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6º ENCONTRO DA ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE RELAÇÕES INTERNACIONAIS
PERSPECTIVAS SOBRE O PODER EM UM MUNDO EM REDEFINIÇÃO
25 a 28 de Julho de 2017
Belo Horizonte - MG
Área temática: Economia Política Internacional
TRABALHO EM ANDAMENTO – FAVOR NÃO CITAR SEM PERMISSÃO
DIREITO À SAÚDE: O DESENVOLVIMENTO NA CONSTRUÇÃO DO PENSAMENTO DO
MOVIMENTO SANITARISTA BRASILEIRO
Camila dos Santos
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro
Instituto de Relações Internacionais
Resumo: Este artigo analisará a aproximação das temáticas da saúde e do
desenvolvimento no interior do movimento sanitarista brasileiro, a partir da década de 1970.
As amplas discussões sobre autonomia e cidadania circundam o pensamento de seu projeto
de desenvolvimento em saúde, que, em um contexto de ruptura democrática, ganha força e
eleva a ideia de saúde coletiva à concepção de direito universal, considerado fundamental
para o desenvolvimento brasileiro. A busca dos médicos sanitaristas pela própria autonomia
em ditar o futuro do desenvolvimento do país se tornou marcante não apenas na luta por um
sistema único de saúde universal (SUS), mas também pela concepção de que tal conquista
só se alcançaria de fato com a redemocratização e a volta de direitos civis e sociais que
haviam sido cerceados nas últimas décadas. Entretanto, somado aos esforços para a sua
privatização, durante toda a sua história de implementação o SUS enfrentou violências
culturais determinantes para a consolidação de sua identidade. O cerne deste problema tem
sido apontado por alguns autores (Menicucci, 2014; Bahia apud Cueto, 2014) como parte da
decisão dos governantes de alocar poucos recursos e vontade política na ampliação do
sistema, caracterizando-o sempre como oneroso demais, que precisa ser reduzido. Tais
concepções retirariam dos gastos realizados em saúde o seu papel essencial na garantia do
bem-estar da população e a sua importância produtiva na própria formação do PIB, além de
diminuir seu protagonismo como símbolo de um projeto maior de desenvolvimento. Isto
posto, este artigo procurará compreender a combinação própria de saúde e
desenvolvimento revelada pelo movimento sanitarista brasileiro. Na tentativa de lançar luz
aos constrangimentos e desafios a serem enfrentados no cenário atual, a reflexão aqui
proposta espera ajudar a avançar na aproximação das discussões acerca da conquista de
direitos sociais e do modelo de desenvolvimento que nossas sociedades almejam.
Palavras-chave: saúde, desenvolvimento, movimento sanitarista brasileiro.
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Direito à Saúde: o desenvolvimento na construção do pensamento do movimento
sanitarista brasileiro
Camila dos Santos1
Introdução
Fruto de um esforço reflexivo que visa lançar luz à importância da luta por direitos
sociais no interior das estratégias de desenvolvimento, este artigo se empenhará em criar
conexões entre a literatura dominante no campo do desenvolvimento e a necessidade de se
garantir e ampliar a manutenção de direitos fundamentais na busca pela redução das
desigualdades. Partindo do caso do movimento sanitarista brasileiro, serão abordadas as
amplas discussões sobre autonomia e cidadania que circundam seu projeto de
desenvolvimento em saúde, que, num contexto de ruptura democrática, ganhou força e
logrou elevar a ideia de saúde coletiva à concepção de direito universal.
Diverso em qualquer que seja a sua temporalidade, o debate em torno das políticas de
desenvolvimento tem apresentado um conjunto heterogêneo de abordagens. Neste sentido,
é debruçando-me sobre como o desenvolvimento vem sendo (re)pensado nas políticas
internacionais que explorarei a idéia de desenvolvimento como um processo que envolve
todas as sociedades, como parte de um processo global (Pieterse, 2010). Para tanto, será
feito um (re)exame de algumas das noções „mainstream‟ e ocidentais de desenvolvimento,
caminhando para a discussão de sua complexificação a partir da justaposição entre os
discursos do desenvolvimento e da globalização. Em seguida, o artigo revisitará os escritos
clássicos da economia política de Karl Polanyi, cujos conceitos de duplo movimento e
autoproteção social se mostrarão cruciais para um melhor entendimento das contradições
complexas do projeto liberal, enfrentadas nas sublevações sociais em sua busca pelo direito
a uma vida digna.
Por fim, o artigo se aterá à junção da temática da saúde e do desenvolvimento no
interior do movimento sanitarista brasileiro, a partir dos anos 1970. A literatura do
movimento nos ajudará a observar como os efeitos da expansão do capital se refletem na
dinâmica dos movimentos de resistência, conferindo hibridez ao projeto de desenvolvimento
em saúde. Dito isto, o problema aqui exposto não se traduzirá na expressão de uma
particularidade brasileira, mas na observação de uma lógica própria à expansão do capital
internacional e aos desafios que este impõe no trato com a modernidade – tornando
necessária, portanto, a compreensão dos imperativos econômicos operantes e de como
estes reconfiguram os modos como as sociedades estão organizadas (Bauman, 1998).
1 Doutoranda em Relações Internacionais pelo Instituto de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro (IRI/PUC-Rio). Contato: [email protected]
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O Pensamento do Desenvolvimento
Diretamente relacionado às transformações experimentadas pelo conhecimento
humano, o conceito de desenvolvimento ganhou força com a ascensão da ciência e sua
tentativa de sistematização do saber. Suas bases evocam uma concepção biólogica,
naturalista e evolucionista da história, passando pela criação de uma narrativa teleológica e
pelo estabelecimento de postulados que permitiram, no auge das teorias iluministas, a
tentativa de tomar as rédeas do destino da humanidade.
Partindo da percepção organicista e biológica do conceito, Gilbert Rist (2008) aponta
quatro características presentes no senso comum que tornaram-se fundamentais para sua
existência. Seriam elas: a (i) direcionalidade; a (ii) continuidade; a (iii) cumulatividade; e a
(iv) irreversibilidade. Tais características ofereceriam uma metáfora entre o desenvolvimento
humano e o crescimento observado na natureza, em analogia com seus mais distintos
sistemas biológicos. Apesar de preconizar um progresso humano mais plausível, a metáfora
obscurecia seu processo, já que nesse momento inicial não se previa que a intervenção
humana pudesse guiá-lo; no máximo, a ação humana deveria facilitar o trabalho da
natureza, evitando prejudicar o crescimento já „natural‟ das coisas, sem de fato ser
determinante para o seu resultado final.
A primeira tentativa de complexificação do sistema naturalista é identificada por Rist nos
trabalhos dos antigos. Aristóteles, por exemplo, pressupunha que o homem analisava os
fatos científicos de acordo e em conformidade com a sua natureza, e que cada coisa
possuía, então, um princípio próprio de desenvolvimento. Neste sentido, a ciência tratava do
estudo da natureza, o que implicava um entendimento do crescimento como algo limítrofe,
dotado de finitude e perfeição. Tal concepção tornava sua teoria cíclica, composta por início
(nascimento), meio (crescimento) e fim (morte) (2008:29). Tudo aquilo que ocorresse
deliberadamente e sem termos precisos era considerado imperfeito. Assim, por algum
tempo defendeu-se que o estudo das anomalias e casualidades caberia à história, uma vez
que a ciência se ocupava das normatividades presentes na vida humana, regidas pelas „leis‟
naturais que governavam a natureza (2008:31).
Se antes Aristóteles concebia a existência simultânea e independente de ciclos de
desenvolvimento, Santo Agostinho passou a compreendê-los como um cíclo único, que
abarcaria a história da salvação humana – integrando a totalidade do fenômeno „natural‟ às
anomalias dos eventos históricos. Para Rist, apesar de manter a ideia de nascimento,
crescimento e morte dos ciclos aristotélicos, Agostinho mudou de vez a trajetória do
desenvolvimento, construindo seu argumento ao redor de três aspectos: (i) filosofia da
história, que confere universalidade ao esquema, transformando a história humana na
história da salvação divina; (ii) papel secundário da história humana, em que eventos
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particulares não possuem importância, reinterpretando-os dentro de um framework cristão
em função da filosofia da história; (iii) ausência de uma necessidade de ativamente
desenvolver-se, já que a progressão humana é desenhada por Deus para toda a eternidade,
sendo assim inevitável e intransponível. Estabelecidos os três aspectos, o retorno ao estágio
inicial ou a possibilidade de novos ciclos de crescimento esgotam-se: Agostinho abre
caminho para uma concepção do desenvolvimento a partir de uma história linear,
progressiva e européia (2008:33).
No ápice da Renascença e do pensamento iluminista, a autoridade atingida pelos
escritos agostinianos é mobilizada em prol de um crescimento que já não mais se encerra
na vontade divina, mas que é fruto do acúmulo de experiências humanas. Assim,
pensadores modernos teriam acrescentado à ideia de Agostinho a percepção de que o
conhecimento se acumularia às tradições antigas, expandindo a ciência em tempo e espaço
– tornando o inescapável fim dos tempos cada vez mais distante e incerto. Dadas tais
mutações na concepção da evolução humana, a única noção prevalecente desde os antigos
seria, para Rist, a ideia de crescimento, que viabilizava no final do século XVII a ascensão e
dominação de uma ideologia do progresso, permitindo o ranqueamento das sociedades a
partir de percepções cognitivas particulares de cada intelectual da época (2008:36).
Se o progresso é inicialmente percebido como algo „naturalmente‟ cíclico, equiparando
leis sociais às leis naturais, para Richard Peet & Elaine Hartwick (2009) foi por meio do
conceito de „organicidade‟, trazido por Auguste Comte para a sociologia, que a necessidade
da intervenção humana transformou-se em agência, devendo ser previamente orientada a
deliberar e intervir no desenvolvimento dos organismos sociais. Uma vez admitida a
necessidade da ação humana, o desenvolvimento passa a ser pensado como projeto, como
uma forma de unir ordem e progresso. À medida em que a humanidade passava a
reconhecer-se como agente de seu próprio destino e evolução, a tensão entre naturalismo e
racionalismo permitia o surgimento de tentativas teóricas de compreender e sistematizar o
comportamento humano e o desenvolvimento de suas instituições sociais (2009:107).
Mais tarde, seria então por meio dos postulados de Max Weber que a sociologia melhor
sistematizaria o racionalismo moderno. A postura existencial moldada por princípios éticos,
religiosos e institucionais que governavam a conduta diária calvinista denunciaram, segundo
o sociólogo alemão, o “desencantamento” com o mundo místico e metafísico da pré-
modernidade. A cultura protestante, ética e racional, determinou os estágios de
desenvolvimento experimentados pela humanidade a partir das teorias neo-evolucionistas,
tornando-se um tipo ideal de sua civilização. Para Weber, “necessary complementary factors
were the rational spirit, the rationalization of the conduct of life in general, and a rationalistic
economic ethic” (1950:354). O desenvolvimento deixava, portanto, de ser um evento
histórico necessariamente destinado a sua mais completa realização. Ele ocorreu por meio
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de sua exaltação material, por meio de poupanças e investimentos – dois produtos
específicos da teleologia da contemplação calvinista –, resultados de uma combinação única
entre predestinação e transcendência, entre a materialidade e os mundos mundano e divino.
A personalidade econômica capitalista deixava de ser desenhada como produto do
„egoísmo‟ natural – tal qual defendido pelas clássicas teorias econômicas –, e passava a ser
compreendida como uma construção social, criada por cultura e história particulares (Peet &
Hartwick, 2009:112).
A contemporânea concepção de desenvolvimento
Apesar dos autores clássicos da economia política – como Adam Smith, David Ricardo
e Karl Marx, entre outros – serem considerados os primeiros pensadores do
desenvolvimento, o termo „desenvolvimento‟ não necessariamente era utilizado naquela
época. Cowen & Shenton (1995) enfatizam que, surgido apenas na Inglaterra do século XIX,
como contraponto complementar à ideia de progresso, o desenvolvimento teria aparecido
como ação de medicação e reparo para questões que o progresso não havia conseguido
solucionar – como o problema da superpopulação, apontado por Malthus; e a questão social
e a miséria urbana, abordada por Marx. Assim, a doutrina liberal do progresso (e não do
desenvolvimento), associada inicialmente a John Locke e Adam Smith, foi o resultado de
uma tentativa de resolução do problema hobbesiano de como a ordem social e política
poderia ser alcançada (1995:11).
Identificando um paradoxo no estabelecimento de distinções entre o desenvolvimento
como um processo imanente e uma prática intencional, Cowen & Shenton afirmam que a
imagem cíclica e pré-moderna do desenvolvimento foi um processo imanente, que era
referido como desenvolvimento „externo‟ (da ordem providencial de Deus, da natureza, do
ciclo da vida). A partir do século XIX e de sua tentativa de transcender a idéia de progresso,
o desenvolvimento perde sua imagem cíclica e passa a representar o potencial e a
possibilidade de um movimento linear de melhoria humana. O paradoxo é que o movimento
cíclico reaparece, seja qual for o seu propósito progressivo, na intenção de desenvolver-se.
Era tal intenção que englobava o desenvolvimento „interno‟, ou seja, a autoridade consciente
do ser autônomo para determinar e realizar seu potencial (a agência humana) (1995:54).
Neste sentido, o pensamento do desenvolvimento do século XX na Europa passaria a
ser encarado como uma reação ao progresso do século XIX e às falhas políticas herdadas
do deslocamento social provocado pelos processos de industrialização e pelas políticas
coloniais de tutela. Assim, a compreensão contemporânea do termo desenvolvimento
originou-se no pensamento do período pós-guerra. Ainda que munida de artefatos culturais
e econômicos desde o encontro colonial, a narrativa do progresso consolidou suas bases
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institucionais e transformou-se em políticas para o desenvolvimento a partir do retrato do
hemisfério Sul como uma região „subdesenvolvida‟, na ocasião do discurso de posse do
então presidente estadunidense, Harry Truman, em 1949 (Sachs, 2010:XVI).
Marcada pelo contexto bipolar da Guerra Fria, a concepção de desenvolvimento
orientou seu significado central para a ideia de crescimento econômico. Desta forma, as
políticas de desenvolvimento passaram a serem vistas como medidas necessárias para
superar desigualdades estruturais. Sob a liderança estadunidense, preceitos tais como os
formulados por Walter W. Rostow (1960) trabalharam para acelerar o predomínio do setor
moderno sobre o setor „tradicional‟ e „arcaico‟ dessas sociedades duais. Imaginando captar
o sentido geral da evolução econômica, Rostow definiu o processo de modernização
econômica como um processo universal, pelo qual todas as sociedades passariam. Cinco
eram as etapas necessárias para alcançar o desenvolvimento: (i) a sociedade tradicional
(agrícola); as (ii) pré-condições para o arranco (dualidade entre setores tradicionais e
modernos); o (iii) arranco, (predomínio do setor moderno); a (iv) marcha para a maturidade
(intervalo de progresso flutuante); e o (v) consumo em massa (predomínio do consumo de
bens duráveis).
No cerne do processo de normalização da modernização repousava a ideia de que as
diferentes sociedades estão sempre submetidas a um mesmo estado de natureza selvagem,
e que o futuro destas dependeria da intervenção estatal em prol da liberalização do
mercado. Assim, naturalizou-se não apenas o capitalismo e suas desigualdades, mas
consolidou-se também a visão linear acerca das relações de poder presentes no sistema
internacional. As teorias da modernização exerceram ainda forte influência na África e
América Latina dos anos 1960, uma vez que a tentativa de suplantar o setor tradicional
dessas economias consistia também na tentativa de evitar a disseminação do comunismo
nos continentes – combinando, assim, crescimento econômico com modernização política.
A crítica às fórmulas modernizantes de desenvolvimento para as sociedades duais viria
pelas teorias da dependência. Estas revelaram as diferentes trajetórias percorridas pelos
países em desenvolvimento, ressaltando a necessidade de uma historicização crítica de
seus pontos de partida, colocando em cheque afirmações de que o desenvolvimento
exterminaria as desigualdades sociais. Seus argumentos centrais acrescentariam a ideia de
que as nações desenvolvidas partiriam de uma condição de „não-desenvolvimento‟, ou seja,
seu „arranco‟ para uma sociedade moderna nunca poderia ser compatível com a realidade
pós-colonial e periférica dos países subdesenvolvidos. Além disso, estendendo a tese de
Vladimir Lenin sobre o desenvolvimento desigual imperialista, a dependência ressaltava a
intensificação da polarização do desenvolvimento desigual, que ocorria cada vez mais
devido ao entrelaçamento das oligarquias nacionais dos países em desenvolvimento com o
capitalismo internacional (Paul Baran, 1957; Gunder Frank, 1966; Cardoso & Faletto, 1978;
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entre outros). Todavia, a despeito das importantes críticas levantadas pela teoria da
dependência, de maneira geral o principal significado do desenvolvimento ainda era
orientado pelo crescimento econômico e pela acumulação de capital – já que o processo de
acumulação dependente e associado impedia a modernização das economias periféricas.
Seria na década de 1970 que o pensamento voltaria-se para a ideia de
desenvolvimento alternativo (Korten, 1990; Friedman, 1992; entre outros), introduzindo
novos entendimentos focados no desenvolvimento social e comunitário, visando o
„florescimento humano‟ (Pieterse, 2010:6). Seus principais argumentos preocupavam-se
com a introdução de práticas alternativas e a redefinição dos objetivos do desenvolvimento.
Sua ideia se consolidou através da percepção de que os esforços de desenvolvimento são
mais bem sucedidos quando há participação comunitária, tornando comumente aceito os
novos papéis desempenhados por novos atores, como as ONGs. Para Jan Neverdeen
Pieterse (2010), esse sucesso refletiu não apenas a força das ONGs e da política de base,
mas também a recuperação, nos anos 1980, do Estado, o avanço das forças do mercado e
a degradação de sua regulamentação. A redefinição geral do desenvolvimento tornou
amplamente aceito que este não é simplesmente sinônimo de crescimento do PIB, mas que
o desenvolvimento humano também é um objetivo e uma medida mais apropriada. Isto
também significou que as abordagens alternativas se tornavam menos distintas do discurso
e da prática do desenvolvimento „mainstream‟, uma vez que foram por este absorvidas
(2010:84). Pieterse argumenta ainda que o enorme aumento dos fundos canalizados através
das ONGs nas últimas décadas sugeriu uma coexistência pacífica entre o desenvolvimento
„mainstream‟ e o desenvolvimento alternativo. Posta em três esferas, agentes, métodos e
objetivos/valores de desenvolvimento, a „alternativa‟ referida se daria em relação ao Estado
e ao mercado, mas não necessariamente em relação ao discurso geral do desenvolvimento
(2010:86). Para Pieterse, a preferência por um extenso arquipélago de perspectivas e
alternativas locais impediu a sua transformação em um princípio firme, marcando a ausência
de paradigma em suas construções teóricas (2010:104).
Em meados da década de 1980, o desenvolvimento humano surgia em sequência aos
trabalhos de Amartya Sen (1999) e Martha Nussbaum (2011) sobre as capacidades e os
direitos, permitindo considerar o desenvolvimento uma ferramenta capacitadora, que
promovia “o alargamento das escolhas pessoais”. A concepção de desenvolvimento como
liberdade compreendeu o desenvolvimento como parte de um processo de expansão das
liberdades individuais dentre as quais temos razão para valorar, e que, por isso, nos permite
ser socialmente completos. Sua concepção envolvia tanto processos que permitem a
liberdade de ações e decisões, quanto oportunidades que os indivíduos possuem, dadas as
circunstâncias pessoais e sociais (1999:16). Apresentando uma interdependência holística
ente indivíduo e sociedade, Sen argumenta que, ao mesmo tempo em que as capacidades
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humanas devem ser estimuladas pelas políticas públicas, estas são influenciadas pelo uso
eficaz de capacidades participatórias, que tornam os arranjos sociais mais eficientes
(1999:18). Aqui, a relação entre desenvolvimento e política passa a ficar ainda mais
evidente. O consequencialismo deontológico desta teoria vê no direito à liberdade a
oportunidade de eliminar as restrições ao acesso ao desenvolvimento humano. Isto posto, o
papel do desenvolvimento vai além do êxito econômico e passa a ser integrado a um quadro
mais amplo e completo de sucesso e privação, ao considerar as oportunidades sociais
disponíveis. A interrelação entre as liberdades políticas, econômicas e socias tornam,
portanto, necessária a pluralidade da agenda que se apresentava até então, uma vez que o
processo do desenvolvimento, “when judged by the enhancement of human freedom, has to
include the removal of this person's deprivation”(1999:37).
Fundamental para o estabelecimento de políticas preocupadas com o alcance de metas
para o desenvolvimento junto às agências das Nações Unidas, a abordagem do
desenvolvimento humano ainda apresenta limitações no que se refere à ausência de uma
maior dimensão moral. Pieterse ressalta que, na medida em que o desenvolvimento humano
pode permitir que o comércio continue a se desenvolver de maneira ainda mais competitiva,
ao adquirir uma face mais „humanizada‟ ele não desafia o neoliberalismo e o princípio da
competitividade, mas o respalda. Partindo do paradigma da economia neoclássica, o
argumento do capital humano assume o indivíduo como unidade de desenvolvimento e não
aborda de maneira fundamental o problema do mercado não regulamentado. Com o Estado
atuando como fornecedor de habilidades humanas para o mercado, estimulando programas
de concorrência global efetiva, o desenvolvimento humano tornou-se institucional e
ideologicamente aceitável por todos (2010:134).
Diante do acirramento das políticas neoliberais com a crise do débito e em meio às
políticas de ajustes estruturais do FMI, nos anos 1990 os debates voltariam-se para a
perspectiva do pós-desenvolvimento. Este configurou-se como uma reação radical,
manifestando extrema insatisfação e total rejeição às práticas e narrativas do
desenvolvimento mainstream. Suas abordagens percebem o desenvolvimento como um
discurso historicamente produzido, problemático na medida em que é construído pelo
ocidente; que cria em seu discurso uma gramática prescritiva, trazendo consigo a alteridade
em relação aos povos considerados „primitivos‟, „tradicionais‟ e „subdesenvolvidos‟, tornando
necessária a crítica à modernização e à ciência. Suas tentativas teóricas associam um
enquadramento metodológico foucaultiano e análises de discursos inspiradas pelo pós-
estruturalismo.
Tal aversão foi também combinada com uma perspectiva futura, indicando a
possibilidade de superar o desenvolvimento. Expoente do pós-desenvolvimento, Arturo
Escobar (1995) afirmou que o desenvolvimento apresenta outra face, por vezes oculta em
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seu discurso: em vez de possibilidade, torna-se impedimento. Para Escobar, a realidade foi
colonizada pelo discurso do desenvolvimento, já que a produção social de espaços regidos
por um telos moderno, implícito em seus termos, limitaria a produção de ordens sociais
diferentes e subjetivas no Sul global, especialmente após o processo de descolonização
(1995:39). Entretanto, concebendo o desenvolvimento como um processo singular, Escobar
parece cair na própria crítica, reaproximando-se da modernização ao acreditar que todas as
sociedades podem ser enquadradas nas mesmas etapas de evolução e desenvolvimento
econômico e social. Tal visão linear não considera a possibilidade da coexistência de
múltiplas modernidades: Escobar classifica manifestações políticas, econômicas e sociais
como meramente sujeitas ao processo evolutivo capitalista, reduzindo o processo histórico
de consolidação da narrativa do desenvolvimento a um projeto único da modernidade. Além
disso, romantiza o encontro colonial, apostando em um „Terceiro Mundo‟ inferiorizado,
resignado ao modelo ocidental de práticas top/down. Sua proposta defende a eliminação da
narrativa desenvolvimentista como saída para a manifestação cultural daqueles lançados à
margem de seu modelo. Todavia, a ausência de um paradigma sólido e pragmático
(Pieterse, 2010), que lidasse com as urgentes e persistentes desigualdades enfrentadas em
todas as partes do mundo, revelou a crise teórica e prática pela qual o pensamento do
desenvolvimento ainda vivenciava.
Autoproteção social: reações ao desenvolvimento global da sociedade de mercado
Com a chegada do século XXI, as várias noções do desenvolvimento pareceram
caminhar para uma direção semelhante: o desaparecimento do desenvolvimento e sua
reconstrução como desenvolvimento mundial. Pieterse defende que a relação entre
dinâmicas endógenas e exógenas no desenvolvimento, apontaram assim para uma
reconceitualização do mesmo enquanto uma problemática global (2010:37). Segundo o
autor, a justaposição do discurso do desenvolvimento e da globalização traria consigo a
percepção de que o Estado-nação não pode mais ser considerado como unidade de
desenvolvimento, já que transações transfronteiriças e micro ou macro-regionalização
tornaram-se grandes caminhos de desenvolvimento (2010:50). Mais do que um termo
moderno para o neoliberalismo disfarçado de impulso global, a globalização não é uma nova
dinâmica, mas um processo de longo prazo. O que distinguiria a globalização
contemporânea seria justamente a velocidade na qual se dão as inovações tecnológicas, o
crescimento da economia da informação e o início de sistemas de produção mais flexíveis.
Por isso mesmo, a globalização não se transforma em paradigma, mas permanece uma
descrição abreviada de um conjunto de processos (2010:49).
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Empenhando-se em mapear alguns dos dilemas centrais que definem a experiência das
pessoas sob as forças econômicas e culturais que constituem o fenômeno da globalização,
Zygmunt Bauman (1998) identifica a sua essência na intensa vontade para uma mobilidade
sempre acelerada – melhor compreendida pelo termo cunhado por David Harvey (1989),
„compressão do espaço-tempo‟. Harvey identificou o surgimento de um novo conjunto de
experiências do espaço e do tempo, marcado pela volatilidade e efemeridade das relações
sociais e de produção (1989:256), que comprimiam espaço e tempo em escala global, de
modo a acelar o tempo de giro do capital e adaptar as sociedades ao rápido movimento das
mudanças de mercado. Como Harvey, Bauman define os imperativos econômicos
subjacentes a esta aceleração como fator central que impulsiona a globalização. Entretanto,
opta por enfatizar os efeitos da mobilidade na reconfiguração dos modos como as
sociedades estão organizadas, cujo acesso diferencial aos direitos estaria relacionado à
estratificação de classes (1998:9).
Para Bauman, os efeitos da atual compressão espaço-tempo sobre a estruturação de
sociedades e comunidades têm gerado novas versões de um „senhorio ausente‟, garantindo
a independência das elites globais de unidades territorialmente confinadas de poder político
e cultural, livrando-as de qualquer responsabilidade social e provocando o consequente
desempoderamento nas esferas sociais mais desprovidas, cuja mobilidade não se configura
como opção. A „compressão espaço-tempo‟ teria, portanto, tornado a mobilidade um
sinônimo de liberdade, disponível apenas para aqueles que possuem os meios para com ela
arcar. Ao tornar-se totalmente livre dos constrangimentos do lugar e da história, o apego do
capital transnacional a qualquer território único basearia-se em relações efêmeras e
superficiais, já que a mobilidade passa a figurar como estratégia essencial de sobrevivência
dos negócios e chave para a aceleração da lucratividade. Isso culminaria com a privação,
dos excluídos dos lucros da globalização, da capacidade de imaginar ativa e produtivamente
versões alternativas de uma „boa vida‟.
A cultura neoliberal e seu espírito de desregulamentação provocou uma fusão incômoda
de emancipação e exclusão. Para Jean & John Comaroff (2005), tal metamorfose seria
forjada pelo papel do trabalho na equação evasiva que liga a produção ao consumo. O
advento do consumo como lócus privilegiado para a fabricação do „self‟ e da sociedade, da
cultura e da identidade, estaria intimamente ligado à mudança do status do trabalho em
condições contemporâneas. Seguindo Harvey, os autores afirmam que a explosão de novos
mercados e instrumentos monetários, auxiliados por meios sofisticados de coordenação
planetária e compressão espacial, deram à ordem financeira elevado grau de autonomia –
produzindo uma desvalorização da força de trabalho como resposta à queda de lucros e a
crises periódicas de produção de commodities. Neste contexto, Comaroff & Comaroff
defendem o exame consciente de como o sentimento e o apego são constituídos nas
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condições prevalecentes, uma vez que as categorias de classe têm se tornado uma base
menos plausível de identificação e ação, justamente enquanto crescem as disparidades de
riqueza e poder, apontando para a urgência da reação inversa.
Não obstante, a capacidade da sociedade de se proteger dos efeitos nocivos da
sociedade de mercado é abordada por Karl Polanyi (1944) como um mecanismo, por vezes
inconsciente, da busca pela sobrevivência humana. Revelando as contradições complexas
do projeto liberal, mostrando como mercado e economia estão, de fato, incorporados ao
tecido social, Polanyi contrariou as percepções que classificavam a economia como
entidade autônoma, dotada de uma lógica interna própria. Para o autor, a regulamentação e
os mercados cresceram juntos, sendo a emergência da idéia de autorregulação fruto de
uma inversão completa da tendência do desenvolvimento. O ponto central em sua obra é o
de que a commoditização de trabalho, terra e dinheiro – que figuram como precondição para
a economia de mercado –, não se verifica no estudo mais detalhado de suas origens,
mostrando que as três commodities estiveram sujeitas a um conjunto inteiramente diferente
de regulamentações institucionais.
Segundo Polanyi, o trabalho seria apenas um outro nome para atividade humana que
acompanha a própria vida, e que não é produzida para venda, mas por razões diversas que
não podem ser destacadas do resto da vida, bem como não pode ser armazenada ou
mobilizada. Por sua vez, a terra seria outro nome para a natureza, que não é produzida pelo
homem. O dinheiro seria então um símbolo do poder de compra que não é produzido, mas
adquire vida através do mecanismo dos bancos e das finanças estatais. Assim, nenhum
deles é produzido para a venda, tornando „inteiramente fictícia‟ a sua descrição como
mercadorias (2012:78). A irrealidade de tal postulado ofereceu um princípio de organização
vital em relação à sociedade como um todo, afetando praticamente todas as suas
instituições.
Como a organização do trabalho é apenas um outro termo para as formas de vida do
povo comum, isto significou que o desenvolvimento do sistema de mercado estava
acompanhado de uma mudança na organização da própria sociedade, tornando-a um mero
„acessório do sistema econômico‟ (2012:81). Dessa forma, a crença inabalável no progresso
espontâneo se transformaria na mentalidade do século XIX, favorecendo as pressões em
prol da mudança na sociedade, sem limites nem regulamentações. Diante dos terríveis
efeitos causados pela instituição de uma sociedade de mercado sustentada por commodities
fictícias, Polanyi argumenta que a sociedade humana poderia ter sido aniquilada, “não fosse
a ocorrência de alguns contramovimentos protetores que cercearam a ação desse
mecanismo autodestrutivo” (2012:82).
Assim, a história social do século XIX teria sido resultado de um duplo movimento. O
teórico identificou na construção da legislação fabril e social, de tarifas agrárias e leis
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fundiárias, uma manifestação social pela proteção do trabalho humano e dos recursos
naturais contra as implicações da ficção da mercadoria. Sem o respaldo de tais mecanismos
legais a sociedade seria arruinada, tornando a função principal do intervencionismo o papel
de enfrentamento da ação do mercado em relação aos fatores de produção (trabalho e
terra). Por outro lado, a gestão de bancos centrais e do sistema monetário também mostrou-
se necessária para manter as manufaturas e outras empresas produtivas a salvo do perigo
que envolvia a ficção aplicada ao dinheiro. Contraditoriamente, a própria oganização da
produção capitalista tinha de ser protegida contra os efeitos devastadores do mercado
„autorregulável‟ (2012:147). O deslocamento na vida das pessoas tornava-se expressão das
transformações do ritmo e do tempo da vida social, que, quando radicalmente alterados,
abririam caminho para a degradação geral da existência humana.
Neste sentido, o duplo movimento polanyiano pode ser caracterizado como uma
perspectiva de recuperação da sociedade em resposta aos efeitos desestabilizadores do
mercado desregulado. Tal recuperação ocorreria sob a ação permanente e contraditória de
dois princípios organizadores: (i) o princípio do liberalismo econômico, que objetivava
estabelecer um mercado autorregulável, usando principalmente o laissez-faire e o livre
comércio como seus métodos; e (ii) o princípio da proteção social, cuja finalidade é
preservar o homem e a natureza, além da organização produtiva, utilizando como seus
métodos uma legislação protetora, associações restritivas e outros instrumentos de
intervenção (2012:148). A tese de Polanyi ressalta a importância das instituições sociais na
vida humana, considerando que nenhuma definição puramente monetária dos interesses é
suficiente à necessidade vital de proteção social – cuja representação no período moderno
cabe ao Estado e seus governos. Para Polanyi, foram precisamente os interesses sociais, e
não os econômicos, que permitiram a conjugação de forças de diferentes segmentos da
população que se viram ameaçados pelo mercado. A despeito das tentativas do credo
liberal de separar as esferas política e econômica, as tensões originadas na esfera do
mercado se difundiram para a esfera política, compreendendo o todo da sociedade
(2012:240).
Ao desnudar a lógica do mercado como uma forma entre muitas, Polanyi expôs a
diversidade da experiência econômica, contemplando as várias formas da economia e não
apenas estágios anteriores na „evolução‟ de nossa sociedade de mercado contemporânea.
Neste sentido, os ecos da crítica de uma sociedade de mercado influenciaram ainda os
escritos pós-coloniais de Sankaran Krishna (2009) e Blaney & Inayatullah (2010). Polanyi
antecipou em muitos aspectos o que Krishna definiu como uma „perspectiva pós-colonial‟,
representando um importante recurso filosófico e político para aqueles que se opõem ao
atual fundamentalismo de mercado. A crítica polanyiana seria, portanto, filosoficamente
crucial, na medida em que revela como a sociedade de mercado deriva sua ética de uma
12
lógica empobrecida da economia, reduzindo o domínio ético-político ao domínio da
economia, de modo a despolitizar a sociedade (2009:160). Para Krishna, um dos momentos-
chave na consolidação da hegemonia neoliberal decorre da incapacidade de nos
concebermos fora da cartografia nacional do mundo. Assim, a resistência de alguns
movimentos à globalização neoliberal torna-se promissora ao empenhar-se em imaginar
uma forma de ser que não seja estritamente nacional, contrariando o poder transnacional e
as ligações de uma classe capitalista mundial com alianças de trabalhadores e organizações
de base similarmente transnacionais.
Com o objetivo de estabelecer uma crítica ética e etnológica que permita repensar a
economia política internacional, B&I também procuram em Polanyi a possibilidade de
resistência ao discurso da necessidade da economia moderna. O uso de Polanyi implicaria
que não precisamos polarizar as visões modernas e selvagens do tempo. Na tensão entre
repetição e inovação, podem ser localizadas visões alternativas da vida social e a
possibilidade de moderar as deslocações da mudança, convergindo na idéia de que os
tempos do selvagem e do moderno se sobrepõem. Tal coevalidade removeria a hipotética
naturalidade e inevitabilidade do capitalismo liberal. Assim, estendendo a percepção de
Polanyi, B&I defendem que a vida econômica está inserida em instituições sociais que, elas
próprias, existem dentro de cosmologias particulares do tempo (e não no tempo, como uma
grade pré-existente). Dessa forma, desafiar o reinado dos mercados livres e do livre
comércio envolveria não simplesmente maximizar mais nosso uso do tempo escasso, mas
sim alterar nossas próprias noções de como o tempo emerge e flui (2010:195).
O Caso do Movimento Sanitarista Brasileiro
Resultado da ação permanente e contraditória dos princípios organizadores das
economias e sociedades de mercado, a configuração do movimento sanitarista brasileiro
pode ser lida como uma reação que se articula historicamente em torno da defesa das
substâncias sociais ameaçadas pelos mercados. Ao compreender a sua sublevação como
um movimento necessário não apenas na forma de resistência ao mercado global, mas,
sobretudo, como um mecanismo de proteção social, esta seção buscará articular uma
análise socialmente engajada, incorporando a complexidade dos processos sociais no
pensamento do desenvolvimento.
Um movimento que por vezes se confunde com o processo de luta contra a ditadura e
pela abertura democrática, o movimento sanitarista brasileiro dos anos 1970 protagonizou a
criação do consenso em torno da ideia de saúde como direito fundamental para o
desenvolvimento do país. Tal processo envolvia as transformações da saúde como parte
13
das iniciativas de democratização do Estado, suas instituições e instâncias decisórias2. Suas
origens remontam à incorporação de novas abordagens ao ensino da medicina preventiva e
social nos departamentos de medicina das universidades brasileiras nos anos 1950,
contando com o substantivo apoio de organismos internacionais, como a Organização Pan-
americana de Saúde (OPAS/OMS) (Escorel, 1999:27). A forte atuação da OPAS/OMS
influenciaria ainda a revisão do ensino médico, a valorização das Ciências Sociais e o
desenvolvimento da Medicina Social3.
Entre os anos 1950 e 1960, as relações entre saúde, economia e desenvolvimento
articulavam-se na OPAS de modo a incluir temas como saúde e educação na agenda do
desenvolvimento. Tal inclusão pode ser lida, entretanto, aliada à tentativa estadunidense de
controlar o avanço do socialismo no campo das políticas sociais, que ameaçava “seduzir” os
países latino-americanos – repercutindo no continente a „ofensiva econômica soviética‟
(1956), o lançamento da Operação Pan-americana (1958), a Revolução Cubana (1959), a
celebração da Ata de Bogotá (1960), e o lançamento da Aliança para o Progresso (1961)
(Pires-Alves & Maio, 2015:75).
Durante a longa ditadura civil-militar (1964-1985), o Brasil vivia sob a duplicidade de
um sistema de saúde dividido entre a medicina previdenciária e a saúde pública. Enquanto o
primeiro setor se dirigia a ações que contemplassem a saúde individual dos trabalhadores
formais, voltando-se prioritariamente para zonas urbanas sob o comando dos institutos de
pensão, o segundo centrava-se em ações de caráter preventivo organizadas pelo Ministério
da Saúde (MS), direcionadas principalmente às zonas mais pobres e rurais. Com a criação
do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS) em 1966, o governo civil-militar priorizou
a contratação de serviços privados para o atendimento dos beneficiários, remunerando seus
fornecedores por unidade de serviços. Tal modelo de remuneração mostrar-se-ia “altamente
danoso por incentivar a corrupção, ampliar de forma desmesurada procedimentos médicos
desnecessários, e impedir qualquer planejamento dos serviços a serem priorizados” (Paiva
& Teixeira, 2014:18). O período foi marcado ainda pela instauração da crise de recursos e
pelo enfraquecimento da capacidade de ação do MS, registrando queda de 2,21% para
1,40%, entre 1968 e 1972, no orçamento total da União para a pasta da saúde (idem).
Nos diagnósticos realizados em escala continental sob patrocínio da OPAS/OMS nos
anos 1960, a baixa cobertura assistencial e a disseminação de verminoses e doenças de
2 Para Telma Menicucci, a própria ideia de cidadania se expandia, considerando não apenas o ponto de vista de
direitos formais, de direitos políticos, “mas principalmente a ideia de uma democracia substancial, de direitos substantivos, que envolviam certa igualdade de bem-estar”(2014:78). Assim, a inclusão da participação via direitos conectava o exercício de direitos políticos com a promoção de componentes de bem-estar social. 3A organização desempenhou um papel crucial na erradicação, nas Américas, de doenças infecciosas como a
varíola, a poliomielite, e a rubéola. O primeiro curso de medicina social no Rio de Janeiro (IMS/UERJ) obteve apoio técnico e financeiro da OPAS e da Fundação Kellog em 1973 (Escorel, 1999). Em períodos distintos, OMS e OPAS contaram com a direção geral de dois brasileiros – OMS por Marcolino Candau, 1953-73; e OPAS por Carlyle Guerra de Macêdo, 1982-95 (OPAS/OMS, 2016).
14
veiculação hídrica caracterizavam a intensificação do quadro de pobreza brasileiro. Em seu
relatório, a OPAS prescrevia o desenvolvimento de metodologias para um planejamento
integral do desenvolvimento econômico e do bem-estar (Paiva; Teixeira; 2014:19). O
momento exigiu que os conhecimentos articulados dentro dos departamentos de medicina
brasileiros promovessem e disseminassem debates sob um novo enfoque histórico-
estrutural, que dar-se-ia “a partir do reconhecimento da fragilidade, incorreção e
fragmentação com que vinham sendo analisadas as relações [entre] saúde e sociedade”
(Escorel, 1999:26). A concepção da realidade sanitária movia-se por meio da crítica à
suposta neutralidade científica do planejamento difundido pela OPAS, considerando a saúde
cada vez mais um objeto de estudo e intervenção política (1999:27). Particularmente
especial para a academia brasileira, a década seguinte foi tomada por diversos debates e
literaturas propositivas, que esperavam não apenas ajudar a superar os entraves ao
desenvolvimento, mas também estabelecer as bases para o caminho de volta à democracia.
A redemocratização tornava-se então condição sine qua non para quaisquer que fossem as
pretensões à mudança. A busca dos médicos sanitaristas pela própria autonomia em ditar o
futuro do desenvolvimento do país se tornaria marcante pela concepção de que a conquista
de um sistema de saúde universal só se alcançaria, de fato, com a volta de direitos civis e
sociais que haviam sido cerceados nas últimas décadas.
Em 1975, a promulgação da lei n. 6.229 instituía o Sistema Nacional de Saúde, uma
iniciativa que terminaria por consolidar a separação dos campos de atuação da saúde
pública e da assistência médica previdenciária. A lei determinava à pasta da saúde ações de
coordenação da vigilância epidemiológica em todo o território nacional, a fiscalização e
controle sanitários, além de outras medidas e ações de corte coletivo. Ao cargo do Ministério
da Previdência e Assistência Social (MPAS) recairiam responsabilidades de coordenação
dos serviços assistenciais, entre outras ações voltadas para a atenção da saúde individual.
Paiva & Teixeira alertam que a mesma lei também daria base legal a uma questão que
permanece atual na gestão do SUS: a separação entre sistemas formadores de recursos
humanos e as necessidades do sistema de saúde. Isso porque, a partir desta legislação, as
políticas de formação e habilitação de profissionais, bem como a produção de diretrizes para
o sistema de saúde, ficaria ao cargo do Ministério da Educação (2014:20).
Se, por conta de sua estrutura, as políticas de saúde mais substanciais eram
garantidas apenas aos trabalhadores (via medicina previdenciária), a cidadania passava a
ser atrelada à uma posição social específica, regulamentada pela profissão, pela carteira de
trabalho e pela participação em sindicatos públicos. Vale destacar que, em 1976, a
prestação de serviços de saúde à população contribuinte da Previdência concentrava mais
de 80% dos recursos setoriais (Dawbor, 2012:90). Os direitos dos cidadãos à saúde eram
decorrentes dos direitos de suas profissões, que só passavam a ser reconhecidas a partir da
15
regulamentação estatal. Tal regulação implicava na discriminação da distribuição dos
benefícios previdenciários e concentração urbana de seu acesso, o que ocorria desde a
reforma das intituições no Estado Novo, durante o governo varguista4.
O movimento de reforma sanitária ganharia força, portanto, na segunda metade dos
anos 1970, período que coincide com a criação do Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
(Cebes), em 1976; e da Associação Brasileira de Pós-graduação em Saúde Coletiva
(Abrasco), em 1979. Para Monika Dawbor (2012), se a fundação do Cebes permitiu a
criação de uma revista que veiculasse as principais ideias do movimento (o periódico Saúde
em Debate), a própria ideia de constituição da Abrasco surge por iniciativa de docentes dos
cursos de medicina preventiva e seus programas de residência, com o objetivo de politizar a
formação de recursos humanos. Em meados dos anos 1980, tais associações obteriam a
liderança da vanguarda política do movimento, como frente de mobilização e pressão nas
arenas políticas, consolidando uma atuação que extrapolava o campo acadêmico (2012:98).
Esteves & Assunção (2017) afirmam que os especialistas em saúde formavam-se assim, na
junção de duas configurações: (i) um aparelho de produção de conhecimento; e (ii) um
regime de treinamento e socialização, que englobou uma vasta gama de técnicas,
reproduzindo um corpo específico de conhecimento (2017:111).
A retirada do Estado de muitas áreas de proteção social e o avanço das políticas
neoliberais ao final da Guerra Fria favoreceu a atuação desregulamentada de um capital
internacional cada vez mais móvel, com elites cada vez menos enraizadas no tecido social
em que atuam. A ausência de maior responsabilidade sob os efeitos da expansão do capital
provocou o agravamento das desigualdades estruturais que marcam a vida cotidiana em
sociedade. Diante deste cenário, e a despeito da repressão enfrentada pela restrição das
liberdades políticas, o movimento sanitário brasileiro logrou promover, entre 1986 e 1987,
diversas conferências estaduais, contando com a ampla participação de associações e
representações da sociedade civil. Consolidando uma atuação que reunia academia e
ativismo, na VIII Conferência Nacional de Saúde discutiram-se as diretrizes políticas do
setor, bem como a aprovação de uma agenda de propostas que incluíam o conceito
ampliado de saúde, a defesa do direito à cidadania, e o dever do Estado com o
financiamento do sistema de saúde (Escorel, 1999:193). A comunidade da saúde passava
então, a organizar-se em torno do conceito de „Determinantes Sociais da Saúde‟ (DSS) –
que reúnem fatores sociais, econômicos, culturais, étnicos/raciais, psicológicos e
comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e seus fatores de
risco na população (Buss & Filho, 2007:78). Tal combinação situava o objeto da saúde, suas
políticas e até mesmo os especialistas em saúde, nas interseções do campo de
4 Sobre a engenharia institucional brasileira e a regulação da cidadania, ver SANTOS, 1979.
16
desenvolvimento (Esteves & Assunção:2017:111). Assim, na contrapartida da visão de
mundo mainstream que entendia por desenvolvimento o êxito econômico, constituia-se
naquele momento a formação da identidade da saúde coletiva no Brasil.
Tendo como uma de suas grandes bandeiras a idealização de um sistema único,
universal e democrático de saúde, o movimento viu, na Constituição brasileira de 1988, a
consagração de um sistema híbrido, que coadunou o acesso universal à saúde com a
liberdade do mercado (Menicucci, 2014:81). A hibridez presente na implementação do
projeto de saúde universal revelou a arena de lutas inerente às tentativas de criação de um
projeto de desenvolvimento nacional, uma vez que consolidava-se a continuidade na
existência de formas privadas de assistência, independentes da intervenção governamental.
Como é possível notar atualmente, o sistema idealizado pela reforma não obteve êxito em
incorporar toda a população, mantendo de fora parte significativa dos cidadãos – seja pela
adesão a planos privados ou pela insuficiência dos serviços oferecidos. Na literatura do
movimento, é comum encontrar dois aspectos importantes nas dificuldades de
universalização do Sistema Único de Saúde (SUS): a sua relação entre público e privado e o
não enfrentamento dessa dualidade na assistência à saúde no Brasil (Menicucci, 2014;
Paiva & Teixeira, 2014; Dowbor, 2012).
A criação do SUS se deu num contexto normativo e ideológico destoante: enquanto o
neoliberalismo ganhava força e reestruturava a relação Estado-Mercado, minimizando a
atuação do Estado e atribuindo a ele um papel secundário, nossa Constituição obrigava sua
atuação e comprometimento com políticas de proteção social, por meio da universalização
do acesso à saúde, educação e previdência. Sua implementação ocorreu paralelamente à
discussão da participação da rede privada de serviços, que acabou por consolidar-se como
um ente separado, independente e não-complementar à política de acesso universal. Dessa
forma, o setor público passaria a ser dependente da prestação de serviços da rede privada,
sem que uma experiência prévia de regulação fosse definida. A intervenção na regulação
dos serviços privados viria apenas em finais da década de 1990, ao mesmo tempo em que
se vivenciava um esforço hercúleo de implementação da política estabelecida na
Constituição, com dura instabilidade na alocação de recursos para tal feito (Menicucci,
2014:81).
Desde então, o projeto defendido pelo movimento sanitarista vem negociando suas
fronteiras a partir dos constragimentos que se apresentam. Ainda que suas negociações
tenham originado um sistema de saúde universal, seus objetivos não fugiram dos anseios
modernizantes de diferentes grupos sociais. Para além disso, sendo um momento delicado
per se, a transição democrática brasileira esbarrou nos limites da responsabilização das
elites que fizeram parte do regime ditatorial e que, de certa forma, permaneceram atuantes
na redemocratização do país. Não obstante, as diversas sublevações deflagradas àquela
17
época indicam um acirramento de pressões sociais que manifestam-se em avanços e
recuos, característicos da dinâmica de incorporação social de constrangimentos dos quais o
capital foi isentado.
Somado aos esforços para a sua privatização, o SUS enfrenta violências culturais
determinantes para a consolidação de sua identidade. A identificação da saúde universal
como um serviço para pobres tem favorecido a sua diferenciação com o setor privado e
endossado o coro para a desoneração de quem pode pagar pelo serviço. Ao mesmo tempo
em que é apropriado pela população como um direito universal – já que queixas a favor da
melhoria dos serviços oferecidos são comuns, e mesmo aqueles que possuem planos
privados seguem utilizando seus serviços básicos como a vacinação e o Serviço de
Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), dentre outros –, criam-se mecanismos de
diferenciação social no seu acesso. O cerne deste problema tem sido apontado muitas
vezes como parte da decisão dos governantes de alocar poucos recursos e vontade política
na ampliação do sistema, caracterizando-o sempre como oneroso demais, e que precisa ser
reduzido (Menicucci, 2014; Cueto et al., 2014).
A visão das pessoas como consumidoras de um mercado global, e não como
participantes de uma comunidade particular, tem originado conjuntos de identidade que
devem menos à história ou à sociedade do que as qualidades humanas podem oferecer
(Comaroff; Comaroff, 2005:182). Tais concepções retiram dos gastos realizados em saúde o
papel essencial na garantia do bem-estar da população e a importância produtiva na própria
formação do PIB. No atual cenário brasileiro de crise política e econômica, o anúncio da
aprovação da Proposta de Emenda Constitucional 241/55, que estabelece o decrescimento,
por 20 anos, dos orçamentos em saúde, educação e segurança pública, é recebido com
muito pesar. Assim, é preciso considerar que o significado da diferença cultural nos países
em desenvolvimento, sua estratificação e as divisões culturais de trabalho dentro de suas
sociedades são pelo menos tão importantes quanto as diferenças econômicas, na medida
em que podem envolver práticas discriminatórias institucionalizadas por parte das elites e
suas burocracias (Pieterse, 2010). Como destacado por Polanyi, “os interesses de uma
classe se referem mais diretamente à sua posição e lugar, ao status e segurança, isto é,
eles são basicamente não econômicos, mas sociais” (2012:172).
Considerações Finais
Este artigo buscou oferecer um breve panorama do debate que circunda o pensamento
do desenvolvimento, evidenciando sua contemporânea crise teórica e paradigmática. Os
limites expostos nas mais diversas estratégias de superação das desigualdades nos indicam
que é preciso desestabilizar a lógica do mercado que permeia nossas sociedades e que
18
criam o mito de um padrão inalcançável de desenvolvimento. Neste sentido, fazem-se
necessárias abordagens metodologicamente pragmáticas que promovam mudanças
fundamentais nas formas pelas quais o conhecimento é produzido e justificado. Tal feito
deve vir acompanhado de uma „ética do desenvolvimento‟ (St Clair, 2007; Dower, 2008), que
desafie o domínio das instituições globais e da economia ortodoxa como fontes únicas de
conhecimento especializado para o desenvolvimento; e que reconheça e incorpore a
complexidade dos processos e relações nas trajetórias das sociedades e suas intituições,
além da importância do quadro internacional e o papel da responsabilidade global dos
indivíduos, Estados e sociedades na busca pelo direito a uma vida mais digna.
Como vimos, ainda que a saúde pública no Brasil tenha sido precária desde o início,
apesar dos esforços empreendidos para torná-la um direito universal, a desterritorialização
do poder promovida pelo advento de um capital flutuante e localmente não consolidado tem
derrubado a responsabilidade por suas consequências e dificultado a criação de
solidariedades, de uma comunidade de sentimentos compartilhados. Ao completar 29 anos,
o SUS ainda enfrenta entraves à sua execução, o que tem comprometido cada vez mais a
qualidade dos serviços oferecidos. Diante das múltiplas diferenças que são postas em jogo,
a participação promovida pelo SUS continua a ser excludente. As adversidades enfrentadas
atualmente parecem requerer doses ainda maiores de comoção.
Se antes o privatismo já constrangia a idealização do direito universal à saúde, após a
redemocratização do país e a criação do SUS ele se fortalece, tornando a mobilização mais
difícil em outras esferas da sociedade, e precária entre os próprios profissionais da saúde –
frequentemente cooptados pelo sistema privativo e pelos ganhos que este pode oferecer. Se
na década de 1970, as emoções compartilhadas em um cenário de privações de liberdades
políticas desempenharam papel crucial para a mobilização mais ampla da sociedade em
torno da proteção de seus direitos cidadãos; nos anos 2010, a extinção dos mesmos direitos
torna-se uma constante ameaça, mas as emoções parecem continuar adormecidas. Ao
retomar o conceito de autoproteção social, é possível perceber que sob a hegemonia do
princípio das políticas liberais se reduz inevitavelmente o espaço de expansão da
democracia, praticamente inviabilizando a construção de um estado de bem-estar social e
de um crescimento econômico sustentado. Diante de um plano de mudança da Constituição
pelos próximos 20 anos, originado por um governo que chega ao poder sem que seu
programa político tenha sido apresentado ao eleitorado, mobilizar-se e emocionar-se é cada
vez mais preciso.
A promoção da ideia de saúde como direito possibilita a imaginação do
desenvolvimento de uma vida digna que não é estritamente nacional, mas que coloca seus
critérios numa concepção humanista da vida em sociedade de maneira geral. Atuante no
movimento sanitarista, Jairnilson Paim (2012) tem argumentado que a saúde universal não é
19
um projeto, mas sim um processo. Não obstante, a mudança na perspectiva sinaliza que o
direito universal à saúde não pode ser visto como projeto findado na implementação
„fracassada‟ do SUS. O processo espinhoso pelo qual as principais ideias dos sanitaristas
têm passado revela, sobretudo, que o movimento é parte de um conjunto mais amplo de
ações, e seu desenvolvimento continua dependendo de uma agenda plural, que incorpore
os cidadãos em suas reflexões. O processo, enquanto desenvolvimento inacabado per se,
deverá ser, antes de mais nada, pedagógico e autônomo. Nas palavras de Paulo Freire
(2011), é preciso compreender “a diferença entre o inacabado que não se sabe como tal e o
inacabado que histórica e socialmente alcançou a possibilidade de saber-se inacabado”.
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