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verbojuridico.net .. OS ACORDOS PARASSOCIAIS NO DIREITO PORTUGUÊS Hugo Daniel Lança Silva Aluno n.º 1402/99/005 Beja, 31 de Outubro de 2000

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Page 1: A Cor Do Paras Social

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OS ACORDOS PARASSOCIAIS NO

DIREITO PORTUGUÊS

Hugo Daniel Lança SilvaAluno n.º 1402/99/005Beja, 31 de Outubro de 2000

Page 2: A Cor Do Paras Social

ÍNDICE

I- PREÂMBULO

4

- Introdução 4

- Perspectiva histórica 6

- Surgimento da questão em Portugal 7

- Esgrimir argumentos acerca da admissibilidade dos acordo 9

II – CONSAGRAÇÃO LEGISLATIVA 16

- Relação entre o contrato social e o acordo parassocial 16

- Análise ao artigo 17.º CSC 25

- Forma 34

- Duração 38

- Transmissibilidade 41

- Meios de conferir efeito externo aos acordos 42

III- TIPOLOGIA DOS ACORDOS PARASSOCIAS 47

- Acordos de voto 48

- Acordos sobre a transmissão de participações sociais 63

- Acordos sobre o exercício do direito à informação 71

- Acordos sobre a distribuição de lucros 71

- Acordos sobre o funcionamento dos órgãos sociais. 72

Page 3: A Cor Do Paras Social

IV- ACORDOS PARASSOCIAS INADMISSÍVEIS 73

- Acordos sobre a conduta dos órgãos sociais 73

- Vinculação a instruções dos órgãos sociais

77

- Venda do voto

81

- Violação das normas de Direito Societário

84

- Incompatibilidade com o interesse Social

85

- Consequências da nulidade de um acordo parassocial. 87

V- INCUMPRIMENTO DOS ACORDOS

89

- Cláusula Penal

89

- Providência Cautelar

92

Page 4: A Cor Do Paras Social

- Acção de Cumprimento

94

- Execução Específica

97

- Acção Executiva

101

- Sanção Pecuniária Compulsória

102

VI APROXIMAÇÃO A UMA POSIÇÃO CRÍTICA .........104

BIBLIOGRAFIA

106

Page 5: A Cor Do Paras Social

I- PREÂMBULO

1- Introdução 2- Perspectiva histórica

3- Surgimento da questão em

Portugal 4- Esgrimir argumentos

acerca da admissibilidade dos

acordos

1. Introdução

1.1 Tratar este tema não é uma escolha inteligente.

Dentro do leque de centenas de temas possíveis para realizar um trabalho em

sede de Direito das Sociedades, este é porventura um dos mais proficuamente

tratados; conforme salienta RAÚL VENTURA “ A bibliografia estrangeira sobre

acordos de voto é vastíssima; a bibliografia mencionada no citado livro de

LUBBERT1 aponta mais de 500 obras. E se os problemas relativos a estes

acordos são discutidos à cerca de 100 anos, natural é que tudo esteja visto e

revisto, em todos os planos ângulos e facetas, tornando repetitivo cada novo

estudo... e se não se chegou a acordo generalizado ...os argumentos repetem-

se até à exaustão, em todos os sentidos possíveis...”

O erro in eligendo é tanto maior quando ainda recentemente brotaram à

cintilante luz das livrarias duas obras, ambas dissertações de mestrado, que

dissecam com inigualável categoria a temática que humildemente e, permitam-

me, insensatamente, procuro analisar. Porque o faço; momentos ouve que

senti na elaboração destas linhas a estranha e sádica sensação de caminhar

de moto próprio para um abismo tal a dimensão e profundidade dos trabalhos

por onde fui deambulando; mas ainda assim encontrava alento na impressão

que apesar dos milhões de palavras escritas, palavras e ideias ainda poderiam

ser ditas.

De quando em quando criticam-se posições de doutrina do mais elevado

coturno; não o faço numa atitude arrogante ou presunçosa; pretende-se, tão

1 O manual citado é Abstimmungsvereinbarungen in den Aktien – und GmbH-Rechten der EWG-Staaten, der Schweiz und Grossbritasnnienns, apud. RAÙL VENTURA, “Acordos de voto”, Estudos vários sobre Sociedades Anónimas, Coimbra, 1992, pp. 17.

Page 6: A Cor Do Paras Social

somente, contribuir, ainda que humildemente, para uma reflexão, tentando

trazer para a mesa da discussão um prisma diferente sobre o instituto.

1.2 Para terminar esta primeira abordagem pretendo deixar uma nota

justificativa sobre o sentido da bibliografia e pesquisa tentada: existe neste

trabalho uma pensada opção de cingir o estudo às opiniões formuladas pelos

autores nacionais; a proliferação de juristas com toda a carga negativa, vezes

de mais sublinhada, teve o indesmentível condão de incrementar a actividade

jurídica e a qualidade da mesma; a proliferação de trabalhos teve o inegável

mérito de incrementar a sua qualidade permitindo ao intérprete dispôr, na sua

própria língua e dentro do espírito do seu sistema jurídico de um muito

interessante conjunto de obras, de acuidade e pertinência similar aos trabalhos

provenientes de outros sistemas jurídicos: a praxis ainda habitual porque tida

por erudita de citar, pelo simples prazer de citar autores de origem estrangeira

em detrimento dos cultores nacionais do direito, é algo a que se ambiciona

fugir.

Recorro, mais uma vez, às palavras de RAUL VENTURA 2 para sublinhar que

apenas “ usarei a doutrina e jurisprudência portuguesas, não só brevitatis

causa, mas ainda porque a nossa doutrina condensou e em parte absorveu a

experiência e as opiniões estrangeiras”

1.3 Esta opção assente também determinantemente em razão do objecto em

estudo: os acordos parassociais no Direito Português, e apenas neste.

Ainda em sede introdutória importa acrescentar o facto do trabalho, embora

com vocação generalista, resvala demasiadas vezes para o tratamento desta

problemática nas sociedades anónimas: a justificação resulta de ser naquelas o

campo natural de aplicação destes acordos o que leva o intérprete a tomar a

parte pelo todo, em mais momentos que os devidos.

Assim, proponho-me a tecer sumárias considerações sobra a génese desta

figura, detendo-nos especialmente no surgimento da querela em Portugal,

analisando as posições doutrinárias sobre o tema; esgotada esta apreciação

2 RAÚL VENTURA, “Acordos de voto, cit. pp. 65.

Page 7: A Cor Do Paras Social

indagaremos acerca da consagração legislativa dos acordos parassociais no

nosso ordenamento jurídico.

Pela sua heterogeneidade e pelas diferentes questões que suscitam

entendemos ser imperativo analisar a tipologia dos acordos parassociais,

delongando-nos nos mais frequentes: os acordos de voto, que não apenas são

mais frequentes como, e sobretudo, são aqueles que mais e maiores querelas

suscitam, sendo frequente o lapso doutrinário de os confundir esta parte com o

todo;3 a nossa atenção decairá ainda de forma mais intensiva sobre as

convenções de bloqueio, igualmente frequentes e não isentas de

constrangimentos e dificuldades.

Serei, ainda, especialmente sensível às proibições consagradas pelo

legislador, porquanto só é cognoscível a licitude de um acordo parassocial

após indagar sobre os impedimentos existentes.

A dissertação inquirirá ainda sobre os efeitos do incumprimento tentando

colmatar alguma lacuna porquanto, conforme sublinha LUIGI FARENGA4 a

doutrina e a jurisprudência não se ocupam do problema, limitando-se a realçar

um genérico reconhecimento do direito ao ressarcimento dos danos. Desde já,

sublinhamos, a consciência da conflituosidade das soluções preconizadas.

2. Perspectiva Histórica

2.1 Atribuísse a OPPO o baptismo dos contratos parassociais, sendo este

comummente considerado um percursor no estudo desta temática, quando em

1942 publicou uma obra com aquele título, que ainda mantém nos nossos dias

uma invejável actualidade.

Mas “ foi basicamente no seio das grandes sociedades anónimas que, no

último quartel do século XIX, nos Estados Unidos e na Inglaterra se

desenvolveram certas modalidades de acordos entre os accionistas visando

disciplinar o exercício dos direitos inerentes às suas acções, os quais foram

admitidos como lícitos nos países anglo-saxónicos.”5

3 A este lapso também nós não conseguimos fugir sendo recorrente tratarmos dos acordos parassociais em geral, tendo presentes os circunstacialismos específicos destes acordos.4 LUIGI FARENGA, Contrati Parasociali, Milano, 1987, pp. 380-381.5 MIGUEL PUPO CORREIA, Direito Comercial, 6ª, Lisboa, 1999, pp. 465. A primeira regulamentação legislativa de acordos parassociais, data de 1901 e pertence ao Estado de

Page 8: A Cor Do Paras Social

No entanto, deve-se ao referido Autor os primeiros passos na análise do

instituto. No seu trabalho OPPO enunciava os traços singulares característicos

deste contrato, que “aparentemente contraditórios, caracterizam e

individualizam os contratos para-sociais: independência e acessoriedade”6.

3. Surgimento da questão em Portugal

Entre nós a questão surgiu a propósito da Sociedade Industrial de Imprensa,

SARL, corria o ano de 1954, e teve por base um acordo que hoje

qualificaríamos de parassocial, podendo afirmar-se que até então a doutrina

portuguesa se manteve adormecida face a esta problemática.

Tem-se entendido, numa visão que aplaudimos, que “o menor desenvolvimento

capitalístico da economia portuguesa será uma explicação plausível para essa

ausência. Por outro lado, os acordos daquela natureza, que certamente se

realizavam, seriam considerados mais como compromissos de honra do que

verdadeiras vinculações jurídicas, o que explicaria a relutância do recurso às

vias judiciais nos casos de incumprimento, por parte de empresários avessos a

trazer para a praça pública aspectos dos seus negócios que preferiam manter

reservados”7. A estas motivações, entendo ser de acrescer, a estrutura social

da época e, nomeadamente, o apego aos compromissos livremente

assumidos, o valor dos acordos de cavalheiros que tornavam, as mais das

vezes, despiciendo o recurso aos Tribunais pela inexistência de

incumprimentos.

Pelo efeito propulsor que teve na nossa doutrina, bem como pelo conteúdo das

cláusulas, parece adequado deter-me por instantes na análise daquele acordo.

Nova Iorque. (neste sentido THEOPHILO AZEVEDO SANTOS( Acordo de accionistas, ROA, Ano 47 (1987),I , pp. 186).6 FERNANDO GALVÃO TELES, “União de contratos e contratos para-sociais”, ROA Ano 11, n.º 1 e 2, pp. 74.7 MÁRIO LEITE SANTOS, Contratos parassociais e Acordos de Voto nas Sociedades Anónimas, Lisboa, 1996, pp. 182

Page 9: A Cor Do Paras Social

Das sete cláusulas deste acordo, sublinhe-se as que estabeleciam restrições à

transmissibilidade de acções (consentimento e direito de preferência) a

distribuição dos órgãos sociais, a estatuição de um dividendo mínimo, a

limitação ao número máximo de acções e uma estratégia para a concertação

do voto a emitir na Assembleia Geral.

Sublinhe-se que neste acordo coexiste um acordo de voto, uma convenção de

bloqueio, normas relacionadas com os órgãos sociais e distribuição de lucros,

uma enorme heterogeneidade de cláusulas.

Fruto, quer das importância dos pactuantes quer da originalidade da lide, este

mereceu a atenção da nossa mais ilustrada doutrina.

Colocados perante a questão os PROFESSORES FERNANDO OLAVO8,

CAVALEIRO FERREIRA9 E BARBOSA DE MAGALHÃES10 e PALMA CARLOS 11 sustentaram a tese tradicionalista, na esteia de FERNANDO GALVÃO

TELES12, tendo os PROFESSORES FERRER CORREIA, e DOMINGOS DE

ANDRADE13 expressado a sua opinião num sentido de sustentarem de modo

favorável a susceptibilidade de realizar acordos parassociais.

4. Esgrimir os argumentos dos que defendem e condenam

4.1 Como ficou indiciado a aceitação pela doutrina deste novo tipo contratual

gerou os mais diversos constrangimentos, não faltando quem, frontalmente, se

opusesse à sua consagração legislativa.

Os críticos aos acordos parassociais começam por atacar a sua finalidade

alegando que “há que reconhecer que os pactos dos accionistas são mais uma

8 FERNANDO OLAVO, “Sociedades anónimas. Sindicatos de voto”, O Direito, Ano LXXXVIII (1956), PP. 187 ss.9 CAVALEIRO FERREIRA, Acerca do problema do sindicato de voto nas Sociedades Anónimas, Obra Dispersa, Lisboa, 1996, pp. 269 ss.10 BARBOSA DE MAGALHÃES, “Inadmissibilidade dos sindicatos de voto”, La società per azioni alla metà del secolo XX, Studi in Memoria di ANGELO SRAFFA, Vol. 1, pp. 23 ss. 11.“Anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Abril de 1967”, O Direito, 1971 (ano 103.º), pp. 231 ss.12 FERNANDO GALVÂO TELES, ob. cit. pp. 37.13 DOMINGOS DE ANDRADE, Pacto de preferência de venda de acções, Lisboa, 1955, 29 ss.

Page 10: A Cor Do Paras Social

consequência da actual tendência dos accionistas para se desinteressarem da

marcha da sociedade e evitar o esforço do debate no seio da Assembleia”14.

Sustentava-se que os acordos de voto eram inadmissíveis “por contrariarem

preceitos imperativos de interesse e ordem pública”15 e nesse sentido

“insusceptíveis de derrogação ou contrariedade no pacto social e, por maioria

de razão, nos pactos particulares entre os accionistas”16. Enaltece-se uma

visão das regras do Direito societário em geral, e as do direito de voto em

particular perseguem razões de interesse público, pela concepção do direito de

voto enquanto direito potestativo “atribuído ao accionista, não tanto no seu

exclusivo interesse, como no interesse colectivo da sociedade.17”

Entendo-se que “o direito de voto é concedido ao accionista em atenção ao

interesse social, decorre daí que ele não pode vincular-se previamente a votar

em determinado sentido, pondo tal direito ao serviço do interesse do sindicato,

ou seja de um interesse que não é aquele em atenção ao qual o mesmo direito

lhe foi concedido e que deve inspirar o seu voto.18”

Pelo exposto sustenta-se que seja de “supor e desejar que a lei se preocupe

com garantir, não apenas a sua liberdade e exercício, com o mínimo de

restrições, mas também a sua genuinidade, não podendo as suas normas, por

serem de ordem pública, ser derrogadas ao contrariadas no pacto social, e, por

maioria de razão, nos pactos particulares entre os accionistas”19

Faz-se a apologia do espírito livre que deve nortear o processo volitivo da

determinação do voto, condenando-se a sua emissão “que não traduza o

libérrimo sentir do eleitor e antes seja obra e reflexo de conluios e maquinações

dos votantes”20. Subjacente ao que fica escrito é a consideração do direito de

voto como um direito essencial da qualidade de accionista e,

consequentemente inegociável.

Refere-se em consequência que “o sindicato de voto viola as regras

imperativas sobre a competência da Assembleia Geral, na medida em que a

14 GARRIGUES apud BARBOSA DE MAGALHÃES, ob. cit. pp. 27.15 MÁRIO LEITE SANTOS, ob. cit. pp. 27.16 BARBOSA DE MAGALHÃES, ob. cit. pp. 29.17 MANUEL CAVALEIRO FERREIRA, ob. cit. pp. 27718 FERNANDO OLAVO, ob. cit. pp. 194.19 BARBOSA DE MAGALHÃES, ob. cit. pp. 29. 20 RLx 18-Maio-1955 apud. , “Anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Abril de 1967”, O Direito, 1971 (ano 103.º), pp. 252

Page 11: A Cor Do Paras Social

vontade social é definida por aquele, em vez de ser nesta”21, sendo que “o voto

deve ser definido consciente e livremente em Assembleia Geral, depois de

ponderados os argumentos apresentados a favor ou contra a proposta

respectiva”22

Insurge-se ainda alguma doutrina contra estes acordos por considerar que se o

direito de voto “é concedido ao accionista em atenção ao interesse social,

decorre daí que ele não pode vincular-se a votar em determinado sentido,

pondo tal direito ao serviço do sindicato, ou seja de um interesse que não é

aquele em atenção ao qual, o mesmo direito lhe foi concedido e que deve

inspirar o seu voto”,23 naquela que usa chamar-se a visão idealista do interesse

social. O interesse social dissociava-se assim dos interesses pessoais dos

accionistas como se de realidades díspares se tratasse. Sobre esta posição

reservamos a nossa posição para momento posterior.

O amplo conjunto de autores que condenam a admissibilidade dos acordos

parassociais, não discutem os méritos da formação antecipada e consciente da

vontade a expressar em Assembleia Geral, comummente designados de

acordos parassociais de consulta prévia, sendo a precedente reunião de um

grupo de accionistas para concertarem posições um meio extremamente

eficaz: o que coloca em causa é o surgimento do vínculo de actuar da forma

determinada e, sobretudo, a obrigatoriedade de o fazer ainda que contrariando

as suas convicções. A questão é a de que “se os fins do pacto são lícitos, e é

“bom” o sentido em que os pactuantes se obrigam a dar o seu voto, que

necessidade há do vínculo”24.

Parece-me indubitável que o receio da sanção contratualmente estipulada para

o inadimplemento do pacto, regra geral uma cláusula penal, funciona como

inibidor para o signatário, servindo o pacto para garantir que os obrigados

actuam de acordo com o assumido; não concordamos assim com LOBO

21 LUÍS BRITO CORREIA, Direito Comercial, deliberações dos sócios, III, 1997, pp. 171.22 LUÍS BRITO CORREIA, Direito Comercial ..., III, cit. pp. 172.23 FERNANDO OLAVO, “ ob. cit. pp. 194.24 VASCO LOBO XAVIER, Sindicatos de voto no Direito Português, ROA, Ano 45 (1985) pp. 644.

Page 12: A Cor Do Paras Social

XAVIER que justifica o vínculo como meio de impedir o desleixo e deslealdade

dos sócios agrupados.25

Mas, tudo o que fica dito, não contraria o facto de os sócios signatários

manterem a possibilidade actuarem de como lhes aprouver, a faculdade de

votarem de forma distinta àquela a que ficaram adstritos, tendo o seu voto total

relevância não sendo a contrariedade com o acordo parassocial motivação

para inquinar a validade das deliberações, sujeitando-se posteriormente às

sanções do incumprimento. Face à influência de um acordo parassocial e à

influência de expressar o seu voto no sentido que interiormente se refuta mais

adequado ao interesse social incumbe ao accionista hierarquizar interesses.26

Já não podemos sustentar a opinião daqueles que denigrem este pacto com a

argumentação de que o mesmo se substitui à Assembleia Geral; sem me

debruçar sobre o conteúdo desta, convoco o argumento de que nem o pacto,

as mais das vezes, congrega o todo social, nem as suas deliberações têm

qualquer relevância, de direito, na esfera da sociedade.

A doutrina tradicionalista27 apoiava ainda as suas críticas na circunstância do

Código Comercial ser omisso face a esta controversa, “só admitindo

agrupamentos de sócios para os fins previstos nos artigos 183º, n.º 4, e 187º”28,

que concernem ao agrupamento de pequenos accionistas e ao exercício do

direito de voto dos accionistas residentes no estrangeiro, retirando dessa

conjuntura um intuito proibitivo.

25 Ob. cit. pp. 645.26 A solução a dar-se a este querela confunde-se com a concepção adoptada para o direito de voto: se este é entendido como um meio de atingir o interesse social, como um direito potestativo, o accionista deve alhear-se do acordo parassocial; se, pelo contrário, pugnamos por uma visão egoísta do direito de voto, se entendemos o voto como um direito de propriedade, o signatário deve expressar o seu voto pelo meio mais eficaz para garantir os seus próprios interesses.27 Neste sentido ADELINO PALMA CARLOS, Anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 4 de Abril de 1967, pp. 236, FERNANDO OLAVO, ob. cit. pp. 193, Embora sem assumir uma posição refuto de pertinente a anotação ao art.º 183 do C.Com de ABÍLIO NETO e CARLOS MORENO, Código Comercial Anotado, Lisboa, 1978, pp. 278-279, que pelas referências jurisprudenciais e doutrinais indiciam a sua concordância com a teoria proibicista. 28 ADELINO PALMA CARLOS, ob. cit. pp. 236 .

Page 13: A Cor Do Paras Social

4.2 “Estes e outros argumentos de modo algum mereciam o acolhimento da

facção contrária, que era, assim, levada a admitir a validade de princípio das

convenções de voto, quer de iure constituendo, quer de iure constituto,

apelando, em derradeiro termo, para a regra da liberdade negocial formulada

no art.º 405.º do Código Civil29”

Neste contexto, pela tese dos subscritores da licitude destes acordos sustenta-

se que a posição da Assembleia Geral não era desvirtuada, avançando-se

argumentos de facto e de Direito.

Desde logo defende-se que como o pacto apenas tem eficácia entre os seus

intervenientes, sendo insusceptível de afectar a essência do direito de voto;

com efeito, ainda que vinculado ao acordo, os sócios dispõem da suprema

liberdade de actuar de acordo com as suas íntimas convicções, usufruindo do

seu direito de voto no sentido que mais lhe aprouver, ficando posteriormente

sujeito às sanções do incumprimento contratual30. Em súmula, da

impossibilidade do inadimplemento sustentar a impugnação do voto expresso

retira-se a conclusão que a natureza inalienável do direito de voto não é

atacada31.

Ainda como argumentos de facto colocava-se em causa a capacidade

esclarecedora das Assembleias, vezes de mais amontoados de posições

insusceptíveis de produzirem um “voto espontâneo, que pressupõe, além do

mais, no sócio singular uma capacidade crítica e uma immediatezza de

resolução que é lícito duvidar, é, de facto, muitas vezes fruto de uma impressão

momentânea ou da incerta psicologia dos grupos que inesperadamente tomam

o predomínio na assembleia e pode, por conseguinte, determinar precipitadas e

não justificadas”32 deliberações. Com efeito, demasiadas vezes assume-se

29 EDUARDO LUCAS COELHO, Direito de Voto dos accionistas nas assembleias Gerais das Sociedades Anónimas, 1987, pp. 84-85.30 Este é um argumento com influência decisiva. “Não se vê razão bastante para impedir, na generalidade, os sindicatos de voto. No âmbito das sociedades comerciais, têm função análoga à da disciplina de voto imposta aos deputados dos grupos parlamentares. Os sócios podem votar se quiserem e como quiserem, podendo, pois, acordar com outros para votar em certo sentido, que corresponda aos seus interesses. LUÍS BRITO CORREIA, Direito Comercial, Deliberação dos Sócios, III, cit. pp. 172.31 Esta tese é ferozmente contestada por FERNANDO OLAVO (ob. cit. pp. 192-193) que sustenta o facto do accionista não estar “evidentemente no momento de emitir o seu voto em condições de liberdade de apreciação, porque o interesse individual de não incorrer na pena convencional ou indemnização por quebra daquele compromisso o coarcta e tolhe a sua determinação”.32 ADRIANO VAZ SERRA, “Assembleia Geral”, Boletim do Ministério da Justiça n.º 197, Jun-1970, pp. 79

Page 14: A Cor Do Paras Social

como preferível que o voto seja exercido após cuidada e introspectiva

meditação, e não baseado em fenómenos de massas.

No mesmo sentido aluda-se à possibilidade das deliberações unânimes por

escrito, admissíveis em qualquer tipo de sociedade (art.º 54º CSC), as quais

não são precedidas de um prévio debate, o que permite demonstrar que o

debate pré-deliberativo não pode qualificar-se como um princípio geral do

Direito Societário33.

Refira-se ainda que o paralelismo entre as Assembleias Gerais e as

Assembleias políticas é desadequado uma vez que existem “meras analogias

extrínsecas –meras semelhanças formais -, e que a dignidade dos interesses

que estão em causa no voto político não encontra paralelo no contexto em que

é emitido o voto do accionista”.34 Em consonância defende-se que “a ideia de

ofensa à liberdade do direito de voto, que se reprova, assenta, afinal, num mito

“- o mito da incomercialidade do direito de voto”35- e há que desmistifica-la”36.

Como motivação de ordem jurídica costumam indicar-se as regras da

representação de sócios na Assembleia Geral.

A doutrina tradicionalista entendia os art.º 183º e 187º do Código Comercial

como normas excepcionais, reforçando deste modo a concepção do direito de

voto como eminentemente pessoal, como integrando-se no grupo dos direitos

corporativos gerais, inderrogável37 e irrenunciável38 qualificador do estatuto de

sócio.

Esta visão deve considerar-se desajustada ao actual regulamento societário,

no qual a possibilidade de representação foi alargado39, enfatizando-se as suas

potencialidades, sendo actualmente proibido impedir a representação para o

33 No mesmo sentido MÁRIO LEITE SANTOS, ob. cit. pp. 204-20534 VASCO LOBO XAVIER, ob. cit. pp. 646-647.35 FERRI, apud. PINTO FURTADO, Deliberações dos sócios, Coimbra, 1993, pp. 100.36 PINTO FURTADO, Deliberações..., cit. pp. 100.37 Direitos inderrogáveis são “aqueles insusceptíveis de ser suprimidos por decisão maioritária dos sócios. (RODRIGO SANTIAGO, Dois Estudos sobre o Código das Sociedades Comerciais, Coimbra, 1987, pp. 16).38 São os “que nem sequer podem ser coarctados com o consentimento do seu titular” (ibidem)39 Por todos vide EDUARDO VERA-CRUZ PINTO, A representação do accionista para o exercício do direito de voto nas Assembleias Gerais das Sociedades Anónimas, AAFDL, 1988.

Page 15: A Cor Do Paras Social

exercício deste direito, quando por pessoas determinadas.40 Assemelha-se

incontornável que o contemporâneo entendimento do direito de voto se ajusta

com a possibilidade de este ser validamente emitido por ente diverso do

accionista, derrubando-se desta forma um dos mais caros argumentos dos

defensores das teses proibicistas.

Ainda como argumentação jurídica refira-se o apelo ao primado da liberdade

contratual que legitimaria a admissibilidade dos acordos parassociais.

Como argumentação, que podemos denominar de finalista, enfatiza-se a

importância destes acordos, capazes de garantir estabilidade organizativa e de

“gestão social, face ao risco de maiorias flutuantes”41, podendo qualifica-los

como “um instrumento indispensável na vida das sociedades”42.

9. Apesar de outros autores terem vindo juntar a sua voz àqueles que

sustentavam a licitude destes acordos (PINTO FURTADO43, MÁRIO

RAPOSO44, AMÂNDIO DE AZEVEDO45) a jurisprudência manteve-se incólume

na condenação destes acordos, reafirmando a tese proibicista sempre que teve

a possibilidade de se pronunciar sobre a temática46.

A resposta à querela relacionada com estes acordos “não pode ser avaliada

segundo um cânone unitário de avaliação, mas ao invés, mediante referências

40 O art.º 380.º CSC estatuí que “o contrato de sociedade não pode proibir que um accionista se faça representar na assembleia geral, contando que o representante seja um membro do conselho de administração ou da direcção da sociedade, o cônjuge, ascendente ou descendente do accionista ou outro accionista.41 LOBO XAVIER, ob. cit. pp. 645.42 FERRER CORREIA e MANUEL DE ANDRADE, Pacto de preferência na venda de acções, Lisboa, 1955, pp. 29. Esta posição não é unânime, não faltando autores, como BARBOSA MAGALHÃES, que “mesmo encarando-os sob o aspecto económico, há que reconhecer a sua inconveniência, produzindo mais prejuízos que benefícios” (ob. cit. pp. 26).43 PINTO FURTADO, Código Comercial anotado (comentário ao art.º 183.º do C.Com), II, Coimbra, 1979, pp. 510 ss.44 MÁRIO RAPOSO, O poder de domínio nas sociedades anónimas, separata da Revista de Direito administrativo, XIV, n.º 3, 1970. 45 AMÂNDIO DE AZEVEDO, Sindicatos de voto, Porto, 1974.46 A jurisprudência portuguesa condenava “rotundamente a contrariedade aos bons costumes dos pactos de voto” (VASCO LOBO XAVIER, ob. cit. pp. 644).

Page 16: A Cor Do Paras Social

a critérios multiformes, identificados umas vezes na conformidade com o

interesse social, outras na boa-fé e na correcção contratual, em alguns casos

com as normas organizativas societárias”47

47 SANTONI, apud. Mário Leite Santos, ob. cit. pp. 16

Page 17: A Cor Do Paras Social

II – CONSAGRAÇÃO LEGISLATIVA

1- Relação entre o contrato social e o acordo

parassocial 2- Análise ao artigo 17.º CSC 3-

Forma 4- Duração 5- Transmissibilidade 6-

Meios de conferir efeito externo aos acordos

1. Relação entre os acordos parassociais e o contrato de sociedade.

1.1 A ligação entre o contrato de sociedade e os acordos parassociais, revela-

se, desde logo com a nomenclatura assumida, que exprime a ligação intensa

entre ambos, sendo insofismável a afirmação de que o parassocial não existe

sem que o social exista, que embora marginal face àquele mas estando

dependente para a prossecução da sua finalidade.

Prova de que a existência de um acordo parassocial tem reflexos na própria

sociedade são os efeitos indirectos emergentes daquele.

Sem preocupação de exaustividade, exemplificativamente refira-se o regime de

responsabilidade solidária dos sócios com as pessoas que por ele eleitas para

exercem cargos sociais, quando a eleição resulta do estabelecido num acordo

parassocial, pelos prejuízos que este origine para com a sociedade, com

fundamento na culpa in eligendo48.

Sobre este tema merece reflexão a sua conjugação com a obrigação de sigilo

impostas em alguns acordos parassociais49: com efeito e ainda que esta

restrição não esteja estatuída é um lugar comum afirmar-se a dificuldade em

conhecer estes acordos: este facto suscita a dificuldade em imputar esta

responsabilidade aos sócios obrigados, em princípio, únicos detentores dos

meios de provar a existência do acordo, mas com todo o interesse em que esta

não se produza de modo a desonerarem-se da referida responsabilidade.

48 Sobre o tema RAÚL VENTURA, Acordos..., cit. pp. 38 ss. e MARIA GRAÇA TRIGO, Os acordos parassociais sobre o exercício do direito de voto, , Lisboa, 1998, pp. 140 ss.49 Corolário deste facto foi a sua denominação de pactos secretos ou reservados que lhe foi atribuída por CUNHA GONÇALVES, Comentários ao Código Comercial Português, 1914, 1ª, pp. 226 e JOSÈ TAVARES, Sociedades e Empresas Comerciais, 1924, pp. 335, conforme sublinha PINTO FURTADO, Curso de Direito das Sociedades, 2ª Edição, , pp. 99.

Page 18: A Cor Do Paras Social

Ainda enquanto efeito indirecto dos acordos parassociais na disciplina

societária relaciona-se com a possibilidade de estes permitirem uma relação de

domínio de uma sociedade para com outra, porque esta seria uma das

modalidades de exercer uma influência dominante, concebendo-se ainda, pelo

secretismo destes acordos, a faculdade de contornar as disposições limitativas

relacionadas com o domínio de sociedades50.

Também no Regime Geral das Instituições de crédito e Sociedades

Financeiras51 encontramos reflexos da existência de acordos parassociais,

nomeadamente a obrigatoriedade de registar no Banco de Portugal os acordos

parassociais relativos ao direito de voto, sob pena da sua ineficácia,52

disposição que porque pioneira reveste especial interesse.

Ainda em sede de consagração legislativa refira-se, pelo seu especial

interesse, o facto de a não comunicação da existência de acordos parassociais

nas sociedades abertas ser cominado como contra-ordenação grave.53

1.2 Ligação com a relação social, a sua acessoriedade face à relação

social54

Apesar de autónomos face ao contrato de sociedade o pacto em análise visa

complementa-lo, seja através de regulamentações autónomas em temáticas

àquele colaterais ou visando integra-lo ou, mesmo, altera-lo,55 visando a

integração ou superação da regulamentação estatutária das através da criação

50 Por todos vide JOSÈ ENGRÁCIA ANTUNES, Os grupos de sociedades – Estrutura e organização da empresa plurisocietária, 1993, passim. Escreve o Autor que “em tal caso, se é certo que a sociedade não dispõe de um poder (maioritário) de voto próprio, é também certo que possui, pelo menos, um poder derivado” (pp. 378).51 Decreto-Lei n.º 298/1992 de 31 de Dezembro de 1992.52 Redacção do art.º 111, n.º 1 do D/L supra referido.53 Pelo disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 390 do Código de Mercado de valores Mobiliários. (Decreto-Lei n.º 486/1999 de 13/11/1999.54 Sobre o tema vide por todos GIUSEPPE RESCIO, LA distinzione del sociale dal parasociale, Rivista delle Società, Milano, 1991, pp. 596 ss.55 Neste sentido é pertinente a distinção avançada por GIUSEPPE SANTONI, entre os acordos colaterais que concretizam actos de disposição dos direitos dos sócios e os complementares que concretizam assunções de obrigações perante outros sócios (ou terceiros) em favor da sociedade.

Page 19: A Cor Do Paras Social

de vínculos individualmente assumidos pelos sócios, entre eles ou perante a

sociedade, ou face a terceiros.”

Assim, estes acordos são passíveis de serem caracterizados por terem como

finalidade permitir aos sócios regular os seus interesses na sociedade,

nomeadamente as suas relações recíprocas e as suas relações com a

sociedade.

E suma, o que releva desta posição é a necessidade do pacto se debruçar

sobre a sociedade, embora sem confundir-se com esta; o acordo parassocial

não existe sem a sociedade; neste contexto merece referência a posição de

ORLANDO GOMES, com a qual nos identificamos, quando explica existirem

“contratos que dependem da existência de outros. Seria mais correcto qualificá-

los de contratos dependentes, mas o uso consagrou a expressão contratos

acessórios”56

1.3 Distinção do contrato social, a sua extrincidade ao contrato social

Contrato de sociedade e acordo parassocial são duas realidades díspares e

inconfundíveis, a despeito de grande confluências intrínsecas; desde logo os

efeitos de um estendem-se ao social, enquanto que no outro o vínculo se cinge

aos seus participantes.

Estamos perante “ negócios jurídicos com autonomia própria, regidos por

normas que lhe são peculiares”57, “pois só assim se explica a diversidade de

efeitos e de regime jurídico que lhe são imputáveis”58

Neste sentido ensina OPPO que os acordos parassociais se “distinguem do

contrato social, pelo carácter individual e pessoal do vínculo que é produzido

pelo negócio em contraposição ao carácter social das obrigações assumidas

pela lei das sociedades comerciais, de modo que ficam excluídas para aqueles

a particular eficácia nas relações internas e nas relações com terceiros tem o

regulamento social (legal ou estatutário) da relação social”59 , formando-se “no 56 ORLANDO GOMES, Contratos, Rio de Janeiro, 1998, pp. 92.57 FERNANDO GALVÃO TELES, ob. cit. pp. 74.58 MÁRIO LEITE SANTOS, ob. cit. pp. 26.59 GIORGIO OPPO, “Contratti parasociali”, Diritto delle Società, scritti giuridici II, Milão, 1993, pp. 2-3

Page 20: A Cor Do Paras Social

âmbito individual dos sócios e os seus efeitos apenas se repercutem na esfera

pessoal dos que a eles se submetem”60.

1.4 Tudo o que se disse transforma em premissas lógica duas realidades: o

contrato de sociedade e o acordo parassocial são institutos diversos; mas

apesar da diversidade não são realidades estanques, sendo que um deles, por

definição, se relaciona com o outro.

Assim, é característica individualizadora dos acordos parassociais, a sua

conexão com o pacto social, que os justifica, legitima e lhes confere razão de

ser; com efeito, para que um acordo possa beneficiar da qualificação de

parassocial tem de gravitar sobre temáticas relativas à sociedade, de molde a

complementar a regulamentação jurídica que norteia o ente societário.

Para a compreensão exacta desta conexão é importante realçar os traços

distintivos destes dois contratos. Não sendo exaustivo, importa destacar os

mais pertinentes elementos distintivos:

i) Em relação à constituição:

- o contrato de sociedade tem se ser celebrado por escritura pública61 e

carece de registo, sendo que estas são formalidades ad substanciam como

se depreende do art.º 5 e 7º CSC; para o acordo parassocial vigora o

princípio da liberdade de forma, de acordo com as disposições do art.º 219º

CC;

Das formalidades exigíveis para a celebração de cada um destes contratos

usam retirar-se importantes consequências; assim, como consequência da

necessidade de o contrato de sociedade ser obrigatoriamente constituído

por escritura pública, que posteriormente é registado e publicado no jornal

oficial, alega-se a sua eficácia erga omnes, facto que se justifica pela

60 MARIO LEITE SANTOS, ob. cit. pp. 17-1861 O que se afirma não é, actualmente, inteiramente correcto, uma vez que a exigência de escritura pública não engloba a totalidade dos tipos sociais; com efeito, a sociedade unipessoal por quotas pode constituir-se por documento escrito. Ainda assim, faz-se apelo a este critério de distinção, não só por usual na doutrina, mas, e sobretudo, pela excepcionalidade do regime das sociedades unipessoais. Refira-se também, que nestas sociedades a dogmática dos acordos parassociais é quase inexistente, devendo-se este factor à pouca relevância social e económica destas sociedades e especialmente, pela insusceptibilidade material da maioria dos acordos parassociais se debruçar sobre estas sociedades.

Page 21: A Cor Do Paras Social

susceptibilidade de os terceiros poderem conhecer o conteúdo contratual;

no que concerne aos acordos parassociais, regra geral, o seu regime

apenas é conhecido pelos seus intervenientes, fundamentando a sua

inaplicabilidade a terceiros.

Não obstante constatarmos a existência de diferenças no que concerne à

constituição dos institutos em análise, não as elevamos a factor decisivo

para a sua diferenciação, do que releva não podermos concordar com

LUIGI FARENGA quando sustenta “é licito afirmar que o contrato

parassocial é aquele contrato que tendo por objecto uma disciplina de

situações jurídicas derivadas da estipulação de um contrato de

sociedade...do qual não foram respeitados os requisitos formais ou

substanciais (ou ambos) previstas na lei societária”62

ii) Em relação à eficácia:

- conforme se indiciou, este tem sido um plano privilegiado pela doutrina

para discernir as realidades em análise, enaltecendo a característica de o

contrato de sociedade gozar de eficácia real, enquanto o acordo parassocial

tem eficácia meramente obrigacional63; desta premissa decorre que a

violação destes têm distintas consequências, sendo as do contrato social

suficientes para inquinar os actos desconformes e as do acordo parassocial

apenas conducentes aos preceitos que estatuem o incumprimento

contratual e, por consequência, indiferentes às vicissitudes societárias.

iii) Em relação à modificalidade:

62 LUIGI FARENGA, ob. cit. pp. 185. No mesmo sentido RESCIO (La distinzione del sociale dal parasociale, Revista delle Società, Anno 36º (1991), marzo-giugno 2º-3º, MIlano, pp. 602-603) ensina que “ a parcial inobservância das regras procedimentais não é passível de ser valorada como indicativo de parassocial, sendo simplesmente um vício do contrato social”. No mesmo sentido escreve MÁRIO LEITE SANTOS que sustenta que 2o parassocial não pode ser confundido com o social viciado”.(ob. cit. pp. 42).63 Sobre o tema MARIO LEITE SANTOS ob. cit. pp. 18 ss. A diversidade derivada dos efeitos gerados fica plenamente demonstrada pelo circunstancialismo de um pacto de preferência para a venda de participações sociais se realizar no seio da sociedade ou num acordo parassocial; a violação do primeiro torna a cessão inoponível à sociedade e a do segundo, ainda que emergente de um pacto em que todos os sócios se vincularam, obriga a sociedade a reconhecer a qualidade de sócio do adquirente.

Page 22: A Cor Do Paras Social

- o contrato de sociedade, regra geral, pode ser modificado por maioria e os

acordos parassociais apenas por unanimidade.

As formalidade, requeridas para a constituição do pacto, repetem-se para a

sua modificação, embora esta tenham a especificidade de não carecer da

adesão da totalidade dos sócios, sendo possíveis alterações a despeito da

vontade de alguns dos seus sócios, justificando-se este facto pelo caracter

dinâmico da sociedade.

No que respeita aos acordos parassociais, e salvo estipulação em contrário,

exigir-se-à a concordância da totalidade dos signatários para introduzir

alterações no seu conteúdo, consistindo este num outro factor diferenciador

dos contratos em análise.

iiii) Em relação à finalidade:

- o contrato de sociedade tem, nas palavras de SANTONI, um significado

organizacional, nos quais o sócio é um terceiro face ao agir societário,

enquanto os acordos parassociais tutelam relações num plano meramente

individual, não se incluindo naquele “ainda que sejam concluídos pelos

mesmos sujeitos que estipularam o contrato social e com referência à

mesma actividade económica de empresa colectiva regulada por este”64.

Sublinha-se com esta construção o carácter institucional que caracterizaria

o contrato social, inexistente nos acordos parassociais, porquanto estes

visam os interesses egoístas dos sócios enquanto tais, que através deste

meio procuram incrementar as suas vantagens sociais.

Com apelo a este critério distintivo torna-se compreensível a possibilidade

de a “inclusão material de uma regra no contrato de sociedade não ser por

si suficiente critério para lhe ser atribuída a natureza de norma societária.65

iiiii) Em relação à interpretação

64 GIUSEPPE SANTONI apud. MÁRIO LEITE SANTOS, ob. cit. pp. 37.65 MÁRIO LEITE SANTOS, ob. cit. pp. 28. RAUL VENTURA,( Alteração do contrato de Sociedade, 2ª Edição, Coimbra, 1996, pp. 32-33) exemplifica com a necessidade de fazer constar no contrato as vantagens concedidas aos sócios e eventuais indemnizações ou retribuições devidas a estes ou a terceiros (art.º 16.º CSC) à qual deve negar-se a natureza social.

Page 23: A Cor Do Paras Social

- a interpretação do contrato de social deve fazer-se segundo “um critério

fundamentalmente objectivo na hermenêutica da fonte da relação social,

para a qual é despicienda a vontade das partes que procederam à

constituição da sociedade

Por seu turno, as regras interpretativas a aplicar ao acordo parassocial são

as regras gerais de interpretação de negócios jurídicos, com estatuição

legal no art.º 236.º CC.

1.5. Na esteia de GIORGIO OPPO entendo ser oportuno uma sumária análise

à incidência dos acordos parassociais sobre o pacto social, nomeadamente as

repercussões que o primeiro exerce sobre o segundo66.

Desde logo individualizam-se os acordos sobre temáticas estranhas ao estatuto

social, não se diagnosticando quaisquer consequências sociais. Aponte-se os

exemplos de os sócios regularem os direitos e obrigações que lhe assistem

nessa qualidade, nomeadamente a distribuição dos lucros em termos díspares

ao estipulado no pacto e algumas regras relativas à transmissão das

participações sociais. Da sua irrelevância face à sociedade tem-se concluído

que nada obsta à sua validade e eficácia entre os intervenientes, sempre que

não estejam em oposição com normas legais imperativas67.

Um segundo conjunto de acordos encerram a faculdade de obterem-se

vantagens especiais para a sociedade a expensas dos sócios; será o caso de

um ou mais sócios se vincularem a conceder empréstimos à sociedade ou a

aumentarem o capital social, a escoar o produto social ou a angariar parceiros

estratégicos, entre uma infinidade de possibilidades, com o denominador

comum de se traduzirem num benefício para a sociedade não plasmado no

contrato social.

Bem mais perniciosa é a capacidade de os sócios se aglutinarem num sentido

que possa produzir um prejuízo para a sociedade ou demais sócios, ora

regulamentando a determinação do sentido de voto, ou a constituição dos

órgãos sociais, exercendo uma directa influência no ente social. É

66 Esta construção é esboçada entre nós por FERNANDO GALVÃO TELES, ob. cit. pp. 76 ss. e RAÚL VENTURA, Acordos..., cit. pp. 11.67 Seria o caso de, entre outros, o acordo parassocial consagrar um pacto leonino.

Page 24: A Cor Do Paras Social

fundamentalmente sobre este que deve deter-se a interpretação da doutrina

num esforço para detectar as vinculações admissíveis e as condenáveis, de

molde a expurgar a possibilidade de os sócios se agruparem para a

prossecução de finalidades intoleráveis face ao quadro do direito societário.

1.6 Ainda na análise das relações entre o acordo parassocial e o contrato

social, dissequemos um ponto que, na minha modesta opinião, parece central e

prende-se a influência do primeiro sobre a validade do segundo.

Trato da possibilidade de o estatuto social tecer considerações acerca do

pacto: se o faz para determinar a sua licitude, para permitir que os sócios se

agrupem deste modo, a norma é desnecessária, porque redundante, em

relação à letra da lei68.

Problema mais complexo é o de o contrato social proibir a existência de

acordos parassociais; entre nós RAUL VENTURA69 proclama a validade destas

cláusulas que defendem estatuírem-se com base no princípio da liberdade

contratual, não violando qualquer norma legal. MARIA GRAÇA TRIGO, embora

sem tomar uma posição definitiva inclina-se, alicerçada na doutrina alemã, pela

tese oposta. Com o devido respeito pela posição em contrário, não vejo como

se possa inquinar a validade de uma cláusula societária proibitiva de acordos

parassociais: os sócios ao incluírem determinada cláusula no contrato social,

ao darem o seu consentimento para que esta cláusula se insira no pacto,

fazem-no de moto próprio, ao abrigo do princípio da autonomia contratual,

fazem emergir a obrigação de cumprirem pontualmente o resultado do seu

acordo de vontades.

Posto isto, resta averiguar se esta previsão contraria as regras que disciplinam

a legalidade dos contratos, ou mais concretamente, se estamos perante uma

disposição imperativa ou facultativa; inclino-me, sem receio, para a concepção

de que o preceituado no art.º 17.º do CSC está ao alcance da disponibilidade

das partes, nada obstando a que os sócios em sede contrato de sociedade

disponham a ilicitude de realizar este tipo de acordos.68 A análise à cláusula que esboçamos era muitíssimo pertinente face ao silêncio da lei, nomeadamente face à posição maioritária da doutrina que condenava a validade destes acordos: com a consagração legal da licitude deste tipo contratual a temática perdeu por completo a acuidade.69 Acordos..., cit. pp. 37.

Page 25: A Cor Do Paras Social

A posição preconizada alarga-se à estatuição social de cláusula que obrigue os

sócios a comunicar à sociedade ou aos seus sócios da existência de um destes

acordos. Assim, mais do que a própria ilicitude da norma em si mesma,

sublinhe-se a dificuldade em descortinar os efeitos do inadimplemento: face ao

quadro legal actual e devido aos argumentos anteriormente aduzidos, é

indefensável a sustentação de que o contrato seria nulo.70

Dogmaticamente mais atraente resulta a faculdade de o contrato social alargar

o campo de aplicação destes acordos, derrogando a disposição legal,

nomeadamente através da estatuição da oponibilidade dos acordos

parassociais.

Sobre o tema MARIA GRAÇA TRIGO ensina que a hipótese deve ser recusada

“na medida em que desrespeitaria a regra geral imperativa da ineficácia dos

acordos perante terceiros” 71.

Em nossa opinião a resposta a esta querela encontra-se prejudicada pela

solução adoptada para dois distintos problemas, a saber:

- a consideração do art.º 17º como uma norma imperativa ou facultativa;

- o sentido em que entendemos o princípio da inoponibilidade consagrado

na referida disposição legal.

Sobre o primeiro dos problema enunciados já ficou expressa a nossa posição;

no que respeita ao segundo, reservamos uma tomada de posição para a parte

que encerra o estudo72.

2. Análise ao Artigo 17º CSC

70 Não obstante o que fica escrito, não condenamos a possibilidade de se exigir no pacto social a comunicação de eventuais acordos parassociais, cominando-se o incumprimento desta cláusula com uma qualquer sanção, desde que, não inquine a validade dos acordos.71 RAÚL VENTURA, Acordos..., cit. pp. 151.72 Sobre o tema vide infra ponto 2.1 capítulo V.

Page 26: A Cor Do Paras Social

2.1 A despeito de uma posição “prevalecente na doutrina e pacífica na

jurisprudência”73 o legislador português pôs termo à cisão doutrinal,

regulamentando a matéria.

A regulamentação legislativa dos acordos parassociais, teve o condão de

deslocar a doutrina dos problemas relacionados com a validade destes

acordos, agora um dado adquirido, para se centrar na análise do regime legal

vigente, tentando dissecar os limites legalmente impostos à sua validade.

Ainda sobre o modo como se consagrou a admissibilidade dos acordos

parassociais faz-se eco com a mais recente doutrina que critica,

acertadamente, a inexistência de trabalhos preparatórios publicados, que

dificultam o intérprete na sua tarefa de compreensão do instituto e

nomeadamente dos motivos que determinaram a sua consagração legal.

Sobre o teor da redacção legislativa pode afirmar-se que a mesma consistiu em

admitir a validade dos acordos parassociais em geral, detendo-se

posteriormente na problemática dos acordos de voto, que expressamente são

admitidos, ainda que não sem reservas; com efeito, alguns destes são

cominando com a nulidade.

O modo como se produziu esta admissibilidade causou estranheza, mesmo

nos seus mais entusiásticos defensores, que não duvidam em qualificar a

redacção adoptada de demasiado ousada.74

Assim, os acordos parassociais gozam de consagração legislativa, desde 1986,

pelo disposto no art.º 17º Código das Sociedades Comerciais (CSC). Esta

estatuição legal veio por termo à controvérsia doutrinal e jurisprudencial,

dirimindo-a deste modo.

Mas a estatuição legal da validade dos acordos parassociais não encerra a

discussão acerca do seu conteúdo, incumbido à doutrina examinar os seus

conteúdos, nomeadamente a tarefa de determinar os seus limites, e indagar

73 VASCO LOBO XAVIER, ob. cit. pp. 64374 Neste sentido VASCO LOBO XAVIER, ob. cit. pp. 651. Também MARIA GRAÇA TRIGO entende “que a forma como o princípio da admissibilidade foi introduzido no direito português se caracteriza por uma certa artificialidade” considerando o carácter precipitado da nova regulamentação legal (ob. cit. pp. 139).

Page 27: A Cor Do Paras Social

sobre o seu verdadeiro campo e âmbito de aplicação, de molde a proceder ao

seu aprofundamento.

A redacção do artigo corresponde à apresentada no projecto elaborado por

RAUL VENTURA; nesta foi descurado, por ventura erradamente, a contribuição

de VAZ SERRA75, que anos antes defendera a consagração legal deste

instituto, embora com uma diferente redacção. Pela sapiência técnica e pela

coincidência com as opiniões que formularemos, reputamos de pertinente

reproduzir esta proposta.

1. É nulo o contrato pelo qual o accionista se obrigue, para com a sociedade ou

terceiro, a exercer o seu direito de voto segundo instruções da sociedade ou da

administração, da direcção ou do conselho de vigilância ou fiscal da sociedade, ou

segundo instruções de uma empresa dependente, ou a votar as eventuais

propostas de algum desses órgãos da sociedade, ainda que tal contrato obrigue os

accionistas entre si.

2. São, porém, válidos os contratos pelos quais os accionistas se obriguem, por

escrito, para com a sociedade entre si, a votar uniformemente nas assembleias

gerais, salvo se tais contratos violarem um princípio das sociedades por acções ou

puderem prejudicar o interesse da sociedade; estes contratos não podem valer por

mais de três anos, limitando-se a sua duração a este período quando não for

determinada.

3. Não pode ser exigido judicialmente o cumprimento dos contratos previstos no

número anterior, mas só a indemnização ou a pena convencional por não

cumprimento deles.

4. Se os referidos contratos forem nulos, não são por esse motivo inválidas as

deliberações da assembleia geral em que a maioria se tenha formado mediante a

espontânea observância do contrato; se forem válidos, a sua inobservância não

afecta a validade das deliberações da assembleia geral.

A redacção legal que vingou para a problemática em análise recebeu influência

decisiva da lei societária alemã - AktG Alemã de 1965 -, que por sua vez já

influenciara a proposta da V Directiva da CEE de 198376.

75 ADRIANO VAZ SERRA, Assembleia Geral..., cit. pp. 86-87.76 A redacção da Directiva de 1983 era a seguinte:São nulas as convenções pelas quais um accionista se obriga a votar:

a) seguindo sempre as instruções da sociedade ou de um dos seus órgãos;b) aprovando sempre as propostas feitas por eles;c) exercendo o seu direito de voto em determinado sentido ou, pelo contrário abstendo-se

de o exercer em contrapartida de vantagens especiais.

Page 28: A Cor Do Paras Social

2.2 Após algumas considerações preliminares entendo ser oportuno iniciar um

ensaio em concreto aos acordos parassociais, tal qual foram recebidos no

nosso ordenamento jurídico.

Pela análise do preceito legal estes definem-se com acordos celebrados

entre todos ou alguns dos sócios pelo qual aqueles, nessa qualidade, se

obriguem a uma conduta, permitida por lei.

Da definição que o legislador nos oferece encontramos alguns aspectos que

carecem de uma apreciação mais detalhada com base nas dificuldades que

destacam.

Num primeiro momento importa tecer sumárias considerações sobre as partes

existentes neste acordo: ensina-nos o artigo que o acordo parassocial é

celebrado por dois ou mais sócios, que correspondam ou não à totalidade dos

sócios da sociedade.

Pela redacção adoptada assume-se, sem margem de risco, a possibilidade de

existirem contratos, outorgados por todos os sócios, mas, e apesar deste facto,

extrínsecos ao contrato social. Assim, afastada a questão da admissibilidade

destes pactos, merece reflexão determinar a sua finalidade, inquirir sobre o que

move a totalidade dos sócios a celebrarem entre si um outro contrato,

autónomo mas conexionado com o contrato social, qual a finalidade

prosseguida pelos sócios nestes acordos, insusceptível de ser conseguida no

contrato social77. A correcta resposta a esta questão baseia-se na consideração

de que a par das disposições societárias são enunciáveis outras motivações

que carecem da convergência dos sócios, mas distintas do pacto social,

passíveis de realizarem melhor a sua função típica se prevista num instituto

diferente daquele, nomeadamente em termos de formalismos, publicidade e

eficácia, ou ainda a necessidade de acordar sobre temáticas que, não obstante

se dirigirem ao ente social, não têm a natureza de disposições sociais.

77 A questão é despicienda quando o contrato não engloba a totalidade dos sócios, por se vislumbrarem diversas motivações para a sua união.

Page 29: A Cor Do Paras Social

Retomando uma abordagem subjectiva ao preceito legal, merece, desde logo

cuidada reflexão, a identificação das pessoas que podem celebrar tais acordos.

Numa primeira e apressada análise somos empurrados a considerar que

acordos parassociais são convenções entre sócios, dependendo a sua validade

da conformidade com os preceitos imperativos de direito societário. Esta visão

prejudica a qualificação como parassociais de acordos em que intervenham

não sócios, e, por maioria de razão, em que não intervenham sócios.

Uma segunda leitura admissível, consiste em considerar que de todos os

acordos parassociais possíveis o legislador se limitou a disciplinar aqueles em

que intervêm sócios78.

De forma sintética refira-se que os acordos parassociais são uma realidade da

praxis económica que os diversos legisladores se viram obrigados a

regulamentar. Estamos assim perante um tipo legal que visou regulamentar um

tipo extralegal ou tipo social, i e, sobre metodologias contratuais que eram

típicas nas relações societárias.

Assim, na prática societária são comuns os acordos celebrados entre sócios de

uma dada sociedade com terceiros face àquela sobre temáticas relacionadas

com o ente social: sem dificuldade poderemos exemplificar com a realização de

um acordo para um financiamento, pactos para a realização de uma nova

entrada, ou para escoar produção, entre inúmeras outras possibilidades.

Não se vislumbram motivações para inquinar a validade em geral destes e de

outros acordos de semelhante escopo, sufragando a sua licitude como

corolário do princípio da autonomia contratual. A questão reside em considerá-

los ou não como acordos parassociais.

Numa deambulação pelos autores que analisaram o tema que agora nos

preocupa deparamos com frequentes exemplos de situações idênticas a estas

tratadas no âmbito dos acordos parassociais, o que revela, ainda que

inconscientemente, a sua qualificação como acordos parassociais, num sentido

coincidente com o nosso pensamento.

78 Com respeito pela avalizada voz de RAÚL VENTURA (Acordos..., cit. pp. 13) não podemos concordar em estar perante uma mera definição de uma categoria dogmática. Existe também um problema material de elevado interesse, que se prende com o facto de aquilatar se o legislador, ao referir-se a acordos celebrados entre sócios, exclui os acordos em que os sócios não intervém da disciplina legal, ou, se pelo contrário, os terá reputado de inaceitáveis.

Page 30: A Cor Do Paras Social

Opinamos pois, que a referência legislativa aos acordos celebrados entre

sócios não curou de excluir os acordos celebrados com terceiros, mas somente

pretendeu regulamentar uma parte de todos os acordos parassociais possíveis.

Entendemos estar perante “um tipo contratual legal que não corresponde a um

tipo social”79, nada obstando à validade dos referidos acordos.

Resta analisar o regime legalmente aplicável a estes acordos. Postulamos da

opinião que o art.º 17.º CSC é aplicável analogicamente a estes acordos:

solução inversa seria inaceitável porque se traduziria na consagração de um

regime mais restritivo para os acordos em que só interviessem sócios em

relação a semelhantes acordos em que alguns ou todos os intervenientes não

possuem aquela qualidade.

No que concerne à finalidade prosseguidas pelas partes que celebram este

contrato, podemos encontrar um objecto, relacionado com interesses que

gravitem à volta da sociedade, uma vez que um contrato que com esta não se

relacione não deve considerar-se parassocial.

Precise-se o facto de o texto legal exigir que os sócios se obriguem “nessa

qualidade”. A ratio desta precisão prende-se com o conteúdo das obrigações

que são admissíveis, sendo que estas, se limitam às decorrentes do estatuto

de sócio. Pelo afirmado, a possibilidade dos sócios de vincularem entre si, tem

como limite as suas atribuições sociais enquanto sócio, excluído-se por este

meio quaisquer outras que aquele circunstancialmente possua, mas

independentes da sua qualificação como sócio, v. g. como a circunstância de

cumular aquela qualidade com a de gerente e pretender vincular-se a uma

determinada conduta típica desta condição.

A ratio legis do artigo foi consagrar legalmente um princípio da admissibilidade

dos acordos parassociais, dentro dos limites do artigo e dentro do leque das

suas proibições, bem como consagrar o princípio da sua ineficácia perante a

sociedade e demais sócios.

Pela outorga de um acordo parassocial surge para aqueles que se vinculam

uma obrigação jurídica, sendo este o efeito pretendido pelas partes. Esta

obrigação pode ser positiva, sendo este o caso de o sócio se vincular a exercer

79 PEDRO PAIS DE VASCONCELOS, Contratos Atípicos, Coimbra, 1995, pp. 59.

Page 31: A Cor Do Paras Social

o seu direito de voto com um determinado conteúdo, ou negativa se consiste

em abster-se de votar ou de alienar as suas participações sociais.

Assim, o efeito útil da norma legal em análise foi desde logo esclarecer as

dúvidas que concerniam à sua licitude, e consequentemente submetendo as

suas violações aos ditames da responsabilidade contratual.

No que diz respeito ao seu âmbito de aplicação entendo que estes acordos

podem relacionar-se com um qualquer tipo social; se é indesmentível que a

prática ensina e demonstra que estão normalmente conexionados com as

sociedades anónimas, nada obsta a que se relacionem com uma sociedade de

tipologia diversa.

Se dúvidas subsistissem, haveria a possibilidade de argumentar que a sua

inserção na parte geral do CSC, esclarece a sua potencialidade de nortear os

comportamentos dos sócios independentemente do tipo social que adoptem.80

Seguindo o raciocínio assumido, e em obediência aos princípios fundamentais

que norteiam os argumentos que defendem a licitude do instituto,

nomeadamente o reincidente argumento que a sua conformidade como o

Direito de baseia no postulado da liberdade contratual, talvez o mais adequado

local de sede legislativa da admissibilidade dos contratos parassociais se situa-

se no Código Civil pela sua potencialidade de adaptação a qualquer tipo de

sociedade, abstraindo-se da sua comercialidade. Com efeito, não se

vislumbram motivações materiais para que um acordo parassocial verse sobre

uma sociedade civil.

2.3 Um outro elemento que importa considerar prende-se com a nomenclatura

adoptada, nomeadamente a expressão “acordos” inusual na nossa cultura

jurídica. O PROFESSOR RAUL VENTURA, embora desvalorize a questão “...

chamar-lhe acordos, convenções, contratos, não faz grande diferença” termina

entendendo que a qualificação de contrato se ajusta a este instituto.81

80 No mesmo sentido MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 146. Esta afirmação, no entanto, não prejudica a consideração de que é no seio das sociedades anónimas que estes acordos têm maior acutilância, o que sugere a alguns autores limitarem a este tipo social o estudo dos acordos parassociais; ainda neste sentido vide FERNANDO GALVÃO TELES, ob. cit. pp. 75 e MÁRIO LEITE SANTOS, ob. cit. que se limita a análise destes acordos neste tipo societário.81 RAUL VENTURA, Acordos..., cit. pp. 31

Page 32: A Cor Do Paras Social

Com a devida vénia não me parece que a questão seja tão simplista como

apresentada, tanto mais que, o receio da adopção da expressão contratos

patenteia-se num amplo conjunto de ambiguidades que norteiam este instituto,

num receio, fundado ou não, de conferir dignidade plena a este instituto

jurídico, ou mecanismo económico da vida societária82.

Corolário do que se afirmou é a particularidade singular dos acordos

parassociais, tais como estes existem à luz do jus constituto, é a sua

inoponibilidade face ao contrato social. É inequívoco o art.º 17 CSC em

determinar que com base no incumprimento de um acordo parassocial “não

podem ser impugnados actos da sociedade ou dos sócios para com a

sociedade”.

O legislador confere-lhes uma eficácia mitigada, no sentido em que, se, por um

lado, proclama a sua validade, a sua eficácia entre os intervenientes, por outro,

a sua inobservância, em princípio, não pode consubstanciar em algo mais que

uma singela indemnização.

Sustenta-se, por esta forma, que este contrato tem mera eficácia entre os seus

signatários, sendo a violação impotente para inquinar um qualquer acto da

sociedade ou dos sócios para com a sociedade.

O que aqui se salienta é que existindo “uma discrepância entre, por um lado,

um acto praticado pela sociedade ou por um sócio, e, por outro lado, a

obrigação assumida no acordo parassocial”83, prevalece a emitida no seio da

sociedade. “É assim estabelecida uma barreira entre o acordo e o contrato de

sociedade; as relações jurídicas criadas por aquele não vão afectar as relações

criadas por este, designadamente, têm de contentar-se com as suas sanções

próprias e não podem contar com as sanções próprias das relações

82 Em sentido similar MÁRIO LEITE SANTOS (ob. cit. pp. 176-180) considera “que o legislador pesou intencionalmente o alcance das palavras, com vista à expressão da sua vontade. Mais do que a opção pelo vocábulo acordo não se pode considerar desprovido de significado o ter-se evitado a utilização da palavra contrato. Refira-se finalmente que a opção pela, expressão contratos para qualificar a situação em análise não é inaudita no nosso direito, sendo utilizada no projecto VAZ SERRA; no mesmo sentido é lapidar FERNANDO GALVÃO TELES (ob. cit. pp. 82) ao afirmar que “todos os negócios para-sociais são,...em suma, contratos”.83 RAUL VENTURA, Acordos..., cit. pp. 14.

Page 33: A Cor Do Paras Social

societárias, nem para impugnação de actos sociais, nem para reforçar a

eficácia do acordo.” 84

Mas a inoponibilidade dos acordos parassociais face ao contrato social deve

ainda ser observado numa diferente perspectiva; se o incumprimento do pacto

não pode afectar a deliberação social, também os vícios do pacto social são

irrelevantes para as vicissitudes da sociedade; parece incontestável que se o

facto estiver ferido de nulidade mas, não obstante, os pactuantes

espontaneamente o cumprirem é axiomática a validade da deliberação

verificada, ainda que realizada na convicção errónea da vinculabilidade do

acordo, sendo esta mais uma decorrência da independência entre estas

figuras.

2.4 Obviamente que a impossibilidade de impugnar actos da sociedade com

base na violação de um acordo parassocial seria um dos aspectos nucleares

para incrementar a eficácia destes acordos, compreendo-se a preocupação

legislativa de, expressamente, aniquilar essa susceptibilidade. Mas, como bem

sublinha RAÚL VENTURA não é o único, sendo também concebível a

faculdade de se fazer intervir os órgãos da sociedade no funcionamento do

acordo.

Esta possibilidade é terminantemente afastada pelo ilustre professor citado;

pensamos que se exige alguma reflexão. Na defesa da sua posição RAUL

VENTURA exemplifica com a inadmissibilidade de, no caso de um acordo

parassocial pretender limitar a circulação de participações sociais, não pode

prever que se exige o consentimento da sociedade para a transmissão ou o

não reconhecimento por esta de uma alienação com violação do pactuado.

Mas, avancemos uma outra hipótese: alguns dos sócios acordam entre si que

votarão de acordo a uma proposta de cisão, se os administradores

concordarem com o mesmo. Neste caso, a regulamentação do acordo inclui

um órgão da sociedade que, ainda que indirectamente, determinará o sentido

de voto dos signatários do acordo: no exemplo aduzido nada obsta à licitude do

pacto. A posição que agora se defende é decorrente da interpretação a

contrario sensu da alínea a) n.º 3 do art.º 17.º CSC, que ao estatuir a proibição

84 Ibidem, pp.. 15.

Page 34: A Cor Do Paras Social

das convenções de voto nas quais os sócios se obrigam a exercer este seu

direito seguindo sempre as instruções da sociedade ou de um dos seus

órgãos, deixa aberta a possibilidade de se verificar uma situação paralela à

referida, que se consubstancia em fazer intervir a sociedade ou alguns dos

seus órgãos no acordo parassocial celebrado entre os sócios.

Por tudo, opinamos que o efeito útil da frase “não podem ser impugnados actos

da sociedade ou dos sócios para com a sociedade” deve cingir-se a impedir a

anulação de deliberações sociais com base no incumprimento de um qualquer

acordo parassocial, e não a impedir qualquer intervenção da sociedade na

regulamentação parassocial85.

3. A forma exigida para os acordos parassociais

3.1 Os acordos parassociais não carecem de qualquer formalidade legal,

aplicando-se-lhe assim o princípio da consensualidade ou liberdade de forma

previsto no art.º 219 CC.

Esta opção legislativa é antagónica à proposta do PROFESSOR VAZ SERRA

que exigia a forma escrita86.

Modestamente adiro a esta douta opinião. A relevância destes acordos “não se

compadece com a insegurança da forma oral”87.

Sendo certo que todos os acordos parassociais que alcançaram a barra dos

Tribunais estavam plasmados na forma escrita, de modo a facilitar ou permitir a

prova da sua existência, algumas dúvidas invadem-me o espirito, uma vez que

também é certo que a exigência de uma dada forma legal não se relaciona

unicamente com a sua função probatória, mas igualmente com a preocupação

em que a vinculação tenha por base uma consciente e fundamentada formação

85 Veja-se a nossa posição supra nota 69, ponto 1.3 capítulo II.86 Também as propostas de reforma legislativas em Itália requeriam esta formalidade, sendo que este era um ponto de contacto dos projectos apresentados por ASCARELLI, pela Comissão do Centro Italiano de Estudos Jurídicos e DE GREGORIO.87 RAUL VENTURA, Acordos..., cit. pp. 40. Também este autor entende que estes acordos devem celebrar-se por escrito, acrescentando que todos os acordos conhecidos pelos autores e Tribunais apresentaram esta forma.

Page 35: A Cor Do Paras Social

de vontade, funcionando a necessidade de forma especial como um meio de

permitir a reflexão88.

A desnecessidade de uma forma especial pode suscitar questões que não são

meramente académicas, nomeadamente de estabelecer a destrinça entre os

acordos de cavalheiros e os acordos juridicamente vinculativos; estabelecer

quais os casos em que os sócios ou delinearem estratégias para a vida

associativa têm ou não o desejo de se colocarem sobre a alçada do Direito,

quando pretendem a sua tutela. Assim, se três sócios jantam antes de uma

Assembleia Geral e combinam que vão votar a destituição de um dos

administradores estamos ou não perante um acordo parassocial? A questão é

delimitar quando estamos perante uma vontade de se vincular juridicamente a

uma estratégia ou a mera delimitação de uma estratégia comum sem intuito

vinculativo, a celebração de um mero acordo de princípio ou intenção.

3.2. Característico ainda dos acordos parassociais, tais como são entendidos à

luz do nosso direito positivo, é o secretismo que rodeia muitos destas

convenções. Algumas vezes encontramos inclusive esta obrigação como

cláusula daquele acordo.

Mas ainda que assim não seja é incontornável que a esmagadora maioria dos

acordos em análise não abandona o anonimato, sendo portanto desconhecidos

dos que dele não constam89.

Este facto, contraposto à publicidade que caracteriza os contratos de

sociedade, suscita delicadas questões; desde logo, como tudo o que é secreto

suscita o receio próprio do desconhecido, o temor da sua contrariedade face à

moral e ao Direito90.

88 Sobre o tema vide ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Tratado de Direito Civil Português, tomo I, Lisboa, 1999, pp. 319 ss. e ENZO ROPPO, O Contrato (Tradução de Ana Coimbra e Januário Gomes) Coimbra, 1988, pp. 96 ss.89 É recorrente a doutrina sublinhar a dificuldade de teorizar sobre estes pactos alegando o reduzido número dos pactos conhecidos, sendo que usualmente apenas é possível descobrir o seu conteúdo após a sua impugnação judicial.90 Criticamente sobre o tema classifica THEOPHILO AZEVEDO SANTOS( ob. cit. pp. 184) estes acordos de “ocultos”, irresponsáveis” e de “eficácia duvidosa em grande número de casos, aplaudindo a sua publicidade e arquivo na sede da sociedade.

Page 36: A Cor Do Paras Social

Por outro lado, a própria noção subjacente ao princípio societário, a junção “de

duas ou mais pessoas (que) se obrigam a contribuir com bens e serviços para

o exercício em comum de certa actividade económica ... a fim de repartirem os

lucros resultantes dessa actividade”91 exige que os sócios, corolário directo do

princípio da boa fé, que actuem com lealdade entre eles.

Merece reflexão o facto de, se dois ou mais daqueles unirem esforços à revelia

dos outros, como que formando uma sociedade dentro da sociedade, não

contrariam o espírito de conjugação de esforços que deve estar subjacente ao

intuito associativo.

Pessoalmente, e com respeito por posição em sentido inverso, não encontro

motivos que aconselhem ao secretismo destes acordos. Perfilho assim da

opinião, de jure constituendo, da consagração do princípio da publicidade

desses acordos, ou mais correctamente a obrigação de comunicar à sociedade

a existência de um acordo parassocial bem como do conteúdo da vinculação.

A opinião que expresso nada tem de inaudita, uma vez que vem na sequência

do estatuído no Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades

Financeiras, que no seu art.º 111 n.º 1 dispõe da obrigação de registar esses

acordos no Banco de Portugal92.

É uma regra análoga a esta de âmbito geral que aqui se propõe, dispondo-se a

obrigatoriedade de dar conhecimento à sociedade destes acordos.

Não se aceita o argumento em contrário baseado no receio de a possibilidade

de conhecimento ser prejudicial aos pactuantes por o acordado ser susceptível

de conhecimento por uma qualquer pessoa. Para tanto, o direito societário

estabeleceu um amplo conjunto de mecanismos que permitem proteger a

sociedade de uma utilização abusiva das suas informações internas, que

devem ser igualmente capazes de dar uma resposta eficaz à necessidade de

alguns acordos parassociais não deverem ser de conhecimento geral93.

91 Art.º 980.º Código Civil. A noção de sociedade consagrada pelo legislador foi decalcada dos art.º 2247º e 2248º do Código Civil.92 Sobre o tema vide CATARINA MARTINS DA SILVA, Os grupos bancários no regime geral das instituições de crédito e sociedades financeiras, ROA, 1997, III, Ano 57, pág. 1043 ss.93 Sobre o tema vide ANTÓNIO PEREIRA DE ALMEIDA, ob. cit. pp. 55 ss., JOÃO LABAREDA, Das acções das Sociedades Anónimas, Lisboa, 1988, pp. 173 ss., LUIS BRITO CORREIA,

Page 37: A Cor Do Paras Social

Numa outra perspectiva que não deve ser menosprezada, esta obrigatoriedade

de dar conhecimento seria um meio eficaz de fiscalização da licitude em

concreto dos acordos parassociais.

Sendo óbvio que a nulidade de um acordo parassocial deve ser decretada pelo

Tribunal, e que em caso de fundada interrogações sobre a sua conformidade

com o Direito vigente cabe ao pactuante em juízo inquirir sobre esta, a prática

ensina que o recurso à tutela judicial só se verifica em situações de

incumprimento. Há assim toda a vantagem em submeter os acordos

parassociais a uma fiscalização preventiva, ainda que imprópria, pelo efeito

persuasor que encerra.

Em conclusão e pelo exposto é convicção do autor destas linhas que a

consagração da obrigatoriedade de dar conhecimento da existência de acordos

parassociais será um pequeno passo para a optimização deste instituto.

5. A duração dos acordos parassociais

5.1 Também a despeito da contribuição do PROFESSOR VAZ SERRA94 não se

estipulou qualquer limitação temporal para estes acordos, que na sua proposta

determinava que o seu limite seriam três anos95.

Sobre a duração dos acordos parassociais refira-se a susceptibilidade destes

conterem uma cláusula que delimite a sua duração, seja a termo certo ou

incerto.

Direito Comercial, Sociedades Comerciais, II, 1997, pp. 316 ss., MIGUEL PUPO CORREIA, ob. cit. pp. 509 ss., 94 O ilustre professor sustenta que a estatuição de um limite temporal máximo se “destinava a reprimir abusos do grupo de comando para conservar o controle da sociedade” (Assembleias..., cit. pp. 80).95 Com uma longevidade que varia entre os três e cinco anos, encontramos previsão idêntica nos projectos de reforma legislativa italianos. Também no direito americano, no qual estes acordos gozam de maior popularidade, existe uma limitação de dez anos para os voting trust. Também no direito brasileiro não existe uma limitação temporal, sendo o facto criticado por WILSON CAMPOS BATALHA, MODESTO CARVALHOSA, CELSO BARRETO e RUBENS REQUIÃO, apud. THEOPHILO AZEVEDO SANTOS(ob. cit. pp. 189). A não estatuição de prazo tem sido fundamento de invalidade dos acordos de voto pela jurisprudência francesa, que assinala a dissociação dos direitos conferidos pelas acções e uma renúncia absoluta ao exercício do Direito de Voto. (DOHM apud. MODESTO CARVALHOSA, Acordo de acionistas, São Paulo, 1984, pp. 80-81)

Page 38: A Cor Do Paras Social

Em diferente perspectiva, podemos encontrar causas objectivas e subjectivas

de extinção do acordo: a extinção da sociedade que determina a extinção do

acordo por impossibilidade do seu objecto e a cessação da qualidade de sócio,

por impossibilidade subjectiva do sócio se manter vinculado ao acordo, porque

o estatuto de sócio é indispensável para que o acordo prossiga os seus

objectivos.

O problema surge quando o acordo não prevê uma duração para a sua

estatuição, e não se verifica nenhuma daquelas causas, o que implica uma

tendência para a perpetuação daquela vinculação.

Sem prejuízo de comentários adicionais, adianto a minha reserva a acordos

tendencialmente vitalícios, nomeadamente quando o seu objecto é o direito de

voto.

Inegavelmente que num mundo específico, concorrencial e competitivo como o

empresarial é sobremaneira aplicável o brocardo popular o que hoje é verdade

amanhã é mentira : a consagração legal ad eternum deste tipo de vinculações

parece-me desajustada e atentatória da salutar liberdade de modificar a

opinião.

Sobre a questão Raul Ventura recorre “ às armas clássicas do nosso arsenal

ou aos remédios já clássicos do nosso receituário”96 entendendo que não

devem admitir-se vinculações perpétuas, consistindo a sua solução não em

considerar nulos os contratos com aquelas características mas sim na

aplicação àqueles das regras gerais da resolução do acordo, com ou sem justa

causa.

Com a devida vénia receio que os remédios do nosso receituário possam ser

impotentes para a globalidade dos acordos parassociais; se para os acordos de

voto as regras gerais do direito civil são suficientes, maiores duvidas suscitam

a sua capacidade curativa para os sindicatos de voto; a ratio desta opinião

resulta da certeza e determinabilidade das convenções pontuais sobre o

exercício do voto ( destituir ou nomear os órgãos, aumentos de capital, etc.) e

da necessária e óbvia indeterminabilidade e generalidade dos acordos que

tendem a perpetuar-se, dos acordos que por definição tem a característica a

durabilidade.

96 Para utilizar a feliz expressão do PROFESSOR VASCO LOBO XAVIER, ob. cit. pp. 652.

Page 39: A Cor Do Paras Social

Esta perspectiva vai ser desenvolvida aquando do tratamento dos sindicatos de

voto.

A problemática da durabilidade destes acordos não passou despercebida a

FERNANDO OLAVO, que trouxe à colação o caso paradigmático de conterem

disposições sobre a constituição dos órgãos sociais. É insofismável que a

generalidade dos acordos parassociais distribuem pelos pactuantes os diversos

cargos sociais, obrigando-se os signatários a reciprocamente se elegerem

afrontando assim as disposições imperativas relativas à duração daqueles

mandatos.97

Sobre o tema RAÚL VENTURA preconiza que “é muito duvidoso que uma

limitação legal à duração dos acordos sirva sempre os interesses dos

participantes”98. Com profundo respeito pelo autoridade desta posição, entendo

que a questão deve colocar-se num plano inverso, ou seja, se os interesses

dos participantes se mantiverem após a expiação do prazo legalmente previsto,

nada obsta a que o acordo se renove.

5.2 As convicções expostas obrigam-nos a debruçar sobre os meios que o

sócio dispõe para se exonerar de um acordo parassocial.

Sublinhe-se a acuidade da problemática, traduzida no facto de a exoneração

afectar decisivamente a finalidade dos acordos parassocias, prejudicando

gravemente o escopo prosseguido pelos sócios sindicatos, facto este que

legitima uma cuidada análise.

Desde logo aponte-se a possibilidade de exoneração decorrer de uma cláusula

contratual, esta não suscita inquietações, pelo que não nos delongaremos.

Realmente controverso é a putativa existência de outras formas de

exoneração, nomeadamente, a aplicação analógica aos acordos das regras da

exoneração dos sócios99.

97 FERNANDO OLAVO, ob. cit. pp. 196.98 RAÚL VENTURA, Acordos..., cit. pp. 42.99 O “direito de exoneração é basicamente a faculdade concedida ao sócio de se afastar da sociedade” e resulta da “aplicação do princípio geral que proíbe a vinculação perpétua das partes aos contratos duradouros” (MARIA AUGUSTA FRANÇA, Direito à Exoneração, Novas perspectivas do Direito Comercial, Coimbra, 1988, pp. 207) de molde a tutelar a liberdade de

Page 40: A Cor Do Paras Social

Ultrapassadas algumas dificuldades é actualmente pacífico a consideração do

direito à exoneração como um princípio geral de direito societário, ou seja,

aplicável a todos os tipos de sociedade:100 assim sendo, este é um meio de o

sócio sindicado abandonar a sociedade e consequentemente o sindicato. Mas

o que se sustenta é a admissibilidade de, com base nas mesmas motivações o

sócio se exonerar do acordo parassocial, mantendo aquela qualidade:

esbocemos o seguinte exemplo: um dos accionistas sindicados não cumpre o

acordo parassocial, sem que por esse facto os restantes lhe apliquem as

sanções que contratualmente estavam previstas; será lícito a um sócio

indignado com esta actuação situação abandonar o acordo. Sabendo que no

caso de a situação descrita ter lugar no seio de uma sociedade por quotas,

pelo disposto na alínea b) do n.º 1 art.º 240º CSC, o sócio poderia exonerar-se

urge concluir que a mesma solução se aplicaria quando no seio de um acordo

parassocial.

Por tudo, sustentamos que as disposições legais que permitem a exoneração

dos sócios devem aplicar-se, por analogia101, aos acordos parassociais, que

desta forma beneficiariam, não só dos mecanismos gerais do Direito Civil, mas

também dos específicos do Direito Comercial.

5. Transmissibilidade dos acordos parassociais

5.1 Sustenta-se que a alienação das participações sociais não faz nascer ipso

juris a vinculação por parte do adquirente: e este é o princípio geral que importa

consagrar e realçar: a alienação das acções sujeitas a um acordo parassocial

não vincula o novo adquirente;

iniciativa económica. Assim, a “exoneração é a saída do sócio da sociedade por decisão unilateral dele e mediante o pagamento do valor da sua participação” (LUIS BRITO CORREIA, Direito Comercial, Sociedades Comerciais, II, cit. pp. 453.)100 Neste sentido LUIS BRITO CORREIA, Direito Comercial, Sociedades Comerciais, II, cit. pp. 453 ss.101 Neste sentido LUÍS BRITO CORREIA (Os administradores de sociedades anónimas, Coimbra, 1993, pp. 569 ) que ao tratar da problemática da remuneração dos administradores exemplifica com um contrato entre estes e os accionistas maioritários (logo, um contrato em que intervêm não sócios) considerando que “a este contrato é aplicável o disposto no art.º 17 do CSC”.

Page 41: A Cor Do Paras Social

Assim, se alguém não tem a inteira liberdade de exercer o direito de voto, ou

está sujeita a uma outra qualquer limitação de carácter parassocial usufrui

sempre da possibilidade de se desvincular através de uma venda real ou

fictícia das suas acções, num expediente que tem tanto de fácil como de

eficaz.102

Esta posição é atacável pela evocação do facto de que é usual os acordos

parassociais consubstanciarem regras que consistem em criar mecanismos

que impelem o transmitente a conseguir a anuência do transmissário ao acordo

parassocial, ou que o inibem de alienar as suas participações sociais a

terceiros face ao sindicato; resulta evidente dos acordos conhecidos esta

preocupação.

Mas esse facto não contradiz a regra, que como se disse, se consubstancia na

facilidade de poder existir uma fácil exoneração do acordo através de uma

efectiva ou hipotética alienação, traduzindo-se esta susceptibilidade num

romper das legítimas expectativas das restantes partes no acordo.

Contudo, não restam dúvidas que a alienação de acções vinculadas ao acordo

parassocial não submetem o adquirente aos seus ditames, sendo esta facto

consequência da eficácia meramente obrigacional conferida a este contrato.

5.2 No que incumbe à transmissão mortis causa, defende ANTÓNIO ALMEIDA

PEREIRA103, fazendo apelo ao art.º 2025º no seu n.º 1 do CC, que os acordos

de voto se transmitem uma vez que estamos no âmbito das relações jurídicas

patrimoniais104.

Obviamente que estamos perante um interesse que para os seus

intervenientes deve perdurar no tempo; dúvidas suscita o facto de classificar os

acordos de voto como uma relação de carácter patrimonial, ou pelo menos,

absolutamente patrimonial: se meditarmos sobre a hipótese de o acordo versar

sobre a distribuição dos órgãos sociais, deve reconhecer-se a predominância

de uma componente pessoal que exigiria a sua intransmissibilidade105.

102 Neste sentido BARBOSA DE MAGALHÃES, ob. cit. pp. 25. 103 ANTÓNIO ALMEIDA PEREIRA, Sociedades Comerciais, 1997, pp. 152. No mesmo sentido RAÚL VENTURA, ob. cit. pp. 46.104 Em posição inversa vide THEOPHILO AZEVEDO SANTOS, ob. cit. pp. 185, que qualifica estes acordos como intuito personae.105 Posição similar, ainda que em contexto diferente é expressada por PINTO FURTADO que proclama que a posição contratual decorrente do contrato promessa não é transmissível aos herdeiros por estarmos perante uma posição jurídica que, pela sua natureza, se extingue pela

Page 42: A Cor Do Paras Social

6. Formas de conferir efeito externo aos acordos.

A relevância empresarial dos acordos parassociais, e mais concretamente a

sua vitalidade prática impeliu os empresários a desenvolverem mecanismos

que os possibilitassem (nos ordenamentos e que são proibidos) ou que os

optimizem o seu funcionamento através do alargamento das suas

potencialidades.

Pensamos ser interessante dissecar suscitamente as modalidades mais usuais

que podem revestir este tipo de relações contratuais.

Uma primeira possibilidade consiste na constituição de uma Sociedade

Gestora de Participações Sociais (SGPS)106. Sobre esta susceptibilidade já

se pronunciaram repetidamente os Tribunais franceses e italianos, o que

demonstra a sua aplicabilidade prática; esta modalidade consiste em os

accionistas que se pretendem agrupar formarem este tipo de sociedades com o

intuito de concentrarem a totalidade das acções sindicadas.

Através da criação de uma SGPS atribui-se uma forma jurídica ao acordo

parassocial pela concentração dos votos numa diferente pessoa jurídica, cuja

personalidade garante a unidade externa do voto, em consequência de este

expressar-se através dos representantes da SGPS no sentido adoptado pelos

seus sócios daquela, obstando-se a que os pactuantes actuem de forma

adversa ao acordado, almejando o exercício unitário do direito de voto.

Em defesa da validade da constituição de SGPS manifestou-se ASCARELLI

“proclamando a licitude das sociedades de participação, sob o argumento de

que não se confundem com os sindicatos de voto, de natureza meramente

contratual e, portanto, com eficácia meramente interna: ao contrário as

“holdings” têm, por força da própria personificação e publicidade, eficácia

externa. Emprestando tanto aos sindicatos como às “holdings” o carácter de

contratos plurilaterais, recorda o autor que os sindicatos criam vínculos

morte do seu titular. (apud. MIGUEL PUPO CORREIA, ob. cit. pp. 464).106 Sobre SGPS vide ANTÓNIO BORGES e JOÃO MACEDO, Sociedades Gestoras de Participações Sociais, Aspectos jurídicos, fiscais e contabilísticos, passim.

Page 43: A Cor Do Paras Social

obrigacionais, ao passo que as sociedades de participação criam vínculos

reais”107.

Em Portugal assinale-se a voz concordante de MANUEL CAVALEIRO

FERREIRA108, com a particularidade de ser um poderoso critico dos acordos

parassociais; o ilustre professor aceita que os agrupamentos se constituam em

sociedades, transferindo para estas as suas participações sociais, porque

neste caso não existirá um divórcio entre quem exerce o direito de voto e o

proprietário das participações sociais.

A pedra de Aquiles deste processo relaciona-se com a perda da titularidade de

acções por parte dos intervenientes e, consequentemente, de todos os direitos

conexos, que são transladados para a nova sociedade, aglutinando-se nesta,

entre outros, o direito aos lucros, que se enumera pela importância que

encerra.

Criticamente refira-se ainda a propensão para se gerar uma tributação

exagerada, à qual se deve anadir os custos com a constituição da nova

sociedade.

Tudo o que se disse impele-nos a reconhecer, malgrado os aspectos

negativos, o facto de este ser um mecanismo de conferir eficácia erga omnes a

acordos parassociais não devendo a sua admissibilidade ser contestada no

confronto com legislações que admitem a validade dos acordos parassociais,

sempre que, obviamente, se respeitem os requisitos legais que regulam este

instituto109, que sendo diverso daqueles acordos é um meio susceptível de

alcançar os mesmos objectivos, com a vantagem de conferir uma ampla

segurança110.

Uma outra possibilidade de reforçar a eficácia dos acordos parassociais, ou,

uma diferente fórmula de alcançar a mesma finalidade consiste em colocar as

participações sociais em regime de compropriedade111, beneficiando

107 ASCARELLI apud. MODESTO CARVALHOSA, ob. cit. pp. 17.108 Ob. cit. pp. 272.109 Neste sentido RAÚL VENTURA, ob. cit. pp. 62;110 Mais acuidade merece a problemática em ordenamentos jurídicos que proíbem os acordos parassociais, nomeadamente aquilatar se estamos em presença de uma fraude à lei.111 Sobre o tema vide JOÃO LABAREDA, ob. cit. pp. 69 ss.

Page 44: A Cor Do Paras Social

posteriormente do método de emissão dos votos neste regime que, como é

sabido se realiza através de um representante comum (303.º e 222.º CSC), que

expressará o voto no sentido deliberado pelo conjunto dos sócios sindicados.

Por este meio impede-se que os pactuantes não acatem a decisão do

agrupamento votando como lhes aprouver, garantindo-se, desta forma, a

unidade do voto.

Uma outra modalidade com a faculdade de produzir os mesmos efeitos que os

acordos parassociais é a constituição de um usufruto112 das acções dos sócios

agrupados, beneficiando do regime legal deste instituto que adoptou “uma

solução a que podemos chamar de compromisso, atentas as outras soluções

possíveis”113 uma solução a que LUCAS COELHO114 classifica de ecléctica na

qual o usufrutuário tem o direito de “votar nas Assembleias Gerais, salvo

quando se trate de deliberações que importem alterações de estatutos ou

dissolução da sociedade”115. Este mecanismo permite garantir a unicidade do

exercício do voto, porque ao constituir-se o usufruto na pessoa de um

representante do agrupamento acautela-se a possibilidade de algum dos

signatário não respeitar o acordado.

Mas estas potencialidades não devem fazer o intérprete descurar que o

desmembramento da propriedade sobre a acção gera, desde logo, a

problemática de o direito aos lucros, que cabem ao usufrutuário (alínea b) do

n.º1 art.º 1467.º CC), bem como ficar limitado o objecto de aplicabilidade do

acordo a decisões que não impliquem a alteração dos estatutos; se o objectivo

da constituição é dar maior fiabilidade aos acordos parassociais a constituição

do usufruto tem, entre outros, estes efeitos colaterais nefastos.

Pelo exposto, embora sem colocar em causa a legalidade do exercício,

entendo que, existindo outros mecanismos possíveis com menores riscos,

defende-se a sua utilização prioritária.

112 Sobre o tema vide ANTÓNIO CAEIRO e ÃNGELA COELHO, “Proibição (e não probição como por erro se escreve no título) de cessão de quotas sem consentimento da sociedade e constituição de usufruto sobre a quota”, Revista de Direito e Economia, Ano VIII n.º 1 Jan/Jun 1982, pp. 71 ss., J. PINTO COELHO, Usufruto de acções, Separata da Revista de Legislação e jurisprudência, Ano 90, n.º 3097 a 3117 e Ano 91, n.º 3118 a 3122, Coimbra, 1958, pp. 6 ss. e pp. 9 ss. e JOÃO LABAREDA, ob. cit. pp.110 ss. 113 ANTÓNIO CAEIRO e MARIA ÂNGELA COELHO, ob. cit. pp. 75.114 Ibidem, pp. 72.115 alínea b) do n.º1 art.º 1467.º CC.

Page 45: A Cor Do Paras Social

Uma modalidade complementar é a cessão legitimadora116. Ensina BRITO

CORREIA 117 que os sócios que pretendam unificar os seus votos de modo a

não ficarem sujeitos à deslealdade de um dos pactuantes podem ainda

transmitir as suas participações sociais com uma promessa de retransmissão a

prazo.

Este é um instituto há muito consolidado no direito germânico, no qual se opera

“uma transmissão meramente formal de acções para um terceiro que assim fica

legitimado para participar na assembleia social, exercendo o direito de voto em

nome próprio”118.

Na cessão legitimadora não existe uma transmissão da propriedade das

acções, continuando o cedente a ser o seu proprietário, visto o cessionário não

possuir o animus domini; não pode ainda ser entendida como uma

representação porque o representante actua em nome próprio e por conta

própria.

Este é, no entanto, um meio que encerra a desvantagem de o sócio abdicar

desta qualidade, ficando ainda submetido ao cumprimento por parte do

transmissário da referida promessa.

Sobre esta modalidade pronunciou-se criticamente BARBOSA DE

MAGALHÃES119 que a considera “mais um expediente à margem da lei”

utilizada pelas grandes companhias, sendo “uma manifestação da política

capitalista”.

116 “Haverá aqui subjacente um negócio fiduciário, ou seja, uma forma de negócio indirecto, baseado na confiança (fiducia) entre as partes, pelo qual o mandatário ou adquirente a retro das participações sociais irá executar a vontade dos participantes no sindicato de voto, exercendo o direito de voto nos termos por estes definidos”. (MIGUEL PUPO CORREIA, ob. cit. pp. 466, nota 449). Sobre o tema vide ainda BARBOSA DE MAGALHÃES, ob. cit. pp. 35 ss.117 LUÍS BRITO CORREIA, Direito Comercial ..., III, cit. pp. 168.118 MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 93119 BARBOSA DE MAGALHÃES, ob. cit. pp. 35.

Page 46: A Cor Do Paras Social

III- TIPOLOGIA DOS ACORDOS PARASSOCIAS

1- Acordos de voto 2- Acordos sobre a transmissão

de participações sociais 3- Acordos sobre o

exercício do direito à informação 4- Acordos sobre

a distribuição de lucros 5- Acordos sobre o

funcionamento dos órgãos sociais.

A consagração legislativa dos acordos parassociais pode ( e deve) ser

entendida como uma vitória do pragmatismo sobre a dogmática., ou seja, um

triunfo das necessidades da vida empresarial moderna sobre o puritanismo dos

conceitos académicos. Sem dúvida, os acordos parassociais têm sido “um

destes temas marginais que vivem ou acampam fora da lei, mas que gozam,

ao mesmo tempo, de um grande prestígio e de uma grande atracção entre os

homens de negócios... que indiferentes ou despeitosos face à doutrina, passam

a vida tecendo pactos de sindicação de acções”120

O passar do tempo consolidou as palavras de ASCARELLI, quando afirmou

estar feita a prova de que a vida não pode dispensar os acordos

parassociais.121

Neste prisma duas posições de princípio deveriam nortear o jurista: ou acatar o

fenómeno como irreversível e dogmatizar sobre ele, ou servir de contrapeso,

de travão á descaracterização da pureza conceptual.

Parece insofismável que a relação do jurista com estes acordos é feita a

reboque das evidências; o jurista é confrontado com uma realidade da vida

económica, que foge aos quadros legais existentes, vendo-se forçado a

procurar encontrar-lhe os contornos legais, a estabelecer-lhe juridicidade; a

evidência da afirmação anterior impele-nos a caminhar nesse sentido, sendo o

presente trabalho uma mitigada tentativa de compreender a aplicabilidade

prática deste instituto.

120 JOAQUIM GARRIGUES apud. MÁRIO LEITE SANTOS, ob. cit. pp. 11.121 Apud. PINTO FURTADO, Curso de Direito..., cit. pp. 100 e BARBOSA DE MAGALHÃES, ob. cit. pp. 32.

Page 47: A Cor Do Paras Social

A construção legislativa adoptada para conferir tutela jurídica a estas práticas

contratuais consistiu em consagrar a admissibilidade dos acordos parassociais,

detendo-se depois sobre os seus limites através da estatuição de um conjunto

de proibições que tem como valor negativo a nulidade dos acordos.

Assim, para em concreto aquilatar se estamos perante um acordo parassocial

validamente constituído deve-se inquirir sobre a putativa violação de preceitos

imperativos proibitivos.

Antes desta análise parece, no entanto, oportuno, de forma esquemática

catalogar alguns géneros de acordos parassociais, tarefa árduo porque “as

matérias abrangidas pelos contratos parassociais podem ser as mais diversas.

Tudo aquilo que respeite ou tenha alguma conexão com o contrato de

sociedade, com direitos, obrigações e poderes que dele derivem para os

sócios, ou com a própria actividade da sociedade pode ser objecto de acordo

parassocial.”122

Assim e a despeito da imensa heterogeneidade123 entendo ser de arriscar um

esboço de classificação, numa tentativa de agrupar em categorias, os mais

frequentes acordos parassociais; alerta-se que, por tudo o que se disse, esta

não é uma classificação exaustiva:

1. acordos que versam sobre o voto124

1.1 É sobre a validade das convenções que versam sobre o exercício do direito

de voto que as maiores dificuldades e controvérsias se levantam, ou seja, é em

relação à licitude das promessas de votar num sentido pré-determinado que as

maiores críticas se formulam à licitude destas vinculações.

Nos acordos que se debruçam sobre o exercício do direito de voto o que está,

fundamentalmente, em causa é uma deslocação do espaço natural do debate e

da votação - a Assembleia Geral - para um outro local, extrínseco à sociedade

– a assembleia de sócios sindicados -; pelo que fica escrito, importa

122 MÁRIO LEITE SANTOS, ob. cit. pp. 14.123 Neste sentido FERNANDO GALVÃO TELES, ob. cit. pp. 76.124 Para considerações de Direito Comparado vide MÁRIO RAPOSO, ob. cit. pp.12 ss., LUCAS COELHO, ob. cit. pp. 87 ss. e MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 45 ss.

Page 48: A Cor Do Paras Social

compreender que a determinação do voto deixa de fazer-se no seu espaço por

excelência para fazer-se em outro qualquer local.

A conformidade destas condutas com o Direito Societário sugere as maiores

interrogações e sempre suscitou as mais delicadas querelas, nomeadamente a

licitude dos sócios se obrigarem a exercer o seu direito de voto num dado

sentido; doutrina e jurisprudência demasiadas vezes demonstraram

constrangimento em aceitar estas vinculações como vinculativas, confundindo-

se reincidentemente a problemática dos acordos de voto com a dos acordos

parassociais, dos quais aqueles são apenas uma parte, ainda que crucial.

Não estranha, portanto, que seja expressa e inequívoca a letra da lei ao admitir

a convenção sobre o voto no n.º 2 do artigo 17º:

“Os acordos referidos no número anterior (acordos parassociais) podem

respeitar ao exercício do direito de voto...”

Repete-se que a tutela do voto é de primordial importância para a temática dos

acordos parassociais, sendo a sua regulamentação o principal objectivo

prosseguido por estes acordos. Este facto é tanto mais compreensível quando

se compreende que o voto é o meio adequado para os sócios têm capacidade

para intervir, influenciando o comportamento da sociedade.

Ensina MARIA GRAÇA TRIGO, com o intuito de justificar a especial atenção

doutrinária, que estes “correspondem a uma das mais frequentes vinculações

de carácter parassocial e, por outro lado, porque a seu respeito se têm

suscitado as maiores dúvidas e divergências tanto na doutrina como na

jurisprudência”125.

1.2 Precedentemente ao abordar da problemática dos acordos de voto refuto

de indispensável tecer sumárias considerações acerca da controversa natureza

do direito de voto.

125 MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 17.

Page 49: A Cor Do Paras Social

1.2.1 É hoje maioritariamente entendido que o voto é uma declaração de

vontade126 e não uma mera opinião. Mais complexo é determinar se o voto é

um direito subjectivo, um poder ou um dever jurídico.

A resposta a esta questão é prejudicada pela concepção de sociedade, ou

mais concretamente com o conceito de interesse social.

Os apologistas das teorias institucionalistas127 tendem em considerar o voto

como um poder jurídico, como um poder dever que visa alcançar um interesse

comum da empresa em si, da sociedade enquanto instituição.

A esta posição contrapõe-se os argumentos dos percursores das teorias

contratualistas128 para quem o voto é entendido como um meio de prosseguir

um interesse comum a todos os sócios, “entendido como um interesse superior

e distinto do interesse de cada sócio”129.

A despeito da querela referida130, a doutrina dominante tende a entender o voto

como um direito subjectivo, um direito conferido ao sócio para a prossecução

dos seus próprios interesses individuais. Como direito subjectivo é-lhe lícito

exerce-lo no sentido que mais lhe aprouver, ou abster-se de o exercer sem que

desse facto resulte qualquer consequência nefasta.

Esboçadas sumariamente as diversas teorias sobre a natureza do voto, importa

adoptar posição acerca da sua natureza; entende-se que a sua qualificação

126 Neste sentido LUÍS BRITO CORREIA, Direito Comercial, Deliberações dos sócios, Vol. III, cit., pp. 133, EDUARDO LUCAS COELHO, ob. cit. pp. 25, VASCO LOBO XAVIER, Anulação de deliberação social e deliberações conexas, Coimbra, 1975, pp. 583 ss. MIGUEL PUPO CORREIA, ob. cit. pp. 559, RODRIGO SANTIAGO, ob. cit. pp. 12, PINTO FURTADO, Deliberações..., cit. pp. 98 ss.127 As teorias institucionalistas tendem a centrar a ideia de interesse social na própria sociedade, como empresa ou instituição, que se abstrairia dos interesses dos próprios sócios. “De facto, segundo uma ideia comum a estas doutrinas, a propriedade privada e a livre concorrência perderam o carácter de instrumentos privilegiados do desenvolvimento económico e do equilíbrio do mercado, e as sociedades anónimas, “em lugar de meras formas privatísticas de exercício colectivo de actividades económicas”, são consideradas “instituições sociais” em cujo destino se mostram interessados, tantos os accionistas e dirigentes, quanto os prestadores de serviços os credores e os próprios consumidores, constituindo, no seio da empresa, uma verdadeira unidade sociológica” (EDUARDO LUCAS COELHO, ob. cit. pp. 27, nota 21 – sublinhado nosso) 128 Esta teoria sustenta a existência de um direito comum aos sócios, mas que não se confunde com os interesses particulares de cada um dos sócios; estaríamos, assim, perante “um interesse abstracto e superior aos interesses de cada sócio “uti socius”.” (LUIS BRITO CORREIA, Direito Comercial..., III, cit. pp. 138)129 LUIS BRITO CORREIA, Direito Comercial..., III, cit. pp. 138.130 Poderíamos ter focado ainda outras teorias sobre a natureza do voto, como o entendimento de que este como direitos de colaboração, direitos de formação ou direitos de organização: limitamos a enunciar as mais representativas de modo a obstar a um afastamento do tema que nos propomos a dissecar.

Page 50: A Cor Do Paras Social

não deve fazer-se a partir do abstracto, mas com base na acepção que lhe é

conferida num determinado ordenamento jurídico. Face ao direito societário

português “o voto é simultaneamente um meio de concretização do interesse

social, definido apenas em linhas gerais dos contratos, e de defesa dos

interesses de cada sócio, no quadro do interesse comum que todos se

vincularam a prosseguir, quando entraram para a sociedade”131, “podendo, sem

grave distorção desta ideia, qualificar-se como direito subjectivo”132.

1.1.2 O voto é um dos direitos fundamentais dos sócios perante a sociedade,

corresponde a uma das principais atribuições daqueles que tem o estatuto de

sócio e equipara-se ao direito aos lucros, o direito de participar nos órgãos

sociais ou ainda ao direito à quota de liquidação.

O direito de voto pode qualificar-se, conforme frisámos, como um direito

corporativo geral, inderrogável e irrenunciável.

1.2 No que concerne à estrutura nas vinculações de voto importa identificar a

sua base contratual, uma vez que, resultam da conjugação de vontades de

diversos pactuantes, tendo como objecto o exercício concertado do sentido de

voto. Assim, a obrigação assumida pelas partes nestes acordos consiste em

votar ou absterem-se de votar, em sentido determinado.

Estamos assim perante uma estrutura que é em tudo análoga à do contrato

promessa: assume-se a obrigação de futuramente adoptar determinada

conduta, sendo neste caso, não a realização de um contrato futuro, mas a de

exercer o direito do voto no sentido a que se vinculou, a emitir uma declaração

de vontade num sentido predeterminado.

Sobre os acordos parassociais que se debruçam sobre o direito de voto é curial

elaborarem-se algumas distinções, as quais consideramos de extrema

importância, sendo muito mais que uma mera questão terminológica.; assim,

devemos discernir entre os:

131 LUIS BRITO CORREIA, Direito Comercial ..., II, cit. pp. 139.132 EDUARDO LUCAS COELHO, ob. cit. pp. 31

Page 51: A Cor Do Paras Social

- acordos de voto – são acordos para predeterminarem o sentido de

voto. Estes acordos são ocasionais e tem um objectivo determinado,

uma dada deliberação em concreto para a qual os accionistas reúnem e

deliberam o sentido do seu voto;

- sindicatos de voto – ou mais correctamente, “agrupamento de sócios

para o exercício do direito de voto133” distinguem-se do acordos pelo

recurso a um critério temporal, porquanto estes surgem para perdurar

durante um dado período com a finalidade de alcançar uma actuação

concertada no seio da sociedade, que não se limite a esporádicas

acções conjuntas; estes acordos surgem “à ilharga das sociedades por

acções... e procuram substituir a sua actuação livre e dispersa, por uma

actuação colectiva e organizada tendo em vista vários fins”134

Na óptica que analiso esta temática este distinção não é estéril135. Deixemos

para momento posterior a explicação desta posição.

Relacionado com a finalidade que norteia esta vinculação, o elemento

psicológico que impele os sócios a agruparem-se, encontramos, desde logo, o

receio de isoladamente serem impotentes para alcançar o objectivo que

anseiam, procurando pelo colectivo atalhar um objectivo que isoladamente

serem incapazes. Nesta, ou seja, pelo apelo à finalidade são sobretudo dois os

acordos pensáveis:

- sindicato de defesa - Estes acordos também denominados de

acordos de minoria ou resistência agrupam pequenos accionistas que

procuram por este meio equilibrar as forças no seio da sociedade

através da “organização da minoria”136 . Sobretudo estes procuram

contrabalançar o poder dos sócios majoritários, através da concentração

dos seus votos, formando assim uma minoria activa e actuante.

133 RAÚL VENTURA, ob. cit. pp. 31134 MANUEL CAVALEIRO FERREIRA, ob. cit. pp. 272.135 Também SANTONI ao dissertar sobre o tema observa a problemática a propósito dos sindicatos de voto.136 MANUEL ANTÓNIO PITA, “A protecção das minorias”, Novas perspectivas do Direito Comercial, Coimbra, 1988, pp. 366

Page 52: A Cor Do Paras Social

O objecto mais comum deste tipo de sindicato é a de reunir os votos

necessários para a realização de uma assembleia geral137, conseguir

eleger um membro da administração, exercer os direitos de informação,

bem como, ter uma participação mais determinante na formação da

vontade da societária.

- sindicato de comando - No sindicato de comando reúnem-se os

sócios que pretendem assumir ou manter o governo da sociedade, o

poder de dirigir a sociedade. Corolário da dispersão do capital social por

uma enormidade de accionistas, é o facto de se exigirem menores

quantidades de acções para dirigir a sociedade, porque aumentam o

número de accionistas passivos cuja única finalidade é beneficiar dos

dividendos ou das mais valias adjacentes às acções, caracterizando-se

a sua actuação social por um enorme absentismo e desinteresse pela

gestão social tendo o seu objectivo prioritário uma dimensão extra-social

que é a especulação financeira.

O sindicato de comando é um meio de potenciar o controlo da sociedade

pela reunião de um conjunto de accionistas com capacidade para

determinar o seu percurso.

Esta é uma decorrência lógica das acções se encontrarem disseminadas

por um heterogéneo grupo de accionistas, traduzindo-se na

susceptibilidade de um restrito grupo deter o controlo da sociedade,

desde que construam mecanismos que possibilitem manterem-se

unidos, actuando concertadamente.

O sindicato de maioria ou comando é uma das diversas possibilidades de

concentração de poder em sede de direito societário; embora o tema seja

paralelo ao que se disseca não podemos deixar de enumerar outras

modalidades de conseguir assumir o controle de uma sociedade, sem dispor da

maioria do seu capital. Para esta narração recorremos à sapiência de CALVÃO

DA SILVA138 que enumeram as seguintes modalidades:

137 O que, no caso das sociedades anónimas é de 5% dos accionistas, conforme n.º 2 do art.º 375º138 JOÃO CALVÃO DA SILVA, “Pacto parassocial, defesa Anti-OPA e OPA concorrente”, Estudos de Direito Comercial (Pareceres), Coimbra, 1996, pp. 239-240.

Page 53: A Cor Do Paras Social

- a emissão de acções preferenciais sem direito de voto;

- introduzir limitações estatutárias ao direito de voto;

- a sociedade adquirir acções próprias;

- a estabilização dos órgãos societários pelo reforço da maioria

necessária para os eleger ou destituir;

- o reforço do quorum;

1.3 Retomando aqui a distinção supra realizada entre os acordos e os

sindicatos de voto que penso merecerem tratamento em separado, entendo ser

oportuno tecer, neste momento, algumas considerações, ainda que sumárias.

A distinção das figuras faz-se fazendo apelo a um critério temporal sendo os

acordos de voto aqueles que “se celebram tendo em vista a participação numa

ou mais votações determinadas” e os sindicatos “...que se destinam a vigorar

por um período de tempo prolongado ... isto é, os acordos celebrados entre

sócios ou accionistas de uma sociedade pelos quais estes se comprometem

reciprocamente a exercer concertadamente o direito de voto...”139

A propensão para perdurar no tempo ou a esporadicidade das convenções

sobre o voto tem influência decisiva na conformação do contrato.

Compreende-se facilmente que se num acordo pontual a deliberação que o

justifica e o sentido de voto fica desde logo estabelecido, sendo que a própria

união dos sócios deve fazer-se com base na afinidade de objectivos, no facto

de existir uma finalidade comum que os impele a unificar-se; nestes são mais

ténues as apreensões sobre a liberdade de determinação do sentido do voto,

pelo facto de, em princípio, a homogeneidade de posições determinar a união

dos sócios.

Maior controvérsia oferecem os sindicatos de voto nos quais os pactuantes se

obrigam para o futuro, para um conjunto mais ou menos amplo de obrigações,

sendo que, pela própria intemporalidade destes acordos, se exige que o

sentido do voto seja diferido no tempo. Com efeito, os signatários agrupam-se

139 MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 23

Page 54: A Cor Do Paras Social

para o futuro e para uma heterogeneidade de circunstâncias, não sendo, pela

natureza do acordo, possível estabelecer previamente as suas posições: os

signatárias vinculam-se entre si a conciliarem o exercício do direito de voto sem

conhecerem em concreto as deliberações em que o mesmo será exercido e

muito menos o sentido em que o mesmo se exercerá.

A determinação do sentido do voto, a orientação do voto, far-se-à, assim, num

momento posterior, através da forma prevista no acordo. A forma como se

determinará o voto do sindicato apresenta importância capital, merecendo

cuidadosa análise.

Desde logo existe a possibilidade de a decisão do sindicato resultar da vontade

unânime dos seus membros, que assumiriam a obrigação de pugnar pela

unicidade do exercício do direito de voto; a decisão do sindicato pode ainda

resultar da vontade maioritária dos sócios agrupados ou ainda, compelir a um

terceiro a determinação do sentido de voto.

i - pelo voto unânime dos pactuantes;

Quando o voto é determinado pela primeira forma apresentada não se revelam

grandes problemas; a estrutura deste acordo consiste em os sócios pactuantes

se reunirem em momento anterior à Assembleia Geral com o intuito de

elaborarem uma estratégia comum de modo a actuarem de forma concertada,

possibilitando-lhes uma maior e melhor tutela dos seus interesses.

No seio do sindicato estabelece-se um diálogo que preconiza uma solução

consensual entre os seus intervenientes, implicando a decisão final o voto

unânime dos sócios sindicados no sentido uniformemente delineado; mas,

obviamente, esta coerência de posições, sempre desejável, não é fácil de

almejar, podendo suceder, e ocorrendo as mais das vezes a existência de uma

ou mais vozes desalinhadas. A solução seria a de, frustrado o consenso,

restituir a liberdade a todos os intervenientes no sindicato de determinarem de

per si a direcção do seu voto.

Page 55: A Cor Do Paras Social

A forma que de examina oferece amplas garantias aos seus aderentes das

quais se sublinha a impossibilidade de um qualquer sócio exercer o seu direito

de voto desconformemente à sua vontade, sem que esse facto seja cominado

por uma qualquer indemnização que pelo efeito dissuador que esta acarreta,

induz o sócio a agir de acordo com as instruções do sindicato.

Oferece ainda a especial vantagem de permitir aos sócios aderentes um “palco

privilegiado” para debater as temáticas sociais, potencialmente mais

esclarecedora que as assembleias, possibilitando uma mais racional

deliberação.

ii - pelo seu voto maioritário;

Se o voto resulta da vontade maioritária dos acordantes, alguns problemas

podem suscitar-se: desde logo, alguns dos sócios (os sócios vencidos) vão

exercer o seu Direito de voto de modo desconforme à sua convicção; a sua

conduta na Assembleia Geral vai ser direccionada em sentido oposto à sua

consciência.

É esta situação aceitável? Merece tutela jurídica o voto consciente ou mais

concretamente, merece perseguição jurídica o sócio que exerce o seu direito

de voto de acordo com a sua íntima convicção?

Os entusiastas dos acordos parassociais sustentam a afirmação fácil de que

este se obrigou ao abrigo da sua autonomia contratual, gerando legítimas

expectativas nos restantes contraentes de que os signatários do acordo

concertariam o seu voto. Acresce ainda que se estivermos perante uma

intolerável violação da sua consciência reserva-se sempre a possibilidade de

exercer o seu direito no sentido que reputa de mais ajustado, submetendo-se

às consequências do inadimplemento do acordo parassocial.

Ainda criticamente sustenta-se que a deliberação social deste modo alcançada

não vai espelhar, ou pode não espelhar, aquele que é o desejo maioritário dos

sócios, porque alguns deles votam em determinado sentido, não por convicção,

mas por vinculação?

É insipiente o argumento de que a deliberação social vai ser o reflexo da

votação expressa na Assembleia Geral; esse facto, obviamente verdadeiro,

Page 56: A Cor Do Paras Social

não deve fazer esquecer que os votos declarados podem não corresponder ao

sentir dos sócios, podem não traduzir a vontade dos accionistas: supondo que

uma sociedade tem cinco accionistas com idêntico peso social e que três

destes celebraram entre si um sindicato de voto é mais que provável, vigorando

no sindicato o princípio maioritário, que uma deliberação seja aprovada ou

recusada por 60% (correspondente ao sindicato, ainda que um destes tenha

posição distinta) contra 40% (restantes sócios) quando não traduz o verdadeiro

sentimento do colectivo dos sócios.140

Por fim urge questionar qual a razão de ser da realização de uma Assembleia

Geral para a qual as vontades estão previamente determinadas? Se em sede

do sindicato de voto os sócios definem o sentido do voto a expressar na

assembleia esta “funcionaria como mera chancela do que estes

determinassem”141, sendo despicienda o debate e os esclarecimentos às

propostas apresentadas.

Vale o argumentos dos defensores da validade destes acordos, já recorrente,

quando proclamam a possibilidade de, com base na inoponibilidade do acordo

perante a sociedade, o sócio alterar o sentido do seu voto, tendo ainda assim

aquela Assembleia o condão de elucidar os sócios sobre os méritos das

propostas em discussão.

Mas, a exactidão da afirmação é impotente para desmentir o facto de o

pactuante desalinhado incorrer em responsabilidade civil por inadimplemento

contratual.

Pelo exposto torna-se pertinaz a interrogação acerca de se proibir a venda do

voto em troca de uma vantagem e tutelar-se que o voto se exprima num

sentido inverso à convicção do sócio, que apenas o faz temendo uma

indemnização, ou seja, por imperativos económicos relacionados com o temor

a uma desvantagem patrimonial?

140 Partindo de números reais vide ADELINO PALMA CARLOS, ob. cit. pp. 245 ss. Considerações de teor idêntico são efectuadas por FERNANDO OLAVO, ob. cit. pp. 195-196.141 ADELINO PALMA CARLOS, ob. cit. pp. 249.

Page 57: A Cor Do Paras Social

Parece-nos insofismável que nos casos expostos existe uma identidade de

motivações, ou seja, a determinação do sentido de voto desenvolve-se por

apelo a razões económicas alheias à declaração de ciência que

tradicionalmente determinaria o voto142.

iii - ou através de instruções de um pactuante ou de um terceiro 143 .

Falta analisar a susceptibilidade do voto ser determinado pelas instruções de

um sócio ou de um terceiro.

Comece por afirmar-se que o legislador do CSC expressamente admite a

possibilidade de os sócios se vincularem licitamente de acordo com as

instruções de não sócios: assim, ao proibir o voto reiterado segundo as

instruções da sociedade ou dos seus órgãos, admite-se a vinculação ocasional

de exercer o direito de voto no sentido os órgãos sociais determinem.144

Maior complexidade reveste a possibilidade de, por acordo parassocial, os

sócios se obrigarem a votar de acordo com as instruções de um terceiro face à

sociedade, como será o exemplo de conferir ao mandatário comum, não sendo

este um dos sócios sindicados, a incumbência de determinar o sentido de voto.

Será a conduta legítima? Não estaremos perante um intolerável divórcio do

sócio da sua função, “na medida em que manifesta um total desinteresse do

sócio em relação ao destino societário”.145

Ao referir-se ao contrato de gestão de empresas ENGRÁCIA ANTUNES

testemunha, num sentido que merece o nosso mais entusiasta aplauso, “que o

conselho de administração de uma sociedade anónima não pode alienar o seu

poder de direcção em favor de terceiros estranhos à colectividade social, nem

142 No entanto, urge reconhecer a diferente génese das vinculações, porquanto a venda ou cessão do voto evidencia um profundo desinteresse pelo percurso societário, enquanto que a vinculação parassocial patenteia uma preocupação com o destino da sociedade.143 Neste caso os accionistas colocam a possibilidade de determinação do voto nas “mãos” de um “terceiro (sindico) por eles constituído como mandatário para o exercício do direito de voto, ou ao qual transmitem fiduciariamente as suas participações para fins do acordo”. (MIGUEL PUPO CORREIA, ob. cit. pp. 466)144 Neste sentido, LUCAS COELHO, ob. cit. pp. 86, MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 165, MÁRIO LEITE SANTOS, ob. cit. pp. 228-229 e RAÚL VENTURA, ob. cit. pp. 74.145 MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 168. Refira-se que esta citação foi retirada do contexto, sendo utilizada pela Autora, na esteia de LUBBERT para justificar a nulidade da venda do voto.

Page 58: A Cor Do Paras Social

que a vida social possa deixar de ser conduzida em função dos interesses

próprios de tal colectividade e por conta exclusiva dos respectivos membros”146.

Pergunta-se se os mesmos motivos argumentados pelo Autor para inquinar a

validade daqueles contratos, não se devem utilizar para arguir a invalidade das

convenções sobre o voto cuja determinação do sentido caiba a um terceiro face

à sociedade, porque também neste caso a vida da sociedade passa a ser

determinada por pessoas que lhe são estranhas.

Neste âmbito, problema que também gera grandes dificuldades interpretativas

relaciona-se com a duvidosa legalidade de, num caso de cedência de

participações sociais que seja inoponível face á sociedade, por acordo

parassocial, se estabelecer que o cedente vai exercer o seu direito de voto de

acordo com as instruções do cessionário; recorde-se que o contrato de cessão

é um contrato válido, com particularidade de não ser invocável nas relações

com a sociedade; na perspectiva da sociedade o sócio é o cedente, sendo-lhe

lícito exercer todas as atribuições decorrentes do seu estatuto de sócio. Mas, e

observando a problemática da óptica do cessionário, é no seu património que

se repercutem, ainda que mediatamente, as vicissitudes sociais, justificando-se

a sua legitimidade para desempenhar uma actuação activa na formação da

vontade social147.

Perfilho a opinião de que a licitude da determinação por terceiro do sentido do

voto exige uma resposta diferenciada, com base no vínculo existente entre os

sócios sindicados e o terceiro, ou entre estes e a própria sociedade.

Sem dúvida que é inadmissível a reiterada obrigação dos exercício do direito

de voto de acordo com as instruções de terceiros face à sociedade, retirando

aos accionistas a possibilidade de influenciar a vontade social: refuta-se por

extemporânea uma interpretação a contrario sensu da impossibilidade de votar

sempre de acordo com as instruções da sociedade ou dos seus órgãos com o

sentido de permitir a obrigação de votar de acordo com as instruções de

146 JOSÉ ENGRÁCIA ANTUNES, ob. cit. pp. 414.147 Problema distinto consiste em o cedente pretender manter influência na sociedade, vinculando-se o cessionário a exercer o seu direito de voto de acordo com as instruções daquele; no caso em apreço entendo estarmos perante uma verdadeira cessão do direito de voto, não merecendo esta modalidade qualquer tratamento diferenciado.

Page 59: A Cor Do Paras Social

terceiros148, devendo antes entender-se que se se proíbe o voto de acordo com

a orientação daqueles (o menos) com toda a certeza se proíbe conduta igual

com a agravante da indicação do sentido de voto advir de estranhos à

sociedade (o mais).

Situação distinta será a existência de um negócio jurídico que conexione os

sócios sindicados com terceiros como, v. g., será o caso de num empréstimo à

sociedade o mutuante impor como condição a não distribuição de

dividendos149, a obrigação perante terceiro de concretizar a pedido deste um

aumento de capital e a permitir que este adquirisse a nova quota150 ou ainda,

numa cessão de quotas votar favoravelmente o consentimento.

Nos exemplos expostos mais do que circunstâncias legitimadoras, a obrigação

de votar num sentido determinado pelo terceiro é um corolário do princípio da

boa-fé no cumprimento dos contratos exemplificados, ou mais do que isso,

correspondem a uma cláusula acessória daqueles contratos, cujo cumprimento

merece tutela jurídica.

Por tudo, a resposta à licitude de determinação do sentido de voto por terceiro

não pode ser sumariamente afastada; insurgimo-nos contra a validade de

acordos parassociais tendentes a afastar o sócio da participação da vontade

social, defendendo-se a nulidade destes acordos. mas posição pode ( e deve)

ser excepcionada quando os mesmos resultarem da sequência de um negócio

jurídico lícito, em relação ao qual a convenção de voto tenha caracter

subsidiário ou se para a prossecução do bem comum os sócios se obriguem a

exercer o seu direito de voto de molde a permitir a exequibilidade daqueles

negócios. Em resumo postula-se uma análise casuística ao teor destes acordos

como meio de aquilatar da sua legalidade.

1.4 A forma como o voto é emitido na Assembleia Geral também merece a

atenção do intérprete.

148 No mesmo sentido, RAÚL VENTURA, Acordos..., cit. pp. 88.149 Ibidem, pp. 89.150 ZUTT apud. MARIA GRAÇA TRIGO ob. cit. pp. 41.

Page 60: A Cor Do Paras Social

A hipótese mais usual consiste em o próprio sócio votar pessoalmente na

Assembleia Geral. Neste caso este mantém a plena autonomia de determinar

livremente a sua vontade, sendo-lhe permitido actuar no sentido predefinido

pelo sindicato, ou não seguindo as suas directrizes e vinculando-se de modo

distinto, suportando depois os ónus do incumprimento.

Podemos concluir ser para esta vertente que o art.º 17.º CSC está pensado,

sendo este o sentido da estatuição da não oponibilidade do acordo às

deliberações sociais: quando o legislador toma como possível o incumprimento

por parte do signatário do acordo parassocial, remete-nos para as situações

em que este detém a possibilidade, de facto e de direito, de actuar de acordo

com a sua íntima consciência e de modo distinto do pactuado.

O voto pessoal do accionista vinculado ao acordo agrada à mais puritana

doutrina porque com mais facilidade permite combinar a validade do acordo

com o “sagrado” valor da Assembleia Geral que não perderia o seu vigor e

importância por ser susceptível de contribuir pela exposição e discussão para

determinar o sentido do voto por parte do accionista. As criticas relativas à

emissão pessoal do voto são nos apresentadas pelos entusiastas dos acordos

parassociais, porque este meio põe a descoberto as fragilidades do instituto,

permissivo a actuações desconformes e violadores do acordo.

Para obviar a possibilidade de incumprimento do acordo , a desconfiança por

parte dos diversos accionistas agrupados determina que o voto será emitido

através de mandatário comum, “como forma de garantir a emissão dos votos

em sentido unitário”151.

Este é o meio que maiores e complexas questões suscita porque consiste em

os signatários de um acordo parassocial confiarem as suas acções a um

mandatário comum que fica com a posse fiduciária152 daquelas e

151 MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 160. É controvertida a qualificação deste, nomeadamente se é um mero mandatário dos sócios sindicados, um mandatário sem representação, ou ainda se transcende estas figuras, especialmente quando lhe compete decidir o sentido do voto. Refira-se que nada obsta a que os sócios determinem que o voto seja emitido por mandatário comum; mais complexa é a possibilidade de o mandato ter carácter irrevogável; não falta quem, como RIPERT considere nula a estatuição de um mandato irrevogável, porquanto consubstancia uma verdadeira limitação à liberdade de votar. (apud. FERNANDO OLAVO, ob. cit. pp. 191, que sustenta a mesma posição).152 “Os negócios fiduciários reconduzem-se a uma transmissão de bens ou direitos, realmente querida pelas partes para valer em face de terceiros e até entre elas, mas obrigando-se o adquirente a só exercitar o seu direito em vista de uma finalidade. (MANUEL DE ANDRADE, apud PEDRO PAIS DE VASCONCELOS, ob. cit. pp. 254-255).

Page 61: A Cor Do Paras Social

posteriormente expressar, em Assembleia Geral, o voto de acordo com a

deliberação dos pactuantes.

Os méritos desta possibilidade são notórios: impossibilitam o incumprimento do

acordado, no que ao sócios concerne; assim, como o sócio não mantém as

acções em seu poder não lhe é permitido não votar ao votar

desconformemente ao assumido pelos sócios sindicados, almejando-se, com

este procedimento, o voto uniforme daqueles. Mas esta potencialidade não

deve descurar o intérprete na análise de aspectos controversos.

Como referimos, para incrementar as potencialidades do método é usual

depositarem-se as acções junto do sindicato ou do mandatário comum,

impossibilitando a participação dos sócios na Assembleia, o que torna

impossível a violação do acordo: estamos assim perante a patológica situação

de o sócio ficar impossibilitado de participar na Assembleia Geral.

A estatuição deste mandatário comum com a finalidade de obter a unicidade do

sentido de voto, entronca com a problemática da representação dos accionistas

nas Assembleias Gerais; o direito de representação é actualmente

insusceptível de derrogação em sede de sociedades anónimas e considera-se

como uma emanação do próprio direito de votar, devendo esta realizar-se

através de procuração, dirigida ao presidente da mesa da Assembleia Geral,

devidamente assinada pelo accionista153.

Incrementa a controvérsia a possibilidade de o mandato ter carácter

irrevogável, existindo quem defenda a nulidade do acordo por estarmos

perante uma verdadeira limitação à liberdade de votar de acordo com a íntima

vontade do accionista, que por este meio se viria despojado da possibilidade de

exercer o direito de voto inerente às participações sociais de que é único e

legítimo proprietário.154

A nossa posição ficou indiciada quando analisámos as formas de conferir efeito

externo aos acordos parassociais; ao pugnar pela legalidade daquelas não é

sustentável inquinar esta, que como as dissecadas encerra a possibilidade de

garantir a unicidade do exercício do voto.

153 Sobre o tema vide EDUARDO VERA-CRUZ PINTO, ob. cit., RODRIGO SANTIAGO, ob. cit. pp. 30 ss. EDUARDO LUCAS COELHO, ob. cit. pp. 127 ss.154 Neste sentido RIPERT conforme sublinha FERNANDO OLAVO, ob. cit. pp. 191.

Page 62: A Cor Do Paras Social

2. acordos parassociais sobre a transmissão de quotas ou acções

São também extremamente frequentes as convenções extra-estatutárias que

determinam restrições às transmissões de participações sociais, ou seja a

regulamentação do meio de transmitir as acções, normalmente com um intuito

restritivo ou limitativo, ordinariamente designadas de convenções de bloqueio.

A regra geral em sede de direito societário é a da “livre transmissibilidade das

acções, dada a natureza da sociedade anónima e das próprias acções. Esta

transmissibilidade das acções é, além do mais, imprescindível à satisfação da

função social típica que a sociedade anónima e as acções visam realizar”155,

derivando este facto do carácter intuitus pecuniae que define este tipo de

sociedades.

A existência de acordos entre os accionistas relativos ao seu estatuto mas fora

do ente societário determina o recíproco interesse daqueles continuarem

ligados à sociedade de molde a prosseguirem a finalidade do contrato

estabelecido.

Com efeito “todos os sindicatos de accionistas supõem como pedra angular da

sua constituição uma maior ou menor imobilização ou bloqueio das acções dos

aderentes ao sindicato. É essa a condição prévia para a estruturação formal do

agrupamento, como órgão destinado à prossecução de determinado fim. Se os

accionistas pudessem dispor livremente das acções, o sindicato não teria

verdadeiramente existência; desfazer-se-ia ao sabor da vontade de cada

accionistas, sem que a vontade superior do sindicato pudesse manter a sua

continuidade, pelo controle dos sucessivos titulares das acções que se

pretendam bloquear”156

Do que se disse não pode, no entanto, depreender-se que a finalidade única

das convenções de bloqueio seja a de garantir a eficácia dos acordos

parassociais, actuando como uma “muleta” ou cláusula acessória para a sua

155 MARIA VAZ TOMÈ, “Algumas notas sobre as restrições contratuais à livre transmissão de acções, Direito e Justiça, 1989/1990, pp. 212.156 MANUEL CAVALEIRO FERREIRA, ob. cit. pp. 272. A este respeito RAÚL VENTURA fala de em providências que devem ser tomadas como um complemento natural dos acordos de voto propriamente ditos. (ob. cit. pp. 99). Ainda neste sentido PEDROL sustenta que “o sindicato de voto necessita do sindicato de bloqueio para obter uma real efectividade do convénio” (apud. MODESTO CARVALHOSA, ob. cit. pp. 11)

Page 63: A Cor Do Paras Social

subsistência; podem cogitar-se motivações para que a convenção de bloqueio

adquira um valor intrínseco e independente157, nomeadamente como forma de

garantir a estabilidade da estrutura accionista ou impedir a penetração de

parceiros indesejados na arquitectura societária.

“Na verdade, o intuitus personae invadiu o âmbito do intuitus pecuniae, tendo-

se a sociedade anónima afastado do total anonimato, personalizando-se”158.

Na esteia de VAZ SERRA159 defendemos que as cláusulas limitativas da

transmissibilidade podem corresponder a uma verdadeira necessidade da

sociedade, correspondendo a um seu legítimo interesse. Exemplo do que fica

escrito é o constrangimento suscitado para o ente social da entrada no seu seio

de especuladores financeiros, de empresas concorrentes, capitais estrangeiros,

pessoas estranhas no caso da sociedade ter carácter familiar, entre uma

imensidão de exemplos pensáveis.

Pelo exposto parece oportuno, em consonância com MARIA GRAÇA TRIGO160

realizar uma tipificação dos mais frequentes limitações à livre transmissão de

participações sociais, ou mais concretamente aos constrangimentos

normalmente previstos em acordos celebrados à margem do contrato social.

- proibição da transmissão inter vivos161 das participações sociais, durante

determinado tempo;

- sujeição da transmissão ao consentimento do sindicato;

- a atribuição a um dos membros do sindicato de um direito de opção à

aquisição de participações sociais;

- consagração de um direito de preferência;

- e a obrigação do transmitente conseguir que o adquirente adira ao

sindicato;

157 Em sentido oposto MANUEL CAVALEIRO FERREIRA,( ob. cit. pp. 272) que opina que “este bloqueio nunca pode ser um fim em si mesmo”.158 MARIA VAZ TOMÉ, “Algumas notas sobre as restrições contratuais à livre transmissão de acções, Direito e Justiça, 1989/1990, pp. 213.159 ADRIANO VAZ SERRA, “Acções nominativas e acções ao portador”, BMJ, n.º 175 a 178.. 160 ob. cit. pp. 29161 Reproduz-se a expressão da Autora citada, embora se entenda desnecessária, não sendo concebível que a proibição englobasse a transmissão mortis causa.

Page 64: A Cor Do Paras Social

Da tipologia exposto suscita maiores acanhamento a admissibilidade de

estatuir uma cláusula que proíba a transmissão de participações sociais 162 ,

nomeadamente a querela de determinar se não estaremos parente uma

intolerável limitação ao direito de livre disposição do património, “que consiste

na faculdade de gozar e de dispor livremente de tudo quanto se adquiriu”,163

violando interesses de ordem pública e cumulativamente os princípios do

Direito Societário, no que concerne ao direito de negociar as participações

sociais.

Deve neste âmbito ser ponderado um elemento que consideraremos histórico-

psicológico correlacionado com a génese das sociedades anónimas: na origem

deste tipo societário esteve a necessidade de captar o investimento dos

pequenos e médios aforradores, tentados pela possibilidade de participarem na

estrutura capitalista e detendo a possibilidade de, a todo o tempo, podem

transaccionar de modo rápido e seguro as suas participações, reabilitando as

suas poupanças, porventura acrescidas de mais valias.

Neste caso estamos em face de uma verdadeira cláusula de inalienabilidade164

porque “afectam a natureza das acções, que supõe como sua característica a

negociabilidade, em maior ou menor dimensão extensão”165.

Se estas cláusulas se destinassem a vigorar ad eternum, a opção por invocar a

sua nulidade não suscitaria qualquer celeuma, porquanto tal como em outros

“ordenamentos jurídicos, verifica-se a rejeição generalizada das cláusulas de

inalienabilidade perpétuas...que violam, sem qualquer limite, o princípio de

interesse e ordem pública da livre circulação dos bens”166.

Maior controversa suscita a licitude de cláusulas de inalienabilidade

temporária167, quando se destinam a satisfazer interesses legítimos,

susceptíveis de serem protegidos pelo Direito.

Na esteia de ALMEIDA COSTA, consideramos “que estas são válidas no

quadro do nosso direito, embora...não devem considerar-se admissíveis

162 Sobre o tema nas sociedades por quotas vide ANTÒNIO AGOSTINHO CAEIRO, A exclusão do direito de voto nas sociedades por quotas, Estudos de Direito Comercial, Coimbra, 1969, pp. 152 ss.163 MÁRIO RAPOSO, ob. cit. pp. 19.164 Sobre o tema vide ALMEIDA COSTA, “Cláusulas de Inalienabilidade” , Contratos: Actualidade e evolução, Porto, 1997, pp. 25 ss.165 CAVALEIRO FERREIRA, ob. cit. pp. 276.166 ALMEIDA COSTA, “Cláusulas..., cit. pp. 31.167 Obviamente que a questão não se coloca quando a duração estatuída não tenha limites razoáveis, porque este seria um forma diferente para alcançar idêntico objectivo.

Page 65: A Cor Do Paras Social

irrestritamente, mas só quando correspondam a um interesse atendível de uma

das partes ou de terceiro... e se situem dentro de limites temporários razoáveis,

a apreciar em função do objecto concreto prosseguido”168.

Em síntese, se condenamos a licitude de estipulações parassociais que

proíbam os sócios signatários de alienar as suas acções naqueles acordos em

que não existe prazo estatuído, não nos opomos a, verificados dados

requisitos, aceitar a existência de cláusulas que proíbam durante certo tempo a

transmissão inter vivos de participações sociais.

As considerações anteriores não perdem pertinência quando a cláusula

parassocial exigir o consentimento do sindicato169 para a alienação de acções:

sobre esta cláusula em concreto aposta no acordo parassocial celebrado entre

alguns sócios da Sociedade Industrial de Imprensa, SARL pronunciou-se

CAVALEIRO FERREIRA atestando estarmos perante “uma absoluta

inalienabilidade por parte dos contraentes, pois que essa alienação

dependerá...não da vontade do proprietário das acções mas da vontade

expressa dos não proprietários.”170

A aferição da validade destas cláusulas merece um tratamento unificado,

porque a proibição ou a exigência de consentimento alcançam o desiderato

comum de constranger a livre disponibilidade do património e retirar do livre

arbítrio do accionista a possibilidade de abandonar a sociedade, ficando por

este meio prisioneiros da sociedade. Por fim importa ainda conciliar esta

estipulação parassocial com as normas societárias que regulam os limites à

transmissão de participações sociais.

No que concerne ao primeiro dos problemas entendo que a solução a adoptar

depende de alguns requisitos; desde logo, se a convenção de encontra limitada

no tempo ou tende a perpetuar-se; importa ainda conhecer a putativa

existência de mecanismos que permitam a exoneração existindo uma recusa

de consentimento, nomeadamente a aquisição das participações sociais pelos

168 ALMEIDA COSTA, “Cláusulas..., cit. pp. 36.169 Sobre a exigência de consentimento da sociedade para a transmissão de acções vide A. FERRER CORREIA e ANTÓNIO CAEIRO, Alteração das cláusula de preferência na transmissão de acções, Revista de Direito e Economia, n.º 1, 1975, pp.155 ss. JOÃO LABAREDA, ob. cit. pp. 281 ss.170 Ob. cit. pp. 286.

Page 66: A Cor Do Paras Social

restantes signatários do pacto ou por terceiro que, em tempo útil, por aqueles

indicado. Posição diversa não se compreenderia: se o CSC determina que nos

casos em que a sociedade não consente a alienação a mesma fica vinculada a

“fazer adquirir as acções por outra pessoa nas condições de preço e

pagamento do negócio para que foi solicitado o pagamento”171, não se

compreenderia que uma exigência paralela, por plasmado num acordo extra-

social, tenha diversas consequências jurídicas.

Por tudo, sou da opinião de que na circunstância da convenção estar limitada

no tempo ou, não estando, se estabelecerem meios que possibilitem ao sócio

demitir-se da sociedade, nada obsta à sua licitude de cláusulas com este

conteúdo; não se verificando qualquer daqueles requisitos, arguo invalidade da

estatuição por determinar que o sócio fique prisioneiro da sociedade.

No que concerne ao pacto de opção, ou seja, quando “uma das partes emite

logo a declaração correspondente ao negócio que pretende celebrar, enquanto

que a outra se reserva ao direito de aceitar ou declinar o contrato”172, proclama

CALVÃO DA SILVA173 não vislumbrar qualquer obstáculo, quer no plano do

direito comum dos contratos, quer em sede dos princípios gerais de direito das

sociedades, que obstem à sua inserção num acordo parassocial.

Com o devido respeito, a solução a esta problemática exige alguma

ponderação, não faltando quem refute de inadmissível a cláusula em análise174.

No pacto de opção existe a obrigação do accionista que se pretende

desvincular da sociedade de alienar as suas participações por um valor pré-

definido, ou por um valor a determinar através de métodos previstos no acordo.

A primeira dificuldade patenteada resulta da determinação do valor da venda:

estipula-lo em paridade com o valor nominal ou do valor do último balanço da

sociedade traduz-se, as mais das vezes, em pretender adquirir as acções por

um valor nitidamente inferior ao seu valor real, ao esforço patrimonial que um

adquirente normal estaria na disponibilidade de abdicar para possuir as acções;

determinar que o preço seria estabelecido pelos demais signatários do acordo,

171 Alínea c) do n.º 3 do Art.º 329.º CSC.172 ANTUNES VARELA, Das obrigações em geral, Volume I, Coimbra, 1994, pp. 314173 ob. cit. pp. 238174 Neste sentido, MARIA VAZ TOMÉ, ob. cit. pp. 217, nota 17.

Page 67: A Cor Do Paras Social

era possibilitar aos interessados impor o preço pelo qual iriam adquirir as

participações sociais; fazer incidir sobre a Assembleia Geral ou a

Administração a determinação do preço suscita questões materiais e formais:

formais porque seria fazer intervir a sociedade num acordo parassocial, o que

para a doutrina maioritária contrariaria o princípio da inoponibilidade; materiais

porque os interessados podem ter o poder de determinar a vontade da

sociedade, aplicando-se assim as objecções adiantadas para a determinação

do preço pelo sindicato.

As considerações precedentes levam-me a teorizar que a determinação do

preço no caso da validade da estatuição de um pacto de opção só poderia

caber a um Revisor Oficial de Contas designado por mútuo acordo, conforme

previsto no art.º 105.º CSC, uma vez que este é o único garante de que a

venda se realizaria pelo real valor das participações.

Situação inversa seria inadmissível: é insofismável que quer a estatuição da

necessidade de consentimento, quer o pacto de opção são limitações ao

princípio da livre transmissibilidade de participações sociais; é ainda

indesmentível que o pacto de opção proporciona uma maior facilidade de

transmissão do a exigência de consentimento, sendo, consequentemente,

inaceitável que a determinação de uma norma legal mais permissiva se traduza

em colocar o sócio numa situação mais débil. Em consonância, sustenta-se

que a validade do pacto de opção fica dependente da forma pela qual se

determine o valor das participações sociais.

Por tudo, em minha modesta opinião, a atribuição aos membros do sindicato de

um direito de opção na aquisição das participações sociais nunca se poderá

traduzir na obrigação do sócio as alienar por um preço inferior ao valor de

mercado, visto este facto ter os mesmos efeito de uma cláusula que obstava à

livre transmissão por inibir o sócio de vender, por ter consciência do prejuízo

patrimonial que encerra: sublinhe-se que não se coloca em causa a licitude dos

pactos de opção; o que se condena é o meio de determinar o seu valor.175

175 Esta não é uma posição original; no mesmo sentido vide ESCARRA, RAULT e ASCARELLI apud MARIA VAZ TOMÉ, ob. cit. pp. 208, nota 66.

Page 68: A Cor Do Paras Social

No que concerne há existência de uma cláusula extra-social que confira aos

demais signatários do acordo um direito de preferência na aquisição das

acções, apraz-me aplaudir a solução. Através do direito de preferência

amenizam-se os interesses controversos entre o sócio que se pretende

desvincular e os sócios que tem legítimo interesse na manutenção da vigência

do acordo, porque o sócio aliena as suas acções pelo seu valor real, pelo valor

que um qualquer terceiro estaria disposto a dar pela sua titularidade e, por

outro lado, os signatários do acordo assistem à continuação da vinculação

daquelas acções aos ditames do sindicato. Estamos perante uma cláusula que

encerra a necessidade e legítimo interesse de permitir a aplicabilidade prática

do acordo parassocial sem colidir com as pretensões dos sócios que a todo o

momento podem abandonar a sociedade.

Para finalizar resta tomar posição sobre a estatuição da obrigação do

transmitente conseguir a adesão do adquirente ao sindicato. A solução para

esta problemática fica dependente do entendimento sobre esta obrigação, ou

seja, se estamos perante uma obrigação de meios ou resultado. Se a

considerarmos uma obrigação de meios, i e, se entendermos que o

transmitente fica obrigado a utilizar de toda a diligência para conseguir que o

adquirente adira ao sindicato, nada há a obstar; pelo contrário, se estamos

perante a obrigação de aquele conseguir a efectiva adesão ao sindicato,

podemos aproximar-nos de uma intolerável limitação ao direito de disposição

do património, o que nos sugere a ilicitude da cláusula em análise.

3. acordos parassociais sobre o exercício do direito de informação

Através deste expediente as partes regulam entre si o exercício do direito à

informação. Sublinhe-se que a validade destes acordos tem como limite a

regulamentação legal sobre este direito, não sendo possível por contrato limitar

o acesso às informações pertinentes com a vida societária; o que é admissível

é utilizar este acordo para alargar o direito à informação legal ou

estatutariamente previsto.

Page 69: A Cor Do Paras Social

“O cumprimento destes acordos pode dar origem ao exercício vinculado do

direito de voto nas assembleias de sócios, bem como pressupor determinadas

condutas dos membros dos órgãos sociais”176.

4. Acordos sobre a distribuição de lucros177

Pode ainda motivar a criação de um acordo parassocial a estatuição, a latere

do pacto social, de regras sobre a distribuição dos lucros, ao abrigo da

admissibilidade de modificar o princípio da participação proporcional, que

vigora na falta de convenção ou preceito em contrário; a prova da sua

acutilância encontramo-la em FERNANDO GALVÃO TELES quando escreve

que “não faltam exemplos em que um sócio se obriga para com outro a

garantir-lhe um mínimo de proveitos178.”

Como bem sublinha LUIGI FARENGA serão nulos os acordos que estatuam

cláusulas que reconduzam à figura do pacto leonino179, porquanto é

inadmissível que uma disposição expressamente proíba pela lei societária

ganhasse eficácia porque aposta num acordo parassocial.180

Mas, e salvo a limitação referida bem como a necessidade de respeitar os

princípios gerais de Direito Societário, nada obsta à validade destes acordos

reconhecendo-se que podem prosseguir finalidades que merecem protecção

legal.181

5. Acordos sobre o funcionamento dos órgãos sociais

176 MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 30.177 Todas as considerações aduzidas a este propósito são extensíveis a acordos que alterem o regime de responsabilidade entre os sócios.178 FERNANDO GALVÃO TELES, ob. cit. pp. 74. 179 Sobre o tema vide FERRER CORREIA, Estudos vários de Direito, Coimbra, 1982, pp. 563 ss. (também publicado em RLJ, n.º 115, pp. 106 ss., Pacto leonino; Espécies; Proibição e seus fundamentos)180 LUIGI FARENGA, ob. cit. pp. 151-152.181 V. g., uma disposição que determina que os sócios gerentes beneficiaram de um lucro especial se atingirem determinadas objectivos empresariais, cláusula essa que terá todo o interesse em não constar do contrato social, expondo-se aos requisitos de publicidade para aquele exigíveis.

Page 70: A Cor Do Paras Social

Apesar de não suscitarem questões especiais merece ainda referência a

possibilidade de os sócios, ou os membros dos órgãos sociais, estatuírem por

acordo parassocial o funcionamento dos órgãos da sociedade.

A eleição por este meio prende-se com o facto de tratarem “frequentemente

aspectos de detalhe de forma a não sobrecarregar os estatutos182”.

A licitude destes acordos depende da sua conformidade com a lei ou os

estatutos não aventando particulares preocupações.

182 ANTÓNIO PEREIRA DE ALMEIDA, Sociedades Comerciais, 1997, pp. 151.

Page 71: A Cor Do Paras Social

IV - ACORDOS PARASSOCIAS INADMISSÍVEIS

1- Acordos sobre a conduta dos órgãos sociais 2-

Vinculação a instruções dos órgãos sociais 3-

Venda do voto 4- Violação das normas de Direito

Societário 5- Incompatibilidade com o interesse

Social 6- Consequências da nulidade de um acordo

parassocial.

Apresentada a estrutura básica e a relevância dos chamados acordos

parassociais, é o adequado momento para partirmos em busca do seu

conteúdo, para tentarmos compreender a sua teia legal, dissecando-o na

procura de entender quais os limites que o legislador rodeou a sua validade.183:

1.1 Os acordos parassociais não podem versar sobre “... a conduta de

intervenientes ou de outras pessoas no exercício de funções de

administração ou de fiscalização.”

É óbvio o sentido desta proibição: a actuação dos órgãos da sociedade deve

ter como primeira e única vinculação o interesse da sociedade, os interesses

de sócios e trabalhadores, conforme estabelece o art.º 64.º CSC, que submete

a conduta dos órgãos sociais à tutela do interesse social que funciona como

razão de ser e limite da sua actuação; esta norma pode classificar-se de

desnecessária porque as competências de actuação dos sócios e dos

183 Recordemos a norma legal:Artigo 17 - (Acordos parassociais)1 - Os acordos parassociais celebrados entre todos ou entre alguns sócios pelos quais estes, nessa qualidade, se obriguem a uma conduta não proibida por lei tem efeitos entre os intervenientes, mas com base neles não podem ser impugnados actos da sociedade ou dos sócios para com a sociedade.2 - Os acordos referidos no número anterior podem respeitar ao exercício do direito de voto, mas não a conduta de intervenientes ou de outras pessoas no exercício de funções de administração ou de fiscalização.3 - São nulos os acordos pelos quais um sócio se obriga a votar: a) Seguindo sempre as instruções da sociedade ou de um dos seus órgãos;b) Aprovando sempre as propostas feitas por estes;c) Exercendo o direito de voto ou abstendo-se de o exercer em contrapartida de vantagens especiais.

Page 72: A Cor Do Paras Social

administradores, gerentes ou directores e dos membros do órgão de

fiscalização estão tipificadas na lei e não se confundem com as atribuídas aos

sócios, que, recorde-se apenas podem celebrar acordos parassociais no limite

das suas competências.

Nas palavras de MARIA GRAÇA TRIGO “ a prevalência dos deveres dos

membros dos órgãos sociais perante a sociedade sobre eventuais vinculações

de carácter parassocial, afigura-se-nos evidente.”184

Tem-se entendido que o efeito útil desta proibição seria impedir que os

administradores actuassem sob a direcção ou influência dos sócios o que

traduzir-se-ia numa delegação de poderes, expressamente condenada pelos

art.º 391º n.º 6 e 252 n.º 5, ambos do CSC; estes deixariam de um órgão da

sociedade para se tornarem em meros mandatários dos sócios sindicados.

Em defesa da sua dama RAUL VENTURA185 afiança que o “ o preceito não

deve ser interpretado no sentido de ser proibido uma acordo de voto que verse

sobre as matérias da administração da sociedade”. Em seu entender são lícitos

os acordos sobre esta temática dentro dos limites das competências dos

sócios. Mas é o próprio a reconhecer que “ o espaço que fica livre para tais

acordos... estreita-se nas sociedades por acções”186, que são, por excelência o

espaço de actuação destes mesmos acordos.187

Do prisma que entendo a questão, esta proibição é total, impedindo os sócios

de fazendo apelo a normas extra-estatutárias determinarem o modo com a

sociedade deverá ser administrada,(e fiscalizada) consagrando-se por este

meio, aquilo que a doutrina brasileira denomina de, proibição da invasão de

competências188.

184 Ob. cit. pp. 155.185 Acordos..., cit. pp. 69.186 Ibidem, pp. 70.187 Por todos, MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 156 ss. 188 Em sentido contrário, interpretando a norma em sentido menos restritivo ANTÓNIO PEREIRA DE ALMEIDA, (ob. cit. pp. 150) sustenta que apenas se proíbe que se imponham aos titulares destes órgãos condutas concretas; assim, entende serem válidas convenções que imponham a unanimidade nas decisões ou a necessidade do voto favorável de um dado administrador para a tomada de determinadas decisões.

Page 73: A Cor Do Paras Social

1.2 A estatuição da não ingerência dos sócios, através de acordos

parassociais, na conduta dos intervenientes no exercício da administração,

merece profunda reflexão.

Não deixa de ser curioso que se a ratio dos acordos parassociais é, e utilizando

a expressão dos mais acérrimos e entusiastas defensores da validade dos

contratos parassociais, VASCO LOBO XAVIER189, pretender-se “assegurar a

estabilidade da gestão social” ou para “ conferir estabilidade e unidade de

direcção à vida da empresa”190 se proíbam aos sócios exercer influência sobre

a conduta daqueles que têm o poder e a função de gerir as sociedades.

A interpretação que se faz é assim coincidente com a de RAÚL VENTURA que,

sem afirmar inequivocamente a nulidade das cláusulas contratuais que incidem

sobre a estratégia de gestão da sociedade, admite que apenas não serão

inválidas quando relacionadas com as deliberações permitidas aos sócios

nesse campo, devendo portanto estes acordos ser interpretados casuística e

restritivamente.

1.3 Em suma, parece que a ratio legis é fundamentalmente dar cobertura legal

à possibilidade de fazendo apelo aos acordos parassociais os sócios

determinarem a distribuição de lugares nos órgãos sociais, conseguindo

através de uma actuação concertada, posicionarem-se nos locais decisivos da

sociedade.

Mas também este é um outro ponto para o qual sobejam dúvidas e

interrogações, bem expressadas pela doutrina germânica191 , relaciona-se com

a dificuldade de articular a subsequente combinação: permite-se que através

de acordos parassociais os sócios se debrucem sobre a eleição dos órgãos

sociais, sobre a sua destituição, mas não sobre a sua conduta.

Pressupõe-se que os sócios, por o meio em análise, estabeleçam o perfil dos

administradores ou directores, elegendo-os pela conduta que deles conhecem

e esperam, que os destituam quando a sua actuação se afasta do esperado;

189 Ob. cit. pp. 645.190 MÁRIO LEITE SANTOS, ob. cit. pp. 7.191 BAUMANN / REIB, apud. MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 154.

Page 74: A Cor Do Paras Social

paralelamente proíbe-se que os sócios recorram a estes acordos para

determinar a conduta das pessoas encarregues da administração e fiscalização

da sociedade.

Embora compreendendo a lógica prosseguida, entendo que só ingenuamente

se pode acreditar na sua relevância prática. Embora reconhecendo que os

administradores devem ter a coragem para pugnar pela legalidade e interesse

social abstraindo-se de motivações externas a estes desígnios a seriedade

exige sublinhar que o espectro de um afastamento, de uma demissão caso se

afastam das instruções dos sócios que os elegeram é o incentivo difícil de

resistir.

Assim a possibilidade de, através dos acordos de voto, se distribuir a

composição dos órgãos sociais tem a função e consequência determinar, ainda

que indirectamente, a conduta das pessoas que integram aqueles órgãos.

1.4 Esta proibição torna-se (ainda) mais complexa quando um ou mais dos

sócios aderentes ao acordo está adstrito a funções num dos órgãos da

sociedade.

Uma interpretação descuidada da norma legal poderia impelir o intérprete a

considerar ilícita a celebração por estes de acordos parassociais, posição da

qual discordamos. O que se exige é que a vinculação assumida se cinja às

atribuições decorrentes do estatuto de sócio, sendo-lhes proibido a vinculação

sobre condutas características da qualidade de titular de um órgão social.

1.5 A pertinência das motivações aduzidas anteriormente são ainda mais

nítidas no que concerne às convenções sobre os órgãos de fiscalização, que

pela sensibilidade das funções que desempenham jamais poderão ficar

“atados” às instruções dos sócios.

1.6 Problema de menor importância consiste na possibilidade de os sócios,

através de acordo parassocial, se debruçarem sobre a conduta da mesa da

Assembleia Geral.

Quem, como nós, sustenta que “em face do CSC, o presidente da mesa (ou

presidente da Assembleia Geral) tem efectivamente um conjunto de poderes

Page 75: A Cor Do Paras Social

próprios que permitem qualifica-lo como verdadeiro órgão da sociedade”,192 não

pode aceitar que os sócios extravasem as suas competências para invadir

estas; defendemos assim a inadmissibilidade destes direitos, não apenas por

respeitarem a condutas que não pertencem aos sócios, mas também por

infringirem o princípio da tipologia dos órgãos sociais.

2. São nulos os acordos pelos quais um sócio se obriga a votar seguindo

sempre as instruções da sociedade ou de um dos seus órgãos.

2.1 Subjacente a esta proibição existe a preocupação de haver uma inversão

do normal processo volitivo, ou seja, que a vontade da sociedade e dos seus

órgãos seja o espelho do desejo maioritário dos seus sócios e não o inverso;

nestes acordos, denominados por DOHM como consórcios de administração,

teme-se que a vontade da sociedade não se forme através da votação dos

desejos heterogéneos mas conciliáveis dos membros que as compõem, mas

seja a própria sociedade a formar a vontade daqueles, a determinar-lhe o

sentido da votação, que “ a administração da sociedade, por meio desses

votos, exerça influência na Assembleia Geral”193, comandando-as e colocando

em causa a estrutura de separação de competências vigente no Direito

Societário.

Sem dúvida, as deliberações sociais são apanágio dos sócios, e não tendo a

sociedade direito de voto seria atípico que os mesmos fossem para esta

transladados, actuando esta como se de um sócio se tratasse.

Esta impossibilidade da sociedade assumir parte activa na formação da

vontade social nada tem de inaudita, encontrando-se também expressa no

princípio da suspensão dos direitos inerentes às acções próprias;194 pugnar por

um tratamento distinto, ou seja, permitir que através de um acordo parassocial

a sociedade influenciasse, pelo voto, a determinação da vontade societária, -

seria não apenas tratar de modo desigual situações paralelas, mas ainda criar

um regime mais restritivo para as situações em que a sociedade exerce o voto

respeitante às acções das quais é titular do que aquele que vigoraria para o

192 LUÍS BRITO CORREIA, Direito Comercial. Deliberações dos Sócios, III, cit., pp. 51.193 Raul Ventura, Acordos..., cit. pp. 71.194 Estatuído pela alínea a) do n.º 1 do 324º CSC

Page 76: A Cor Do Paras Social

circunstancialismo de existir uma cisão entre a determinação do voto e o

património sobre o qual recaí o risco – consubstanciaria um claro exemplo de

fraude à lei195, porquanto se conseguiria por ínvios caminhos um direito

expressamente negado

Nas palavras certas de MÁRIO LEITE SANTOS “o que está em causa nestes

preceitos é a distribuição imperativa de competências entre os vários órgãos da

sociedade anónima. Do mesmo modo que os accionistas não detém poderes

directos no domínio da gestão, excepto naquelas matérias que a lei

expressamente os atribua, também os administradores, directores ou membros

do conselho geral não deverão ter a possibilidade nos domínios reservados aos

accionistas...”196

Esta questão ganha redobrada acuidade quando a deliberação incide sobre a

apreciação pelos sócios da actividade da administração, ou seja, quando tem

por objecto a destituição da gerência ou administração, aprovação do relatório

de gestão e das contas de exercício, exoneração da responsabilidade dos

titulares dos órgãos sociais, entre outras, naquilo que usa chamar-se o “voto de

verdade”, com efeito seria inadmissível que pendesse sobre os sócios que vão

apreciar a conduta dos órgãos sociais uma vinculação parassocial a

condicionar o seu voto.

Merece também análise a licitude de um acordo de voto em que os pactuantes

se obrigam a votar seguindo as instruções ou aprovando sempre as propostas

feitas por um sócio, que cumulativamente é membro de um órgão da

sociedade197.

195 Hoc sensu. MODESTO CARVALHOSA, ob. cit. pp. 62.196 Ob. cit. pp. 227.197 Sobre o tema MODESTO CARVALHOSA (ob. cit. pp. 65) defende que “o administrador que for também accionista sofre uma restrição...na medida exacta em que não poderá configurar uma situação conflituante entre o interesse que decorre da sua função e o seu interesse uti singuli como acionista”

Page 77: A Cor Do Paras Social

Defende o PROF RAÚL VENTURA a licitude destes acordos sendo que na

proibição analisada: “não se alarga o preceito às instruções de um membro

isolado desses órgãos” 198

Mas é esta uma atitude conforme o Direito? Será que a ratio legis desta

proibição é tão somente impedir que seja a administração a determinar a

vontade da sociedade, ou mais amplamente condena a determinação por

terceiros do sentido de voto.

Interpretando o preceito no sentido mais restrito aceitar-se-ia que o sócio

coloca-se o seu voto na disponibilidade de outra pessoa, divorciando-se desse

seu direito; e neste caso não estaríamos perante uma actuação análoga à

cessão do direito de voto, tão acutilantemente condenada pela doutrina199.

Certamente por ignorância minha, não concebo a conciliação entre a citação

anterior e a subsequente, pertencentes ao mesmo autor: “A

intransmissibilidade do direito de voto resulta, em meu entender, do próprio

conceito de contrato de sociedade. O cerne do status de sócio reside no

exercício em comum de uma actividade económica; para que o exercício seja

comum é necessário que todos os sócios nela participem e, nos esquemas das

actuais sociedades essa participação consiste primacialmente no exercício do

direito de voto.

Quem transmitisse a outrem o seu direito de voto deixaria de exercer a

actividade em comum, embora por ventura mantivesse outros direitos inerentes

à quota, como os direitos patrimoniais. Mas esses outros direitos são todos

derivados do exercício em comum e não se justificariam depois do transmitente

do direito de voto deixar de exercer actividade comum.”200

A questão que me assombra é a seguinte: se condenamos tão fortemente

quem cede a outrem o seu direito de voto, porque tutelamos que se permita a

outro a formação da minha vontade?

198 Acordos..., cit. pp. 73.199 Por todos RAÚL VENTURA, Acordos..., cit. pp. 56 ss.200 RAÚL VENTURA, Acordos..., cit. pp. 56-57.

Page 78: A Cor Do Paras Social

A questão, na minha óptica deve colocar-se do seguinte modo: é lícito ou não

que o sócio se divorcie de exercer pessoal e livremente o seu direito de voto?

Ou mais correctamente, é lícito que o sócio transmita a outrem o poder de

determinar a sua vontade?

Recorde-se que analisamos a possibilidade de seguir sempre as instruções de

um titular de um órgão da sociedade, de forma reiterada actuar segundo os

ditames estabelecidos por outro; é nossa convicção que tal conduta revela um

total desinteresse pelo fim social, não merecendo protecção jurídico.

2.2 Nova problemática se suscita pela redacção adoptada, erguendo-se

interrogações sobre a valência das expressões instruções da sociedade ou de

um dos seus órgãos, nomeadamente se não estaríamos perante uma

desadequada repetição. Afirma-se, correctamente, que só através dos órgãos a

sociedade pode exprimir posições, consequência necessária e directa da sua

impessoalidade.

A interpretação correcta do preceituado, de modo a salvar a sua letra é

entender as expressões no sentido de englobar todos os órgãos sociais, quer

aqueles que podem actuar em nome da sociedade, quer os que não podem

actuar em nome da sociedade.201

Concordando com ser esse o sentido a interpretar a norma, não antevejo

qualquer efeito útil para a expressão “sociedade”, porque, é minha convicção a

expressão” um dos seus órgãos é suficiente para abarcar o sentido da

proibição.

2.3 b) Aprovando sempre as propostas feitas por estes;

Esta proibição vem na linha da analisada anteriormente. Deve merecer o

cuidado do intérprete dissecar o conteúdo do advérbio sempre. Sublinha

alguma doutrina202 a opção legislativa consistiu em permitir acordos ocasionais

pelos quais os sócios se vinculam a exercer o seu direito de voto no sentido da

201 Nesse sentido, RAUL VENTURA¸ Acordos...,cit. pp. 72202 Por todos LUCAS COELHO, ob. cit. 86.

Page 79: A Cor Do Paras Social

proposta dos órgãos sociais, apenas proibindo que esses acordos sejam

duradouros; justifica-se esta posição porque nos acordos pontuais, nos quais

se conhece a deliberação e o sentido da mesma (sendo estes os motivos que,

em princípio permitiram a actuação concertada), não se verifica a intolerável

influência do órgão da sociedade sobre a Assembleia Geral, que determina a

cominação de nulidade daqueles pactos.203

3. c) Exercendo o direito de voto ou abstendo-se de o exercer em

contrapartida de vantagens especiais.

3.1 O que está em causa, o que justifica esta norma legal é condenar a

chamada venda ou tráfico do voto, a troca do voto por vantagem material.

O legislador toma assim uma posição que, apesar de dominante, não é

unânime na doutrina: a ilicitude de negociar, de vender o direito de voto.204

Pende a doutrina dominante para considerar imoral a venda do voto, por, entre

outras razões, demonstrar um total desinteresse pelo interesse social, ... a

venda do voto afecta a essência do conceito de sociedade...”205

Esta proibição é comum à esmagadora maioria dos ordenamentos jurídicos,

inclusive naqueles que são mais permissivos na amplitude da consagração dos

acordos parassociais.

Refira-se que o elemento de maior destaque é mesmo o valor negativo dos

acordos parassociais que consubstanciam a venda do voto.

Se ordenamentos jurídicos se contentam com a estatuição da nulidade destes

acordos, outros determinam que estes acordos são passíveis de contra-

ordenação206, e outros ainda que cominam de crime a venda do voto207.

A opção legislativa preconizada em Portugal, merece, com o devido respeito,

alguns reparos; mais do que uma nulidade da venda do voto, o que está

203 No mesmo sentido, MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 165 e MÁRIO LEITE SANTOS, ob. cit. pp. 229.204 Em sentido permissivo DOHM, Les accords pp. 82, que não considera estes acordos imorais, só admitindo a sua invalidade quando lesem os interesses da sociedade, ou causem prejuízo, a esta ou a terceiros (apud. RAÚL VENTURA, Acordos..., cit. pp. 77. .205 MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 168206 Direito Alemão207 Direito Francês

Page 80: A Cor Do Paras Social

estatuído é um mecanismo de exclusão da ilicitude em benefício do pactuante

faltoso desta “transacção”. A posição exposta fundamenta-se no facto de que

esta cominação legal possibilita que o pactuante se exonere da obrigação

livremente assumida, seja ela a de votar no sentido acordado, seja a de não

cumprir as vantagens prometidas alegando, para tanto, a nulidade do acordo.

Assim, se dois sócios celebram uma compra e venda do direito de voto, sendo

o negócio benéfico para ambos, e fruto do secretismo inerente a estes acordos,

a nulidade prevista na lei para estes acordos é meramente programática; pelo

exposto, defendemos a posição de que o seu efeito prático desta nulidade é o

de permitir a desvinculação de um dos sócios pela invocação da nulidade do

acordo. E não estamos perante um vevire contra factum proprium ?

3.2 Questiona alguma doutrina qual o sentido da proibição; se se proíbe o sócio

de votar num dado sentido ou se engloba ainda os casos em que o sócio se

obriga a exercer o direito de voto, mantendo, no entanto, a disponibilidade do

sentido em que o exerce.

Embora a questão se discuta208 tomo o partido daqueles que não vislumbram

qualquer contrariedade ao Direito na assunção de uma obrigação extra-

societária de exercer o seu direito de voto, de desempenhar um papel activo no

desenlace da vida societária.

Repúdio merece, indubitavelmente, um acordo em sentido inverso, uma

vinculação de não comparência, a obrigação de se abster.

3.3 O comércio do voto consiste no exercício do direito de voto numa

determinada direcção a troco de vantagens especiais. Importa, portanto,

analisar a noção de vantagens especiais.

Para tanto, recupera-se a construção de MARIA GRAÇA TRIGO209, que

preconiza que para existirem aquelas vantagens se exige:

- a existência de relação causal entre a vantagem e a obrigação de voto;208 Em sentido contraditório RAÚL VENTURA, Acordos..., cit. pp. 80 e MARIA GRAÇA TRIGO ob. cit. pp. 166.209 Ob. cit. pp. 168.

Page 81: A Cor Do Paras Social

- não existir vantagem especial quando esta decorre da própria votação;

- não se exigir que a vantagem tenha carácter patrimonial, podendo

consubstanciar-se numa vantagem pessoal.

Termina-se por reafirmar um ponto assente na doutrina: a proibição do

comércio do voto é absoluta sendo despiciendo analisar a bondade intrínseca

do sentido da vinculação. A ratio essendi da proibição não é a potencialidade

destes acordos prejudicarem a sociedade ou os seus sócios, a sua

desconformidade com o interesse social, mas a própria venda em si; é o

desvalor da venda do voto que legitima a sua nulidade.

4. Mas as limitações mencionadas não são as únicas que oneram a

constituição válidas destes acordos210.

Desde logo a primeira parte do artigo 17.º estabelece a obrigatoriedade de

estes acordos não obrigarem a uma conduta proibida por lei.

Não é fácil interpretar o sentido da norma. Numa primeira leitura a expressão

parece claramente desnecessária porque tautológica211, pois seria ilógica

posição inversa.

Para salvar a expressão RAÚL VENTURA ensina que o sentido da expressão

não é meramente tautológico, mas a sua ratio é submeter a validade destes

acordos aos princípios do Direito Societário.

Sendo este o sentido a interpretar-se a referida parte do art.º 17.º seria

desejável ter-se aproveitado os ensinamentos de VAZ SERRA que, de modo

claro e inequívoco, no seu anteprojecto, de modo literal submetia a validade

210 Neste sentido aplaudimos LUCAS COELHO (ob. cit. pp. 86) que entende que “ a enumeração não deverá, porventura, reputar-se taxativa. A esta luz, compreende-se então que o CsocCom tenha querido conferir relevo a casos extremos de atentado à liberdade do voto em situações características de ofensa ao princípio essencial organizatório da separação dos órgãos da sociedade, e de infracção a elementares princípios éticos, de decoro e de igualdade entre os sócios”.211 Neste sentido MIGUEL PUPO CORREIA ( ob. cit. pp. 467) que considera “que esta ressalva não carecia de ser expressa: ela resultaria sempre da regra geral da nulidade do negócio jurídico com objecto legalmente impossível ou contrário à lei (art.º 280º, n.º 1, do CC)”.

Page 82: A Cor Do Paras Social

dos acordos parassociais à conformidade com os princípios gerais do direito

societário.

Defende-se, ainda, a atendibilidade de um outro limite à validação dos acordos

parassociais, relacionada com a sua conformidade ao pacto social, inibindo-os

de contrariarem as normas naquele contidas.

Dogmatiza-se sobre a relevância das cláusulas sociais que proíbam os acordos

parassociais, bem como aquelas que constituem os pactuantes na obrigação

de comunicar a sua existência e conteúdo.

A nossa posição sobre o tema foi alvo de dissecação anterior.

5. Análise em separado merece a relevância do interesse social para

estabelecer a licitude dos acordos parassociais.

Também a este respeito a proposta do PROFESSOR VAZ SERRA tomava

inequívoca posição, sendo que esta, em consonância com o que é seu

apanágio, bem conseguida, dispondo expressamente que não serão válidos

quando “.puderem prejudicar o interesse da sociedade”.212

O facto de o actual preceito ser omisso no que concerne a esta temática,

acrescido do teor da disposição do art.º 64º CSC, que limita a obrigação de

actuar no interesse da sociedade aos órgãos de administração, suscita a

problemática da necessidade de os acordos parassociais se conformarem com

o interesse social.

Sobre a problemática tomou posição RAÚL VENTURA questionando “como

pode um acordo prejudicar a sociedade”213 sustentando que “como só a

deliberação poderá afectar o interesse social, parece que entre o acordo e o

interesse social existe uma barreira intransponível”214

212 ADRIANO VAZ SERRA, Assembleia Geral, cit. pp. 83-84. Ainda no sentido de que, face ao nosso ordenamento jurídico, o interesse social deve limitar a validade destes acordos vide. MÁRIO RAPOSO, ob. cit. pp. 23, FERNANDO OLAVO, ob. cit. pp. 193-194, ANTÓNIO PEREIRA DE ALMEIDA, ob. cit. pp. 151, LUCAS COELHO, ob. cit. pp. 94.213 Ob. cit. pp. 92.214 Ibidem. No mesmo sentido considera MÁRIO LEITE SANTOS, (ob. cit. pp. 210) que “ o acordo não produz quaisquer efeitos jurídicos na esfera social, pelo que não parece curial estar, à partida, a condicionar a sua validade a um critério que é próprio e exclusivo da organização societária”.

Page 83: A Cor Do Paras Social

Ensina ainda o ilustre professor que considerar nulo o acordo parassocial por

violação do interesse social teria como único efeito útil acautelar a posição “do

sócio que vinculado pelo acordo não votou como estava obrigado a fazer, e

através da nulidade do acordo pretende escapar às sanções cominadas”215.

Com o devido respeito não poderemos aceitar a referida construção. Mau

grado um aparente silêncio da lei afigura-se axiomática a necessidade de os

sócios exercerem os seus direitos sociais de acordo com o interesse social216;

qualquer outra explicação é inconciliável com o disposto na alínea b) do art.º

58º do CSC, quando comina a anulabilidade das deliberações em “...prejuízo

da sociedade...” e, cumulativamente, a responsabilidade solidária dos sócios

pelos prejuízos causados” (n.º 3 do mesmo artigo).

Esta evidência poderia guiar-nos a considerar pela desnecessidade de inquinar

a validade de um acordo parassocial, porquanto a deliberação assim

conseguida é passível de anulação. Sendo certo, é, ainda evidente, que se

manteria a obrigatoriedade do sócio responder pelos prejuízos causados; tal

facto, colocaria o sócio sindicado na paradoxal circunstância de ser obrigado a

exercer o seu voto numa direcção que discorda, por entender nefasta ao

interesse social, de modo a não estar sujeito às sanções estabelecidas pelo

acordo, e, por este motivo, ficar sujeito à obrigação de indemnizar a sociedade

ou os restantes sócios pelo sentido de voto assumido nessa deliberação217.

Por outro prisma, a circunstância de uma deliberação social não poder

contrariar o interesse social deve afastar a licitude dos acordos susceptíveis de

alcançar, ainda que indirectamente, o mesmo desiderato, porquanto esta será

uma situação em que estes obrigam a uma conduta proibida por lei,

expressamente afastado pelo disposto n.º 1do art.º 17.º.

215 Ob. cit. pp. 93.216 Inclusive os Autores que defendem a concepção de que o voto “não serve um interesse propriamente alheio...” que “o direito de voto não é um direito-dever” (VASCO LOBO XAVIER, ob. cit. pp. 648) podendo, portanto, determinar-se por motivações egoístas, não o entendem sem limitações, nomeadamente limitado pelo Abuso de Direito, do qual a violação do interesse social deverá ser exemplo. Ensina o Autor que “nos casos em que o sentido de voto a que a convenção, na aparência, o obrigaria se antolha ao pactuante inquestionavelmente “prejudicial aos interesses da sociedade”, aquele poderá furtar-se a emitir tal voto, seja com base na interpretação ou integração adequadas do contrato, seja com base na referida ideia do abuso do direito”. (VASCO LOBO XAVIER, ob. cit. pp. 653). Ver ainda THEOPHILO AZEVEDO SANTOS, ob. cit. pp. 190 ss., sobre a problemática em face do direito brasileiro.217 A mesma interrogação é formulada por LUIGI FARENGA, ob. cit. pp. 340.

Page 84: A Cor Do Paras Social

O direito de voto, tal como é entendido no nosso direito societário, deve

qualificar-se como um meio proporcionado a cada sócio para tutela dos seus

interesses, mas “simultaneamente um meio de concretização do interesse

social.”218

Para permitir um melhor enquadramento da temática em análise, formulamos o

seguinte raciocínio: supomos que alguns sócios de uma dada sociedade,

acordam entre si, por acorda parassocial, a distribuição dos órgãos sociais ao

abrigo deste contrato um dos signatários pretende fazer eleger para a

administração uma personalidade inepta para o desempenho da função; a

relação entre a vinculação parassocial e o interesse social, no contexto

apresentado, suscita a problemática de ser lícito ou não ao sócio vinculado o

incumprimento do acordo, sem que desse facto resulte um inadimplemento

contratual.

É nossa opinião que neste circunstancialismo, bem como em outros análogos,

é lícita a conduta do sócio que, apesar da existência do acordo, dirige a sua

actuação para um sentido mais conforme o interesse da sociedade, não

podendo, por esse facto incorrer em responsabilidade por inadimplemento

contratual.

Em síntese, entendemos que a cisão entre o teor do acordo e o interesse da

sociedade é justificação bastante para legitimar o sócio a não cumprir o acordo,

sendo esta uma situação concreta de inexigibilidade da prestação219.

6. Resta aquilatar das consequências de um acordo parassocial ser nulo.

218 LUÍS BRITO CORREIA, Direito Comercial..., III, cit. pp. 13219 “O cumprimento de um dever como causa de justificação do não cumprimento de outro não se acha expressamente previsto na lei...mas decorre...da própria ideia de dever” ( PESSOA JORGE, Ensaio sobre os Pressupostos da Responsabilidade Civil, Reimpressão, Coimbra, 1999, pp. 167). Mais digo, que no caso em apreço – em que colide a vinculação parassocial com a necessidade de pugnar pelo interesse social – não fica na disponibilidade da parte a opção pela obrigação a cumprir, porquanto “o cumprimento do dever mais forte justifica o inadimplemento do dever mais fraco, enquanto que o cumprimento deste não justifica a violação daquele” (ibidem, pp. 174); assim, deve o sócio actuar em consonância com o interesse social, “não havendo delito pelo desrespeito pelo outro” (MENEZES CORDEIRO, Direito das Obrigações, II, Lisboa, 1980, pp. 364.)Neste sentido pronuncia-se MÁRIO LEITE SANTOS, ob. cit. pp. 215, LUIGI FARENGA, ob. cit. pp. 338 ss., COTTINO e JAEGER (apud. MÁRIO LEITE SANTOS, ibidem). Não “colhe” o argumento de que esta concepção se mostra “inconciliável com o princípio, pacificamente aceite, da não sujeição do voto a um controle de mérito por parte das instâncias judiciais (LOBO XAVIER, ob. cit. pp. 649), porquanto a sua admissão inquinaria a sujeição a estas instâncias à análise das deliberações passíveis de anulabilidade com base na mesma violação.

Page 85: A Cor Do Paras Social

Desde logo é evidente que o desrespeito pelo seu teor não corresponde a

qualquer acto ilícito; se um sócio se vincula a votar num determinado sentido

em troca do pagamento de uma dada importância, a declaração de nulidade do

acordo, liberta o sócio do cumprimento do vínculo.

SENA considera que “se o sindicato de voto é nulo, o sócio é livre (em face dos

outros participantes do acordo) de votar como entender e, portanto, o seu voto

não é inválido por violar a convenção e voto”.220 Sem colocar em causa o mérito

da afirmação, apenas corrigimos no sentido que ainda que o acordo seja lícito

o voto em sentido divergente não inquina a sua validade, porquanto o

desrespeito por aquele não tem valência para impugnar actos da sociedade.

A validade da deliberação não pode também ser contestada se o sócio, não

obstante a nulidade do acordo, actuar em conformidade com o que aquele

determinava; a nulidade do acordo não exclui o direito de voto nem inibe o

sócio a actuar segundo lhe aprouver.

Questão mais complexa é a de o sócio votar no sentido previsto no acordo na

consciência errónea de se encontrar vinculado; entendemos que o caso em

apreço caí na “alçada” dos princípios gerais do direito, sendo passível a

evocação de um erro na formação da vontade.221

220 GIUSEPPE SENA, apud. LUÍS BRITO CORREIA, Direito Comercial. Deliberações..., cit. pp. 173.221 No mesmo sentido ECKARDT, apud. LUCAS COELHO, ob. cit. pp. 100.

Page 86: A Cor Do Paras Social

V- INCUMPRIMENTO DOS ACORDOS

1. Cláusula

Penal 2- Providência Cautelar 3- Acção de

Cumprimento 4- Execução Específica 5

Acção Executiva - 6- Sanção Pecuniária

Compulsória

1.1 Como repetidas vezes se frisou elemento fulcral e caracterizador dos

acordos parassociais, tal como são entendidos no nosso direito positivo, é a

sua inoponibilidade à sociedade, isto é, o facto de o seu incumprimento ser

insusceptível de alegação para inquinar a validade de uma deliberação social.

Neste sentido é insofismável a letra da lei ao determinar que os acordos

parassociais são válidos “mas (que) com base neles não podem ser

impugnados actos da sociedade ou dos sócios para com a sociedade”.

Mas constate-se, que o legislador de 1986 ao consagrar a sua validade teve o

condão de lhes conferir juridicidade, afastando-os do campo dos mero

“gentleman’s agreements”, o que lhes permite gozar de sanções em caso de

incumprimento.

Esta é uma consequência lógica e necessária da sua submissão aos ditames

do direito e permite que, existindo inadimplemento, o contraente não faltoso

possa recorrer aos meios coercivos do Estado para ver ressarcido o seu direito.

Nesse sentido “ninguém duvida que a vinculação assumida num acordo de

voto implica a aplicação ao infractor de sanções civis: a obrigação de

indemnizar...”222 de acordo com o estatuído pelas regras do incumprimento

contratual.

Mas, igualmente ninguém duvida, que o problema reside na “dificuldade do

cômputo dos danos do incumprimento (que) obstará quase sempre à

praticabilidade da indemnização tendente a ressarci-los” 223

222 ADRIANO VAZ SERRA, ob. cit. pp. 97.223 VASCO LOBO XAVIER, ob. cit. pp. 642. No mesmo sentido ANTÓNIO PEREIRA DE ALMEIDA, ob. cit. pp. 151 e LUIGI FARENGA, ob. cit. pp. 380.. Com efeito, atente-se no exemplo de o acordo ter por objecto a eleição dos administradores, no qual é praticamente impossível quantificar os prejuízos sofridos, bem como demonstrar que se a escolha tivesse recaído sobre outra pessoa existiriam maiores vantagens económicas.

Page 87: A Cor Do Paras Social

Sem dúvida é extremamente complexo delimitar o prejuízo para o sócio que

não viu aprovada uma deliberação que desejava ou calcular “os danos sofridos

por aquele que não consegui fazer eleger para o “Conselho de vigilância” uma

ou mais pessoas devido à não satisfação da obrigação de votar conjuntamente

por parte de outro sócio”224

Pelo exposto, é com evidência que concluímos que as regras gerais do cálculo

da indemnização são pouco acutilantes face às especificidades destes

acordos.

1.2 A estas dificuldades a melhor doutrina contrapõe o argumento de ser curial

os acordos de voto estabeleceram de per si sanções para o seu

incumprimento, nomeadamente uma cláusula penal; sendo certo que assim é,

o facto não retira validade ao que se afirmou, sublinhando-se a prudência em

consagrar legislativamente regras supletivas de cariz indemnizador para o

instituto em estudo, uma vez que, como refere RAÚL VENTURA “nem em

todos os acordos são estipuladas cláusulas penais, ficando, portanto, o

(in)cumprimento sujeito às regras gerais”225.

1.3 No que concerne à possibilidade de prevenir o incumprimento merece

ainda análise um outro clausurado tendente ao mesmo objectivo, consistindo

este em obrigar o pactuante faltoso a comprar ou a vender aos outros a sua

participação social em caso de incumprimento do acordado.226

Face ao nosso direito merece reflexão a admissibilidade das buy or sale

options nomeadamente a possibilidade de obrigar o contraente faltoso ao

cumprimento desta norma sancionatória.

Parece ilógico admitirmos a executabilidade de uma cominação aposta num

acordo parassocial, quando se proclama a inexecutabilidade daquele pacto.

2. Mas serão os meios analisados, a responsabilidade civil e as cláusulas

sancionatórias estabelecidas no acordo parassocial os únicos meios de tutela

para os contraentes cumpridores?

224 EGBERT PETERS apud. MARIA GRAÇA TRIGO ob. cit. pp. 202225 Ob. cit. pp. 55.226 Sobre este ponto MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 215, que remete para KONDRING E TEIPEL

Page 88: A Cor Do Paras Social

Não oferece dúvidas que lhes está vedado a possibilidade de com base no

desrespeito por um acordo parassocial impugnar os actos da sociedade: a letra

da lei é inequívoca ao optar por essa susceptibilidade, tomando clara opção

pela primazia da vontade expressa em Assembleia Geral sobre quaisquer

outras.

E compreende-se que assim seja; a dignidade deste órgão não deve permitir

que deliberações que não inferem de qualquer invalidade seja atacadas com

base num qualquer acordo, que embora conexionado com a sociedade lhe é

marginal e, demasiadas vezes, estranho a parte dos seus sócios227.

Mas pretenderá o legislador subtrair ao pactuante cumpridor quaisquer outros

meios de tutela que não os mencionados.

Cogitemos no seguinte: a validade dos acordos parassociais encerram ou não

um importante meio de tutela do interesse social? Desempenha ou não função

de “assegurar a estabilidade da gestão social, face aos riscos das maiorias

flutuantes” para “ assegurar a manutenção de uma política comum, de

fundamental interesse para a sociedade em determinadas circunstâncias”228.

Sendo a resposta afirmativa porquê impedir os sócios defraudados das “armas

do nosso arsenal” não aplicando as respostas típicas do direito civil para o

inadimplemento contratual.

2.1Providência cautelar:

A possibilidade de interpor uma providência cautelar não especificada, quando

exista o fundado receio de o sócio sindicado, em determinada Assembleia

Geral, fruste as legítimas expectativas dos consócios é expressamente

227 Esta posição não é inédita no nosso direito societário, sendo identificável paralelo nas regras do mandato; assim, quando o mandatário não respeita as instruções do mandante, este fica inibido de impugnar a deliberação com base naquela argumentação. Assim, “ a eficácia do voto não é prejudicada pelo facto de o representante não cumprir indicações do representado quanto à emissão do voto, incumprimento que apenas relevará no domínio das relações internas entre o dominus e o procurator, às quais a sociedade é estranha” (EDUARDO LUCAS COELHO, ob. cit. pp. 137) No mesmo sentido “se o representante comum viola a deliberação adoptada pelos contitulares, nem por isso serão afectados os actos por ele praticados no exercício dos direitos inerentes à acção, restando somente a responsabilidade civil do infractor” (JOÃO LABAREDA, ob. cit. pp. 74).Pelo exposto é lícita a conclusão de que a ratio destas estatuições consiste em estabelecer um predomínio da assembleia sobre quaisquer invalidades que lhe são externas. 228 VASCO LOBO XAVIER, ob. cit. pp. 645

Page 89: A Cor Do Paras Social

defendida por RAÚL VENTURA229. Esta posição espelhada pelo ilustre

professor, com a devida vénia, não é coerente com o pensamento

desenvolvido pelo mesmo sobre esta temática; com efeito, exigência lógica e

necessária de uma providência cautelar é a subsequente interposição de acção

judicial, uma vez que a providência cautelar não pode subsistir isoladamente.

Não vislumbramos que acção possa ser esta, uma vez que, o ilustre professor

é categórico em negar a possibilidade de qualquer acção judicial.

Em sentido diametralmente oposta encontramos MARIA GRAÇA TRIGO230,

que, proclama a possibilidade de acção de cumprimento mas refuta a

admissibilidade de interpor uma providência cautelar não especificada,

defendendo que esta se traduziria numa actuação definitiva e irrevogável,

porque “implicaria a produção de efeitos próprios da acção principal, sem

possibilidade de retrocesso se esta última não fizesse vencimento”231,

afastando-se, por aquele facto, da essência daquelas providencias que visam

“obter uma composição provisória da situação controvertida antes do

proferimento da decisão definitiva”232.

A nossa posição sobre o tema é prejudicada pela exposição em torno da

licitude de interpor acção judicial; mas, desde já, sublinhamos que sendo lícita

esta acção, podem reunir-se os pressupostos necessários para a

admissibilidade de uma providência cautelar.

Com efeito, não aceito os argumentos de que requerer um adiamento de uma

reunião da Assembleia Geral deva considerar-se como lesivo para os

interesses sociais ao ponto de afastar esta susceptibilidade ou, que admitir este

adiamento se traduza em opor o acordo à sociedade.

Para a primeira das alegações a justificação assemelha-se evidente: se o

nosso ordenamento jurídico de forma inequívoca estatui a possibilidade de

229 Ob. cit. pp. 98-99 230 ob. cit. pp. 225 ss.231 MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 227232 MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, Estudos sobre o novo processo civil, 2ª Edição, Lisboa, 1997, pp. 226

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suspensão de deliberações sociais, verificado determinado condicionalismo, a

mesma ordem de ideias legitima o adiamento da assembleia233.

Já a segunda afirmação encerra maiores dificuldades, embora ultrapassáveis.

É crença do autor destas linhas que a impossibilidade de impugnar actos dos

sócios para com a sociedade, determinada pelo n.º 1 do art.º 17.º não engloba

a possibilidade de adiar a assembleia com base no incumprimento de um

qualquer contrato, não se excepcionando o acordo parassocial. Adiar-se uma

assembleia e impugnar um acto da sociedade ou dos sócios para com esta são

realidades díspares: a inoponibilidade traduz-se na insusceptibilidade de

revogar um acto da sociedade, de impugnar uma deliberação social tendo

como fundamento o não cumprimento de um acordo parassocial. O que neste

contexto se reclama é, não inquinar uma deliberação, mas antes obstar a que

esta se verifique e que com esta se lesem direitos protegidos por lei.

2. Acção de cumprimento

No projecto do PROFESSOR VAZ SERRA afastava-se de modo expresso a

possibilidade de interpor uma acção de cumprimento.234

Face ao silêncio que caracteriza o texto legal actual são admissíveis duas

interpretações díspares: contrariamente à referida proposta permite-se a acção

judicial de cumprimento ou, pelo contrário, ao estatuir-se que “não podem ser

impugnados actos da sociedade ou dos sócios para com a sociedade”

pretendeu-se afastar o recurso a este meio.

Antes de dissecarmos em concreto esta problemática tenho por pertinente

esclarecer que defendo existir em confronto duas diferentes ordens de razão,

233 Um sócio pode requerer que uma deliberação contrária á lei ou aos estatutos seja suspensa, desde que demonstre que a mesma pode causar um dano apreciável á sociedade, não se exigindo que seja irreparável ( Neste sentido, RP 15-NOV.-1993), se esta possibilidade não “choca” o intérprete não aceitamos que seja condenável tratamento análogo, em circunstâncias em que o dano é irreversível.234 3. Não pode ser exigido judicialmente o cumprimento dos contratos previstos no número anterior,(acordos de voto) mas só a indemnização ou a pena convencional por não cumprimento deles.

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que merecem tratamento diferenciado, pela heterogeneidade de problemas que

apresentam.

Desde logo existe uma questão processual, um problema formal que se traduz

na exequibilidade ou não de utilizar a acção de cumprimento, ou um outro

qualquer meio de tutela para o inadimplemento, que não a reparação

pecuniária.

Distinto problema é a legitimidade do recurso a estes meios, a legalidade de

suprir o incumprimento: esta á uma questão material ou substantiva e emana

do sentido adoptado para o princípio da inoponibilidade entre o parassocial e o

social.

Comecemos por tomar posição sobre o primeiro dos problemas enunciados;

entende a doutrina maioritária que não tendo o signatário cumprido a obrigação

assumida no acordo parassocial, esta torna-se impossível, sendo despiciendo

o recurso aos meios judiciais, ou seja, se o sócio se vincula a votar em

determinado sentido e não o faz, os contraentes não faltosos nada

beneficiaram em interpor acção de cumprimento, uma vez que esta

possibilidade se gorou, pela impossibilidade de anular a deliberação social

conseguida com a violação do acordo parassocial.

Sem colocar em causa a pertinência da construção, urge questionar se não

serão configuráveis situações em que, não obstante a existência de um

inadimplemento, os restantes pactuantes mantenham interesse no

cumprimento da prestação: pensemos no caso de a Assembleia Geral ter sido

adiada, não chegando a realizar-se a votação que vinculava o accionista, ou,

tratando-se de um sindicato este reiteradamente o violasse. Nestes casos,

apesar do incumprimento a obrigação continua possível mantendo o credor

interesse na sua realização: estas considerações impelem-nos a considerar

que, embora reconhecendo que na maioria dos casos o incumprimento da

prestação a tornam impossível, são diagnosticáveis hipóteses em que se

mantém o interesse na prestação, nada obstando, da perspectiva ora

interpretada, à imposição judicial do cumprimento.

Page 92: A Cor Do Paras Social

Analisemos agora a conformidade da acção judicial de cumprimento com o

regime estabelecido para os acordos parassociais, nomeadamente com o

princípio da inoponibilidade.

É nossa opinião que a impossibilidade de anular deliberações sociais com base

no inadimplemento de um acordo parassocial tem como fundamento garantir a

primazia das declarações sociais manifestadas na Assembleia Geral sobre

quaisquer outras, visando proclama-la “como o órgão soberano ou supremo

dentro de cada sociedade”235, nada obstando à legalidade de se introduzirem

mecanismos para que em sede de Assembleia os sócios actuem em

conformidade com os acordos estabelecidos.

Semelhante conclusão deve retirar-se do pensamento de RAUL VENTURA236,

que, embora sem o afirmar taxativamente, ao entender realizável a obtenção

de uma providência cautelar não especificada, reconhece a potencialidade dos

acordos parassociais serem exequíveis judicialmente; só ingenuamente

podemos acreditar que o Autor ao expor a posição anterior descorou a

necessidade de interpor a acção principal. As suas conclusões vão no sentido

de não se verificar qualquer incompatibilidade substancial entre o princípio da

inoponibilidade e a possibilidade de acção de cumprimento, sendo as

dificuldades de ordem processual.

Defender a tese contrária, ou seja, considerar que o princípio da

inoponibilidade traduz “um princípio fundamental de direito societária, i e, o

princípio da liberdade na formação da vontade na sociedade”237 equivaleria a

inquinar a validade de todas as formas de garantir a unidade do exercício do

direito de voto.

Indubitavelmente se a interpretação da norma legal consistisse em garantir aos

sócios a suprema liberdade de, ainda que vinculados por acordos parassociais,

mantivessem a liberdade de os não cumprir, a consagração de um direito a

arrependimento, teríamos forçosamente de recusar a validade dos mecanismos

de conferir efeito externo aos acordos parassociais, porquanto seriam fraude à

lei, por procurarem “contornar ou circunvir uma proibição legal, tentando chegar

235 MIGUEL PUPO CORREIA, ob. cit. pp. 547.236 Acordos..., cit. pp. 97 ss.237 MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 205.

Page 93: A Cor Do Paras Social

ao mesmo resultado por caminhos diversos dos quais a lei designadamente

previu e proibiu.238”

Em resumo, entende-se que a admissibilidade de interpor acção judicial de

cumprimento não viola nenhuma norma legal imperativa, nem viola os

princípios fundamentais de direito societário.

Mas estas considerações só por si não são suficientes para afirmarmos a

admissibilidade de interpor acção de cumprimento; falta, ainda, indagar se esta

acção é exequível face ao direito civil, ou seja, se se verificam os pressupostos

gerais exigíveis pelo art.º 817.º CC.239

A acção de cumprimento é “essencialmente destinada a obter a declaração da

existência e da violação do direito e a intimação solene, emanada do Tribunal,

para que o devedor cumpra”240; no caso em apreço, existindo uma violação do

acordo, e mantendo-se o interesse na prestação, nada obsta a que os sócios

lesados requeiram ao tribunal com o referido desiderato.

Aceitando como boa a possibilidade de interpor acção de cumprimento, esta

não obsta a que, ainda que judicialmente intimado a cumprir, o sócio não acate

a decisão judicial, e actue no seio da sociedade no sentido que lhe aprouver,

rotulando de infrutuosa a tutela judicial perseguida pelos demais sócios; sendo

justa a objecção recorda-se que a mesma tem validade universal, não sendo

privativa dos acordos parassociais.

Por tudo não encontramos justificação para, nos casos em que a prestação se

ainda é possível, os signatários interponham acção judicial de cumprimento

contra o sócio remisso.

238 MANUEL DE ANDRADE, Teoria Geral da relação jurídica, II vol., 1972, pp. 338. Assim, a defesa da existência de um princípio societário de liberdade de formação de vontade na Assembleia é inconciliável com a possibilidade de constituição de uma SGPS, usufruto, compropriedade, de molde a conferir eficácia externa ao sindicatos de voto. No mesmo sentido inquinava-se a validade de depositar as acções num mandatário comum, porque também neste caso o sócio perderia a possibilidade “de facto” de exercer o seu direito de voto de forma antagónica à sua vinculação parassocial.Complemente-se com afirmação de que a própria possibilidade de representação é atacada pela consagração daquele princípio, porque também neste caso o sócio não forma a sua convicção no seio da sociedade.239 “Não sendo a obrigação voluntariamente cumprida, tem o credor o direito de exigir judicialmente o seu cumprimento...”240 ANTUNES VARELA, Das obrigações ..., II, cit. pp. 147-148.

Page 94: A Cor Do Paras Social

3. Execução específica241

Fundamental interesse reside na possibilidade dos contraentes não faltosos

requererem a execução específica do acordo parassocial; podemos mesmo

considerar ser esta a mais importante e controversa questão no que concerne

aos meios de suprir o inadimplemento destes acordos.

241 A possibilidade de recorrer ao mecanismo da execução específica para suprir o inadimplemento de um acordo parassocial é temática controvertida no direito comparado. Em sentido permissivo enumeramos a legislação americana na qual se pode aformar “a tendência, hoje, dominante, é no sentido de considerar-se essencial a execução específica dos acordos de accionistas” (MODESTO CARVALHOSA, ob. cit. pp. 251). O legislador brasileiro foi seduzido por este entendimento, dispondo no seu art.º 118.º que “os acordos de accionistas, sobre a compra e venda de suas acções, preferências para adquiri-la, ou exercício do seu direito de voto deverão ser observados pela companhia, quando arquivados na sua sede”. Pelo exposto é licita a afirmação que “a principal diferença entre legislação brasileira e a dos outros países reside execução específica do acordo de accionistas, o que representa para os que participam de tais pactos a garantia de que as obrigações de fazer, ou não fazer, poderão ser exigidas in natura” (AZEREDO SANTOS, ob. cit. pp. 192) e não apenas através da mera reparação pecuniária.No que concerne ao direito continental podemos identificar uma inequívoca tendência para excluir esta potencialidade. Assim, no Direito Italiano, e não obstante a existência da possibilidade de execução específica, entende-se ser esta privativa das obrigações de contratar; acresce o entendimento da ilegitimidade dos Tribunais para impedir o livre exercício do Direito de voto.Em face da disciplina legal espanhola , e apesar da admissibilidade destes acordos fazer escola desde a década de quarenta, reputa-se de inaceitável o recurso a estes acordos porquanto “se um dos accionistas não respeitar a obrigação contraída, somente restará acção pessoal, por inadimplemento contratual, que se reduz ao ressarcimento por perdas e danos” (GURRIGUES-URIA apud. MODESTO CARVALHOSA, ob. cit. pp. 255).No direito alemão verificou-se uma histórica orientação jurisprudencial contrária a exequibilidade destes acordos. Num primeiro momento sustentava-se que estas sentenças seriam facilmente desrespeitadas porquanto, ainda que o Tribunal impusesse ou ficcionasse uma determinada declaração de vontade, os sócios manteriam a possibilidade de marcar uma nova Assembleia Geral, com o intuito de revogar as deliberações anteriores. (neste sentido PETERS apud. MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 203). Esta concepção tem perdido aderentes, sendo que, embora não pacificamente, os Tribunais Alemães já declararam “que uma vinculação do direito de voto é admissível e exequível segundo o meio previsto no §894 ZPO” (Sentença do BGH de 29-05-67, na qual inauditamente consagrou a execução forçada de uma convenção de voto, na qual um sócio por acordo reconheceu que adquirira a sua participação com os meios financeiros de terceiro, comprometendo-se em ceder-lhe as quotas aquando da sua solicitação apud. MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp.94-95). ( O referido artigo dispõe que “seja o devedor condenado à emissão duma declaração de vontade, a declaração vale como emitida assim que a sentença tenha transitado em julgado” , pelo que a norma não deve ter-se por coincidente com o art.º 830º CC. A referência justifica-se porque também neste caso uma decisão jurisdicional vai tornar exequível um acordo parassocial)As principais objecções a esta possibilidade resultam da consideração de que, ainda que o exercício do direito de voto possa ser substituído por declaração judicial, nada justifica a inibição ao sócio de participar na Assembleia; pelo facto, a doutrina que aceita tem sustentado a possibilidade de o sócio, ainda que impossibilitado de votar possa usufruir dos restantes direitos inerentes à sua participação social, nomeadamente a apresentação e discussão de propostas. Uma outra objecção que é assacada a esta possibilidade pela doutrina alemã relaciona-se com “a impraticabilidade da medida, que viria sempre muito tarde” (JAEGER apud. MODESTO CARVALHOSA, ob. cit. pp. 256), pelo que teria um “valor meramente teórico a

Page 95: A Cor Do Paras Social

O primeiro problema que nos oferece comentar consiste em determinar a

aplicabilidade do art.º 830.º CC ao inadimplemento de acordos parassociais.

RAÚL VENTURA ensina que “no nosso direito a execução por meio de

sentença que produza os efeitos da declaração negocial do faltoso é possível

apenas nos casos previstos no art.º 830.º CC”242relativo ao contrato promessa,

sendo insusceptível de englobar as violações decorrentes dos acordos de voto.

E é exactamente neste aspecto que reside a problemática: deve o referido

artigo ter uma aplicação circunscrita ao contrato promessa ou, pelo contrário,

aplicar-se-à a qualquer obrigação de emissão de declarações de vontade.

Numa perspectiva de aplicação restritiva da execução específica ensinam

PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA que esta apenas se aplica a obrigações

resultantes de um contrato-promessa, o que demonstra que o legislador “foi

cauteloso, e entendeu que não devia de ir demasiado longe”243

Em sentido inverso, e merecedor do nosso aplauso, saliente-se a posição de

ALMEIDA COSTA que sustenta não existirem razões para a consideração da

“regra do art.º 830.º constitua um princípio excepcional no quadro jurídico

vigente. Corresponde ao sistema da nossa lei, que atribui à restauração natural

prevalência sobre a indemnização por equivalente”244 Acresce que “parece-nos

inadmissível que o Direito fosse dar cobertura à atitude de uma pessoa que

contratasse com o fito de não cumprir, abdicando, em homenagem ao

prevaricador, da forma mais perfeita de coacção jurídica: a execução

específica”245.

execução específica, pois a medida seria aplicável eficientemente, apenas no caso de ser conhecido, antes da Assembleia, o voto contrário ou sentido convencionado. (ibidem).Com o devido respeito a argumentação aduzida não é convincente, porquanto não apenas “se constrói um argumento substancial a partir de uma consideração meramente factual (PETERS apud. MARIA GRAÇA TRIGO, ob. cit. pp. 203) como também nas próprias críticas se enumeram situações em que esta acção tem um efeito útil. 242 Ob. cit. pp. 98.243 PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA, Código Civil Anotado, Vol. II, 1981, pp. 92. No mesmo sentido INOCÊNCIO GALVÃO TELLES (Direito das Obrigações, 7ª Edição, 1997, pp. 135, nota 1) ensina que a execução especifica “aplica-se somente ao contrato-promessa que a lei associa. É no nosso sistema jurídico, claramente, uma providência excepcional e por isso não pode ampliar-se a outras situações, ainda que análogas ou de algum modo análogas”.244 ALMEIDA COSTA, Direito, cit. pp. 205. No mesmo sentido, ADRIANO VAZ SERRA, O contrato e o negócio jurídico unilateral como fontes das obrigações, BMJ, n.º 77, pp. 160 ss. e JOÃO CALVÃO DA SILVA, Cumprimento e sanção pecuniária compulsória, 2ª edição, Coimbra, 1995, pp. 500 ss.245 ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Direito das obrigações, 1º Vol., Lisboa, 1980, pp. 469.

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Ainda que concordando com as opiniões expostas, este facto só por si não

permite concluir, sem mais, pela admissibilidade do recurso à execução

específica para contrariar o incumprimento de um acordo parassocial,

remanescendo dissecar se existe uma incompatibilidade de aplicação do art.º

830.º CC aos acordos parassociais, nomeadamente a faculdade de uma

sentença judicial se substituir á emissão do voto.

Os defensores da inadmissibilidade alegam como premissas:

- o não cumprimento voluntário traduz-se na impossibilidade de cumprir246;

- o Tribunal é ilegítimo para intervir na Assembleia de sócios;

- o caracter infungível do direito de voto;

Sobre a primeira das objecções já assumimos a nossa posição, pelo que não

tecemos considerações adicionais.

No que concerne á intervenção do Tribunal não encontramos motivações que

justifiquem um tratamento diferenciado em relação ao adoptado para

participação de um qualquer outro terceiros na Assembleia, nomeadamente o

adoptado para a representação voluntário.

A intervenção do tribunal na Assembleia Geral não deve qualificar-se de

intolerável, porquanto “não interfere forçosamente na formação da vontade do

ente, posto que o procedimento judicial é dirigido directamente contra o sócio e

não contra a sociedade”247.

Por outro lado, sublinhe-se que não cuidamos de impedir o sócio de participar

na Assembleia, mas tão somente de o impedir de exercer o seu direito de voto,

porque contraditório com outros compromissos que livremente assumiu.

Normalmente o sócio pode intervir na assembleia geral e exercer o seu direito

de voto. Mas, nos casos excepcionais em que lhe é vedado votar, nem por isso

fica privado do direito de assistência e participação na reunião, podendo, dessa

246 Vide a nossa posição supra.247 ECKARDT, apud. Eduardo Lucas Coelho, ob. cit. pp. 96.

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forma, lutar para que a deliberação a adoptar se oriente ma direcção que mais

lhe interessa”248

Situação mais controvertida prende-se com a pretensa infungibilidade do direito

de voto.

Parte significativa da doutrina entende que o voto “não é fungível, pois só o

próprio accionista ... cabe a participação na assembleia e a emissão do voto.”249

Tal posição afigura-se-nos indefensável no nosso quadro legislativo vigente,

que expressamente consagra o direito de o sócio fazer-se representar na

Assembleia Geral, sendo inclusive um direito inderrogável nas sociedades

anónimas, por disposição expressa, (380.º n.º 1 CSC), bem como nas

sociedades por quotas,250 sustentando-se “que a supressão do Direito de

Representação conduziria à supressão do próprio direito de voto”.251

Por tudo, e como foi sendo indiciado, juntamos a nossa humilde voz à de

MARIA GRAÇA TRIGO252 e de PEREIRA ALMEIDA253 sustentando a

possibilidade de, em determinadas circunstâncias, recorrer à execução

específica como forma de suprir o inadimplemento de um acordo parassocial.

4. Acção executiva

248 JOÃO LABAREDA, Das acções das Sociedades Anónimas, AAFDL, Lisboa, 1988, pp. 161. No mesmo sentido EDUARDO LUCAS COELHO, ob. cit. pp. 109-110.249 RAÚL VENTURA, ob. cit. pp. 98.250 Assim RAÚL VENTURA, Sociedade por quotas, II, Coimbra, 1989, pp. 205 ss.251 EDUARDO VERA-CRUZ PINTO, ob. cit. pp. 11. o que se afirmou não prejudica a consideração de que nos tipos sociais em que a representação não é permita o voto deva ter-se por infungível. Sobre a representação pronunciou-se, em 1914, CUNHA GONÇALVES considerando que a cláusula que a proíba, por violar um princípio geral do Direito, que confere a todos o poder de serem substituídos por outro quando não podem comparecer. (Comentário ao Código Comercial Português, I, 1914, pp. 458)252 Ob. cit. pp. 216 ss.253 O autor não justifica as suas posições mas é inequívoco quando afirma que “os acordos parassociais são convenções...que apenas têm efeitos obrigacionais, nomeadamente responsabilidade civil, ou, por vezes, execução específica” (ob. cit. pp. 149.

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Importa ainda considerar a possibilidade de interpor uma acção executiva, em

caso de inadimplemento de um acordo parassocial, através do processo de

execução para prestação de facto, regulado no art.º 933.º do CPC254.

Em oposição a esta possibilidade encontramos RAUL VENTURA que sustenta

esta impossibilidade com base de o prazo não ser certo, a necessidade que o

exequente ter que provar o incumprimento e, finalmente na já referida

infungibilidade do direito de voto255.

Com o devido respeito entendo que os argumentos não colhem; no que

concerne ao prazo, o próprio Autor reconhece a possibilidade de o prazo ser

certo256 pelo que não nos delongaremos na sua apreciação; quanto á

necessidade de provar o incumprimento este é, facilmente, possível pelo

confronto do acordo com as actas da Assembleia Geral em que o mesmo não

foi cumprido.

Por outro lado a possibilidade de interposição desta acção transforma-se numa

verdadeira necessidade porquanto, “mesmo quando, sendo a prestação de

facto infungível, logo no momento da propositura se sabe que, salva a

prestação voluntária pelo devedor”257 não se pode almejar o resultado

desejado, deve interpor-se acção executiva para prestação de facto que

posteriormente se vai converter em acção executiva para pagamento de

quantia certa.

Com efeito, “o tipo de execução é sempre determinado pela prestação

constante do título executivo (art.º 45º, n.º 1), pelo que, mesmo que se

reconheça que nunca se pode conseguir na execução a prestação não

cumprida, deve utilizar-se a execução adequada àquela prestação”258.

254 Para o caso em análise são configuráveis como títulos executivos quer a sentença condenatória, quer o próprio acordo quando assinado pelas partes que se vinculam. (alíneas a) e c) do CPC).255 Acordos..., cit. pp. 98.256 Ibidem.257 JOSÉ LEBRE DE FREITAS, A acção executiva à luz do Código Revisto, 2ª, 1997, pp. 15 nota 24.258 MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, ob. cit. pp. 612.

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5. Sanção pecuniária compulsória

Conforme se sublinhou o direito de voto tem, em determinadas condições,

carácter infungível.

Nestes casos é insustentável o recurso à execução específica; merece,

portanto, pertinência analisar a possibilidade de recorrer a outros mecanismos

legais.

Dentro destes merece especial atenção o recurso à sanção pecuniária

compulsória259 como meio privilegiado para “convidar” o sócio inadimplemente

ao cumprimento da vinculação parassocial: em nossa opinião nada obsta á sua

aplicabilidade sempre que, o voto seja infungível e se mantenha o interesse

dos credores no cumprimento da obrigação. Sublinhe-se que este é um meio

mais fácil e com maior efeito útil, porquanto o pagamento daquela quantia

funciona como um forte estímulo ao cumprimento; refira-se ainda a

potencialidade desta sanção se incluir nos próprios acordos, optimizando-os.

259 A sanção pecuniária compulsória é ”uma figura intermediária entre a prevenção e a reparação” (ALMEIDA COSTA; Direito ..., cit. pp. 952) e consubstancia-se em “providência tomadas após a violação da norma e que se destinam a evitar que a mesma se prolongue” (ibidem). Para a sua consagração legislativa – Decreto-Lei n.º 262/83 de 16 de Junho, que dispõe “nas obrigações de prestação de facto infungível, positivo ou negativo, salvo nas que exigem especiais qualidades cientificas ou artísticas do obrigado, o tribunal deve, a requerimento do credor, condenar o devedor ao pagamento de uma quantia pecuniária por cada dia de atraso no cumprimento ou por cada infracção, conforme o que for mais conveniente às circunstância do caso. – muito contribuiu a influência da jurisprudência francesa; sobre o tema vide ALMEIDA COSTA, Direito..., cit. pp. 952 ss.

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VI APROXIMAÇÃO A UMA POSIÇÃO CRÍTICA

Catorze anos após a consagração legislativa dos acordos parassociais parece

oportuno ensaiar sobre a sua acutilância, dogmatizar sobre a sua utilidade.

O legislador, corajosamente, ao avaliza-los perante a controvérsia doutrinal e

ao arrepio da jurisprudência fê-lo, e bem do meu ponto de vista, de modo

envergonhado. Admite-os mas rodeia-os de um amplo conjunto de limitações e

constrangimentos, apenas permitindo que se movam num reduzidíssimo

campo de acção.

Os argumentos que as justificam confundem-se com aqueles que os legitimam

forçando demasiadas vezes a incoerências ao pensamento do intérprete.

Talvez se aproxime o momento que exige uma clara opção, com todos os

riscos a esta inerentes, consistindo ou na aceitação numa acepção plena

destes acordos, ou emendando a mão e proibindo-os. A dificuldade subjacente

à escolha não deve merecer uma omissão, não deve fazer recear uma tomada

de posição.

A dicotomia relacionada com a admissibilidade destes acordos é sublimemente

evocada por FERNANDO GALVÃO TELES quando afirma que “os contratos

para-sociais correspondem assim a um instrumento útil a que se recorre para

suprir as deficiências da lei e para atender muitas vezes às prementes

necessidades da prática, protegendo interesses legítimos das partes no seio da

sociedade. Mas não deixam, todavia, de representar um risco grave que resulta

tanto da circunstância de efectiva e realmente vigorar um regulamento da

sociedade diferente daquele que a publicidade imposta por lei tornou

conhecido”260.

Defendo a necessidade de questionar se os acordos parassociais

correspondem ou não a uma necessidade premente da vida económica; quem,

como nós, aplaude esta posição, e na esteia de ASCARELLI sustenta estar

feita a prova que a vida os não pode dispensar, não pode escamotear que “no

260 Ob. cit. pp. 75.

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domínio do direito comercial, dada a sua especial relação com a economia,

deve o intérprete atender aos efeitos práticos das soluções que propõe,

averiguar se elas são susceptíveis de promover o progresso, a dinamização e a

circulação da riqueza”261

Concordando com as premissas apresentadas o caminho exigível consiste em

alargar a aplicabilidade destes acordos, conferindo juridicidade a situações

vigentes na vida económica e social.

Defendemos jus constituedo a oponibilidade destes acordos à sociedade,

vinculando esta ao seu cumprimento; o que se afirma, nada tem de inovador,

não sendo mais que a defesa da intervenção do legislador na regulamentação

de uma temática já existente na prática; os sócios que pretendem agrupar-se

desta forma tem meios de torna-los inquebráveis; SGPS, compropriedade,

usufruto, cessão legitimadora, a estatuição de uma sanção penal exemplar. Por

outro prisma, o que nesta sede se exige é a generalização de uma norma que

já existe, mas privativa das instituições de crédito.

Com efeito, consideramos axiomática a constatação da inexistência de efeitos

perversos naquelas entidades decorrentes da oponibibilidade destes acordos, o

que reforça a nossa convicção na utilidade de passar a norma excepcional do

art.º 111 para direito comum, e assim, aplica-la a todos os tipos sociais.

Sustentamos, que o actual quadro legal vigente apenas aproveita àqueles que,

apesar de validamente se vincularem se pretendem eximir às suas obrigações,

conduta que não merece protecção legal.

261 ANTÒNIO AGOSTINHO CAEIRO, ob. cit. pp.205-206.

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