a base conceitual da ciência

15
46 2. TvwIcOES DA PESQUISA A BASE c0NcEITUAI. DA cIENCIA 47 N LI criadas. A niaioria enquadra-se nas cléncias on nas humanidades. As ciên- cias sociais não 56 estão mal-representadas como seus nomes - econornia politica, filosofia mental - soam estranhos aos ouvidos modernos. Analo- garnente, a divisão entre inatérias da ciência e das humanidades cm geral é bastante clara. São as linhas divisórias entre essas disciplinas e as ciências sociais que tendem a 5cr muito obscuras. As matdrias intercssantes, do ponto de vista da classificação, são as que pairam vagameilte em tomb de uma das fronteiras ciencia–ciencia social–hunianidades. A psicologia é urn born exemplo dc nina matéria cujo dcscnvolvi,nento reflete nina filiação incerta. 0 interesse académico pela psicologia comb disciplina desenvolveu-se primeiro na Alernanha durante o século xix. Al- guinas pesquisas psicológicas estavain sendlo feitas naquela época no mun- do anglófono, geralniente sob o tomb dc 'fi)osofia mental'. 0 surgirnento, porém, da pesquisa psico6gica como atividade distinta nos Estados Unidos em geral é atribuido a William James, que começou a ensinar essa matéria em Harvard em 1875. A formaçao de James era em fisiologia, mas dc de modo alguin acreditava quc a Onica abordageni da psicologia fosse por in- terrnédio do trabalho em laboratOrio. A psicobogia, poréni, era geralmente vista nos Estados Unidos corno nina maméria experimental. Nos pnnieiros anos do sdcubo XX, por exemplo, 0 behaviorisnio teve grande impacto nas pesquisas psicológicas nos Estados Unidos, e, segundo os behavioristas, a psicologia era urn ramo experimental puramente objetivo da ciéncia natu- ral. Suas idéias se nutriram tanco per melo de periodicos quanto de reuni- Ocs, e urn dos behavioristas ihais destacados, John Watson, foi influente editor da Psychological Review, e depois prcsidenre da American Psycholo- gical Association. A medida que o tempo passava, essa visao da psicologia como cléncia naturalsofria niudanças. A psicologia clinica representa urn exemplo cxrre- mo. No inicio, o enfoque freudiano era tido como essencialmenre cienti- fico, mas, ha alguns anus, etc e merodos alms passaram a ser vistos sob urna luz diferente. A mudança reflete-se neste cornentSrio da decada de 1950: Existe uma impressão predominante quanro a mnsustentabibidade cientilica da psicologia clinica entre uluitos psicólogos. Coni Irequência, a psicologia clinica é Vista comb nasa arte; ou Se acritica estiver propensa ascr ma's critica, cIa pocle set concehida corno uma tentariva tie obter conhecinienmos per meios mismicos e realizar mudanças per mcmi niãgicos! 0 fato de diferentes iireas da psicologia estareni sendo pesquisadas de maneiras cliferentes suscitou urna quesmão fundamental. As ciencias namurais desenvolveram concepçOes, que são amplamente accitas pelos pesquisadores dcssas areas, sobre quai é seu objeto e como as pesquisas devern set reali- zadas. Será a psicologia capaz de desenvolver urn enfoque unificado similar, on devcrá continuar sendo inn grupo de distmntas especmalidadcs — algurnas mais afins corn as ciéncias naturais e outras menos? HaverS ciii psicologia leis dc aplicação geral corno ha (por exemplo) na fisica? Essa é uma questão que afeta todas as ciências sociais. Confornie iunplica a seguintc citação - talvez isso dependa da especialidade que se tern em rnira. Nevitt Sanford, que então pertencia a Stanford University, afirrnou em 1963: "A grande dificuldade da psicologia genii 6 que as leis gerais' tab adniiradas tao avidanieiite buscadas nunca são muito gerais. Ao contriirio, nornialnienre são hem especificas." Isso significaria que a psicologia simpiesmenre não teria progredido o sufi- .;cicntecparaçerinimir,que..alguéntcoiscebesse uma meoria abrangente. Mas pode- rut significar algo hem diferente: que a psiculogia não é uma ciéncia no mesmo sentido que a fisica, qulmica on biologia; que cia é nut aglomerado de campus cientificos que, eiubora alms, são "unto dispares para se enquadrareni no mar- co de nasa teomia tinica [..j dc fato o campo da psicobngia explodiu em areas autOnomas tie especiaiizaçao. A American Psychotogical Association reconhece amuatmente 58 campos dapsicologia, e 42 das 45 'divisaes' (subgrupos dc asso- ciados) da AA representam esses campus on, poder-se-ia dizer, esses produtos de fissao da psicologia.' Os grupos dentro da MA distinguern-se não apenas pelas diferenças de enfoque prSrico, mas rarnbém por posiçflo meOrica. Como o nOrnero de divi- sacs sugere, determinados gmupos podem set muito especificos quanto a metodobogia de pesquisa que consideram adequada. Per exempbo, foi cnn- da urna divisao para se concentrar cm pcsquisas que adotarn a inetodobogia behaviorista advogada por Burrhus Skinner. Apesar da especificidade (10 t erna , tratam dde quatno nevistas especiatizadas. Essa espccialIzaçao pot incio da rnctodoiogia, e nab do conmeOdo, ocorre con, inuita freqUência nas ciências soclais. Dois periOdicos europeus de sociobogia que circubavain apOs a Segunda Guerra Mundial possularn clienrelas muito parecidas. Sun exismGncia independenme derivava do fato tie que a formação de pesquisa- dotes antes e depois da guerra havia tornado caminhos bern diferentes. As posiçães teOricas dos dois grupos cram incornpativeis, de rnodo que suas cornunicaçOes encaminhavarn-se a destinos separados. A base conceituat da ciéncia Conforme esse übtimo exeinplo sugere, as diferenças dentro e entre as matérias são cm gemal tanto urna questão de enfoque quanmo de conteOdo. Muitos psicObogos definiriarn, scm dOvida, sun maténia corno o esmudo das caractenisticas mentais on arimudes de urna pessoa on grupo de pessons. Aquibo em que difemeni está no niodo de estudar cssns caracterismicas on ami- -. - - tudes. Esma questão CIa estrumura conceitual a 5cr adomada na realizaçfio die pesquisis é inn irnpbrtante fator ,u determinaçno de dlifcrcnças no padrao - - de comunicação entrc maténias. Grande parte do debate acerca dcssas estru-

Upload: cynthia-m-kiyonaga

Post on 23-Jun-2015

369 views

Category:

Documents


4 download

TRANSCRIPT

Page 1: a base conceitual da Ciência

46 2. TvwIcOES DA PESQUISA A BASE c0NcEITUAI. DA cIENCIA 47

N

LI

criadas. A niaioria enquadra-se nas cléncias on nas humanidades. As ciên-cias sociais não 56 estão mal-representadas como seus nomes - econornia politica, filosofia mental - soam estranhos aos ouvidos modernos. Analo-garnente, a divisão entre inatérias da ciência e das humanidades cm geral é bastante clara. São as linhas divisórias entre essas disciplinas e as ciências sociais que tendem a 5cr muito obscuras. As matdrias intercssantes, do ponto de vista da classificação, são as que pairam vagameilte em tomb de uma das fronteiras ciencia–ciencia social–hunianidades.

A psicologia é urn born exemplo dc nina matéria cujo dcscnvolvi,nento reflete nina filiação incerta. 0 interesse académico pela psicologia comb disciplina desenvolveu-se primeiro na Alernanha durante o século xix. Al-guinas pesquisas psicológicas estavain sendlo feitas naquela época no mun-do anglófono, geralniente sob o tomb dc 'fi)osofia mental'. 0 surgirnento, porém, da pesquisa psico6gica como atividade distinta nos Estados Unidos em geral é atribuido a William James, que começou a ensinar essa matéria em Harvard em 1875. A formaçao de James era em fisiologia, mas dc de

modo alguin acreditava quc a Onica abordageni da psicologia fosse por in-terrnédio do trabalho em laboratOrio. A psicobogia, poréni, era geralmente vista nos Estados Unidos corno nina maméria experimental. Nos pnnieiros anos do sdcubo XX, por exemplo, 0 behaviorisnio teve grande impacto nas pesquisas psicológicas nos Estados Unidos, e, segundo os behavioristas, a psicologia era urn ramo experimental puramente objetivo da ciéncia natu-ral. Suas idéias se nutriram tanco per melo de periodicos quanto de reuni-Ocs, e urn dos behavioristas ihais destacados, John Watson, foi influente

editor da Psychological Review, e depois prcsidenre da American Psycholo-

gical Association. A medida que o tempo passava, essa visao da psicologia como cléncia

naturalsofria niudanças. A psicologia clinica representa urn exemplo cxrre-mo. No inicio, o enfoque freudiano era tido como essencialmenre cienti-fico, mas, ha alguns anus, etc e merodos alms passaram a ser vistos sob urna luz diferente. A mudança reflete-se neste cornentSrio da decada de 1950:

Existe uma impressão predominante quanro a mnsustentabibidade cientilica da psicologia clinica entre uluitos psicólogos. Coni Irequência, a psicologia clinica é Vista comb nasa arte; ou Se acritica estiver propensa ascr ma's critica, cIa pocle set concehida corno uma tentariva tie obter conhecinienmos per meios mismicos e realizar mudanças per mcmi niãgicos!

0 fato de diferentes iireas da psicologia estareni sendo pesquisadas de maneiras cliferentes suscitou urna quesmão fundamental. As ciencias namurais desenvolveram concepçOes, que são amplamente accitas pelos pesquisadores dcssas areas, sobre quai é seu objeto e como as pesquisas devern set reali-zadas. Será a psicologia capaz de desenvolver urn enfoque unificado similar, on devcrá continuar sendo inn grupo de distmntas especmalidadcs — algurnas

mais afins corn as ciéncias naturais e outras menos? HaverS ciii psicologia leis dc aplicação geral corno ha (por exemplo) na fisica? Essa é uma questão que afeta todas as ciências sociais. Confornie iunplica a seguintc citação - talvez isso dependa da especialidade que se tern em rnira.

Nevitt Sanford, que então pertencia a Stanford University, afirrnou em 1963: "A grande dificuldade da psicologia genii 6 que as leis gerais' tab adniiradas tao avidanieiite buscadas nunca são muito gerais. Ao contriirio, nornialnienre são hem especificas."

Isso significaria que a psicologia simpiesmenre não teria progredido o sufi-.;cicntecparaçerinimir,que..alguéntcoiscebesse uma meoria abrangente. Mas pode-

rut significar algo hem diferente: que a psiculogia não é uma ciéncia no mesmo sentido que a fisica, qulmica on biologia; que cia é nut aglomerado de campus cientificos que, eiubora alms, são "unto dispares para se enquadrareni no mar-co de nasa teomia tinica [..j dc fato o campo da psicobngia explodiu em areas autOnomas tie especiaiizaçao. A American Psychotogical Association reconhece amuatmente 58 campos dapsicologia, e 42 das 45 'divisaes' (subgrupos dc asso-ciados) da AA representam esses campus on, poder-se-ia dizer, esses produtos de fissao da psicologia.'

Os grupos dentro da MA distinguern-se não apenas pelas diferenças de enfoque prSrico, mas rarnbém por posiçflo meOrica. Como o nOrnero de divi-sacs sugere, determinados gmupos podem set muito especificos quanto a metodobogia de pesquisa que consideram adequada. Per exempbo, foi cnn-da urna divisao para se concentrar cm pcsquisas que adotarn a inetodobogia behaviorista advogada por Burrhus Skinner. Apesar da especificidade (10 terna , tratam dde quatno nevistas especiatizadas. Essa espccialIzaçao pot incio da rnctodoiogia, e nab do conmeOdo, ocorre con, inuita freqUência nas ciências soclais. Dois periOdicos europeus de sociobogia que circubavain apOs a Segunda Guerra Mundial possularn clienrelas muito parecidas. Sun exismGncia independenme derivava do fato tie que a formação de pesquisa-dotes antes e depois da guerra havia tornado caminhos bern diferentes. As posiçães teOricas dos dois grupos cram incornpativeis, de rnodo que suas cornunicaçOes encaminhavarn-se a destinos separados.

A base conceituat da ciéncia

Conforme esse übtimo exeinplo sugere, as diferenças dentro e entre as matérias são cm gemal tanto urna questão de enfoque quanmo de conteOdo. Muitos psicObogos definiriarn, scm dOvida, sun maténia corno o esmudo das caractenisticas mentais on arimudes de urna pessoa on grupo de pessons. Aquibo em que difemeni está no niodo de estudar cssns caracterismicas on ami-

-. - - tudes. Esma questão CIa estrumura conceitual a 5cr adomada na realizaçfio die pesquisis é inn irnpbrtante fator ,u determinaçno de dlifcrcnças no padrao

- - de comunicação entrc maténias. Grande parte do debate acerca dcssas estru-

Page 2: a base conceitual da Ciência

48 2. TItAD!cOES tm PESQUISA A BASE copJcEiTuAi. DA CIENCIA 49

baihando seguindo as mesmas linhas ao mesmo tempo, isso significa pie quern for o primeiro a levar jima descoberta ao conhecimento do püblico terá prioridade em relaçao an trabalho de outros. For conseguinte, o sure-ma de cornunicação deve ter condiçOes de estabelecer corn clareza quern derern prioridade tie cada novo avanço. Ou, tomando outro exemplo, a ênfase na observaçao irnparcial e na andlise quantitariva vincula-se a forma corno Os resultados das pesquisas são normalrnente apresentados urn estilo irnpessoal muiras vexes entremeado corn rnatemática. Esta fomnia de apre-sentar a ciência e indigesta para os não-cientisras, o que levou ao surgirnento dos especialistasern divulgaçao cientffica. Mesrno a convicção in unicidade da ciéncia tern implicaçOes pamaa difusaoe aceitaçflointemnacional da infor-inação cientifica. Sugere que todos os paises devem adotar as fornias deco-rnunicação desenvolvidas nos paises que se acharn na vanguarda da ciência.

Essas diversas convicçOes sobre a ciéncia implicarn necessariarnenre pie a pesquisa cientifica estd inrimnarnenre ligada a intemação social. A necessi-dade de acurnular dados, desenvoiver teorias e expemiências simultanearnente, e modificar idCias, tudo isso fax corn que os cientistas Se envolvam corn co-rnunicação. lssd ndo quer dizer que a ciéncia somente precise scm conside-

4 rada em termos sociológicos: os estilos de pesquisa dos individuos, que envolvern sun psicologia, são tarnbern importantes. Mas a coinunicação C, por definiçao, urna atividade de grupo. Por conseguinte, são os aspectos so-

t ciais da ciéncia que aqui nos interessam principalrnente. Em outras pala-

4 vras, em que os cientistas acredirani no que tange a forrna como devern agir como rneinhros de urna cornunidade cientifica?

Essa C basicarnente urna questão sobre regras de conduta, Cu, conio são frequentemente charnadas, norrnas sociais. Fomarn feitas várias tentativas para definir conjuntos de norrnas para a comunidade cientifica. 0 niais in-fluente deles, o de Robert Merton, propOe a existéncia de quatro normas básicas: universalismo, sentido de coinunidade [communality], desprendi-mento e ceticisrno organizado.'" 'Universalismo' significa que a cornuni-dade cientifica avalia as novas contribuiçoes corn base em critCrios preesta-helecidos e irnpessoais, independenternente de fatomcs pessoais conio sexo, raça, nacionalidade, meligião, etc. Os resuirados de novas pesquisas depen-dern, em ülrirna instflncia, da inreração enrre cienristase devem, porsua vex, sercolocados a disposição da coniunidade cienrifica. 0 'sentido de cornuni-dade' reflete o requisito de que o conhecirnento cienrifico deve 5cr de pro-priedade cornuni. 0 'desprendirnenro' inforrna ao cientista que sua preocu-

S pação primordial deve ser corn o progresso do saber. Os cienrisras não de-veni envolver-se ernocionalmente corn a aceitação ou rejelção de determi-midas idCias. For firn, a cornunidade cientifica deve submerer continuarnen-tea análise critica - isto C, an 'ceticismo organizado' - os conhecimentos

I '

que aceit-a, a procura de possfveis emmos devidos a oinissão Cu

turas conceituais tern girado ate hoje em tomb da idéia de urn 'rnétodo cien-tifico'. Isso, portanto, coustitui urn born porno tie partida para se exarninar a relaçflo entre estrutura conceitual e cornuflicaçao.

Para rnuitos cientisi.as em atividade essa conversa sobre estmutura con-ceitual' e certarnente sobre 'mCtodo cientifico' soaria desnecessariarnente extravagante. Eles aprenderam a estudar o mundo a sua Volta corn o cm-prego de uma variedade de métodos especIficos para cada fini. Os pressu-posos que suscitarn no realizar esscs estudos pamecem em sun maloria muito óbv,os para que mereçarn ser mencionados. No entanto, esses pressupostos afetam em ültirna análise a forma como des se cornunicam. Os cientistas acreditam que existe urn rnundo real Ia fora, que possui suas próprias camac-teristicas, i.ndependenternente das expectativas e anseios dos seres hurna-nos. Pressupoem automaticamente que podern dissociar-se de modo sufici-ente deste mundo, a firn de poderem exarniná-lo corn cent grau de impes-soalidade. Acreditarn que a obtenção de informaçoes confiáveis sobre o mundo irnplica urn mCtodo racional, quantirativo, que acumule dados por rneio tie ohservaçOes e experiências, interpretando-os corn uma estrutura te6rica apropnada. 0 progresso das pesquisas cientificas depcnde da apli-cação de uma rnescla de trabaiho prático e teOrico, em que cada compo-nente conferee ajuda o outro. Esse metodo leva an descobrirnento de regu-laridades, cjue, em tItima instftncia, podern 5cr inclulcias las 'leis da natu-reza'. For exernplo, o esiudo das regularidades do movirnento dos planetas levou ii lei da gravitacflo.

A identificaçio dessas leis perrnite que sejani feitas previsOes. For exem-plo, onde se cncontrará deterininado planeta em deterrninado niornento. Se as prcvisOes faiharem, teremos que voltar a pmancheta: os cientisras devein estar preparados para rnodificar suas idéias quando houver indicios que sugerem de modo bastanre forte que estao errados. Esse crescimento por rneio de rnudanças garante que a irnagern que winos do rnundo aurnentará continuamente scu alcance. Em outras palavras, a ciência progride a medida que o tempo passa não apenas pela acumulação de mais dados, mas tambCrn por proporcionar percepcOes rnais gerais C mais elaboradas da natureza de nosso mundo. Todos esses pressupostos levararn Os cientistas a acreditar que, ernbora a ciência nab seja a ünica forma de expiorar o rnundo, cIa o fax de ulna forma ünica. Na verdade, rnuitos cientistas supOein que o desenvol-vimento da ciëncia modemna foi, em Si, urn evento lilipar - algo que acon-teceu na Europa ocidenral durante os séculos xvi e xvii—, embora alguns historiadores tenhani menos certeza disso.

Essas convicçOes influenciarn a forma corno a ciéncla se cornunica. Urn exemplo é a convicção de que existe apenas urn mundo real a espera de 5cr explorado, o qiie implica que descobriinentos especificos acerca dde so-rnente podein 5cr feitos unla Vex. Unia vez que vários cientistas estarão tra-

Page 3: a base conceitual da Ciência

50 2. TRADIçOES DA PESQU!SA A BASE CONCEITIJAI. DA CIENCIA 51

E possivel elaborar vfirios comentários sobre essas regras de conduta. Urn deles é que tais regras nio são necessariarnente verdadeiras. l'or exem-plo, a probabilidade de urna idéia radicalmente nova set aceita d em geral consideravelniente ampliada se o pai dessa idéia empenhar-se bastante nela. Muitos cienuscas achariani isso nina prStica normal e, portanto, implicita-mente estariarn quesnoiiando a norma do 'desprendimento'. Além disso, pode bayer nornias adicionais, perceptiveis na comunidade ciencIfica, mas que não escejarn inclufclas nas quatro normas de Merton. Mais de uma yea foi sugerido, par exemplo, que os cientistas também acreditam fortemente numanorma de 'originalidade': Isso tequer qneocientisttvsomelite divul-gue resultados que contenham algurna novidade genuina. Em outro nivel, e claro que todas as normas sugeridas são iniringidas, as vexes frequente-mente, pelos cientistas durante suas pesquisas. Em certo sentido, não ha nada de surpreendenre nisso: os dcx mandamentos estabelecidos na Biblia são desrespeitados corn assiduidade ainda major. A diferença esta em que os dcx nmndamentos representam uma afirrnaçflo ex cathedra, enquanto as normas cientificas são tidas como generalixaçOes baseadas nas perspeccivas reals da coniuwdade. Parece que uma tIe duas conclusôes decorre disso. A pnrneira e que deve haver uma continua tensão entre o que as cientistas pensam que deveriam estar fazendo como membros de urna comunidade ci suas próprias predileçoes pessoais. Alternativaniente, podernos rejeitar a deja de que a cornuniclade ciencifica de fato obedece a esse conjunco de nor-

inas Sociais. E.ssa ültima ação parece uiuito extrerna. As normas de Meiton refl&eni

pelo menos o que Os cientistas veriam conio urn mundo da ciëncia perfeito. H5, pordni, uma ressalva iniportante: essas nOrnias aplicam-se it ciência que se priltica em uni versidacles. Para servi rein aos ob jetivos de in riitos cientist:ts dand(isvria elas precisariam de uma grande cirurgia. Mesnio jia ciéiicia fei-ta em universidades, vitrias especialidades podeni asslililIr posiçoes hem di-ferentes, e Os membros de cacla urna, de qualquer modo, provavelmeiite te-ritO OpiniOes divergentes. Pot exemplo, houve inámeros debates entre espe-cialidades C no seiO de uma mesnia especialidade sobre os problemas da aceitaçito de financiamento de pesquisas oriundo de fontes militares. Urn aspecto em cliscussao refere-se a norma do sencido de cornunidade - a convicçfio de que o conhecimento cientifico deve 5cr colocado livremeare a disposiçflo de toda a comunidade -, 0 (jue C niuttas vexes impossivel de concretizar quando se trata de projetos para a defesa. Deve-se acrescentar clue, embora Se possa encontrar aceitaçito das normas de Mertoit tanibCm na Ii iStóri a passada da ciéncia, as acitudes m ucla in corn o tempo. Pot exern-plo, eminences cientistas do sCculo XIX discutiam se a aceicaçño de financia-mento do governo liinitaria de alguni mocha it liberdide de suas ativiclades de psqtiisa. I-loje 6 raro ouvil- -se mençito a essa preocupaçitO nials anipia.

A existCncia e aceitação de normas pode afetar a processo de coniunica-ção. Vejamos a conceito de universalismo em prirneiro lugar. Urn exemplo de como isso funciona pode 5cr encontrado ha andlise de artigos submetidos a publicaçito cm reviscas cientificas. Os echtores* em geral se esforçarn para garantir que Os artigos sejam aceitos pelo seu próprio mCrito e nito apenas pOrque 0 aucor C unia pessoa de renome. Confornie ficarit evidente em capf-tulo posterior, as editores despendem enorme esforço na tentativa de lidar de modo imparcial coin o material que flies C submecido. A norma do send-do de comunidade tambCni enconcra urn born exemplo nas revistas. Os

•-autores,-porrnais importante que seja seu crabalho, não podem, ao puhlicá-to, esrahelecer condiçOes sobre sua utilizaçao e desenvoivimento posterior. 0 fato de os autores não terem a expectativa de que serito remunerados pela publicaçdo de sua pesquisa em periódicos (corn efeito, its vexes tern dIe con-tribuir para o custo dessa pubbicaçito) é, par sua yea, urn exernp[o de des-prendirnenco. A avaliaçflo de artigos cientificos pelos pares é, igualmente, urn excelente exemplo de coma funciona o ceticismo organizado. (A mes-ma funçno critica pode serencontrada na cornunicaçito informal, quando as apresentadores de trabalhos em semindrios on conferéncias são interro-gados pela piatCia.) Se Se aceitar a originalidade coma norma adicional, isso entito cambCm Se manifesca no processo de avaliaçiio de artigos, em que constitui urn requisito bSsico para sua aceitação. TambCm funciona como urn objetivo decisivo na forrnação de novos pesquisadores, p015 uma condi-ção essencial para a obtençao do doutorado e que a candidato baja produzi-do conhecimento nova. Qualquer,uma ou todas essas normas mertonianas podeni ser questionadas em termos de representatividade e nivel de accita-bilidade pela comunidade. No entanto, o sisterna de coniunicaçito cienti-fica, e ent particular a processo de avaiiação de originals, pressupCe cia-ramente aigumas regras consensuais die conduta para que possa funcionar. A existCncia dessa concorditncia tabvez seja bern exernphficada nas ocasiöes em que e ignorada. Urn exemplo óhvio disso C a tratamenco severo dado pea cornunidade cientifica a quem de modo flagrante infringe as regras', seja plagiando trabaiho aiheio, sea forjaitdo dados.

Essas consideraçaes anceriores levam a conciusno de que dois farores conceituais desenipenham influCncia importante no processo de comiani-cação da ciCncia: os pressupostos bitsicos que os cientistas estahelecem acer-ca do trahaiho que realizarn e as convicçöes que sustencam relativas it coniu-nidade cientifica ciii forma corno cia deveria atuar. A questão seguinte a 5cr

* Nesta rraduçso, empregon-se it palavra 'editor' colno equivalenre do boinografo inglis editor, seguindo mendénria ji consolidada no Braid e qile, coriio assinala Emanuel Aralijo (4 co,zstrudo do lh,ro, p. 50), recupera o senudo primirivo (10 vocébulo, it. forma como per-durou en, inglés. I'ara publisher adotou-se a rraduçao 'editora'. (NT.)

Page 4: a base conceitual da Ciência

52 2. TRADIçOES DA PESQUISA

forinulada é: era que niedida a ciéncia difere nesses aspectos de outros carnpos da pesquisa acadernica? Abordaremos essa questão per rneio de uma pequena digressao, perguntando, antes de tudo, corno e per que a pesquisa leva os cientisras a mudarern was opiniOes sobre corno é o mundo e a rnaneira conio deve ser pesquisado.

A ciëncia e outras disciplinas

As mudancas mais óbvias na ciéncia são, naturairnente, as grandes mu-danças: da convic-ção dc cjue a Terra tinha-a1gunsrni1hresdeanosdeidade para a convicção de que tern alguns bilhoes de anos; cia convicção de que a Terra está no centro do sistema solar para a convicção de que é a So] que au Se encontra; da convicção Un irnagem newtoniana do universo para a con-vicçflo an irnagem einsteiniana; c assim por diante. Thornas Kuhn deTnons-trou que a pesquisa cientufica pode 5cr dividida em periodos de desenvol-virnento relarivarnente tranqüilo, que denominou 'ciência normal', inter-caladas corn periodos de alteraçao iniportante, denorninados 'revoluçOes', coma as rrês mencionadas ml frase anterior.' Durante urn perfodo de cién-cia normal, o canipo concernente e governado pot urn 'paradigrna' geral-niente aceitO. 0 paradzgrna, essencialniente urn marco conceitual que en-volve ranto a teoda quanto a prática, proporciona aos pesquisadores orlen-taçflo sobre quais os problernas que merecern ser investigados e coma de-vern ser atacados. A medida que as pcsdluisas avançarn, corncçarn a Se acu-mular anomalias, que a paradigma acha cada vez mais diIfcil4lc acornodar de niodo convincente. Pinalniente, toda a.cstrutura é posta ahaixo pot unia revoluçao conceitual. Assim, no corneço do seculo xix, urn paradigma geralmenre aceito na hiologia era de que cada espécic havia sido criacla de modo independente. No entanto, nurn nümero crescente de casos essa suposiçao lcvou a problernas de intcrprctação. Era meaclos do século XIX,

550 causou unla revolução na hiologia que introduziu urn paradignia di ferente - a evoluçao clarwiniana. 0 novo paradigma Ioriiiulou sua pro-pria especificaçao de quas pesqasas cram importantes e de Coma deve-riarn 5cr realizadas.

A análise de Kuhn observa a situação de urna perspectiva macroscopica, focalizando as grandes rnudanças. Eu cjue aconrece de outra perspectiva: as mudanças de pequena escala iue ocorrern corno parte das atividades qile dc

rotulou de 'ciéncia norma]'? Urn modelo cornurn da pesquisa cientifica pressupOe quc as cienristas normalmente adotani urn enfoque hi pOtetico-cledutivoi 2 Esse é urn enfoque que Se pode considerar de rnodo geral como urn nietodo em quc a pessoa avança apenas corn suns prOprias forcas. 0 cientista arrisca alguns palpitcs - denorninados 'hipOtescs' - sobre algum aspecto do mundo natural. Essas bipOteses são entao submetidas a testes

A CIENCIA E OLJII&AS DISCII'LINAS 53

• práricos, cujos resultados são comparados corn as pa]pites originars. A dis- cordflncia jiode levar a unla rnodificacao das hipoteses, seguida de novos testes, e assim por diante ate que a cienrisra se sinta satisfeito corn a jogo. Urna hipOtese bem-testada pode acabar inipregnando-se na irnagem que os cientistas tern do mundo, mas jamais havera a garantia abso]uta dc que a]-gum descobrimento nova não irS complementS-la. Karl Popper demons-trou, de law, que a fator irnportante no desenvolviniento da ciCncia C este potencial que a pesquisa possui de revelar ideias que são fa]sas. Enquanto todo urn prograrna de pesquisa não obtiver a certeza de que detcrniinada

-hip6teseseja yerdadeira, sern qualquer sombrade düvida, urn ãnico experi-mento talvez seja suficientc para mostrar que CIa está errada.

Uma iniagern, ou mais precisamente uma sCrie de esboços, da ciCncia forrnada a partir de conjeturas coma as de Kuhn e Popper ofcrece ulna es-trutura üti] para se analisar a pesquisa e a cornunicação em clCncia. PorCrn nenhunia inlagem isolada oferece urna descriçao definitiva de coma a sis-tema da ciCncia funciona. Par exemplo, 110 nivel rnais a]to, as revoluçOes cientilicas raramenre são tao claras quanta Kuhn origina]mente postulava (snas opiniOes rnudaram urn pouco cam a tenipo). Quando, na fisica do inicio do sCculo XX, 0 mode]o classico do universo foi 'substituido' pe]o rnodelo quãntico, isso nab significou quc rodas as pesquisas sabre a niodelo c]Sssico cessaram imediatamenre. Ao conrrSrio, continuam ate hoje, e as pesquisadores admitem ciue tanto o rnodelo c]dssico quanta a quflntico são Sreis, a depender do contexto. Do mesmo rnodo, nein toda pesquisa pode ser classificada coma conscientemente hiporetico-dedutivad ía Popper. An-tes da sCrie de descidas na Lua, a NASA crioli lins programa para mapear a face visfvel do satClire. Esse proceso de mapearnento envolveu scm duvida inümeras hipOreses irnplicitus, Inns em sua rnaior pane forum consideradas muito Obvias para serem explicitarnente mencionadas, e muito menos ann-lisadiis. Ate rnesrno a critCrio da falsificabi]idade de Popper é apenas pane da história. Ha uma sCrie de casos em que novas provas parecem con-tradizer uma liip6tese aceita, 110 entanto Os cientistas coiitinuanl, Eclizes, a fazer uso dessa hipOrese em seu traba]ho. For exemplo, nos anos quc Se seguirarn no anóncio feito par Einstein de sun teoria da relatividade, algu-mas experiCncias parcciam contradizer as previsOes dela decorrentes. Não forani consicleradas suficienteniente signiflcanvas para fazer cal -n cjue OS

cientistas deixassem de lada sua convicçflo nu nova teoria. Tudo isso parece esrar afirmando que a pesquisa cientifica C unia arivi-

dade clesordenada, e assim é natural quc a pcsquisa cientifica sonienre de modo parcial possa 5cr derita por nleio de modelos simples. 0 aspecto interessante, contudo, são as perguntas que esses modelos suscitarn sobre a

-: natureza do conhecirnento cientifico e, par conseguinte, sobrc como dc

deve 5cr coniunicado. A imagein de nina rnudança de paradigrna,elaborada

Page 5: a base conceitual da Ciência

54 2. TRADIçOES DA ILSQUISA It A cIENCIA E OUTRAS DISC!PLINAS 55

par Kuhn, mastra ciuc a estado do conhecirnento em determinado carnpa de pesc1uisa passa par uma transforrnação compleca antes e depois da reva-luçao. Muitos dos dados permanecem utiiizãveis, mas as inforrnaçOes deles extraidas são diferentes. Coma resultado, coniunicaçOes ancenores dcixarn de ser consultadas:

Q uando reje ta urn parad igma passado, unla comwiidade cicittIfica si inulta-neatnente deixa de usar, coma material adequado para estudo profisslonal, a major pane dos livros e artigos em que esse paradigina esrava corporificado.

Dc modo mais genérico, esse modelo ye as inforrnaçOes cienifficas acu-nailando-se apenas de forma liniitada, corn as convicçOes e consequence usa da inforniaçao sendo transformados a cada rnudança de paradigma. Con-fornie assinala Kuhn:

Estamos codas extreniamente habituados a ver a ciCncia canto our ernpreendi-rococo que Se aproxima de modo Constance de unla meta estabelecida antecipa-darnente pela natureza.

Mas serã preciso que haja essa mera? Serã que não podernos justificar a exisrencjd da ciCncia.e seu sucesso em funçao da evolução do estado de conhe-cirnento da comunidade em dado monlento? Será que realmenre ajuda ma-ginar que exisce urn relaco coinpleto, objecivo e verdadeiro do narureza e que a medida apropriada das realizaçoes cientificas seja a exrensAo coin que dos nos aproximain dessa nieta final? 4

o que está sendo aracado aqui são alguns dos pressuposcos basicos feicos pelos ciencistas a respeito de seu trabaiho. Em particular, Kuhn estã desa-fiando a convicçao que des tern de que podern co?iseguir inforrnaçoes con-fiãveis par ineio da investigação racional de urn mundo excerno do qual podern mancer-se afascados. Mais genericarnence, a desafto aos ciencisras em dCcadas recences partiu tie trés direçoes. A primeira expande o enfaque de Kuhn e basicamence questiona se a conhecinienco cientffico C de law diference de ourros cipos de conhecirnenco. A segundo afirma que a investi-gação cientifica está tao amarrada a oucras acividades sociars que a pesqur-so não .pode ser vista corno se conscitufsse.uma encidade a pane diferente delas. Esses dais aspectos podem set combinados:

é vital não se deixar desviar pelo mica que diz haver tint hiaco entre a ciCncia a policica e que ambus são, on deveriam 5cr, separados. Nosso argumento [.1 C que a ciCncia C a politico por outros nieios e, desta manerra, que o escudo do ciência nos leva diretamence politico [ ... ] A id6ia segundo a qual existe urn mCcodo ciencifico especifico, urn reiuo onde a verdade prospera no ausCncia de poder, C urn mico. IS

A terceira direção diz respeico a linguagern empregada pelos cienciscas. 0 p oblerna C que as vocabulas cientificos apresentani-Se necessariariiente carregados de teoria, par mais que pareçani fáceis de entender. Par exern-plo, farça parece set urna palavra b:rsraitte simpies, parCrn seu signilicado

cientifico C muito mais restrito do cjue seu eniprego na vida cotidsana, e sua meihar definição Se fax pot meio de uma equaçãa maternácrca. 0 processo de compreensão dos palavras envolve urna interaçflo entre a farnecedar do inforrnação (seja urn set hurnano, urn texto impresso ou paiavras numa cela de campurador) e a pessoa que recebe a i.nformaçaa. Deste ponto de vista, a transferCncia de informaçâo e nab SC urna atividade dificil, mas tanihCrn envolve alto grau de subjedvidade na cxecuçãa desse processa.

0 pensaniento [.1 nño 6, porranto, para 5cr procurado apenas en, formulaçôes tcOricas corno as do filnsofia on da clCncra; dc pode e deveser analisado em cada

- inaneirade -falar, bier ou comportar-se, em queo individuo aparece cage 1...] urn sujeito conscic rue de si e dos outros.

Para a finalidade ora presente de exanainar as difcrenças entre discipli-nas, as duas prinleiras direçOes são as n'ais imporcantes. 0 que se está afir-niando, nurn nivel, C simpiesmente que se deve investigar a ciCncia e sua co-municação em funçao do hipotese segundo a qual a conhecimenco cientifi-co nãa C diferente de quaiquer outro conhecimenro gerado pela pesquisa.

Sc não existe nenhunr caminho real que eve a verdade cientifica, nias, 00 con-trário, urn carninho que sC se descobre mediante a aplicação de critCrios de avaliaçn complexos c cCcnicos, então o vies e a irracionalidade não são as ünicos mocivos pelos quais olguCrn perderia o rurno [ ... ] Podroes de signilicado e nornias de avdliação não podem nais ser ignorados ao se estudar a debate cientifico, canto intra quanco exrra-insricucional; rorna-se necessCno o examc cornpleto dos pontos de vista dos acores. Corno estanios interessados apenas em coma os arores avaliani as prerensCes dos ciencisras, convCm, nessa investi-gação, rambCrn suspender renlporarialuenre nossa prOpria fC na verdade deles. 17

Obvianienre, poréni, falca apenas urn pequeno passo entre rsso e a afir-niaciva de que de Into não exisre diferença perceprivel encre oconhccirnenta cientilica e ourras cipos de conhecimenco. Esse foi urn passo dado por a'-guns sociOlagos e filCsafas da ciCncia. Sua afirrnaciva constitul urn born ponro de parcida para a quescão: como e percebido a canhecinienco em campos não-ciencIficos? Provavelrnence so virnios qunis as convicçOes acer-coda ciCncia que escão senda negadas, isso nos data alguma id6ia de quats as convicçöes que estño senda susrenradas acerca de ourros cipas de geração de canhecirnenro. A seguinte descriçao sugere exaranienre onde se julga escar a diferença niais importance encre ciCncia, de urn lado, e as humani-dades e ciCncias sociais, de oucra lado.

essas cendCncias [humaniscas] [.4 tentarn devulver a ator' a cena: 0 01°c nâO canto unia unidacle absrraca de andl se on urn robo posicivista, ntas coma urn set humnano que tern enioçOes, curiflitos, incoerCncias, e que não vivc nuni vácuo social, Inas, anres, inedeia encre a contexto mais aniplo sociopoliricu e cultural eo tip0 de clCncia que dde resultai4

Page 6: a base conceitual da Ciência

56 2. TRADIcOES DA PESt1UISA 10111 DIVISOES DO CONFIECIMENTO 57

A pesquisa em hunianidadese ciências sociais caracteriza-se muitas vezes pot não envolver - na realidade, näo permitir - unia nftida separaçao entre a mundo que nos cerca e a pessoa que o descreve. Uma das conse-qiléncias clesse pressupOsto é que as pesquisas nesses campos nãO implicarn necessariarnente alga corno a enfoque hipotético-dcdutivo que foi sugerido para a ciência. Os estudos em geml náo são quantitativos e, mesrno que o fossem, não levariarn a nada parecido corn as leis da natureza. Talvez Seja difIcil, ncsses campos, definir o que seja 'progresso'. A idéia kuhniana de urna niudança de paradigma em ciência, onde 0 antigo marco conceitua! (e gratdrparre doconteudoinfornnciona4.qtieoaCOmpuha)deSCatd0e se aceita outro inteiralnente nova, ajusta-se rnuito hem no quadro, no caso de Vñrias inuclanças importantes que ocorreram nag humanidades e ins ciências sociais, was corn urna cliferença fundamentaL Tanto o veiho quan-tO 0 nova paradignia podern niwto bern continuar coexistinclo nessas disciplinas, ao inv6s de urn substituir o outro. Essa coexisténcia pode de-pender de fatomes pessoais: idade, nacionalidade, etc.

Coma esse ülrirno aspecto sugeme, as normas sociais derivadas da cornunidade cientilica nao são necessariamente ap!icdveis as cornunidades de pesquisa das hurnanidacles e das ciências sociais. Muitas das pessoas nessas clisciplinas rejeitariani a idCia de universahsnio em peio nienos algtins tipos dc pesquisa, alegando que toda urna gama de fatores pessoais pode afetar o enfoque c, porranto, a aceitabilidade dos resultados. De igual mo-do, o desprendimento, corn sun critica no envolvirnento ernocional do autor nos resuitados de scu trabaiho, não seria viflo como urn ideal cigna de 'iiCn-to por inuitos pesquisadomes das hurnanidades e ciéncias sociais. Em suma, tanto as pressupostos basicos forrnulados acerca da pesquisa quanta as regras de condura racitarnente aprovadas pela cornunidade de pesquisa podern divergir entre a ciência e ourras disciplinas. Isso pode levar a due-reiças na naturezq da cOrnunicaçilo nesses canipos, corno Serã niostrado. Anres de faze-b, precisamos le,nbrar, coma foi antes obiservado nesre capi-rub, que rodas as linhas divisdrias entre marCrias e disciplinas estão em cerra medidas confundidas. Agoma vejanios surnariarnenre coma isso afera a quesrão da narureza do conheciniento nuina disciplina.

DivisOes do conhcciniento

Forarn feiras numerosas tenrativas ao bongo dos alias para classificar as conhecirnentos em categorias basics. Os parãrnetros urdizados variarani grandernente. Por exernpio, Shiyali Ranganarhan, da India, autor anipla-nienre cirado ciii marCria de classificaçflo dos conhecimentos, esboçou DID

esquenia baseado nurna visão vCdica tradicional da narureza do conheci-mento. A categorização disso resuirante niostrava diferencas de enfase em

comparação corn a rnaioria d05 esquernas ocidenrais. 0 que C notavel acerca de rodas essas classificaçacs, quaisquer que sejam os parânierros urilizados, C que raraniente produzern divisoes marcanres entre diferenres disciplinas acadêmicas. Mesmo quando nos voltarnos para esquemas elaborados corn a finalidade especffica de analisar a conhecirnento e os programas de ensi-no, ainda ocorre a desencontro corn as areas ternáticas. Assim, urn esque-ma disringue seis caregorias de conhecimento, 9 A primeira categoria, ' SliD-

bólica', inclui todos as assunros abrangidos par alguma fomma de comunica-ção sirnbd!ica. A seguinte, 'ernpirica', diz respcito a inforrnaçao factual (isto C, extraIda da - ohservaçao direta), e assim per diante. Em temmos das fron-teiras convencionais entre os assunros, esta classificaçao do conhecirnento reüne tdpicos ern geral colocados em discip]inas separadas. A sinihó!ica reüne a linguageni, em geral rebacionada cam as hunianidades, e a rnaremi-tica, que C coniurnenre cobocada nas ciCncias. Do mesrno rnodo, ernhora a empinca seja evidenrenienre uma parte fundamental das ciCncias narurais, eba C ranibCni importanme nas ciéncias sociais e, de fato, C componenre de urna sCrie de rnacCrias das biunianidades. Mesmo a rerceira categoria deco-nhecimenro nesta lista - a esrCrica - cruza as diversas binhas divisdrias en-tre disciplinas. Seu foco principal pode esrar nas huniaiiidades, mas rnuitos tedricos das ciQncias alegariarn que sen trahablia conreinpla de forum muito fundamental urn sentido estCrico. Coma a exempbo rnostra, a razao da exis-tCncia de fronreiras rndistintas entre diferenres niarCrias e disciplinas deve-se a que a coincidCncia entre tipos de aquisiçflo de conhecimenros, par uni bado, e -matCrias definidas pelo conreüdo informacional, per outro lado 3 esrá lange de ser perfeita. Matérias distintas apresentani vSrias misturas de tipos de conhecirnento, a que causa parcela major on inenor de dup!icação entre si no que range a fornia coma operam e como rratam a inforniacao.

Esse argurnenro pode set ainda mais desenvobvido. Mesmo nunia derer-niinada marCria diferentes rainos podem apresentar diferenres enfoques. Nos estucbos bibbicos, era usuaj disringuir entre 'crftica inferior' e 'critica su-perior'. 0 prirneiro ripo de pesqwsa preociipava-se corn ativic!ades coma definim os significados de palavras, renrar esrabebecer urn rexto definirivo e assirn per diante. jd o segundo ripo preocupava-se corn a esrabebecimento de urna estrutura reórica segundo a qual a texto bibbico seria inrcrpretado. Estc ripo de divisno C cornurn nas hunianidades, itesubra não 56 em nieto-dobogias de pesquisa cbiferenres, nias rarnhCin em duferenres corn preensOes daquilo que consrirui unia pesquisa aceirñyeb. Eis un refbexo dessa diferença na area dos esrudos do Novo Tesramenro:

No esrudo das exteriaridades do Nova Tesranienro - que se casruniava cha-'liar a ' cririca inferior' - podeinas pcI a nienos esperar per cc rros resu Irados quc ciii sua validade cientifica serão cornparñveis as reabizaçóes dos cienrisras das ciCnc'as fI.sicas. Ent quesrOes inais funda lien rais [ismo C, a ' africa su pe non

Page 7: a base conceitual da Ciência

58 2. TRADIcOES DA PESQtJISA DIVISOrS DO CONI-IECIMENlO 59

e possive I ter a confiança de encontrar cerras reo Has que resisti rain corn tanto ÔXiCO critica que podern, pelo menos pot enquanro, 5cr aceitas conlo ferra-rnentas üteis de traballio. 25

Parafraseando isso, dir-se-ia que certas partes dos estudos sobre o Novo Testarnento contain coin metodologias bern-deuinidas e os restiltados acu-mularn-se de modo muito parecido coin o que acontece numa ciência. On-tras part:eS, em gerM as que são mais explicitamente orientadas parts a teoria, são menos exams, no sentido de que nab ha consenso definitivo quanto as

metodologias e conclusOes. :D e rnodo similar, urna análise sobre os interesses dc pesqnisas denma

faculdade inglesa na década de 1980 constatou que au havia pelo inenos cinco diferentes correntes de pesquisa em aruação. 2 ' Forain assim clefinidas: iilvestigação tradicional (historica, biográfica, uinguIstica); estudos textil-ais; estudo da literatura em contextos sociais e culturais; cornparação da literatura corn outros meios de comunicacäo (principalmente a televssao e o cinema); enfoque internacional (estruturalista, pds-estrutural, etc.). Esta lista aharca desde uma posição nlais ohjetiva ate urn enfoque mais subjetivo. Tambern abrange desde estudos antigos consagraclos are estudos recentes sobre estilo. 0 quehouve foi que a natureza das pesquisas na tirea de estudos literdrios (e nab apenas de lingua iiiglesa) sofreu rnudanças. Antigarnente os pesquisadores recebiam o texto coino thes era passado: era tarefa do espe-cialista situd-lo nuns contexto. Hoje, Inuitos pesquisadores consideram 5cr de interesse primordial a interação do leitor corn o texto. Isso irnpOe uma rnudança do que se julgapesquisa aceitdvel: porexemplo, o papel da africa literária vein se rornando cada vez mais unla questão aberta ao debate.

Não serA fdcil noinear urn critico imporrante que fosse soinenre enrico e nada nsais; isto C, arC ha bern pouco tempo. Arualraente, r, inundo está cheio de cd-

ticos literiirios, alguns ridos como irnportanres, que nada fazem senão escrever critica lirerárin, e todos trahalhans em ,,niversidades.

Esse incrernenro da cr1 tica corno forma de pesquisa C igualado pot units enfase creseente no conhecirnento conceirual, comparado coin o factual, nudança essa que suscira opiniOes que Se modificarn rapidarnenre sobre a aceitahilidade de disrintos enioques tedricos. Poucas posiçOes conceituais populares ha poucas dCcadas ainda são ridas en] aIm courts hoje em dia. Ao niesnio tempo, a ênfase no conceitual significa que os estudos sohre teoria inerecern hoje mais arençflo. Essa nsudança do especifico e empirico para o genCrico e reOrico encontra-se em outros cainpos akin da literatura inglesa:

Faa agora [arC a dCcada dc 1990] u tempo de ui-na geração que as humanidades de faro penalizaran] a cspeclalizaçau estrira e reservaram suas lila's alras recoil'-pensas para os trabalhos que propOcm as mais ahrangentes scorias culturais e an] pl as genera Ii zaç(]es i nerd isci pl in ares, trahalhos que pronicre ni recolisi dera o paracligrna cuni que se pcnsa sobre sen sujeiw.

A batallia acerca da funçao e importãncia da teoria flO se limita as humarndades. Ela C travada coin a mesma ferocidade nas ciCncias sociais, onde C exacerbada pot uma forte rradição de pesquisa empirica. A questão em foco não C a necessidade de teoria, mas se as teorias cjue tudo abarcarn s5o realn,eiite viáveis nas ciCncias sociais. Pot exemplo, Merton enfatizou a necessidade de empregar teorias de alcance mCdio em sociologia. (Unia teoria tie alcance rnCdio C aquela que ajuda a unificar Os estudos empiricos em dererminada area, sem tentar oferecer urn quadro que abarque rudo.) Ele ohserva que:

a sociologia avançara ua med,da eni que sua preocupação principal (mas não exclusiva) for con] a desenvolvi mento de reorias de alcance rnCdio, e se atrasarã Se sua atenção btisica estiven voltada para a desenvulvimenro de sisremas socio-IOgicos rorais 24

Merton compara con] cerra minücia a funçflo da reoria en] sociologi com sua função nas ciencs naturais. Esta tendCncta a localizar burros calnpos de pesquisa relativos aos processos de pesquisa no ciCncia de ha niuiro tens sido caracreristica das ciCncias sociais e hurnanidades A hisroria nos oferece urn horn exemplo da rnaneira como as opiniOes sobre isso Se modificaram corn o passar do tempo. A maioria dos historiadores do sCculo XIX via sua drea de esrudo firmernenre vinculada ao campo cientifico. A influCncia da culthra alernã, enrão n,uiro forte, acenruava essa vinculação.

o hisroricisn,o alemão do sCculo xix f ... ] recebeu stIa primeira inspiraçño de duas fomes: a cririca textual dos filólugns e a rnecânica do ciCncia fisica [.1 An se aproxirnar o final do sftulo passado, as ciéncias doininanres da fisica e da flbologla foram substiruidas pela hiologia, anrropobogia e sociobogia, tendo comb resultado que a histaria rornou-se ranto Inais sutil quanro Incnos exara, mais relarivisra [... Essas rrãs i nfluencias pernianecerani fortes desde então.

A questão sobre qual modelo conceirual escoiher para a pesquisa em derern,inado canipo reni arrás tIe si outra questão. Coino C possivel o desen-volviinenrode urna especialidade cientifica influirsobre qual modeloC acei-ravel? Por exeniplo, as ciéncias fisicas e hioiógicas adoraram enfoques de pesquisa sensivelmenie di ferenres no inicio do secuuo xx. As prirneiras preo-cupavam-sesobretudocom processos nos niveisatômico on molecular e dc-

- -. pendiam fortenienre da teoria. Nenhurn desses enunciados aplicava-se a biouogia. Avanços en] dCcadas recenres aproxirnaram cada vez niais as cién-

- cias fisicas ehiologicas. 0 modelo conceituau que os hiouogos rem de sua dis-ciplina sofreu rnudanças que o alinharaln corn o dos cientisras fisicos.

Supunha-se geralrnente no sCculo xix que disciplinas diferenres encon-travarn-se en] etapas diferenres tie desenvolvirnento. A medida que 0 tempo passava, suas caracreristicas tenderiarn a convergir. Auguste Conite, por exeniplo, rraçou urna seqUCncia de campus do conhecimento que poderia

-- ser assin' sintetitada: ciCncias fisicas—ciCncias bioldgicas—sociologia. Em

Page 8: a base conceitual da Ciência

60 2. TlcDIçOEs DA PESQUISA

EXAMINANDO AS DIFERENçA5 ENTRE MATERIAS 61

stlaopiniao, isso não 56 partia doconhecimenco Diais hasico para oconheci-mento menos básico, mas tambérn era uma seqiiëncia evolucionSria. A sociologia tonlar-se-ia mais afi in coin as ciências biolOgicas corn o passar do tempo e amhas, pot fim, se aproximariam do rigor das ciéncias fisicas. No século xx, e mais especialinente nas ü!timas decadas, os pesquisadores de ciéncias sociais e hurnanidades alastararn-se bastante dessa opinião. Passa-ram a ver, cada vex mais, a aquisição de conhecimentos em termos reiati-vistas. Na verdacle, alguns pesciuisadores acharn que essa é a maneira apro-priada dc encarar todo o conhecirnento. Sustentam que os cientistas estão erradorao acreditarem que podern chegarmoconhecinmntetbjetivo.Os cientistas negam isso, afirmando, por sua vez, que sornente o conheciniento cientifico e passivei de desenvolviniento sistemático. Urn bidlogo exrernou esta convicção em termos comtialios:

Em certo sentido, toda cléncia aspira a 5cr colno a fisica, e a fisica aspira a 5cr corno a rnateiniitica. Mas Laura aspiração pode levar a frustração. Apesar de éxiros recentes, a hiologia ainda tern urn longo caminho a percorrer quando corriparada corn a fisica on a quiinica. Mas, e a sociologia? Os hió!ogos ainda podern estar cheios de esperança e vivendo urna época empolgante, rnas que esperança exisre de a sociologia adquirir urn hrilho parecido corn o da fisica?"

0 faro de as universidadesserern organizadas em departarnentos e facul-dades, ambos haseados em matérias, é urn reconheciniento obvio das due-renças exisrentes entre as matdrias. Ao contrdrio tie falar em termos gerais sobre diferenças entre disciplinas, e possfvei pergunrar aos pesquisadores universitdrios quais são os outros deparranientos dos quais des se sentem mais próximos e poE quC. Suas avaiiaçOes ioderao ser analisadas para rnos-trar Os farores que influeni em sen julgamento. Os pesquisadores em geral parecern julgar os outros departarnentos em funço de a]gurnas antfreses básicas." IJni parãrnerro importante refere-se posição em que a matéria é vista no eixo puras—aplicadas. Porém, o fator mais iinportante em rerrnos de conhecimenro é a extensão corn que uma niaréria é tida corno 'rigida' [hard]

ou 'fiexivel'. [soft]. (Aqui, 'rIgido'significa q uantirarivo e rigoroso, enquan-to 'ilexive!' significa o contrrio.) Parece que osacademicos costurnam divi-dir as matérias em rigidas (ciéncias narurais e recnologia), flexiveis (hunia-nidades) e as que se siruarn no meio (ciCncias sociaas), reproduzindo assim as distinçOes tradicionais que vimos exarninando.

A irnprcssão geral deixada POE C55C permanente debate é que ha dife-reiiças auténticas enrre discipliiias em função do tipo de conhecinienro que os pesquisadoresbuscani e como des o tratam. Isso não 3o mesmo que dizcr que o conheciinento em marérias cientificas é de urn tipo e nas hurnani-dades de outro. Nlesnio Iançando mao de unia dicotoinma simples, corno 'rfgido—iiexivcl', a pesquisa ciii gera] IMO SC emiquadra totainiente null or' noutro caso. Ens terinos de nateria, urn campo ünico de esrudo normal-

mente mistura esses cornponentes. Pot exeniplo, o trabaiho de pesquisa-dores no campo das letras varia desde a teoria literãria (muito flexive)) ate a linguisrica (muiro rigida). Do mesino niodo, out projeto cspecifico de pesquisa pode ser uma mistura. Ern ffsica, as ativiciades de pesquisa variam da formulação de novas idCias (em geral nluito flexiveis) ate a dedução de resuitados (rfgida). Talvez Se pudesse irnaginar a pesquisa rigida como se fosse água e a pesqumsa flexfvei conlo se fosse á!coo!. Ambos podem 5cr mis-turados em várias proporçOes, corn efeitos sensiveirnenre diferenres em quem behe as misturas resuiranres.

Examinando as dmferenças entre matCrias

Se essas diferenças entre matCrias e disciplinas são tao significativas quanto parece, C razoável supor que ranihCrn Se reflitarn nos padroes de comunicação. No inicio da dCcada de 1970, Derek Price sugeriu que essas diferenças poderiam ser percebidas na fornia corno os arrigos cienriuicos ciram-se mutuarnenre. 28 Quase rodos os artigos trazern referéncias de publi-caçöes alms, corn a finalidade de justificar argumenros, criricar trahaihos anteriores, etc. Essas referéncias podem 5cr vistas coino urn niecanismo de red!e Ci Lie intcgri num rodo a I itera turn cientffmca. A in anei [a corn o 0 faze rim deveria propiciar a!guma cornpreensao do processo pelo qual as mnforrna-çOcs novas se reiacionani corn as antigas; Price sugeriu que existeni diferen-ças entre as snatCrias, C para explicar em que consistern C preciso fazer unia digressao para exarninar os çesultados dos 'esrudos de citaçOes'.

A palavra citaçdo C amplanienre ernpregada para descrever o ato de re-meter de urn artigo para ourro. E habitual, nesse contexto, disringnir entre o arrigo ciranre (que contCrn a referCncia) e o arrigo cirado (o niencionado na referCncia). Conforme foi salientado no capirulo anterior, a quanridade de literatura cientifica rem crescido de modo aproxirnadarnenre exponen-cial ao longo do tempo. Se roda essa lirerarura for de igual inreresse para os pesquisadores, será natural que a disrrihuiçao das referCncias feiras a cia no tempo siga inn padrao similar, corn urn nü'nero muito niaior de referéncmas de pubiicaçOes recentes do que anrigas. Dc faro, C isso que aconrece, porCrn, can alguns campos de pesquisa, a proporçño de lireratura recenre cirada C arC nesmo rnaior do que o que serma previsivel corn umna taxa de crescimenro exponencial. Price chaniou de 'efeito de proxirnidade' essa ciração excessi-va de pubimcaçoes recenrcs. Sugermu que esse efcmro scria rnedido de rnodio rnuiro Si npies dererniinando-se a proporçfio total de referencias nuni cam-p0 dado que se relacionasse coin a lirerarura publicada nos cinco anos ante-notes. Ele dererniinou essa proporçño, a qime Se referiu como 'fndice de Price', para unla sCrie de revisras especializadas. As revistas de ciCncia apresenrarani urn indice de 60-70%, o indice das revisras de ciCncia social

Page 9: a base conceitual da Ciência

62 2. TRAOIcOES DA PESQUISA

EXAMINANDO AS DIFERENçA5 ENTRE MATERIAS 63

loi I O_20% menor, e as revistas de burnanidades chegararn a urn valor ainda sensivelmente inferior.

A interpretacão desses dados foi que o efeito de proximidade indica a existéncia de "ma 'frcnte dc pesquisa' [research front]. As caracteristicas dessa frente de pesquisa relacionam-se, por sua vez, corn a natureza da nformaçao corn que se esteja lidando. Assirn, urna das caracteristicas da inforrnação cientIfica que assinalarnos e sua naturezacumulativa. Acumula-çãø, neste sentido, no quer dizer que as inforrnaçOes simplesmente se amontoarn. Quer dizer que as inforrnaçOes são sisternaticarnente codifica-das e tbsorviclas. Conio resultado desse processo, vs ci'entistas erngeraI precisam, ao realizar seus prOprios estudos, estar cienres apenas cbs iraha-Ihos recentes. Ao contrário, as informacOes nas ciéncias sociais corn Ire-quencia são menos facilniente coclificadas, dc modo que a literatura antiga continua sendo mencionada. As humanidades constituern inn caso especial, pois a literatura amiga representa para elas muitas vexes a matéria-prima de suas investigaçOes. Corno observarnos, certas caracterIsticas cientO,des', inclusive a maneira corno as inforrnaçOes se acumulain, surgern não apeflaS ,ias ciências: podem 5cr tanibern percebida.s em alguns ripos de pesqulsa wino nas ciéncias sociais quanto nas humanidades. Existe, por conseguinte, certa dispersão do indice de Price no nivel de deterniinadas especialiclades.

A existéncia de uma frente de pesquisa implica que ha urna fine !igação de citaçOes entre publicaçOes recentes em virtude de a comuniclade de pes-quisaestar procurando compreender e assirnilar as resultados que elas con-tern. A medida que o tempo passa e isso acontece, as publicaçoes antigas são relegadas para o arquivo geral das pesquisas reconhecidas e por isso serão citadas corn menos frequëncia. 0 prOprio Price calculou que urn artigo da frente de pesquisa seria citado por outros artigos urn pouco menos de duas vexes por ano, enquanto urn artigo do ard1uivo seria citado apenas ulna vex a cada dois anos. Ele tentou ilustrar esses argumentos relativos a frente de pesquisa realizando urn estudo detalbado de publicacOes sobre as raios N.

Esses raios loran, 'descohertos' no inicio do seculo xx: o nome raios n foi

calcado nos j5 conhecidos raios x. Os nov05 raios despertararn inteiisO inte-resse durante breve perfodo de tempo. Então tornou-se evidente que a de-tecção desses raios havia sido esp(iria e o tema lot relegado ao esqueci-rnento. Em decorrCncia disso, umas duas centenas de artigos sobre raios N

loran, publicados e passararn a formar urn pequeno hloco, isolado da litera-tura cienrifica. Price estava convencido de que sua análise dessas publica-çâes mostrava claraniente como funcionava uma 'frente de pesquisa'. Estu-do posterior laiiçou düvida sobre isso! 9 Urna razão, curiosarnente, esta na maneira diferente corno as pesquisadores então se comunicavam em corn-paração corn agora. No entanto, o conceito de ulna 'frence de pesquisa' con-tinua sendo uma maneira ütil de cogitar sobre o efeito de proximidade.

Corno seria natural, ocorrern a cada ano oscilaçoes estatfsticas de aiguns pontos percentuais no indice de Price para deterrninada matdria. Tambdrn podern ocorrer alteraçOes sistemáticas, mais especialmente quando urn assunto soire urna ruptura importance on atravessa urn perfocbo de contra-vdrsia. Par exeniplo, quando uma especialidade da psicologia passou par importante mudança, constatou-se que o indice de Price aurnentara consi-deraveirnente. Assirn C1Ue a mudança foi absorvida pela cornunidade, o mndi-cc voltou a cair. 3° Parece haver aqui dois fatores em jogo. Urn é a nivel inaior de integraçfio entre pesquisadores durante urn perfoda de intensos debates.

:Qoutro.d.anexisténcia de literatura anterior Dara 5cr citada quando ocor-rerain alteraçôes irnportantes no modelo aceito de pesquisa. Esse ülrimo fator torna-se evidenre quando urn novo tcnia dc pesquisa surge de modo abrupto. Por exempbo, as pulsates forarn detectados de forma totalniente inesperada pebos astrOnornos. Corno havia então pouco material perrinen-re, a bibliografia inicial sabre pulsares continha uma grande parcela de refe-rCncias cruzadas entrc as arrigos que erarn publicados. Por isso, essa area,

.naquele momenta, apresentava urn indice de Price muito elevado, masque foi posteriormente dirninuindo a niedida que a pesquisa sobre pulsares am-pliava seu alcance. Tambérn é possivel haver tendCncias de bongo prazo. Por exemplo, urna coinparação das referCncias apensas a artigos publicados em revistas inglesas tie fisiobogia e geobogia no final do sdcubo XIX e na década de 1960 sugere que o indice de Price aurnentou em arnbas as matérias ao longo do periodo. A diferença do indice entre as duas matérias permaneceu iguab durante esse pesiodo, refletindo a diferença essencial de sua natureza. Uma ciéncia haseada in ohservaçao, coma a geologia, senipre precisa re-portar-se a materiat antigo, rnais do qime urna cmëncia experimental, coma a fisiotogia. A reudéncia mi plica, porém, que o nivel de integração da Irente de pesquisa tornou-se mais firme, para arnbas, corn o passar do tempo.

O efeito de proxiniidade n5o constitui o ünico rneio para se exarninar o grau de integraçäa das marérias. Outro método consiste em investigar dbire-taniente o grau de vinculaçao entre artigos que traram do mesmo assunto. 0 mécodo niais tmsado tarnbém emnprega as referCncias apensas ao final de cada arrigo. Vimos dizendo que as citaçOes refletem conio a pesquisa sobre urn tema se relaciona corn trabaihos anueriores. Se isso for verdade, dois artigos escritos sobre precisamente o mesmo tópico deverão provaveirnente exaniinar 0 niesnio conjunto die pesquisas anteriores. Por isso, deveriamu citar quase a mnesnia bibliografia. E possivel, na reabidade, constatar essa coincidéncia. I-hi alguns aims, a revista Nature recebeu, sirnubraneamente, mas de modo independente, dois originais para avaliaçao (urn dos Esrados Unidos e outro do Reino Unido) sobre urn tema identico: a identificaçao de certos organismos veiculados pebo ar. 0 editor da Nature cornentou:

o incidenre pode rambéni i nieressa r aos especialistas em literarura cientIlica,

Page 10: a base conceitual da Ciência

64 2. TRADIçOES DA PESQULSA

EXAMINANDO As DIEE1SENçAS ENTRE MATERIAS 65

particularmeute aos que gostam de, cinicamente, afirniar que 90% de qualquer lista de referencias destinarn-se a exibir a erudiçfio do autor e tho os anteceden-tes de sen artigo. Sete das oito referéncias cle amlios [us autores] são idénticas. 3

A existéncia de urna coincidéncia sugere urna maneira diferente de exa-rninar as divisOes entre as especialidades. Sc essas clivisOes foreni reais, as citaçOes constantes de publicaçOes dentro de determinada especialidade deverflo provavelmente coinciclir niais entre si do que corn as citaçOes de artigos dedicados a outras especialidades. Seth possivel exarninar essa coin-cidéncia de rnodo estatisticarnente vidvel?

0 Irhtute for Scientific Information, de Filaclélfia (EuA), vem conipi-

lando indices informatizados de citaçOes desde a década de 1960. (Urn

'indice de citaçôes' e urna lista de artigos citados junto coin os artigos que os citararn.) Embora o foco original de interesse fosse ciéncia, medicina e tecnologia, sua cobertura posteriormerite Sc amplion, incluindo ciéncias so-

ciais e humanidades. Vários niilhares de periodicos - a lista é atualizada regularmente - são exarninados todo aim a fini de alimentar essa base de dados. Todos os dados das ciraçOes são armazenados em formato digital: a

cobertura amal é não so atnpla, rnas tambérn proporciona urna VisãO retros-pectiva c1ue abrange urn longo perlodo. Naturalniente, esse material oferece • ensejo de ser feito urn rninuciosc} estudo sobre coincidéncia de citaçOes.

Apesar do exemplo dc Nature, yen fica-se que norrnalmente d pequerio

• grau de coincidéncia entre as citaçOes de diferentes artigos dc periOdicos,

sobretudo porque d ran) tratareni de assuntos absol ilL niente idénricos. Por

conseguinte, a Iigação entre dois artigos paasou a ser definida de maneira niui to n ais genérica. En, gem] é definicla can ftinção cia quanmiclade de vexes que determinado par de artigos são citados juntos nas listas de releréncias

apensas a Outros artigOs. 0 argtitnentO 6 (Inc qiianto n,aior für a Ircquêiicia

Coin qtie OS pesquisadores associani esses dois artigos en, seus trabaihos,

major seth a probabilidade de que digarn respeito aO rncsinU assuato. Urn

estudo dessas co-citaçOes deve, portanto, rnostrar se as cimaçOcs podem 5cr usadas para constatar a exisméncia de grupos de armigos de periOdicos, em cite cada aglomerado nefere-se a urn assunto especiuico.

Quando o exercfcio é levado a cabo, produx, de fato, urn efeito percep-

tivel de agrupamento, ao iiivés de UIii Un' forme oceano de co-ciracOes. 0 agruparnento é normairnente hierárquieo. Algumas co-cimaçOes ligarn arti-gos sob ic a in terna de pescitlisa especifico, porérn outras os ii gaul a grupos rnaiores e assim por dianme ate toda urna disciplina. Pot exemplo, artigos clue tratani de certo tipo de espectroscOpia podeni ligar-se forteniente. Em outro nivel, esse grilpo pode ligar-se coni outros arrigos que tratan, do estudo de plasnias. E ainda em outro five1, os estudos sobre plasnias podeni ligar-se a grupos que cobreni tin' vasto leixe dc pesquisas de fisica. E pos-

nycl compilar mapas dc co-cstaçOes de ciCncia, que mostrern Os agrupa-

nientos que se forniani para ligaçöes de diferentes intensidades. Os mapas para a ciéilcia corno urn todo mostram, em gera!, neste easo, urn agrupa-mejito de fisica que tern ligaçOes corn outros agruparnentos disciplinares, principalmente cOni a niateniãtica e a qufniica, pOrCni, apesar disso, per-manece incon lull divel.

Esse rnapearnento de campos do conhecimento tern sido objeto de mui-tas crfticas. Un, prohierna, em particular, C que os resultados pocleni depen-der, de niodo bastante cnitico, das instruçOes fornecidas ao computador para a ordeoaçao dos claclos. Apesar disso, não ha duvida de que podem scm istinguidorSIgunsgnipos, que manérn razoável estahilidade de urn aao

para outro. Muitos deles podern estar reiacionados corn os modelos men-tais que os pesquisadores ten, de seu mundo. Por exernplo, os acadCrnicos tenden, a s'er uma conexão entre todas as disciplinas que lidarn coni a vida e, portanto, em geral juntani em suas mentes as ciCncias biolOgicas e sociais. Essa conexão tamhCm aparece em mapas de co-citaçdo, rnas estes propor-cionam n,ais inforniaçOes sobre a liatllreza da ligação, ao niostrar que cia

- ocorre mecliante certos tOpicos, corno classificação ou niCtodos de anãlise e interpretaçao de dados. Os mapas contribuern pim apontar a uifltiCncia que urna area tenidmica pode exercem sobre outra - pot exemplo, pesquisa hioinCdica em c1tiimica - assim cliamanclo atenção para arividacles Intel clis-ciplinares, que abrem caminho nas divisOes convencionais.

As investigaçOes sobre similaridades podem empregar quase qualquer caracterIstica distintiva dos arligos dc periddicos - nome do autor, titulo do armigo afillação institucional, etc. - ao fazerern as buscas dos agru-parnentos. A anOlise de conteüdo C particularmente i.nteressante, pois 0

texto de urn artigo contCrn muito mais inforniaçoes do que suas referCncias. 0 argurnento, neste caso, C que os antigos que tratani do rnesrno assunto terao yãrias palavras-chave eni coniuni. Assin,, se dois artigos de quirnica referirein-se aos niesnios coin p05105 quilnicos e aos niesinos U pos de instru-menração, parece razodvel supor que abrangern uma area de interesse coin-cidente. Metodologias semeihantes as utihzadas eni anOlise de co-ciiaçOes 1,nden, scm adomadas na andlise de pa!avnas co-oconrentes. 0 esrudo de pala-vras oferece algunias vaittagens ciii comparaçao cOni 0 esttido tie citaçCes. Pode, por exemplo, scm aplicado a qualquer mipo de clocuniento: livros e relatOrios, bem coino artigos de periOdicos. E possivel tambeni escoiher palavras qLie procumeni cliferentes tipos die senielhanças eiitre Os artigos: nao sO se o oh em da invesugação Co rnesmo, masse estão senc!o aplicados enfo-ques conceimuais sinii lames ou mCmodos sirnilares tie anãlisc. l'or exemplo, am esmudo de biomecnoiogia feimo con, análise de co-ocorréncia de palavmas verilicou 5cr possivel discemnir diferentes elifoques de pesquisa entre mu-vemsidades, instituiçOes governanienmais de pesquisa e a indósmria.

Embora os estudos de palavras co-ocorrentes possani assim scm usaclus

Page 11: a base conceitual da Ciência

66 2. TMDIçOE5 FM PESQUISA DIFEKENcA5 ENThEt MATERIAS 0 COMUNIcAçAO 67

corn propOsitos dilerentes dos estudos de co-citação, anihos demonstraru a capacidade tie separar t.enias de pesquisa numa série de agruparnentos. Em que medida esses agrupamencos coincidem corn as fronteiras traçadas pelos especialistas da area? Dc modo mais especifico, ate ondc os mapas rnentais percebidos pelos especialistas coincidem corn os mapas bibliornétricos? Na realidade, isso é muito difIcil de detcrniinar. Nao so os especialistas em geral desconsiderarn os gnspos obridos por meios bibliornCtricos (classifi-cando os agruparnentos como Obvios ou errados), mas rendem a achar que os gráficos uniditnensionais ou bidimensionais empregados para apresen-tar os-resnlxddostibliomCtricos não casani tnwro bern cornseus prOprios rnapas menials da ciéncia. Outro problerna e que as respostas dadas pelos especialistas podem variar segundo seus interesses e sua formaçao. Portan-to, para se obter urn rnapa da cornunidade seth preciso obter a media de inürneras respostas individuais. Dc modo bastante parecido, diferentes auá-uses bibliométricas podein produzir inapas bern diferentes de determinado terna. 0 resulraclo global é que urn conjunto urn tanto indistinto de opiniOes de especialistas tern de sec superposto a urn conjunto urn ranto inclisrinto de rnapas bibliornCtricos. Quando isso C feitc, parece que os rnapas meutais e os mapas bibliornCrricos de law Se parecern uns corn os outros em funçao (IC

suas caracteristicas principals, mas 'lao (o que é natural) em set's detalhes. 3 -'

Dilerenças ernie matCrias e con -sunicaçño

Parece que as principals divisöes (10 conhecimento, corno as que sOo

tradiciorialmente rraçadas entre as clOncias, ciências socials e humanidades, correspondein a algo real, ainda qsie indisrinto. lrnplicarn diferenças naqui-lo que C visto comb atividade de pesquisa aceitável em cacla cainpo e, do rnesrno modo, 110 que é visto conlo infornlaçao cientifica aceit$vel e sua coniunicação. Isso sugere que as difercnças entre matCrias devem set cvi-dentes no que tange a niuitos aspectos distintos da infornlação 00 coinuni-cação cienillica. Examinarnos em seguida alguns exemplos disso (os fatores em jogo são examinados mais detidaniente em capitulos posterlores). Para corneçar, a tabela 6 compara algunlas this caracreristicas dos artigos de periOdicos publicados em algumas niat6rias. 34

Observarnos an tes q Lie urn enfoq ire a I ta non te q nantita tIVO constitul U ill

dos sinalizadores da fronteira que em geral C traçada eiltre as ciencias natu-rais e as ciCncias socials. A prirneira colwla da tahela 6 indica irma rendCncia na direção esperada (corn a psicologia, como sempre, na linha divisoria), embora a di ferença ernie econonhia e sociologia sop tño grailde quanto a difereiiça en, re bioqufmica c ecoihoillia. As duas colunas seguhihteS IiiOstraihh coma os enfoques adotados por dilerenres matCrias afetarn a forma conio as niformaçoes siio apresentadas 10 artigo. As tabelas podern ser emprega-

Tabela 6 Caracteristicas dos artigos de periódicos per matéria

c:onteni Incluem lncliie,n Consignanh anal se tabelas gráfi cos Ii nan ci amen to

Matéria quanti tativa (%) (%) exterun (Wo)

Bioquimica 98,1 73,5 91,0 74,2 Psicologia 75,1 70,7 41,5 43,4 Economia 72,1 46,8 39,6 34,3 Sociologia 52,6 65,0 22,6 27,0

das pain mostrar inforrnaçOes quantitativas Ou qualitativas: assi.m, seu cm-prego não usostra nenhuma tendCncia especifica. Os bioquiniicos precisam tanto de gráficos, para veicular dados uunhCricos, quanto de figuras (de arnostras, etc.). TambCrn C norãvel a difereuça Ciltre a bioquinhica e as Outras disciplinas em termos de grdficos.

A Oltirna coluna funciona corno urn lernbrete de que a produçao de pes-quisa custa dinheiro. A pesquisa cientifica exige geralniente nlais apoio fi-nanceiro do que a pesquisa em clérhcias sociass, que, por sua vex, requer rnais recursos do que a pesquisa em humanidades. Essas diferetsças de finan-ciamento podern afetar a coniunicação das pesquisas. Urn simples exernplo refere-se ao pagamento pela puhlicaçflo de artigos. Alguns dos periódicos cientfficos norte-americanos importantes adotarani o sistema do solicitar aos autores que paguem deterrninada quantia destinada a cobrk o custo da puhlicaqao de seus artigos. Supoe-se que esse pagamento (em geral cobrado em terrnos de tantos dOlares por pógina impressa) snirã do financiamento que os cicntistas recehem para levar avante suas pesquisas. Dilicilmenre es-qtiema senielliarite poderia 5cr imposro nas ciCncias sociais e humanidades, pois nelas os frnanciamenros nño sO sao nlcnores, conlo tanibCni C nienor o nümnero do pesquisadores que a des léni acesso. Urn exclnplo nlais expres-sivo concerne 5 exrensão da publicaçao. Nao C raro o Orgão financiador inipor restriçôes sobre conio e quando os resulrados da pesqinsa seriho tor-nados pOblicos. Isso C coniuni en algumas Sreas da ciCncia (por exemplo, pesquisas financiadas pela indtisrria farniacCutica ou por Orgãos niilirnres), nias C nienos ireqüente nas ciCncias sociais, sendo rara nas huinanidades.

A tabela 7 chania arençflo para outro aspecto da divisflo carte as ciCncias, ciéucias sociais e humanidades: o nivel de atividade cooperariva dencro do uma disciplina. 35 Em rermos de cornunrcaço, urn reflexo do nivel de co-operacAo é a proporção de arrigos quo conram coin mais de urn auror. A co-operaçiio pode assuinir várias forruas. Torna-se necessiiria, por exeniplo, so a pesquisa exigir unla diversidade de talentos. lambern so o orierirador esti-ver trahaihando em dererniinaclo projero junto corn urn grupo de estudan-

Page 12: a base conceitual da Ciência

68 2. TRADIçOES DA PESQUISA DIFERENcAS ENTRE MAIERIAS E coMuNrcAçAo 69

TaI,cla 7 Niiuiero de autorrs pot artigo

Urn Dais Tres Quatw

Maréria autor (%) autores (%) aurores CEo) ou mais (%)

Bioquimica 19 46 22 13

Psicologia 45 36 15 4

Econornia 83 16 1 -

Sociologia 75 21 3 1

tes de cloutorado. Qua!quer cjue seja o mecanislnoern jogo, a necessidade de cooperacño e as mejos para alcangá-la são eon geral maiores 13 ciéncia do

que Has ciências sociais, e rnaiores nas cséncias socials do que Has huniani-dades. Dc fato, urna vez que o trahalbo em equipe exige major financia-mento do que o trabalbo de uma só pessoa, é natural ver urna corre!ação entre as dados da tabela 7 e a coluna final do tabela 6.

lJni dos fatores importantes na divulgaçao das pesqulsas e, obviarnente,

a extensão corn que Os resultados são efet,varncnte tornados püblicos. A re-grageral é que a publicacño é mais facil nas ciências, mais dificil nas ciéncias sociais e ainda nials dificil nas burnanidades. 36 As taxas reais de recusa de originals vaflarn sensiveirnente segundo as periódicos escoihidos Para en-me, mas essa sequéncia de grau de diuiculdade permanece relativaiiiente es-tável. Entram em jogo aqui várias forças, nias urna, certainente, Co nivel de consenso sobre o qtie constltui unla pesquisa aceitãvel. Confornie vinios, näo se trata de urn cisma exclusivarnente disciplinar: ha tenias Has clencias sociais e huinanidades eli) que C razoavelmente boa a concordãncia a respei-to de conio se deve lidar corn a pesquisa. Para ternas que se enquadrain nessa categoria (por exeniplo, liiiguLstica), as Laxas de recusa de arrigos pelos periOdicos aproxirnarn-se da cléncia que estã na OlItra ponta do espeCtro. 0mw fator relaciona-se a padroes —O que os especialistas da area esperani de urn,artigo aceitdvel. Emciência, pOr.exeiiiplO, as artlgos liãO sóapresen-tans urn feirio padronizado, nias tarnbCm Un) enfoque geralrneiite seilie-Ihante. Os editores e avaliadores de originais consideram norrnalniente seu trabailso corno sendo o exame de artigos submetidos pata puhlicacflo coIl) a finalidade de verificar se existe algo de errado neles. Nas hurnanidades, Os

artigos podern diferir de Ieição e revelar urria variedade de opiniOcs acerca daquilo que consntui pescjuisa apropriada. Os editores e avaliadores tern menUs interesse em ficar procurando coisas que estejarn erradas, e estão niais preocupados Con) avanços cnativos. Dito dessa fornia, fica Illais COIlS-

preensivel porque as taxas dc reCtisa são muito niaiOres Ha ninioria das dreas

das liumanidades do que na major pane da ciCncia. Outro lator adicional é a disponibilidade de reCursos. A publicação de

revist:Ls Coilsonie dinheiro. (TarnhCrn exige tempo, mas, desde que baja fi-

nanciarnentosuficiente, serd passive] pagar por niao-dc-obraespeciahzada.) Coinunidades de pesquisa que controlani vultosos recorsos financeiros constatani 5cr muito nais fácil apolar varios periddicos do que aquelas que dispOenl de pouco finanCiarnento. Isso qucr direr que os cientistas contam corn mais opçOes de periódicos para a publicação de seus trabaihos do que seus colegas das hurnanidades. Deste ponto de vista, as taxas de recosa em diferentes mater,as tern como base consideraçOes de ordem econCmica: as artigossão selecionados para publicaçflo, do total de recebidos, COin base no espaço que pode ser destinado a niateria.

4ssomos traz a questflo da publicagao de pesquisas por rneio de nieca-nismos diferentes do periódico. Em todas as marCrias as artigos de perid-dicos são urn dos dpos n'ais cornuns de publicaçEo de pesquisas, o que não significa, porCni, que sejarn semprc classificados CornO 0 tipo tnais impor-tantc de publicaçno. Pode-se ter urna idCia nlais Clara disso examinando as referencias apensas as publicaçOes. A tahela 8 compara a amplitude da dis-tribuição de ciraçOes encontrada nas ciCncias coni a das ciCncias sociais. -" Naturairnente, as periódicos cons tmiern a rnais importante fonte de infor-rnaçño Has clCncias, Inns 5O suplantados pelos livros nas ciCncias sociais. Estudos sobre as hunianiclades indicarn mirna seqiiCncia sirni jar is das ciCncias sociais (enibora 'outras fontes de informaçfio' apresentem rnaior probabili-dade de incluir ediçoes crfticas, etc., do que relatdrios).

Essas constatagôes podem ser interpretadas em funçao das diferentes pressôes en) jogo. No que lange no conreñdo, a natlireza da pesqoisa em ciCncias sociais e hurnanidades eta] que sua apresertaçflo en) geral acarreta consideraçOes nlais extensas do que nas ciencias, quando se reuneni dados de unia sCrie de trabalbos de uni projeto. Isso cm geral C dificil ou irnpossf-vel de realizar rnediante ulna sCrie de artigos de periódicos. An niesino tem-po, a velocidade de piihlicação dos permódicos nessas isreas C em geral lenta: a produçao de urn jivro niso necessariarnente dernorará muito rnais. Do ponto de vista ecoflôrnico, 05 liVtOs podeni scm vi;iveis, rnas n 7io unia sCrie de artigos. Todos esses fatores podeni sofrer alteraçiso coin o passar do tem-po, hem corno de urna rnatCria pam outra. Uina das publicaçoes cientificas mais insportantes do sCculo xix - A origern des espdcies, de Darwin - foi editada em forma de livto porque o atitor queria desenvolver suas idCias porrnenorizadarnente. Isso foi economicarnente viisvel porque a narrativa de Darwin, 30 contrário da rnaioria dos textos cientificos de hoje en) dia, expressava-se em linguagein qile niso desencorajava urn publico am plo.

Coniunicaçiso corn urn publico inaior

Essa questão da amplitude do pdblico leitor C outro ponto que revela a exisrCncia de diferenças caracterisricas entre as niarérias. A maheja 9 mostra

Page 13: a base conceitual da Ciência

70 2. -riDicOES DA PESQUISA

coMuNrcAçso COM UM PUBUCO MAIOR 71

IaIwia 8

Distribuiçno cit citaçôes de Lipos diferenres de publicaçAo na ciOncia c nas ciências soda's

Tipo cit pubiicaçlo Ciênc,a (%) Ciências soc,a,s (%)

Periódicos 82 29

i.ivros 12 46

Ourros (principaimeniic reiarorios) 6 25

alguns resultados Ut urn estudo holandés que examinou quantas publica-

çôes qué visavam ao grande püblico, ao inves decdlegaspesquisaclores,

haviam sido produzidas por diversos departarnenros de universidades. 3 '

(Os resultados apresentados referem-se ao máxlrnO ericOiltraclO para deter-

minado tipo Ut departamento.) Essas diferencas poclem estar relacionadas

corn a pergunra: quais as caracrerfsricas de urn tema de pesquisa que o fazem

ntais on menos adequado Para ser comunicado ao grancle pühlico?

Pode-se encontrar unsa prirneira resposta examinando-se que tipo de

pesquisa e citado preferencialniente nos rneios de comunicacão de massa. Os repOrtercs e produtores do inidia preocupain-se pri])cipalrntlitC Coil)

tern-as que possam ser considerados jornalfsticos'. Esses temas apresentam

várias caractc-rfsticas. Em prinieiro lugar, urn acontecimento, para 5cr ticlo

COillo inlportante, deve ter ocorrido recentenlente ou, mellior aincia, estar para acontecer. Em segundo lugar, deve, de alguni mudo, ter alguiiia perti-

nencia para a vida normal das pessoas. Finalmente, deve ter urn elernento de

distraçao.Nao e preciso que todos os acontecirnentos jornalisticos conte-nham todos os trés clernentos em quantidades lguaiS. Em relatos de pes-

quisas, o üitimo elernento tende a sersuavizado; embora qualquem pesqulsa-

dor qite alegar bayer definido 0 sensO de humor, on mosuado que a astrolo-

gia é verdadeira, quase certamente virarñ noticia.

Como esses exemplos sugereni, as prioridades da midia ao noticiar pes-

quisas diIereni em niuito cbs priom,dades da cornunidade cientifica. Isso ale-

ta a extensão co'ii que difementes temas são noticiados no rnfdia. A tabela 10

compara 0 espaço cledicado a diversos ramos da ciêndia null) jomnal diário

'de qualidade' durante urn ano. 39 Essas proporcOes guardarn pouca Sense-

lliança Corn a c1uantidade relativa Ut resultados de pesqwsas cjue estão sendo

puhlicados. A quitnica, por exemplo, 3 urn dos principals produtores Ut

artigos de pesquisa rias ciencias, no entanto é ramamente nienciunada no

jamal. Urn estudo sobre o contedo tie revistas de divulgação cientifica

coniparoti a cobertura ternática con] a populacao de pesc1uisadores (ineclida

pelo numero de cioutores que estavain sendo produzidos em cada ñrea). A

qu fin ca, ma is uma vez, esteve mui to aquéni das cx pectativas, enquanto a

astronomia (inclusive a ciOncia espacial) obteve urn valor major do que o

tamanho da populaçao de pesquLsadores de astronomia poderia sugerir. 4 '

Tabela 9 Proporção maxima cit pubhcaçOes voitadas para o grande póhiico prodozidas

par departamentos de universidacles holaadesas

Matéria i'roporçao maxima de publicaçOes de 'divuigaçao' (%)

Linguistica 8,5 Psicologia experimental 10,4 HistOria social 33,0 Literatura liol :u,desa 43,0

Tabeia 10 Espaço relatjvo dcdicado a diferentes teEns, cienrificos film jamal di:irjo

Tenia Espaço dedicado so renla (%)

Biomedicina 48 Tccnoiogia 30 Asrmo,ioinia/ciência espacial 17 Geocieticias 3 Quimita I Fisica 1

Essas diferenças não sub dificeis de conipreender em função das priori-dades da mfdia anreriormente esboçadas. Grande pane da pesquisa cm

c1urnica não pode scm facilmenre relacionada corn interesses Ilumanos lIne-

diaros. Para compreender suairnpomtancia é preciso uma ampla base teórica

e prática. Por isso, talvez seja dificil identificar e interpretar avanços impor-

tantes. Compare-se isso corn a pesquisa em botunica on zoologia. Ainda que

a pesquisa possa scm igualmente coniplexa, Os menibros do pühlico acham -. ma's filcil relactonar-se com os objetos Ut eswdo e se inreressar pelo resul-

taclo da pesquisa. Do ponto de vista da midia, de iato, as Ciéfldi:is situarn-se

nos dois grupos 'llencionilclos anreriornlenre: 0 cbs dléliCias experinleutais

codas ciéndias cit ohservaçao. Os lahoratdrios iião fazem pane da vida con-

diana da maiona clas pessoas. Ciéncias, cotno a fisica ou a qufmica, qite

dependem p ri ncipa Irnenre Ut cx pe ri men nos de lahoratOrio, tern, portan to,

muito pouco a vet- don] a major pane cia vivendia llnitilana. Em domparaçfio,

dlélidias corno astronomia, geologia e a porte de 'liisrória natural' cia botfl-

- nica e da zoologia estão voltadas para a observaçao de coisas qIle fazern

porte do ambiente humano. Por conseguinte, estas iltimas diéncias tendem

a esrar excesslvamente represenmadas no que range a sita produção de pes-quisas. As ciéncias de obsemvaçao tamb6ni são en] geral mais fotogenicas do

que as cléndtas experamentais, a que é uma vantagem no caso de noticias

cientificas transniitidas pela televisão. Assim, a astrononiia Ca ciéncia espa-

c,al, emiadoras de niuitas iniagens grdficas empolgantes rias dltinias décaclas,

Page 14: a base conceitual da Ciência

72 2. iiDicOES DA PESQUISA coMuNicAcAo COM uM PiiflLiCo MAIOR 73

são ainda muito mais representadas na televisao do que nos jornais. Aprin-cipal exceção é a pesquisa biomédica, que, mesmo sendo de laboratdrio, ainda e amplamente noticiada (corno mostra a tahela 10). Al os fatores ne-gativos são compensados por sua grande irnportância para a vida hurnana.

As niesmas prioridades da midia rambém se aplicam, naturalmenre, a pesquisa 'las ciéncias sociais e humanidades. Seria natural que essas disci-plinas fosseni comparativamente niais beneficiadas pot mis prioriclades d0 que as ciéiscias. A arqueologia, por exemplo, preocupa-se corn inatdrias que dizem respeito tanto a vida huniana quanto ao meio arnhiente em que vive-mos. Nto e preciso ter muiros conhecinientospara compreender aimper-tflncia de novas descohertas. As escavaçöes arqueolOgicas e os artefatos en-contrados são corn frequência interessantes do ponto de vista da irnagern grdfica. Assirn, a arqueologia e noticiada pela nildia corn inais freqüéncia do que seria natural tendo em vista o volume de pesquisas arqueologicas pro-duzidas. Mas entrain em jogo algumas influéncias em sentido oposto. A natureza da pesqrnsa nessas disciplinas significa que as 'rupturas' são menos facilmente identificaveis do que nas ciéncias. Akin disso, a crescente im-portância atribuida as pesquisas sobre teorias abstratas afastou do grande püblico algumas partes dessas disciplinas.

A apresentacão püblica de pesquisas em humanidades suscita urn eiiigma intrigante. Nuni amplo leque de temas das humanidades, o interesse da midia concentra-se principalmente no objeto de estudo e não na prOpria pesquisa. Pot exemplo, urn prograrna de televisão pode set rodo dc dedi-cado a nina pinrura. A anãlise dessa pintura baseia-se em gerat din Várias pesquisas, mas e o quadro e sen pintor que dominam 0 progrania. Talvez nAo fique absolutamente evidente para o telespectador quanta pesquisa está por trãs daquela auãlise. Do mesmo modo, a produçao de will peça para a televisno talvez Sc apoic em niuitos anos de pesquisas, inas estas normal-merge 'lao serão obvias para o püblico. Mesnio quando a misnira de pes-quisa e produçao houver sido especialmelite extensa - por exemplo, no estudo e restauração de partituras, tecnicas musicais e instrurnentos empre-gados em niüsicaantiga -, o elemento de pesquisa pode 5cr facilmeute ignorado. 0 prohlema agrava-se em algumas areas (las hunianidades, onde a tinha divisdria entre pesqtusar sobre urn objeto e criar urn objeto pode tor-nar-se indistinta. Urn exernpto obvio nos é dado por meinbros do corpo docente de departamentos de literatura inglesa de universidades, que escre-vent romances, que podem ser transforniados em programas de relcvisão. Esses roiliances e prograrnas de celevisão podem, por sua vez, toriiar-sc oh-jeto de estuclos cientfuicos.

As prioridades de noticias da midia não niudani grandeniente coin o tempo, mas a cohettura de detenninados tOpicos, Mm. Urn dos motivos estã na mudançii da natureza da pesquisa, tornanclo-a iia, on nienos, atrativa

para 0 piibhco em geral. Assim, no inicio do seculo xx, havia relativamente mais noticias de pesquisas qufmicas porque cram vistas como tendo inipor-tflncia mais imediata para it vida humana. Ocorreram tambdm flutuaçoes na atração mais ampla exetcida pelos temas de ciéncia social e humanidades. A crItica literária nos dd urn exeinplo:

ate o advenro da Nuva Critica notte-aniericana e inglesa a trahaiho do critico consistia em fazer utna apreciação da obra tanto para o publico din geral quaiito para us outtos ctiricos. A critica funcionalista provoca uma ruptura extrcma-merge pronunciada entrc a comunidade de criticos e a pühlico em geraI. 1

Outro motivo Obvio para as variaçOes de coberttira deve-se a impor-tames niudanças nas quantidades comparadas das pesquisas em curso. Por exemplo, as notfcias na rnidia sobre pesquisa espacial cresceram de virtual-meme zero no inicio da década de 1950 ate alcançar o pico por volta de 1970 coin a prinieira descida do homem na Lua. Depois disso, diminuiram corn os cortes no programa espacial norre-americano. A rabela ii conipara a cobertura de asrronoinia e ciência espacial em dois jornais diãrios ingleses,

- em duas épocas, separadas nina da outra por urn perfodo de 15 anos. 41 Naturalinente, a medicina tomou o lugar da astrononna e da ciência espa-cia] durante esse perfodo coma foco de atenção da nifclia.

Unia via niais direta pela qual a pesquisa pode alcançar urn pdblico maior C aquela em quc os próprios pesquisadores são os apresentadores. As duas maneiras principais de conseguir isso são on por nieio de colaboração coin artigos em revistas popubres on escrevendo livros de nivel adequado, embora haja alguns pesquisadores que tambCm Se apresentani no radio on na relevisão. Existeni aqui, tambCm, diferenças entre as disciplinas. Em his-tdria, por exemplo, muitos livros que apresentam os resultados de pes-quisas especializadas são redigidos de tat forma que sen conteüdo e acessivel a não-especialistas. Neste caso, o texto especializado e stia popularizaçao

- são a mesma coisa Em outras areas das hunianidades—critica literñria, por exemplo—a teoria e a linguagem especializada de muitos livros de pescluisa podeni atualmente 5cr excessivas para o leitor leigo. An niesmo tempo, talvez não baja inuito mercado para versôes populares de teoria literaria. 0 leitor rnedio fica, portanto, corn os poucos titulos especializados nessc campo que sejam suficienteniente faceis de conipreender para sereni lidos. A ciCncia, de novo, C dilerenre. A pesquisa cientifica em geral aparece em periddicos, de niodo que qualquer tivro destinado a urn pühlico maior precisa ser redigido especialmente para tal fim. lsso pode 5cr feito pe]os prOprios pesquisadores, nias muitos rextos de divulgaçao cientifica são escritos por nau-pesquisadores, como, por exemplo, pessoas corn qualili-caçOes cienrificas que escreveni na midia sobre os progressos cientificos. Essas diferenças enue disciplinas quanto a forma como sc relaciona a pesquisactor corn o piibtico cm geral podem ret atgo a vet coin as distinçOes

Page 15: a base conceitual da Ciência

sr'

'-a 74 2. TILAOIçOES DA I'ESQIJISA

TECNOLOCIA DA INI0RMAçA0 E DIFERENAS [1NIRI1 MATERIAS 75

Tabela Li Conipar ação do nil 'nero dc arti gos ded icaclos as, ratio' In tilci lad a esp ic i a I

e niedicina em duas êpocas

Jornal Area 1974-1975 1989-1990

The Times Medicina 86 183

AstrotiorniWc,lneia espadial 69 68

Guardia,' Medicina 22 125

Astronornialciência espacial 26 34

feitas antes neste capItnlo— por exernplo, entre pesquisa 'rfgida' e pesquisa 'flexivel' - eh qoestão da especiaiizaçao C profisssonalizacflo no prinlwro capitn!o. Mudanças nas duas üirimas significam cjoe as diferenças entre ma-térias, no que Lange a maneira como a pesquisa é apresentada ao grande püblico, se ampliaram corn o passar do tempo. No século xix, era malor do quc Iloje a probahilidade de todos os tipos de pesquisas serern apresentados de forma sirni] ar a Un] publico In LS amplo.

Tecuologia di inforrnaçiio e diferenças entre matdrlas

Os exerilpios das diferenças entre rnatér,as mencionados Ileste CapftLIlO foram, em sna major parte, excrafdos da comuoicaçdo irnpressa. Observa-mos, de passagem, que os critérios para apresentacao ,pübiica podern ser diferentes, como acontece entre os jornais e a reievisão. Serh pie as diferen-ças entre matdrias poderiam, em si mesmas, sofrer aiteraçôes, dependendo do meiO enipregado? Por exeniplo, vinios que os iivros são mais impor-tantes para a pesquisa em bnmanidades do que em ciéncias. Dois dos fate res nisso implicados são o dinheiro e a velocidade de comunicação. Ambos relacionain-se, en] parte, corn o meio. Os hvros e periodicos são Iinanciados de diferentes fornias - c1uer dizer, representam diferentes manei ras de acondicionar materiaL impresso em papel - e a escoiha entre urn C outro depende, en] parte, das fontes de financiamento disponIveis para produção e consnmo. 0 tempo despendido na prodnção e distribnição está, gnat-menre, relacionado CI]] parte as limitaçOes dc manipulação impostas pelo nieio inipresso. Corno unit, alteraçao cia n]eio afetaria fatores clessa espécie

O rapido crescimento das redes de computadores estd começando a faze r cia rear a res posta a essa pergunta. Comece 1)05 exam i nando Ca,]] 0 a passagem para acomllnicação informatizada pode aferar de modo diferenre as comonidacles de pesqoisadiores. A leitura de material impresso exige a aplicaçao de vãrias habilidades (aspecto a ser retomado en] capftulo poste-rior). I-In muitos anos, a educação en] rodos os nfveis tern sido pianejada para ajudar a desersvoiver essas habilictades, que são, subsequenternente,

postas em prática pelas exiglncias da vida cotidiana (por exemplo, a teitura de jornais). An contrãrio, o ampio acesso an computador 56 se tornou pos- sivel em época retativamente recente, e o processamento informatizado da

• informação ainda d urn tema hermdtico para urn odmero aprecidvel de pesquisadores. As diferenças en) materia de aptidoes em informatica encon-tradas na comunidade die pesqnisa são, portanto, muito maiores do que quaisquer cliferenças las habilictades necessarias ao uso de material impres-

• so. Encontrarn-se diferenças qoanro an uso de computadores tanto entre grupos qnanto entre inclivfduos. Por exemplo, Os U5t1flO5 I]iais sagazes ctas redeselerr6nicas são jovens do sexo masculino. As usudrias de quadros de aviso etetrouicos e grupos de discussão simliares talvez se sinrant desenco-rajadas corn isso, principalmente SC nãO foren] especiatistas no nso de corn-putador e redes eierrônicas. Também, 0 iivel de acesso a tecnologia da informação é muitas vezes deterniinado pela capacidade de obtencao do financiamento i]ecessário paris equiparnento, etc. Isso significa que as maté-Has das homanidades tén estado geralmente em desvanragem can compara-ção corn as matdrias cienrificas. Emliora essas diferenças financeiras esrejam sendo gradiaalmente atenuadas, ainda persiste unla diferença do nivel dc capacitação em informática disponIvel pan pesquisadores de diversas materias. Em geral, as pesquisadores das ciéncias dispOeni mais facitniente de assessoramento e assisténcia do que os pesquisadores de liumanidades.

Historicamente, o emprego de computador pelos pesquisadores tern dependido do que etc pode oferecer-lhes Diferentes disciplinas voirararn-

• - se para 0 computador can n1onientos difereutes e coin propósitos diferentes. No começo, as compstadores cram chaniados de 'devoradores' de nt'Ime-ros. Eran], portanto, en]pregados prineipairnente par pesquisadores das ciéncias rfgiclas, enibora us cientistassociacs interessados na analise de grail-des conjunros de dados estatisticos tanibdni os utilizassem. Mais recente-meilte, tornon-se eon, tint 0 processatnellto eficiente dc textos, 0 que am-

- ption 0 emprego regular de computadores em todas as disciplinas. Ainda persistem di ferenças entre os pesquisadores 110 que tat]ge ao Icesso aO C0I]1-

putador, nms silo n]ellOs previsiveis do qne antigamenre. Admire-se, can geral, cine a utiiização regular do compurador para fins de inforniaçflo Cxi-

ge que a acesso a dc seja imediaro, ranto no gahi nete qtlanto no labora-tdrio. Uma pesquisa en] grande escala feita junto a pesquisadores do Reino Unido no inkio da década de 1990 verificou, como seria de Se esperar, que amaioria dos fIsicos e niateillatidos dispOe desse acesso imediaro. 43 E, o que é mais surpreendenre, foram equiparados pelos cientistas sociais qne, it esse respeito, estavan] bern a frente dos biologos, qnfmicos e engenheiros. Isso reflete a alta importancia pe muitos cientistas sociais l]oje atrihuem ii dis-ponihilidade de coniputadores. Mesmo em setores especIficos, 0 emprego da recnologia da inforinação pode variar segundo aqoilo que cia oferece an