a contribuição da formação inicial de licenciatura em educação
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA
Guilherme Bardemaker Bernardi
A CONTRIBUIÇÃO DA FORMAÇÃO INICIAL DE LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO
FÍSICA DA ESEF/UFRGS PARA A PRÁTICA DOCENTE ESCOLAR
Porto Alegre
2008
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Guilherme Bardemaker Bernardi
A CONTRIBUIÇÃO DA FORMAÇÃO INICIAL DE LICENCIATURA EM EDUCAÇÃO
FÍSICA DA ESEF/UFRGS PARA A PRÁTICA DOCENTE ESCOLAR
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado na Escola de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, como requisito parcial para obtenção do título de licenciado em Educação Física.
Orientador: Vicente Molina Neto
Porto Alegre
2008
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AGRADECIMENTOS
Agradeço aos quatro colegas que toparam colaborar com este estudo.
Agradeço ao professor Vicente Molina Neto e aos colegas do grupo de
pesquisa F3P-EFICE, por todos os ensinamentos que tive ao longo destes dois
anos.
Agradeço aos companheiros do Movimento Estudantil e do Diretório
Acadêmico de Educação Física - Paulo Hollerbach - da EsEF/UFRGS. Desde a
construção do EREEF de 2006 até o ENEEF de 2008, todos e todas que pude
conviver de alguma maneira contribuíram para a minha formação acadêmica,
militante e pessoal.
Agradeço à família Colvara Bernardi, que mesmo morando longe estiveram
sempre por perto. Aos meus tios e tias que em muitos momentos foram Pais e Mães;
aos meus primos e primas, que em muitos momentos foram irmãos e irmãs.
Agradeço à família Silva Bardemaker, pelos divertidos momentos que sempre
passamos juntos, pelos Natais clássicos e as ótimas festas em família.
Agradeço à galera do Albion, por ter crescido com vocês, pelos já 15 anos de
amizades que temos até hoje.
Agradeço à galera do Champagnat, pela parceria de sempre, mesmo com a
distância.
Agradeço à minha namorada, Andressa, por ser acima de tudo minha grande
companheira. Te amo.
Ao meu pai, Luiz Emílio, minha mãe Vera Lúcia, e minha irmã Marcela. Minha
Família, que sempre esteve ao meu lado. Obrigado por tudo que já fizeram e fazem
por mim. Amo vocês.
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RESUMO
O presente trabalho aborda a formação profissional para a docência escolar do curso de licenciatura da Escola de Educação Física da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (EsEF/UFRGS). Seu objetivo é compreender como o currículo da formação inicial subsidia os estudantes de educação física para a prática docente em escolas públicas. Para entender o objeto de estudo em profundidade, optamos por estudo de caso etnográfico. Dessa forma, a disciplina de Prática de Ensino constituiu-se como momento de interlocução entre os conhecimentos adquiridos durante a formação e a utilização prática dos mesmos, fato que nos levou a observar e dialogar com uma representação tipológica dos estudantes matriculados nessa disciplina no Ensino Fundamental no primeiro semestre de 2008. Iniciamos com uma revisão bibliográfica da Teoria Crítica de Ensino da Educação Física, dando ênfase aos aspectos referentes à temática da formação de professores e da prática docente em escolas públicas. Ao relacionar este referencial com as informações obtidas durante o trabalho, foi possível identificar a dificuldade que os estudantes que realizam a prática docente no Ensino Fundamental apresentam para desviarem da ótica de que a educação física é uma disciplina para "treinar" as habilidades de uma determinada modalidade esportiva ou desenvolver determinado aspecto motor. Além disso, o conteúdo esportivo apareceu como predominante tanto no currículo de formação quanto na prática docente dos estagiários. Destacamos que a perspectiva técnica e biológica ainda prevalece na formação de professores, fazendo com que esta se reproduza no currículo escolar. Além disso, os estágios do curso de licenciatura se colocam no fim do curso, caracterizando uma concepção terminalista de currículo, impossibilitando uma posterior reflexão dos graduandos sobre sua prática docente em outras disciplinas do currículo de graduação.
PALAVRAS-CHAVE: Formação inicial em educação física; Currículo de graduação; Prática docente escolar.
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO / 71.1 Tema / 81.2 Justificativa / 8
2 REFERENCIAL TEÓRICO / 10
3 ABORDAGEM METODOLÓGICA / 183.1PROBLEMA DE PESQUISA E QUESTÕES DE PESQUISA/ 183.2 OBJETIVOS / 183.2.1 Objetivo Geral / 183.2.2 Objetivos Específicos / 183.3 CARACTERIZAÇÃO DO ESTUDO / 193.3.1 Tipo de estudo / 203.4 SUJEITOS DO ESTUDO / 213.5 INSTRUMENTOS DE COLETA DE INFORMAÇÕES / 223.5.1 Análise de documentos / 223.5.2 Observação Participante e Diário de Campo / 223.5.3 Entrevistas / 24
4 DA APROXIMAÇÃO TEÓRICA AO CAMPO: O processo de construção das categorias de análise / 254.1 ENTRE A DISCÊNCIA E A DOCÊNCIA: As experiências passadas como processo inicial da formação do professor / 254.2 ASPECTOS DO ÂMBITO LEGAL: O currículo de graduação e sua influência na formação profissional / 304.2.1. O QUE SE APRENDE E O QUE SE ENSINA EM EDUCAÇÃO FÍSICA: o esporte como perspectiva hegemônica / 364.3 A DISCIPLINA DE PRÁTICA DE ENSINO: Entre a teoria e a prática / 43
5 CONSIDERAÇÕES TRANSITÓRIAS/ 52
REFERÊNCIAS / 55
APÊNDICES / 60
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LISTA DE QUADROS
QUADRO 1 – COLABORADORES DO ESTUDO / 21
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1 INTRODUÇÃO
Criticar a educação física escolar da rede pública, de um modo geral, hoje no
Brasil não é tarefa difícil. Os problemas são tantos e tão antigos que temos a
impressão de que citá-los já virou clichê. Os baixos salários, a falta de recursos
materiais e infra-estrutura, a desvalorização do trabalho docente e a seqüência de
governos descompromissados com a educação pública são alguns dos pontos que
nos levam a refletir sobre o desafio que é ser professor da rede pública de ensino
nos dias atuais. Além destes problemas, é comum este professor encontrar no seu
cotidiano problemas de ordem social, como a violência, a subnutrição, a drogadição,
o trabalho infantil, a evasão escolar, entre outros. Todas estas dificuldades citadas
interferem na docência dos professores, tanto na questão pedagógica e
metodológica, como na questão dos conteúdos a serem ensinados, defasando
assim sua atuação como educador propriamente dito. Assim, entendo que a
formação inicial dos professores de educação física deve contribuir de maneira que
os futuros docentes possam, mesmo em frente aos mais diversos problemas
conjunturais e estruturais da escola pública, ensinar os conhecimentos
historicamente construídos, para que esta não seja, como em muitos dos casos, um
mero “recreio orientado” ou um horário para a prática descontextualizada de alguma
atividade física ou de algum esporte.
Apesar de ter consciência de todas estas incertezas e dificuldades que
permeiam a prática docente na educação física escolar, desde que ingressei no
curso de educação física, no ano de 20041, meu anseio em relação à profissão é ser
professor de escola. Muito disso deve-se ao fato de meu pai ser professor de
Educação Física e eu ter sido seu aluno. Creio que tenha sido uma “influência
indireta”, pois ele nunca me pressionou para cursar educação física, mas sempre o
vi, seja em aula ou em casa, como exemplo de um professor que acredita na
educação como parte essencial da formação humana.
Sendo assim, ao longo dos semestres fui procurando cursar, além das
obrigatórias, disciplinas eletivas que eu julgava importante para a construção do meu
conhecimento, sempre visando uma formação consolidada para a prática escolar. Ao
começar a participar do Diretório Acadêmico, e conseqüentemente do Movimento
Estudantil, no meu 5º semestre, tomei contato com uma perspectiva crítica da 1 Ingressei na EsEF/UFRGS no 1º semestre de 2004, prestando o último vestibular antes da divisão
do curso em licenciatura e bacharelado. Faço parte da chamada licenciatura plena.
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Educação Física que, desde então, passou a inspirar meu entendimento sobre
aspectos existentes na formação de professores da EsEF/UFRGS. A partir desta
perspectiva, fui percebendo uma limitação do currículo de formação inicial com o
trato do mundo escolar e um predomínio de disciplinas voltadas para o âmbito das
ciências biológicas, como a fisiologia, a cinesiologia, a biomecânica. Entendendo
estas como impressões e conclusões iniciais que tenho em relação à formação de
professores de educação física, vi na pesquisa científica uma possibilidade de
produção de conhecimento acerca do tema, além de contribuir para a minha própria
formação enquanto professor, fato que me levou à ingressar ao grupo de pesquisa
Formação de Professores e Prática Pedagógica em Educação Física e Ciências do
Esporte (F3P-EFICE), no qual pude me dedicar à atividade investigativa, resultando
neste estudo.
Procurei ao longo desta pesquisa tecer algumas considerações sobre a
formação de professores do curso de licenciatura em educação física da
EsEF/UFRGS para a docência escolar, entendendo que um estudo de caso
etnográfico, no âmbito da pesquisa qualitativa, seja uma alternativa para entender
melhor questões relativas à formação docente para o ensino de educação física no
ambiente escolar.
1.1 TEMAPartindo de uma perspectiva crítica da educação e da educação física, vejo a
necessidade de se compreender o quão preparado está o egresso do nosso curso
para atuar no ensino básico da escola pública. Delimito o tema do presente trabalho
na formação inicial de professores e o currículo de graduação de licenciatura em
educação física.
1.2 JUSTIFICATIVAOs estudos sobre a formação inicial de professores e currículo na área da
educação física têm se intensificado ao longo dos últimos anos. Tendo como
referência a Revista Brasileira de Ciências do Esporte (RBCE), periódico científico
do Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte (CBCE), vimos que o primeiro artigo
publicado sobre a temática da formação profissional aparece apenas em 1993, 14
anos após a primeira edição da RBCE, e que somente em 1996 a temática da
formação profissional teve suas discussões intensificadas neste periódico. Porém,
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tomando como referência o último CONBRACE (Congresso Brasileiro de Ciências
do Esporte), dos 334 trabalhos apresentados, 38 estavam inscritos no Grupo de
Trabalho Temático (GTT) Formação Profissional e Mundo do Trabalho, o que totaliza
em torno de 10% de todos trabalhos do evento, o que mostra que a temática vem
despertando um crescente interesse por parte dos cientistas da área da educação
física. Estudos como os de Mocker (1993), Molina Neto (1997), Kunz et. all (1998),
David (2002), são alguns dos trabalhos publicados no períodico do CBCE que
abordaram aspectos referentes à formação inicial e/ou currículo. Além deste
periódico, temos o exemplo de dissertações de mestrado como a de Gori (2000), e
também as obras de Figueiredo (2005) e Taffarel e Hildebrandt-Stramann (2007) que
abordam o tema em questão. Podemos apontar que o tema vem, ao longo das
últimas duas décadas, se consolidando como uma importante linha de pesquisa
dentro da educação física, considerando sua relevância para a área. Por ter o
entendimento que as pesquisas relacionadas à temática se encontram
prioritariamente no campo da pesquisa qualitativa, e que assim sendo, se
apresentam como recortes de uma determinada realidade, não objetivando a busca
de verdades absolutas, entendo a necessidade deste trabalho, na medida em que
ele se propõe a fazer um debate sobre a formação inicial com foco na formação para
a docência escolar. Acredito que a contribuição de um trabalho com este propósito
pode ser fundamental, pois segundo Moreira (2000) “[...] a presença de
pesquisadores nos esforços da mudança curricular pode abrir espaços para a
revitalização tanto da teoria quanto da prática” (MOREIRA, 2000, p. 131). Apesar de
o trabalho não ter o objetivo principal de elaborar uma proposta curricular, pode
servir como um ponto de apoio para reflexões sobre o tema e uma nova
compreensão de formação para a docência escolar, colaborando para uma futura
alteração no currículo de nossa escola.
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2 REFERENCIAL TEÓRICO
Para debater as questões relacionadas à formação e ao currículo em
educação física, se faz necessário compreender alguns aspectos que permeiam
esta temática. O grande leque da área de conhecimento da educação física, tanto
epistemológico quanto de atuação profissional, faz com que diferentes concepções
da educação física entrem em conflito na hora da proposição de currículos para os
cursos de graduação. Historicamente, porém, a educação física brasileira se
consolidou baseada em um paradigma hegemônico. Ghiraldelli Jr. (1991) traz em
sua obra muitos apontamentos sobre as tendências que consolidaram este
paradigma durante o século XX, e todas elas se baseiam em concepções liberais de
sociedade. A primeira delas é a tendência higienista, fortemente disseminada até a
década de 1930, que coloca a questão da saúde como a principal função das
práticas corporais, e conseqüentemente da educação física. Assim, o caráter da
tendência higienista, baseado principalmente nos pensamentos liberais do início do
século, é a manutenção da higiene do corpo através da atividade física. Bastante
identificada com a medicina, esta tendência encara a educação física
essencialmente no seu aspecto biológico, praticada através de métodos que, apesar
da pretensão de atender ao ser humano como um todo, conferem à prática de
exercícios físicos um caráter anatomofisiológico (OLIVEIRA, 2001).
Entre a década de 1930 e meados da década de 1940, temos a ascensão da
chamada tendência militarista. Ghiraldelli Jr. chama a atenção para não
confundirmos militarista com militar. E essa observação é pertinente. A educação
física militarista pressupõe muito mais do que uma prática militar de atividades
físicas. Ela pressupõe a transferência da pedagogia do exército para o âmbito da
educação física escolar, que busca acima de tudo um comportamento padrão para a
sociedade, um doutrinamento da juventude, para que esta estivesse pronta para
defender a nação caso fosse preciso. E a educação física cumpre um papel
fundamental neste processo de doutrinamento, sendo até hoje presente a influência
desta tendência na educação física brasileira.
No período pós-guerra (1945-1964), ganha força a chamada educação física
pedagogicista, que segundo Ghiraldeli Jr (1991), é fortemente influenciada pelas
teorias da chamada “Escola Nova”. Apesar de ser um avanço à educação física
militarista, não existe na prática um abandono total deste tipo de organização
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didática. Entretanto, essa nova concepção incumbe à educação física
responsabilidades educativas que não seriam possíveis de incumbência à outras
disciplinas:
As fanfarras da escola, os jogos intra e inter-escolares, os desfiles cívicos, a propaganda da escola na comunidade, tudo isso passa a ser incumbência do professor de Educação Física. Este elemento, abnegadamente, deve, além das aulas, cumprir sua função de “educador” e até mesmo de “líder da comunidade. A Educação Física, acima das “querelas políticas”, é capaz de cumprir o velho anseio da educação liberal: formar o cidadão (p.29)
Assim, a educação física pedagogicista segue a básica premissa da
educação liberal, que é a formação de um cidadão, idéia que se consolida com a
ascensão da educação física competitivista. Esta tendência surge entre as décadas
de 60 e 70, em plena ascensão do regime militar brasileiro, e reduziu a educação
física ao esporte de alto rendimento. O apelo governamental ao esporte, à busca de
recordes, à “fabricação” de ídolos esportivos, o culto ao “atleta-herói”, àquele que
pode superar as dificuldades individuais e chegar ao alto do pódio, aquele que pode,
através de muito esforço, conquistar seu lugar ao sol, todas estas são características
marcantes desta tendência, que, juntamente com aspectos relacionados às
tendências higienista, militarista e pedagogicista, se consolida como o paradigma
hegemônico da educação física, centrando tanto a educação física escolar como a
de âmbito acadêmico numa concepção positivista, privilegiando o aspecto biológico
em detrimento do aspecto pedagógico.
Assim como as tendências que consolidaram a educação física brasileira, a
questão referente ao currículo merece destaque. Segundo Silva (1999), o livro
considerado o marco no estabelecimento do currículo como um campo de estudos é
o livro de Bobbit, denominado The Curriculum, de 1918. Neste livro, Bobbit propunha
um sistema escolar que funcionasse da mesma forma que qualquer empresa
comercial ou industrial, privilegiando a eficiência do processo educacional. Para ele,
o currículo nada mais é do que uma questão organizacional, evidenciando o aspecto
técnico de sua visão. A consolidação deste modelo de currículo acontece quando
Tyler publica seu livro Princípios básicos de currículo e ensino, de 1974. Com este
livro, as idéias centradas na organização e planejamento adquirem e ganham
legitimidade. Estas idéias, além de dominarem os paradigmas curriculares nos
Estados Unidos, influenciaram diversos países europeus e latino-americanos,
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incluindo o Brasil. Como coloca Silva (1999), estas idéias, classificadas por ele como
a chamada “teoria tradicional do currículo”, pretendem ser neutras, científicas e
desinteressadas. Segundo o autor, os conceitos que enfatizam este tipo de teoria
são: ensino, aprendizagem, avaliação, metodologia, didática, organização,
planejamento, eficiência, objetivos.
Desta forma, é possível tecer relações entre as tendências que consolidaram
a educação física brasileira e a teoria tradicional do currículo com a própria história
das Escolas de Educação Física, ou seja, das escolas formadoras de professores e
seus currículos de formação. Durante o período da educação física militarista é que
se instituem a Escola de educação física do Exército (1939) e também as primeiras
escolas de educação física civis. Dentro deste período é que em 1940, devido às
exigências por parte do Governo Federal de formação profissional específica para o
exercício das profissões de professor de educação física, técnico desportivo e
médico especializado em educação física e desportos, entra em funcionamento no
Rio Grande do Sul o Departamento Estadual de Educação Física e a Escola de
Educação Física (ESEF), que anos mais tarde seria federalizada pela UFRGS. Seu
princípio se constituiu enraizado nas tendências higienistas e militaristas e o
currículo da ESEF se voltava prioritariamente para o aspecto técnico. Apesar de ser
um curso de formação de professores, seu primeiro currículo não contava com
disciplinas de cunho pedagógico, que só foram introduzidas após o decreto nº 8270,
de 1945 (www.esef.ufrgs.br, acesso em 11/2008). Além disso, nos primeiros
currículos esefianos, a grande maioria das disciplinas eram ministradas por médicos,
capitães e tenentes do exército, reforçando a tendência que destacava o papel do
exercício físico e do desporto na formação de um homem obediente e adestrado. Os
cursos de formação de professores em educação física acabam por sofrer fortes
influências deste contexto, que acarreta neste tipo de proposta pedagógica para a
educação física da escola, o grande campo de atuação do professor até então.
Inspirado nestes ideais, é fundado em 1978 o Colégio Brasileiro de Ciências
do Esporte (CBCE). Legitimado como a entidade científica da educação física, o
CBCE direcionou durante quase uma década sua produção científica nos moldes da
pesquisa empírico-analítica. Em meados dos anos oitenta, porém, vários autores
começam a questionar esse paradigma conservador, que na educação física se
materializa no estigma do desenvolvimento da aptidão física. Sendo assim, nesta
década, que ficou conhecida como o período de “crise” da educação física, inicia-se
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uma fase de muito debate e críticas em relação a esse padrão, de modo a abordar
questões de cunhos epistemológicos, metodológicos e ontológicos da nossa área. A
produção científica da área vai aos poucos se preocupando em debater cada vez
mais, entre outras, questões inerentes ao currículo e à formação de professores, se
contraponto às lógicas que predominavam. Segundo Taffarel (2007), a herança
tecnicista e positivista começa a ser questionada radicalmente na década de oitenta,
e era necessário romper, no âmbito da formação do profissional e nas intervenções
sociopedagógicas, com as origens desta perspectivas que serviam de referência
para a formação acadêmica no Brasil. Inicia-se então, dentro do próprio CBCE, um
processo de rearticulação da entidade, abrangendo toda a comunidade científica,
com produções que questionavam a forma como até então era pensado e produzido
o conhecimento da educação física, abrindo espaço também para os estudos
realizados nos âmbitos das ciências humanas e sociais, além da abertura para
elaboração e teorização de outras concepções de educação física, como a
perspectiva crítico-superadora (COLETIVO DE AUTORES, 1992). Contraponto-se à
lógica de educação física como o desenvolvimento de aptidões físicas, esta
perspectiva trouxe a proposta de uma educação física escolar pautada na reflexão
da cultura corporal, que de certa forma imergiu dos grandes anseios da década de
80. A Revista Brasileira de Ciências do Esporte (RBCE), criada um ano após a
fundação do CBCE, e que inicialmente segue o mesmo padrão da entidade, também
começa a sentir os efeitos da “crise”. A temática da formação de professores
aparece somente pela primeira vez em 1993, com apenas um artigo relacionado ao
tema, se intensificando a partir de 1996 e tendo o seu auge em 2001, com um total
de 10 artigos nos dois volumes deste ano. (COSTA et. All, 2005).
Apesar do surgimento de novas perspectivas dentro da educação física, e do
próprio avanço na produção científica da área com relação à formação e intervenção
pedagógica, o campo de trabalho da área foi se expandindo ao longo destes últimos
vinte anos em outros postos de trabalho que não a escola, principalmente em
setores que vêem a educação física na perspectiva da aptidão e do treinamento
físico. Segundo Scherer (2005):
[...] nos últimos vinte anos, a ampliação do campo de intervenção profissional seguiu caminhos influenciados por uma visão de rendimento pautada por uma perspectiva de desenvolvimento profissional ligada ao individualismo e ao funcionalismo, com ênfase na preocupação estética, característica da sociedade capitalista (p.18).
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Com isso, o professor de educação física, geralmente visto na escola e em
clubes, passou a atuar nas mais diversas áreas, como na área da saúde, ginástica
laboral, academias, treinamento particular, na área do lazer, recreação, dentre
outros. Apesar de que, em primeira análise esse aumento do campo de atuação
possa parecer positivo, o que vemos é uma desvalorização da educação física
escolar, e, apesar do “status” que as áreas não-escolares começam a ganhar,
vemos o professor de educação física atuando cada vez mais sujeitos às
flexibilizações do mercado, oriundas do processo de reordenamento do mundo do
trabalho dentro da sociedade capitalista, ocorrido no fim da década de 70 (NOZAKI,
2004). Essas mudanças acarretaram numa maior intensificação da exploração da
força de trabalho, ocasionando um desemprego estrutural e uma conseqüente
precarização do trabalho através do avanço do neoliberalismo como salvação da
crise estrutural do capital e por meio da desregulamentação de direitos trabalhistas.
Este problema pode ser constatado no grande número de professores da área não-
escolar que atuam como autônomos e sem direitos trabalhistas historicamente
conquistados, como carteira assinada, férias, licença maternidade,13º salário, etc.
Partindo deste quadro é que podemos aprofundar na questão da formação de
professores no que diz respeito à docência escolar, fazendo-se necessário
compreender este contexto estrutural em que se insere a educação e a própria
instituição escolar. David (2002) coloca que é difícil e inadequado abordar a questão
da formação de professores de forma isolada, e mesmo que alguns avanços tomem
forma nos processos curriculares sugeridos, não significam que sejam processos
transformadores. Isto porque até o melhor dos avanços curriculares para a formação
de professores têm como pano de fundo o modelo capitalista de produção, e nesse
mesmo contexto é que se insere a instituição escolar. A escola, assim como as
outras instituições sociais, deve ser analisada levando em consideração a realidade
em que se situam.
Deste modo, a escola, que foi criada com o intuito de transmitir os
conhecimentos historicamente construídos pelos seres humanos, acaba tendo um
papel importante na manutenção da ordem vigente, na medida em que é pensada
de forma acrítica e distante da realidade social. Como pondera Franco (1991), a
educação escolar não pode ser reduzida à pura transmissão de conhecimentos
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enciclopédicos. Os conhecimentos devem ser vivos e concretos, indissoluvelmente
ligados às experiências dos alunos e às exigências históricas da sociedade
presente. Até porque a escola não tem fim em si mesma. Apesar de reproduzir
muitos elementos da sociedade vigente, difundindo as idéias, verdades e valores
desta, ela é passível de transformações, seja pelos educandos como pelos
educadores. Compreender o significado social da escola é fundamental para que se
busque uma profunda transformação da escola brasileira, até porque ela não tem
conseguido desenvolver seu papel social. Franco (1991) ainda coloca que, além de
não conseguirem ensinar e instruir, de maneira sólida e competente os alunos que
por ela passam, a escola reproduz as grandes desigualdades sociais que vivemos
em nosso país na medida em que exclui muitos alunos dos bancos escolares, em
sua esmagadora maioria alunos das classes mais pobres. Além disso, o mesmo
autor coloca que os professores em geral não conseguem relacionar os conteúdos
que transmitem à experiência de vida dos alunos e à realidade social nas quais se
situam, e acredita que isso se deve ao fato da baixa qualidade dos cursos de
licenciatura, que não tem conseguido consolidar uma formação voltada para a
atuação nas escolas públicas. Deste modo, nos encontramos numa situação
adversa, na qual o professor, em sua prática pedagógica, tem encontrado uma
estruturação escolar que visa a manutenção de uma determinada ideologia política e
econômica.
Ao trazer esta discussão para a área da educação física, vimos que o atual
contexto do avanço neoliberal faz com que, cada vez mais, a formação se oriente
pelas diversas leis de mercado, o que na educação física nos remete ao descaso
com a educação física escolar e ao crescimento da chamada área não-escolar da
educação física. Lembrando que não questiono a importância deste campo de
trabalho, a discussão se faz no momento em que ela acaba direcionando os
currículos para uma formação acrítica e gestada nos modelos hegemônicos, que
sempre viu a educação física como uma simples disciplina reprodutora de
movimentos (NOZAKI, 2004).
Desta forma, é preciso pensar de que maneira o modelo hegemônico vem
pautando o currículo escolar da educação física. Uma das perguntas mais
freqüentes da área é “o que se ensina e o que se aprende em educação física?”
Segundo o Coletivo de Autores (1992), o conteúdo da educação física são os
diversos elementos da cultura corporal, como os esportes, os jogos, as danças, as
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lutas, e a proposta de ensino se baseia na reflexão destes elementos na busca pela
leitura da realidade. Já a perspectiva de educação física escolar que tem como
objeto de estudo o desenvolvimento da aptidão física, tem contribuído
historicamente para a manutenção da estrutura capitalista. Nesta perspectiva, o
esporte é selecionado como conteúdo prioritário, pois possibilita o exercício de
rendimento, tendo seus conteúdos sistematizados na forma de técnicas, como o
passe, arremesso, chute, etc. Desta forma, como apresenta Oliveira (2001), a
tendência esportiva dada à educação física induz a concebê-la num caráter
extremamente competitivo, e reflete os mecanismos político-ideológicos que
caracterizam nossa sociedade.
Com a proposta de superar este modelo de educação física, o que vemos é
que apesar do aumento significativo da produção científica em relação ao tema da
formação e do currículo, na prática os avanços ainda são muito limitados,
principalmente no que tange à uma formação voltada para a prática docente escolar.
Isto porque, tanto no “macro” quanto no “micro”, temos concepções que corroboram
para a limitação de avanços práticos. No “macro”, podemos abordar as políticas e
projetos educacionais de caráter mais amplo no país dos últimos anos, como a
aprovação da Lei nº 9696/98 em 1º de setembro de 1998, que regulamenta o
profissional de educação física e cria o sistema Confef/Crefs2, o qual tem grande
peso na implementação na Resolução n. 7, de 31 de março de 2004 do Conselho
Nacional de Educação. Essa resolução, que institui as diretrizes curriculares para os
cursos de graduação e divide o curso em licenciatura e bacharelado, faz com que a
fragmentação do conhecimento já se dê ao nível da formação inicial, propondo uma
especialização precoce. Com isso, no “micro”, o que temos são currículos
fragmentados, não abordando de uma forma seqüencial, crítica e lógica os
conteúdos da educação física. Desta maneira, acabamos encontrando disciplinas
como se elas existissem por si só e tivessem fim em si mesmas, o que acaba por
privilegiar àquelas que são maioria: as disciplinas biológicas e esportivas. O que tem
acontecido nos últimos anos em relação à formação e currículo é apenas um
agravante desta concepção de educação física, dominante, já abordada neste
trabalho.
No sentido de ir na contramão desta lógica, é que diversos setores da
educação física, como o movimento estudantil de educação física (MEEF), têm se
2 Conselho Federal e Conselhos Regionais de Educação Física.
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posicionado criticamente ao longo de sua história em relação à lógica dominante
para a formação profissional e currículo. Através da Executiva Nacional de
Estudantes de Educação Física (ExNEEF), entidade representativa dos estudantes
de todo o país e da qual participei ativamente durante dois anos3, várias discussões
sobre o assunto têm sido salientadas. Organizados e editados pela ExNEEF, os
Caderno de debates volume 02/96 e o volume 06/02 com o título de “Movimento
estudantil e currículo” e “MEEF” e formação profissional” respectivamente, são
algumas da produções que trazem produções textuais no sentido de debater essas
questões, aproximando ao público da graduação. Ao escrever um artigo sobre
movimento estudantil e currículo, dedicado à comunidade da EsEF/UFRGS,
Goellner (1996) argumenta que se faz necessário que toda a comunidade
acadêmica se mobilize para superar a deficiência da formação profissional, incluindo
alunos, funcionários e professores, de modo que se possa superar a matriz
hegemônica dos nossos cursos de formação, que a autora considera “[...] fortemente
arraigada em ações burocráticas, centradas no anacronismo científico, cultural e
tecnológico” (p. 31). Neste sentido, é que surge a proposta deste estudo, de modo a
tecer considerações sobre a formação inicial do professor de educação física da
EsEF/UFRGS, de modo que possa, ao rigor científico, não deixar de ser propositivo.
3 Compus a nominata da Coordenação Regional da ExNEEF na gestão 2006-2007, e compus as gestões 2006-2007 e 2007-2008 do Diretório Acadêmico de Educação Física – DAEFI/UFRGS.
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3 ABORDAGEM METODOLÓGICA
Por entender a complexidade de se fazer um estudo sobre a formação de
professores, ainda mais com o foco específico sobre a prática docente dentro do
ensino regular, entendo que a abordagem metodológica de cunho qualitativa seja a
mais adequada para o presente estudo. Desta forma, neste capítulo apresentarei as
decisões metodológicas utilizadas nesta pesquisa.
3.1 PROBLEMA DE PESQUISA E QUESTÕES DE PESQUISA
O problema da pesquisa ficou delimitado da seguinte maneira: Qual o subsídio que a formação inicial proporciona ao egresso do curso de Educação Física da EsEF/UFRGS para a prática docente escolar?
Para melhor compreender o tema, algumas questões de pesquisa surgiram
para melhor direcionar o estudo:
- Como se articula o currículo da graduação em licenciatura da EsEF/UFRGS para a
formação de professores à docência escolar?
- Que perspectivas epistemológicas compõem o currículo de formação da
EsEF/UFRGS?
− Quais conhecimentos relacionados ao mundo da escola e prática docente foram
adquiridos pelos licenciandos analisados do estudo?
− De que maneira as experiências da graduação contribuem para a construção de
uma prática docente escolar?
3.2 OBJETIVOS3.2.1 Objetivo Geral
Compreender como a formação do curso de Educação Física EsEF/UFRGS
subsidia seu egresso para a prática docente na escola.
3.2.2 Objetivos específicosApós delimitar o problema de pesquisa e o objetivo geral do estudo, alguns
objetivos específicos foram elaborados para melhor organizar e desenvolver a
pesquisa:
19
a) Analisar o currículo sobre o qual os estudantes do curso de licenciatura
foram submetidos ao longo de sua formação.
b) Identificar os aspectos de articulação do currículo para uma formação
voltada para a prática docente escolar.
c) Analisar o estágio curricular obrigatório sobre o qual os estudantes de
licenciatura são submetidos para obter o título de licenciados em educação física.
d) Identificar quais conhecimentos sobre mundo da escola e prática docente
foram adquiridos pelos graduandos ao longo do curso.
3.3 CARACTERIZAÇÃO DO ESTUDO
Ao iniciar este estudo, ao elaborar um problema de pesquisa para ele, foi
necessário que pensasse também na melhor forma para tentar responder a este
problema. Primeiramente, é importante destacar que toda ação científica pressupõe
a escolha de um paradigma científico. Como coloca Sarmento (2003) :
[...]os efeitos dos paradigmas fazem-se sentir na apresentação das bases discursivas sobre as quais se formulam as perguntas que desencadeiam as investigações e nas consequências que daí decorrem nas selecções dos objectos de estudo, na construção das estratégias e designs, na escolha das técnicas e métodos de escolha de informação, e, finalmente, no seu inventário, tratamento e apresentação sob a forma de resultado de investigação. (p. 140-141)
Ou seja, o paradigma nada mais é do que o “óculos” que o pesquisador utiliza
para enxergar seu objeto de estudo, para analisá-lo e para tratar as informações
obtidas durante o período de sua investigação científica. Neste sentido, fiz a escolha
por um paradigma qualitativo crítico-hermenêutico, pois ao mesmo tempo em que
me utilizei de instrumentos interpretativos, procurei fazer a articulação dos dados
com a realidade social e o contexto político vigente. Assim, creio que a pesquisa
qualitativa crítica surgiu como o suporte metodológico ideal para que eu pudesse
desenvolver este estudo da forma mais otimizada possível. Além de me auxiliar
metodologicamente, creio que epistemologicamente esta foi a melhor escolha por se
tratar da formação de professores e da prática pedagógica. Concordo com Negrine
(2004), quando o autor diz que “uma das linhas mestras que norteia este paradigma
20
se sustenta na crença que generalizações não são possíveis” (p. 61). Ou seja, a
pesquisa qualitativa busca compreender um determinado contexto particular em
profundidade, porém não tem como intuito generalizar os achados, como é de praxe
nas pesquisas do paradigma positivista. Assim, entendo que uma pesquisa de cunho
quantitativo, mesmo que trouxesse elementos importantes para o problema da
pesquisa, seria limitada no sentido de não compreender a fundo os significados que
os próprios sujeitos constroem sobre o tema em questão.
3.3.1 Tipo de estudo
Ao escolher como paradigma metodológico a pesquisa qualitativa, foi
necessária a escolha de um dos tipos desta abordagem. Para desenvolver esta
pesquisa, me utilizei metodologicamente do estudo de caso etnográfico educativo,
por entender que este método contribui para um melhor aprofundamento da temática
do trabalho. Nesse sentido, ao propor um estudo sobre a formação de professores e
o currículo de formação inicial, o estudo de caso etnográfico me pareceu ser o mais
apropriado, pois tem a vantagem de conectar-se rapidamente com a realidade
evitando simplificações (MOLINA, 2004), já que a intenção do trabalho não foi testar
hipóteses ou fazer generalizações, e sim descrever profundamente um contexto
particular. Concordo com André (1998), quando a autora coloca que “[...] o estudo de
caso etnográfico possibilita uma visão profunda e ao mesmo tempo ampla e
integrada de uma unidade complexa” (p. 49). Nesse sentido, compreendo que a
formação inicial investigada neste estudo assume o papel desta “unidade complexa”,
por entender que ela é uma organização estruturada e que necessita de elementos
metodológicos determinados para orientar a pesquisa, tais quais explicita Sarmento
(2003): permanência prolongada no contexto estudado; interesse por todos os traços
e pormenores que fazem o cotidiano destes contextos; o interesse tanto para
comportamentos e atitudes dos atores sociais quanto para suas interpretações
destes comportamentos, por isso concordo com Stake (1985), apud André (1998),
quando o autor coloca que [...] a decisão de realizar, ou não, um estudo de caso
etnográfico é muito mais epistemológica do que metodológica.(p. 50), pois se
quisesse fazer uma relação formal entre variáveis, ou até mesmo criar
generalizações, optaria por outras estratégias de pesquisa.
21
3.4 SUJEITOS DO ESTUDO
Ao definir como tema da pesquisa a questão do currículo de licenciatura
dando ênfase à docência escolar, foi necessário escolher qual seria a maneira mais
vantajosa de dialogar com os atores do processo de formação inicial da
EsEF/UFRGS, já que a intenção deste estudo foi buscar considerações acerca deste
processo na perspectiva dos estudantes de graduação. Dessa forma, a disciplina de
Prática de Ensino constituiu-se como momento de interlocução entre os
conhecimentos adquiridos durante a formação e a utilização prática dos mesmos,
fato que me levou a observar e dialogar com uma representação tipológica dos
estudantes matriculados nessa disciplina no Ensino Fundamental no primeiro
semestre de 2008.
Assim, como sujeitos deste estudo, contei com a colaboração de 4
estudantes do curso de licenciatura em educação física da EsEF/UFRGS, 3 homens
e 1 mulher, que estivessem realizando a disciplina de prática de ensino em escolas
da rede pública, 2 em uma escola estadual e 2 em uma escola municipal. É bom
frisar que atualmente existem dois currículos de licenciatura vigentes na nossa
escola. A chamada licenciatura plena (0.45), com ingresso até 2004 e que possui
apenas 1 estágio de docência obrigatório; e a nova licenciatura, com ingresso a
partir de 2005, que conta com 3 estágios de docência obrigatórios. Por uma
limitação da pesquisa, as observações foram feitas junto ao estágio de docência no
ensino fundamental, obrigatório da licenciatura plena, mas que também faz parte do
currículo da nova, inclusive conta com estudantes de ambas licenciaturas na mesma
turma. Por opção observei 2 estudantes de cada currículo, porém deixo claro que a
intenção do trabalho não é fazer uma comparação entre os currículos, mas sim
compreender a formação como um todo.
No quadro abaixo, a relação dos colaboradores, seus respectivos currículos e
escolas na qual atuaram.
Colaborador Ano de Ingresso na EsEF/UFRGS
Currículo Escola em que realizou o estágio
Rosa 2003/1 Licenciatura 0.45 Escola EstadualVladimir 2004/2 Licenciatura 0.45 Escola MunicipalErnesto 2005/1 Licenciatura Nova Escola Municipal
22
Marques 2005/1 Licenciatura Nova Escola EstadualQUADRO 1 – Colaboradores do Estudo
Assim, a opção de diálogo com estes estudantes deu-se por alguns motivos:
um deles é entender que seria difícil encontrar professores de educação física
recém-formados na EsEF/UFRGS que estivessem já atuando na rede pública de
ensino. Além disso, o estudo com professores que já tenham alguma experiência na
rede poderia não suprir a necessidade da pesquisa, entendendo que a proposta é
analisar a atual formação de professores, e, também, por acreditar que professores
que já praticam a docência escolar adquirem ao longo do tempo práticas
pedagógicas próprias, desenvolvendo alternativas necessárias para suas próprias
realidades escolares.
3.5 INSTRUMENTOS DE COLETA DE INFORMAÇÕES
3.5.1 Análise de documentos
A análise de documentos é um importante instrumento de obtenção de
valiosas informações, desde que, claro, se entenda que o documento não fala por si
só. É preciso entendê-lo como qualquer outro procedimento investigativo, sendo
necessário interpretar e refletir sobre a informação ali contida (SILVA, 2007). Assim,
por se tratar de um estudo sobre a formação, os documentos analisados nesta
pesquisa foram:
a) o currículo sobre o qual foram submetidos os sujeitos do estudo
b) as ementas das disciplinas do curso de licenciatura
c) Resoluções e Pareceres do Conselho Nacional de Educação sobre as
Diretrizes Curriculares Nacionais de formação para a educação básica e para
a graduação em educação física
3.5.2 Observação Participante e Diário de Campo
A observação é um instrumento muito importante na coleta de informações, a
23
fim de obter informações valiosas sobre o contexto analisado. Como coloca Negrine
(2004), a observação
[..]requer que se utilize processos mentais superiores como: a atenção, a perecepção, a memória e o pensamento, para observar fatos e realidades sociais presentes. Nesse caso é fundamental que a obsevação das pessoas se realize num conxteto real no qual desenvolvem normalmente suas atividades. (p.67)
Segundo o autor, para que a observação seja objetiva do ponto de vista
científico, é necessário que ela seja intencionada com os objetivos do estudo e que
seja sustentada pelo corpo de conhecimentos teóricos utilizados pelo pesquisador.
Silva (2007) elenca algumas características importantes que o observador deve ter,
a fim de auxiliá-lo na coleta das informações: Intenção, motivado pelo interesse de
pesquisa e relacionado com o problema desta; atenção, intimamente ligado à
concentração e à intenção; e registro, momento de passar para o papel o que foi
observado. Segundo a autora, quanto mais detalhada e descritiva for essa etapa,
mais eficiente será o processo de análise e interpretações das informações.
Partindo desses pressupostos, a decisão metodológica de diálogo com os
estudantes que estivessem realizando a disciplina de prática de ensino fez com que
minhas observações fossem realizadas neste conxteto, onde os estudantes da
licenciatura realizavam suas atividades de estágio curricular obrigatório. Iniciei,
então, observando as primeiras reuniões da disciplina de prática de ensino, com
todos os estudantes matriculados e com o professor responsável. Passei a observar
especificamente os quatro colaboradores de meu estudo após a escolha das turmas
e das escolas em que cada estagiário ministraria suas aulas. Como as aulas eram
em dois dias da semana, a escolha dos colaboradores foi intencional, de modo que
eu pudesse observar em um dos dias os colaboradores da escola municipal e no
outro dia os colaboradores da escola estadual. Encerrei o processo de minhas
observações na reunião final do estágio, onde os estudantes puderam colocar suas
impressões, dificuldades, anseios, e contar um pouco mais de suas experiências
durante o período de docência. Ao todo foram vinte e um (21) dias de observação
participante, contando as reuniões que antecederam e procederam o período de
docência. As anotações foram anotadas em um caderno tamanho grande, num total
de quarenta e cinco (45) páginas.
24
3.5.3 Entrevistas
Outro instrumento que utilizei na pesquisa foi a entrevista. Este instrumento
permitiu a obtenção de informações sobre a proposta estudada a partir da
perspectiva dos sujeitos do estudo. Como argumenta Negrine (2004), a entrevista,
por ser uma estratégia de coleta de informações em que se está frente a frente com
o colaborador, permite um vínculo maior com o indivíduo, possibilitando uma maior
profundidade nas perguntas elaboradas como roteiro. Dentre os diversos tipos de
entrevista, utilizei a do tipo semi-estruturada, pois este instrumento possibilita um
roteiro para o diálogo, além de ser flexível para que os participantes incluam novas
questões e contribuições relevantes sobre o estudo (Molina Neto, 2004).
Desta forma, realizei 4 entrevistas, uma com cada um dos colaboradores do
estudo. Pela minha proximidade com os colaboradores, que são colegas da
graduação, acredito que este processo foi bastante proveitoso, visto que a
realização das entrevistas se deu de forma bastante facilitada, fazendo com que eu
pudesse obter valiosas informações. As entrevistas foram realizadas todas na
Escola de Educação Física da UFRGS, que totalizaram 110 minutos de gravação.
Após isto, as entrevistas foram transcritas e retornaram aos colaboradores que
fizeram as devidas correções. Depois, as entrevistas foram analisadas para a
construção das categorias de análise.
25
4 DA APROXIMAÇÃO TEÓRICA AO CAMPO: O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DAS CATEGORIAS DE ANÁLISE
O processo de construção das categorias de análise foi um processo
trabalhoso, mas fundamental para a pesquisa. Primeiramente, fiz a análise das
entrevistas, onde pude identificar 122 unidades de significado relevantes, que foram
agrupadas em blocos temáticos. Após isso, busquei considerar também as
informações obtidas através dos documentos e dos diários de campo, resultando na
construção de três categorias de análise e uma sub-categoria, que apresento a
seguir.
4.1 ENTRE A DISCÊNCIA E A DOCÊNCIA: As experiências passadas como processo inicial da formação do professor.
A formação do professor de educação física, assim como qualquer outro tipo
de formação profissional, é um processo amplo, complexo, e que envolve diversos
elementos que influenciam o processo de construção dos saberes docentes. Há
elementos do âmbito legal e que condicionam uma boa parte deste processo, como
a questão curricular, as disciplinas e os conteúdos. Há também os elementos que
fazem parte do cotidiano dos alunos, como a convivência com os colegas e com os
professores, os estágios extracurriculares e a participação em grupos de iniciação
científica, que, apesar de não serem quantificados, colaboram para a futura atuação
do professor de educação física, seja em qual for o âmbito de trabalho. Como
colocam Günther e Molina Neto (2000), o processo de formação do professor é um
“continum”, que não se inicia apenas no momento em que este ingressa no curso e
também não se encerra ao término deste, mas se estende por toda a sua vida
profissional. Desta forma, as experiências vividas no período anterior ao ingresso na
graduação podem ser consideradas como o início do processo de formação do
professor, visto que estas experiências além de terem relação direta com a escolha
pela educação física, também podem influenciar a prática dos futuros professores.
Atráves das informações obtidas é possível colocar que em grande parte dos
casos, os estudantes que optaram pelo curso de educação física tiveram
experiências positivas na educação física escolar ou têm experiência em alguma
26
prática corporal expecífica, como por exemplo, algum esporte ou a participação em
grupos de dança ou de capoeira, entre outros elementos da cultura corporal, fato
que de certa forma influencia a escolha pela educação física como profissão. Um
dos nossos colaboradores, Vladimir, trás este elemento neste trecho da entrevista:
[...] eu sempre gostei de praticar atividades...brincadeiras, jogos, todos os tipos de práticas que hoje eu vejo que são ligadas diretamente à educação física, mas, no meio da minha adolescência eu comecei a praticar de forma mais regular, primeiramente o futebol de campo e depois canoagem, de forma que tinha continuidade de uma fase pra outra, de iniciação, passava pra um treinamento, e eu sou uma pessoa que gosta muito de desafios, eu vejo a competição como um desafio e praticar de forma organizada os esportes são, no meu ver, um caminho que tem pra enfrentar esses desafios, daí, como eu gosto bastante disso, eu me senti com a vocação de, conjuntamente com outras experiências, né, de eu gostar de auxiliar as pessoas, com essa minha vontade de praticar atividades físicas, aí eu vi como a profissão ou os conhecimentos que eu gostaria de me aprofundar, porque eu gostava muito, daí eu me senti apontado pra esse caminho aí, da educação física (Entrevista Vladimir, 6/10/08).
No caso de outro colaborador, Marques, a escolha da profissão não foi devido
às experiências positivas com atividades físicas, mas sim pelo fato de trabalhar em
um escritório, num ambiente fechado. Como ele coloca, “era ruim tu estar ali o dia
inteiro, né, preso, e de repente com dor, estar incômodo” (Entrevista Marques,
30/09/08). Ele ainda coloca que “seria bacana se eu pudesse ajudar as outras
pessoas a poder encontrar um pouco de saúde através de atividade física”. Segundo
o colaborador, após a entrada no curso, a questão educacional, de estar “formando
caráter” e “formando pessoas”, o encantou e o fez permanecer no curso.
Mesmo não enfatizando as práticas corporais como uma influência direta para
a escolha da profissão, em um trecho da entrevista o colaborador diz:
[...] coincidentemente, eu joguei de tudo assim, né, na minha infância né, eu fiz todos os esportes mais tradicionais, eu nadei, futebol de campo, futebol de salão, que hoje é o fustal, joguei vôlei, joguei basquete, então...desde pequeno sempre fiz tudo isso, porque eu sempre fui bastante alto né, sempre passei da média, então a mãe e o pai sempre me estimularam a fazer esportes assim como o meu irmão também, mas não tem nenhuma relação direta entre eu ter tido práticas corporais durante a minha infância e adolescência e a minha escolha do curso. Obviamente depois que tu entra no curso tu vê como isso te ajuda um monte né, tu ter jogado, tu ter vivido coisas te facilita um monte agora..enquanto olhar docente e não mais discente (Entrevista Marques, 30/09/08).
27
Desta forma, o próprio estudante, ao transferir o olhar antes discente para um
olhar docente, ressalta que esta experiência anterior com os esportes facilita a sua
prática enquanto professor.
Em se tratando das experiências tidas durante o processo de escolarização
com a educação física, este processo de experimentação, principalmente quando
são positivas, também podem interferir na escolha profissional. No caso da
colaboradora Rosa, as experiências positivas durante o ensino fundamental e médio
tiveram influência direta na decisão pela educação física:
Nossa! Era muito bom![...]desde o princípio eu tive muita sorte com professores, porque eu tinha todos os esportes na sala de aula, eu tinha, aliás, todos os esportes dentro da escola..[...].além de expressão corporal que a gente tinha dentro de sala de aula, a gente tinha um trabalho muito intimista, assim, era uma coisa bem voltada pra dentro..então era bem global assim. Era uma educação física como ela deve ser, inteira, sabe. Muito legal...e..nossa..tenho só boas lembranças..só tive bons professores...isso também me influenciou muito pra seguir carreira. (Entrevista Rosa, 09/09/2008)
Assim, ao tratarmos especificamente da educação física de âmbito escolar, é
possível colocar que assim como em outras áreas do conhecimento que fazem parte
do currículo da escola, todos os futuros docentes chegam à graduação com uma
experiência docente às avessas. Isto porque este futuro professor já foi
obrigatoriamente um aluno de educação física durante a realização do seu ensino
regular. Ou seja, ao ingressar no curso de licenciatura, o graduando já traz consigo
experiências tidas na condição de discente. Estas experiências, sejam elas
positivas, como no caso de Rosa, ou negativas, conduzem o estudante a construir
uma mínima idéia do que é a educação física escolar, quais conteúdos fazem parte
desta área de conhecimento, e como é a dinâmica de uma aula de educação física.
Além disso, mesmo que a escolha pela licenciatura tenha se dado pela aproximação
com alguma prática em especial, o estudante já teve contato com professores, com
diversas práticas docentes e com processos contínuos de ensino-aprendizagem,
seja em qual tenha sido o contexto destas experiências. Desta forma, mesmo tendo
a compreensão dos diferentes enfoques das experiências vividas pelos estudantes,
como no caso de Vladimir é o esporte de competição, e no caso de Rosa é a própria
experiência na escola, estas aprendizagens trazem importantes elementos para a
28
construção de seus saberes na condição de docentes.
Entretanto, é preciso atentar para uma questão importante sobre a formação
do professorado. A educação física enquanto área de conhecimento, detém um
vasto leque de atuação profissional. Desta forma, por mais que as próprias
experiências de sucesso nas aulas de educação física possam ter sido o motivo da
escolha profissional, isso não significa que este estudante tenha a vontade de
lecionar em escolas. Inclusive, ao chegar no estágio, muitos estudantes se sentem
apreensivos, vendo aquele momento como uma pura obrigação. Pude notar, nas
observações feitas durante as reuniões que antecediam o estágio em si, que muitos
encaravam como um desafio lecionar na escola pública. Muitos diziam não ter a
intenção de trabalhar em escola, alguns diziam que estavam na educação física pelo
esporte de rendimento e alguns viam o trabalho de professor escolar como “algo a
mais” para se trabalhar, caso fosse necessário. Inclusive a estagiária Rosa, que
relacionou sua escolha profissional com a experiência escolar afirma em seu
depoimento:
[...]eu nunca tive na verdade vontade de dar aula em escola. Quando eu entrei na educação física era mais pra conhecer essas coisas de corpo sabe?[...] a escola nunca foi um atrativo, apesar da minha mãe ser professora a vida inteira..sempre vi ela dando aula, inclusive de educação física [...] a minha mãe teve uma escola de educação infantil de uma pré-escolar e naquela época, eu trabalhei muito próximo, só que eram crianças bem pequenas..e a parte que eu mais gostava já era isso, era de fazer recreação, ensinar coisinhas do corpo, sabe..fazer eles se movimentarem..explorar movimento..mas a escola em si eu nunca visei..e no momento também não tenho interesse. De repente depois de eu ter passado pela experiência do estágio, agora eu já vejo que não é tão horrível como parecia (risos).no princípio né [...] (Entrevista Rosa, 09/09/2008)
A partir da fala de Rosa, foi possível refletir sobre alguns aspectos
interessantes. O primeiro é que as dificuldades inerentes à prática docente escolar,
no que tange principalmente às mazelas estruturais da escola pública, faz com que
grande parte dos alunos veja a escola como “válvula de escape” profissional. O
segundo aspecto que posso refletir é que a dificuldade dos graduandos para com a
escola é de maneira conceitual sobre o próprio ensino docente escolar. Como coloca
Molina Neto (2000), ao chegar no estágio supervisionado, o aluno tem pouco
conhecimento sobre o mundo escolar, o que pode explicar de certa forma o porquê
de muitos graduandos já trabalharem com crianças de faixa etária escolar em outros
29
espaços, como escolinhas esportivas, mas terem uma dificuldade de lidar com
crianças no espaço da instituição escolar, o que pode levar estes graduandos à
rejeitarem a possibilidade de atuação profissional neste campo de trabalho ou não
despertarem o interesse. É possível constatar este aspecto na fala de Vladimir:
[...] eu tenho o desejo de participar da escola sim, mas eu vejo mais como talvez..eu nunca dei aula na escola de fato, a não ser no estágio, assim, ou nas cadeiras aqui da esef, nunca tive uma continuidade fora da universidade, antes, então é difícil dizer que tu quer fazer uma coisa que tu não tem a experiência, se tu não tem o contato, eu fui aluno, eu não fui professor, e...daí..mas eu gosto da posição de professor, e por isso que eu entrei com essa idéia de também ser professor de escola, não que eu já soubesse como que ia ser, mas, que eu via que era um caminho natural pra quem fosse fazer o curso [...] (Entrevista Vladimir, 06/10/2008)
Contudo, mesmo frente à esse distanciamento do processo de formação com
a escola e compreendendo a dificuldade da atuação no espaço escolar, os
graduandos vêem a escola sob uma perspectiva financeira, no sentido de
estabilidade profissional. Ernesto, um de nossos colaboradores, que tem como
experiência o trabalho de iniciação esportiva ao futebol, fala sobre estas questões:
[...] Tenho interesse, acho legal, acho uma área legal, principalmente uma área mais estável, né, no sentido do concurso né, tu fazer um concurso e tu ter estabilidade assim, né. Mas...também acho mais difícil, acho que é bem trabalhoso também, não é fácil dar aula em escola, um bom professor né, um mal profissional tem em várias áreas, a gente sabe disso, né, o rola-bola, que a gente chama, né, mas tu ser um bom professor, né, até pela diversidade que tu..que tu encontra na escola, muitas turmas, muitas idades, às vezes tu dá aula pra quinhentas turmas ao mesmo tempo, ter uma metodologia, um trabalho bom né, acho que é bem difícil. Mas eu tenho essa..tenho de repente..essa vontade de trabalhar, mais tarde, em escolas. (Entrevista Ernesto, 04/09/02008)
Assim, Ernesto comenta da dificuldade relacionada à prática docente neste
espaço, que por diversos fatores se coloca como mais complexa em relação à sua
experiência anterior com o futebol. Porém, evidencia que o campo da educação
física escolar é uma oportunidade de manter a estabilidade profissional. Marques
também coloca a sua vontade de trabalhar em escola. Ele coloca que após a
conclusão do curso seu primeiro objetivo “é ir atrás de escola” (Entrevista com
Marques, 30/09/08). E ele conclui dizendo que “por questões tanto ideológicas
quanto financeiras, eu vejo a escola como uma primeira porta de saída da
faculdade”.
30
Por entender que a escola ainda é um dos campos de maior atuação do
professor de educação física, me parece clara a necessidade de aproximar a
formação inicial da docência escolar como um todo, e não apenas na questão
específica dos conteúdos. Como vimos nos relatos dos colaboradores, as
experiências anteriores à graduação têm um peso grande na escolha da profissão e
têm influencia de certa forma em suas práticas. Como coloca Sanchotene (2007), os
saberes utilizados pelos professores nas aulas de educação física não têm relação
apenas com a sua formação acadêmica, mas também com experiências vividas em
todas as dimensões, desde a escolarização, passando pelas vivências esportivas e
chegando na formação inicial, continuada, e na própria prática escolar, constituindo-
se um saber de caráter plural. Concordo com a autora, mas entendo que é um dever
da academia, produtora e certificadora do conhecimento científico, de ser a principal
formadora do professor de educação física. Entendo que a formação profissional é
um processo muitas vezes subjetivo. Mesmo submetido ao mesmo currículo,
pessoas diferentes passam por experiências diferentes ao longo da vida, e assim
suas práticas tem um caráter subjetivo inquestionável do ponto de vista científico.
Porém, é necessário que esta subjetividade, oriunda das vivências específicas de
cada professor, tenha seu lugar reservado apenas ao subjetivo e não na maioria do
processo de ensino escolar. Por isso, há a necessidade de o licenciando conhecer
desde cedo a estruturação escolar, para que quando este chegar no processo de
estágio, não chegue carregado de dogmas que cerquem esta prática docente e para
que tenham a possibilidade de uma prática mais próxima da realidade da escola,
sem os preconceitos e valores que estes trazem de suas experiências passadas e
que hoje são impressos na instituição escolar. Desta forma, é sobre a questão
curricular da formação inicial é que discutirei na próxima categoria.
4.2 ASPECTOS DO ÂMBITO LEGAL: O currículo de graduação e sua influência na formação profissional
Os elementos que condicionam a formação do professor de educação física
são os mais diversos. Como argumentei no capítulo anterior, o processo anterior ao
ingresso na graduação constitui um período importante na construção de saberes do
futuro docente. Porém é importante frizar que os aspectos do âmbito legal se
colocam na centralidade deste processo. Assim, as disciplinas e conteúdos, que são
31
parte do currículo de formação, elaborados a partir de concepções de educação,
oriundos das Diretrizes, Resoluções e Decretos do Conselho Nacional de educação,
são elementos que integram a vida acadêmica dos estudantes de educação física.
Desta forma, é preciso questionar: Para que e para quem serve a formação
profissional nos dias de hoje? E de que forma esta formação subsidia a prática
docente escolar dos futuros professores de educação física?
Sendo assim, é importante iniciar contextualizando as origens do processo de
formação da EsEF/UFRGS. Como destaquei anteriormente, a origem higienista e
militarista dos cursos de formação consolidaram concepções de currículo
extremamente voltadas para o aspecto técnico. Como traz o site da EsEF (2008), as
disciplinas de cunho pedagógico foram sendo integradas ao currículo aos poucos.
Seu primeiro currículo não constava com nenhuma disciplina, passando para três no
segundo currículo, chegando a um total de nove no currículo dos anos setenta, o
terceiro da Escola. Os debates foram se aprofundando ao longo desta década, que
culminou com a aprovação da Resolução nº1/86 da Comissão de Carreira. Esta
proposta acabou sendo implantada em 1987, constituindo assim o quarto currículo
da ESEF. Currículo este que se propunha a formar "um professor generalista dentro
de uma concepção humanista". (op cit.)
É interessante destacar, entretanto, que, nos últimos anos, a concepção que
tem sido parâmetro para os cursos de formação profissional é a concepção da
educação pela “pedagogia das competências”, que se insere em diversos
documentos oficiais como a Resolução CNE/CP (Conselho Nacional de
Educação/Conselho Pleno) nº1, de 18 de fevereiro de 2002, que institui Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica, em
nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena, e que traz no seu artigo 3º
que a formação de professores que atuarão nas diferentes etapas e modalidades da
educação básica observará princípios norteadores, dentre os quais devem
considerar a competência como concepção nuclear na orientação do curso (BRASIL,
2002). Ainda segundo o documento, é necessário “adotar essas competências como
norteadoras, tanto da proposta pedagógica, em especial do currículo e da avaliação,
quanto da organização institucional e da gestão da escola de formação” (p.2).
Vemos então, na proposta de Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN) de
2002, onde o curso de educação física é enquadrado dentro das ciências da saúde,
que coloca o objeto de estudo destas DCN como sendo
32
[...] permitir que os currículos propostos possam construir perfil acadêmico e profissional com competências, habilidades e conteúdos, dentro de perspectivas e abordagens contemporâneas de formação pertinentes e compatíveis com referências nacionais e internacionais, capazes de atuar com qualidade, eficiência e resolutividade.(BRASIL, 2000a, p.2)
Já os objetivos das diretrizes são
[...]levar os alunos dos cursos de graduação em saúde a aprender a aprender, que engloba, aprender a ser, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a conhecer, garantindo a capacitação de profissionais com autonomia e discernimento para assegurar a integralidade da atenção e a qualidade e humanização do atendimento prestado aos indivíduos, famílias e comunidades.(op cit, grifo do autor)
Desta forma, segundo Ramos (2002), a educação baseada no princípio das
competências, mesmo sendo enunciadas como um princípio formativo adequado à
flexibilidade e à complexidade atual dos processos de trabalho, se reduzem a
atividades profissionais prescritíveis, se encaixando dentro dos padrões de produção
taylorista-fordista compreendendo assim uma formação de caráter técnico
instrumental. Ao fazer o contraponto a este tipo de visão educativa, tenho acordo
com a autora quando ela argumenta que
[...]a aprendizagem significativa não se processa pela primazia da ação, mas à medida que o pensamento trabalha com conceitos, no movimento de compreender a essência dos fenômenos e ultrapassar o senso comum. Essa perspectiva tem o trabalho como princípio educativo, configurando uma unidade entre epistemologia e metodologia. Os processos produtivos não são vistos exclusivamente por seu potencial econômico ou pelo conteúdo científico-tecnológico e operatório, mas como momentos históricos e como relações políticas e sociais concretas (p.419).
Indo ao encontro destas idéias, Taffarel & Santos Júnior (2005) colocam que o
projeto de educação baseado na pedagogia das competências está articulado com o
plano econômico por meio da reestruturação produtiva, calcado nos princípios
políticos do neoliberalismo. Desta forma os autores, rejeitando esta proposta
formativa, defendem que a formação do professor de educação física seja pautada
em princípios que tenham como horizonte histórico a superação da organização da
vida ao modo do capital. Segundo os autores, o profissional assim formado passaria
[...] a ser qualificado para o exercício de atividades profissionais no campo que tenham como objeto as atividades corporais e esportivas,
33
entendida como um campo de estudo e ação profissional multidisciplinar cuja finalidade é possibilitar a todo cidadão o acesso aos meios (de produção) e aos conhecimentos acumulados historicamente [...] (p. 130)
Assim, nesta proposta, a concepção nuclear da educação física não estaria
focada na noção de competência, mas sim configurada nas diversas dimensões do
conhecimento, como a científica, técnica, pedagógica, ética, moral e política,
pautada em ações libertadoras e emancipatórias. Entretanto, a noção de
competência é o parâmetro central para a atual formação do professor de educação
física, se situando dentro dos moldes do processo de reordenação da formação
profissional baseado no discurso do empreendedorismo. Como nos trás Nozaki
(2005), a formação em educação física
[...] tem passado , desde a década de 80 e mais fortemente na década de 90, por uma grande orientação para o campo não-escolar. O discurso ligado ao empreendedorismo apontou o assim chamado mercado emergente das práticas corporais, sobretudo o das atividadades físicas, como o mais promissor para gerir a precarização do trabalho docente. (p. 24)
A formação baseada nestes moldes, então, têm precarizado o trabalho
docente escolar, na medida em que o domínio das habilidades técnicas e
instrumentais por si só não são suficientes para a dimensão social e política do
mundo escolar. Tendo o objeto de estudo pautado na ótica da atividade
física/movimento humano e classificada dentro das ciências da saúde, a formação
em educação física secundariza a gama de conhecimentos das práticas educativas
e pedagógicas, inerentes e fundamentais para a atuação do professor enquanto
educador, independente de qual seja seu espaço de trabalho.
Assim, podemos considerar que, tanto os currículos escolares, quanto os
currículos de formação de professores têm se baseado majoritariamente no que
Giroux (1997) chama de “modelo tecnocrático”, ignorando a promoção de uma
reflexão crítica, favorecendo uma visão passiva dos estudantes sobre os conteúdos
curriculares. Segundo o autor,
[...]o conhecimento no modelo curricular dominante é tratado basicamente como um domínio dos fatos objetivos. Isto é, o conhecimento parece objetivo no sentido de ser externo ao indivíduo e de ser imposto ao mesmo. Como algo externo, o conhecimento é divorciado do significado humano e da troca inter-subjetiva. Ele não é mais visto como algo a ser
34
questionado, analisado e negociado. Em vez disso, ele se torna algo a ser administrado e dominado (p. 45)
Para acentuar esta lógica, é aprovada no ano de 2004 pelo CNE a Resolução
nº 7, de 31 de março, que institui as novas Diretrizes Curriculares Nacionais para os
cursos de graduação em educação física, dividindo assim o curso em licenciatura e
bacharelado. Com a falsa idéia de qualificar a formação do graduando, as novas
diretrizes criam uma falsa dicotomia na área, onde existiriam os professores, aptos
para atuar somente na escola básica, e os profissionais, que seriam os formados
para as outras áreas de atuação. No caso da EsEF/UFRGS, a nova disposição entra
em vigor já no vestibular seguinte à aprovação das novas diretrizes, ou seja, a partir
do ano de 2005, fazendo com que haja dois vestibulares distintos para o curso de
educação física. O novo curso de licenciatura, então, é assim apresentado, segundo
as informações do sítio eletrônico da instituição (www.esef.ufrgs.br):
O novo currículo da Licenciatura em Educação Física entrou em vigor no primeiro semestre de 2005 e tem por objetivo a formação de professores de Educação Física para atuarem na rede escolar formal, que compreende o ensino infantil, o ensino fundamental e o ensino médio. Desse modo, o Licenciado em Educação Física atua prioritariamente em creches e escolas de ensinos infantil, fundamental e médio [...] (ESEF, Sítio eletrônico).
Já o curso de bacharelado é assim apresentado:
O Bacharelado em Educação Física entrou em vigor no primeiro semestre de 2005 e tem por objetivo a formação de profissionais qualificados para o exercício da área de Educação Física, entendida como um campo de estudo multidisciplinar e de intervenção profissional através das diferentes manifestações e expressões do movimento humano. O Curso visa à formação, ao desenvolvimento e ao enriquecimento cultural das pessoas, para aumentar as possibilidades de adoção de um estilo de vida fisicamente ativo e saudável. O Bacharel em Educação Física está apto a atuar nos campos da prevenção, promoção, proteção e reabilitação da saúde, da formação cultural, da educação e reeducação motora, do rendimento físico-esportivo, do lazer, da gestão de empreendimentos relacionados às atividades físicas, recreativas e esportivas, além de outros campos que oportunizem ou venham a oportunizar a prática dessas atividades, em ambientes diferenciados da rede escolar formal [...]
Com isso, é possível identificar dois aspectos relativos a este processo de
divisão dos cursos de educação física. O primeiro deles é a fragmentação do
conhecimento no currículo de formação. Segundo estas novas diretrizes, o
35
conhecimento pedagógico e educativo é exclusivo do licenciado, formado apenas
para a educação física escolar, e o conhecimento do bacharelado compreenderia os
conteúdos necessários para a atuação em outros espaços, como a academia e
clubes esportivos por exemplo. Entretanto, esta divisão simplesmente ignora o
princípio inerente a toda ação dentro da área da educação física: a prática
pedagógica. Independentemente do espaço de atuação, o professor de educação
física é um educador, necessitando de conhecimentos que possam contribuir para a
prática perante os indivíduos com os quais irá desenvolver seus processos
pedagógicos, seja no espaço escolar ou no espaço não-escolar. Desta forma, as
diretrizes colocam em lados opostos uma mesma profissão que parte do mesmo
pressuposto epistemológico.
Com a divisão surge o segundo aspecto referente a este processo. A partir da
fragmentação do conhecimento e da área de atuação, se cria a distinção entre
“professor” e “profissional”. Assim, é possível colocar que as novas diretrizes, assim
como esta distinção de caráter conceitual, tem relação direta com o próprio processo
de regulamentação da profissão de educação física, sob a lei nº 9696/98. A partir da
aprovação desta lei e da conseqüente criação do Sistema CONFEF/CREFs, há uma
forte influência política na tentativa de então colocar em prática as novas diretrizes,
pois como colocam Titton et al (2005), no processo de reordenamento do mundo do
trabalho, o sistema CONFEF/CREFs tem sido o órgão responsável por implementar
os ajustes estruturais na nossa área, intervindo diretamente na construção destas
DCN e na intenção de resguardar o “profissional de educação física”. Desta forma,
numa clara tentativa de reserva de mercado e de recrutar filiados, o conselho cria a
categoria do “profissional”, mascarando assim os problemas importantes da
educação e desvalorizando a figura do professor e da própria educação física
escolar. É interessante colocar que, apesar do discurso da especificidade de
atuação na educação física escolar, não há impedimento legal para a atuação do
licenciado. Já o bacharel é impedido legalmente de atuar no espaço escolar por seu
currículo não estar de acordo com as Diretrizes Curriculares para a Educação
Básica.
Em relação à formação específica para a docência escolar, faço necessário
argumentar que, apesar da alteração curricular que as licenciaturas sofreram, sua
disposição praticamente manteve-se igual4. A chamada licenciatura plena, em
4 Como ao longo destes últimos semestres desde a implantação dos novos cursos (licenciatura e bacharelado) a
36
extinção, com ingresso até o semestre 2004/2, do qual fazem parte os
colaboradores Rosa e Vladimir, conta com 22 créditos5 obrigatórios distribuídos em
10 disciplinas que tratam de assuntos referentes à prática docente em escolas. Já a
nova licenciatura, com ingresso a partir de 2005, que fazem parte os colaboradores
Ernesto e Marques, conta com apenas 2 créditos obrigatórios a mais do que a
licenciatura plena (24), distribuídos em 11 disciplinas. Já se formos considerar as
disciplinas obrigatórias do currículo de licenciatura de cunho biológico, elas se
consolidam num total de 30 créditos. Claro que é necessário que se entenda que
minha intenção não é quantificar o currículo, mas sim compreender de que forma
esta estruturação curricular está sendo condizente com a formação do professor
para a atuação no mundo escolar.
Compreendo que tanto as disciplinas referentes ao conhecimento pedagógico
quanto as disciplinas de cunho biológico são necessárias para a prática dos
professores. Entretanto, é preciso que se compreenda de que maneira se articula
esta relação teoria e prática, de que modo as disciplinas do currículo fazem uma
contextualização com a prática do mundo docente, e de que modo este currículo
está preparando os futuros professores a ensinar seus alunos no mundo da escola
os vários elementos da cultura corporal.
4.2.1 O QUE SE APRENDE E O QUE SE ENSINA EM EDUCAÇÃO FÍSICA: o esporte como perspectiva hegemônica
Segundo o Coletivo de Autores (1992), a educação física é uma disciplina
escolar que trata de uma área do conhecimento denominada “cultura corporal”.
Assim, fazem parte desta área diversos elementos e formas de atividades corporais
como as danças, os jogos, a ginástica, as lutas, o esporte, entre outros. Assim, o ser
humano foi se apropriando ao longo dos séculos destes elementos por diversos
motivos, seja para celebrar e festejar, com as danças; seja como forma de proteção
dos seus povos, que se criam as lutas; ou seja para se divertir que criam os jogos;
seja para exercitar o corpo, cria-se a ginástica. Entretanto, é o esporte que se
COMGRAD (Comissão de Graduação) do Curso de Educação Física da EsEF/UFRGS têm feito diversas alterações curriculares, tomei como padrão de análise os currículos referentes ao semestre de 2008/2.
5 Um crédito equivale a 15h/aula.
37
constitui como a maior expressão da cultura corporal do mundo contemporâneo.
Como nos traz Bracht (1997), a gênese do esporte moderno acontece
durante meados do século XVIII, tornando-se uma atividade corporal de caráter
competitivo, que esportiviza, ou seja, institucionaliza elementos lúdicos das classes
populares, como os diversos jogos com bola. Assim, as formas populares de jogos,
não fazendo mais sentido durante os processos de industrialização que vinham
passando as sociedades européias, acabam sendo aos poucos esportivizadas.
Segundo o próprio autor, este fenômeno esportivo “tomou de assalto” o mundo da
cultura corporal, sendo hoje a expressão hegemônica das atividades corporais.
Tanto é que nos países de língua germânica, adotou-se o termo esporte de forma
geral para significar qualquer modalidade de exercício físico (Oliveira, 2001). Além
disso, existem os grandes eventos esportivos, como os Jogos Olímpicos e a Copa
do Mundo de Futebol, que são a grande expressão do esporte na atualidade.
Partindo destes pressupostos, é possível elencar alguns elementos que
fazem com que se compreenda o porque do esporte se expressar enquanto
conteúdo hegemônico e dominante da formação em educação física e
conseqüentemente da educação física escolar.
Assim, como tratado anteriormente sobre as experiências passadas dos
graduandos, foi possível notar que a maioria das experiências que os futuros
professores tiveram em relação à atividades corporais foram experiências com
práticas esportivas e além disso, a maioria das aulas de educação física se
consolidavam na prática de esportes, como é possível ver neste depoimento de
Ernesto:
[...]prioridade futebol, né, melhor ainda, futsal, né...futsal, o futebol não, era futsal, era quadra, as aulas eram centradas no jogo, né , dificilmente a gente fazia, geralmente era ou um aquecimento, alguma brincadeira e era o jogo né, dificilmente tinha um trabalhinho técnico, alguma coisa tática, técnico-tática, porque era aquele negócio da escola, era muita gente, muitos alunos e um professor, então fica complicado de fazer uma..um trabalho [...] começava pelo futebol, aí um..um mês era vôlei, mas a última aula era futebol, aí o outro semestre era handebol, outro mês era handebol mas a última era de futebol, entendeu, então sempre buscando essa aula de..de..essa aula livre era sempre voltada pro futebol, futsal. (Entrevista Ernesto, 04/09/02008)
Assim, as recordações de Marques sobre suas aulas de educação física
escolar também centravam-se na questão do esporte.
38
Ah..totalmente né, totalmente, totalmente direcionada pro esporte..na minha recordação né [...] isso é o que eu me lembro né, o que vem...é o que na verdade é o que ficou então...por isso importante né, mas é..futebol, aí futsal, colocaram tabela de basquete uma época, rede de vôlei, e rede pendurada em tudo quanto era lugar na escola, então..era mais ligada aos esportes mesmo (Entrevista Marques, 30/09/08)
Ou seja, a manifestação esportiva, assim como a mais expressiva entre as
atividades corporais, se destaca também como a maior parte das experiências dos
alunos antes do período de graduação. Ao chegar no curso superior, entretanto, esta
lógica, ao invés de ser questionada, é reforçada, devido ao seu currículo
extremamente esportivizado. São ao todo vinte e duas (22) disciplinas esportivas
que compõe o currículo da licenciatura, enquanto as disciplinas relacionadas à
outros temas da cultura corporal, como dança, expressão corporal, ginástica e lutas
totalizam 13 disciplinas. Desta forma, é possível esperar que a prática do futuro
docente esteja imersa dentro deste universo esportivo, já que tanto sua experiência
de vida quanto sua formação acadêmica foram pautadas pelas práticas esportiva.
Outra questão que ao meu ver merece destaque é que, ao se deparar com a
escola pública, o graduando chega cheio de idéias, pensamentos de fazer coisas
novas, porém encontra uma estrutura escolar que contém diversos padrões culturais
também fortemente influenciados pela prática esportiva, mais precisamente o
futebol, que se consolida como a prática esportiva de maior relevância no Brasil.
Como apresenta Molina Neto (1995), o futebol se constituiu historicamente em uma
manifestação cultural que transcendeu seus limites e se transformou em um
fenômeno social com efeitos e influências diretas e indiretas em todo o tecido social,
tanto no Brasil, quanto no resto do mundo. Assim, da mesma maneira que se
popularizou entre as camadas mais pobres (antigamente o futebol só era praticado
pelas elites), as dimensões econômicas e políticas do futebol tomaram proporções
gigantescas, como no caso da época do governo militar, auge da tendência
competitivista da educação física (GHIRALDELLI JR., 1991), o governo utilizou-se
do futebol para desviar a atenção da crise econômica e dos graves problemas
sociais e políticos que o país passara. Assim, a vitória brasileira da Copa do Mundo
de 1970 no México foi utilizada como propaganda do governo, com o intuito de
mascarar as atitudes autoritárias relacionadas às torturas, perseguições e mortes,
39
freqüentes naquele período triste de nossa história (FUJIKAWA et. Al, 2006).
Os patamares atingidos pela influência do futebol perante a sociedade se
refletem na escola e desta forma a cultura do futebol, principalmente na lógica do
rendimento, se manifesta de forma tão forte no universo da educação física que
proporciona situações como esta que observei durante uma das minhas muitas
observações nas aulas dos estagiários:
Estou assistindo à aula do Marques, quando dois alunos de outro estagiário foram tirados da aula por motivos de indisciplina, e sentaram ao meu lado na escada de acesso ao pátio. Ao conversar um pouco com eles, um dos dois diz: “sôr bala era o da 3ª série, todos os dias de “física” era só futebol, só futebol”. (Diário de campo 21/05/08)
Assim, o futebol enquanto reflexo da cultura dominante do esporte na escola
interfere diretamente nas aulas de educação física, pois pelo fato de seu poder de
inserção e aceitação pelos estudantes da escola, faz com que a expectativa do
próprio aluno gire em torno da presença ou não deste conteúdo nas aulas, o que
acaba por influenciar a prática e o planejamento dos licenciandos para o estágio
docente, como vemos neste trecho:
[...]antes de fazer o estágio eu conversei com o professor Roberto né, perguntei como é que era, como é que eram as aulas que ele fazia, né, pra ver o que que eles já tinham trabalhado, né, uma turma de terceira série, mais ou menos isso, terceira série, nove anos, então pra ver o que eles tinham feito, né, até pra eu planejar as minhas aulas e ver o que que eu poderia dar, o que que seria proveitoso. O Roberto falou que eles tavam muito centrados na escola no futebol, uma cultura muito forte no futebol, e como eu já tinha uma uma experiência com futebol, pra mim era mais fácil [...] então eu tomei como meta, a prioridade trabalhar com futebol, mas nas aulas de futebol trabalhar outros elementos, não só o futebol [...] pensei em trabalhar, duas habilidades manipulativas, que seria da mão e do pé, né..só que pé seria futebol e mão eu optei pelo handebol para trabalhar com eles (Entrevista Ernesto, 04/09/02008)
A utilização do futebol e suas variações (como o caso do futsal), enquanto
elemento a ser ensinado nas aulas de educação física, passa então a ser utilizado
como “moeda de troca” com os alunos. No caso de Ernesto, a aproximação com
esta modalidade facilitou sua prática e a escolha desta modalidade, porém, a
experiência de outros estagiários esteve relacionada a uma certa “negociação” com
40
os alunos da turma. Assim, ao fazer uma sondagem com os escolares de suas
respectivas turmas, os estagiários se depararam com a aclamação dos alunos para
a prática do futebol, fato que os levou a optar por este conteúdo, mas também com a
intenção de trabalhar outros elementos que julgassem necessários ou de seus
interesses, como vemos no caso de Marques:
Trabalhei handebol e futsal [...] Eu queria fazer algo diferente, algo que eles não quisessem fazer, e..eles queriam fazer muito futebol, futsal, principalmente os guris né, então eu bom..vou começar a fazer alguma coisa que eles não querem, mas que..eu acredito que seja importante de trabalhar, e ao mesmo tempo eu não vou deixar de escutar os alunos né, até porque eu não vou pra dentro da escola fazer um planejamento de ensino de 3 anos, eu vou ali pra ficar seis meses, quatro meses na verdade, então..não faria muita diferença eu acho pros alunos o que que eu fosse trabalhar [...] então, eu achei que colocando o futsal de alguma forma isso motivaria os alunos a fazer alguma coisa diferente com mais empolgação, sabendo que bom, ah..o segundo bloco do estudo vai ser o futsal. Então eu escolhi o futsal, porque..de forma geral os alunos pediram isso, no início do semestre, eu conversei com eles perguntado das expectativas..e perguntei o que eles queriam ter..e grande parte disseram que seria o futsal (Entrevista Marques, 30/09/08).
A escolha do futsal surge então como estratégia na tentativa de mobilização
do grupo para as demais práticas da educação física, no caso de Marques,
buscando a aceitação do grupo pela prática de outro esporte, o handebol. No caso
de Rosa, que se utilizou de um processo “democrático” para a escolha do conteúdo
a ser trabalhado, o futebol surge como proposta da turma, entre outros motivos, pela
ocorrência de um campeonato na escola, fazendo os alunos a enxergar o espaço da
educação física como o espaço para o treinamento da equipe da turma para o
torneio que aconteceria:
[...] quando eu cheguei na sala de aula..eu reuni todos eles..e eu achei que a gente poderia decidir juntos o que a gente ia trabalhar. De repente hoje eu não faria isso, mas eu fiz.. E aí a gente fez os grupos, assim, três grupos, e cada grupo sugeria uma atividade, e depois eu queria saber até que ponto que eles tavam maduros, sabe..era uma turma madura ou não..5ª série né? E eles sugeriam e aí no final, por meio de votações e tal das sugestões que eles tinham dado eles devriam defender porque que eles queriam aquela coisa. E aí no final a gente ficou com algumas atividades, e uma das que eles queriam muito, mas queriam muito mesmo, inclusive as meninas, que foi por isso que eu...de repente deixei eles....ou melhor eu...bom..eu acatei o que eles queriam sabe, porque as meninas queriam muito jogar futsal, e aí..eu, bom então tá..e eles tavam por volta dum torneio, então eles tavam...sabe...inebriados com aquela história do tal do torneio que ia ter no colégio...então eles queriam muito treinar..e eles viam o espaço
41
da educação física como o mais propício pra fazer isso, ou seja..eu tinha obrigação de dar..na cabeça deles eu tinha obrigação de dar futsal pra eles, entendeu..aí eu combinei que dos três períodos um pelo menos seria de futsal... aí essa foi nossa combinação, dos outros dois eu trabalhava todas as outras coisas que eu queria ( Entrevista Rosa, 09/09/2008)
É interessante destacar então, que a vontade do aluno é satisfeita no intuito
de conseguir com que outros elementos sejam possíveis de serem trabalhados, pois
talvez do contrário, o trabalho da estagiária, que já contou com as diversas
dificuldades inerentes à docência na escola pública, estivesse destinado a ser um
entrave, entre a proposta de conteúdos que a estagiária julgasse ser adequado a ser
ensinado, e os que a turma julgasse ser adequado. Ao pensar que este possa ser
um elemento corriqueiro nas aulas de educação física, fica a reflexão sobre se isto
aconteceria em outras áreas do conhecimento. Talvez seria estranho, e quem sabe
inimaginável ver uma turma de quinta série pedir para ter uma aula de história sobre
Grécia Antiga quando o professor está ensinando História do Brasil. Penso que a
partir disso, fica a necessidade de saber trabalhar de forma crítica o esporte (até
porque negá-lo não me parece a solução) e promover a discussão sobre seu real
papel dentro da escola. Se a graduação não der elementos para que o estagiário e
futuro professor possa argumentar e sustentar a defesa do ensino de outros
conteúdos, é bem provável que sua prática se condicione às práticas culturais mais
expoentes da nossa sociedade, como o esporte, e principalmente aqui no Brasil, o
futebol, que se destaca como o esporte mais popular e com maior apelo midiático.
Além disso, há a necessidade, a partir da formação inicial, de confrontamento
da lógica com a qual vêm sendo tratada o esporte, pautado na lógica do rendimento,
como nos trouxe o exemplo do campeonato de futsal que balizou uma parte das
aulas da estagiária. Compreendo que o torneio, assim como os eventos curriculares
da escola são necessários e importantes para a integração e para o processo de
formação dos estudantes, porém sua lógica e seu caráter competitivo parece não
ser questionado. Silva e outros (2008), ao abordarem o poder de penetração do
esporte, sobretudo dos jogos olímpicos nas práticas escolares, trazem a questão da
inter-disciplinalidade envolvida para a realização destes eventos, como o caso da
Geografia e os costumes e tradições dos países, a História com os acontecimentos
e fatos, e a educação física, que fica incabida de realizar os jogos. Porém, segundo
os autores,
42
Na especificidade da Educação Física, por exemplo, podemos afirmar, com certo grau de certeza,que o lema olímpico “Citius, Altius, Fortius” (o mais rápido, o mais alto, o mais forte) de maneira nenhuma é questionado. Quantas vezes, em nossa vivência com o esporte já participamos de “cerimônias de abertura” de jogos, torneios e competições em que nos púnhamos de braço direito erguido repetindo em uníssono o “juramento” do atleta? Seria necessário questionar-se por que essa situação ocorre com tamanha freqüência e se essas práticas têm fundamentação para além da mera reprodução de uma lógica que é, no fim, imposta. Inegável é, entretanto, o fato de que esses exemplos e tantos outros acontecem com bastante freqüência (p.5)
Cabe então, ressaltar que esta lógica acaba se reproduzindo sem ser
questionada no processo de formação, transformando o momento para se definir
quem é o melhor, o mais habilidoso, com o intuito de direcionar a aula ao torneio
escolar. Desta forma, em acordo com Santos Júnior (2005) pude notar a dificuldade
dos estudantes que realizam o estágio em fugir da ótica de que a aula de educação
física é um espaço para “treinar” as habilidades de uma determinada modalidade
esportiva. Com isso, além de aparecer como conteúdo mais trabalhado durante o
estágio, o esporte ainda aparece numa perspectiva do alto rendimento, onde os
mais habilidosos participam, e aqueles que não tem domínio das técnicas acabam
por serem “excluídos” ou se “auto-excluírem” do processo de ensino-aprendizagem,
pelo insucesso nas atividades propostas. Há uma passagem do diário de campo que
explicita bem esta realidade:
[...] após a atividade, a estagiária pegou dois alunos para escolher os times. Os meninos foram escolhidos primeiro. A estagiária pediu para que o restante, dois meninos gordinhos e as gurias, esperassem. Nisso, uma aluna gritou “que discriminação, sora”. A estagiária não ouviu e seguiu organizando o jogo. Após este jogo, o time ganhador ficou em quadra e enfrentou o time das gurias (Diário de Campo, 02/04/08)
Na tentativa de responder a questão “o que se aprende e o que se ensina em
educação física?”, o que posso destacar é que os diversos fatores históricos,
culturais, políticos e econômicos que transformaram o esporte num dos maiores
fenômenos do mundo contemporâneo, afetam diretamente o processo de formação
e de docência do professor de educação física. O desenvolvimento de outros
elementos da cultura corporal no âmbito escolar é dificultado na medida em que
estas manifestações são discriminadas duplamente: no próprio currículo de
graduação, e na escola, onde os fatores culturais condicionam a prática do
43
licenciando para o feômeno esportivo. Sobre a prática propriamente dita é que
discutirei na próxima categoria de análise.
4.3 A DISCIPLINA DE PRÁTICA DE ENSINO: Entre a teoria e a prática
Nesta categoria, tomei como objetivo analisar a prática docente dos
estagiários do curso de licenciatura em educação física, na tentativa de
compreender todos os aspectos referentes à inserção destes estudantes no mundo
escolar. Tenho a clareza de que a prática de ensino por si só já seria tema para
muito estudo, pois ela traz elementos riquíssimos para compreender este processo
de introdução aos signos, às culturas, às dificuldades, e aos diversos elementos
inerentes à realidade da escola pública. Assim, minha intenção inicial era utilizar a
prática de ensino como elemento metodológico, através de observações, para então
teorizar sobre a formação como um todo. Entretanto, após realizar as entrevistas e
iniciar o processo de construção das categorias de análise, percebi que a própria
prática de ensino estava se constituindo como uma delas, visto que as experiências
dos licenciandos trouxeram muitos elementos referentes a suas atuações na
condição de professores da escola pública. Desta forma, a experiência da prática
docente surge como um elemento importantíssimo do processo de formação inicial
dos estudantes de educação física, na qual eles têm a oportunidade de pôr em
prática (ou ao menos tentar) toda a gama de conhecimentos adquiridos durante seu
processo de graduação.
Sendo assim, é interessante colocar que a experiência do estágio não surge
como o primeiro contato docente dos estagiários. Todos eles colocaram que durante
a graduação tiveram algum tipo de experiência docente em relação à escola. Os
colaboradores fazem menção a disciplinas em que tiveram a oportunidade de
lecionar na escola, como no caso do colaborador Marques:
[...]até inclusive uma coisa que eu não colocava no currículo..era a minha experiência docente da faculdade né..eu comecei a dar conta que eu dei aula em um monte de lugar e que isso não ficava registrado em lugar nenhum, porque tu faz uma cadeira por exemplo, de tópicos especiais em educação física, então, mas as pessoas não sabem o que que se trata, né..então, eu dei aula de basquete técnicas de ensino, aí eu dei aula em efi infantil, no na escola Otávio de Souza [...].tiveram algumas disciplinas assim, acho que em torno de quatro, que eu dei aula né..algumas eu fui obrigado teoricamente, por exemplo efi infantil, que é uma cadeira
44
obrigatória que eu tenho que fazer e no caso a professora propunha que a gente desse aula na escola, outras eu optei né, por exemplo basquete técnicas de ensino, que daí eu sabia do que se tratava a cadeira, que era pra dar aula e tal, mas, antes do estágio, dentro da faculdade eu participei de umas quatro cadeiras assim relacionadas a prática docente né, dentro da escola. (Entrevista Marques, 30/09/08)
Assim como no caso de Marques, Vladimir faz menção também a algumas
disciplinas nas quais teve a oportunidade de lecionar:
[...]teve pelos menos 3 ou 4 disciplinas que tinham entre as atividades a gente planejar e ir praticar..aplicar algum conjunto de aulas, assim...não era um semestre inteiro, não era um período muito grande, era apenas um período curto, talvez assim um mês..quatro semanas, 3 aulas, 2 aulas..até uma aula..não, 3 aulas foi acho que chegou a ter em alguns casos, então teve, antes do estágio teve..teve essa oportunidade (Entrevista, Vladimir, 6/10/08)
Há também aquelas experiências relativas a projetos, como é o caso da
colaboradora Rosa, que além de disciplinas do currículo, faz menção a um projeto
escolar onde trabalhava com crianças em uma escola da rede pública:
[...]eu fiz parte do segundo tempo, dei aula no Gabriel Obino, também, e era uma escola muito...ela tem todos os recursos que tu precisa né. Aqui na graduação eu fiz o tópicos (especiais em educação física) e era rodas cantadas né..as cirandas...e a gente também pode colocar isso na escola, mas eram crianças bem pequenas que a gente pegou. Já no segundo tempo não, já tinha alunos de todas as idades, todos os alunos da escola fizeram parte, principalmente lá no Gabriel Obino. Foi bem bom, foi uma experiência bem boa.(Entrevista Rosa, 09/09/2008)
Já Ernesto não menciona experiência alguma durante a faculdade, mas sim
sua experiência com a iniciação esportiva:
[...]eu comecei a trabalhar com..com criança..hã..antes da faculdade, escolinha de futsal, aí específico, o esporte futsal, mas numa escola, dentro de uma escola, inserida num contexto escolar. Então eu comecei a dar aula quando eu passei no vestibular, então eu comecei a trabalhar e depois eu comecei a cursar a faculdade, então a experiência que eu tinha era só de ex-atleta, né, não tinha experiência docente nenhuma,
45
então eu fui ao longo das aulas eu fui aprendendo e amadurecendo, até pelo contato com os outros professores né, mas experiência docente não tinha..né, essa foi a..essa foi a experiência que eu tive com a escola (Entrevista Ernesto, 04/09/02008)
É possível argumentar então, que os licenciandos, ao chegarem na prática de
ensino, trazem experiências docentes que de alguma forma contribuiram para a sua
formação. Projetos (como o segundo tempo), a prática em determinadas disciplinas
ao longo do curso, e os estágios extra-curriculares são alguns exemplos de
experiência docente que os licenciados acumulam ao longo de sua trajetória durante
a graduação. Entretando, a imersão de fato no mundo da escola se dá apenas ao
chegarem no estágio curricular obrigatório. Nas outras experiências, os estudantes
estão ali para cumprir funções de docência, porém com objetivos que se diferenciam
do objetivo da prática de ensino, como por exemplo, a experiência de algumas
disciplinas, quando o estudante da graduação é “contemplado” com determinado
tema ou conteúdo, e precisa planejar uma ou algumas aulas para aplicar em um
contexto escolar de forma isolada; o caso dos projetos de turno inverso, onde são
propostas atividades referentes à educação física, mas que não se enquadram
dentro de um planejamento de ensino regular, com métodos avaliativos necessários;
e também o caso das escolinhas de iniciação esportiva, onde existe um
planejamento, uma continuidade do trabalho, mas o objetivo se pauta no rendimento
naquela modalidade específica.
Com isto, a função de professor escolar, que inclui não só o ato de “dar aula”,
mas também diversas outras funções, como o planejamento, o acompanhamento da
turma, a avaliação sistemática, acaba ocorrendo de fato só quando os graduandos
chegam ao estágio obrigatório. Assim, ao se depararem com a escola pública, se
deparam também com as diversas mazelas que fazem parte deste contexto. E
sentem na pele as dificuldades de atuação em uma realidade muitas vezes
desconhecida. Alguns inclusive ficaram receosos em realizar o estágio em
determinadas escolas pelo contexto social extremamente complicado que
encontram. Recordo-me que um dos estudantes matriculados na disciplina desistiu
de concluí-la ainda no período das reuniões com o grande grupo quando soube que
houvera o assassinato de uma pessoa nas proximidades de uma das escolas na
qual haveria disponibilidade para realizar o estágio.
Outro fato, também referente a esta mesma escola, que inclusive foi a escola
46
na qual realizaram suas práticas os colaboradores Ernesto e Vladimir, aconteceu no
período pré-estágio, em uma aula onde haveria a divisão das turmas entre os
estagiários. Lembro que quando alguém se disponibilizava para ficar com alguma
turma nesta escola, o grupo restante comemorava, aplaudia, como se estivessem o
reverenciando por ter aceito o “martírio” de lecionar naquele lugar. Numa clara
indagação à turma sobre qual seria o motivo de tanta comemoração por aqueles que
escolhiam as turmas nesta escola, um estagiário chegou a questionar: “Mas porque
isso? Por acaso eles são terroristas das FARC”? (diário de campo, 17/03/08). A
escola, que se situa num dos bairros mais pobres e violentos de Porto Alegre, reflete
em seu cotidiano todos os problemas sociais existentes daquela comunidade. Isso
constituiu uma gama de dificuldades na própria aproximação e na inserção dos
estagiários naquele contexto escolar, como podemos analisar neste depoimento de
Vladimir:
[...]a gente teve como se situar e como de certa forma avaliar as condições que iríamos encontrar lá nessa escola. E daí eu imaginei que teriam alguns problemas relacionados a condição social, as pessoas que estão expostas a condições de risco social, e de repente alguns problemas mais né, principalmente acho que os relacionados a criminalidade, falta de..ao desemprego..desigualdade econômica, problemas relacionados à família. Eu imaginei que eles todos somados dariam um certo trabalho. Mas chegando lá, eles dão trabalho, mas acho que o principal da população lá dos alunos, o problema é por eles não ter regramentos na própria instituição escola, no momento que eu fui lá eu pensei em como regrar a minha aula, porém a minha aula, talvez se eu colocasse certas imposições estaria não em desacordo, mas por não ter condições de se estender por exemplo pra direção da escola, se eu por exemplo, instituísse na minha aula alguma certa punição ou alguma certa providência em relação à alguma atitude que fosse indevida talvez eu não fosse balizado pela escola, então deixava eu de certa forma refém de uma situação que já tava imposta e não teria como eu mudar (Entrevista Vladimir, 6/10/08)
A realidade social interferia diretamente no contexto das aulas do estagiário,
fato que também derivava das dificuldades que a própria direção da escola tinha em
conseguir manter a organização da instituição. Das muitas vezes que estive lá
observando as aulas de educação física, sempre me deparei com situações de
violência entre os alunos, mas que entre eles ganhava uma conotação de
“brincadeira”. Além disso, havia uma circulação enorme de estudantes durante os
períodos de aula pelo pátio. Independentemente da hora, se estavam em aula ou
não, sempre haviam diversos alunos correndo, tentando adentrar outras salas de
47
aula, mantendo diálogo com outros estudantes pelas janelas das salas, enfim, uma
desordem que se não impossibilitava, dificultava muito o andamento das aulas de
educação física. Vez ou outra o Roberto, professor das turmas do Vladimir e do
Ernesto, intervinha para separar alguma briga ou para conter os alunos que estavam
fugindo do local onde estava sendo realizada a aula de educação física. Desta
forma, o professor auxiliou bastante os estagiários perante as dificuldades
encontradas, como nos mostra este depoimento de Ernesto:
[...]tinha um professor de educação física que era o professor Roberto na escola. Ele era o professor de educação física, um dos, tinha uns três ou quatro se não me engano, mas ele era o professor, e como se fosse aquele o apaga incêndio, né, ficava no pátio pra gerenciar e controlar pra não dar maiores problemas né, porque? porque a escola não tinha um plano de ensino, não tinha uma estrutura capaz de solucionar esses problemas [...] até foi o professor que me auxiliou..me ajudou muito nas aulas, principalmente observando as aulas [...] quando achava necessário interferia nas aulas, quando alguma coisa que ele achasse meio importante, mas geralmente ele me deixava na aula, eu ter a imposição na aula, mas depois ele sempre me dava o feedback, né ah..isso aqui tá certo isso, aqui tá errado, então acho que isso foi proveitoso, assim (Entrevista Ernesto, 04/09/02008).
Assim, muitas das práticas destes alunos nesta escola estiveram
condicionadas a esta realidade. Na escola em que Rosa e Marques realizaram seus
estágios, a situação não era tão complicada como a de Vladimir e Ernesto, mas
mesmo assim existiam muitos pontos em comum. A dificuldade em lidar com os
alunos foi uma questão que também apareceu muito fortemente nesta outra escola.
Marques faz uma relação entre as dificuldades e sua aprendizagem com o estágio:
[...]cara..eu tenho uma frase que tem me acompanhado assim na faculdade, que é: quanto maior o calo, maior o aprendizado. Então...acho que quanto maior o desafio, maior o aprendizado. Quanto mais difícil, quanto mais desgaste, mais envolvimento tem que ter, mais comprometimento tem que ter, teoricamente mais aprendizado né...ou uma refuta total a nunca mais querer voltar. Realmente assim, a minha turma foi uma turma...hã..que eu achei que ela não foi nem um pouco fácil de dar aula praquela turma, mas eu achei também que não foi o inferno, digamos assim [...] Foi uma experiência difícil, que eu saía sempre com a minha voz muito cansada [...] eu tinha que tá falando muito, assim, tá gritando, e..isso era uma coisa bem desconfortável assim, na verdade a idéia que eu tenho pras aulas de educação física são tem que ser um espaço de aprendizado, por isso a justificativa pra estar na escola, senão não precisaria ensinar isso na escola, e eu gostaria que fosse com bastante prazer, ou seja, que as crianças pudessem aprender se divertindo. E essa era a minha idéia, mas nem sempre isso era possível né (Entrevista Marques, 30/09/08)
48
É interessante colocar que as dificuldades são inerentes a todo mundo que
atua na escola pública, porém compreendo que, quanto mais cedo o estudante ter
contato com a realidade da escola, e desta forma mais cedo tiver contato com as
dificuldades, no mínimo mais familiarizado com as situações adversas ele estará
para refletir e poder organizar uma metodologia que facilite sua atuação docente.
Mais cedo ele terá compreendido a cultura e as relações que existem dentro do
espaço escolar. E desta forma, facilitaria o processo de ensino-aprendizagem
proposto pelos estagiários.
Uma análise que faço dentre as várias situações vividas pelos estagiários
está no quesito conteúdo. Como nos mostram os Parâmetro Curriculares Nacionais,
os conteúdos são dividos nas categorias conceitual (fatos, conceitos e princÌpios),
procedimental (ligados ao fazer) e atitudinal (normas, valores e atitudes). Os
conteúdos de caráter procedimental, como visto na categoria anterior, se voltaram
majoritariamente ao conteúdo esportivo, que também abarcou de certa forma os
conteúdos de caráter conceitual, muitos deles ligados também ligados aos esportes,
como por exemplo o ensino de regras. Entretando, uma constatação que puder fazer
a partir das observações, e que depois apareceu como um elemento constante nas
entrevistas, é que os objetivos de ensino dos estagiários, que a princípio seriam uma
mescla entre os conteúdos de caráter atitudinal, conceitual e procedimental, acabou
pegando um rumo de modo que o central do ensino eram os conteúdos de caráter
atitudinal, frente às imensas dificuldades que os estagiários tinham em controlar a
turma e fazer com que os alunos se comportassem respeitosamente. Desta forma, o
conteúdo específico da educação física acabou sendo completamente
secundarizado, e a utilização de seus elementos servia apenas como pano de fundo
na tentativa de tornar a aula minimamente organizada, como nos sugere este trecho
da entrevista de Rosa:
[...]o foco do meu trabalho era isso, que eles tivessem ordem e disciplina..era isso...só que aí eu tive que usar todas aquelas atividades que eles queriam pra fazer isso..por isso que cada aula eu tinha que mudar...então eu usava o futsal..o vôlei, as fileiras...as ordens de apito..a gincana...tudo pra chegar lá no final e eles terem disciplina, tu entendeu...e atenção..eles eram muito desatentos..eles tavam sempre dispersos...então eu usava tudo que eu tinha, carta , jogos de memória, mímica...sabe...tudo que eu tinha, .tudo que eu pude usar, além dos esporte de bola [...] mas
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sempre praquilo...ordem e disciplina...sabe..e atenção, atenção, atenção[...] (Entrevista Rosa, 09/09/2008)
Assim, Ernesto faz uma reflexão sobre esta necessidade de se trabalhar os
aspectos comportamentais do aluno, para que então pudesse trabalhar com os
elementos mais específicos da educação física.
[...]se tu for ver meus planos de aula, todo o plano de aula tinha “trabalhar coletividade, trabalhar o respeito, né, respeito às regras do jogo”, porque isso eles não tinham, entendeu, eles não tinham essa..esse..então eu tinha que toda aula trabalhar. Pra fazer uma fila, era difícil, pra reunir eles, era difícil. Então como é que eu quero..como é que eu vou trabalhar hã...como é que eu vou conseguir trabalhar com eles o des..desenvolvimento motor deles, né, o repertório motor, as atividades, se eles não nem se organizam pra fazer a atividade. Não sabiam se organizar, se saem chutando, se saem..brigando, entendeu, então, ao longo do semestre eu tinha uma perspectiva, ao longo eu vi que, que eu tinha que trabalhar outros elementos pra chegar nesse fim aí né, por isso que eu acho que consegui trabalhar, alcançar meus objetivos em parte, justamente porque a turma..ela.. carecia de muitas..muitas coisas né (Entrevista Ernesto, 04/09/02008)
Claro que os conteúdos de caráter atitudinal fazem relevância para a prática
dos professores. Entretanto, entendo que existe uma diferença entre utilizar como
recurso e ser o objetivo principal. Assim, a dificuldade de organização acaba se
tornando uma obsessão pela manutenção da ordem. Segundo Enguita (1989), esta
obsessão é uma característica comum e importante que existe entre as escolas, e o
que confere a dimensão característica ao problema da ordem nas escolas é o fato
delas não serem instituições voluntárias. Para explicitar este pensamento, o autor
apresenta o exemplo de que é muito mais fácil manter a ordem numa sala de
cinema. Assim, os alunos se vêem inseridos nas relações de hierarquia e poder
dentro da escola, o que resulta obviamente numa “resistência”, caracterizando esta
incansável luta entre professores e alunos, o que faz com que boa parte da aula de
educação física seja na tentativa de manutenção desta ordem.
Um outro elemento importante de se discutir também, é até que ponto os
conteúdos da educação física se consolidam ou não enquanto relevantes para
aquelas crianças. Aliás, pensando um pouco mais além, fica a necessidade de os
cursos de formação terem a capacidade de fazer com que os futuros professores
possam tornar as práticas de educação física relevantes para os estudantes da
50
escola pública. Neste sentido, entendo que é responsabilidade da formação inicial
proporcionar uma maior aproximação dos estudantes de graduação com a realidade
escolar. Esta realidade precisa ser vivenciada de maneira mais sólida dentro do
processo formativo do professor. A necessidade desta forma de tratar o
conhecimento foi um aspecto que apresenta a colaboradora Rosa:
[...]escola aqui no livro é legal, é muito legal, que é tudo fácil, tu propõe coisas que eles vão fazer, aqui na esef quando a gente faz um exercício de recreação todo mundo faz, todo mundo sabe como fazer o movimento, todo mundo fica ali até o final, sabe, ninguém sai correndo ou bate no coleguinha, não, não é assim, aqui na esef tudo funciona, aqui é o mundo das maravilhas, pensa bem. E tu chega lá na escola, nada disso! Tu propõe oito atividades e tu faz uma, porque a turma não te escutou do jeito que..eles não fizeram silêncio do jeito que aqui na esef tu faz, entendeu? Então como é que tu vai preparar uma pessoa que vai trabalhar com pessoas, com outro público? Que é um público de acadêmicos, aqui, que é muito fácil de trabalhar (Entrevista Rosa, 09/09/2008)
Partindo desta fala, fica evidente que, apesar de obrigatórios, os estágios
supervisionados e as práticas de ensino do modo como estão organizados nos
currículos não têm preparado significamente os estagiários para a prática em
escolas públicas. Isto porque a estruturação dos estágios, que têm como objetivo
dar a oportunidade para os graduandos a prática da docência, tem se dado nos
cursos de licenciatura dentro uma concepção mecânica de interligar teoria e prática,
como se fosse possível o estudante passar o curso inteiro acumulando
conhecimentos, e ao chegar no final do curso, na sua prática de ensino, depositar os
conteúdos acumulados nos seus educandos. Com isso, entendo ser necessário
repensar o papel do estágio de modo a promover uma articulação mais harmônica
entre os conteúdos programáticos e a realidade escolar, e nesse sentido, concordo
com Silva, Aroeira & Mello (2005) ao afirmarem que “[...] não basta ter o estágio
supervisionado na grade curricular [...] é preciso que o estágio configure elementos
significativos na formação de professores” (p.158). Em outras palavras, acredito que
a significância do estágio para a docência só será eficiente quando for organizada
de forma sistemática e não isolada, de modo a abordar tanto o conhecimento
específico da área quanto as questões referentes à didática e metodologia do ensino
propriamente dita, instigando no futuro professor uma consciência e um agir
pedagógicos crítico nos espaços escolares. Sendo assim compactuo com as idéias
de Santos (1991) ao colocar que a experiência do estágio assume um papel
51
importante na formação do professor, desde que não seja apenas uma socialização
do aluno com a prática dominante das escolas. E essa prática dominante não se
consolida apenas quando se faz uso do esporte e do rendimento nas aulas de
educação física, mas sim também na medida em que os professores não
conseguem fazer com que suas aulas façam significado para o aluno. Compreendo,
claro, que o problema da escola pública não é restrito à questão da formação de
professores. Entendo que enquanto tivermos uma sociedade pautada na lógica
capitalista, a escola refletirá, proporcionalmente, os valores que nela estão inseridos
e as mazelas que a ela são inerentes. Aliás, esta foi uma questão que por muitas
vezes me instigou durante a realização das observações nas escolas. Há uma
passagem em meu diário de campo, que acredito ter sido a mais impactante, que
traduz um pouco deste distanciamento, tanto da instituição escolar quanto da
formação de professores da realidade do aluno:
O estagiário não está conseguindo manter ordem nenhuma. As crianças ficam impacientes. Algumas começam a tocar giz e pó de giz nas outras. Ele tenta manter a ordem dentro da sala para só depois sair pro pátio com a turma. Está uma verdadeira guerra. As crianças estão se machucando, brigando muito. Os pedidos de ordem, obediência, são em vão. Nada dá certo. Alunos de outras turmas ficam nas janelas , entram na sala. Está fora das competências de qualquer professor. Parece que não falam a mesma língua. O estagiário tenta argumentar de todas as formas com os alunos, mas eles não dão bola. Violência faz parte da cultura, eles aceitam, como se fosse uma brincadeira. Alguns o chamam de senhor, ao mesmo tempo em que nem escutam o que ele está falando. Estamos quase a 50 minutos dentro da sala e nem a chamada foi feita. Quase uma hora depois, ele levou a turma para o pátio. Lá as coisas não deram certo. Depois de ter combinado algumas coisas e nada ter dado certo ele voltou com a turma para a sala, sendo que alguns alunos já ficaram pelo meio do caminho, nessa ida e volta da sala para o pátio. Por incrível que pareça, nem o famoso e muito criticado Rola-Bola o estagiário conseguiu fazer.(Diário de campo, 02/06/08)
A escola pública traz situações que muitas vezes fogem da competência de
qualquer professor, isto porque a estruturação escolar ainda se mantém dentro da
lógica vigente. Porém entendo que a formação deve ser suficientemente capaz de
promover a reflexão dos futuros docentes para contestarem esta lógica. A formação
do professor de educação física entendendo seu papel de educador deve ser um
pilar central neste processo e não apenas secundário, como vêm sendo.
52
5 CONSIDERAÇÕES TRANSITÓRIAS
Primeiramente, quero colocar que este trabalho, assim como os demais,
apresenta diversas limitações, tanto de ordem teórica quanto metodológica, visto o
caráter inicial de meu patamar dentro da produção científica. Além disso, sublinho
que apesar de parecer estranho eu, um aluno de graduação fazer um trabalho de
campo com alunos de graduação, sobre uma situação pela qual eu também passei,
que é o estágio obrigatório, na forma de prática de ensino, pude, em muitos
momentos, no próprio processo de produção textual, compartilhar com meus pares
as diversas dificuldades que tive no meu processo de formação e na minha prática
na escola pública. Contudo, ao passo de que foi fácil a aproximação com meus
colaboradores, visto que eram colegas de curso, em muitas vezes foi difícil o
processo de distanciamento necessário que um pesquisador deve ter para poder
analisar seu objeto de estudo da maneira mais coerente possível.
Como me utilizei metodologicamente de um estudo de caso, as
considerações que faço aqui em momento algum têm a pretensão de se generalizar,
pois apesar de entender a formação de professores como uma temática com
dimensões estruturais muito semelhantes (como por exemplo, às tendências que
consolidam os paradigmas dos cursos de formação, as diretrizes e as resoluções do
CNE), compreendo que a temática apresenta dimensões muito peculiares de cada
curso e de cada currículo, até porque os diferentes cursos estão imersos em
diferentes realidades. Mesmo assim, entendo que um trabalho científico,
principalmente se for de cunho qualitativo e crítico, como me propus a produzir este,
deve ser propositivo. Na minha opinião, a produção do conhecimento se dá
exatamente quando, a partir do seu objeto de estudo, o pesquisador tem a
capacidade de refletir em cima dos dados obtidos no campo e, conjuntamente com o
referencial teórico, propor novos argumentos sobre a temática analisada. Assim,
compreendo meu papel propositivo enquanto pesquisador, e coloco então os
elementos mais centrais que pude extrair desta pesquisa que realizei.
A docência escolar é um tema extremamente importante, e sendo assim, a
questão da formação de professores constitui um elemento que influi diretamente na
prática dos professores de educação física nas escolas públicas. É importante
colocar que o processo de formação do professor inicia-se antes mesmo de sua
entrada na graduação. As experiências anteriores acrescentam elementos
53
consideráveis sobre o mundo da educação física, seja em âmbito escolar ou não,
fazendo com que os estudantes da licenciatura tenham uma mínima noção de
aspectos como didática, métodos avaliativos, e conteúdos a serem trabalhados. Ao
chegar na graduação, o estudante se depara com uma formação voltada para o
aspecto técnico, baseado na chamada pedagogia das competências. A formação
baseada no “modelo tecnocrático” ignora a promoção de uma reflexão crítica,
levando aos estudantes a simplesmente reproduzir os conhecimentos. Desta forma,
ao chegar na escola, o estagiário apenas reproduz a lógica dominante, fazendo com
que a escola continue sendo uma importante agência de legitimação da ordem
vigente na medida em que, ao definir o conhecimento de certos grupos como
legítimos, elas contribuem para a reprodução da cultura e de formas ideológicas dos
grupos dominantes da sociedade (APPLE, 1989). Assim, o esporte, consolidado
como a maior expressão entre as atividades corporais do mundo contemporâneo,
assume este papel de reprodução da cultura dominante, visto que tanto no currículo
de graduação quanto no currículo da escola, o fenômeno esportivo se caracteriza
como o conteúdo hegemônico das aulas de educação física. Além disso, o caráter
de rendimento do conteúdo esportivo apareceu também enquanto o mais presente
durante as aulas observadas, sendo possível constatar em nossa pesquisa de
campo a dificuldade dos estudantes que realizam o estágio em fugir da ótica de que
a aula de educação física é um espaço para “treinar” as habilidades de uma
determinada modalidade esportiva.
Suponho que a utilização destes métodos e conteúdos hegemônicos talvez
tenha relação direta com as dificuldades de inserção do estagiário no mundo
escolar. Sendo assim, parece menos conflitivo de trabalhar com práticas já aceitas
culturalmente no contexto da escola pública do que práticas inovadoras. Partindo
destas análises, é possível argumentar que muito das dificuldades docentes,
principalmente no que tange à dificuldade em conseguir aplicar na prática o que
planejam se devem a vários motivos. Um dos fatores é de que na maioria dos casos
os cursos de licenciatura se pautam por discursos didáticos que idealizam um
modelo de aluno, de professor e de escola, como colocam Molina & Molina Neto
(2002). Assim, os estagiários passam a sua vida acadêmica imersos em teorias, e
ao chegar nos últimos semestres do curso no estágio, se deparam com alunos reais
Acrescento ainda que além do discurso, a própria construção didática prática dos
saberes dos futuros docentes se baseia a partir destes modelos idealizados, na
54
medida em que se constituem inócuos frente à complexidade social e estrutural da
realidade escolar. Assim, ao se constituir uma determinada noção de saber docente,
baseado na idéia de um contexto e não na realidade concreta deste contexto em si,
leva ao mascaramento das reais situações de ensino e de aprendizagem que
ocorrem nos processos pedagógicos das aulas de educação física, desvirtuando e
prejudicando a construção de saberes dos estudantes de graduação. Assim, por
mais que tenham conhecimentos específicos para a prática, fica uma lacuna no que
diz respeito ao desenvolvimento de uma capacidade reflexiva dos graduandos sobre
sua própria prática. O conhecimento específico e técnico é muito bem trabalhado no
processo de formação, mas os processo reflexivos são negados, já que o currículo
se constitui numa estrutura terminalista, com os estágios ao fim do curso,
impossibilitando uma reflexão posterior em outros espaços do processo de
formação.
Para finalizar, entendo que estas considerações, apesar de concluírem este
trabalho, são transitórias. Tenho clareza que a formação do professor é apenas um
dos aspectos referentes às dificuldades da docência da educação física na escola
pública. Entretanto entendo que é necessário que possamos teorizar sobre o tema, a
fim de termos avanços em relação a este processo. Tenho a convicção de que a
pesquisa não é o único, mas um dos importantes elementos para o debate proposto,
com o intuito de que a cada dia avancemos nas discussões na busca de formação
passível de uma intervenção pedagógica crítica e compromissada socialmente.
55
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STAKE, R.E. “The case study method in social inquiry”. In: Educational Researcher nº2. fev. 1978, vol. 7 In: ANDRÉ, Marli Eliza Dalmazo Afonso de. Etnografia da prática escolar. Campinas, SP: Papirus, 1998. – (Série Prática Pedagógica)
TAFFAREL, C. Z.. Política científica e produção do conhecimento na educação física/ciência do esporte: a conjuntura, as contradições e as possibilidades de superação. In: Carvalho, Y. M.; Linhales, M. A. (org.). Política científica e produção do conhecimento em educação física. Goiânia: CBCE, 2007.
TAFFAREL, C. Z; SANTOS JUNIOR, C. de L. Nexos e determinações entre formação de professores de educação física e diretrizes curriculares: competências para quê? In: FIGUEIREDO, Zenólia Christina Campos, (Org.). Formação Profissional em educação física e mundo do trabalho. Coletânea de textos, v. 1, 2005 (Vitória. Gráfica da Faculdade Salesiana)
TITTON, M; TRANZILO, P; ALVES, M. O embate de projetos na definição das diretrizes curriculares nacionais dos cursos de educação física: contribuições do meef para a formação de professores. Motrivivência. Ano XVII. Nº 25. 2005
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www.esef.ufrgs.br. acesso em 11/2008.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SULESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA
GRUPO DE ESTUDOS QUALITATIVOS FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICA PEDAGÓGICA EM EDUCAÇÃO FÍSICA E CIÊNCIAS DO ESPORTE
APÊNDICE 1
CARTA DE ANUÊNCIA DA ESCOLA IDENTIFICADA EM PRESENTE PROJETO DE PESQUISA.
NOME DA ESCOLA: ______________________________________________________Endereço:________________________________________________________________CEP:_____________ Cidade: __________________ Telefone: ______________
Pelo presente instrumento comprometo-me a permitir o acesso do Dr. Vicente Molina Neto e seus estudantes de Mestrado, Doutorado e Bolsistas de Iniciação Científica aos estagiários aqui lotados bem como ao grupo de crianças e adolescentes aqui matriculados, participantes que forem identificados com o perfil de interesse do Projeto de Pesquisa intitulado: “Formação inicial e a prática pedagógica: A contribuição do currículo para uma formação à docência escolar”. O acesso será negociado, em seus detalhamentos, tais como o número de pessoas envolvidas, número de horas de entrevistas, número de observações, forma de retorno das informações à escola, locais e horários nos quais se dará a coleta das informações, etc. após a aprovação Comissão de Pesquisa da ESEF/UFRGS e pelo Comitê de Ética da UFRGS”.
Caberá ao professor pesquisador obter a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), de todos os atores que compuserem o grupo pesquisado.
Porto Alegre,............... de junho de 2008.
___________________________________________(Nome, assinatura e carimbo do Representante Legal da Escola)
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GRUPO DE ESTUDOS QUALITATIVOS FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICA PEDAGÓGICA EM EDUCAÇÃO FÍSICA E CIÊNCIAS DO ESPORTE
APÊNDICE 2
DECLARAÇÃO
NOME DA ESCOLA: ______________________________________________________Nome do(a) Diretor(a):_____________________________________________________Endereço:________________________________________________________________CEP:_____________ Cidade: __________________ Telefone: ______________
Declaro que o Professor Vicente Molina Neto, juntamente com seu bolsista de graduação, Guilherme Bernardi, está autorizado a realizar coleta de dados para a pesquisa intitulada: “Formação inicial e a prática pedagógica: A contribuição do currículo para uma formação à docência escolar” no primeiro semestre de 2008, nesta Escola.
Tenho conhecimento de que a pesquisa objetiva compreender qual o subsídio que a formação inicial proporciona a seus egressos para a atuação na escola pública. Para efetivar a coleta de dados, o pesquisador terá permissão para realizar entrevistas com os estagiários de educação física.
Estou ciente de que o pesquisador preservará a identidade dos sujeitos colaboradores e observará os procedimentos éticos no manejo das informações obtidas.
As atividades do pesquisador deverão ser executadas com planejamento prévio e sem prejuízo nas atividades da comunidade escolar.
Porto Alegre,............... de junho de 2008.
___________________________________________ (Assinatura e carimbo do Representante Legal da Escola)
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GRUPO DE ESTUDOS QUALITATIVOS FORMAÇÃO DE PROFESSORES E PRÁTICA PEDAGÓGICA EM EDUCAÇÃO FÍSICA E CIÊNCIAS DO ESPORTE
APÊNDICE 3
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Você está sendo convidado(a) a participar de um estudo sobre “Formação inicial e
a prática pedagógica: A contribuição do currículo para uma formação à docência
escolar. Neste sentido, pedimos que você leia este documento e esclareça suas dúvidas
antes de consentir, com a sua assinatura, sua participação ou a participação da
criança/adolescente por quem você é legalmente responsável, neste estudo. Você receberá
uma cópia deste Termo, para que possa questionar eventuais dúvidas que venham a surgir, a
qualquer momento, se assim o desejar.
Objetivos do Estudo:
Analisar o currículo sobre o qual os alunos do curso de licenciatura foram submetidos ao
longo de sua formação, e quais princípios o norteiam.
Identificar os aspectos de articulação do currículo para uma formação voltada para a prática
docente escolar;
Analisar o estágio curricular obrigatório sobre o qual os alunos são submetidos para obter o
título de licenciados em educação física, e como este contribui para a formação docente;
Identificar quais conhecimentos sobre o mundo da escola e prática docente foram adquiridos
pelos formandos ao longo do curso;
Identificar os princípios norteadores do currículo de graduação da EsEF/UFRGS
Procedimentos:
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Participar de uma ou mais entrevistas, previamente agendadas, a serem realizadas nas
dependências do seu local de trabalho ou estudo, com duração máxima de uma (1) hora. Esta
entrevista será gravada, transcrita e devolvida para sua confirmação das informações
coletadas.
Permitir a observação de duas a cinco aulas de educação física ministradas na escola em que
você está realizando o estágio.
Riscos e Benefícios do Estudo:
Primeiro: Sua adesão como colaborador(a) com o nosso estudo, não oferece nenhum
risco à sua saúde, tão pouco o(a) submeterá a situações constrangedoras.
Segundo: Você receberá cópia da sua entrevista (individual e coletiva) para validar,
retirar ou modificar as informações, a seu critério, antes do texto ser transformado em fonte da
pesquisa.
Terceiro: Este estudo poderá contribuir no entendimento científico dos problemas
relacionados com a formação e a prática pedagógica, vivenciados pelos estudantes de
graduação, em âmbitos escolares.
Confidencialidade:
Todas informações coletadas, sob a responsabilidade do pesquisador, preservarão a
identificação dos sujeitos pesquisados e ficarão protegidas de utilização não autorizadas.
Voluntariedade:
A recusa do(a) participante em seguir contribuindo com o estudo será sempre
respeitada, possibilitando que seja interrompido o processo de coleta de informações, a
qualquer momento, se assim for seu desejo.
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Novas informações:
A qualquer momento os(as) participantes do estudo poderão requisitar informações
esclarecedoras sobre o projeto de pesquisa e as contribuições prestadas, através de contato
com o pesquisador.
Os(as) participantes poderão trazer acompanhantes para assistirem as entrevistas de
coleta de informações.
Contatos e Questões:
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
Rua Felizardo 750. Jardim Botânico. Porto Alegre/RS
Professora Vicente Molina Neto E-mail: [email protected]
Fone (51) 3316-5821
Comissão de Pesquisa ESEF/UFRGS:
______________________________________________
Dr. VICENTE MOLINA NETO
(Coordenador da Pesquisa)
Declaração de Consentimento
Eu ______________________________________________, estagiário(a) da Escola
___________________________________________________, tendo lido as informações
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oferecidas acima e tendo sido esclarecido(a) das questões referentes à pesquisa, concordo em
participar livremente do estudo.
Assinatura_________________________________ Data ________________
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Unidades de significado relevantes
1. adaptação ao ambiente2. alteração curricular3. aluno bom4. aluno ruim5. alunos6. aprender a escutar7. aprendizado8. aprendizado no estágio 9. aprendizagem docente10.aproximação com a realidade11. aspecto afetivo 12.aspecto social 13.Atividade Física14.atividades com bola15.atletismo16.atuação docente17.aula de efi18.autoritarismo19.Basquete20.brincadeiras21.canoagem22.capoeira23.cidadão24.clubes esportivos25.comportamento26.condição social27.contato com pessoas28.conteúdo afetivo29.conteúdo motor30.conteúdos escolares31.contexto social32.controle de turma33.corridas34.criança35.criminalidade36.cultura esportiva37.currículo 38.dedicação39.desemprego40.didática41.dificuldade docente42.dificuldades43.disciplina44.disciplinas da graduação 45.disciplinas da licenciatura46.diversão47.Educação
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48.envolvimento49.escola50.escola pública51.esportes52.estágio como obrigação53.estágio docente 54.estrutura escolar55.evasão escolar56.expectativa docente57.Experiência de estágio58.experiência docente59.Experiências docentes60.Experiências motoras61.experiências passadas62.expressão corporal63. falta de espaço64. falta de material65. fileiras66. formação67. formação inicial 68. futebol69.Futsal70.ginástica71.handebol72. idealização do aluno73. Ideologia74. importância da ed. Física75. influência para a carreira76. interesse do estudante77. Interesse pela docência escolar78. interesse pelo aluno79. Intervenção pedagógica80. introdução à prática de estágio81.Jogos82.Lembranças da Efi Escolar83. liberdade 84.Licenciatura em educação física85.Licenciatura x Bacharelado86.mestres87.metodologia do ensino da efi88.motivação pela efi89.objetivos90.olhar do professor91.ordem 92.papel da educação93.Paulo Freire94.planejamento de ensino95.posição de professor96.Prática Livre97.prática recreativa
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98.Práticas corporais99.Práticas esportivas100.preferência do aluno101.Prova de ed. Física102.Questões financeiras103.rafting104.realidade105.realidade do aluno106.recreio107.reflexão108.regras109.remo110.respeito111.respeito às diferenças112.responsabilidade docente113.risco social 114.Saúde115.segundo tempo116.stress117.técnicas de ensino118.vandalismo119.vela120.Vigotsky121.violência122.voleibol