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Pedido de Uniformização de Jurisprudência em Apelação Cível em Mandado de Segurança n. 2006.030031-7/0001.00, de São José Relator Designado: Des. Luiz Cézar Medeiros ADMINISTRATIVO OPTOMETRIA RESTRIÇÃO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL – ILEGALIDADE 1 Afronta o princípio da razoabilidade a restrição ao exercício da optometria com embasamento nos ultrapassados Decretos ns. 20.931/32 e 24.492/34, já que, a toda evidência, a ratio legis desses diplomas não mais se afeiçoa à realidade da vida moderna. 2 Se existe curso superior reconhecido pelo Ministério da Educação que habilita profissionais para o exercício das atividades de optometria, não tem sentido impedir que aqueles que colam grau e providenciam o registro no respectivo órgão fiscalizador exerçam em toda a sua plenitude a profissão que escolheram. O exercício profissional da optometria, no entanto, deverá se restringir àquelas atividades facultadas pelas normas de regência, sendo vedado, em absoluto, as práticas privativas do médico oftalmologista. Vistos, relatados e discutidos estes autos de Pedido de Uniformização de Jurisprudência em Apelação Cível em Mandado de Segurança n. 2006.030031-7/0001.00, da Comarca de São José (Vara da Fazenda Pública), em que é suscitante a Colenda Segunda Câmara de Direito Público: ACORDAM, em Grupo de Câmaras de Direito Público, por maioria de votos, conceder parcialmente a ordem. Vencidos os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Ricardo Roesler e Jânio Machado, que votaram no sentido de conhecer do pedido de uniformização de jurisprudência e manter a sentença que denegou a ordem. Custas na forma da lei. RELATÓRIO Maynara Motta Lino - ME impetrou ordem de mandado de

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Pedido de Uniformização de Jurisprudência em Apelação Cível em Mandado deSegurança n. 2006.030031-7/0001.00, de São JoséRelator Designado: Des. Luiz Cézar Medeiros

ADMINISTRATIVO – OPTOMETRIA – RESTRIÇÃO DOEXERCÍCIO PROFISSIONAL – ILEGALIDADE

1 Afronta o princípio da razoabilidade a restrição ao exercícioda optometria com embasamento nos ultrapassados Decretos ns.20.931/32 e 24.492/34, já que, a toda evidência, a ratio legis dessesdiplomas não mais se afeiçoa à realidade da vida moderna.

2 Se existe curso superior reconhecido pelo Ministério daEducação que habilita profissionais para o exercício das atividadesde optometria, não tem sentido impedir que aqueles que colam graue providenciam o registro no respectivo órgão fiscalizador exerçamem toda a sua plenitude a profissão que escolheram. O exercícioprofissional da optometria, no entanto, deverá se restringir àquelasatividades facultadas pelas normas de regência, sendo vedado, emabsoluto, as práticas privativas do médico oftalmologista.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Pedido deUniformização de Jurisprudência em Apelação Cível em Mandado de Segurança n.2006.030031-7/0001.00, da Comarca de São José (Vara da Fazenda Pública), em que ésuscitante a Colenda Segunda Câmara de Direito Público:

ACORDAM, em Grupo de Câmaras de Direito Público, por maioriade votos, conceder parcialmente a ordem. Vencidos os Excelentíssimos SenhoresDesembargadores Ricardo Roesler e Jânio Machado, que votaram no sentido deconhecer do pedido de uniformização de jurisprudência e manter a sentença quedenegou a ordem. Custas na forma da lei.

RELATÓRIO

Maynara Motta Lino - ME impetrou ordem de mandado de

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segurança, com pedido de provimento liminar, contra ato do Diretor da VigilânciaSanitária do Município de São José, objetivando que a autoridade coatora fornecessealvará sanitário, que lhe fora negado por haver, no estabelecimento, profissionaloptometrista. Em razão disso, lavrou-se auto de infração, tendo em vista que ooptometrista realizava "consulta com exames de acuidade visual e adaptação de lentesde contato, prescrevendo receitas optométricas que são aviadas na própria ótica" (fls.03).

Aduziu, em síntese, que a vigilância sanitária não detémcompetência para efetuar fiscalização com o fim de apurar as prerrogativas dooptometrista. Ressaltou, ainda, que é lícito o exercício da profissão, nos termos daPortaria n.º 397/02 do MTE, e que não foram recepcionados pela Constituição de 1988os arts. 38, 39 e 41 do Decreto n.º 20.931/34, revogados, inclusive, pelo Decreto n.º77.052/76, dispositivos estes que limitavam as atividades do optometrista.

Notificada, a autoridade coatora prestou informações às fls. 89-92,aduzindo que a atuação dos agentes de fiscalização se deu dentro da mais estritalegalidade, de acordo com o que preceitua a Resolução 001/DIVIS/2004. Destacou,ademais, que a regulamentação da profissão é prescrita pelo Decreto n.º 20.931/32,citando, neste contexto, precedente deste Tribunal.

A liminar foi indeferida às fls. 94-97.

O representante do Ministério Público se manifestou pela denegaçãoda ordem.

A ordem foi denegada, tendo como fundamento os Decretos n.º20.931/32 e 24.492/34 (fls. 108-112).

Inconformada, a impetrante apelou repisando seus argumentosiniciais, postulando inclusive o reconhecimento da inconstitucionalidade dos Decretos n.º20.931/32 e 24.492/34, e reclamando, por outro lado, a aplicação da Portaria n.º 397/02,que também disciplina a atividade de optometrista.

Houve contra-razões.

A Procuradoria-Geral de Justiça manifestou-se pelo desprovimentodo recurso (fls. 195-197).

Levado a julgamento, a Segunda Câmara de Direito Público houvepor bem suscitar incidente de uniformização de jurisprudência, a fim de conferir tratolinear à matéria no âmbito deste Tribunal de Justiça.

Na prática, a jurisprudência da Corte tem divergido ao pretender darcontorno à profissão de optometrista; há decisões reconhecendo apenas a aplicação dosDecretos n.º 20.931/32 e 24.492/34 para definir o rol de atividade a ser exercidas pelo

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optometrista, e, de outro vértice, tem-se reconhecido, em alguns julgados, a incidênciaconcorrente da Portaria n.º 397/02 do MTE, com ampliação exponencial das atribuiçõesdo profissional.

Diante desse quadro, decidiu-se, em julgamento colegiado, remetera matéria à uniformização.

É o relatório.

VOTO

A questão posta nos autos não é nova nesta Corte e com o concursode meus eminentes pares da Terceira Câmara de Direito Público tive a oportunidade deenfrentá-la, quando do julgamento da Apelação Cível em Mandado de Segurança n.2004.029922-1, de Lages, da qual fui relator, bem assim em outros julgamentos de quetomei parte.

Sustentava com supedâneo em outros julgados deste Tribunal, emespecial na Apelação Cível em Mandado de Segurança n. 1996.009307-9, doDesembargador Nelson Schaefer Martins, que “são de competência exclusiva do médicooftalmologista a análise, visualização e descrição de outras anomalias encontradas noglobo ocular, não sendo possível atribuir-se estas atividades ao técnico da optometria”.

Não obstante, sempre ressalvei que as normas que legitimam a açãoda vigilância sanitária a impedir a atuação do optometrista em estabelecimentos do ramoótico são vetustas e não mais se ajustam à realidade hodierna.

A questão está enredada nos Decretos ns. 20.931/32 e 24.492/34,diplomas editados em época que sequer existia médico oftalmologista e curso superiorde optometria.

A situação dos optometristas é paradoxal: a profissão é reconhecidapelo Estado, pois consta da Classificação Brasileira de Ocupações; esses profissionaisse submetem a um curso com carga horária mínima de 2.400 horas, com grade curricularaprovada pelo Ministério da Educação, e depois de formados não podem exercer o seumister por conta da aplicação de um Decreto que tinha razão de ser em um contextototalmente diverso do atual.

A situação é muito bem retratada no excerto da sentença prolatadapelo Juiz de Direito da Vara dos Feitos da Fazenda Pública da Comarca de Itajaí noMandado de Segurança n. 033.05.017900-7, que me permito reproduzir:

“Mesmo com todos os fundamentos legais apresentados, a ousadia dealguns médicos oftalmologistas é tanta, que parte desses profissionaistenta de forma inverídica confundir as autoridades brasileiras, não se

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preocupando em omitir que na escolaridade médica, não existe provisãopara sua formação, das matérias CONTATOLOGIA e OPTOMETRIA;esquecem também, que na complementação que buscam, freqüentamcursos de especialização em oftalmologia, dentre os quais não existe umsequer que trate do assunto com profundidade, situação divergente doTécnico em Óptica que como já foi demonstrado, tem que provar suacapacidade técnica profissional havida pela freqüência de curso regularcom carga horária mínima de 1230 horas mais 620 horas deespecialização em Optometria (cerca de 2 anos de curso) e exames desuficiência. Isso sem falar nos Optometristas com formação universitáriaem curso de oito semestres, como é o caso dos autos.

“Fala-se ainda sobre “ato médico” e seu conceito: entende-se que ele seexaure naquilo que por sua natureza é reconhecidamente privativo demédico. Como exemplo, podemos citar a administração de medicamentosou a prática cirúrgica por se tratar de procedimentos invasivos. Emoftalmologia podemos citar o implante de lente intra-ocular. Essa práticaenvolve não só conhecimentos de anatomia e fisiologia do olho. Dosistema respiratório, circulatório e outros, mas também por exigir técnicasde procedimento cirúrgico, bem como envolver tratamento clínico pósoperatório. Difere o implante intra-ocular de uma adaptação de lentes decontato, na medida em que o primeiro é um ato cirúrgico de risco não sóna execução como também, no pós operatório uma cirurgia mal sucedidapode levar o paciente à cegueira ou até mesmo à morte; em contrapartidaas lentes de contatos não passam de órteses não invasivas, cujo objetivofinal é compensar opticamente as ametropias (miopia, hipermetropia,astigmatismo, etc.) quando se faz necessário.

“Destaca-se que a prática da optometria, atividade inerente ao óptico emmais de 130 países, compreende uma série de testes visuais com ointuito de avaliar e melhorar, quando necessário for, a performance visualdo interessado” (fls. 207-208).

O Superior Tribunal de Justiça, mesmo que de forma oblíqua, já quenão analisou a questão meritualmente, reconheceu a validade e a legalidade daClassificação Brasileira de Ocupações e dos cursos superiores de óptica e optometria,conforme precedente assim sumariado:

“ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR.CURSO SUPERIOR DE TECNOLOGIA EM OPTOMETRIA.RECONHECIMENTO PELO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO.LEGITIMIDADE DO ATO.

“1. A manifestação prévia do Conselho Nacional de Saúde é exigidaapenas para os casos de criação de cursos de graduação em medicina,em odontologia e em psicologia (art. 27 do Decreto n. 3.860/2001), não

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estando prevista para outros cursos superiores, ainda que da área desaúde.

“2. Em nosso sistema, de Constituição rígida e de supremacia das normasconstitucionais, a inconstitucionalidade de um preceito normativo acarretaa sua nulidade desde a origem. Assim, a suspensão ou a anulação, porvício de inconstitucionalidade, da norma revogadora, importa oreconhecimento da vigência, ex tunc, da norma anterior tida por revogada(RE 259.339, Min. Sepúlveda Pertence, DJ de 16.06.2000 e na ADIn652/MA, Min. Celso de Mello, RTJ 146:461; art. 11, § 2º da Lei 9.868/99).Estão em vigor, portanto, os Decretos 20.931, de 11.1.1932 e 24.492, de28 de junho de 1934, que regulam a fiscalização e o exercício damedicina, já que o ato normativo superveniente que os revogou (art. 4º doDecreto n. 99.678/90) foi suspenso pelo STF na ADIn 533-2/MC, por víciode inconstitucionalidade formal.

“3. A profissão de optometrista está prevista em nosso direito desde 1932(art. 3º do Decreto 20.931/32). O conteúdo de suas atividades estádescrito na Classificação Brasileira de Ocupações - CBO, editada peloMinistério do Trabalho e Emprego (Portaria n. 397, de 09.10.2002).

“4. Ainda que se possa questionar a legitimidade do exercício, pelosoptometristas, de algumas daquelas atividades, por pertencerem aodomínio próprio da medicina, não há dúvida quanto à legitimidade doexercício da maioria delas, algumas das quais se confundem com as deótico, já previstas no art. 9º do Decreto 24.492/34.

“5. Reconhecida a existência da profissão e não havendo dúvida quandoà legitimidade do seu exercício (pelo menos em certo campo deatividades), nada impede a existência de um curso próprio de formaçãoprofissional de optometrista.

“6. O ato atacado (Portaria n. 2.948, de 21.10.03) nada dispôs sobre asatividades do optometrista, limitando-se a reconhecer o Curso Superior deTecnologia em Optometria, criado por entidade de ensino superior. Assim,a alegação de ilegitimidade do exercício, por optometristas, de certasatividades previstas na Classificação Brasileira de Ocupações é matériaestranha ao referido ato e, ainda que fosse procedente, não constituiriacausa suficiente para comprometer a sua validade.

“7. Ordem denegada” (MS n. 9.469-DF, Min. Teori Albino Zavascki).

E do corpo do erudito voto merece destaque:

“3. A profissão de optometrista está prevista em nosso direito desde 1932(art. 3º do Decreto 20.931/32). O conteúdo de suas atividades estádescrito na Classificação Brasileira de Ocupações - CBO, editada peloMinistério do Trabalho e Emprego (Portaria n. 397, de 09.10.2002).

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“4. Ainda que se possa questionar a legitimidade do exercício, pelosoptometristas, de algumas daquelas atividades, por pertencerem aodomínio próprio da medicina, não há dúvida quanto à legitimidade doexercício da maioria delas, algumas das quais se confundem com as deótico, já previstas no art. 9º do Decreto 24.492/34.

“7. A profissão de optometrista está prevista em nosso direito desde 1932,pelo menos. A própria legislação invocada pelos Impetrantes previa,expressamente, o seu exercício. Assim, o art. 3º do Decreto 20.931/32,dispôs:

"‘Art. 3º - Os optometristas, práticos de farmácia, massagistas e duchistasestão também sujeitos à fiscalização, só podendo exercer a profissãorespectiva se provarem a sua habilitação, a juízo da autoridade sanitária'.

“O próprio artigo 38 do Decreto, ao proibir aos optometristas certaspráticas, reconhece, de forma indireta, não apenas a existência daprofissão, como também a legitimidade do exercício das demaisatividades não incluídas na proibição. Diz o art. 38:

"‘Art. 38 - É terminantemente proibido aos enfermeiros, massagistas,optometristas e ortopedistas a instalação de consultórios para atenderclientes, devendo o material aí encontrado ser apreendido e remetidopara o depósito público, onde será vendido judicialmente a requerimentoda Procuradoria dos leitos da Saúde Pública e a quem a autoridadecompetente oficiará nesse sentido. O produto do leilão judicial serárecolhido ao Tesouro, pelo mesmo processo que as multas sanitárias.’

“A profissão de optometrista está, atualmente, prevista e descrita naClassificação Brasileira de Ocupações - CBO, editada pelo Ministério doTrabalho e Emprego - MTE (Portaria n. 397, de 09.10.2002), em cujo item3223, arrola-se como de sua especialidade:

"‘A - REALIZAR EXAMES OPTOMÉTRICOS

"‘1. Fazer anamnese; 2. Medir acuidade visual; 3. Analisar estruturasexternas e internas do olho; 4. Mensurar estruturas externas e internas doolho; 5. Medir córnea (queratonometria, paquimetria e topografia); 6.Avaliar fundo do olho (oftomoscopia); 7. Medir pressão intraocular(tonometria); 8. Identificar deficiências e anomalias visuais; 9. Encaminharcasos patológicos a médicos; 10. Realizar testes motores e sensoriais;11. Realizar exames complementares; 12. Prescrever compensaçãoóptica; 14. Recomendar auxílios ópticos; 15. Realizar períciasoptométricas em auxílios ópticos.

"‘B - ADAPTAR LENTES DE CONTATO.

"‘1. Fazer avaliação lacrimal; 2. Definir tipo de lente; 3. Calcularparâmetros das lentes; 4. Selecionar lentes de teste; 5. Colocar lentes de

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teste no olho; 6. Combinar uso de lentes (sobre-refração); 7. Avaliar teste;8. Retocar lentes de contato; 9. Recomendar produtos de assepsia; 10.Executar revisões de controle.

"‘C - CONFECCIONAR LENTES

"‘1. Interpretar ordem de serviço; 2. Fundir materiais orgânicos e minerais;3. Escolher materiais orgânicos e minerais; 4. Separar insumos eferramentas; 5. Projetar lentes (curvas, espessura, prismas); 6. Blocarmateriais orgânicos e minerais; 7. Usinar materiais orgânicos e minerais;8. Dar acabamento às lentes; 9. Adicionar tratamento as lentes(endurecimento, anti-reflexo, coloração, hidratação e filtros); 10. Aferirlentes; 11. Retificar lentes.

“(omissis)

"‘F - PROMOVER EDUCAÇÃO EM SAÚDE VISUAL

"‘1. Assessorar órgãos públicos na promoção da saúde visual; 2. Ministrarpalestras e cursos; 3. Promover campanhas de saúde visual; 4. Promovera reeducação visual; 5. Formar grupos multiplicadores de educação emsaúde visual.

"‘G - VENDER PRODUTOS E SERVIÇOS ÓPTICOS EOPTOMÉTRICOS.

"‘1. Detectar necessidades do cliente; 2. Interpretar prescrição; 3. Assistircliente na escolha de armações e óculos solares; 4. Indicar tipos delentes; 5. Coletar medidas complementares; 6. Aviar prescrições deespecialistas; 7. Ajustar óculos em rosto de cliente; 8. Consertar auxíliosópticos.

"‘H - GERENCIAR ESTABELECIMENTO

"‘1. Organizar local de trabalho; 2. Gerir recursos humanos; 3. Prepararordem de serviço; 4. Gerenciar compras e vendas; 5. Controlar estoquede mercadorias e materiais; 6. Controlar estoque de mercadorias emateriais; 6. Controlar qualidade de produtos e serviços; 7. Administrarfinanças; 8. Providenciar manutenção do estabelecimento.

"‘Y. COMUNICAR-SE

"‘1. Manter registros de cliente; 2. Enviar ordem de serviço a laboratório;3. Orientar cliente sobre o uso e conservação de auxílios ópticos; 4.Orientar família do cliente; 5. Emitir laudos e pareceres; 6. Orientar aergonomia da visão; 7. Solicitar exames e pareceres de outrosespecialistas.

"‘6) RECURSOS DE TRABALHO

"‘Queratômetro; Máquinas surfaçadoras; Lâmpada de burton; Filtros e

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Feltro; Lâmpada de fenda (biomicroscópio); Produtos para assepsiaabrasivos; Retinoscópio; Lensômetro; Refrator; Oftalmoscópio(direto-indireto); Pupilômetro; Topógrafo; Caixas de prova e armação paraauxílios ópticos; Calibradores; Alicates; chaves de fenda; Máquinas paramontagem; Tabela de Projetor de Optótipos; Torno; Tonômetro; Corantese fluoesceína; Soventes Polidores e lixas; Foróptero, Espessímetro,Moldes e modelos Títmus Resinas’.

“Pode-se até questionar a respeito da legitimidade do exercício dealgumas dessas atividades pelos optometristas, por configurarematividades médicas típicas. Todavia, como bem acentuou o parecer doMinistério Público, não há dúvida quanto à legitimidade do exercício damaioria delas, algumas das quais, aliás, confundem-se com as de ótico, jáprevistas no art. 9º do Decreto 24.492/34. Ora, reconhecida a existênciada profissão de optometrista, como se reconhece, e não havendo dúvidaquando à legitimidade do seu exercício em certo campo de atividades,está caracterizada justificativa suficiente para considerar legítima aexistência e o reconhecimento oficial de um curso próprio de formaçãoprofissional. E o ato atacado no presente mandado de segurança nadamais fez do que reconhecer o Curso Superior de Tecnologia emOptometria. Não foi seu desiderato dispor sobre o conteúdo dasatividades próprias da profissão, matéria legislativa que não se comportano âmbito da atividade administrativa do Ministro da Educação.

“Em suma, ainda que se admitisse, para argumentar, que a ilegitimidadedo exercício, por optometristas, de algumas das atividades previstas naClassificação Brasileira de Ocupações - CBO, editada pelo Ministério doTrabalho e Emprego (Portaria n. 397, de 09.10.2002), essa circunstânciade modo algum permitiria a anulação do ato atacado pelos impetrantes. Éque a Portaria n. 2.948, de 21.10.03, nada dispõe sobre as funções doprofissional em optometria, de modo que, se alguma ilegalidade existenas atribuições a ela conferidas pela CBO/2002, é imputação que nãopode ser dirigida ao Ministro da Educação, mas sim à autoridade queexpediu a Portaria n. 397, ou seja, ao Ministro de Estado do Trabalho eEmprego. E, ainda que procedente, a imputação não ensejaria aprocedência do pedido formulado na impetração” (MS n. 9.469 - DF, Min.Teori Albino Zavascki).

Recentemente, a mesma Corte Superior, agora em julgado darelatoria do Ministro Luiz Fux, reafirmou a validade da Classificação Brasileira deOcupações ? CBO e, conseqüentemente, da profissão de optometrista. A ementa dojulgado está assim redigida:

"PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA.PROFISSIONAL DA OPTOMETRIA. RECONHECIMENTO PELOMINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. PRECEDENTE/STJ. LEGITIMIDADE DO

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ATO. EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ. DIREITO GARANTIDO SEPREENCHIDOS OS REQUISITOS SANITÁRIOS ESTIPULADOS NALEGISLAÇÃO ESPECÍFICA. VALORIZAÇÃO DO TRABALHO HUMANOE A LIBERDADE PROFISSIONAL. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS.

"1. A valorização do trabalho humano e a liberdade profissional sãoprincípios constitucionais que, por si sós, à míngua de regulaçãocomplementar, e à luz da exegese pós-positivista admitem o exercício dequalquer atividade laborativa lícita.

"2. O Brasil é um Estado Democrático de Direito fundado, dentre outrosvalores, na dignidade e na valorização do trabalho humanos. Essesprincípios, consoante os pós-positivistas, influem na exegese dalegislação infraconstitucional, porquanto em torno deles gravita todo oordenamento jurídico, composto por normas inferiores que provêm destasnormas qualificadas como soem ser as regras principiológicas.

"3. A constitucionalização da valorização do trabalho humano importa quesejam tomadas medidas adequadas a fim de que metas como busca dopleno emprego (explicitamente consagrada no art. 170, VIII), distribuiçãoeqüitativa e justa da renda e ampliação do acesso a bens e serviçossejam alcançadas. Além disso, valorizar o trabalho humano, conforme opreceito constitucional, significa defender condições humanas de trabalho,além de se preconizar por justa remuneração e defender o trabalho deabusos que o capital possa dessarazoadamente proporcionar. (LeonardoRaupp Bocorny, In "A Valorização do Trabalho Humano no EstadoDemocrático de Direito, Editora Sergio Antonio Fabris Editor, PortoAlegre/2003, páginas 72/73).

"4. Consectariamente, nas questões inerentes à inscrição nos ConselhosProfissionais, esses cânones devem informar a atuação dos aplicadoresdo Direito, máxime porque dessa legitimação profissional exsurge apossibilidade do trabalho, valorizado constitucionalmente.

"5. O conteúdo das atividades do optometrista está descrito naClassificação Brasileira de Ocupações - CBO, editada pelo Ministério doTrabalho e Emprego (Portaria n. 397, de 09.10.2002).

"6. O art. 3º do Decreto nº 20.931, de 11.1.1932, que regula a profissãode optometrista, está em vigor porquanto o ato normativo supervenienteque os revogou (art. 4º do Decreto n. 99.678/90) foi suspenso pelo STFna ADIn 533-2/MC, por vício de inconstitucionalidade formal.

"7. Reconhecida a existência da profissão e não havendo dúvida quandoà legitimidade do seu exercício (pelo menos em certo campo deatividades), nada impede a existência de um curso próprio de formaçãoprofissional de optometrista.(MS 9469/DF, Rel. Ministro TEORI ALBINOZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10.08.2005, DJ 05.09.2005)

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"8. A competência da vigilância sanitária limita-se apenas à análiseacerca da existência de habilitação e/ou capacidade legal doprofissional da saúde e do respeito à legislação sanitária, objeto, incasu, de fiscalização estadual e/ou municipal.

"9. O optometrista, todavia, não resta habilitado para os misteresmédicos, como são as atividades de diagnosticar e tratar doençasrelativas ao globo ocular, sob qualquer forma.

"10. O curso universitário que está dimensionado, em sua duração eforma, para o exercício da oftamologia, é a medicina, nos termos dalegislação em vigor (Celso Ribeiro Bastos, In artigo "Da Criação eRegulamentação de Profissões e Cursos Superiores: o Caso dosOftalmologistas, Optomestristas e Ópticos Práticos", Estudos e Pareceres,Revista de Direito Constitucional e Internacional, nº 34, ano 9 -janeiro-março de 2001, RT, pág. 257).

"11. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o Tribunal de o origem,embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre aquestão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado arebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que osfundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.

"12. Recurso Especial provido, para o fim de expedição do alvarásanitário admitindo o ofício da optometria" (RE n. 975.322/RS -julgado em 14/10/2008)

Sobre a impropriedade da tentativa de subsumir o exercício daoptometria aos comentados Decretos de 1932 e 1934, quando do julgamento do RecursoOrdinário em Mandado de Segurança n. 26.199-B/DF, exortou o eminente MinistroSepúlveda Pertence:

“É claro que não me aventuraria, aqui, a descer a pormenores de saberse há atividades postas no Código Brasileiro de Ocupações que invadamou não esta área tão bem-defendida do exercício médico.

“O que creio, no entanto, é que seria um exercício de anacronismo julgareste caso, com base nestes decretos de 1932 e de 1934. Eu não tenho amenor dúvida. A não ser a questão formal de não se ter manifestado oConselho Nacional de Saúde, o que se tem é um reconhecimento doMinistério da Educação de um curso em funcionamento, há longos anos,absolutamente regular. E seria, efetivamente, kafkiano que a esta altura,com base num decreto evidentemente defasado em termos de tecnologiada saúde, simplesmente eliminássemos essas profissões e atrás delasmuitas outras de pacífico reconhecimento internacional como, porexemplo, o da neurociência”.

Desse modo, é de se concluir que a ação da vigilância sanitária até

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poderia se justificar em atendimento a posturas reguladas no direito local, sem, noentanto, afrontar a garantia do exercício profissional. De igual forma, afronta o princípioda razoabilidade a restrição com embasamento nos ultrapassados Decretos ns.20.931/32 e 24.492/34, já que, a toda evidência, a ratio legis não mais se afeiçoa àrealidade da vida moderna.

Se existe um curso superior reconhecido pelo Ministério daEducação que habilita profissionais para o exercício das atividades de optometria, nãohá sentido em impedir que aqueles que colam grau e providenciam o registro norespectivo órgão fiscalizador exerçam em toda a sua plenitude a profissão queescolheram.

A restrição quanto às atividades a serem exercidas pelosoptometristas deve ser averiguada pelo Conselho Federal de Medicina ou Órgão similar,a quem cabe a fiscalização do exercício regular da profissão. Ou seja, a concessão doalvará é para a atividade de optometrista. Ora, se a colocação de lentes de contato ououtros procedimentos não são de sua competência, cabe ao Órgão Fiscalizador adotaras providências cabíveis para coibir o ato e não simplesmente o Município negar o alvarápara a instalação e funcionamento do estabelecimento onde será desenvolvido o laborprofissional em comento.

Nesse sentido, a Terceira Câmara de Direito Público, com votocondutor da eminente Desembargadora Sônia Maria Schmitz já decidiu:

"MANDADO DE SEGURANÇA. ALVARÁ SANITÁRIO. OPTOMETRISTA.

"Reconhecida a formação profissional em optometria, inclusive peloMinistério da Educação, não se há negar a concessão de alvará sanitárioaos técnicos devidamente habilitados, desde que respeitados os limiteslegalmente impostos para o desempenho da atividade" (MS n.2007.042022-7, de Balneário Camboriú).

Na mesma linha, com elogiável judiciosidade, o DesembargadorCarlos Prudêncio sumariou o voto vencido que proferiu na Apelação Cível n.2007.007911-6 nos seguintes termos:

"APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO COMINATÓRIA. OPTOMETRIA E MEDICINAOFTALMOLÓGICA. INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONALIZADA DODIREITO. LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL DEVE SERINTERPRETADA A LUZ DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E DE SEUSPRINCÍPIOS. LIMITAÇÃO MÍNIMA À LIBERDADE INDIVIDUAL.RECURSO NÃO PROVIDO.

"Em razão de a Ciência Jurídica estar cada vez mais moderna – daífalar-se em "visão constitucionalizada do Direito" -, não se admite nosdias atuais que uma norma seja aplicada sem que passe pelo crivo dos

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princípios e regras constitucionais, que são a base norteadora dasavaliações dos atos normativos.

"O Direito Civil e toda a legislação infraconstitucional, incluídos osDecretos 20.931/32 e 24.492/34 – que regulamentam a atividadeprofissional dos tecnólogos em optometria – devem ser lidos em face daConstituição e de seus princípios fundamentais e estruturantes,transcendendo a análise fria dos textos normativos e conferindo eficáciaao conteúdo das normas constitucionais.

"Neste contexto, a Constituição Federal encampa princípios, como o darazoabilidade, de observância obrigatória pelos operadores jurídicos,significando que qualquer restrição à liberdade individual, dentre elas olivre exercício da atividade profissional, deve apoiar-se em fator mínimode limitação.

"OPTOMETRIA. CIÊNCIA QUE ESTUDA O SISTEMA VISUAL.OPTOMETRISTA DE NÍVEL SUPERIOR. FORMAÇÃO PROFISSIONALPARA ATUAR PARALELAMENTE AO OFTALMOLOGISTA.INEXISTÊNCIA DE SUBTRAÇÃO DE ATIVIDADE EXCLUSIVA DAMEDICINA OFTALMOLÓGICA.

"A optometria, reconhecida mundialmente como profissão, estando naClassificação Internacional de Ocupações (ISCO-88), publicada pelaOrganização Internacional do Trabalho (OIT), é a ciência que estuda osistema visual, habilitando profissionais independentes na área da saúde,sanitários, não médicos, que atuam na prevenção de problemas ocularese sistêmicos e na constatação de defeitos refrativos e disfunções visuais,cabendo-lhe especificar as ações e medidas corretoras adequadas sem autilização de drogas ou intervenções cirúrgicas.

"O optometrista de nível superior tem formação profissional para atuarparalelamente ao oftalmologista na aferição da deficiência visual depacientes que necessitam usar lentes de grau e inclusive para prescreveras respectivas lentes, desde que respeite, evidentemente, aimpossibilidade de agir quando o caso requer tratamento médico. Suaatividade e os equipamentos que utiliza não são exclusivos de nenhumaprofissão e seu trabalho vai muito além do ato de prescrever uma fórmulaóptica adequada, ele atua principalmente na prevenção e promoção dasaúde visual, trabalhando em conjunto com as demais profissões da área,numa atitude de cooperação, respeito e responsabilidade.

"DECRETOS N. 20.931/32 E 24.492/34. VEDAÇÕES INCOMPATÍVEISCOM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS.PROIBIÇÃO DO LIVRE EXERCÍCIO DE ATIVIDADE ÚTIL E VÁLIDA.DECRETOS NÃO RECEPCIONADOS PELA CONSTITUIÇÃO FEDERALDE 1988. INCOMPATIBILIDADE RECONHECIDA POR VIA DIFUSA.

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POSSIBILIDADE DE EXERCÍCIO DAS ATIVIDADES POROPTOMETRISTA COM NÍVEL SUPERIOR.

"Muito embora os Decretos n. 20.931/32 e 24.492/34 possuam aspectoscompatíveis com a atual Constituição Federal, há pontos deincompatibilidades tão fortes que os viciam na sua integralidade. Asvedações impostas à atuação dos optometristas, sob a ótica deinterpretação constitucional e sistêmica dos Decretos (arts. 3º, 4º, 38, 39,40, do Decreto n. 20.931/32 e os arts. 7º, 9º, 'b', 14 e 15, do Decreto n.24.492/34), devem ser aplicadas somente ao técnico sem curso superior,ou seja, ao optometrista prático ou sem qualificação para a manutençãode consultório, não incidindo sobre os optometristas com formaçãosuperior.

"O desconhecimento da Optometria no país e o uso de decretos arcaicosda década de 30, levam ao não reconhecimento dos optometristas comoprofissionais qualificados para colaborarem com o processo de promoçãoda saúde visual, o que acaba fazendo com que esses profissionais fiquemno limbo da marginalidade, ficando praticamente impedidos de exerceruma atividade altamente destacada no mundo inteiro, constituindo esteimpedimento uma verdadeira afronta aos anseios da saúde pública e àConstituição.

"Por todos esses motivos, as restrições estabelecidas nos obsoletosDecretos n. 20.931/32 e 24.492/34 não são razoáveis porque não sefundam em fatores mínimos de limitação, proibindo o livre exercício deatividade válida e útil à população e malferindo ideais de Justiça eprincípios constitucionais e humanos como o livre exercício de atividadeprofissional e o progresso econômico. Referidos Decretos, portanto, nãoforam recepcionados pela nova ordem constitucional, impondo-se oreconhecimento dessa incompatibilidade por via difusa, de forma a afastaras restrições e autorizar o exercício da atividade da optometria aquelescom formação superior".

Depois de pertinente análise em que enfocou o tema sob a luz dosprincípios constitucionais e da não sintonia dos Decretos ns. 20.931/32 e 24.492/34 comos enunciados da Carta de 1988, destacou Sua Excelência:

"Feitas estas considerações, há que se registrar algumas informaçõespertinentes à atividade profissional dos optometristas, parte delasconstante de dados do Instituto Brasileiro de Optometria, conforme segue.

"O conceito de optometria é universal. O termo optometria é derivado dogrego e formado pelas palavras opto (visão) e metria (medida).Optometria, então, pode ser entendida, no seu conceito mais simples,como medida da visão.

"Por definição clássica, tem-se que a optometria é a ciência que estuda o

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sistema visual, habilitando profissionais independentes na área da saúde,sanitários, não médicos, que atuam na prevenção de problemas ocularese sistêmicos e na constatação de defeitos refrativos e disfunções visuais,cabendo-lhe especificar as ações e medidas corretoras adequadas sem autilização de drogas ou intervenções cirúrgicas.

"A optometria chegou ao Brasil com os imigrantes europeus, quetrouxeram na bagagem os instrumentos necessários ao exercício de suaprofissão.

"O primeiro curso superior de Optometria, em nosso país, iniciou-se em1997, na Universidade Luterana do Brasil (ULBRA – Canoas/RS).

"Atualmente existem 4 (quatro) cursos superiores de optometria, sendoofertados por universidades brasileiras, que são: ULBRA – UniversidadeLuterana do Brasil (Canoas/RS); UNC – Universidade do Contestado(Canoinhas/SC); UES – Universidade de Estácio de Sá (Rio deJaneiro/RJ) e UBC – Universidade de Brás Cubas (Mogi das Cruzes/SP),todas já reconhecidas pelo MEC.

"A optometria é reconhecida mundialmente como profissão, estando naClassificação Internacional de Ocupações (ISCO-88), publicada pelaOrganização Internacional do Trabalho (OIT) e serviu de base para aelaboração do Código Brasileiro de Ocupações, publicado em 2003,salvaguardando os padrões definidos pela OIT.

"Documentos traduzidos do inglês para o vernáculo, pela TradutoraPública e Intérprete Comercial Lúcia de Almeida e Silva Nascimento, emFlorianópolis, fornecem informações importantes sobre a profissão dosoptometristas, sendo que, do documento intitulado Tradução n. 10.962/05– que dispõe sobre a Norma Internacional de Classificação Profissional de1988 (International Standard Classification of Occupations – ISCO -88) -consta o registro das atribuições dos optometristas e oculistas, nosseguintes termos preliminares:

"Optometristas e oculistas prescrevem e adaptam óculos e lentes decontato e fornecem orientação sobre seu uso ou o uso de outros recursosvisuais, bem como sobre a iluminação adequada para o trabalho e leitura"

"Consta também da Tradução n. 10.961/05, dada pela mesma TradutoraPública, que o Conselho Mundial de Optometria foi admitido peloConselho Executivo da Organização Mundial da Saúde, para fins derelações oficiais com a OMS, em sessão realizada em janeiro de 2004.

"Da mesma Tradutora e Intérprete, tem-se ainda a Tradução n. 10.960/05,que trata sobre a Agência Internacional para Prevenção da Cegueira.Desse documento, consta informação de que o Conselho Mundial deOptometria foi aprovado para admissão na Força Tarefa da Agência

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Internacional para Prevenção da Cegueira, constando ainda dodocumento em questão agradecimento do Vice-Presidente deste Órgãoao Diretor Executivo do Conselho Mundial de Optometria por seu apoio aoPrograma Visão 2020.

"A Organização Mundial da Saúde (OMS) realiza inúmeros programas deSaúde Visual em conjunto com o Conselho Mundial de Optometria,inclusive no maior programa de erradicação da cegueira, o projeto 2020.

"Uma das funções do optometrista, descritas na classificaçãointernacional e brasileira, é examinar os olhos e prescrever óculos, lentesde contato ou outros tratamentos para melhorar a visão, encaminhandoaos profissionais da medicina especializada os casos que exigemintervenção médica.

"O optometrista não prescreve o uso de medicamentos, nem tampoucorealiza qualquer intervenção cirúrgica. Todos os seus equipamentos sãode caráter observativo e direcionados à avaliação quantitativa e qualitativado sentido da visão.

"Atua, assim, de forma a colaborar na atenção primária à saúde, atravésda prevenção de problemas oculares e sistêmicos, que, uma vezidentificados, são encaminhados para os profissionais da medicina para odevido e adequado tratamento médico.

"Verifica-se, assim, que inexiste qualquer desarmonia entre a optometria ea medicina oftalmológica, eis que se constata uma certa identidade deatribuições entre ambas as profissões, sem, contudo, perceber-sequalquer invasão da esfera médica no que diz respeito à prescrição demedicamentos e intervenções cirúrgicas (por pequenas que sejam),afetas tão somente à ciência da medicina.

"Sendo um profissional da saúde, o optometrista trabalha em harmoniacom outros profissionais da mesma área, fazendo parte do conjunto dosprofissionais incumbidos de cuidar da saúde da coletividade.

"A base fundamental da avaliação optométrica é a luz. Utilizam-se osprincípios da física óptica (reflexão e refração) para avaliar as estruturasoculares, permitindo a constatação ou não da integridade visual.Conforme a avaliação, o optometrista poderá ou não, dependendo docaso, prescrever lentes de grau, devendo encaminhar os casos querequerem tratamento médico ao profissional habilitado para tanto.

"Uma vez detectada qualquer patologia no exame realizado pelooptometrista, ele está obrigado a encaminhar seu cliente à avaliaçãomédica de acordo com a especialidade, que não se restringe apenas àoftalmologia, podendo o caso requerer a análise de um clínico geral, deum neurologista, entre outros especialistas da medicina.

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"O optometrista somente prescreve lentes de grau após a necessáriaavaliação do estado íntegro do sistema visual e o faz por meio deaparelhos ou equipamentos específicos, sendo que a "medida visual" nãoé realizada, há que se enfatizar, antes da certificação da integralidadeocular do paciente.

"O resultado final de uma avaliação optométrica pode se dar em trêspassos: o primeiro passo consiste na verificação da existência ou não deproblemas que necessitam intervenção médica; sendo esta necessária, ooptometrista orienta o cliente acerca da necessidade de procurar ummédico, de acordo com as especialidades próprias relacionadas a cadacaso, no que se inclui a especialidade oftalmológica, esta indicada nagrande maioria dos casos. Vencida essa primeira etapa, não sendo casode encaminhamento à avaliação médica, o optometrista utiliza-se deinstrumentos para a aferição da visão do paciente, prescrevendo, quandonecessário, lentes corretivas da deficiência visual. A terceira hipóteseconsiste na recomendação de exercícios visuais para afastar problemasmotores.

"O optometrista de nível superior tem formação profissional para atuarparalelamente ao oftalmologista na aferição da deficiência visual depacientes que necessitam usar lentes de grau e inclusive para prescreveras respectivas lentes, desde que respeite, evidentemente, aimpossibilidade de agir quando o caso requer tratamento médico.

"O Curso Superior de Tecnologia em Optometria oferecido pelaUniversidade Luterana do Brasil - ULBRA, no qual o apelado alega terformação, dispõe de uma grade curricular que informa serem ministradasno curso aulas de anatomia, biologia e fisiologia humanas, patologiageral, anátomo-fisiologia ocular, farmacologia geral e ocular, ópticageométrica, óptica física, legislação e ética profissional em optometria,história e evolução da optometria, óptica visual e oftálmica, óptica clínica,patologia ocular, lentes de contato, emergência clínica e diagnóstico,geriatria e reabilitação visual, optometria clínica, dinâmica das relaçõesem clínica optométrica, estágios supervisionados em optometria clínica, I,II e III, sistemas e serviços de saúde, sociologia da saúde, epidemiologia,bases conceituais em saúde coletiva, cuidados primários oculares, saúdeocupacional e meio ambiente, sendo estas as disciplinas de maior pesopara o caso dos autos, dentre as demais constantes da mesma gradecurricular, sendo a carga horária total de 2.820 (dois mil, oitocentos evinte) horas/aula.

"Pelo seu conhecimento em física óptica, tem o optometrista capacidadepara prescrever a fórmula óptica adequada. O estudo das funçõesoculomotoras permite ao optometrista orientar a execução de exercícioscorretivos para eventuais disfunções, melhorando a qualidade de vida

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(conforto e produtividade) durante a realização das atividades diárias.

"As atividades do optometrista e os equipamentos que utiliza não sãoexclusivos de nenhuma profissão e seu trabalho vai muito além do ato deprescrever uma fórmula óptica adequada. Isto porque ele atuaprincipalmente na prevenção e promoção da saúde visual, trabalhandoem conjunto com as demais profissões da área, numa atitude decooperação, respeito e responsabilidade.

"O curso superior de optometria capacita o profissional nosconhecimentos e habilidades necessários para atuação na promoção eprevenção da saúde ocular, desenvolvendo ainda a capacidade deinvestigação.

"O desconhecimento da Optometria no país e o uso de decretos arcaicosda década de 30, levam ao não reconhecimento dos optometristas comoprofissionais qualificados para colaborarem com o processo de promoçãoda saúde visual, o que acaba fazendo com que esses profissionais fiquemno limbo da marginalidade. Esses profissionais estão praticamenteimpedidos de exercer uma atividade altamente destacada no mundointeiro, constituindo este impedimento uma verdadeira afronta aos anseiosda saúde pública.

"Neste ponto impende passar-se à análise sucessiva dos citadosDecretos n. 20.931/32 e n. 24.492/34, aquele tratando de regular efiscalizar o exercício da medicina, da odontologia, da medicina veterináriae das profissões de farmacêutico, parteira e enfermeira, este baixandoinstruções sobre o Decreto 20.931/32, na parte relativa à venda de lentesde graus, senão vejamos.

"Inicialmente, em que pese as deficiências do citado Decreto n.20.931/32, que têm dificultado aos optometristas de nível superior oreconhecimento do direito de exercerem a profissão, há que se registrarque o aludido decreto contemplou, embora de forma muito limitada, oreconhecimento desse direito, o que se depreende da leitura do art. 3º c/co art. 4º, conforme segue:

"Art. 3º Os optometristas, práticos de farmácia, massagistas e duchistasestão também sujeitos à fiscalização, só podendo exercer a profissãorespectiva se provarem a sua habilitação a juízo da autoridade sanitária".

"Art. 4° Os graduados por escolas ou universidades estrangeiras sópodem exercer a profissão após submeterem-se a exame de habilitação,perante as faculdades brasileiras, de acordo com as leis federais emvigor".

"Da análise do supra citado art. 3°, percebe-se que o decreto contemploua figura do optometrista de nível superior ao exigir prova da habilitação

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específica para o exercício da profissão. Nem poderia ser diferente,porque ainda que no art. 3° não tenha havido expressa alusão à situaçãodos profissionais com formação superior, está implícito que houve essacontemplação, uma vez que além da exigência de prova da habilitaçãoespecífica neste art. 3º, o art. 4°, logo a seguir, cuidou dos profissionaisgraduados por escolas ou universidades estrangeiras, admitindo oexercício da respectiva profissão tão-somente após submissão a examede habilitação perante as faculdades brasileiras. Pode-se-aí perguntar: seo art. 4º tratou expressamente dos graduados em universidadesestrangeiras, o art. 3º, quando exige a prova da habilitação específica,não estaria contemplando também os profissionais graduados emuniversidades brasileiras? A resposta parece lógica, incluindo-se aí ostecnólogos em optometria com formação superior, a par dos graduadosnas demais áreas regulamentadas pelo citado decreto.

"Impende registrar que a dificuldade em se reconhecer como legítimo odireito de exercício da atividade profissional dos tecnólogos emoptometria com formação superior está no fato de não ter o referidoDecreto n. 20.931/32 reservado um dispositivo específico contemplandoexpressamente este direito a estes profissionais, o que denota uma desuas deficiências. Dando continuidade à análise das deficiências destedecreto, impõe-se afirmar que ele há de ser considerado incompatívelcom a atual Constituição, incompatibilidade esta que decorreprincipalmente da discriminação de tratamento dado a algumas atividadesprofissionais que regulamenta, inserindo-se aí as conseqüências advindasdas disposições do art. 38 (no qual se apóiam os apelantes) e que assimenuncia:

"É terminantemente proibido aos enfermeiros, massagistas, optometristase ortopedistas a instalação de consultórios para atender clientes, devendoo material aí encontrado ser apreendido e remetido para o depósitopúblico, onde será vendido judicialmente a requerimento da Procuradoriados leitos da Saúde Pública e a quem a autoridade competente oficiaránesse sentido".

"Da leitura desse dispositivo, extrai-se uma evidente incompatibilidadecom o ordenamento constitucional em vigor, e, num desdobramento, coma dinâmica que envolve as três primeiras profissões mencionadas emface dos dias atuais. Como é cediço, conta-se hoje com consultórios deenfermagem especializados não somente em atendimento de primeirossocorros, como também de buscas de pacientes onde quer que seencontrem para encaminhamento ao hospital ou de lá transportá-los paraseus domicílios. Vê-se também plenamente funcionando consultórios demassagens, tanto na área terapêutica quanto estética. Quanto aosoptometristas, esse artigo 38 revela-se também problemático, poismenciona a expressão optometrista, sem especificar que a vedação à

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instalação de consultórios refere-se aos profissionais da área que nãotenham habilitação para tanto, aí se enquadrando a figura do optometristaprático, não sendo possível, evidentemente, deferir-lhe as mesmasatribuições de um optometrista com formação superior. A vedaçãoconstante do citado art. 38 não poderia e não pode ser estendida aooptometrista com formação superior, o que, para não colidir com odisposto no art. 3º do mesmo decreto, que contempla, conforme jáasseverado, este profissional, deveria o dispositivo referir-seexpressamente à figura do optometrista prático ou sem a devidaqualificação para a manutenção de consultório especializado em atenderpacientes, na forma como atua um optometrista de nível superior. Aproibição desse art. 38 é tão arcaica quanto a expressão Procuradoriados leitos da Saúde Pública nele utilizada, que também não mais seinsere na realidade de nossos dias.

"Eis aí a necessidade de substituição do art. 38 do multicitado Decreto n.20.931/32, cabendo neste passo o registro de mais uma de suasimpropriedades: o dispositivo cita ainda o "ortopedista", dentre as demaisprofissões ali mencionadas, parecendo referir-se ao vendedor deinstrumentos ou aparelhos ortopédicos, daí porque a vedação deinstalação de consultórios. Mas o fato é que a expressão "ortopedista"lembra também a qualificação profissional da especialidade médica naárea da ortopedia, por isso o dispositivo deveria especificar a categoriaprofissional e não utilizar genericamente a expressão "ortopedista",valendo o mesmo para a menção ao optometrista.

"Os subseqüentes arts. 39 e 41 desse mesmo decreto também devem serincluídos no rol de substituição, senão vejamos:

"Art. 39 É vedado às casas de ótica confeccionar e vender lentes de grausem prescrição médica, bem como instalar consultórios médicos nasdependências dos seus estabelecimentos"

"Art. 41 As casas de ótica, ortopedia e os estabelecimentos eletro, rádio efisioterápicos de qualquer natureza devem possuir um livro devidamenterubricado pela autoridade sanitária competente, destinado ao registro dasprescrições médicas"

"Conforme já se demonstrou, em que pese as deficiências do mencionadoDecreto n. 20.931/32, ele contemplou a figura do optometrista de nívelsuperior, tendo este formação para a prescrição de lentes de grau, deacordo também com o já explicitado. Sendo assim, o art. 39 igualmenterequer substituição, para inclusão da prescrição do optometrista comformação superior ao lado da expressão prescrição médica, comopermissivo para a confecção e venda de lentes de grau, havendoconsentimento legal para tanto pelos já mencionados arts. 3º e 4º.

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"E o art. 41, a seu turno, pelas mesmas razões, requer o acréscimo dasprescrições do optometrista a serem lançadas no livro de registro dascasas de ótica, a par das prescrições médicas constantes dessedispositivo.

"Muito embora o Decreto n. 20.931/32 possua aspectos compatíveis coma nossa atual Constituição Federal, há pontos de incompatibilidade tãofortes que o viciam na sua integralidade, propiciando sua substituição porcompleto; conforme já consignado, verifica-se uma flagrantediscriminação em relação ao tratamento dado a algumas atividadesprofissionais por ele regulamentadas, eis que cuidou muitosuperficialmente das profissões de enfermeiro, farmacêutico, massagista,optometrista, ortopedista e duchista, sendo que, com exceção às duasprimeiras profissões mencionadas, a regulamentação das demais, emverdade, ocorreu como um acréscimo não previsto em seu preâmbulo;além disso, merece ênfase a afirmação de que nesta discriminação seinclui principalmente a vedação inconstitucional do já referido art. 38,havendo necessidade de uma nova regulamentação aos profissionais alimencionados, mormente em razão da vedação que lhes é imposta pelocitado dispositivo; constata-se ainda a omissão e/ou inconstitucionalidadedos demais artigos que requerem substituição ante à discriminação querecai sobre a atividade profissional dos optometristas com formaçãosuperior, nos termos já explicitados.

"Tendo por finalidade tão importante missão, qual seja, regular o exercíciodas atividades profissionais na área da saúde, mas não correspondendoàs expectativas de algumas das atividades profissionais que menciona,principalmente em nossos dias, o Decreto n. 20.931/32 necessita sersubstituído por uma lei que venha a lume a partir de criteriosa análise dasquestões que envolvem as atividades profissionais nessa área, incluída aía atividade dos optometristas, com expressa diferenciação das funçõesdo optometrista prático e dos respectivos técnicos de nível médio esuperior.

"No que se refere ao Decreto n. 24.492/34, dos seus 25 artigos, pelomenos 4 requerem modificação para a inclusão do optometrista comformação superior e são eles: arts. 7º, 9º, "b", 14 e 15; todos essesdispositivos são omissos quanto à inclusão do optometrista de nívelsuperior quando se referem às fórmulas óticas fornecidas para aaquisição de lentes de grau, porquanto são expressos em viabilizá-las porprescrição médica tão somente.

"Como se pode ver, há também necessidade de modificação dedisposições do citado Decreto n. 24.492/34, a par da necessidade de totalsubstituição do prefalado Decreto n. 20.931/32, merecendo ênfase areflexão sobre o tempo já decorrido entre a expedição de ambos os

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decretos e nossos dias, contando com mais de setenta anos de evoluçãodas atividades profissionais, o que, diante das garantias dos direitosfundamentais, amplamente reconhecidos na atual Carta Magna, requeruma reformulação da legislação em comento, devendo ser sanada adiscriminação quanto às profissões já mencionadas, quer pelainsuficiência de regulamentação, quer pela proibição de instalação deconsultórios aos profissionais que tenham habilitação para tanto, no quese incluem os optomestristas com formação superior, devendo a estes serreconhecido expressamente o direito de atuarem como profissionaiscapacitados para exercerem a profissão nos moldes em que vêmatuando, inclusive com o direito à prescrição de lentes de grau, atividadeesta plenamente condizente com a habilitação desses profissionais.

"O citado Decreto n. 20.931/32, em verdade, é insuficiente para o fim aque se destina, tendo, em razão de suas deficiências, sido instrumento deviolação do direito ao exercício da atividade profissional dos tecnólogosem optometria com formação superior, desde o seu surgimento no mundojurídico, a par das deficiências que recaem também sobre as outras áreasjá mencionadas e que regulamenta, não se admitindo tal discriminaçãofrente ao atual texto constitucional, o que se constitui em razão suficientepara sua substituição por completo.

"Sabe-se que a redação de qualquer ato normativo deve ser o mais clarapossível, deve primar por uma linguagem comum, evitando-se, portanto,na medida do possível, palavras que requerem consulta ao dicionário.Também deve tratar do assunto da forma mais explícita possível,procurando ainda apontar as necessárias especificidades e ainda deveestar em consonância com os ditames constitucionais. Tudo isto para quese perpetue no tempo. Não atendidas essas condições, a probabilidadede substituição torna-se maior. Parece ser este o caso do Decreto n.20.931/32, dada à incompatibilidade com a Constituição Federal,conforme já asseverado, não podendo mais ser aplicado na sua totalidadea grande parte das atividades profissionais que regulamenta e que, aexemplo de muitas outras profissões, conquistaram ao longo do tempomaior espaço de funcionalidade.

"Neste contexto, no que se refere especificamente aos optometristas, deque tratam os autos, há que se perguntar: 1º) seria justo que a falta declareza do Decreto n. 20.931/32 e a inexistência de regulamentaçãoexpressa da figura do optometrista de nível superior, acarretandodificuldade de interpretação, viesse propiciar a escolha da interpretaçãomais desfavorável a esse profissional? 2º) E essa interpretação nãoestaria sendo corporativista, preconceituosa e totalmente em desalinhocom os avanços da Ciência constatados no mundo?

"Feita esta reflexão, importante se faz o registro de que, apesar de

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algumas decisões contrárias, tem-se constatado decisões favoráveis aosoptometristas de nível superior, sendo-lhes reconhecido o direito deexercício da profissão, tanto no âmbito da Justiça Estadual quanto daFederal, a exemplo das decisões de fls. 114 e 137 dos autos.

"Sem sombra de dúvida que esta precariedade na regulamentação daatividade desses profissionais, juntamente com a que recai sobre asdemais, conforme já asseverado, constituem razão suficiente a impor anecessidade de ser editada uma lei que venha regulamentar de modomais amplo essas profissões da área da saúde que não tiveram muitoespaço na citada legislação, publicada na década de 30, durante oGoverno Provisório de Getúlio Vargas, quando o Estado brasileiro aindaera denominado República dos Estados Unidos do Brasil" (fls. 11-23).

Como visto, e em arremate ao anteriormente afirmado, é preciso quea exegese emprestada aos vetustos dispositivos sejam compatibilizados com a realidadeda vida e com a própria realidade constitucional. Não é aceitável que, por viastransversas, o Poder Judiciário seja utilizado como garantidor de uma injustificávelreserva de mercado aos profissionais da medicina. Os tempos são outros e, assim comoocorreu com outros campos relacionados ao bem estar e à saúde humana, a multifacedessas atividades abriu espaço para novas profissões, em que a exigência deconhecimentos específicos são supridos pela necessária especialização.

Conforme muito bem ressaltou o voto acima colacionado, o art. 38do Decreto n. 20.931/32 é evidentemente lacunoso, pois menciona a expressãooptometrista, sem especificar que a vedação à instalação de consultórios se refere aosprofissionais da área que não tenham habilitação para tanto, aí se enquadrando a figurado optometrista prático, ao qual não se poderia obviamente deferir as mesmasatribuições de um optometrista com formação superior.

Assim, como resultado de interpretação lógica e sistêmica,mostra-se razoável a afirmação de que a vedação constante do citado art. 38 nãoencampa o exercício profissional do optometrista com formação superior, até para nãocolidir com o disposto no art. 3º do mesmo Decreto, que expressamente contempla esteprofissional.

Desse modo, ainda secundando o que se afirmou nos julgados doSuperior Tribunal de Justiça e na decisão retro, deveria o aludido dispositivo referir-seexpressamente à figura do optometrista prático ou sem a devida qualificação para amanutenção de consultório especializado em atender pacientes, na forma comolegalmente pode atuar um optometrista de nível superior.

De outro lado, não há que se falar em ilegalidade da Portaria n.397/02, do Ministério do Trabalho, que aprovou a Classificação Brasileira de Ocupações,sob a alegativa de que ela colide com o disposto nos Decretos ns. 20.931/32 e

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24.492/34.

Concorda-se, em princípio, com o argumento expendido peloeminente relator originário, que os Decretos em referência tem status de lei e, mesmoassim não fosse, a Portaria, por ser hierarquicamente inferior não teria o condão derevogar o que neles está expresso.

Não se trata, a bem dizer, de revogação, mas de simplescomplementação para suprir as inegáveis lacunas daqueles decretos e principalmente devaler-se de norma que possibilite a aplicação daquelas regras à luz da nova ordem legale constitucional.

Demais disso, não se pode descurar que a Portaria n. 397/02, doMinistério do Trabalho, que aprovou a Classificação Brasileira de Ocupações, não estásolta no ordenamento legal. Ela foi editada com base em delegação dada pelaConstituição Federal ao Presidente da República e este, de seu turno, ainda comautorização derivada da Lei Maior, atribuiu essa competência ao Senhor Ministro doTrabalho.

Com efeito. Nos termos do art.84 da Constituição Federal, competeprivativamente ao Presidente da República "exercer, com o auxílio dos Ministros deEstado, a direção superior da administração federal (inc. II) e "dispor sobre aorganização e o funcionamento da administração federal, na forma da lei" (inc. VI). Emcomplemento, o art. 87 estabelece que "compete ao Ministro de Estado, além de outrasatribuições previstas nesta Constituição e na lei" (parágrafo único), "expedir instruçõespra a execução das leis, decretos e regulamentos" (inc. II) e "praticar os atos pertinentesàs atribuições que lhe forem outorgadas ou delegadas pelo Presidente da República"(inc. IV).

Na concretização dos mandamentos constitucionais, foi editada a Lein. 9.649, de 27 de maio de 1998, que "Dispõe sobre a organização da Presidência daRepública e dos Ministério e dá outras providências". Na seqüência, o Chefe do PoderExecutivo fez publicar o Decreto n. 3.129, de 9 de agosto de 1999, ainda vigente à épocaem que foi editada a Portaria 397/2002, que regulamentou a estrutura e competências doMinistério do Trabalho, dentre elas a atualização da Classificação Brasileira deOcupações ? CBO.

Eis o teor do dispositivo que tem pertinência com o tema sobenfoque:

"Art. 12. Ao Departamento de Emprego e Salário compete:

"[...]

"IV ? supervisionar a atualização da Classificação Brasileira deOcupações ? CBO, de modo a promover sua constante adequação ao

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mercado de trabalho;"

Mesma diretriz foi observada no Decreto n. 5.063, de 3 de maio de2004, atualmente em vigor.

Evidente, pois, que a Portaria foi editada com respaldo no Decreto n.3.129/99, vigente à época de sua publicação, o qual determinava que compete aoMinistério do Trabalho, por meio do Departamento de Emprego e Salário, supervisionar aatualização da Classificação Brasileira de Ocupações, bem como promover a suaadequação ao mercado de trabalho. E foi exatamente o que ocorreu com a inclusão daprofissão de optometria, que tem como requisito a conclusão de curso de nível superior.

Em conclusão, como os optometristas tem sua profissãoreconhecida em lei ? como se viu, desde a edição do Decreto n. 20.931/32 ?, o fato deas atividades que por eles podem ser desenvolvidas não estar claramenteregulamentadas, é ilegal a negativa da Administração em conceder alvará para ainstalação do estabelecimento em que elas serão exercidas. Poderão os órgãosfiscalizatórios coibir aquelas práticas que são privativas de médico, situação que nãoestá em análise no presente julgado.

Sobre isso já obtemperou o Desembargador Newton Trisotto:

"Estabelecida a premissa de que a optometria é uma atividade lícita(Decreto Federal nº 20.931/1932, com força de lei, conforme decisão doSupremo Tribunal Federal na ADI-MC nº 533), não há como negar alvarásanitário ou de funcionamento e localização àquele que para ela sehabilitou, sem o qual estará impossibilitado de exercer a profissão.

"O alvará deverá especificar as atividades que poderão ser exercidas pelolicenciado" (ACMS n. 2008.022199-0).

No mesmo rumo é o entendimento da Desembargadora Sônia MariaSchmitz:

"Reconhecida a formação profissional em optometria, inclusive peloMinistério da Educação, não se há negar a concessão de alvará sanitárioaos técnicos devidamente habilitados, desde que respeitados os limiteslegalmente impostos para o desempenho da atividade" (MS n.2007.042022-7, de Balneário Camboriú).

Ante o exposto, dou provimento ao recurso para reformar a sentençae conceder parcialmente a segurança, para o fim de reconhecer o direito de a impetranteobter o alvará sanitário reclamado e declarar a insubsistência do Auto de Infração n.1.525. O exercício profissional da optometria, no entanto, deverá se restringir àquelasatividades facultadas pelas normas de regência, sendo vedado, em absoluto, as práticasprivativas do médico oftalmologista.

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DECISÃO

Nos termos do voto do relator, por maioria de votos, concederamparcialmente a ordem. Vencidos os Excelentíssimos Senhores DesembargadoresRicardo Roesler e Jânio Machado, que votaram no sentido de conhecer do pedido deuniformização de jurisprudência e manter a sentença que denegou a ordem.

O julgamento, realizado no dia 11 de março de 2009, foi presididopelo Excelentíssimo Senhor Desembargador Pedro Manoel Abreu, com voto, e deleparticiparam os Excelentíssimos Senhores Desembargador Ricardo Roesler,Desembargador Pedro Manoel Abreu, Desembargador Cláudio Barreto Dutra,Desembargador Newton Trisotto, Desembargador Luiz Cézar Medeiros, DesembargadorVanderlei Romer, Desembargador Sérgio Roberto Baasch Luz, Desembargador RuiFortes, Desembargador Cid Goulart, Desembargador Jaime Ramos e DesembargadorJânio Machado.

Florianópolis, 24 de março de 2009.

Luiz Cézar MedeirosRELATOR DESIGNADO

Declaração de voto vencido do Des. Substituto Ricardo Roesler.

OPTOMETRIA. DISCUSSÃO, EM SEDE MANDAMENTAL,CENTRADA NOS LIMITES DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE DOTÉCNICO OPTOMETRISTA. CONFRONTO ENTRE O DISPOSTONOS DECRETOS N.º 20.931/32 E N.º 24.492/34, QUEDISCIPLINAVAM ORIGINARIAMENTE A PROFISSÃO, EM FACEDA PORTARIA N.º 397/02, DO MINISTÉRIO DO TRABALHO EEMPREGO, QUE INCLUIU A ATIVIDADE NA CLASSIFICAÇÃOBRASILEIRA DE OCUPAÇÕES ? CBO. DECRETOS QUE GOZAMDO STATUS DE LEI, RECEPCIONADOS PELAS CONSTITUIÇÕESQUE OS SUCEDERAM. ADMISSIBILIDADE DE LIMITAÇÃO AOEXERCÍCIO DA ATIVIDADE, POR FORÇA DO PRIMADO DASAÚDE PÚBLICA. AUSÊNCIA DE INCOMPATIBILIDADE COM AORDEM CONSTITUCIONAL VIGENTE (ART. 5.º, XIII).

PORTARIA QUE COLIDE FRONTALMENTE COM ASDISPOSIÇÕES DOS DECRETOS. ILEGALIDADE. EXPEDIENTENORMATIVO SEM PODER REGULAMENTADOR, QUE NÃO PODESE OPOR AOS CONTORNOS DOS DECRETOS QUE TRATAMSOBRE A ATIVIDADE DO OPTOMETRISTA. EXERCÍCIO DA

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PROFISSÃO QUE REQUER CONFORMAÇÃO AOSRESPECTIVOS DECRETOS.

Os Decretos n.º 20.931/32 e 24.492/34, que regulamparcialmente a atividade de optometria, foram recepcionados pelanova ordem constitucional, com força de lei. Conquanto aConstituição de 1988 conclame o livre exercício de qualqueratividade, impõe o dever de que seja exercida de acordo com o queprescreve a lei, em sentido amplo (art. 5.º, XIII, da CR). No caso daatividade de optometria, as limitações ao seu exercício decorrem dasua estreita afinidade com as atividades próprias do ofíciooftalmológico ? em particular, os exames de medição de grau eprescrição de lentes ?, em observância ao primado da saúdepública.

Diferentemente do que ocorre com os Decretos n.º 20.931/32 e24.492/34 ? editados durante o Governo Provisório, no primeiroperíodo de mandato de Getúlio Vargas, aos quais se conferemstatus de lei ? a Portaria n.º 397/02, editada pelo Ministério doTrabalho e Emprego, não tem poder regulamentar. A portaria é, porexcelência, diploma destinado à normatização no âmbito interno daadministração pública (Celso Antônio Bandeira de Mello, Curso deDireito Administrativo). Ainda que tenha consignado a profissão deoptometrista no rol de Classificação Brasileira de Ocupações ? CBO,a fim de tê-la como atividade reconhecida (fato já implicitamentereconhecido pelos vetustos decretos), foge ao estreito âmbito desseespécime regulamentar fixar os contornos da profissão. A matéria éreservada ao crivo da lei, assim compreendida entre os espécimesprescritos pelo art. 59 da CR (à exceção, por óbvio, da emendaconstitucional), e, portanto, ao talante do Poder Legislativo. Nessecontexto, o exercício da atividade de optometria deve ficar jungidoaos limites definidos pelos decretos mencionados, à míngua de leidiversa regulando a profissão.

Tratam os autos de liberação de alvará sanitário a fim de permitir àimpetrante manter o seu estabelecimento profissional de optometria. A causa de pedir,porém, exige que sejam delimitados os contornos da atividade, sobretudo em face daaparente revelada no cotejo da legislação regente.

Com efeito, as atividades do optometrista são reguladas nosDecretos n. 20.931/32 e 24.492/34, e na Classificação Brasileira de Ocupações ? CBO,editada pelo Ministério do Trabalho e Emprego, por intermédio da Portaria n.397/2002 doMTE.

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Ocorre que algumas das atividades previstas na CBO contrariam odisposto nos decretos, contrapondo-se, em tese, às atividades privativas do médicooftalmologista.

A propósito do que já mencionei no julgamento que concluiu pelainstauração de incidente uniformizador nestes autos, as Câmaras que reúnem os órgãosjulgadores no âmbito do direito público nesta Corte posicionam-se de modo diverso, issono que pertine aos limites do exercício da atividade de optometria. E a razão da colisãojurisprudencial decorre da concorrência de diplomas que pretendem a regulamentaçãoda profissão de optometrista.

De um lado, o Decreto n.º 20.931/32, que indiretamente prestaalguma disciplina à profissão de optometrista, assim dispõe:

"Art. 3º Os optometristas, práticos de farmácia, massagistas e duchistasestão também sujeitos à fiscalização, só podendo exercer a profissãorespectiva se provarem a sua habilitação a juízo da autoridade sanitária.

Art. 4º Os graduados por escolas ou universidades estrangeiras só podemexercer a profissão, após submeterem-se a exame de habilitação, peranteas faculdades brasileiras, de acordo com as leis federais em vigor.

Art. 5º É obrigatório o registro do diploma dos médicos e demaisprofissionais a que se refere o art. 4.º, no Departamento Nacional deSaúde Pública e na repartição sanitária estadual competente. (...)

Art. 9º Nas localidades onde não houver autoridade sanitária, compete àsautoridades policiais e judiciárias verificar se o profissional se achadevidamente habilitado para o exercício da sua profissão.

Art. 10. Os que, mediante anúncios ou outro qualquer meio, sepropuserem ao exercício da medicina ou de qualquer dos seus ramos,sem titulo devidamente registrado, ficam sujeitos, ainda que se entreguemexcepcionalmente a essa atividade, às penalidades aplicáveis aoexercício ilegal da medicina.

Art. 13. Os que apresentarem oposições ou embargo de qualquer ordemà ação fiscalizadora da autoridade sanitária, ou que a desacatarem noexercício de suas funções, ficam sujeitos à multa de Cr$ 2.000,00 a5.000,00, cobrável executivamente sem prejuízo da ação penal pordesacato à autoridade que poderá ter lugar por denúncia do MinistérioPúblico na Justiça Federal ou por denúncia dos órgãos competentes daJustiça Estadual. (...)

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 38. É terminantemente proibido aos enfermeiros, massagistas,optometristas e ortopedistas, a instalação de consultórios para atender

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clientes, devendo o material ai encontrado ser apreendido e remetido parao depósito público, onde será vendido judicialmente a requerimento daProcuradoria dos Feitos da Saúde Pública, a quem a autoridadecompetente oficiará nesse sentido. O produto do leilão judicial serárecolhido ao Tesouro, pelo mesmo processo que as multas sanitárias.

Art. 39. É vedado às casas de óptica confeccionar e vender lentes de grausem prescrição médica, bem como instalar consultórios médicos nasdependências dos seus estabelecimentos. (...)

Art. 41. As casas de óptica, ortopedia e os estabelecimentos eletro, rádioe fisioterápicos de qualquer natureza devem possuir um livro devidamenterubricado pela autoridade sanitária competente, destinado ao registro dasprescrições médicas.

Art. 42. A infração de qualquer dos dispositivos do presente decreto serápunida com a multa de Cr$ 2.000,00 a 5.000,00 conforme a sua natureza,a critério da autoridade autoante, sem prejuízo das penas criminais. Estaspenalidades serão discriminadas em cada caso no regulamento.

Parágrafo único. Nos casos de reincidência na mesma infração dentro doprazo de 2 anos, a multa será duplicada a cada nova infração. (...)"

De outro vértice, o Decreto n.º 24.492/34, que disciplina a venda delentes de grau, dispõe o seguinte:

"Art.1º - A fiscalização dos estabelecimentos que vendem lentes de grauem todo o território da República é regulada na forma dos artigos 3, 39,41, e 42 do decreto nº 20.931, de 11 de janeiro de 1932 e exercida , nodistrito federal,pela Inspetoria de Fiscalização do Exercício da Medicina,da Diretoria Nacional de Saúde e assistência Médico Social porintermédio do Serviço de Profilaxia das Moléstias Contagiosas dos olhose nos Estados ficará a cargo das repartições sanitárias Estaduaiscompetentes. (...)

Art.5º- A autorização para o comércio de lentes de grau será solicitada àautoridade sanitária competente em requerimento assinado peloproprietário ou sócio, ficando o requerente responsável pelo fielcumprimento deste decreto.

Art.6º- Para obtenção da autorização ou licença respectiva, oestabelecimento comercial é obrigado a possuir:

I - no mínimo, um óptico prático, de acordo com o artigo 4º desdedecreto.

II – as seguintes lentes, no mínimo duas de cada espécie.

Esféricas positivas, em grau crescente, de 0.25 D em 0.25 D, desde 0.25D até 10 D, e, daí por diante de 1 D em 1 D até 20 D; b) Esféricas

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negativas em grau crescente de 0.25 D em 0.25 D, desde0.25 D até 10D, e daí por diante de 1 D em 1 D até 20 D; c)Cilíndricas simples,positivas em grau crescente, desde 0.25 D até 4 D; d) Cilíndricas simplesnegativas, em grau crescente desde 0.25 D cilíndricas combinadas com0.25 D esféricas e progressivamente até 2 D cil, com 6 D esféricas; f)Esfero –cilíndricas negativas desde 0.25 D. Cil, com 0.25 D esf. Eprogressivamente até 2.50 D Cil. Com 10 esf.; g) vidros em brutoincolores e conservas que habilitem ao aviamento das receitas de óptica.

Parágrafo Único – A exigência dos Ns. I e II se tornarão efetiva para osestabelecimentos já instalados, decorridos seis meses da publicação dopresente decreto:

III – Os aparelhos seguintes: Pedra para rebaixar cristais, aparelhos paraverificação do grau das lentes e respectiva montagem de lentes.

IV – Um livro para o registro de todas as receitas de óptica, legalizadocom um termo de abertura e encerramento, com todas as folhasnumeradas e devidamente rubricadas pela autoridade sanitáriacompetente.

V – Na localidade em que não houver estabelecimento comercial quevenda lentes de grau na forma do artigo 6º, será permitido, a títuloprecário, as farmácias ou a outro estabelecimento devidamente licenciadodas autoridades sanitárias, a venda de lentes de grau cessando, porém,esta licença, seis meses depois da instalação de estabelecimentolicenciada forma do presente decreto.

Art.7º - No livro de registro serão transcritas textualmente as receitas deóptica aviadas, originais ou cópias, com o nome e residência do paciente,bem como do médico oculista. (...)

Art.9 – Ao óptico prático do estabelecimento compete:

a) a manipulação ou fabrico das lentes de grau; b) o aviamento perfeitodas fórmulas ópticas fornecidas por médico oculista; c) substituir porlentes de grau idêntico aquelas que lhe forem apresentadas danificadas;d) datar e assinar diariamente o livro de registro do receituário de óptica.(...)

Art.11º - O óptico registrado não poderá ser responsável por mais de umestabelecimento de venda de lentes de grau.

Art.12º - Nenhum médico oculista, na localidade em que exercer a clínica,nem a respectiva esposa, poderá possuir ou ter a sociedade paraexplorar o comércio de lentes de grau.

Art.13º - É expressamente proibido ao proprietário, sócio-gerente, ópticoprático e demais empregados do estabelecimento, escolher ou permitir

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escolher, indicar ou aconselhar o uso de lentes de grau, sob pena deprocesso por exercício ilegal da medicina, além das outras penalidadesprevistas em lei.

Art.14º – O estabelecimento de venda de lentes de grau só poderáfornecer lentes de grau mediante a apresentação da fórmula óptica domédico cujo diploma se ache devidamente registrado na repartiçãocompetente.

Art.15º - Ao estabelecimento de venda de lentes de grau só é permitido,independente a receita médica substituir por lentes de grau, executarconserto nas armações das lentes e substituir as armações quandonecessário.

Art. 16º - O estabelecimento comercial de venda de lentes de grau nãopode ter consultório médico fora das suas dependências, não sendopermitida ao médico sua instalação em lugar de acesso obrigatório peloestabelecimento.

1º - É vedado ao estabelecimento comercial manter consultório médicofora das suas dependências; indicar médico oculista que dê à suasrecomendadas vantagens não concedidas aos demais clientes, edistribuir cartões ou vales que dêm direito à consulta grátis, remuneradasou com reduções de preço. (...)

Art.17º - É proibida a existência de câmara escura no estabelecimento devenda de lentes de grau, bem assim ter pleno funcionamento, aparelhospróprios para o exame dos olhos, cartazes e anúncios com oferecimentode exames de vista. (...)"

A leitura comparativa desses diplomas revela uma esfera bastantereduzida à atividade de optometria, limitando, de um modo geral, à confecção de lentesde grau e montagem de óculos. Não permite a legislação apontada o aviamento delentes de grau, ou mesmo qualquer prática de caráter propriamente médico (a exemplode exames visuais), tenha ou não natureza invasiva.

Por outro lado, fora recentemente editada nova legislação (Portarian.º 397, do Ministério do Trabalho e Emprego) que renovou os contornos daClassificação Brasileira de Ocupações ? CBO e, entre outros, incluiu a atividadeoptometria em seu rol (item 3223). Com a classificação as atribuições do optometristapassaram a ser as seguintes:

"A - REALIZAR EXAMES OPTOMÉTRICOS1. Fazer anamnese 2. Medir acuidade visual 3. Analisar estruturasexternas e internas do olho 4. Mensurar estruturas externas e internas doolho 5. Medir córnea (queratonometria, paquimetria e topografia) 6.Avaliar fundo do olho (oftomoscopia) 7. Medir pressão intraocular

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(tonometria) 8. Identificar deficiências e anomalias visuais 9. Encaminharcasos patológicos a médicos 10. Realizar testes motores e sensoriais 11.Realizar exames complementares 12. Prescrever compensação óptica 14.Recomendar auxílios ópticos 15. Realizar perícias optométricas emauxílios ópticos.B - ADAPTAR LENTES DE CONTATO.1. Fazer avaliação lacrimal 2. Definir tipo de lente 3. Calcular parâmetrosdas lentes 4. Selecionar lentes de teste 5. Colocar lentes de teste no olho6. Combinar uso de lentes (sobre-refração) 7. Avaliar teste 8. Retocarlentes de contato 9. Recomendar produtos de assepsia 10. Executarrevisões de controle.

C - CONFECCIONAR LENTES1. Interpretar ordem de serviço 2. Fundir materiais orgânicos e minerais 3.Escolher materiais orgânicos e minerais 4. Separar insumos eferramentas 5. Projetar lentes (curvas, espessura, prismas) 6. Blocarmateriais orgânicos e minerais 7. Usinar materiais orgânicos e minerais 8.Dar acabamento às lentes 9. Adicionar tratamento as lentes(endurecimento, anti-reflexo, coloração, hidratação e filtros) 10. Aferirlentes 11. Retificar lentes.(omissis)F - PROMOVER EDUCAÇÃO EM SAÚDE VISUAL1. Assessorar órgãos públicos na promoção da saúde visual 2. Ministrarpalestras e cursos 3. Promover campanhas de saúde visual 4. Promovera reeducação visual 5. Formar grupos multiplicadores de educação emsaúde visual.G - VENDER PRODUTOS E SERVIÇOS ÓPTICOS E OPTOMÉTRICOS.1. Detectar necessidades do cliente 2. Interpretar prescrição 3. Assistircliente na escolha de armações e óculos solares 4. Indicar tipos de lentes5. Coletar medidas complementares 6. Aviar prescrições de especialistas7. Ajustar óculos em rosto de cliente 8. Consertar auxílios ópticos.H - GERENCIAR ESTABELECIMENTO1. Organizar local de trabalho 2. Gerir recursos humanos 3. Prepararordem de serviço 4. Gerenciar compras e vendas 5. Controlar estoque demercadorias e materiais 6. Controlar estoque de mercadorias e materiais6. Controlar qualidade de produtos e serviços 7. Administrar finanças 8.Providenciar manutenção do estabelecimento.Y. COMUNICAR-SE1. Manter registros de cliente 2. Enviar ordem de serviço a laboratório 3.Orientar cliente sobre o uso e conservação de auxílios ópticos 4. Orientarfamília do cliente 5. Emitir laudos e pareceres 6. Orientar a ergonomia davisão 7. Solicitar exames e pareceres de outros especialistas.6) RECURSOS DE TRABALHOQueratômetro Máquinas surfaçadoras Lâmpada de burton Filtros e FeltroLâmpada de fenda (biomicroscópio) Produtos para assepsia abrasivos

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Retinoscópio Lensômetro Refrator Oftalmoscópio (direto-indireto)Pupilômetro Topógrafo Caixas de prova e armação para auxílios ópticosCalibradores Alicates chaves de fenda Máquinas para montagem Tabelade Projetor de Optótipos Torno Tonômetro Corantes e fluoesceínaSoventes Polidores e lixas Foróptero, Espessímetro, Moldes e modelosTítmus Resinas".

É de fácil visualização que a nova legislação alargou sensivelmenteo rol de atribuição do técnico em optometria, dando origem ao dissenso que se verificanesse Tribunal acerca da matéria.

A corrente majoritária defende a tese de que os Decretos n.º20.931/32 e 24.492/34, recepcionados pelas Constituições que os sucederam(conferindo-lhes, inclusive, o status de lei), sobrepõem-se à disciplina conferida àatividade de optometria com o advento da Portaria n.º 397, visto que este expedientenormativo não poderia regular a matéria já disciplinada. Cito, na linha de precedentescom esta orientação, ACMS n. 20080221990, de Rio do Sul. Primeira Câmara de DireitoPúblico. Rel. Des. Newton Trisotto. Decisão de 20.10.08; AC n. 2007.007911-6, deTubarão. Primeira Câmara de Direito Civil. Rel. Des. Maria do Rocio Luz Santa Ritta.Decisão de 19.02.08; ACMS n. 2007.003760-6, da Capital. Primeira Câmara de DireitoPúblico. Rel. Des. Vanderlei Romer. Decisão de 16.10.07.

Por outro lado, também há entendimento diverso na TerceiraCâmara de Direito Público deste Tribunal, fundado na tese de aplicação concorrente dosdiplomas, conferindo-se ao optometrista as prerrogativas conferidas a partir da edição daaludida Portaria n.º 397/02, ao argumento da interpretação conforme à Constituição (cito,em particular, AI n. 2008.007690-0, de São Bento do Sul. Rel. Des. Luiz CézarMedeiros. Decisão de 27.06.08).

Firmado o dissídio, é necessário promover a uniformização. Antes,contudo, há discussão a ser vencida, pertinente à alegação de "inconstitucionalidade"dos Decretos n.º 20.931/32 e 24.492/34, invocada por ocasião da interposição daapelação, tendo em vista que a decisão atacada guiou-se por estes diplomas.

Reconheço que a alegação, nesta fase, de "inconstitucionalidade",não é apropriada, pois fugiu da apreciação da instância originária, onde deveria ter sidoprovocada pela via dos embargos declaratórios. Todavia, tendo em vista que a intençãodeste julgado é uniformizar o entendimento do Tribunal sobre a matéria, e que eventualvício material ou formal dos diplomas em questão poderá influir na solução do incidente,entendo ser pertinente a análise de timbre constitucional.

Lembro, ademais, que revelado ser invencível a análise de fundosem apreciação dos contornos constitucionais dos decretos apontados, é lícita aapreciação oficiosa pelo órgão judicante, visto que "o controle da constitucionalidade por

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via incidental se impõe toda vez que a decisão da causa o reclame, não podendo o juizjulgá-la com base em lei que tenha por inconstitucional, senão declará-la em prejudicial,para ir ao objeto do pedido" (RE 89553/GO. Primeira Turma. Rel. Min. Rafael Mayer.Decisão de 24.03.81).

Posto isso, inicio por destacar que nada impede que a discussão nãoseja promovida pelo órgão plenário, pois que não se discute de fato eventualinconstitucionalidade dos diplomas, mas sim a não-receptividade em face da novaConstituição.

De fato, debate-se acerca de diplomas que precederam aConstituição da República de 1988, e nesse caso eventual análise de constitucionalidadesomente poderia ser promovida com o confronto oportuno em face da Constituição entãovigente. Em relação à nova ordem constitucional, pode-se apenas debater-se sobre suareceptividade, ou, em sentido oposto, sobre sua revogação de acordo com a ordemvigente, expediente que, ao revés da declaração de inconstitucionalidade, não requerobservância à cláusula de reserva de plenário (Ag. Reg. No RE n.º 353.508-1/RJ.Segunda Turma. Rel. Min. Celso de Mello. Decisão de 15.05.07). Logo, fica afastada nocaso a incidência da Súmula Vinculante n.º 10.

No que pertine à validade dos diplomas questionados, parece nãohaver dúvida quanto à sua recepção pela Constituição vigente.

Ambos os decretos, que datam do primeiro governo de GetúlioVargas (editados entre 1932 e 1934), foram formalmente recepcionados pelaConstituição superveniente, isso porque, à época de sua edição, os decretospresidenciais gozavam de poder regulatório, desfrutando do status de lei. Nessecontexto, sucederam as Constituições posteriores (Cartas de 1937, 1967-69 e 1988),sem que se observe qualquer vício aparente.

Sobre o tema, anotou Celso Ribeiro Bastos que

"Vale salientar um aspecto formal de fundamental relevância neste ponto.É que referidos decretos foram editados n primeiro período do GovernoVargas, quando, então, era-lhe permitido legislar sobre a forma dedecreto. Daí a força (de lei) que sempre a tiveram, inclusive atualmente"(Da Criação e Regulamentação de Profissões e Cursos Superiores: ocado dos oftalmologistas, optometristas e ópticos práticos, em Revista deDireito Constitucional e Internacional, v. 34, jan-mar.2001, RT, p. 250-251? grifei).

O mesmo parece evidente em relação à matéria vinculada nosdecretos. Segundo a recorrente, os decretos, sob o ponto de vista material, nãoguardariam harmonia com a Constituição de 1988, forte no art. 5.º, XIII ("é livre oexercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações

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profissionais que a lei estabelecer"), que enaltece o primado do pleno emprego.

Deve ser destacado, contudo, que o disposto no art. 5.º, XIII, daCR/1988 encerra norma de eficácia contida, ou seja, pode ter o seu exercício limitado emlei; não há, por certo, exercício amplo e irrestrito de qualquer atividade, salvo se nãohouver regulamentação à profissão.

Por fim, destaco que as limitações contidas originariamente nestesdiplomas não autorizam concluir pela sua não-receptividade. Conquanto a nova ordemconstitucional prime pela valorização do trabalho e da livre iniciativa, inclusive como valorfundamental da República (art. 1.º, IV, da CR), repetindo-o, pontualmente, como princípioda ordem econômica (art. 170, caput e inc. IV), o exercício de qualquer atividade deveestar circunscrita aos parâmetros legais (art. 5.º, XIII, e art. 174, caput, da CR).

Pesam aqui, por certo, injunções de toda ordem, a começar pelanecessidade de equacionar-se os limites da concorrência, de sorte que cada profissão ouofício fique circunscrito a determinado campo de atuação. Na lição de Celso RibeiroBastos,

"Pela livre iniciativa, assegura-se a todos o direito de ingressarem nomercado, mas não se torna certo o direito de todos o fazerem sem oatendimento de certas condições. A livre concorrência significa que osêxitos de uns e os malogro de outros decorrerão do fator competência, enão de práticas desleais e fraudulentas.

A livre iniciativa, em conclusão, jamais poderia ser considerada como umdireito ou liberdade absoluta. Sofre condicionamentos tanto porque aConstituição admite que a lei exija o cumprimento de certoscondicionamentos para que dada profissão seja exercida, como tambémporque sempre poderá haver a restrição de uma liberdade em face doexercício de outra" (Da Criação e Regulamentação de Profissões eCursos Superiores: o cado dos oftalmologistas, optometristas e ópticospráticos, em Revista de Direito Constitucional e Internacional, v. 34,jan-mar.2001, RT, p. 248).

Ao lado deste primado há, também, o imperativo da saúde pública,de modo a exigir maior ou menor limitação ao exercício de determinadas atividades, aexemplo da função de optometria. Conquanto por vezes se pretenda concluir que taisatividades não implicam na atuação do profissional no campo da saúde, pareceinduvidoso que atuam, de algum modo, no âmbito da medicina visual, posto que seentenda por atuação "não-invasiva". Daí porque não podem reclamar indulgência algumado poder público nos limites de sua atuação, impondo-se, em toda sua extensão, rígidanormatização, a exemplo do que disciplinam os Decretos n.º 20.931/32 e 24.492/34.Assim pontifica Celso Ribeiro Bastos:

"Nota-se, em todos os dispositivos que regulam a matéria, a manifestação

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de preocupações quanto à saúde pública. A atuação exclusiva demédicos oftalmologistas, afastando a atividade dos ópticos práticos e dosoptometristas, justifica-se na media em que o tratamento e mesmo odiagnóstico das patologias relacionadas ao globo ocular deve sernecessariamente, alçada de profissional com conhecimentos quepropiciem a correta detectação da doença e as possíveis implicações quedela advenham. Daí a exigência de que tais atividades sejam promovidasexatamente por médicos.

Seria ignorar todo o avanço da humanidade, o pretender-se que tambémo óptico prático ou o otpometrista pudesse avançar em alguns segmentospertencentes ao ofício médico. Além do perigo iminente à saúde pública,caso viesse o Estado a propiciar esta situação, tem-se, ainda, a certezade que os danos de cunho individual poderiam ser exatamente gravosos.O mesmo se diga quanto à atividade desempenhada pelo denominadocontactólogo. Não pode este, por idênticos motivos, prescrever ou adaptarlentes de contato".

E prossegue:

"Mostra-se ingênua a idéia de que prescrever a lente de grau ? seja ounão uma lente de contato ? é algo alheio à saúde da pessoa,restringindo-se o problema à qualidade de visão do paciente. Aconteceque o ter um problema visual não implica apenas na prescrição de umgrau de lentes, envolvendo, outrossim, o determinar com precisão ascausas, para eventualmente também combatê-las, o que está totalmentefora das perspectivas de qualquer profissional que não seja médico.

O problema visual não se reduz à medição do grau de uma lente. É umpressuposto absolutamente errôneo este de que os problemas da visãosão resolvidos como o puro ato de indicar lentes. Com isto quer -se dizerque, simultaneamente à prescrição de lentes corretivas, faz-se necessáriauma avaliação geral do globo ocular. A deficiência visual pode se mostrarcomo a ponta de um iceberg, como um mero fator externo, que nãocontempla fatores internos degenerativos da córnea, não diagnosticadospelo simples teste da visão.

Em outras hipóteses, a manifestação de deficiência na visão é resultanteou prenúncio de outras doenças mais graves, não bastando a meracorreção por meio da prescrição de lentes de grau, que se mostrariamsolução imediatista e pouco conveniente ao tratamento do paciente.

É preciso fixar-se a clara dimensão que a prática profissional em pautaassume quando se leva em conta que uma distorção da visão pode tercausas outras que não a mera conformação da córnea. Pode-se envolverproblemas de retina, de pressão intra-ocular, todos pontos que só sãoexaminados à luz de efetivas práticas médicas.

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Na realidade, o que se pretende fazer, por meio da criação de cursos deoptometria dirigidos à prática da medicina é exatamente o contrário. Épressupor que qualquer problema na visão se exaure nele mesmo e que,portanto, a questão se limita a encontrar um grau de lente mais cômodo àvisão do paciente (...)" (Da Criação e Regulamentação de Profissões eCursos Superiores: o cado dos oftalmologistas, optometristas e ópticospráticos, em Revista de Direito Constitucional e Internacional, v. 34,jan-mar.2001, RT, p. 251-252)

Conclui, em arremate, o saudoso constitucionalista:

"A extrapolação, pela classe do óptico prático, dos lindes de seu ofício, éintolerável, por se absolutamente incompatível com os interesses difusosda sociedade, seja qual for a vertente que se pretenda assumir. Tantopela saúde pública como pelos direitos do consumidor, assim como peloângulo penal, a atividade deve ser coibida quando exercida de formaincompativel com o ofício próprio da medicina" (op. cit., p. 255).

Diante deste cenário, não se pode reconhecer qualquer mácula aosdecretos em comento, quer de natureza formal, quer de natureza material.

Ressalto que, além disso, a recorrente invocara a revogação dosarts 38, 39 e 41 do Decreto n.º 24.492/34, por força da superveniência do Decreto n.º99.678/90. Na verdade, contra este decreto fora proposta ação direta deinconstitucionalidade, e conferida a suspensão dos seus efeitos em caráter liminar (ADIn.º 533-2/DF. Rel. Min. Carlos Velloso. Decisão de 07.08.91). Atualmente, portanto,mantém-se hígidos os Decretos n.º 20.931/32 e 24.492/34.

Superadas as discussões inaugurais, é necessário proceder aocotejo dos diplomas que atualmente dispõem sobre a profissão de optometrista.

Conforme anotei alhures, a dissidência da Corte resume-se àaplicação apenas dos Decretos n.º 20.931/32 e 24.492/34 para definir os contornos dasatividades a serem exercidas pelos optometristas, ou fazê-lo com a concorrência com aPortaria n.º 397/02. E, a meu sentir, não há como associar a aplicação dos diplomas,seja pela palmar incompatibilidade (na verdade flagrante antinomia), seja pela naturezaformal de cada espécime legislativo.

Com efeito, os Decretos em questão limitam de modo bastantesevero os contornos da atividade do optometrista, de sorte a conferir-lhe somente o ofíciode confecção de óculos e lentes. Conforme já destaquei na legislação colacionada, osvetustos decretos não permitem o exercício da clínica, vedando, inclusive, a instalaçãode câmaras escuras ou o uso de aparelhos próprios para o exame dos olhos emestabelecimentos de ótica (art. 17 do Decreto n.º 20.931/32). De outro norte, já foi dito, aPortaria n.º 397/02 deu margem à ampliação extraordinária das atribuições dooptometrista, permitindo, inclusive, a realização de alguns exames visuais.

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Destaco que o STJ cotejou-se com a matéria, decidindo no sentidoda aplicação concorrente dos decretos com a portaria n.º 397/02, julgando a matéria emduas ocasiões distintas:

"ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR.CURSO SUPERIOR DE TECNOLOGIA EM OPTOMETRIA.RECONHECIMENTO PELO MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO.LEGITIMIDADE DO ATO.

1. A manifestação prévia do Conselho Nacional de Saúde é exigidaapenas para os casos de criação de cursos de graduação em medicina,em odontologia e em psicologia (art. 27 do Decreto n. 3.860/2001), nãoestando prevista para outros cursos superiores, ainda que da área desaúde.

2. Em nosso sistema, de Constituição rígida e de supremacia das normasconstitucionais, a inconstitucionalidade de um preceito normativo acarretaa sua nulidade desde a origem. Assim, a suspensão ou a anulação, porvício de inconstitucionalidade, da norma

revogadora, importa o reconhecimento da vigência, ex tunc, da normaanterior tida por revogada (RE 259.339, Min. Sepúlveda Pertence, DJ de16.06.2000 e na ADIn 652/MA, Min. Celso de Mello, RTJ 146:461; art. 11,§ 2º da Lei 9.868/99). Estão em vigor, portanto, os Decretos 20.931, de11.1.1932 e 24.492, de 28 de junho de 1934, que regulam a fiscalização eo exercício da medicina, já que o ato normativo superveniente que osrevogou (art. 4º do Decreto n. 99.678/90) foi suspenso pelo STF na ADIn533-2/MC, por vício de inconstitucionalidade formal.

3. A profissão de optometrista está prevista em nosso direito desde 1932(art. 3º do Decreto 20.931/32). O conteúdo de suas atividades estádescrito na Classificação Brasileira de Ocupações - CBO, editada peloMinistério do Trabalho e Emprego (Portaria n. 397, de 09.10.2002).

4. Ainda que se possa questionar a legitimidade do exercício, pelosoptometristas, de algumas daquelas atividades, por pertencerem aodomínio próprio da medicina, não há dúvida quanto à legitimidade doexercício da maioria delas, algumas das quais se confundem com as deótico, já previstas no art. 9º do Decreto 24.492/34.

5. Reconhecida a existência da profissão e não havendo dúvida quando àlegitimidade do seu exercício (pelo menos em certo campo de atividades),nada impede a existência de um curso próprio de formação profissionalde optometrista.

6. O ato atacado (Portaria n. 2.948, de 21.10.03) nada dispôs sobre asatividades do optometrista, limitando-se a reconhecer o Curso Superior deTecnologia em Optometria, criado por entidade de ensino superior. Assim,

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a alegação de ilegitimidade do exercício, por optometristas, de certasatividades previstas na Classificação Brasileira de Ocupações é matériaestranha ao referido ato e, ainda que fosse procedente, não constituiriacausa suficiente para comprometer a sua validade.

7. Ordem denegada" (MS 9469/DF. Primeira Seção. Rel. Min. Teori AlbinoZavascki. Decisão de 10.08.05 ? grifei).

Naquela ocasião conferiu-se, por mandado de segurança, amanutenção dos efeitos da Portaria n.º 2.948/03, que assegurava o reconhecimento docurso superior de Tecnologia em Optometria. A propósito de denegar-se a ordempostulada pelo Conselho Federal de Medicina, que pretendia sustar os efeitos daportaria, alegando que o curso de optometria abrangia disciplinas próprias da medicinaoftalmológica, a Corte Superior tangenciou a disciplina das atividades de optometria,justificando a manutenção do curso com fundamento concorrente nos decretos e naPortaria n.º 397/02.

Nessa esteira, recente decisão daquele Tribunal conferiu nuancesmais definidas à matéria, no seguintes termos:

"PROCESSO CIVIL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA.PROFISSIONAL DA OPTOMETRIA. RECONHECIMENTO PELOMINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. PRECEDENTE/STJ. LEGITIMIDADE DOATO. EXPEDIÇÃO DE ALVARÁ. DIREITO GARANTIDO SEPREENCHIDOS OS REQUISITOS SANITÁRIOS ESTIPULADOS NALEGISLAÇÃO ESPECÍFICA. VALORIZAÇÃO DO TRABALHO HUMANOE A LIBERDADE PROFISSIONAL. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS.

1. A valorização do trabalho humano e a liberdade profissional sãoprincípios constitucionais que, por si sós, à míngua de regulaçãocomplementar, e à luz da exegese pós-positivista admitem o exercício dequalquer atividade laborativa lícita.

2. O Brasil é um Estado Democrático de Direito fundado, dentre outrosvalores, na dignidade e na valorização do trabalho humanos. Essesprincípios, consoante os pós-positivistas, influem na exegese dalegislação infraconstitucional, porquanto em torno deles gravita todo oordenamento jurídico, composto por normas inferiores que provêm destasnormas qualificadas como soem ser as regras principiológicas.

3. A constitucionalização da valorização do trabalho humano importa quesejam tomadas medidas adequadas a fim de que metas como busca dopleno emprego (explicitamente consagrada no art. 170, VIII), distribuiçãoeqüitativa e justa da renda e ampliação do acesso a bens e serviçossejam alcançadas. Além disso, valorizar o trabalho humano, conforme opreceito constitucional, significa defender condições humanas de trabalho,além de se preconizar por justa remuneração e defender o trabalho de

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abusos que o capital possa dessarazoadamente proporcionar. (LeonardoRaupp Bocorny, In 'A Valorização do Trabalho Humano no EstadoDemocrático de Direito', Editora Sergio Antonio Fabris Editor, PortoAlegre/2003, páginas 72/73).

4. Consectariamente, nas questões inerentes à inscrição nos ConselhosProfissionais, esses cânones devem informar a atuação dos aplicadoresdo Direito, máxime porque dessa legitimação profissional exsurge apossibilidade do trabalho, valorizado constitucionalmente.

5. O conteúdo das atividades do optometrista está descrito naClassificação Brasileira de Ocupações - CBO, editada pelo Ministério doTrabalho e Emprego (Portaria n. 397, de 09.10.2002).

6. O art. 3º do Decreto nº 20.931, de 11.1.1932, que regula a profissão deoptometrista, está em vigor porquanto o ato normativo superveniente queos revogou (art. 4º do Decreto n. 99.678/90) foi suspenso pelo STF naADIn 533-2/MC, por vício de inconstitucionalidade formal.

7. Reconhecida a existência da profissão e não havendo dúvida quando àlegitimidade do seu exercício (pelo menos em certo campo de atividades),nada impede a existência de um curso próprio de formação profissionalde optometrista.(MS 9469/DF, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI,PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 10.08.2005, DJ 05.09.2005)

8. A competência da vigilância sanitária limita-se apenas à análise acercada existência de habilitação e/ou capacidade legal do profissional dasaúde e do respeito à legislação sanitária, objeto, in casu, de fiscalizaçãoestadual e/ou municipal.

9. O optometrista, todavia, não resta habilitado para os misteres médicos,como são as atividades de diagnosticar e tratar doenças relativas aoglobo ocular, sob qualquer forma.

10. O curso universitário que está dimensionado, em sua duração eforma, para o exercício da oftamologia, é a medicina, nos termos dalegislação em vigor (Celso Ribeiro Bastos, In artigo 'Da Criação eRegulamentação de Profissões e Cursos Superiores: o Caso dosOftalmologistas, Optomestristas e Ópticos Práticos', Estudos e Pareceres,Revista de Direito Constitucional e Internacional, nº 34, ano 9 -janeiro-março de 2001, RT, pág. 257).

11. Inexiste ofensa ao art. 535 do CPC, quando o Tribunal de origem,embora sucintamente, pronuncia-se de forma clara e suficiente sobre aquestão posta nos autos. Ademais, o magistrado não está obrigado arebater, um a um, os argumentos trazidos pela parte, desde que osfundamentos utilizados tenham sido suficientes para embasar a decisão.

12. Recurso Especial provido, para o fim de expedição do alvará sanitário

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admitindo o ofício da optometria" (Resp 975.322/RS. Primeira Turma. Rel.Min. Luiz Fux. Decisão de 14.10.08, publicada em 03.11.08).

Das razões de voto, destaco:

"O optometrista, todavia, não resta habilitado para os misteres médicos,como são as atividades de diagnosticar e tratar doenças relativas aoglobo ocular, sob qualquer forma.

Deveras, o optometrista não trata de enfermidades dos olhos, não realizacirurgias nem prescreve medicamentos, porque na verdade, cuida do atovisual, não do globo ocular.

É que o curso universitário que está dimensionado, em sua duração eforma, para o exercício da oftamologia, é a medicina, nos termos dalegislação em vigor (Celso Ribeiro Bastos, In artigo 'Da Criação eRegulamentação de Profissões e Cursos Superiores: o Caso dosOftalmologistas, Optomestristas e Ópticos Práticos', Estudos e Pareceres,Revista de Direito Constitucional e Internacional, nº 34, ano 9 -janeiro-março de 2001, RT, pág. 257).

Tese análoga a ora analisada já restou enfrentada nesta Tribunal, no MS9.769, de Relatoria do Ministro Teori Zavascki, assim ementada:(...)

Por sua vez, entende-se que o ato médico se exaure naquilo que por suanatureza é reconhecidamente privativo de médico. Cite-se, por exemplo, aadministração de medicamentos ou a prática cirúrgica por se tratar deprocedimentos invasivos, como o implante de lente intra-ocular, práticaque envolve não apenas conhecimentos de anatomia e fisiologia do olho,do sistema respiratório, circulatório, mas também técnicas deprocedimento cirúrgico e pós-operatório.

Diversa é a situação do optometrista, que apenas adapta lentes decontato, que não passam de órteses não invasivas, cujo objetivo final écompensar opticamente as ametropias (miopia, hipermetropia,astigmatismo) quando se faz necessário.

Destaca-se que a prática da optometria, compreende uma série de testesvisuais com intuito de avaliar e melhorar, quando necessário, aperformance visual do interessado.

Neste sentido, entendo que o profissional em Optometria que lida com asaúde visual, poderá identificar, diagnosticar, corrigir e prescreversoluções ópticas, excetuadas aquelas exclusivas dos médicosoftamolgista que além destas poderá tratar terapeuticamente, através decirurgias e/ou medicamentos, porquanto único legitimado para tratarenfermidades oculares e sistêmicas" (grifei).

Isso, porém, não nos deve remeter a um juízo precipitado, de sorte a

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concluir que a matéria encontra-se exaurida. É bom que se diga, a decisão lançada pelaCorte Superior nos autos de mandado de segurança n.º 9469/DF ? o primeiro a tratarcom alguma pontualidade sobre a profissão do optometrista ? foi objeto de reforma emsede de recurso extraordinário. A Suprema Corte, na ocasião, concluiu por não ser aação constitucional campo próprio para o cotejo entre as disciplinas do curso demedicina e aquelas que compõem a grade do curso de optometria, e daí concluir pelavalidade ou não do curso. Cito o precedente:

"RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA.AUTONOMIA DIDÁTICO-CIENTÍFICO DAS UNIVERSIDADES. ART. 207DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. CURSO SUPERIOR DE TECNOLOGIAEM OPTOMETRIA. ATIVIDADES QUE SERIAM PRIVATIVAS DOEXERCÍCIO DA MEDICINA E DA OFTALMOLOGIA. DILAÇÃOPROBATÓRIA. De acordo com o art. 53 da Lei nº 9.394/96, asuniversidades têm a prerrogativa de criar, organizar e extinguir, em suasede, cursos e programas de educação superior. Por outro lado, amanifestação do Conselho Nacional de Saúde somente era exigível paraa criação de cursos de graduação em medicina, em odontologia e empsicologia (art. 27 do Decreto nº 3.860/2001). No caso, a alegada"invasão nas atribuições da profissão médica" depende de comprovaçãodilatória, inadmissível na via estreita do mandado de segurança.Mantém-se a decisão denegatória do Superior Tribunal de Justiça, talcomo proferida" (RMS 26199/DF. Primeira Turma. Rel. Min. Carlos Britto.Decisão de 27.03.07).

Em seu voto, o ministro relator destacou ser imprópria a via domandado de segurança para aferir o grau de entrelaçamento entre as disciplinas quecompõem a grade do curso de medicina oftalmológica e aquelas arroladas no curso deoptometria, a ponto de apurar-se indevida projeção desta sobre aquela. Aponta o relator:

"17. Sucede que tudo isso é negado pela parte contrária, que traça linhasparalelas de atuação profissional, sem entrechoques, para osoptometristas e os oftalmologistas. Sendo certo que o próprio Relator doacórdão recorrido ? Ministro Teori Albino Zavascki ? deparou com essaextrema dificuldade quanto ao marco divisor ou à linha demarcatória dasduas profissões. Por isso que Sua Excelência se valeu da ClassificaçãoBrasileira de ocupações ? CBO, publicada pelo Ministério do Trabalho eEmprego (Portaria n.º 397/2002), para listar u´a miríade de atividades queseriam privativas do ofício de optometrista (fls. 1.883/1.884). Sem deixarde dizer, é fato, que se pode 'questionar a legitimidade do exercício, pelosoptometristas, de algumas daquelas atividades, por pertencerem aodomínio próprio da medicina' (fls. 1.880).

18. Daqui se conclui, então, que o deslinde da controvérsia exige mesmodilação probatória, incomportável na via processualmente acanhada do

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mandado de segurança, segundo a mais firme jurisprudência desteSupremo Tribunal Federal (..)" (grifei).

Nesse contexto, é de se concluir que a matéria está longe de serexaurida, notadamente no que pertine aos limites do exercício da atividade. Ajurisprudência colacionada apenas reconheceu a atividade profissional de optometrista,sem maior análise, na prática, do âmbito de atuação.

Por outro lado, não creio que a demanda analisada necessite dedilação invencível no mandado de segurança. A lide, ao que vislumbro, circunscreve-seà análise dos diplomas regentes. Ou seja: cinge-se ao exame de legalidade dosregramentos apontados. Não se discute diretamente eventual ingerência do profissionalde optometria nas funções próprias do médico oftalmologista, mas sim a possibilidade desuperposição dos diplomas indicados.

Conforme já destaquei, os decretos não evidenciam qualquer vícioformal ou material. E, aliás, é bom lembrar, até o advento da Portaria n.º 397/02, quetingiu com expressivo colorido as atividades do optometrista, a profissão era regidaunicamente por aqueles decretos.

De outro vértice, não obstante tenha enveredado por alargadodebate, a meu ver incontornável diante das variáveis que a matéria aponta, entendo quea solução para definir-se os limites da atividade de optometrista seja simples, circunscritaà legalidade da portaria e de sua equiparação ou não aos Decretos n.º 20.931/32 e24.492/34.

Já foi dito que os decretos foram concebidos pelo então Presidentedo governo provisório, Getúlio Vargas, e cuja recepção os deu força de lei nas cartassupervenientes. Gozam, invariavelmente, do status de lei, na acepção constitucional (art.59 da CR). Eis porque o STF, ao analisar o Decreto n.º 99.678/90 (ADI/MF n.º 533-2/DF),no ponto em que revogara aqueles decretos, reconheceu sua inconstitucionalidade,extraindo-lhe a almejada carga de normatividade.

A decisão está assim ementada:

"CONSTITUCIONAL. ATOS NORMATIVOS PRIMÁRIOS.IMPOSSIBILIDADE DE SUA REVOGAÇÃO POR ATOS NORMATIVOSSECUNDÁRIOS. I. Decreto com força de lei, assim ato normativoprimário. Impossibilidade de sua revogação mediante decreto comum, atonormativo secundário. II. Ocorrência dos pressupostos da cautelar.Deferimento" (ADI-MC 533/DF. Tribunal Pleno. Rel. Min. Carlos Velloso.Decisão de 07.08.91 ? grifei).

Evidentemente, mero decreto presidencial (tratou-se naquele casode expediente editado pelo Chefe do Executivo) não poderia sobrepujar decreto que,materialmente, goza de força de lei, sobretudo quando a ordem constitucional vigente

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confere à lei a disposição sobre a matéria em questão.

É da letra do invocado art. 5.º, XIII, da CR, conforme já citeitextualmente, que ""é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidasas qualificações profissionais que a lei estabelecer". Lei, aqui, no sentido formal, comoespécime legislativo, o que compreende estritamente aqueles indicados no estreito rol doart. 59 da Constituição da República: "Art. 59. O processo legislativo compreende aelaboração de: I - emendas à Constituição; II - leis complementares; III - leis ordinárias;IV - leis delegadas; V - medidas provisórias; VI - decretos legislativos; VII - resoluções".

À exceção das emendas constitucionais, todos os demais espécimesarrolados no art. 59 da CR são considerados lei (incisos II a VII), para todos os efeitos,inclusive às limitações previstas no art. 5.º, XIII, da Constituição da República, queconfere à lei os limites ao exercício de ofício ou profissão.

A portaria, nesse contexto, não goza de tal prerrogativa. Trata-se,em verdade, de ferramental próprio do poder executivo, no exercício regulamentador desuas funções, no âmbito interno. Não revela em si poder normatizador em relação aosadministrados. Da lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, colho o seguinte excerto:

"Portaria ? é fórmula pela qual autoridade de nível inferior ao Chefe doExecutivo, sejam de qualquer escalão de comandos que forem,dirigirem-se a seus subordinados, transmitindo decisões de efeito interno,quer com relação à vida funcional de servidores, ou, até mesmo, por viadelas, abrem-se inquéritos, sindicâncias, processos administrativos.Como se vê, trata-s de ato formal de conteúdo fluido e amplo" (Curso deDireito Administrativo, 2008, p. 432 ? grifos no original).

Lembro, por oportuno, que por força do primado da segurança dasrelações jurídicas, a normatização titularizada pelo Poder Executivo ? ressalvados algunsinstrumentos (a exemplo das medidas provisórias), e respeitadas as restriçõesconstitucionais ? não extravasa o âmbito da Administração. E isso porque é funçãotípica e própria do Poder Legislativo a edição de normas gerais, a pressupor desmedidainvasão em campo alheio a edição de expediente normativos pelo Poder Executivo paraalém da regulamentação de suas próprias atividades.

Se, a exemplo do que taxara o STF, não pode um singelo decretopresidencial, mesmo que nascido sob a égide do regime constitucional implantado em1988, afrontar decreto que disponha de força de lei, muito menos pode simples portaria,sobretudo a ponto de alargar desmedidamente o campo de atividade de profissão queencontra regulamentação há muito, posto que de modo bastante restrito.

Dito isso, tenho que melhor posição é dada à jurisprudência dessaCorte se afirmada no sentido de conferir à função de optometrista aqueles atributosprescritos pelos Decretos n.º 20.931/32 e 24.492/34, cujo desbordo fica sujeito à atuação

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da fiscalização, no legítimo exercício do poder de polícia administrativo, bem como aeventual repreensão judicial, se assim se fizer necessário.

Por estas razões, dissenti da douta maioria e votei no sentido deconhecer o pedido de uniformização de jurisprudência e de manter a sentença quedenegou a ordem.

RICARDO ROESLERRELATOR

Declaração de voto vencido do juiz Jânio Machado

As razões de divergência foram, antes, expostas pelo ínclito juizRicardo Roesler, às quais adiro.

Florianópolis, 2 de abril de 2009.Jânio Machado

Juiz de Direito de Segundo Grau

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