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1 A IMAGEM DIGITAL DO CELULAR OU LUPA ÓPTICA? OS RECURSOS TECNOLÓGICOS NAS AULAS DE ARTES Maria Cristina Blanco 1 Universidade de São Paulo Escola de Com. e Artes [email protected] RESUMO Este trabalho tem por objetivo analisar de que maneira as novas tecnologias de telefonia móvel, tornou-se um recurso que possibilita de forma social e democrática o acesso a informação. (HORST: MILLER, 2006). Os desdobramentos dessas possibilidades enriquecem de certa forma as metodologias educativas. Sendo as aulas de Artes, no ensino básico uma disciplina que desfruta destes recursos. Observou-se junto aos jovens alunos do ensino médio, como eles utilizam estes recursos contemporâneos. A questão central na verdade não é a forma como as tecnologias digitais se suplantam as formas tradicionais (ou mesmo métodos físicos), mas sim como uma pode colaborar e complementar em relação à outra. De certa maneira notou-se na pesquisa como o avanço tecnológico destes aparelhos possibilitou uma infinidade de recursos explorados pelos jovens na aprendizagem da Arte. Palavras chave: Ensino da arte, leitura da obra, novas tecnologias ABSTRACT This work has the objective of analyzing the way which mobile telephone technology is becoming a social and democratic resource to reach information.(HORST: MILLER, 2006).The appearing of these possibilities can also create, in some way, richer educational possibilities. The Art Education classes, during the basic education, are gifted with such resources. It’s been noticed among high school students, a continuous use of these contemporaneous resources. The central question, however, is not about the way digital technology has taken the place of the traditional methods (or even physical methods), but how both technology and methods can collaborate and complement each other. Somehow it’s been noticed in a research that, has created an infinity of resources, which can be explored by young Art students and help immensely the discoveries in this field of education. This has been noticed not only on formal learning places, but also on informal ones. Keywords: Teaching of art, reading of work art, new technologies 1.1 Introdução No mundo contemporâneo nota-se a presença cada vez mais acirrada da busca pelas informações digitais, que se fazem necessária tanto para o educador como para educandos. A era digital tem tocado a todos e mudado substancialmente o papel social da informação dentro desse contexto. 1 Estudante de Pós-Graduação , nível doutorado da Escola de Comunicações e Artes da USP, orientanda da profa Dra Maria Christina de Souza Lima Rizzi.

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1

A IMAGEM DIGITAL DO CELULAR OU LUPA ÓPTICA?

OS RECURSOS TECNOLÓGICOS NAS AULAS DE ARTES

Maria Cristina Blanco1

Universidade de São Paulo – Escola de Com. e Artes

[email protected]

RESUMO

Este trabalho tem por objetivo analisar de que maneira as novas tecnologias de telefonia móvel,

tornou-se um recurso que possibilita de forma social e democrática o acesso a informação. (HORST:

MILLER, 2006). Os desdobramentos dessas possibilidades enriquecem de certa forma as

metodologias educativas. Sendo as aulas de Artes, no ensino básico uma disciplina que desfruta destes

recursos. Observou-se junto aos jovens alunos do ensino médio, como eles utilizam estes recursos

contemporâneos. A questão central na verdade não é a forma como as tecnologias digitais se

suplantam as formas tradicionais (ou mesmo métodos físicos), mas sim como uma pode colaborar e

complementar em relação à outra. De certa maneira notou-se na pesquisa como o avanço tecnológico

destes aparelhos possibilitou uma infinidade de recursos explorados pelos jovens na aprendizagem da

Arte.

Palavras chave: Ensino da arte, leitura da obra, novas tecnologias

ABSTRACT

This work has the objective of analyzing the way which mobile telephone technology is becoming a

social and democratic resource to reach information.(HORST: MILLER, 2006).The appearing of these

possibilities can also create, in some way, richer educational possibilities. The Art Education classes,

during the basic education, are gifted with such resources. It’s been noticed among high school

students, a continuous use of these contemporaneous resources. The central question, however, is not

about the way digital technology has taken the place of the traditional methods (or even physical

methods), but how both technology and methods can collaborate and complement each other.

Somehow it’s been noticed in a research that, has created an infinity of resources, which can be

explored by young Art students and help immensely the discoveries in this field of education. This has

been noticed not only on formal learning places, but also on informal ones.

Keywords: Teaching of art, reading of work art, new technologies

1.1 Introdução

No mundo contemporâneo nota-se a presença cada vez mais acirrada da busca pelas

informações digitais, que se fazem necessária tanto para o educador como para educandos. A

era digital tem tocado a todos e mudado substancialmente o papel social da informação dentro

desse contexto.

1 Estudante de Pós-Graduação , nível doutorado da Escola de Comunicações e Artes da USP, orientanda da profa

Dra Maria Christina de Souza Lima Rizzi.

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O professor contemporâneo faz usos destes recursos instrucionais ainda hoje e

incorpora as novas tecnologias digitais. Nessa afirmação não deve sugerir que as novas

tecnologias eletrônicas devam suplantar as antigas, pois são estas que podem trabalhar em

parceria com as ditas “novas”. Segundo aponta a UNESCO, (2013) as possíveis razões pela

busca desta tecnologia de informação:

De acordo com o guia publicado pela UNESCO, entre os motivos para o

uso de tecnologias móveis estão: permite que se aprenda em qualquer hora

e lugar; dá suporte a aprendizagem in loco; provê avaliação e feedback

imediatos; melhora a aprendizagem contínua e amplia o alcance e a

equidade em educação. Dentre os dispositivos que podem entregar/suportar

o Mobile Learning, o telefone celular é sem dúvida o mais popular e

acessível. “Se o computador ainda é um objeto restrito, o celular está

presente em boa parte das escolas, nas mochilas dos alunos de diferentes

classes sociais”. (MERIJE, 2012, p.81).

O presente trabalho em por intenção verificar a forma recorrente que os jovens

estudantes de ensino médio utilizam seus telefones celulares para captar imagens através da

câmera digital, armazenar imagens coletadas na internet, registrar as imagens como seus

próprios desenhos, para suas criações nas aulas de Artes. Eles organizam assim um banco de

imagens pessoal.

Dessa forma percebe-se a importância dos usos tecnológicos, tanto na pesquisa como

na sala de aula, nos obriga a atentar para os novos movimentos da era digital. A aula de Artes

é responsável direta pela interpretação e leitura de imagens na escola, não que as demais

disciplinas não o sejam, porém ela conecta os jovens estudantes a todo instante às imagens,

relacionadas à produção artística. A questão aqui presente possibilita refletir como os jovens

desta geração utilizam seus aparatos de telefonia celular para desfrutar melhor a percepção

destas imagens. Esta forma de aprendizagem tem recebido uma nomenclatura específica

segundo Fonseca (2013):

O grande diferencial, no entanto, pode ser atribuído à ascensão dos

dispositivos comunicacionais móveis. Convergentes, portáteis e

multimídias, esses aparelhos tem possibilitado um conjunto de

alternativas que podem ser exploradas também para a aprendizagem,

denominada de Mobile Learning – aprendizagem Móvel. (FONSECA,

2013, p. 58)

1.2 Metodologia da pesquisa

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A pesquisa utilizou-se da metodologia denominada “pesquisa-ação participante”

postulada por Michel Thiollent, (2008), na qual coloca o pesquisador no bojo das ações, ou

seja, como propositor dos movimentos, atuando junto aos sujeitos da pesquisa.

Querem pesquisas nas quais as pessoas implicadas tenham algo a “dizer”

e a “fazer”. Não se trata de simples levantamento de dados ou de

relatórios a serem arquivados. Com a pesquisa-ação os pesquisadores

pretendem desempenhar um papel ativo na própria realidade dos fatos.

(THIOLLENT, 2008, p 18).

Sendo assim tomei uma postura de pesquisadora e professora na qual me coloquei no

bojo das ações da questão tratada.

A pesquisa preocupou-se com uma das bases fundantes dentro do contexto do ensino

da arte, que é a percepção das imagens (ARNHEIM, 1989:1986). Dessa forma torna-se o

professor o grande responsável por estimular a percepção dos alunos através da leitura da obra

de arte nos seus diversos sistemas de “ver”. Sobre o “olhar” ressalta Arnheim (1986):

O ato de olhar está longe de ser um simples registro mecânico de

elementos sensórios e, dessa forma, a visão prova ser uma apreensão

verdadeiramente criadora da realidade, possibilitando a imaginação, a

invenção, a perspicácia e a beleza. Toda a percepção é também

pensamento, todo o raciocínio é também intuição, toda a observação é

também invenção. (ARNHEIM, 1986, p. V).

No caso verificou-se em lócus (presença na sala de aula) das ações a respeito das

percepções de captação de pequenas imagens presentes nas obras localizadas no período

Renascentista, correspondente aos pintores Hieronymus Bosch e Pieter Paul Brueguel. Outros

momentos de aprendizagem da arte foram observados na pesquisa: o banco de imagens feitas

pelos alunos para o apoio nas aulas de Artes, onde as obras são captadas de maneira digital,

tornando-se assim facilitador nas atividades em sala de aula.

Desde há alguns anos os instrumentos instrucionais para a observação minuciosa

destas obras; tão repletas de detalhes; eram feitas na maioria dos casos, com a lupa ótica. A

partir dos anos de 2010, notou-se um grande avanço tecnológico nos aparelhos celulares, no

que diz respeito aos seus dispositivos de câmeras digitais acopladas a eles, e a forte presença

destes objetos entre os materiais dos alunos do ensino médio. Por um problema estrutural que

sofrem a maioria das aulas de artes nas escolas tradicionais, a quantidade de lupas óticas, só

está disponível para uma parcela de quinze por cento dos alunos. De certa forma a solução

para atender a captação de imagens, via modo digital tornou-se um grande facilitador neste

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processo. Além disso, notaram–se os usos individuais (e em certos momentos há o

compartilhamento das imagens, tanto via eletrônica como pelo meio físico) que todos os

jovens fazem deste recurso. A seus modos cada um deles capta o fragmento da obra o traz

consigo, tornando assim um “objeto imagético” de sua posse, diferente do recurso propiciado

pela lupa óptica, que obriga a memorização a todo instante. Não se anulou o fato de

memorizar em nome da captação da imagem via câmera do celular, mas os benefícios dessa

nova forma de aprender e perceber a Arte.

1.3 Desenvolvimento das ações

Tópicos a serem relatados e analisados:

1- [Espaços de aprendizagem formais- Escola] – Situação 1- A captação de imagens

através das reproduções da obra de arte do pintor, Hieronymus Bosch, O Jardim das delícias

terrenas, 1504 (tinta a óleo sobre madeira – tríptico) Museu do Prado, Espanha e Pieter

Brueguel. Observação e análise da utilização dos recursos de captação de imagem digital

pelos estudantes. Coleta de depoimentos e análise dos trabalhos feitos pelos alunos, baseados

em análise qualitativa/quantitativa.

2- [Espaços de aprendizagem formais- Escola]- Situação 2- A utilização do banco

de imagens presente nos aparelhos celulares dos jovens. Notou-se de maneira geral, eles

armazenam desenhos (de anime, mangá, personagens de seriados, dos games, vinhetas, ícones

da internet, entre muitos outros). Buscou-se investigar em que ordem e grau os jovens

buscam, armazenam a acessam essas imagens, para o auxílio às atividades de criação durante

as aulas de artes.

Em ambas as situações foram elaboradas a coleta de depoimentos e análise dos trabalhos

feitos pelos alunos, baseados em análise quantitativa, referente à posse de aparelhos celulares,

computadores e acesso a internet. E qualitativa, no que se refere aos usos da tecnologia celular

em sala de aula.

1.4 Panorama tecnológico particular dos estudantes e da Escola E. E Antonio

Francisco Redondo2.

2 Pequeno Histórico - A Escola Estadual Antonio Francisco Redondo foi fundada no ano de resolução 40/81 D.O.E. de 19

de março de 1981. Situada a Rua Evandro Danton Ferreira Gandra nº 148 Vila Mangalot – Pirituba, São Paulo, na região de

metropolitana de Pirituba. Quando fundada a escola, atendia apenas a comunidade de Ensino Básico, hoje Ensino

Fundamental I, ou seja, de primeira a quarta série. Quando ocorreu a reestruturação das escolas estaduais, passou a oferecer

também o antigo ginásio hoje conhecido como Ensino Fundamental II. Somente no ano de 2004 a escola passou a ser

exclusivamente de Ensino Médio. Esse fato resulta até os dias de hoje, certo problema quando a organização do espaço físico

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As escolas públicas brasileiras, assim como as americanas necessitam de reestruturação

urgente, no que diz respeito às transformações tecnológicas (PAPERT, 1997). Percebe-se que

neste sentido, por exemplo, o ensino médio nas escolas estaduais paulistanas está obsoleto

devido à forma como se opera as tecnologias tanto na sala de aula como nos demais locais de

aprender no espaço escolar.

Foi realizado no mês de fevereiro de 2013 um levantamento a respeito, das posses

relacionadas ao acesso à internet via computador residencial e via celular. Foi computada

também a quantidade de alunos que não possuem acesso ao telefone celular assim como ao

acesso via internet por este aparelho e mesmo os casos de alunos que não possuem sequer o

aparelho celular. Seguem as tabelas destas definições:

Tabela 1 – Informações quantitativas referentes à posse de aparelho celular e acesso/

não acesso à internet3

Possuem aparelho celular sem acesso a internet 13 %

Possuem aparelho celular com acesso a internet 81 %

Não possuem aparelho celular 6 %

Tabela 2 – Informações quantitativas referentes à posse de computador residencial e

acesso/ ou não à internet:

Possuem computador pessoal sem acesso a internet 39 %

Possuem computador pessoal com acesso a internet 37 %

Não possuem computador pessoal 24 %

Perguntou-se para os estudantes entrevistados sobre a questão dos dados referentes à

informação da grande quantidade de posse referente ao aparelho celular e o acesso a internet,

o nos foi relatado que os planos de telefonia celular, com acesso à internet são mais

econômicos do que os planos de internet banda larga via empresas de telefonia fixa ou mesmo

da escola, sabendo-se que o volume físico dos alunos de Ensino Fundamental I e Ensino Médio são bastante diferentes. Hoje a escola opera com um número total de trinta e duas classes de séries, compostas pelos primeiros, segundos e terceiros anos

do ensino médio. Sendo doze classes de primeiro ano, onze de segundo ano e sete de terceiro ano do ensino médio. Estes

jovens são de idade que varia entre quatorze e dezenove anos. Atualmente o corpo docente é formado em seu total por

quarenta e seis professores. A coordenação é formada por dois professores-coordenadores, um vice diretor e um diretor.

3 Observação: foram levantados os dados de treze turmas de alunos do ensino médio, (com idade entre quatorze e dezesseis

anos) com o número total de alunos/ por série em torno de trinta e oito. Ou seja, o total de alunos entrevistados foi de

quinhentos e dezoito alunos.

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de TV a cabo. Além disso, estima-se que o número de 81%, de alunos que possuem acesso à

internet via celular, não consta como um número verdadeiro, pelo fato de que os alunos

acessam irregularmente a rede wireless da escola, sendo assim este número “exato”, difícil de

ser calculado.

Quanto à posse de computador pessoal, notou-se que 39%, dos alunos possuem este

equipamento em casa, mas sem acesso a internet, e apenas 37 %, possuem com acesso à rede.

E apresentou-se um número de 24 %, de estudantes que não possuem computador pessoal em

casa. Perguntou-se de forma geral como eles acessam a internet quando não possuem

computador em casa com acesso a internet, e as respostas foram dadas quase em

unanimidade: utilizam-se os computadores nas lan house, presentes nas cercanias da escola ou

de suas casas.

No que diz respeito ao acesso dos computadores na escola, existe atualmente a S.A.I –

Sala Ambiente de Informática4, com o uso democratizado a todos os alunos. Este projeto paga

bolsas no valor de R$ 430,00 para os próprios estudantes das escolas estaduais para

trabalharem como “aluno-monitor” da S.A.I. Porém nota-se certa dificuldade em manter os

jovens estudantes do ensino médio nestes empregos temporários, pelo fato de serem estes

necessitados de empregos fixos, que pagam salários um pouco melhores e que ofereçam

condições trabalhistas melhores.

1.5 A Utilização do celular como instrumento de apoio às aulas de artes

Notou-se nos últimos três anos, em decorrência do avanço tecnológico dos aparelhos

celulares e ao fácil acesso a internet possibilitada graças às melhorias dos preços destes

serviços, que a cada dia, os jovens estudantes utilizam esta tecnologia como um recurso

educativo em sua formação. Além do que devido aos recursos destes aparelhos

contemporâneos, eles são cada vez mais utilizados como agendas, despertador, máquina

fotográfica, filmadora, gravador de áudio, assumindo assim o papel maior do que um simples

aparelho que possibilita a ligação sem fio (DORLASS; MARQUES, 2013; AMIEL, 2011).

Nota-se que nas aulas de artes, tão necessitantes do registro, e armazenamento de

imagens, esse recurso contempla uma vasta exploração feitas pelos jovens adolescentes do

ensino médio. Com seus aparatos dotados de acesso à internet, eles buscam imagens de todos

os tipos, na Word Wilde web, e criam um banco de imagens, na qual acessam o tempo todo

4 Este projeto Acessa São Paulo, presente nas S.A. I é mantido pelo Governo do Estado de São Paulo, em

colaboração administrativa da Diretoria de Ensino Norte 1.

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para compor suas criações. Além disso, trocam essas informações entre si, via email ou

mesmo através das redes sociais.

Em verdade há educadores que proíbem o uso destas tecnologias em sala de aula.

Porém na postura de professora e pesquisadora, coloco-me em defesa daquilo que é um aliado

nas aulas de arte-educação, que é o “captador de imagens”, via câmera fotográfica do celular.

Por exemplo, existe a todo o momento nas aulas de artes a necessidade da abordagem e leitura

da obra de arte.

Quanto aos recursos instrucionais referentes a esta atividade em sala de aula, trata-se de

reproduções de obras de arte, impressas em geral em formatos de folhas A-4 (210x297 mm) e

A-3 (297x420 mm). Tornando-se assim a visualização destas reproduções uma tarefa difícil

sem o auxílio de uma lente de aumento óptica. Porém durante muitos anos este recurso era o

único para solucionar o problema da dificuldade visual. A obra a que me refiro para

observação minuciosa é Hieronymus Bosch, O Jardim das delícias terrenas, datada de 1504.

Segue a imagem da obra:

Figura 1 – Reprodução da obra: O Jardim das delícias terrenas,

Hieronymus Bosch5, datada de 1504

A atividade em sala de aula consiste nas discussões em torno da leitura desta obra6 que

consiste em contextualizar a temática religiosa vista e interpretada aos olhos do pintor

Hieronymus Bosch, que viveu no período que foi denominado pelos críticos de arte como

Renascentista (entre 1400 a 1550, aproximadamente). A tarefa da leitura desta obra é a

5 Fonte da imagem: fragmentosculturais.wordpress.com . Acesso em 10/05/2013. 6 Leitura da obra de arte refere-se à ação a ser realizada e inclui necessariamente as áreas de Crítica e Estética da Arte. Essa

tarefa envolve uma participação ativa do educando, ou seja, ele não pode ser considerado um simples depositário de

informação. A interpretação da obra de arte deve incluir o observador no processo de percepção da obra ou objeto a ser

estudado. Sendo este apenas um dos três pilares básicos da proposta triangular do ensino da arte (BARBOSA, 1999).

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contextualização geral desta obra específica e toda a sua relação com as demais obras deste

pintor dentro do contexto típico do período dito acima. A questão religiosa e antropológica

levantada em sala de aula sobre a temática de obra que neste caso é o pensamento religioso da

época e modos de viver na sociedade da época só pode ser observada em detalhes com o uso

de lentes de aumento (lentes ópticas). Porém na contemporaneidade com o uso dos registros

fotográficos em celulares e suas múltiplas possibilidades, esta atividade ganhou uma nova

dimensão. Segue procedimento do estudante diante das novas tecnologias de aparelhos de

celular:

Figura 2 – Detalhe da observação com lupa óptica

da obra; O Jardim das delícias terrenas,

Hieronymus Bosch, datada de 1504

Figura 3- Idem fig. 2, com captação

da imagem do aluno Thiago, 16 anos

Notou-se que em primeiro momento os jovens estudantes observam as imagens das

reproduções com a lupa óptica, porém eles precisam investigar os pequenos detalhes com

mais precisão e recorrem ao recurso da tecnologia celular, e dessa forma exploram seus

recursos que são a câmera fotográfica como a ampliação de imagem. Utilização das linhas de

guia, para selecionar a parte escolhida da obra, entre outros recursos. Segue imagem

ilustrativa:

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Figura 4 – Detalhe da observação

da obra e captação da imagem através

da fotografia digital, Thiago, 16 anos

Figura 5- Manipulação do recurso de ampliação,

no celular Galaxy 2S, Samsung, permite

uma visualização quadriculada (linhas de guia) que disponibiliza sua ampliação selecionada-

Aluno Thiago, 16 anos

Foi elaborado um estudo dentro do recorte de apenas duas turmas de sala de aula,

(oitenta alunos), para este estudo qualitativo. Dos estudantes que prestaram seus depoimentos,

notamos uma grande diversidade de opiniões, no que diz respeito às escolhas dos recursos de

visualização.

Quanto à tabulação dos dados coletados, optou-se dentro desta pesquisa, a não

sistematização destes termos, pelo fato de que amostragem, que são no caso os jovens

estudantes. Realizamos o questionário de pesquisa com apenas cinco estudantes do ensino

médio, para termos uma situação de parâmetro comparativo.

Em verdade encontramos uma série de fatores que variam desde a falta de recursos, na

escola, como por exemplo, a carências de reproduções de obras de arte, a carências de lupas

ópticas, (neste caso só estão disponíveis cinco delas), o que leva de certa forma a escolha da

captação da fotografia digital a uma opção prática para resolver o problema de escassez de

recursos instrucionais ou mesmo didático pedagógicos. Porém mesmo com estas ações

pontuais dentro do contexto escolar, perguntei para estes jovens, a maioria deles, (dentro do

grupo escolhido), se eles preferiam a lupa óptica ou a captação de foto digital. A maioria

deles, respondeu que gosta do recurso da visualização da obra com a lupa ótica e que o

recurso digital, lhes possibilita a apreensão da imagem, que funciona neste caso como um

recurso facilitador pelo fato de colaborar com as ações de memória estimulada. Outra parcela

(eu diria que uns 40%) da sala simplesmente não gosta de captar as imagens via celular,

porém nestes casos a lupa óptica precisa estar em suas mãos o tempo todo durante o ato de

desenhar/ ou recriar a obra.

Ou seja, de certa forma as novas tecnologias digitais, são capazes de auxiliar a

percepção e captação das imagens, mas não são estas insubstituíveis, ou descartadas em troca

de outro recurso físico (no caso as lupas ópticas). Outra coisa que se deve destacar é o papel

do professor, este deve propiciar que as escolhas dos estudantes seja livre e democrática. O

professor deve tomar cuidado com a figura de líder que ele possui, e sendo assim não deve

“conduzir” as escolhas dos alunos. Ele deve sim, ajudá-los a escolher seus próprios caminhos

e não fazer as escolhas para eles. Sem contar com o fato de que quando os alunos estão em

idade adolescente, o professor que queria torna-se um professor impositivo, este terá

dificuldade, pelo fato de que os jovens desta idade possuem suas opiniões um pouco mais

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firmes e formadas, do que no caso as crianças da primeira fase da infância (de cinco a nove

anos).

Figura 6- Aluno Thiago de Mesquita Arruda, (18 anos), primeira

série Ens. Médio, utilizando uma imagem do seu banco de

dados no celular, (Gasparzinho)

Este aluno, que cursa o primeiro ano do ensino médio, Thiago de Mesquita Arruda, 18

anos, (fig. 6) busca com freqüência as imagens presentes no seu cotidiano visual, que neste

caso são os desenhos animados da televisão (ao mesmo tempo gibi), muitas vezes já estão

presentes no seu dispositivo de armazenamento do aparelho celular, e caso não, ele faz a

busca via internet, salva o arquivo e o utiliza na sala de aula.

Figura 7- Detalhe da mão esquerda do aluno Filipe

de L. Porto, 14 anos, desenhando personagem

já existente e criando outros

Figura 8 – Idem fig. 7 com

visão panorâmica

Em outro caso, como por exemplo, o Filipe de Lira Porto, 14 anos, (fig. 7 e 8) que se

apresenta como um jovem muito admirador da atividade do desenho, não gosta de desenhar

observando modelos prontos, que neste caso exclui tanto os modelos feitos em papel ou

digital.

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Figura 9 – Vitor Hugo L. de Souza, selecionando

imagem do Angry Birds, (game), em seu tablet

Figura 10 – Idem fig. 9, em detalhe

No entanto outros jovens investem em aparatos digitais na qual possui uma

visualização um pouco mais ampla do que os celulares. O tablet vem sendo utilizado em

pequena escala ainda nas escolas públicas devido ao seu alto preço de mercado hoje

estabelecido. Percebeu-se que neste caso o aparelho celular é abandonado pelo fato de que a

imagem visualizada no tablet é maior e possui boa definição (fig. 9 e 10).

Além do papel de banco de dados de imagens que o celular assume dentro da sala de

artes, ele serve também como o “registrador” do próprio trabalho feito pelo aluno. Após a

realização do desenho/ ou outro trabalho de técnica similar, ele vê a possibilidade de

fotografar como um fato de apropriar-se do trabalho e o leva consigo7·, tornando-se assim

algo como um “bem” (Fig. 11 e 12).

Figura 11- Aluno Cleiton Fernandes S. Filho,

16 anos, fotografando seu desenho finalizado

Figura 12- Aluno Cleiton Fernandes S.

Filho, 16 anos, imagem fotográfica

do seu trabalho

7 Devido às regras escolares, o professor deve reter os trabalhos dos alunos durante o ano letivo, porém sendo

um procedimento meu, retenho até o findar do bimestre, devolvendo logo que este acaba. Porém, para os

mais aficionados nesta “arte do desenho” torna-se necessária a aquisição de tal imagem, realizada com

tamanha destreza.

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Considerações finais

No caso desta pesquisa foi interessante notar as revelações sobre os usos e desusos das

tecnologias digitais para captação de imagens para a aprendizagem da arte na escola. Pensar

como utilizá-la sem afastar a ajuda dos velhos recursos, sendo assim um recurso cooperador e

não excludente. Pensar as formas com que as pessoas usam incansavelmente estas

tecnologias, não fazendo um bom uso delas e refletir sobre as demais que fazem seu uso que

colabora para a vida moderna e dinâmica da era digital.

E outra questão que nos coloca a pensar sobre o uso tecnológico e através dessas reflexões

fazer de seu uso, um instrumento social e integrador. E principalmente transformá-lo em um

novo ato de criação e construção de novos modos de ver.

Além de que se deve levar em consideração, quem são os sujeitos pesquisados, que posses

eles tem sobre as novas tecnologias digitais, ou mesmo que posses eles não tem! E no caso de

ter alguma posse, que usos ele faz delas? Creio que o que voga na pesquisa, é sempre uma

tomada de decisões para analisar os dados e quando isso ocorre, deve-se levar em conta

muitos fatores como estes relatados acima, e não simplesmente analisá-los de um ponto de

vista do pré-concebido. Acredito sim que devemos permitir e estimular o uso das novas

tecnologias em sala de aula, inclusive nas aulas de Artes, mas recomendo a não condução

dessas escolhas. Dessa forma teremos certeza de

realizar uma educação de partilha e democratização com os estudantes.

Referências

AMIEL, Tel. Entre o simples e o complexo: tecnologia e educação no ensino básico.

Comunicação e Ciência. Nº 131. Campinas. 2011

ARNHEIM, Rudolf. Intuição e intelecto na arte. São Paulo: Ed.Martins Fontes, 1989. 343 p.

______. Arte e percepção visual: uma psicologia da visão criadora. São Paulo: Ed.

Pioneira. 1986. 503 p.

BARBOSA, Ana Mae T. Bastos. A imagem no ensino da arte. São Paulo: Ed. Perspectiva.

1999. 134 p.

DORLASS; Walter C.; MARQUES, Fagner C. S.; Porque e como utilizar um celular para

dar aula. Tecnologia da Informação- CW Dorlass Consultoria Educacional. (Material não

publicado).

FONSECA, Ana Graciela M. F. Questões relevantes na relação dispositivos

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Maria Cristina Blanco – Doutoranda e mestre em Artes Visuais pela Escola de Comunicações e

Artes da Universidade de São Paulo. Sua área de investigação consiste em Arte-educação, educação

em museus e história da gravura. Investiga no momento aprofundamentos na Leitura da obra de arte.

A pesquisadora faz parte do projeto: Observatório da Formação de Professores no âmbito do Ensino de

Arte: estudos comparados entre Brasil e Argentina. Atualmente leciona a disciplina de Artes na Rede

Estadual de São Paulo. Supervisionou o projeto PIBID, ECA-USP, no ano de 2012.