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1. CAPÍTULO 6
HIDROQUÍMICA
6.1 Introdução
Os fenómenos físicos de diluição, dispersão e sedimentação, conjugados com
fenómenos biogeoquímicos, que envolvem reacções de oxidação-redução, associadas ou não
com processos de precipitação, coprecipitação e adsorção, constituem reguladores
importantes da fracção metálica dissolvida. A presença de microorganismos, bactérias
aeróbicas e aneróbicas, desempenham também um papel muito relevante como reguladores
da passagem, permanência e remoção de certos metais em solução (Santos Oliveira et al.,
2000).
A actividade mineira reflecte-se na composição química das águas de dois modos
distintos:
• pela introdução de macro-elementos ausentes no ambiente geológico, os quais
provocam alterações mais ou menos pronunciadas na estrutura iónica dos sistemas
aquosos;
• pela inserção de uma carga metálica anómala, susceptível de tornar a água
imprópria para determinados fins.
Antes de tentar aplicar acções minimizadoras e/ou remediadoras das descargas
problemáticas, é necessário caracterizá-las, adequadamente, ao longo de um período de
tempo suficientemente longo e definir quais os locais prioritários de intervenção. Assim, o
potencial sucesso de uma acção correctiva será optimizado. A realização desta tarefa
consiste na identificação, caracterização e quantificação das principais fontes de
contaminação de um couto mineiro de modo a que as ferramentas de decisão possam ser
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aplicadas e os meios de remediação mais apropriados sejam empregues (Younger e
Wolkersdorfer, 2004). Um trabalho de campo cuidadoso e análises químicas de laboratório
associados ao entendimento dos processos possíveis são necessários à obtenção de
conclusões para cada situação em particular.
6.2 Recolha de amostras de água e métodos analíticos
A escolha de pontos de água para recolha de amostras destinadas a análise química
obedeceu aos seguintes critérios: abranger toda a área de estudo, possibilitar a
determinação de áreas contaminadas e não contaminadas e, por último, considerar as
características geomorfológicas, geológicas e tectónicas (fracturação) da região.
As amostras dos pontos de água, escolhidos após o inventário hidrogeológico (ver
capítulo 4), foram recolhidas de furos, nascentes, locais de descarga da mina e escombreira.
Também se contabilizaram, para amostragem, 4 pontos de observação de águas superficiais
nas ribeiras e rios adjacentes. Procedeu-se à colheita da água da chuva na amostragem de
Outubro de 2003 para ajudar na interpretação dos estudos de modelação geoquímica. Todos
eles foram enviados para laboratório para análise dos elementos maiores, menores e
elementos traço (Figura 6.1 e Tabela 6.1).
Tabela 6.1 Identificação dos pontos de água de amostragem e respectiva campanha
Ponto Amostrado
Tipo Maio98 Outubro 98
Abril 03 Outubro 03
Junho 04
Outubro 04
A1 Rio A* B D E F G
A2 Rio A B D E F G A3 Rio A B D E F G A5 Rio A B D F3 Furo A B D F F G F7 Furo A B D E F G F9 Furo A B D E F G F11 Furo D E F G F13 Furo D E F G F14 Furo D E F G F18 Furo D F19 Furo D F N1 Nascente A B N8 Nascente D E F G
M1 Galeria mina
A B D E F G
M3 Galeria mina
A B D F G
E1 Escombreira A B D E F G * As letras identificam a campanha de amostragem
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Figura 6.1 Localização dos pontos de água sujeitos a análise química
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Durante a recolha, os principais parâmetros de campo – pH, temperatura (T),
condutividade eléctrica (EC), potencial de oxidação-redução (Eh) e o total de sólidos
dissolvidos (TDS) – foram medidos após a sua estabilização.
É necessário salientar que a amostragem ocorrida no ano de 1998 foi executada
dentro de um protocolo celebrado entre a Direcção Geral do Ambiente e o Instituto Geológico
e Mineiro (actual INETI), no âmbito de um estudo multidisciplinar designado “Estudo do
Impacto Ambiental em Minas Abandonadas”. Esse estudo efectuou-se na área envolvente do
Couto Mineiro do Pejão (CMP) nos sectores da Lomba (Mina do Barral), de Germunde-Arda e
de Arda-Pejão, no qual a autora esteve integrada como geóloga estagiária no Departamento
de Hidrogeologia do Instituto Geológico e Mineiro (IGM). Dentro deste projecto, resultaram
várias publicações como Santos (1998), Canto Machado (1999), Pedrosa (2000), Santos
Oliveira e Ávila (1999), Pedrosa et al. (2000), entre outros.
O planeamento diferenciado e temporal das amostragens levaram a que dois
procedimentos de recolha de águas fossem aplicados.
Durante as duas primeiras campanhas de amostragem, realizadas no ano de 1998,
procedeu-se à recolha de 500 ml de água não filtrada para análise dos elementos maiores.
Os métodos analíticos empregues foram: pH por potenciometria; condutividade eléctrica por
electrometria; alcalinidade, cálcio, hidrogeno carbonato e cloreto por volumetria; sílica,
fosfato, fluoreto, nitrato, nitrito e amónio por espectrometria VIS/UV; sulfato por
gravimetria; sódio, potássio e lítio por fotometria de chama e, por último, magnésio por
espectrometria de plasma. As amostras de água para análise química dos metais foram
filtradas "in loco", através de membrana de filtração de porosidade 0,45 µm e, de imediato,
acidificadas com ácido nítrico concentrado de qualidade suprapur (5 ml de ácido para 500 ml
de amostra). Os metais foram quantificados por Espectrometria de Emissão Óptica com
Plasma Indutivo (ICP-OES) por aspiração directa nas amostras de mineralização total
superior a 1g/L e, após uma fase de pré-concentração, nas restantes (Canto Machado,
1999). Todas as análises foram efectuadas no Núcleo de Caracterização Química do
Laboratório de São Mamede de Infesta do INETI.
Para as amostragens decorridas nos anos de 2003 e 2004, procedeu-se à recolha de
2 litros de amostra não acidificada para análise dos elementos maiores. Os métodos
analíticos utilizados foram: electrometria para o pH e condutividade eléctrica; volumetria
para alcalinidade e hidrogeno carbonato; complexometria para a dureza e cálcio;
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espectrometria absorção molecular para a sílica; cromatografia iónica para o fluoreto,
cloreto, sulfato e nitrato; fotometria de chama para o sódio e potássio; oxidação com KMnO4
em meio alcalino a quente para a matéria orgânica; por secagem e pesagem o resíduo seco;
magnésio por diferença entre a dureza e o cálcio e, por último, o CO2 por cálculo. Todas as
amostras foram enviadas para o Laboratório Químico do Departamento de Hidrogeologia do
INETI.
Para se analisarem os metais por ICP-MS ou ICP-OES foi necessário recolher-se, para
cada ponto de amostragem, cerca de 50 ml de água, imediatamente acidificadas com ácido
nítrico suprapur, até se obter um pH inferior a 2. Seguidamente, foram enviadas para o
laboratório Activation Laboratories Ltd (Actlabs) no Canadá. A decisão da não filtragem das
amostras de água foi intencional, uma vez que se queria ter a concentração total dos
elementos (dissolvidos, colóides e partículas). De facto, alguns estudos, como o de Reimann
et al. (1999) e Banks et al. (2005), demonstraram que as diferenças entre amostras filtradas
e não filtradas para a maioria dos elementos são irrelevantes e que as amostras filtradas não
reflectem necessariamente a “verdadeira solução química de uma água”. Banks et al.
(1997b) também encontraram uma boa correlação entre as concentrações de amostras
filtradas e não filtradas para os elementos Mn, Fe, Al e Zn de descargas de águas ácidas de
minas de carvão no Reino Unido, embora, se tenha notado uma tendência relativa para uma
maior perda de Fe (devido à retenção da fracção coloidal dos hidróxidos de ferro) nas
amostras filtradas com pH alto e baixas concentrações de Fe.
O controle da qualidade dos resultados analíticos obtidos (Anexo C) envolveu o
cálculo do balanço iónico e a análise dos duplicados de amostras. Como muitos metais
apresentam concentrações muito elevadas, a fórmula de cálculo do balanço iónico (B.I.) foi
modificada de modo a estes elementos estarem presentes, uma vez que todos contribuem
para a electroneutralidade da água (Eq. 6.1):
( ) 001*)
3NO
3HCO
4SO(ClCu)NiAlZnMnFeMgCaK(Na
)3
NO3
HCO4
SO(ClCu)NiAlZnMnFeMgCaK(NaB.I.
∑ ∑ +++−+++++++++
∑ ∑ +++++++++++++=
(Eq. 6. 1)
A distribuição do erro do balanço iónico está representada na tabela 6.2. Os erros do
balanço iónico são bastante aceitáveis uma vez que 87,2% das amostras apresentam um
erro de ± 10%. Os maiores erros de balanço iónico estão associadas a águas muito pouco
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mineralizadas (como a água da chuva e do furo 9), ou seja, muito diluídas e, também, a
águas muito mineralizadas, como a descarga da mina (M3), cujo erro no balanço iónico pode
ser reflexo das determinações de cloreto, pois para altas concentrações de ferro pode haver
formação de complexos de ferro total que mascaram o ponto final da titulação (Younger,
1995).
Tabela 6.2 Distribuição dos erros do balanço iónico de todas as colheitas de água efectuadas (número de amostras total = 78). Os resultados das análises efectuadas encontram-se no Anexo C Erro balanço iónico Nº amostras dentro da classe / total
amostras % erro
< 5% 61 / 78 78,2 > 5% e < 10% 7 / 78 9,0 > 10% e < 20% 6 / 78 7,7 > 20 % 4 / 78 5,1
6.3 Caracterização Hidroquímica
6.3.1 Caracterização fácies hidroquímicas
Antes do encerramento da mina, foram realizados trabalhos de caracterização prévia
da qualidade das águas da mina (ECD, 1995). Estas análises químicas estiveram limitadas ao
estudo dos elementos maiores e dos parâmetros físico-químicos base. Todavia, uma vez que
este estudo implicou a caracterização dos vários pisos, permitiu verificar a existência de
variações de fácies hidroquímicas entre os pisos da mina, o que ajudou no estudo das fontes
de recarga de água aquando da inundação da mesma. No anexo D, apresentam-se os
resultados dos boletins de análise química que constam do arquivo técnico da mina de
Germunde.
Uma primeira abordagem dos resultados analíticos das diversas campanhas de
amostragem aos pontos seleccionados para monitorização da área foi a identificação inicial
das fácies hidroquímicas presentes obtida através da projecção das amostras no diagrama
triangular de Piper. As águas de escombreira e de descargas de mina, segundo aquela
representação gráfica, apresentam fácies sulfatadas magnesianas não se conseguindo
realizar qualquer distinção entre elas. No entanto, nos furos, nascentes e águas superficiais é
possível distinguir uma variação temporal das fácies (Figura 6.2):
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• as águas que não apresentam qualquer tipo de contaminação surgem com fácies
cloretadas sódicas ou bicarbonatadas cálcicas ao longo do tempo;
• já as águas que apresentam algum contacto com zonas contaminadas apresentam
variações de fácies ao longo das diferentes amostragens.
Figura 6.2 Diagrama de Piper das amostras de água da área de estudo (n=78). Os resultados analíticos encontram-se no Anexo C
As águas sujeitas a contaminação mineira apresentam alteração de fácies
hidroquímica. A fácies regional cloretada sódica ou bicarbonatada cálcica passa, no local da
antiga exploração mineira, a sulfatada cálcica ou magnesiana. À medida que se dá o
afastamento do foco poluidor as águas vão passando sucessivamente por várias gradações
intermédias, verificadas tanto na composição catiónica como na aniónica.
A aplicação de diagramas hidroquímicos (diagramas de Piper, Stiff, Glover, Durov,
etc.) usualmente utilizados para a classificação das características químicas das águas
tornam-se desajustados quando se quer clarificar se uma água se encontra contaminada
devido à exploração e/ou abandono de uma mina, essencialmente, por duas razões:
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• nestas águas, elementos químicos de grande importância e com concentrações
elevadas (como o Fe e o Al) não são considerados no estudo resultando, assim,
numa ideia errónea da composição;
• o facto de uma água, por exemplo, ser sulfatada magnesiana não implica que esteja
contaminada. Tudo irá depender da concentração desses elementos. Ora, este tipo
de gráficos, apenas, expressa relações entre iões e não concentrações.
Para águas de mina, o balanço entre alcalinidade total e acidez total é uma medida
reveladora das condições químicas da água. Por esse motivo, ao longo dos anos, vários
autores tentaram estabelecer um novo sistema de classificação para este tipo de águas
(Hedin, 1994; Younger, 1995; Rees et al., 2002; Younger e Wolkersdorfer, 2004). Younger e
Wolkersdorfer (2004) apresentam a modificação final do diagrama adoptado para a
classificação de águas de mina (após Rees et al. (2002) e Younger (1995)). Num dos eixos,
está representado a rede de “Net alkalinity” que é igual à alcalinidade total menos a acidez
total (ver definições cap. 2). No outro eixo, representa-se o balanço entre o sulfato
(componente que representa o grau de oxidação da pirite) e o ião cloreto (que, em elevadas
concentrações, é um indicador de águas sedimentares). A aplicação deste diagrama de
classificação aos dados analíticos obtidos aquando das campanhas de recolhas de água
efectuadas durante a elaboração deste trabalho está representada na Figura 6.3. Como se
pode verificar, obtém-se de imediato uma diferenciação do padrão químico tendo em conta
os locais de recolha. A sua aplicação permite uma abordagem primária de separação dos
tipos de águas relativamente à sua composição química.
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Figura 6.3 Classificação das águas da Mina de Germunde em termos de “Net alkalinity” e proporções de ião cloreto e sulfato, segundo o esquema de Younger (1995) e adaptado de acordo com as propostas de Rees et al. (2002) (adaptado de Younger e Wolkersdorfer, 2004). Encontram-se projectadas todas as amostras incluídas no Anexo C
Os mesmos autores consideram que este tipo de diagrama permite fazer uma
abordagem inicial para a escolha do tipo de tratamento a aplicar a uma descarga mineira.
Todavia, no caso em questão, onde se pretende estudar o comportamento hidroquímico (de
furos, nascentes, descarga de mina e escombreira) na área de um couto mineiro
abandonado, ambiciona-se obter outro tipo de respostas sendo necessário uma abordagem
diferente. Algumas das respostas que se pretende obter são: qual a proporção de cada
mineral, qual o seu contributo para o problema, quais os elementos químicos que estarão a
reagir, etc.... Com o intuito de obter respostas clarificadoras às questões anteriores várias
técnicas foram utilizadas em virtude de se pretender descobrir qual delas explica melhor as
interacções entre água, elementos químicos, minerais, rochas e ambiente mineiro.
6.3.2 Análise uni- e bivariada de dados
No total, foram analisados 12 elementos maiores em 78 amostras. O número de
elementos vestigiários ou metais pesados analisados dependeu da campanha de amostragem
(ver secção 6.2). Nas campanhas de 1998, foram analisados 20, enquanto que, nas
campanhas de 2003 e 2004, foram analisados 61 elementos vestigiários e metais pesados.
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Efectuou-se uma análise estatística univariada e bivariada dos dados, com o cálculo
dos principais parâmetros estatísticos, box-plots e matriz de correlação. No entanto, para
realização dessa análise estatística e dado que existiam elementos cujas concentrações se
encontravam abaixo dos limites analíticos de detecção dos aparelhos, consideraram-se estes
como tendo um valor igual a metade do valor do limite de detecção desse elemento.
Os elementos químicos que, para todas as campanhas efectuadas, se encontravam
abaixo do limite de detecção do aparelho foram excluídos. Estes são: ósmio, platina, ouro,
mercúrio, bismuto, tântalo, telúrio, índio, prata, paládio, ruténio e o nióbio. O molibdénio e o
estanho foram eliminados uma vez que 75% das amostras apresentavam valor nulo no
terceiro quartil.
O objectivo principal deste estudo estatístico é determinar a variabilidade ou a
dispersão da concentração dos elementos de modo a evidenciar a influência da passagem de
água em locais expostos à contaminação mineira. Desta forma, é lógico inferir que as
condições geológico-mineiras não actuam sobre um qualquer conjunto de dados de um
determinado elemento químico desde que este apresente uma variância e desvio padrão
próximo de zero, aliado a concentrações muito baixas desse elemento. Assim sendo, o
estudo estatístico descritivo univariado permitiu reduzir o grupo de variáveis a utilizar uma
vez que foram retirados o rénio, o tálio, o germânio, o césio, o háfnio, o zircónio, o gálio, o
túlio, o lutécio e o tório das análises estatísticas posteriores, dado que as concentrações
químicas presentes eram extremamente baixas (inferiores a 0.8 µg/L, excepto para as águas
recolhidas na escombreira) não tendo, por conseguinte, qualquer interesse a sua inclusão.
Optou-se pela eliminação dos elementos brometo, titânio, vanádio e volfrâmio
porque os valores de concentração apresentados no 3º quartil são iguais ou inferiores aos
definidos por Hem (1985) para as concentrações médias destes em águas de rio. Nas tabelas
6.3 e 6.4 estão expressos os resultados analíticos obtidos nos restantes elementos.
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Tabela 6.3 Estatística das análises a elementos maiores
Unidade N Média Mínimo q1 Mediana q3 Máximo Variância
pH 78 5,6 2,5 4,7 6,0 6,5 7,8 1,7
EC µS/cm 78 864,1 35,3 219,0 299,5 478,0 11000,0 2648843,8 Res. seco mg/L 56 751,9 19,4 152,8 217,3 311,4 5328,0 1941153,0
SO42- mg/L 78 666,2 1,6 22,0 78,7 188,9 13744,0 3674775,3
Cl- mg/L 78 24,4 5,3 16,7 22,4 33,8 50,5 118,0
HCO3- mg/L 78 49,7 0,0 2,4 30,5 70,8 195,8 2967,4
F- mg/L 78 0,7 0,0 0,1 0,2 0,4 10,8 3,4
NO3- mg/L 78 4,2 0,0 0,1 1,7 5,2 35,3 40,4
Mg2+ mg/L 78 92,0 0,7 7,0 15,9 27,5 1915,0 67598,1
Ca+ mg/L 78 44,7 0,2 7,7 16,4 35,3 345,0 4810,2
Na+ mg/L 78 16,6 3,8 11,0 14,5 22,5 32,8 48,5
K+ mg/L 78 2,3 0,2 1,0 1,6 2,5 11,1 5,9
Si mg/L 78 10,91 0,03 4,39 9,67 15,41 43,43 69,72
N – Número de amostras de água analisadas por parâmetro; L.D. – Limite de detecção do aparelho; q1 - 1º quartil ; q3 - 3º quartil O sulfato e o magnésio são os constituintes maiores maioritários que apresentam
uma maior discrepância entre a sua concentração mínima e máxima.
O cálcio apresenta uma discrepância de concentração entre o 3º quartil e o máximo.
Este aumento de concentração é verificado nas águas pertencentes às descargas mineiras.
As concentrações de cloreto apresentam variações típicas entre 5 e 50 mg/l, o que
indica que à sua origem está associada a precipitação de sais concentrados por
evapotranspiração.
O sódio apresenta maiores concentrações nas águas de furos e na descarga da mina
inundada (M1), reflectindo que a sua origem está associada a processos de interacção água /
minerais silicatados.
O nitrato encontra-se sempre com valores inferiores ao máximo recomendado pela
directiva. A maior concentração (35,3 mg/l) foi observada num furo situado numa zona
agrícola. Esta observação está de acordo com outros trabalhos (Banks et al., 1997b) que
evidenciam que as descargas de mina de carvão não contribuem com nitrato para a poluição
das águas.
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Tabela 6.4 Estatística das análises a elementos vestigiários e a metais pesados
Unidade L.D. N Média Mínimo q1 Mediana q3 Máximo Variância
Al µg/L 2 78 29350,8 1,0 20,0 95,0 1020 859000 14453621309
Fe µg/L 5 78 22896,2 2,5 194,0 734,5 5720,0 336000,0 4262119413,0
Mn µg/L 0,05 78 8665,1 5,0 74,4 670,5 1740,0 200000,0 732703456,6
Zn µg/L 50 78 1312,9 0,8 19,4 284,0 641,0 30600,0 16449715,0
Ni µg/L 0,2 78 366,8 0,3 2,0 50,3 231,0 7600,0 1056375,8
Co µg/L 0,01 78 278,9 0,003 2,0 17,6 106,0 7200,0 900310,5
Li µg/L 0,1 78 194,4 0,05 15,0 28,5 89,0 4000,0 309164,4
Y µg/L 0,003 78 58,7 0,007 0,200 0,4 8,9 1600,0 50936,7
Cu µg/L 0,1 78 52,4 0,3 2,0 9,9 31,6 1020,0 23074,6
Sr µg/L 0,04 78 164,2 1,3 47,0 143,0 251,0 713,0 18289,3
Nd µg/L 0,004 56 28,9 0,003 0,1 0,3 3,6 401,0 9387,3
Be µg/L 0,05 78 14,6 0,025 0,025 0,2 4,2 338,0 2749,7
Cd µg/L 0,01 78 9,0 0,005 0,13 0,5 1,1 352,0 1796,0
Gd µg/L 0,002 56 9,6 0,0010 0,0380 0,09 1,4 143,0 1051,6
Sm µg/L 0,002 56 9,3 0,001 0,036 0,1 1,2 131,0 983,6
I µg/L 1 56 12,3 0,5 3,0 5,0 9,5 173,0 767,0
Pr µg/L 0,001 56 7,1 0,001 0,028 0,1 0,8 118,0 585,2
Dy µg/L 0,001 56 6,1 0,001 0,0205 0,1 0,9 89,3 427,2
Ba µg/L 0,1 67 18,3 2,0 10,0 15,1 24,0 92,9 175,3
Pb µg/L 0,1 56 6,1 0,1 0,7 1,4 4,9 83,7 172,7
U µg/L 0,001 56 3,5 0,010 0,045 0,4 1,1 72,5 139,7
Er µg/L 0,001 56 2,8 0,0005 0,012 0,03 0,5 41,5 89,5
Eu µg/L 0,001 56 2,5 0,0005 0,009 0,02 0,3 37,6 75,4
Yb µg/L 0,001 56 2,5 0,001 0,010 0,03 0,3 36,6 68,5
Cr µg/L 0,5 78 2,0 0,25 0,25 0,5 2,3 47,0 29,7
Sc µg/L 1 56 4,6 0,5 0,8 3,0 6,0 24,0 26,7
Se µg/L 0,2 56 1,4 0,1 0,1 0,1 0,3 25,5 22,0
Tb µg/L 0,001 56 1,3 0,001 0,005 0,01 0,2 20,7 20,8
Rb µg/L 0,01 56 4,1 0,3 1,9 2,9 4,0 17,8 16,5
As µg/L 0,03 78 2,4 0,015 0,5 1,5 3,0 22,0 12,4
Ho µg/L 0,001 56 1,0 0,0005 0,0040 0,01 0,2 15,5 12,1 N – Número de amostras de água analisadas por parâmetro; L.D. – Limite de detecção do aparelho; q1 - 1º quartil ; q3 - 3º quartil
A variabilidade dos elementos vestigiários, dos metais pesados e lantanídeos é muito
grande chegando a existir diferenças de 6 ordens de grandeza entre o máximo e o mínimo
(Tabela 6.4). Através da comparação do 3º quartil (q3) e dos valores máximos obtidos para
vários elementos verifica-se a existência de valores anómalos bastante elevados e que
diferem 1 a 2 ordens de grandeza do 3º quartil para o valor máximo.
A carga metálica muito elevada faz-se sentir principalmente nas drenagens de mina e
escombreira estando presentes os metais Fe, Al, Mn, Zn, Cu, Cd, Co, Be, Y, com gamas de
concentração que, por vezes, atingem as dezenas de ppm. O decaímento desta componente
metálica é, no entanto, rápido.
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As águas de superfície, nos pontos amostrados, exibem características químicas
bastante diferentes. São sistemas de baixa mineralização, de pH na zona neutra, exibindo
como par iónico maioritário o hidrogeno carbonato e o cálcio. A poluição mineira faz-se sentir
nestas águas pela presença do sulfato e pelo aumento da concentração do magnésio. No
naipe metálico aparecem apenas os metais com maior mobilidade, sobretudo manganês,
alumínio e zinco.
No Rio Douro não foi detectada qualquer modificação significativa da composição
química da água após a descarga da mina M1 (ponto de amostragem A2). Tal facto deve-se
a dois factores: à precipitação de vários oxihidróxidos antes da entrada de água no rio Douro
e também à rápida mistura das duas águas com caudais significativamente diferentes. O
mesmo se passa no Rio Arda, a linha de água mais importante na envolvente estudada e
receptora das águas da escombreira que, perto da confluência, já não mostra índices
relevantes de contaminação mineira.
Já nas águas subterrâneas, constata-se que as dos furos exibem uma carga metálica
bastante significativa, assumindo estas proporções importantes em alguns deles tornando,
por tal facto, as respectivas águas impróprias para consumo humano.
O estudo da componente vestigiária é muito útil, pois ajuda a distinguir as
particularidades de cada água e apoia a despistagem de contaminação ambiental numa fase
muito incipiente. O “sinal” dado pela componente vestigiária, sendo precoce, ajuda a tomar
medidas remediadoras mais cedo do que quando o “sinal” é dado pela componente
maioritária de uma análise química.
Nas figuras 6.4 e 6.5, onde estão representados os “box-plots”, é possível visualizar
a variação e o comportamento dos elementos para cada local de amostragem. Em todos os
box-plots apresentados, distinguem-se 3 tipos de águas:
• águas superficiais (de rios e ribeiras);
• águas subterrâneas (de nascentes e furos);
• águas de mina (descargas mineiras e escombreira).
Anomalias da concentração dentro dos dois primeiros grupos (como A5, F19 e N8 no
box-plot de Al) podem ser indicadoras de provável contaminação.
É possível apurar um aumento da concentração de alguns metais e sulfato com a
diminuição do pH (Figura 6.3). Isto é devido a diversos factores:
114
• metais, protões e sulfato são libertados quando há dissolução de sulfuretos;
• aumento da solubilidade e mobilidade destes iões com o pH baixo.
A existência de uma simetria positiva entre o SO42- e o Mn é nítida. Ao mesmo
tempo, é evidente a simetria negativa destes “box-plots” com o pH.
O Al, o Fe e o Mn apresentam um comportamento geoquímico similar, excepto para
as concentrações de Al na descarga M1, em virtude deste metal ter comportamento diferente
dos restantes em condições de pH superiores a 4,5. Para estes valores de pH, o Al torna-se
pouco solúvel deixando de ser um componente problemático na drenagem mineira (Hedin et
al., 1994).
115
Figura 6.4 “Boxplots” ilustrando a distribuição do pH, SO4
2-, Mg, Al, Mn, Fe, Ni e Ca (eixo dos YY em escala logarítmica) para cada local de amostragem. Linha a tracejado representa o valor paramétrico para a água destinada ao consumo humano definido pelo Decreto-Lei 306/07 de 27 de Agosto. Linhas a vermelho separam águas superficiais (A1, A2, A3 e A5), das águas captadas em furos e nascentes (representadas pelas letras F e N) e as águas das descargas mineiras (M1 e M3) e escombreira (E1)
116
Figura 6.5 “Boxplots” ilustrando a distribuição do Li, Zn, As, Be, Sr e Rb (eixo dos YY em escala logarítmica) para cada local de amostragem. Linha a tracejado representa o valor paramétrico para a água destinada ao consumo humano definido pelo Decreto-Lei 306/07 de 27 de Agosto. Linhas a vermelho separam águas superficiais (A1, A2, A3 e A5), as águas captadas em furos e nascentes (representadas pelas letras F e N) e as águas das descargas mineiras (M1 e M3) e escombreira (E1) As altas concentrações de Li presentes podem ser justificadas através de reacções de
troca iónica entre minerais, onde o lítio é menos adsorvido que outros elementos comuns
(Figura 6.5). Por isso, é plausivel, que quando este entra em solução através de reacções de
dissolução, continue no estado dissolvido (Hem, 1985).
Segundo Younger et al. (2002), o Zn pode ser utilizado como traçador de processos
de drenagem mineira, dado que é um elemento com grande mobilidade. Observando o seu
comportamento nos diferentes “box-plots”, pode-se assumir este comportamento para as
nossas análises.
117
A adsorção do As é minimizada em condições de pH alcalino uma vez que as
superfícies tendem a ficam carregadas negativamente. Provavelmente, por causa destas
características de adsorção, o As encontra-se com concentrações mais altas na descarga da
mina (M1), onde o pH apresenta valores mais elevados.
As concentrações de Pb mais elevadas foram verificadas no furo F13 e a sua origem
é independente da mina e litologias. Foi devido a contaminação antropogénica durante a sua
construção, em Fevereiro 2003.
O comportamento padrão das terras raras podem gravar processos geoquímicos
suavizados em sistemas naturais (Taylor and McLennan, 1988). Devido à natureza litófila dos
elementos terra rara a sua presença na água subterrânea estes podem ser utilizados como
traçadores naturais de misturas de águas e de interacções água-rocha (Banner et al., 1989;
Smedley, 1991; Fee et al., 1992; Johannesson et al., 1994; Banks et al., 1999). Recorreu-se
à normalização dos valores dos lantanídeos para que fosse possível a respectiva comparação
uma vez que eles ocorrem com gamas de valores bastante diferentes. Constata-se que estes
elementos apresentam sempre a mesma variabilidade no comportamento geoquímico para
os locais amostrados indicando a dissolução dos minerais durante a interacção água-rocha
(Figura 6.6).
1.E-08
1.E-07
1.E-06
1.E-05
1.E-04
1.E-03
1.E-02
1.E-01
Ce Nd Sm Eu Gd Tb Dy Er Yb Th
Terr
as ra
ras
/ NA
SC
A1A2A3A5CHUVAE1F11F13F14F18F19F3F7F9M 1M 3N8
Figura 6.6 Distribuição das terras raras normalizados segundo o NASC para os diferentes locais de amostragem (eixo dos YY em escala logarítmica). Todos os valores em µg/L.
O uso de relações entre determinados iões pode fornecer informações sobre o tipo de
reacções químicas que estão associados aos processos hidroquímicos (tabela 6.5):
118
• a razão Na/Cl é indicadora de processos de troca catiónica;
• a razão Si/Na é o reflexo de que os processos de dissolução dominam;
• a razão entre Cl/SO4, indicadora da presença de reacções de oxidação e/ou redução
em determinada água, sendo a que mais se destaca neste estudo. Este dado
encontra-se em conformidade com o tipo de reacções esperadas num local afectado
por drenagem ácida;
• a razão Ca/Mg permite determinar a contribuição da calcite e da dolomite na
composição da água (Ettazarini, 2005). Se esta razão é inferior a 1, então o Mg
excede o Ca e sugere a existência de várias fontes para estes elementos. Tal
situação acontece em quase todas as amostras estudadas com excepção para as
águas colhidas no Rio Arda e Rio Douro;
• a razão Ni/Co (Bernard, 2008) distingue a origem geológica ou antropogénica do Ni
na água e a intensidade do processo de dissolução (Figura 6.7).
Tabela 6.5 Estatística das razões entre iões obtidas (meq/l)
Parâmetro N Média Mín q1 Mediana q3 Máx Variância Desvio Padrão
Cl/SO4 78 1,61 0,00 0,27 0,77 1,17 16,57 7,32 2,71
Na/Cl 78 0,73 0,25 0,60 0,70 0,79 2,38 0,08 0,29
Si/Na 78 2,12 0,02 1,10 1,94 2,49 10,22 2,73 1,65
Ca/Mg 78 0,87 0,11 0,21 0,52 1,26 2,96 0,72 0,85
Ni /Co 56 6,28 0,17 1,78 2,08 5,01 96,94 218,15 14,77
As variações entre os valores mínimos e máximos indicam imediatamente que se
está perante águas onde estão a decorrer processos hidroquímicos distintos. Este facto tem
a ver com a grande variabilidade do grupo amostral.
119
0.000 1 0 .0 01 0.01 0 .1 1 1 0 100 10 00
0.01
0.1
1
10
100
1000
Co (meq/L)
Ni (m
eq/L
)
Ni/Co = 10
OrigemAntropogénica
(Ni/Co)>10
Origem Geológica
(Ni/Co <10)
Aum ento dop ro cesso de d is solução
Figura 6.7 Correlação entre níquel e cobalto para as amostras de água estudadas (gráfico adaptado de Bernard et al., 2008)
No geral, pode-se concluir que a recarga rápida dos aquíferos freáticos reflecte-se na
composição química das águas através da diminuição nas concentrações dos constituintes
dissolvidos, devido a fenómenos de diluição coadjuvados pela diminuição do tempo de
contacto água/rocha. Todavia, existem casos em que a concentração das espécies
dissolvidas aumenta com a recarga dos aquíferos o que indicia mecanismos de dissolução à
superfície, com arrastamento dos elementos remobilizados durante a infiltração e percolação
das águas pluviais no subsolo. Também, se pode afirmar que os dados reflectem a existência
de situações em que nem todos os elementos dissolvidos possuem a mesma origem, estando
alguns deles associados com remobilizações selectivas e provindo outros (como o estrôncio)
de fenómenos de interacção água/rocha.
6.4 Aplicação de técnicas estatísticas multivariadas para análise dos
processos de contaminação mineira
A utilização de técnicas de estatística multivariada está a tornar-se uma prática
comum em estudos de diferentes áreas, incluindo a hidrogeologia, em virtude de serem
ferramentas de grande versatilidade. As suas principais vantagens são permitir:
• analisar grande quantidade de dados sem perda de informação significativa;
• classificar e caracterizar estruturalmente relações entre variáveis e amostras;
120
• realçar grupos de amostras e variáveis com características similares;
• estudar a contribuição de cada variável e/ou amostra na estrutura da base de dados
hidroquímicos;
• alcançar padrões espaciais e temporais da base de dados hidrogeoquímica;
Neste tipo de análise, as preocupações tidas em conta são:
• descrição dos dados: exploraram-se os dados, tanto espacial como
cronologicamente, para constatação de eventuais valores anómalos que possam
mascarar a estrutura.
• interpretação: os produtos gráficos obtidos a partir das informações numéricas são
avaliados levando em consideração tanto o conhecimento já adquirido com dados
similares como com factos científicos relacionados com as variáveis sob estudo.
A interpretação da estrutura espacial ou temporal, as associações e as relações
casuais entre variáveis devem, então, ser organizadas num modelo que se ajuste à
realidade.
6.4.1 Análise em Componentes Principais
A Análise em Componentes Principais (ACP) é um método particularmente adaptado
para extrair as características estruturais de um quadro de dados quantitativos. Permite
reduzir um conjunto de variáveis em um conjunto menor de variáveis artificiais que se
chamam componentes principais (CP) ou factores.
Em geral, as variáveis de base são muito heterogéneas, apresentando valores
médios e variâncias muito diferentes (como se pode ver nas tabelas 6.3 e 6.4). Para reduzir
este efeito, é necessário proceder à transformação da matriz de dados inicial numa outra
matriz, onde as novas variáveis serão adimensionais com média nula e variância unitária.
Esta nova matriz chama-se matriz de inércia e consiste, portanto, numa matriz de correlação
entre variáveis. Trata-se de uma técnica de análise de dados em que as variáveis originais
(tomadas como eixos definidores de um espaço onde se posicionam as amostras) são
substituídas por outras variáveis (os factores), obtidos à custa de um novo sistema de eixos.
Cada factor, associado a um eixo, descreve uma certa quantidade de variância estatística
121
dos dados analisados e a sua interpretação é efectuada de acordo com as variáveis
intercorrelacionadas.
Uma boa descrição do algoritmo aplicado nos cálculos efectuados pelo programa
(“Andad 7.12”) pode ser consultada em Pereira e Sousa (2000).
6.4.1.1 Abordagens metodológicas
A presença numa matriz de amostras contaminadas e não contaminadas pode não
permitir a detecção de todos os processos hidrogeoquímicos que estão a ocorrer nos
diferentes locais de amostragem uma vez que algumas amostras, devido aos seus valores
anómalos, podem mascarar outros processos que estejam a decorrer. Torna-se, então,
necessário aplicar a ACP a diferentes matrizes.
Numa primeira abordagem, aplica-se a ACP a todo o grupo amostral. Segue-se a
aplicação da ACP a um subgrupo amostral (sem as amostras anómalas) de modo a
determinar se existem ou não processos hidrogeoquímicos mascarados. Várias metodologias
foram experimentadas de modo a tentar encontrar o grupo de amostras que estariam
associadas à anomalia geoquímica como, por exemplo, a classificação ascendente
hierárquica, mas sem grandes resultados. Por fim, optou-se por utilizar uma adaptação da
metodologia definida por Pereira et al. (2003). O fluxograma da metodologia encontra-se na
figura 6.8.
122
Figura 6.8 Fluxograma da metodologia empregue para a detecção das amostras representativas da anomalia geoquímica (adaptado de Pereira et al., 2003)
O primeiro passo consiste na aplicação de ACP a uma matriz de dados constituída por
todas as amostras. Os eixos resultantes podem, geralmente, ser interpretados nos termos da
associação das propriedades num contexto geológico e geoquímico. Os eixos também
permitem a separação das regiões, no espaço do factor, que estão provavelmente
relacionadas com a anomalia das que estão relacionadas com o fundo geoquímico. Para tal,
escolhem-se aquelas amostras cujas coordenadas em eixos significativos são mais elevadas.
Através da representação gráfica, identificam-se as amostras e variáveis que se encontram
associadas à anomalia geoquímica. Assim, obtêm-se dois subconjuntos de amostras: um
ligado ao fundo geoquímico (bloco B), e outro à anomalia geoquímica (bloco A).
Com a aplicação da ACP a esta nova matriz (61x22) associada à projecção
suplementar das amostras “anómalas” (bloco A), entra-se na segunda etapa desta
metodologia.
123
Esta segunda etapa fornece a intensidade da anomalia para cada amostra, dada pela
distância, ao longo dos eixos significativos entre as posições da amostra, antes e depois da
sua projecção suplementar. Esta distância mede a desigualdade entre uma amostra vista
como a parte de um todo e da mesma amostra segregada no subconjunto anómalo e vista
na estrutura do fundo complementar. A distância pode ser vista como a contribuição da
amostra à intensidade global da anomalia, uma vez que mede a importância de cada
amostra no subconjunto anómalo.
O objectivo final desta segunda etapa é o cálculo de uma intensidade global da
anomalia obtida calculado a partir da média das distâncias acima definidas para todas as
amostras incluídas no grupo amostral da anomalia (bloco A).
A intensidade global da anomalia mede quanto do grupo amostral inteiro é
perturbado pela presença das amostras anómalas, funcionando como um critério para julgar
se a separação das amostras foi ou não a mais correcta.
Subsequentemente, numa terceira etapa, as amostras que se encontram na
vizinhança das fronteiras que definem as regiões da anomalia no espaço do factor podem ser
movidas do seu subconjunto inicial para o outro, até que a intensidade global da anomalia
seja maximizada. Neste momento, a separação óptima do subconjunto da anomalia do fundo
é alcançada.
6.4.1.2 Aplicação
Inicialmente, aplicou-se a ACP a uma matriz de dados constituída por todas as
amostras (78) e 22 variáveis activas (elementos maiores, parâmetros físico-químicos de pH
e condutividade eléctrica (EC) e alguns elementos menores). Na tabela 6.6, está
representada a matriz de correlação pxp obtida. As variáveis que se encontram destacadas
apresentam uma correlação significativa para ρ<0,01, isto é, para um intervalo de confiança
de 99%. Presencia-se uma forte correlação entre os iões maiores SO42-, Ca2+ e Mg2+ e os
metais Al, Mn, Y, Zn, Ni, Be e Li com a EC. A sua presença é um testemunho de que estão a
decorrer processos de drenagem mineira que originam a contaminação das águas. O Cl- e o
Na+ apresentam entre si uma boa correlação.
124
Tabela 6.6 Matriz de correlação p x p das 78 amostras (base de dados completa)
pH EC Cl HCO3- SO4
2- NO3- F- Na+ K+ Ca2+ Mg2+ Si Li Fe Al Mn Zn Ni Co Cr Be Y
pH 1,00
EC -0,41 1,00
Cl -0,35 -0,01 1,00
HCO3- 0,52 -0,32 -0,21 1,00
SO42- -0,37 0,99 -0,08 -0,29 1,00
NO3- 0,03 0,41 -0,09 -0,21 0,42 1,00
F- -0,34 0,35 0,31 -0,24 0,30 0,21 1,00
Na+ -0,19 0,07 0,77 -0,12 -0,02 0,03 0,01 1,00
K+ 0,17 0,22 0,16 -0,22 0,12 0,23 0,05 0,43 1,00
Ca2+ -0,19 0,89 0,05 -0,23 0,83 0,34 0,37 0,20 0,57 1,00
Mg2+ -0,37 0,98 -0,08 -0,27 1,00 0,42 0,31 -0,03 0,09 0,81 1,00
Si -0,49 0,55 0,45 -0,08 0,54 0,03 0,18 0,45 -0,16 0,38 0,55 1,00
Li -0,43 0,95 -0,04 -0,28 0,97 0,43 0,40 -0,06 -0,01 0,75 0,98 0,56 1,00
Fe -0,01 0,46 0,13 -0,30 0,36 0,17 0,06 0,43 0,87 0,75 0,33 0,10 0,23 1,00
Al -0,37 0,92 -0,15 -0,22 0,96 0,39 0,25 -0,15 -0,12 0,67 0,97 0,54 0,96 0,11 1,00
Mn -0,36 0,98 -0,11 -0,28 1,00 0,42 0,25 -0,03 0,11 0,81 1,00 0,54 0,97 0,35 0,97 1,00
Zn -0,39 0,89 -0,09 -0,23 0,94 0,38 0,16 -0,04 -0,11 0,63 0,94 0,60 0,93 0,13 0,97 0,94 1,00
Ni -0,41 0,68 0,00 -0,30 0,66 0,18 0,42 -0,08 -0,01 0,56 0,63 0,37 0,63 0,17 0,66 0,63 0,59 1,00
Co -0,37 0,96 -0,16 -0,26 0,99 0,42 0,21 -0,07 0,02 0,74 0,99 0,54 0,96 0,27 0,98 0,99 0,96 0,62 1,00
Cr -0,30 0,79 -0,14 -0,22 0,84 0,48 0,18 -0,05 0,00 0,59 0,86 0,46 0,87 0,19 0,83 0,86 0,84 0,21 0,87 1,00
Be -0,39 0,92 -0,15 -0,25 0,96 0,37 0,23 -0,13 -0,09 0,68 0,95 0,54 0,94 0,15 0,98 0,95 0,95 0,76 0,97 0,75 1,00
Y -0,39 0,92 -0,14 -0,24 0,96 0,41 0,32 -0,15 -0,11 0,67 0,97 0,54 0,97 0,12 0,99 0,96 0,96 0,67 0,98 0,83 0,97 1,00
125
Através da ACP, 5 factores foram extraídos, explicando 89,7% da variância total da
matriz original (Tabela 6.7).
Tabela 6.7 Valores próprios e percentagem de variância explicada por cada um dos eixos factoriais
F1 F2 F3 F4 F5
Valor Próprio
12,4 2,9 2,1 1,3 1,0
% Variância 56,4 13,2 9,7 6,0 4,4
% Variância acumulada
56,4 69,6 79,3 85,3 89,7
A projecção das variáveis no primeiro plano factorial, construído com o 1º e 2os eixos
factoriais, encontra-se representada na figura 6.9.
Figura 6.9 Projecção das variáveis activas e das variáveis suplementares no primeiro plano factorial (matriz inicial constituída por 78 amostras activas e 22 variáveis activas)
126
O primeiro eixo factorial (F1) explica 56,4% da variância total. Este eixo mostra a
oposição entre a EC, SO42-, Mg2+, Al, Zn, Mn, Be, Y, Li, Co, Cr e Ni (lado negativo) e o pH
(lado positivo). Em drenagem mineira, esta correlação negativa é tipicamente observada
entre o pH e as concentrações de muitos metais e metalóides, catiões básicos e o sulfato
(Banks, 2004), uma vez que a geração e solubilidade destes elementos através de reacções
de dissolução de sulfuretos são dependentes do pH. Sendo assim, pode-se interpretar este
eixo como relacionado com a contaminação mineira – quanto mais negativo for o valor mais
contaminada se encontra a amostra.
O segundo eixo factorial corresponde a 13,2% da variância da matriz inicial. A
variável HCO3 – está localizada no lado positivo em oposição às variáveis Cl, Na e K, que se
encontram projectadas na parte negativa do 2º eixo. Estas variáveis estão associadas às
fácies regionais das águas.
A posição relativa do Fe, neste 1º plano factorial, é explicada pelo facto de o
relacionamento entre o pH e o Fe não ser directo dado que existe uma multiplicidade de
reacções a decorrerem ao mesmo tempo quando a água é muito agressiva (Wood et al.,
1999).
Os restantes eixos (não representados), geralmente, explicam a variância de apenas
um parâmetro ou estabelecem correlações pouco significativas entre dois parâmetros.
A figura 6.10 representa a projecção das amostras no primeiro plano factorial. É
possível separar as amostras em três grupos tendo em conta a sua posição no 1º eixo: a
descarga da escombreira (1), as descargas da mina (2) e um terceiro grupo formado pelos
furos, nascentes, rios (3). Também se nota que, com o tempo e tendo em conta o significado
do 1º eixo factorial, a escombreira da mina apresenta uma melhoria significativa de 1998 a
2004. De facto, verifica-se a aproximação das amostragens realizadas em 2003 e 2004 à
origem do eixo.
127
Figura 6.10 Distribuição das diferentes amostras de água no primeiro plano factorial para a matriz inicial (78 amostras activas X 22 variáveis activas)
Tendo em conta a interpretação dada ao eixo 1 como estando associado ao grau de
contaminação (quanto mais distante se projecta uma amostra da origem, no lado negativo
do eixo 1, maior é o seu carácter anómalo), pode-se definir o subconjunto de amostras
anómalo como sendo constituído por todas as amostras da escombreira e das descargas da
mina (M1 e M3). Assim, a matriz inicial (78 amostras x 22 variáveis) foi dividida em dois
subconjuntos, um constituído pelas amostras que, provavelmente, representaram o padrão
hidroquímico natural das águas (61 x 22) e outro formado pelas amostras que poderão estar
associadas à anomalia geoquímica associada à contaminação mineira (17x22).
Com a aplicação da ACP a esta nova matriz (61x22) e a projecção suplementar das
amostras “anómalas” (17x22), entra-se na aplicação da segunda etapa da metodologia
definida na figura 6.8. A projecção das amostras activas e suplementares encontra-se na
figura 6.11. Como esperado, as amostras anómalas movem-se no sentido negativo do eixo
1, afastando-se da origem.
128
Figura 6.11 Projecção das 61 amostras activas (a azul) e 17 suplementares (a vermelho) no primeiro plano factorial (após a aplicação do 2º passo da metodologia seguida)
As intensidades das anomalias das amostras podem ser medidas pela distância entre
as suas posições, ao longo do eixo 1, antes e após a projecção suplementar (Tabela 6.8).
Como se constata, a distância entre posição da amostra, ao longo do eixo 1, antes e após a
sua projecção suplementar apresenta, para algumas amostras, uma grande disparidade o
que provocava um desequilíbrio muito grande na matriz inicial. Ao retirarem-se essas
amostras da matriz, obteve-se a projecção representada na figura anterior. Aqui é visível
que as correlações entre as amostras que pertencem a este subgrupo amostral variaram
129
relativamente ao grupo inicial. Há uma redistribuição das amostras ao longo do eixo 1,
dando-se a passagem de algumas delas para o lado negativo do eixo, isto é, para a região
da anomalia do espaço do factor.
Tabela 6.8 Distância entre a posição da amostra ao longo do eixo 1 antes e depois da sua projecção suplementar
Amostra Distância
E1A -59,612
E1B -100,486
E1D -29,403
E1E -17,365
E1F -27,215
E1G -28,911
M1A -13,718
M1B -11,228
M1D -7,118
M1E -6,531
M1F -5,994
M1G -6,894
M3A -6,349
M3B -1,764
M3D -2,827
M3F -1,485
M3G -2,059
A intensidade global da anomalia obtida através da média dos valores é -19,35.
Com o intuito de encontrar o melhor subconjunto de amostras anómalas, através da
interpretação dos dados representados na Figura 6.11, procedeu-se ao aperfeiçoamento do
subconjunto anómalo com integração de novas amostras que se encontravam na vizinhança
das fronteiras que definem as regiões da anomalia no espaço do factor. Assim, a aplicação
da terceira etapa da metodologia anteriormente definida permitiu alcançar a separação
óptima dos subconjuntos, onde uma anomalia global máxima foi obtida (-22,13). Conseguiu-
se, no final, uma matriz com as 22 variáveis e 57 amostras activas e outra matriz com 22
variáveis activas e 21 amostras suplementares.
A representação gráfica destes dois subconjuntos amostrais óptimos encontra-se na
figura 6.12. O primeiro eixo factorial separa a região onde as reacções da ácido-base
(neutralização) ocorrem (lado positivo) dos ambientes onde as reacções de oxidação
dominam (lado negativo). A presença das amostras do mesmo local em quadrantes
diferentes revela a mistura das águas por fracturas. O segundo eixo factorial separa as fácies
das águas regionais.
130
Figura 6.12 Projecção das 57 amostras activas (a azul) e 21 suplementares (a vermelho) para a separação óptima alcançada no final da aplicação da metodologia
Na tabela 6.9 está representada a matriz de correlação p x p (57x22), revelando
existência de correlações bivariadas entre variáveis.
131
Tabela 6.9 Matriz de correlação p x p para o subgrupo amostral obtido através da aplicação da metodologia seguida
pH EC Cl HCO3- SO4
2- NO3- F- Na+ K+ Ca2+ Mg2+ Si Li Fe Al Mn Zn Ni Co Cr Be Y
pH 1,00
EC -0,25 1,00
Cl -0,50 0,60 1,00
HCO3- 0,37 0,40 -0,17 1,00
SO42- -0,56 0,76 0,50 -0,14 1,00
NO3- 0,16 -0,28 0,01 -0,22 -0,36 1,00
F- -0,09 0,10 0,07 0,00 0,10 0,03 1,00
Na+ -0,36 0,66 0,95 -0,04 0,47 -0,05 0,11 1,00
K+ 0,14 -0,22 -0,01 -0,05 -0,33 0,47 0,00 -0,01 1,00
Ca2+ 0,42 0,54 -0,13 0,89 0,04 -0,17 0,00 0,04 0,01 1,00
Mg2+ -0,43 0,91 0,54 0,27 0,85 -0,37 0,11 0,54 -0,43 0,32 1,00
Si -0,46 0,61 0,71 0,09 0,48 -0,38 0,03 0,70 -0,42 0,01 0,65 1,00
Li -0,70 0,53 0,50 -0,18 0,79 -0,33 0,09 0,40 -0,29 -0,14 0,68 0,54 1,00
Fe -0,24 0,24 0,39 -0,20 0,31 -0,23 -0,13 0,31 -0,25 -0,22 0,25 0,45 0,28 1,00
Al -0,35 0,28 -0,08 -0,14 0,63 -0,03 0,13 -0,16 -0,17 -0,09 0,49 -0,06 0,41 -0,04 1,00
Mn -0,64 0,49 0,24 -0,16 0,81 -0,28 0,12 0,17 -0,36 -0,16 0,74 0,34 0,71 0,19 0,80 1,00
Zn -0,33 0,31 0,53 -0,18 0,40 -0,14 0,00 0,50 -0,10 -0,10 0,32 0,40 0,44 0,09 0,00 0,16 1,00
Ni -0,43 0,13 0,31 -0,30 0,36 -0,12 -0,02 0,18 -0,02 -0,32 0,28 0,25 0,43 0,13 0,25 0,44 0,35 1,00
Co -0,73 0,29 0,18 -0,35 0,71 -0,15 0,12 0,06 -0,22 -0,31 0,51 0,22 0,78 0,21 0,68 0,86 0,17 0,45 1,00
Cr 0,17 -0,23 -0,21 -0,24 -0,19 0,23 0,14 -0,15 0,28 -0,15 -0,30 -0,26 -0,28 -0,05 -0,03 -0,15 -0,11 -0,18 -0,11 1,00
Be -0,46 0,28 0,16 -0,35 0,63 -0,21 0,03 0,09 -0,25 -0,31 0,43 0,21 0,47 0,53 0,60 0,74 0,11 0,33 0,75 0,11 1,00
Y -0,40 0,32 0,00 -0,19 0,68 -0,10 0,11 -0,09 -0,19 -0,13 0,52 0,03 0,45 0,10 0,97 0,81 0,01 0,29 0,72 -0,04 0,70 1,00
132
Pela apreciação simultânea das tabelas 6.6 e 6.9, observa-se que as correlações
entre os elementos químicos é diferente para ambos os grupos amostrais, o que revela
automaticamente a existência de diferentes processos hidroquímicos a decorrerem nos
diferentes pontos de amostragem.
O Ca2+ é dos elementos onde essa variação é mais notada. Na matriz inicial (Tabela
6.6), o Ca2+ apresenta uma correlação muito forte com o SO42-, indicando que as condições
químicas presentes são mais oxidantes e propícias à dissolução de gesso (CaSO4•2H2O). Esta
dissolução ocorre onde existem reacções redox que se encontram perfeitamente associadas
aos processos de drenagem mineira (ver capítulo 2). Já quando há separação do grupo
amostral (as amostras associadas à contaminação são retiradas), o Ca2+ correlaciona-se
fortemente com o ião HCO3-, podendo estar a indiciar a percolação da água pelas rochas e
seu sucessivo enriquecimento em Ca2+ e HCO3- (Appelo e Postma, 1996). Estes dados estão
de acordo com os mostrados na secção anterior relativamente às fácies hidroquímicas, onde
as águas que não apresentam qualquer tipo de contaminação podem surgir com fácies
bicarbonatadas cálcicas.
O novo posicionamento das variáveis no primeiro plano factorial, também, evidencia
alteração no comportamento dos elementos químicos (Figura 6.13).
Figura 6.13 Projecção das variáveis activas e suplementares da matriz no primeiro plano factorial para a separação óptima alcançada no final da metodologia
133
O total da variância explicada por ambos os eixos diminui. As variáveis encontram-se
mais dispersas no plano factorial.
6.4.1.3 Síntese dos resultados
A aplicação da ACP segundo a metodologia definida no fluxograma permitiu distinguir
os principais processos hidroquímicos que estão a decorrer na área de estudo. A separação
em diferentes grupos amostrais permitiu:
• a identificação de variações hidroquímicas dentro do grupo amostral;
• a identificação de águas não contaminadas de águas contaminadas;
• a identificação dos elementos químicos associados à DMA;
• a visualização de variações temporais e espaciais das características hidroquímicas
das águas;
Através da projecção dos resultados médios obtidos para cada local no mapa da
área, antes e após a obtenção da anomalia global máxima onde se obteve a separação
óptima dos subconjuntos, é possível constatar que a aplicação desta metodologia melhorou
significativamente a interpretação dos resultados. Entre ambas as figuras (Figura 6.14 e
Figura 6.15) é possível observar um refinamento dos resultados permitindo a distinção
significativa das águas pertencentes ao subconjunto do fundo geoquímico.
Da figura 6.15 é, ainda, possível concluir que:
• Amostras de água da mesma litologia apresentam valores distintos no 1º factor, isto
é, têm diferentes composições químicas; daqui, se conclui que a litologia não é um
parâmetro que nestas condições influencie o tipo de água;
• a presença de falhas por si só também não é, uma vez que pontos de amostragem
localizados sobre falhas e na mesma litologia tem diferentes composições. Assim, as
falhas apenas são um factor determinante para a propagação de contaminação
quando existe comunicação hidráulica entre o interior da mina e o ponto de
amostragem.
134
Figura 6.14 Projecção dos valores médios do 1º factor resultante da aplicação da ACP à matriz completa (78 amostras x 22 variáveis)
Figura 6.15 Projecção dos valores médios do 1º factor resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos (57 amostras x 22 variáveis)
135
A projecção espacial dos valores factoriais das amostras para cada uma das
amostragens efectuadas encontram-se nas figuras 6.16 à 6.20.
Figura 6.16 Projecção dos valores do 1º factor para a amostragem de Abril de 1998 resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos
Figura 6.17 Projecção dos valores do 1º factor para a amostragem de Outubro de 1998 resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos
136
Figura 6.18 Projecção dos valores do 1º factor para a amostragem de Abril de 2003 resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos
Figura 6.19 Projecção dos valores do 1º factor para a amostragem de Outubro de 2003 resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos
137
Figura 6.20 Projecção dos valores do 1º factor para a amostragem de Junho de 2004 resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos
Figura 6.21 Projecção dos valores do 1º factor para a amostragem de Outubro de 2004 resultante da aplicação da ACP após a separação óptima dos subconjuntos
É possível concluir das figuras que há variações nos locais de amostragem
dependendo da época das amostragens. As variações não são maiores devido ao facto de, a
138
partir de 2003, os anos hidrológicos terem sido anómalos não apresentando as variações
hidrológicas previstas para a altura da recolha das amostras.
Este trabalho desenvolvido através da aplicação da ACP e suas interpretações foram
bastante produtivas no sentido de funcionar como um sistema de alerta para situações e
pontos de amostragem. Assim, permite partir para a modelação geoquímica com uma
perspectiva completamente diferente.
Contudo, uma vez que se está a trabalhar com um grupo amostral bastante grande e
diversificado, alguns aspectos de reacções hidroquímicas podem ficar dissimulados. Tal
acontece, por exemplo, com a correlação entre o Fe e o SO42-. A fraca correlação existente
entre o Fe e o SO42- para ambas as tabelas de correlação poderia indicar que a oxidação da
pirite não é a reacção dominante nestas águas, incluindo as águas de mina. No entanto,
quando se aplicam coeficientes de correlação apenas às amostragens ocorridas em cada
local, denotamos que o coeficiente de correlação aumenta para valores superiores a 0,90
para as descargas directamente influenciadas pela mina (Tabela 6. 10).
Tabela 6. 10 Coeficientes de correlação entre o Fe e o SO42- obtidos para as descargas mineiras
Local de
amostragem Coeficiente de correlação
entre o Fe e o SO42-
M1 0,92
M3 0,99
E1 0,98
Para suprimir este problema, aos resultados obtidos através da ACP, foram aplicadas
técnicas de modelação hidrogeoquímica recorrendo ao programa PHREECQI (capítulo 7). A
conjugação de ambos os métodos permite obter duas abordagens diferentes do problema:
uma global onde é feita uma caracterização integral da área de estudo (quer a nível espacial
quer temporal) e outra específica, onde através dos dados obtidos anteriormente irá ser
realizado um estudo pormenorizado de alguns dos locais de amostragem.
Através dos dados obtidos nos diferentes tipos de captações foi possível identificar
que a contaminação mineira está a interferir nos níveis freáticos de tal modo que a utilização
actual das águas subterrâneas na envolvente deste Couto Mineiro deverá ser analisada no
contexto dos mecanismos que controlam a mobilidade dos metais, tendo em vista a
implementação de processos prévios de tratamento para rectificação da sua composição
química.
139
6.5 Índice de Contaminação Mineira
A Comunidade Europeia, através das suas políticas ambientais, recomendou medidas
que visam a redução e eliminação de locais de poluição pontual e difusa. Os objectivos
destas leis foram abordados no capítulo 1.
O estudo, a caracterização e a monitorização de problemas ambientais (quer seja em
águas, solos, ar,....) exigem uma abordagem, pelos investigadores, multidisciplinar de
conhecimentos e de uma grande quantidade de dados científicos.
Um dos maiores problemas na aplicação destas leis é a transmissão do conhecimento
entre a comunidade científica, os políticos e a comunidade em geral, em especial, aos
políticos que aplicam as leis. A necessidade de criação de ferramentas, pelos investigadores,
que ajudem na transmissão dos problemas e a aplicação das leis torna-se essencial.
O uso de índices de qualidade pode ser uma das ferramentas que permite a ligação e
a comunicação entre todos. Estes índices são criados e desenvolvidos com o objectivo de,
rapidamente, associarem uma larga quantidade de informação a um único valor e, assim,
permitir uma compreensão dos dados científicos.
O objectivo principal deste capítulo é a criação de um índice de contaminação mineira
das águas que permita às pessoas, fora do domínio científico da drenagem mineira,
entenderem o problema e poderem usar este índice como um guia nos trabalhos de
monitorização que se desenvolvam em áreas afectadas por antigas minas.
6.5.1 Metodologia
As técnicas estatísticas multivariadas, Análise de Componentes Principais (ACP) e
Análise Factorial de Correspondências (AFC), podem ser utilizadas na construção de um
Índice de Contaminação Mineira da Água Subterrânea (ICMAS) (Ribeiro, 1996; Pereira e
Sousa, 2000; Stigter, 2005; Stigter et al., 2006).
A ACP já foi utilizada anteriormente neste capítulo; todavia, a metodologia empregue
na construção do ICMAS é distinta. Os passos gerais a seguir para a construção de um índice
são:
• selecção das variáveis a serem integradas no ICMAS;
• selecção de critérios e definição de duas amostras fictícias que representem a melhor
e a pior qualidade que a água pode ter;
140
• extracção dos factores baseando-se apenas nestas duas amostras. As amostras reais
são tratadas como suplementares;
• cálculo do índice de contaminação através da projecção das amostras de água no 1º
eixo factorial.
O estudo de ACP efectuado precedentemente demonstrou que as variáveis que
estavam correlacionadas com a contaminação mineira eram: a conductividade eléctrica (EC),
SO42-, Mg, Al, Zn, Mn, Be, Y, Li, Co, Ni e o pH.
Contudo, para um índice ser facilmente aplicável convém ter o menor número de
variáveis para tornar a sua utilização mais acessível.
Os elementos químicos podem apresentar correlações entre eles. Tendo em conta
esta observação, para a selecção das variáveis a serem integradas no índice de
contaminação, efectuou-se uma análise das dependências entre os elementos, de modo a
verificar se a sua inclusão era necessária ou não.
O pH da água na área de trabalho apresenta um valor máximo de 6,84 o que é um
valor pouco superior ao valor guia definido na lei (6,5). Águas com valores baixos de pH são
típicos destes tipos de litologias atravessadas pelas águas (ver capítulo 3), não podendo,
neste caso, ser considerado um indicador de qualidade da água. Também, o facto de se
introduzirem para o cálculo do as drenagens mineiras ácidas e neutras faz com que o seu
uso como variável seja incorrecto.
Foi reconhecido, nas secções anteriores, que as águas que apresentavam
contaminação mineira eram sulfatadas magnesianas. Assim, é possível retirar o magnésio
uma vez que o aumento deste elemento na água está estreitamente correlacionado com o
sulfato.
O manganês, que é um constituinte muito comum em drenagens mineiras de carvão,
usualmente, persiste na água mesmo a longas distâncias, só desaparecendo da solução após
um longo tempo (Hem, 1985). A permanência em solução dos constituintes que estão
ligados à drenagem mineira é muito importante pois permite a sua utilização como traçador.
Esta característica é primordial para um elemento ser integrado num índice de
contaminação.
141
Um estudo das concentrações do zinco no grupo amostral leva a presumir que a
origem deste elemento nas águas seja mais do que uma. Como se pode observar no anexo C
há um decréscimo acentuado de concentração em alguns locais tais como:
• na descarga da mina M1 de 1998 até 2004 (de 1,1 para 0,182 mg/L);
• no furo F13 desde a sua construção em Fevereiro de 2003 (primeira amostragem em
Abril do mesmo ano) até Outubro de 2004 (variação entre 6,96 e 0,34 mg/L);
Presume-se que estas variações severas possam estar associadas à dissolução do
zinco presente nos tubos. As flutuações sazonais nos restantes furos podem estar ligadas à
interacção água /rocha, mas também podem estar associadas à mesma fonte de poluição
antropogénica. Por esta razão, não é aconselhável o uso do zinco na construção do índice.
Nas tentativas realizadas de obter o melhor índice possível, foi verificado que as
presenças do itrío e do berílio, no cálculo do índice são extremamente pequenas, optando-se,
assim, por retirar estes dois elementos.
O cobalto, em águas não contaminadas, tem concentrações de apenas alguns µg/L.
Nas águas analisadas, o valor de cobalto atinge valores de 1000 µg/L quando associado à
contaminação. A abundância do níquel é maior que a do cobalto na crusta terrestre. São dois
elementos que têm algumas características similares como, por exemplo, a sua tendência
para co-precipitar com óxidos de ferro e, especialmente, com óxidos de manganês (Hem,
1985). Como a correlação entre estes dois elementos não é muito forte para as águas
analisadas, optou-se por manter os dois para o cálculo do índice.
Tendo em consideração estas observações, a construção de um índice de
contaminação mineira teve por base os seguintes elementos: sulfato, ferro, alumínio,
manganês, níquel, lítio e cobalto.
A base de dados, utilizada nos capítulos anteriores, inclui quer águas subterrâneas
quer superficiais. O estabelecimento de um índice não permite a utilização de ambas ao
mesmo tempo pois os processos químicos que ocorrem são diferentes. As colheitas de águas
nos rios envolventes (A1, A2, A3 e A5) foram realizadas apenas com o objectivo de servirem
de pontos de controlo químico das descargas da escombreira (E1) e do nível 20 da mina
(M1). As diferenças químicas entre os diversos pontos são enormes o que utiliza-los para a
construção de um índice de contaminação de águas superficiais seria erróneo.
Para a definição das duas amostras fictícias (Tabela 6.11), que correspondam aos
limites superior e inferior do índice, utilizaram-se as concentrações mínimas e máximas
142
encontradas para os parâmetros químicos do grupo amostral formados pelas 50 amostras de
águas subterrâneas. Na análise fictícia de concentração mínima o único valor que não
corresponde aos limites de detecção é o sulfato.
Tabela 6.11 Definição dos limites das amostras para a construção do ICMAS (todos os valores em mg/L)
SO42- Li+ Fe2+ Al Mn Ni Co
Concentração máxima
2564 0,43 336 17,8 36,8 1,4 1,1
Concentração mínima
4,3 O,008 0,0025 0,001 0,005 0,0004 0,00002
Por último, a extracção dos factores foi efectuada numa matriz de duas amostras
activas (as amostras fictícias) e 7 variáveis. O resultado é a extracção de um único factor
que explica 100% da variância dos dados. Este factor corresponde ao ICMAS e varia num
intervalo de -1 (melhor composição) e 1 (pior composição).
As amostras reais são introduzidas no programa como amostras suplementares (isto
é, a sua presença não contribui para os cálculos efectuados na extracção do factor) para
obtenção da sua localização no factor extraído. É definido, deste modo, o grau de associação
que as amostras reais tem com as amostras fictícias que definem a melhor (-1) e a pior
composição que as águas podem ter (1).
6.5.2 Aplicação ao caso de estudo
A construção do ICMAS foi efectuada de acordo com a metodologia definida na
secção anterior. No total foram utilizadas todas as amostras de águas subterrâneas
recolhidas entre 1998 e 2004. A análise química da água da chuva, correspondendo a uma
água desmineralizada, foi incluída, para servir de guia na projecção das amostras.
Na Figura 6.22 estão representados os resultados obtidos.
Figura 6.22 Índice de contaminação mineira para águas subterrâneas (ICMAS) obtido através da aplicação da ACP segundo a metodologia definida (a identificação das amostras foi sobre elevada para melhor identificação dos pontos que se encontram sobrepostos)
143
A primeira ilação que se pode retirar da figura 6.22 é que a maioria dos dados se
encontram muito próximos do valor -1 (melhor composição). Isto deve-se à circunstância de
as concentrações máximas e mínimas dos elementos químicos, usados para a definição das
amostras fictícias, serem muito díspares. O facto de serem usadas as amostras da descarga
mineira M1, com concentrações muito altas (Anexo C), faz com que as restantes amostras
sejam projectadas para o lado negativo do índice.
Outra dedução é que os valores que definem a análise fictícia de pior composição não
se baseiam, exclusivamente, nas concentrações num local de amostragem. É a variável
alumínio que interfere na composição final desta análise fictícia. As características químicas
de dissolução e precipitação do alumínio estão estreitamente relacionadas com o pH da água.
A partir de pH superiores a 4,5 o alumínio tende a precipitar, enquanto para valores
inferiores tende a ficar dissolvido. Altas concentrações de alumínio são esperadas para as
drenagens mineiras ácidas como é o caso da descarga M3. A eliminação do alumínio como
variável do índice mascara os problemas de contaminação mineira em locais de pH mais
baixo, através da deslocação das amostras para o lado negativo do factor. A deslocação é
bastante marcada para a descarga de mina M3 e o furo F19 (Figura 6.23) onde o alumínio é
uma variável muito importante. Isso faz com que aumente a disparidade entre o grupo de
amostras, não sendo, por isso, uma solução a tomar.
Figura 6.23 Projecção das amostras reais após retirada da variável alumínio no cálculo do índice de contaminação (a identificação das amostras foi sobre elevada para melhor identificação dos pontos que se encontram sobrepostos)
A projecção localizada de quase todas as amostras dos furos não demonstra a
ausência de contaminação mineira mas sim uma discrepância dos valores das concentrações
encontradas na área de estudo. Assim, o ICMAS tem que ser utilizado, neste caso concreto,
com algum cuidado.
144
6.5.3 Considerações finais
Embora os resultados alcançados ficassem aquém do esperado uma vez que se está
perante uma área muito complexa a nível geológico, a metodologia utilizada neste índice
poderá ser utilizada noutros locais e com resultados mais satisfatórios. Para tal, basta que na
definição das amostras fictícias de água as variações entre amostras reais sejam menos
elevadas.
As variáveis utilizadas para a construção do índice revelaram-se apropriadas. As
várias experiências realizadas para diminuição do seu número demonstraram que tal
prejudicava a fiabilidade dos resultados. Um exemplo destas tentativas foi dado através do
cálculo do índice com a exclusão da variável alumínio (Figura 6.23).
As águas analisadas são águas naturais, sem qualquer tipo de tratamento, onde os
limites dos valores guia definidos na lei, para águas para consumo humano, são muitas
vezes excedidos. Tal pode não representar uma contaminação, mas apenas ser o reflexo das
litologias atravessadas. No entanto, é possível realizar uma análise, onde as características
da geoquímica de fundo são retiradas e salientar os problemas associados à contaminação
mineira. Pelas razões expostas, este índice não pode ser considerado um índice de qualidade
da água mas sim um índice de composição da água subterrânea.
De realçar que várias tentativas foram realizadas na procura de um índice que
expressasse da melhor maneira possível os problemas das águas afectadas pela
contaminação mineira. Outras metodologias foram aplicadas, como a Análise Factorial de
Correspondência, mas sem êxito. A razão principal para este insucesso, deve-se ao facto de
se estar a trabalhar com águas quimicamente muito complexas.