a ciência, o ideal científico e a razão instrumental
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Prof. Ms. Felipe Saraiva Nunes de Pinho
felipepinho.com
AULA 4 A CIÊNCIA, O IDEAL CIENTÍFICO
E A RAZÃO INSTRUMENTAL
O que é o Senso Comum?
Ciência e Senso Comum
• O senso comum corresponde aos nosso saberes cotidianos, ao conhecimento passado de geração em geração e que não tem uma comprovação científica;
• O senso comum é um conjunto de crenças, opiniões e saberes aceitos como verdadeiros e compartilhados pelos membros de uma determinada sociedade;
• O conhecimento do senso comum é:• Subjetivo; qualitativo; individualizador;
generalizador; expressa sentimentos de angústia diante do desconhecido; predomina o pensamento fantástico.
O que é a Ciência?
• Do Latim temos o substantivo scientia, que significa “conhecimento” e o verbo scire, que significa “saber”;
• A ciência é o esforço para descobrir e aumentar o conhecimento humano de como a realidade funciona;
• Adota um método objetivo: o método científico;• A ciência é um pensamento sistemático: busca
uma coerência entre os fenômenos, além de relações complexas de causa e efeito.
• Busca descobrir os princípios gerais e universais dos fenômenos observados (teorias, leis, etc.).
O que é Ciência?
• “Em seu sentido amplo e clássico, a ciência é um saber metódico e rigoroso, isto é, um conjunto de conhecimentos adquiridos metodicamente, sistematicamente organizados, e suscetíveis de serem transmitidos por um processo pedagógico de ensino.” (Japiassú; Marcondes. Dicionário Básico de Filosofia, 1996).
• Ela tem por finalidade propor uma explicação racional e objetiva da realidade e estabelecer entre os fenômenos observados relações universais e necessárias. (Japiassú; Marcondes. Dicionário Básico de Filosofia, 1996)
Características do conhecimento científico
• É objetivo;• É quantitativo;• É homogêneo;• É generalizador;• Busca a causalidade;• É emancipador: afirma
que pelo conhecimento o homem pode se libertar dos medos e das superstições;
• Busca renovar-se constantemente.
A Ciência como um pensamento sistemático
• O pensamento sistemático, paradigma emergente das ciências contemporâneas, busca superar o pensamento reducionista/mecanicista do paradigma newtoniano-cartesiano da modernidade;
• Defende que todo fenômeno é composto de inúmeras partes que se inter-influenciam para formar uma complexidade coerente;
• Todo fenômeno ou objeto é algo complexo, que sofre a influência de seu contexto e de outros fenômenos e objetos, não podendo ser reduzido, nem simplificado;
• Na Administração temos como teorias sistemáticas, a Abordagem dos Sistemas Abertos, e a Teoria Contingencial.
O método científico
René Descartes (1596 —1650) Seu mais famoso livro: O
Discurso do Método (1637)
O método científico
Método: (grego) caminho para se chegar a um fim. O método científico é um conjunto de regras básicas para desenvolver uma experiência a fim de produzir novo conhecimento.
Ideais do método científico: objeto específico, linguagem rigorosa, métodos e técnicas específicas, processo cumulativo do conhecimento, objetividade, universalização, crença no progresso, neutralidade científica.
Objetivos científicos
• Separar o objetivo do subjetivo;
• Construir o fenômeno como objeto científico;
• Demonstrar e provar os resultados;
• Produzir uma teoria geral, universal.
A ciência como um ideal de homem
• A ciência moderna acredita na evolução do homem e da cultura;
• A ciência moderna acredita no homem como um ser racional;
• A ciência moderna acredita que a realidade poder ser conhecida e explicada.
O Ideal Científico
• Confiança na capacidade da razão de conhecer a realidade;
• Distinção entre o Sujeito do conhecimento e o objeto (independência do fenômeno);
• Método científico: conjunto de regras, normas e procedimentos gerais, que servem para definir ou construir o objeto e para o autocontrole do pensamento durante a investigação e, após esta, para a confirmação ou falsificação dos resultados obtidos;
• As operações de análise e síntese;
O Ideal Científico
• Confiança na capacidade da razão de conhecer a realidade;
• A lei do fenômeno: regularidade, constância e universalidade. A lei do fenômeno define como o objeto se constitui, como se comporta, por que e como permanece e por que e como se transforma;
• O uso de tecnologia como forma de superar as limitações das capacidades humana;
• O uso da linguagem científica: separação do objeto da experiência vivida cotidiana.
A crítica à Neutralidade Científica
• “O princípio da neutralidade científica é o princípio segundo o qual os cientistas estariam isentos e imunes, em nome de sua racionalidade objetiva, de formular todo e qualquer juízo de valor, de manifestar toda e qualquer preferência pessoal e, consequentemente, de ser responsáveis pelas decisões políticas relativas ao uso de suas descobertas.” (Japiassú; Marcondes. Dicionário Básico de Filosofia, 1996).
A crítica à Neutralidade Científica
• Alguns teóricos defenderam que a Ciência seria uma forma de saber neutro, uma vez que ela descreveria fatos e explicaria fenômenos objetivos, sem emitir juízos de valor ou crenças e opiniões dos próprios cientistas;
• No entanto, nos dias atuais, essa suposta neutralidade é criticada, uma vez que compreendemos que toda Ciência está inserida em um contexto sócio-histórico e sofre pressões e influências dos setores políticos, econômicos, religiosos, além da própria sociedade civil.
A ciência desinteressada e o utilitarismo
• Duas concepções sobre o valor da ciência: o ideal do conhecimento desinteressado e o utilitarismo;
• O ideal do conhecimento desinteressado: o valor do conhecimento independe de sua aplicação prática (ampliar o saber humano sobre a realidade);
• O utilitarismo: o valor da ciência está na quantidade de aplicações práticas que ela aporta:
Valorização da Prática em detrimento à Teoria; Confusão entre Ciência e Técnica.
• “A ciência tornou-se parte integrante e indispensável da atividade econômica. Tornou-se agente econômico e político”.
O Utilitarismo
• É uma doutrina filosófica consequencialista, ou seja, avalia as consequências das ações, que defende que as ações são boas quando tendem a promover a felicidade da maioria;
• Em muitas ocasiões, para promover o bem-estar da maioria é aceito o sacrifício do bem-estar das minorias.
• Bentham, um dos principais teóricos utilitaristas do século XIX, defendeu o princípio da utilidade, que defende que “toda ação, qualquer que seja, deve ser aprovada ou rejeitada em função da sua tendência de aumentar ou reduzir o bem-estar das partes afetadas pela ação. (...) Designamos por utilidade a tendência de alguma coisa em alcançar o bem-estar, o bem, o belo, a felicidade, as vantagens, etc.”;
A Ciência como uma forma de Poder
• A Ciência, ao longo da construção das sociedades “modernas”, transformou-se ela mesma em uma espécie de mito, ou seja, adquiriu o status de poder ilimitado capaz de explicar todos os fatos e propor verdades absolutas;
• Nessa perspectiva, a ciência divide os seres humanos em duas categorias, de acordo com a ideologia da competência: Os que sabem – devem comandar a sociedade e
exercer o poder sobre os que não sabem, pois são competentes;
Os que não sabem – por serem considerados incompetentes devem obedecer e se deixar mandar.
O Cientificismo
• Sistema Filosófico que defende a tese de que a única via de acesso válido à realidade é através das ciências positivas (Augusto Comte);
• Acredita na possibilidade de uma racionalização completa do saber;
• “Fora da Ciência não há salvação;
• Defende que apenas os técnicos e os cientistas devem dirigir todos os negócios humanos, por serem os únicos conhecedores do saber verdadeiro.
Augusto Comte (1798-1857)
A ideologia cientificista
O cientificismo: crença na capacidade ilimitada da ciência de conhecer e explicar tudo; de conhecer os fenômenos e a própria realidade tal como ela é em si mesma (o mito da ciência); a manipulação e o conhecimento da realidade sem limites para a ação humana; o domínio dos que detêm o conhecimento sobre os que não o detêm (ideologia da competência);
A ilusão da neutralidade científica: A ciência como imparcial, objetiva e neutra (mito); A escolha do fenômeno a ser estudado já não é neutra; A ciência está inserida em um contexto histórico e
cultural onde existem interesses econômicos e políticos; Ela representa o pensamento de uma determinada
cultura, por isso tende a ser influenciada pelo etnocentrismo.
A crítica às ciências modernas
• No início do século XX teóricos como Karl Marx e Max Weber, entre outros, procuraram desmascarar os ideais de neutralidade e progresso científicos.
• Surge a teoria crítica, vinculada à Escola de Frankfurt.
• Aparece o conceito de razão instrumental.
Max Weber (1864 - 1920)
A ciência como Ideologia
• A ciência como Ideologia: lógica social e imaginária de ocultamento da realidade histórica (Marx);
• A ciência é uma forma de poder;
• A ciência expressa os ideais da classe “burguesa”;
• A ciência tem como objetivo dominar o próprio homem.
Karl Marx (1818 – 1883)
Herbert Marcuse(Alemanha, 1898 – 1979)
• A razão da ciência moderna não é a verdadeira Razão;
• A ciência e a técnica são apropriadas pela sociedade capitalista;
• A ciência e a técnica como instrumento de dominação ideológico das sociedades capitalista.
A razão instrumental
• Para o Iluminismo, conhecer é dominar e controlar a natureza e o homem;
• Francis Bacon: a natureza atormentada; atormentar a natureza é fazê-la reagir a condições artificiais, criadas pelo homem;
• A razão instrumental tem como finalidade a aplicação e a transformação da própria realidade e do homem;
• A ciência como ideologia: não é mais a busca pelo conhecimento que move ciência, e sim a busca pelo controle e pela dominação da natureza e do homem.
A Razão Instrumental
• A Razão Instrumental, nascida dos ideais Iluministas, se caracteriza pela utilização do conhecimento como uma forma de criar condições material para a conservação da vida do ser humano;
• O termo “Razão Instrumental” foi provavelmente cunhado por Max Horkheimer. Para criticar esse conceito, Horkheimer defendeu o conceito da Razão Crítica.
A Razão Instrumental
• Usa-se a razão (pensamento) para aprender, para criar algo “útil”, economicamente compensador: saber é poder;
• A Razão instrumental promove um verdadeiro desencantamento do mundo, na medida em que todo conhecimento humano perde seu valor absoluto como fim, se torna apenas um meio;
• Na sociedade capitalista, o conhecimento é um meio para se alcançar a maximização das ganâncias e dos benefícios financeiros.
A Volta à Barbárie
• ADORNO e HORKHEIMER, fazem a seguinte pergunta: “por que a humanidade, em vez de entrar em um estado verdadeiramente humano, está em uma nova espécie de barbárie?”
• Essa é a prova que a razão não busca mais a verdade, a crítica ao pré-estabelecido: na sociedade de massa a tecnificação do saber sacrifica a própria liberdade e consciência das pessoas;
• É a volta do ser humano à barbárie.
A crítica de Horkheimer ao projeto Iluminista da Modernidade
• A modernidade, sob o viés iluminista, pôs em marcha o seu projeto de racionalizar o mundo. Esse processo visava desencantar o mundo, dissolver os mitos e substituir a imaginação e a fé pelo saber;
• O problema é que em vez desse projeto promover a emancipação do ser humano, o escravizou, nas armadilhas da ignorância.
• Na modernidade capitalista, o que interessa não é a verdade, mas o pensamento operativo, técnico e eficaz.
• Nessa ânsia pelo conhecimento técnico, o ser humano perde a consciência do que realmente está em jogo, se aliena, do mundo e de si mesmo.
A Mudança de Paradigma nas Ciências contemporâneas
• Vivemos, na contemporaneidade, uma crise de paradigmas nas ciências. Os modelos científicos mecanicista-lógico-matemáticos foram considerados mecanicistas e reducionistas e não dão conta de explicar a realidade em sua complexidade;
• A Ciência hoje, busca desenvolver uma leitura mais sistêmica dos fenômenos, considerados complexos e holísticos;
• Na Administração temos um intenso debate sobre a eficácia dos métodos estritamente racionais, além de um resgate da complexidade humana e da subjetividade;
• Estudos sobre valores, cultura e clima, liderança, mostram o quanto a dimensão informal e não-racional determina o desempenho nas empresas.
A Mudança no Paradigma Científico
• Paradigma Newtoniano-cartesiano (modernidade)
- A especialização;- A objetivação e a objetividade;- O método racional;- Causalidade linear.
• O Modelo Holístico – Sistêmico (pós-modernidade)
- O todo e as partes – a complexidade;- A humanização e a intersubjetividade ;- O resgate da criatividade e da espontaneidade;- Causalidade circular e multicausalidade.
prof.Felipe Pinho
A mudança de Paradigma científico
PARADIGMA MODERNO PARADIGMA CONTEMPORÂNEO
• Objetividade;• Causalidade linear;• Neutralidade científica;• Racionalidade;• Método científico: matemática e física;• O conhecimento pelo conhecimento;• O sujeito como parte da engrenagem organizacional, como uma peça da máquina• Foco na tarefa.
• Objetividade e Subjetividade;• Multicausalidade;• O envolvimento ético;• A compreensão de que outros fenômenos psicológicos e sociais interferem no comportamento humano;• Desenvolvimento de um método científico próprio ao estudo do “humano”;• A responsabilidade do conhecimento: ética e bioética;• O sujeito como parte da estrutura informal, da cultura, da construção social da organização• Foco no ser humano.
Reflita: O progresso da Tecnologia
• O minério coltan (columbita-tantalita) é um dos materiais mais procurados do mundo;
• Quando refinado se transforma em tântalo, um pó mágico, um componente-chave de tudo, desde telefones celulares fabricados por Nokia e Ericsson e chips de computador da Intel, passando por aparelhos de som da Sony, até mísseis e reatores nucleares.
• Um dos maiores produtores mundiais desse minério é o Congo que vive uma guerra civil sangrenta;
• Onde será que as empresas de tecnologia compram esse material?
Reflita: sobre os problemas e limites do uso das ciências
• Há limites para o uso das ciências? A Ciência pode tudo?
• Os avanços tecnológicos e científicos só trazem realmente benefícios para toda a humanidade?
• A ciência é neutra e desinteressada?
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo: Ática, 2003.JAPIASSÚ; MARCONDES. Dicionário Básico de Filosofia. Rio de Janeiro, Jorge Zahar Ed., 1996.HORKHEIMER, Max. Eclipse da razão. São Paulo: Centauro, 2002.
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Bibliografia