a feminizaÇÃo da violÊncia contra o idoso · expressada como negligência, abuso financeiro,...
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
FACULDADE INTEGRADA AVM
A FEMINIZAÇÃO DA VIOLÊNCIA CONTRA O IDOSO
Por: Marcela Lobo de Castro
Orientador
Prof. Eduardo Brandão
Rio de Janeiro
2011
UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
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PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
FACULDADE INTEGRADA AVM
A FEMINIZAÇÃO DA VIOLÊNCIA CONTRA O IDOSO
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em psicologia
Jurídica
Por:. Marcela Lobo de Castro
3
4
AGRADECIMENTOS
....à Deus, à minha família, amigos e
colegas de trabalho pelo apoio e
confiança.
5
DEDICATÓRIA
.....dedica-se ao meu pai Roberto, à
minha mãe Fatima e ao meu irmão Tiago
por serem minha força e inspiração.
6
RESUMO
Este trabalho tem como objetivo abordar a questão da violência contra a
pessoa idosa passando pelo recorte de gênero. A questão do envelhecimento
e suas implicações e a predominância do feminino neste segmento
populacional são analisados com base em levantamento bibliográfico e na
análise de dados coletados de relatórios sociais realizados no ano de 2010 de
situações que envolviam maus tratos a idosos.
A partir destes dados concluímos que a população feminina é a que
mais sofre maus tratos, na maioria das vezes por seus próprios familiares.
Assim, analisaremos as possíveis causas que levam as mulheres idosas a
serem vitimizadas.
Palavras Chave: Idoso, violência contra idoso, gênero
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METODOLOGIA
O presente trabalho foi realizado através de pesquisa bibliográfica que
versam sobre o tema e sobre os assuntos que a ele se relacionam e aqui
destacamos como autores Maria Cecília Minayo, Ana Maria Goldani e Ana
Amélia Camarano. Além disso, foi utilizada a análise de dados coletados a
partir dos relatórios realizados no ano de 2010, pelos profissionais de Serviço
Social que atuam prestando assessoria às Promotorias de Justiça de Proteção
ao Idoso e à Pessoa com Deficiência do Ministério Público do estado do Rio de
Janeiro.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
CAPÍTULO I - O envelhecimento populacional: suas causas e conseqüências
I.I – A Feminização da Velhice
CAPÍTULO II - A violência contra a pessoa idosa
CAPÍTULO III – Dialogando com a realidade: a experiência no Ministério
Público do Estado do Rio de Janeiro
CAPÍTULO III.I - O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro CAPÍTULO III.II – Análise de dados CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA
ÍNDICE
FOLHA DE AVALIAÇÃO
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INTRODUÇÃO
O tema da presente monografia é a Violência contra a pessoa idosa
com recorte de gênero. Este trabalho se baseia na experiência profissional
como assistente social no Ministério público do estado do Rio de Janeiro, mas
especificamente na assessoria aos promotores de justiça nos casos que
envolvem maus tratos a idosos, percebemos que as idosas são mais
vitimizadas.Esta violência geralmente é praticada por um familiar e pode ser
expressada como negligência, abuso financeiro, físicos, psicológicos e/ou
abandono.
A questão do envelhecimento vem ganhando espaço no debate
contemporâneo em virtude do aumento da longevidade populacional, o que
acarreta a redefinição das relações sociais, das responsabilidades familiares e
das políticas públicas.
Como população vulnerável, a violência contra os idosos deve ser
encarada como uma questão social a ser discutida e enfrentada. Em 2003 o
Estatuto do Idoso vem para regulamentar os direitos dos idosos e servir de
instrumento legal para a questão dos maus tratos. Tais violências tem sérias
conseqüências para a vida do idoso tanto para sua saúde física e mental como
para o seu convívio social. Por isso, a importância em se discutir o referido
tema, mais especificamente a relação de gênero, para se pensar formas de
enfrentamento.
No capítulo I pretendemos discutir o envelhecimento populacional, suas
causas e conseqüências, com destaque para a feminização da velhice.
No capítulo II vamos discutir sobre a violência contra a pessoa idosa
perpassando sobre o conceito de velhice e pelas novas configurações
familiares.
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No capítulo III, primeiramente vamos expor sobre o que é o Ministério
Público e qual o seu papel no que tange a proteção a população idosa. Na
segunda parte faremos a análise dos dados.
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Capítulo I
Envelhecimento populacional, suas causas e
conseqüências.
Em virtude dos impactos gerados pelo fenômeno do envelhecimento da
população mundial e, conseqüentemente, dos significados da velhice e do
processo de envelhecimento em nossa sociedade, pode-se perceber um
interesse progressivo sobre esta temática. Segundo o censo de 2010, a
população idosa é a que mais cresceu na última década.
No censo realizado há dez anos, a população idosa representava 8% da
população total. No censo de 2010 essa porcentagem chegou a 12%. Pelas
projeções, espera-se que em 2050 o Brasil tenha uma pirâmide etária
semelhante à da França, com uma população de idosos tão grande
quantitativamente falando quanto a de jovens, processo resultante de uma
baixa taxa de fertilidade e uma elevada expectativa de vida.
Com base na PNAD 2009 podemos traçar um breve perfil desta
população. As mulheres são a maioria (55,8%), assim como os brancos
(55,4%), e 64,1% ocupam a posição de pessoa de referência no domicílio. A
escolaridade dos idosos brasileiros é ainda considerada baixa: 30,7% tem
menos de um ano de instrução. Pouco menos de 12,0% vivem com renda
domiciliar per capita de até ½ salário mínimo e cerca de 66% já se
encontravam aposentados.
Este envelhecimento populacional se expressa de várias formas
acarretando conseqüências no mercado de trabalho, saúde, família, habitação
dentre outros.
12
As transformações ocorridas na família como a queda na taxa de
fecundidade, o que acarreta em famílias menores, e a entrada da mulher no
mercado de trabalho implica em alterações no papel desempenhado pela
família no suporte e apoio a pessoa idosa.
A família Brasileira tem se modificado com a modernização da
sociedade. Novos arranjos familiares surgiram. Segundo Sarti
“No mundo contemporâneo, as mudanças ocorridas
na família relacionam-se com a perda do sentido da
tradição. Vivemos numa sociedade onde a tradição vem
sendo abandonada como em nenhuma outra época da
história. Assim o amor, o casamento, a família, a
sexualidade, e o trabalho, antes vividos a partir de papéis
pré-estabelecidos, passam a ser concebidos como parte de
um projeto em que a individualidade conta decisivamente e
adquire cada vez mais importância social”. (2006, 43)
Dentre as mudanças observadas no cenário social contemporâneo, as
alterações pelas quais a instituição familiar vem passando merecem ser
observadas, desde a diversificação de arranjos familiares à inserção das
mulheres no mercado de trabalho, o que compromete o desempenho de um
dos papéis que lhe foram postos historicamente: destinar atenção aos
familiares dependentes de cuidados diários, o que contempla os idosos.
Outros fatores ainda devem ser destacados, tais como: famílias que
careçam de condições econômicas, pessoas com extensa jornada de trabalho
ou com mais de um vínculo empregatício, fragilidade psicológica de familiares,
idosos que cuidam de idosos etc. Todos estes elementos influenciam
diretamente no cuidado ao idoso no âmbito familiar.
13
Segundo o IBGE1, 45% das pessoas com mais de 60 anos viviam em
2007 com seus filhos e netos na condição de chefes de família, sendo que
para 53 % dessas famílias a contribuição das aposentadorias representava
metade do total da renda familiar. Observamos assim, que existe uma
inversção dos papéis sociais nas famílias brasileiras na medida em que os
filhos dependem mais dos pais idosos, pois diante do aumento do desemprego
e do trabalho informal a casa dos pais se tornou lugar de suporte
socioeconômico.
O processo de envelhecimento não vem acompanhado de uma
adaptação, do ponto de vista social, político e econômico. Os países em
desenvolvimento ainda não se encontram preparados para o impacto que tal
mudança pode causar aos diversos seguimentos da sociedade. Em
decorrência, diversos conflitos se estabelecem sejam de ordem familiar,
econômica, política, previdenciária, social, de gênero ou de saúde.
A velhice quando entendida como um processo “homogêneo e a-
histórico” (GOLDMAN, 2006, p. 162) é vivenciada de formas diferentes pelos
indivíduos, de acordo com a classe social que estão inseridos e suas
condições de vida.
Ao chegar à velhice, os indivíduos enfrentam além das dificuldades
físicas, sensoriais e decorrentes de problemas de saúde, problemas de
adaptação relativos a aspectos sociais, culturais e psíquicos relativos à
questão do envelhecimento. Estes aspectos são intensificados em uma
sociedade capitalista, que os exclui do mercado de trabalho e cujas famílias
afetadas pelas expressões da questão social, os renegam a segundo plano, no
seu interior, e no restante da sociedade.
Na última pesquisa realizada pelo IBGE verificamos a prevalência de
mulheres na faixa etária dos 60 aos 94 anos. Em função dos diferenciais de
1 Síntese dos Indicadores sociais, 2008
14
mortalidade por sexo, o envelhecimento tende a assumir maior projeção entre
as mulheres. Portanto, discutir sobre envelhecimento populacional implica em
discuti-lo numa perspectiva de gênero.
Segundo Debert (1994), a velhice é uma experiência coletiva, diferente
para mulheres e homens. “A velhice não tem o mesmo sentido nem as
mesmas conseqüências para os homens e para as mulheres.” (BEAUVOIR,
1990, p. 104).
Esta diferença se expressa de forma concreta nos tipos de arranjos
familiares. As mulheres idosas, em sua maioria, tiveram uma trajetória de vida
marcada pela pouca escolarização, baixa inserção no mercado de trabalho
formal, baixa qualificação profissional, e um ambiente sócio-cultural marcado
pela forte ideologia de gênero que prescreve um papel subalterno a mulher na
sociedade.
A mudança na estrutura familiar e nas relações de gênero interferem no
cuidado e atendimento a pessoa idosa, à medida que a mulher assume cada
vez mais uma vida profissional em detrimento de seu papel tradicional de
cuidado dos membros da família.
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Homens e mulheres sofrem perdas com a idade, enfrentam
preconceitos, mas os recursos que contam para enfrentar o envelhecimento
são distintos. As mulheres acumulam todas as desvantagens vividas ao longo
de sua trajetória de discriminação e desigualdades estruturais. No Brasil, a
maioria não teve trabalho remunerado e conta com benefícios mínimos de
aposentadoria. Mesmo as que trabalharam, essas tiveram salários
equivalentes à metade ou pouco mais que os dos homens e acabam como as
mais dependentes e pobres entre os idosos.
As mulheres costumam viver mais que os homens e por isso tendem a
se tornarem dependentes em virtude de doenças crônicas. Além disso, em
razão dos homens morrerem antes, as mulheres tendem a ficar sós. Assim,
citando GOLDANI (1999):
“ao falarmos dos problemas dos idosos se está
falando, sobretudo, dos problemas das mulheres. Isso
porque muitos dos problemas dos idosos estão
relacionados com o fato deles estarem sós e dependentes,
condição típica de muitas mulheres idosas brasileiras”.
As mulheres idosas enfrentam uma problemática muito particular na
sociedade atual, o que as coloca, em uma posição de fragilidade e de
vulnerabilidade. Diferem de outros grupos de idade quanto ao nível de
educação formal (escolaridade), tendo normalmente menos anos completos de
escola do que outros grupos. Geralmente possuem menor qualificação
profissional para conseguir emprego do que os grupos mais jovens e do que os
grupos de homens idosos. Diferem em relação ao estado civil, sendo na sua
maioria, viúvas e, portanto, muitas vezes, chefes de família.
16
Capítulo II
A Violência contra a pessoa idosa
“A violência contra o idoso faz parte da violência
social, ou seja, no Brasil e no mundo, ela se expressa nas
formas como a sociedade organiza suas relações de
classe, de gênero, de etnias e de grupos etários e de como
o poder é exercido nas esferas macro e micropolíticas e
institucionais. Nesse caso concreto, as relações no interior
da instituição familiar têm relevância peculiar.”
Maria Cecília Minayo
O crescimento populacional deste seguimento vem dar mais visibilidade
social e maior relevância na expressão de suas necessidades. De acordo com
Freitas et al (2006) além do acentuado envelhecimento da população, o
aumento da expectativa de vida que em consequencia aponta para um número
cada vez maior de pessoas com algum tipo de declínio funcional e cognitivo; a
nuclearização familiar associada ao empobrecimento da população; e a
escassez de suporte comunitário e de serviços assistenciais adequados aos
idosos incapacitados são fatores de risco para a ocorrência de violência contra
os idosos.
Simone de Beauvoir (1990) caracteriza a velhice como uma “totalidade
complexa” que é determinada tanto pela questão biológica, mas também por
uma questão cultural revestida de conteúdos simbólicos. O modelo social dos
velhos se constrói pela contraposição a identidade de jovem.
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A identidade de velho é produzida e reproduzida, com todos os seus
significados depreciativos, na relação com o outro e pelo outro, e este outro é o
não velho.
Bauman (1999) assinala para o paradigma da simplificação do
complexo, baseado no princípio da separação e classificação. Surgem
classificações que passam a habitar a fala cotidiana, sob a forma de
dualismos, tais como aqueles ligados à idade (juventude e velhice), ao gênero
(masculino e feminino), ao valor (bondade e maldade) e ao juízo (racional e
irracional), entre outros.
Trata-se, portanto, da criação de mecanismos discriminatórios que
consistem em conferir às coisas e aos indivíduos um significado que consiga
abarcar o que devem ser ou vir a ser. Nesse sentido, categorias são impostas,
cabendo aos indivíduos aceitá-las e identificarem-se com elas a fim de serem
reconhecidos e de se reconhecerem (Goffman, 1988).
É interessante observar que as forças sociais e históricas que
contribuíram para essa separação não são reveladas. As diferenças e limites
entre essas categorias, embora arbitrariamente estabelecidos, são
apresentados como naturais e universais (Bourdieu, 1996). Os elementos são
dissociados e isolados, sendo ignorados o conjunto e a totalidade dos
fenômenos e, portanto, sua complexidade.
A convivência dos idosos com indivíduos mais jovens e a dependência
obrigatória podem gerar conflitos tanto no âmbito familiar, institucional e no
convívio social.
O conflito de interesses intrageracionais pode levar a prática de
violência contra o idoso, na medida em que este é considerado um sujeito
improdutivo, dependente e obsoleto, do ponto de vista cultural (aquele que não
acompanha as novas tecnologias e as novas visões de mundo) tornando-se
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um ser marginalizado, excluído o que desperta nos jovens o desejo coletivo
inconsciente de sua morte.
Em seu trabalho sobre violência e envelhecimento, Herrera (2004) cita a
relação de invisibilidade estabelecida com o idoso, onde seus familiares
desconhecem o seu ser, ter e sentir, faltando com o reconhecimento social,
político e finalmente, pessoal, desrespeitando sua individualidade, capacidade
de decisão, participação e exigência de seus direitos.
“A construção de um ambiente doméstico onde a
velhice não seja percebida de maneira negativa, e onde as
necessidades do idoso possam acompanhar o ritmo e
estilo de vida dos demais integrantes da família requer
adaptações que perpassam o caminho que pode levar a
situações de risco.” ( Bruno, 2005: 02)
A Rede Internacional para Prevenção dos Maus Tratos contra o idoso
adotou a seguinte definição para a violência contra o idoso: “uma ação única
ou repetida, ou ainda a ausência de uma ação devida, que cause sofrimento
ou angústia, e que ocorra em uma relação em que haja expectativa de
confiança” (1995 apud MINAYO, 2005, 13)
Baseando-se em MINAYO (2005), tais atos podem ocorrer através de
maus-tratos físicos, maus-tratos psicológicos, abuso financeiro ou material,
abuso sexual, negligência, abandono, e auto-abandono ou autonegligência.
Além da violência institucional que
“(...) se realiza como uma forma de agressão
política, cometida pelo estado, em nível
macrossocial, e, de maneira mais específica, nas
19
instituições públicas de prestação de serviços e nas
públicas e privadas de longa permanência”.
Muitas vezes o convívio entre as gerações é imposto pelo
empobrecimento da população, em especial nos grandes centros urbanos, o
qual soma-se a sobrecarga de tarefas impostas às mulheres e a ausência de
políticas públicas que auxiliem e atuem como facilitadoras das relações
domésticas.
Salientamos também que o conflito entre as gerações são conseqüência
das relações de autoridade e de poder e são inerentes à realidade familiar,
uma vez que ela é atravessada por sentimentos contraditórios como amor e
ódio, generosidade e avareza, solicitude e descaso. (Peixoto, 2009)
Considerando a literatura consultada (MINAYO) que versa sobre esta
temática, a família é hoje a maior causadora de violência contra o idoso, seja
através do abuso financeiro, negligência, maus tratos físico e/ou psicológicos.
A dependência econômica dos filhos adultos dos pais idosos é muito
comum e consiste em fator de risco, assim como a dependência do idoso, por
adoecimento, também gera aspectos negativos na relação familiar em virtude
do aumento do desgaste físico e emocional dispensado pelos cuidadores,
principalmente com a conjuntura familiar contemporânea: menor número de
filhos, divórcios, inserção das mulheres no mercado de trabalho e diminuição
do poder aquisitivo.
A involução do idoso à dependência pode acarretar uma situação em
que ele passa a ser infantilizado pelas pessoas a sua volta, sendo
progressivamente afastado da tomada de decisão. O idoso, nessa condição,
pode ser relegado ou até superprotegido de modo indesejável, criando-se uma
20
imagem e uma auto imagem de impotência. Sobre isso, Beauvoir (1990)
assinala que
“A tristeza das pessoas idosas não é provocada por
um acontecimento, ou por circunstâncias singulares: ela se
confunde com o enfado que as devora, com o amargo e
humilhante sentimento de sua inutilidade, de sua solidão
no seio de um mundo que só lhes tem indiferença. A
decadência senil não é apenas penosa de suportar em si
mesma, mas põe o homem idoso em perigo no mundo”.
A visibilidade sobre a velhice coloca a violência contra os idosos como
uma questão social que precisa ser enfrentada como uma questão mais ampla
de construção da cidadania em um ambiente democrático.
A implementação do estatuto do Idoso vem para regular os direitos às
pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos, estabelecendo não
só a obrigação dos governos municipais e estaduais, e também do Poder
Judiciário e do Ministério Público, e aplicá-las na sociedade.
O Estatuto do Idoso tem finalidades protetiva e assistencial, traduzidas
na promoção do atendimento das necessidades básicas das pessoas idosas.
Foi conferido ao Ministério público o restabelecimento do princípio da
igualdade aos idosos e, desse modo, resgatar sua cidadania, com vistas à
proteção dos interesses sociais e individuais indisponíveis.
As promotorias de justiça são órgãos públicos que prestam serviços à
comunidade na defesa de seus legítimos interesses. O Promotor de Justiça
moderno deve ser o sucessor do tribuno do povo, livre, prudente e
independente, corajoso e audaz.
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A atuação do Ministério Público na tutela dos direitos individuais
indisponíveis dos idosos se dará quando houver situação de risco social a
pessoa idosa e competindo adotar providências na impossibilidade de idoso
fazê-lo e na falta dos familiares.
As Promotorias de Justiça de Proteção ao Idoso e às Pessoas com
Deficiência, espalhadas nos diversos municípios do estado do Rio de Janeiro,
atreladas ao 3º Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça
Cíveis, apuram os fatos envolvendo maus-tratos e desrespeito a idosos,
expostos a situação de risco; assim como fiscalizam entidades incumbidas de
trabalhar diretamente com idosos.
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Capítulo III
Dialogando com a realidade: a experiência no Ministério
Público do Estado do Rio de Janeiro
CAPÍTULO III.I – O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro
A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 define o
Ministério Público2 como uma instituição defensora dos interesses coletivos,
difusos, sociais e individuais indisponíveis, atribuindo-lhe, dentre outras, a
função de "zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de
relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo as
medidas necessárias a sua garantia" (BRASIL, 1988, artigos 127 e 129).
Mas nem sempre foi assim. Nos textos constitucionais anteriores à
Constituição Cidadã, fruto do desenvolvimento do estado brasileiro e da
democracia, ora Ministério Público aparece, ora não é citado. Esta
inconstância decorre das oscilações entre os regimes democráticos e regimes
autoritários/ditatoriais, conforme pode ser observado abaixo:
Constituição de 1824
Não faz referência expressa ao Ministério Público. Estabelece que “nos juízos dos crimes, cuja acusação não pertence à Câmara dos Deputados, acusará o procurador da Coroa e Soberania Nacional”.
Não faz referência expressa ao Ministério Público. Dispõe sobre a escolha do Procurador-Geral da República e a sua iniciativa na revisão
2 De acordo com a CRFB/88, abrange o Ministério Público da União (compreende o Ministério Público Federal, o Ministério Público do Trabalho, o Ministério Público Militar e o Ministério Público do Distrito Federal e Territórios) e os Ministérios Públicos Estaduais.
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Constituição de 1891 criminal
Constituição de 1934
Não faz referência expressa ao Ministério Público no capítulo “Dos órgãos de cooperação”. Institucionaliza o Ministério Público. Prevê lei federal sobre a organização do Ministério Público da União.
Constituição de 1937 Não Faz referência expressa ao Ministério Público. Diz respeito ao Procurador-Geral da República e ao quinto constitucional
Constituição de 1946 Faz referência expressa ao Ministério Público em título próprio (artigos 125 a 128) sem vinculação aos poderes.
Constituição de 1967 Faz referência expressa ao Ministério Público no capítulo destinado ao Poder Judiciário.
Emenda Constitucional de 1969 Faz referência expressa ao Ministério Público no capítulo destinado ao Poder Executivo
Constituição de 1988
Faz referência expressa ao Ministério Público no capítulo “Das funções essenciais à justiça”. Foi na área cível que o MP adquiriu novas funções, dando evidência à instituição, tornando-a uma espécie de Ouvidoria da sociedade brasileira.
O novo papel atribuído constitucionalmente ao Ministério Público
destacando-lhe funções diversas, a fim de preservar a boa qualidade de vida
do povo brasileiro, é um indicativo da necessidade de se enfrentar a atual
complexidade da sociedade, que se apresenta nos profundos conflitos sociais.
Diante da condição econômica e política do Brasil, fica mais difícil implementar
os direitos sociais. Faria (1994:105):
“Ao contrário da maioria dos direitos individuais
tradicionais, cuja proteção exige apenas que o Estado
jamais permita sua violação, os direitos sociais não
podem simplesmente ser ‘atribuídos’ aos cidadãos; cada
24
vez mais elevados à condição de direitos constitucionais,
os direitos sociais requerem do Estado um amplo rol de
políticas públicas dirigidas a segmentos específicos da
sociedade - políticas essas que têm por objetivo
fundamentar esses direitos e atender às expectativas por
eles geradas com sua positivação.”.
Por isso, cada vez mais o Poder Judiciário e o Ministério Público vêm
intervindo a fim de que esses direitos sejam garantidos, bem como a sua
execução
“Diferentemente do Judiciário – que atua mediante
provocação – o Ministério Público pode agir por iniciativa
própria, sempre que considerar que os interesses sociais
estejam ameaçados. Ou então, pode ser acionado por
qualquer cidadão que considerar que algum direito ou
princípio jurídico esteja sob ameaça”. (Moraes, 2003).
O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, cujos princípios
institucionais são a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional,
conta com órgãos de administração superior (a Procuradoria-Geral de Justiça,
o Colégio de Procuradores de Justiça, o Conselho Superior do Ministério
Público), órgãos de administração (as Procuradorias de Justiça e as
Promotorias de Justiça) órgãos de execução (o Procurador-Geral de Justiça –
chefe administrativo -, o Conselho Superior do Ministério Público, os
Procuradores de Justiça e os Promotores de Justiça) e órgãos auxiliares (Os
Centros de Apoio Operacional, a Comissão de Concurso, o Centro de Estudos
e Aperfeiçoamento Funcional, os órgãos de apoio administrativo e os
estagiários). Na defesa dos direitos constitucionais, a instituição atua nas mais
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diversas áreas: criminal, eleitoral, execução penal, infância e juventude,
fundações e cível3, nesta incluindo-se a tutela individual da pessoa idosa.
As Promotorias de Justiça de Proteção ao Idoso e à Pessoa com
Deficiência atuam na defesa dos direitos transindividuais de idosos e de
pessoas com deficiência. Desempenham, ainda, a tutela individual do idoso em
situação de risco social, à qual implica a propositura de demandas diversas,
como as ações de interdição, de registro tardio e de alimentos e a aplicação de
medidas protetivas.
Em síntese, a tutela individual da pessoa idosa dar-se-á sempre que
seja configurada situação de risco social, a qual represente violação, ou ainda,
uma ameaça aos direitos previstos no Estatuto do Idoso por:
I – ação ou omissão da sociedade ou do Estado;
II – por falta, omissão ou abuso da família, curador ou entidade de
atendimento;
III – em razão da condição pessoal4.
Sendo verificada qualquer uma das hipóteses anteriores, são aplicáveis
as medidas de proteção ao idoso, as quais estão previstas na Lei 10.741/2003,
as quais seguem:
I – encaminhamento à família ou curador, mediante termo de responsabilidade;
II - orientação, apoio e acompanhamento temporários;
III – requisição para tratamento de sua saúde, em regime ambulatorial,
hospitalar ou domiciliar;
3 Como já foi dito o MP conta com Centros de Apoio Operacional em sua organização, dentre os quais está o 3º Centro de Apoio Operacional Cível cuja função é prestar auxílio aos Promotores de Justiça com atribuição nas matérias de família, de registros, fazendária, cível, orfanológica, sucessória, empresarial, acidentária e fundacional. Recentemente, sua esfera de atuação foi ampliada para abranger, ainda, a tutela individual da pessoa idosa. 4 Conforme art. 43 do Estatuto do Idoso.
26
IV – inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e
tratamento a usuários dependentes de drogas lícitas ou ilícitas, ao próprio
idoso ou à pessoa de sua convivência que lhe cause perturbação;
V – abrigo em entidade;
VI – abrigo temporário.
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CAPÍTULO III.II – Análise dos dados
A equipe de serviço social que está lotada no 3º CAOP-Cível tem como
uma de suas atribuições prestar assessoria técnica aos promotores de justiça,
através de relatórios e pareceres gerados a partir de entrevistas, visitas
domiciliares e institucionais, com o objetivo de verificar possíveis situações de
risco e/ou vulnerabilidade social vivenciadas por pessoas idosas, pessoas com
deficiência e/ou transtorno mental.
Foram analisados 76 relatórios elaborados no ano de 2010. Todos
foram solicitados pelas Promotorias de Justiça de Proteção ao Idoso e à
Pessoa com Deficiência do município do Rio de Janeiro e envolviam situações
de possíveis maus tratos a idosos.
Deste total, 62 apontavam as idosas como vitimas (81,5%), sendo que
em 08 casos envolviam casais de idosos. Podemos assinalar que as mulheres
são as vitimas preferenciais em razão da histórica marginalização a qual este
gênero está submetido.
“A mulher idosa é universalmente maltratada
e vista como uma carga. É parte de uma maioria invisível
cujas necessidades emocionais, econômicas e físicas
permanecem, em sua maioria, ignoradas. Pode-se
assinalar, sem dúvida, que a velhice se feminilizou,
converteu- se em um assunto de mulheres. O fato mais
significativo e simples sobre a velhice é que a população
idosa é predominantemente feminina.” (SALGADO, 2002)
Ainda no levantamento dos dados, do grupo de mulheres vitimizadas,
90% estão acima da faixa etária dos 70 anos. Realizando um cruzamento com
o dado referente à dependência funcional, percebemos que 52% das idosas
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são dependentes para a realização das atividades básicas e instrumentais de
sua vida diária. Além disso, há a dependência econômica, 77% das idosas são
responsáveis pelo sustento do domicílio.
A relação de dependência do idoso e sua família aumenta a
proximidade, o que pode causar aspectos positivos e negativos. Se a
dependência for em razão de adoecimento, as chances de aumento de
estresse, cansaço físico e emocional e sobrecarga da família se elevam e
complica a relação. A convivência e a co-dependencia pode gerar conflitos que
resultam em violência.
74% residem com filhos ou netos. As demais residiam sozinhas, com a
amigas ou com seu cônjuge. Não houve nenhum caso de recasamento. Este
dado sinaliza que, sejam elas viúvas, solteiras ou separadas, a mulher vive na
velhice sozinha ou dentro do mesmo esquema de funções e responsabilidades
no interior da família, cuidando da casa, de netos, filhos e etc.
Segundo Goldani (1999), as chances de as mulheres idosas viúvas
recasarem são muito poucas porque se tem observado que a disponibilidade
de parceiros é muito pequena. Isso porque os homens mais velhos com quem
normalmente se casariam morrerem em maior quantidade, mas também
porque as diferenças de idade ao casar, entre homens e mulheres, aumentam.
29
CONCLUSÃO
A mudança na distribuição etária de uma população altera o perfil das
políticas sociais exigindo estratégias e implementação de benefícios, serviços,
programas e projetos relacionados a promoção dos direitos dos idosos. Ainda
mais quando se percebe que estes idosos estão sendo vitimas de abandono e
maus tratos por seus próprios familiares. A violência praticada contra os idosos
em seus domicílios é uma realidade grave e complexa, e precisa ser
enfrentada pelos diferentes atores sociais, mas principalmente na
responsabilidade do estado em promover políticas públicas que apóiem
diretamente as pessoas de mais idades, bem como as suas famílias.
Existem hoje dispositivos legais e normativos para o enfretamento da
violência. No entanto a uma imensa distância entre as leis e portarias e sua
implementação. Muitas transformações previstas implicam em mudanças de
hábitos, usos e costumes, portanto, outra mentalidade.
Além disso, deve ser estimulada a formação de uma verdadeira rede de
proteção e atendimento ao idoso A interlocução entre todos esses órgãos e
instituições torna-se essencial para a garantia dos direitos dos idosos, bem
como para a inserção nos orçamentos dos recursos necessários para o
atendimento das demandas das pessoas idosas. O maior antídoto contra a
violência é a ampliação da inclusão na cidadania.
A feminização da violência contra o idoso deve ser considerada ao ser
pensado forma de enfrentamento, pois esta população possui algumas
especificidades que requerem atenção diferenciada, assim como não se pode
discutir esta temática sem considerarmos as configurações familiares
contemporâneas, na medida em que a família funciona como a mais próxima
instituição de apoio e ao mesmo tempo a maior responsável pelos maus tratos.
30
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32
SARTI, Cynthia Andersen. A família como espelho: um estudo sobre a moral
dos pobres. São Paulo: Cortez Editora, 2006.
33
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 2
AGRADECIMENTO 3
DEDICATÓRIA 4
RESUMO 5
METODOLOGIA 6
SUMÁRIO 7
INTRODUÇÃO 8
CAPÍTULO I
(TÍTULO) 11
1.1 - A Busca do Saber 12
1.2 – O prazer de pesquisar 15
1.2.1 - Fator psicológico 15
1.2.2 - Estímulo e Resposta 17
CONCLUSÃO 48
ANEXOS 49
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 52
BIBLIOGRAFIA CITADA 54
ÍNDICE 55
34
FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição:
Título da Monografia:
Autor:
Data da entrega:
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