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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU PSICOPEDAGOGIA A PSICOPEDAGOGIA NO BRASIL E SUAS DIFERENTES IDENTIDADES Por: Roberta Chaves Carvalho Orientado por: Prof. Dr. Vilson Sérgio de Carvalho 2009.01

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

PSICOPEDAGOGIA

A PSICOPEDAGOGIA NO BRASIL E SUAS

DIFERENTES IDENTIDADES

Por: Roberta Chaves Carvalho Orientado por: Prof. Dr. Vilson Sérgio de Carvalho

2009.01

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU

PSICOPEDAGOGIA

A PSICOPEDAGOGIA NO BRASIL E SUAS

DIFERENTES IDENTIDADES

Por: Roberta Chaves Carvalho Orientado por: Prof. Dr. Vilson Sérgio de Carvalho

Trabalho monográfico entregue como requisito parcial para conclusão do curso de Pós-Graduação Lato Sensu e obtenção do título de especialista em Psicopedagogia.

2009.01

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AGRADECIMENTOS

Agradeço ao meu orientador, Prof. Dr. Vilson Sérgio de Carvalho, pela paciência com minha dificuldade em escrever e me organizar. Meu agradecimento mais sincero.

Agradeço aos colegas do curso que tanto somaram

durante as discussões nas aulas e trabalhos, levo um pouco de cada um e espero deixar algo também.

Agradeço aos mestres que, apesar das

dificuldades, desenvolvem um trabalho nobre. Minha admiração.

Roberta Chaves Carvalho

4

DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha mãe, Maria da Glória, e a meu irmão, Edgard, obrigado por serem minha família. Dedico também ao meu companheiro, Alexandre, que compreendeu a falta de tempo em muitos finais de semana, me apoiando e incentivando sempre. Obrigada por tudo.

Roberta Chaves Carvalho

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RESUMO

O presente trabalho pretende, ao abordar o tema da Psicopedagogia no

Brasil e Suas Diferentes Identidades, discutir e analisar o histórico da

Psicopedagogia no Brasil e suas diferentes identidades nas áreas de atuação

no mercado de trabalho.

Em ‘A História da Psicopedagogia’, realizou-se a revisão bibliográfica

sobre o tema desde o surgimento desta profissão até a atualidade. No capítulo

sobre o ‘A Psicopedagogia no Brasil’ foram realizadas análises sobre a

Psicopedagogia em nosso país e no capítulo ‘As Diferentes Identidades da

Psicopedagogia no Brasil’ foi realizada uma pesquisa bibliográfica que discute

os diferentes papéis que este profissional desempenha atualmente.

6

METODOLOGIA

Os procedimentos para a elaboração desta pesquisa foram escolhidos na

intenção de caminhar com as questões relacionadas aos interesses que guiam

este trabalho. Segundo Nogueira, (2004) “A escolha metodológica é uma

incumbência do pesquisador. Ele fará aquela em que tem mais competência e

afinidade para realizar.” (p. 69). Para tanto, a metodologia escolhida foi a

pesquisa bibliográfica.

Ainda segundo Nogueira (2004) “A pesquisa bibliográfica é constituída

por material já elaborado, analisado e publicado em forma de livros, artigos e

outros impressos.” (p.74). Desta maneira, a pesquisa abrange a leitura, análise

e interpretação de livros e textos em geral.

O material foi escolhido através de um levantamento sobre teóricos que

discorrem sobre o tema em questão. O objetivo foi obter atualizações sobre a

temática e as diferentes contribuições científicas sobre a pesquisa abordada,

além de encontrar respostas sobre as questões levantadas. Em seguida,

leituras foram realizadas com o intuito de acompanhar anotações para servir de

fundamentação teórica deste estudo.

Segundo Andrade (1999) “O levantamento bibliográfico é uma etapa

fundamental da pesquisa. Além de proporcionar uma revisão sobre a literatura

referente ao assunto.” (p.124). Fica claro que a pesquisa bibliográfica dá

subsídios para elaborar o histórico de um determinado tema.

Diante do tema deste trabalho, a pesquisa bibliográfica foi considerada a

mais conveniente, uma vez que segundo Nogueira (2004) ela é a mais

adequada para investigação de fatos históricos e de evolução de processos.

Será feito um estudo histórico que busca obter melhor conhecimento do campo

a ser investigado.

7

A pesquisa teórica teve como objetivo fazer um levantamento histórico

para entender e analisar a Psicopedagogia no Brasil e como suas diversas

identidades no mercado de trabalho foram se formando.

8

SUMÁRIO

INTODUÇÃO.....................................................................................................09 CAPÍTULO I – A HISTÓRIA DA PSICOPEDAGOGIA.....................................13 CAPÍTULO II – A PSICOPEDAGOGIA NO BRASIL .......................................19 CAPÍTULO III – AS DIFERENTES IDENTIDADES DA PSICOPEDAGOGIA NO BRASIL..............................................................................................................23 2.1 – Psicopedagogia Institucional....................................................................24 2.2 – Psicopedagogia Clínica............................................................................28 CONCLUSÃO....................................................................................................33 BIBLIOGRAFIA.................................................................................................35 WEBGRAFIA.....................................................................................................36

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INTRODUÇÃO

Segundo Bossa (2007), desde o século XVI, pensadores da Europa já se

preocupavam com as problemáticas que causavam as dificuldades de

aprendizagem. Nesta época, as explicações para estes problemas eram

pautadas na genética, taxadas como patologias clínicas e tratadas como tal.

No século XIX, a busca de soluções para estas dificuldades uniu

profissionais de áreas como medicina, psicanálise, psicologia, fonoaudiologia e

pedagogia buscando um atendimento interdisciplinar que atendesse as

crianças da forma mais completa possível.

Os centros de atendimento interdisciplinar aumentaram de número tanto

na Europa quanto nos Estados Unidos. Com esta demanda, já no início do

século XX, surge a necessidade de unir conhecimentos para a eliminação dos

sintomas que causavam problemas no desenvolvimento normal.

Na década de 1950, em Buenos Aires, Argentina, é criada a graduação

em psicopedagogia. O objetivo deste curso era formar profissionais capazes de

realizar diagnóstico e tratamento dos mais diversos problemas que afetavam a

aprendizagem. Por vários fatores, o curso acaba tendo como foco a

psicanálise, fazendo uso de testes psicomotores e de inteligência, ou seja,

instrumentos precisos. (Bossa, 2007).

Somente na década de 1970, quando pensadores brasileiros

começaram a justificar o fracasso escolar como tendo suas causas também em

problemas sociais é que a psicopedagogia chega ao Brasil. Ao contrário da

Argentina, em nosso país o curso chega não em forma de graduação, mas

como uma pós-graduação com duração de dois anos, ou seja, uma

especialização.

10

Neste momento, a atuação do psicopedagogo era baseada nos modelos

médicos de atendimento com auxílio de psicólogos. Neste contexto, o Brasil

recebeu forte influência do modelo de psicopedagogia da Argentina. Assim, a

análise das crianças passou a ser feita através de diversas correntes da

psicologia com objetivo de fazer diagnóstico e tratamento de sintomas, este é o

enfoque do atendimento clínico.

Aos poucos, a prática da psicopedagogia também ganhou um enfoque

preventivo e começou a ser realizada por profissionais de diversas áreas e não

somente por psicólogos, o que caracterizou a atuação do psicopedagogo

institucional.

Com o crescimento acelerado dos cursos de psicopedagogia em nosso

país, surge a preocupação com a qualidade da formação desses profissionais.

Com a diversidade de currículos e enfoques, a identidade do curso fica

igualmente comprometida.

Por ser uma área de conhecimento novo, ela ainda está desenvolvendo

seu próprio quadro teórico. Sobre este desenvolvimento, Bossa afirma (2007)

“É uma nova área de conhecimento, que traz em si as origens e contradições

de uma atuação interdisciplinar, necessitando de muita reflexão teórica e

pesquisa”. (p.19).

A psicopedagogia tem seu foco de estudo nas dificuldades de

aprendizagem e nos fatores que podem influenciar um desenvolvimento

normal. Para tanto, objetiva ir além da junção entre pedagogia, psicologia e

psicanálise e por este motivo ainda está em construção.

Sobre o foco da psicopedagogia, Andrade (2002) afirma: “os distúrbios

não são o foco da psicopedagogia, mas sim os aspectos subjetivos e autoria de

pensamento” (p. 18).

11

Sendo assim, o foco deve ser todo o processo de aprendizagem

humana, considerando aspectos subjetivos que influenciam o desenvolvimento

como a relação da criança com o meio, família, escola, sociedade e o reflexo

dessas relações em sua vida.

Diante de tamanha complexidade, fica claro que a aprendizagem

humana possui enorme dimensão. Deste modo, a psicopedagogia surge da

demanda que é a dificuldade de aprendizagem e evolui na medida em que

mais recursos surgem para atender esta demanda. Este objeto de estudo

dependerá do trabalho do psicopedagogo com enfoque clínico ou preventivo.

Segundo Bossa (2007) o trabalho clínico busca compreender os motivos

implícitos que impedem aprendizagem normal, buscando entender como o

sujeito aprende e favorecendo a aprendizagem. Já no trabalho preventivo,

desenvolvido em instituições, são avaliados os processos metodológicos e a

dinâmica da instituição buscando evitar problemas futuros ou mediar os já

existentes causados por problemas na instituição.

Ao longo da história, o curso de psicopedagogia entendeu seu objeto de

estudo de várias formas diferentes. Atualmente fala-se em estudar o sujeito

“aprendendo”. Fica evidente a importância das relações da criança com os que

se propõem a educá-la. Sobre esta relação, afirmou Andrade (2002):

“Aprendente é um ente de relações e, portanto, complexo, essencialmente social que carece do outro, do ensinante, aquele que lhe empresta a possibilidade de pronunciar-se e escutar os significados que empresta às coisas do mundo em que está inserido.” (p. 22).

De acordo com os autores citados, percebemos que a psicopedagogia

considera atualmente que o aparato biológico e as condições afetivas e

intelectuais, interferem no desenvolvimento do sujeito. Por este motivo, todos

estes aspectos devem ser considerados diante de uma intervenção

psicopedagógica, sendo ela clínica ou institucional. Segundo Rubinstein (1999):

12

“Diferentes abordagens teóricas contribuem em seus enfoques para a construção de um referencial que explique este processo e sustente práticas que tornem compatíveis as demandas sociais e o desenvolvimento do indivíduo.” (p. 13).

Sendo assim, mais uma vez se coloca a importância de diversas teorias

para a contribuição da edificação de explicações sólidas para os

acontecimentos no desenvolvimento de um sujeito. Dentro deste contexto, a

psicopedagogia ainda está formando sua identidade e ganhando espaço no

mercado de trabalho.

Diante desta situação, o presente trabalho pretende trazer um breve

resumo sobre o histórico da psicopedagogia, sua chegada em nosso país e

suas principais formas de atuação no mercado de trabalho na atualidade.

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CAPÍTULO I

A HISTÓRIA DA PSICOPEDAGOGIA

Este capítulo certamente não trará todas as informações sobre a história

da psicopedagogia, mas reúne contribuições de autores importantes nesta

temática buscando fazer um breve resumo. De acordo com Bossa (2007), a

preocupação com as problemáticas de aprendizagem teve origem na Europa,

no século XIX. Em pleno capitalismo industrial a burguesia obtinha poder

político e econômico, assim os ideais de igualdade e fraternidade vindos do

século anterior foram sendo deixados de lado.

Surge a necessidade de buscar explicações para as desigualdades

existentes entre os homens. Com a queda da tendência de justificar os fatos

com a teologia, surge a necessidade de uma explicação científica para os

acontecimentos. Bossa (2007).

Essas ideias, fortalecidas no século XIX, mas originalmente vindas de

dois séculos anteriores com Francis Bacon, gera uma concepção de que a

ciência e a tecnologia podem explicar o Universo. Tendência esta que

permanece até os dias atuais.

Ainda segundo Bossa (2007), também no século XIX, Charles Darwin

acaba com a divisão entre ciências humanas e sociais e as ciências naturais. E

é neste contexto que surge a psicologia, de modo independente, mostrando

que áreas da ciência fizeram uso de conhecimentos biológicos em sua

construção.

Nesta conjuntura, o objeto de estudo da psicologia, que é o

comportamento humano, era verificado através da psicologia experimental,

seus testes de inteligência e a ideia de que tudo poderia ser explicado por

14

fatores genéticos. Esta mesma corrente esclarecia as desigualdades sociais

com a mesma justificativa e foi neste contexto que os diferentes rendimentos

escolares também foram elucidados. Desta maneira, o enfoque orgânico

orientava médicos, educadores e terapeutas da época. Bossa (2007).

Segundo Masini (1994) “Essa linha diagnóstica que procurava identificar

no físico as determinantes das dificuldades do aprendiz é encontrada no

histórico da educação especial e da psicopedagogia.”. (p. 13). Mais uma autora

confirmando a tendência norteadora de explicações baseadas em diagnósticos

precisos, espírito que perdurou durante um longo período.

Já no século XX, segundo Bossa (2007), estudos desenvolvidos em

laboratórios, mais especificamente na área de psiquiatria, classificavam

pessoas rigidamente como normais ou anormais. Este conceito de

anormalidade aos poucos passou a ser utilizado em escolas e aquelas crianças

que apresentavam dificuldade para aprender foram taxadas como anormais.

É na França, em 1946, que surge o primeiro centro psicopedagógico,

fundado por George Mauco, onde buscaram articular os conhecimentos da

medicina, psicologia, psicanálise e pedagogia, para resolver problemas na

aprendizagem e comportamento. Segundo Bossa (2007):

“O termo psicopedagogia, adotado por Janine Mery, é usado para caracterizar uma ação terapêutica que considera aspectos pedagógicos e psicológicos no tratamento de crianças que apresentam fracasso escolar” (p.39).

Masini (1994), afirmou sobre o atendimento realizado neste centro que

“Neste enfoque de trabalho o diagnóstico pedagógico visava esclarecer a

inadaptação escolar e social e corrigi-la.”. (p. 14). Nesta época, ainda eram os

médicos quem faziam os diagnósticos e determinavam que tipo de tratamento

seria utilizado. Para tanto, os testes de inteligência tinham muita credibilidade e

eram usados para obter tais diagnósticos. Nesta visão, ainda segundo Masini

(1994):

15

“Esse enfoque de diagnóstico, prescrição, tratamento, envolvendo prognóstico, trás implícita uma concepção funcionalista de educação, que entende a formação do homem como sendo determinada pela sociedade já estruturada, a qual ele deve adaptar-se.”. (p. 15).

Mais uma vez, fica claro que o objetivo do tratamento era modificar o

aluno com problemas para que este se adequasse aos parâmetros

considerados normais. Sendo assim, não havia busca de problemas fora da

criança, uma vez que pressupunha-se que este estava implícito no indivíduo

que apresentava comportamento inadequado.

De acordo com Bossa, falando ainda de Janine Mery, somente no século

XIX alguns educadores começaram a se preocupar com as questões das

crianças com problemas na aprendizagem. Entre eles estão Itard, Pereire e

Pestalozzi, este último acabou fundando uma escola de reeducação destinada

a crianças com deficiência mental. Mais tarde, levou suas idéias para os

Estados Unidos, onde foi mais aceito.

Já no final do século XIX, Maria Montessori, que era psiquiatra, cria um

método destinado às crianças ditas na época como retardadas. Hoje a

metodologia da italiana é usada com todas as crianças, inclusive as

consideradas normais, em muitas escolas. Ovidir Decroly também trabalha

para educação infantil trazendo novas ideias nesta mesma época. Bossa

(2007).

Ainda segundo Bossa (2007), nos Estados Unidos e na Europa,

aumenta a quantidade de escolas particulares e de ensino individualizado para

crianças com problemas na aprendizagem. Estes centros, já na década de 30

do século XX, possuíam equipes com médicos, psicólogos, educadores e

assistentes sociais, ou seja, um atendimento interdisciplinar.

Surgem tentativas de unir conhecimentos para tratar os comportamentos

inadequados na infância, tendo uma abordagem curativa. A busca de um novo

16

comportamento estava sempre baseada nos conhecimentos da psicologia,

pedagogia e psicanálise. Sendo assim, o objetivo da atuação psicopedagógica

era eliminar o sintoma que atrapalhava o desenvolvimento normal, tendo

enfoque curativo e objetivando que o sujeito seja agente de sua própria

aprendizagem e conhecimento. (Sara Paín 1986, apud Bossa, 2007, p. 41).

Nesta mistura entre pedagogia, psicologia e psicanálise, a

psicopedagogia ganha muitos sentidos, mas a identidade deste curso ainda

está em processo de maturação, já que se trata de algo novo e que ainda está

se estruturando.

Desta forma, a prática do psicopedagogo já era exercida por

profissionais de diversas formações, mas o curso de psicopedagogia como

uma profissão diferente da pedagogia e psicologia existe somente desde a

década de 1950 e foi criado na Argentina em forma de graduação.

Segundo Bossa (2007) “Profissionais viram a necessidade de ocupar um

espaço que não podia ser preenchido pelo psicólogo nem pelo pedagogo”

(p.42). No começo, o curso focava trabalhos com memória, percepção,

atenção, motricidade e pensamento. Estas atividades tinham como objetivo

resolver os problemas do fracasso escolar.

O curso passou por várias reformas curriculares sempre com o propósito

de resolver os problemas de aprendizagem na escola. De acordo com Bossa

(2007), dificuldades estas causadas pelos mais diversos fatores, como

métodos inadequados, aumento do número de crianças nas escolas, evasão

escolar, repetências e dificuldades no processo da aprendizagem. Neste

primeiro momento, por volta de 1956, a psicopedagogia estava voltada para

questões pedagógicas.

Num segundo momento, em torno de 1963, a psicologia fica mais em

foco na formação do psicopedagogo com o objetivo de trabalhar funções

17

cognitivas e afetivas. Já em 1978, com o fim da exigência do curso normal para

cursar a graduação em psicopedagogia, o curso sofre mais uma reforma, pois

passaria a receber alunos que desconheciam temas como a didática e a

pedagogia. Neste terceiro momento, pelos motivos apresentados, o currículo

passa a bordar também estas disciplinas.

Neste contexto, na década de 1970, a psicopedagogia ganha uma

dimensão relevante na área de educação e saúde. O perfil do psicopedagogo

argentino tinha ênfase na psicanálise por entender que ao tratar os problemas

de aprendizagem as crianças desviavam os sintomas, que antes eram as

dificuldades na aprendizagem, desenvolvendo transtornos de personalidade

como fobias e etc. Bossa (2007).

Sendo assim, fica claro que o papel do psicopedagogo argentino estava

ligado à saúde e a educação. Na área de educação ele atua em atividades

dentro de instituições escolares e na área da saúde ele deve reconhecer e

atuar sobre as alterações na aprendizagem. Os psicopedagogos argentinos

utilizavam instrumentos muito precisos como testes e provas psicológicos para

avaliar e tratar sua demanda.

Somente da década de 1980, na Europa, que as investigações sobre o

fracasso escolar deixam de focar os fatores individuais do aluno. Passou-se a

investigar os fatores intra-escolares, os problemas sociais, econômicos e até as

políticas de educação. Sobre este contexto, Masini (1994) afirma:

“O ponto nevrálgico da questão passou a ser o papel da escola para efetivo preparo da clientela que a freqüenta, analisando-se neste sentido a adequação da estrutura e funcionamento dessa instituição, do currículo e dos métodos de ensino aí empregados.” (p. 17).

Diante desta mudança, o psicopedagogo é remetido a novas reflexões

sobre a sua prática. Surgem novas questões, como entender o processo de

18

aprendizagem, de que maneira ajudar o aluno de fato e ainda, como trabalhar

de forma preventiva nas instituições são algumas delas.

Perante tantas reflexões e atividades distintas, a delimitação da área do

psicopedagogo se faz necessária. Caso contrário, a psicopedagogia fica

vulnerável às críticas, pois acaba se confundindo com a ação de outros

profissionais, como um psicólogo infantil, um psicoterapeuta, um orientador

educacional ou até mesmo, um explicador de luxo. É necessário que o

profissional desta área saiba o seu papel, que segundo Masini (1994), é:

“Acompanhar o aprendiz nos processos evolutivos na aquisição e elaboração de conhecimentos, estudando condições para que isso ocorra, localizando dificuldades e problemas que levam as paradas nestes processos e propondo caminhos para que o aprendiz possa superá-los.” (p. 19).

Sendo assim, levantados alguns dados sobre a história da

psicopedagogia no mundo, conheceremos em seguida seu percurso no Brasil e

suas diferentes identidades.

19

CAPÍTULO II

A PSICOPEDAGOGIA NO BRASIL

No Brasil, segundo Bossa (2007), a idéia de que os problemas na

aprendizagem tinham causas orgânicas também perdurou por muitos anos,

segundo a autora: “(...) tais problemas teriam como causa uma disfunção

neurológica não-detectável em exame clínico, a disfunção cerebral mínima

(DCM)” (p.51). Sendo assim, esta justificativa escondia os outros diversos

fatores que contribuíam com as causas das dificuldades na aprendizagem,

como os problemas sociais.

Somente na década de 1980 as explicações sobre o fracasso escolar

começam a se fundamentar nos problemas socioeconômicos. Neste contexto,

afirma Bossa (2007) “Muito embora a psicopedagogia tenha, em seu início,

uma tradição clínica, existe atualmente um profundo compromisso com o

aspecto preventivo e, portanto, com a escola.” (p.53). Sendo assim,

conhecendo que fatores externos também causam problemas na

aprendizagem, o foco passa a ser a prevenção.

De acordo com Bossa (2007), antes da formação em psicopedagogia,

alguns profissionais já trabalhavam para resolver as dificuldades de

aprendizagem. Em Porto Alegre, profissionais se reuniam para fazer grupos de

estudos baseados nos moldes das pesquisas feitas em Buenos Aires, com

abordagem interdisciplinar.

Fica claro que a história deste curso no Brasil é influenciada pelos

moldes da psicopedagogia na Argentina. Inicialmente apresentou-se como um

curso complementar destinado aos professores que trabalhavam com

problemas de aprendizagem e apenas em 1970, em Porto Alegre na

Universidade Federal do Rio Grande do Sul, o curso de psicopedagogia

apresentou-se em forma de especialização com duração de dois anos. Porém,

20

por falta de estrutura e pessoal qualificado, o curso deixou de ser oferecido

pela UFGS e passou a ser realizado em caráter particular. Em 1972 também é

oferecido, como especialização e mestrado, pela PUCRS. Bossa (2007).

Em 1979, em São Paulo, é criado o primeiro curso de psicopedagogia

regular no Instituto Sapientiae. Nesta época, os profissionais que procuravam

este curso tinham a expectativa de trabalhar na área clínica. Somente com o

redirecionamento dado pelas teorias de desenvolvimento é que os cursos

passam a ter um novo redirecionamento. Bossa (2007).

O curso oferecido por esta instituição merece destaque na história da

psicopedagogia no Brasil. Isso se justifica pelas diversas faces que o mesmo

teve ao longo dos anos, hora com enfoque preventivo, hora clínico. De acordo

com este histórico, os cursos foram tomando diversas identidades. Sobre o

histórico deste profissional, Bossa (2007) afirma:

“(...) profissional brasileiro, que nasce como reeducador e que, ao longo do tempo, amplia o seu compromisso a responsabilidade com a diminuição dos problemas de aprendizagem nas escolas e, consequentemente, com a redução dos altos índices de fracasso escolar.” (p.56).

Segundo a mesma autora, na década de 1990, os cursos em forma de

especialização se proliferaram não só em São Paulo, mas em diversos

Estados. Assim, no IV encontro de psicopedagogos, já havia profissionais de

quase todo o país.

Este aumento rápido do número de cursos possui um lado positivo e

outro negativo. É bom saber que mais pessoas se interessam pelas questões

da psicopedagogia, mas a formação precária, oferecida por alguns cursos,

pode ajudar a perpetuar o histórico da educação brasileira. O foco da

psicopedagogia não pode se perder e o mesmo, segundo Bossa (2007) é:

21

“O compromisso de contribuir para a compreensão do processo de aprendizagem e identificação dos fatores facilitadores e comprometedores desse processo, com vistas a uma intervenção.” (p.57).

Por este motivo, o surgimento de cursos que não oferecem formação

adequada inviabiliza as contribuições nesta área ao passo que vão contra o

compromisso profissional colocado acima pela autora. Para entender melhor,

falaremos um pouco sobre a formação deste profissional no Brasil.

Legalmente, a psicopedagogia ainda não é uma profissão. Neste

sentido, se faz necessário a legalização da mesma. Desta maneira, este

profissional acaba desempenhando o papel de sua formação na graduação, já

que o curso que forma psicopedagogos só existe em nosso país como pós-

graduação.

Neste sentido, já que estamos discutindo a identidade do curso, cabe

uma definição. Segundo o dicionário Aurélio, identidade é, “Conjunto de

caracteres próprios e exclusivos de uma pessoa (nome, idade, sexo, estado

civil, filiação etc.)”. (http://www.dicionariodoaurelio.com). No caso, não nos

referimos a uma pessoa, mas a um curso. A identidade deste curso se define

através do histórico do mesmo.

A identidade pode ser definida como sendo um conjunto de caracteres

próprios e exclusivos de uma determinada pessoa ou coisa. Este conceito está

ligado à sua história, ao futuro e outras características. Segundo de Deus

(2002): “A identidade permite que o indivíduo se perceba como sujeito único,

tomando posse da sua realidade individual e, portanto, consciência de si

mesmo.”(http://www.coladaweb.com/psicologia/identidade.htm).

Com os profissionais de um determinado curso também não é diferente,

se a identidade é o conjunto de caracteres próprios e exclusivos com os quais

se pode diferenciar pessoas, animais, plantas e objetos inanimados uns dos

outros, aqueles que se formam numa profissão também necessitam de uma

22

identidade bem definida para estabelecer respeito e espaço no mercado de

trabalho.

Atualmente existem diversos cursos em nosso país, todos em formato

de especialização. Mas ainda não existe um currículo comum, o que faz com

que psicopedagogos tenham formações muito distintas, enfocando o trabalho

institucional ou clínico e quase sempre norteados pela formação da graduação,

dificultando ainda mais a formação da identidade deste curso.

Assim, questões sobre os conhecimentos necessários para a prática do

psicopedagogo surgem. Pois, cada curso acaba apresentando um currículo

distinto, com diferentes enfoques e objetivos. Estes temas são muito

pertinentes e mereceriam especial atenção, mas fogem ao foco desta

pesquisa.

23

CAPÍTULO III

AS DIFERENTES IDENTIDADES DA

PSICOPEDAGOGIA NO BRASIL

Vimos que, no Brasil, a psicopedagogia se apresenta em duas grandes

vertentes: a psicopedagogia institucional e a clínica. Na vertente institucional o

psicopedagogo atua em diversas áreas, de acordo com Bossa (2007) “(...) já

existem experiências de atuação psicopedagógica em empresas, hospitais,

creches e organizações assistenciais.” (p.87).

O papel deste profissional nas instituições, entre outros, é trabalhar

valores e ideologia de acordo com a demanda necessária. Por este motivo, o

psicopedagogo institucional trabalha com a prevenção de possíveis problemas.

Neste trabalho, o foco será a atuação do psicopedagogo na instituição escolar.

A segunda vertente se mostra na psicopedagogia clínica. Neste caso, o

psicopedagogo tem o trabalho da investigação. Pois, segundo Bossa (2007),

“Nesse trabalho clínico, que se dá em consultórios ou em hospitais, o

psicopedagogo busca não só compreender o porquê de o sujeito não aprender

algumas coisas, mas o que ele pode aprender e como.” (p.94).

Vale lembrar que a psicopedagogia institucional não anula a clínica e

vice versa. Nos subcapítulos que se seguem conheceremos um pouco mais

sobre essas duas vertentes que se complementam, afinal, somente com a

demanda do trabalho saberemos do que vamos precisar, assim como afirma

Bossa (2007):

“A metodologia do trabalho, ou seja, a abordagem e o tratamento, enfim a forma de atuação se vai tecendo em cada caso, na medida em que a problemática aparece. Cada situação é única e requer do profissional atitudes específicas em relação àquela situação.” (p.83).

24

Mais uma vez fica evidente que o trabalho do psicopedagogo não se

trata de uma fórmula fixa para realizar um tratamento. Diversos autores

ratificam a importância de uma prática flexível e singular para cada caso.

Segundo Rubinstein (1999):

“A psicopedagogia é concebida como uma práxis dinâmica, tanto em seu contexto interno, isto é, no interior da relação terapêutica, no processo, nos recursos e necessidades do paciente, como no contexto externo, no sentido em que as diferentes concepções teóricas que sustentam a prática estão muito relacionadas com o percurso acadêmico e com o contexto particular e singular da formação pessoal do profissional que exerce a função.” (p. 10).

Sendo assim, diante deste breve histórico da psicopedagogia em nosso

país, encerramos a primeira parte deste capítulo. Nos tópicos que se seguem,

estudaremos mais profundamente as maiores vertentes da psicopedagogia no

Brasil, a institucional e a clínica.

2.1 – Psicopedagogia Institucional

A educação de um indivíduo se faz em todos os ambientes sociais que

ele freqüenta, por este motivo a instrução acontece de maneira formal ou não.

Trataremos neste trabalho da atuação do psicopedagogo dentro de uma

instituição formal, a escola.

A educação, segundo Mazzota (1987) “implica um relacionamento entre

pessoas, de forma a exercerem influências recíprocas” (p.33). É neste contexto

de trocas que o psicopedagogo desenvolve sua prática preventiva e lida com

os diversos fatores que, dentro da instituição escolar, pode influenciar

negativamente no desenvolvimento da criança.

25

A escola é o ambiente onde a criança inicia seus primeiros passos para

uma independência, é um espaço fundamental para fazer uma primeira

incursão pelo mundo do conhecimento, das relações interpessoais e do desafio

que a socialização coloca. Ela também representa referencial de construção e

reconhecimento da cidadania, da capacidade de desenvolvimento,

desempenho e de descoberta de potencialidades. Mazzota (1987).

O psicopedagogo neste contexto contribui para socialização dos

conhecimentos ao promover um melhor desenvolvimento e aprendizagem. E é

através da aprendizagem que o sujeito é mais bem inserido na sociedade e,

neste processo, o psicopedagogo pode atuar como um mediador. Sobre a

escola, Bossa (2007) afirma:

“A escola é, então, participante deste processo de

aprendizagem que inclui o sujeito no seu mundo cultural. Ela é, com efeito, a grande preocupação da psicopedagogia em seu compromisso de ação preventiva. Cada sujeito tem uma história pessoal, da qual fazem parte várias histórias: a familiar, a escolar e outras, as quais, articuladas, se condicionam mutuamente.” (p.88).

Sendo assim, no âmbito da atuação preventiva, a psicopedagogia

dedica-se mais à escola em diversas atuações como planejamento e

assessoramento pedagógicos, tendo também um caráter clínico, no sentido de

fazer diagnósticos e procurar soluções para os problemas encontrados. Neste

trabalho de prevenção leva-se em conta tanto o aluno quanto o professor, além

da família e da sociedade.

Nesta atuação, segundo Bossa (2007), o psicopedagogo deve

considerar as questões do afeto, pois a afetividade pode contribuir tanto para o

sucesso quanto para o fracasso no processo de aprendizagem. A criança não

vai para a escola por escolha própria, por isso a mesma deve oferecer aos

alunos uma preparação para a entrada na sociedade através de aprendizagens

importantes para o sujeito.

26

Outra questão importante se refere à formação do professor. Este deve

apropriar-se dos conhecimentos necessários para proporcionar a melhor

construção do conhecimento para o aluno. Desta maneira o professor foge da

antiga prática de dominação negativa e busca uma relação melhor com seus

alunos.

A falha na formação destes profissionais também é causada pela

descaracterização do curso de formação de professores, que começa na

separação entre o curso normal e a licenciatura nos cursos superiores de

pedagogia, sobre isso Gatti (1997) afirmou que:

“A fragmentação da formação nestes dois níveis de ensino (nível médio e licenciatura), com a separação sem articulação conveniente, entre disciplinas de conteúdos básicos e conteúdos de disciplinas pedagógicas, tem sido o fator mais apontado como determinante dos problemas de formação profissional dos docentes para o ensino fundamental e médio” (p.39).

Segundo a mesma autora, existem pesquisas que comprovam a

insatisfação dos profissionais com a formação que receberam. Outro fator

importante para este desagrado é a ausência de uma integração entre teoria e

prática, pois muitas vezes o que é aprendido no curso de formação não auxilia

o profissional em sua posterior prática em sala de aula.

Cabe dizer que nenhuma formação, por mais completa que seja e em

qualquer profissão, dificilmente trará tudo o que é necessário para uma boa

prática. Sendo assim, a busca individual por uma atuação profissional de

qualidade não pode ser ignorada.

Ainda sobre as condições para o exercício da profissão, a LDB garante

em seu Art. 67 que os sistemas de ensino deverão promover e valorizar os

profissionais de educação com estatutos e planos de carreira definidos. Este

mesmo artigo garante em seus incisos que o ingresso para o magistério público

27

deverá ser realizado através de concurso público e que o Ministério público

deve garantir aperfeiçoamento profissional continuado.

Assim, a lei coloca princípios que, se cumpridos de forma correta,

poderiam garantir um exercício profissional digno. Mas sabemos que a

realidade não é bem essa, que professores ficam muito tempo sem um curso

de aperfeiçoamento e que sua carga horária nem sempre permite horas

dedicadas aos estudos.

Em uma crítica, Dermeval Saviani (1997) interpreta os limites da nova

LDB principalmente como omissões, pelo fato de ela não incorporar

dispositivos que apontem para a necessária transformação da estrutura

educacional. Para esse autor, a lei é mais indicativa do que prescritiva e não

contém o conjunto de reformas que se está fazendo para além dela, antes e

depois de sua aprovação pelo MEC. Provavelmente, o autor estava se

referindo ao fato da lei apenas apontar o objetivo a ser alcançado, no próprio

caso da inclusão. Mas, as maneiras como esses objetivos serão alcançados

não ficam claras, nem são garantidas pela lei.

O presente trabalho não entrará na questão geral da formação de

professores, pois provavelmente surgiriam outras questões que fogem ao foco

desta pesquisa. Caberia assim, uma discussão mais específica e aprofundada,

que não será realizada neste momento.

Deste modo, uma importante tarefa do psicopedagogo em sua função

preventiva está relacionada à formação dos professores, pois professores bem

formados podem evitar futuros problemas causados por uma prática realizada

de maneira incorreta.

Segundo Bossa (2007), o trabalho do psicopedagogo institucional possui

níveis de prevenção. No primeiro, o profissional deve atuar nos processos

educativos buscando diminuir a freqüência dos problemas de aprendizagem e

28

isso inclui a formação e orientação dos professores e aconselhamento às

famílias.

No segundo nível, o objetivo é diminuir e tratar os problemas já

existentes. Para que isso seja alcançado, é necessário ter um diagnóstico da

realidade da instituição, e elabora-se um plano de intervenção para modificar o

quadro encontrado e em seguida, reavalia o currículo e os métodos utilizados

para que o problema não ocorra novamente.

No terceiro nível, o objetivo é eliminar o transtorno existente em um

procedimento clínico. Assim, ao extinguir com um transtorno previne-se o

aparecimento de outros e aqui permanece o caráter preventivo desta prática

profissional.

Essas são as principais questões com as quais o psicopedagogo deve

preocupar-se dentro de uma instituição escolar quando decide atuar de

maneira preventiva. Em seguida, conheceremos mais sobre as questões da

psicopedagogia clínica.

2.2 – Psicopedagogia Clínica

Falar sobre a psicopedagogia clínica nos remete a reflexão da

complexidade do processo de aprendizagem. É por este motivo que a prática

psicopedagógica necessita buscar ajuda nas mais diversas fontes para resolver

os diferentes problemas que investiga com o objetivo de solucioná-lo. Resolver

os problemas na aprendizagem é o principal papel do psicopedagogo clínico e

sobre isso, afirmou Andrade (2002):

29

“Os distúrbios de aprendizagem podem ser considerados como uma disfunção do pensamento, que desvela uma fratura no equilíbrio dinâmico das diversas instâncias que o constituem.” (p. 18).

Pensamento, segundo a mesma, seria: “um princípio estruturante,

produto de um funcionamento das operações lógicas e significantes e que traz

na sua origem um espaço opaco denominado ignorância.”. (p. 17). Sendo

assim, de acordo com a concepção desta autora, um desequilíbrio nos

processos normais de aprendizagem pode ter origem nos processos lógicos de

pensamento.

Aqui se apresenta a principal característica do psicopedagogo clínico, a

investigação, que é considerada um diagnóstico. Ele deve encontrar as

respostas para as causas dos problemas de dificuldades na aprendizagem

através da articulação de conhecimentos, ou seja, de forma interdisciplinar.

Andrade (2002).

Para definir que tipo de trabalho será feito, ou seja, o tipo de intervenção

a ser realizada, o profissional deve saber fazer um diagnóstico através de uma

metodologia adequada. Sobre o diagnóstico, Bossa (2007) afirma:

“O diagnóstico psicopedagógico é um processo, um contínuo sempre revisável, onde a intervenção do psicopedagogo inicia em uma atitude investigadora até a intervenção. É preciso observar que essa atitude investigadora, de fato, prossegue durante todo o trabalho, na própria intervenção, com o objetivo da observação ou acompanhamento da evolução do sujeito” (p.94).

Sendo assim, o trabalho clínico tem dois momentos igualmente

importantes, o diagnóstico e a intervenção. O primeiro passo deve ser a

investigação que tem como objetivo encontrar o motivo pelo qual a criança está

apresentando um tipo de sintoma.

Esta investigação pode ser realizada de diversas maneiras, uma delas é

a anamnese que pode ser feita através de entrevistas ou outros instrumentos,

30

mas sempre levando em consideração o conforto do paciente e não

esquecendo do objetivo que é encontrar em que momento começou o

problema apresentado pela criança. Somente depois deste processo é que se

pode entrar com a intervenção. Bossa (2007).

Neste momento o psicopedagogo esbarra mais uma vez em sua

formação, pois dependendo da graduação que cursou, ele não pode utilizar

alguns procedimentos que são exclusivos para uso de psicólogos, por exemplo.

Pois além da anamnese, dependendo do caso, são necessários testes

psicomotores, teste neurológico, prova de linguagem, entre outros.

Nesta investigação, a atitude do profissional faz a diferença ao

interpretar devidamente os sinais dados pela criança com o objetivo de

solucionar os efeitos dos sintomas apresentados por ela. Neste ponto,

encontra-se mais uma vez a fragilidade na formação do psicopedagogo em

nosso país. Segundo Bossa (2007), falta aprofundamento teórico para a

interpretação correta dos sintomas e sobre isso ela afirma:

“O problema de aprendizagem funciona como uma mensagem simbólica que o paciente traz como um texto subjetivo, o qual, se tomado em seu sentido literal, encobre a sua verdadeira função.” (p. 107).

Assim, o psicopedagogo deve sempre interpretar os sintomas como uma

materialização de manifestações simbólicas, carregadas de significado a serem

desvendados através de técnicas escolhidas através da análise dos dados

coletados. O sucesso desta decifração depende, mais uma vez, da

qualificação do profissional.

Depois de todos esses passos, é hora de elaborar uma intervenção, que

se trata do tratamento psicopedagógico em si. Neste momento, mais uma vez é

a sensibilidade do profissional que fará toda a diferença, pois duas crianças

com um mesmo sintoma podem merecer intervenções totalmente diferentes. A

31

singularidade de cada caso pede um tratamento igualmente singular. Sobre a

intervenção, Rubinstein (1999) afirma:

“A psicopedagogia, como disciplina que estuda e trabalha com as aprendizagens humanas, oferece um campo de intervenção, cujos limites são amplos. O próprio processo humano de aprendizagem é um fenômeno complexo, que envolve múltiplos fatores e desafia qualquer tentativa de explicação a partir de um discurso científico único.” (p. 13).

Assim, no exercício clínico, o profissional deve reconhecer sua

subjetividade na relação com o outro sujeito. Afinal, seu objetivo é conhecer no

outro o que o impede de aprender. Por isso, o psicopedagogo, segundo Bossa

(2007), deve saber como se constitui o sujeito, como este se transforma nas

etapas da vida e de que forma ele produz conhecimento.

Para tanto, o psicopedagogo clínico deve conhecer as teorias sobre

aprendizagem e tudo o que pode influenciá-la de alguma maneira. Também é

necessário distinguir como os métodos educativos e o processo ensino-

aprendizagem podem causar transtornos no processo escolar.

Diante de tamanha complexidade, o profissional deve beber em diversas

fontes, buscando auxílio nas mais variadas teorias. Sobre esta importante

característica da psicopedagogia, a interdisciplinaridade, Rubinstein (1999)

afirma:

“Consolidar pontes entre disciplinas é e será condição inerente da psicopedagogia. Isso a coloca em lugar de privilégio neste final de século, em que a divisão taxativa entre ciências, própria do positivismo, perde lugar. Não obstante, também a coloca num lugar de complexidade, estimulando o debate e a consolidação de enunciados epistemológicos para suas práticas e problemas.” (p. 13).

Sendo assim, cabe à psicopedagogia, enquanto disciplina de um

paradigma interdisciplinar, compreender a subjetividade do ser humano através

do conhecimento e de criatividade buscando possibilitar a criatividade e autoria

de pensamento no sujeito. Andrade (2002):

32

Sendo assim, entende-se como atendimento psicopedagógico clínico a

investigação e a intervenção para que se compreenda o significado, a razão e

a modalidade de aprendizagem do sujeito, com o intuito de sanar suas

dificuldade e prevenir outras possíveis. Desta maneira, a psicopedagogia

clínica procura compreender de forma global e integrada os processos

cognitivos, emocionais, sociais, culturais, orgânicos e pedagógicos que

interferem na aprendizagem, objetivando criar situações que desenvolvam o

prazer de aprender como um todo.

33

CONCLUSÃO

Diante de todo levantamento teórico sobre a história da psicopedagogia e

do aprofundamento das questões colocadas durante este trabalho, podemos

concluir que, no que se refere à psicopedagogia, esta ainda é uma área em

desenvolvimento e por este motivo tem muitos passos a seguir e trabalho a

desenvolver para que um saber científico produzido na mesma seja legitimado.

Sobre a pesquisa e a construção de um conhecimento específico da

psicopedagogia, os cursos atuais ainda não atendem à demanda. Isso se

justifica pelo fato da função dos cursos de pós-graduação, na maioria das

vezes, ainda ser consolidar os conhecimentos da área da graduação.

Talvez, o próprio princípio da psicopedagogia, que é reunir diversas

áreas de conhecimentos na busca de um mesmo objetivo, tenha colaborado

para que a mesma não adquirisse uma identidade bem definida. Afinal,

conforme vimos no presente trabalho, cada profissional buscou se aprofundar

em sua área original de formação e não na certificação científica da

psicopedagogia.

Podemos concluir que há muitas décadas existe a preocupação com

aqueles que apresentam comportamento diferente do esperado como normal.

Antigamente, as explicações para estes fatos limitavam-se a fatores biológicos

e as intervenções buscavam mudanças no sujeito. Neste sentido, as

contribuições das correntes que formaram a psicopedagogia são evidentes,

afinal agora consideramos também os fatores sociais, emocionais, culturais

entre outros e ainda, consideramos mudanças fora do indivíduo.

Inegavelmente, houve uma grande evolução ao se considerar os

diversos fatores que podem influenciar o desenvolvimento normal. Neste

contexto, o psicopedagogo ainda busca sua identidade, já que sua prática deve

34

ir além da pedagogia, psicanálise ou psicologia, sendo um trabalho que

envolve diretamente a subjetividade.

Diante da história do curso e suas identidades clínica e institucional, é

importante frisar que um enfoque sempre complementa o outro. Uma vez que o

psicopedagogo institucional trabalha na busca da prevenção de problemas

futuros ele também usa dos artifícios do psicopedagogo clínico quando faz um

diagnóstico e traça metas para elaborar sua intervenção. Bem como o

psicopedagogo que atua na área clínica também busca evitar futuros

problemas, usando assim, o enfoque preventivo da psicopedagogia

institucional.

Sendo assim, podemos concluir que a identidade do curso ainda está

em formação e que a prática do profissional se baseia nas mais diversas

disciplinas, buscando a complementação científica que o curso de

psicopedagogia ainda não oferece. Caminhos para a legalização da profissão

já foram abertos, mas esta será uma longa caminhada.

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BIBLIOGRAFIA

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