a ajuda da jararaca
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19 • CORREIO BRAZILIENSE • Brasília, quarta-feira, 14 de outubro de 2009
Pesquisadora da USP e do Instituto Butantan descobre, no veneno de uma cobra muito comum no Brasil, uma substância que promete ajudar a reduzir a pressão arterial sem os efeitos colaterais comuns aos medicamentos atuais
A ajuda da
jararacaU
ma pesquisa do Instituto de Quí-mica da Universidade de São Pau-lo (USP) pode revolucionar o con-trole da hipertensão arterial, mal
que atinge pelo menos 30 milhões de bra-sileiros e 600 milhões de pessoas em todo omundo. O estudo feito por Claudiana La-meu, que também é pesquisadora do Insti-tuto Butantan, de São Paulo, encontrou noveneno da cobra jararaca, presente em boaparte do Brasil, um novo tipo de peptídiopotencializador de bradicinina (BPP) —substância capaz de controlar a hiperten-são arterial —, que teria a vantagem de nãoapresentar efeitos colaterais.
Os atuais medicamentos disponíveis nomercado já são baseados em BPPs, masagem na inibição de uma substância co-nhecida como enzima conversora de an-giotensina (ECA) — ou seja, atuam na di-minuição de substâncias causadoras doaumento da pressão arterial. Em contra-partida, a diminuição dessas substânciascausa uma elevação da frequência cardía-ca, o que dificulta o tratamento de muitospacientes.
Já o peptídio descoberto por Claudianatem uma ação completamente diferente, emais eficaz. Ele age nos barorreceptores,agentes que regulam a pressão, impedindo
por exemplo, que ela caia bruscamentequando nos levantamos, ou suba exces-sivamente quando praticamos exercí-cios. Com a ação do peptídio estudadopela farmacêutica paulista, esses baror-receptores ficam mais sensíveis, contro-lando com mais eficácia as variações napressão arterial.
A principal vantagem em relação aosmedicamentos atuais está em uma apa-rente ausência de efeitos colaterais, comoa elevação da frequência cardíaca. “Aindanão conhecemos de fato quais seriam ascontraindicações. No entanto, por ser umamolécula endobiótica e agir em dosesmuito baixas, acreditamos que reações ad-versas sejam mínimas”, explica Claudiana.
Testes
A pesquisa foi realizada com dois gru-pos de ratos. Um, formado por animais hi-pertensos, o outro por animais saudáveis.Ambos receberam as mesmas quantidadesdo BPP de jararaca. No grupo hipertenso,os animais tiveram suas pressões regula-das, sem o desenvolvimento de qualquerreação adversa, o que comprova a eficáciada ação da substância.
Já no grupo saudável, nada aconteceu,
o que sugere que a substância age apenasna regulação do funcionamento dos baror-receptores, não interferindo em outrasfunções do organismo dos animais. “Os re-sultados foram muito positivos, pois essasmoléculas foram capazes de diminuir apressão arterial somente de ratos doentese corrigir problemas inerentes à hiperten-são”, comemora a pesquisadora.
A substância estudada por Claudiananão é encontrada apenas no veneno doréptil — também está presente no sistemanervoso e no baço do animal. “O interes-sante é que, se o veneno está presente tam-bém em outros tecidos importantes da ja-raraca, como o cérebro, por exemplo, isso éum sinal de que ele tem algum papel fisio-lógico importante para ela”, comenta.
A próxima fase das pesquisas é verificara eficácia da substância na hipertensão ar-terial de seres humanos. Ainda não existe,porém, previsão para a inovação chegar àsfarmácias e aos hospitais. “Já fui procuradapor algumas indústrias farmacêuticas,que, pelo potencial das moléculas, ficarammuito interessadas em prosseguir com osestudos em seres humanos, mas para issomuito dinheiro precisa ser investido, porse tratar de uma inovação radical”, com-pleta Claudiana.