20º congresso brasileiro de sociologia 12 a 17 de julho de
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20º Congresso Brasileiro de Sociologia
12 a 17 de julho de 2021 UFPA – Belém, PA
Comitê de Pesquisa: CP20 – Pensamento Social
DAS RAÍZES AO DESPEJO: A FOME ENTRE A CORDIALIDADE E A VIOLÊNCIA NA CULTURA BRASILEIRA
Marilia Gabrielle de Paula
Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP)
Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES)
1
Das raízes ao despejo: a fome entre a cordialidade e a violência na cultura brasileira1
Marilia Gabrielle de Paula2
Resumo
Este estudo parte de uma investigação sobre a fome - construída como conceito -, e pensada como um dos aspectos centrais do desenvolvimento da modernidade brasileira, na qual operaria não apenas como produto inerente à desigualdade, mas como componente atuante na forma de um mecanismo inserido em nosso imaginário moderno. Desse modo, três hipóteses principais se apresentam como direção do problema traçado, que seriam costuradas na análise da fome enquanto signo, portanto, como importante emblema expressivo na construção de um conjunto mais amplo e representativo de crenças coletivas. Seguido de sua delimitação epistemológica, considerando-a um tipo específico de violência, mais estritamente como um ponto marginal da cordialidade - termo que ganhou estatura conceitual em Raízes do Brasil (1936) -, propõe-
se inferir que a fome se moveria por um trânsito de poder, especialmente de afetos, no qual assumiria dois modos fluídos de operar: um condicionante e, outro, condicionado, no que se refere ao discurso cultural e político desse processo. Por consequência e, em terceira instância, além das fundamentações sociológicas, este trabalho buscou se valer, de forma medular, da obra Quarto de despejo: diário de uma favelada (1960)
de Carolina Maria de Jesus, concebendo-a como produção literária relevante a integrar contribuições às vertentes temáticas do pensamento social brasileiro.
Palavras-chave: fome, cordialidade, literatura, violência, modernidades periféricas.
Introdução
Embora seja vasto o campo e o acúmulo de ensaios teóricos que trataram os
conceitos e elementos acerca dos processos de formação da sociedade
brasileira, é perceptível ainda, precisamente por nossa complexidade histórica, o
leque de possibilidades vigorosas que continuam se apresentando para se pensar
a cultura do país. Por essa razão, este artigo se debruça sobre um tema que, por
envolver uma dimensão orgânica em aspecto biológico, por vezes se naturalizou
também nas discussões sociais que ora foram analisadas no campo da saúde,
como meta política a ser superada, ora instrumentalizadas em um campo de
disputa imerso em nosso imaginário coletivo e cultural enquanto nação.
Nesse sentido, este trabalho propõe, como escopo primeiro, uma investigação
sobre a fome que busca formulá-la como conceito, apoiando-a no pressuposto de
que ela teria sido parte central do desenvolvimento da modernidade brasileira, um
1 Este presente artigo, apresentado ao 20º Congresso Brasileiro de Sociologia, compõe pesquisa mais ampla
iniciada recentemente, a qual dá base ao desenvolvimento de minha tese de doutorado. Em seu andamento estão
contidos, de modo mais refinado, os detalhamentos em relação às referências teórico-metodológicas utilizadas e às
etapas pretendidas no resumo submetido para a participação neste Comitê de Pesquisa, e que serão aprimoradas
também a partir das contribuições realizadas nesta sessão. Como a pesquisa está em construção e, em vista do
recorte temático do comitê, foram compilados nesta síntese os principais apontamentos referentes ao escopo
preliminar de hipóteses, alguns indicativos de seus resultados e os caminhos tencionados para o seu seguimento. 2 Doutoranda em Ciências Sociais pelo PPGCS da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP) adequado à
linha de pesquisa: Pensamento, Conhecimento, Expressão.
2
elemento constitutivo dela, não apenas um produto inerente à desigualdade, mas
uma engrenagem sistêmica, operativa e produtiva, do imaginário moderno. Desse
modo, além de se sustentar evidentemente em fundamentações sociológicas, o
objetivo em tratá-la nesses termos decorre, de forma medular, da obra Quarto de
despejo: diário de uma favelada, de Carolina Maria de Jesus, publicada pela
primeira vez em 1960, concebendo-a como produção literária relevante para as
vertentes da área de pesquisa do pensamento social brasileiro.
Por esse ângulo, uma análise mais minuciosa dos desdobramentos da obra,
parece nos permitir também apontar, a partir dela, os desdobramentos
epistemológicos aplicados no desenvolvimento de tal narrativa, ou seja, na
medida em que surgem as aberturas que essa obra fornece, pretende-se elaborar
a ideia da fome como categoria portadora do estatuto de um signo. Isso significa
assinalar, de antemão, uma escolha metodológica que apoiada na literatura
estabelece suas bases para a formulação, por sua vez, de um conceito
sociológico.
Sendo assim, três hipóteses principais se apresentam como direção do
problema traçado, as quais seriam costuradas no esquadrinhamento conceitual
da fome. Em primeira instância, a da possibilidade de o termo ser pensado
também no espaço simbólico, portanto, como importante emblema expressivo na
construção de um conjunto representativo de crenças coletivas. Já, em segundo
espectro, na esteira desse registro preliminar seria articulada a sua delimitação
como um tipo específico de violência, mais estritamente como um ponto marginal
da cordialidade, termo que ganhou estatura conceitual em Raízes do Brasil (1936)
e que será mais discutido a diante.
Os objetivos aqui pretendidos envolvem investigar como a categoria fome
pode emergir tensionada pelas noções de cordialidade e de violência, isto é,
tratada em seu aspecto social e formulada em termos cordiais, construída no
âmbito cultural e negligenciada dentro do aparato de Estado. Assim, na junção da
violência, aqui proposta na qualidade de denominador comum entre a fome e a
cordialidade, teríamos uma das importantes bases para a definição dos
movimentos contraditórios que marcam o desenvolvimento da modernidade
brasileira. Processo em que a fome seria recriada periodicamente enquanto
3
símbolo afetuoso e espacial, composto pelo desterro e pelo despejo, ora
marginalizado ora aproximado do coração, por isso, cordial e violento.
Aqui, o conceito de cordialidade não é tratado em seu aspecto ligado à
concórdia, mas é explorado e problematizado, sobretudo, naquilo que se
aproxima de uma espécie de “fetiche da igualdade” (SALLES, 1994) ou de um
consenso “ilusório”. Um “horror às distâncias”, um mediador das relações nas
quais as distâncias sociais mais pronunciadas, quase gritantes, ganham a
aparência de encurtamento em que contribuem para que situações de conflito,
frequentemente, pareçam não resultar em conflito de fato. E que embora
carreguem questões e desafios latentes, “resultem”, por sua vez, em uma
aparente “conciliação” como um acordo tácito em torno de valores tidos como
verdadeiros por todos.
Se entendemos que o decênio de 1930 inaugura um marco temporal
importante diante da noção de um Brasil moderno em consolidação, se nesse
mesmo período o conceito de cordialidade aparece também como categoria
disputável dentro das leituras sobre o país e, se em Quarto de despejo vê-se
desenrolada uma ótica que interroga a aspiração moderna da década de 1960
através de um enredo que protagoniza ideia da fome emergindo como um
emblema significativo entre o Estado e os indivíduos, possíveis convergências,
suas nuances e suas contradições podem estar inscritas nesse processo.
A subjetividade que marca o diário enquanto gênero textual não aparece
como impeditivo ao estudo sociológico, já que as intersecções e a ótica que
direcionam a autora vão além da visão que reduz sua escrita a um simples
“registro da realidade”, pois permeiam contradições substanciais da nossa
sociedade, internalizadas e estilizadas pela escritora, sendo necessário evitar
rótulos ao tentar compreender suas posições. Mobilizar o passado através do
presente crítico e assentar em teorias que permeiam, sobretudo, a sociologia
brasileira é o que dá substrato ao processo de acionar a literatura como
ferramenta interlocutora desse tema.
Além dessas considerações, o manuseio metodológico parte da perspectiva
genealógica de Michel Foucault (2014). Esta que confere ao sociólogo, a quem
interessa a necessária relação entre o texto construído e as condições sociais que
permitiram a sua emergência, a possibilidade de pincelar vários objetos de
4
diversas dimensões para traçar a problemática que estuda. Portanto, a
genealogia não possui como propósito mostrar o sentido do que constituímos,
mas busca apreender o engendramento dos acontecimentos3 particulares que
edificaram nosso presente histórico, assumindo a tarefa de discerni-los enquanto
singularidades, as quais, de algum modo, prosseguem nos transpassando. A
tarefa consiste em percorrer a história, relevando seus deslocamentos, quebras e
substituições, tornando visível outras possibilidades de interpretação das que
foram concebidas pela primazia de visões dominantes e totalizantes.
Se, consideramos a fome, nessa perspectiva de categoria, e não apenas por
aquilo que a define a partir da experiência da escassez e da restrição, a literatura
abre outros caminhos interpretativos a tais significados dados a essa mesma falta
que habita o corpo, sendo, nesse sentido, algo que ultrapassaria o seu aspecto de
déficit tornando-a, contudo, uma espécie de mecanismo sistematizado em uma
determinada lógica, isto é, que exerce um papel e, por isso, parece emergir com
consequências complexas quando relacionadas, desse modo, a um problema
mais amplo inserido nos âmbitos cultural e político do pensamento social
brasileiro.
Em vista disso e, depurada com base em deslocamentos contidos no diário
Quarto de despejo, essa dimensão que reconstrói a fome alicerçada ao seu
entendimento enquanto categoria propositiva, sem tratar somente daquilo que
“não se tem” implicado em sua caracterização mais direta, permitiria, então,
propor a sua análise vinculada à edificação de um imaginário moderno brasileiro
devido principalmente à sua possível relação com as instituições políticas
nacionais formadas a partir do início da década de 1930.
Nesse sentido, estaríamos diante também de uma insígnia produtora de um
encadeamento que, só porque se engendra nesse mecanismo, poderia se
perpetuar de tal maneira. Logo, sendo signo relativo a um projeto de sociedade e,
importante ressaltar, que seu aspecto produtivo não está ligado a consequências
positivas, ao contrário, apreendida nesses termos poderíamos inferir que a fome
se moveria ainda - em terceira instância das hipóteses mencionadas
3 “Certamente o acontecimento não é nem uma substância nem acidente, nem qualidade, nem processo; o acontecimento não é de ordem dos corpos. Entretanto, ele não é imaterial; é sempre no âmbito da materialidade que ele se efetiva, que é efeito; ele possui seu lugar e consiste na relação, na coexistência, na dispersão, no recorte, na acumulação e na seleção de elementos materiais; não é o ato nem a propriedade de um corpo; produz-se como efeito de e em uma dispersão material.” (FOUCAULT apud FONSECA, 2015, p. 246)
5
anteriormente -, por um trânsito de poder, especialmente de afetos4, no qual
assumiria dois modos fluídos de operar: um condicionante e outro condicionado,
no que se refere ao discurso político e cultural desse processo.
No livro, o cotidiano da favela é delineado através do discurso que parte da
compreensão de quem o experiencia, portanto, da elucidação de um novo locus
de narrativa pensada, contudo, por uma mulher negra, migrante de Sacramento -
Minas Gerais, “escritora, lavradora, catadora de papel, compositora, sambista,
poetisa, dramaturga, cantora, atriz circense, raizera” (PERES, 2007, p.60) que
cursou até o segundo ano do ensino fundamental5, mãe solo e moradora de
Canindé, primeira grande favela de São Paulo.
O diário, ao se aproximar de um imaginário denunciado, cumpre, logo, um
lugar em que um cenário teórico não somente é desvelado, mas também
construído e interpelado pela literatura no que se refere, sobretudo, à brutalidade
da miséria e da fome em sua intersecção com marcadores étnico-raciais. A
problemática aqui proposta passa, então, a ser concebida partindo de uma
interlocução que trata a periferia como ponto de vista em sentido dilatado em
relação à margem que a designa no espaço geográfico. Assim, essa expansão
alegórica só se torna possível na medida em que a compreendemos também
como uma ideia, isto é, como uma noção organizada e enunciada
sociologicamente se estabelecendo, do mesmo modo, como um lugar simbólico
disputável.
4 O termo será tratado, neste momento, apoiado em seu significado etimológico advindo do latim afficere, afectum:
produzir impressão; afficere ad actio: próximo ao sentido de “onde o sujeito se fixa” ou “onde o sujeito se liga”. A partir desse ponto, sugiro considerar uma compreensão mais ampla sobre os modos de compor e de edificar uma sociedade, sobretudo no que se refere aos impactos e às forças de adesão social construída por meio das afecções que, evidentemente, não são tácitas. O que proponho pensar é que poder e normatividade, os quais permeiam o campo político por excelência, são atravessados também por aspectos culturais que, por sua vez, incidem sobre outras formas distintas de negativar determinados grupos com base nas emoções e na violência capaz de se produzir a partir delas. “Uma sociedade que desaba são também sentimentos que desaparecem e afetos inauditos que nascem. Por isso, quando uma sociedade desaba, leva consigo os sujeitos que ela mesma criou para reproduzir sentimentos e sofrimentos.” (SAFATLE, 2016, p.8) 5 Destaque à recente concessão do título de Doutora Honoris Causa à escritora Carolina Maria de Jesus aprovada por unanimidade em 09 de novembro de 2020 pelo Conselho de Coordenação do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), sendo a homenagem póstuma sugerida pela Direção do Instituto de Filosofia e Ciências Sociais (Ifcs). Na justificativa, é importante ressaltar que a comissão salienta a relevância crescente da escritora quanto às temáticas de pesquisas acadêmicas desenvolvidas no âmbito da CAPES nos últimos seis anos, principalmente no que se refere a seu papel, assinalado pelo conselho, “fundamental na luta antirracista”, dada a necessidade de “reparação histórica do apagamento não de uma personalidade, mas de um segmento étnico que historicamente foi negado o lugar na cultura nacional” e do silenciamento de “mulheres como Carolina Maria de Jesus como parte da produção da literatura brasileira” que contou com a colaboração das próprias instituições acadêmicas. Além disso, afirmam a necessidade de que a reparação, que se inicia no interior da Universidade, se estenda para a sociedade. O parecer da Comissão Acadêmica pode ser acessado na íntegra através do endereço digital: http://www.cfch.ufrj.br/images/parecer_comissao_academica_cfch_honoris_causa_carolina_de_jesus
6
Localizando olhares interpretativos
No entanto, ao pretender tal análise, é preciso partir, invariavelmente, de uma
contextualização dos dilemas e nuances que, assim, também sustentam a fortuna
crítica do pensamento social brasileiro dedicado a algumas questões centrais
para este trabalho. Grosso modo, de um lado dos impasses6 da tradição, há
leituras que tencionam os debates se assentando no caráter da falta ou da
incompletude, uma narrativa que se desenvolveu com base nos apontamentos
daquilo que não teria logrado êxito e dos fundamentos que não atingimos como
nação e, portanto, da falha na busca de uma “identidade” que foi idealizada como
alcance de um fim projetado e emancipatório.
Nessa esteira, observamos principalmente questões ligadas ao conceito de
modernidade7 e aos embaraços que cercam sua implementação tanto na
mentalidade em âmbito cultural quanto nas transformações dos arranjos de
ordens econômica, política e social. Assim, o desvio e o atraso enunciados, em
termos de “civilidade” brasileira recebem a denominação “arqueologia da
ausência”, cunhada por João Cezar de Castro Rocha (1998), a qual seria uma
“avaliação das produções culturais que se baseia na identificação da ausência
deste ou daquele elemento, ao invés da análise dos fatores que efetivamente
definem o produto cultural estudado” (ROCHA, 1998, p.79), notada com
frequência na bibliografia sobre o tema.
Partindo dessa ótica, mesmo que a procura pelo assim chamado sentimento
íntimo ou da terra8 apresente notável potencialidade analítica, ela revela também
uma debilidade devido ao seu esfacelamento frente a uma noção que
sobejamente nos cimentou, de certo modo superficialmente, como desajustados
quando se trata de pensarmo-nos como um “nós” na contraface de um “outro” e,
nesse sentido, me parece mais proveitoso percorrer a fundo a investigação sobre
as razões dessa consideração.
6 Cf. PAULA, 2018, pp. 11-14 e pp.133-135; ROCHA, 2006, pp.27-28; SCHWARCZ & BOTELHO, 2011a, pp.11-16; Idem, 2011b, pp.139-159. 7 A noção de modernidade que é assumida na explicitação desse dilema está associada à sua formulação mais consolidada, isto é, àquela atribuída ao contexto padrão e hegemônico referente ao desenvolvimento em termos de racionalização da Europa central a partir do século XIX. Segundo Jürgen Habermas (2000), ainda que o termo tenha sido definido pela primeira vez de forma mais distintiva no âmbito da filosofia, com Friedrich Hegel, é a partir da acepção sociológica clássica de Max Weber [1904-5] (2004), que o conceito de modernidade emerge com porte notoriamente sólido apoiado na célebre análise que propõe sua afinidade com o racionalismo ocidental advindo do processo de desencantamento do mundo. 8 Cf. ASSIS, [1873] (1979), p.3.
7
De outro lado, o pensamento social no Brasil também esteve envolvido com a
averiguação do surgimento de características particulares consideradas, dessa
vez, alicerces de um percurso singular, fazendo isso por meio da exaltação do
traço local e revelando o que tínhamos de mais peculiar, antes visto como
inferioridade, e posteriormente convertido em matéria necessária de ser estudada.
Tendo afastado a ideia de falta ou de vazio, as teorias que fundaram a busca
por uma identidade nacional ao acentuar em tom favorável a miscigenação e a
denotar a liquefação no trato da relação entre as esferas pública e privada - que
submeteria a primeira ao domínio da segunda -, deveram-se, sobretudo ao
movimento modernista de primeira geração e aos intérpretes do Brasil, como
Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda, análises nas quais o conceito de
cordialidade é examinado em contexto brasileiro. Sendo assim, para o
desenvolvimento da problemática farei a discussão na tensa fronteira que media
as duas linhas de abordagem - a do cânone como ausência e a da delimitação da
singularidade -, com a finalidade de situar minha questão central na amplitude de
suas distinções.
Tratar a fome como signo, nesses termos, seria um modo de desestabilizar
em alguma medida as premissas desse cenário. Então, partindo de uma
perspectiva que considera a cordialidade em uma tessitura cultural mais extensa
de autores e produções (PAULA, 2018)9, pode-se observar que o conceito não
aparece exclusivamente na obra de Sérgio Buarque, mas, ao contrário, se
estabelece como um ideário de época amarrado a um longo deslocamento
histórico na identificação de uma circulação interpretativa acerca do assunto. A
viabilidade da existência desse fluxo de percepções tece o fio que alinhavava um
conjunto mais variado de concepções tangentes, de alguma maneira mesmo que
indireta, e não menos densa por isso, aos interesses de discussão em torno
desse tipo de convívio10.
Ao acompanhar essa hipótese, é plausível considerar que a noção de
modernidade enquanto processo se decodifica também por meio do texto literário
9 O trabalho mencionado examinou o ideário de época partindo da análise de obras dos literatos Manuel Bandeira e Mário de Andrade. 10 Alusão a uma das definições clássicas sobre o homem cordial: “forma natural e viva que se converteu em fórmula” (HOLANDA, 1995, p.147).
8
de Carolina Maria de Jesus. Durante meados das décadas de 1950 e 196011, a
obra perpassa o desenvolvimento12 objetivo e simbólico da modernização através
do prisma da fome, a qual trafega pelo diário como uma personagem trágica e
ativa, operando como signo cultural cuja densidade permite que lhe seja conferida
inclusive uma cor: é “amarela” (JESUS, 2014, p.44), segundo a autora. Nesse
contexto, conceber o presente e imaginar esse moderno se entrecruzam, quase
que inevitavelmente, com a cordialidade em uma dimensão polissêmica que
carrega a violência em um de seus principais aspectos afetivos, o que permite
abrir a chave que é proposta neste trabalho. Vejamos13:
“Eu classifico São Paulo assim: O Palacio, é a sala de visita. A Prefeitura é a sala de jantar e a cidade é o jardim. E a favela é o quintal onde jogam os lixos.” (JESUS, 2014, p.32)
Em um período em que o país se industrializa, enredos e personagens vão
ressignificando o par de oposição campo e cidade, já bastante assentado pelo
cânone14, para os pares cidade e subúrbio; centro e periferia; asfalto e morro;
bairro e orla; “casa de alvenaria e barraco”15, todos em uma espécie de
fragmentação que cinde internamente no ponto mais obscuro, e perversamente
cordial, essa sociedade que se aspira moderna. Não seria impreciso, então,
assinalar que marginalidade, nesse contexto, ganha desenho desde a primeira
página de Raízes do Brasil, obra na qual somos designados pelo desterro
(HOLANDA, 1995, p.31) e chega, aqui, no despejo - em sua interface com a fome.
Ao tomarmos um dos trechos mais salientes da crítica de Quarto de despejo,
observamos que a composição dos espaços da cidade, atribuída a um jardim na
analogia citada, desenha, por sua vez, outros pares de oposição: margem/favela
11 Período aproximado ao do prognóstico referente à chave de superação proposta por Sérgio Buarque - em nota polêmica na 2ª edição de Raízes do Brasil - por se tratar de uma resposta à crítica do escritor Cassiano Ricardo (1948) em torno da acepção do conceito. Nela, o considerado um dos intérpretes do Brasil apontava que, com a progressiva modernização nos decênios de 1940 e 1950, o homem cordial estaria fadado “provavelmente a desaparecer, onde ainda não desapareceu de todo” (HOLANDA, [1948] 2006, p.396). No entanto, observa-se que tais relações não foram modificadas conforme seu diagnóstico original e que o homem cordial “(...) não desapareceu com a urbanização das décadas de 40 e 50 do nosso século. Ele se acomodou à nova situação, naturalmente, sofrendo transformações importantes, mas preservando traços nitidamente cordiais, apesar de sua adaptação.” (ROCHA, 1998, p. 27). 12 O diário abrange os intervalos que vão de 15 de julho de 1955 a 28 de julho de 1955 e de 02 de maio de 1958 a 01 de janeiro de 1960. 13 As citações de Quarto de despejo: diário de uma favelada serão transcritas mantendo a integralidade da grafia original do livro. 14 Cf. CANDIDO, 1998 e WILLIAMS, [1973] 1989. 15 Cf. os seguintes trechos: “Cheguei na favela: eu não acho jeito de dizer cheguei em casa. Casa é casa. Barracão é barracão. O barraco tanto no interior como no exterior estava sujo” (JESUS, 1960, p. 47) e “...Os visinhos de alvenaria olha os favelados com repugnancia. Percebo os olhares de odio porque eles não quer a favela aqui. Que a favela deturpou o bairro. Que tem nojo da pobresa.” (JESUS, 1960, p.55). Carolina Maria de Jesus trazia tal dicotomia de modo latente em sua narrativa, temática acurada que desenvolveu posteriormente na obra Casa de Alvenaria: diário de uma ex-favelada publicada em 1961.
9
e sala de visita (“Palacio”); quarto/quintal e sala de jantar (“Prefeitura”), que
justapõem o público e o doméstico e vão se cadenciando nos movimentos de
desterro e de despejo, isto é, expondo um “não-lugar”. Nessa direção,
contribuições a partir de pesquisas sobre o rural e o urbano feitas por Élide Rugai
Bastos e Mariana Chaguri (2015) concentram o olhar lançado à forma como
esses aspectos acarretaram explicações distintas no que diz respeito à
organização complexa do país.
Segundo as autoras, as diferentes posições teóricas sobre democracia e
direitos foram os elementos que serviram como substrato às compreensões
posteriores assentadas nas ideias sobre moderno e modernização em nossa
sociedade. Desse modo, os antagonismos e consonâncias que advêm das
distintas acepções dessas dicotomias centralizam um assunto, que até hoje
envolve o “direito à propriedade e à posse de terra” (BASTOS e CHAGURI, 2015,
p.14) e isso significa transformá-lo em condição que classifica o que é diferente.
Como categoria analítica, a fome, assumida como uma faceta da cordialidade
enquanto um gênero de violência simbólica, nos permite pensar teoricamente em
dilemas impostos pelo tema da democracia que atravessam os alicerces tanto da
esfera política, em macroinstituições, quanto na esfera dos laços sociais.
Reposicionar tais discursos na imersão do imaginário que construímos cria
saídas para variações sobre a questão, as quais não necessariamente têm sido
consideradas. Portanto, ao adotar a concepção de que o “rural” ou o “atraso” não
são apenas contraposições simplistas dos padrões modernos, mas se constituem
como conceitos a se considerar no exame de fenômenos sociais, políticos e
culturais precisamente no bojo de uma concepção específica de modernidade.
Se a cordialidade esteve compreendida a partir do sentido que o próprio
Sérgio Buarque de Holanda deu ao texto, remetendo-se à sua definição
etimológica (HOLANDA, 1995, pp.204-205) ao salientar que cordial deriva de cor,
cordis, coração em latim, o autor frisa16 que o termo não significa gentil, amável e
ainda menos polido, tornando contestável essa percepção por parte da crítica,
uma vez que reduz a definição, generalizando-a e se apoiando em uma leitura,
por vezes, equivocada e psicologizante.
16 Cf. HOLANDA, 1995, p.147.
10
É fundamental sublinhar esse aspecto, pois parece ter havido uma espécie de
assimilação do conceito, por parte da crítica de Raízes do Brasil, muito mais
próxima da definição de Ribeiro Couto17 do que daquela adotada por Sérgio
Buarque. Segundo este último, o homem cordial seria um indivíduo que tem suas
expressões ligadas a um fundo emotivo, de maneira que é bastante controverso
pressupor que ele se refira apenas à concórdia, posto que esse traço, todavia,
pode designar a disposição para condutas extremamente violentas, física ou
simbolicamente.
Os “inhos” que permeiam a nossa comunicação são também preenchidos por
violências e absorvidos quase que como condição para serem atravessados por
uma agressividade de fundo emotivo. Não em absoluto, a espontaneidade
conferida de modo inerente ao “temperamento” brasileiro chega a aceitar modos
de reverência desde que não anulem a possibilidade de convívio mais familiar e
supram o desejo de estabelecer intimidade.
Essa ânsia por convivências mais próximas tem como exemplos, no campo
da linguística, o uso frequente de palavras no diminutivo, visto que sua
terminação tende a nos trazer para mais perto de pessoas ou objetos, ao passo
que se sobressaem os sentidos próximos do coração. Em vista disso, as
dimensões “solar” – afetuosa, acolhedora – e “obscura” – hostil, violenta –
(PAULA, 2018, p.15) desse termo expressam a tentativa terminológica de
conceituar os sentidos que penetram esses eixos. A imagem construída
historicamente no âmbito dos estudos acadêmicos sobre o que somos também
encontra espaço convergente na formulação simbólica que edificamos entre nós.
Isto é, na teia cultural dos papéis sociais que englobam a caracterização de
uma “personalidade” brasileira que nos identifica com base na representação de
povo singularizado apenas sob a luz aparente de qualidades afáveis. Uma
familiaridade que pouco é analisada em sua face capaz de obscurecer
socialmente a relação desigual entre atores ou grupos que possuem
17 Cf. REYES, 1932. A gênese da expressão “homem cordial" é do escritor Ribeiro Couto escrita em carta datada de 7 de março de 1931 e dirigida a Afonso Reyes, o qual publicou um trecho da mesma em sua revista intitulada Monterrey. A cópia do registro original é documento que hoje integra o Arquivo Ribeiro Couto e está sob a guarda do Arquivo-Museu de Literatura da Fundação Casa de Rui Barbosa no Rio de Janeiro. Segue trecho da correspondência: “(...) a Família dos Homens Cordiais, esses que se distinguem do resto da humanidade por duas características essencialmente americanas: o espírito hospitaleiro e a tendência à credulidade. Numa palavra, o Homem Cordial. Atitude oposta do europeu: a suspicácia e o egoísmo do lar fechado a quem passa.” (COUTO apud BEZERRA, 2005, p.125).
11
reconhecimentos distintos ao situá-los em uma linha de ambiguidade entre essa
transição sem mediação, uma espécie de “dialética da marginalidade” (ROCHA,
2006, p.37) que se manifesta meticulosamente pela utilização e evidenciação da
violência:
“Amanhã não vou ter pão (...) − Mamãe, vende eu para Dona Julita, porque lá tem comida gostosa.” (JESUS, 2014, pp.41-42)
Das raízes ao despejo
Nesse sentido, se analisamos de maneira mais minuciosa a citação acima e a
atrelamos a um processo mais amplo, é plausível pensarmos que a fome exposta
por Carolina Maria de Jesus, que percorre todo o curso do livro, é denunciada
levando em conta uma configuração bastante específica ao apontar como tal
escassez é tratada sob uma forma de violência cordial inscrita como elemento
que, em seu devir, demonstra constituir aqui o que concebemos como
modernidade a partir dos estudos da “geração de 1930”18.
Assim, evocamos um enigma que sintetiza um dos espectros em volta da
identificação do signo nacional, “da palavra Brasil” (MONTEIRO, 2015), sendo
uma alegoria resistente, instigante e, de certo modo, insuficiente, a qual, dentro
de um imaginário moderno, não pode ser encarada apenas como um tempo
provisório e fugidio. Isso envolve a reflexão sobre uma metáfora que não é
apenas espacial, devido à designação de seu termo, mas de um símbolo que
ocupa espaço na construção de subjetividades marcadas como desterradas.
Logo, cria-se a possibilidade de, em face da literatura, estabelecer um diálogo
entre as projeções históricas e culturais sobre a fome:
“No dia que chove eu sou mendiga.(...) Ageitei um guarda-chuva velho que achei no lixo e saí. Fui no Frigorifico, ganhei uns ossos. Já serve. Faço uma sopa. Já que a barriga não fica vazia, tentei viver com ar. Comecei a desmaiar. Então resolvi trabalhar porque eu não quero desistir da vida. Quero ver como é que eu vou morrer. Ninguem deve alimentar a ideia de suicidio. Mas hoje em dia os que vivem até chegar a hora da morte, é um herói. (...) porque é duro a gente vir ao mundo e não poder nem comer.” (JESUS, 2014, p.61)
Mediante o que qualifica Alba Zaluar (1999), a violência apresenta-se
particularmente enquanto um conceito complexo em sua definição e, por isso,
logo compreendemos que se trata de “um termo polifônico em sua própria
18 Cf. ARRUDA, 2004, pp.107-118; CANDIDO, 1989, pp.140-216; LAFETÁ, 1974, pp.7-38; PRADO, 2015, pp.199-359.
12
etimologia” (ZALUAR, 1999, p.28), pois a expressão pode carregar múltiplos
sentidos e manifestações. Originalmente do latim violentia, violência está
associada à força ou ao vigor, vis, os quais poderiam se transformar no momento
em que excedessem e desestabilizassem normas e convenções subjacentes que,
por sua vez, regulariam vínculos sociais em contexto específico. Com base nisso,
a autora afirma que é justamente por essa razão que a violência, ao ser definida,
é atravessada pela necessidade de apreensões cultural e sensível aos pontos
limítrofes dos desarranjos e da consternação acarretados por ela, as quais
disponibilizariam, assim, recursos para assinalar uma ação como violenta.
Em vista disso, no que tange os âmbitos simbólicos que orbitam em torno da
violência, por isso considerada como categoria ligada à cordialidade em sua
dimensão de marginalização potencial, a relação entre a fome e a escravidão,
para além da concretude evidente do fenômeno, não é gratuita em Quarto de
despejo, e tampouco na história: “E assim no dia 13 de maio de 1958 eu lutava
contra a escravatura atual - a fome!” (JESUS, 2014, p.32).
Por ser emblemática, e duramente física, tal relação envolve também
aspectos em que a violência se dissemina escamoteada em contatos
naturalizados e em julgamentos morais que revelam traços importantes da
estrutura social brasileira da segunda metade do século XX. Desse modo, funda-
se como um elemento edificador a partir do qual se dispõe a própria ordem social
operando, por vezes, como seu alicerce, principalmente em culturas de extração
colonial.
Diante disso, se também concebemos vis não somente como emprego de
força física, mas também como os recursos do corpo para exercer a sua força
vital, este estudo busca elaborar conceitual e sociologicamente o tipo de violência
que irá circunscrever a condição de privação desses mesmos meios vitais e a
maneira com que ela engendra conteúdo e, sobretudo, forma à modernidade que
se institucionaliza em disputas e aproximações nos campos cultural e político. O
corpo passa, nesse caso, a ser locus específico da organização e do
desenvolvimento de um imaginário moderno em construção, a exemplo de 1958,
como elucida abaixo Carolina Maria de Jesus ao se referir a uma experiência e
que não parece ter tido suas arestas aparadas até o momento presente:
“A tontura da fome é pior do que a do alcool. A tontura do alcool nos impele a cantar. Mas a da fome nos faz tremer.
13
Percebi que é horrivel ter só ar dentro do estomago. Comecei sentir a boca amarga. Pensei: já não basta as amarguras da vida? Parece que quando eu nasci o destino marcou-me para passar fome. Catei um saco de papel. Quando eu penetrei na rua Paulino Guimarães, uma senhora me deu uns jornais. Eram limpos, eu deixei e fui para o deposito. Ia catando tudo que encontrava. Ferro, lata, carvão, tudo serve para o favelado. O Leon pegou o papel, recebi seis cruzeiros. (...) Resolvi tomar uma media e comprar um pão. Que efeito surpreendente faz a comida no nosso organismo! Eu que antes de comer via o céu, as arvores, as aves tudo amarelo, depois que comi, tudo normalizou-se aos meus olhos.” (JESUS, 2014, p.44)
A temática que aparece a princípio em Casa-Grande & Senzala (1933), de
Gilberto Freyre, e que esteve associada à miscigenação, à interação de fatores
socioeconômicos e geográficos do nordeste brasileiro e à crítica ao processo de
eugenia do período, demonstrou o surgimento, na sociedade colonial baseada no
patriarcalismo e na monocultura latifundiária e escravocrata da cana-de-açúcar,
de um padrão de consumo e de hábitos alimentares produtos de um sincretismo
étnico-cultural centralizado na farinha de mandioca e no milho.
Sob outra perspectiva, Josué de Castro, médico, geógrafo e cientista político
que convergia com Freyre na crítica ao movimento eugenista, no sentido de
apontar que o mal do Brasil não era de raça, também se opunha a ele, pois, a
despeito da valorização da fusão cultural, considerava que o Brasil sofria do mal
da fome, isto é, apreendia o assunto essencialmente pelo marcador de classe
discutido em obras clássicas como Condições de vida das classes operárias do
Recife (1935), Geografia da Fome: A Fome no Brasil (1946) e Geopolítica da
Fome (1951).
Análogo à perspectiva de Castro, em A integração do negro na sociedade de
classes (1965), Florestan Fernandes também introduz a questão no que se refere
aos percalços econômicos deixados no período pós-abolição da escravatura,
ambos conflitando teoricamente com a noção de "democracia racial" atribuída ao
pensamento contido nas obras de Gilberto Freyre. No entanto, é válido ressaltar
que a fome, nos termos que estabelecidos neste artigo, não aparece nitidamente
nessas obras canônicas como símbolo de um imaginário coletivo que marca,
instrumentaliza e sustenta aspectos importantes tangentes à idealização da
modernidade brasileira.
Portanto, não se trata nesta pesquisa de apontar apenas o fato de que o
desenvolvimento de políticas governamentais não acompanhou uma alteração
eficaz nas condições sociais de determinados grupos, uma vez que isso parece
14
ser, em larga medida, bastante tratado nos estudos sociológicos. Complexificando
a questão, a minha proposta está ligada à análise do estatuto, na qualidade de
signo, que a fome assume na esfera da desigualdade, como ela se estabelece e é
caracterizada imersa nesse conjunto, que consideramos mais amplo, de
vulnerabilidade e assimetria.
Dito isso, não porque se faça uma atenuação do imperativo da fome em seu
aspecto biológico, o que seria sobejamente infundado. Ao contrário, e justamente
por tal razão, o que se apresenta aqui é uma hipótese explicativa concernente ao
modo pelo qual ela se manifesta na dimensão material, delimitando grupos e se
engendrando como parte do sustentáculo de uma “comunidade imaginada”
(ANDERSON, 2008) que promove impactos e projeções significativas no percurso
da modernização do país. Isso porque, paralelamente, a fome - enquanto signo e
mobilizadora de afetos - estaria sendo também recriada e articulada de maneira
instrumentalizada, sobretudo, no âmbito cultural e se assentando como
componente substancial do discurso político19, não necessariamente constituindo
uma relação determinante de causa e efeito, mas, um vínculo causal
interdependente.
Nesse sentido, o uso do termo “imaginativa” se justifica, visto que a fome
reinventa formas, sistemas valorativos, linguagens e expressões ao aquecer um
lugar institucionalizado de violência no interior da identidade de um Brasil
formulado como “quase” moderno. E que, em alguma instância, operacionaliza o
advérbio para sustentar essa espécie de “fome interessada”, não da parte de
quem a sente, mas do ponto de vista que torna possível sua investigação como
elemento que possui lógica implícita e é constantemente alimentada, seja como
telos de superação, seja como álibi do atraso, sem que seja, de fato, combatida,
processo que lhe conferiria legitimidade enquanto padronização sobre o conceito
original de racionalização moderna20.
19 Cf. CASTRO & MACHADO, 2007. Autoras de uma das biografias sobre Carolina Maria de Jesus ressaltam a probabilidade de que a primeira matéria sobre a escritora data de 1941, por intermédio do jornalista Villi Aureli, com um poema em homenagem a Getúlio Vargas. Ainda segundo as autoras, há controvérsias sobre a data variando entre 1940, 1946 e início de 1950. Além desse dado, é possível identificar durante toda a leitura do livro as notórias reflexões e intersecções que a literata sintetiza estabelecendo contrapontos e aproximações entre o contexto narrado em seus diários e a esfera política discursiva citando, diversas vezes, figuras como Carlos Lacerda e o ex-presidente Juscelino Kubitschek, assim como, ao fazer numerosas menções a órgãos públicos como a Secretaria Municipal da Saúde de São Paulo e a setores de serviço social. 20Cf. HABERMAS, 2000. Refiro-me, novamente, à revisão teórica realizada pelo autor acerca da definição do
conceito de modernidade.
15
Como consequência e trazendo novamente a possível relação entre o signo
da fome e os conceitos de cordialidade e violência, o lado solar da nossa forma
de sociabilidade estaria situado, portanto, na afabilidade dos contrários, uma
familiaridade que pode ocultar uma grande indiferença para com as
desigualdades sociais, isto é, um lado solar cujo quadro “positivo”, por si só, não
se sustenta:
“Os dois filhos dela conduziu-me no elevador. O elevador em vez de descer, subiu mais dois andares. Mas eu estava acompanhada, não tive receio. Fiquei pensado: a gente fala que não tem medo de nada, as vezes tem medo de algo inofensivo. No sexto andar o senhor que penetrou no elevador olhou-me com repugnancia. Já estou familiarisada com estes olhares. Não entristeço. Quiz saber o que eu estava fazendo no elevador. Expliquei-lhe que a mãe dos meninos havia dado-me uns jornaes. Era este o motivo da minha presença no elevador. Perguntei-lhe se era medico ou deputado. Disse-me que era senador. O homem estava bem vestido. Eu estava descalça. Não estava em condições de andar no elevador. Pedi ao jornaleiro para ajudar-me a por o saco nas costas, que o dia que eu estivesse limpa eu lhe dava um abraço. Ele sorriu e disse-me: − Então já sei que vou morrer sem receber o seu abraço, porque você nunca está limpa.” (JESUS, 2014, p.111).
Observa-se que tal abordagem se faz, sobretudo, por meio de uma transposição
que possui uma regra marcada de forma muito clara. Considerando que a fome
se apresenta, neste estudo, na esteira da cordialidade, a família patriarcal e seu
mandonismo característico não apenas invadem o espaço público como ali se
perpetuam, fazendo com que as hierarquias se reproduzam na escala social, mas
o fazem a partir de um mecanismo novo, o qual aponta que a modernidade
acarreta uma violência arbitrária e “legitimada pela sua ilegalidade” (CHAGURI &
SILVA, 2014, p.194).
Desse modo, é possível presumir que constituiríamos o avesso do que
gostaríamos de pensar, como em uma espécie de posição em que a própria
sociedade parece não reconhecer uma face de sua sociabilidade, a qual incorpora
de maneira latente e velada. Haveria, portanto, uma grande problemática pautada
na proximidade excessiva que oculta uma distância intransponível nesse conjunto
de imediações, proximidade que, em última instância, acaba sendo muito
perversa ao nublar uma parcela expressiva das disparidades que a própria
sociedade produz.
Sendo assim, esses moldes influenciam diretamente a construção de
memórias que são, por sua vez, coletivas. A proposta de tratar o diário de
16
Carolina de Jesus como uma obra literária que ilumina alguns dos impasses
acerca do pensamento social brasileiro se dá, então, pelo fato de que, ao evocar
o passado em sua leitura do presente, ela o move e o reelabora, oferecendo
chaves originais de percepção e sensibilidade, as quais demonstram a
inteligibilidade do condicionamento e da memória da fome.
Partindo de uma compreensão culturalmente heterogênea da modernidade,
considerando possível sua emergência em contextos múltiplos, a perspectiva
teórica desenvolvida pelo sociólogo Shmuel Eisenstadt (2007) vem na contramão
tanto das teorias da modernização das décadas de 1950 e 1960, que operavam
uma padronização sobre o conceito, quanto da tradição sociológica clássica, as
quais se relacionam fundamentalmente com a ideia de racionalismo ocidental
assentado na Europa ao longo do século XIX.
Trazendo essa mesma leitura para o contexto local, Ana Lúcia Teixeira (2009)
salienta que uma modernidade consubstanciada historicamente por ações
racionais e pela burocracia do Estado, que, no entanto, sofreu modificações e
ultrapassou os limites originais do conceito, pode se configurar como uma espécie
de “modernidade desterrada”, um alcance da modernidade na “periferia da cena
moderna”21. A formulação de Eisenstadt não pressupõe que tais modernidades
sejam categoricamente frágeis ou precárias, mas qualitativamente variáveis e
desdobradas a partir da viabilidade de respostas e soluções distintas que
oferecem para o andamento de seu próprio processo de modernização.
Apoiados nessa vertente, notamos a abertura de novas lentes, as quais
permitem questionar interpretações baseadas em formulações que caracterizam
processos locais como “síntese do atraso”, o que significa enfrentar parte da
crítica que tratou fundamentalmente do diagnóstico de inadequação. Por outro
lado, é importante ressaltar que não basta assinalar contraposições e negar
desvios quando os mesmos emergem, o que seria analiticamente insuficiente.
Logo, o interesse é compreender como tais interações operam sem, obviamente,
dar como esgotadas as possibilidades de resposta.
21 Cf. TEIXEIRA, 2009, pp. 304-329. Estudo no qual a autora desenvolve esta ideia recuperando o percurso histórico do conceito e relativizando-o à luz dos contextos de modernidade na literatura brasileira e portuguesa: “(...) na periferia do mundo onde essa mesma Modernidade chega com algum grau de artificialidade, posto que não brota das relações sociais aqui desenvolvidas, mas terá de se combinar com elas, configurando Modernidades de perfis diferenciados, o que ofereceu como contrapartida um questionamento da grande teoria racional, produzida na Europa, imbuída de pretensões universalistas, uma vez que é na periferia do mundo que ela receberá limites e será relativizada.” (Ibid, p.306)
17
O empenho teórico é o de não conferir um caráter acidental aos movimentos
considerados “desviantes” em relação ao processo de modernização que nos
trouxe até aqui, já que tal implicação se estabeleceria no pressuposto de que
apenas nos desencaminhamos de um parâmetro referencial e que, portanto, a
solução mais lógica estaria no ajuste. Isso também desconsideraria um conjunto
expressivo de aspectos específicos de nossa formação e, se não os entendemos
em seus pontos nevrálgicos, não há como alterar os rumos dessa modernidade.
Desse modo, deslocamos o discurso da chave de que não nos modernizamos
para uma busca de compreensão da forma como nos modernizamos, ainda que
de maneira problemática. O sentimento de pertencimento pressupõe, entre nós,
um dualismo que parece coexistir com o esforço exaustivo de um encontro com
uma ontologia do passado que desconsidera os arranjos forjados da atualidade,
ou seja, que faz do presente um inalterado reflexo desse passado e atenua a
construção de uma ontologia própria do presente, que não é mera extensão do
pretérito e, tampouco, uma heroificação do vigente. É, contudo, um complexo de
diálogos, convergências, rupturas, adaptações e modificações.
Com base nessa acepção, proponho pensar a invisibilidade como um
fenômeno também advindo dessa proximidade, não solar, que coloca o indivíduo
à margem22. Nesse sentido, o olhar apurado de Carolina Maria de Jesus, na
condição de autora e, sobretudo, de personagem da obra, desvela algo sobre o
processo de modernização que vai na mesma direção daquilo com o que, aqui,
faço analogia do conceito de cordialidade - ligado à violência e à fome. Há que se
ter em conta que esta última, a cordialidade, é elemento fundamental para
construção de um símbolo que é marcado para ser vencido e, na prática, é
substrato que mantém os lugares do personalismo brasileiro.
Portanto, a sociedade desenvolve-se, a cidade constitui-se, mas o fazem
operando de um modo em que o coração é ponto central, marginal e violento
simultaneamente nas relações sociais. Ao fim de Quarto de despejo, encontramos
uma análise de Carolina Maria de Jesus sobre um filme, realizado na favela do
Canindé em 1959, acerca da trajetória de um personagem com nome bastante
sugestivo ao debate aqui desenvolvido: “O que se nota é que ninguem gosta da
22 Alba Zaluar (2005) propõe a substituição do conceito de “exclusão” pelo o de “integração perversa”.
18
favela, mas precisa dela. Eu olhava o pavor estampado no rosto dos favelados.
Eles estão filmando as proezas do Promessinha. Mas o Promessinha não é da
nossa favela.” (JESUS, 2014, p. 190).
A experiência da violência é, antes, uma experiência de violação de direitos
individuais e, portanto, que afeta qualitativamente a estabilidade de nossa
democracia – uma democracia disjuntiva, uma deslegitimação dos direitos civis se
evidenciada na forma com que a violência e as intervenções no corpo são
amplamente toleradas quando tratamos de minorias sociais. Aqui estamos
falando, mais uma vez, de indivíduos que não são considerados totalmente ou,
nem sempre, pelo crivo da racionalidade.
Contra essas pessoas, a violência parece ser necessária, ela é uma
linguagem que sendo inequívoca e inteligível teria o poder de impor princípios e,
por meio da dor, ser capaz de corrigir e reformar comportamentos. Nesse sentido,
o corpo é concebido como um campo para várias intervenções, ou seja, a ideia do
corpo manipulável dessas pessoas está no cerne do debate sobre a
modernização e a democratização da sociedade brasileira.
Por essa razão, o corpo é percebido, ao mesmo tempo, como um locus de
punição e justiça, como um lugar apropriado onde é permitido que autoridades se
afirmem através da inflição da dor. No que diz respeito a ela, em corpos
incircunscritos não são colocadas barreiras claras ou limites, eles são antes vistos
como permeáveis e abertos ao manejo do outro, sem que isso seja questionado
ou reconhecido como problemático. Nesse sentido, o corpo incircunsrito é
desprotegido por direitos individuais e resulta historicamente de sua ausência.
Entretanto, países como o Brasil, mas também outros com histórias diferentes
(geralmente coloniais) e que possuem democracias disjuntivas, forçam uma
dissociação dessa sequência linear de modernidade. Mostram paradoxalmente,
por exemplo, a coexistência de uma cidadania política sem o controle da
violência; de direitos sociais legitimados sem garantia a todos de segurança
alimentar e de democracias eleitorais sem direitos civis ou sem um sistema
judiciário legitimado.
A modernidade, compreendida em sua engrenagem, transforma a exclusão
em um “lugar” na medida em que expõe uma organização na qual o indivíduo,
embora esteja afastado do espaço nuclear, não deixa de participar, de modo
19
ferino, como elemento significativo ao desenvolvimento do resultado final. Assim,
a posição marginalizada, social e economicamente, cumpre, por sua vez, também
um papel em que afetos, como ódio e desamparo23, são mobilizados para a
inserção do corpo político, mas os fazem permanecer como sujeitos
“incircunscritos”24 e permeáveis por intervenções. Um manejo que explora a
violência numa ótica que funciona, a um só tempo, como aprazimento e controle:
“... A comida no estomago é como o combustivel nas maquinas. Passei a trabalhar mais depressa. O meu corpo deixou de pesar. Comecei andar mais depressa. Eu tinha impressão que eu deslisava no espaço. Comecei sorrir como se estivesse presenciando um lindo espetaculo. E haverá espetaculo mais lindo do que ter o que comer? Parece que eu estava comendo pela primeira vez na minha vida.” (JESUS, 2014, pp.44-45)
Então, é preciso destacar que esses afetos funcionam, enquanto
normatividades culturais e políticas, segundo um exercício atravessado por
tensões entre códigos tácitos e outros nítidos, isto é, mediante princípios que são
expressos e outros que não necessitam ser declarados para serem
implementados. “Um corpo político produzido pelo desamparo é um corpo em
contínua despossessão e desidentificação de suas determinações.” (SAFATLE,
2015, p.21). Todavia, ainda assim é um corpo que desafia a ontologia da
inserção, integrando e construindo uma simultânea rede de conteúdos e
significados ao extravio.
Por fim, reforço as pretensões de contribuição desenvolvidas neste item no
que se refere às inferências decorrentes desta pesquisa nos pontos que ela
carrega originalidade. É a simbologia da fome que, embora não tenha sido tratada
nessa formulação pelo cânone da tradição, justamente se torna a aresta aberta
por onde se intensifica a sua relação com determinados temas centrais do
pensamento social brasileiro. A questão que direciona todo este trabalho oferece
a oportunidade de se inserir também em um debate que está no âmago do
pensamento social brasileiro, esteve – e em alguma medida é possível, inclusive,
dizer – originalmente e que permanece vigendo até hoje.
São as tensões que advêm das perguntas do cânone, como – o que nos ficou
faltando ou quais são os caminhos de integração da matéria singular de que
dispomos? – e o interesse contínuo em reformulá-las que investe esta análise,
23 Cf. SAFATLE, 2016. 24 Cf. CALDEIRA, 2000, pp.343-377.
20
assim como busco oferecer, por meio dos resultados de tais investigações, uma
compreensão sobre a fome que vincula suas implicações e os desdobramentos -
culturais e políticos - dimensões pouco imbricadas nas análises acerca do tema.
Colocada na tríade que a aproxima da cordialidade, pelo teor violento dos
afetos que as movem, esses obstáculos ganham novos significados na medida
em que mostram ainda a necessidade de enfrentamento. Por essa razão, é
plausível considerar que um novo olhar crítico que se dispõe remontar um
problema antigo e, não obstante, estrutural, haja vista sua capacidade de
atualização, colabore tanto para o refinamento acadêmico sobre o fenômeno,
tornando-o de fato um problema sociológico, quanto que contribua de algum
modo às reflexões que nos levem também a dinâmicas práticas de sua superação
na sociedade, buscando conter o avanço de negacionismos e retrocessos ainda
maiores.
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