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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES A IMPORTÂNCIA DAS BRINCADEIRAS NO DESENVOLVIMENTO INFANTIL (3 A 6 ANOS) Autora: Mônica Nunes da Silva Oliveira Orientadora: Fabiane Muniz Rio de Janeiro 2005

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

A IMPORTÂNCIA DAS BRINCADEIRAS NO

DESENVOLVIMENTO INFANTIL

(3 A 6 ANOS)

Autora: Mônica Nunes da Silva Oliveira

Orientadora: Fabiane Muniz

Rio de Janeiro

2005

2

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

A IMPORTÂNCIA DAS BRINCADEIRAS NO

DESENVOLVIMENTO INFANTIL

(3 A 6 ANOS)

OBJETIVOS:

Trabalho elaborado para conclusão do Curso

de Pós-Graduação “Lato Sensu” em

Psicopedagogia no Projeto A Vez do Mestre.

3

AGRADECIMENTO

Agradeço ao meu marido Carlos Alberto, meus

filhos Matheus e Victor, à minha mãe Neide

pelo carinho e paciência dada durante o

período desta pesquisa monográfica.

4

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho ao meu marido Carlos

Alberto pela compreensão e apoio para a

realização do curso e para este trabalho

acadêmico.

5

RESUMO

O objetivo do trabalho é provar como através de brincadeiras e jogos

a criança percebe como se dão as relações humanas, tendo um papel

fundamental em seu desenvolvimento, explorando noções sobre o mundo

físico, estabelecendo cadeias de significados e ampliando sua percepção do

real. O jogo para a criança é o exercício, é a preparação para a vida adulta.

A criança aprende brincando e sua inteligência começa a ser construída

desde o seu nascimento, fazendo com que descubra o mundo ao seu redor

através de estimulações; em suas fases posteriores a brincadeira e o faz-de-

conta serão primordiais para a formação geral e o desenvolvimento de suas

emoções com a sua realidade. A educação infantil é um ambiente acolhedor

às brincadeiras: a criança terá acesso a todos os tipos de materiais,

estímulos, que irão fomentar a sua criatividade, combinando fatos entre si,

construindo conhecimentos, trabalhando as emoções, fazendo-se como

processos em busca da descoberta do ser social. Os jogos e brincadeiras

serão importantes num contexto psicopedagógico, mas terão que ter

objetivos definidos a serem alcançados e adequados ao momento

educativo.A proposta é ir além do jogo, do ato de jogar; preparar e

confeccionar o próprio jogo antes de joga-lo, ampliando a capacidade do

jogo em si a outros objetivos, como profilaxia, exercício, desenvolvimento de

habilidades e potencialidade e também na terapia de distúrbios específicos

de aprendizagem. Assim sendo, conclui-se, ao propor atividades

desafiadoras e interessantes, serão estimulados ações criativas em que as

crianças serão trabalhadas internamente e externamente, promovendo

manifestações de sentimentos e atos e que através de um esforço conjunto

de ajuda, as crianças como pequenos cidadãos irão construir as regras de

convívio social e de que forma terão seus direitos e deveres respeitados,

sendo necessários para a convivência e o trabalho coletivo.

6

METODOLOGIA

A partir de um processo histórico e de investigação, através de livros,

artigos, revistas especializadas e internet, será feita a pesquisa para atestar

o questionamento deste presente trabalho acadêmico.

7

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ............................................................................................ 08

CAPÍTULO I – A importância do ato de brincar .......................................... 11

CAPÍTULO II – Fantasia: um ensaio para a realidade ................................ 26

CAPÍTULO III – A interação do profissional de psicopedagogia com as

brincadeiras e jogos da educação infantil .................................................... 33

CAPÍTULO IV – Brinquedos e brincadeiras para a faixa de 3 a 6 anos ...... 42

CONCLUSÃO .............................................................................................. 50

ANEXOS ...................................................................................................... 52

BIBLIOGRAFIA ........................................................................................... 57

ÍNDICE ......................................................................................................... 59

8

INTRODUÇÃO

“Na medida em que o menino ou a menina, individualmente, chegam uma organização pessoal da realidade psíquica interna, esta última é constantemente comparada com exemplos da realidade externa ou compartilhada. Desenvolvendo-se uma nova capacidade baseada num intercâmbio entre a realidade externa e exemplos oriundos da realidade psíquica pessoal. Essa capacidade se reflete no uso de símbolos pela criança, no brincar criativo e, como tentei demonstrar, na capacidade gradativa da criança de utilizar o potencial cultural, na medida da disponibilidade deste, no meio ambiente social imediato”. (D.W. Winnicott, 1975, p. 178)

Como poderemos avaliar a construção do conhecimento pelas

brincadeiras espontâneas das crianças?

Esta pergunta nos atinge em cheio, como educadores, pais, enfim,

como pessoas que convivem diretamente com as crianças, principalmente

as pequeninas que estão dando os seus primeiros passos em seu

desenvolvimento como um todo.

A criança tem a sua disposição o seu potencial que já traz consigo

com o seu meio, para criar situações e ações que a leve coordenar

movimentos no espaço e no tempo, trabalhando sentimentos, músculos e

mente, direcionando o seu ponto de interesse para habilidades que irá

desenvolver.

Permitir que as crianças brinquem do que quiserem é uma forma de

ajudá-las a enfrentar seus temores e a ter domínio sobre as situações.

Meninos e meninas diferem muito na escolha de suas brincadeiras e

dependendo da idade e do grau de desenvolvimento de cada um, as

preferências também mudam.

9

O despertar do interesse e da curiosidade, a troca de informações

com os pais serão essenciais para o trabalho do psicopedagogo,

respeitando o estágio do desenvolvimento da criança, sem cobranças ou

avaliações, já que esta não encara o aprendizado como uma obrigação e

não se sentirá excluída do grupo quando não conseguir acompanhar a

maioria.

Mas é preciso ficar claro: estimular não significa queimar etapas, e

sim aperfeiçoar habilidades. Como em qualquer situação, é preciso bom

senso. O desenvolvimento da criança não deve ser atropelado pela

ansiedade de seus pais, cada uma tem seu ritmo e devemos respeitar o seu

caminhar e conseqüentemente o seu aprendizado.

As brincadeiras têm todo um simbolismo e o jogo é um fenômeno

cultural com múltiplas manifestações e significados que variam conforme a

época, a cultura ou o contexto. O que caracteriza uma situação de jogo é a

atividade da criança: sua intenção em brincar, a presença de regras que lhe

permitem identificar sua modalidade.

De maneira geral, o jogo infantil compreende brincadeiras de faz-de-

conta (em que intervêm a imaginação a imaginação, a representação, a

simulação) jogos de construção (manipulação, composição e representação

de objetos), jogos de regras.

O jogo é considerado uma estratégia didática, facilitadora da

aprendizagem, quando as situações são planejadas e orientadas pelo

adulto, visando ao aprender, isto é, a de proporcionar à criança a construção

de algum tipo de conhecimento, alguma relação com o seu eu.

Portanto, o jogo cumprirá uma dupla função-lúdica e educativa e a

educação infantil configurou-se como o espaço natural e a participação ativa

da criança.

10

Assim sendo, o objetivo do trabalho é desmistificar a brincadeira como

uma to puro e simples da criança que não tem valor algum; como o

profissional da área de psicopedagogia poderá interagir e como as

brincadeiras podem ser reveladoras das qualidades e produções humanas.

11

CAPÍTULO I -

A IMPORTÂNCIA DO ATO DE BRINCAR

Para que serve o brinquedo?

“Brinquedo não serve para nada (...) o brinquedo

é uma atividade inútil. E, no entanto, o corpo quer voltar

a ele. Por quê? Por que o brinquedo, sem produzir

qualquer utilidade, produz alegria? Felicidade é brincar.

E sabem por quê? Porque no brinquedo nos

encontramos com aquilo que amamos. No brinquedo o

corpo faz amor com objetos de seu desejo. Pode ser

qualquer coisa: ler um poema, escutar uma música,

cozinhar, jogar xadrez, cultivar uma flor, conversar

fiado, tocar flauta, empinar papagaio, nadar, ficar de

barriga para o ar olhando as nuvens que navegam,

acariciar o corpo da pessoa amada - coisas que não

levam a nada. Amar é brincar. Não leva a nada. Porque

não é para levar a nada. Quem brinca já chegou.

Coisas que levam a outras, úteis, indicam que ainda

estamos a caminho: ainda não abraçamos o objeto

amado. Mas no brinquedo temos uma amostra do

paraíso”. (ALVES, Rubem, 1994, p.78).

12

1.1 – A importância do ato de brincar

A inteligência começa a ser construída no período sensório-motor

desde o nascimento, caracterizado, por uma ampliação constante de

esquemas. O esquema é definido, segundo Piaget, como “... o que, numa

ação, é assim transponível, generalizável ou diferenciável de uma situação à

seguinte, ou seja, o que há de comum nas diversas repetições ou aplicações

da mesma ação”. (PIAGET, 1975).

Já no período pré-operário, segundo Piaget, a inteligência é

assimilação porque incorpora à sua estrutura os dados da experiência; é

acomodação porque se modifica incessantemente para poder ajustar esta

estrutura à diversidade das coisas; e é organização porque as ações se

coordenam de acordo com determinadas leis de equilibração. Este fator de

equilibração ou auto-regulação é considerado como um fator explicativo das

construções porque mostra as possibilidades crescentes de reações ativas

às perturbações exteriores. As estruturas da inteligência resultam dessa

organização progressiva que, ao mesmo tempo que assegura a conservação

daquelas já construídas, ao integrá-las como conteúdo necessário à

elaboração de novas formas, amplia as possibilidades de trocas com o meio.

Hoje, o debate sobre a função do jogo no desenvolvimento infantil

remete à transformação dos espaços e dos objetos de lazer. Com a

crescente urbanização e as mudanças na dinâmica familiar, a educação pré-

escolar não ocorre apenas em casa e na vizinhança, mas é realizada

coletivamente na creche, nas escolas maternais e jardins-de-infância.

Os brinquedos-reprodução em miniaturas dos artefatos produzidos

pela sociedade tecnológica acompanham a sofisticação de seus modelos.

Carrinhos, bonecas e panelinhas ganham luzes, som e movimento; cubos de

madeira são substituídos por peças plásticas de encaixe. A indústria bélica

se faz mais presente, munindo os novos heróis robotizados com raios

destruidores e aeronaves preparadas para combates espaciais.

13

A eficiência tecnológica se volta cada vez mais para a fabricação de

games que simulam situações de impasse: cabe ao jogador, quase sempre

solitariamente, escolher uma alternativa e agir rápido.

O jogo ou brincadeira facilita a apreensão da realidade e é muito mais

um processo do que um produto. Por meio dele a criança percebe como se

dão as relações humanas, explora e desenvolve noções sobre o mundo

físico, estabelecendo novas cadeias de significados, e amplia sua percepção

do real.

Por ser essencialmente dinâmico, o jogo permite comportamentos

espontâneos e improvisados, uma vez que os padrões de desempenho e as

normas podem ser criados pelos participantes. Há liberdade para a tomada

de decisões, e a direção que o jogo assume é determinada pelas crianças

considerando o grupo e o contexto.

Na escola tradicional, os jogos são pouco utilizados como estratégia,

caraterizando uma cisão entre o lúdico e o pedagógico motivada pela

acomodação dos educadores e pelo desconhecimento da importância do

jogo no desenvolvimento infantil.

O jogo, segundo vários autores, simula relações de troca durante toda

a vida e em seu livro, AROEIRA, 1996, p. 68 e 69, cita alguns deles.

Segundo Margareth Mead, nos chamamos jogos livres a criança

brinca de ser vários personagens, representando freqüentemente os papéis

suplementares numa mesma situação atua ao mesmo tempo como

comprador e vendedor. Assim, aprende a desempenhar o papel do outro, a

reagir a suas próprias ações como o outro o faria. (apud AROEIRA, 1996)

14

Para Jacob Moreno, criador do psicodrama, a criança cresce

representado, assumindo e desempenhando diferentes papéis, reais ou

irreais - estes últimos vividos em situações de faz-de-conta, nos quais ela

pode visualizar a estrutura interativa dos papéis sociais e as ideologias que

os governam. É nas experiências pessoais com os parceiros que se dá a

construção desses papéis. (apud AROEIRA, 1996)

Henri Wallon coloca o jogo como uma forma de organizar o acaso, de

superar repetições. No jogo a criança manifesta suas disponibilidades

funcionais de modo efusivo e apaixonado, e experimenta diversas

possibilidades de ação. (apud AROEIRA, 1996)

Lev Vygotsky, por sua vez, destaca que no jogo a criança encena a

realidade utilizando regras de comportamento socialmente constituídas.

Nessa situação, os objetos perdem sua força determinadora sobre o

comportamento da criança; ela passa a agir independentemente daquilo que

vê, Desse modo, está lidando com uma situação imaginária na qual novos

significados são associados aos objetos. (apud AROEIRA, 1996)

Para PIAGET, 1981, o jogo representa a predominância da

assimilação sobre a acomodação. É uma transposição simbólica que sujeita

as coisas à atividade da criança sem limitações. Assim como imitação, o

desenho e a linguagem, contribui para a construção da representação pela

criança, constituindo atividade essencial nessa fase.

15

1.1.1 – TIPOS DE JOGOS

Existem diferentes concepções sobre o que seja o jogo e também

sobre a distinção entre o que é jogo, brinquedo ou brincadeira.

O termo jogo terá os significados propostos em Kammi, 1991.

ü O jogo deve ser para dois ou mais jogadores, sendo, portanto, uma

atividade que as crianças realizam juntas;

ü O jogo deverá ter um objetivo a ser alcançado pelos jogadores, ou seja,

ao final, deverá haver um vencedor;

ü O jogo deverá permitir que os alunos assumam papéis interdependentes,

opostos e cooperativos, isto é, os jogadores devem perceber a

importância de cada um na realização dos objetivos do jogo, na

execução das jogadas, e observar que um jogo não se realiza a menos

que cada jogador concorde com as regras estabelecidas e coopere

seguindo-as e aceitando suas conseqüências.

ü O jogo deve ter regras preestabelecidas que não podem ser modificadas

no decorrer de uma jogada, isto é, cada jogador deve perceber que as

regras são um contrato aceito pelo grupo e na violação representa uma

falta; havendo o desejo de fazer alterações, isso deve ser discutido com

todo o grupo e, no caso de concordância geral, podem ser impostas ao

jogo daí por diante;

ü No jogo, deve haver a possibilidade de usar estratégias, estabelecer

planos, executar jogadas e avaliar a eficácia desses elementos nos

resultados obtidos, isto é, o jogo não deve ser mecânico e sem

significado para os jogadores.

A existência de todas as característica mencionadas, especialmente

as referentes às regras , caracteriza os jogos em grupo, ou sociais, e é a

forma mais avançada e complexa do jogo. Esse tipo de jogo simula as

características principais das relações dos indivíduos em sociedade.

16

Os jogos, segundo Kammi, devem trazer situações interessantes e

desafiadoras, permitindo que as crianças se auto-avaliem quanto a seu

desempenho e participem ativamente do jogo o tempo todo.

É preciso também acrescentar que, embora preveja um vencedor, a

situação de jogo não deve privilegiar a competição, mas levar ao

desenvolvimento da cooperação e do respeito entre os jogadores, que são

aspectos que julgamos importantes no desenvolvimento das inteligências

intra e inter-pessoal.

Kammi afirma que, após os cinco anos, é natural e saudável o

surgimento da habilidade de comparação entre os jogadores e o

aparecimento de tentativas de vencer o adversário.

Crianças que até então admitiam que todos do grupo pudessem ser

vencedores passam a elaborar previsões de como vencer. De acordo com

Kammi, essa mudança favorece os processos de descentração, pois faz

com que as crianças comecem a comparar suas performances e a

coordenar as intenções dos diferentes jogadores.

Porém, quando a competição aparece, ela não deve ser estimulada

no sentido de ganhar a qualquer preço, mas as crianças devem cooperar

para chegar a algum acordo e resolver seus conflitos.

Os jogos em grupo oferecem muitas oportunidades para elaboração

de regras, discussão de procedimentos e condutas, observação dos efeitos

de tais elementos e modificações de atitude. Assim, se um criança quer

ganhar sempre e por isso transgride regras, sua conduta deve ser discutida

e analisada com ela e com os demais componentes do grupo para permitir

uma reflexão e posterior mudança de atitude.

17

Entretanto, se não houver o estímulo do adulto para a

supervalorização do vencedor, poucos serão os casos nos quais as crianças

tentarão deliberadamente vencer a qualquer preço.

1.1.2 – A BRINCADEIRA NA PRÉ-ESCOLA E SEUS PRINCÍPIOS

PSICOLÓGICOS:

No período pré-escolar da vida de uma criança, desenvolvimento das

brincadeiras é um processo secundário, redundante e dependente, enquanto

a moldagem da atividade - fim que não é uma brincadeira constitui a linha

principal do desenvolvimento.

A razão desta mudança em que a brincadeira se transforma, deixando

de ser um processo secundário, subordinado para se tornar um processo

dominante, se consiste no fato de o mundo objetivo do qual a criança é

consciente continuamente se expande e este mundo inclui não apenas os

objetos que constituem o mundo ambiental próximo da criança, dos objetos

com os quais ela pode operar, e de fato opera, mas também os objetos com

os quais os adultos operam, mas a criança ainda não é capaz de operar, por

estarem ainda além de sua capacidade física.

O papel dominante do brinquedo na idade pré-escolar é reconhecido

praticamente por todos, mas para dominar o processo do desenvolvimento

psíquico da criança neste estágio, quando o brinquedo desempenha o papel

dominante, não é certamente suficiente apenas reconhecer este papel da

atividade lúdica. É necessário compreender claramente em que consiste o

papel capital das brincadeiras; as regras do jogo e de seu desenvolvimento

precisam ser apresentadas. O desenvolvimento mental de uma criança é

conscientemente regulado sobretudo pelo controle de sua relação precípua

e dominante com a realidade, pelo controle de sua atividade principal. Neste

caso, o brinquedo é a atividade principal; é, por conseguinte, essencial saber

como controlar o brinquedo de uma criança, e para fazer isto é necessário

18

saber como submetê-las às leis de desenvolvimento do próprio brinquedo,

caso contrário haverá uma paralisação do brinquedo em vez de seu controle.

O brinquedo é caracterizado pelo fato de seu alvo residir no próprio

processo e não no resultado da ação. Para uma criança que está brincando

com cubos de madeira, por exemplo, a alvo da brincadeira não consiste em

construir uma estrutura, mas em fazer, isto é, no conteúdo da própria ação.

Isto é verdadeiro não apenas no caso das brincadeiras do período pré-

escolar, mas também no de qualquer jogo em geral. A fórmula geral da

motivação dos jogos é “competir, não vencer”.

Por isso, nos jogos dos adultos, quando a vitória, mais do que a

simples participação, torna-se o motivo interior, o jogo deixa de ser

brincadeira.

Esta, todavia, é uma caracterização muito geral do brinquedo, pois

este evolui e a maneira de brincar de uma criança em idade pré-escolar é

muito diferente daquela que encontramos em uma criança em idade escolar

ou em um adulto.

Os traços específicos das brincadeiras pré-escolares são:

ü Há formas de brinquedos que diferem em seu conteúdo e origem.

ü Há jogos, por exemplo, que só são disputados em forma certa situação e

que desaparecem com ela; eles são individuais não podem ser

repetidos.Tal jogo começa repentinamente, é disputado, e desaparece

para sempre; ele é produto de condições casuais e não tem tradição.

ü Há também jogos tradicionais, como a amarelinha. As regras podem

variar, e as maneiras de desenhar os quadrados também podem ser

diferentes, mas os princípios do jogo permanecem inalterados.

É um ponto interessante, indicado pela história do brinquedo, que

alguns destes jogos existem há cem, ou até mesmo mil anos.

19

Há também jogos com uma tradição mais curta; eles surgiram pela

primeira vez em um certo grupo de crianças e são, em seguida, convertidos

em um jogo tradicional apenas para esse grupo.

Assim, o brinquedo raramente varia não apenas em seu conteúdo,

mas também em suas formas e origens.

O brinquedo aparece na criança em idade pré-escolar, a partir de sua

necessidade de agir em relação não apenas ao mundo dos objetos

diretamente acessíveis a ela, mas também em relação ao mundo mais

amplo dos adultos. Uma necessidade de agir como um adulto surge na

criança, isto é, de agir da maneira que ela vê os outros agirem, da maneira

que lhe disseram, e assim por diante. Ela deseja montar um cavalo, mas não

sabe como fazê-lo e não é ainda capaz de aprender a fazê-lo, isto está além

de sua capacidade. Ocorre, por isso, um tipo de substituição, um objeto

pertencente ao mundo dos objetos diretamente acessíveis a ela toma o lugar

do cavalo em suas brincadeiras.

Em um jogo, as condições da ação podem ser modificadas: pode-se

usar papel, em vez de algodão; um pedacinho de madeira ou um simples

pauzinho, em vez de agulha; um líquido imaginário, em vez de alguma

bebida, mas o conteúdo e a seqüência da ação devem, obrigatoriamente,

corresponder à situação real.

O conteúdo do processo da brincadeira apresentado pela análise

psicológica, aquilo que chamamos ação, é assim a ação real para a criança,

que tira da vida real. Assim sendo, ela não é nunca enquadrada

arbitrariamente; ela não é fantástica. O que a distingue de uma ação que

não constitui uma brincadeira é apenas sua motivação e, a ação lúdica é

psicologicamente independente de seu resultado objetivo, porque sua

motivação não reside nesse resultado.

20

Jogos “com regras”, como esconde-esconde, diferem muito de jogos,

como “teatrinho”, onde se brinca de médico, de soldado, etc. Eles não

parecem estar relacionados uns com os outros por qualquer tipo de

sucessão genética, e parecem constituir linhas no desenvolvimento do

brinquedo infantil. Na realidade, porém, uma forma se desenvolve a partir da

outra, em virtude de uma necessidade inerente à própria atividade lúdica da

criança, pela qual os jogos “com regras” surgem em um estágio posterior.

É muito difícil para uma criança de três ou quatro anos de idade,

obrigar-se a obedecer às regras de um jogo. Jogos com regras são, por isso,

mais tardios.

Inicialmente, as primeiras ações lúdicas surgem com base na

necessidade crescente da criança de dominar o mundo dos objetos

humanos. O motivo contido nesta ação está fixado em uma coisa,

diretamente em seu conteúdo objetivo. A ação aqui é o caminho que leva a

criança, antes de tudo, à descoberta da realidade objetiva; o humano ainda

surge para a criança em sua forma objetiva. No papel do cavaleiro, a ação

lúdica de montar é brincar “de cavalo”, as ações com um bloco de madeira

que a criança “guia” de uma cadeira para outra é brincar “de carro”.

Portanto, em estágios relativamente precoces do desenvolvimento da

atividade lúdica, uma criança descobre no objeto não apenas as relações do

homem com esse objeto, como também as relações das pessoas entre si.

Os jogos de grupo tornam-se possíveis não apenas “um ao lado do outro”,

mas também “juntos”. As relações sociais já surgem nesses jogos de forma

explícita – sob a forma de relações dos jogadores entre si. Ao mesmo

tempo, o papel de “brinquedo” também é alterado. Seu conteúdo agora

determina não apenas as ações das crianças em relação ao objeto, mas

também suas relações em face de outros participantes do jogo. Estes

últimos (os demais participantes) tornam-se também conteúdo da atividade

lúdica, e neles se fixa o motivo do jogo. O que distingue os jogos são as

21

diferentes ações relativas a outras pessoas e que se tornam a coisa

principal.

O desenvolvimento dos jogos dramatizados, dos jogos inventados e

improvisados, dos jogos de ilusão e de fantasia é muito mais importante.

São jogos que significam o esgotamento da atividade lúdica em suas formas

pré-escolares. Embora permanecendo enquanto brinquedo, eles são,

todavia, cada vez mais destituídos de sua motivação inerente. O processo

da atividade aparece psicologicamente à criança sob essas formas de

brinquedo simultaneamente com o resultado, o produto; a criança relaciona-

se com elas como com produto.

Por conseguinte, a motivação desses jogos é, ao mesmo tempo, cada

vez mais transferida para seus resultados.

Finalmente, as relações sociais intrínsecas os momentos morais, os

de maior conteúdo emocional tornam-se o centro. O mesmo ocorre em

outros jogos infantis; as crianças brincam das mesmas coisas em idades

diferentes, mas elas brincam de forma diferentes.

Assim para analisar a atividade lúdica concreta da criança é

necessário penetrar sua psicologia verdadeira, no sentido que o jogo tem

para criança, e não, simplesmente, arrolar os jogos a que ela se dedica. Só

assim o desenvolvimento do brinquedo surge para nós em seu verdadeiro

conteúdo interior.

22

1.1.3 – EVOLUÇÃO DO JOGO

De acordo com sua função predominante, os jogos se classificam em

funcionais ou de exercício, jogos simbólicos, de aquisição, de construção e

de regras.

1.1.3.1 – JOGOS FUNCIONAIS

Também chamamos de jogos de exercício, os jogos funcionais são

marcados pelo caráter exploratório, realizados com o próprio corpo - mexer

as mãos, balançar a cabeça ritmadamente, passar objetos de uma mão para

outra. Esses jogos exploram ritmo, cadência, força, limitações, assim com os

efeitos que os atos produzem no ambiente.

Esses jogos iniciais são movimentos simples, que a criança repete por

prazer, sem nenhuma intenção de representação e evoluem para atos mais

complexos, como encher e esvaziar um balde de areia ou manipular

massinha e nomear o objeto que ela produziu sem querer, de repente olha

para o bloco e acha que parece um sorvete; “Olha o meu sorvete!”. Só com

o tempo irá estabelecer objetivo da brincadeira: Agora, eu vou fazer sorvete

de uva”.

1.1.3.2 – JOGOS SIMBÓLICOS

A partir dos 2 anos, mais ou menos, as atividades lúdicas da criança

se convertem numa transposição fantasiosa do mundo real: o jogo simbólico.

Os jogos funcionais ficam em segundo plano, e ganham mais

importância as imitações desde as mais simples até as mais complexas,

baseada na construção de roteiros para representação individual ou coletiva

de papéis.

23

A criança transforma objetos em símbolos uma caixa de sapatos é o

carro, o carro é o avião e os utiliza para desempenhar papéis (mãe, médico,

professor).

Aqui, a realidade pode ser transformada conforme o desejo da

criança. Enquanto brinca de casinha, refaz a própria vida, revivendo

prazeres, conflitos e necessidades não satisfeitas na situação familiar. Para

Piaget, o jogo simbólico funciona como catarse durante a primeira infância e

ajuda a criança a estabelecer ou manter o equilíbrio afetivo. A criança

representa o que ela vive no seu dia-a-dia, através de diálogos, gestos e

comportamentos de pessoas próximas.

Assim, até aproximadamente os quatro anos a forte carga projetiva do

jogo permite-nos obter importantes informações sobre a criança e sua

relação com o mundo.

A brincadeira infantil permite que a criança reviva suas alegrias, seus

conflitos e seus medos, resolvendo-os a sua maneira e transformando a

realidade naquilo que ela quer. Com isso internaliza regras de conduta,

desenvolvendo o sistema de valores que irá orientar seu comportamento.

1.1.3.3 – JOGOS DE AQUISIÇÃO

Em alguns momentos, a criança se dedica a observar, escutar,

tentando compreender objetos, pessoas, uma historia, uma canção.

Esse esforço concentrado para captar a totalidade do objeto

observado é o chamado jogo de aquisição. Para o adulto, a criança parece

estar ausente, sem participar do que ocorre à sua volta. Na realidade,

contudo, ela está trabalhando intensamente os significados que a cercam.

24

A maneira lúdica será uma “ponte” para o conhecimento; em uma

turma, a comunicação é essencial, para que todos possam ser atingidos,

apesar das diferenças individuais, atendendo assim, as necessidades de

cada um, proporcionando à criança a construção de algum tipo de

conhecimento, alguma relação ou o desenvolvimento de alguma habilidade.

1.1.3.4 JOGOS DE CONSTRUÇÃO

Reunir, combinar, modificar e transforma objetos são maneiras de

conhecê-los. O mesmo percurso é feito e refeito inúmeras vezes pela

criança; ela monta e desmonta fileiras de objetos, procura organizá-los, para

construir outros objetos. É sua forma de atuar sobre a realidade

conhecendo-a para modificá-la; ela usa o livre arbítrio e idealiza o que quer

construir. É uma das atividades mais desejadas. É preciso deixar que elas

explorem e criem situações através de jogos de encaixe, sucatas, fantasias,

fantoches, máscaras... Todo e qualquer material posto ao alcance da criança

faz com que ela vá criando e imaginando uma forma diferente de brincar

com esse objeto.

1.1.3.5 JOGOS DE REGRAS

A regra surge da necessidade de jogar com alguém, da intenção de

partilhar experiências, por isso implica relação com outra pessoa. Envolve,

portanto, conteúdos e ações preestabelecidas que regularão a atividade.

Até os quatro anos, aproximadamente, a criança continua jogando

sozinha, embora já tenha acesso a regras coletivas que regulamentam

determinada ação. Não há espaço para competição, não é necessário

ganhar de ninguém. Muitas vezes, as crianças se reúnem e ficam brincando

sozinhas, todas com o mesmo jogo, mas cada qual à sua maneira e com seu

próprio material.

25

Quando começam a partilhar o jogo, porém, surge a necessidade de

estabelecer um controle mútuo das ações, unificar as regras. Aos poucos, os

procedimentos passam a ser minuciosamente definidos, e em geral, a

criança segue as regras estabelecidas pelo grupo.

Em algumas atividades infantis (amarelinha, queimado, bolinhas de

gude), as regras já existem e são incorporadas pelo grupo. Às vezes, porém,

ocorre o inverso - as regras espontâneas são definidas por uma criança ou

por um grupo pequeno e são socializadas no grupo maior:

“Ninguém pode levar pneu para o pátio”; Quem derrubar o boliche

azul perde ponto”. São regras coletivas que coordenam as ações individuais.

Sob todos os aspectos vistos, o jogo simula as relações sociais da

criança, permitindo que ela trabalhe suas emoções, sentimentos, dúvidas e

ansiedades.

Poderão ser utilizados vários tipos de materiais e a partir do brincar e

jogar, a criança poderá representar e, assim, ampliará sua expressividade

entendida como uma totalidade. Construirá conhecimentos através dos

papéis que representa, desenvolvendo ao mesmo tempo dois vocabulários -

o lingüístico e o psicomotor - além do ajustamento afetivo emocional que

atinge na representação desses papéis.

Podemos considerar que, desde os primeiros anos da infância,

encontram-se processos criativos que se refletem, sobretudo nos jogos. É

através deles que as crianças reelaboram, criativamente, combinando fatos

entre si e construindo novas realidades de acordo com seus gostos e

necessidades.

É no brincar, e somente no brincar, que o indivíduo, criança ou adulto,

pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral; e é somente sendo

criativo que o indivíduo descobre o eu (self).(WINNICOTT, 1975).

26

CAPÍTULO II –

FANTASIA: UM ENSAIO PARA A REALIDADE

A conduta lúdica da criança que usa a representação dramática sem

as preocupações que a palavra representar tem no seu sentido usual, ou

seja, para um público, vai além do imaginário infantil.

É uma atividade psicológica de grande complexidade, que

desencadeia o uso da imaginação criadora pela impossibilidade de

satisfação imediata de desejos por parte da criança.

Essa atividade enriquece a identidade da criança, porque ela

experimenta outra forma de ser e de pensar; amplia suas concepções sobre

as coisas e as pessoas, porque a faz desempenhar vários papéis sociais ao

representar diferentes personagens.

Segundo Vygotsky, quando brinca, a criança elabora hipóteses para a

resolução de seus problemas e toma atitudes além do comportamento

habitual de sua idade, pois busca alternativas para transformar a realidade.

Os seus sonhos e desejos, na brincadeira podem ser realizados facilmente,

a sua fantasia é a sua principal ferramenta, criando e recriando as situações

que ajudam a satisfazer alguma necessidade presente em seu interior. (apud

AROEIRA, 1996)

Vygotsky assinalou que uma das funções básicas do brincar é permitir

que a criança aprenda a elaborar/resolver situações conflitantes que vivencia

no seu dia-a-dia. (apud AROEIRA, 1996)

E para isso, usará capacidades como a observação, a imitação e a

imaginação.

27

Essas representações que de início podem ser “simples”, de acordo

com a idade da criança, darão lugar a um faz de conta mais elaborado, que

além de ajudá-la a compreender situações conflitantes, ajuda a entender e

assimilar os papéis sociais que fazem parte de nossa cultura (o que é ser

pai, mãe, filho, professor, médico...). Através desta imitação representativa a

criança vai também aprendendo a lidar com regras e normas sociais.

Quando Vygotsky discute o papel do brinquedo, refere-se

especialmente à brincadeira de “faz-de-conta”, como brincar de casinha,

brincar com um cabo de vassoura como se fosse um cavalo. Faz referência

a outros tipos de brinquedos, mas a brincadeira “faz-de-conta” é privilegiada

em sua discussão sobre o papel do brinquedo no desenvolvimento. (apud

AROEIRA, 1996)

As crianças evoluem por intermédio de suas próprias brincadeiras e

das invenções das brincadeiras feitas por outras crianças e adultos. Nesse

processo, ampliam gradualmente sua capacidade de visualizar a riqueza do

mundo externamente real e, no plano simbólico procuram entender o mundo

dos adultos, pois ainda, que com conteúdos diferentes, estas brincadeiras,

possuem uma característica comum: a atividade do homem e suas relações

sociais e de trabalho. Deste modo, elas desenvolvem a linguagem e a

narrativa e nesse processo vão adquirindo uma melhor compreensão de si

próprias e do outro, pela contra posição com coisas e pessoas que fazem

parte de seu meio e que são portanto, culturalmente definidas também.

Para Vygotsky, ao reproduzir o comportamento social do adulto em

seus jogos, a criança está combinando situações reais com elementos de

sua ação fantasiosa. Esta fantasia surge da necessidade da criança, em

reproduzir o cotidiano da vida do adulto, através de ações, atos e palavras,

da qual ela ainda não pode participar ativamente. Porém, essa reprodução

necessita de conhecimentos prévios da realidade exterior, deste modo,

quanto mais rica for a experiência humana, maior será o material disponível

28

para imaginações que irão se materializar em seus jogos. (apud AROEIRA,

1996)

A construção da real parte então do social (da interação com outro),

quando a criança imita o adulto e é orientada por ele, e paulatinamente é

internalizada pela criança. Ela começa com uma situação imaginária, que é

uma reprodução da situação real, sendo que brincadeira é muito mais a

lembrança de alguma coisa que de fato aconteceu, do que uma situação

imaginária totalmente nova. Conforme a brincadeira vai se desenvolvendo

acontece uma aproximação com a realização consciente do seu propósito.

Num ambiente favorável, como na Educação Infantil, a criança tem

oportunidades para que imite os atos sensatos dos adultos e desenvolva sua

fantasia no brincar. Ela está aprendendo a viver através da imitação e da

espontaneidade na comunicação com o meio ambiente, a natureza e tudo o

que está a seu alcance.

Permitir que as crianças brinquem do que quiserem é uma forma de

ajudá-las a enfrentar seus temores e a ter domínio sobre as situações. Como

as crianças brincam de se fantasiar com outras crianças, este é também um

ótimo exercício de convivência em sociedade – aprender a dividir objetos, a

respeitar a opinião dos colegas, além de ganhar maior vocabulário com as

fantasias.

Muitos lares já não oferecem um porto seguro e aconchegante tal

como a criança precisaria. Se ela for muito cobrada ou deixada livre demais,

se ela não encontrar um ambiente agradável para imitar, para aprender a

viver, muito cedo criará uma situação de apreensão, de medos e dúvidas e,

por isso, uma diminuição da força inteligente que está aberta para aprender

e evoluir. Pois a força da imitação é realmente uma escola para a vida. Ela

atua na criança como o primeiro meio de comunicação com o mundo ao

redor. Ela reage espontaneamente a qualquer estímulo. Tudo, os

pensamentos, as alegrias e tristezas, medos e sustos, a destreza e a

29

incapacidade, o modo corajoso, o medroso de enfrentar situações da vida, a

criança absorve ocorrendo naturalmente, sem precisar ser imposto; ela

atuará livremente, o que estará passando pelo seu íntimo.

“No desenvolvimento, a imitação e o ensino desempenham um papel de primeira importância. Põem em evidência as qualidades especificamente humanas do cérebro e conduzem a criança a atingir novos níveis de desenvolvimento. A criança fará amanhã sozinha aquilo que hoje é capaz de fazer em cooperação. Por conseguinte, o único tipo correto de pedagogia é aquele que segue em avanço relativamente ao desenvolvimento e o guia; deve ter por objetivo não as funções maduras, mas as funções em vias de maturação” (VYGOTSKY, 1979; 138).

Não é o caráter de espontaneidade do jogo que o torna uma atividade

importante para o desenvolvimento da criança, mas sim, o exercício no

plano da imaginação da capacidade de planejar, imaginar situações

diversas, representar papéis e situações do cotidiano, bem como, o caráter

social das situações lúdicas, os seus conteúdos e as regras inerentes à cada

situação.

Também não é todo jogo da criança que possibilita a criação de uma

Zona de Desenvolvimento Proximal que, segundo Vygotsky define como a

diferença entre o desenvolvimento atual da criança e o nível que atinge

quando resolve problemas com auxílio, o que leva a conseqüência de que as

crianças podem fazer mais do que conseguiriam fazer por si sós. Do mesmo

modo que nem todo o ensino o consegue, porém, no jogo simbólico,

normalmente as condições para que ela se estabeleça estão presentes, haja

vista que nesse jogo constam uma situação imaginária e a sujeição a certas

regras de conduta. As regras são partes integrantes do jogo simbólico,

embora não tenham o caráter de antecipação e sistematização como nos

jogos habitualmente “regrados”.

30

O jogo simbólico é a representação corporal do imaginário, e apesar

de nele predominar a fantasia, a atividade psico-motora exercida acaba por

prender a criança à realidade. Na sua imaginação ela pode modificar sua

vontade, usando o “faz-de-conta”, mas quando expressa corporalmente as

atividades, ela precisa respeitar a realidade concreta e as relações do

mundo real. Por essa via, quando a criança estiver mais velha, é possível

estimular a diminuição da atividade centrada em si própria, para que ela vá

adquirindo uma socialização crescente.

As características dos jogos simbólicos para Vigotsky são:

Ø Liberdade de regras (menos as criadas pela criança);

Ø Desenvolvimento da imaginação e da fantasia;

Ø Ausência de objetivo explícito ou consciente para a criança;

Ø Lógica própria com a realidade;

Ø Assimilação da realidade ao “eu”!

No jogo simbólico a criança sofre modificações, a medida que vai

progredindo em seu desenvolvimento ruma em direção à intuição e à

operação. E finalmente, numa tendência imitativa, a criança busca coerência

com a realidade.

Na pré-escola, o raciocínio lógico ainda não é suficiente para que ela

dê explicações coerentes a respeito de certas coisas. O poder de fantasiar

ainda prepondera sobre o poder de explicar. Então, pelo jogo simbólico, a

criança exercita não só sua capacidade de pensar ou seja, representar

simbolicamente suas ações, mas também, suas habilidades motoras já que

salta, corre, gira, transporta, rola, empurra, puxa, etc. Assim é que se

transforma em pai/mãe para seus bonecos ou diz que uma cadeira é um

trem. Didaticamente, o educador deve explorar com muita ênfase as

imitações sem modelo, as dramatizações, os desenhos e pinturas, o faz-de-

conta, a linguagem e tudo mais, permitindo que realizem os jogos

31

simbólicos, sozinhas e com outras crianças, tão importantes para seu

desenvolvimento cognitivo e para o equilíbrio emocional.

A fantasia de cada idade:

Dependendo da idade e do grau de desenvolvimento de cada um, as

preferências também mudam.

Ø De 2 a 3 anos: a tendência a imitar é substituída pelo desejo de

realmente se tornar aquela pessoa. Muitos pais se preocupam com isso.

No início, as crianças gostam de encenar fatos da vida real. Elas podem

fingir que estão dando comida a um bebê ou se vestir com as roupas da

sua mãe. Os pais têm um papel importante nessa brincadeira. Quando o

adulto aceita, por exemplo, um bloco como se fosse uma xícara de chá,

ou pergunta se seu filho está no trabalho ou na escola, contribui de

alguma forma a tornar o jogo mais interessante.

Ø De 3 a 4 anos: esses são anos mágicos, quando o poder da imaginação

da criança atinge seu auge. À medida que os conhecimentos e

experiências se ampliam, ela se torna capaz de pegar um objeto e

imaginá-lo como sendo qualquer coisa. Esse é o estágio em que um

lençol se transforma num vestido de baile e, de uma hora para outra, vira

um manto.

Quanto menos elaborada a roupa, melhor. É que a criança terá chance

de ser ainda mais criativa. O ideal é que os pais também deixem que ela

estabeleça suas próprias regras. Isto não quer dizer que eles não

possam participar das brincadeiras, quando forem convidados.

Nessa hora, é importante se policiar para não ficar corrigindo as

contradições das crianças e reprimindo suas escolhas. Mas sim procurar

mostrar que, na fantasia, tudo é possível, dando vazão à criatividade dos

filhos.

32

Ø De 5 a 8 anos: enquanto uma criança de 3 anos pode pegar um bastão e

fingir que é uma guitarra,uma criança mais velha já pode tocar uma

guitarra no ar, sem nenhum objeto para representá-la. Esta também é a

idade em que as crianças começam a representar peças, geralmente

com apenas algumas cenas do enredo. Nessa etapa da vida, geralmente

a criança já possui a simbolização mais estabelecida. Ela pode brincar

com fantasias mais abstratas, sem precisar de objetos.

33

CAPÍTULO III –

A INTERAÇÃO DO PROFISSIONAL DE

PSICOPEDAGOGIA COM AS BRINCADEIRAS E

JOGOS DA EDUCAÇÃO INFANTIL

A atuação e interação do Psicopedagogo na instituição possibilita a

prevenção e/ou interferência nas situações de dificuldades de

aprendizagem, demonstradas pelos alunos, bem como buscar o resgate das

raízes e filosofia dessa instituição, ao mesmo tempo em que procura

sintonizá-la com a realidade que está sendo vivida no momento histórico

atual, buscando adequar essa escola às reais demandas da sociedade e

como adultos, deixando de lado falsos conceitos e opiniões pré-

estabelecidas. O trabalho deste profissional será aproximar-se da criança

através de jogos e brincadeiras para poder atingir a raiz do problema,

desenvolvendo a integração relacional e vínculos afetivos através de

atividades práticas.

Através destes jogos e brincadeiras o psicopedagogo poderá observar

o raciocínio, a psicomotricidade, a lateralidade, a coordenação motora,

enfim, aspectos que serão relevantes para a construção do conhecimento.

Poderá ser oferecido um jogo de regras, por exemplo, que são

oferecidos às crianças e adultos em lojas de brinquedos e propor uma

situação-problema (objetivo do jogo) em que o sujeito resolverá ou não

(resultado do jogo). O objetivo do jogo e seu resultado, de um modo geral e

como condição, devem ser sempre claros para quem joga. Não importa de

que se trata de um jogo individual, em que o objetivo é, por exemplo, montar

um “quebra-cabeças”, sob certas condições, ou eliminar peças de um

tabuleiro restando apenas uma; ou, se o jogo é para dois ou mais indivíduos,

em que o objetivo é resolver certas situações (classificar ou seriar cartas de

um baralho de um certo modo, por exemplo, antes do adversário). Aqui são

realçados três pontos sempre presentes em qualquer jogo.

34

1 – um objetivo ou situação-problema

2 – um resultado, em função desse objetivo e

3 – um conjunto de regras determinando os limites dentro dos quais os

aspectos (1) e (2) serão considerados. O desafio do jogador é encontrar ou

produzir os meios que, dentro desses imites, o levarão à vitória, ou seja, a

um resultado favorável. Esse contexto de ‘luta”contra alguém ou alguma

coisa, com suas táticas e estratégias, é o que encanta ou atemoriza àquele

que joga.

O fato de que em um jogo de regras os objetivos e os resultados são

claros, interessa para o psicopedagogo, a análise dos meios, ou seja, dos

procedimentos que o jogador utiliza ou constrói. A análise dos meios é algo

a ser privilegiado em um contexto psicopedagógico porque possibilita-nos

uma aproximação – ainda que indireta – ao mundo mental do sujeito, que

determina sua ações e jogadas. Conversar sobre elas com o sujeito, analisá-

las junto a ele, propor-lhe comparar as jogadas entre si, pedir justificativas

para suas ações e tudo o mais em torno disso constitui, o objetivo e a razão

de ser do trabalho psicopedagógico. O pressuposto é que a análise das

ações do sujeito, dentro de tais condições, possibilita-lhe pouco a pouco

enriquecer suas estruturas mentais e romper (no plano da ação ou

compreensão) com o sistema cognitivo que determina a utilização de meios

inadequados ou insuficientes para a produção de certos resultados em

função de certos objetivos. Outro pressuposto é o de que esta situação

vivida no ambiente psicopedagógico poderá servir de modelo ou de quadro

referencial ao sujeito, já que “os jogos da vida” são outros e seus objetivos e

resultados nem sempre são claros. Ele poderá, pouco a pouco, transferir lá

“para fora” aquilo que ele pôde verdadeiramente construir ou compreender

“aqui dentro”. Só a pesquisa dirá se estas pressuposições são válidas ou

não.

35

O objetivo do profissional é a análise dos meios que o sujeito utiliza

ao jogar, da parte dele a condição é construir ou utilizar meios que produzem

os resultados que ele deseja obter. Nesta construção dois desafios estão

sempre presentes, mesmo que ignorados pelo sujeito:

a) considerar em cada jogada diferentes possibilidades;

b) eliminar aquelas que prejudicam os objetivos do jogo.

São desafios diferentes: no primeiro o sujeito deve estar atento para

os muito modos de combinar entre si os elementos do jogo, e no segundo,

escolher aqueles que se configuram como os melhores. Compreender ou

dominar um jogo supõe poder considerar – ao mesmo tempo e o melhor

possível – esses dois requisitos

Ao explicar os seus objetivos para o uso de jogos com crianças

pequenas, Kammi (1991) afirma:

“Em relação ao aprendizado, gostaríamos que as crianças fossem alertas, curiosas, críticas e confiantes na sua capacidade de imaginar coisas e dizer o que realmente pensam. Gostaríamos também que elas tivessem iniciativa, elaborassem idéias, perguntas e problemas interessantes (...)” (p. 15)

Kammi (1991) também afirma que:

“As crianças pequenas ficam muito interessadas em jogar e que, por isso, os jogos constituem uma situação natural em que as crianças são motivadas a cooperar para estabelecer regras e seguí-las, isto porque um jogo não pode começar a não ser que os jogadores concordem com as regras e, uma vez começado, não pode continuar, a não ser que os jogadores concordem com a interpretação das regras”.

36

Podemos dizer que o jogo serve como meio de exploração e

invenção, reduza conseqüência dos erros e dos fracassos da criança,

permitindo que ela desenvolva sua iniciativa sua autoconfiança, sua

autonomia. No fundo, o jogo é uma atividade séria que não tem

conseqüências frustantes para as crianças.

Em sue livro, Kátia Cristina Stocco Snole destaca que, de acordo com

Bruner (1976), “na educação infantil o jogo também tem a função de

desenvolver a linguagem materna”. Segundo ele, há algo no jogo que

estimula a atividade lingüística e que intervém na elaboração de expressões

mais complicadas da linguagem. Durante o jogo, a criança exercita e

desenvolve sua linguagem como instrumento de pensamento, comunicação

e ação, simultaneamente.

Azevedo (1993) afirma que:

“os jogos permitem a colocação de problemas, favorecem a criatividade e a elaboração de estratégias de solução. Para ela, os problemas colocados pelos jogos se constituem num fator de desafio e desequilibração, que instigam a crianças à ação, a busca pela superação dos desafios”.

E ainda “que os jogos criam uma relação descompromissada com

resultados rápidos e que isso permite um espaço maior para o indivíduo

constituir seu autoconceito positivamente”.

No jogo é possível que os erros possam ser revistos de forma natural

na ação das jogadas, sem deixar marcas negativas, mas propiciando novas

tentativas, estimulando previsões e checagem.

Em sua área de atuação, permite ao profissional psicopedagogo,

analisar o processo de aprendizagem do ponto de vista do sujeito que

aprende e da instituição que ensina, no que tange a sue decurso normal ou

com dificuldades.

37

Através do material aplicado, que poderá ser um jogo comprado em

loja, ou então, preferencialmente, confeccionado pela criança, o

psicopedagogo terá conhecimento de como o aluno constrói seu

conhecimento, compreende as dimensões das relações com a escola, com

os professores, com o conteúdo e relacioná-los aos aspectos afetivos e

cognitivos, permitindo uma atuação mais segura e eficiente.

O profissional deverá refletir a respeito do ser global que está inserido

em um ambiente e movimento de aprendizagem e deverá considerar que o

desenvolvimento deste ser se dá harmoniosamente e equilibradamente nas

diferentes condições: orgânica, emocional, cognitiva e social.

As dificuldades de aprendizagem podem surgir quando um ou mais

aspectos citados encontram-se alterados e tendem a agravar-se na medida

em que não são diagnosticados precocemente.

A atuação da psicopedagogia tem como base o pensar; a forma como

a criança pensa e não propriamente o que aprende.

Ter um olhar psicopedagógico de um processo de aprendizagem é

buscar compreender como eles utilizam os elementos do seu sistema

cognitivo e emocional para aprender e compreender a relação do aluno com

o conhecimento, a qual é permeada pela figura do professor e pela escola.

Uma criança que, em seu processo encontra dificuldades em

“crescer”, em lidar com as novas propostas pode estar transformando suas

má-relações familiares para o espaço escolar.

O estado emocional determina e permeia todo tipo de relação, sendo

numa proposta educacional formal ou não.

38

É importante que o professor tenha consciência de que a criança traz

consigo a bagagem natural cultural e também traz todas as referências

afetivas.

No aspecto social, destaca-se o ambiente, a quantidade e a qualidade

de estímulos recebidos e o valor dado à aprendizagem pela família e/ou

meio social comunitário.

Dentre causas orgânicas podemos citar as lesões cerebrais,

síndromes congênitas, desnutrição e o Distúrbio do Déficit de Atenção, com

ou sem Hiperatividade (DDAH).

As crianças gostam de brincar e não tendo o mesmo acesso à

linguagem e à comunicação verbal que os adultos, o brincar torna-se

terapêutico ao permitir à criança exprimir-se, compreender-se e

experimentar diferentes formas de lidar com os seus conflitos, medos e

angústias.

Através de jogos a criança pode alterar sua forma de olhar os

acontecimentos, as relações e o mundo. Ao recriar as suas frustrações e ao

conseguir lidar com elas de uma outra forma na brincadeira, a criança está a

conscientizar-se e a ganhar confiança em si própria para lidar com as

questões que a impedem de elaborar e encaminhar a sua aprendizagem.

Na aplicação de jogos e brincadeiras, a questão emocional é

enfaticamente colocada, já que tem o objetivo de conduzir à compreensão,

reestruturação e equilíbrio psicológicos e, conseqüentemente, ao bem-estar.

O envolvimento parental é essencial neste processo, em que seguirá

determinadas recomendações dadas pelo profissional.

39

Durante todo o processo educativo, o psicopedagogo, deverá procurar

investir numa concepção de ensino-aprendizagem que:

§ Propicie as interações interpessoais;

§ Incentive os sujeitos da ação educativa a aturem considerando

integradamente as bagagens intelectual e moral;

§ Estimule a postura transformadora de toda a comunidade

educativa para, de fato, inovar a prática escolar,

contextualizando-a;

§ Enfatize o essencial: conceitos e conteúdos estruturantes, com

significado relevante, de acordo com a demanda em questão;

§ Oriente e interaja com o corpo docente no sentido de

desenvolver mais o raciocínio do aluno, ajudando-o a aprender a

pensar e a estabelecer relações entre os diversos conteúdos

trabalhados;

§ Reforce a parceria entre a escola e família;

§ Lance as bases para a orientação do aluno na construção de

seu projeto de vida, com clareza de raciocínio e equilíbrio;

§ Incentive a implementação de projetos que estimulem a

autonomia de professores e alunos;

§ Atue junto ao corpo docente para que se conscientize de sua

posição, de sua importância e envolvimento no processo de

aprendizagem.

Como já foi citado, é interessante a criança confeccionar o próprio

jogo, podendo variar os objetos e matérias oferecidas à criança. Tem-se

mostrado eficiente na prática psicopedagógica com diferentes faixas etárias.

O uso de jogos de construção é uma das atividades mais desejadas. É

preciso deixar que elas explorem e criem situações através de jogos de

encaixe, sucatas, fantasias, fantoches, máscaras. Todo e qualquer material

posto ao alcance da criança faz com que ela vá criando e imaginado uma

forma diferente de brincar com esse objeto.

40

Fayga Ostrower (1977) diz:

“Criar é tão difícil ou fácil como viver

E é do mesmo modo necessário”.

Considerando-se, ainda que a construção e conhecimentos a respeito

dos outros, de si mesmo e da realidade social é influenciada pelas ações e

interações significativas da vida cotidiana e, ao mesmo tempo, nelas

interfere, conclui-se que os contextos são tão heterogêneos quanto as

crianças que irão gerar formas de compreensão do mundo e acesso a

conhecimentos também bastante diversos. Essa afirmativa fica por ora como

uma inferência; progressivamente, com a continuidade de cada trabalho e

com as investigações que vão sendo desenvolvidas, torna-se possível

delinear um quadro mais preciso como constroem conhecimentos.

Através destes instrumentos, o psicopedagogo estará solicitando ao

educando que se manifeste através do seu interior (seu modo de aprender,

sua aprendizagem, sua capacidade de raciocinar, de poetizar, de criar

estórias, seu modo de entender e de viver) e aproveitar sua manifestação

para se “aprofundar”, utilizando-a como suporte de diagnóstico, de troca

dialógica e da possível reorientação da aprendizagem tendo em vista o

desenvolvimento do educando, usando uma linguagem clara e

compreensível, para salientar o que se deseja pedir.

O direito de brincar.

Os adultos têm dificuldades de reconhecer os direitos de brincar. E de

reconhecer que brincar é o trabalho da criança.

Brincar é uma necessidade, uma forma de expressão, de aprendizado

e de experiência.

41

Todas as crianças em todo o mundo, mesmo nas mais terríveis

condições de dificuldades, pobreza e proibição, brincam.

Para aprender, ganhar experiências, exercitar sua criatividade e

fantasia, desenvolver-se.

Brincando é que a criança organiza o mundo, domina papéis e

situações e se prepara para o futuro. (adaptado de: Lobo, s.d.)

42

CAPÍTULO IV –

BRINQUEDOS E BRINCADEIRAS

PARA A FAIXA DE 3 A 6 ANOS

O jogo para a criança é o exercício, é a preparação para a vida adulta.

A criança aprende brincando, é o exercício que a faz desenvolver suas

potencialidades.

Os educadores se ocuparam durante muitos anos com os métodos de

ensino, e só hoje a preocupação está sendo descobrir como a criança

aprende. As mais variadas metodologias podem ser ineficazes se não forem

adequadas ao modo de aprender da criança.

A criança sempre brincou, Independentemente de épocas ou de

estruturas de civilização, é uma característica universal, portanto, se a

criança brincando aprende, por que então não ensinarmos à criança da

maneira que ela aprende melhor, de uma forma prazerosa para ela e,

portanto eficiente?

Já são conhecidos muitos benefícios de certos jogos. Porém, é

importante que o educador, ao utilizar um jogo, tenha definidos objetivos a

alcançar e saiba escolher o jogo adequado ao momento educativo.

Enquanto a criança está simplesmente brincando, incorpora valores,

conceitos e conteúdos. Os jogos apresentados são, na sua grande maioria,

jogos clássicos ou passatempos já bastante utilizados, porém a novidade é o

estudo feito sobre o aproveitamento dos jogos no momento educativo,

explorando ao máximo esse momento com conhecimento das finalidades de

cada jogo.

43

A proposta é ir além do jogo, do ato de jogar, para o ato de antecipar,

preparar e confeccionar o próprio jogo antes de joga-lo, ampliando desse

modo a capacidade do jogo em si a outros objetivos, como profilaxia,

exercício, desenvolvimento de habilidades e potencialidades e também na

terapia de distúrbios específicos de aprendizagem. Com objetivos claros,

cada atividade de preparação e confecção de um jogo é um trabalho rico

que pode integrar as diferentes áreas do desenvolvimento infantil dentro de

um processo vivencial. A criança tem pouco espaço para construir coisas,

para confeccionar brinquedos.

“Numa sociedade de consumo, são, sem dúvida, infindáveis os apelos que chegam até as pessoas. (...) Como mercadoria, a TV vende todos os valores de produtos de limpeza a idéias, sentimentos e atitudes”. (REZENDE, 1993, p. 7)

E como consumistas, as pessoas compram a maioria delas. As

crianças então gastam a maior parte de seu tempo livre diante da televisão e

consomem os atraentes jogos e brinquedos eletrônicos. Não sobra tempo

para criar, inventar e soltar a imaginação. A criança acaba por não ter

oportunidade de conhecer alguns de seus potenciais criativos por falta de

tempo e espaço disponíveis.

Eis alguns jogos:

1 – Quebra-cabeça:

Número de participantes: esta atividade deve ser desenvolvida

individualmente, mas também poderá ser trabalhada em pequenos grupos.

Encontramos diversas variedades de quebra-cabeça prontos no

comércio, mas para estimular a criatividade de nossos alunos e atingirmos

determinados objetivos específicos em nossas aulas, devemos confeccionar

com nossos alunos o quebra-cabeça.

44

Por exemplo, se a turma estiver estudando animais. No dia anterior ao

que quiser trabalhar o jogo, o educador deverá pedir que cada criança

pesquise em casa, gravuras grandes onde apareçam determinado tipo de

animal, ou simplesmente um animal. No dia seguinte, eles estarão com sua

gravura, então será pedido para cada criança com auxílio de um lápis e uma

régua que seja desenhado sobre a gravura várias linhas que se cruzem.

Após o desenho, eles deverão colar a gravura num pedaço de papel cartão

do tamanho da gravura escolhida; depois de seca a colagem, a criança

deverá recortar sobre as retas que desenhou, desta forma a gravura ficará

subdividida em diversas partes. Separando-se e misturando-se as partes, o

jogo começa. A criança deverá recriar a gravura original, unindo os pedaços.

Esta atividade desenvolverá a coordenação motora fina, a

organização espacial, a percepção figura-fundo, o conceito de análise e

síntese, o conceito de reversibilidade.

2 – Jogo da Memória

Número de participantes: Pode ser jogado em dupla, ou em maior

número de crianças. Preferencialmente deverá ser jogado por pequenos

grupos.

O jogo da memória adapta-se a diversas faixas etárias, a partir dos

dois anos de idade preferencialmente. Devemos somente ir aumentando a

complexidade do jogo.

Pode-se elaborar o jogo da memória, a partir de rótulos de

embalagem, gravuras iguais aos pares, desenhos feitos pelas próprias

crianças. As gravuras devem ser sempre aos pares.

45

As próprias crianças podem recortar as gravuras e preparar o fundo

de cartolina em tamanhos iguais, que deverão ser determinados antes de

recortarem e colarem as gravuras. Caso as crianças ainda não tenham idade

para recortar e colar, isto deverá ser feito com auxílio ou pela professora. O

tema para escolha das gravuras podem estar vinculados com o assunto que

estiver sendo desenvolvido.

Esta atividade desenvolve a coordenação motora fina, a coordenação

viso-motora, a atenção e a concentração, a aceitação de regras e limites,

desenvolve a memória visual; proporciona condições à criança de trabalhar

a sua ansiedade, de aprender a planejar uma estratégia de ação, além de

proporcionar excelente oportunidade de desenvolver e fixar os conteúdos

que estejam sendo trabalhados no dia-a-dia.

3 – Jogo de Dominó

O jogo de dominó é um excelente meio de ajudar a criança no seu

processo de alfabetização, uma vez que, neste jogo, é necessário

estabelecer correspondências entre uma e outra palavra, um e outro nome,

etc.

O jogo de dominó contém vinte e oito peças divididas em duas partes:

cada ficha leva marcados de um a seis pontos, ou nenhum.

Para transformar o jogo de dominó em jogo de dominó-alfabetização,

basta atribuir a cada número um desenho, letra, sílaba, nome ou palavra.

Material para confecção: vinte e oito caixas de fósforos ou caixas de

remédios. Forrar as caixas de preferência com papel branco. No caso de

usar a caixa de fósforos, dividi-la ao meio, sendo que o fundo da “gaveta”

será uma das partes correspondentes.

46

Colocar à esquerda do cartão a letra e à direita, o desenho; ou à

esquerda do cartão, a palavra e à direita, o desenho.

Para encostar duas caixas, é necessário que a palavra de uma

encontre o desenho da outra, ou a palavra encoste na mesma palavra.

Desenvolvimento do jogo: O professor distribuirá de quatro a cinco

peças de dominó para o número de três a quatro jogadores. As peças

restantes ficarão no centro da mesa para serem recolhidas pelo jogador que

não tiver a sua correspondente. No caso de os alunos optarem pelo jogo em

pequenos grupos, deverá haver tantos jogos quantos forem os grupos de

competidores ou participantes. Os grupos deverão ter os mesmos números

de jogadores: três ou quatro.

Cada jogador receberá cinco peças. As restantes deverão

permanecer no centro da mesa. Cada jogador deverá encostar uma peça

com a letra, sílaba ou palavra corresponde à peça colocada pela jogada

anterior. Caso o jogador não possua uma peça que corresponda à anterior,

deverá comprar da mesma. Vencerá o jogo quem ficar primeiro sem peças

em seu poder.

O jogo de dominó poderá ser adaptado a outros conteúdos, como

singular e plural. Junto aos alunos podem-se criar outros critérios, como

jogos de dominó com palavras que terminam em vogal, palavras com ss, c,

ç, lh, nh, ch, etc.

47

4 – História em Quadrinhos

Cada criança irá desenhar cenas em seqüência, uma em cada folha,

de forma que cada folha seja a continuação da outra e assim

sucessivamente. A criança irá expor seus desenhos para o grupo contando a

história para os colegas.

Variação: Escrever em cada folha a história correspondente àquele

desenho e organizar a seqüência para criar uma história em quadrinhos.

Esta atividade desenvolve o raciocínio lógico do pensamento, análise

e síntese, coordenação viso-motora, linguagem oral, linguagem escrita.

5 – Repetindo Seqüências

Objetivo: aprofundar o trabalho com seqüências.

O professor pede ao aluno que procure expressar com outros

elementos ou símbolos o mesmo critério definidor de uma seqüência já

apresentada.

Outra possibilidade: apresenta uma ficha com uma seqüência e

propõe ao aluno que faça um colar de acordo com ela.

Nas atividades de seriação convém o professor deixar o aluno

manipular o material livremente antes de fazer qualquer proposta. Essa

exploração, com ausência de regras, permite à criança envolver-se com o

material, perceber as características dos objetos e estabelecer relações

entre eles.

48

Durante a exploração livre, a noção de seriação pode surgir

espontaneamente, e aí sim o professor propõe: “Arrume estas caixas numa

fila, seguindo uma ordem”, “coloque estes cubos um sobre o outro, formando

uma torre”.

Outra possibilidade: pedir que o aluno ordene gravuras de uma

história, de uma vela acesa diminuindo, de uma planta crescendo, de uma

abelha se aproximando da flor.

Ao propor um arranjo linear, o professor poderá retirar alguns

elementos do conjunto a ser seriado e apresentá-los depois à criança para

que os intercale. Esse tipo de atividade estimula o aluno a utilizar o conceito

de reciprocidade, ao mesmo tempo que permite ao professor avaliar a

evolução do conceito de seriação.

O exercício de jogos competitivos, quando são trabalhadas as

emoções dele decorrentes, faz com que a criança internalize conceitos e

possa lidar com seus sentimentos dentro de um contexto grupal, o que a

prepara para a vida em sociedade.

Dentro de um grupo, porém, muitas vezes se faz necessário reunir

uma série de objetivos que atinjam os participantes de forma individual ou

grupal. Para isso, o educador pode fazer um planejamento em que a

utilização dos jogos tenha um efeito gradual e globalizante dentro dos

aspectos desenvolvidos em cada jogo.

Durante o processo que envolve a confecção e o jogo, surgirão

situações inesperadas, pois cada momento é único e possui características

próprias. A partir daí, o professor poderá ter novos objetivos a alcançar,

criando muitas possibilidades para ampliar os recursos mediante a

confecção de jogos.

49

Pela confecção de jogos, a criança poderá ter suas experiências,

errar, acertar, construir, criar, copiar, desenvolver planos, e isto aumentará

sua auto-estima, revelando que é capaz, que pode usar o pronto, mas

também pode fazer muitas coisas para si própria.

O desenvolvimento da autonomia na criança é aspecto fundamental

para a maturidade emocional e o equilíbrio entre o psíquico e o mental.

50

CONCLUSÃO

Ao finalizar o presente trabalho, pode-se constatar o quanto é

fundamental a liberdade de expressão nas brincadeiras e atividades

desenvolvidas na faixa etária de 3 a 6 anos na educação infantil.

Porém, essa perspectiva não é tão fácil de ser adotada na prática.

Podemos nos perguntar: como colocar em prática uma proposta de

educação infantil em que as crianças desenvolvam, construam, adquiram

conhecimentos e se tornem autônomas e cooperativas? Como os

professores favorecerão a construção de conhecimentos se não forem

desafiados a construírem os seus?

O caminho que parece possível implica pensar a formação

permanente dos profissionais que nela atuam. Os educadores deverão

contemplar a brincadeira como princípio norteador das atividades didático-

pedagógicas, possibilitando às manifestações corporais encontrarem

significado pela ludicidade presente na relação que as crianças mantêm com

o mundo.

Esta integração, seria formada por uma tríade: ensinante, aprendente

e o jogo, onde haveria uma troca constante entre as pessoas envolvidas

neste processo, respeitando sua maturidade intelectual e emocional. Assim,

a criança irá gradativamente internalizando as informações e refletindo sobre

elas para que surjam novas questões.

Todo trabalho educativo supõe uma avaliação. A avaliação possibilita

verificar se os objetivos propostos estão sendo atingidos, ao mesmo tempo

em que fornece informações que ajudam a planejar as atividades para

determinado fim. Assim sendo, o educador deverá conhecer as fases do

desenvolvimento infantil, observar as crianças com atenção, conhecer os

objetivos das atividades que as crianças realizam e avaliar o seu próprio

trabalho e ao responder essas questões, o profissional descobrirá melhores

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caminhos para uma maior aproximação, indo de encontro e de forma

positiva a prática do trabalho pedagógico com as crianças.

Enfim, brincar é coisa séria!!!

52

ANEXOS

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54

55

56

57

BIBLIOGRAFIA

ALENCAR, Eunice Soriano de (org). Novas contribuições da Psicologia aos

Processos de Ensino e Aprendizagem. São Paulo: Ed. Cortez, 1992.

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de A. Didática de Pré-escola: vida criança: brincar e aprender. São Paulo:

FTD, 1996.

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Editora Unidas, 1993.

KAMMI, Constance e DEVRIER, Rheta. Piaget para a Educação Pré-

escolar. Porto Alegre: Artes Médias, 1991

KRAMER, Sonia (coord). Com a Pré-escola nas mãos: uma alternativa

curricular para a Educação Infantil. São Paulo: Editora Ática, 1994.

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aprendizagem pode ser uma grande brincadeira. Rio de Janeiro: Editora

WAK, 2001.

OSTROWER, F. Criatividade e Processos de Criação. Rio de Janeiro:

Editora Imago, 1977.

PIAGET, Jean. A formação do símbolo na criança: imitação, jogo e sonho,

imagem e representação. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 1975.

PIAGET, Jean. Seis Estudos e Psicologia. Rio de Janeiro: Editora Forense

Universitária, 2004.

58

RALLO, Rose Mary Petry de e QUEVEDO, Zeli Rodrigues de. A magia dos

jogos na Educação. Porto Alegre: Editora Kuarup, 1993.

SEBER, Maria da Glória. Construção da inteligência pela criança: atividades

do período pré-operatório. São Paulo: Editora Scipione, 1991.

SMOLE, Kátia Cristina Stocco. A Matemática a Educação Infantil. São Paulo:

Editora Artmed, 2000

VIGOTSKY, L. S. Pensamento e Linguagem. São Paulo: Editora Martins

Fontes, 1991.

VIGOTSKY, L. S.; LURIA, A. R. e LEONTIEV, A. N. Linguagem,

Desenvolvimento e Aprendizagem. São Paulo: Editora Ícone, 1988.

WINNICOTT, D. W. O Brincar e a Realidade. Rio de Janeiro: Imago Editora,

1975.

WINNICOTT, D. W. A Criança e seu mundo. Rio de Janeiro: Editora

Guanabara Koogan, 1982.

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ÍNDICE

INTRODUÇÃO ............................................................................................ 08

CAPÍTULO I – A importância do ato de brincar .......................................... 11

1.1 – A importância do ato de brincar ...................................... 12

1.1.1 – Tipo de Jogos ...................................................... 15

1.1.2 – Brincadeiras na Pré-Escola e seus princípios

psicológicos ..................................................................... 17

1.1.3 – Evolução do Jogo ................................................ 22

1.1.3.1 – Jogos Funcionais ................................. 22

1.1.3.2 – Jogos Simbólicos ................................. 22

1.1.3.3 – Jogos de Aquisição .............................. 23

1.1.3.4 – Jogos de Construção ........................... 24

1.1.3.5 – Jogos de Regras .................................. 25

CAPÍTULO II – Fantasia: um ensaio para a realidade ................................ 26

CAPÍTULO III – A interação do profissional de psicopedagogia com as

brincadeiras e jogos da educação infantil .................................................... 33

CAPÍTULO IV – Brinquedos e brincadeiras para a faixa de 3 a 6 anos ...... 42

CONCLUSÃO .............................................................................................. 50

ANEXOS ...................................................................................................... 52

BIBLIOGRAFIA ........................................................................................... 57

ÍNDICE ......................................................................................................... 59