a tolerância do amor

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A Tolerância do Amor Título original: The toleration of love Extraído de: Christian Love, or the Influence of Religion upon Temper Por John Angell James (1785-1859) Traduzido, Adaptado e Editado por Silvio Dutra Dez/2016

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Page 1: A tolerância do amor

A Tolerância

do Amor

Título original: The toleration of love

Extraído de: Christian Love, or the Influence of Religion upon Temper

Por John Angell James (1785-1859)

Traduzido, Adaptado e

Editado por Silvio Dutra

Dez/2016

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J27

James, John Angell – 1785 -1859

A tolerância do amor / John Angell James. Tradução , adaptação e edição por Silvio Dutra – Rio de Janeiro, 2016. 36p.; 14,8 x 21cm Título original: The toleration of love

1. Teologia. 2. Vida Cristã 2. Graça 3. Fé. 4. Alves, Silvio Dutra I. Título CDD 230

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Em sua autobiografia, Spurgeon escreveu:

"Em uma primeira parte de meu ministério,

enquanto era apenas um menino, fui tomado

por um intenso desejo de ouvir o Sr. John

Angell James, e, apesar de minhas finanças

serem um pouco escassas, realizei uma

peregrinação a Birmingham apenas com esse

objetivo em vista. Eu o ouvi proferir uma

palestra à noite, em sua grande sacristia, sobre

aquele precioso texto, "Estais perfeitos nEle." O

aroma daquele sermão muito doce permanece

comigo até hoje, e nunca vou ler a passagem

sem associar com ela os enunciados tranquilos

e sinceros daquele eminente homem de Deus ."

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"O amor suporta todas as coisas."

"O amor acredita em todas as coisas."

"O amor espera todas as coisas."

1. "O amor SUPORTA todas as coisas."

Alguns autores consideram este sétimo verso

de I Cor 13, como uma ampliação do precedente

e explicam-no, em referência à verdade, da

seguinte maneira: "O amor suporta todas as

coisas", relatadas nas verdades das Escrituras,

em oposição à corrupção da natureza do ser

humano. "O amor crê todas as coisas"

importadas das verdades da Escritura, ou todas

as inferências que os apóstolos deduziram dela,

como sendo bem ligadas à fonte de onde ela flui.

"O amor espera todas as coisas" prometidas nas

verdades da Escritura. "O amor sofre todas as

coisas", ou sofre pacientemente todas as aflições

que possam assistir a um firme apego às

verdades da Escritura. Isso dá um bom senso das

palavras e admite toda a força dessas expressões

universais. No entanto, certamente concorda

melhor com o escopo do apóstolo, em entender

o versículo com referência aos irmãos como

sendo os objetos deste amor.

Se entendermos a primeira expressão, "O amor

suporta todas as coisas", como nossos

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tradutores entenderam, isso pode significar que

carregamos os fardos e fraquezas, uns dos

outros, o que é cumprir a lei de Cristo; e deve ser

confessado que isso é estritamente verdadeiro,

pois quem está sob a influência do princípio do

amor possuirá um espírito de terna simpatia.

Neste mundo, todos gememos, sendo

sobrecarregados; cada um tem sua própria

carga de cuidado, ou tristeza, ou imperfeição.

Este mundo não é o estado onde encontramos o

descanso perfeito. Quão ampla é a abrangência,

quão frequente a oportunidade, quantas vezes

as ocasiões, para a "simpatia do amor"! E quem é

possuído da benevolência, pode permitir-se

passar por um irmão na estrada, trabalhando

sob um fardo mais pesado do que os seus

próprios, sem oferecer ajudar para carregá-los?

Não devemos ser audaciosamente intrusivos e

intermediários, nem espremer os segredos de

nossos próximos com curiosidade, mas

investigar a causa que lhes dá tanta

preocupação ou dor é o dever daqueles que são

testemunhas de seu rosto preocupado e olhar

abatido. Que coração insensível deve ter aquele

homem que pode ver uma pessoa muito triste

diante dele, e nunca perguntar gentilmente a

razão de sua tristeza!

É pouco o que a simpatia pode fazer pelo

sofredor, mas quanto menos possa fazer, mais

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alegremente deve ser oferecido, porque ser

despercebido e estar sem piedade em nossas

enfermidades, acrescenta muito ao seu peso.

Para que propósito os cristãos são reunidos em

igrejas? Não apenas para comer juntos a Ceia do

Senhor, pois isso poderia ser feito sem qualquer

reconhecimento distinto de um

relacionamento mútuo, como o que ocorre na

comunhão dos crentes. O fim e o projeto desse

vínculo é que, unidos como um só corpo, os

membros possam ter uma simpatia geral uns

pelos outros e exercer sua benevolência no

caminho da assistência mútua.

Os ricos, por sua generosidade devem ajudar

seus irmãos mais pobres a suportar o fardo da

pobreza; os fortes devem ajudar os fracos a

suportar a carga de seus medos e apreensões;

aqueles que estão em saúde e conforto devem

através de visitas sazonais, palavras suaves, e

serviços gentis carregar o fardo dos doentes; o

conselho deve ser sempre dado quando é

procurado por aqueles que estão em

dificuldade; e uma disposição deve permear

todo o corpo, para tornar seus variados

recursos, talentos e energias, disponíveis para o

benefício do todo.

Mas, embora isso também dê um belo

significado e imponha um dever necessário, não

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é a visão correta da passagem. A palavra traduzida "suporta" todas as coisas, significa

também "conter, esconder, cobrir". A ideia de "suportar", é paralela em significado à de

"perseverar", da qual o apóstolo fala na última parte do versículo; e não é provável que tenha

sido sua intenção expressar o mesmo pensamento duas vezes. Adotando a ideia de "encobrir", como o sentimento que ele

pretendia expressar; e as "falhas dos outros", como o objeto a que se refere, eu continuarei

mostrando como isto é na prática.

Para fazer isso com um efeito ainda maior,

mostraremos uma visão geral dos pecados aos quais esta visão do amor cristão está exposta; e

estes são - calúnia, detração e julgamento precipitado, ou censura.

Talvez não haja pecados mais frequentemente aludidos ou mais severamente repreendidos nas Escrituras do que os da LÍNGUA; e por esta

razão, porque não há nenhum com o qual sejamos tão frequentemente tentados, nenhum

ao qual estamos tão propensos, ou tão ousados a desculpá-lo, nenhum que seja tão produtivo de

desordem e desconforto para a sociedade. Além das palavras vãs, da falsidade, da obscenidade e

da blasfêmia, a Escritura fala de testemunho falso, de cochichos, de calúnias e de censuras;

uma enumeração sombria de vícios

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pertencentes a esse membro do corpo, que era a glória de nosso corpo.

Por “difamação”, entendemos a circulação de um relatório falso com a intenção de prejudicar

a reputação de uma pessoa. Seu excesso mais vicioso é a invenção e construção de uma

história que é absolutamente falsa do começo ao fim. Seu próximo grau mais baixo, embora pouco inferior em criminalidade é tornar-se o

propagador do conto, sabendo que é falso. "Isto", diz Barrow, "é tornar-se os vendedores de

mercadorias falsificadas, ou sócios neste comércio vil.” Não existe nenhum criador de

falsidades que não tenha emissários e cúmplices prontos para tirar da sua mão e

passar sua mercadoria para outros, e assim os caluniadores que espalham a estória são menos

culpados do que os primeiros, os seus autores. Quem produz mentiras pode ter mais

inteligência e habilidade, mas o "difusor da calúnia" mostra malícia e maldade semelhantes.

Não há grande diferença entre o diabo vil que prepara relatórios escandalosos , e os diabinhos

que correm e os dispersam.

A próxima operação da difamação é receber e difundir, sem examinar a verdade dos relatos falsos e prejudiciais. É uma parte do caráter de

um bom homem, que "ele não faz uma censura contra o seu próximo", isto é, ele não a recebe

facilmente, e muito menos a propaga; ele não a

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recebe, senão sobre a evidência mais convincente. Mas, a calúnia funda contos de

repreensão sobre "mera conjectura ou suspeita", e levanta uma representação

prejudicial em uma mera suposição. Às vezes, murcha a reputação de uma pessoa por falar

precipitadamente, ou afirmando de forma veemente coisas que não tem razão para acreditar, e nenhum motivo para afirmar,

exceto pela esperança de excitar a má vontade para com o caluniado.

A calúnia é pecaminosa, porque é proibida em todas as partes da Escritura. A calúnia é cruel,

porque está roubando ao próximo o que lhe é mais caro do que a vida, a saber, a sua reputação.

A calúnia é insensata, porque sujeita o caluniador a todos os tipos de problemas, pois

não somente o expõe à ira de Deus, à perda de sua alma e às misérias do inferno no mundo

vindouro, como também o torna odioso na vida presente, fazendo com que seja evitado e

desacreditado, arma sua consciência contra a sua própria paz, traz sobre si as acusações mais

reprovadoras, e não raramente há a vingança da justiça pública, que é nomeada justamente para

ser a guardiã não apenas da propriedade e vida, como também da reputação.

A DETRAÇÃO ou MALEDICÊNCIA, difere um pouco da calúnia, embora em sua natureza geral

e constituição se assemelhe muito a ela. A

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calúnia envolve uma imputação de falsidade, mas a detração pode revestir-se de verdade! A

calúnia é um veneno adocicado servido em um copo de ouro, pela mão da hipocrisia. O objetivo

de um detrator é o mesmo que o do caluniador - prejudicar a reputação de outros, mas ele se

serve de meios que são um pouco diferentes. Ele representa as pessoas e suas ações sob as circunstâncias mais desvantajosas que possa,

expondo aquelas que podem torná-los "aparentemente" culpados ou ridículos,

ignorando as qualidades e ações louváveis daqueles que atacam.

Quando ele não pode negar que o metal é bom, e o selo é verdadeiro, ele o corta, e assim o rejeita como sendo de fato um bom metal - ele

interpreta mal as ações duvidosas e joga sobre as próprias "virtudes" do seu próximo, o nome de

“falhas”, chamando o sóbrio, de amargo, o moroso consciencioso, de devoto supersticioso,

o frágil, de sórdido, o alegre, de frívolo, e o reservado, de astuto! Ele diminui a excelência

das boas ações, mostrando o quanto melhor poderiam ter sido feitas, e tenta destruir toda a

confiança no caráter estabelecido há muito tempo e todo o respeito por ele, concentrando-

se em um único ato de imprudência, e expandindo-o em magnitude, pintando assim

todo o caráter com a escuridão, que a verdade e a justiça proíbem. Tal é o detrator, cujo crime é

composto pelos seguintes ingredientes: vileza,

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orgulho, egoísmo, inveja, malícia, mentira, covardia e loucura.

A calúnia deve ser peculiarmente odiosa para Deus, pois Ele é o Deus da verdade, portanto detesta a mentira, da qual a detração sempre

tem um tempero. Ele é o Deus da justiça, portanto aborrece especialmente prejudicar as

melhores pessoas e ações. O Deus do amor, portanto, não pode deixar de odiar esta violação

primária do amor; Ele tem zelo por Sua glória, portanto não pode suportar vê-la ser abusada,

arrastando seus bons dons e graças. Ele não pode deixar de odiar a ofensa que se aproxima

desse mais hediondo e imperdoável pecado, que consiste em difamar as excelentes obras

realizadas pela bondade e poder divino e atribuí-las a causas más.

O mesmo escritor ao falar do mal da detração, que visa desencorajar os outros da execução daquela bondade, que é assim difamada e

vilipendiada tem as seguintes belas observações: "Muitos, vendo os melhores

homens assim depreciados, e as melhores ações vilipendiadas são desanimados e dissuadidos de

praticar a virtude, especialmente em um grau conspícuo e eminente."

Por que muitos dirão a um homem, que valeria a pena ser estritamente bom, vendo a bondade

ser tão susceptível de ser mal utilizada? Não

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seria melhor me contentar com uma mediocridade e obscuridade de bondade, do

que por um brilho deslumbrante atrair o olho invejoso, e acender a raiva e o ridículo sobre

mim?

E, quando a honra da virtude for exteriorizada

em suas práticas, muitos serão desviados dela, assim como a virtude se tornará fora de moda, e o mundo será corrompido por esses agentes do

MAL. Parecem sempre desvirtuar, nem mesmo quando temos certeza de que estão falando mal,

não o faremos de verdade, se descobrimos qualquer homem que fosse considerado digno,

em quem notamos quando estamos sob uma luz mais próxima, que melhor ilumine o nosso

entendimento, que os tais não são verdadeiramente o que eles dizem - contudo a

sabedoria daria ordens e a bondade disporia para não prejudicar sua reputação, se

observássemos sem perigo de erro, qualquer ação benéfica a ser realizada por motivos,

princípios ou projetos ruins. Em discrição e honestidade devemos deixá-la passar com a

condenação que sua aparência pode merecer, em vez de difamá-lo expelindo nossas

apreensões negativas sobre ele.

A censura é outro pecado da mesma classe - outro filho da mesma família variando entretanto, daqueles que já consideramos

agindo não tanto na maneira de "relatar" faltas,

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mas em "condená-las" com muita severidade. É diferente da calúnia, na medida em que assume

que o que ela condena é verdadeiro; e da detração, na medida em que não é exercida com

a intenção de ferir outra pessoa em estima pública, mas apenas reprová-la pelo que está

errado. Assume o caráter, não de uma testemunha, mas de um juiz, e daí a liminar, "Não julgue".

A censura, portanto, significa uma disposição para examinar os motivos dos homens, a fim de passar uma sentença sobre sua conduta, para

repreender suas faltas, acompanhada de uma relutância em fazer todas as tolerâncias

razoáveis por seus erros, e uma tendência para a misericórdia, ao lado da severidade. Não

devemos supor que toda a inspeção e condenação da conduta dos outros é pecado,

nem que toda repreensão dos ofensores seja uma violação da lei do amor, nem imaginar que

devemos pensar bem do nosso próximo em oposição à mais simples evidência, nem que

possamos entreter tal opinião crédula da excelência da humanidade, como confiar

inocentemente nas pretensões de cada homem. Mas, há algo de errado nesse tipo particular de

censura, que indaga inutilmente a conduta e os motivos dos outros homens, examinando-os e

julgando-os em nosso juízo pessoal, quando não temos relação com eles que exija tal escrutínio;

como emitir nossa opinião quando não é

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exigida, pronunciar sentença com severidade indevida, e amontoando o maior grau de

reprovação sobre um ofensor, com o pior tipo de linguagem que possamos expressar.

"O mundo tornou-se tão crítico e censurável que, em muitos lugares, o principal emprego

dos homens, e o principal corpo de conversação é, se o notamos, o de julgar, e todo ajuntamento de pessoas transforma-se em um tribunal de

justiça, em cada mesa de um bar onde todos os homens são citados; onde cada homem é

acusado e condenado; onde não há qualquer sublimidade ou sacralidade de dignidade,

nenhuma integridade ou inocência de vida; nenhuma prudência ou circunspecção de

comportamento, que não pode isentar qualquer pessoa, e ninguém escapa de ser taxado sob

algum nome odioso, ou caráter escandaloso. Não apenas as ações exteriores e práticas

visíveis dos homens são julgadas, como também seus sentimentos secretos são revisados, suas

disposições internas têm um veredicto passado sobre elas, e seus estados finais são

determinados.

Grupos inteiros de homens são assim julgados de uma vez! E é fácil em um fôlego, prejudicar todas as igrejas, e com um empurrão derrubar

nações inteiras para o poço sem fundo! Sim, o próprio Deus não é poupado, sua providência

vem sob o ousado ridículo daqueles que, como o

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salmista fala de alguns em seu tempo, cuja raça ainda sobrevive: "falam alto e colocam sua boca

contra os céus".

Barrow, para denunciar esse temperamento censurador, dá as seguintes QUALIFICAÇÕES

DE UM JUIZ: Ele deve ser nomeado pela autoridade competente, e não se intrometer no

cargo. A quantos censores podemos dizer: "Quem te fez juiz?" O Juiz deve estar livre de todo

preconceito e parcialidade. Mas é este o caso com os censuradores? Ele nunca deve proceder

ao julgamento, sem um exame cuidadoso do caso, assim como para compreendê-lo. Que os

juízes particulares autonomeados se lembrem disto e ajam segundo o princípio de Salomão:

"Aquele que responde a uma questão antes de ouvi-la, isto é uma loucura e uma vergonha para

ele".

O juiz nunca deve pronunciar sentença, senão com boas razões, depois de certas provas e

convicção plena. Se essa regra fosse observada, quantas censuras seriam evitadas. Ele não se

meteria com causas além da jurisdição de sua corte. Se isso fosse lembrado e agido, a voz da

censura ilegal iria morrer em silêncio! Pois, quem somos nós, para provarmos os corações e

buscar os pensamentos dos homens, ou julgar o servo de outrem? Ele nunca deve agir contra

qualquer homem, sem citá-lo para comparecer

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pessoalmente ou por seu representante, dando-lhe a oportunidade de se defender.

Quando alguém é censurado em companhia, sempre deve ser encontrado algum espírito generoso que proponha que o acusado deve ser

enviado para julgamento, e este deve ser adiado até que ele apareça.

O juiz deve pronunciar-se, não de acordo com a imaginação privada, mas segundo as leis

públicas estabelecidas. É esta a regra dos censores? Não é seu costume fazer da sua

própria opinião privada a lei? Ele deve ser uma pessoa de grande conhecimento e habilidade.

Qual é o caráter usual dos censores particulares da conduta humana? Não são pessoas de grande

ignorância e poucas ideias que, por falta de outra coisa para dizer, ou capacidade de dizê-lo,

falam das falhas de seus semelhantes - um tópico sobre o qual uma criança, ou um tolo, podem ser fluentes?

O Juiz constituído legalmente, também não deve ser é um acusador, além disso, em virtude de

seu cargo é um conselheiro para o acusado. Ao contrário, os censuradores não são em geral

juízes, acusadores e advogados contra os culpados que levaram ao seu tribunal? O juiz

deve se inclinar, até onde o bem público permitir, ao lado da misericórdia. Mas, a

misericórdia não tem lugar no seio dos

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censuradores, e sua própria justiça é crueldade e opressão. O juiz deve ser inocente.

Por que não se ouve uma voz em todas as companhias, quando o prisioneiro é acusado, e

começa o processo de julgamento, dizendo "Quem está sem pecado, que jogue a primeira

pedra?" O juiz prossegue com solenidade, dor e lentidão, para passar a sentença. Mas, que pressa indecente e superficial, sem exceção de

alegria, testemunhamos naqueles que são dados à prática de censurar a conduta do seu

próximo.

Agora, a todas estas práticas pecaminosas, o amor cristão é diretamente oposto. É com muito tempo antes que o amor cristão percebe as

faltas dos outros. Não é mais rápido o instinto no pássaro, ou besta, ou peixe para descobrir sua

vítima, do que o detrator e os censores são para observar imperfeições, logo que aparecem na

conduta daqueles ao seu redor. Sua visão é bastante telescópica para ver objetos deste tipo

à distância! Eles têm um poder microscópico de inspeção, para examinar aqueles que são

pequenos e próximos; e, ao olhar para as falhas, eles sempre empregam o maior poder de

ampliação que seu instrumento admite. Eles estão sempre olhando para aqueles "pequenos

defeitos" que a olho nu, se perderiam em meio à virtude circundante. Eles não querem ver

virtudes. Não! Tudo o que é virtuoso, bom, e

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louvável é passado por alto, em busca de deformidade e maldade.

Mas, tudo isso é totalmente repugnante para a natureza do amor, que, atento ao bem-estar da

humanidade e ansioso por sua felicidade está sempre olhando para observar as virtudes dos

outros. O olho do filantropo cristão é tão empregado na procura da excelência, tão fixo e tão arrebatado por ela quando é encontrada, que

é certo que passará sobre muitas coisas de natureza contrária, como não incluídas no

objeto de sua busca, assim como quem está à procura de gemas é provável que passe por

muitas pedras comuns; ou como aquele que está procurando uma estrela particular ou

constelação nos céus, não é susceptível de ver as velas que estão perto dele na terra. Os homens

bons são seu deleite, e para encontrá-los muitos da geração do mal foram passados por alto. E há

também, um singular poder de abstração em sua benevolência para separar, ao olhar para um

caráter misto, o bem, do mal, e, perdendo de vista o mal, concentra sua observação no bem.

E quando o amor cristão é obrigado a admitir a existência de imperfeições, diminui tanto

quanto possível a sua magnitude, e as esconde tanto quanto é lícito de sua própria observação.

Não se deleita em olhar para elas, não encontra prazer em mantê-las. Se encontramos uma

afinidade entre os nossos pensamentos e os

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pecados de que somos espectadores, é uma prova clara de que a nossa benevolência é de

uma natureza muito duvidosa, ou que se encontra num estado fraco. Pelo contrário, se

involuntariamente desviarmos os nossos olhos da contemplação do mal, e estivermos

conscientes de nós mesmos de uma forte repulsa e de uma angústia aguda quando não pudermos nos afastar totalmente da visão dele,

possuímos uma evidência de que conhecemos muito essa virtude que cobre todas as coisas. Se

estivermos corretamente, como devemos ser, sob a influência do amor cristão, faremos todas

as concessões razoáveis para as coisas que são erradas na conduta de nosso próximo, como já

vimos, e não iremos adiante para suspeitar do mal, mas devemos fazer tudo para diminuir a

hediondez da ação. É o que se quer dizer, quando se diz que "o amor cobre uma multidão de

pecados". "O ódio suscita contendas, mas o amor cobre todos os pecados."

É o desejo e o ato do amor esconder do público todas as faltas que o bem do ofensor e os fins da justiça pública não exigem ser revelados. Há

casos em que ocultar ofensas, qualquer que seja a bondade que possa ser para um, seria desonra

para muitos. Se uma pessoa que vive em pecado, até agora tem imposto a um ministro, como

induzi-lo a propor-lhe para a admissão ao companheirismo da igreja, é o dever de

qualquer indivíduo que conhece o verdadeiro

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caráter do candidato, fazê-lo conhecido do pastor; e a mesma revelação deve ser feita em

referência a uma pessoa que já está em comunhão, mas na verdade está vivendo no

pecado - a ocultação nestes casos é um dano a todo o corpo de cristãos.

Se uma pessoa é susceptível de ser ferida em suas preocupações temporais, por colocar sua

confiança em alguém que é totalmente indigno, é o dever daqueles que estão familiarizados com

a armadilha, avisar a vítima destinada de seu perigo. Se alguém está tão distante,

independentemente da paz da sociedade e das leis do país, como estar envolvido em grandes

crimes contra ambos, a ocultação por parte dos que estão cientes da existência de tais práticas,

é uma participação no crime . Como nosso amor deve ser universal, bem como particular, nunca

deve ser exercido para os indivíduos de uma maneira que seja realmente oposta aos

interesses da comunidade.

Mas, quando não há nenhum outro interesse, onde nenhuma reivindicação exige uma

revelação, onde nenhum dano é causado pelo ocultamento, e nenhum benefício é conferido

dando publicidade a uma falha, lá nosso dever é cobri-lo com o véu do segredo, e manter um

silêncio ininterrupto sobre o assunto.

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Em vez desta reserva amigável e amável, quão diferente é a maneira com que muitos agem!

Assim que ouviram falar da falha, partiram com a notícia picante, tão contentes como se

tivessem a notícia de uma vitória, proclamando o fato melancólico com estranho prazer em

todas as companhias, e quase a todos os indivíduos conhecidos. E como há um apetite ganancioso em algumas pessoas por

escândalos, eles acham muitos ouvidos tão abertos para ouvir o conto, como seus lábios

estão prontos para contar. Ou, talvez relacionem o assunto como um "segredo", exigindo uma

promessa daqueles a quem comunicam, que nunca mais o mencionarão. Mas, se não for

apropriado publicá-la ao mundo, por que eles falam disso? Se for apropriado para a

publicidade, por que trancá-lo em silêncio?

Às vezes, o ato de dizer faltas em segredo é uma espécie de fraqueza lamentável, uma impossibilidade absoluta de guardar qualquer

coisa na mente, acompanhada de uma intenção de publicá-la apenas a uma única pessoa, mas

em outras pessoas é um desejo de ter a gratificação de ser o primeiro a comunicar o

relatório a um grande número; cada um é solicitado para prometer que não vai divulgá-lo,

e que o repórter original não pode ser revelado.

Há, então, alguns que publicam as faltas dos outros sob o pretexto hipócrita de lamentar

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sobre elas, produzindo em outros uma advertência contra a mesma coisa. Você os verá

em companhia, com um semblante sério e ouvindo-os se dirigirem à pessoa que esteja

sentada ao lado deles, mas com uma voz suficientemente alta para chegar a todos os

cantos da sala, o que ele ouviu sobre o Sr. Fulano. Assim, sob o disfarce hipócrita da piedade e do aborrecimento do pecado, ele se entregou a

essa propensão maliciosa, porém muito comum para publicar as falhas de algum irmão errado.

Ele mencionou o assunto ao próprio indivíduo? Provavelmente não. E se ele reteve esse modo de

expressar sua piedade, o que aproveita sua comiseração pública? Que possível simpatia

pode haver nisso para o ofensor, ao colocá-lo em público, e apontar suas falhas em companhia?

Há quem suponha, que há pouco mal em falar em seus próprios círculos, das falhas de seus

próximos - eles não falariam dessas coisas diante de estranhos, ou da sociedade em geral,

mas não sentem nenhum escrúpulo em fazer-lhes matéria da conversação entre seus amigos

seletos. Mas, nem todos esses amigos podem ser prudentes, e se for desejável que o fato não seja

conhecido fora do círculo, a melhor maneira é que não seja conhecido dentro dele. Onde não

há benefício que possa ser obtido pela publicidade, é melhor em referência ao caráter,

fechar o segredo em nossa mente e, literalmente observar a injunção do profeta:

"Não creiais no amigo, nem confieis no

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companheiro; guarda as portas da tua boca daquela que repousa no teu seio." (Miqueias 7:

5).

O amor não só originará, como também não ajudará a divulgar um relatório do mal. Quando

o conto chega a ele, nessa direção, ele o detém. "Não é segredo", dizem eles, "senão eu não

mencionaria". Mas, não devemos fazer isso, não devemos inventar, nem originar, nem propagar

um relatório maligno. Enquanto toda língua é volúvel em espalhar más notícias, o amor será

silencioso; enquanto todos parecem ansiosos por gozar a comunhão na calúnia e na censura,

e saborear o cálice da destruição à medida que passa pelos companheiros, o "amor" diz à pessoa

que contou a história: "Não tenho ouvidos para a difamação, nem mesmo para conhecer as falhas

de outros, vá, e fale carinhosamente com o indivíduo de suas falhas, mas não fale delas em

público.”

Se todos os homens agissem com base nesses princípios, a calúnia morreria nos lábios que lhe

deram origem; os fofoqueiros cessariam por falta de clientes para continuarem seu

comércio como "traficantes de maledicência”; as calúnias ficariam fora de moda, e o amor ao

escândalo ficaria faminto pela falta de comida.

Os males então, contra os quais o amor cristão se opõe, são os seguintes:

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Calúnia, que inventa um relatório injurioso para prejudicar a reputação de outros.

Detração ou maledicência, que amplia uma falha em alguém que tem muitas virtudes.

A censura, que é demasiado intrometida e rígida para condenar uma falha.

Fofoca, que propaga uma falha.

Curiosidade, que deseja conhecer uma falha.

Malignidade, que tem prazer em uma falha.

Desta lista de vícios, a calúnia é naturalmente a pior, mas uma "disposição fofoqueira", embora

possa ter pouco da malignidade da calúnia, é um servo para fazer o seu trabalho, e um

instrumento para perpetrar o seu prejuízo. As pessoas desta descrição são muito numerosas!

Eles devem ser encontrados em cada cidade, em cada aldeia, sim, e em cada igreja! Eles não são

os autores de difamação, mas são os editores; eles não elaboram o cartaz, mas apenas o colam

em todas as partes da cidade e são responsáveis, não pela malícia que inventou a mentira

difamatória, mas pelo dano de circulá-la. Suas mentes são uma espécie de esgoto comum, no

qual todos os fluxos imundos de escândalo estão perpetuamente fluindo; um receptáculo para o

que é ofensivo e nocivo!

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Essas fofocas podiam ser lamentadas pela sua fraqueza, se não fossem ainda mais temidas

pelos danos que causam. Elas não são malignas, mas são criadoras de mágoas; e, como tal,

devem ser evitadas e temidas. Cada porta deve ser fechada contra elas, ou pelo menos, cada

ouvido. Devem ser sensibilizados quanto a sentirem que, se o silêncio for uma penitência para eles, seus contos ociosos e prejudiciais são

uma penitência muito mais aflitiva para o seu próximo.

Agora, essas pessoas não só seriam tornadas mais seguras, porém mais dignas pelo "amor" - essa virtude celestial, ao destruir sua propensão

para fofocar, salvá-las-ia do opróbrio e conferiria a elas uma elevação de caráter à qual

eram estranhas antes. Transformaria sua atividade em um novo canal e faria, então, com

tanta vontade de promover a paz da sociedade, como antes a perturbavam com o barulho da

língua ociosa e maldizente. Eles perceberiam que a felicidade de nenhum homem pode ser

promovida pela publicação de suas falhas, pois se ele é penitente, ter suas falhas feitas o assento

do ridículo, é como derramar vinagre sobre as feridas profundas de uma mente conturbada;

ou, se não é penitente, esta exposição fará mal, produzindo irritação e assim, colocando-o mais

longe da verdadeira contrição.

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Se é essencial para o amor cristão sentir uma disposição para cobrir as faltas que

testemunhamos, e tratar com ternura e delicadeza o ofensor, é bastante angustiante

considerar o pouco amor cristão que existe no mundo. Quanta necessidade temos de trabalhar

por um aumento dele em nós mesmos e difundi-lo pela nossa influência e exemplo, para que a harmonia da sociedade não possa ser tão

frequentemente interrompida pelas mentiras do caluniador, os exageros do detrator, os duros

julgamentos dos censuradores, ou pela fofoca ociosa do portador do conto.

2. "O amor CRÊ em todas as coisas."

Quase aliado à propriedade que acabamos de considerar, e sendo parte essencial da tolerância, é o seguinte: "O amor crê em todas as

coisas", isto é, não somente em todas as coisas contidas na Palavra de Deus, porque a fé no

testemunho divino não é o que está sendo dito aqui. Mas, o amor crê em todas as coisas das

quais são dados testemunhos a respeito de nossos irmãos; não, entretanto, as que são

testemunhadas em sua desvantagem, mas em seu favor. Esta propriedade ou operação de

amor está tão envolvida, e tem sido ilustrada em tal extensão no que já consideramos, que não é

necessário ampliar o assunto novamente. Como o amor considera com benevolente desejo o

bem-estar de todos, deve sentir-se

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naturalmente disposto a acreditar em qualquer coisa que possa ser declarada a seu favor.

Diga a uma mãe afeiçoada sobre as falhas de seu filho; ela imediata e inteiramente acredita no

testemunho? Não! Você perceberá um aspecto de incredulidade em seu semblante, você ouvirá

perguntas e insinuações duvidosas de seus lábios, e depois que a mais clara evidência foi apresentada em apoio ao testemunho, ainda

discernirá que ela duvida de você. Mas, ao contrário, leve-lhe um relatório da boa conduta

de seu filho, conte-lhe suas realizações em sabedoria ou em virtude, e você vê de imediato

o olhar de assentimento, o sorriso de aprovação, e em alguns casos testemunha até um grau de

confiança que equivale à fraqueza. Como podemos explicar isso? Segundo o princípio do

apóstolo, "o amor crê em todas as coisas". A mãe ama seu filho; ela está sinceramente ansiosa

pelo seu bem-estar, e como nossos desejos têm uma influência sobre nossas convicções, ela se

adianta para acreditar no que é dito para honra de seu filho, e recua para acreditar no que é dito

para seu descrédito.

Aqui, então, está uma das demonstrações mais brilhantes de amor, como exibido no homem que crê todas as coisas que estão relacionadas

com a vantagem dos outros. Ele ouve o relatório com sincero prazer, ouve com o sorriso da

aprovação, o aceno de assentimento; ele tenta

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encontrar fundamento e razão para desacreditar o fato, nem procura com olhar

curioso alguma falha na evidência, para acusar a veracidade do testemunho; ele não mantém

cautelosamente seu julgamento em suspenso, como se tivesse medo de crer muito bem do seu

próximo, mas se a evidência provém de probabilidade, ele está pronto a acreditar no relato, e se deleita em encontrar outro exemplo

de excelência humana, pelo qual ele pode ser mais reconciliado e ligado à humanidade, e pelo

qual descobre que há mais bondade e felicidade na terra, do que conhecia antes.

A prova mais forte e o poder do amor, neste modo de operação, é sua disposição de acreditar em todos os bons relatos de um inimigo ou um

rival. Muitas pessoas não podem acreditar em nada de bom, senão que tudo é mau, daqueles

que consideram inimigos ou rivais; que uma vez tenham concebido um preconceito de aversão,

que tenham sido feridos ou ofendidos, resistidos ou humilhados, por qualquer pessoa,

e a partir desse momento seus ouvidos estão fechados contra cada palavra a seu crédito, e

abertos a cada história que possa tender para a sua desgraça. O preconceito não tem olhos nem

ouvidos para o bem, mas é todo olho e ouvido para o mal. Sua influência no julgamento é

imensa, suas operações desconcertantes sobre nossas convicções são realmente muito

surpreendentes e assustadoras. Em muitos

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casos, o preconceito não acredita em evidências tão brilhantes, claras e estáveis como o

esplendor meridiano do sol, para seguir o que é fraco e ilusório com a fraca luz de uma vela.

Quão temerosos devemos ser para manter a mente livre da influência enganosa do

preconceito! Quão cuidadoso é obter esse juízo sincero, imparcial e discriminatório que pode distinguir entre coisas que diferem, e aprovar

coisas que são excelentes, mesmo em referência a pessoas que são em alguns aspectos

opostas a nós! Esta é a tolerância cristã.

Através dessa grande lei de nossa natureza, que chamamos de associação de ideias, somos muito aptos, quando descobrimos uma coisa

errada no caráter ou na conduta de outro, e uni-la com nada, senão o que é errado, e isso

continuamente. Nós quase nunca pensamos nele ou repetimos seu nome, senão sob a

influência maligna dessa associação infeliz. O que precisamos é mais do poder da objetividade,

através do qual podemos separar o "ato ocasional" do "caráter permanente", as más

qualidades das boas, e ainda ser deixados em liberdade para acreditar no que é bom, não

obstante o que nós saibamos do que é mau.

Se, de acordo com os princípios da revelação bíblica, com o testemunho dos nossos sentidos e com a evidência da experiência, acreditamos

que, aos olhos de Deus, não há ninguém tão

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perfeito como para ser destituído de todas as falhas; devemos ao mesmo tempo acreditar que,

na medida em que a mera excelência geral desaparece, há poucos tão maus como para

serem desprovidos de todos os traços de aprovação.

O negócio do amor cristão é examinar, relatar, crer com imparcialidade e, a tolerância é uma das operações do amor. Esta disposição celestial

proíbe o preconceito que é gerado pelas diferenças sobre o tema da religião e permite ao

seu possuidor desacreditar o mal e acreditar no testemunho favorável que é dado aos de outras

denominações e congregações. Toda excelência não pertence à nossa igreja ou denominação;

todo o mal não pode ser encontrado em outras igrejas ou denominações! No entanto, quão

preparadas estão muitas pessoas a não acreditarem em nada bom, ou em qualquer

coisa ruim de outras igrejas ou denominações. Afastemos este espírito detestável! Lancemo-lo

fora da igreja do Deus vivo! Como o espírito demoníaco que possuía o homem que habitava

entre os túmulos, e fez dele um tormento para si mesmo, e um terror para os outros, este

"demônio do preconceito" tem muito tempo possuído, rasgado, e enfurecido até mesmo o

corpo do Igreja.

"Oh Espírito de amor, venha e expulse o infernal usurpador, lance fora este saqueador da nossa

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beleza, este perturbador da nossa paz, este oponente da nossa comunhão, este destruidor

da nossa honra. Prepare-nos para acreditar em todas as coisas que nos são relatadas para o

crédito dos outros, sejam eles do nosso grupo ou não, se nos ofenderam ou não, e se em tempos

passados fizeram o mal ou o bem".

3. "O amor ESPERA todas as coisas."

A esperança tem a mesma referência aqui,

como entendido na expressão analisada anteriormente, de que o amor crê em todas as

coisas como se referindo a pessoas, e não especificamente à Palavra de Deus. De igual

forma isto se aplica à ESPERA aqui referida. Mas, o amor espera o bem, daquilo que é

relatado existir em nosso próximo. Em um relatório de uma questão duvidosa, onde a

evidência é aparentemente contra um indivíduo, o amor ainda vai esperar que algo ainda possa vir para a sua vantagem, que alguma

luz ainda será lançada sobre as características mais escuras do caso, que irá definir a matéria

de um ponto de vista mais favorável. O amor não dará crédito total às aparências atuais, por mais

indicativas que pareçam ser do mal, mas esperará mesmo contra a esperança, para o

melhor.

Se a ação em si não puder ser defendida, então o amor esperará que o motivo não seja ruim, que

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a intenção na mente do ator não era tão má como a ação apareceu aos olhos do espectador,

que a ignorância, não a malícia, foi a causa da transação, e que o tempo virá quando isso será

visto.

O amor não abandona rapidamente um ofensor

em desânimo. O amor não o reputa imediatamente como incorrigível, nem logo deixa de empregar os meios necessários para

sua reforma, mas está disposto a esperar que ele ainda possa se arrepender e melhorar, por

maiores que as aparências desanimadoras presentes possam ser. A esperança é a principal

fonte do esforço, e como o amor significa um desejo pelo bem-estar dos outros, não deixará

logo de lado essa esperança, na qual todos os seus esforços devem ser paralisados.

Há razões que o tornam sábio em acreditar e esperar todas as coisas para o melhor.

Evidências presuntivas, por mais fortes que sejam, são muitas vezes falaciosas. Muitas

circunstâncias no caso podem parecer muito suspeitas; no entanto a descoberta de algum

pequeno acontecimento pode alterar o aspecto de todo o assunto e tornar a inocência do

acusado muito mais aparente do que até mesmo sua culpa parecia antes. Os vários casos em que

nós próprios fomos enganados pelas aparências e guiados por evidências defeituosas, embora

que ao mesmo tempo as evidências

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convincentes, certamente nos ensinem a cautela que devemos ter na escuta de relatos

maléficos e nos dispõem a acreditar e esperar todas as coisas para o bem.

Quando consideramos, também, quão comum é

a difamação, a destruição e o conto, não devemos nos apressar em formar uma opinião,

nem se deve esquecer a preocupação que muitas vezes se manifestam por cada parte

envolvida em uma disputa para ganhar a nossa aliança com sua causa, por ser o primeiro a

relatar o assunto e produzir uma impressão favorável a si mesmo. Salomão nos deu um

provérbio, cuja verdade vimos provada em mil casos, e no entanto, estamos sempre

esquecendo "O que primeiro começa o seu pleito parece justo; até que vem o outro e o

examina." (Provérbios 18:17).

É uma prova de grande fraqueza dar o nosso ouvido ao primeiro repórter, e fechá-lo contra a outra parte, e ainda estamos todos prontos a

fazer isso! Um conto plausível produz uma impressão, que nenhum testemunho oposto

subsequente, embora atendido com evidência muito mais clara da verdade do que a primeira

afirmação, pode efetivamente obliterar. Sabemos que cada caso tem dois lados, todos

nós conhecemos experimentalmente a loucura de decidir até ouvirmos os dois lados; e ainda,

em oposição à nossa razão e à nossa experiência

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estamos aptos a assumir um preconceito de um ponto de vista unilateral ou partidário.

Outra circunstância pela qual corremos o risco de sermos induzidos em erro em nossa opinião sobre a conduta de nosso próximo é a propensão

maliciosa de muitas pessoas para exagerar tudo o que relatam. Seja qual for a causa filosófica em

que um "apego pelo maravilhoso deleite na surpresa emocionante", possa ser apreciada,

sua existência e prevalência são inquestionáveis. Talvez todos nós gostamos de

relatar o que é novo, estranho e interessante; e isto não excetua até mesmo as más notícias. A tal

ponto, isto é levado por aqueles que estão profundamente infectados com a propensão

para exagerar, que eles nunca dizem nada como ouviram, cada fato é embelezado ou ampliado.

Se uma pessoa mostrou um pouco de raiva, eles o viram "chateado como uma fúria!" Se estava um pouco alegre depois do jantar, ele estava

"talvez bêbado!" Se era evasivo, protestam que ele cometeu “falsidade, senão perjúrio”. Se não

tivesse sido tão generoso em suas transações como poderia ser desejado, ele era “um

avarento, e desprovido de honestidade comum”.

Nada é moderado e sóbrio nas mãos de tais pessoas; tudo é extravagante ou extraordinário!

Todos eles se encontram com a forma de

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aventura. Do menor incidente podem construir um conto; e em uma base pequena da verdade,

levantam uma superestrutura poderosa da ficção, para interessar e imprimir cada

companhia em que estejam! Não se deixam intimidar pela presença do indivíduo de quem

receberam o fato original, não têm escrúpulo de continuar em magnificar e embelezar, até que o autor da declaração possa mal reconhecer sua

própria narrativa.

Quão estranho parece, que tais pessoas não queiram saber, ou se lembrar, que em tudo isso estão dizendo falsidades! Eles não parecem

entender que, se relacionarmos uma circunstância de tal maneira que é calculada

para dar uma impressão que, na natureza ou em grau, não concorde com a realidade, somos

culpados do pecado de mentir. Onde está o caráter de outra pessoa, o pecado é ainda maior,

já que acrescenta calúnia à falsidade. Muita reputação de um homem foi desperdiçada por

esta propensão perversa e maliciosa. Cada narrador de um caso de má conduta em um

exemplo talvez não hediondo em primeira instância, acrescentou algo ao fato original, até

que a ofensa tenha permanecido diante do público tão enegrecida por essa "difamação

acumulada", que uma vez perdeu o seu caráter, e só o recuperou parcialmente no final, e isso

com extrema dificuldade.

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Recordando a existência de tal mal, devemos ser tardios para formar uma opinião desfavorável

na primeira aparição, e onde não pudermos acreditar em todas as coisas, devemos estar

dispostos a ESPERAR. Tal é o ditado do amor, e tal é a conduta daqueles que cedem seus

corações à sua influência.

"O amor suporta todas as coisas."

"O amor acredita em todas as coisas."

"O amor espera todas as coisas."