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O diagnóstico, bem sabe, é um processo intelectivo, com etapas, que permite efetuar através do raciocínio uma elaboração construtiva, que se baseia numa anamnese correta, no exame físico bem-realizado, e na interpretação judiciosa dos exames de laboratório e da evolução. Por isso defendemos que o exame pelo urologista é o passo mais importante no diagnóstico de câncer da próstata.

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A Próstata e a Vida

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São Paulo 2015

A Próstata e a Vida

Lado A

Gustavo Eduardo Teixeira da Rocha

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Copyright © 2015 by Editora Baraúna SE Ltda.

Projeto gráfico Monica Rodriguês

Revisão Andrea Bassoto

CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTESINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ

________________________________________________________________R573p

Rocha, Gustavo Eduardo Teixeira da A próstata e a vida/Gustavo Eduardo Teixeira da Rocha. - 1. ed. - São Paulo: Baraúna, 2014.

ISBN 978-85-7923-995-3

1. Literatura brasileira. 2. Próstata - Câncer. I. Título.

14-12308 CDD: 869.93 CDU: 821.134.3(81)-3________________________________________________________________19/05/2014 23/05/2014

Impresso no BrasilPrinted in Brazil

DIREITOS CEDIDOS PARA ESTAEDIÇÃO À EDITORA BARAÚNA www.EditoraBarauna.com.br

Rua da Quitanda, 139 – 3º andarCEP 01012-010 – Centro – São Paulo – SPTel.: 11 3167.4261www.EditoraBarauna.com.br

Todos os direitos reservados.Proibida a reprodução total ou parcial, por qualquer meio, sem a expressa autorização da Editora e do autor. Caso deseje utilizar esta obra para outros fins, entre em contato com a Editora.

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Apresentação

O livro do Dr. Gustavo Eduardo Teixeira da Rocha, intitulado “A Próstata e a Vida” é mais que um livro de informações científicas e mais que uma história de vida. É um poema, nascido na alma de um médico que, com extraordinária sabedoria, consegue produzir uma obra lite-rária na interface do sofrimento e da poesia; dos encantos do velejar e do sentir-se no leito de um hospital; do saber em medicina ortodoxa e do saber da cultura geral; da frieza dos laudos médicos e da beleza dos versos dos poetas.

Poucos conseguem ver a vida nesta multiplicidade de dimensões, quando a dimensão motivadora da inspiração é o diagnóstico de um câncer de próstata. É como se a doença, na sua manifestação ameaçadora, fizesse romper a alma e dela libertasse o sagrado encanto pela vida, tradu-zindo em experiências de íntimo contato com a imensidão dos mares. Ao leitor, fica a agradável percepção de que a

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integração entre a pessoa, o velejar e o mar transcende as limitações da individualidade humana e deixa a alma ve-lejando horizontes infinitos, onde sofrimento e serenidade se unem e se sobrepõem ao drama da vida.

Não apenas os homens, de qualquer idade, mas também as mulheres em todas as idades crescerão com a leitura deste livro. Nele nos reconheceremos em nossas fraquezas humanas, relatadas com fidelidade e sem dis-farces de “super-homem”. Nele também encontraremos fortaleza que também é nossa, como humanos que so-mos. Tudo muito bem-relatado a cada tempo, tudo em seu momento e lugar.

Neste livro, o Dr. Gustavo deixa revelado que, na alma do extraordinário médico ortopedista, de incansá-veis leituras e constantes estudos de atualização, existe um poeta do mar, um velejador experiente de tormentas do mar e da alma, que, sem perder a direção dos ventos, sabe que existe um horizonte de bonança para qual todos nós navegamos, não obstante os temporais de percurso.

Parabéns, Dr. Gustavo Teixeira, por nos presen-tear com este livro e por me permitir a honra de es-crever esta apresentação.

Eliane S. AzevêdoProfessora de Genética da

Faculdade de Medicina da UFBaEx-Reitora da UFBa

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Prefácio (a seis mãos)

I

Convidado a prefaciar este livro, logo percebi a mi-nha responsabilidade, embora seja uma honra fazê-lo. O autor, Dr. Gustavo Eduardo Teixeira da Rocha, homem de cultura, de talento e de comprovada capacidade na área da Medicina e do humanismo, conhecido e admira-do, dentro e fora da Bahia, dispensaria, na verdade, qual-quer tipo de respaldo científico ou mesmo literário.

Ortopedista de renome, nascido no interior pobre da Bahia, diplomado na primeira escola de Medicina do Brasil, correu o mundo se especializando, mas sem esquecer o berço.

E passou a gostar de viver no seu veleiro, o Curu-mim. A Próstata e a Vida é um pouco da minha vida. É um trabalho que traduz experiência do seu autor, sua in-teligência e seu espírito criador, buscando sempre ser útil na revelação de uma vocação de mestre. Aqui, poderia

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relatar o fato que dá título ao livro, com toda a sua co-ragem, grandeza e desprendimento. Não o farei, porém. Eis que o autor, logo adiante, fala disso com a veemência dos que sofreram e dos que venceram a amarga estória da dor. Essas considerações prévias legitimam, assim, o surgimento deste livro, no qual Gustavo Teixeira, no me-lhor estilo e na melhor linguagem, expõe sua vida e seus problemas cruciais. Estudioso, em dia com as ideias e as técnicas do seu tempo, acompanha o vertiginoso avanço da ciência e da tecnologia, no sentido de bem situar-se entre seus pares da área médica.

Este livro, estou certo, terá lugar de destaque e de relevo nas boas bibliotecas, a exibir um drama pessoal que servirá a nós outros como uma lição de vida e de grandeza moral. Foi uma honra para mim, repito, emitir esta opinião. O leitor há de concordar comigo, aplaudindo-o também.

Dr. Manoel Juncal PazosUrologista

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II

Normalmente, quando um homem é informado de que é portador de câncer de próstata, perguntas tais como “o que é câncer da próstata?”, “como pode ser tratado?” passam a atormentá-lo. Também é normal que surjam te-mores e preocupação no paciente, em sua família e nas pessoas mais próximas de seu convívio. Muitos homens e seus familiares relatam que sua angústia se alivia quando começam a melhor entender e a tratar essa enfermidade.

O câncer da próstata é atualmente um dos tumo-res de maior incidência no sexo masculino. Quando não detectado e tratado em tempo hábil, traz repercussões graves e até a morte para o paciente. Ele traz em si não só o medo da morte, como todo câncer, mas medos que tocam no próprio cerne da masculinidade, pois o trata-mento, não importa a forma que se adote, quase invaria-velmente acarreta os conhecidos riscos da incontinência e impotência que atingem direto qualquer homem em sua imagem de si mesmo, seu orgulho e prazer de viver, e que, por sua própria natureza, apresentam a propensão a tornar os homens reticentes quanto ao assunto.

O melhor conhecimento da neoplasia pelos médi-cos, meios de diagnósticos mais eficientes, maior preocu-pação com a doença pelos pacientes, em decorrência de

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sua divulgação pelos meios de comunicação, vêm modifi-cando a incidência do seu diagnóstico, ainda em estádios precoces. Há 18 anos estudo e trato o câncer de próstata e acredito que a prevenção através da orientação e detecção precoce é a chave para se aumentar as chances para a cura. “PREVENÇÃO É A SOLUÇÃO”.

“A Próstata e a Vida”, escrito pelo Dr. Gustavo Tei-xeira, veio preencher soberbamente este vácuo existente na nossa literatura, que é a falta de informações preventi-vas para leigos. Dotado de extraordinária sensibilidade e utilizando sua experiência pessoal na luta contra o câncer da próstata, o Dr. Gustavo enfatiza o valor da preven-ção, seu tratamento e sua evolução após a cirurgia, de forma franca e realista, apresentando as dúvidas e os te-mores que atingem um portador da doença e que nunca poderiam ser descritos nem mesmo pelo mais brilhante especialista, sentado do outro lado da mesa. Ao descrever sua história, o autor ensina que LUTAR CONTRA O CÂNCER DA PRÓSTATA VALE A PENA!

Francisco Sávio PintoUrologista Oncológico

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III

Inesperadamente, numa noite corriqueira, recebo uma ligação de Salvador, de um colega médico de quem ouvi fa-lar algumas vezes ser um excelente ortopedista, ter um vasto conhecimento e ser dedicado a seus pacientes e familiares.

Estava decidido a ser operado de prostatectomia, pois já pesquisara, instruíra-se de todos os caminhos e destinos que um homem com biópsia de próstata posi-tivo para adenocarcinoma poderia ter. Esse profissional tem a noção real do que é ser portador de câncer de prós-tata: o estadiamento, o tratamento a ser usado, as com-plicações pós-operatórias imediatas, as sequelas advindas, as falhas da conduta e as falhas humanas.

Determinado a extirpar de si a “besta apocalíptica”, restava-lhe apenas escolher a equipe e o hospital que lhe operaria. Poderia ter sido em Cleveland (EUA) ou em Fortaleza, com o emérito Dr. Édson Pontes, a sumidade em cirurgia de prostatectomia radical, do qual me pedira informações e encontrava-se no Ceará, naquela ocasião. Estaria no outro dia em Fortaleza para fazer contato.

Pouco mais de 24 horas transcorreu entre nosso contato inicial e a sua cirurgia, realizada pelos colegas que mencionei.

Ficou, naquele momento, a imagem de um homem de fé, serenidade, decisão e autoconfiança, que ajudaria a vencer a batalha.

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Em “A Próstata e a Vida”, o Dr. Gustavo mescla sua experiência pessoal de portador de adenocarcinoma de próstata, seu tratamento e recuperação (rico em informa-ções sobre o órgão e as doenças que o acometem), com as viagens do Curumim, recordações de sua vida.

Os lances e “flashes” de sua vida, assim como fra-ses, versos, textos, músicas de outros autores que mar-caram sua trajetória terrena, tornam a leitura agradável, ao mesmo tempo em que vai conscientizando o homem da necessidade da prevenção e tratamento do câncer de próstata, desmistificando e facilitando sua compreensão. É por excelência um livro indispensável aos homens que cruzam a barreira dos 40 anos e desejam ter uma longe-vidade saudável.

Dr. Gilson de Sousa Oliveira FilhoUrologista

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Introdução

A ideia deste livro começou quando estava no lei-to do hospital, no pré-operatório. Logo após o inter-namento, comecei a rabiscar fatos e acontecimentos de minha vida para me manter ocupado e gravar algumas coisas que relembrava da minha infância. Estava eu ali, naquele momento, após a saída do quarto da equipe cirúrgica do Dr. Sálvio, com uma longa experiência de cirurgia de tumores, especialmente a cirurgia radical. Tinha treinamento nos Estados Unidos e no Japão (e vinha já há alguns anos realizando a cirurgia pelo méto-do de Dr. Walch de Baltimore) e também no Memorial Sloan Kethering Câncer, em Nova York).

Tinha eu ido a Fortaleza para rever familiares, quan-do Gílson apresentou-me a Saulo e me convenceu a fazer a operação em Fortaleza, onde ele poderia me dar assistên-cia, juntamente com outra minha prima, Dra. Angélica,

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que já há muitos anos residia naquela capital. Meu médi-co assistente, Dr. Juncal, também especialista em cirurgia urológica e bastante experiente na cirurgia radical, já me tinha preparado, solicitando todos os exames necessários, e marcado a operação no centro cirúrgico do Hospital Português. Já em Fortaleza, com menos de 12 horas de contato com o médico, vi-me internado no hospital.

No decorrer da narração, o leitor vai verificar que misturo fatos e dados, bem como a cronologia, pois tudo isso foi colocado à medida que os fatos surgiam na minha lembrança, mantendo-me a mente ocupada até dormir sob o efeito de drogas. Logo que acordei da anestesia, com os braços presos e recebendo soluções endovenosas, já se passando as primeiras 24 horas, passei a gravar em um gravador pequeno, de bolso.

Depois, julguei necessário tornar público minhas anotações. Os nomes e fatos relatados por alguns dos per-sonagens, faço questão de publicá-los no livro. Não se tra-ta, portanto, de ficção. E se essa mensagem for lida apenas por um pequeno número de pessoas, e se quem ler venha a aprender algo com minha experiência e meu relato, já estarei tranquilo por ter cumprido minha missão.

Também me moveu a esta narrativa o desejo de que a maior parte dos homens, principalmente meus amigos e contemporâneos, coloque em sua agenda a rotina dos exames urológicos, pois somente assim poderemos ven-cer esse terrível mal. Acredito piamente que muitos deles nem sequer se atinam para a grandeza e a complexidade da doença, que poderá virar pelo avesso a vida de qual-quer um desses machos.

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Denominei o câncer de próstata, sobretudo o ade-nocarcinoma, de “Hidra” ou “Besta do Apocalipse”, pois lembra a Hidra da mitologia grega (chamada Hidra de Lerna, porque vivia nos pântanos de Lerna, na Argólia, cidade da Grécia, na Região do Peloponeso). Conta a mi-tologia que Hércules por várias vezes cortou suas cabeças, que renasciam, e só conseguiu terminar a tarefa quando seu sobrinho lolau começou a queimar as cabeças, à medi-da que eram cortadas.

Acontecimento que se manifesta por seu poder de destruição, comparei com o tumor de próstata (adeno-carcinoma) à hidra, por ser também capaz de produzir metástase à distância, assim também cheio de tentácu-los, cada metástase tendo o poder de renascer se não for devidamente tratada.

Comparei também com a Besta do Apocalipse de São João, pois relembrei uma passagem das histórias contadas por meu tio José, à beira do fogo de lenha na casa de minha avó, nos frios invernos bonfinenses. Era a história da Bes-ta-Fera que saía do mar e tinha sete cabeças e dez chifres, e que, nas noites de escuro, ia chegando sorrateiramente, devagarinho, até que dava o seu bote mortal. Era a história que mais nos atemorizava, mas que todas as vezes que tio José ia nos visitar, pedíamos-lhe que contasse.

Comparativamente, o tumor de próstata (a Besta ou a Hidra) tem que ser combatido logo no início, cortando--se o mal pela cabeça. Daí a importância do diagnóstico precoce, antes que o monstro venha, com seis tentáculos malignos, envolver todo nosso corpo, quebrando nossos ossos e levando o nosso fôlego vital.

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Lado B

Gustavo Eduardo Teixeira da Rocha

São Paulo 2015

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Rocha, Gustavo Eduardo Teixeira da A próstata e a vida/Gustavo Eduardo Teixeira da Rocha. - 1. ed. - São Paulo: Baraúna, 2014.

ISBN 978-85-7923-995-3

1. Literatura brasileira. 2. Próstata - Câncer. I. Título.

14-12308 CDD: 869.93 CDU: 821.134.3(81)-3________________________________________________________________19/05/2014 23/05/2014

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Lado “B”Minha Terra, Minha Gente

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I

Uma Vida de Saúde

N asci numa pequenina cidade de nome Saúde, situada na região do Piemonte da Diamantina, Bahia. Pequena, não conseguiu acompanhar o

tempo. Mas lá as pessoas dificilmente adoeciam, e senta-vam-se à porta das suas casas, todos os fins de tarde, para um bate-papo amigável e intercâmbio de notícias.

Sob o signo da saúde, o maior patrimônio que o ho-mem possui, atravessei toda minha vida, até os 57 anos. Minha infância foi uma vida livre pelos campos, bastante alegre e saudável, sem contar as quedas de árvores, panca-das, cortes com linha de arraia ou de pesca. Nem mesmo uma dor de dente, tão comum naquela época, prejudicou as brincadeiras com os colegas de infância.

Tinha eu seis anos de idade, quando minha família se transferiu para Senhor do Bonfim, antiga Vila Nova da Rainha, também região do Piemonte da Diamanti-

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na. Ali, aos seis anos, fui batizado na igreja matriz. Nes-sa época sofri um acidente grave, uma queimadura com água fervendo, que me deixou uma cicatriz extensa ao nível do hemitórax esquerdo e ao nível da face, que no decorrer dos anos desapareceram em quase sua totalida-de. A cicatriz da face parecia o desenho de um pequeno mapa, o que me valeu o apelido de “cara-de-mapa” no momento das brigas com os colegas.

A Região

O Piemonte da Diamantina é uma das regiões econô-micas do estado da Bahia (vide localização na figura abaixo). É de se estranhar que um nome tão bonito seja praticamente desconhecido, até mesmo ignorado pelas prefeituras da re-gião. Um nome tão interessante poderia ser mais divulgado para identificar a região, a exemplo do que ocorre com a Chapada Diamantina, que é limítrofe ao Piemonte.

É uma região de clima predominantemente semi-árido, inserida no Polígono das Secas. A diversidade do seu relevo (tabuleiros e serras) proporciona, entretanto, climas amenos em altitudes mais elevadas.

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II

Lembranças...

C omecei meu curso primário na Escola Bartolo-meu de Gusmão, com a Profª Aristéia Café. Sen-do canhoto de nascimento, ela me obrigava a es-

crever com a mão direita, o que me deixou ambidestro, facilitando muito, posteriormente, na minha especializa-ção de cirurgião-ortopédico. Educadores como os irmãos Evaldo, Damasceno, Pio Gerônimo, Macedo e outros, tanto marcaram meu caráter e minha vida. Irmão Ludo-vico, cuja cabeça era lisa, completamente sem cabelos, francês de nascimento, só se dirigia a nós em francês, para que nos habituássemos com a língua.

Na grande área do colégio, com quadras de esporte, apiário e um grande número de árvores frutíferas, minha adolescência foi quase paradisíaca. Era uma época em que nas nossas cidades não existiam drogas e alcoolismo entre os jovens, e o conceito de trabalho, de verdade, de hones-

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tidade e do respeito era fato primordial da nossa educa-ção. Dizia o Irmão Chanel, quando com ele cuidávamos das abelhas e das hortas: “O pior trabalho é o nenhum”. Nesse ambiente fui educado. Tínhamos aula de teatro, poesia, trabalhos manuais da horta e no campo e uma variedade de esportes. Aprendemos que o importante era competir, e não ganhar. Nesse ambiente fui educado.

Estava numa aula de francês quando um portador veio avisar que meu pai havia falecido, provavelmen-te de enfarte do miocárdio, aos 63 anos de idade. Era uma quinta-feira. Minha vida sofreu um grande impacto. Tinha 11 anos, e minha mãe, bastante jovem, 28 anos, assumiu a chefia da família, com a responsabilidade de educar seis filhos. Meu pai foi sepultado no outro dia pela manhã. Como era costume local, somente saímos de casa para a missa do sétimo dia, e todos vestidos de preto. Assim, de luto, continuamos até a missa de um ano.

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III

Doce Infância

É ramos um grupo de meninos na adolescência, mas que já pensávamos como adultos, brincávamos de empinar arraia (pipa) com linha temperada de vidro

pisado. Faziam parte do grupo Lambaio (meu compadre), Arílio, Jega-Velha, Papagaio (Guido Guerra), Bololó, Zé Titela, Nequinho, Valdevir, Silu, Clóvis, Washington, To-nho (John Bull), Vieira, Zanoni, Humberto Malheiros, Ja-cinto Sangalo, Diógenes, Ion e outros de uma grande lista.

A ginástica que fazíamos era trepando no muro das Sacramentinas, cujas fardas das alunas vinham até o meio da canela, e nos deliciávamos quando elas sentavam, pois víamos os joelhos. De uma feita, Sílvio Guimarães se des-cuidou e caiu do muro para o lado do colégio. Lembro-me dos dias santificados na igreja matriz, as alunas do colégio Sacramentinas sentadas de um lado da igreja e os alunos do ginásio do colégio Sagrado Coração do outro lado. Era uma

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exigência das irmãs e dos irmãos Maristas; creio que para evitar o “estímulo ao pecado”. Mesmo assim, os namorados arriscavam passar um bilhete, e muitos deles se tornaram matrimônios que perduram até hoje.

Após as ginásticas e as peladas, os alunos iam tomar banho, nos banheiros que eram construídos em fila. O banho era monitorado pelo irmão Pio Gerônimo. Um apito, e o primeiro grupo ficava em fila da porta do ba-nheiro; um segundo apito, todos entravam; no terceiro, tirávamos os calções e abríamos o chuveiro e nos ensa-boávamos. Outro apito, nos enxugávamos, vestíamos as roupas e saíamos. Ele dizia que era para economia de água, não havia tempo ou possibilidade da masturbação, que era o único pecado cometido e confessado ao padre Lisboa, todas as sextas-feiras, pagos com penitência, a de-pender do número de pecados da semana.

Tive uma infância muito alegre e feliz. Corria nos cam-pos e caçava pássaros com baladeiras (estilingues). A caatin-ga, no período das chuvas de trovoadas, é bastante verde, com o perfume das flores do alecrim, rica em frutos silves-tres – umbuzeiros, araticum, guabirabas, azedinhas, fruto de palmas, de mandacaru, faveleiras, ouricuri, cajazeiras, ariris. Tudo isso fazia parte da rica vegetação da caatinga, que qua-se desapareceu com o desmatamento e as queimadas.

Saíamos caçando e aprendíamos a viver com tudo que a riqueza da caatinga nos apresentava. Éramos fortes e ativos, sujeitos a refeições fugazes, mas sadias. As roli-nhas, bem-te-vis, juritis, garrinchas e cardeais que canta-vam, no fim da tarde, davam-nos a impressão de que eles sofriam com o pôr-do-sol.

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Tomávamos banhos nus na lagoa salgada, com uma turma de grandes amigos de infância, muitos dos quais nos mantemos em contato até hoje.

Éramos todos crianças, meninos de origem ligadas ao campo. A maioria dos nossos pais tinha nascido na zona rural, em fazendas, de maneira que a nossa inti-midade com a caatinga era muito grande. O grupo era composto por Miguel Martins, Tonho, Messias, Geral-do, Timo, os filhos de D. Bebé – Ernani, Jorge e Paulo Silva (Paulo da Bebé) –, Ion e seu compadre Sílvio, e outros. Tínhamos o hábito de ir para o distrito de Um-buranas, a três quilômetros da sede do município. A estrada era cheia de chácaras, roças de milho e melancia, umbuzeiros e cajazeiras.

No caminho, fazíamos o primeiro abastecimento da chácara de D. Mãezinha, com laranjas e mangas. Mais na frente subíamos nas cajazeiras e pés de umburana. Tomá-vamos banho no tanque de Flávio Silva, pai de Timo. Lá bulíamos com os jumentos e ficávamos observando um animal tão pequeno com um enorme pinto, balançando e batendo na barriga.

Todos crianças, na faixa de seis a nove anos. Éra-mos considerados uma turma de endiabrados, pois an-dávamos sempre juntos e sempre aprontávamos alguma novidade que saía da cabeça de uma juventude bastante criativa. No retorno, passávamos na roça de Compadre Dedinho, para nos refrescarmos com algumas melancias. Subíamos no muro baixo da casa de Felinto, crente, e todos em fila, sentados, ficávamos conversando.

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Primeiro, apostávamos quem mijava mais longe; de-pois, quem cuspia a uma distância maior; quem assobia-va mais alto. Certa vez inventaram um concurso de rolas, para ver quem tinha a maior. Cada um tirou um talo de capim e mediu a sua. Sempre ganhava Tonho, e em segun-do Miguel. Depois passávamos na Padaria de Sr. João Fer-nandes, para filar um pão quente, fabricado na hora pelo nego Roxo. De barriga cheia, íamos para a frente da casa do Sr. Fernando Silva, pelo caminho mais longo, passan-do pelo Chafariz, Roça de João Avelino. Saltando a cerca, entrávamos no atual muro do ginásio, para tirar seriguelas e Jamelão, e saíamos em frente à casa de D. Bebé. Já era fim de tarde e começávamos a pelada, e nos intervalos co-míamos peta com umbuzada oferecida pela mãe de Jorge.

A bola era de meia ou de bexiga de boi. Éramos bastante felizes. De vez em quando saíamos na porrada, mas coisa passageira. Certa vez, Jorge subiu no muro do vizinho, no intervalo do baba, para ver umas moças que moravam do outro lado, e voltou alegre, dizendo que ti-nha visto o “xibiu” de um delas. Depois nos falou que era mentira. De outra feita, a cadelinha da vizinha saiu com um lacinho de fita amarrado no pescoço e se juntou a uns cães que estavam na rua, voltando engatada e guinchada. Tonho falava que acontecia a mesma coisa com as pessoas adultas, para poder nascer os filhos.

Sempre andávamos em grupos. Todos nós tínhamos baladeiras, com as quais atirávamos em urubus, gatos, ga-linhas. Também as usávamos para tirar frutas das árvores em que não podíamos subir, quase sempre na chácara do Cocone, ou na do bolsos peões, feitos de madeira na ofi-