a componente estratégica nos planos municipais · por forma a perceber a evolução da definição...
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A Componente Estratégica nos
Planos Municipais
Joana Margarida de Almeida Lima
Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em
Engenharia do Território
Júri
Presidente: Professora Doutora Maria Beatriz Marques Condessa
Orientador: Professor Doutor José Álvaro Pereira Antunes Ferreira
Co-Orientador: Professor Doutor Valerio Cutini
Vogais: Professor Doutor Jorge Manuel Gonçalves
Outubro 2011
i
Muitos foram os que me apoiaram nesta realização pessoal e profissional que marca o fim
deste percurso, no entanto, não poderei deixar de agradecer em particular:
Aos meus Orientadores, Professor Doutor Antunes Ferreira pelo papel fundamental que
desempenhou ao longo da minha formação académica e Professor Doutor Valerio Cutini, por
me ter dado a oportunidade de apreender e participar neste projecto.
Á Professora Doutora Rosário Partidário e aos meus colegas que me ensinaram tantas novas
competências, e me incentivaram na realização desta dissertação.
À Patrícia Nunes que me ajudou a contornar tantos obstáculos burocráticos ao longo do
percurso académico em especial na participação no programa Erasmus e na realização desta
dissertação.
Aos meus amigos que estiveram presentes em muitos momentos de dúvida e desânimo e que
me apoiaram e incentivaram, agradeço assim à Joana, à Filipa, ao David e ao Miguel.
Por fim, aos meus pais, irmãos e Filipe pelo entusiasmo, paciência, espírito crítico e apoio, a
quem dedico todo o meu trabalho.
Agradecimentos
iii
A Componente Estratégica nos
Planos Municipais
Joana Margarida de Almeida Lima
Resumo
O objectivo desta dissertação é compreender, à luz dos actuais conceitos, o entendimento da
estratégia subjacente nos Planos Municipais atribuído pelo sistema legal e, em simultâneo,
analisar o actual conceito de estratégia territorial e as implicações que a mesma traz para o
processo de planeamento municipal e para a elaboração de Planos, em particular.
Por forma a perceber a evolução da definição é realizado um enquadramento do planeamento
estratégico ao nível municipal, analisando-se a raiz e o fundamento de cinco conceitos:
Estratégia, Planeamento, Planeamento Estratégico, Planeamento Municipal e Planeamento
Estratégico ao Nível Municipal. Explicitam-se as figuras legais, a par dos conceitos e da prática
de planeamento municipal, no sentido de perceber os princípios que constituem a legislação e
os objectivos que se pretendiam alcançar.
A operacionalização da estratégia considera-se essencial, na medida em que é um elemento
chave no processo de planeamento municipal, por isso, a explicitação desta temática, apoia-se
na análise dos Planos Municipais disponíveis em vigor de Vila Franca de Xira e Pisa.
Por fim é realizada uma reflexão final relativa ao tema e aos objectivos da dissertação,
fazendo-se algumas considerações sobre as dificuldades que derivam da implementação da
estratégia e os benefícios que a sua operacionalização pode trazer para a gestão municipal.
Apontam-se ainda linhas de orientação para o prosseguimento da investigação nestas
matérias.
Palavras-chave: Estratégia, Planeamento, Planeamento Estratégico, Planeamento
Municipal e Planeamento Estratégico ao Nível Municipal
iv
The Strategic Component in
Municipal Plans
Joana Margarida de Almeida Lima
Abstract
The aim of this dissertation is to understand, considering the current concepts, the strategy
underlying Municipal Plans, assigned by the legal system and simultaneously, to analyze the
actual concept of territorial strategy and its implications to the process of municipal planning and
the preparation of plans, in particular.
To understand the evolution of the definition a framework for the strategic municipal planning
level is developed, to analyze the root and the basis of five concepts: Strategy, Planning,
Strategic Planning, Municipal Planning and Strategic Municipal Planning Level. The legal
entities, as well as the concepts and practice of municipal planning, are explained in order to
understand the principles that constituted the legislation and its main goals.
To make a strategy operational is essential, in a way that it is a key element of the municipal
planning process, so, the explanation of this subject it is supported by the analysis of the
Municipal Plans in effect of Vila Franca de Xira and Pisa.
Ultimately, it is structured a final reflection about this subject and the main goals of this
dissertation, where some considerations are made about the struggles when this strategy is
implemented and the benefits that it can bring to municipal management. There are pointed
some guidelines for further research in these areas.
Keywords Strategy, Planning, Strategic Planning, Municipal Planning and Strategic Municipal
Planning Level
v
Índice Agradecimentos.............................................................................................................................. i
Índice ............................................................................................................................................ v
Índice de Figuras ........................................................................................................................... vi
Índice de Quadros ......................................................................................................................... vi
Lista de Acrónimos ....................................................................................................................... vii
1 Introdução .............................................................................................................................. 1
1.1 Enquadramento geral do tema ....................................................................................... 1
1.2 Contexto da Investigação ............................................................................................... 2
1.3 Objecto de Estudo .......................................................................................................... 3
1.4 Objectivos da Investigação ............................................................................................. 4
1.5 Estrutura e Metodologia .................................................................................................. 5
2 Estado da Arte ....................................................................................................................... 7
2.1 Estratégia ........................................................................................................................ 8
2.2 Planeamento ................................................................................................................. 10
2.3 Planeamento Estratégico .............................................................................................. 13
2.3.1 Planeamento Estratégico no contexto empresarial ............................................... 14
2.3.2 Planeamento Estratégico no contexto territorial .................................................... 17
2.4 Planeamento Municipal ................................................................................................. 27
2.5 Componente Estratégica no Planeamento Municipal ................................................... 40
2.5.1 Enquadramento Legal ........................................................................................... 48
Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo ........................ 48
Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial ................................................. 49
Avaliação Ambiental Estratégica ...................................................................................... 51
3 Estudo de Casos .................................................................................................................. 53
3.1 Apresentação dos Municípios ....................................................................................... 54
3.1.1 Vila Franca de Xira ................................................................................................ 54
3.1.2 Pisa ........................................................................................................................ 55
3.2 Enquadramento dos planos e identificação das componentes estratégicas ................ 56
3.2.1 Plano director Municipal de Vila Franca de Xira ................................................... 56
3.2.2 Piano Strutturale - Comune di Pisa ....................................................................... 60
4 Conclusões........................................................................................................................... 63
vi
4.1 Síntese dos conceitos ................................................................................................... 63
4.2 Análise dos Casos ........................................................................................................ 67
4.3 Reflexões ...................................................................................................................... 69
5 Desenvolvimentos futuros .................................................................................................... 71
5.1 Linhas de orientação ..................................................................................................... 71
6 Referências Bibliográficas ....................................................................................................... i
Figura 1 - Identificação de conceitos a abordar na primeira parte da dissertação ....................... 5
Figura 2- As quatro fases de desenvolvimento de um plano estratégico integra. ...................... 22
Figura 3- Inserção geográfica de Vila Franca de Xira na sub-região da Grande Lisboa e na AML
..................................................................................................................................................... 54
Figura 4- Inserção geográfica do município de Pisa na Província de Pisa ................................ 55
Quadro 1-Modelos de planeamento ............................................................................................ 19
Quadro 2- Aspectos positivos com a introdução da prática dos Planos Estratégicos ................ 24
Quadro 3 – Factores negativos e positivos PDM da década de 90 ............................................ 34
Quadro 4 - Evolução do enquadramento legal do Planeamento Municipal ................................ 37
Quadro 5 - Evolução da aplicação do planeamento estratégico aos territórios ......................... 41
Índice de Figuras
Índice de Quadros
vii
AAE Avaliação Ambiental Estratégica
AIA Avaliação de Impacte Ambiental
AML Área Metropolitana de Lisboa
CEE Comunidade Económica Europeia
CTA Comissões Técnicas de Acompanhamento
CM- VFX Câmara Municipal de Vila Franca de Xira
DGOTDU Direcção-Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano
EUA Estados Unidos da América
IDT Instrumentos de desenvolvimento territorial
IGT Instrumentos de Gestão Territorial
INE Instrumentos de natureza especial
IPS Instrumentos de política sectorial
IPT Instrumentos de planeamento territorial
LBPOTU Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo
LED Linhas Estratégicas de Desenvolvimento
OE Objectivos específicos
PDM Plano director municipal
PMOT Planos municipais de ordenamento do território
PP Plano de pormenor
PROSIURB Programa de Consolidação do Sistema Urbano Nacional
PU Plano de urbanização
RJIGT Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial
SWOT Forças (Strengths), Fraquezas (Weaknesses), Oportunidades (Opportunities) e Ameaças (Threats)
VFX Vila Franca de Xira
Lista de Acrónimos
1
1 Introdução
1.1 Enquadramento geral do tema
A presente dissertação foi realizada com o propósito de obtenção do grau de Mestre em
Engenharia do Território, pelo Instituto Superior Técnico – Universidade Técnica de Lisboa. É
alusiva ao Planeamento Estratégico ao Nível Municipal e enquadra-se na área de estudo de
Ordenamento do Território e Urbanismo.
A escolha do tema, “A componente estratégica nos planos municipais”, deve-se ao interesse
suscitado pela importância do planeamento municipal no ordenamento do território, e completa-
se com a existência de outros tópicos que tornam pertinente a discussão desta temática, tais
como:
a crise económica e financeira mundial e nacional, que enfatiza a necessidade de
realizar o processo de planeamento de forma mais eficaz e eficiente, através da
inclusão da componente estratégica;
a mudança de paradigma: a actual fase de transição, presente na Revisão dos Planos
Directores Municipais (PDM), em Portugal, abre perspectivas para a valorização desta
figura de plano, nomeadamente pela exigência do enquadramento legal. O PDM terá,
assim, uma componente estratégica, sendo importante perceber se foi atingida ou caso
contrário, como deverá ser atingida e quais as mais-valias daí resultantes para o
planeamento do território.
2
1.2 Contexto da Investigação
Estrela (1982:51) sustenta que "Nenhum projecto, nenhum estudo científico poderá ser
realizado sem o conhecimento da realidade a que ele se refere, isto é, sem se conhecer o
campo em que se quer intervir"
Desta forma, torna-se importante identificar as características principais do contexto, Ronald
Carter (1993) sugere que o esquema de identificação das características principais do contexto
assenta na resposta às seguintes questões:
quem são os participantes envolvidos na acção?
quando se realiza a acção?
onde tem lugar a acção?
porque se realiza a acção?
Na sequência deste pensamento, dar-se-á resposta às perguntas apresentadas caracterizando
o contexto, em que se desenvolve a presente dissertação.
Quem: a autora (Joana Lima), o seu Orientador (Doutor José Álvaro Pereira Antunes Ferreira)
e Co-Orientador (Doutor Valerio Cutini).
Quando: 2010 e 2011.
Onde: Em Portugal, (Lisboa e Vila Franca de Xira) e em Itália (Pisa), mais precisamente no
Instituto Superior Técnico da Universidade Técnica de Lisboa e na Facoltà di Ingegneria
dell'Università di Pisa.
Porquê: pelo interesse suscitado ao longo do percurso académico, pela importância e
pertinência actual da discussão desta temática e, finalmente, para a obtenção do grau de
Mestre em Engenharia do Território.
3
1.3 Objecto de Estudo
Propõe-se compreender à luz dos actuais conceitos, o entendimento da estratégia, subjacente
nos Planos Municipais, atribuído pelo sistema legal e, em simultâneo, analisar o actual conceito
de estratégia territorial e as implicações que a mesma traz para o processo de planeamento
municipal e para a elaboração de Planos, em particular. Por último, procura-se apontar de que
forma a componente estratégica responde aos desafios que se colocam actualmente ao
planeamento e o modo como esta introdução pode ser operacionalizada.
4
1.4 Objectivos da Investigação
Deste modo, o principal objectivo desta dissertação é analisar a componente estratégica nos
planos de escala municipal. De forma a atingir o objectivo enunciado, estabeleceram-se os
seguintes objectivos específicos - OE (e a respectiva justificação à direita):
OE1- Perceber a evolução da definição,
dos objectivos e as alterações que
foram sendo introduzidas na figura
Plano Director Municipal e dos
conceitos subjacentes à sua análise;
Pois é importante compreender a causa
e o modo como o PDM pode encerrar a
estratégia do município.
OE2- Clarificar o significado do nível
estratégico do planeamento;
Porque são associados múltiplos
significados quer ao nível táctico, quer
ao nível da operacionalização, e torna-
se relevante relacioná-los com o
sentido dos conceitos: horizonte,
perenidade dos objectivos e população
ou abrangência do território.
OE3- Analisar as especificidades
metodológicas do planeamento
estratégico, pormenorizando aquelas
que podem ser introduzidas no
processo de Revisão dos Planos
Directores Municipais;
Pois trata-se de um procedimento
indispensável na discussão das
componentes estratégicas que devem
ser incluídas ao nível do planeamento
municipal
OE4- Analisar e comparar um caso
português com um caso europeu;
Pois é relevante integrar a situação
portuguesa no contexto europeu, e
tendo em conta as limitações temporais
de uma dissertação reduz-se este
universo a dois exemplos.
OE5- Avaliar a operacionalização da
estratégia na elaboração dos planos,
quer em termos processuais, quer
analíticos, identificando as
dificuldades implícitas;
Após a análise de estudos de caso é
imprescindível identificar a componente
estratégica dos respectivos planos, bem
como, avaliar a sua operacionalização.
OE6- Questionar a integração da vertente
estratégica na Revisão dos Planos
Directores Municipais e explicitar os
objectivos e as mais-valias que se
pretendem alcançar.
Porque se trata de um estádio
necessário para a discussão final do
tema em análise, depois de ter sido
realizada a análise e avaliação de dois
planos municipais em vigor.
5
1.5 Estrutura e Metodologia
A abordagem metodológica, definida para responder aos objectivos traçados, apresenta-se
estruturada em quatro partes:
A primeira parte (Capítulo 2) corresponde ao enquadramento do planeamento estratégico ao
nível municipal, analisando-se a raiz e o fundamento do planeamento estratégico, as suas
potencialidades e debilidades e os benefícios trazidos por este tipo de metodologias à
conformação do modelo territorial dos municípios. Consequentemente, analisa-se o carácter
estratégico atribuído aos PDM pelo novo enquadramento legal e as mais-valias que assume
para o planeamento do território municipal. Por isto, destaca-se o enquadramento e definição
de cinco conceitos: Estratégia, Planeamento, Planeamento Estratégico, Planeamento Municipal
e Planeamento Estratégico ao Nível Municipal. A Figura 1 explicita a forma como estes
conceitos conduzem ao Planeamento Estratégico ao Nível Municipal e como os quatro
primeiros se constituem como conceitos base deste objecto de estudo.
Figura 1 - Identificação de conceitos a abordar na primeira parte da dissertação
A par dos conceitos enquadram-se, ainda, as figuras legais, e da prática de planeamento
municipal, no sentido de perceber os princípios que constituem a legislação e os objectivos que
se pretendiam alcançar.
Na segunda parte (Capítulo 3), aborda-se o conteúdo dos Planos Municipais, a forma como
estes podem responder à proposta consagrada no quadro legislativo vigente e, sobretudo,
como a estratégia territorial se reverte nos mesmos. A operacionalização da estratégia
considera-se essencial, na medida em que é um elemento chave no processo de planeamento
municipal, exigindo que se encare o PDM como instrumento estratégico que constitui a base do
desenvolvimento concelhio, no qual assenta a gestão urbanística municipal. Por isso, a
explicitação desta temática, apoia-se na análise e comparação dos Planos Municipais de Vila
Franca de Xira (como exemplo de caso Português) e Pisa (como exemplo de caso Toscano).
Esta análise foi efectuada tendo em consideração todos os elementos disponíveis em vigor.
6
A escolha destes dois casos de estudo prende-se com o facto de o município de Vila Franca de
Xira ter em vigor um PDM de segunda geração, em conformidade com a legislação estudada
nesta dissertação, e o município de Pisa ter realizado um plano estratégico com uma escala
fora dos limites administrativos e espectáveis, constituindo-se como o elemento exemplar
seguido noutros municípios da região da Toscana
A terceira parte (Capítulo 4 e 5) contém uma reflexão final relativo ao tema e aos objectivos da
dissertação, fazendo-se algumas considerações sobre as dificuldades que derivam da
implementação da estratégia e os benefícios que a sua operacionalização pode trazer para a
gestão municipal. Apontam-se ainda linhas de orientação para o prosseguimento da
investigação nestas matérias.
7
2 Estado da Arte
Numa época marcada por mudanças económicas e sociais aceleradas, com fortes incidências
no território, em particular nas cidades, originam-se múltiplos discursos e entendimentos sobre
o planeamento. Importa, assim, apresentar o que mais de recente tem sido reflectido ,
diferenciando, contextualizando e definindo os conceitos de Estratégia, Planeamento,
Planeamento Estratégico, Planeamento Municipal e, por fim, a componente Estratégica no
Planeamento Municipal.
8
2.1 Estratégia
As origens do planeamento estratégico remontam à Grécia e têm como fundamento a sua
utilização para fins militares. A palavra estratégia deriva do grego stratego – stratos (exército) +
ego (líder) – e define-se como a disciplina ou arte de conduzir um exército e dirigir as
operações de modo a retirar vantagens sobre o inimigo (Guell, 1997; Lopes, 1998).
A "Arte da Guerra", obra escrita por Sun Tzu há mais de 2300 anos, foi o primeiro documento
conhecido que sistematiza o método de pensamento estratégico no comando dos exércitos.
Especifica o conjunto de orientações para os líderes militares definirem e hierarquizarem as
actuações que lhes possibilitariam conduzir os seus homens e exércitos de forma mais eficaz,
de modo a se apresentarem em vantagem perante os inimigos e vencê-los.
No início do século XX, destacam-se os trabalhos de Taylor, Fayol, Follet e Max Weber sobre a
racionalização dos processos de organização do trabalho e dos processos de gestão nas
empresas. Tome-se o exemplo da General Motors e outras indústrias de referência dos EUA
que começaram a adoptar os princípios do planeamento estratégico nas suas actividades. A
recessão de 1929 e, particularmente, a II Guerra Mundial intensificaram a transposição das
metodologias de planeamento militar para as actividades empresariais. Através da gestão por
objectivos1, recorre-se, de acordo com Ferreira (2007), a uma criteriosa análise prospectiva dos
mercados e à sua conquista, mediante a utilização das novas técnicas de marketing.
Na segunda metade do século XX, assinala-se uma mudança radical que vai da projecção de
tendências (planeamento de longo prazo) para o planeamento e a gestão estratégicos criativos
e participativos, envolvendo todos os elementos da empresa na definição dos objectivos e na
mobilização dos recursos para os atingir (gestão participativa por objectivos). Num quadro de
concorrência global aberta, de complexificação das actividades e de evolução incerta, as
técnicas com recurso à previsão, à prospectiva e ao desenho de "cenários de evolução"
ganham predominância sobre os clássicos processos de projecção de tendências, mais ou
menos lineares. (Ferreira, 2007)
No entanto, as crises económicas da década de setenta, caracterizadas por um contexto de
rápidas mudanças e de incertezas crescentes, promoveram o início de técnicas de
antecipação e previsão e conduziram à valorização do planeamento da empresa,
denominado por planeamento estratégico (Godet, 1993). Este conceito prende-se com a
necessidade de reflectir sobre as condições existentes e sobre a capacidade de
antecipação às mudanças que pudessem ter implicações estratégicas na empresa, bem
1 Em finais dos anos 50, Peter Drucker revolucionou a direcção empresarial através da "gestão
participada por objectivos", ultrapassando o formalismo e a cristalização do "taylorismo" e criando novos dinamismos através do aproveitamento dos conhecimentos e da motivação dos quadros e das sinergias criadas a partir da comunicação interdepartamental no seio das organizações.
9
como a necessidade de adaptação da estratégia com base na flexibilidade exigida pelo
meio envolvente (Godet, 1993; Guell, 1997).
Neste contexto de mutação contínua e de incerteza, a "própria noção de planeamento
enquanto objectivo fixado a priori, torna-se inadaptada, pois não é o objectivo que conta (...), é
a capacidade de reagir e de se adaptar às modificações que é determinante" (Godet, 1993).
Deste modo, nos anos 80/90, na sequência das crises, económica e energética, a identificação
das tendências (dinâmicas) ganha terreno sobre a fixação dos pontos fortes e dos pontos
fracos. A detecção, o aproveitamento das oportunidades, bem como a minimização das
ameaças tornaram-se fundamentais. Passou-se, assim, do plano como produto para o
planeamento e para a gestão como processos. A participação alargada afirmou-se. E reforçou-
se a atenção concedida à análise da "envolvente externa" (Ferreira, 2007).
Em suma, na última década do século passado, houve um renascimento dos princípios
estratégicos e um desenvolvimento do planeamento estratégico criativo e participado que não
só busca novas formas de focar o negócio, como também envolve a participação de todos os
segmentos empresariais na definição da sua estratégia, consolidando-se, então, o
planeamento estratégico como um novo instrumento capaz de responder às exigências da
conjuntura e dos mercados cada vez mais competitivos e incertos (Rodrigues, 2005).
Não havendo uma definição única de “estratégia”, para efeitos desta dissertação adopta-se “ a
definição de objectivos de longo prazo (objectivos estratégicos) e a adopção de cursos de
acção com alocação de recursos para os atingir” (Chandler 1962) ou ainda, “as principais
linhas de acção que se dirigem a objectivos de longo prazo” (DGOTDU 2003).
10
2.2 Planeamento
O método e a teoria do planeamento têm as suas origens nas ideias iluministas e no
pensamento técnico e racional dessa época. O iluminismo procurou o progresso e a
modernidade através da definição de objectivos de planeamento e continuou a ser
desenvolvido através dos ideais utópicos do século XIX. O pensamento técnico-racional criou
os instrumentos para a construção de um processo de planeamento capaz de interpretar e
justificar tomadas de decisão e procedimentos considerados racionais, assistindo-se, no final
do século XIX, a um avanço significativo do estudo das organizações e do pensamento sobre a
administração e a gestão (Rebelo, 2000).
Este desenvolvimento intenso do planeamento de programas e acções, durante a II Guerra
Mundial, foi posteriormente transferido do contexto militar para o campo empresarial, passando
as empresas a prever e organizar de forma mais sistemática o crescimento e a diversificação
das suas actividades a partir de uma análise a curto prazo dos produtos e mercados,
começando a surgir o conceito de marketing (Rodrigues, 2005).
Nos anos 50, o crescimento económico e o célere desenvolvimento dos mercados, levam à
instalação de sistemas de planeamento para acompanhamento da evolução. Só a partir desta
altura, o planeamento começa a ser motivo de forte interesse por parte das empresas e
organizações em geral. Desenvolve-se, assim, o planeamento a longo prazo que defendia que
as tendências do passado continuavam no futuro e, portanto, aceitava-se a projecção apenas
baseada nas informações e experiências do passado, nomeadamente vendas, custos e
tecnologia (Rebelo, 2000).
De uma forma geral, definir planeamento, nas décadas de 60 e de 70, acentua o seu carácter
voluntarista e racional, caracterizado por ser um processo mental, como método de obter
decisões, independente do fenómeno planeado (Webber, 1965); é considerado como uma
organização consciente das actividades para servir as necessidades humanas (Saarinen,
1974); é ainda entendido como uma actividade centrada entre o conhecimento e a acção
organizada (Friedmann, 1974) e descrito como um processo mental de influenciar o futuro
(Faludi A. , 1976).
Nesta sequência, o Planeamento é definido como sendo uma das cinco funções da
administração, para além da organização, da direcção, do controlo e da gestão de pessoal
(Fayol, 1976). Constituindo-se ainda um referencial em que se organiza o conhecimento
administrativo e a acção de uma organização, o planeamento, tomado como função essencial
da administração, é considerado como um processo de decisão, como o processo de enfrentar
o futuro, assumindo riscos que se Faludi (1973) distingue diferentes dimensões do
planeamento, ou conceitos ligados à maneira de planear, que se exprimem como opostos e
que estão relacionados com a atitude dos agentes de planeamento e com o contexto
socioeconómico e político em que se desenvolve o planeamento.
11
A primeira dimensão, contrapõe o plano papel ao processo de planeamento, analisando o
modo como os agentes do planeamento encaram a acção a realizar na sua área. No plano
papel estão definidos não só os objectivos, garantindo-se através do programa estabelecido, a
maneira exacta de os alcançar. No planeamento processo, o plano estabelecido é adaptado
durante a sua implementação, quando surge nova informação que exige alterações.
Na segunda dimensão analisa-se o planeamento racional / integrado face ao planeamento
desagregado / desenvolvimentista, analisando os modos como se investigam as alternativas
antes de formular o programa a aplicar na respectiva área de acção.
O planeamento racional / integrado considera que todas as possibilidades de acção devem ser
identificadas e avaliadas segundo todos os fins. Os programas apresentados para avaliação
cobrem todo o espaço de acção, o qual por sua vez, foi deduzido através de uma exaustiva
definição do problema a resolver. Este tipo de planeamento implica grande volume de
informação e uma estrutura de procedimento centralizada que identifica e situa todos os
aspectos do problema a resolver.
No planeamento desagregado/desenvolvimentista considera-se impossível e indesejável
realizar a avaliação de todas as acções a desenvolver segundo todos os fins. Os programas
considerados por cada unidade orgânica de planeamento são limitados e não esgotam o
espaço de acção disponível, que está ele próprio mal definido. Esta diversidade de unidades
orgânicas, representando interesses próprios, implica a existência de conflitos e a possibilidade
do planeamento exprimir a actuação dos interesses dominantes.
A terceira e última dimensão aborda o planeamento normativo em contraponto ao planeamento
funcional, analisando-se a capacidade dos agentes de planeamento avaliarem os meios e os
fins da sua acção. Nesta dimensão é discutido se se deve, e até que ponto, estender a escolha
racional dos meios aos fins.
No planeamento funcional os técnicos assumem os objectivos que lhe são dados e preocupam-
se apenas com a racionalidade dos meios para os alcançar. No planeamento normativo a
preocupação fundamental são os fins a atingir, que são os do próprio sistema, fins que o
planeamento tem de procurar. O espaço de acção do planeamento é objecto de uma escolha
racional e esta pode ser revista como e quando se considerar necessário.
Koontz, O'Donnell e Weihrich, em 1986, definem a função planeamento como sendo "decidir
antecipadamente o que fazer, quando fazer, como fazer e com quem fazer". De uma forma,
mais elaborada, o planeamento é tomado como "a escolha consciente de padrões de influência
nos decisores, com o objectivo de coordenar decisões para um período de tempo no futuro e
de os influenciar para metas globais".
Nos anos 90, o planeamento já é tomado como um processo formalizado de tomada de
decisão, que elabora uma representação desejada de um estado futuro e que específica as
12
modalidades de execução dessa vontade (Strategor, 1993). Desta forma o planeamento é
interpretado como uma actividade explícita, que se baseia num método e se desenvolve no
tempo e no espaço segundo um programa previamente determinado, esta actividade termina
num processo de escolhas estratégicas e em programas de acção visando assegurar a
concretização dessas escolhas. É, portanto, um modo de tomada de decisão que se distingue
essencialmente pelo seu carácter formalizado, sem que isso signifique que esteja inteiramente
codificado: o grau de formalização e a sua natureza são muito variáveis.
Poder-se-á concluir que o conceito de planeamento tem mudado e têm sido diversas as
representações e conceitos relativamente ao âmbito, tipo de actividade, objectivos, processos,
aplicações e perspectivas do planeamento. De forma geral, pode-se observar que estão
presentes dois elementos fundamentais do planeamento - decisões e objectivos. Com o
planeamento enfrenta-se o futuro, definindo-se em determinado momento, qual ou quais os
objectivos a atingir. Considera-se assim o planeamento no âmbito deste trabalho, como um
processo racional de decisão e desenvolvimento da melhor modalidade de acção para atingir
um objectivo.
13
2.3 Planeamento Estratégico
A partir dos anos 60, o conceito de Planeamento Estratégico foi transposto do sector
empresarial para o desenvolvimento regional e para o planeamento urbano, num contexto
analógico, em que as cidades ou as regiões, num enquadramento regional ou global,
competem também entre si, desta forma, a evolução do Planeamento Estratégico seguiu
paralelamente em contextos diferentes. No entanto, ainda que possam existir relações entre o
planeamento estratégico empresarial e o planeamento estratégico territorial, a adopção dos
conceitos e modelos do primeiro não poderá ser feita de uma forma directa, não só porque os
objectivos a atingir e os pontos de vista a considerar são manifestamente diferentes como
também o serão certamente as decisões a tomar, as estruturas existentes e os recursos a
afectar (Sallez, 1986).
Desta forma, importa distinguir a evolução do Planeamento Estratégico nestes dois contextos
diferentes: empresarial e territorial.
14
2.3.1 Planeamento Estratégico no contexto empresarial
Como já foi referido, no enquadramento do conceito de estratégia, as crises económicas da
década de 70 levaram a fortes críticas aos esforços de antecipação e previsão num contexto
de rápidas mudanças e de incerteza crescente e conduziram ao reconhecimento da
importância do planeamento da empresa rebaptizado como planeamento estratégico (Godet,
1993). Este conceito prendia-se, então, com a necessidade de reflectir sobre as condições
existentes e sobre a capacidade de antecipação às mudanças que pudessem ter implicações
estratégicas na empresa, bem como a necessidade de adaptação da estratégia com base na
flexibilidade exigida pela envolvente (Godet, 1993; Guell, 1997).
Neste contexto a "própria noção de planeamento enquanto objectivo fixado a priori, torna-se
inadaptada, pois não é o objectivo que conta mais (...), é a capacidade de reagir e de se
adaptar às modificações que é determinante" (Godet, 1993, p. 252). Por isto, nos anos 80 a
gestão estratégica toma o lugar do planeamento, visto que esta apresenta-se como forma de
conferir maior agilidade e flexibilidade que o planeamento estratégico clássico.
No entanto, e de acordo com o referido anteriormente, nos anos 90, houve um renascimento
dos princípios estratégicos, desenvolvendo-se o planeamento estratégico criativo e participado
que procurava novas formas de focar o negócio envolvendo a participação de todos os
segmentos empresariais na definição da sua estratégia, consolidando o planeamento
estratégico como um novo instrumento capaz de responder às exigências da conjuntura e dos
mercados cada vez mais competitivos e incertos (Rodrigues, 2005).
Com efeito, a evolução para uma conjuntura económica mais complexa e competitiva,
determinou também a evolução do exercício do planeamento clássico para o planeamento
estratégico, que no entender de Maria Clara Mendes (1994) pode ser definido como um meio
sistemático para gerir as alterações e criar um futuro possível. Trata-se de um processo que se
pretende criativo, que permite identificar e realizar uma política conclusiva, tendo em conta os
pontos fortes e fracos da organização num contexto mais vasto em que ela se situa e do qual
terá de aproveitar as oportunidades que surgem, no momento próprio.
A par do enquadramento do conceito de Planeamento Estratégico é importante destacar e
diferenciar outros conceitos e metodologias necessárias para o exercício desta forma de
planear, segue-se assim uma súmula dos referidos conceitos.
Em 1972, Child refere que escolha estratégica pressupõe que os processos de variação e
selecção ocorrem simultaneamente, dependendo das decisões internas à organização relativas
à procura racional de fins alternativos e métodos para os atingir e à selecção entre as
alternativas possíveis (Aldrich, 1979). Assim, destaca-se o efeito potencial dos gestores e
outros agentes que participam no processo de decisão, sobre as escolhas estratégicas,
considerando que os decisores têm mais autonomia que a inferida por aqueles que
argumentam o domínio da envolvente - as organizações também podem influenciar o meio
15
envolvente, mas a percepção e a avaliação dos acontecimentos por parte dos decisores são
importantes ligações entre a envolvente e a acção desenvolvida na organização (Nicolau,
2001).
As escolhas estratégicas tornam-se cada vez mais difíceis face ao desenvolvimento de novas
tecnologias e de novos produtos e ao surgimento de novos mercados, entre outros aspectos
que se colocam cada vez com maior intensidade. O planeamento estratégico fixa, assim, as
grandes orientações que permitem à organização consolidar a sua posição face à concorrência
e gerir a mudança. O horizonte temporal do planeamento estratégico é mais longínquo do que
o do planeamento operacional, apresentando também uma orientação mais qualitativa.
(Rebelo, 2000).
Na gestão estratégica, a visão refere-se aos objectivos a longo prazo e mais gerais. A visão
descreve as aspirações para o futuro sem especificar os meios para as alcançar. As visões
com mais efeito são aquelas que criam inspiração e esta inspiração é normalmente querer
mais, maior e melhor. Isso pode ser por exemplo prestar o melhor serviço ou desenvolver o
produto mais resistente e deve ser sempre inspirativo (Dess & Miller, 1997).
A comunicação da visão pode ser feita de duas maneiras: uma mais óbvia, através da missão
e outra menos óbvia usando a liderança. Apesar de poder parecer menos óbvia a segunda, a
forma de comunicação é baseada na capacidade de persuasão da liderança, através do
comportamento dos líderes na exposição da visão. A visão torna-se tangível com a definição
da missão. Esta reflecte aquilo em que um líder pensa relativamente à organização e às
direcções que ela deve seguir (Dess & Miller, 1997).
Apesar da missão ser especifica de cada organização, a definição da missão deve conter as
respostas a questões como o propósito, as alterações ao longo do tempo, os segmentos alvo,
os principais produtos (da actualidade e do futuro), as principais preocupações, os nossos
valores, aspirações e prioridades. Desta forma são estabelecidos os limites que servem de
orientação na formulação da estratégia, os padrões para o desempenho da organização em
múltiplas dimensões e para o comportamento ético dos indivíduos (Dess & Miller, 1997).
Os objectivos estratégicos são o referencial do planeamento estratégico, têm como finalidade
tornar a Missão mais concreta e alcançar a Visão de futuro da organização. Devem ser
definidos de forma a que possam ser mensuráveis e comparáveis, de modo a permitir a sua
avaliação, é necessário que contenham uma componente temporal; que sejam passíveis de ser
realizados; e que contenham a diversidade de interesses da organização; e ainda que sejam
minimizadores de conflitos, redutores de consequências indesejáveis e facilitadores de
compromisso (Rebelo, 2000).
Baseada na definição e procura de objectivos estratégicos como resultado da
construção de consensos e da constante avaliação de escolhas e processos para os
atingir, a abordagem estratégica procura associar as vantagens do planeamento
16
racional e da construção de modelos com possibilidade de integrar valores e ideias
inovadoras. Promovendo a constante auto-avaliação, este processo deverá estar
aberto à reformulação ditada pela oportunidade da execução face às mudanças da
envolvente. Esta abordagem deverá ser sistémica, identificando a inter-relação entre os
diferentes sistemas e subsistemas, variáveis e factores de regulação.
No âmbito da prospectiva estratégica, Michel Godet, 1993, parte da busca de uma
visão global da envolvente da organização e na forma de um diagnóstico, destaca os
pontos controversos e aponta as tendências prováveis, as principais incertezas e os
riscos de rupturas possíveis. Desta base evolui-se, assim, no sentido dos objectivos,
das estratégias e das acções que compõem o plano estratégico global. Conciliando o
processo de planeamento estratégico com a prospectiva, designadamente pela
integração do método dos cenários na metodologia utilizada na fase de diagnóstico,
este autor propõe um esforço de reflexão sobre os cenários possíveis e os desafios e
objectivos associados, sobre as acções possíveis para fazer face a esses desafios e as
consequências dessas acções possíveis.
O método dos cenários tem essencialmente como objectivos, revelar os pontos a estudar
com prioridade (variáveis chave), determinar a partir destas variáveis chave, os actores
fundamentais, as suas estratégias e os meios disponíveis e a descrição, sob a forma de
cenários, da evolução do sistema estudado, tendo em conta as evoluções mais prováveis das
variáveis chave e a partir de jogos de hipóteses sobre o comportamento dos actores. (Rebelo,
2000)
17
2.3.2 Planeamento Estratégico no contexto territorial
Para os autores britânicos, o conceito de planeamento estratégico está intimamente ligado ao
planeamento do uso do solo e apresenta quatro características básicas, Breheny (1991) refere-
se a uma escala geográfica concreta; o seu alcance tende a ser global, embora os agentes que
o implementam optem por ser selectivos na sua cobertura, concentrando-se em temas
fundamentais; devem ser elaborados para períodos superiores aos dos planos que lhe estão
subordinados, sendo como tal, normalmente, de longo prazo; a metodologia a adoptar é
baseada numa abordagem racional onde é importante a análise e a tomada de decisões
(Alexandre, 2003).
O planeamento estratégico, no âmbito do planeamento urbano, acompanhou as tendências de
polarização de alguns centros urbanos à volta de áreas metropolitanas, a emergência do poder
local, o processo de descentralização política e económica da Europa comunitária acompanhou
a evolução cada vez mais rápida, dos padrões de gestão urbana, mais eficiente e direccionada.
O planeamento estratégico é assim instrumentalmente utilizado na competição entre cidades
ou regiões, na busca de um dinamismo demográfico e económico (Rebelo, 2000).
Numa perspectiva de reorientação dos domínios de intervenção pública urbana e de contributo
para o reposicionamento competitivo das grandes cidades no contexto do sistema urbano
europeu e mundial, que justamente o autor situa a utilização do referencial do planeamento
estratégico, Oliveira das Neves (1996) refere que esta abordagem estratégica pressupõe
alargar o campo da intervenção pública a domínios que tradicionalmente não integram as
atribuições e competências das administrações municipais das grandes cidades, e que se
passam a elencar:
acompanhamento dos processos de reconversão do tecido económico local, com
orientações e incentivos à descentralização;
reformulação das estratégias de gestão e alargando os eixos privilegiados de
intervenção urbana;
estabelecimento e aprofundamento de relações de cooperação com as escolas, as
universidades, os laboratórios e centros de investigação, numa perspectiva de
valorização dos recursos humanos e de reforço de competitividade da oferta de bens e
serviços das grandes cidades;
a recriação de estratégias de marketing, que reforcem o potencial de atracção das
grandes cidades, tanto na captação de investimentos e de iniciativas, como na
revalorização das actividades e recursos existentes.
O planeamento estratégico surge assim como um instrumento ao serviço das cidades, não
tanto na óptica da superação do planeamento tradicional, mas na óptica da produção de
externalidades que contribuam para reconfigurar as vantagens competitivas urbanas,
mobilizando procedimentos sistemáticos de discussão do futuro, em termos das funções
18
estruturantes e em termos da equação das relações com outras grandes cidades no quadro
nacional e do sistema urbano europeu, dimensões que respeitam a diversos agentes,
operadores públicos, agentes económicos, agentes dos sistemas de educação, sistemas
científicos e tecnológicos, gestores, autarcas e cidadãos (Rebelo, 2000).
No entanto, outros autores caracterizam o conceito de planeamento estratégico territorial de
forma complementar, ou seja, que pode ser visto como um equacionamento entre o futuro
desejável e o possível para um determinado território, chegando a um consenso nas medidas
concretas a tomar no presente, tendo em vista uma melhoria no futuro (Güell, 1997) ou,
segundo Esteve (1999), como um processo flexível destinado a transformar a cidade num
espaço singular, que lhe traga notoriedade, objectivo alcançável através de um acordo dos
principais actores e entidade urbanos que têm capacidade de a transformar.
Por sua vez, Cabral e Marques (1996) defendem que o planeamento estratégico promove uma
visão para o território fundamentada num diagnóstico prospectivo e numa gestão de longo
prazo, construindo uma ideia do planeamento como lugar de convergência da sociedade civil e
do Estado, promovendo a participação e as parcerias, a descentralização dos processos de
decisão e de implementação.
Oliveira (2010), citando Fonseca e Ramos (2006), aponta quatro efeitos que devem ser
estimulados por um plano estratégico: melhorar o aproveitamento dos recursos endógenos
(naturais, humanos, históricos...); reforçar as condições de atractividade e de recepção de
iniciativas de investimentos provenientes do exterior; criar, qualificar e diversificar o emprego;
fixar a população, qualificando os recursos humanos.
O planeamento estratégico tem como base um processo caracterizado por uma abordagem
integrada (económica, social, cultural, institucional), focada na procura de uma conciliação de
agentes sociais e económicos e integrando a participação da população, sendo este um factor
de mobilização. Este processo tem como objectivo a construção de um território mais atractivo
a novos recursos (população, investimentos, equipamentos, turistas, etc.) pela sua capacidade
de criar ou de explorar as suas potencialidades e de gerar processos de inovação,
reconhecendo que os agentes locais dominam melhor a realidade do seu território, dando
ênfase à descentralização e co-responsabilização na gestão de um plano. Fonseca e Ramos
(2006) salientam a flexibilidade do planeamento estratégico, como factor essencial para
enfrentar a rápida evolução da realidade territorial, num contexto de grandes mudanças e de
incertezas, defendendo “…o planeamento não pode basear-se em morosas e pesadas análises
conducentes a rigorosos diagnósticos, que levem à definição de intervenções rígidas e
infalíveis”. Neste contexto de crescente protagonismo dos actores económicos e sociais, a
governança urbana passa a ter um papel cada vez mais destacado na gestão do território
(Oliveira, 2010).
19
No que diz respeito à metodologia do planeamento estratégico, Fonseca e Ramos (2006)
apontam três grandes linhas metodológicas, das quais destaca-se a atitude prospectiva e de
cultura de avaliação do processo.
A preparação de um plano estratégico constituirá a melhor ocasião para estabelecer acordos
entre os agentes envolvidos e será um momento decisivo para a determinação e a conciliação
dos diferentes objectivos a atingir, com vista a tirar a maior potencialidade das oportunidades e
recursos existentes e a gerar, face a cenários que se pretendem alcançar.
No entanto, e de forma mais pragmática, outros autores defendem situações híbridas onde as
forças do mercado e as iniciativas públicas criam alianças e formas de parcerias dependentes
das situações locais e das conjunturas económicas: o planeamento estratégico e
oportunidades tácticas determinam o desenvolvimento dos projectos segundo os tipos de
intervenção que alternam ou combinam frequentemente processos hierárquicos ou processos
negociados (GODIER, TAPIE e CHIMITS, 2002) (Quadro 1).
Quadro 1-Modelos de planeamento in Alexandre (2003) Adaptado de GODIER, TAPIE e CHIMITS (2002).
Modelo hierárquico ou racional Modelo estratégico ou negociado
Actores
(públicos e
privados) e
Cidadãos
Domínio do poder público e dos
Estados centrais. O sector privado
é um operador. Delegação do
interesse público; o cidadão é
informado ou consultado.
Transacções e contratos entre actores
públicos centrais e locais, actores
públicos e privados. O cidadão é
“associado” e pode participar na
elaboração dos projectos.
Profissionais
Centralização das apreciações
Profissionais do urbano
dominantes (engenheiros,
arquitectos). A engenharia pública
orienta e ordena o planeamento e
os projectos em colaboração com
os peritos liberais solicitados.
Primado do planeamento.
Abertura dos sistemas de apreciações.
Integração de novas exigências:
gestão, economia, comunicação.
Difusão de um modelo empresarial na
condução das apreciações.
Pluridisciplinaridade e modo de trabalho
por projecto.
Gestão de
projectos
Papel dos procedimentos e
daqueles que os definem
(engenharia pública). Definir
soluções para as instâncias e
profissionais legítimos
(engenheiros e arquitectos).
Informar.
Organização dos intervenientes e dos
recursos em redes políticas e técnicas.
Centralidade das funções estratégicas
e de mediação. Criação de instâncias
técnico-políticas de concertação.
Estabelecer um consenso e mobilizar.
20
Quadro 1-Modelos de planeamento in Alexandre (2003) Adaptado de GODIER, TAPIE e CHIMITS (2002).
Modelo hierárquico ou racional Modelo estratégico ou negociado
Temporalidade
dos projectos
Decompor e ordenar: plano,
programa, operações. Regras
hierarquizadas e a executar no
tempo.
Responder às evoluções contextuais e
ao jogo oportunidades-ameaças de um
ambiente em mudança acelerada.
Desta forma, os sistemas de planeamento tradicionais resultantes do crescimento urbano do
pós-guerra, com uma predominância do ordenamento do território e do desenho urbano com
carácter fortemente regulador, embora válidos e necessários à pratica da administração
urbanística, têm, no entanto, grandes dificuldades em conciliar as diferentes estratégias dos
agentes que no território se poderão determinar como factores decisivos de resposta à
mudança, na medida em que:
regulamentam muito mais do que estimulam;
concentram em organismos legalmente e democraticamente definidos o papel de motor
e o poder de decisão mais do que repartem a responsabilidade na iniciativa e no
consenso;
privilegiam a modificação da estrutura construída em detrimento da actividade social,
económica e cultural da comunidade como forma de transformar a cidade;
arbitram conflitos de interesse no processo de participação mas dificilmente se
constituem como plataformas para acordos de acções a empreender conjuntamente;
impõem-se na modelação do futuro, todavia são pouco ágeis na readaptação que as
mudanças sempre exigem.
Assim, a resolução dos problemas no momento do plano, e a prevenção das ameaças futuras
que se colocam a uma cidade não podem resolver-se unicamente através de propostas
urbanísticas, sendo necessária uma política mais ampla que vise alcançar objectivos
estratégicos intersectoriais. Mas sim, através de um processo de planeamento estratégico
ambicioso sendo necessário orientar e articular as acções sectoriais e estimular o conjunto da
sociedade para alcançar os objectivos definidos. Pois, “o desenvolvimento não depende tanto
de encontrar a combinação óptima para os factores de produção, mas de saber reconhecer e
mobilizar para o próprio desenvolvimento, recursos e capacidades que estão negligenciados,
dispersos ou mal utilizados” (HIRSCHMAN, 1958, cit. em HENDERSON e MORGAN, 1999).
Ou seja, a eficiência na organização, a arte de chegar a acordos, de resolução de conflitos e a
actividade de cooperação, são primordiais em qualquer processo de desenvolvimento.
(Alexandre, 2003)
21
Além disso, considera-se o sistema urbano como um conjunto integrado, onde as localizações
físicas, as redes de infra-estruturas, os processos ecológicos e as actividades económicas e
sociais estão inter-relacionadas de forma complexa. O sistema de planeamento exige a
integração adequada dos departamentos de planeamento (físico, social e económico) de forma
a compreender o complexo sistema urbano como um todo. (Alexandre, 2003)
A ênfase no planeamento holístico sublinha que o desenvolvimento físico deve ser
acompanhado pelo desenvolvimento social e da comunidade e auxiliado pelo desenvolvimento
económico apropriado. O planeamento para alcançar a integração deste desenvolvimento
multifacetado requer uma colaboração intersectorial para conceber capacidades dos sectores
público, privado e associativo. Assim, a noção de planeamento holístico está intimamente
ligada com a noção de parceria. (Alexandre, 2003)
Este tipo de planeamento, em vez de criar planos ou procedimentos para regular os resultados
físicos, visa o desenvolvimento de um processo através do qual uma renovação sustentável e
multifacetada possa ser alcançada de forma colaborativa (Henderson & Morgan, 1999).
No novo contexto em que o desenvolvimento da cidade se coloca, a abordagem estratégica
potencia e promove a ideia de Plano ou Projecto Estratégico como projecto comum,
indispensável para enquadrar e integrar a diversidade de interesses e de campos de acção
necessários à criação de inovação e à afirmação da posição da região (Rebelo, 2000).
Quanto à metodologia correntemente adoptada no desenvolvimento dos planos estratégicos à
escala da cidade ou à escala municipal, no âmbito da bibliografia analisada, a formulação é
significativamente coincidente. Do ponto de vista metodológico, conforme refere Maria Clara
Mendes (1994) o desenvolvimento de um plano estratégico integra quatro fases, apresentando-
se de forma sistemática na Figura 2.
22
Figura 2- As quatro fases de desenvolvimento de um plano estratégico integra.
Adaptado de Maria Clara Mendes (1994)
O Programa de Consolidação do Sistema Urbano Nacional e Apoio à Execução dos PDM
(PROSIURB), foi criado através do Despacho do MPAT n.° 6/94, de 26 de Janeiro de 1994,
destinando-se a apoiar o desenvolvimento integrado de acções de infra-estruturação,
equipamento e dinamização dos centros urbanos localizados fora das áreas metropolitanas de
Lisboa e do Porto. Os destinatários deste programa são, assim, os municípios, as associações
de municípios ou instituições privadas sem fins lucrativos.
No Despacho do MPAT n.° 7/94, de 21 de Janeiro de 1994, são definidos os termos em que o
indispensável plano estratégico da cidade deve ser realizado, definindo-o como um documento
da responsabilidade municipal, que visa definir um quadro coerente de intervenções que
viabilizem uma estratégia de desenvolvimento de médio e longo prazos para determinada
cidade. No contexto programático deste documento, são expressos os objectivos gerais que
-
-
-
-
-
-
23
devem presidir à elaboração do plano estratégico, são enunciados os objectivos estratégicos
segundo os quais este deve ser estruturado e é ainda expresso um amplo conjunto de
referências que o plano estratégico da cidade deve conter.
No âmbito da análise à metodologia adoptada na formulação dos planos estratégicos, Rebelo
(2000) constata que nos casos mais representativos, nomeadamente os elaborados para as
cidades de Évora (1995), Faro (1996), Lisboa (1992) e Torres Vedras (1996), é seguida na
generalidade a mesma metodologia, podendo ainda verificar-se na formulação, a influência da
definição do conteúdo programático que deve presidir à elaboração do plano estratégico. De
forma geral, é elaborado um diagnóstico, analisado o quadro de potencialidades e de
vulnerabilidades que sustentam e justificam a formulação dos objectivos e estratégias
desenvolvidas para a cidade. O autor verifica, ainda, algumas diferenças nos termos utilizados
e no nível de estruturação adoptado, constatando uma significativa semelhança entre os
conceitos utilizados, na relação e na hierarquização estabelecida entre estes. Com efeito, em
todos os casos analisados, identifica-se a opção por uma relação de sequencialidade,
coerência e hierarquia entre objectivos dotados de algum grau de agregação, entre as
estratégias adoptadas para alcançar esses objectivos e entre os programas, acções ou
projectos correspondentes.
Na sequência desta análise Rebelo (2000) afirma ainda que a tendência, a nível nacional, que
se verificou foi o excessivo protagonismo das Câmaras neste processo, utilizando os Planos
Estratégicos como meros instrumentos de captação de financiamentos municipais, pouco
mobilizadores da sociedade civil, pois estes Planos constituíam-se como condição de acesso
aos quadros comunitários, e ao nível municipal, no âmbito do PROSIURB. Estes planos não se
têm assumido assim como instrumentos de fixação de uma carta de compromissos mútuos,
tanto para os serviços públicos e agentes económicos, sociais e culturais, como para os
cidadãos em geral.
Assim, de uma forma geral, é possível afirmar que estes planos foram elaborados com
excessiva rapidez, por conseguinte faltou-lhes a orientação de princípios metodológicos na
definição de instrumentos, agentes operadores e meios, num processo que se distingue
sobretudo pela ausência da participação dos cidadãos. Este défice de comunicação dos
cidadãos, é inibidor da sua participação activa, comprometendo aspectos fundamentais da
metodologia do processo de planeamento estratégico.
Há no entanto que reconhecer que deste processo resultou uma evolução significativa, quer
para a forma de encarar o planeamento, quer para a sua prática. Assim, identificam-se os
seguintes aspectos positivos no Quadro 2.
24
Quadro 2- Aspectos positivos com a introdução da prática dos Planos Estratégicos
A prática tradicional do
planeamento beneficiou da
introdução de alguma inovação
metodológica e dos princípios
do planeamento estratégico
adoptando-se métodos de prospectiva, de integração de
um conjunto mais alargado de factores e de componentes
críticos ao planeamento (com incidência nas variáveis
externas às áreas de influência), valorizando-se o diálogo
entre instituições e agentes e aumentaram-se as
exigências de organização
Foram também ultrapassadas
algumas limitações do
planeamento tradicional
integrando componentes não espaciais, assumindo o plano
como um processo para a resolução de problemas através
do diálogo e da participação, da criação de
complementaridades e da descentralização de
competências e responsabilidades, racionalizando-se e
valorizando-se assim os recursos
Divulgou-se uma atitude e uma
metodologia de actuação
estratégica no exercício político
do poder
elevando o nível de exigência dos cidadãos face ao
planeamento e a todos os agentes nele intervenientes
No entanto, na análise de Oliveira das Neves (1996) sobre a apropriação pela orgânica do
planeamento de base municipal dos planos estratégicos, o autor refere que há um atraso
apreciável, arriscando-se a constituir uma moda passageira, não assimilada pelos actores na
sua génese e motivação, e que poderia, por isso, prolongar a má sina do planeamento do
território em Portugal: preencher requisitos jurídico-formais de acesso a programas e recursos
financeiros ou de legitimação da gestão do uso e ocupação do solo. Neste contexto, o
florescimento do planeamento estratégico no nosso país poderia desenvolver o efeito perverso
primário de encerrar a reflexão estratégica - que viesse a ter lugar durante a fase de
elaboração - nos planos, ao invés de contribuir para a modernização dos mecanismos e
instrumentos de gestão do território.
Rebelo (2000) comenta esta perspectiva de Oliveira das Neves (1996) referindo que a
apropriação dos referenciais teóricos e da prática do planeamento estratégico pela
administração local no âmbito de um quadro integrador para racionalizar a acção pública
urbana, numa postura analítica e propositiva que teve em vista dotar a administração de
instrumentos de gestão num contexto de mudança, sobretudo da sua envolvente externa e das
vantagens competitivas que aí possam consolidar. O autor sugere, ainda, que a necessidade
de articular planeamento e gestão com um duplo significado:
25
A existência de um Plano Estratégico de Cidade
como resultado de um processo de
consensualização de objectivos entre
agentes públicos e privados, a ter
sequência em instrumentos de gestão e de
concertação institucional
concebido no contexto de mudança referido e
dando lugar a instrumentos inovadores de
gestão, deve ter sequência no domínio da
reorganização dos serviços, tanto na perspectiva
da qualificação dos serviços prestados aos
cidadãos e às empresas, como na perspectiva da
própria filosofia de estruturação interna e
funcionamento efectivo desses serviços
Rebelo (2000) destaca que esta problemática inserida num contexto actual torna pertinente e
interessa a análise a contribuição de dois aspectos essenciais ao seu enquadramento. Por um
lado a crítica à profusão e diversidade de planos e figuras de planeamento, e por outro, ao
conteúdo unificador da Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo
(LBPOTU), Lei n.° 48/98, de 11 de Agosto, no âmbito de uma intervenção unificadora, institui o
princípio da tipicidade, através do qual se estabelece que o planeamento só poderá
consubstanciar-se através de tipos de planos previstos pelo legislador.
Neste sentido torna-se importante mencionar a perspectiva de Fernando Condesso (1999): o
grande objectivo da política de ordenamento é a integração de todas as acções promovidas
pela Administração Pública, ou seja, o eixo basilar da eficácia da política de ordenamento
passa a ser a obrigação da sua integração com as outras políticas, numa exigência imposta
aos poderes públicos de integração positiva, activa (inserir as suas opções nas outras políticas)
e de integração negativa, reactiva, na vertente do princípio da precaução ou da prevenção
(evitar nas definições das diferentes políticas tomar ou executar medidas que prejudiquem os
princípios e orientações da política do ordenamento territorial).
Assim, tendo em conta os aspectos já mencionados supra sobre a validade do processo de
planeamento estratégico e os benefícios que a metodologia e os princípios que o planeamento
estratégico trazem à prática tradicional do planeamento, ultrapassando algumas das suas
limitações e divulgando uma nova atitude face ao planeamento, referidos por Oliveira das
Neves (1996) quanto à necessidade de produção de um quadro integrador para racionalizar a
acção pública no ordenamento, adopta-se nesta dissertação a mesma posição de Rebelo
(2000), ou seja, uma perspectiva unificadora, a integração dos princípios e fundamentos do
planeamento estratégico na pratica aplicada de planeamento municipal, nos campos
socioeconómicos e urbanísticos.
Pois, tal como Rebelo (2000) sugere, trata-se de desenvolver, como uma solução possível, um
modelo de integração da metodologia do planeamento estratégico e da pratica de elaboração
dos planos estratégicos municipais no contexto do processo de planeamento municipal, de
26
forma consistente e no âmbito de uma perspectiva sistémica. Ressalva-se aqui sobre este
aspecto, o significativo grau de coerência e de consistência verificado entre a formulação
utilizada nos planos estratégicos, analisados anteriormente, e a metodologia da abordagem
formal adoptada para o sistema municipal de planeamento no âmbito do presente trabalho.
De notar, que este modelo a desenvolver integra o planeamento estratégico e a metodologia de
desenvolvimento dos planos estratégicos na base do planeamento municipal. Desta forma, os
princípios do planeamento estratégico poderão assumir um papel estruturador do planeamento
municipal, contribuindo para minimizar uma administração fragmentária e casuística do
território.
27
2.4 Planeamento Municipal
Expresso em planos físicos de acção, o modelo racionalista do planeamento foi dominante na
sua pratica até ao final dos anos 60, altura em que começou a ser contestado por, entre vários
motivos, excessivo determinismo, pouca flexibilidade, incapacidade de atender à diversidade
de valores e de interesses de urna sociedade em que o social e o económico ganhavam uma
importância crescente e, finalmente, por continuar a assumir o processo racional como a única
forma válida de pensamento (Healey P. , 1990).
Na década de 70, a emergência de novas ideias neste domínio traduziu-se por alterações na
prática do planeamento associadas a transformações nas formas de intervenção dos estados
(descentralização, novos níveis de planeamento sectoriais e espaciais, criados para enquadrar
diferentes formas de governo local e regional e a participação de partidos políticos), e a uma
crise financeira e fiscal do estado que se reflectiu em novas prioridades nas despesas públicas.
Na emergente estrutura económica e institucional, o papel do técnico de planeamento e do seu
produto sofreu também alterações.
Como resultado do debate sobre a validade do racionalismo no planeamento foram enunciadas
novas abordagens menos interessadas na questão do modelo teórico a ser adoptado e mais na
eficácia da prática do planeamento. Nas questões levantadas, maioritariamente ligadas a
posições que defendiam um maior pragmatismo, era proposto dar mais atenção ao processo
de implementação, à procura do consenso e ao papel do planeamento como forma de
aprendizagem. Numerosas contribuições teóricas se seguiram, destacando-se a de Michael
Porter, 1982, que demonstrou que os métodos operacionais só davam correctamente conta de
um pequeno número de situações muito particulares, e que não passavam, portanto, de uma
parte de um todo muito mais vasto, dando ênfase ao contexto constatado para as organizações
como o principal factor explicativo da estratégia. Para este autor, no entendimento mais
simples e mais vulgar, a estratégia consiste numa política geral para alcançar objectivos
específicos.
O conceito actual de urbanismo transcende hoje o sentido estrito que a etimologia do termo
sugere, o estudo do que é próprio da urbe, da cidade, do aglomerado urbano. A conjuntura
económica, social e política, surgida após a II Guerra Mundial, vem alargar este conceito do
ordenamento da cidade, ao contexto das regiões e das nações.
Fernando Condesso, 1999, define a urbanística como o conjunto de técnicas que orientam a
criação e expansão dos aglomerados urbanos. Compreendem-se neste conjunto uma ampla
diversidade de áreas do conhecimento, como a arquitectura, a engenharia, a biologia, a
geografia, o direito, as técnicas de construção, as técnicas de planeamento ou as tecnologias
de comunicações e de transportes.
Esta compreensão mais alargada das questões urbanísticas traduziu-se em Inglaterra, no início
dos anos 40, na designação abrangente de Town and Country Planning Acts, num conjunto de
28
leis para a planificação do campo e da cidade. Também os franceses, por seu lado, a partir de
metade da década de 40, com as políticas de "l'aménagement du territoire", foram
incorporando progressivamente medidas que têm que ver com as interligações existentes entre
a planificação territorial e a económico-social, até englobarem finalmente as preocupações
ambientais.
Em Portugal, também se verificou este entendimento amplo das questões urbanísticas.
Margarida Souza Lôbo (1995), abordando o desenvolvimento do urbanismo em Portugal, no
contexto da elaboração dos planos de urbanização à época de Duarte Pacheco, refere uma
visão alargada do processo de planeamento, que envolve a estruturação administrativa e a
fundamentação legal das operações a desenvolver.
Actualmente, o urbanismo, passa por uma abordagem global e integradora de tudo o que se
refere à relação do homem com o meio físico em que se insere, e que, conforme Michael
Porter, 1980, tem o solo como recurso natural insubstituível e inexpansível, como eixo
operativo, impondo estratégias de intervenção, que seriam impossíveis sem um dado
planeamento.
De acordo com Sidónio Pardal, Costa Lobo, e Paulo Correia o urbanismo pode entender-se
como a arte e ciência de conceber a adaptação de espaços concretos do território, de forma a
criar aí condições favoráveis à instalação de comunidades humanas. O urbanismo visa assim
ordenar, planear, projectar e construir o espaço das actividades sociais, com mérito técnico e
estético.
O planeamento urbanístico surge na História como o meio de colectivamente reajustar o
processo de desenvolvimento espacial a novas formas de produção, utilização e apropriação
do espaço urbano. Duas ideias principais têm estruturado o conceito e a prática do
planeamento, a necessidade de coordenação dos diversos interesses na definição dos
objectivos de desenvolvimento e a necessidade de um programa de trabalhos e de uma
sequência hierarquizada de acções para atingir esses objectivos.
E segundo Sidónio Pardal (2000), quando o poder político tem capacidade de controlar o
processo de decisão, prevalecem os critérios e objectivos decorrentes da sua linha
programática. Se existirem condições favoráveis para o desenvolvimento do trabalho do
urbanista, este poderá então assumir a responsabilidade dos resultados, sob o ponto de vista
urbanístico, nas vertentes técnica e estética. Com um aparelho administrativo bem configurado
e enquadrado pode assegurar-se a eficiência do processo urbanístico e garantir condições de
participação pública, argumentação crítica e implementação das acções em tempo útil.
Após selecção e aprovação das soluções de plano, passa-se à sua implementação no contexto
do processo de gestão urbanística. A gestão, com as suas estratégias, é hoje um domínio que
29
tende a demarcar-se, às vezes com exageros de autonomia. A gestão deve sujeitar-se aos
objectivos programáticos e conceptuais dos planos.
Ainda de acordo com Sidónio Pardal (2000) o processo de planeamento, tal como se apresenta
na actualidade, integra seis componentes:
a realidade social e territorial concreta;
a teoria de Direito e a superestrutura jurídica e administrativa;
as bases de ordenamento que procuram o conhecimento objectivo produzido sobre
uma determinada realidade social e territorial;
os planos e os seus métodos, incluindo a sua avaliação para apoio à decisão;
a gestão urbanística e as suas estratégias que desenvolvem projectos, realizam obras
e instalam serviços;
a monitorização e o seu apoio a um planeamento flexível e dinâmico.
Os planos têm de emergir de um poder consubstanciado em princípios inerentes ao Estado de
Direito. Os conteúdos dos planos que interferem com os direitos dos cidadãos, enquanto
utilizadores de bens essenciais à sua vida e enquanto proprietários, carecem de uma
legitimidade que só pode ser garantida pela própria lei. No entanto, o conteúdo da lei, em
última instância, legitima-se pela sua racionalidade, nomeadamente no que diz respeito à sua
fundamentação urbanística e pela forma como é aplicada. A argumentação técnico-científica, a
crítica estética e a apreciação subjectiva devem ter um espaço próprio no processo de
planeamento e gestão.
O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais, nos termos das suas atribuições e das
competências dos respectivos órgãos, devem ordenar o território, ou seja, promover, de forma
articulada, políticas activas de ordenamento do território, de acordo com o interesse público e
no respeito pelos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, o que envolve a obrigação de
zelar pela efectiva consolidação de um sistema de gestão territorial e de acautelar os efeitos
que as demais políticas prosseguidas possam, aos diversos níveis, envolver para o
ordenamento do território.
A política territorial ou do ordenamento do território é enformada pelo conjunto de normas
jurídicas, planos, programas e actuações desenvolvidas pela administração pública,
reguladoras do uso do solo, com uma visão global e integrada, de modo que as acções das
entidades públicas e privadas com incidência no espaço físico sejam prosseguidas com
objectivos sociais orientados para a melhoria da qualidade de vida e bem-estar das
comunidades residentes (Condesso, 1999).
O controlo da administração pública sobre o processo de urbanização foi aumentando na
mesma medida que o ritmo de crescimento e a importância das principais áreas urbanas do
país se foi concretizando (Correia, 2002), situação que se intensificou depois da queda da
ditadura em Portugal, em 1974. Nesta altura, verificavam-se carências e deficiências em vários
30
sectores do país, especialmente no sector das infra-estruturas e habitação, e com um défice de
600 000 alojamentos. Na sequência da afirmação do poder local na Constituição da República
Portuguesa (1976), surgiu a primeira Lei de Atribuições e Competências das Autarquias Locais
(Lei 79/77), que representou um sinal claro da administração pública, no reforço progressivo da
autonomia municipal nas questões referentes ao planeamento físico (Oliveira, 2010).
A Lei n.° 48/98, de 11 de Agosto, Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de
Urbanismo (LBPOTU), visa unificar o tratamento de uma parte do direito referente à disciplina
do território. Estabelecendo os princípios e objectivos desta política, a política de ordenamento
do território e de urbanismo define e integra, com base na instituição de um sistema de gestão
territorial (composto por um conjunto coerente e racional de instrumentos prospectivos,
concretizadores da interacção coordenada dos diversos âmbitos territoriais), as acções
promovidas pela Administração Pública, para assegurar uma adequada organização e
utilização do território nacional, em ordem à sua valorização, designadamente no espaço
europeu, na perspectiva do desenvolvimento económico, social e cultural integrado,
harmonioso e sustentável do país, suas diferentes regiões e aglomerados urbanos.
A LBPOTU institui o princípio da tipicidade, através do qual impede a Administração Pública de
dar ao conteúdo planificador o continente que entende, ou seja, o planeamento só poderá
consubstanciar-se através de tipos de planos e figuras de plano previstas pelo legislador, a
quem compete escolher os nomes dos planos e definir os seus objectivos, procedimentos de
elaboração e conteúdos técnicos.
Os planos ou instrumentos da gestão territorial preconizados na LBPOTU, efectivam a
organização funcional do território, em quatro categorias distintas, de acordo com as funções
diferenciadas que desempenham, designadamente: instrumentos de desenvolvimento territorial
(IDT), instrumentos de planeamento territorial (IPT), instrumentos de política sectorial (IPS) e os
instrumentos de natureza especial (INE).
Dentro do âmbito estabelecido para o presente trabalho, num primeiro estágio de ajustamento
ao seu enquadramento municipal, a análise a efectuar incidirá apenas sobre os instrumentos
de planeamento territorial, constituídos pelos planos municipais de ordenamento do território
(PMOT), que compreendem o plano director municipal (PDM), o plano de urbanização (PU) e o
plano de pormenor (PP). Sendo instrumentos de natureza regulamentar, estabelecem o regime
de uso do solo, definindo modelos de evolução da ocupação humana e da organização de
redes de sistemas urbanos e, na escala adequada, os parâmetros de aproveitamento do solo.
É neste contexto que surge a figura do Plano Director do Município. Os primeiros planos
municipais ocorreram de 1975 a 1981, com a designação de “Concelhios” ou de “Estruturas”,
sendo caracterizados pela inexistência de um enquadramento legal, e cujo processo de
elaboração coube às equipas municipais responsáveis (Pereira, 2003). Foi precisamente com a
31
influência da experiência do PDM de Évora, cuja elaboração decorreu entre 1978 e 1981, e que
foi considerada um sucesso, que se criou o Plano Director Municipal (PDM)2.
O PDM dotou pela primeira vez as autarquias portuguesas de algum grau de autonomia no
planeamento, conferindo-lhes um papel central no processo de desenvolvimento do seu
município, definindo: “… as metas a alcançar nos domínios do desenvolvimento social do
município, nas suas relações com o ordenamento do território, é um instrumento de
planeamento, ocupação, uso e transformação do território do município pelas directrizes
sectoriais, de actividade nele desenvolvidas e é um instrumento de programação das
realizações e investimentos municipais …” (artº1)(Oliveira,2010).
No entendimento de Ferreira (2005) era um conceito demasiado avançado para o seu tempo,
revelando posteriormente pouca eficácia, várias dificuldades e escassez na sua aplicação. Em
termos gerais, Pereira (2003), aponta como causas para este insucesso o “...carácter
facultativo, a ausência de uma cultura de planeamento e a valorização da gestão quotidiana
dos problemas do momento em prejuízo de uma visão integrada de médio/longo prazo...”.
Assim, este insucesso pode ser associado ao processo per si, e à incapacidade de
Administração (autarquias e estado central) para o levarem à prática. O processo de
elaboração e aprovação do PDM era bastante complexo, moroso e burocrático, dividido em
fases rígidas, que precisavam de aprovações parcelares, quer por parte dos municípios quer
pelas Comissões Técnicas de Acompanhamento (CTA). Estas comissões tinham como
objectivo, além de harmonizar os PDM vizinhos entre si, compatibilizar estes com os objectivos
da política regional e nacional, consoante as políticas da Administração Central. No entanto,
Ferreira (2005) também considera que a sua acção revelou-se ineficaz face ao excessivo
número de membros da sua composição técnica (em média 8 a 10), além da incapacidade
técnica e pouca experiência dos funcionários face à realidade do terreno. Relativamente à
Administração Central, esta falhou na medida em que não providenciou um enquadramento
legal claro ao nível da política regional3, não dando indicações políticas balizadas e objectivas
ao plano(Oliveira,2010).
Com a entrada de Portugal na Comunidade Económica Europeia (1986), a situação do
planeamento municipal sofreu alterações, aumentando a pressão política para cobrir todo o
território nacional com planos municipais, situação que não foi cumprida com o D.L. 208/82.
Neste sentido, em 1990, é criado o D.L 69/90, regulamentando os Planos Municipais do
Ordenamento do Território (PMOT). Através deste, as antigas figuras do Plano Geral de
Urbanização (PGU) e Plano Parcial de Urbanização (PPU) dão lugar ao Plano de Urbanização
(PU) mantendo-se a figura do Plano Pormenor (PP). De salientar a importância destas duas
figuras no planeamento municipal, operando a diferentes escalas. Deste modo, o PU (escala
2 Regulamentado pelo D.L 208/82, Portaria (P) 989/82 e Decreto Regulamentar 91/82.
3 Os Planos Regionais de Ordenamento do Território (PROT) foram criados em 1983, pelo D.L 338/83, mas viria a ser
revisto pelo D.L 176-A/88, e a primeira conclusão e aprovação só aconteceu em 1991 com o PROT – Algarve.
32
1:5000) define: “… uma organização para o meio urbano, estabelecendo, designadamente, o
perímetro urbano, a concepção geral da forma urbana, os parâmetros urbanísticos, o destino
das construções, os valores patrimoniais a proteger, os locais destinados à instalação de
equipamentos, os espaços livres e o traçado esquemático da rede viária e das infraestruturas
principais …” (Artigo 9º, alínea 3) (Oliveira,2010).
A mesma figura urbanística define também as Unidades Operativas de Planeamento e Gestão
(UOPG4) que servirão de base ao desenvolvimento, enquanto o PP, actuando a uma escala
mais reduzida (escala 1:1000, 1:2000) define: “… com minúcia, a tipologia de ocupação de
qualquer área específica do município, estabelecendo no caso de área urbana a concepção do
espaço urbano, dispondo, designadamente, sobre usos do solo e condições gerais de
edificação, quer para novas edificações, quer para transformação das edificações existentes,
caracterização das fachadas dos edifícios e arranjos dos espaços livres …” (Artigo 9º, alínea 4)
(Oliveira,2010).
O PDM tem um horizonte de 10 anos (desde a sua ratificação), a partir dos quais deve ser
revisto. Para a sua ratificação é necessário integrar um conjunto de elementos fundamentais,
dos quais constam um regulamento, que é traduzido espacialmente através da Planta de
Ordenamento e da Planta Actualizada de Condicionantes. A Planta de Ordenamento “…
delimita classes de espaços, em função do uso dominante, e estabelece UOPG...” (artigo 10º,
alínea 3), enquanto que a planta actualizada de condicionantes é uma planta síntese,
resultante de várias análises parcelares, que espacializa todo o tipo de restrições (legais e
físicas) à ocupação urbana com o objectivo de salvaguarda dos valores naturais e culturais.
Esta inclui as servidões administrativas e restrições de utilidade pública, integrando áreas da
“…Reserva Agrícola Nacional e da Reserva Ecológica Nacional, áreas submetidas ao regime
florestal, áreas de protecção a imóveis classificados e as áreas integradas no domínio público
hídrico...” (artigo 10º, alínea 6) (Oliveira,2010).
As principais inovações deste diploma face ao anterior têm a ver com o aligeirar do processo
de elaboração (através do conteúdo mínimo de cada figura de plano), dispensando-se os
volumosos estudos sectoriais, e de componente sócio económica dos PDM, bem como tornar
facultativo o plano de financiamento e o programa de execução (Pereira, 2003). O objectivo
deste instrumento era um reforço das autonomias dos municípios na condução do processo
(concedendo-se autonomia aos municípios para a aprovação do PU e de PP desde que
compatíveis com o PDM ratificado), tendo como visão o novo regime da elaboração dos PMOT,
estipulado até à data de 31 de Dezembro de 1991. Esta “celeridade” política tinha, porém, um
motivo muito concreto e objectivo, nomeadamente o facto do Estado português estar sob
pressão da CEE, para a elaboração dos planos, cuja forma viria a ser exercida sob um
4 Conceito definido como uma “…porção contínua do território, delimitada em PDM ou PU para efeitos de
programação da execução do plano ou da realização de operações urbanísticas” (D. Reg. nº9 de 29/05/2009).
33
condicionamento ao acesso de fundos comunitários por parte das autarquias que não
dispusessem de PDM aprovado, em algumas medidas dos Programas Operacionais
Regionais5 (Oliveira,2010).
Tendo em conta as condições impostas, os municípios acataram naturalmente as ordens de
elaboração, aprovação e ratificação dos PDM. Porém este provou-se “muito moroso e bastante
atribulado”, tendo a grande maioria necessitado entre 3 a 5 anos6, para se tornar eficaz desde
a data da nomeação da Comissão Técnica de Acompanhamento até à publicação em Diário da
República (Alves, 2003). Tal facto pode ser comprovado pelos dados totais de aprovação dos
PDM ao nível nacional, dado que no final de 1991, 23 PDM ainda não tinham a CTA nomeada
e apenas sete municípios dispunham de PDM aprovado (mais três posteriores à lei). No final
de 1993, esse valor subiu para 34 municípios, sendo que a maior parte das ratificações
concentraram-se em 1994 e 1995 (Pereira, 2003), e em finais de 1996, mais de 250 concelhos
dos 275 do continente, tinham o seu PDM ratificado. No final da década de 90, concretizam-se
cerca de 90% dos PDM; porém, o país só estaria totalmente coberto por estes instrumentos de
planeamento com a ratificação do Plano Director Municipal de Góis, em 2003 (Oliveira,2010).
Vários autores apontam inúmeras razões e condicionantes para justificar esta demora no
processo. Portas (1995) refere a impreparação do país, quer do ponto de vista político-
administrativo, quer técnico. Enquanto outros autores debruçam-se sobre a incapacidade
técnica de vários agentes públicos, e sobre os conflitos difíceis de resolver, que surgiram com
as CTA (com exemplos de excesso de formalismos na aplicação das regras), estas
frequentemente alteravam as regras e as metodologias, obrigando as equipas municipais a
alterar muitas vezes os seus planos. Persistiam ainda problemas como cartografia inadequada,
ambiguidade nos critérios de demarcação das reservas agrícola e ecológica nacionais,
informação estatística dispersa (ou mesmo desactualizada) e sem desagregação espacial
ajustada ao planeamento municipal (Oliveira,2010).
Do lado das autarquias também havia alguma desconfiança, tendo em conta que
presumivelmente este seria um instrumento que iria condicionar as decisões do município,
diminuindo o grau de discriocinidade e de arbitrariedade destas (Alves, 2007). Por último, por
parte das empresas que elaboravam os PDM, também não existia capacidade de resposta em
relação aos compromissos assumidos contratualmente com as câmaras municipais, pois
algumas delas tinham a seu cargo a elaboração de um número elevado de PDM (Correia,
2003).
Cruz (2003) referindo Nunes da Silva (1997), critica a aplicabilidade dos PDM por várias
razões, apontou os contributos positivos no ordenamento do território, organizados no Quadro
3:
5 Incluídas no Plano de Desenvolvimento Regional 1994-99 (Despacho 62/MPAT/94, de 2/8.) e no Plano
de Desenvolvimento Regional 2002-2006 (D.L nº281/99, 14/10). 6 Uma média de 4,3 anos para a sua elaboração.
34
Quadro 3 – Factores negativos e positivos PDM da década de 90 Adaptado de Cruz (2003)
Pontos negativos Pontos positivos
A classificação e fiscalização dos espaços nem
sempre se apoiaram nas tendências do
crescimento urbano;
Contenção da admissibilidade urbanística e
do crescimento urbano em determinados
espaços;
As áreas urbanizáveis foram globalmente
sobredimensionadas;
Fomento de um maior rigor e transparência
no processo de licenciamento do uso do
solo;
A regulamentação dos espaços urbanizáveis
teve um detalhe excessivo (próprio de um PU
ou PP);
Maior uniformização de critérios de gestão
urbanística;
Os valores médios dos índices propostos não
foram enquadrados na dimensão dos
perímetros urbanos;
Existência de maior objectividade na
administração urbanística, nomeadamente
na emissão de parecer;
Alguns planos pecaram pelos demasiados
condicionalismos ou restrições impostas e uma
excessiva regulamentação;
Os PDM passam a ser os principais
instrumentos da administração urbanística.
Para o espaço urbano consolidado foram
fixadas regras e índices, mas o espaço público
(ao nível dos equipamentos e das infra-
estruturas) foi descurado;
Os objectivos do desenvolvimento estratégico
poucas vezes são claros e precisos;
Deficiente atenção aos requisitos para a sua
implementação, por exemplo, insuficiência de
orientação de política fundiária e omissão sobre
as fontes de financiamento.
A urgência imposta pelo Governo levou a uma produção “em série” de planos por parte das
autarquias, muitas vezes sem a qualidade desejável face ao tempo curto para elaboração e à
escassez de recursos técnicos, sendo poucas as que iniciaram um processo de gestão do
plano, ou seja, contínuo no tempo).
35
Posteriormente, a Lei 48/98, de 11 de Agosto, denominada “Lei de Bases do Ordenamento do
Território” (LBOTU) estabeleceu, pela primeira vez em Portugal, as bases da política de
ordenamento do território e de urbanismo (capítulo I, artigo 1). Esta lei propõe um sistema de
gestão territorial, coordenado em três âmbitos distintos, designadamente nacional, regional e
municipal, este último tem de establecer “…de acordo com as directrizes de âmbito nacional e
regional e com opções próprias de desenvolvimento estratégico, o regime de uso do solo e a
respectiva programação” (artigo 7, alínea c). O sistema de gestão territorial é também
operacionalizado através de diferentes tipos de instrumentos de gestão territorial7, destacando-
se no contexto do planeamento municipal, os instrumentos de planeamento territorial, de
natureza regulamentar, que estabelecem o regime de uso do solo, definindo modelos de
evolução da ocupação humana e da organização de redes e sistemas urbanos e, na escala
adequada, parâmetros de aproveitamento do solo (artigo 8, alínea a). Este diploma previa que
no prazo de um ano fossem aprovados os diplomas legais complementares que iriam definir o
regime jurídico dos vários âmbitos (nacional, regional e municipal), o que aconteceu em 1999,
através do D.L n.º 380/99, denominado Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial
(RJIGT) (Oliveira,2010).
Inserido no RJIGT, na categoria dos instrumentos de planeamento territorial, de natureza
regulamentar, está o PDM, que é definido como um plano que “... estabelece o modelo da
estrutura espacial do território do município, constituindo uma síntese da estratégia perseguida
de desenvolvimento e de ordenamento local, integrando as opções de âmbito nacional e
regional com incidência na respectiva área de intervenção” (art. 84º) (Oliveira,2010).
Comparando com o anterior diploma, segundo Pereira (2003:183), caracterizando as principais
diferenças afirma que: “…questões de desenvolvimento são (re)integradas, o programa de
execução e o plano de financiamento ganham de novo carácter vinculativo (mas agora apenas
integram o investimento público) e, pela primeira vez, é colocada particular atenção na
execução dos instrumentos de planeamento territorial, nas condições de revisão dos planos e
nas formas de avaliação da execução” (Oliveira,2010).
A inovação relativamente a este D.L tem a ver com o facto de a monitorização ser integrada,
pela primeira vez e de forma explícita, no processo de planeamento, através da figura do
Relatório do Estado do Ordenamento do Território Municipal (REOT-M). A câmara municipal
tem de apresentar, de dois em dois anos, à assembleia municipal (e após discussão
municipal), o REOT-M, cujo conteúdo contém a execução dos PMOT, bem como a sua
articulação com a estratégia de desenvolvimento municipal, abrindo a possibilidade de uma
eventual necessidade de proceder à sua revisão ou alteração (artº144 do D.L nº380/99). Neste
contexto, a avaliação dos níveis de execução do plano devem incidir sobre factores como:
ocupação do solo, compromissos urbanísticos, reservas disponíveis do solo urbano, níveis de
7 Instrumentos de desenvolvimento territorial, Instrumentos de planeamento territorial, Instrumentos de
natureza especial e Instrumentos de política sectorial.
36
infra-estruturação, equipamentos, acessibilidades e condicionantes. A dinâmica recente deve
ser também demonstrada através da evolução dos principais indicadores do concelho
(demográficos, económicos e sócio-culturais), bem como pela avaliação da qualidade
ambiental, nomeadamente eficácia dos sistemas de abastecimento de água, de saneamento
básico, de recolha e tratamento de resíduos, aliados a outros indicadores ambientais (Pereira,
2003).
Houve também a preocupação de abrir o processo de planeamento a outros agentes fora do
município através de alterações na composição da Comissão Mista de Coordenação (CMC),
que para além dos representantes do próprio município e de vários serviços da administração
directa e indirecta do Estado, abriu a possibilidade de participação dos representantes dos
municípios vizinhos e das organizações económicas, sociais, culturais e ambientais de maior
relevância na área do município (Oliveira,2010).
A revisão do plano (art. 98 do D.L nº380/99) apenas pode acontecer três anos após a
ratificação, e se esta acontecer antes do horizonte a partir do qual é obrigatória (10 anos),
devido a alterações não pontuais e de suspensão parciais, terá que ser necessariamente
justificada através de um relatório que aborda a avaliação da execução e a caracterização da
evolução das condições económicas, sociais, culturais e ambientais do sistema territorial
(Oliveira,2010).
A alteração ao PDM foi também simplificada, podendo ser de dois tipos: alterações simples
(regime simplificado) ou alterações mais complexas (regime mais complexo), incluindo neste
caso a revisão e suspensão do PDM e também a divulgação da informação e promoção da
participação da população e esclarecimento público. Nos últimos anos, tem-se verificado um
grande dinamismo na alteração e revisão de PDM, designados por PDM de segunda geração,
devendo-se a pelo menos a quatro ordens de factores (Alves, 2007):
a revisão tornou-se obrigatória para um elevado número de PDM ratificados no início
da década de 90;
dificuldades sentidas na elaboração dos PDM de primeira geração, quer ao nível
técnico (exemplo da cartografia) ou político (caso das indefinições em termos de
orientação aos níveis nacional e regional) foram supridas;
a elaboração de planos nacionais, regionais, especiais e sectoriais, obrigaram a
adaptações nos PDM em vigor;
as perspectivas de desenvolvimento nos municípios alteraram-se profundamente nos
últimos anos, obrigando a adaptações nos planos municipais.
Seguidamente sintetiza-se o papel dos três principais diplomas do Planeamento Municipal, no
quadro 4:
37
Quadro 4 - Evolução do enquadramento legal do Planeamento Municipal Fonte: in Oliveira (2010) Adaptado de Pereira (2003)
Decreto-Lei 208/82 Decreto-Lei 69/90 Decreto-Lei 380/99
Pontos Positivos Pontos Negativos Pontos Positivos Pontos Negativos Pontos Positivos Pontos Negativos
Inovador nos domínios conceptual e metodológico
“Desajustado” da realidade nacional
Escassez de corpo técnico (administrativo e empresas)
Insipiência da cultura de planeamento
Simplificação do processo
Carácter de obrigatoriedade para aceder a fundos comunitários foi decisivo para impulsionar o processo
Concretização generalizada dos PDM
Riscos referidos anteriormente
Maior ênfase à execução do plano
Ultrapassada a fase do mero projecto-plano
Fase de aprendizagem do
Planeamento Municipal
Consolidação do Planeamento
Municipal
Posteriormente às referencias temporais enunciadas, ocorreram alterações ao RJIGT,
nomeadamente através do D.L nº 316/2007, de 19 de Setembro, e do D.L 46/2009, de 20 de
Fevereiro. A alteração do primeiro decreto-lei aconteceu pela necessidade de modificar o
conteúdo material dos PU e dos PP, bem como do regime da dinâmica dos instrumentos de
gestão territorial em geral. As principais alterações desse decreto-lei passam pela
reclassificação do solo, integração da avaliação ambiental estratégica, alteração no processo
de acompanhamento e de aprovação, bem como a alteração da justificação da revisão
(Oliveira,2010).
Deste modo, a reclassificação do solo, nomeadamente de solo rural para solo urbano, passa a
ter carácter excepcional, limitando-se aos casos comprovadamente necessários para a
expansão populacional e ao desenvolvimento económico e social. Destaque ainda para a
integração da Avaliação Ambiental Estratégica, através da produção de um Relatório Ambiental
conforme consagrado no D.L n.º 232/2007, de 15 de Junho, com o objectivo de analisar os
efeitos ambientais durante as várias fases de execução dos instrumentos de gestão territorial
(i.e. elaboração, acompanhamento, participação pública e aprovação). Por fim, ao nível do
processo de acompanhamento (Portaria n.º 1474/2007, de 16 de Novembro), as CA deixam de
integrar os representantes de interesses económicos, sociais, culturais e ambientais
(Oliveira,2010).
Quanto ao D.L 46/2009, de 20 de Fevereiro, alterou o RJIGT, nomeadamente na temática da
suspensão dos PMOT, com o intuito de aumentar a responsabilização e autonomia dos
municípios pelas suas opções em matéria de ordenamento do território e de urbanismo
(Oliveira,2010).
38
Devido a esta mudança, foi constatada a necessidade de proceder a alterações em matérias
relacionadas, caso da anulação das ratificações de medidas preventivas. No entanto, esta
política não significou um retrocesso dos poderes do Estado Central, já que este optou também
por um reforço da participação das Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional
(CCDR), através da previsão da emissão de pareceres nos procedimentos de suspensão dos
planos municipais de ordenamento do território e no estabelecimento de medidas preventivas
(Oliveira,2010).
A recente evolução do quadro legal no âmbito municipal, alarga as competências e a
capacidade de intervenção das autarquias, municípios e freguesias, no desenvolvimento
socioeconómico e na transformação do território, exigindo o correspondente aumento
qualitativo e quantitativo das acções de planeamento, gestão e controlo municipais. O âmbito
do planeamento municipal é, por definição, um âmbito complexo, multifacetado, global. Deste
âmbito fazem parte a própria complexidade dos fenómenos socioeconómicos e territoriais,
percebidos na sua dinâmica, de forma não sectorial, e encarados numa perspectiva de acção
transformadora das relações sociais e respectivos espaços, de resolução progressiva dos seus
problemas (Rebelo, 2000).
De uma forma exaustiva e sistemática, no âmbito de diversos estudos de base sobre o
planeamento municipal, Luz Valente Pereira (1986) por analogia com o exercício da acção
política pelos autarcas, definiu o processo de desenvolvimento do Planeamento Municipal
através de várias etapas, que se passa a listar:
conhecer o município;
definir objectivos e políticas para a acção;
pensar nas estratégias adequadas para as cumprir;
estabelecer múltiplos contactos para conhecer o município e o contexto regional e
nacional em que este se insere;
procurar vias de solução para os problemas ponderando a possibilidade de se
efectivarem diferentes acções, negociando condições e apoios, estimando meios e
recursos (estudo de soluções em função dos recursos, meios, prioridades, níveis de
qualidade exigíveis);
tomar decisões, reajustar objectivos, políticas e estratégias em função dos resultados
obtidos nas múltiplas consultas e negociações;
exprimir e justificar as decisões em planos e programas de actividades a serem
cumpridos em prazos mais ou menos dilatados;
procurar executar as acções planeadas e programadas, tomando as iniciativas
necessárias;
avaliar os resultados e introduzir correcções aos diferentes níveis de decisão e
execução e prosseguir os contactos para manter actualizado o conhecimento do
município.
39
No âmbito desta descrição, toda esta actividade se vai incrementando continuamente e sem a
rigidez deste faseamento, isto é, as diferentes fases não são estanques, estão presentes e em
elaboração ao longo do exercício do processo de planeamento. Em todos os municípios, de
forma mais ou menos organizada, tendo em conta apenas alguns ou o conjunto dos aspectos
do desenvolvimento e do ordenamento do território, com maior ou menor rigor, existem práticas
de planeamento municipal, no mínimo as que são traduzidas pela elaboração obrigatória do
Plano de Actividades e do Orçamento, elementos de gestão municipal indispensáveis à
execução legal e administrativa das acções municipais.
No entender de Rebelo (2000), dada a extrema complexidade e importância das questões que
estão envolvidas no planeamento municipal e a multiplicidade e diversidade dos agentes
sociais em presença, internos ou externos ao município, há por um lado uma ausência de
organização formal do planeamento municipal, e por outro, falta à autarquia o suporte
necessário para o cumprimento dos objectivos que estão subjacentes aos interesses públicos a
prosseguir. Uma limitação, que de forma corrente é apontada à eficácia da prática do
planeamento municipal, consiste na tendência para uma abordagem desintegrada entre a
actividade de planear e de produzir planos e o contexto prático da actividade municipal. Pode-
se assim concluir, que na prática, tem-se confundido a actividade do planeamento com a
actividade de produzir planos.
No entanto, o mesmo autor (Rebelo, 2000) identifica que a maior incidência da orientação da
actividade municipal restringe-se à gestão financeira para resolver os problemas prioritários e
satisfazer as necessidades imediatas. Na maior parte das situações, observa-se uma ausência
de uma orientação planeada, confinando-se a acção pràtica à resolução de problemas
imediatos, com maior ou menor rigor de programação.
A actividade de planeamento municipal, ao formalizar-se, deve desenvolver um processo
idêntico à prática desejada, como condição de que o processo de planeamento sirva para
planear e também, cumprir o planeamento.
Em conclusão, conceito sobre o planeamento municipal deve ser entendido como uma prática
contínua de construção social, de desenvolvimento e de estruturação do território que se traduz
pelo desenvolvimento de um processo no tempo, e não como uma mera actividade de
produção de planos. Esta perspectiva implica que o processo de planeamento deverá dispor de
uma organização formal, sistémica e integrada (Rebelo, 2000).
40
2.5 Componente Estratégica no Planeamento Municipal
De forma geral os modelos de análise estratégica efectuavam o diagnóstico do território
identificando o que constituía as suas forças e as fraquezas, de maneira a apresentar a sua
competência distintiva, e os elementos sobre os quais ela tinha interesse em basear a sua
estratégia face à concorrência. No contexto exterior importa analisar as ameaças e as
oportunidades susceptíveis de afectarem a organização, de modo a identificar as variáveis
estratégicas próprias do domínio de actividade escolhido. Mediante a aproximação, efectuada
de modo iterativo, da análise interna e da análise externa, por vezes analisada de acordo com
a metodologia do quadro SWOT podia-se então definir o conjunto das opções abertas ao
município e operar neste campo uma escolha da visão a alcançar.
A complexidade do conceito de estratégia, anteriormente referida, foi de forma bastante
expressiva analisada por Mintzberg (1994) que para compreensão e definição do termo,
enunciou diversas abordagens ao conceito, a saber:
a estratégia como um plano, o que equivale a uma orientação, a um guia ou um curso
de acção para o futuro;
a estratégia como padrão, ou seja como a consistência do comportamento ao longo do
tempo;
a estratégia como posição, determinando certos produtos em mercados específicos,
por exemplo;
a estratégia como perspectiva, na maneira da organização fazer as coisas, no conceito
que a organização faz de sua actividade.
A aplicação do planeamento estratégico aos territórios surge na década de 80, do século
passado e encontra-se, sobretudo, ligada às cidades enquanto motor do desenvolvimento
urbano mas, simultaneamente, palco das principais condicionantes da mesma. Esta
complexidade do sistema urbano está associada com as transformações e os desafios
colocados ao seu desenvolvimento e que obrigam a uma mudança de atitude face ao
planeamento territorial. Estas transformações são sintetizadas por Guell (1997) nos seguintes
pontos:
o dinamismo da conjuntura, reflexo das mudanças económicas, políticas, inovações
tecnológicas, atitudes socioculturais e alterações das estruturas sociais que exercem
uma forte pressão nos instrumentos tradicionais de planeamento, impõe respostas
adequadas;
a exigência, por parte dos actores sociais e económicos, de requisitos de habitabilidade
e competitividade como condição para a sua permanência numa dada área, obrigou os
decisores públicos a considerar as suas exigências e a torná-los parte intrínseca do
processo de decisão;
41
a globalização e a abertura dos mercados comerciais potenciou a rivalidade entre
cidades na obtenção de investimentos, postos de trabalho, turistas e ajudas públicas,
reivindicando às cidades grande capacidade de antecipação e de reacção perante as
actuações estratégicas das suas adversárias mais directas;
a complexidade e a inter-relação entre os problemas urbanos impõem abordagens
multidisciplinares e intersectoriais que ultrapassam a abrangência dos instrumentos de
planeamento sectoriais.
Rodrigues (2005) sintetiza a evolução da aplicação do planeamento estratégico aos territórios
analisando a forma como a mesma se efectuou, as situações conjunturais e os resultados
obtidos nas experiências analisadas. Apresenta-se no quadro 5 uma sistematização do
entendimento do autor.
Quadro 5 - Evolução da aplicação do planeamento estratégico aos territórios
Fonte: Adaptado de Rodrigues (2005)
Localização Data Marco
São Francisco 1981 O planeamento estratégico de cidades surge pela primeira vez
Esta iniciativa foi do sector privado que, aquando da crise fiscal e económica da cidade,
sem contar com o apoio da Administração Local, organizou o Plano da cidade com o
objectivo de melhorar os impostos a partir do reforço do sector habitacional que permitiu
aumentar a densidade, concentrar sedes de empresas no centro da cidade e deslocalizar
para a periferia as actividades mais "pesadas", ao mesmo tempo que o sistema de
transportes colectivos foi reestruturado para responder à nova estrutura urbana
O êxito deste plano despoletou um surto de outros, em mais de 25 cidades norte-
americanas (por exemplo, Los Angeles, Filadélfia, Detroit) que vão já na sua segunda e
terceira revisão, apoiados e difundidos em grande escala.
Europa Década 80 O processo foi mais lento e iniciou-se com o planeamento
estratégico sectorial
Embora com a lacuna de ausência de participação activa e efectiva dos actores urbanos,
mas teve um bom exemplo na transformação do porto de Roterdão no principal centro
logístico europeu e a conseguinte devolução dos espaços obsoletos à cidade
Birmingham 1986 Marca a aplicação do planeamento estratégico na Europa de
forma estruturada
Através da canalização de fundos da Comunidade Europeia para o desenho da
transformação estratégica da cidade (Pujadas, Font, 1998).
42
Quadro 5 - Evolução da aplicação do planeamento estratégico aos territórios
Fonte: Adaptado de Rodrigues (2005)
Localização Data Marco
Esta levou à criação de uma nova centralidade em redor de equipamentos e estruturas, à
reabilitação de áreas obsoletas, à reconversão de solo industrial qualificado para a
instalação de novas actividades a par de estratégias de apoio e formação profissional e
de integração racial (Esteve, 1999).
Barcelona 1988-1992 O primeiro Plano Estratégico de Barcelona é também um marco
do planeamento estratégico na Europa
Pela metodologia de elaboração adoptada, seguida por um conjunto de outras cidades
que o sucederam. Com o seu Plano Estratégico (já na sua terceira revisão) a cidade foi
capaz de encontrar a sua própria singularidade, de crescer em competitividade e de
aumentar a qualidade de vida dos seus cidadãos
O exemplo de Barcelona foi seguido por outras cidades e regiões espanholas, onde a
elaboração de planos estratégicos se difundiu como forma de resposta às alterações dos
territórios e de afirmação global. São disto exemplo as cidades de Madrid, Bilbao,
Valência e Málaga (Esteve, 1999).
Portugal 1992 as primeiras iniciativas de planeamento estratégico foram
implementadas em Lisboa e em Évora
No primeiro caso como resultado de uma opção política que levou à conclusão do Plano
Estratégico de Lisboa em 1992; no segundo, na sequência do envolvimento da cidade no
Projecto Speyer ao abrigo do programa RECITE (Regiões e Cidades Europeias) que
conduziu sua apresentação dois anos depois do de Lisboa (Fonseca, Ramos, 2004).
Portugal 1994 A sua regulamentação é efectuada na sequência do Programa
PROSIURB
Tinha como objectivos o desenvolvimento de centros urbanos com um papel estratégico
na organização do território nacional, dotando-os de equipamentos e infra-estruturas de
apoio ao dinamismo económico e social. O alvo deste programa foram as cidades
médias fora das áreas metropolitanas, estando a cargo dos municípios a execução dos
respectivos planos. O acesso a fundos da Administração Central era condicionado pela
existência de um PDM eficaz e de um Plano Estratégico.
Portugal Actualidade
Este processo continua, embora padecendo de alguns males, de que ressaltam a excessiva protagonização
do processo por parte dos Municípios, a débil participação pública e a ausência de suportes regulamentares
e enquadramento legal e financeiro que permitam a sua afirmação como instrumento de fixação de uma
carta de compromissos mútuos entre a Administração e os administrados (DGOTDU, 1996).
43
Quadro 5 - Evolução da aplicação do planeamento estratégico aos territórios
Fonte: Adaptado de Rodrigues (2005)
Localização Data Marco
Em contrapartida, evidenciou progressos na forma de encarar o planeamento urbano, de seguida
aprofundados, nomeadamente: introdução de uma nova abordagem metodológica e de princípios de
planeamento estratégico, exigência do diálogo entre instituições e actores e integração de componentes não
espaciais no planeamento (DGOTDU, 1996).
Verifica-se, assim, que não há uma definição universal de planeamento estratégico, pois, tal
como Nicolau (2001) refere, o conceito de estratégia é "multidimensional e situacional e isso
dificulta uma definição de consenso", no entanto, verifica-se alguma convergência em relação
aos objectivos e pressupostos de base que importa evidenciar do conjunto de definições de
planeamento estratégico.
Seguem-se os entendimentos deste conceito de autores considerados relevantes.
Guell (1997) define-o como uma forma sistemática de controlar as mudanças e de criar o
melhor futuro possível para a cidade, ou seja, como um processo criativo que aponta as bases
de uma actuação integrada a longo prazo, estabelece um sistema contínuo de tomada de
decisões que comporta risco, identifica rumos de acção específicos, formula indicadores de
monitorização sobre os resultados e envolve os agentes sociais e económicos no processo.
Outro entendimento é o de Fonseca e Ramos (2004): o planeamento estratégico promove uma
visão para o território, fundamentada num diagnóstico prospectivo e numa gestão de longo
prazo, constrói uma ideia de planeamento como lugar de convergência da sociedade civil, do
Estado e dos mercados, promovendo a participação, as iniciativas em parceria e a
descentralização do processo de deliberação, decisão e implementação.
Para Esteve (1999) o planeamento estratégico não pode ser entendido como um ritual
metodológico mas como um processo flexível, destinado a dotar a cidade de uma estratégia
consistente que lhe proporcione notoriedade e singularidade e, sobretudo, o comprometimento
dos principais actores urbanos isto é, aqueles que têm capacidade para transformar a cidade.
Por último, para Lopes (1998) o sistema de planeamento estratégico tem como objectivo
principal a coordenação dos vários níveis e funções estratégicas de uma organização num
projecto global. Este autor considera quatro pontos principais: a missão (o que queremos
fazer/onde queremos chegar), as estratégias (como chegar lá), o orçamento (o que podemos
fazer) e o controlo (como medir o andamento do processo).
44
De acordo com Rodrigues (2005) no espectro de definições apresentadas surge a estrutura
basilar do planeamento estratégico:
construção de uma visão de futuro conjunta para o território;
atitude pró-activa e não reactiva na abordagem dos problemas e questões que se vão
colocando;
participação da sociedade como alicerce para a cooperação e responsabilização na
construção de um futuro comum;
importância dos meios e recursos para a implementação da estratégia definida;
avaliação e monitorização permanente dos resultados obtidos na implementação.
O planeamento estratégico é um esforço de mobilização eficiente e direccionada de recursos
(físicos, humanos, financeiros, políticos) para a definição de objectivos, acções e projectos com
efeitos concretos no território. O seu objectivo principal é, assim, o de conseguir a transposição
da visão individual do cidadão para uma moldura global em que o conjunto é apercebido como
parte e responsabilidade de todos (Lopes, 1998) .
De facto, a abordagem estratégica "potencia e promove a ideia de Plano ou Projecto
Estratégico como projecto comum, indispensável para enquadrar e integrar a diversidade de
interesses e de campos de acção necessários à criação de inovação e à afirmação da cidade"
(DGOTDU, 1996: 28). A cooperação e negociação entre os diversos actores, públicos e
privados, torna-se crucial para a obtenção de consensos e para o atingir do futuro desejável do
território em causa.
Um processo de planeamento estratégico baseado na mobilização institucional e social
alcançará, em termos de desenvolvimento territorial, resultados mais positivos que um
processo dependente de uma única entidade (Leandro, 2004). Simultaneamente, procura-se
"atenuar a planificação centralizada (e imperativa) dando uma maior importância às entidades
descentralizadas, que conhecem melhor a realidade local e que podem agir mais rapidamente"
(Fonseca, Ramos, 2004: 2).
Num processo desta natureza está também implícita a noção de avaliação permanente das
mudanças para que sejam formuladas as melhores estratégias de intervenção em cada
momento concebendo-se o território como um meio inovador (Fonseca, Ramos, 2004). 0
planeamento estratégico, ao promover a constante auto-avaliação, "está aberto à reformulação
ditada pelo timing da execução face às mudanças da envolvente" potenciando uma abordagem
que "deverá ser sistémica, identificando a inter-relação entre os diferentes sistemas e sub-
sistemas, variáveis e factores de regulação" (DGOTDU, 1996: 28).
Deste modo, Guell (1997) considera como principais características do planeamento
estratégico:
45
visão a longo prazo e de carácter plurilegislativo, isto é, a estratégia para um território
leva anos e mesmo décadas a ser alcançada, pelo que deve ser entendida como um
projecto comum e independente de legislaturas políticas;
importância da conjuntura e dos factores exógenos ao território em questão, pela
assumpção de que os mesmos têm implicações na forma como o território se
desenvolve;
visão integral da realidade urbana, considerando os factores físicos, económicos,
sociais e políticos, numa tentativa de aumentar a competitividade e a qualidade de vida
de forma concreta e integrada;
flexibilidade nas decisões para abordar problemas com um elevado grau de incerteza e
que não podiam ser previstos no início do processo;
concentração de esforços em temas críticos, oportunidades e problemas potenciando a
reflexão sobre as questões essenciais do desenvolvimento e progresso do território;
envolvimento e participação dos actores sociais e económicos na concretização da
visão futura do território sendo fulcral para a promoção da cooperação público-privada;
orientado para a acção, isto é, procura a concretização das medidas propostas através
da mobilização de actores e recursos e da tomada de decisões;
exigência da modernização do corpo técnico e político da administração traduzida por
um elevado grau de motivação e qualificação, uma diminuição dos processos
burocráticos e a capacidade de coordenação e dinamização da sociedade.
O planeamento estratégico assume a importância de actuar sobre as condições
socioeconómicas do desenvolvimento urbano e não apenas sobre as suas consequências,
criando as bases para promover o desenvolvimento económico (de competitividade, de
consumo e qualidade de vida, de atracção de funções, de decisão, de negociação e de
mobilização), orientando-se por princípios de cultura de transformação urbana e de
desenvolvimento sustentado (DGOTDU, 1996).
Por constituir um programa de acção que envolve escolhas e opções políticas, tem de encarar-
se a vertente política do processo, mas também o esforço de mobilização da sociedade para a
sua concretização. Consequentemente, a cooperação público-privada é determinante para a
coordenação de acções individuais ou comunitárias num processo de procura de implantação
de objectivos consensuais que permitam alcançar a visão conjunta do território (Lopes, 1998).
A caracterização do planeamento estratégico realizada permite retirar conclusões sobre as
vantagens e os riscos da sua aplicação. A maioria dos autores (Guell, 1997; Lopes, 1998;
Esteve, 1999; Fonseca, Ramos, 2004) reconhece a superioridade das vantagens sobre as
desvantagens que apresenta, mas é necessário não esquecer as segundas, para o mesmo ser
realizado de forma consciente e informada.
Uma das principais mais-valias desta forma de planeamento é a sua perspectiva dinâmica e
interactiva na forma de abordar as questões urbanas, fazendo apelo à participação e ao
46
diálogo de todos os agentes intervenientes no território, o que os torna um instrumento
essencial no diagnóstico dos problemas, na formulação de objectivos e orientações, permitindo
a tomada de decisões em torno de projectos estruturantes e sustentados (Fonseca, Ramos,
2004).
Vários autores (Guell, 1997; Lopes, 1998; Esteve, 1999) enfatizam as vantagens da aplicação
do planeamento estratégico:
a definição de prioridades, diferenciando as acções estratégicas urgentes;
a concentração de energias nos objectivos chave que permitem a passagem da
situação actual para a possível e desejável;
o aumento da objectividade à medida que os diagnósticos proporcionam informação
válida e fiável, potenciando a concentração no essencial;
a sistematização de objectivos para o território permitindo a identificação de formas de
nele intervir, a racionalização da actuação dos agentes territoriais e o ganho de
perspectiva sobre o mesmo;
o estímulo ao diálogo e à cooperação entre os sectores público e privado como
garantia do cumprimento das estratégias definidas;
a criação de uma cultura estratégica, baseada na cooperação público-privada e na
participação da sociedade, na construção de uma visão comum de desenvolvimento
que permitirá o seu prolongamento temporal ao longo da implementação do processo;
o reforço da liderança da administração local, e mais concretamente do município, pela
capacidade de conduzir um processo de gestão integrada da cidade baseado em
objectivos concretos capazes de mobilizar a sociedade;
a identificação do uso efectivo dos recursos e dos fundos públicos e maior facilidade na
obtenção dos mesmos, na medida em que procura o financiamento necessário para a
concretização das estratégias adoptadas baseada em decisões e objectivos
consensuais;
A multiplicação das vantagens num horizonte temporal alargado e que se estendem à
sociedade como um todo em como consequência ganhos de eficiência e produtividade que
permitem uma aceleração do seu desenvolvimento económico e social.
No entanto Esteve (1999) enuncia os riscos que o planeamento estratégico aponta a sua não
concretização, pelo enfoque na elaboração e não na implementação do Plano:
a percepção das realizações inferior às expectativas geradas, o que pode criar
insatisfação quando as mesmas não são apercebidas de forma correcta;
a definição de objectivos muito genéricos e eliminando o debate para a coesão da
sociedade e para o traçar do seu caminho comum;
a politização do processo, transformando-o numa operação de propaganda política e
47
a minimização dos custos da execução do plano estratégico que podem resultar num
trabalho precário em termos de definição de objectivos estratégicos apropriados e na
correcta articulação entre a iniciativa pública e privada.
Aos riscos acima identificados Lopes (1998) acrescenta:
a definição incorrecta do território a ser alvo de intervenção, que pode conduzir a
acções desligadas da realidade e a não contemplar as partes relevantes para o seu
desenvolvimento;
a confusão entre planos estratégicos e planos urbanísticos que, embora partindo de
informação de base comuns, apresentam especificidades pela diferença de objectivos,
formas de elaboração e implementação, espaços temporais e visões de
desenvolvimento;
a participação pública reduzida ou a passiva pode conduzir ao insucesso do processo
pela falta de mobilização em torno de objectivos comuns;
uma deficiente comunicação e divulgação que conduz à limitação do conhecimento
essencial para a obtenção de consensos significativos, e o risco de não implementação
pela falta de um compromisso firme dos actores envolvidos para a sua concretização.
As críticas tecidas por Guell (1997) ao planeamento estratégico de cidades, nos últimos anos,
prendem-se com:
o desenvolvimento através de projectos pontuais e fechados em si, em vez do seu
entendimento como processo circular e continuo;
e o ênfase na competitividade económica e a diminuta atenção conferida ao
desenvolvimento sustentável e a utilização corrente do planeamento estratégico que
tem que ser complementada com os processos tradicionais de planeamento físico,
económico e social, estabelecendo a ponte entre a Administração Pública e as
entidades privadas.
Rodrigues (2005) ressalva que apesar das críticas apresentadas, os benefícios geram
consenso generalizado desde que sejam garantidos aspectos como a definição de objectivos
claros, uma vontade política de concretização e rigor técnico em todo o processo de
desenvolvimento estratégico. Com o planeamento estratégico integram-se as componentes
não espaciais no planeamento e assume-se o plano como um processo para a resolução de
problemas através do diálogo e da participação, da criação de complementaridades e da
descentralização de competências e responsabilidades, obtendo deste modo, a diminuição dos
custos e a valorização dos recursos.
48
2.5.1 Enquadramento Legal
No âmbito da componente estratégica no planeamento municipal destacam-se três
documentos legislativos que abordam esta temática:
Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo
Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial
Avaliação Ambiental Estratégica
Segue-se a análise dos mesmos, focalizando apenas a referência à componente estratégica,
salvaguarda-se o facto das duas disposições legais LBPOTU e o RJIGT já terem sido referidas
e analisadas anteriormente.
Lei de Bases da Política de Ordenamento do Território e de Urbanismo
A Lei n.º 48/98, de 11 de Agosto, com a primeira e única alteração na Lei nº. 54/2007, de 31 de
Agosto, estabelece as bases da política de ordenamento do território e de urbanismo. Este
documento apresenta, aquando da caracterização do sistema, a imposição da definição de
uma estratégia no âmbito municipal, de acordo com o as directrizes já explicitadas nos planos
de hierarquia superior (Artigo 7.º alínea 2- c))
Determina ainda, na caracterização dos instrumentos de gestão territorial a estrutura espacial,
Artigo 9.º alínea 2- a), que a classificação básica do solo (bem como parâmetros de ocupação,
considerando a implantação dos equipamentos sociais, e desenvolve a qualificação dos solos
urbano e rural, estabelecida no plano director municipal) tem como base a estratégia de
desenvolvimento local.
49
Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial
O Decreto-Lei nº. 2/2011, de 06 de Janeiro, que procede à última alteração ao Decreto-Lei nº.
380/99, de 22 de Setembro, que estabelece o regime jurídico dos instrumentos de gestão
territorial, como já referido anteriormente, após a 6ª alteração (DL n.º 46/2009 de 20 de
Fevereiro), permite um significativo incremento da responsabilização municipal associada à
simplificação de procedimentos, nomeadamente, através da alteração do regime aplicável à
ratificação dos planos municipais de ordenamento do território.
Tendo em conta o carácter deste decreto-lei segue-se uma análise mais pormenorizada deste
documento, no entanto, uma vez que são inúmeras as referências que este regime jurídico faz
à componente estratégica dos IGT, sublinham-se apenas as referências que dizem respeito ao
âmbito desta dissertação:
Princípios gerais
Artigo 8.º 2 — Os instrumentos de gestão territorial asseguram a
harmonização dos vários interesses públicos com
expressão espacial, tendo em conta as estratégias de
desenvolvimento económico e social, bem como a
sustentabilidade e a solidariedade intergeracional na
ocupação e utilização do território.
Os dois artigos
enfatizam a
apresentação de uma
estratégia articulada
com os interesses
públicos com expressão
territorial
Artigo 20.º
1 — A articulação das estratégias de ordenamento
territorial determinadas pela prossecução dos
interesses públicos com expressão territorial impõe ao
Estado e às autarquias locais o dever de coordenação
das respectivas intervenções em matéria de gestão
territorial.
Relação entre os instrumentos de âmbito nacional ou regional e os instrumentos de âmbito
municipal
Artigo 24.º
1 — O Programa Nacional da Política de
Ordenamento do Território e os planos regionais
definem o quadro estratégico a desenvolver pelos
planos municipais de ordenamento do território e,
quando existam, pelos planos intermunicipais de
ordenamento do território.
Consigna a articulação
com estratégias já
explicitadas em planos
de hierarquia superior,
de acordo com o
mencionado na
LBPOTU - Artigo 7.º
alínea 2-c)
50
Planos municipais de ordenamento do território
Artigo 70.º
Os planos municipais de ordenamento do território
visam estabelecer:
a) A tradução, no âmbito local, do quadro de
desenvolvimento do território estabelecido nos
instrumentos de natureza estratégica de âmbito
nacional e regional;
b) A expressão territorial da estratégia de
desenvolvimento local;
Estes três artigos são
especificamente para
os PDM e são
referentes
(respectivamente) aos
objectivos, ao objecto e
ao conteúdo material.
Relativamente aos
objectivos do plano,
sublinha-se a
expressão de
estratégias de âmbito
territorial superior para
o território em causa.
No Artigo 84.º
correspondente ao
objecto dos PDM
explicita que é esta
figura de plano que
deve estabelecer a
estratégia de
desenvolvimento
territorial.
E por fim, no que diz
respeito ao conteúdo
material o RJIGT
reforça que esta
tipologia de IGT deve
definir as estratégias e
objectivos de
desenvolvimento
estratégico para
contextos mais
específicos.
Artigo 84.º
1 — O plano director municipal estabelece a estratégia
de desenvolvimento territorial, a política municipal de
ordenamento do território e de urbanismo e as demais
políticas urbanas (…)
2 — O plano director municipal é um instrumento de
referência para a elaboração dos demais planos
municipais de ordenamento do território e para o
estabelecimento de programas de acção territorial,
bem como para o desenvolvimento das intervenções
sectoriais da administração do Estado no território do
município, em concretização do princípio da
coordenação das respectivas estratégias de
ordenamento territorial.
Artigo 85.º
1 — O plano director municipal define um modelo de
organização municipal do território nomeadamente
estabelecendo: (…)
d) Os objectivos de desenvolvimento estratégico a
prosseguir e os critérios de sustentabilidade a adoptar,
bem como os meios disponíveis e as acções
propostas; (…)
f) A identificação das áreas e a definição de
estratégias de localização, distribuição e
desenvolvimento das actividades industriais, turísticas,
comerciais e de serviços;
g) A definição de estratégias para o espaço rural,
identificando aptidões, potencialidades e referências
aos usos múltiplos possíveis; (…)
51
Avaliação Ambiental Estratégica
A Directiva Europeia 2001/42/CEE, vem estabelecer o quadro legal de enquadramento da
Avaliação Ambiental de certos planos e programas a nível europeu. Esta Directiva mantém em
aberto a abordagem a tomar face à Avaliação Ambiental, não a dirigindo a Avaliações
Ambientais de base estratégica (AAE), a directiva induz claramente a abordagem AIA, mas não
impede outras abordagens.
De acordo com o estabelecido no Decreto-Lei n.º 232/2007 de 15 de Junho, com alteração no
Decreto-Lei n.º 58/2011, de 4 de Maio, que transpõe para a ordem jurídica nacional a Directiva
Europeia, a Avaliação Ambiental Estratégica constitui-se como um elemento de carácter
obrigatório na realização dos planos, estabelecendo o “regime jurídico da avaliação dos efeitos
de determinados planos e programas no ambiente”. Este diploma mantém aberta a abordagem
conceptual a adoptar, no entanto não refere explicitamente no corpo do Decreto que a
avaliação seja de abordagem estratégica.
No entanto, de acordo com Partidário (2007) a AAE é um instrumento de avaliação de impactes
de natureza estratégica cujo objectivo é facilitar a integração ambiental e a avaliação de
oportunidades e riscos de estratégias de acção no quadro de um desenvolvimento sustentável.
As estratégias de acção estão fortemente associadas à formulação de políticas, e são
desenvolvidas no contexto de processos de planeamento e programação. Listam-se, assim, os
principais objectivos:
contribuir para um processo de decisão ambiental e sustentável;
melhorar a qualidade de políticas, planos e programas;
fortalecer e facilitar a AIA de projectos;
promover novas formas de tomar decisão.
A metodologia de AAE que é descrita no Guia de boas práticas para Avaliação Ambiental
Estratégica- APA, também redigido por Partidário, adopta uma abordagem estratégica assente
numa perspectiva de longo prazo, holística, transversal e muito focalizada em poucos, mas
significativos, factores de análise que são estratégicos para a decisão. O âmbito da AAE inclui
aspectos de natureza física, ecológica, social, cultural e económica, na medida em que são
relevantes para determinar a qualidade da envolvente em que se vive.
Desta forma a AAE tem um papel preponderante na componente estratégica dos planos, uma
vez que apresenta uma abordagem estratégica fortemente ligada ao conceito de ciclo de
decisão. Tal como Soares (2008), adaptando de Partidário, afirma: este conceito de ciclo
estabelece uma noção de continuidade em que decisões estratégicas (de prioritização,
planeamento, escolha ou execução) são tomadas sucessivas vezes ao longo de um processo
de planeamento e programação, em momentos críticos do processo de decisão (janelas de
decisão). O desenvolvimento de novas estratégias resulta de uma reflexão da análise, ainda
52
que informal, de estratégias anteriores, face a cenários de evolução e a objectivos prioritários,
influenciando assim o ciclo seguinte de planeamento ou programação. Esta noção de
continuidade é crucial em AAE, e consequentemente nos planos, uma vez que o seu objecto
de avaliação é um processo contínuo e iterativo.
Assim, a AAE constitui-se como um elemento estratégico do plano, em particular, do plano de
escala municipal, uma vez que induz à adopção de abordagens estratégicas no plano.
Os factores motivadores de impacte, em AAE, são as opções estratégicas de desenvolvimento,
correspondentes a modelos de desenvolvimento territorial, económico e social, e objectivos e
metas definidos à luz de uma visão de longo prazo, apoiando-se num quadro de grandes
opções de desenvolvimento que permitam atingir esses mesmos objectivos e metas.
De acordo com Soares (2008), citando Dalal-Clayton e Sadler (2005), a AAE tem tido uma
evolução muito rápida a nível mundial e a sua prática actual é muito diversificada,
apresentando abordagens metodológicas variadas consoante seja mais influenciada pela
prática da avaliação de impacte ambiental (AIA) de projectos, ou por processos estratégicos de
planeamento e de avaliação de políticas. Estas abordagens metodológicas têm resultados
diferentes relativamente à capacidade da AAE influenciar a decisão estratégica.
53
3 Estudo de Casos
Num tema recente e vasto como o que se apresenta, corre-se o risco de não o abordar na sua
plenitude e deixar de fora questões importantes na delimitação do problema, com vista a
beneficiar a análise das matérias tratadas, deste modo dar-se-á ênfase à forma como os
municípios entenderam e interiorizaram o processo de inclusão da componente estratégica e
como resolveram metodologicamente as suas premissas, não incluído questões que se
prendem com a sua avaliação face aos objectivos nos quais os planos se propunham actuar,
ou seja, o objectivo deste estudo prende-se mais com a comparação de processos e
metodologias adoptadas e não com uma avaliação que qualificaria o melhor plano e a
respectiva prática.
Como já foi referido o estudo de casos é referente aos planos municipais em vigor de Vila
Franca de Xira e de Pisa. Considerou-se relevante esta amostra Vila Franca de Xira, visto que
é um município que já concluiu a revisão do PDM, encontrando-se assim, em vigor o PDM de
segunda geração contendo as novas exigências legais, nomeadamente a introdução da
componente estratégica explicita no plano e a realização da AAE. E Pisa visto que é uma
cidade comparável pelas suas características fisiográficas e demográficas ao Município de Vila
Franca de Xira, apresentando-se como um caso de referencia no que diz respeito ao
Planeamento Estratégico visto que realizou um Plano Estratégico discricionário.
A exposição dos casos de estudo foi dividida em três etapas:
apresentação dos municípios
enquadramento dos planos e
identificação das componentes estratégicas
54
3.1 Apresentação dos Municípios
3.1.1 Vila Franca de Xira
De acordo com o site do município de VFX, com base no Anuário Estatístico de 2010, o
concelho contém 144 123 habitantes residentes, distribuídos pelos seus
317,7Km2 ,representavam uma densidade populacional de 453,7 hab/km
2
O município de Vila Franca de Xira é um dos 19 concelhos que compõem a Área Metropolitana
de Lisboa (AML), contribuindo em grande medida para que esta constitua o principal centro
polarizador de actividades, fluxos e emprego, ao nível nacional.
Importa destacar que Vila Franca de Xira se situa num território onde confluem realidades
geográficas bastante distintas, contactando com outros municípios com dinâmicas e estruturas
socioeconómicas muito diferenciadas, induzidas, seja face a Lisboa, seja pela presença de
eixos de transporte com significado regional ou supra-regional, seja, ainda, pelos sectores
motrizes das economias locais.
Concelho que integra características urbanas e rurais, a sua localização permite-lhe usufruir de
um valioso património natural: o rio Tejo, a Reserva Natural do Estuário do Tejo, as Lezírias as
diferentes características topográficas.
Figura 3- Inserção geográfica de Vila Franca de Xira na sub-região da Grande Lisboa e na AML
Fonte: DGA, Atlas do Ambiente; Tratamento – Plural in ANÁLISE E DIAGNÓSTICO Caderno I – Introdução, Enquadramento e Contexto Regional e Metropolitano Volume I
55
3.1.2 Pisa
De acordo com o site Guida ai Comuni, alle Province ed alle Regioni d'Italia, com base no
ISTAT8, Pisa contém 88 217 habitantes residentes, distribuídos pelos seus 185,10 Km
2
representavam uma densidade populacional de 476,59 hab/km2
O município (comune) de Pisa está localizado, na província Pisana, na região de Toscana que
por sua vez se situa na Itália central. A maioria do seu território assenta na planície aluvial do
rio Arno e uma pequena porção do rio Serchio. Do ponto de vista altimétrico é importante
salientar que apesar da maior parte da extensão do município se localizar na planície do rio
Arno, Pisa contém vastas áreas de cota negativa (inferior ao nível médio das águas do mar) e
em oposição contém também os Monti Pisani e a Colline Livornesi, assim, a estrutura de Pisa é
composta por dois sistemas distintos e espacialmente separados: o urbano agregado e o
sistema costeiro.
Pisa é também o lar de uma Universidade cuja história remonta ao século XII, posicionada com
uma das melhores Escolas Superior de Graduação em Itália, em determinadas áreas
científicas. Destaca-se este facto pois tem como consequência a existência de dinâmicas
demográficas de cariz diferenciado, uma vez que há um fluxo de grande expressão por parte
dos alunos que vêm de diversas partes do país e que apenas habitam na área durante os
ciclos de estudo.
Figura 4- Inserção geográfica do município de Pisa na Província de Pisa Fonte: http://www.smart.toscana.it/contenutiportale/marketinginsediativo/6_info_territoriale/VisurePS.aspx
8 Istituto nazionale di statistica – 01/01/2011
56
3.2 Enquadramento dos planos e identificação das componentes
estratégicas
Uma vez que são planos distintos e realizados de acordo com contextos territoriais e legais
diferentes, optou-se por não se executar uma análise segundo uma abordagem sistémica, em
que se iriam comparar os dois planos, segundo os critérios relevantes para ambos os casos,
em oposição realizou-se uma análise focada nas particularidades de cada plano, no âmbito do
tema da dissertação.
3.2.1 Plano director Municipal de Vila Franca de Xira
Os Planos Municipais de Ordenamento do Território, tal como definidos pelo RJIGT, são
instrumentos de natureza regulamentar (Art.º 69º) estabelecendo, o PDM, a “estratégia de
desenvolvimento territorial, a política municipal de ordenamento do território e de urbanismo e
as demais políticas urbanas, integrando e articulando as orientações estabelecidas pelos
instrumentos de gestão territorial de âmbito nacional e regional e estabelecendo o modelo de
organização espacial do território municipal” (Art.º 84º).
O Plano Director Municipal de Vila Franca de Xira foi ratificado pela Resolução do Conselho de
Ministros n.º 16/93, publicada no Diário da República, n.º 64, I Série-B, de 17 de Março de
1993,e foi alterado por deliberação da Assembleia Municipal de Vila Franca de Xira de 15 de
Dezembro de 2000, publicada no Diário da República, II Série, n.º 201, de 30 de Agosto de
2001, e parcialmente suspenso através da Resolução de Conselho de Ministros n.º 43/2004,
publicada no Diário da República, I Série-B, n.º 78, de 1 de Abril de 2004, para permitir a
construção do novo Hospital de Vila Franca de Xira, torna-se necessário proceder à sua
revisão.
Destacam-se cinco objectivos dos dezassete enunciados no Caderno I- Introdução,
Enquadramento e Contexto Regional e Metropolitano, das Peças Escritas da referida revisão:
1. Proceder à compatibilização do Plano com Estudos e outros planos de âmbito estratégico
tais como o Plano Estratégico do Concelho de Vila Franca de Xira, o Plano de
Desenvolvimento Turístico e o Plano Estratégico de Ambiente do Concelho de Vila Franca de
Xira;
2. Proceder à articulação do PDM, nesta sua 1ª revisão, com os Instrumentos de Gestão
Territorial hierarquicamente superiores que abrangem o concelho, nomeadamente com o
Plano Regional de Ordenamento da Área Metropolitana de Lisboa - de acordo com o Artigo 7.º
alínea 2-a) da LBPOTU, bem como o Artigo 24.º alínea 1 do RJIGT, que consignam a
articulação com estratégias explicitadas em planos de hierarquia superior;
57
3. Especificar um modelo estratégico de actuação que estabeleça acções distintas para a
promoção de um desenvolvimento sustentado do concelho, tendo em atenção a sua
diversidade territorial e as mudanças operadas nos últimos anos- de acordo com os Artigos
70.º e 84.º do RJIGT, que declaram que esta figura de plano deve estabelecer a estratégia de
desenvolvimento territorial;
4. Prever estratégias que permitam que se caminhe no sentido de libertar a zona ribeirinha,
particularmente, da ocupação industrial, promovendo assim a criação de espaços de recreio e
lazer que se coadunem com o disposto no PROTAML para esta área- de acordo com o Artigo
7.º alínea 2-a) da LBPOTU, bem como o Artigo 24.º alínea 1 do RJIGT, que consignam a
articulação com estratégias explicitadas em planos de hierarquia superior;
5. Proceder à adequação do Plano e das suas disposições à legislação que consagra a
elaboração de PMOT, em particular de PDM- de acordo com o Artigo 7.º alínea 2-a) da
LBPOTU, bem como o Artigo 24.º alínea 1 do RJIGT, que consignam a articulação com
estratégias explicitadas em planos de hierarquia superior.
No Relatório de Proposta - 1ª revisão do PDM- VFX é reforçada a ideia que esta revisão tem
como princípio que o Concelho e o seu ordenamento se devem desenvolver em
compatibilidade, não só com os planos e orientações de âmbito nacional, regional e sectorial,
mas também, com os estudos e planos de âmbito de municipal com carácter estratégico (Plano
Estratégico, Plano de Desenvolvimento Turístico, Plano Estratégico do Ambiente e Estudo de
Acessibilidades e Plano de Desenvolvimento Logístico).
E por isso, a estratégia de desenvolvimento do Concelho, da 1ª revisão do PDM de VFX ,
decorre das conclusões e opções materializadas no Plano Estratégico do Concelho que
constituem a base das propostas de Ordenamento.
O referido Plano Estratégico identificou um conjunto de desafios que se colocam ao Concelho
perante os quais constituiu uma base metodológica de resposta positiva, no sentido de que tais
desafios se constituam como janelas de oportunidade para a criação de uma nova dinâmica de
desenvolvimento e de afirmação de Vila Franca no contexto regional, nacional e comunitário.
Estes são os domínios de actuação estratégica para VFX num horizonte de médio prazo:
LED 1: Reforçar a coesão social e territorial - Vila Franca de Xira, Município Solidário
LED 2: Criar condições necessárias ao desenvolvimento sustentado da economia - Vila
Franca de Xira, Município Competitivo
LED 3: Produzir e difundir inovação - Vila Franca de Xira, Município Inteligente
58
LED 4: Valorizar o património natural e cultural - Vila Franca de Xira, Município com
Identidade
LED 5: Promover a reorganização dos espaços urbanos e consolidar as novas áreas de
expansão - Vila Franca de Xira, Município de Qualidade
Conforme o mesmo Relatório, as Linhas Estratégicas de Desenvolvimento identificadas e os
projectos previstos são considerados de forte pertinência e oportunidade quando analisadas à
luz da visão estratégica e dos objectivos globais e específicos de desenvolvimento previstos
para a Região de Lisboa e Vale do Tejo e, em particular, para a Área Metropolitana de Lisboa,
consubstanciados no Programa Operacional da Região.
De notar, ainda, que os objectivos e as acções estruturadas ao abrigo do Plano Estratégico de
Vila Franca de Xira foram definidos tendo como pano de fundo os grandes desafios que se
abrem não só ao Concelho, como a envolvente metropolitana, estando sempre subjacente a
ideia da sua necessária e óbvia integração em sistemas territoriais mais amplos e em
complexidade crescente.
É, ainda, neste mesmo documento (Relatório de Proposta - 1ª revisão do PDM de VFX), que é
feita a análise de compatibilização entre a estratégia e o ordenamento. Neste âmbito, é referido
que o Objectivo Central que o Plano Estratégico definiu para o desenvolvimento do Município
foi: “Vila Franca de Xira: um concelho de Qualidade renovada, Porta Norte da Área
Metropolitana de Lisboa”
Na sequência do Objectivo Central, o Plano Estratégico define as Linhas Estratégicas de
Desenvolvimento, as LED são agrupadas da seguinte forma:
As LED 2 e 3 enquadram acções de consolidação do dinamismo económico e captação
de investimentos;
As LED 1, 4 e 5 convergem para a promoção da qualidade urbana e ambiental.
A concretização das LED passa por um conjunto de vectores de desenvolvimento (VD) de
carácter estruturante, condicionadores das opções a tomar, a saber:
VD 1 - Actividade Industrial e Logística
VD 2 - Informação e Inovação
VD 3 - Desenvolvimento Turístico
VD 4 - Dinâmica Urbana
VD 5 - Qualidade de Vida
E verificado que o Plano Estratégico não define nenhum, vector de desenvolvimento (VD)
eminentemente ambiental e do solo rural. Consideramos portanto, que o ambiente é
transversal a todos os vectores e que os aspectos relacionados com o solo rural estão patentes
precisamente no último vector (qualidade de vida).
59
Também foi realizada uma análise da concretização da estratégia de desenvolvimento para o
concelho no ordenamento e regulamentação do plano onde foram identificadas acções que o
Plano Estratégico define para cada Vector de Desenvolvimento, as Linhas de Desenvolvimento
Estratégico com as quais cada vector se relaciona e as propostas ou opções da revisão do
PDM que os concretizam. Constata-se que alguns dos vectores, ou das acções que a eles
reportam, nomeadamente o V2,que não tem uma materialização directa do ordenamento.
Relativamente às imposições legais da AAE, ressalva-se que a 1ª revisão do PDM de Vila
Franca de Xira foi iniciada em 1997 tendo os primeiros elementos sido entregues à Comissão
Técnica de Acompanhamento em 1999 (Comissão Técnica de Acompanhamento da 1ª revisão
do PDM-VFX , 2008). Considerando que apenas dez anos depois se tornou legalmente
obrigatória a Avaliação Ambiental de planos e programas (Decreto-Lei n.º 232/2007, em
conjugação com a nova redacção do RJIGT, Art.º 152º, que obriga a Avaliação Ambiental
antecipada dos planos cuja elaboração não tivesse terminado à data de publicação) e que,
portanto, a revisão do plano não foi sujeita a Avaliação Ambiental antes disso, facilmente se
conclui que a AAE não acompanhou as fases primordiais de concepção da visão e estratégia
para o município. De facto, em 2008, quando tem início a AAE, a 3ª versão da proposta de
plano encontrava-se em fase final de elaboração tendo já sido concretizados o Regulamento e
as Plantas de Ordenamento e de Condicionantes, além dos demais elementos de diagnóstico e
de acompanhamento da proposta.
Considera-se, ainda, relevante mencionar que este caso foi um dos primeiros PDM sujeito a
AAE, sendo por isso um caso pioneiro, no entanto, uma vez que a intervenção da AAE foi
tardia no processo de planeamento, procurou-se analisar os resultados do processo de AAE, a
sua interacção com o processo de planeamento e a sua influência sobre a decisão face a este
desafio. Neste sentido, verificou-se que foi no âmbito da realização da AAE que foram
identificados factores considerados fundamentais no processo de decisão, na concepção de
opções estratégicas do plano e das acções que as implementam, estes factores a considerar,
com materialização no ordenamento são:
Estruturação e Requalificação Urbana;
Valorização Ambiental;
Ruralidade;
Ligação/Interface com o Rio;
Emprego e a Qualificação Humana.
60
3.2.2 Piano Strutturale - Comune di Pisa
Relativamente ao quadro legal que este plano se insere é importante referir que o Piano
Strutturale - Comune di Pisa está em conformidade com a Legge Regionale 16 Janeiro 1995, n.
5, que define o sistema do ordenamento do território e planeamento urbano inicialmente
definido pela lei urbanística de 1942.
De acordo com o quadro para a política de planeamento regional e local o Governo Regional
da Toscana promoveu uma iniciativa que visava "preparar directivas e orientações para a
coordenação supramunicipal dos instrumentos de planeamento" para as áreas de Livorno e
Pisa. O desejo de proceder a esta iniciativa foi reafirmado por uma "decisão" da Giunta
Regionale em 1986, e um grupo técnico especialmente designado produziu, assim, uma
variedade de materiais, juntamente com outras contribuições, são dadas na Conferência para a
coordenação do planeamento territorial de Livorno - Pisa, que aconteceu a 30 de Junho 1 de
Julho de 1988.
Posteriormente, são produzidos e apresentados em 1990 "Lineamenti dello schema strutturale
per l'area Livorno - Pisa", que poderia levar ao desenvolvimento de um novo quadro estrutural,
a ser aprovado pelo Conselho Regional como um quadro regional para a coordenação local,
que acabou por não ter sido realizado. Os objectivos traçados por este documento são no
âmbito do zonamento de áreas de características diferentes, sem conferir o carácter
estratégico.
Em 1991, a província de Pisa decidiu começar a elaborar um Plano Provincial Espacial, este
documento é dividido em três etapas sequenciais e inter-relacionadas:
o desenvolvimento de uma metodologia geralmente acompanhada por um princípio de
funcionamento do programa, que é aprovado pelo Conselho Provincial em 1992;
a preparação do anteprojecto, que é aprovado pela Câmara Municipal em 1994;
a versão final do plano, que está substancialmente concluída em 1995.
De notar, que no âmbito deste plano são definidos objectivos mais relacionados com gestão e
governança.
Em 1994, é proposto o desenvolvimento de um novo sistema regulador que possa fornecer,
para além desses objectivos, a atribuição de padrões de planeamento adequado e execução
de obras de infra-estrutura.
Deste modo, à luz do planeamento tradicional, a Proposta do Piano Strutturale - Comune di
Pisa é centrada apenas na mitigação dos riscos geológicos, hidráulicos e ambientais;
recuperação e requalificação urbana e mobilidade.
Uma vez que as normas legislativas relativas à Avaliação Ambiental Estratégica (AAE) que
fazem a transposição da Directiva 2001/42/CEE da Directiva 85/337/CEE, alterada e integrada
61
com a Directiva 97/11/CE, foram apenas aplicadas em 2006. O Piano Strutturale - Comune di
Pisa não realizou AAE, não obstante de ter sido realizado um documento com os “elementi per
la valutazione degli effetti ambientali” (Artt 5, 24,. 32- L.R. 5/95),em que não estão presentes
quaisquer contribuições de cariz estratégico para o município.
No entanto, em 2001, a Comune de Pisa publica o Regulamento Urbanístico, onde são
publicados as opções estratégicas de natureza funcional, que estão associados às opções no
âmbito das infra-estruturas e de natureza física.
Apesar de ainda não ser ter realizado a revisão deste plano municipal, em 2005 Pisa iniciou a
Realização de um Plano Estratégico, que veio a ser aprovado em 2008, a par de um
documento de Analisi del Posizionamento Competitivi dei Settori Strategici della Provincia di
Pisa, e de um Piano di Marketing Territoriale della Provincia di Pisa.
A produção deste último documento tem duas premissas importantes, são elas: nos relatórios
diagnóstico foram utilizando dados completamente novos e originais, que subverteram o
entendimento inicial daquele território, e a introdução de um novo elemento o como, isto é, para
mudar, como mudar, de acordo com uma compreensão mais profunda, e a abordagem para os
problemas.
Salienta-se que, como abordagem inovadora foi introduzida uma nova escala de análise, uma
unidade não definida administrativamente, mas que fazia sentido nesta metodologia em que se
via a unidade territorial como um sistema da área Pisana, assim entende-se como "Área de
Pisa" a cidade de Pisa, os municípios de Calci, House, St. Julian, Vecchiano e Vicopisano.
Este Plano está dividido em três partes: Definição de linhas estratégicas, objectivos a serem
alcançados para cada linha estratégica e acções necessárias para atingir os objectivos. Esta
estrutura que se traduz em 7 linhas estratégicas para um total de 27 objectivos e cerca de 80
acções .
A versão final do Plano, de facto, tem em conta as características de Pisa - seus pontos fortes
e fracos, riscos e oportunidades, incluindo uma participação alargada pelas partes
interessadas, públicas e privadas, que formam o tecido da sociedade tendo Pisa.
Destacam-se assim as linhas estratégicas:
necessidade e oportunidade de um governo metropolitano;
as escolhas de planeamento urbano e desenho da nova cidade;
a primazia da educação, ciência, pesquisa;
a revitalização da estrutura cultural;
a promoção, as prioridades e os recursos da saúde;
a nova imagem do Pisa no mercado de turismo;
desenvolvimento económico da tradição à inovação.
62
É de realçar, ainda, que foi realizado o exercício de relacionar os subsistemas da cidade e da
sociedade em complementaridade com as LE:
a) o sistema de educação em todos os níveis, a começar desde a infância, com a obrigação de
continuar e terminar com a de pós-graduação especialização
b) a identidade, a qualificação do espaço urbano no sentido de descoberta e desenvolvimento
de personagens e vocações áreas específicas e bairros da cidade
c) o sistema de redes para a transmissão de informações e o interlocutor direto e imediato (a)
dos cidadãos e empresas em conjunto com instituições e serviços públicos e (b) dos centros de
governo entre eles.
d) o sistema de assentamentos em Pisa (Pisa da área comum) que, por causa da boa
qualidade, não constituem um "puro" em vez de os subúrbios e são um factor de auto-restrição
do sistema Galileo.
63
4 Conclusões
4.1 Síntese dos conceitos
De acordo com o que foi referido inicialmente, o entendimento dos conceitos abordados nesta
dissertação é diverso e constitui frequentemente objecto de opiniões contraditórias, assim,
apresentam-se, de uma forma muito sintética, os conceitos chave deste tema, aglutinando a
multiplicidade de concepções, perspectivas e premissas contidos no entendimento de cada um
destes conceitos.
O planeamento caracteriza-se por uma atitude de empenhamento, baseada na antecipação, a
finalização e a vontade. Implica o exame antecipado de um conjunto de problemas e de
acções, com possibilidade de conduzir, mais segura e eficazmente, aos resultados pretendidos,
do que decisões tomadas pontualmente, uma após outra. Determina de modo explícito um
estado desejado, ou desejável, num dado horizonte, e considera necessário desenvolver
acções para atingir esse estado, que não está inscrito no curso natural das coisas. Se bem que
também voltado para o futuro, o planeamento distingue-se nitidamente da mera previsão. A
atitude de empenhamento diferencia-o da programação, que exprime uma sequência de
acções precisamente determinadas na sua natureza e na sua data. A imagem de programa,
procede de uma representação do objecto no seu contexto e da ideia de que o futuro é
perfeitamente previsível. O planeamento justifica-se quando leva em conta um conjunto
suficientemente vasto de problemas, sendo eles próprios largamente independentes, e para os
quais se torna impossível um tratamento simultâneo. A unidade na qual o processo de
planeamento se desenrola não é necessariamente a organização na sua globalidade, já que se
pode considerar que esta é susceptível de ser dividida em conjuntos suficientemente
independentes.
A estratégia é um conceito decorrente originalmente da ciência militar e refere-se
genericamente ao estudo e planeamento de meios para atingir objectivos políticos. Pode ainda
ser entendido como o conjunto de acções consideradas como meios importantes para a
consecução de objectivos (Academia das Ciências de Lisboa, 2001). Ainda de acordo com
Mintzberg (1994) as abordagens estratégicas em política e planeamento não se destinam a
tentar saber o que pode acontecer no futuro, mas sim atentar planear e guiar acções que
constituam caminhos possíveis para um futuro desejável.
O planeamento estratégico, assume-se como um processo de análise (contém um diagnóstico
que procede a uma analise externa, ou seja, identifica as ameaças e oportunidades que a
envolvente fornece e a uma analise interna, identificando nomeadamente os pontos fracos e
fortes com que a cidade se depara), de decisão (envolve a selecção de objectivos a atingir) e
de acção (propõe a forma como esses objectivos são atingidos - operacionaliza os objectivos),
capaz de gerir oportunidades, mudanças e contingências e de contrariar estrangulamentos e
fragilidades, com vista a tirar partido das potencialidades existentes. Assume-se ainda, como
64
um processo prospectivo (visa a criação de um futuro melhor), participado/negociado (contribui
para a actuação articulada dos intervenientes), contínuo e flexível (obriga a procedimentos
sistemáticos e acompanhamento das acções). Neste contexto os planos estratégicos são
entendidos como o documento formal que traduz a estratégia assumida e cuja elaboração
permite encetar o processo de planeamento estratégico.
Relativamente aos planos Municipais, em particular ao PDM, este é entendido como o modelo
de estrutura espacial do território municipal, constituindo uma síntese da estratégia de
desenvolvimento e ordenamento local prosseguida. De entre o vasto conteúdo material
preconizado, estão referidos os objectivos a prosseguir, os meios disponíveis, as acções
propostas, a identificação das áreas e a definição de estratégias de localização, distribuição e
desenvolvimento das actividades industriais, turísticas, comerciais e de serviços, a definição de
estratégias para o espaço rural.
Actualmente, é efectuada alguma avaliação e reflexão sobre a experiência do que têm
representado os Planos Directores Municipais, é corrente o entendimento de que estes planos
não traduzem efectivas políticas urbanas municipais, isto é, não traduzem opções, objectivos,
medidas e acções. Muitos dos planos directores municipais, transformados em documentos
sem estratégia e sem programa, constituem apenas a síntese das situações existentes, o
registo do existente, em vez de se constituírem somo agentes de transformação e de
desenvolvimento dos municípios, numa perspectiva de prosseguimento e concretização das
estratégias municipais.
A mistura de conteúdos tem sido uma prática sistemática devido, em grande parte, à falta de
disciplina e de clareza na arrumação dos conceitos. A separação dos conteúdos formais dos
planos, particularmente os que são objecto de normas imperativas, dirigidos à sua gestão e
realização, deverá ser necessariamente compatível com a exploração de relacionamentos
entre todos os planos que partilham o mesmo território ou tratam de territórios com relações de
vizinhança. É corrente a carência no âmbito do conteúdo dos planos directores municipais, da
explicitação clara dos fins públicos e dos objectivos a prosseguir. Regra geral, os objectivos
confundem-se com as finalidades e são expressos de forma muito geral. Este quadro estende-
se à explicitação das estratégias adoptadas, que para além de escassamente referidas, não
envolvem nunca a explicitação dos meios e recursos afectos à sua execução.
A ausência de um quadro conceptual assumido e uma estruturação deficiente dos princípios de
planeamento municipal, junta-se por vezes a existência de conteúdos deslocados, podendo o
próprio plano constituir um entrave ao desenvolvimento. Esta situação não é inédita na História
do planeamento nacional. Conforme referido por Margarida Souza Lôbo, 1996, a propósito dos
planos de urbanização à época de Duarte Pacheco, impossibilitando a legislação da altura a
aplicação de uma efectiva política fundiária, privando os municípios dos instrumentos
necessários, estes experimentam dificuldades inultrapassáveis para implementar os seus
planos, manifestando a sua completa incapacidade para combater os efeitos perversos dos
65
planos. A construção surge na periferias das áreas abrangidas pelos planos, não se
desenvolvendo os aglomerados propriamente ditos.
A transição dos sistemas de planeamento tradicional, fortemente radicados no ordenamento do
território, para métodos com componentes estratégicas de planeamento, é uma transição
sempre controversa e vulnerável. Com efeito, o planeamento estratégico destacando-se da
prática do planeamento urbano como processo de planeamento autónomo, apresenta, por
vezes tendências para o desvalorizar, subestimando a sua importância, determinante no
processo de desenvolvimento urbano.
Por outro lado, o planeamento estratégico advindo de um conjunto de metodologias de gestão
empresarial, situa-se num quadro concorrencial em que as questões relacionadas com a
concorrência são dominantes, em detrimento de questões como a solidariedade e a equidade.
Verifica-se, assim, a tendência para privilegiar como interlocutores os agentes económicos,
desvalorizando-se a participação dos agentes sociais, culturais ou ambientais.
“Por um lado, imaginar (e, sempre que possível, controlar por processos científicos) o que vai
acontecer de uma forma durável num domínio determinado; esse trabalho de imaginação tem a
ver com a capacidade de diminuir a incerteza e conseguir encontrar fenómenos dificilmente
previsíveis, como a ruptura, a mudança, a transformação e a descontinuidade (…) Por outro
lado, ser um instrumento que ajude à tomada de decisão, estando intimamente ligada numa
atitude política de agir” (Brissos, 2004:47).
O planeamento estratégico nunca veio a preencher as expectativas criadas e ainda hoje muitos
autores analisam as causas deste facto. De acordo com Mintzberg (1994) esta razão prende-se
com o equívoco entre dois conceitos, o pensamento estratégico e o planeamento estratégico,
bem como em erradamente ter-se assumido que o segundo pressupõe o primeiro. O
planeamento estratégico, tal como veio a ser praticado veio geralmente a anular o pensamento
estratégico, causando a confusão da visão estratégica com a manipulação de dados. Quase
sempre, o planeamento estratégico veio a articular estratégias e a legitimar decisões políticas
que já existiam. Esta pratica do planeamento estratégico veio a provocar uma reflexão crítica
que pôs em causa os seus fundamentos Gary Hamel e C. K. Prahalad (1994) referem também
no âmbito desta tónica, a necessidade de substituição da exclusividade dos planos
estratégicos, pela sua complementaridade com o desenvolvimento de uma arquitectura
estratégica, de uma envolvente estratégica, que resistisse à dinâmica de mudança, cada vez
mais rápida e imprevisível
É indispensável encontrar novas formas de assegurar um padrão de equilíbrio para o
desenvolvimento socioeconómico. O planeamento e em particular a metodologia do
planeamento estratégico situam-se no âmbito desse esforço.
A abordagem a alguns aspectos, amplamente discutidos na actualidade, é suficiente para o
demonstrar. Existem com certeza poucas dúvidas que o consumo de energia deve ser
66
reduzido, no sentido de evitar o esgotamento dos recursos não renováveis. Existem, com
certeza várias formas de reduzir o consumo de energia, mas um adequado processo de
planeamento do território, é uma das formas mais eficazes.
O aspecto mais óbvio situa-se no sector dos transportes. Sendo usual tomar a política de
transportes unicamente como o meio e a forma de se aceder do local A ao local B, esta política
não pode deixar de abordar também, a temática da relação da localização de A, face a B. O
planeamento envolve-se no entanto, quase só com os problemas de acomodação do tráfego,
na presunção de que o número de carros irá aumentar e que o processo de planeamento
deverá apenas considerar o inevitável.
É esta presunção que se tem de alterar, recuperando e desenvolvendo o potencial do processo
de planeamento estratégico. A promoção de um sistema de transportes públicos é
seguramente indispensável, mas a estrutura urbana terá que ser planeada por forma a que a
necessidade de mobilidade dependente do uso do automóvel seja reduzida, não sendo este
uso tão necessário às deslocações de trabalho ou de lazer.
Não se pode confrontar de uma forma absoluta um tipo de transporte com outro,
nomeadamente opinar sobre a vantagem de optar pelo transporte colectivo ou individual. Mas
em certas situações em que há uma massa crítica de população concentrada, pode optar-se
por um desenho urbano que favoreça a utilização do transporte público. Não estão aqui em
causa opções individuais nem valores culturais ou factores educativos, o que está mesmo em
causa são configurações urbanísticas confrontadas com a eficiência dos seus sistemas de
transportes.
Embora o planeamento seja mais encarado como uma defesa, contra o que as pessoas não
querem mas têm a percepção que pode acontecer, este deverá ser mais entendido como um
instrumento de acção, como um meio de promover e não de resistir à mudança.
A forma mais adequada de efectuar decisões coerentes nos domínios da habitação,
transportes, economia local, consumo de energia, remoção e tratamento de resíduos sólidos,
etc., é providenciando um mecanismo que, exercendo-se de forma democrática, tenha em
consideração a visão alargada e a longo prazo que a comunidade local necessita, mas que o
mercado por si só não pode assegurar. Esse mecanismo é o planeamento estratégico,
desenvolvido no enquadramento do processo municipal de planeamento.
67
4.2 Análise dos Casos
Considera-se que os dois planos são incomparáveis não só pelo contexto legislativo e territorial
a que se inseriam, mas acima de tudo pela evolução que desenvolveram, enquanto que o
PDM-VFX entra em vigor em 2009 e tem como base o estudo estratégico de 2003, o Plano de
Pisa entra em vigor em 1995 e posteriormente realiza o Plano Estratégico, aprovado em 2008.
Considerando que o planeamento estratégico adopta urna metodologia com três características
essenciais: entendimento do plano, enquanto processo, integração de instrumentos de
prospectiva no equacionar do futuro e participação pública, como elemento chave da
elaboração e implementação do plano, verifica-se que o Plano Estratégico de Pisa incorporou
na sua plenitude estas premissas.
Relativamente ao PDM-VFX, entende-se que o actual enquadramento legal coloca a tónica no
PDM enquanto síntese da estratégia de desenvolvimento local prosseguida, pelo que exige
uma concepção do Plano, onde a gestão, a execução e a monitorização, a par com a
participação da comunidade assuma o seu papel enquanto partes intrínsecas do processo de
planeamento a ser operacionalizadas através de uma nova abordagem metodológica.
Deste modo, a proposta metodológica do planeamento estratégico permite dar o salto
qualitativo pretendido na Revisão dos PDM por responder às principais questões a que o
diploma legal em vigor e a própria gestão municipal exigem:
Plano-processo: A nova concepção do PDM enfatiza o plano-processo ao invés do Plano
enquanto produto final, na medida em que do Plano faz parte intrínseca a gestão, não se
esgotando deste modo o planeamento no Plano. Consequentemente, afirma-se o planeamento
enquanto acção continua, interactiva e flexível isto é, assume-se o seu carácter circular
estando em permanente avaliação, integrando as diversas componentes que constituem o
sistema territorial dado que a actuação numa tem implicações nas restantes e dotando-se de
capacidade de resposta aos desafios e oportunidades imponderáveis aquando da sua
elaboração.
Visão de desenvolvimento: O planeamento estratégico tem como objectivo o traçar de uma
visão de desenvolvimento que traduza o futuro desejável para o território e a sua comunidade.
Este esforço de antevisão e antecipação do futuro é conseguida através da introdução de
mecanismos de prospectiva, como sejam a elaboração de um diagnóstico orientado, a sua
síntese numa análise SWOT em que se ponderam as variáveis internas e externas com
influência no território, a construção de cenários alternativos de desenvolvimento do território
que traduzem eventuais caminhos e direcções futuras. Estes instrumentos permitem clarificar
as opções a tomar e traçar o projecto de desenvolvimento desejado e possível do território.
Participação pública: O envolvimento da comunidade na concepção do Plano é o alicerce do
planeamento e a chave para a sua posterior implementação. Assim, importa identificar os
68
principais actores e agentes locais e mobilizá-los para o plano, de modo a aproximar os
objectivos da comunidade em torno de um projecto comum. Para tal, é necessário criar
condições e momentos próprios de integração em que se abra espaço ao diálogo e
concertação de interesses bem como à resolução de conflitos inerentes a actores com lógicas
de actuação distintas. Só deste modo, será possível que a sociedade se reveja e identifique
com o plano apercebendo-se dele enquanto projecto comum e coloque os recursos e meios
para a sua implementação através da assumpção de compromissos e responsabilidades. A
participação pública é uma ferramenta essencial para a viabilização do plano numa época de
crescente debilidade financeira da Administração Pública.
Gestão: A execução do Plano é determinante no processo de planeamento, na medida em que
se o Plano constitui o projecto de desenvolvimento do território, a gestão é a sua
materialização em termos de medidas e projectos. Assim sendo, o processo de planeamento
tem que criar condições para a sua concretização, sendo o programa de execução e o plano de
financiamento fulcrais para a implementação das propostas do Plano na medida em que se
torna necessário elencar as diversas propostas, a entidade responsável pela sua realização e
os meios e recursos para a sua concretização.
Simultaneamente, focam-se os aspectos organizacionais e a sua importância para um correcto
ordenamento e planeamento territorial. Não só é premente uma maior coordenação entre os
diferentes níveis da Administração Pública como dentro da Administração Local se exige uma
melhor articulação entre os serviços, de modo a que o seu funcionamento tenha como
resultado a correcta implementação do Plano e não desvirtue as suas propostas.
Monitorização: A avaliação contínua e permanente do Plano é também um elemento essencial
a ter em consideração no PDM. Num contexto de crescente incerteza e incapacidade do Plano
responder a solicitações não ponderadas a priori, interessa monitorizar o plano e os níveis de
aderência entre o Plano e o território de forma a detectar desvios ou erros e corrigi-los em
tempo real e permitir a resposta a novas oportunidades que se coloquem num dado momento.
O Plano reveste-se assim de uma maior flexibilidade que lhe permite ser um instrumento de
planeamento regulador mas ao mesmo tempo facilitador do desenvolvimento do território ao
estimular e absorver projectos não previstos aquando da sua concepção.
O planeamento estratégico vem, nesta prespectiva, dar outro ênfase à ligação entre as
componentes sociais e físicas e aos mecanismos de gestão e implementação do plano. A
complementaridade entre estas duas formas de planeamento permite, através de uma
concepção diferente do PDM, dotá-lo de um carácter simultaneamente físico e estratégico
tornando-o assim um instrumento mais qualificado para responder aos desafios que se impõem
ao desenvolvimento e ordenamento do território municipal.
69
4.3 Reflexões
A pesquisa efectuada na presente dissertação permitiu retirar algumas conclusões sobre a
pertinência da introdução das especificidades do planeamento estratégico no processo de
Revisão dos PDM.
Os objectivos definidos são o alicerce das conclusões a retirar na medida em que a sua
prossecução demonstrou aspectos importantes que importa rever, nomeadamente:
a evolução do conceito de PDM que se foi afirmando ao longo do tempo como o
instrumento de planeamento territorial por excelência do desenvolvimento municipal;
as limitações evidenciadas na prática do planeamento, a fraca ligação entre
planeamento e gestão, a ausência de mecanismos de execução do Plano, a incipiente
participação da comunidade na elaboração do Plano;
o enfoque na elaboração do Plano na qual se coloca o empenho e o esforço técnico e
o descuramento da implementação do Plano por falta de mecanismos que a
operacionalizem;
as vantagens da abordagem metodológica do planeamento estratégico para lidar com
a complexidade dos actuais sistemas territoriais, a incerteza com que se deparam, a
crescente competitividade entre territórios e a debilidade financeira da Administração
Local;
a complementaridade entre o planeamento estratégico e o planeamento físico e as
mais-valias da sua articulação que permite alcançar uma visão mais global do
planeamento e uma implicação dos actores locais;
as dificuldades subjacentes ao processo de Revisão do PDM e as dúvidas intrínsecas
ao desbravar de um novo caminho e à introdução de uma abordagem metodológica
inovadora.
No entanto, apesar das mais-valias apresentadas, a aplicação prática desta abordagem
metodológica revelou algumas debilidades:
o confronto entre um PDM regulador e um PDM flexível pelo receio da Autarquia ter
que recorrer, no segundo caso, à posterior elaboração de planos de hierarquia inferior
para o desenvolvimento do território;
a brevidade dos prazos impostos para as revisões dos planos que não se coaduna com
a morosidade e a exigência intrínseca ao envolvimento da comunidade no processo;
a visão estratégica peca pela ausência de um desenvolvimento através de linhas
estratégicas consubstanciadas em objectivos específicos, pelo que se corre o risco de
a mesma se afirmar como uma intenção globalmente positiva mas nunca efectivamente
operacionalizada pela ausência de mecanismos que a possibilitem;
70
as dúvidas que subsistem na forma como se dota o plano da necessária flexibilidade
nomeadamente no que se refere à classificação e qualificação do solo e à sua
quantificação através de índices e parâmetros urbanísticos;
a atitude passiva em relação ao sistema de monitorização do plano que se encara
como sua parte integrante, mas para a qual não foram direccionados técnicos e
esforços no sentido de o construir e implementar ao longo da elaboração de modo a
que possa tornar-se um instrumento de avaliação e gestão do plano;
a rigidez da estrutura administrativa local e falta de vontade política para a reformular
pelo que se antevê a manutenção dos bloqueios e limitações já evidenciadas pela falta
de articulação e coordenação existentes.
Consequentemente, verificou-se que, apesar do esforço empreendido para a introdução da
componente estratégica no PDM que permite dar um passo em frente na forma de o encarar e
de lhe dar o papel preponderante do desenvolvimento territorial municipal, subsistem aspectos
insuficientemente consubstanciados e explorados que podem comprometer a implementação
do Plano.
A Revisão dos planos é assim, facilmente estratégica do ponto de vista analítico (que é aquele
que se torna mais simples), mas em termos processuais os passos em frente têm tendência a
ser bastante pequenos. A Revisão dos PDM constitui o momento próprio para repensar e
ponderar não apenas o tipo e estrutura de planos que se desejam mas sobretudo, o modelo de
gestão adequado para o efectivo salto qualitativo que o desenvolvimento municipal solicita.
Este modelo de gestão exige esforços adicionais no sentido da reforma da Administração
Pública e do seu funcionamento, da abertura efectiva (e não apenas conceptual ou teórica) de
mentalidades para a integração dos actores e agentes territoriais no Plano, da
operacionalização de um sistema eficiente de avaliação permanente do Plano e dos seus
resultados.
71
5 Desenvolvimentos futuros
5.1 Linhas de orientação
A presente dissertação procurou demonstrar que parte das limitações evidenciadas pela
experiência de planeamento municipal nas últimas duas décadas pode ser ultrapassada
através de uma abordagem metodológica diferente. Deste modo, a investigação realizada
permite identificar um conjunto de questões que carecem de maior aprofundamento visto que
se está numa fase de aprendizagem e de consolidação de conhecimentos com vista a uma
melhor fundamentação da forma como melhor se alcança a vertente estratégica dos PDM.
Assim, apontam-se como linhas de orientação para o prosseguimento da investigação nesta
matéria:
Estudar a integração efectiva da participação pública na Revisão dos PDM e a sua
operacionalização em termos concretos, dadas as limitações temporais e financeiras
que caracterizam este processo;
Analisar as estruturas organizativas das Autarquias Locais e o modo como podem ser
alteradas em prol de um funcionamento mais eficiente e eficaz no âmbito do
planeamento e gestão do território;
Perceber a forma mais eficiente de acompanhamento do PDM pela Administração
Central e o modo como este pode ser agilizado;
Investigar a introdução de flexibilidade na regulamentação do PDM e o modo como
esta pode ser concretizada em termos de índices e parâmetros urbanísticos;
Entender o âmbito do sistema de gestão e monitorização do Plano criando
mecanismos adequados para a sua implementação e funcionamento.
O entendimento de estratégia do PDM suscita assim, interrogações e crê-se que há ainda um
longo caminho a percorrer neste sentido. No entanto, pode dizer-se que a estratégia do Plano
se afirma como projecto de desenvolvimento territorial nas suas várias vertentes (sociais,
económicas, físicas, culturais), ancorado nas especificidades intrínsecas do município a que
respeita e alicerçado na co-responsabilidade e comprometimento da comunidade em prol da
melhoria da sua qualidade de vida e de urna maior equidade e solidariedade não apenas social
mas territorial.
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Pianificazione, Palazzo Pretorio - Vicolo del Moro 2 - Piano 2 (tel. 050 910 406/409). (s.d.).
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Tuttitalia. (s.d.). Il Comune di Pisa. Obtido em 3 de Julho de 2011, de Guida ai Comuni, alle
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