03capítulo iif

60
C A P Í T U L O I I REVISÃO DE LITERATURA 2.1. Introdução Embora a escola se afirme como igual para todos, ela constitui-se como obstáculo para muitos alunos. O desempenho escolar muitas vezes não é o desejado pelos pais, pelos professores e, como é natural, pelos alunos, sendo a matemática muitas vezes um problema bem presente. Esta situação, de grande complexidade, é tratada pela expressão ‘insucesso escolar’, a qual se reveste de um mistério de incertezas e hipóteses quanto ao descobrimento das suas causas concretas e medidas de remediação. Por outro lado, surge o professor de Matemática, pois é ele que, como educador e matemático, está intimamente ligado aos seus alunos. No entanto, o professor e a sua prática pedagógica são resultado de um conjunto de vivências e acontecimentos, que efectivamente contribuem para a sua maneira de ser e actuar enquanto professor. Neste capítulo vamos procurar encontrar, com base em diversos autores, um suporte para a interpretação e análise de toda a temática que envolve o presente estudo, o insucesso escolar em matemática e o desenvolvimento profissional do professor de matemática. 2.2. Insucesso escolar A problemática do insucesso escolar é complexa e multiforme. Os tipos de insucesso são diversos. Diferenciam-se, vulgarmente, o insucesso escolar do insucesso educativo. Sem dúvida, para além de ensinar conhecimentos, a escola deve assumir o

Upload: lena-coradinho

Post on 07-Nov-2015

226 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

capitulo 3

TRANSCRIPT

  • C A P T U L O I I

    REVISO DE LITERATURA

    2.1. Introduo

    Embora a escola se afirme como igual para todos, ela constitui-se como obstculo

    para muitos alunos. O desempenho escolar muitas vezes no o desejado pelos pais,

    pelos professores e, como natural, pelos alunos, sendo a matemtica muitas vezes um

    problema bem presente. Esta situao, de grande complexidade, tratada pela expresso

    insucesso escolar, a qual se reveste de um mistrio de incertezas e hipteses quanto ao

    descobrimento das suas causas concretas e medidas de remediao.

    Por outro lado, surge o professor de Matemtica, pois ele que, como educador e

    matemtico, est intimamente ligado aos seus alunos. No entanto, o professor e a sua

    prtica pedaggica so resultado de um conjunto de vivncias e acontecimentos, que

    efectivamente contribuem para a sua maneira de ser e actuar enquanto professor.

    Neste captulo vamos procurar encontrar, com base em diversos autores, um suporte

    para a interpretao e anlise de toda a temtica que envolve o presente estudo, o

    insucesso escolar em matemtica e o desenvolvimento profissional do professor de

    matemtica.

    2.2. Insucesso escolar

    A problemtica do insucesso escolar complexa e multiforme. Os tipos de

    insucesso so diversos. Diferenciam-se, vulgarmente, o insucesso escolar do insucesso

    educativo. Sem dvida, para alm de ensinar conhecimentos, a escola deve assumir o

  • 15

    papel de educar. Deste modo, os grandes desafios incumbidos escola, podem ser

    vistos em duas vertentes: em primeiro lugar, a actualizao e a especializao dos

    saberes, ou seja, requer-se, atravs dos contedos programticos e da sua actualizao

    regular, que o conhecimento cientfico produzido chegue aos alunos tambm pela

    escola (Morgado, 1999, p.9); em segundo lugar, requerida uma formao global e

    pessoal do indivduo, isto ,

    torna-se necessrio um esforo de integrao e equilbrio entre a disperso e especializao de conhecimentos e a globalizao da aco educativa, de forma a evitar que a educao seja simplesmente transmitir conhecimentos mas, fundamentalmente, a construo de um projecto vivel para chegar ao futuro (Morgado, 1999, p.9).

    Na mesma linha de pensamento, Pires, Fernandes e Formozinho (1991, pp.187-

    188) atribuem educao as finalidades de instruir, estimular e socializar os

    educandos, ou seja, visa a aquisio de determinados conhecimentos e tcnicas

    (instruo), o desenvolvimento equilibrado da personalidade do aluno (estimulao) e a

    interiorizao de determinadas condutas e valores com vista vida em sociedade

    (socializao) (id. p.188). Assim, pode dizer-se que se alguma destas dimenses no

    for atingida h insucesso na educao escolar.

    O insucesso educativo toma deste modo uma dimenso abrangente, extravasando

    largamente o mbito do insucesso escolar, em que o presente trabalho se centra.

    Naturalmente no se pretende descurar a importncia fulcral que a escola desempenha

    no desenvolvimento das outras dimenses. Para realar esta ideia, Pires, Fernandes e

    Formozinho (1991, p.188) dizem

    que na escola valorizada a instruo em detrimento de uma concepo mais ampla de educao onde a dimenso personalista ... a dimenso socializadora... so claramente subalternizadas. Frequentemente, acontece que estas dimenses no so tomadas em considerao num juzo global sobre sucesso ou insucesso escolar, quando realmente elas so essenciais para caracterizar a eficcia do projecto educativo.

  • 16

    2.3. Os diversos conceitos de insucesso escolar

    De acordo com Benavente (1990), o insucesso escolar um problema social que

    preocupa pais, professores e alunos, comeando a ser mais falado em Portugal a partir

    de 1987.

    Caracteriza-se o insucesso escolar pelo baixo rendimento escolar dos alunos, que por

    razes de vria ordem, no puderam alcanar resultados satisfatrios, no atingiram os

    objectivos desejados no decorrer ou no final de um determinado perodo escolar e, por

    conseguinte, reprovam. Pode ser tambm designado pela falta de xito/mau resultado no

    processo de ensino-aprendizagem.

    Pires, Fernandes e Formozinho (1991, p.187) referem que o insucesso escolar a

    designao utilizada vulgarmente por professores, educadores, responsveis de

    administrao e polticos para caracterizar as elevadas percentagens de reprovaes

    escolares verificadas no final dos anos lectivos. Tambm Iturra (1990, p.104) frisa que

    o insucesso escolar um fenmeno de falhano na escola e define-o como a

    dificuldade que a escola tem de treinar mentes que j tm um conhecimento cultural do

    real. Em consonncia, contrape que o caminho para o sucesso consiste em

    domesticar uma mente na verdade histrica, cultural e conjuntural. (...) A escola

    precisa de pr as crianas no caminho da interrogao (Iturra,1990, p.129).

    Se nos reportarmos definio de insucesso escolar preconizada por Fernandes,

    citada na Enciclopdia Luso Brasileira (1980, p.162 ), insucesso escolar designa a no

    obteno ou no realizao de objectivos predeterminados pela organizao escolar ou

    pela instruo em si. Acrescenta, tambm que o termo insucesso um conceito que

    exige, a priori, um outro comparativo: mau resultado em relao aos objectivos

    escolares, falta de xito na aprendizagem, ausncia de eficcia na interiorizao,

    apreenso e assimilao dos conhecimentos (id, p.162).

  • 17

    A definio ditada pelo Ministrio da Educao (1992, p.47) Unidade Europeia da

    rede Eurydice anuncia que, em Portugal, entende-se o insucesso escolar como a

    incapacidade que o aluno revela em atingir os objectivos globais definidos para cada

    ciclo de estudos.

    Podemos atribuir o insucesso escolar instruo escolar, no que concerne

    incapacidade que o sistema educativo muitas vezes apresenta em dar resposta a um

    vasto nmero de problemas com que cada aluno se debate, podendo conduzir ao

    fracasso e, at mesmo, ao abandono escolar prematuro. Para assinalar esta posio,

    Iturra (1990) afirma que o insucesso escolar consiste na dificuldade que as crianas

    tm em aprender, em completar a escolaridade no tempo previsto, em obter notas altas

    ou pelo menos satisfatrias pelo seu trabalho escolar para poderem continuar os seus

    estudos.

    Segundo este mesmo autor, relativamente a opinies de professores que com ele

    conversaram, existem duas razes pelas quais este fenmeno acontece. Uma delas que

    os estudantes no esto interessados em aprender e os seus pais tm sobre eles

    expectativas que vo alm das capacidades dos adolescentes. A outra razo afirma que o

    insucesso escolar dos alunos se deve no existncia de meios para ensinar e

    inexistncia de orientao pedaggica adequada. Iturra resume estas duas razes com a

    seguinte afirmao: ou os estudantes no esto aptos para aprender, ou os professores

    no esto aptos para ensinar (1990, p.15).

    Neste momento surge a dvida se haver uma discrepncia entre o desenvolvimento

    integral da criana e as exigncias do sistema educativo propostas para a sua fase etria.

    Neste mbito, Le Gall refere que uma grande percentagem de insucesso escolar se

    relaciona com a inadaptao da personalidade da criana s exigncias escolares (1978,

    p.15). O mesmo autor salienta que nas escolas do ensino bsico, colgios particulares ou

    outras instituies de ensino confrontamo-nos com uma enorme diversidade de

    personalidades infantis, e quando as escolas e as suas exigncias no se sabem adaptar a

  • 18

    essas personalidades e condicionamentos psicolgicos que algumas crianas tm, tal

    pode levar ao insucesso escolar. Tambm para Le Gall, a adaptao da criana escola

    deveria ser feita juntamente com o professor, a escola, o aluno e a famlia, indo cada um

    ao encontro dos outros, para que deste modo fossem ultrapassadas todas as dificuldades

    e possveis falhas.

    Para Muiz (1989, p.9), o insucesso escolar define-se como a grande dificuldade

    que pode experimentar uma criana com um nvel de inteligncia normal ou superior

    para acompanhar a formao escolar correspondente sua idade . Para este autor, a

    criana tem inteligncia normal ou superior ao normal desde que no sofra de qualquer

    leso cerebral, que seja assdua s aulas e que no tenha origem numa famlia com um

    nvel cultural muito baixo.

    Rangel (1994) d-nos uma noo mais abrangente deste conceito. Para esta autora, o

    insucesso escolar significa a falncia de um projecto, assim como a posio difcil em

    que somos colocados pelos adversrios. No campo educacional, significa o insucesso

    num exame, bem como o afastamento definitivo da escola provocado por repetncias

    sucessivas (Rangel, 1994, p.20). A mesma autora complementa que a noo de

    insucesso escolar s tem sentido dentro de uma dada instituio escolar e num dado

    momento da escolaridade.

    Assim, o termo insucesso escolar utilizado na realidade escolar como a falta de

    xito dos alunos face ao seu processo de ensino-aprendizagem, ou seja, o fraco

    rendimento/aproveitamento escolar dos alunos.

    2.4. Teorias explicativas do insucesso escolar

    Ao longo do tempo foram surgindo diferentes teorias destacando vises diversas

    sobre o insucesso. Assim, at final dos anos 60 reinou a teoria dos dons. Esta teoria

    explica o insucesso escolar atravs de aptides, as quais tm origem no nvel

  • 19

    intelectual expresso no Q.I. (Quociente de Inteligncia). Como refere Benavente (1989),

    citada por Ministrio da Educao (1992, p.7), o sucesso/insucesso explicado pelas

    maiores ou menores capacidades dos alunos, pela sua inteligncia, pelos seus dotes

    naturais.

    No final dos anos 60 aparece a teoria do handicap scio-cultural, a qual explica o

    insucesso dos alunos pela cultura de que dispem entrada na escola. Benavente

    (1989), citada por Ministrio da Educao (1992, p.7), afirma que a teoria do

    handicap scio-cultural, baseada em explicaes de natureza sociolgica, o

    sucesso/insucesso explicado pela pertena social, pela maior ou menor bagagem

    cultural de que os alunos dispem entrada na escola.

    Aps o incio dos anos 70 surge a teoria scio-institucional, a qual destaca o papel

    institucional na compreenso do insucesso do aluno. Tambm Benavente (1989), citado

    por Ministrio da Educao (1992, p.7), diz que a corrente scio-institucional sublinha

    a necessidade de diversidade e de diferenciao pedaggica pondo em evidncia o

    carcter activo da escola na produo do insucesso.

    Nas trs subseces seguintes sero abordadas, mais detalhadamente, cada uma

    destas teorias explicativas do insucesso escolar.

    2.4.1. Teoria dos dons

    Desde o final da 2 Guerra Mundial at ao final da dcada de sessenta vigorou a

    chamada teoria dos dons ou dos dotes individuais, tida como teoria explicativa das

    causas do insucesso escolar (Benavente, 1990). A teoria em causa explica o rendimento

    escolar por dons pessoais e naturais do prprio aluno, ou seja, era a inteligncia de

    cada um que ditava o sucesso na escola (Corteso e Torres, 1990).

    Deste modo, a teoria dos dons assenta na origem animal do Homem e no carcter

    fisiolgico de toda a actividade psquica. Atribu-se natureza do indivduo a

    responsabilidade pelas desigualdades intelectuais e considera-se que as mesmas eram

    determinadas pela hereditariedade (Benavente e Correia, 1980).

  • 20

    Nestas perspectivas hereditrias argumenta-se que a inteligncia da criana

    hereditria e que os factores genticos tm uma importncia fundamental para se

    compreender as diferenas entre classes sociais. Poder-se- dizer que se as crianas

    fracassam na escola, isso deve-se aos seus genes e no ao contexto, contedo e

    metodologia pedaggica.

    Poder-se- afirmar que a perspectiva psicolgica aborda o insucesso escolar como

    sendo um problema individual respeitante a cada criana, ou seja, ela apresenta

    problemas de dislexia, disgrafia, discalculia, disortografia e problemas congnitos que a

    levam a ter dificuldades numa longa escolarizao. Como refere Rangel (1994, p.40),

    uma srie de disortografias, de discalculias, de dislexias apareciam para tentar

    explicar esse gnero de dificuldades.

    Para Pereira e Martins (1987), nesta anlise explicativa do insucesso escolar, a

    criana entraria num ciclo de repetncias na escola devido ao seu nvel intelectual no

    ser compatvel com a escolaridade normal, isto , as dificuldades escolares estavam em

    grande parte associadas a dificuldades cognitivas das crianas. Esta ideia surge da

    constatao de que o Q.I. mdio nas classes mais baixas inferior ao Q.I. mdio das

    classes consideradas mdia e alta. Esta teoria explicativa justifica a razo por que as

    classes trabalhadoras no atingem percentagens altas de frequncia no ensino superior,

    j que um nvel de inteligncia baixo um obstculo ao acesso a este nvel de ensino.

    2.4.2. Teoria do handicap scio-cultural

    Os inmeros estudos sobre a inteligncia e sobretudo os trabalhos de Sociologia da

    Educao contriburam para o aparecimento de uma nova teoria explicativa do

    insucesso escolar a teoria do handicap scio-cultural, em que o sucesso/insucesso

    dos alunos explicado pela sua pertena social, pela maior ou menor bagagem cultural

    de que dispem entrada na escola (Benavente, 1990, p.6).

    Trata-se de uma teoria que encara o insucesso escolar como um fenmeno social e

    que o explica pela maior ou menor bagagem cultural que o aluno dispe entrada da

  • 21

    escola, ou seja, o insucesso escolar passa assim a ser entendido como o resultado de

    desigualdades sociais (Benavente, 1987).

    Para Rangel (1994), nesta abordagem do insucesso escolar as investigaes so

    centradas na famlia e na sua herana ou cultura. Deste modo, esta teoria refere que as

    crianas dos meios rurais tm uma experincia diferente daquela que caracteriza as

    classes mdia e alta dos meios urbanos. Neste caso, as formas de linguagem so as

    responsveis pela possibilidade ou impossibilidade das crianas adquirirem

    competncias/conhecimentos que lhes possibilite ou condicione o sucesso escolar e

    profissional.

    A linguagem , e sempre foi, indispensvel para a criana aceder comunicao,

    sendo um processo privilegiado de enriquecimento de experincias que influenciam a

    aprendizagem. E devido existncia de obstculos, tais como: um espao fsico pouco

    desenvolvido e uma pobre herana social e cultural da criana, que estas no iro

    desenvolver uma linguagem compatvel com a que promovida na escola e,

    consequentemente, todo um conjunto de experincias que podero levar ao sucesso

    escolar.

    Neste contexto, a criana desfavorecida ou com handicap sociocultural e lingustico

    aquela que vem de um meio diferente e que ao entrar na educao formal

    confrontada com a linguagem utilizada pelo professor, o que a pode perturbar, segundo

    se trate de uma linguagem mais ou menos diferente da que usada no meio onde se

    encontra inserida.

    Pereira e Martins (1987, p.50), referem que se a escola no respeitar as suas ideias,

    opinies e vivncias, ento a criana deixa de se sentir vontade no universo escolar,

    aparecendo-lhe este, inevitavelmente, como estranho.

    Por este facto e como refere Bernstein (1975), citado por Pereira e Martins (1987),

    necessrio que o professor se esforce e compreenda melhor a linguagem das crianas

    dos meios desfavorecidos em vez de persistir em alter-la. Pensa-se que importante o

  • 22

    facto do professor compreender a linguagem destas crianas, j que s a partir dessa

    compreenso o professor poder facilitar redes comunicacionais entre ele prprio e a

    criana. Tal significa que ao existirem redes comunicacionais slidas, o processo de

    ensino e aprendizagem poder ser adaptado s realidades destas crianas.

    Neste contexto, poder-se- colocar a seguinte questo: O facto de o professor no

    se esforar por compreender a linguagem familiar da criana e tentar alter-la, poder

    levar ao insucesso dos alunos?

    Naturalmente que se o professor actua em disfuno com o meio onde est inserida a

    escola, ser difcil criar um ambiente de aula que favorea a comunicao interactiva,

    assim como os mtodos pedaggicos no estaro adaptados ao meio, reflectindo-se num

    desequilbrio do processo de ensino-aprendizagem, o que pode, sem dvida, levar os

    alunos ao insucesso escolar.

    Na realidade, em relao ao insucesso escolar, alm de selectivo e precoce,

    constante, massivo e cumulativo, existindo em todos os graus de ensino, h indicadores

    de que quanto mais um aluno reprova, mais facilidade tem em voltar a reprovar

    (Benavente e Correia, 1980).

    Em Portugal, estatsticas referentes a 1983, apontam 43% como mdia nacional de

    repetncias na primeira fase e cerca de 30% na segunda fase (Benavente, 1987, p.11).

    Associadas noo de handicap sociocultural, para explicar o insucesso escolar das

    crianas, esto as investigaes relativas desigualdade de oportunidades perante o

    ensino. Uma criana com dficits lingusticos e culturais ter uma menor

    disponibilidade de meios, atitudes e motivao para competir com os considerados

    alunos ideais.

    Seguindo esta linha de raciocnio, Bordieu e Passeron (1985, citados em Rangel,

    1994) sublinham a distribuio desigual das oportunidades escolares segundo a origem

    social. Estes autores consideram que as crianas so herdeiras da dimenso cultural da

    sua famlia e se estas so provenientes de meios sociais desfavorecidos, onde o capital

  • 23

    social e econmico baixo, tm menos possibilidades de xito na escola e so aquelas

    que mais insucesso apresentam.

    Os principais problemas em lidar com crianas de diferentes meios sociais so: a

    instruo, a disciplina e a aceitabilidade moral. O problema da instruo depende do

    nvel social da famlia, logo reflecte-se em dificuldades nas actividades escolares,

    tornando-se uma tarefa difcil para o professor. Quanto disciplina, um dos principais

    problemas com que se deparam os professores, sendo mais frequente a indisciplina no

    caso dos alunos das classes sociais mais baixas. Em relao aceitabilidade moral, a

    criana das classes mais baixas so aquelas que mais ofendem a sensibilidade moral dos

    professores, isto porque so as que praticam mais frequentemente actos como fumar,

    beber e no tm hbitos de higiene considerados bsicos. Estes factores contribuem para

    a formao de expectativas relativas vida acadmica dos alunos, as quais se

    constituem como condicionantes do seu xito escolar.

    Esta teoria deixa de culpar apenas os filhos para culpar tambm os pais que, no

    tendo meios para lhes assegurar condies favorveis a uma educao adequada, os

    colocam numa situao de desigualdade perante os colegas de um meio social mais

    favorecido.

    2.4.3. Teoria scio-institucional

    Atendendo ao facto de que nos pases ditos desenvolvidos a melhoria do nvel de

    vida scio-econmico no fez anular o insucesso escolar, mantendo-se essencialmente

    inalterado, a teoria do handicap scio-cultural comeou a perder fora para dar lugar a

    uma nova teoria a teoria scio-institucional. Nesta teoria destacado o papel

    institucional na compreenso do insucesso escolar.

    Ultrapassado algum fatalismo, presente na teoria do handicap scio-cultural, passa-

    se a investir na transformao da prpria escola, nas suas estruturas, contedos e

    prticas, procurando adapt-la s necessidades dos diversos pblicos que as

    frequentam, elucidando subtis mecanismos de reproduo de diferenas e procurando

  • 24

    caminhos de facilitao das aprendizagens para todos os alunos (Benavente. 1990,

    p.7).

    O insucesso escolar torna-se, assim, uma realidade cada vez mais abrangente. Na

    dcada de oitenta visto como um fenmeno relacional que envolve factores de

    natureza poltica, cultural, institucional, scio-pedaggica e psicopedaggica; tem a ver

    com as relaes que a escola estabelece com os alunos que vm de meios mais afastados

    dos saberes letrados, tem a ver com as dificuldades que a escola (baseada na igualdade

    formal e numa suposta neutralidade) tem em se relacionar com os alunos social e

    culturalmente diversos (Benavente, 1980, p.24).

    Deste modo, a teoria scio-institucional explica o fenmeno do insucesso escolar

    atravs de uma abordagem conflitualista, na medida em que o insucesso escolar

    atribudo s relaes de classes. Nesta perspectiva, o professor um agente de execuo

    ao servio das classes.

    Rangel (1994) defende que nenhum modelo cultural de classes , em si, superior aos

    outros e se existe um modelo dominante porque este imposto por uma classe

    dominante. A autora refere ainda que a escola considerada por Althusser (1970) como

    o aparelho ideolgico do Estado e Bordieu e Passeron (1970) salientam o facto de que

    tambm a escola a responsvel pela reproduo das relaes sociais.

    Nesta linha de pensamento encontra-se Lurart (1978, p.23) ao referir que a escola

    desempenha um importante papel como difusora da ideologia dominante. Para esta

    autora, a ideologia dominante transmitida pela escola um factor de insucesso para

    certas crianas, mais especificamente as crianas do meio rural, porque corresponde a

    uma rotura com a prtica e com a realidade a que esto habituados.

    Esta teoria atribui responsabilidades escola pelo insucesso escolar, argumentando

    que as prticas escolares e pedaggicas tm por base o modelo de aluno ideal,

    penalizando com maior frequncia os alunos mais desfavorecidos. Corteso e Torres

    (1990, p.81) consideram que de facto a cultura que a escola ministra, nomeadamente o

  • 25

    seu cdigo lingustico, aquele que predomina na sociedade. Se a criana o no

    possui, ela fica menos apta para vencer na vida e, seno se lhe proporciona esse cdigo,

    est-se a contribuir para agravar a desigualdade social. O insucesso escolar, alm de

    massivo e socialmente selectivo, constante e cumulativo, no se podendo deixar de

    fora a escola na explicao deste fenmeno.

    Nos pases desenvolvidos que resolveram problemas extremos de

    subdesenvolvimento, de fome e sade, de nvel de vida e escolaridade, o insucesso no

    desapareceu. Assim, este continua a ser um fenmeno importante e selectivo, embora

    em percentagens mais baixas em relao s percentagens dos pases que ainda sofrem

    de tais problemas.

    Gomes (1987) refere que durante o sculo XIX o sistema educativo, dando como

    exemplo o ensino secundrio, estava organizado em bases estritamente classicistas, ou

    seja, existiam diferentes tipos de educao secundria administrando ensinos sociais e

    escolares muito diferentes. Como consequncia, no final dos estudos reproduzia-se a

    diviso social do trabalho e a estrutura de classes igualmente diferenciadas e

    hierarquizadas. Refere ainda que em Portugal os liceus forneciam populao escolar

    das classes mdia e superiores um ensino do tipo acadmico, proporcionando-lhes o

    ingresso nas universidades. Por outro lado, para as classes mdia e baixa existiam

    escolas tcnicas comerciais e industriais que davam acesso aos sectores secundrios e

    tercirios. Como salienta Gomes (1987), argumentando com a ideia de Becker,

    introduz-se, deste modo, o conceito de cliente ideal do aparelho escolar.

    Para Becker, citado por Gomes (1987, p.32), a diversidade sociocultural que

    caracteriza a populao escolar arrasta consigo srios problemas de adaptao ou

    ajustamento para os profissionais do ensino, j que se vem envolvidos numa situao

    em que so obrigados a interagir com uma clientela escolar que, em certos casos, se

    afasta ostensivamente dos seus padres e ideias.

  • 26

    Cabe escola fomentar e assegurar a mudana. A escola tem de se organizar de

    forma a proporcionar a todos os alunos oportunidade de se realizarem. Mais do que

    nunca tem de assumir as suas funes sociais interagindo numa reciprocidade com o

    meio. Compete-lhe ser dinmica de modo a identificar e ultrapassar obstculos,

    actuando de forma realista e adequada em cada momento e em todas as situaes.

    Os professores/educadores devero construir uma escola que conduza todos os seus

    intervenientes alunos, pais, professores a uma realizao individual e social.

    Como se acabou de referir, existem vrias teorias que propem explicaes para o

    insucesso escolar dos alunos. A abordagem psicolgica do insucesso escolar parte do

    pressuposto que este tem como causa principal as diferenas individuais de cada

    criana. A abordagem sociolgica explica o insucesso escolar atravs das componentes

    sociais e, assim, surge a famlia como principal responsvel, j que as crianas so as

    herdeiras da cultura familiar de onde so oriundas. A criana tem uma viso inicial do

    mundo no seio da famlia, onde inicia o seu processo de socializao atravs da

    aquisio de atitudes e valores indispensveis sua vida social futura.

    Segundo Marques (1992), quando os valores da escola coincidem com os valores da

    famlia, quando no existem rupturas culturais, a aprendizagem d-se com mais

    facilidade. Mas, hoje em dia, cada vez mais as escolas tm uma comunidade estudantil

    heterognea, onde os pais e professores apresentam razes culturais bem diversas. No

    ter em conta este factor, desconhecer os valores da famlia, pode significar no perceber

    uma criana em risco, levando-a ao insucesso.

    Na abordagem scio-institucional, o insucesso atribudo s relaes de classe.

    Neste contexto, surge a escola e mais especificamente o professor como o principal

    responsvel pela fraca aprendizagem das crianas na escola. Outras causas exteriores

    criana tm peso no insucesso, as quais tm a ver com a prpria famlia da criana e

    com a escola.

  • 27

    O insucesso escolar afinal um fenmeno relacional que envolve factores de

    natureza poltica, cultural, institucional, sociopedaggica e psicopedaggica,

    dependente das relaes que a escola estabelece com os alunos social e culturalmente

    diversos. Essas relaes vo desde a rede escolar, desigual no pas, aos critrios social e

    culturalmente dominantes na escola, das normas e dos comportamentos esperados e

    exigidos, at s prticas escolares e pedaggicas que nela se desenvolvem.

    Em jeito de concluso, e numa viso geral das trs teorias, pode-se dizer que

    inicialmente as origens do insucesso escolar residiam apenas no aluno. Pela ausncia de

    capacidades, ele no transitava, no era aprovado, tinha de repetir para tentar uma nova

    oportunidade, muitas vezes sem resultados positivos.

    Numa fase posterior, as causas de insucesso escolar centraram-se na origem scio-

    cultural dos alunos, no abrangendo, porm, as expectativas da escola. Para atenuar as

    diferentes origens scio-culturais, foram implementadas actividades com o intuito de

    minorar as lacunas que o aluno trazia logo entrada na escola

    Finalmente, a escola tambm posta em causa e investe-se na transformao da

    prpria escola, nas suas estruturas, contedos e prtica, procurando adapt-la, s

    necessidades dos diversos pblicos que a frequentam. (Benavente, 1989, citado em

    Ministrio da Educao, 1992, p.8).

    2.5. Factores de insucesso escolar

    O no acompanhamento pelo aluno das aprendizagens desencadeia alguma

    repugnncia e muitas vezes constrangimento para os pais, alunos, professores e at

    mesmo prpria instituio de ensino, e por conseguinte ao Estado. Onde estar a

    origem deste problema? difcil chegar a um consenso, pois os interesses e

    perspectivas dos envolvidos, directa ou indirectamente, so muito divergentes.

  • 28

    Na realidade existe um leque diversificado de factores responsveis pelo fraco

    desempenho escolar, e muitas vezes este insucesso socialmente inaceitvel, quer numa

    perspectiva individual quer colectiva.

    Antes de invocar os factores do insucesso escolar, considera-se oportuno aduzir,

    mesmo que de forma muito superficial, os indicadores do insucesso escolar, que podem

    ser internos ou externos.

    De entre os indicadores internos, o Ministrio da Educao (1992) aponta a

    repetncia, os resultados dos exames, a distribuio dos alunos por diversas vias de

    ensino, o atraso escolar, o absentismo, o abandono e o sentimento pessoal. Refere como

    indicadores externos a distribuio dos alunos pelos cursos ps-escolaridade

    obrigatria, dificuldades de insero na vida activa, desemprego dos jovens,

    analfabetismo e iletrismo e, por fim, a delinquncia e o abuso de drogas.

    Trs dessas manifestaes permitem averiguar a prpria eficcia do sistema

    educativo, sendo elas: o abandono escolar antes de terminar o ensino bsico; as

    reprovaes sucessivas que originam uma grande discrepncia entre a idade cronolgica

    do aluno e o nvel escolar, podendo os nveis de fracasso ser a todas ou quase todas as

    disciplinas, ou a nvel parcial numa ou duas disciplinas; e a escolha dos alunos por tipos

    de ensino menos exigentes, que o encaminham para aprendizagens profissionais

    imediatas, mas distanciando-o do ingresso no ensino superior.

    Sendo assim, pode dizer-se que o insucesso escolar pe em causa a vida escolar dos

    alunos e pode eventualmente alterar, at mesmo prejudicar, o desenvolvimento integral

    do aluno.

    De acordo com estudos realizados por vrios autores, entre eles Iturra (1990), Lurat

    (1978) e Pires, Fernandes e Formozinho (1991), as causas do insucesso escolar so

    mltiplas e por vezes contraditrias, mas quase todas se relacionam com factores

    ligados ao prprio aluno, ao nvel scio-econmico e cultural da sua famlia, escola

    enquanto instituio e aos elementos que nela trabalham, designadamente o professor.

  • 29

    Neste quadro, sero analisados em seguida tais factores de modo a permitir uma

    viso mais pormenorizada da questo.

    2.5.1. Aspectos relativos ao aluno

    Durante muito tempo a responsabilidade do sucesso/insucesso foi atribuda apenas

    ao aluno. Cada aluno tem as suas prprias caractersticas que, como Piaget referiu, tm

    influncia no ritmo da sua aprendizagem. O aluno muitas vezes alvo de determinadas

    carncias que influenciam negativamente o seu aproveitamento escolar. Vamos,

    seguidamente, abordar alguns factores que explicam a origem do insucesso no aluno.

    Para Avanzini (s.d.) existem vrios factores que podero conduzir a situaes de

    insucesso escolar. Entre o conjunto dos factores referidos por este autor, alguns

    atribuem a origem do insucesso ao prprio aluno. O aluno pode ter dificuldades por

    apresentar insuficincia intelectual, devendo-se esta insuficincia a causas de tipo

    neurolgico ou podendo ser uma consequncia de um meio de origem pouco

    estimulante do ponto de vista do desenvolvimento cognitivo, tendo assim a insuficincia

    intelectual um carcter social.

    Tambm Le Gall (1978) refere como origem do insucesso escolar do aluno o seu

    quociente intelectual. Nesta mesma linha de pensamento, Pires, Fernandes e

    Formozinho (1991, p.189) indicam a inexistncia de aptides do aluno, que podem

    ser de origem psicossomtica (alunos deficientes) como de origem intelectual

    (determinada atravs de quocientes de inteligncia). Peixoto (1999) aponta igualmente

    o nvel intelectual como um aspecto ligado ao insucesso escolar quando diz que

    medida que caminhamos do alto para o baixo nvel intelectual diminui a percentagem de

    sujeitos com zero reprovaes (p.138).

    A preguia outro dos factores apresentado por Avanzini (s.d.). Nesta ptica, este

    autor procurou encontrar motivos que permitissem compreender o porqu deste

    comportamento. Um dos motivos prende-se com a obrigatoriedade das tarefas escolares,

    que provavelmente, muitas delas, no fazem parte do leque de interesses do aluno. Por

  • 30

    outro lado, a lentido, ou mesmo recusa, na realizao das tarefas escolares poder ser

    uma forma de irritar o adulto, bem como ser um indcio de uma atitude de desinteresse

    pelo trabalho, podendo permanecer durante a idade adulta. Avanzini (s.d.) refere ainda

    que a preguia poder ser um efeito de situaes de insucesso escolar.

    A auto-estima outro aspecto considerado como um factor relacionado com o

    insucesso escolar. Segundo um estudo feito por Peixoto (1999, p.130), medida que

    caminhamos da alta para a baixa auto-estima diminui a percentagem de sujeitos com

    zero reprovaes.

    A diferena de atitudes e comportamentos dos alunos em contexto escolar, segundo

    Fontaine (1990), interfere, directa ou indirectamente, na realizao e satisfao

    escolares (p.95). A capacidade intelectual geralmente apresentada como o principal

    factor explicativo das diferenas de rendimento escolar dos alunos. No entanto, este

    factor no explica mais do que a quarta parte da variao dos resultados escolares,

    segundo a mesma autora. Assim, algumas razes que poderiam explicar essas diferenas

    de rendimento escolar estariam relacionadas com atitudes, tais como a falta de

    participao e interesse, ansiedade durante a avaliao, uma alimentao deficiente dos

    alunos e faltas de cuidados de sade, sobretudo no que diz respeito aos olhos, ouvidos e

    dentes; fraca frequncia escolar, deficincias congnitas e mentais e o prprio

    desinteresse e baixa auto-estima do aluno constituem tambm para Lurat (1978)

    factores a ter em conta no insucesso dos alunos a Matemtica.

    Ainda Pires, Fernandes e Formozinho (1991, p.189) sublinham os factores

    socioculturais como as principais causas das carncias do aluno que acede educao

    escolar numa situao de desvantagem, relacionando a causa do insucesso escolar com

    factores como a cultura informal da famlia e do meio ambiente, habitat do aluno

    (cidade/campo), nvel econmico da famlia (p.189).

    Le Gall (1978, p.15) atribui uma grande percentagem de insucessos escolares

    inadaptao da personalidade da criana s exigncias escolares, referindo que a

  • 31

    personalidade desempenha um papel de causa adjuvante e que as diferentes instituies

    de ensino no souberam adaptar-se aos condicionamentos sociopsicolgicos da

    populao escolar. Aponta, ainda, que esta adaptao deveria ser realizada pelo aluno e

    professor, indo cada um ao encontro do outro e a escola devia encaminhar tais aces de

    forma convergente.

    Destes factores, muitos deles exercem influncia mesmo antes do aluno iniciar a sua

    escolarizao e prolongam os seus efeitos ao longo de toda a sua escolaridade. Deste

    modo, h desde logo uma desigualdade de oportunidades, quer no acesso educao

    escolar quer no sucesso escolar do aluno.

    Outro aspecto a referir o perodo de gestao, em que o prprio estado psicolgico

    da me, ansiedades, depresses, etc., pode ter repercusses, por vezes graves, no

    sistema neurovegetativo, assim como alguns factores hereditrios podem estar na

    origem do insucesso escolar.

    O facto do aluno rejeitar o professor, no permitindo a criao de laos de amizade,

    pode influenciar a sua aprendizagem, assim como a estruturao morfopsicolgica e

    fsiolgica da criana, timidez, inibio, falta de autoconfiana, ser muito introvertida,

    ser em demasia preocupada com aspectos de vria ordem, levam desconcentrao,

    nervosismo, etc. Tambm deficincias a nvel dos sentidos, pouca memria visual e

    dislexia podem explicar dificuldades de aprendizagem.

    Pode afirmar-se que o insucesso escolar pode advir de tantas causas que se revelam,

    em muitos casos, interdependentes umas das outras, tornando-se numa miragem

    procurar definir uma causa simples e objectiva para justificar o insucesso escolar do

    aluno.

    2.5.2. Aspectos relativos ao sistema escolar

    Outros aspectos que podem estar na origem do insucesso escolar do aluno situam-se

    ao nvel da estrutura escolar.

  • 32

    Pires, Fernandes e Formozinho (1991, p.189) referem um conjunto de factores

    escolares que podem estar na origem do insucesso escolar, como tipo de cursos e

    currculos, estruturas e mtodos de avaliao, formas de agrupamento dos alunos,

    preparao cientfica e pedaggica dos professores.

    Martins (1991) tambm considera que o insucesso escolar pode ter origem no

    prprio Sistema Escolar. Este autor refere ainda que as causas socioculturais e culturais

    so as maiores responsveis pelo insucesso escolar massivo dos alunos provenientes

    das classes mais desfavorecidas (p.14). A explicao para a grande incidncia destas

    causas prende-se com o facto de a escola privilegiar os saberes acadmicos, no

    incluindo convenientemente nos planos de estudos saberes mais de acordo com a

    realidade de muitos alunos. Os saberes acadmicos obrigam ainda a uma abstraco que

    no est de acordo com os cdigos lingusticos e posturas das classes mais baixas ou

    marginais ao sistema de valores dominante (Martins, 1991, p.14). As dificuldades ou

    mesmo a incapacidade que os alunos tm em perceber as mensagens vo assim criar

    obstculos aprendizagem e conduzem ao insucesso dos alunos. De igual modo, a

    reprovao no parece apresentar vantagens para o aluno, pois que este ir desenvolver

    comportamentos especficos e desenvolver uma imagem que no propcia ao bom

    aproveitamento escolar.

    O insucesso escolar tem tambm sido atribudo, por pais e muitos professores,

    utilizao do mtodo tradicional. Segundo Avanzini (s.d.), este mtodo tradicional no

    toma em linha de conta a realidade especfica de cada criana. A iniciativa na

    organizao de todas as actividades, nomeadamente a nvel do programa e separao

    das disciplinas, assumida unicamente pelo professor. Assim, este mtodo encarado

    como factor explicativo para situaes de insucesso escolar por se basear unicamente

    em interesses extrnsecos aos alunos. Para contrariar esta situao, o professor deve

    utilizar metodologias variadas e inovadoras, as quais necessitam ser dinmicas, tornar

  • 33

    os contedos o mais reais possvel, a comunicao aliciante e acalorada, de modo a

    corresponder a todas as necessidades psicolgicas dos alunos.

    No que se refere ao programa, Jacinto (1991) defende que este privilegia os alunos

    dos meios mais favorecidos, pois os seus contedos vo ao encontro da sua cultura, da

    experincia do seu meio, colocando automaticamente em situao de desvantagem os

    restantes alunos. Partindo deste pressuposto, cabe perguntar: At que ponto a

    organizao e seleco dos programas no ser um factor de insucesso escolar?

    Muitas vezes os programas encontram-se desfasados da realidade onde so aplicados

    e revela-se importante ter em conta determinados aspectos na planificao dos

    programas. Concretamente, considerar a utilizao de objectivos nacionais, regionais

    ou, mais precisamente, peculiares escola ou classe pode ser um meio eficaz de

    melhorar o ensino ao centrar a ateno sobre certos domnios precisos e ao ligar ensino

    e avaliao (OCDE, 1992, p.213). Benavente (1990), numa entrevista que fez a um

    professor, destacou o facto deste se referir aos programas como todos iguais, tanto para

    filhos de engenheiros como de operrios (p.289) e que as crianas favorecidas esto j

    bem dispostas para a aprendizagem, tm outros meios, outro conforto, outras condies,

    (...) podem acertar mais facilmente as matrias que se trabalham na escola . Os

    programas e os manuais so, muitas vezes condicionadores das prticas desenvolvidas

    nas salas de aula, as planificaes so formais concebidas a partir do programa e das

    necessidades educativas dos alunos. Porm, os programas no podem ser rgidos mas

    adaptveis s constantes mudanas e necessidades.

    Os professores tambm se sentem inseguros na medida em que os programas so

    alterados com alguma frequncia e no so acompanhados de estruturas de apoio que os

    ajudem a ultrapassar dificuldades intrnsecas s mudanas (Benavente, 1990).

    No mesmo estudo j referido, Benavente verificou que 61% dos professores

    inquiridos sentiu dificuldades no domnio dos novos programas, nomeadamente em

    expresso plstica, msica, sade, etc. por no terem tido qualquer formao, a nvel

  • 34

    material, pela falta de meios inerentes concretizao dos programas e a nvel da gesto

    do prprio programa face diversidade dos alunos.

    Grande parte dos professores continuam a trabalhar isoladamente, ainda que no

    mesmo espao fsico, pelo que a interpretao dos programas parece estar ao critrio de

    cada um. Esta situao, em certos casos, poder levar ao insucesso motivado pela

    diversidade de gesto e exigncias dos professores. A estas dificuldades, juntam-se

    ainda o medo de no se cumprir o programa face sua extenso.

    Referindo-se ao professor, Avanzini (s.d.) defende que este dever ser para os

    alunos um modelo de identificao, tal como os pais. Deste modo, no acesso profisso

    docente a personalidade deveria ser tida em conta, tal como a preparao cientfico-

    pedaggica. Professores com uma personalidade indiferente, frustrada, severa ou

    inferiorizada no se revelam hbeis no estabelecimento de um bom relacionamento com

    os alunos. Mart e Guerra (dir.) (1997, p.21) mencionam que tem vital importncia as

    bases humanas que formam o perfil do bom professor. H qualidades como a

    maturidade pessoal [entre outras] que, sobretudo na juventude, constituem um elemento

    de referncia necessrio para um desenvolvimento equilibrado. Assim, o domnio

    relacional revela-se de considervel importncia para o sucesso escolar, pelo que as

    competncias relacionais e a estrutura de personalidade deveriam ser aspectos a tomar

    em considerao na prtica pedaggica e na seleco de professores. A este respeito,

    Sprinthall e Sprinthall (1993, p.21) afirmam que o ensino algo de intensamente

    pessoal. Como possvel pensar num professor separado dos seus alunos, como um

    estrangeiro no pas dos alunos? (...) O ensino um processo interpessoal. Tem de

    envolver o corao e a alma, e no apenas a mente. De acordo com a OCDE (1992,

    pp.214-215), quatro objectivos se impem para se ser um bom professor: atrair bons

    elementos; dar uma melhor formao aos novos docentes; tomar medidas para manter

    a competncia dos docentes em exerccio; de uma forma geral, procurar melhorar o seu

    moral e a sua motivao.

  • 35

    Gomes (1987) e Luart (1978) so unnimes em considerar que vulgarmente um

    professor no incio das aulas faz uma classificao das crianas em bons e maus alunos,

    e segundo estas expectativas que vai agir. De facto, ao rotular os alunos o professor,

    ainda que indirectamente, pode promover o insucesso. Esta atitude naturalmente

    indesejvel, pois deste modo estar a seleccionar os melhores (do seu ponto de vista) e

    no a educar igualmente todos os seus alunos.

    Ao professor compete compreender os alunos, conhecer as suas necessidades e

    exigncias, ser tolerante, mas ao mesmo tempo revelar uma postura de autoridade moral

    e dominar os conhecimentos cientficos. Igualmente importante criar com os alunos

    laos de amizade e simpatia de forma a poder ajud-los a transporem as dificuldades

    que vo surgindo e a evitar determinadas causas de insucesso, contribuir para o seu

    desenvolvimento e ajud-los a tornarem-se indivduos equilibrados.

    Tavares (1998, p.40) preconiza que a escola, cuja principal razo de ser preparar

    os jovens para que a sua entrada na vida adulta se faa com autonomia e autoconfiana

    pelas qualidades de iniciativa, responsabilidade e independncia, que dentro de um

    esprito de justia e de liberdade lhes deve incutir, tem que estar preparada para

    implementar essas mesmas qualidades na prossecuo de um desenvolvimento cultural

    total, dentro do esprito democrtico consignado na Constituio, visando o progresso

    scio-econmico, moral e cientfico da Nao.

    Porm, nem sempre a escola consegue preparar os alunos, sendo, muitas vezes,

    comprometida a sua funo pelo insucesso escolar, devido especialmente forma

    como est estruturada, (...) aos contedos curriculares (...), tipo de ensino e processos de

    avaliao (...), que se articulam com a origem social do aluno (Martins, 1991, p.13).

    Pires, Fernandes e Formozinho (1991, p.190) consideram que o insucesso escolar

    pode ser relacionado com a prpria estrutura social no seu conjunto, acrescentando

    que a escola um agente educativo determinado pela sociedade. Os mesmos autores,

    aprofundando nesta concepo, referem que a escola exerce uma tripla aco:

  • 36

    a) selecciona os alunos originrios dos estratos dominantes, garantindo-lhes o acesso aos nveis superiores da educao escolar e abrindo-lhes, no termo final da educao escolar, o acesso s ocupaes sociais prestigiadas e mais bem remuneradas;

    b) distribui atravs dos mecanismos de seleco e orientao escolares os restantes alunos originrios dos estratos subordinados para educaes escolares mais curtas e menos prestigiadas, ou afasta-os pura e simplesmente da educao escolarnormalmente aps a escolaridade obrigatria para ocupar os lugares subordinados que requerem mo-de-obra menos qualificada e mesmo no qualificada;

    c) finalmente, interioriza nos alunos a convico de que o seu fracasso escolar no deriva de mecanismos de seleco escolar e de reproduo social, mas de incapacidades naturais (p.190).

    Roazzi e Almeida caracterizam o insucesso escolar como sendo insucesso do

    sistema. Ainda a este respeito, afirmam que a disjuno entre a cultura das classes

    sociais mais desfavorecidas e a cultura escolar tem sido associada a dfices

    comportamentais, que no tem sido suficientemente valorizados pelos professores,

    escola e sistemas educativos. Os docentes valorizam o conhecimento do contexto social

    e familiar dos educandos, mas esse conhecimento no se manifesta numa alterao das

    prticas pedaggicas. Nesta ptica, Medeiros (1990) recomenda um melhor

    conhecimento da cultura de cada aluno de modo a permitir uma melhor

    operacionalizao da aprendizagem, o que poder ser traduzido num aumento do

    sucesso escolar pelo recurso cultura e aprendizagens extra-escolares. No que diz

    respeito aos critrios de avaliao, Medeiros (1990) defende uma flexibilizao dos

    critrios de modo a acatar as diferenas individuais dos alunos. Nesta continuidade de

    ideias, alega ainda que a reprovao nem sempre faz com que um aluno aprenda ou

    aumenta a sua motivao. Diferentemente, a reprovao poder contribuir para o

    abandono escolar e o aparecimento de sentimentos pessoais de incapacidade, baixa

    auto-estima e fracasso generalizado. A participao de todos os intervenientes na

    recolha e anlise da informao na avaliao, assim como o reforo do carcter

  • 37

    formativo da avaliao, so duas condies fundamentais para uma escola de maior

    sucesso.

    2.5.3. Aspectos relativos famlia

    O estrato social da famlia, a falta de estruturas sociais e escolares, o baixo nvel

    cultural e social do agregado familiar, ao no proporcionarem meios, estmulos,

    motivaes, condies de estudo e aprendizagem aos seus educandos, so obstculos ao

    normal funcionamento do processo de aprendizagem e esto na origem do insucesso

    escolar.

    Martins (1991) admite que a origem econmica e cultural das famlias dos alunos e

    o nvel escolar das mesmas constituem causas dominantes de insucesso escolar. Alm

    disso, menciona ainda que a origem econmica e cultural da famlia dos alunos se

    relaciona com aspectos como a distncia entre a casa e a escola e a zona de residncia.

    Em relao ao primeiro aspecto, forar os alunos a deslocaes longas ou cansativas

    reduz o tempo e a disposio para dedicao ao estudo em casa ou a actividades ldicas;

    em relao ao segundo aspecto, a residncia em zonas degradadas pode ter tambm

    consequncias negativas para o aproveitamento escolar.

    Decorrente do seu nvel scio-econmico, as diferentes classes sociais tm formas

    diferenciadas de satisfazer necessidades bsicas (alimentao, vesturio, habitao),

    bem como possibilidades distintas de acesso a bens de cultura. Por outro lado, o

    rendimento econmico familiar fraco pode conduzir ao abandono escolar devido

    necessidade de reduzir as despesas e aumentar o rendimento familiar atravs de um

    novo ordenado. Todos estes aspectos, na perspectiva de Martins (1991), desenvolvem

    nos alunos aspiraes e atitudes diferenciadas (p.14), que de certo modo influenciam,

    quer o nvel do desenvolvimento cognitivo, quer as opes escolares e profissionais e o

    prprio sucesso escolar. As classes mdia e mdia alta tendem a incutir expectativas

    mais elevadas aos seus filhos e a orient-los para profisses mais valorizadas, enquanto

  • 38

    que as classes mais baixas procuram objectivos mais imediatos em profisses pior

    remuneradas e menos prestigiadas socialmente.

    A perspectiva de Avanzini (s.d.) est de acordo com a de Martins (1991) ao afirmar

    a importncia do clima cultural familiar no aproveitamento escolar, o qual seria mais

    relevante que o prprio nvel econmico familiar. Nas famlias em que a cultura no

    valorizada, no esto criadas as melhores condies para um empenho dos alunos nas

    actividades escolares, pois os valores econmicos so percebidos como mais relevantes

    para a afirmao social. Porm, as famlias que valorizam a cultura criam melhores

    condies para um melhor empenho dos filhos nas actividades escolares,

    independentemente do estatuto econmico familiar. Contudo, considera-se importante

    salientar que quando existe um nvel econmico satisfatrio h mais facilidade no

    acesso a bens de cultura, o que poder influenciar positivamente o aproveitamento

    escolar.

    Avanzini (s.d.) refere-se igualmente ao meio scio-cultural nas situaes de

    insucesso escolar. Este factor exerceria influncia significativa por contribuir para as

    expectativas e aspiraes de futuro. Em pessoas com expectativas baixas quanto ao

    nvel scio-econmico associado sua profisso futura, o ensino torna-se pouco

    interessante, comparando-o com um ensino de carcter preparatrio para o exerccio de

    uma profisso. Deste modo, e devido predominncia das disciplinas de carcter

    terico, relativamente s de carcter prtico, compreensvel que sejam encontrados

    casos de desinteresse que podero originar situaes de insucesso escolar devido

    correspondncia entre a realidade escolar e as expectativas quanto ao futuro

    profissional. Pelo contrrio, alunos que pertenam a meios socioculturais mais

    favorecidos tero expectativas de futuro mais elevadas e encontram uma relao mais

    objectiva entre a realidade escolar e expectativas de futuro.

    O clima afectivo familiar constitui tambm para Avanzini (s.d.) um factor

    importante para um bom aproveitamento escolar. Em famlias que se verifiquem

  • 39

    situaes como desentendimentos conjugais, cimes, comportamento de agressividade

    dos pais relativamente aos filhos e comportamentos de infantilismo haver mais

    possibilidades de ocorrerem situaes de insucesso escolar. A este respeito, Muiz

    (1993, p.76) conta que

    quando o casal no funciona adequadamente, os interesses da criana so reabsorvidos pelos conflitos familiares, pelos receios deles derivados e, portanto, a capacidade de se interessar e de enfrentar problemas e dificuldades escolares fica diminuda e imbuda da problemtica familiar.

    O equilbrio familiar constitui uma condio necessria para uma boa adaptao

    escolar. Ainda na perspectiva de Avanzini (s.d.), uma famlia que tenha educado as suas

    crianas num clima de equilbrio afectivo t-las- preparado melhor e de um modo mais

    eficiente para enfrentar a realidades escolares e as outras realidades.

    2.6. Solues e medidas especficas contra o insucesso escolar

    Revela-se tarefa rdua e impossvel focar todas as medidas especficas de combate

    ao insucesso escolar, at seria demasiado pretensioso devido sua complexidade e aos

    nveis de abrangncia desta problemtica. Contudo, a sua preveno sem dvida uma

    tarefa urgente e, como tal, procuraremos neste espao mencionar algumas medidas de

    preveno do insucesso escolar .

    Comearemos por enunciar algumas estratgias de interveno preconizadas pelo

    Ministrio da Educao (1992) e algumas das linhas de interveno da Unio Europeia,

    citadas pelo Ministrio da Educao (s.d.).

    As estratgias e linhas de interveno desenvolvem-se a diversos nveis e esto

    relacionadas com as polticas estruturais, a escola, o professor, a famlia e o aluno.

    Passamos, seguidamente, a falar um pouco de cada medida.

    De acordo com o Ministrio da Educao (1992, p.13), no mbito das polticas

    estruturais, ambiciona-se:

  • 40

    Generalizar a pr-escolaridade, medida unanimemente considerada de importncia fundamental.

    . Adequar o ritmo escolar s necessidades das crianas e dos jovens, sublinhando a importncia da repartio equilibrada dos tempos de trabalho e de lazer no dia, na semana, no ano escolar.

    . Tornar o horrio flexvel, adaptando a organizao do ensino s caractersticas de vida da comunidade em que a escola se insere.

    . Reduzir as rupturas entre os vrios ciclos, quer desenvolvendo um tronco comum, quer considerando cada ciclo um todo, diminuindo a frequncia dos momentos de seleco. (...)

    . Facilitar as aprendizagens bsicas, como as da linguagem e as da matemtica.

    . Utilizar novos equipamentos e mtodos pedaggicos com recurso aos muitos canais de difuso de conhecimentos, para estimular as aprendizagens e desenvolver o potencial de cada aluno.

    . Recorrer a novos sistemas de avaliao adequados aos novos objectivos da educao. Preferncia marcada pelos sistemas que atendem prioritariamente aquisio de competncias, permitindo implicar o aluno na sua avaliao e respeitar o seu ritmo e estilo de aprendizagem.

    . Disponibilizar apoio ao jovem, no campo da orientao, tanto ao longo do percurso escolar, como na escolha profissional, quando se verifica a passagem para o mundo do trabalho.

    2.6.1. Escola

    No que concerne escola, de acordo com o estipulado pelo Ministrio da Educao

    (1992), procura-se:

    melhorar a articulao com o ambiente, permitindo instituio escolar uma

    mudana de acordo com o meio em que est inserida, pois a escola, para alm dos

    conhecimentos que transmite, amplia a socializao e a capacidade para interpretar o

    meio;

    aumentar a autonomia, o que favorece uma adaptao dos programas ao contexto

    especfico e diversidade dos seus alunos, permite um melhor aproveitamento dos

    recursos de que dispe e pode desenvolver iniciativas no sentido de envolver toda a

    comunidade educativa e social;

  • 41

    uma maior cooperao com a famlia em actividades escolares e para-escolares,

    pois no s a escola mas tambm a famlia so grandes pilares da educao das

    crianas. Ambos devem visar os mesmos objectivos e apoiar-se mutuamente, actuando

    de modo coordenado;

    melhorar a vida escolar, enaltecendo o desempenho dos professores no sucesso

    escolar, oferecer um acolhimento adequado no incio do ano escolar e estabelecer um

    mediador que auxilie o aluno na sua relao com a escola.

    2.6.2. Professor

    Relativamente ao professor, este desempenha uma funo crucial na reduo do

    insucesso. Segundo o Ministrio da Educao (1992), a teoria segundo a qual cabe ao

    professor um papel fundamental no combate ao insucesso do aluno defendida por

    todos os Estados-Membros da Unio Europeia. Estes reconhecem que o xito e a

    eficcia das medidas a serem postas em prtica dependem, em grande parte, da

    capacidade de envolvimento do professor. Da, a importncia que assume a sua

    formao, quer inicial quer contnua, para uma permanente adaptao das suas

    competncias tcnico-cientficas em constante mudana.

    De facto, como pressuposto bsico relativo s funes e responsabilidades

    profissionais do educador, importa salientar a sua formao permanente com seminrios

    e cursos de especializao, que lhe permitem exercer correctamente a sua tarefa dentro

    da comunidade educativa (Mart e Guerra (dir.), 1997, p. 21).

    O Ministrio da Educao (s.d.) refere ainda que, em Portugal, o Programa de

    Educao para Todos (PEPT), criado em 16 de Maio de 1991,

    lanou um projecto de Centro de Recursos para a Escolarizao Ano 2000, que visa nomeadamente animar uma unidade de informao e formao contnua de professores e de outros agentes, numa perspectiva de preveno do abandono escolar, com vista criao de uma cultura de escolarizao prolongada (p. 92).

    Atendendo a que o professor muitas vezes o suporte scio-afectivo de grande parte

    da vivncia diria de uma criana, em processo de desenvolvimento, considera-se

  • 42

    tambm urgente que se tomem medidas na sua formao terica e prtica,

    nomeadamente ao nvel da educao em geral, da pediatria e da psicologia do

    desenvolvimento e da aprendizagem. Assim, o docente deve usufruir de uma autonomia

    e incumbe-lhe saber utiliz-la de forma adequada ao processo de ensino-aprendizagem

    dos seus alunos.

    A complexidade crescente que caracteriza a misso do professor, sobretudo no

    quadro do combate ao insucesso escolar, s poder ser verdadeiramente assumida por

    este se, para o efeito, puder contar com o apoio e a colaborao dos restantes parceiros

    da comunidade educativa. nesta perspectiva que se enquadra o trabalho cooperativo

    entre professores de uma mesma escola e pela cooperao estreita entre os docentes de

    estabelecimentos de diferentes nveis escolares. Esta cooperao tem vindo a ser

    desenvolvida por alguns sistemas educativos; cooperao reconhecida como eficaz, mas

    que encontra ainda resistncias por parte de alguns professores (Ministrio da

    Educao, s.d.).

    2.6.3. Famlia

    Em relao famlia, h acordo de que esta desempenha um importante papel no

    processo educativo, e por conseguinte no combate ao insucesso escolar.

    O Ministrio da Educao (s.d.) considera que a interveno da famlia no processo

    educativo, e mais especificamente na luta contra o insucesso escolar, em larga escala

    reconhecida, pelo menos teoricamente, na maioria dos Estados-Membros da Unio

    Europeia. Neste sentido, o empenho da famlia torna-se muito desejvel uma vez que se

    reconhece que os factores/causas do insucesso dos alunos em geral, e mais

    especificamente em Matemtica, residem para muitas crianas, no no contexto escolar,

    mas no seio da prpria famlia.

    Nesta ptica, aponta-se para a participao dos pais na gesto da escola, participao

    essa assegurada principalmente atravs do Conselho de Turma. Porm, raramente

    encontramos as famlias associadas a trabalho de fundo capaz de afectar o projecto de

  • 43

    escola. Poderemos mesmo adiantar que o nvel da sua participao depender do grau

    de autonomia de que as escolas gozam (Ministrio da Educao, s.d., p. 87).

    No entanto, cada vez mais a famlia convidada a envolver-se no processo

    educativo dos filhos, quer a nvel de actividades escolares ou mesmo para-escolares.

    Actualmente, j existem inmeras iniciativas de preveno do insucesso dos alunos

    a Matemtica no 2 ciclo, nomeadamente projectos-piloto dirigidos aos jovens com

    dificuldades, visando concretamente o reforo da participao dos pais no processo

    Educativo dos seus filhos (Ministrio da Educao, s.d., p. 88). Por exemplo, o

    projecto Northamptoushire, na Gr-Bretanha, introduziu novas metodologias tendentes

    a encorajar as famlias a participar mais activamente em determinadas actividades

    escolares.

    Segundo Medeiros (1990), uma das medidas a ser tomada prende-se

    fundamentalmente com o ciclo de desenvolvimento da criana pela interveno das

    interaces familiares, isto num registo complexo que toca a gravidez, a relaes

    precoces at constituio de grupos de pais (p.304).

    Em resumo, tm-se feito esforos para apoiar a famlia, integr-la nos rgos de

    gesto e envolv-las nas actividades escolares, porque o conhecimento do modo como

    se desenvolvem as aprendizagens na classe, auxlio no desenvolvimento do gosto das

    crianas pela leitura, utilizao de bibliotecas para pais, cooperao na procura de

    solues para as dificuldades dos filhos (Ministrio da Educao, 1992, p. 15) pode ser

    essencial na aco contra o insucesso.

    2.6.4. Aluno

    Em relao ao aluno, Fonseca (1999, p.532) diz que para superar o insucesso

    necessrio comear por algo que a criana possa aprender e no aguardar que,

    milagrosamente, a criana aprenda sem possuir pr-aptides e pr-requisitos, donde os

    alunos devem ter experincias pedaggicas muito gratificantes e que se adaptem a ele.

  • 44

    De facto, muitas so as pedagogias que podem favorecer o desenvolvimento pessoal

    e o interesse pela frequncia escolar. A este respeito, o Ministrio da Educao (1992,

    p. 15-16) aponta algumas delas:

    a pedagogia por grupos de nvel visando a adaptao s caractersticas individuais e permitindo um diagnstico preciso das dificuldades de cada um;

    a pedagogia diferenciada que se fundamenta no princpio de que no h via nica para o conhecimento; paralelamente, pela avaliao formativa, o aluno guiado na sua formao pela ajuda identificao das suas finalidades e procura do modo de as resolver;

    a pedagogia de projecto, j que aprendizagem implica aco. O projecto, levado a cabo por um grupo de alunos e animadores, supe esprito de cooperao e abordagem interdisciplinar dos objectivos, desenvolve uma pedagogia activa fundada numa relao constante entre a prtica e a teoria e acentua a criatividade e a expresso livre dos alunos.

    Ainda o Ministrio da Educao (1992, p.16) refere que a maior parte dos Estados-

    Membros

    dispe de um dispositivo de despiste de dificuldades, como exames mdicos, psicolgicos, cognitivos, permitindo a utilizao de dispositivos de apoio adequados: tipo de ensino, ritmo adequado, orientao, actividades de recuperao. Destaca os dispositivos de educao global, pois atribui ao aluno em dificuldade uma maior responsabilizao no mbito de projectos ligando estreitamente a escola, a famlia e o meio.

    Outro aspecto focado pelo Ministrio da Educao (1992, p.16) para recuperao

    dos alunos com insucesso o recurso colaborao das empresas procurando por

    iniciativa, quer central, quer local, a formao que facilite aos jovens a insero

    profissional ou mesmo, numa perspectiva mais ambiciosa, que visando a sua educao

    integral os habilite a uma autntica insero social.

    Deste modo impossvel separar a conquista de caminhos de luta contra o insucesso

    escolar da prtica educativa. As tentativas de combate ao insucesso acarretam

    necessariamente a construo de uma melhor escola e melhorar a formao dos alunos

    em dificuldade significa afinal melhorar o conjunto das tcnicas pedaggicas e a

    qualidade do ensino. (Reunio de Altos Funcionrios da Educao sobre o Insucesso e

  • 45

    o abandono Escolar nos Sistemas Educativos nota para debate preparada a pedido da

    Presidncia. Citado em Ministrio da Educao, 1992, p. 16).

    De uma forma geral, procura-se juntar diversos esforos a nvel da Comunidade

    tendo em vista a troca de informaes, o apoio ao desenvolvimento de projectos e

    estudos que ajudem a descortinar e a compreender o problema do insucesso, a utilizao

    dos programas existentes para debate do problema e, por fim, estabelecer laos entre

    diferentes organizaes internacionais.

    Tambm foram acordadas algumas linhas de fora para o desenvolvimento de

    estratgias visando o sucesso educativo em cada um dos Estados-Membros, entre estas

    realam-se as trs ltimas linhas apontadas:

    A oferta de educao deve ser flexvel e diversificada, para permitir a cada estudante encontrar um caminho adequado aos seus talentos e objectivos. (...)

    O potencial das novas tecnologias e os instrumentos para educao distncia devem ser explorados no sentido de se enriquecerem os contedos da educao.

    Devem ser desenvolvidos sistemas de informao e de avaliao para aprofundar o conhecimento destes problemas, para ajudar cada estudante a fazer as suas opes e para possibilitar administrao o controlo do insucesso e do abandono. (Ministrio da Educao, 1992, p. 18).

    Numa outra viso, e olhando a escola no mago do insucesso, surgem-nos os alunos

    em que os seus interesses e resultados so profundamente influenciados pelo clima ou

    esprito particular de cada escola. Assim e numa linha de procurar solues, a OCDE

    (1992, pp.218-219) aponta dez caractersticas, consideradas de carcter fundamental

    para atingir bons resultados escolares:

    I) o desejo de alcanar normas e finalidades definidas claramente e de comum acordo;

    II) uma planificao em colaborao, uma comum tomada de decises e um trabalho colegial empreendido num esprito de experimentao e de avaliao;

    III) uma direco dinmica para o pr em prtica e a manuteno do melhoramento;

    IV) a estabilidade do pessoal;

  • 46

    V) uma estratgia de formao permanente e de aperfeioamento do pessoal que corresponda s exigncias de cada escola no plano da pedagogia e da organizao;

    VI) a aplicao de um programa de estudos meticulosamente elaborado e coordenado que permita a cada aluno adquirir os conhecimentos tericos e prticos essenciais;

    VII) um alto nvel de participao e de apoio da parte dos pais;

    VIII) o reconhecimento dos valores peculiares do estabelecimento e a adeso a estes valores mais do que aos valores individuais;

    IX) uma explorao mxima do tempo escolar;

    X) o apoio dinmico e slido da autoridade escolar competente.

    Outras medidas urgentes a tomar no mbito da preveno do insucesso dos alunos

    so tambm referidas por Medeiros (1990):

    Intensificar a aco mdica escolar;

    Intensificar a aco social escolar;

    Fornecer uma rede de escolas adequadas s necessidades psicopedaggicas nas crianas, sem descurar a componente esttica;

    Fornecer materiais pedaggicos e de suporte s escolas ou um fundo de maneio compatvel;

    Promover a figura do psiclogo na escola que, funcionando como uma antena e em conjunto com o professor, possa identificar grupos de alto risco e proceder ao seu encaminhamento para as estruturas de apoio, como os Centros de Apoio Mdico-Psicopedaggicos;

    Promover a figura do pedagogo que, em conjunto com o professor e o psiclogo, poder delinear programas de interveno ao nvel pedaggico para os grupos de baixo risco de insucesso escolar.

    luz da Lei de Bases do Sistema Educativo, as medidas a implementar para

    promover o sucesso escolar e educativo na escolaridade obrigatria so:

    a) actividades de acompanhamento e complemento pedaggicos;

    b) servios de psicologia e orientao escolar e profissional;

    c) aco social escolar;

    d) servios especializados dos centros comunitrios de sade. (Artigos 24 a 28)

    Na realidade, as medidas tomadas para minorar o insucesso so inmeras e todas

    colocam a escola, professores, famlia e alunos em paridade como meio de ultrapassar

  • 47

    esta situao. Porm, as medidas s sero eficazes se os valores da escola coincidirem

    com os valores da famlia e, por conseguinte, do aluno, pois s assim a aprendizagem se

    desenvolver com mais facilidade e sucesso.

    2.7. O insucesso escolar em Matemtica

    Includo na temtica do insucesso, o insucesso na disciplina de Matemtica reveste-

    se de uma importncia particular, pois a Matemtica uma disciplina-chave no sistema

    de ensino (Oliveira, 1996, p.18). Se nos reportarmos aos pressupostos da Lei de Bases

    do Sistema Educativo Portugus de 14 de Outubro de 1986, deparamos com os

    princpios orientadores da reforma educativa, em que est implcita a ideia de que a

    Matemtica e o Portugus so reas fulcrais na formao global do aluno e,

    consequentemente, na do cidado. Por conseguinte, e porque a Matemtica sem

    dvida essencial ao desenvolvimento de quase todos os sectores, seno de todos, se os

    cidados no aprenderem Matemtica e no desenvolverem a sua inteligncia

    certamente os pases tero muitas dificuldades em competir e absorver as contnuas

    revolues tecnolgicas.

    Embora no sendo exclusivo da disciplina de Matemtica, o insucesso escolar

    tornou-se uma preocupao para o sistema educativo portugus, o qual no deu ainda

    respostas concretas e eficazes para solucionar este problema. Em conformidade com o

    que ouvimos com frequncia de geraes anteriores, o insucesso em Matemtica j

    existe desde h muito tempo, embora s a partir da dcada de 50 se comece a sentir as

    suas primeiras grandes manifestaes e actualmente reveste-se de uma preocupao

    constante, tanto para os professores como para os pais. Frequentemente, encontramos

    pessoas, mais ou menos jovens, que manifestam uma atitude claramente negativa

    perante a matemtica, provavelmente relacionada com experincias escolares negativas,

    com uma frustrante incapacidade para as actividades matemticas mais elementares do

  • 48

    dia-a-dia ou associadas a actividades profissionais. Nas nossas escolas acontece o

    mesmo, de tal modo que professores e pais j esto habituados a atitudes passivas e

    desinteressadas acerca desta disciplina.

    Segundo Ponte (2003, p.1), o insucesso na disciplina de Matemtica

    uma realidade incontornvel. Reconhece-se no s pelos maus resultados dos alunos em testes e exames, mas muito especialmente pela sua generalizada dificuldade na resoluo de problemas, no raciocnio matemtico, s vezes nas tarefas mais simples e, sobretudo, no seu desinteresse crescente em relao Matemtica. O insucesso no s existe como tende a agravar-se.

    Oliveira (1996, p.17) afirma que o que contribui para as dificuldades escolares dos

    alunos na disciplina de Matemtica

    a generalizao a um largo nmero de alunos e o seu carcter de maior ou menor irreversibilidade com o avanar na escolaridade. As bases insuficientes dos alunos e o seu auto-conceito na aprendizagem e na realizao desta disciplina podem associar-se a tais dificuldades. Tambm as dificuldades dos professores na materializao dos contedos matemticos ou no partir de situaes quotidianas dos alunos para a leccionao desta disciplina tm tambm a sua quota parte de responsabilidade em tal insucesso.

    Tambm acrescenta que, para alm dos alunos e professores, o sistema educativo d

    a sua contribuio ao permitir que os alunos transitem anualmente sem aproveitamento

    numa dada disciplina, sendo-lhes progressivamente exigidos conhecimentos

    curriculares dos anos transactos que se sabe no possurem. Tratando-se do caso da

    Matemtica, o Sistema , claramente, (re)produtor destas dificuldades (id. 1996,

    p.17).

    Foi publicado um artigo no Pblico (14.04.2001), onde se afirma que um tero (32

    por cento) dos alunos do 9 ano passam com negativa a Matemtica, o que nos leva a

    questionar de onde advm esta falta de xito dos alunos em Matemtica.

    O estudo internacional PISA (Project for Internacional Student Assessment) revelou

    resultados preocupantes dos alunos portugueses em literacia de leitura, matemtica e

    cincias:

    Os alunos portugueses de 15 anos tm um desempenho modesto em literacia de leitura, matemtica e cincias, comparativamente com os seus pares da OCDE,

  • 49

    revela o estudo internacional PISA (Programme for International Student Assessment) ( Fernandes e Rocha, 2001, p.51).

    Do total de 265 mil participantes, em Portugal estiveram envolvidos 4604

    estudantes, frequentando desde o 5. ao 11. anos de escolaridade, e pertencentes a 149

    escolas seleccionadas.

    Relativamente aos resultados obtidos pelos alunos de 15 anos, em literacia de

    leitura, matemtica e cincias, verificou-se que:

    Os piores resultados so apresentados pelos alunos que, aos 15 anos, frequentam nveis de escolaridade entre o 5. e o 9. ano. Daqui se pode inferir que, ficar para trs um ou mais anos, no percurso escolar, pode condenar ao insucesso. (Alves, 2001, p. 4);

    Os jovens portugueses com maiores nveis de literacia em leitura, cincias ou matemtica so, em mdia, piores do que os colegas com melhor desempenho nos restantes pases;

    H grandes diferenas regionais: os jovens de Lisboa e Vale do Tejo obtiveram resultados mdios superiores aos do espao da OCDE; os jovens das ilhas, Alentejo e Algarve apresentam os resultados mais fracos. O GAVE (Gabinete de Avaliao Educacional) do Ministrio da Educao reconhece que so situaes problemticas para as quais urge encontrar solues. (Alves, 2001, p. 4);

    As notas que os professores de Portugus deram aos alunos testados no mbito do PISA tm pouco a ver com os resultados que estes vieram a obter nos testes de literacia, concluindo o GAVE que o que apreciado na avaliao que se faz nas nossas escolas tem pouco a ver com as competncias implicadas. (Alves, 2001, p. 4);

    Em Portugal, as diferenas entre as escolas esto dentro da mdia. Contudo, h disparidades significativas dentro do mesmo estabelecimento, o que leva a crer que, nas salas de aula, convivem alunos muito bons com alunos muito fracos.

    Os resultados obtidos na primeira fase deste estudo colocam os nossos alunos numa

    posio bastante modesta, alcanando uma mdia de 454, bastante abaixo da mdia

    alcanada pelos alunos japoneses (557) e inferior mdia da OCDE (500). Se olharmos

    para a mdia obtida pelos alunos, o decrscimo acentua-se medida que o nvel de

    escolaridade baixa (Fernandes e Rocha, 2001).

  • 50

    Assim, e mais do que na leitura, na literacia matemtica e na literacia cientfica

    que os alunos portugueses de 15 anos mais perdem em comparao com os seus

    parceiros da OCDE.

    Perante tais circunstncias, revela-se urgente tomar medidas de combate ao

    insucesso escolar em Matemtica. Neste sentido, Ponte (2003, pp.4-5) nomeia algumas

    solues para o combate ao insucesso escolar em Matemtica, afirmando que

    necessrio:

    A criao duma imagem diferente da Matemtica, como actividade humana multifacetada, susceptvel de proporcionar experincias desafiantes a todas as pessoas;

    A divulgao duma viso mais ampla do que so os processos de pensamento e as competncias prprias da Matemtica;

    A formao dos professores, virada no apenas para a actualizao cientfica e pedaggica geral, mas sobretudo para uma nova viso da Matemtica e das formas de trabalho que favorecem a sua apropriao pelos alunos;

    A reformulao dos currculos, com uma efectiva valorizao da componente metodolgica e, no ensino secundrio, uma adequada diferenciao entre os programas de alunos de diversas reas;

    O enriquecimento das prticas pedaggicas, valorizando-se o trabalho de grupo, a realizao de projectos, as actividades exploratrias e de investigao, a resoluo de problemas, a discusso e a reflexo crtica;

    A diversificao das formas e instrumentos de avaliao, quer formativa quer sumativa;

    A alterao do sistema de acesso ao ensino superior, diversificando-se os indicadores de seleco.

    Uma outra medida a ser tomada, por forma a diminuir o insucesso dos alunos a

    Matemtica, prende-se com a estruturao do ensino. De facto, o papel do professor no

    combate ao insucesso dos alunos nesta disciplina, s poder ser verdadeiramente

    assumido por este se tiver um determinado grau de autonomia para poder conceber

    percursos escolares mais individualizados e utilizar metodologias de ensino e de

  • 51

    avaliao mais adequados heterogeneidade da turma (Ministrio da Educao, s.d., p.

    93).

    Neste sentido, considera-se tambm importante citar as estratgias como uma

    medida a ter em linha de conta na problemtica do insucesso dos alunos na disciplina de

    Matemtica. , pois, neste contexto que o Ministrio da Educao (s.d., p.94) se refere a

    uma multiplicidade de estratgias de preveno ou de remediao das dificuldades de

    aprendizagem do aluno: estratgias de despistagem precoce de dificuldades logo a

    partir das primeiras aprendizagens; estratgias especificamente concebidas para

    estimular o desenvolvimento pessoal e escolar do aluno, que incluem os grupos de

    nvel, o ensino diferenciado, a pedagogia da mestria, a pedagogia do projecto, a

    pedagogia expressiva e criativa, etc.; metodologias que todas elas, implicam

    obrigatoriamente prticas de avaliao mais ajustadas ao ritmo de progresso prpria de

    cada aluno.

    Assentando nesta ideia, Oliveira (1996, p.195) diz que os professores devem

    munir-se de estratgias de interveno para ajudar os alunos a desenvolver padres

    atribucionais o mais adequados possvel no seu confronto com as situaes de insucesso

    na disciplina de Matemtica. necessrio um esforo por parte dos professores no

    sentido de actuarem sobre as convices dos alunos de modo a impedir que eles entrem

    em desnimo e consolidem ideias de incapacidade face matemtica, estimulando neles

    o desenvolvimento de confiana nas suas capacidades e eficcia, contribuindo, deste

    modo, para a promoo do sucesso na disciplina de Matemtica.

    Tudo isto requer por parte do professor esforo e empenho para que as suas prticas

    lectivas sejam produtivas e propcias a um ensino de sucesso. Neste sentido, Jesus

    (1998, p.112) refere que um nvel de dedicao ou de motivao equilibrada, crenas e

    expectativas realistas, atitudes positivas face s situaes profissionais e formas de

    actuao adequadas constituem uma base fundamental para o sucesso e realizao

    profissional do professor.

  • 52

    Prosseguindo na mesma ptica, o professor ter de implementar a sua prtica

    pedaggica direccionando-a para os actuais interesses dos alunos, porque para um aluno

    gostar de matemtica necessrio sentir desejo em saber, mais do que executar umas

    simples operaes, pois

    tambm Pascal estudou a geometria de Euclides muito precocemente e com paixo. Esta experincia afectiva determinante. No se pode gostar de matemtica se no se tiver, num momento ou noutro, sentido entusiasmo pela leitura de um livro de matemtica ou por uma descoberta matemtica, mesmo que limitada. Este entusiasmo decorre do contexto no qual este acto realizado. Essencialmente, necessrio que seja desejado, quer por si prprio, quer por razes exteriores (Lobrot, 1992, p.47),

    podendo estas ltimas ser despertadas pelo professor.

    O insucesso escolar no s uma falha do aluno, muitas vezes causado pelo

    professor, isto , em inmeras situaes o professor no se apercebe das lacunas dos

    alunos, dos seus problemas iminentes e no planifica nem sistematiza com

    individualizao. Assim e de acordo com investigaes realizadas neste domnio,

    citadas por Fonseca (1999, p.514), chegou-se s seguintes concluses:

    Os professores que obtm melhores resultados so os que proporcionam s crianas um ensino individualizado e adequado s suas necessidades;

    Os resultados escolares tendem a melhorar se os mtodos no forem expositivos mas participando ao nvel de interaces: professor-grande grupo; professor-pequeno grupo; criana-professor; criana-pequeno grupo; criana-grande grupo;

    A criana tende a melhorar as suas funes receptivas auditivas, visuais e quinestsicas se se utilizar processos hierarquizados, sistemticos e intensivos de aprendizagem;

    O professor no deve utilizar apenas a palavra como media, deve fazer recursos a projectores, gravadores, jogos, fichas de trabalho e dever igualmente adoptar vrias estratgias educacionais: quebra-cabeas, materiais de composio e de construo, explorao de materiais de aprendizagem, cartes e fichas coloridas, quadros magnticos, lotos e domins simblicos, blocos lgicos e discriminativos, etc...

    Fortificando a convico de que o aluno tem de lidar com a matemtica utilizando as

    suas prprias capacidades e o professor deve oferecer possibilidades diversas

    utilizao do raciocnio, Hole (1977, p.12) sublinha que

  • 53

    cada aluno deve aprender a pensar, com independncia, sobre a matemtica. Um ensino desta disciplina, exclusivamente dirigido transmisso de factos e, quando muito, sua deduo, s com dificuldade poder exercer a essencialidade da sua funo: a preparao de situaes de aprendizagem, na qual se possam originar formas independentes e transferveis de raciocnio.

    O autor termina, considerando que este o caminho mais indicado para a eficcia, na

    conquista dum slido saber matemtico.

    Outro factor a acrescentar o reforo positivo, pois o insucesso deve ser

    equacionado em termos construtivos e no em termos humilhantes.

    Em sntese, o professor deve utilizar metodologias diversas e inovadoras, as quais

    necessitam ser dinmicas, os contedos torn-los o mais reais possvel, a comunicao

    aliciante e acalorada correspondendo a todas as necessidades psicolgicas dos alunos. O

    docente deve, tambm, procurar compreender os alunos, as suas necessidades e

    exigncias.

    Parafraseando Werneck: diante de voc h uma tela em branco apoiada num

    cavalete. Ela a sua vida profissional. A paisagem voc j escolheu a sua profisso.

    Agora cabe a voc dar o colorido que quiser e a iluminao que desejar (1996; citado

    em Jesus, 1998, p. 111). Consequentemente, em termos de ensino, cabe ao professor

    fazer brilhar as suas prticas lectivas.

    2.7.1. Actividades extra sala de aula de Matemtica

    Dentro das actividades extra sala de aula de Matemtica vamos referir-nos aos

    clubes de matemtica e laboratrios de matemtica, pois so espaos onde se podem

    desenvolver actividades que desabrochem nos alunos o gosto pela matemtica.

    Os clubes de matemtica tm, segundo Duarte e Gonalves (1996, p. 65) o

    objectivo de desenvolver as capacidades dos alunos ao nvel do clculo mental e das

    operaes lgicas. Outros objectivos pretendidos com os clubes so desenvolver, no

    aluno, o gosto pela matemtica, utilizar diversos materiais manipulveis e informticos

    visando um ambiente de aprendizagem estimulante. Considerando as lacunas dos nossos

    alunos e as imensas dificuldades que estes apresentam na aprendizagem da disciplina de

  • 54

    Matemtica, os clubes podem ser uma porta aberta para uma matemtica mais ldica,

    com jogos, mais real e aplicvel, alterando a viso enraizada, nos alunos, de uma

    disciplina inatingvel. Como refere Duarte e Gonalves (1996, p. 77), se a matemtica

    nas aulas tem de cumprir o programa, nos Clubes pode ser ldica, pode ser um jogo, ou

    pode ser aplicada na construo de modelos escala.

    Os clubes podem contribuir para transparecer a importncia da matemtica na vida

    real, desde a actividade mais bsica de ir s compras, fsica, construo civil,

    mecnica, etc., despertando nos alunos o interesse por saber matemtica.

    Tambm, neste espao, seria muito aliciante os alunos poderem inventar jogos,

    problemas e situaes que envolvam a matemtica e concretizar tais situaes.

    No entanto, de salientar que um grande contributo para o clube de matemtica a

    utilizao da informtica, pois est no primeiro nvel dos interesses dos alunos e sem

    dvida uma ferramenta fundamental para o futuro, visto a informtica estar presente em

    muitas das actividades profissionais. Tambm, com o computador, podem realizar

    exerccios e jogos em CD-ROM, podem investigar na Internet aspectos relacionados

    com a histria da matemtica, etc. Programas de computador podem tambm constituir

    uma ajuda a nvel de processamento de texto, do estudo da estatstica, da construo de

    representaes grficas, etc.

    Outra inovao fulcral nas nossas escolas, para o sucesso em Matemtica, seria a

    criao do laboratrio de matemtica. O seu objectivo criar condies, na escola, para

    o ensino-aprendizagem da Matemtica; desenvolver, no discente, o gosto pela

    matemtica; constituir um espao prprio da disciplina onde o professor pudesse levar

    os seus alunos para estes poderem investigar, usufruir dos diversos materiais,

    equipamentos, computadores, calculadoras, etc., apresentar ao aluno actividades

    experimentais diversificadas. Assim este espao proporcionaria ao aluno uma

    aprendizagem mais activa, significativa e til, despertando o seu interesse e incutindo

    novas concepes sobre a matemtica. De acordo com Dias, Coelho, Raposo e Saraiva

  • 55

    (1998, pp.125-126) os laboratrios de matemtica so vistos como um espao

    facilitador da experimentao e da descoberta,..., e ao qual est associado, para alm de

    uma sala prpria, todo um conjunto diversificado de equipamentos, nomeadamente as

    calculadoras e as TIC (Tecnologias de Informao e Comunicao).

    Outro elemento a acrescentar seria a possibilidade de esta sala ter um horrio dirio

    na escola, e sempre com um ou dois professores de Matemtica para permitirem aos

    alunos um complemento de aprendizagem, para continuarem o trabalho iniciado na aula

    de Matemtica, ou ainda para colmatarem dvidas relativamente a determinado assunto

    de Matemtica, ou mesmo para os apoiarem na utilizao dos programas de

    computador. Aqui a informtica imprescindvel, pois

    muitos programas computacionais dinmicos permitem a experimentao e facilitam a descoberta. Caractersticas como as possibilidades de repetio e de observao de invarincias nos objectos matemticos criados e em jogo, para alm da grande capacidade grfica, so teis para o sucesso da actividade matemtica dos alunos (Dias, Coelho, Raposo e Saraiva.1998, p.126).

    Seguindo a ideia apresentada por Dias, Coelho, Raposo e Saraiva (1998, p.126), o

    que est em causa toda uma actividade matemtica dos alunos (...), qual est

    subordinado todo um conjunto de opes tcnicas, e no o contrrio, ou seja, sujeit-la

    existncia destas. Os mesmos autores acrescentam que a sala de aula de Matemtica

    tambm pode funcionar como laboratrio de matemtica e, to bem quanto este, apenas

    necessrio o professor desejar e empenhar-se, propondo aos seus alunos tarefas que

    os motivem e lhes permitam uma experimentao matemtica com sucesso (p. 126).

    Perante este quadro rico de como se pode trabalhar a matemtica, tanto nos clubes

    como os laboratrios de matemtica podem desempenhar um papel preponderante no

    combate ao insuce