibilidade.Função fálica de x é a primeira escrita que se produz, indica que a função sexual noser falante é uma, a da castração. Como opera x, para cada particular, cada homem ecada mulher? A resposta joga por terra as referências anedóticas da castração. Acastração terá como função produzir uma diferente relação ao gozo, essa é a diferençaque caracterizará aos seres falantes homens e seres falantes mulheres.

Lacan parte da lógica das proposições de Aristóteles, mas esta lhe é insuficiente,elude a questão do não todo. É a lógica matemática que lhe dá os elementos necessáriospara demonstrar a impossibilidade, se bem que Lacan introduza modificações.

A lógica das proposições aristotélicas não é suficiente a Lacan, já que é de classes,atributos, não aceita o vazio, a variável está sempre especificada, e se uma exceção seapresentar, a universal ficará questionada.

Na teoria dos conjuntos o vazio opera e constitui um impossível. O impossível emlógica é violar um princípio assumido. A fórmula que define o conjunto vazio(0x = {x : x=x, x*x}) é a violação do princípio de identidade, isto constitui então umimpossível.

Introduz-se a quantificação, que não implica quantidade e sim uma escrita queinclua as categorias da "existência " e do todo (lógica de negação); e os modos quecorrespondem as categorias do: necessário, possível, impossível e contingente.

Vemos nas fórmulas da sexuação X por todos os lados, que designam ao ser falante.Enquanto seres falantes temos que nos situar simbolicamente, seja na parte esquerdaou direita, às vezes nas duas independente das diferenças anatômicas. A impossibili-dade da relação é que tanto homem como mulher se relacionam a uma função idêntica:a da castração ou fálica por isso não há acordo fundamental, {"mesmidade" nadiferença).

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Nas fórmulas dá sexuação fica demonstrado que a relação sexual não existe, nãotem objeto como referente, o que há é uma marca da inexistência, tal como o "O " o éno real dos números naturais*. Essa inexistência do real não é igual a "nada"justamente por essa marca.

A linha superior da fórmula trata da dialética da existência e inexistência.3x 3>x, Existe um x que diz não à função fálica. Introduz a questão do Y a de VJJn.

Há do_UM. Isto é o correlato do vazio do Outro cuja escrita se encontra do Outro lado.3x <í>x, não existe um que diga não à função fálica.

3x <í>x é a exceção necessária para poder definir um conjunto de elementos;justamente é o que não está no conjunto, é o UM que designa o conjunto. É o quemiticamente Freud formula em "Totem e Tabu": a idéia de um pai originário espéciede gozador universal de todas as mulheres. É pelo menos um que não é castrado e quefaz dos outros "todo homem ", é o pai mítico.

A exceção confirma a regra, sustenta o todo saindo dele. Isto é complicado e Lacano resolve pela via da topologia colocando esse 3x <I>x como limite, borda, que permitea constituição do Vx Ox (Todo x função fálica). Constitui ao homem como conjuntofechado.

Joga-se aí no Ya de l'Un, uma inderminação que permite que algo se designe, queseja possível. É o que não cessa de não se escrever. Indicando que se o inconscienteestá estruturado como uma linguagem a função da castração é necessária, mas algo aíescapa. Existir está relacionado ao significante. É a partir de 3x <t>x (ex-siste um x) queos outros funcionam em relação à exceção. É necessário ao menos um para que o gozofálico seja possível e limitado.

Y a de l'Vn, há do UM, nos aponta essa exceção, que diz não à castração, pai dahorda primitiva que permite a existência do Si para que os S2 emerjam eles mesmosum a um. Mas Yade l'UN implica também o UM que encontramos na passagem deum número a outro, e é o que se faz necessário em relação ao par sexual. Este UM é oque Lacan fundamenta baseando-se nos números transfinitos de Cantor, e é o alef O( X o) Cardinal transfinito que marca nessa passagem de 1 a outro a inacessibilidade do2, não há possibilidade de complemento, não há relação sexual, não há um mais umigual a dois.

O Complexo de Édipo é o que dá a idéia desta condição lógica que é a daaproximação indireta do homem e da mulher. Lacan aponta que o contrário donecessário não é o impossível e sim o possível.

O outro lado 3x <3>x, não existe um x que diga não à função fálica, diz respeito àinexistência.

Ou seja que o outro companheiro não implica a exceção, indica assim a nãoexistência de X. Não existe, aponta a que não é verdade que a função fálica domine o

* Essa marca produz o 1 do "O". Frege que se interessa pela demonstração lógica do estatuto do número,demonstra que é a partir do "O" que se pode estabelecer a série dos números inteiros.

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que está aí do uso do significante. Não é verdade que a castração domine tudo. Em oseminário "...OuPire", Lacan coloca que o essencial da mulher não é a castração.

O que está colocado nesta escrita é a impossibilidade, o que não cessa de não seescrever", aí está o sentido da Unerkannt (desconhecido) em tanto Urverdrãngt(recalque primário). Nada mais se tira daí, é o limite à associação.

A necessidade se instaura a partir duma suposição de inexistência que é umaconseqüência da produção da necessidade. É na repetição, no sintoma e no automa-tismo que se manifesta a necessidade lógica; os dois incluem a inexistência e sãoexpressão da existência do inconsciente estruturado como uma linguagem.

Na repetição ressoa o que faz ao ser falante falar, que é a interdição ao gozo. Eatravés dela que se elabora pela via ficcional essa impossibilidade. O que a repetiçãopromove na análise é uma reprodução da neurose, ou seja a produção dos Si, oráculos,relacionados ao pai traumático. É neste sentido que ela demanda o novo e algo daordem da escrita deverá emergir para mudar a economia do gozo.

É a lógica da impossibilidade que determina a necessidade de se produzir um limite,uma borda, significante. É a partir dessa impossibilidade como causa_que o acesso àmulher é possível na sua indeterminação. Não todo x função fálica (Vx <I>x), o x nãose pode construir, não faz borda à mulher, determina-a não toda. Não se constitue ouniversal da mulher.

O não todo função fálica (Vx 3>x) é a negação da discordância. Se determina opossível mas não necessário, ou seja, a mulher na função fálica se apresenta à maneirade argumento, de valor, na contingência, é aí que se articula o valor sexual da mulher,marcando uma relação ao gozo diferente, que não se pode dizer, fica sem borda oulimite; é o outro gozo.

Esse não todo para a função fálica se escreve pelo significante do Outro barrado

Para suprir o vazio, a mulher faz o homem, o que não quer dizer ser o homem; é aquestão da histérica. Aonde joga seu papel o amor, espécie de cenário onde a exigênciaé que seja de alma a alma. Te amo com toda a alma e exijo o mesmo - onde se oferecema almas para fazer UM da unidade do campo do ideal. Mas por mais que a mulherqueira essa função fálica, isso não a universaliza, ela não pode ser toda, tem outrarelação ao gozo, que não depende dessa função.

Através das fórmulas da sexuação vemos que a escrita do real impossível marca adiferente relação ao gozo de um lado e do outro.

Do lado das mulheres, o gozo está coordenado ao significante do Outro barradoS(^), mas também tem acesso ao falo, por isso a mulher é não toda, o $. está barrado.Quanto ao homem, só tem acesso a sua parceira tomada como objeto a, causa de seudesejo, lugar que a histérica resiste a ocupar.

Vemos que há UM princípio organizador que determina uma relação entre saber egozo. Saber que desde o real organizará o que é do gozo nos homens e nas mulheres.

Esse é o saber que deve emergir da análise com função de verdade e será particularpara cada um.

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Indica como cada sujeito se coordena à sexualidade, ou seja, como cada um lidacom seu gozo, esse impossível, real do sexo. A função da verdade que deve exercer osaber indica que será apenas por uma escrita que se estabelecerá essa coordenação entreo sujeito (conjunto vazio a se produzir) e a sexualidade (o Outro conjunto vazioenquanto buraco impossível, gozo sem borda), escrita que indica que o real encontreum lugar no simbólico, que não tem a ver com conhecimento ou significação.

Por que o saber é finalmente do gozo? O gozo é um limite do simbólico, é o buracológico, só se pode interpelar a partir da aparência; o amor se dirige ao semblant. Aforma de o sujeito se agarrar ao Outro lugar vazio é vestir a roupagem imaginária quepermite que no caminho realizado pelo simbólico em direção ao real, o objeto a emerjana aparência, sua verdadeira natureza. Parecer-se ao objeto a (olhar-voz-fezes, seio) éo suporte da causa do desejo. Essa relação ao Outro através de a é o que faz com quea relação sexual acabe em um fantasma.

O real, o limite ao simbólico, o gozo, só se introduz no simbólico pela via da escrita,que inclui um atravessamento do imaginário. Esta escrita é contrária ao sentido, marcao "non-sens", o ausentido, é específica da experiência analítica, que gira então emtorno do UM e do a.

Isso se constrói na análise como uma teia de aranha que parte de um ponto opaco.Lacan, no seminário "Encore", diz: (...) "A formalização da lógica matemática, tãobemfeitapara só se buscar na escrita, não poderá ela nos servir ao processo analítico,no que ali se designa isso que invisivelmente retêm os corpos?" Uma imagem danatureza que se aproxima "dessa redução às dimensões da superfície que a escritaexige, e de que já se maravilha Spinoza - esse trabalho de texto que sai do ventre daaranha, sua teia. Função verdadeiramente milagrosa, ao se ver, da superfície mesmasurgindo de um ponto opaco desse ser estranho, desenhar-se o traço desses escritos,onde perceber os limites, os pontos de impasse, os becos sem saída, que mostram oreal acedendo ao simbólico ".

O gozo fica fora da análise, porque o que se analisa é o sujeito como efeito dosignificante. No entanto é o gozo que está em questão na direção da cura. Mas é a partirda experiência analítica que algo poderá mudar na economia do gozo. Já que é pelavia do dito que algo da verdade se revela. Por isso é importante como diz Lacan, nãopular os significantes, para não cair na compreensão que vela o gozo.

Bibliografia

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Seminário: ~.OuPire (inédito) 1972-73Seminário: Mais Ainda 1973 (Zahar editores)Seminário: Les problèmes Cruciaux de Ia Psychanalyse (inédito) 1964.Seminário: VEnvers de Ia Psychanalyse (inédito 1969 - 70)

FREUD.S.Interpretación de losSuehos 1898-99 Obras completas Tomo I (Bliblioteca Nueva)

ELMER, D. - NONINIX, J.Una lectura de "OuPire" 1* e 2* parte .Bs.As (Argentina)

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