a Última olaria de faiança de coimbra

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Centro oleiro com maior produção nacional e projeção internacional, Coimbra foi desde o século XVI um importante centro produtor de faiança. Contando com centenas de olarias, que compunham o Bairro das Olarias, chega ao século XXI com apenas uma, que haveria de encerrar em 2007. “A Última Olaria de Faiança de Coimbra” representa a última memória das olarias coimbrãs, através do registo e estudo de tradições seculares. Da autoria de Luís Sebastian e Filipa Formigo, a publicação, numa edição da Direção Regional de Cultura do Norte, Museu de Lamego e Vale do Varosa, apresenta de forma acessível e clara as bases necessárias ao entendimento e fruição da faiança portuguesa como um bem cultural, histórico e artístico, pretendendo contribuir para o reconhecimento da importância da indústria cerâmica coimbrã na História da cidade, região e país e ainda para a recuperação da identificação da cidade de Coimbra com o seu passado histórico-industrial.

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A ÚLTIMA OLARIA DE FAIANÇA DE COIMBRA

AutoresSEBASTIAN, Luís; FORMIGO, Filipa

TítuloA última olaria de faiança de Coimbra

FotografiaLuís SebastianFilipa Formigo

IlustraçãoLuís SebastianHugo PereiraAna Sampaio e Castro

EditorDireção Regional de Cultura do Norte / Vale do Varosa

LocalLamego

Ano2016

Conceção e composição gráfica

Paulo Rodrigues (colaboração)

ISBN978-989-99516-1-7

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A ÚLTIMA OLARIA DE FAIANÇA DE COIMBRA

PRÓLOGO ............................................................................................................................................. 8

1. A ÚLTIMA OLARIA DE COIMBRA – BREVE NOTA HISTÓRICA .............................................. 131.1. Localização e enquadramento..................................................................................................................... 141.2. Proprietários.................................................................................................................................................. 18

2. TECNOLOGIAS DE PRODUÇÃO DE FAIANÇA NA OLARIA E MATERIAIS DE APOIO ......... 272.1. Matéria-prima .............................................................................................................................................. 282.1.1. Extração e preparação do barro .............................................................................................................. 282.1.2. Obtenção e preparação do esmalte ......................................................................................................... 342.1.3. Obtenção e preparação das tintas............................................................................................................ 392.2. Técnicas de produção................................................................................................................................... 402.2.1. Conformação e secagem........................................................................................................................... 402.2.2. Cozedura de enchacotagem ..................................................................................................................... 482.2.3. Decoração e cozedura de vidragem......................................................................................................... 602.3. Produtos ........................................................................................................................................................ 77

3. OPERÁRIOS E A SUA ORGANIZAÇÃO NA OLARIA .................................................................... 933.1. Mestres, oficiais e aprendizes ...................................................................................................................... 96

4. CONSIDERAÇÕES SOBRE A IMPORTÂNCIA DESTA INDÚSTRIA EXTINTA ........................ 103

FONTES ............................................................................................................................................... 117

BIBLIOGRAFIA .................................................................................................................................. 118

ANEXOS ............................................................................................................................................... 127

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A ÚLTIMA OLARIA DE FAIANÇA DE COIMBRA

AGRADECIMENTOS

Adosinda VinhasAna Sampaio e CastroAntónio PachecoEdgar de AlmeidaHugo PereiraJosé Luís MadeiraLídia CatarinoLiga dos Amigos do Museu de LamegoMaria da Conceição GarrettMaria Ondina CoimbraPaulo Rodrigues

Na «Sociedade de Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.»

Eduardo Correia (proprietário)Vitorino Miguel Ferreira (oleiro)Armando Oliveira (decorador)Alice Coelho Dias (decorador)José Duarte Lucas (oleiro)Júlia Santos (decorador)

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PRÓLOGO

A escavação arqueológica do Mosteiro de São João de Tarouca, decorrida entre 1998 e 2007, contrariou as expetativas iniciais ao permitir exumar um vasto e rico espólio. De entre este, o maior destaque foi, indubitavelmente, para a surpreendente quantidade de faiança, impondo-a, desde o primeiro ano, como a maior e mais ambiciosa frente de investigação, de entre as múltiplas então abertas. Por motivos práticos, o estudo da faiança exumada foi dividido entre portuguesa e importada. Cabendo-me a mim o estudo da primeira, o estudo da segunda foi assumido pela codiretora da intervenção arqueológica, Ana Sampaio e Castro, concluído em 2009 na sua Dissertação de Mestrado em História e Arqueologia “Cerâmica europeia de importação no Mosteiro de S. João de Tarouca (séculos XV-XIX)”, apresentada à Universidade Nova de Lisboa. No entanto, para poder levar a cabo o estudo da faiança portuguesa, senti a necessidade de recuar, e desenvolver previamente um estudo aprofundado sobre os seus centros, matérias e técnicas de fabrico, procurando reunir critérios científicos para a distinção entre centros produtores e cronologias, que fossem para além da tradicional análise estilística, vaga e inconclusiva. O resultado deste trabalho viria a ser defendido como Dissertação de Doutoramento em História com Especialização em Arqueologia na Universidade Nova de Lisboa em 2011, sob o título “A produção oleira de faiança em Portugal (séculos XVI-XVIII)”. Percorrido esse caminho, pude finalmente completar o estudo iniciado em 1998, publicado em 2015 sob o título “A Faiança Portuguesa de Olaria na Intervenção Arqueológica no Mosteiro de São João de Tarouca”.Contudo, em 2007, estando à altura concentrado no estudo das técnicas de fabrico, e lembrando-me da velha olaria do Terreiro da Erva de que tinha conhecimento desde os tempos de estudante em Coimbra, tomei a decisão de aí passar um dia para registar fornos e utensilagem. Fui no entanto surpreendido pelo facto de a olaria estar em processo de eminente encerramento. Como consequência, acabei por permanecer 3 dias na olaria (11, 12 e 13 de julho 2007), em que, com a preciosa ajuda da codiretora e do desenhador da equipa de intervenção arqueológica do Mosteiro de São

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João de Tarouca, Ana Sampaio e Castro e Hugo Pereira, tentamos numa corrida contra o tempo registar por fotografia, desenho e entrevista oral o máximo de informação possível, conscientes de estarmos perante a derradeira oportunidade de registo da última olaria tradicional de faiança em funcionamento em Portugal. O registo então realizado viria a tornar-se uma das fontes mais preciosas para o estudo “A produção oleira de faiança em Portugal (séculos XVI-XVIII)”, sendo aí referido até à exaustão. Todavia, ficou desde então o peso da responsabilidade da total partilha dos dados, que apenas por casualidade, quis o destino que reuníssemos em 2007, ao qual se juntou um sentimento de dívida para com os artificies com quem tanto aprendemos naqueles 3 dias, e nos muitos telefonemas que se seguiram durante os meses seguintes. Por diversas vicissitudes profissionais, nunca me tendo sido possível dar forma de publicação aos dados reunidos, foi mais uma vez por casualidade que em 2014 conheci a investigadora Filipa Formigo, ao arguir a sua Dissertação de Mestrado em Conservação e Restauro na Escola Superior de Tecnologia de Tomar, intitulada “Estudo Decorativo, morfológico e tecnológico da faiança de Coimbra”. Em conversa subsequente, surgiu a ideia de “desenterrar” o registo feito em 2007 e, a duas mãos, publicá-lo, completando-o com toda a investigação complementar em falta, tarefa que Filipa Formigo assumiu na íntegra.Numa história já então cheia de coincidências, estando este trabalho já adiantado, em 2015 o edifício da olaria «Sociedade de Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» entra em obras de reformulação, com o objetivo da sua exploração na vertente turística. Também em meados de 2015 publica-se a obra “Louça tradicional de Coimbra: 1869-1965”, pela mão do investigador António Pacheco, colega de sempre no estudo da faiança portuguesa, e onde a história e produção da olaria do Terreiro da Erva é pela primeira vez alvo de atenção alargada.Foi-nos por isso ainda possível tentar evitar sobreposições entre as duas publicações, buscando antes uma amigável complementaridade, que esperamos ter conseguido. Finalmente cabe aqui uma curta explicação sobre as razões pelas quais coube ao projeto Vale do Varosa a edição desta obra. Em primeiro lugar, se a coleção de faiança portuguesa da intervenção arqueológica do Mosteiro de São João de Tarouca se impõe hoje como uma das maiores coleções de cerâmica Moderna estudadas em Portugal e, como tal, elemento de destaque na divulgação

desse imóvel histórico, e por extensão, do projeto de que é parte integrante desde 2009, essa não seria a realidade sem o registo realizado em 2007. Em segundo lugar, a par dos estudos “Cerâmica europeia de importação no Mosteiro de S. João de Tarouca (séculos XV-XIX)”, “A produção oleira de faiança em Portugal (séculos XVI-XVIII)” e “A Faiança Portuguesa de Olaria na Intervenção Arqueológica no Mosteiro de São João de Tarouca”, fecha-se com esta publicação um ciclo indissociável, em que nenhuma das partes existiria sem as outras. Em terceiro e último, por razões de facto, o vasto quadro tipológico de faiança portuguesa disponibilizado na publicação “A Faiança Portuguesa de Olaria na Intervenção Arqueológica no Mosteiro de São João de Tarouca” corresponde na sua maioria a faiança das olarias de Coimbra. Esta é aliás uma realidade que a investigação mais recente tem vindo a revelar como sendo extensível a todo o Norte Interior de Portugal, pelo menos para os séculos XVII-XVIII. Assim, se queremos conhecer a louça mais usada nas mesas desta região, temos que conhecer o centro produtor onde a sua maioria foi produzida. E é novamente nesta perspetiva que a história da última olaria de Coimbra é de tão grande interesse para a região duriense, num país que é tão pequeno, e num mundo que, afinal, é só um.

Lamego, 11 de fevereiro de 2016Luís Sebastian

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Esperamos, assim, contribuir para o conhecimento da faiança de Coimbra por meio da análise da última olaria da cidade que, inserida num contexto produtivo mais abrangente, torna-se o exemplo mais persistente e duradouro dessa realidade.

Coimbra, 22 de Fevereiro de 2016Filipa Formigo

PRÓLOGO

Em 2011 comecei a trabalhar na inventariação e estudo da faiança portuguesa de contexto arqueológico. Estava então no 3º ano do curso de Conservação e Restauro do Instituto Politécnico de Tomar e o interesse que a temática me despertara conduziu à especialização em materiais cerâmicos. Mais do que o fascínio imediato pela decoração e pelas morfologias, atraiu-me aquela que é uma característica inequívoca destes materiais que é o de terem servido uma realidade sociocultural onde cabem hábitos e costumes próprios sem os quais seriam desproporcionados. Mais interessante ainda é compreender a realidade por detrás do fabrico das mesmas. Como tal, foi em boa hora que surgiu o convite desafiante do Doutor Luís Sebastian e foi com muito agrado e lisonja que o aceitei. Com esta oportunidade tive o privilégio de conjugar o gosto pela temática com o gosto pela investigação histórica necessária ao aprofundamento do conhecimento sobre a origem daquela olaria que se previa mais antiga do que até então se tinha conseguido provar. Para tal mergulhou-se numa pesquisa documental que se pretendia complementar aos estudos existentes sobre a história da olaria. O estudo histórico foi, assim, o início de um projeto de investigação que se foi desenvolvendo em torno das questões diretamente ligadas à olaria. Como tal, naturalmente foram surgindo reflexões e informações sobre o resultado dessa produção e o contexto social e humano da atividade. Para aprofundar esse conhecimento foi fundamental contar com a colaboração e generosidade de particulares, que abriram as portas das suas casas permitindo o registo e estudo das suas coleções, e com antigos trabalhadores da olaria. O facto de ainda existirem testemunhos vivos de pessoas que experienciaram a vida na olaria tornou inevitável que ao longo do desenvolvimento do trabalho surgisse o contato com as mesmas, nalguns casos de forma puramente casual, noutros de forma propositada, pois desde o início do registo desta realidade em 2007 foi valorizada a importância destas fontes orais para a construção de conhecimento, mas também houve a preocupação com a preservação desse património imaterial. Para além desses testemunhos procurou-se, dentro das várias temáticas do universo da olaria sobre as quais nos debruçamos, um estudo comparativo com fontes manuscritas, impressas, arqueológicas e cartográficas com o propósito de se conseguir a maior aproximação possível à realidade.

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BREVE NOTA HISTÓRICA

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Moeda mantém-se ainda hoje com a mesma designação e traça original; já a Rua da Madalena foi integrada na atual Avenida Fernão de Magalhães; apesar de referida na documentação da época, não sabemos hoje onde se situaria a Rua Lopo Dias; o Terreiro das Olarias hoje é o Largo das Olarias, cujos contornos se alteraram apenas em meados do século XX ficando conhecido popularmente por “Bota-abaixo”, resultado da demolição sistemática levada a cabo na década de quarenta do século XX das olarias e casario adjacente aí situadas, por motivos de salubridade pública, indicativo do então avançado estado de decadência deste que foi o coração do bairro oleiro coimbrão; a Rua de Estêvão Nogueira será a atual Rua da Fornalhinha; o Terreiro da Freiria manteve-se até recentemente como Largo da Freiria e a Rua de Almoxarife mantém ainda a sua designação. Além das ruas identificadas documentalmente é provável que na Rua Simão de Évora, na Rua João Cabreira, na Rua de Santo António, na Rua da Louça e na Rua dos Oleiros estivessem localizadas outras olarias. Esta dinâmica de conjunto irá manter-se no seu essencial4, o que leva a considerar como aceitável a extrapolação a períodos mais recuados da localização geral das olarias constantes na Planta do Bairro das Olarias de Coimbra, datável de 1810- 1820 e preservada no Gabinete de História da Cidade - Biblioteca Municipal de Coimbra. A olaria «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» encontra-se situada ao fundo da Rua Direita, no Largo do Prior, números 2 e 4, na Freguesia de Santa Cruz. Desta forma, foi construída num perímetro contíguo ao arruamento mais comum às olarias. A sua entrada principal estaria originalmente virada para a Rua Direita e ter-se-á apenas na sua fase final deslocado para o Quintal do Prior, nome dado à ligação da Rua Direita com o largo originalmente correspondente ao adro da desaparecida Igreja de Santa Justa, hoje popularmente apelidado de Terreiro da Erva5.

Desde meados do século XVI que a produção de faiança em Coimbra mostrou uma evolução positiva até meados do século XVIII. A partir deste período inicia-se uma tendência decrescente que se prolonga até meados de século XX, entrando desde então num período final de lenta agonia, culminando em 2007 com o encerramento da última olaria tradicional de faiança coimbrã, então designada de «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda». No primeiro quartel do século XIX estavam ainda em laboração 10 fábricas de faiança que mantêm características de pequena indústria1 e apesar de se verificar, em relação ao final do século anterior, uma certa estabilidade no número de fábricas a laborar, é já fortemente sentida a concorrência da louça fabril inglesa, cuja importação iniciada nas últimas décadas de setecentos viria progressivamente a aumentar até dominar os mercados portugueses – coloniais inclusive - na centúria seguinte, processo ao qual não foi indiferente a paralisação parcial da indústria cerâmica nacional por via das Guerras Peninsulares2. O advento de uma nova fábrica de louça neste período revela contudo a persistência de uma indústria que teimava em resistir, mantendo a sua tradição secular de forte carácter artesanal.

1.1. Localização e enquadramento

As olarias de faiança de Coimbra estiveram integradas continuamente numa rede organizativa que surge e desenvolve-se ainda no século XVI. Embora nesse período fosse consentido ao artesão instalar-se dentro de muralhas, nos inícios de seiscentos as olarias irão encontrar-se alinhadas junto ao rio Mondego, num perímetro fora de muralhas3. As principais ruas que integraram essa mancha de dispersão foram a Rua da Moeda, a Rua da Madalena, a Rua Lopo Martins, o Terreiro das Olarias, a Rua de Estêvão Nogueira, o Terreiro da Freiria e a Rua do Almoxarife: a Rua da

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Figura 1 | Planta do Bairro das Olarias de Coimbra, de 1810-1820. Gabinete de História da Cidade – Biblioteca Municipal de Coimbra.

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Figura 2 | Adaptação da Planta do Bairro das Olarias de Coimbra, de 1810-1820, a partir de cópia de 1889, conservada no Museu Nacional de Machado de Castro (n.o inventário 12235), aferida com o original.

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A Rua Direita nos séculos XIII-XIV teria a designação de Rua dos Caldeireiros e de Rua Figueira a Velha – dando-se nomes diferentes a dois troços da rua. Nos séculos XIV-XV chamava-se Rua das Caldeirarias e no século XVI surge por vezes referida como Rua de Sansão, em consequência de se iniciar no terreiro do Mosteiro de Santa Cruz, nesta época apelidado de Largo de Sansão. A partir do último quartel de século XVI a nomeação de Rua Direita impõe-se definitivamente6. Esta Rua fazia parte de um conjunto de eixos principais de comunicação

da cidade por via terrestre, tendo sido uma das principais ligações setentrionais da cidade7, e ainda que não existam indícios de que a Rua Direita tenha integrado a mancha de dispersão onde por regra estariam situadas as olarias, a «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» é representativa de uma tradição que detinha aí o seu foco e que ao ter resistido tornou-se na última olaria tradicional de faiança em Portugal.

Figura 3 | Localização da olaria «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra», Lda. na Planta da cidade de Coimbra (folha 9); Autor: José Baptista Lopes (c/ Jaime Loureiro e Frederico Taveira); Data: 1934; Escala: 1:1000; Câmara Municipal de Coimbra – Arquivo Municipal.

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Fabrica de Louça(...)». Estes ficaram autorizados a fazer comunicar «(...) a Caza onde vão construir a fabrica com o Quintal abrindo para essa porta o qual findo este arrendamento taparão pondo a no estado em que antes de aberta se achava», ficando ainda estipulado que «(...) no fim deste arrendamento tornarão a reduzir ao estado em que oje se acha, e tudo isto como quaisquer obras que fassão à própria custa e despeza dellas arrendatarios sem obrigação delle senhorio por cazo algum lhe levar nada dessas despezas em conta (...)». Joaquim da Silva era natural e morador na Freguesia de São João de Santa Cruz, filho de Alexandre da Cunha e de Teresa de Jesus, e casado desde 1814 com Mariana de Jesus12. Começou por exercer o ofício de pintor de louça, tal como o seu pai, e numa determinada data, que a documentação consultada não permitiu apurar, torna-se «mestre de fábrica de olaria branca». É nesta qualidade que surge mencionado numa escritura de 17 de Maio de 1826 em que José Fernandes Moura lhe arrenda por quatro anos a sua fábrica situada na Rua da Moeda13. Passados oito anos, no dia 5 de Julho, Joaquim da Silva compra a João Verissimo da Costa, um cirurgião, «(...) huma Fabrica de Olaria branca, com cazas de habitação no sitio das Olarias desta Cidade, ao fundo da Rua da Moeda (...) pela quantia de duzentos mil reis metal (...)»14. E logo a 14 de Fevereiro de 1835 compra a Maria do Carmo «(...) huma Fabrica de Olaria branca com suas pertenças ao fundo da Rua Tingerodilhas [correspondente à actual Rua da Louça] desta Cidade, que parte com Sebastiana Marcia da mesma, e com rua publica por hum conto de reis (...)»15. Segundo o mapa da «Relacção das Fabricas e Officinas» do distrito de Coimbra, efetuado por determinação de Portaria Circular do Ministério do Reino, Joaquim da Silva detinha entre 1 de Janeiro de 1837 e 11 de Janeiro de 1840 duas fábricas de louça branca: uma situada na freguesia de Santa Cruz, que era administrada pelo próprio proprietário e empregava doze homens e quatro rapazes; outra situada na freguesia de Santa Justa onde trabalhavam

1.2. Proprietários

O nome de «fábrica do lagar»8 por que ficou conhecida a última olaria de Coimbra num primeiro período, terá derivado do facto de, segundo diferentes registos9, ter sido erguida num edifício onde teria funcionado um lagar. Este imóvel pertencia, no primeiro quartel do século XIX, a Joaquim Freire de Macedo e era administrado pelo seu irmão António Freire de Macedo. É nessa qualidade que a 24 de Junho de 1824 realiza o contrato de arrendamento com um pintor de louça chamado Joaquim da Silva de «(...) huma caza que foi um Lagár ao fundo da Rua Direita desta dita Cidade, a qual pello prezente Instrumento na qualidade de administrador dos bens do dito irmão dá do arrendamento ao dito Joaquim da Silva para elle na mesma construir huma fabrica de loussa, por tempo de dés anos (...)»10. Segundo a mesma escritura Joaquim da Silva teria de pagar a renda anual de vinte mil reis e após o período do arrendamento ele teria de abandonar o edifício tendo a permissão para ao fim desse período «(...) levár todos os arranjos (...) para o estabellecimento da Fabrica, ou querendo elle senhorio do Predio ficar com elles será obrigado a pagar-lhos pelo que legalmente for avaliado(...)». O registo deste contrato é, com efeito, a mais antiga prova encontrada referente à construção desta fábrica, embora a data da sua conclusão não possa apurar- se com rigor. Nove dias mais tarde, no dia 3 de Julho de 1824, realiza-se outro contrato de arrendamento11 no qual participa o Prior de Santa Justa José Ferreira Cardoso na qualidade de senhorio do quintal da sua residência. Este é arrendado a Joaquim Ignacio, Joaquim da Silva, Joanna de Mesquita e Angelina Ludovina pelo preço de quarenta e oito mil reis e pelo período de dez anos. Estes arrendatários tinham por finalidade «(...) nelle construirem Barreiros, com comunicassão para a caza que outro tempo foi Lagar e pertence a Joaquim Freire de Macedo desta Cidade, onde os ditos arrendatarios vão construir huma

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Figura 4 | Adaptação da contraposição da cópia de 1889 da Planta do Bairro das Olarias com a “Planta topographica da Cidade de Coimbra” (folhas 6 e 11) de Francisque e César Goullard de 1873-74, aferida com a planta original de 1810-1820 (PAIS, et. al., 2007: 159).Legenda: 1-António d’Oliveira Raimão; 2-Manoel Caetano de Moura; 3 e 11-Manuel José d’Abreu; 4,7 e 15-José das Neves; 5 e 9-Manoel Francisco Barbas; 6-Ritta Damas; 8-B.el José Fortunato d’Almeida; 10- José da Conceição; 12-João de Figueiredo; 13-Manoel de Jesus; 14 e 16-Manoel Joaquim Pessoa.

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seis operários, cinco homens e um rapaz e mais tarde três homens e três rapazes, sob administração de Diogo Francisco16. Contudo, as informações fornecidas por este mapa, particularmente as de cariz espacial, são imprecisas e ambíguas porque foram estabelecidas de forma variável ao critério da pessoa que as registou. A indicação da freguesia do imóvel sem identificação da rua impede uma compreensão mais exata da sua localização, bem como a articulação dessas informações com a cartografia. Segundo as escrituras de compra, as fábricas compradas por Joaquim da Silva em 1834 e 1835, onde surge referido como «mestre de Tenda», situavam-se nas Ruas Tingerodilhas e da Moeda da freguesia de São João de Santa Cruz. Contudo, segundo o mapa da «Relacção das Fabricas e Officinas» de 1837 a 1840 Joaquim da Silva é proprietário de apenas uma fábrica nesta freguesia, sendo proprietário de outra fábrica na freguesia de Santa Justa. A freguesia de São João de Santa Cruz, onde se encontrariam a maioria das olarias, separar-se-ia da freguesia de Santa Justa pelo ribeiro da Água de Runa (a vala de despejos), entre as Ruas da Moeda e de João Cabreira17. Considerando esta conjetura, a Rua Direita pertencia à freguesia de Santa Justa sendo, para os séculos XIII e XIV, a rua principal desta freguesia18. Mais tarde, por decreto de 20 de novembro de 1854, será anexa à paróquia de Santa Cruz. Desta forma, será admissível considerar que esta última fábrica a que se faz referência corresponderá à «fábrica do lagar». Uma dedução que é reforçada por prova documental indicadora de que Joaquim da Silva, para além de edificador, terá sido proprietário dessa fábrica, sendo o primeiro que se conhece. Em 3 de Janeiro de1840 Joaquim da Silva e a sua mulher Mariana de Jesus fazem um dote ao seu filho Leonardo Ferreira da Cunha por ocasião do seu casamento com Narcisa Cortesão. Nesse contrato fica estipulado que «(...) por ser este hum cazamento muito da sua approvação, e para os Noivos suportarem melhor os encargos do matrimonio, dotavão o Noivo seu filho, com a Fabrica de fazer Louça, de que são senhores e possuidores sita ao fundo da Rua Direita desta Cidade, com toda a caza, oficina e mais utensilios Figura 5 | Assinaturas de Joaquim da Silva e de Leonardo Ferreira da Cunha

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pertencentes á mesma Fabrica (...)»19. Para além da Fábrica ficou ainda declarado que «(...) o Barreiro que esta em frente da indicada Fabrica, e as competentes Cazas pegadas ao Barreiro, ficão pertencendo ao dito seu filho, da mesma forma que lhe fica pertencendo a Fabrica (...)»20. Uma vez que esta se encontrava arrendada ficou ainda determinado que findo o contrato de arrendamento em vigor e caso Leonardo Ferreira da Cunha pretendesse administra-la, os seus pais entregavam-lhe a Fábrica «(...) prompta com todos os arranjos, utensilios necessarios ao trabalho della (...)»21. No período em que Leonardo Ferreira da Cunha foi proprietário da fábrica, este irá hipotecá-la numa série de empréstimos, sempre com o propósito de fazer obras para aumento da sua casa situada na Rua de Tingerodilhas: a 4 de junho de 1855 pelo empréstimo de duzentos mil reis22; a 6 de Novembro de 1857 pelo empréstimo de duzentos e vinte cinco mil reis23; a 19 de Agosto de 1859 pelo empréstimo de duzentos mil reis24. Neste último contrato de empréstimo encontra-se anexo um mapa dos «Bens que obriga o devedor Leonardo Ferreira da Cunha e sua mulher». Nesta descrição constam «Huma Fabrica de Louça branca, ao fundo da Rua Direita, desta cidade com todos os seus utensílios, que parte de Nascente com Casal do Parocho da Freguesia, do Poente com a mesma Rua Direita, do Norte com rua que vai para o Adro de Sancta Justa a Velha e do Sul com Antonio Guedes Coelho, desta cidade. Um Quintal pertencente á mesma Fabrica de louça com seus tanques para deposito de Barros, na mesma Rua Direita, que parte do Nascente om filhos de Jose Pedro, do Poente com caminho que veri passar o Adro, digo para o Arnado, do Norte com Rua do Carmo e do Sul com rua que vai para o Adro de Sancta Justa a Velha, tudo no valor de seiscentos mil reis.» Os poucos dados que a documentação já tratada nos faculta impedem de aferir se Leonardo Ferreira da Cunha, além de proprietário, chegou a ser também administrador da Fábrica. Sabe-se apenas que em 1861, segundo o

«Inspector dos Pesos e Medidas do Distrito de Coimbra», a fábrica tinha como administrador Joaquim Maria Nunes que tinha de pagar a Leonardo Ferreira da Cunha a quantia de setenta e dois mil reis anuais25. Mais tarde, em 1867, este último arrenda a fábrica pelo valor de cento e vinte mil reis e por período de quatro anos a Francisco António Maria de Sousa e Francisco Ferreira Duarte26. Leonardo Ferreira da Cunha, em 1871, surge ainda referido como «fabricante de louça» numa escritura de compra, venda e quitação27. Sem que tenhamos outras informações deste proprietário e da fábrica para os anos seguintes, no dia 30 de Agosto de 1873 é realizada uma escritura de administração e sociedade por parte dos filhos de José Joaquim Pessoa e de Rosa Emília do Espirito Santo, o que indica que este último também terá sido proprietário da mesma. Nessa escritura é constituída uma sociedade por Adelino Augusto Pessoa, Adriano Augusto Pessoa, Ermelinda do Ceo Pessoa e Alberto Pessoa designada «Adelino Augusto Pessoa & Irmãos». Adelino Augusto Pessoa, que era o irmão mais velho, torna-se o sócio gerente da sociedade ficando responsável pela administração da fábrica28. Falecido a 28 de Setembro de 1896 com 54 anos, deixa entre os seus bens uma «(...) fabrica completa para fabricação de 1ouça de barro composta de rodas, andaimes, fornos e barreiros, estando estes independentes da mencionada fabrica.»29, que passa a ser de Afonso Augusto Pessoa, filho mais velho de Adelino Augusto Pessoa e Maria Rosa de Jesus30. Em 1897 é constituída a sociedade comercial «Afonso Pessoa & Pimentel» com a qual Afonso Augusto Pessoa e o seu cunhado Manuel António Pimentel tinham o propósito de «(...) dar maior desenvolvimento ao seu comercio e industria»31. Esta ficou constituída para um período de cinco anos, ficando a administração a cabo de Afonso Augusto Pessoa32. Importa referir que estes factos se enquadram num contexto geral de aumento da constituição de sociedades em Coimbra. Em 1899, das 11 fábricas

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de cerâmica situadas em Coimbra, 4 eram exploradas por sociedades33. Um fenómeno promovido pela desburocratização do processo de constituição das mesmas que adveio da promulgação da Lei 22 de Junho de 1867, e que segundo José Amado Mendes “(...) mais do que sintoma de modernização, foi um meio de autodefesa, perante as dificuldades trazidas pela concorrência e pela baixa produtividade.”34. Apesar deste contexto, a sociedade Afonso Pessoa & Pimentel durou menos de dois anos, já que em 19 de Fevereiro de 1897 é realizada uma escritura de dissolução desta sociedade35 seguida de uma escritura de venda, em que Manuel António Pimentel e sua esposa Maria Pessoa Pimentel vendem a sua parte na fábrica ao coproprietário Afonso Augusto Pessoa36. Este último será proprietário da fábrica até pelo menos 190537. Seguir-se-á, provavelmente, um período de interregno – o que se verificava em 190738 –, até surgirem novos registos documentais da fábrica em 1914 e 1915. Um requerimento de 19 de Novembro de 1914 realizado por António Cardoso de Carvalho revela que este pretende adquirir uma licença para explorar a fábrica de louça da Rua Direita, no 13039. Poucos dias depois, de acordo com o preceito legal, num edital na «Gazeta de Coimbra» de 25 de Novembro de 1914, são descritos alguns dos inconvenientes que advinham do funcionamento deste estabe1ecimento industrial. Neste são nomeados os problemas da criação de muito fumo e do perigo da provocação de incêndios, requerendo-se às pessoas interessadas a apresentação de reclamações por escrito em resposta oponente à concessão da licença para um prazo de 30 dias, o que não se verificou40. Poucos meses mais tarde, a 19 de Abril de 1915, o delegado de saúde Vicente Augusto Ferreira Rocha atestou as boas condições sanitárias da fábrica emitindo nesse seu parecer uma nota favorável relativa à sua salubridade pública41. Consequentemente, a 23 de Setembro de 1915, foi passado a António Cardoso de Carvalho o alvará que o autorizou a explorar a fábrica42.

Sem se conhecer, ao certo, quando finda o domínio e administração de António Cardoso de Carvalho, sabe-se que em 1925 a fábrica tinha já sido adquirida por Alfredo de Oliveira43, o que na opinião de José Amado Mendes poderá ter ocorrido em 192144. Apenas em 15 de Abril de 1931 ser-lhe-á passado o alvará que lhe concede a licença de exploração da fábrica45. Por altura da morte de Alfredo de Oliveira, a sua esposa Maria do Nascimento Almeida Martinho assumiu o comando da atividade como fabricante de louça, o que ter- se-á verificado em data anterior ao requerimento feito a 19 de Janeiro de 1942 para o averbamento do alvará para o nome de «Viúva de Alfredo de Oliveira». Este será passado a 4 de Setembro de 194246 fazendo-se, a partir daí, a exploração da fábrica sob este nome47. Aquando da realização do registo da olaria, efetuado em 2007, ainda se encontrava entre o seu recheio um letreiro em faiança onde se lia “Fábrica de Louça / Viuva Alfredo D’Oliveira / Rua Direita 138 / Coimbra”.

Figura 6 | Assinaturas de Alfredo de Oliveira e de Maria do Nascimento Almeida Martinho.

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Figura 7 | Letreiro “Fábrica de louça de viúva Alfredo de Oliveira” (L. Sebastian, 2007).

Posteriormente será Isabel Oliveira Nobre, casada com Manuel dos Santos Nobre e filha de Alfredo de Oliveira e de Maria do Nascimento Martinho, a legitima proprietária da fábrica, sendo dela o nome por que fica popularmente conhecida a fábrica e a louça produzida no início do século XX – “A loiça da Isabelinha”. Em 8 de Janeiro de 1965 uma notícia do Diário de Coimbra48 informa do encerramento da fábrica, referindo que alguns dos operários terão tido a intenção de manter a indústria em laboração. Esta tentativa terá sido infrutuosa assim como outra que se susteve no suposto contacto com a Fundação Calouste Gulbenkian. Nesse mesmo artigo é ainda lançado o apelo: «Haverá quem dedique ao problema um pouco de atenção, procurando soluciona-lo, numa atitude bairrista que teria o aplauso geral?». Terá sido esta

mesma preocupação que conduziu à constituição, a 13 de Março de 1965, da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», formada por quatro casais: Dr. Eduardo Henriques da Silva Correia, Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, e esposa D. Maria Teresa da Conceição Correia Alexandre Bebiano Diniz Correia, cada um com uma cota de quarenta mil escudos; Eng.o António José Hall Temido, engenheiro civil em Coimbra, e esposa D. Maria Alzira Barata Rodrigues Pires Miranda Hall Themido, cada um com uma cota de quarenta mil escudos; Dr. Jaime Barbosa da Cruz Vaz Portugal, médico em Coimbra, e esposa D. Maria Augusta Guimarães Torres Garcia Portugal, cada um com uma cota de trinta mil escudos; Dr. José Manuel Salles Caldeira da Silva, médico em Lisboa, e esposa D. Maria Tereza Guimarães Torres Garcia Caldeira da Silva, cada um com uma cota de dez mil escudos. É

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Figura 8 | Assinaturas e impressões digitais da escritura da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.».

a soma destas cotas que permitem à Sociedade alcançar, nesta fase inicial, um capital social de duzentos e quarenta mil escudos49. Após serem desencadeadas negociações e com o propósito de assumir a exploração da fábrica para o fabrico e o comércio de artigos de cerâmica50, o gerente e sócio Dr. Jaime Barbosa da Cruz Vaz Portugal contratualiza o arrendamento do estabelecimento com o proprietário Manuel dos Santos Nobre, a 26 de Março de 1965. Ficou estabelecida uma renda mensal de mil e quinhentos escudos nos dois primeiros anos, mantendo-se no terceiro ano a renda anual nos dezoito mil escudos, enquanto para os seguintes ficou estabelecida a renda anual de seis mil escudos. Nesta data é ainda efetuada a venda dos bens móveis e incorpóreos que constituíam a fábrica à «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» por cem mil escudos 51. No dia 7 de Junho de 1974 os sócios da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» cederam as suas cotas ao Dr. Eduardo Henriques da Silva Correia fazendo dele e da sua esposa, D. Maria Teresa Correia, os únicos sócios52. Desta forma permaneceu até à atualidade, e no seio desta família, a última olaria de faiança de Coimbra que mostrou ser, desde a sua fundação, um caso de exceção. Criada num período decrescente da produção cerâmica em Coimbra e apartada da malha urbana do bairro das olarias, esta é fundada por pessoas alheias ao rol de relações de uma produção que, no caso coimbrão, se manteve maioritariamente na posse de algumas famílias53. Apesar disso, esta refletiu na sua produção o carácter artesanal tradicional que aí resistiu às sucessivas mudanças de proprietários e às inevitáveis adaptações.

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TECNOLOGIAS DE PRODUÇÃO DE FAIANÇA NA OLARIA E

MATERIAIS DE APOIO

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Não obstante pontuais substituições de materiais e técnicas tradicionais por soluções contemporâneas, impostas pela necessidade de sobrevivência, a última olaria de Coimbra permite testemunhar o essencial daqueles que foram os métodos de produção de faiança coimbrã. As estruturas, instrumentos, técnicas e tradições seculares mantiveram-se aí quase intactas. A sua análise é ainda mais pertinente ao considerar-se que as olarias coimbrãs demonstram uma grande permanência a esse nível, desde o século XVI, sendo aliás essa imutabilidade o cerne da grande discussão que se desenvolveu em Coimbra nos finais de oitocentos em torno da premente necessidade de renovação desta indústria, e que levou, progressivamente, ao seu ocaso, por inadaptação às novas dinâmicas de mercado e correspondentes inovações técnicas54.

2.1. Matéria-prima2.1.1. Extração e preparação do barro

A fase inicial do processo de fabrico de uma faiança passa pela recolha da matéria-prima em barreiro. Na documentação do século XVII é comum a referência aos barreiros de Trouxemil e da Póvoa do Bordalo para a produção da pasta da faiança de Coimbra. Esta extração do barro ter-se-á alargado, posteriormente, para Fala, Loreto, Cucos, Nazaré da Ribeira, Ingote, Anobra e Quarto, no Alto da Estação Velha. Contudo, terão sido os primeiros os locais de exploração mais permanentes. Trouxemil (Cioga do monte) e Póvoa de Bordalo parecem manter-se desde o século XVI até ao fim da exploração direta do barro em meados de século XX55. Segundo o estudo publicado por Charles Lepierre em 1899, o barro da olaria em estudo provinha, à época de Afonso Augusto Pessoa, dos seguintes locais: Quarto, no alto da Estação Velha; Póvoa e Cioga, em Trouxemil. O mesmo autor dá conta de que as porções aí utilizadas seriam: «20 volumes de

marga do Quarto (Estação Velha); 13 volumes de argilla da Povoa; 3 volumes de argila da Sioga»56. Outros barreiros terão sido, mais tarde, explorados na olaria, enquanto «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», como os da zona da Cruz de Morouços, mais exatamente a Sudeste das povoações de Tremoçais e Mesura57. Na década de oitenta do século XX ter-se-á deixado de explorar e tratar diretamente o barro na olaria, passando-se a comprar as pastas já preparadas a fornecedores industriais das Caldas da Rainha. Todavia, conservam-se ainda os tanques de tratamento do barro, que terão sido construídos em 1824 e que atualmente se encontram em avançado estado de degradação, nos atuais números 18 e 54 do Adro de Santa Justa. Da observação da folha 9 da Planta da Cidade de Coimbra levantada em 1934 por José Baptista Lopes, percebe-se que, à data, o terreno contaria com dois tanques contíguos mais pequenos, situados no seu extremo Noroeste. Ainda que tratando-se de um levantamento à escala 1:1.000, podemos apontar para estes dimensões de cerca de 3,3 m por 3,3 m e 4,9 m por 4,6 m, aos quais se juntaria ainda um terceiro tanque mais pequeno, isolado, com cerca de 2,5 m por 3 m. Estas são dimensões bastante aproximadas em relação às descritas por Charles Lepierre em 1899 para Coimbra: «(...) um tanque, cavado na terra de cerca de 1 metro de profundidade, variando a largura e o comprimento entre 3 a 4 metros», sendo as paredes feitas de tijolo58. Esta informação é ainda repetida em 1905 por Fortunato Augusto Freire Themudo59. Nestes tanques era armazenada a argila a céu aberto para os tratamentos de refinamento que permitiam a limpeza da argila, a homogeneização da pasta e a melhoria das propriedades das misturas. Ao barro introduzido no tanque seria então acrescentada água, onde permaneceria a demolhar – “descanso” – durante alguns dias, aproximadamente oito60. Seguidamente a mistura seria mexida com uma enxada de cabo comprido, de forma a permitir que o operário responsável pudesse proceder a esta operação a partir do exterior do tanque.

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Figura 9 | Localização do barreiro na «Planta de Fábrica de António Cardoso de Carvalho»; 1915; escala original: 1:100 (AUC Governo Civil _ Licenças para estabelecimentos industriais 1915, Processo no 99) e vista geral do portão de acesso à área dos tanques de tratamento do barro, visto de Sudoeste para Nordeste (L. Sebastian, 2007).

No Verão as temperaturas altas permitiam a sua realização a partir do interior do tanque, usando uma enxada de cabo mais curto, o que facilitaria a tarefa. Durante esta fase o barro era mexido duas vezes ao dia, ao fim do qual, sendo a mistura líquida do barro – “calda” – dada como homogénea, era baldeada por meio de um cabaço de latão através de um peneiro de tela metálica para um outro tanque anexo, colocado à mesma altura61. O peneiro recebia a designação de “gamela”, sendo de latão com fundo de rede metálica, correndo a calda do barro para uma calha de telha que a conduzia ao tanque

inferior. As dimensões deste segundo tanque da olaria parecem ser as mesmas do primeiro. Charles Lepierre, por sua vez, não esclarece diferenças de área, mas confirma como habitual para as olarias coimbrãs a maior profundidade dos segundos tanques, com 2 metros em média. Uma vez no segundo tanque, a calda do barro era deixada a secar, com depósito do barro por sedimentação e evaporação da água. Por sua vez, após o descanso do barro no segundo tanque, este seria novamente remexido,

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voltando-se a crivar para um terceiro tanque. Este processo levaria entre três a quatro meses, período indicado por Adelino António das Neves e Mello62 em 1886, que o considerava demasiado curto «para lhe fazer depositar as impurezas». Além dos elementos mais grossos tenderem a se concentrar junto ao crivo, o facto da sedimentação geral se fazer naturalmente de acordo com a sua granulometria, ou seja, depositando-se primeiro os elementos mais grossos e pesados e os mais finos e leves por último, possibilitava a recuperação do barro segundo maiores ou menores estados de purificação, e logo de qualidade63. Tudo indica que existia um aproveitamento do barro mais refinado, mas também do menos refinado64, um aspeto que sugere possíveis produções de qualidade diferenciada dentro de uma mesma olaria. No procedimento seguinte para o tratamento do barro Charles Lepierre65 refere que as pastas assim tratadas e ainda húmidas eram submetidas a uma pisadura. Já Fortunato Augusto Freire Themudo66 refere que estas seriam transportadas «para depósitos dentro de casa, junto às oficinas». Na olaria da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» o local para a pisadura, amassadura67 ou argamassar68, era a “capela”, designação atribuída à área superior dos fornos, onde se formava uma relativamente ampla plataforma, correspondente em superfície à soma dos três fornos. Aí o calor emanado das fornadas contribuía para uma mais rápida secagem do barro, no entanto, o facto de se tratar de uma área plana, obrigava a que a contenção de líquidos fosse feita improvisando paredes de retenção com o próprio barro. Todavia, não terá sido esse o único local utilizado para a amassadura do barro pois, segundo a planta da fábrica de 1915, existiria próximo do poço de água um tanque que é aí designado de “piza do barro”, o que indica que esse processo terá sido anteriormente realizado nesse local. A amassadura do barro era realizada com os pés, e teria a duração de cerca de três dias, variando de acordo com os índices de humidade das diversas estações do ano. Ao fim de algum tempo havia uma enorme “bolacha” no chão. Cortava-se então,

Figura 10 | Tanques de tratamento do barro vistos de Norte para Sul e de Sul para Norte (L. Sebastian, 2007).

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no sentido dos seus raios, aquela enorme circunferência. Volta-se a acumular o barro num bloco central e repetia-se a mesma operação até se perceber, pelo próprio calcar, que a pasta estava uniformemente amassada, aveludada e sem ar. Esta prática de auxiliar a amassadura do barro através do seu corte era designada comummente por “traçar o barro”69. Seguia-se a adição de aparas de barro, resultantes do trabalho de acabamento das peças já moldadas e suficientemente secas para permitir ações como o “fretar” – ação de vazar o fundo externo de pratos ou tigelas de forma a criar um pé anelar, ou debrum –, em que não tendo ainda o barro chegado ao fim da “secagem”, ou “enxugo”, se encontra já bastante seco, ou “duro”. A estas aparas, em 1905, chama Fortunato Augusto Freire Themudo70 de “atachas”, enquanto na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» se designava esta

Figura 11 | Vista geral da área superior dos fornos designada por “capela” (L. Sebastian, 2007).

operação por “atacar” o barro, o que servia para acelerar a sua secagem. Após a fase de amassadura o barro encontrar-se-ia seco, mas moldável, sendo cortado em largas tiras e levado a “sovar” numa mesa de pedra, já junto ao local de modelação. Era aí cortado em pedaços, com o mesmo “garrote” usado para separar as peças do prato do torno após a modelação, sendo batido contra a mesa71. Finda esta última fase de tratamento, eram retiradas porções de barro correspondentes às diferentes peças a modelar, dispostas junto ao torno em forma de bolas, que se designavam por “pélas”72. Este procedimento propiciava uma melhor homogeneização da porção de pasta a trabalhar, que se adaptava de forma imediata ao trabalho de modelação que se seguia.

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Figura 12 | Localização do tanque de “Piza do Barro” na «Planta de Fábrica de António Cardoso de Carvalho»; 1915; escala original: 1:100 (AUC Governo Civil _ Licenças para estabelecimentos industriais 1915, Processo no 99)

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Figura 13 | Localização da mesa de “sovar” o barro na «Planta de Fábrica de António Cardoso de Carvalho»; 1915; escala original: 1:100 (AUC Governo Civil _ Licenças para estabelecimentos industriais 1915, Processo no 99) e vista geral da mesa (L. Sebastian, 2007).

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2.1.2. Obtenção e preparação do esmalte

Na fase inicial do processo de fabrico de uma faiança era ainda necessário reunir um conjunto de matérias-primas essenciais à formação do esmalte estanífero. Embora não nos tenha sido possível determinar a origem dessas matérias-primas e a dosagem dos diversos componentes do esmalte empregue na olaria «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» – antes da sua substituição pela aquisição de esmaltes industriais pré-preparados –, poder-se-á extrapolar a realidade envolvente da generalidade das olarias coimbrãs. Charles Lepierre em 189973 informa-nos que nas olarias de Coimbra, à altura, estaria em uso «uma mistura de 100 kilogramas de Chumbo e 18 a 20 kilogramas de Estanho», correspondente a 83,3-84,7% de chumbo para 16,6-15,2% de estanho, ou em partes, cerca de «cinco de chumbo por uma de estanho». Contudo, esclarece que «no princípio do século empregava-se em Coimbra, segundo fórmulas antigas que vi, as seguintes proporções: 100 kilogramas de Calcina de chumbo e 25 kilogramas de Calcina de estanho», ou «o chumbo e o estanho na proporção de quatro partes de chumbo por uma de estanho», correspondente a 80% de chumbo para 20% de estanho. Fortunato Augusto Freire Themudo em 190574 refere, novamente para Coimbra, que «o vidrado é formado por 1 kilograma de estanho por 15 de chumbo misturado com areia do mar para a louça grossa», correspondente a 93,7% de chumbo para 6,3% de estanho, «e 2 de estanho por 15 de chumbo (...) para a louça fina», correspondente a 88,2% de chumbo para 11,8% de estanho. Sem precisar cronologicamente a fase de transição a que se refere, acrescenta ainda que «antes porém do encarecimento do estanho o vidrado da louça fina levava 3 kilogramas de estanho por 15 de chumbo», correspondente a 83,3% de chumbo para 16,7% de estanho. É de notar que, apesar da imposição do

sistema métrico a partir do decreto de 13 de Dezembro de 185275, as dosagens registadas por Fortunato Augusto Freire Themudo em 1905 correspondem ainda à arroba, que com 14,688 kg se aproxima dos «15 kilogramas» referidos, e provavelmente a quatro ou seis arráteis, que com 0,459 kg se aproximam dos 2 e 3 «kilogramas» referidos. Relativamente ao uso do chumbo, em 1886 Adelino António das Neves e Mello76 asseverava que «havia outrora uma galena, com que se vidrava a louça denominada alcofôr, e era composta de sulfureto de chumbo». A isto acrescentava Joaquim Martins Teixeira de Carvalho em 192177 que “o alcanfor é uma galena de chumbo, que ainda hoje tem este nome, e foi usado para vidrar louça pelos espanhóis, que lhe deram o nome de álcool de alfarero”. Considerando-se a vereação de 11 de Agosto de 1576 da Câmara de Coimbra78, disponibilizada pelo mesmo autor (Documento VII), temos a obtenção do necessário óxido de chumbo a partir diretamente da calcinação do minério de chumbo, no caso a galena, segundo a prática na região espanhola valenciana desde a Alta Idade Média79 e confirmada para a Coimbra de 1472 pela requisição do oleiro Brás Eanes80, mas verificando-se já, e por isso pelo menos desde o último quartel de século XV, a oxidação do minério a par da obtenção do óxido de chumbo a partir da calcinação do metal propriamente dito. Num artigo publicado no n.o 849 do jornal O Conimbricense, de 15 de Março de 1862, aponta-se para as olarias de Coimbra a compra de «Chumbo 8:800 kg. a 110 rs. da mina do Braçal», situada em Sever do Vouga, ao qual junta ainda a compra diretamente em Coimbra do já preparado «Zarcão 45 kg. a 160rs»81. A opacificação dos vidrados cerâmicos era concretizada pela adição de estanho, na sua forma oxidada, à semelhança do observado para o chumbo82. O abastecimento do estanho praticado nas olarias de Coimbra poderia

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realizar-se pelo interior com estanho de Viseu ou da Guarda, embora fossem igualmente passíveis de serem fornecidas com estanho de além-mar através do chamado porto de Coimbra, na Figueira da Foz, subindo posteriormente o rio Mondego. O uso do cloreto de sódio, empregue como fundente para esmaltes estaníferos, terá sido quase exclusivamente obtido a partir da adição de sal marinho83. É da combinação deste cloreto de sódio presente no sal com a sílica presente na areia que resulta o silicato sódico, que constitui nesse ponto, e sem adição de qualquer opacificante, a base do vidrado plumbífero translúcido84. É pois apenas a adição do óxido de estanho, já associado ao óxido de chumbo, que como opacificante garantirá a passagem do vidrado plumbífero translúcido para um esmalte estanífero de cor branca85. Poderia pensar-se que em Coimbra, de forma natural, a areia empregue no fabrico de faianças tivesse sobretudo a sua origem nos extensos areais do Mondego. No entanto, no já referido artigo do jornal O Conimbricense de 15 de Março de 1862, encontramos «Areia do mar 2 carros, a 2$400 rs. da Figueira». Por sua vez, Fortunato Augusto Freire Themudo, em 190586, refere-nos que na «louça grossa» seria empregue «areia do mar» e na «louça fina» a «de Soure», levantando a hipótese de a determinado ponto se ter estabelecido um comércio de areias a partir da foz da Figueira subindo o rio Mondego. A mesma origem deveria ter o sal utilizado na preparação dos vidrados. A preparação e transformação das matérias-primas enunciadas passava, numa fase inicial, pela operação de oxidação do chumbo e do estanho. A esta operação encontramos atribuídas às designações “calcinar” ou “queimar”, e consequentemente “calcina” – ou “calcinado” – ou “queima” ao produto resultante.Esta operação era efetuada num pequeno forno, destinado apenas a essa função. José Ferreira da Silva, em 180487, refere-se-lhe apenas como «forno

de calcinação», podendo no entanto entender-se que admita igualmente o termo «fornalha», enquanto António Veloso Xavier em 180588 designa-o já como «forninho», o mesmo termo que vamos encontrar em 1899 em Coimbra segundo Charles Lepierre89. Contudo, na descrição das olarias coimbrãs feita por Fortunato Augusto Freire Themudo em 190590, este diz chamar-se-lhe «fornilho». Na olaria encontramos ainda intacto o forninho e, apesar de já não haver memória da calcinação do chumbo e do estanho no local, este não terá deixado de acontecer antes da década de sessenta do século XX, uma vez que o mais antigo funcionário da casa91 não retinha, já em 2007, qualquer recordação do seu funcionamento. Este distanciamento terá levado mesmo a que a memória da sua função se perdesse completamente. A determinado momento após a sua descativação a câmara de combustão foi separada da câmara de fusão por uma parede de tijolo, transformando-o assim em duas pequenas fornalhas, reaproveitadas pelos funcionários para assar alimentos e aquecer as “buchas” diárias. Se bem que do registo gráfico do forninho coimbrão, publicado por Charles Lepierre na sua Figura 8, fique a ideia de se tratar de uma estrutura independente, à semelhança da representação que o italiano Cipriano Piccolpasso faz na sua obra Litre libri dell’arte del vasaio, de 1557-1559, na olaria «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» o forninho encontra-se inserido paredes-meias entre o “forno grande de vidragem” e o “forno pequeno de vidragem”. Fica-nos pois a ideia de que o forninho seria sobretudo uma estrutura adossada a uma das paredes do volume de um dos fornos cerâmicos, procurando igualmente com a sua localização reaproveitar a chaminé lateral que capta e evacua os gases das cozeduras, o que provavelmente já aconteceria com o forninho representado por Charles Lepierre, ainda que o seu registo

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Figura 14 | Aspeto do forno de revérbero - “forninho” - para calcinação do chumbo e do estanho empregues no esmalte, embutido entre o “forno grande” e o “forno pequeno” de vidragem (L. Sebastian, 2007) e sua representação esquemática (L. Sebastian)

não o esclareça. Na olaria «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» o forninho de calcinação partilha a chaminé lateral do forno de enchacotagem. A calcinação do chumbo seria realizada em primeiro lugar, após a

qual se junta o estanho. De forma a induzir uma maior e mais rápida oxidação dos metais estes são continuamente mexidos com um rodo de cabo comprido, um utensilio que com a sua ponta dobrada e larga permite arrastar o produto

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calcinado. Consoante a formação do óxido na superfície dos metais fundidos, este era empurrado ou puxado para o lado, de forma a melhor expor a superfície líquida à continuação da oxidação. Procurava-se a total oxidação do metal introduzido no forninho, ainda que parte residual devesse permanecer invariavelmente no fundo do lar da câmara de oxidação ou do recipiente usado para expor o metal ao fogo92. Depois de devidamente doseados no seu estado oxidado, ao chumbo e ao estanho seriam acrescentados sem prévia transformação as respetivas doses de sal marinho – cloreto de sódio – e areia – sílica –, mistura essa que colocada na fornalha do forno cerâmico, em recipiente próprio ou em buraco aberto no chão da fornalha e revestido por areia para não pegar, iria então a fritar uma última vez antes da sua moagem93. Na referência de Charles Lepierre à Coimbra de 189894 temos que no princípio de oitocentos empregava-se «100 kilogramas de Calcina de chumbo e

25 kilogramas de Calcina de estanho, a que se juntavam 37,5 kilogramas de Sal marinho e 125 kilogramas de Areia branca, podendo-se juntar 7,5 kilogramas de cristal», ainda que à data de registo já só se use «100 kilogramas de Chumbo e 18 a 20 kilogramas de Estanho», ou «cinco de chumbo por uma de estanho apenas», sendo que «ao volume ocupado por esta calcina adiciona-se 1,5 volume de areia e 32 litros de sal». Como preparação para a fase de moagem, o bolo da frita era triturado – ou pisado95. No espólio da olaria «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» consta uma pia de calcário que se situava defronte aos fornos e que serviu de almofariz, juntamente com a utilização de um pilão de ferro. Segundo a planta da olaria de 1915 este seria designado de “pizão” e estaria localizado junto a uma das janelas direcionadas para o Quintal do Prior, o que indica que este deverá ter sido mudado por alteração do espaço interior da olaria. Na fase de moagem propriamente dita importa analisar o moinho

Figura 15 | Almofariz em pedra com pilão de ferro (L. Sebastian, 2007). Localização do tanque de “Pizão” na «Planta de Fábrica de António Cardoso de Carvalho»; 1915; escala original: 1:100 (AUC Governo Civil _ Licenças para estabelecimentos industriais 1915, Processo no 99)

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empregue nessa tarefa e o seu modo de funcionamento. Na segunda escritura de arrendamento que foi feita por Leonardo Ferreira da Cunha, a Francisco António Maria de Sousa e a Francisco Ferreira Duarte a 13 de Abril de 1867, são descritos dois «moinhos de boi» com ferragem e pedras96. Na descrição dos bens móveis da olaria de 1946 vem referido um «(...)moinho de galgas, para moer o vidro, que era accionado por um animal»97. Posteriormente, todo este equipamento terá dado lugar a um cilindro acionado por um motor elétrico de 5 c.v., o que já acontecia em Janeiro de 194298. O tipo de moinho e o seu modo de funcionamento será semelhante ao descrito por João da Bernarda, com relação à olaria de Alcobaça fundada em 1875. Segundo o autor “O primeiro moinho utilizado para moer vidro era um cilindro feito em madeira (aduelas) como um barril, forrado de pedra que tinha uma mó com uma manivela funcionando ao alto, um pouco como a mó árabe. Passou-se a adaptar neste conjunto uma correia que acoplada a um moinho eléctrico, dava um rudimentar moinho de bolas (seixos) como hoje são conhecidos”99. Num documento datado de Junho de 1946 vem referido que a moagem do vidrado se encontrava instalada na Rua do Adro de Santa Justa, e portanto, na parte referente ao barreiro. Aí constava «1 Moinho cilíndrico para vidro (electrico); 1 Moinho de galgas para vidro (fora de uso); 3 Tornos de oleiro; 1 Motor de 5 c.v.; 2 Barreiros»100. Mais tarde, o motor de 5 c.v. e o moinho cilíndrico para moer vidro, terão sido transferidos para o edifício principal da olaria101. Apesar de não termos encontrado vestígios do moinho de galgas, estas fontes documentais indicam que todas as fases de preparação do vidrado, incluindo a moagem, eram processadas na olaria. Informações que contrariam o testemunho de Charles Lepierre que afirma, em 1898102, que «nenhuma fábrica tem motor seu; as cores e vidrados são moídos numa fábrica independente, de moagem comum, movida a vapor». Uma informação repetida em 1905 por Fortunato Augusto Freire Themudo103, afirmando que «o vidrado e as cores para as diferentes fábricas são moídos numa oficina independente, movida a vapor, e que se encarrega deste serviço para os fabricantes mediante uma certa remuneração». Figura 16 | Moinho cilíndrico elétrico (L. Sebastian, 2007).

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2.1.3. Obtenção e preparação das tintas

Apesar de não existir memória da preparação local do esmalte, esta existe em relação às tintas, que passaram a ser adquiridas ao exterior apenas na década de setenta de século XX, sendo que um moinho de moer tintas vem também referido na descrição dos móveis na segunda escritura de 1867104. Uma vez finalizada a moagem do esmalte, este encontrava-se em condições de ser aplicado sobre a superfície das peças previamente enchacotadas para serem, posteriormente, pintadas. Relativamente às diversas cores empregues na pintura importa considerar de onde são extraídas. O cobalto (Co) é para todos os efeitos um metal que se encontra comummente associado com o níquel nos minerais esmaltite (CoAs2) – cobalto branco piritoso – e cobaltite (CoAsS) – galena de cobalto. Este foi grandemente importado de Inglaterra para Portugal após o desenvolvimento da indústria cerâmica inglesa a partir de meados de século XVIII. Neste sentido vem igualmente a afirmação de Charles Lepierre, em 1899105, em relação às tintas empregues nas olarias de Coimbra, de que «um número grande d’estas cores são importadas de Inglaterra principalmente». O mesmo autor refere ainda que nas receitas de «Azul para faiança ratinha» e de «Azul para faiança Vandelli» é empregue morado ao qual faz seguir a nota «óxido de manganez do Bussaco» ou «MnO2 impuro do Bussaco». A isto podemos ainda juntar a informação de João da Bernarda106 de que “certas pedras do Mondego de côr castanho- escuro davam depois de calcinadas um morado bastante usado em Coimbra e na região de Alcobaça”. O manganês (Mn), ou manganésio como mais correntemente designado nas áreas química e mineralógica, tem como principal mineral a pirolusite (MnO2), ao qual se juntam a manganite (Mn3+O(OH)), a blenda de manganésio (MnS) e o psilomelânio (Mn(MnO3))107.

O óxido de antimónio, utilizado na obtenção dos amarelos, tem como principal mineral a estibina ou sulfureto de antimónio (Sb2S3). Não sendo segura a sua origem, este sulfureto de antimónio deverá na maioria, senão na totalidade, ser provindo também de Inglaterra. Charles Lepierre108 dá força a esta ideia, ao escrever sobre as olarias de Coimbra que «este sulfureto vem de Inglaterra, quando em Portugal se exploram importantes minas d’este mineral (stibina) que dá um excellente producto: dá este facto mais uma prova do atraso dos fabricantes». Utilizado quer no seu estado de oxidação quer no de redução, o ferro (Fe) é utilizado para a obtenção de tonalidades violeta, vermelha, laranja, amarela, preta e verde. A ocorrência do minério de ferro é bastante comum tendo como principais minérios a hematite (Fe2O3), magnetite (Fe2+Fe3+2O4), limonite (FeO(OH)·nH2O), pirite (FeS2) e siderite (Fe(CO3)). Na olaria eram calcinados, na “caldeira” do forno de vidragem, aros de ferro reaproveitados de velhas pipas para que fossem aproveitados na obtenção do óxido de ferro. As tintas de cor verde teriam por base o cobre (Cu) na sua forma oxidada. O cobre pode ocorrer frequentemente no seu estado nativo, mas mais frequentemente ocorre na forma dos seus principais minerais: calcopirite (CuFeS2), cuprite (Cu2O), cacosite, também designável por galena de cobre (Cu2S), malaquite (Cu2(CO3)(OH)2) e azurite (Cu3(CO3)2(OH)2). Apesar de o minério de cobre contar para o território português com diversos pontos históricos de exploração nas regiões do Vale do Vouga, Algarve e sobretudo Alentejo, com destaque para Mértola, Grândola e Aljustrel109, a obtenção do verde cobre aparenta ter tido principalmente por base o azinhavre, correspondente ao carbonato extraído da oxidação da superfície do próprio metal, e o óxido obtido pela calcinação de restos de cobre. Associados a um fundente, vitrificável, incolor e inerte perante as cores, como a areia e o óxido de chumbo110, todos os corantes empregues são

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passíveis de apresentar diversas tonalidades segundo a sua maior ou menor concentração, que de forma controlada e intencional permite um importante enriquecimento decorativo através de diferentes gradações da mesma cor.

2.2. Técnicas de produção

2.2.1. Conformação e secagem

A conformação do barro, nas suas formas pretendidas para a produção de faiança, é obtida por rodagem ou moldagem. A rodagem consiste na formação da peça na roda de oleiro, ou torno de oleiro, que animado por um movimento de rotação contínua permite a formação do barro, manual e com auxílio de instrumentos, em objetos de configuração circular, simétricos segundo um eixo central de revolução111. O termo moldagem define a ação de produzir peças cerâmicas através da conformação do barro em moldes112. No espólio da olaria conserva-se um torno de oleiro original que se presume manifestar um particularismo regional. De acordo com a solução corrente, este era totalmente concebido em madeira, com exceção do eixo e das ferragens de ferro que o fixavam à restante estrutura do torno, sendo no seu todo uma estrutura móvel. A particularidade deste exemplar registado é não possuir banco, ficando o oleiro sentado de través num barrote central, o qual é atravessado pelo eixo, numa solução mais simples, se não mesmo mais grosseira, em comparação com o torno comummente representado113. Esta posição, apesar de pouco confortável para o oleiro, permitiria contudo uma maior impulsão à roda. A sua datação deverá recuar à viragem dos séculos XIX-XX e segundo a planta de 1915 existiriam, à data, cinco rodas de oleiro na fábrica de António Cardozo de Carvalho. Estas, pela óbvia necessidade de luz para a boa execução Figura 17 | Modo de funcionamento e dimensões da roda ou torno de oleiro (L. Sebastian & H. Pereira, 2007).

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Já nos instrumentos auxiliares de calibração se inclui o recurso de cérceas, nas quais se encontrariam inscritos os perfis exteriores ou interiores das peças a rodar, permitindo a reprodução de peças iguais de forma mais segura e rápida, contribuindo assim de forma decisiva para o aumento da capacidade produtiva. Estas seriam sobretudo aplicadas diretamente seguras por uma das mãos do oleiro, podendo no entanto ocorrer soluções que passassem pela sua fixação em um qualquer eixo ou haste. Na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» fomos encontrar a versão já industrializada deste sistema de conformação do barro, a que era dado o nome de “jaula”. Esta utiliza uma roda e uma série de cérceas diferentes consoante o perfil que se quer imprimir à peça.

do trabalho de rodar o barro, estariam posicionadas junto às janelas ou em qualquer vão, orientadas de forma a garantir o maior período possível de luz por dia. A acão de rodar propriamente dita, designada por Pedro Prostes114 como “roderio”, passa primeiramente por uma última amassadura da bola de barro que foi separada após o seu tratamento e feita proporcionalmente à obra a ser produzida, aqui designada por “péla”115. De seguida, a “péla” é colocada sobre o prato do torno, “tangendo” a roda até atingir a velocidade ideal e constante, e molhadas as mãos na água contida no recipiente tido para esse efeito sobre a bancada, o oleiro começa por centrar o barro, passando a fazê-lo subir – puxar o barro – em forma de cilindro ligeiramente cónico, iniciando então com os dedos a abertura do recipiente de cima para baixo e do centro para a periferia116.Ainda que a rodagem do barro fosse sobretudo realizada diretamente com as mãos, a sua execução envolveria quase obrigatoriamente o emprego de instrumentos auxiliares, que poderemos dividir entre auxiliares de modelação e auxiliares de calibração. Dentro dos instrumentos auxiliares de modelação, e segundo José Ferreira da Silva117, seria utilizado o “cutelo” ou “faca”, enquanto António Veloso Xavier118 refere a “agulheta”, «especie de ponta de ferro» aguçada. Consensual é a referência ao uso do garrote no corte de separação da peça concluída do prato do torno, sendo igualmente utilizado no corte do barro na sua fase de preparação. Cipriano Piccolpasso, na sua obra de 1557-1559, diz ser um fio de cobre ou latão119. Já José Ferreira da Silva120 chama-lhe «fio de latão» ou «serra», definindo-o como «ponta de fio de arame guarnecida de um punho em cada extremidade». Outra necessidade óbvia é a presença de um recipiente com água junto ao torno de oleiro, para servir os constantes humedecimentos das mãos121. Figura 18 | Equipamento do sistema de “jaula” (L. Sebastian, 2007).

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À passagem do barro pela cércea esta retira o excesso e imprime ao barro o perfil da cércea. Este trata-se de um sistema misto de conformação uma vez que, para além de utilizar uma roda e um instrumento de calibração, utiliza ainda um molde metálico. Na roda era aplicado o negativo da forma que se queria imprimir para formar a outra face da peça, para que entre o negativo e a cércea se formasse de uma só vez ambos os perfis da peça. O pontalete terá sido igualmente um dos meios mais comummente empregues na orientação do trabalho de modelação do oleiro, sendo que para a olaria alcobacense de tradição coimbrã, João da Bernarda122 descreve que “Para cada medida desejada da série o oleiro tinha uma guia constituída por um bocado de ripa vertical. Esta guia era fixada por um pouco de barro à banca do torno, tendo, a alturas desejadas, lascas de cana que serviam de regulador da forma, definindo o seu perfil com os pontos mais salientes. Este conjunto

dava-nos em rotação, a cada altura, o diâmetro da circunferência pretendida”. No processo manual de “rodagem”, o pontalete tem um papel importante na determinação de diâmetros e alturas, não só das dimensões máximas da peça, mas também das diversas inflexões que determinam o seu perfil. Após a conclusão da formação do barro, este seria separado do prato da roda de oleiro com a passagem do “garrote”, devendo o transporte do barro ainda fresco ser feito com extremo cuidado, dada a fácil deformação das paredes através da pressão exercida pelas mãos no ato de apreensão. A moldagem por sua vez faz-se com recurso a moldes que reproduzem em negativo a forma da peça a obter, sendo por norma compostos de diversas secções, designados por “tacelos”123, permitindo assim o seu desmanche e a recuperação da peça uma vez seco o barro, e sua posterior reutilização124. Em regra os moldes são concebidos em gesso, beneficiando da sua elevada

Figura 19 | Moldes de gesso (L. Sebastian, 2007).

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capacidade de absorção da humidade, acelerando o processo de secagem e recuperação das peças, que uma vez desidratadas contraem, separando-se naturalmente do molde. Especialmente vocacionado para a formação de peças de morfologia complexa e, sobretudo, não circular, o enchimento do molde pode ser por prensagem manual ou por “lambugem”, ou “barbotina”. A primeira refere-se à prática de aplicar o barro em forma de lâmina ao interior do molde, forçando-o a adaptar-se às suas paredes internas reproduzindo em positivo a sua morfologia. Para esta correta adesão a lâmina

Figura 20 | Rolo e réguas para obtenção da lastra de barro para aplicação nos moldes (L. Sebastian, 2007).

de barro, designável por “lastra” ou “folha”, é pressionada com uma esponja molhada, ou com uma boneca125, e com os dedos, ao que se atribui a designação de “rebocar”126, seguindo-se a secagem e recuperação da peça. Para facilitar o destacamento do barro em relação às paredes do molde, estas eram por regra previamente molhadas127. Para a preparação da “lastra”, na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», o barro era estendido, com auxílio de um rolo de madeira, entre duas réguas de madeira, controlando-se a espessura desejada através da escolha da espessura das réguas usadas.

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O segundo processo, também ele utilizado na olaria, refere-se à utilização do barro em estado líquido, nesse ponto designado por “lambugem” ou “barbotina”, molhando-se as paredes do molde de forma sucessiva, com períodos de secagem entre cada nova camada, até o barro atingir a espessura pretendida para as paredes da peça a produzir128. Independentemente do processo empregue na conformação do barro, seguia-se para algumas peças a soldagem das suas diferentes partes ou adição de elementos suplementares. A primeira ocorria em peças cuja complexidade implicasse a formação separada de algumas das suas partes na roda de oleiro.

A segunda aplicava-se a peças que necessitassem da adição de elementos suplementares, produzidos separadamente e posteriormente adicionados, de entre os quais se destacam as asas, bicos e pés das peças produzidas. No espólio da olaria permanece uma fieira manual de alavanca, consistindo basicamente num tubo ao fundo do qual podiam ser ajustados diversos discos metálicos com diferentes secções recortadas. Uma vez cheio o tubo com barro, este era empurrado baixando a alavanca, obrigando assim a que o barro passasse pela secção recortada no fundo do tubo, reproduzindo-o.

Figura 21 | Fieira de alavanca empregue na produção de asas (L. Sebastian, 2007)

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À parte o comum emprego de fieiras na produção de asas verticais de morfologia alongada e secção contínua, não podemos nunca pôr de parte a sua simples formação manual, sobretudo tratando-se de secções circulares simples, facilmente obtidas a partir de rolos de barro. Quer a colagem de peças constituídas por diferentes partes, quer a adição de qualquer um destes elementos ao recipiente já rodado ou moldado, é feita após um curto período de secagem da peça, regra geral numa mesa de trabalho à parte da roda de oleiro e apenas utilizada para o efeito. As zonas de contacto entre as duas partes seriam então raspadas e esfregadas com barro semilíquido, na condição de “barbotina”, que funcionaria como solda, pressionando-se até se obter uma conveniente adesão para suportar a secagem final. Na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» eram ainda utilizadas esponjas e um conjunto de espátulas de madeira com diferentes pontas – com a marca do utilizador – para conferir os acabamentos129. Independentemente da soldagem dessas diferentes partes ou posterior acrescento, ou não, de elementos adicionais, após a rodagem ou moldagem das peças estas seriam sujeitas a uma primeira secagem natural – meia-seca130 – conferindo-lhes apenas a dureza necessária ao seu acabamento. Este acabamento recebia a designação de “tornear”, pelo facto de ser realizado no “tornilho”, um prato rotativo sem roda inferior para impulsão com os pés, sendo a superfície da peça alisada por todo com recurso a lixa ou a esponja húmida. Seguidamente procedia-se ao enxugo total das peças, tratando-se sempre de um processo gradual e lento de secagem, decorrido no interior da olaria para evitar a exposição direta à luz solar, desta feita bastante mais prolongada que a meia-seca necessária ao torneamento das peças. Pelo facto de, para este efeito, as peças serem colocadas em tábuas sobrepostas, já José Ferreira da Silva em 1804131 designa a estrutura por «armação de ripas». A evolução da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» levou a que na década de oitenta do século XX ocorresse a substituição Figura 23 | Fase de torneamento das peças, realizado sobre tornilho (L. Sebastian, 2007).

Figura 22 | Registo gráfico de espátulas de madeira. Pormenor da marca do utilizador - coleção particular (L. Sebastian & F. Formigo, 2015).

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do forno de enchacotagem original por um pequeno forno elétrico, o que terá conduzido a uma redução substancial do número de peças por “fornada”, levando a que o enxugo das peças por enchacotar se fizesse praticamente todo sobre uma só mesa. Este processo de secagem ou enxugo tem por fim a eliminação da água adicionada, sendo o seu processamento obrigatoriamente gradual de forma a evitar que as peças se deformem ou fendam, implicando mesmo por vezes um

Figura 24 | “Armação de ripas” empregue na fase de enxugo das peças (L. Sebastian, 2007). Figura 25 | Peças na fase de enxugo sobre mesa (L. Sebastian, 2007).

humedecimento superficial de modo a abrandar o enxugo em caso de elevadas temperaturas ambientais. Uma vez secas, as peças sofrem invariavelmente uma primeira contração – a que se soma uma segunda e maior na fase da cozedura de enchacotagem – diminuindo aqui o seu volume geral pela perca de grande parte da água adicionada. Estes momentos de contração terão já que ser tidos em conta na fase de modelação, fazendo-se pela experiência do oleiro, e de acordo com

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Analisando os fornos da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» e comparando o utilizado na cozedura de enchacotagem com o da segunda cozedura, ou seja, de vidragem, verifica-se que estes são dimensionalmente opostos, sendo o de vidragem largamente maior. A razão desta distinção dimensional entre fornos de enchacotagem e de vidragem poderá ter sido essencialmente a da redução de custos de produção, isto se considerarmos que o enfornamento da louça na cozedura de enchacotagem dispensava por princípio o emprego de separadores ou sistemas de encaixotamento, que essenciais na cozedura de vidragem, aumentavam para o dobro o volume a enfornar. Assim, o emprego de um forno de menores dimensões para as cozeduras de enchacotagem evitaria desperdícios no consumo da lenha, segundo o princípio incontestado de que apenas se procede a uma fornada com a câmara de cozedura completamente cheia. Por outro lado, a utilização permanente do mesmo forno para ambas as cozeduras poderia levar a uma completa descompensação entre o fluxo de peças enchacotadas e as fases de esmaltagem, pintura e cozedura de vidragem. Começando por analisar o forno de enchacotagem, verificamos estar na presença de um forno de cozedura oxidante de planta retangular, de duas câmaras, também designado “de grelha”, “de tiro vertical”, ou “tiragem direta”136. A câmara de combustão – “fornalha” ou “caldeira” – mede 90 por 146 cm com 100 cm de altura. A separação desta em relação à câmara de cozedura é feita por uma grelha – ou “lar” – perfurada por “ulhais” – “olhais”, “crivos” ou “agulheiros” – quadrangulares com cerca de 10 cm e suportada por dois arcos abatidos. Sobre esta, a câmara de cozedura, com igual largura da câmara de combustão, apresenta 174 cm de altura. Ao contrário dos restantes dois fornos de vidragem, de maiores dimensões, as bocas de carga e descarga da câmara de combustão e a porta de carga da câmara de cozedura são transversais, ou seja, situam-se no alçado com maior extensão. A cobertura

possíveis variações nas argilas empregues, uma compensação na volumetria das peças, ligeiramente maiores que o pretendido no final132. A duração do enxugo variaria de acordo com o tamanho da peça, as flutuações de temperatura e humidade do ambiente envolvente, bem como a circulação de ar, podendo a soma de todos estes fatores determinar um período de secagem de dias ou semanas.

2.2.2. Cozedura de enchacotagem

Após a modelação e secagem, as peças de faiança seriam sujeitas a uma primeira cozedura, denominada de “enchacotagem”, designando-se as peças assim cozidas por “chacota”, podendo-se nomear igualmente a cozedura por “biscoitagem” e o seu produto por “biscoito”133. Esta primeira cozedura de enchacotagem terá sido em geral incontornável na produção de cerâmica com cobertura estanífera em território nacional, ainda que se possam encontrar excecionalmente fabricos em que apenas fosse aplicada uma cozedura, como poderá ter sido o caso das produções coimbrãs oitocentistas de faiança ratinha134. Analisando a necessidade de uma primeira cozedura, encontramos a sua razão de ser no facto de o barro cru, apenas seco, resistir mais à absorção do esmalte e tintas dissolvidos em água. Pelo contrário, cozido em chacota, o barro ganha uma elevada porosidade, acelerando imenso o processo de absorção da água contida no esmalte e tintas em suspensão e fixando de imediato as suas partículas à pasta135. Igualmente prático é o facto de a cozedura de enchacotagem conferir ao barro a resistência mecânica necessária ao seu livre manuseamento e imersão na calda do esmalte, sem perca ou deformação da modelação anteriormente conseguida na roda ou em molde.

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Figura 26 | Registo gráfico da planta inferior dos fornos de enchacotagem e vidragem (L. Sebastian & H. Pereira, 2007).

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Figura 27 | Registo gráfico da planta superior dos fornos de enchacotagem e vidragem (L. Sebastian & H. Pereira, 2007).

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da câmara de cozedura é plana, sendo toda a construção conseguida com tijolos maciços e pedra rudemente afeiçoada. Esta pedra foi no entanto apenas esporadicamente empregue na construção das faces exteriores das paredes, que possuem cerca de 60 cm de espessura em ambas as câmaras. Como acesso ao interior da câmara de cozedura, para enfornamento e desenfornamento das peças, conta com um vão com a altura máxima de 170 cm por 50 cm de largura. Superiormente, nos seus últimos 30 cm, a sua largura atinge os 70 cm, terminando em arco de volta perfeita. Esta configuração prende-se com o facto de, após se enfornarem as peças no interior da câmara de cozedura, este vão ser emparedado com recurso a tijolos e barro, permanecendo aberto apenas este alargamento superior, única saída dos gases durante a cozedura. Feita deste modo a evacuação dos gases do interior da câmara de cozedura, a sua eliminação do interior da olaria fazia-se através de uma chaminé exterior ao próprio forno, dita “chaminé lateral”, que no caso concreto observado era partilhada pelo “forno de enchacotagem” e pelo “forno pequeno de vidragem”. Apenas o terceiro forno, dito “forno grande de vidragem”, possuía uma destas chaminés em exclusivo, pelo que fica a ideia de que no geral, nas olarias de Coimbra, perante a solução de dois fornos a tendência prática teria sido a da sua construção próxima, de forma a partilharem a mesma chaminé lateral. A localização superior do acesso à câmara de cozedura, colocando-o ao nível do segundo piso do edifício da olaria, obrigava a que, a partir deste segundo piso, fossem colocadas pranchas de madeira que permitissem o acesso para enfornamento e desenfornamento das peças, devendo estas pranchas serem retiradas durante a cozedura. A par deste vão de acesso ao interior da câmara de cozedura, a câmara de combustão conta ainda com dois vãos. O primeiro, superior, consiste num meio círculo de 28 cm de altura por 53 cm de largura, basicamente um pequeno

arco de volta perfeita através do qual seria introduzida a lenha, cortada em pequenos cavacos ou tocos. Inferiormente localizado em relação ao vão anterior, o segundo vão consiste numa abertura retangular de apenas 39 cm de altura por 14 cm de largura, sendo que a disposição destes dois vãos tem uma correspondência exata com o registo gráfico da figura 7 apresentada por Charles Lepierre na sua obra de 1899. A base do segundo vão faz-se em rampa descendente para o exterior, diminuindo a altura deste para uns reduzidos 24 cm no interior da câmara de combustão propriamente dita, adaptando-se esta configuração à sua função de permitir a remoção das cinzas. Contudo, João da Bernarda137 refere-nos que a esta função juntava-se ainda a de fornecer mais ou menos oxigénio ao interior da câmara de combustão, cuidando sobretudo de evitar a criação de uma atmosfera redutora no interior da câmara de cozedura, provocada pela excessiva acumulação de fumo. Isto poder-se-ia fazer desimpedindo completamente esta abertura. Caso se desejasse desacelerar o fogo e o consumo de combustível, dever-se-ia então proceder à sua parcial obstrução. Na análise aos três fornos da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», observa-se um gradual desnível do piso em cerca de 50 cm das bocas de carga das câmaras de combustão até à área de modelação do barro. Charles Lepierre138 informa que a câmara de combustão seria «sempre abaixo do solo, por isso é que o crivo destes fornos está em geral ao nível do piso ou quando muito 1 metro acima». Em relação à cota de circulação exterior da olaria, o notório aterro que o Terreiro da Erva sofreu, obrigando mesmo à elevação da porta de entrada para a olaria, obriga a algumas reservas, não se podendo afirmar que à data de construção dos fornos as câmaras de combustão não se encontrassem acima do nível de circulação exterior. Fica, no entanto, a ideia de estarmos

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perante câmaras de combustão já originalmente semienterradas, mas nunca completamente abaixo dos níveis de circulação contíguos, uma vez que ainda hoje não se encontram nessa situação. Este enterramento, ou semienterramento, é uma redundância técnica na construção de fornos cerâmicos139. Já Vannoccio Biringuccio, na sua obra de 1540 De la pirotechnia li diece libri della pirotechnia140, e Cipriano Piccolpasso141, na sua obra de 1557-1559, o referem, ainda que nas suas ilustrações não o reproduzam. Analisando as técnicas construtivas destes fornos, independentemente da pontual aplicação de elementos pétreos, sobretudo ao nível das fundações e, se acaso na elevação das suas paredes, apenas nas suas faces exteriores, o seu principal elemento constituinte é o barro, quer estruturalmente na forma de tijolo maciço, muitas vezes designado de tijolo burro, quer na formação de rebocos, sobretudo interiores. A este nível impõe-se a importância dos materiais empregues apresentarem a necessária resistência a altas temperaturas, sobretudo os em contacto mais direto com o fogo. Fazendo-se a construção destes fornos eminentemente com recurso a barros vermelhos, os hidróxidos de ferro aí presentes agem igualmente só por si como fundentes, reduzindo prejudicialmente a temperatura a que os tijolos ou rebocos daí obtidos entram em fase de vitrificação e, consequentemente, de deformação, comprometendo a integridade estrutural do forno142. Admite-se que para a elevação da refratariedade e isolamento dos materiais empregues na construção dos fornos, além de algum cuidado na escolha dos barros, se tenha recorrido à introdução nestes de diferentes matérias. Conhecendo-se as propriedades refratárias das areias siliciosas, por isso também designáveis por areias refratárias, e sendo a sua introdução no

barro com esse fim já então amplamente reconhecida e aplicada, não só na produção de louça doméstica de ir ao fogo, mas igualmente em cadinhos e estruturas contentoras de fogo, estas terão certamente sido adicionadas aos barros empregues, se possível já selecionados de acordo com a sua maior ou menor presença no seu estado natural de recolha. Além de aumentar a refratividade do barro, a areia iria ainda contribuir para aumentar a sua estabilidade, evitando maiores variações ao nível das retrações e distensões sofridas durante as cozeduras a altas temperaturas143. Para além das areias, admite-se ainda que se tenha recorrido à introdução de materiais que elevassem a porosidade do barro, sobretudo no que aos tijolos diz respeito. Esta porosidade iria aumentar o carácter isolante do tijolo, diminuindo a dissipação térmica para o exterior, contribuindo assim para a elevação da temperatura interior. Contudo, esta porosidade não poderia nunca ultrapassar os 60-70%, sob risco de diminuir a resistência mecânica do tijolo em demasia144. Voltando à questão do isolamento térmico, deste depende em muito a eficácia de qualquer forno cerâmico, na determinação da temperatura máxima atingível bem como no consumo de combustível. A dissipação térmica para o exterior, ao reduzir a temperatura interior da câmara de cozedura, obriga por outro lado a uma maior adição de combustível, de forma a compensar elevando, ou apenas mantendo, a temperatura necessária. Para isto se aumenta a espessura das paredes do forno, devendo o seu aumento ser tanto maior quanto as temperaturas a atingir, e não tanto quanto a sua capacidade. A um aumento de volume da câmara de cozedura deverá então corresponder igual aumento da câmara de combustão, no entanto, mantendo-se as temperaturas praticadas, é desnecessário o espessamento das suas paredes. De notar que este princípio apenas se aplica em cozeduras prolongadas, como é o caso aqui considerado, uma vez que a maiores espessuras de parede também correspondem maiores

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índices de absorção de calor, sobretudo inicial, implicando logo à partida uma considerável injeção de calor145. A aplicação de um reboco interior nas câmaras de combustão e cozedura contribui igualmente para um maior isolamento, podendo ser feito com o mesmo barro empregue nos tijolos ou, de forma vantajosa, selecionando o mais refratário dos barros disponíveis. Este reboco serviria igualmente como capa protetora para os tijolos usados na construção das paredes. A constante dilatação e contração do reboco levaria, mesmo que a longo prazo, à sua fratura e destacamento das paredes. Contudo, este reboco era passível de ser constantemente reforçado ou substituído. Este sacrifício do barro do reboco teria a destacada vantagem de poupar os tijolos à sua máxima exposição, retardando assim a sua tão indesejada desintegração. Abordadas as questões da refratividade e isolamento na construção do forno, importa considerar a importância da configuração do forno na elevação e manutenção da temperatura. Repartindo-se o processo de aquecimento da câmara de cozedura igualmente pela condutividade e radiação dos materiais, o fator mais importante não deixa de ser a circulação do calor por transferência térmica, ou condução, sobretudo ditada pela sua morfologia, levando ao que se designa por uma boa tiragem. Nos fornos retangulares ou quadrangulares, as suas esquinas retas representariam um foco de resistência à rápida circulação do calor, diminuindo a velocidade e, logo, a tiragem, o que ainda assim é minorado por se tratarem aqui, regra geral, de fornos de grande volumetria, uma vez este contra efeito se fazer sentir ainda mais em pequenos fornos. Em termos da relação entre a largura e a altura da câmara de cozedura, o facto de se tratar de fornos de tiragem ascendente, logo de mais fácil tiragem, permite elevar com eficácia a sua altura interior para valores acima dos 50% relativamente à sua largura, com natural melhoramento da

relação entre o consumo de combustível e a quantidade de cerâmica cozida por fornada, ainda que uma relação de iguais dimensões contribuísse para uma melhor uniformização na transferência do calor. Daqui se verificarem amiúde consideráveis diferenças entre o aspeto final de peças produzidas numa mesma fornada, para além das resultantes de diferentes fornadas, dado o forte carácter ainda assim aleatório de muitos dos aspetos envolvidos no manejo destes fornos. Fica-nos pois apenas por analisar a relação da entrada e saída de ar do forno, na determinação da tiragem destes fornos. A entrada de ar para a câmara de combustão fazia-se pela boca de carga da lenha. Sob esta localizava-se ainda a pequena abertura por onde a cinza era posteriormente extraída. Contudo, parece-nos que esta, durante a cozedura, rapidamente deveria ficar obstruída, não contribuindo assim para um aumento significativo de entrada de ar. Superiormente, no vão de acesso ao interior da câmara de cozedura, a interrupção do seu emparedamento junto ao arco em que terminava constituía o único escape dos gases. A relação ideal apontada para fornos de lenha, em que a entrada de ar deve ser duas vezes superior à de saída, não é aí de todo aplicada, havendo antes uma relação de igualdade, o que resultaria numa geral diminuição de tiragem. Estando contudo garantidas as temperaturas máximas necessárias, inequivocamente provadas pelo seu contínuo uso, e novamente tratando-se de cozeduras prolongadas, esta diminuição de tiragem resultaria ainda assim numa consequente economia de combustível, dada a direta relação entre maiores tiragens e maiores consumos146. Ainda que, como já referido, o processo de aquecimento da câmara de cozedura se fizesse sobretudo pela circulação do calor por transferência térmica, a condutividade e a radiação dos materiais são sempre de considerar. Ao nível da última é importante salientar o papel que o completo carregamento da câmara de cozedura desempenha, funcionando as peças ou contentores de

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enfornamento como refletores147. Tendo-se abordado a importância do isolamento e da morfologia dos fornos para a obtenção de mais altas temperaturas, impõe-se agora observar a questão do combustível empregue. Na olaria era utilizado o pinho como combustível, cortado em curtos tocos rachados a meio, na vertical, tal como já referido em 1804 por José Ferreira da Silva148. No uso desta lenha de origem arbórea existia o cuidado de a utilizar no seu estado verde, e não seca, melhorando a sua rápida queima. Funcionando a resina como acelerador de queima, consumia-se por isso mais rapidamente, mas atingindo mais facilmente as temperaturas máximas desejadas, apontadas entre os 2000 e os 4000 kcal/kg149. A lenha seria adquirida a lenhadores dos arrabaldes da cidade, que fariam o transporte até à olaria, dispensando um espaço próprio e vasto para grandes armazenamentos de lenha. Sabe-se que em 1915 ainda existia na olaria um espaço destinado ao armazenamento da lenha, com um corredor de acesso ao exterior através do qual se alimentaria esse “depósito de lenha”150. Posteriormente, sem se saber precisar quando, essa área dará lugar a uma sala destinada ao escritório da firma, levando a que a lenha passasse a ser empilhada junto ao forno por cada vez que uma fornada fosse realizada. O cálculo de consumos de combustível e a frequência de cozeduras é, naturalmente, quase impossível de se conseguir, dada a escassez de dados e o grande número de variantes. Contudo, testemunhos de meados do século XX indicam que a média das fornadas variava entre uma semana e um mês. Usando sobretudo a cozedura de vidragem como referência, para Coimbra, Charles Lepierre151 dá-nos ainda em 1899 para uma cozedura de vidragem, que pode durar «cerca de vinte e duas horas», o consumo de «3500 a 3600 kilogramas de madeira de pinho bravo, cujo preço importa na quantia de 12$000 a 13$000 réis». Fortunato Augusto Freire Themudo152 repete em 1905 esta informação, com «pode durar de 20 a 22 horas», para um consumo

de lenha que «deve regular por 3:500 a 3:600 kilogramas, cujo preço anda por 12$000 réis a 13$000 réis», enquanto que para um forno de cerâmica de construção, «mais pequeno mas em tudo igual aos das olarias de louça», refere o consumo por fornada de cinco carradas de lenha, custando cada carrada 2$000 réis, logo num total de 10$000153. É curioso ainda apontar que, numa vereação da Câmara de Coimbra datada de 17 de Maio de 1608154, impõe-se que os «fornos pequenos» sejam substituídos por fornos que levem mais do que «simquoeta feixes de lenha»239, sendo no entanto difícil determinar a quanto corresponderia tal quantidade de lenha. Como já acima referido, o controlo da distribuição do calor no interior da câmara de cozedura, feita através da criteriosa colocação da lenha na câmara de combustão, deveria contribuir igualmente para um maior consumo de lenha. Na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» os cavacos de pinho, rachados a meio e cortados em dois tamanhos diferentes, seriam colocados na vertical, propiciando ainda mais a sua rápida queima com menos fumo. De forma a evitar quebras de temperatura, estes cavacos seriam retirados ainda antes da sua total queima e substituídos por novos, o que resultaria invariavelmente num ainda maior consumo. Concentrando-nos sobre os utensílios empregues na manipulação destes fornos, temos já na obra de 1557-1559 de Cipriano Piccolpasso a referência àquilo a que veremos referido na olaria como “forcados”, consistindo aí em longos ferros com terminações de diversas formas consoante o seu propósito, fixos a curtos cabos de madeira, permitindo nesse extremo a apreensão direta com a mão, enquanto para a outra mão seria necessária a apreensão indireta com recurso a um pano ou couro. Um desses forcados é empregue durante a cozedura de enchacotagem para retirar temporariamente do interior da câmara, através da abertura no emparedamento deixada para a saída dos gases, algumas peças para observação,

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verificando-se assim a correta cozedura de todo o conjunto por amostragem. Para este fim, o “forcado das amostras” assumia a forma de um estreito garfo de dois dentes, para apreensão das peças de amostra através do seu bordo. Se na cozedura de vidragem eram colocadas amostras especialmente preparadas para o efeito, na cozedura de enchacotagem este forcado serviria apenas para remover temporariamente para observação algumas das próprias peças que se encontravam a enchacotar. Na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» encontramos ainda mais três exemplares de forcados distintos: um primeiro, em forma de forquilha de dois largos dentes, aplicada no manuseamento da lenha; um segundo, com maior número de exemplares, que apresenta na sua extremidade um par de grampos, distando entre si cerca de 40 cm, destinados a apreender os cavacos de pinho para serem introduzidos na câmara de combustão, distribuídos de forma organizada e colocados na vertical para maximização da sua queima; e um terceiro, que consiste apenas numa extremidade em forma de L, de forma a auxiliar a colocação da lenha.O enfornamento da louça a enchacotar na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» variaria sobretudo de acordo com duas práticas. A primeira passaria pelo empilhamento das peças em colunas, no que já Fortunato Augusto Freire Themudo em 1905155 designava por “carrulhos”. Este empilhamento deverá certamente ter sido bastante corrente, pela sua simplicidade e economia de espaço, permitindo o maior volume possível de peças por fornada.Figura 28 | Registo gráfico dos quatro tipos de forcados empregues na manipulação dos fornos (L. Sebastian & H. Pereira, 2007).

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Figura 29 | Representação gráfica esquemática do modo de enfornamento em caixas da louça para cozedura de enchacotagem (L. Sebastian, 2007).

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A segunda prática passaria pela cozedura de enchacotagem utilizando as mesmas caixas da cozedura de vidragem, mas sem as “trempes” empregues na separação individual das peças. A colocação das peças dentro de um contentor de proteção pouco beneficiaria a qualidade da enchacotagem ou se traduziria numa melhoria da qualidade do produto final. No entanto, colocadas as peças em caixas, sem separação e empilhadas, tinha o benefício de permitir maiores alturas e sempre com equilíbrio garantido, ao qual se junta a vantagem de contribuir para um mais gradual arrefecimento das peças e consequente diminuição de quebras por choque térmico durante o período de arrefecimento. Independentemente da solução empregue na colocação da louça para enchacotar no interior da câmara de cozedura, o seu posicionamento teria sempre que ser feito de modo a evitar bloquear os “agulheiros” da grelha, permitindo assim que o calor subisse livremente da câmara de combustão e circulasse abertamente entre as peças na câmara de cozedura. Novamente, na lógica já abordada do processo de aquecimento da câmara de cozedura se fazer pela circulação do calor – transferência térmica –, condutividade e radiação dos materiais, o completo carregamento do forno é essencial, para lá da rentabilização do combustível. Charles Lepierre156 refere mesmo que nos fornos de Coimbra, tendo por norma as ombreiras da porta da câmara de cozedura 100 cm de espessura e o seu emparedamento apenas 10 cm, a louça enfornada em caixas chegava a ocupar este espaço de 90 cm. Fortunato Augusto Freire Themudo157 reitera esta informação, acrescentando no entanto que nem sempre isso acontecia, fazendo-se antes o emparedamento da porta da câmara de cozedura pelo seu limite interior. Na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» registamos que no forno de enchacotagem este emparedamento era no entanto de cerca de 20 cm, ocupando quase toda a ombreira dado as paredes serem mais

estreitas que as dos fornos de vidragem, limitando por isso aí o enfornamento das caixas ao interior da câmara de cozedura. A quantidade de peças enchacotadas por fornada variaria, logicamente, de acordo com a dimensão do forno empregue e o tipo de enfornamento. Charles Lepierre158 refere que nas olarias de Coimbra as cozeduras de vidragem incluiriam entre 1.000 a 1.200 dúzias de peças, resultando num duvidável volume de 12.000 a 14.400 peças. Presumindo-se a enchacotagem em caixas sem separação, a estes números deveriam então corresponder cifras superiores por cozedura de enchacotagem, no entanto, sendo os fornos para a primeira cozedura por regra de menor dimensão, é impossível estabelecer esta relação. Tentando virtualmente encaixar o maior número possível de peças sem separadores dentro das caixas registadas na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», obtemos uma média de cerca de 100 peças por caixa. Colocando essas caixas na câmara de cozedura do forno de enchacotagem desenhado, apenas conseguimos 12 caixas por fornada, evitando obstruir os “agulheiros” da grelha. Deste exercício obtemos um total de apenas cerca de 1.200 peças por fornada, bem longe das cifras indicadas por Charles Lepierre. Os testemunhos orais recolhidos na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» referem que sendo usadas caixas de enfornamento, estas apenas seriam cheias com as peças já no interior da câmara de cozedura, uma vez que o transporte das caixas já carregadas seria quase impossível pelo seu elevado peso, aumentando ainda o risco de perda devido a possíveis quedas. Outro aspeto registado na memória da olaria, e já apontado por Cipriano Piccolpasso159, é a cobertura de todas as colunas de caixas com fragmentos de peças em chacota. Estes fragmentos de chacota seriam reaproveitados para este fim a partir das muitas quebras ocorridas durante as cozeduras. Dada a imprevisibilidade dos fornos empregues e correntes defeitos na preparação do barro, a quantidade de louça que quebrava durante a cozedura de enchacotagem

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deveria ser sempre considerável, à qual se somavam as peças que tinham sofrido deformação por excesso de calor ou quebrado devido a esfriamento demasiado brusco já após a cozedura. Para a realidade coimbrã foi possível observar, na intervenção arqueológica de emergência realizada em 2003 no edifício Garagem Avenida, na Avenida Fernão Magalhães, os lixos de produção com uma quantidade de chacota abandonada marcante. Sendo os desperdícios de chacota abundantes nas olarias160, constituindo inclusive o seu despejo uma constante fonte de conflito com o poder camarário e meio urbano envolvente, não é surpresa voltarmos a encontrar na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» a mesma prática centenária de cobrir as caixas com fragmentos de chacota, designando-se aí a chacota fragmentada por chacota “abentada”. Previsivelmente, já João da Bernarda161 refere igualmente o seu uso, designando a chacota assim empregue como “cacos abafadores”, acrescentando que eram colocados inclusive entre as pilhas de caixas, o que no entanto não verificamos na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», onde apenas se cobriam diretamente as caixas, para além de ir contra o princípio da necessidade de livre circulação do fogo entre a câmara de combustão e a câmara de cozedura. A razão desta camada final de fragmentos de chacota é já indicada pela expressão que João Bernarda emprega – “cacos abafadores” –, servindo para abafar o calor da cozedura, o que tendo algum impacto no retardar da passagem do calor durante, desempenha um importante papel após, na fase de arrefecimento, retendo o calor e contribuindo para uma mais lenta e gradual baixa de temperatura, essencial para evitar a fragmentação das peças. Na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» foi ainda possível registar que durante o arrefecimento do forno era comum a “louça abentada” quebrar, provando mais uma vez a eficácia desta solução, uma vez que sem ela as quebras registadas teriam, muito provavelmente, acontecido entre as peças

superiormente colocadas, as primeiras a esfriar. Fica apenas por perceber como se articularia na olaria esta cobertura das caixas por chacota “abentada” com a pontual necessidade, anteriormente indicada, de, com o “forcado das amostras”, se retirar ciclicamente para observação algumas peças, avaliando-se a correta cozedura de todo o conjunto. A colocação de peças a enchacotar distribuídas sobre todo o conjunto, facilmente acessíveis e que servissem de amostras, poderia ter sido uma solução, ainda que não conservada na memória local. Por outro lado, e ao contrário da cozedura de vidragem, esta chacota poderia na cozedura de enchacotagem cobrir a louça entrando mesmo em contacto direto, podendo por isso não só reaproveitar os detritos de chacota de menor volumetria, mas igualmente dispensar alguns dos cuidados extremos tidos ao nível do contacto durante a cozedura de vidragem. Especificamente em relação à operação de cozedura de enchacotagem, a informação documental e bibliográfica disponível é no geral lacónica, debruçando-se sobretudo sobre a cozedura de vidragem. No entanto, é possível retirar algumas ilações a partir das descrições de 1540 de Vannoccio Biringuccio162, de 1557-1559 de Cipriano Piccolpasso163, de 1804 de José Ferreira da Silva164, e ainda que referente a cerâmica comum, de 1805 de António Veloso Xavier165. Tanto Vannoccio Biringuccio como Cipriano Piccolpasso referem-se à necessidade de a cozedura começar por um primeiro moderado e gradual aquecimento, indicando-se aí quatro horas para a sua duração. José Ferreira da Silva reitera esta indicação, no que designa por «temperar» a louça, antes do «grande fogo», acrescentando que o combustível deve nesta fase ser apenas colocado na entrada da câmara de cozedura, tal como António Veloso Xavier, no que este parece denominar de «fogaõ do forno», correspondente nos fornos aí descritos à cova em frente à boca de carga da câmara de combustão.

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Figura 30 | Registo gráfico do forno de enchacotagem – em corte – e do forno de vidragem – em alçado (L. Sebastian & H. Pereira, 2007).

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de enchacotagem seria igual à de vidragem, correspondente a quatro dias. No entanto, na primeira, logo após os primeiros dois dias de arrefecimento, o emparedamento da câmara de cozedura era desmontado até metade, acelerando assim o processo, ainda que apenas no quarto dia se recuperasse a louça. A recuperação da louça enchacotada de dentro da câmara de cozedura, mesmo após os quatro dias de arrefecimento, implicava o recurso a panos como pegas, dada a ainda considerável temperatura interior, o que levava mesmo ao uso de panos molhados sobre a cabeça de forma a suportar-se melhor o calor. O tempo total da cozedura de enchacotagem seria também o mesmo da vidragem, normalmente iniciando-se às 9 horas de um dia e terminando às 6 horas do dia seguinte, num total de 21 horas. De facto, é um período inserido no intervalo entre 20 e 22 horas indicado por Charles Lepierre167 e Fortunato Augusto Freire Themudo168.

2.2.3. Decoração e cozedura de vidragem

Após a cozedura de enchacotagem as peças em chacota passavam a receber o esmalte. Moído o esmalte no moinho, misturado com água, a calda resultante passava por uma fase de coagem. Coado o esmalte, de forma a garantir a sua homogeneidade e fineza, este seria então transvazada para o “tinão” – recipiente de madeira construído em tanoaria –, sendo que o exemplar registado na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» apresentava inclusive a data de 1908 inscrita num dos lados. Apesar de maior dimensão, vemos a mesma exata morfologia deste tinão na figura 112 da obra de 1905 de Pedro Prostes169, igualmente com provável referência à realidade coimbrã. Antes de se proceder ao mergulho das peças enchacotadas na calda do esmalte – processo a que se dá o nome de “banho” –, estas seriam por regra

Referindo-se este último a esta fase por «enfumaçaõ-se as louças», alarga no entanto a sua duração para seis a dez horas, «conforme a qualidade do barro», durante as quais o combustível é gradualmente introduzido no interior da câmara de cozedura até atingir o fundo, onde durante as últimas duas, três horas se mantém. Sem mais explicação acrescenta que «depois se tapa a entrada de todo inteiramente», o que leva a querer que esta primeira fase é realizada com a câmara de cozedura aberta. Tratando-se de uma descrição particularmente relativa a um forno de duas câmaras de cozedura, com a enchacotagem a decorrer na superior, poderemos talvez entender esta indicação como apenas referente a esta última, de modo a melhor permitir a evacuação dos vapores resultantes da evaporação da água contida nas peças modeladas e apenas secas. Estas seriam as operações iniciais antes de serem atingidas as temperaturas desejáveis à enchacotagem que, como registado na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», seriam superiores à de vidragem, tendo sido indicada a temperatura média de 1.100 °C para a cozedura de enchacotagem e 1.070 °C para a de vidragem. Sendo a prática mais comum a cozedura de vidragem ser feita a temperaturas superiores à da cozedura de enchacotagem, a razão apontada localmente para este desvio foi a de que deste modo garantir-se-ia que o barro não sofria alterações inesperadas, uma vez que tinha já antes sido exposto às mesmas temperaturas que as sofridas durante a cozedura de vidragem. Contudo, além do agravamento do consumo do combustível, esta prática tornaria a chacota menos porosa, dificultando a rápida absorção dos esmaltes e tintas, ainda que não o inviabilizasse de todo. Documentalmente, ainda que com referência a cerâmica de vidrado de chumbo, podemos apenas apontar como paralelo para esta opção a indicação de José Ferreira da Silva em 1804166 de que a temperatura de enchacotagem deveria igualmente ser superior à de vidragem. A duração do período de arrefecimento do forno após a cozedura

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espanadas, de modo a eliminar pós e sujidades derivadas da cozedura de enchacotagem ou posteriormente depositados na fase de armazenamento entre a enchacotagem e a esmaltagem, altamente nocivos ao esmalte durante a sua vitrificação170. Na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» esta operação era realizada com uma esponja, contudo, esta prática recente poderá ter surgido em substituição de utensílios como cauda de raposa, boi ou cavalo, já descritos por Cipriano Piccolpasso em 1557-1559171. Na preparação do “banho”, a calda do esmalte é mexida após cada paragem e antes de qualquer aplicação. Havendo na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» apenas memória da aquisição ao exterior do esmalte já preparado, a sua mistura com a água ficava a cargo do funcionário responsável pelo “banho” das peças enchacotadas, uma tarefa de elevada responsabilidade, podendo-se nesta fase deitar a perder toda uma fornada. A principal preocupação era acertar com a espessura certa do esmalte, evitando o seu excesso, o que contribuiria para o “reboar” do esmalte e da decoração durante a cozedura de vidragem, mas igualmente a sua insuficiência, cuja consequência extrema seria a falha na total cobertura das superfícies a esmaltar. O evitar esmaltes demasiado espessos prende-se igualmente com a sempre presente preocupação de redução de custos, aplicando-se o esmalte apenas necessário. Assim, o controlo desta espessura do esmalte, como já António Veloso Xavier refere, seria sobretudo feito riscando com a unha o esmalte aplicado sobre a primeira peça. Após cada paragem na operação de banho, sobretudo se longa e durante o tempo quente, este acerto da espessura do esmalte teria que ser sempre verificado antes de novo banho. A evaporação de parte da água, tornando o esmalte demasiado espesso, seria facilmente solucionada com a adição de mais água. O estado demasiado líquido do esmalte implicaria por sua vez deixar evaporar a água de um dia para o outro, ou de forma a acelerar este processo,

Figura 31 | Remeximento do banho de esmalte antes da imersão das peças e limpeza da superfície das peças enchacotadas antes do banho de esmalte (L. Sebastian, 2007).

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deixando o esmalte assentar no fundo do “tinão” para posteriormente se retirar o excesso de água com um qualquer recipiente. Este processo, se bem que mais rápido, implicava sempre a perca de algum esmalte ainda em suspensão. A espessura do esmalte prender-se-ia ainda com o tipo de peça a esmaltar. As peças de paredes mais grossas absorveriam sempre mais água, aguando-se por isso mais o banho, procedendo-se de modo inverso para as peças de paredes mais finas. O “banho” de esmaltagem das peças em chacota era feito por imersão172,

apreendendo-se a peça com a ponta dos dedos das duas mãos. Nas formas fechadas, esta apreensão podia ser feita apenas com a ponta dos dedos de uma mão, tal como apontado por Cipriano Piccolpasso173. Quase invariavelmente, os pontos de apreensão da peça resultariam em falhas na cobertura do esmalte, pelo que muito comummente ter-se-ia posteriormente que cobrir estas com esmalte aplicado a pincel. O “banho” acabava invariavelmente na ação de deixar escorrer bem o excesso de esmalte da peça. Cipriano Piccolpasso174 diz-nos que após o “banho”

Figura 32 | Aplicação do banho de esmalte a uma peça enchacotada (L. Sebastian, 2007).

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as peças seriam deixadas a secar. Na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», esse tempo de secagem era de um dia, ainda que a porosidade das peças e a sua consequente elevada absorção da água atribuísse um aspeto perfeitamente seco às peças apenas segundos após o seu banho. De facto, este elevado tempo de secagem poderia não ser estritamente respeitado, e muito provavelmente não o seria em momentos de laboração mais intensa. Questão sempre colocada na fase de esmaltagem, com sérias implicações na fase da cozedura de vidragem, é a esmaltagem, ou não, do fundo das peças, mais correntemente do frete ou pé anelar. Pedro Prostes em 1907175 refere já que «a operária (…) tem por missão tirar com pincéis o vernis do fundo do objecto afim deste não aderir ao suporte sobre que assenta quando vai ao forno», secundado por Maria Helena Pires César Canotilho176 que defende que “como as peças têm de ser colocadas sobre as placas ou suportes, necessitam de ser limpas antes de colocadas no forno. Com a ajuda de uma esponja molhada limpa-se a base da peça do excesso de vidro”. Na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» repetia-se a mesma prática, quer para evitar acidentes de colagem do esmalte durante a cozedura de vidragem, quer por se acreditar que tal contribui para melhorar a aderência das peças à mesa, no momento da sua utilização. A pintura, em termos da sua aplicação, é realizada sobre o esmalte em cru, tendo a peça passado pela sua modelação, cozedura de enchacotagem e “banho” no esmalte, integrando-se apenas no esmalte durante a fase de cozedura de vidragem. A fixação das cores passa pela sua ligação tanto ao vidrado como à pasta, evitando o seu destacamento, devendo para isso os corantes empregues terem o mesmo ponto de fusão do vidrado de suporte, penetrando-o durante a cozedura de vidragem e combinando-se177. Por regra verifica-se uma grande disparidade entre a cor das tintas no momento da sua aplicação e a sua cor após vitrificação, pelo que só a

experiência prévia permite a correta escolha das cores e tons a aplicar. A isto há ainda que somar a variação da cor consoante a temperatura atingida, o tempo de exposição às diferentes temperaturas pelas quais passa a cozedura de vidragem e o seu grau de oxigenação178. A pintura das peças era realizada colocando a peça sobre o tornilho, ou “torninho de pintor” como apontado por Fortunato Augusto Freire Themudo179 para as olarias de Coimbra em geral. Trata-se de uma roda à semelhança da de oleiro, empregue na modelação do barro, contudo, não se destinando a uma rotação constante, é movida manualmente, facilitando o manuseamento da peça sem lhe tocar diretamente com as mãos, evitando assim ferir a cobertura de esmalte, particularmente sensível no seu estado cru. Assim, em relação à roda de oleiro, possui uma estrutura mais simples, desprovida da roda inferior para impulsão com os pés, do banco e da mesa de apoio, consistindo apenas na cabeça, no eixo e na base. Uma vez que o pintor se posiciona sentado à frente do tornilho, este é relativamente baixo, com apenas cerca de 1 m de altura. Apesar da estrutura do tornilho não incluir uma mesa de apoio, na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» os diversos pintores trabalhavam em torno de uma ampla mesa corrida, de altura próxima à dos tornilhos, contando ainda cada pintor com uma pequena mesa lateral. Apesar de terem sido utilizados na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», numa fase mais recente da laboração, tornilhos completamente metálicos, registamos no local, já inativo, um tornilho de madeira, apenas com eixo em ferro, com 1,2 m de altura. No caso deste exemplar em concreto, apresenta o interessante facto de a sua cabeça de madeira apresentar gravados quatro círculos concêntricos e oito eixos radiais. Os círculos concêntricos são também presença obrigatória nos tornilhos metálicos, orientando a colocação centrada das peças, particularmente importante na “filetagem”, ou seja, na aplicação à peça de filetes coloridos, normalmente ao longo das linhas principais

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do perfil, como o bordo, inflexão da caldeira no caso dos pratos, ou contornando o fundo. Este filetar seria por regra feito com o pincel fixo e a peça em suave rotação manual sobre o tornilho. Este facto leva mesmo Pedro Prostes180 a designar o tornilho por “tornilho de filetar”, sendo na figura que apresenta um tornilho já completamente metálico, fixo a uma mesa de trabalho e extensível, o que não deixamos de encontrar na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», mas aplicado aos trabalhos de moldação e torneamento do barro. Quanto aos oito eixos radiais, dispostos em cada 45º, serviriam como linhas orientadoras na igual distribuição dos elementos decorativos, sobretudo útil aquando da aplicação de pintura totalmente livre. Antes de se proceder à pintura havia que sacudir possíveis pós depositados sobre o esmalte durante a sua secagem e, muito frequentemente, partículas soltas do mesmo esmalte, garantindo uma superfície limpa e uniforme para aplicação da pintura181. Na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» esta operação era realizada com um rabo de coelho, garantindo assim uma pincelagem extremamente macia do esmalte, evitando feri-lo, soprando-se seguidamente com cuidado toda a peça. A pintura dos diversos motivos decorativos era realizada com apoio de linhas orientadoras a carvão, e não de forma completamente livre. Para isso recorrer-se-ia ao sistema de transferência através de papel picotado. Este consiste no desenho do motivo pretendido numa folha de papel fino. Seguidamente todo o desenho é picado, tendo-se o cuidado de furar o papel completamente. Colocando o papel perfurado sobre a área da peça sobre a qual se pretende pintar o motivo decorativo em causa, recorrendo a uma boneca de panos impregnada de carvão em pó, bate-se cuidadosamente todas as linhas picotadas do desenho. Uma vez retirado o papel, as linhas do desenho encontrar-se-ão transferidas para a superfície branca do esmalte estanífero em pequenos pontos pretos. Uma vez passado o pincel com a cor escolhida sobre os contornos do desenho, estes pontos de carvão diluir-se-ão na tinta, desaparecendo. Figura 33 | Tornilho em madeira para a pintura das peças (L. Sebastian, 2007).

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Assim, para a realização desta operação, deveriam ser presença constante na área de pintura o “picador” e a “boneca”. O “picador” consistia num cabo de madeira fino, no caso em concreto um cabo de pincel reaproveitado no extremo do qual foi fixo uma agulha, e a “boneca”, consistia numa pequena bola de tecido de algodão extremamente macio e absorvente, sendo o carvão originalmente recolhido na fornalha dos fornos e finamente moído. Os pincéis seriam por regra produzidos na própria olaria, pelo

funcionário que os devia usar. Registamos cinco tipos diferentes de pincéis, o “de contorno”, “de filar”, “de encher”, “de esbater” e “de bicos”. O “de contorno” presta-se ao delinear dos motivos decorativos, o “de filar” sobretudo aos filetes, o “de encher” ao preenchimento dos motivos com cor, e o “de esbater” sobretudo para “puxar” a tinta de preenchimento. O “puxar” consiste basicamente em aplicar uma forte pincelada ao longo de um dos limites da área a encher, após o qual, empregando-se o “pincel de esbater” embebido em água, se “puxa” a pincelada inicial de tinta de modo a preencher

Figura 34 | Limpeza da peça antes da pintura, com recurso ao rabo de coelho (L. Sebastian, 2007).

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Figura 35 | conjunto de instrumentos relacionados com a pintura: rabo de coelho, picador, papel picotado, boneca e pincéis (L. Sebastian, 2007).

toda a área pretendida. Esta técnica permite criar expressivas manchas de diferentes tonalidades – “esbatidos” –, ao invés de manchas coloridas uniformes e inexpressivas. Por fim, o “pincel de bicos” relaciona-se diretamente com a especificidade da técnica de pintura da decoração da faiança dita ratinha, que caracterizou o fabrico de tradição coimbrã no século XIX, pelo que deve não só datar-se o seu aparecimento como tardio em relação à tradição oleira portuguesa, mas igualmente levantar a forte hipótese de corresponder a uma especificidade das olarias de Coimbra e suas posteriores ramificações. Os quatro primeiros são de pelo de marta, enquanto este último é de pelo de cabrito, sendo o pincel mais grosso, juntamente com o “de esbater”. Estes dois são aliás os únicos que não são escalonados, com a metade extrema da ponta do pincel reduzida a um pequeno conjunto de pelos centrais, servindo a metade inicial, junto ao cabo, como depósito de tinta. Os pincéis que eram produzidos na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» deviam possuir quase invariavelmente cabos de canas. Dos pincéis registados apenas o “de bicos” apresenta esta morfologia completamente original. Todavia, e apesar da particularização de cada pincel, na prática o seu uso podia fugir bastante à função inicial, consoante tendências e gostos pessoais. Estas divergências foram observadas na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» como prática comum, respeitando-se mais hábitos pessoais, invariavelmente repetidos, do que as funções inicialmente atribuídas aos diversos tipos de pincéis.

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Figura 36 | Representação gráfica dos instrumentos relacionados com a pintura: rabo de coelho, picador, papel picotado, boneca e pinceis (L. Sebastian, 2007).

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Figura 38 | Aspeto final da decoração pintada a cru sobre o esmalte (L. Sebastian, 2007).

Figura 37 | Preenchimento com cor do motivo decorativo (à direita) e esbatimento com água das pinceladas de preenchimento do motivo decorativo (à esquerda) (L. Sebastian, 2007).

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As diversas formas de decoração eram conservadas através de um catálogo de decorações onde eram armazenados os papéis picotados empregues na transferência da decoração, substituídos progressivamente consoante se danificavam pelo uso. Uma vez que por regra o papel picotado apenas contém um motivo decorativo, e não a composição total, esta ficava dependente da memória e, mais que tudo, da preservação de exemplos acabados, expostos nas mesmas prateleiras onde se armazenavam as peças esmaltadas e pintadas de cru. Ao contrário do armazenamento das peças enchacotadas antes do “banho” de esmalte, feita em carrulhos, o armazenamento das peças depois da aplicação do “banho” de esmalte, durante a secagem, era já feito em prateleiras e separando as peças com trempes, de forma a evitar ferir o esmalte e a pintura no seu estado cru. Após a pintura, as peças voltavam a ser armazenadas da mesma forma, já organizadas nos grupos a introduzir no interior das caixas nas quais iriam à cozedura de vidragem. Esta forma de encaixotamento e separação das peças é a principal distinção entre a cozedura de enchacotagem da cozedura de vidragem no “forno de vidrado”, segundo a sua designação coimbrã182. Estas caixas, simplesmente assim designadas na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», podiam ainda receber a designação de “casetas”, “cazetes” ou “gazetas”, francesismo progressivamente importado a partir de século XVIII tendo por base o termo francês original “casettes”183. A sua função consistia em proteger o esmalte das impurezas da combustão durante o processo de vitrificação, impedindo que as inevitáveis cinzas finas em rápida circulação no interior da câmara de cozedura assentassem e fossem absorvidas pelo vidrado, manchando-o. O contacto direto da chama era igualmente um fator a evitar, queimando as cores e desestabilizando a correta e uniforme distribuição do calor por toda a peça184.

Para este efeito, as caixas empregues na cozedura de vidragem eram concebidas em barro cujas características refratárias lhe permitissem resistir a temperaturas superiores às de vitrificação do esmalte e tintas, garantindo não só a sua estabilidade durante toda a cozedura, mas igualmente a sua reutilização185. As caixas usadas na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» podiam chegar a ser usadas em dezenas de cozeduras, auxiliadas pela sua forma simples, retangular, e pela elevada espessura das suas paredes, de cerca de 4 cm. Para a cobertura das caixas superiormente posicionadas seria utilizada uma camada de fragmentos de chacota – “cacos abafadores” –, colocados por cima e no fim do enfornamento das caixas. Este procedimento, embora semelhante ao de cozedura de enchacotagem, no caso da cozedura de vidragem o contato direto com essa camada de chacota seria completamente lesivo para o esmalte, colando-se literalmente a qualquer fragmento de chacota que se lhe encostasse. Este facto impõe quase só por si a obrigatoriedade de selagem da última caixa com uma qualquer espécie de tampa, e embora na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» não restasse memória da colocação da camada de “louça abentada” sobre tampas, fará sentido o uso de tijoleiras, como claramente indicado por João da Bernarda186. Relativamente à morfologia das caixas, encontramos na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» caixas retangulares, com fundo. Esta opção aparenta ter tido forte enraizamento na tradição coimbrã oitocentista, sendo de uso exclusivo na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.»187. Contudo, anteriormente a oitocentos, outras morfologias de caixa terão estado em uso nas olarias de Coimbra, provado pela recolha de fragmentos de caixa circular em sondagens arqueológicas realizadas em 2004 no próprio Terreiro da Erva, imediatamente defronte da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», e na intervenção arqueológica de emergência no edifício Garagem Avenida, em 2003.

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Figura 39 | Representação gráfica esquemática do modo de enfornamento em caixas com separação por trempes da louça para cozedura de vidragem (L. Sebastian, 2007).

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Por definição, a morfologia de caixas retangulares de grandes dimensões é destinada ao encaixotamento de grandes conjuntos de peças, em que a sua separação é garantida pela colocação intercalada de trempes. As trempes consistem por sua vez em separadores em forma de estrela de três braços, concebidas em barro enchacotado com a mesma pasta das peças a produzir188. De forma a reduzir ao mínimo a zona de contacto com a superfície a vidrar, e consequentemente diminuir possíveis marcas no esmalte, as extremidades das trempes são por regra aguçadas, oferendo como zona de contacto apenas três pontas aguçadas, uma em cada braço, quer para cima quer para baixo. O imperativo aguçamento destas pontas de contacto é aliás a razão para a curta longevidade destas trempes, que normalmente após uma, duas ou raramente mais de três utilizações, acabam por se quebrar inviabilizando

a sua reutilização. A par desta razão como a mais comum para a rejeição das trempes já usadas, temos ainda a ocorrência de escorrimentos do vidrado. Se mínimos, estes poderiam ainda assim ser eliminados por raspagem, caso contrário inviabilizariam a reutilização da trempe pelo perigo que comportava a sua fusão e escorrência durante nova cozedura de vidragem. No espólio da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» registámos um molde para a produção de trempes – onde recebiam igualmente a designação de “cravilhos” –, que consistindo basicamente numa prensa de madeira com molde e contramolde em metal, permitiria a formação do barro em poucos segundos. Uma solução que será uma tendência, posteriormente ao século XVIII, dentro do universo de tradição coimbrã, e que se entende inclusivamente pela celeridade que tal opção representaria, em detrimento da moldação manual.

Figura 40 | Registo gráfico (A. Castro, 2007) e fotográfico (L. Sebastian, 2007) de molde para fabrico de trempes.

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A separação por trempes de peças de forma aberta permitiria a manutenção do esmalte na base da peça, com exceção da peça colocada sob o conjunto, que ficaria assente diretamente sobre o fundo da caixa. No caso de formas fechadas, como tigelas, o seu frete assentaria uma vez mais sobre os braços da trempe, desaconselhando a sua esmaltagem. Contudo, observamos muitas vezes não ter existido esse cuidado, colando-se o esmalte à trempe e obrigando à sua posterior descolagem, com grande probabilidade de inutilização da trempe, e ficando as marcas visíveis no produto final. Tal como acontecia na cozedura de enchacotagem, as caixas retangulares da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», com 65 cm de comprimento por 30 cm de largo e 40 cm de altura, tinham um peso excessivo quando totalmente carregadas, o que obrigava a que recebessem as peças separadas pelas trempes apenas já no interior da câmara de cozedura.

Figura 41 | Cinzeiro com marcas de trempe no fundo externo: 4x22,5 cm (F. Formigo, 2015).

Charles Lepierre189 refere que «o forno de Coimbra para o vidrado póde conter 1:000 a 1:200 duzias de pratos ou tigelas» – 12.000 a 14.400 peças. Carregando os fornos da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» virtualmente, com as caixas aí usadas e as respetivas peças separadas por trempes, obtemos uma média de 52 peças por caixa. O esquema de encaixotamento sugerido pelos agulheiros da grelha aponta por sua vez o número de 36 caixas por fornada, resultando assim no enfornamento de 1.872 peças por cada cozedura de vidragem. Já para o “forno grande de vidragem” – assim designado segundo a memória local – na sua planta aproximada, e partindo do princípio que a distribuição dos agulheiros da sua grelha fosse similar ao do “forno pequeno de vidragem” por nós totalmente registado, obtemos um enfornamento de 60 caixas, resultando num total de 3.120 peças. A comparação do valor de 1.872 peças por fornada para o forno de

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vidragem pequeno e 3.120 peças para o forno de vidragem grande, comparados com as 1.200 peças para o forno de enchacotagem, chama a atenção sobre a necessidade de se proceder a uma média de duas cozeduras de enchacotagem por cada cozedura no forno pequeno de vidragem, e três por cada cozedura no forno grande de vidragem, isto considerando sobretudo as enormes variantes introduzidas pela elevada fragmentação de peças fragmentadas na primeira cozedura. Sabendo-se que esta seria elevada, não tanto por descrições como as de Charles Lepierre190, mas sobretudo pelo volume de regulamentação camarária no sentido de controlar o seu despejo e pela nossa observação direta dos impressionantes caqueiros da zona do Bairro das Olarias, somos levados a levantar a possibilidade de essa fragmentação poder rondar uma média de 20%. Esta hipótese é confirmada pela memória local, em que se regista por vezes a necessidade de uma terceira fornada no forno de enchacotagem para se poder completar o enfornamento do forno de vidragem pequeno, sobretudo dada a considerável variação no número de peças fragmentadas durante a cozedura de enchacotagem. Aceitando como facto a utilização exclusiva do forno mais pequeno para cozeduras de enchacotagem, como claramente indicado pela memória local, a enchacotagem de 1.200 peças por fornada, com uma provável fragmentação de 20%, resultaria na média de aproveitamento de cerca 960 peças. A capacidade para cerca de 1.872 peças do forno pequeno de vidragem estaria novamente de acordo com uma lógica de duplicação da capacidade de enfornamento aquando da vidragem, com duas cozeduras de enchacotagem por cada cozedura de vidragem. No entanto, o emprego simultâneo do forno pequeno de vidragem em cozeduras de enchacotagem, ainda presente vagamente na memória local, repõe entre este e o forno grande de vidragem a hipótese da relação de correspondência próxima genericamente proposta como mais corrente. Nesse

caso, a capacidade para 36 caixas do forno pequeno de vidragem resultaria num total de 3.600 peças encaixotadas sem separadores, que considerando uns hipotéticos 20% de fragmentação, resultariam em 2.880 peças para posterior vidragem, não muito distantes das 3.120 peças calculadas por fornada no forno grande de vidragem. Voltando à preparação da cozedura de vidragem, nela estava incluída a colocação de amostras por cima da camada de chacota que cobriria as caixas. Estas auxiliariam a avaliação do estado da cozedura, para além do cálculo da temperatura no interior da câmara de cozedura através da observação da cor do fogo191. Na olaria estas amostras recebiam o nome de “cubijas”, sendo constituídas por pratos, igualmente mergulhados em esmalte, sobre o qual se pintavam várias listas das cores empregues na decoração das peças a vidrar. Desta forma a observação do ponto de vitrificação do esmalte e das cores das cubijas aproximar-se-ia tanto quanto possível ao da louça enfornada. O forcado das amostras, referido anteriormente, garantiria a viabilidade desta operação com relativa segurança. Ainda que as cubijas fossem sempre empregues na olaria nas cozeduras de vidragem, a determinado ponto, ter-se-á passado a recorrer igualmente a piróscopos fusíveis comprados192, produzidos industrialmente e formados por argilas tornadas fusíveis a temperaturas predeterminadas, normalmente numa escala formada por vinte piróscopos fusíveis em forma de pirâmide ou cone, a que simplesmente chamavam de “barrinhas”. Para a observação destes piróscopos fusíveis, à entrada e a meia altura da câmara de cozedura, passou-se a inserir no emparedamento da porta de carga um cilindro em barro, designado por “tarugo”, permitindo ver a fila de piróscopos colocados normalmente sobre azulejos, de forma a elevá-los à altura de observação. Esta será uma inovação que certamente se generalizou em Portugal progressivamente a partir da sua introdução em França e Inglaterra, na década de oitenta de oitocentos193.

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Reaproveitando o calor da cozedura de vidragem, procedia-se simultaneamente à calcinação da mistura base para cada tinta. Já Charles Lepierre194 referia que a calcinação das tintas deveria ser realizada «ao fogo de faiança» ou «a grande fogo», entendendo nós que por tal se deva entender cozedura de vidragem. Esta calcinação decorreria no interior da câmara de combustão e para tal contariam com uma pia onde seriam depositadas as misturas, especificando-se aí ser de pedra e apenas existir nos dois fornos de vidragem. Infelizmente, quando a olaria passou a comprar as suas tintas ao exterior na década de setenta de século XX, esta pia foi removida do forno a que tivemos total acesso de registo – “forno pequeno de vidrado” –, pelo transtorno que representava na colocação das cavacas de pinho na desejada posição vertical. Não se tendo tido por isso oportunidade de realizar o seu registo, resta-nos a hipótese de que a pia do “forno grande de vidrado” tenha subsistido, o que não logramos igualmente confirmar. Charles Lepierre em 1899 omite na sua publicação qualquer menção a tal tanque, contudo, na sua Figura 7, em que se representa um forno coimbrão, aparece-nos a tracejado o que parece ser a indicação da sua existência, uma vez mais posicionado junto à parede de fundo da câmara de combustão. Ainda que tal elemento esteja identificado com a letra M, Charles Lepierre não faz qualquer referência ao seu significado, mas a sua concordância com o descrito por Fortunato Augusto Freire Themudo, e registado na memória da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», não deixa grande margem para dúvidas de se tratar do mesmo dispositivo destinado à calcinação do esmalte.

Figura 42 | “Forno para cozer a loiça comum em Coimbra”, salientando-se o pormenor possivelmente correspondente ao “tanque” para calcinação do esmalte (LEPIERRE, 1899: fig. 7).

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A operação de cozedura de vidragem seria no geral idêntica à de cozedura de enchacotagem. O consumo de tempo e combustível não se afastaria muito do da primeira cozedura, uma vez que a enchacotagem prévia das peças permitiria acelerar o processo até às temperaturas anteriormente atingidas, compensando os tempos e consumos agravados na fase final, de modo a atingir as temperaturas de vidragem. A maior sensibilidade desta última fase da cozedura de vidragem implicava ainda alguns cuidados extras, passando a observação do fogo para cálculo das temperaturas por um maior número de fases. Na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», em que a temperatura de enchacotagem seria próxima ou mesmo superior à de vidragem, todo o processo é repetido em ambas as cozeduras, com redução na cozedura de vidragem do tempo e risco de quebras durante a eliminação da água adicionada e de combinação. O aumento da temperatura deveria ser gradual até aos 500-700 °C, podendo ser acelerado até atingir o limite pretendido, situado entre os 900-1100 °C, tendo os cerca de 900 °C como mínimo para vitrificação do esmalte e tintas195. Atingida a temperatura de vidragem, genericamente tendo por mínimo os 900 °C e podendo ir até aos 1000-1100 °C, entra-se na fase de maturação do vidrado, no qual todas as reações químicas devem ser completas, com a total expulsão dos gases libertados pela vitrificação, essencial de modo a evitar defeitos na superfície causados por rebentamentos como os de CO2. De modo a garantir esta completa maturação de vitrificação – patamar de vidragem –, o forno deve ser mantido à temperatura de vidragem durante pelo menos 20 a 30 minutos, contribuindo para a homogeneização da superfície vidrada e a combinação química entre o esmalte e o barro, essencial para a sua correta aderência196.

Tal como registado na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», e indicado por António Veloso Xavier197, todo este processo decorre evitando-se irregularidades no fogo, labaredas e fumos excessivos198. Completa a maturação dos esmaltes e tintas, iniciar-se-ia o gradual arrefecimento do forno, com a solidificação do vidrado a ocorrer entre os 700-450 °C, sendo esta fase extremamente sensível. Aos 250-200 °C o arrefecimento é concluído, com a completa transformação dos materiais, podendo-se acelerar o esfriamento do forno199. Este era, segundo João da Bernarda200, acelerado através da remoção do combustível em brasa. Uma vez parada completamente a ação do fogo, as peças seriam desenfornadas na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» após 4 dias, num total de 96 horas, mantendo-se o emparedamento da câmara de cozedura até ao momento de recuperar a louça, divergindo apenas neste pormenor em relação à cozedura de enchacotagem, onde ao final do segundo dia se retiraria metade do emparedamento de forma a acelerar o arrefecimento. Tal como indicado para o desenfornamento da louça enchacotada, a recuperação da louça vidrada seria aí feita através do esvaziamento das caixas com recurso a panos como pegas, dada a temperatura interior ser ainda considerável e o peso das caixas carregadas ser excessivo para o seu transporte. Na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», tal como para a cozedura de enchacotagem, a frequência entre fornadas de vidragem dever-se--ia situar entre uma semana e um mês, dependente do ritmo de produção, por sua vez ditado sobretudo pela quantidade de operários. A paleta cromática da cerâmica produzida na olaria, e que dominou as produções coimbrãs no século XIX, incluía com frequência as cores ditas de “grande fogo”, como o azul e o manganês, em simultâneo com as cores ditas de “pequeno fogo”, como certos verdes e os amarelos e laranjas.

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Figura 43 | Representação gráfica do forno de vidragem – em corte – e do forno de enchacotagem – em alçado (L. Sebastian & H. Pereira, 2007).

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A produção inicial desta olaria deveria, portanto, cingir-se à louça ratinha, cujo carácter depreciativo se encontra ligado ao próprio conceito. Ratinha(o) seria o adjetivo utilizado para definir uma realidade rural, já que serviria também para apelidar os trabalhadores rurais de origem beirã, grandes consumidores desta louça. Este termo carrega uma definição de rusticidade desde o século XVI e XVII e mais tarde é utilizado para definir algo de menor categoria ou valor205. A produção de louça de baixo custo deveria ser uma opção estratégica, já que este era frequentemente indicado como uma das causas para a sua grande procura. A razão fica subentendida na afirmação de um dos testemunhos da exposição que refere que esta louça «(…) aproveita às classes menos abastadas, que são as mais numerosas. Ainda assim, a faiança de 1ª qualidade póde, sem vergonha para a indústria nacional, adornar a mesa do rico e do remediado; e a louça grossa, de uma barateza extrema, aproveita a todos e é indispensável mesmo na casinha do abastado»206. As formas associadas à faiança ratinha deste período são, predominantemente, destinadas ao serviço de mesa. Em termos decorativos é favorecido o uso de uma pincelada larga, de forma mais repetida, abrangendo uma grande área decorativa e o uso da técnica de esponjados, que auxilia na criação de uma elevada densidade pictórica. É usualmente utilizada uma decoração policromática que se reúne num número de grupos decorativos restrito – o que se poderá explicar pela repetição dos esquemas decorativos e pela simplificação dos desenhos. Durante o período da sociedade comercial «Afonso Pessoa & Pimentel» e da exploração por António Cardoso de Carvalho ter-se-á mantido a produção de louça para uso doméstico como anteriormente já que, segundo José Amado Mendes207, por volta de “(…)1928, ter-se-á começado a fabricar, além de louça doméstica, faiança decorativa, cuja produção se intensificou a partir dos

Estas produções terão passado apenas por uma cozedura de vidragem, provando por isso a possibilidade de uma técnica intermédia para uso de ambos os grupos de corantes. Uma vez genericamente consideradas as temperaturas de “pequeno fogo” entre os 500-800 °C e as de “grande fogo” entre os 900-1000 °C, não seria de todo impossível a maturação conjunta do esmalte, tintas de “grande fogo” – azul, manganês e alguns verdes – e tintas de “pequeno fogo” – amarelos, laranjas e alguns verdes – entre os 800-900 °C. Todavia, a considerável inconstância de fatores envolvidos numa cozedura de vidragem levaria invariavelmente a um grande número de peças defeituosas201. Ainda assim, mesmo as peças que passavam pelo crivo da qualidade desejável para venda ao público, detinham um carácter de rusticidade que lhe atribuía personalidade e, sobretudo, singularidade.

2.3. Produtos

A fábrica de Joaquim da Silva, segundo o mapa da «Relacção das Fabricas e Officinas» do distrito de Coimbra, em 1837 e 1840 produzia pratos, tigelas, bacias e vasos202. Um tipo de produção que se mantém, de uma maneira geral, em 1867203, já que, numa escritura de arrendamento é designado o fabrico de canecas, chicaras, pratos, meios pratos, travessas e terrinas. Supõe-se, portante, um tipo de produção semelhante para períodos anteriores à época em que é constituída a Sociedade «Adelino Augusto Pessoa & Irmãos», em que se fabricaria louça de uso comum e de baixo custo, segundo o que terá sido apresentado na Exposição Distrital de Coimbra de 1884204, uma exposição promovida pela Escola Livre de Artes e Desenho e patenteada no edifício do Colégio do Carmo, onde estiveram representadas três das doze fábricas de louça branca que existiam na cidade.

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Figura 44 | Prato e castiçal com marca: 15x1 cm / 23x13 cm (F. Formigo, 2015).

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Figura 45 | Taça e pote com decoração monocromática. 4,5x13,5 cm / 27x16,5 cm (F. Formigo, 2015).

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anos 40 (…)” Assim, será com Alfredo de Oliveira que se dão inovações na produção da fábrica que se irão repercutir nos períodos seguintes. Segundo António Pacheco208, as peças produzidas pelo próprio terão sido identificadas com a marca “A”. A partir de 4 de Setembro de 1942, em que a exploração da fábrica far-se-á pelo nome de «Viúva de Alfredo de Oliveira», será a marca com as iniciais “V.A.O” a identificar todas as peças da sua produção. É ainda neste período que é normalizada a assinatura das peças por parte do pintor de louça que as decora, o que irá permanecer, e que se verifica o alargamento da produção de louça decorativa com a mudança do tipo de produtos fabricados. Iniciou-se a produção de faianças decorativas inspiradas, morfológica e decorativamente, em exemplares presentes na coleção do Museu Nacional Machado de Castro – nomeadamente as faianças do século XVII e as atribuídas a Brioso e a Vandelli –, e em exemplares de Paterna/Manises copiadas do livro de Manuel Gonzalez Marti “Cerâmica del Levante Espanhol:Siglos Medievalis” de 1944209. O uso da decoração inspirada nas faianças do século XVII, a única das praticadas com o uso da monocromia, levou à identificação da sua cronologia junto à marca da fábrica, que vai permanecer, apesar da contínua tendência para um distanciamento dos originais210. Esta resulta da apreensão do estilo, por parte dos pintores da fábrica, que lhes terá permitido utilizá-lo de uma forma mais criativa. Na década de cinquenta foi desenvolvida uma linha de peças com formas e decoração à maneira de Alcobaça e peças sob a influência da louça das Caldas da Rainha. A par desta produção com uma função decorativa parece surgir, com um cariz popular, formas simples e abertas em peças com representação de figuras em bailado ou com quadras de carácter popular211. Desta forma, se por um lado era alargada a produção de peças com

funções meramente decorativas, com um tipo decoração pormenorizada e diversos tipos de inspirações, por outro era mantida a produção de louças de uso comum com motivos decorativos mais simplificados. Esta diversificação na produção, que se irá manter nos períodos seguintes, sugere uma mudança estratégica fruto de uma adaptação ao mercado ou da intenção de conquista de novos mercados. Em termos morfológicos, a produção deste período destinada ao uso doméstico é muito diversa e inclui pratos, jarras, potes, garrafas, canjirões, canecas, floreiras, castiçais, candeeiros, serviços de jantar (terrinas, travessas, galheteiros e pratos), serviços de chá e café (canecas, pires, açucareiros, leiteiras, bules e cafeteiras), bacias de lavatório, miniaturas, caixas e alfineteiras. Nas peças produzidas com carater decorativo incluem-se placas decorativas, esculturas e fontes de parede212. Com a constituição da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» em 1965 vai manter-se a marca com as iniciais “V.A.O”, assim como a inscrição da origem da produção – outra característica identificativa que se encontra junto à marca. Era comum a nomeação da cidade de origem (Coimbra) e, nalguns casos, do país de origem (Portugal). De facto, esta nomeação é encontrada com maior frequência na produção da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» indicando que poderia ser destinada à exportação e, segundo fontes orais, esse seria o fim da maioria das peças desse período213. Esta é facilmente distinguível de produções anteriores pela utilização do código de referência que é pintado acima da marca “V.A.O” e que resulta da catalogação das peças. Um trabalho que parece ter sido iniciado pela «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», de que resulta um catálogo publicado em 1966. A leitura dos códigos de referência que identificam as peças e a comparação das peças em catálogo com coleções permite compreender que para além das morfologias identificadas na época anterior, a produção integra outras

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Figura 46 | Açucareiro e alfineteiras assinaladas com código de referência da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» seguida da marca e do local de origem de produção: 10x10 cm / 2,5x8,5 cm / 2,5x7,5 cm (F. Formigo, 2015).

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Figura 47 | Jarro de água gomil, Garrafa de Whisky e Cabaça com tampa: 26x15 cm / 36x9 cm /20x10 cm (F. Formigo, 2015).

como: jarro (de água, gomil e frango real), candeia de Assis; tabuleiro de bolo inglês (com e sem asa); saladeira (oval com asa, inglesa, retangular); ceirinho; travessa (recortada e oval); saleiro-pimenteiro; garrafa de whisky; gomil;

alguidar-taça; pato com brasão; galinha; mostardeiro; cinzeiro; vinagreira de Nantes; cinzeiro; botija-bar; bengaleiro; molheira; picheira; saleiro-pimenteiro; cabaça com tampa; almofariz; mealheiro e vaso.

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Figura 48 | Travessa leitoeira e almofariz: 5,5x54 cm / 13x11 cm (F. Formigo, 2015).

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Para além das faianças destinadas ao uso doméstico e decorativo, o catálogo de 1966 divulga também os azulejos, outro tipo de peças que terão sido continuamente produzidas na olaria. Supondo-se uma produção semelhante para períodos anteriores na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», eram manufaturados azulejos de figura avulsa a que se somavam os painéis de azulejo, com representações de temática religiosa ou profana, que podiam ser originais ou reproduções. São disso exemplo os três painéis produzidos para o “8º Centenário do Nascimento do Santo António”,

Figura 49 | Azulejos de figura avulsa apresentados no catálogo de 1966 da «Sociedade de Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.»: 7x7 cm / 12x12 cm.

divulgados pelo panfleto publicitário de 1995, onde são mencionados outros painéis realizados para “(…) o Palace Hotel do Bussaco, para o Tribunal de Contas (reprodução de O Contador de Amada Negreiros), para a Universidade de Coimbra (reprodução da Insígnia em coleção de 3 peças comemorativas do VII Centenário da Universidade) bem assim como o Projecto Infante/94 – Comemorações do 6º Centenário do Nascimento do Infante Dom Henrique. De realçar, ainda, a produção para o Banco de Portugal de uma peça comemorativa dos 150 anos da sua fundação”.

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Figura 50 | Panfleto publicitário de 1995 de divulgação dos painéis produzidos para o “8º Centenário do Nascimento do Santo António”.

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Figura 51 | Panfleto e série de pratos “História da Sebenta” da «Sociedade de Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» (coleção privada): 4x20 cm (F. Formigo, 2015).

Estes painéis são representativos de uma parte da produção que se distingue pelo seu carácter excecional, principalmente em termos decorativos – que existiu em períodos anteriores e que se vai perpetuar no período da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» –, que são as peças comemorativas. Estas eram feitas por encomenda e poderiam ser destinadas a inaugurações, homenagens, aniversários, festividades, etc.214. Neste âmbito foi fabricada uma série de pratos com o tema “História da Sebenta”, alusivos à comemoração do “Centenário da Sebenta” festejado em 1899, que exibem a marca “Affonso Pessoa Coimbra”215. Estes terão sido pintados por estudantes da Universidade e fabricados na olaria – já que Afonso Augusto Pessoa era, à época e desde 1896, o proprietário – para serem utilizados no banquete realizado no Largo da Feira. Estas peças terão sido depois “copiadas por operários cerâmicos, dado o grande interesse que despertaram.”216 e, posteriormente, reproduzidas pela «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» numa edição limitada e numerada, que publicita em panfleto. Nesta série, composta por cinco pratos, foi utilizada a marca “V.A.O Coimbra” e a marca “Affonso Pessoa Coimbra”. As peças comemorativas ou de caráter excecional são por isso um exemplo claro da envolvência da olaria com a sociedade, particularmente a da própria cidade, à qual pertencem a Universidade e os seus estudantes. Uma dinâmica de abertura permanente que a caracteriza, elevando o seu valor social e humano. Uma génese que a «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» irá manter dando também continuidade à produção anterior, exibindo muitas das inspirações decorativas antecedentes a par da decoração em hastes florais faustosas que densamente preenchem as áreas decorativas das peças e que irá proliferar.

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Figura 52 | Caneca da “Cerveja Topazio” (coleção privada): 13x12 cm (F. Formigo, 2015).

Figura 53 | Gomil com prato e saladeira oval com asas decoradas com hastes florais faustosas (coleção privada): 30x38 cm / 4x31 cm (F. Formigo, 2015).

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Em termos morfológicos irão manter-se algumas das morfologias, à exceção das peças que se baseiam na produção da «Real Fábrica de Louça» sita ao Rato. Este é o caso da designada terrina do Rato, a floreira de parede Rato e o pato com o brasão da Rainha Santa Isabel que constam no catálogo da fábrica de 1966. A primeira, embora aparente ter uma aproximação distante, terá como modelo de inspiração a muito representativa terrina assente em quatro pés de motivo vegetalista, com duas asas de enrolamentos de acanto e concheados217. A segunda revela uma grande semelhança com o modelo de forma troncocónica invertida, rodeado por diversas caneluras, de reentrância central e face superior rebaixada com diversos orifícios e rodeada por um bordo recortado, do ciclo produtivo de Tomás Brunetto (1767-1771)218. A terceira assemelha-se à terrina da Real Fábrica em forma de um cisne sentado, moldada, com o brasão do Conde de Oeiras, incluída no conjunto de terrinas com formas naturalistas de animais de gosto Rococó219. Nos anos setenta do século XX é criado um novo catálogo onde são apresentados novos códigos de referência alfanumérica. A análise da produção do primeiro e segundo período permite compreender a introdução, nesta segunda fase, de novas morfologias: cesto de fruta; tacho; conjunto de refresco; tabuleiro; bule com aquecedor; chaleira; copo de ovos; tinteiro; papeleira e almotolia.

Figura 54 | Terrina do Rato da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» (Catálogo, 1966) e terrina da «Real Fábrica de Louça» (PAIS, 2003:329): 35x25 cm / 26x37x25 cm.

Figura 55 | Floreira de parede Rato da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» (Catálogo, 1966) e floreira da «Real Fábrica de Louça» (PAIS, 2003:215): 11x15 cm / 10,5x20,5x 12,5 cm.

Figura 56 | Pato com brasão da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» (Catálogo, 1966) e terrina em forma de cisne da «Real Fábrica de Louça» (PAIS, 2003:227): 23x25 cm / 34x34,5x25,5 cm

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Figura 57 | Tinteiro produzido na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» marcado com o código de referência: 16x21,5 cm (F. Formigo, 2015).

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Figura 58| Prato da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.»: 5x30 cm (F. Formigo, 2015).

Figura 59 | Pinto mealheiro da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.»: 22x15 cm (F. Formigo, 2015).

Transversais aos diferentes períodos produtivos são as peças que, indiferentes à mudança de proprietário ou ao tipo de decoração utilizada, subsistem pela aplicação sucessiva dos mesmos moldes. O maior exemplo de continuidade será o prato de louça de uso comum, de natureza grosseira, que continuou a ser fabricado desde a produção de louça ratinha220 até ao período da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» (199-A). Noutros casos pode existir uma adaptação para reaproveitamento do mesmo molde, como se compreende no caso do mealheiro pinto (286-A) produzido pela «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.». Esta peça terá sido adaptada a essa função já que no período da fábrica «Viúva de Alfredo de Oliveira» era uma escultura produzida para o restaurante “Pinto de Ouro”221.

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OPERÁRIOS E A SUA ORGANIZAÇÃO NA OLARIA

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A história da produção de cerâmica na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», desenvolvida segundo um modelo secular, é um exemplo máximo de continuidade, refletida no seu edifício e estruturas de produção, mantidos de uma maneira geral desde a sua fundação, e como tal, o perfeito arquétipo da produção oleira coimbrã. No barreiro e no piso inferior da olaria, encontravam-se a maioria das estruturas e equipamentos utilizados para a preparação, conformação e cozedura do barro, e por esses espaços estariam distribuídos os operários que manuseavam diretamente o barro e laboravam com os fornos, tendo anexo um espaço de armazém, albergando as peças prontas para a comercialização. Apesar destes terem acesso à área da câmara de cozedura no piso superior, este seria maioritariamente utilizado pelos operários dedicados à decoração das peças, podendo-se assim definir o piso inferior como zona “suja” e o superior como zona “limpa”. O número de operários, dependente da dinâmica do mercado, terá oscilado, e a perceção geral da sua variação é um indicador que permite uma aproximação à realidade produtiva da olaria. Segundo o mapa da «Relacção das Fabricas e Officinas»222, em 1837 a olaria empregava cinco homens e um rapaz, e dois anos mais tarde laboravam três homens e três rapazes. Em 1861, segundo o registo de Francisco Teixeira da Silva223, encontravam-se a laborar o mesmo número de pessoas, quatro homens e dois rapazes, menores de 16 anos. Em 1905 ter-se-á verificado um ligeiro aumento do número de operários já que, segundo Fortunato Augusto Freire Themudo224, existiriam 8 artistas e 1 menor. Em 1926 o número de operários era de 7 homens225, um número que terá aumentado significativamente nos anos seguintes, já que em 1967 encontravam-se a trabalhar na olaria 20 operários226. No ano seguinte, estes haviam ascendido a 35 e, passados dez anos, esse número era sensive1mente o mesmo, pois «…cerca de 36 trabalhadores aqui encontram emprego com uma

folha salarial de cerca de 250 000$00 mensais»227. Entre 1970 e 1980, segundo um testemunho laboral, o número de operários terá diminuído, laborando cerca de 25 pessoas, 10 oleiros e 15 pintores228. Em 1991 e 1992 a olaria funcionava apenas com 8 operários a título permanente, sendo 6 pintores e 2 oleiros, que asseguravam toda a produção229. Estes valores, que devem ser observados com precaução, pela variação de critérios e pela maior ou menor credibilidade da respetiva fonte, demonstram que entre 1926 e 1967 houve um exponencial crescimento da mão-de-obra. Este corresponde ao intervalo de tempo dos anos 40 e 50 do século XX que, tal como referido anteriormente, foi um período de viragem no tipo de produção para a procura e conquista de novos mercados. Contudo, este crescendo no número de operários não impediu a permanência das tecnologias de fabrico características de uma olaria tradicional, de pequena escala. Da ligação ao passado provém, desde logo, o modo de aprender o ofício e de exercer a atividade, que se pode ainda associar à herança da organização dos antigos mesteres. O contexto administrativo e organizativo destes no seu universo social confundia-se muitas vezes com o religioso, bastando para tal relembrar que a organização dos mesteres tinha por base a sua filiação em bandeiras, correspondendo cada uma destas ao respetivo santo padroeiro. Um caráter religioso que está na génese das corporações dos ofícios portugueses que, segundo José Pinto Loureiro230, terão descendido das corporações romanas, verdadeiras confrarias ou irmandades, que tinham uma finalidade puramente cultual. Na opinião do mesmo autor “Um dos traços de parentesco das confrarias portuguesas com os colégios romanos e com as guildas germânicas seria mesmo o da obrigação de acompanhar o confrade morto à sua última morada.” Prova desta herança é a bandeira “Arte Ceramica de Coimbra” que integra o espólio da olaria e que, segundo fontes orais, era utilizada para prestar honra fúnebre aos oleiros da cidade. Naquilo que parece ser uma alegoria à

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arte cerâmica, ao centro uma figura feminina, envolta num manto vermelho, ergue os braços sobrepondo duas coroas de louros, uma em cada mão, sobre as cabeças das figuras do pintor de loiça – ao seu lado direito – e do oleiro – ao seu lado esquerdo – no exercício da sua atividade, enquadrados por um painel de azulejos azuis e brancos. Sabendo-se que em 1517, na procissão do «Corpus Christi», os oleiros tinham a quarta bandeira231 e que seria habitual a sua renovação quando se apresentasse em avançado estado de degradação232, poder-se-ia encarar a bandeira “Arte Ceramica de Coimbra” como inspirada na antiga bandeira que filiou os oleiros da cidade, desde o século XVI ao século XIX, isto a um nível meramente especulativo. De facto, segundo José Queirós233 a bandeira dos oleiros de Lisboa seria em seda branca ou vermelha e nela deveria constar a imagem das santas padroeiras dos oleiros, Santa Justa e Santa Rufina, embora Eduardo Freire de Oliveira, nos Elementos para a História do Município de Lisboa234, aluda apenas a Santa Justa, na bandeira dos oleiros. É disto sintomático o facto de o Bairro das Olarias se situar na freguesia de Santa Justa, e ser exatamente esse o nome do largo onde se situa a nossa olaria, por aí ter existido uma igreja dedicada a essa mesma santa, fazendo por isso sentido que fosse esta a padroeira representada na bandeira original dos oleiros de Coimbra. Saindo do domínio do especulativo, certo é que permaneceu a herança do uso de uma bandeira como elo de ligação entre os membros deste ofício em Coimbra. Sobrevivendo o símbolo de uma união que resistiu à extinção das corporações e à evolução para uma sociedade laica, que terá afetado a união pelo culto. Figura 60 | Bandeira "Arte Ceramica de Coimbra" (J. Lucas, 1980).

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3.1. Mestres, oficiais e aprendizes

Na organização dos mesteres, a aprendizagem do ofício era feita pelo aprendiz, que inicia a sua formação profissional sob a orientação permanente do mestre. No regimento dos oleiros e malagueiros de Coimbra do século XVII determina-se que «(…) todos os aprendizes para se examinarê tenhaõ (…) aprendido cõ offecial aprovado e mostrem certidaõ delle na forma costumada (…)»235.

Este modo de aprendizagem da profissão subsistiu aqui, fruto de uma mentalidade conservadora que irá neste caso prolongar o empirismo tradicional de herança medieval até mesmo ao século XX, de que é sintomática a primeira regulamentação da atividade por via contratual, de 30 de Setembro de 1942236, – realizada pelo Grémio dos industriais de Cerâmica e pelos Sindicatos Nacionais dos Operários da Industria Cerâmica e Ofícios Correlativos dos distritos do Porto, Aveiro, Coimbra, Leiria, Lisboa, e Setúbal – ao contemplar os aprendizes como condição obrigatória no acesso à categoria profissional237. A idade para se iniciar a aprendizagem do ofício terá variado. Existem testemunhos de ter sido aos 16 em 1970, aos 12 em 1966 e aos 14 em 1972, informação coincidente com a que vigorava nos contratos coletivos de trabalho. A 30 de Setembro de 1942 fica estipulado que “Só podem ser admitidos como aprendizes os indivíduos com mais de doze anos, quando do sexo masculino, e com mais de catorze anos, sendo do feminino, que saibam ler, escrever e contar.”238. Na revisão ao contrato de 18 de Junho de 1962 a idade mínima de admissão de um aprendiz são os 17 anos. Porém, podiam ser admitidos pré-aprendizes, do sexo masculino ou feminino, com mais de 12 ou 14 anos de idade, desde que habilitados pelo exame da 4ª classe do ensino primário239. Com a regulamentação do trabalho de 29 de Junho de

1972 fica decretado que só podiam ser admitidos indivíduos do sexo masculino ou feminino com idade mínima de 14 anos com a 4ª classe do ensino primário e com exame médico de robustez física, embora o tempo de aprendizagem só comece a ser considerado “(…) a partir da data em que o aprendiz perfaz 16 anos de idade (…)”240. Para além do aprendiz, na olaria existiam os oficiais. Os oficiais eram os trabalhadores especializados que, após o período de aprendizagem, se encontravam qualificados a desempenhar a sua função. Estes oficiais poderiam tornar-se mestres ao assumirem a responsabilidade de orientação dos trabalhos, após vários anos de experiência e de casa. Tanto os oficiais como os mestres poderiam contar com ajudantes que dedicar-se-iam às tarefas menos especializadas. Para a realização de todas as diferentes operações de extração e tratamento do barro, poderiam existir os “coadores de barro” e os “amassadores de barro”241. Os primeiros, também conhecidos como “filtradores de pasta”242, eram os oficiais que tratavam da depuração do barro nos tanques, enquanto os segundos se ocupavam da posterior amassadura e sovagem das pastas de barro. Na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» a amassadura na zona da capela era da inteira responsabilidade de um só operário, que independentemente da possibilidade de ser auxiliado na pisadura, garantia pela sua experiência a correta preparação da pasta final. A preparação das tintas também poderia estar a cargo de um operário designado “preparador de tintas”243, que tinha a responsabilidade de realizar a moagem e a composição das mesmas. Da operação de modelação na roda ou torno de oleiro estava encarregue o oficial de roda, “rodeiro”244, “rodista”245 ou “oleiro rodista”246. Este podia acumular ainda a função de conformação do barro no sistema de jaula, no qual também era utilizada a roda, ou poderia estar apenas uma pessoa encarregue

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dessa tarefa, e nesse caso designar-se “oleiro jaulista”247. Na conformação do barro poderia contar--se ainda com a figura do “oleiro formista”248, que era o responsável pela produção de peças à lastra, e com os “acabadores”249, a quem cabia o acabamento das peças antes e após a secagem. O “forneiro”250 estaria encarregue do controlo do fogo – um processo empírico dependente da sua experiência – e da cozedura dos produtos desde o enfornamento até ao desenfornamento das peças. Desta forma, dele dependia a correta condução de todo o processo de manipulação dos fornos. Na «Sociedade de Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» este papel era preferencialmente desempenhado por duas pessoas simultaneamente, dada a exposição a altas temperaturas implicar uma alternância de cerca de 2 horas durante o processo de cozedura, acima das quais se tornaria quase impossível suportar o calor. Para se protegerem deste, os forneiros usavam um avental de couro, ao qual, nos períodos de maior temperatura, fixavam panos molhados de forma a proteger o peito e baixar a sua temperatura corporal. Dada a longa duração da cozedura, esta alternância permitia igualmente algum descanso, dormindo-se por curtos períodos de tempo durante a noite sobre fardos de palha, colocados para o efeito nas proximidades. A aplicação do esmalte nas peças previamente enchacotadas era realizada pelo “vidrador”251 para que, posteriormente, fossem executados os trabalhos de desenho e pintura a pincel pelo “pintor de loiça”252 ou simplesmente “pintor”253 254. Segundo testemunhos laborais na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», o pintor era o mestre responsável pela pintura que orientava o trabalho dos “decoradores”255. Ao pintor caberia realizar os testes das cores e técnicas, produzir pincéis na olaria com cabos de canas e pele de animais e criar os motivos ou contornar os motivos na peça para que os decoradores pudessem filetar, preencher, esbater ou dar cor. Para além do nome do fundador Joaquim da Silva, perpetuaram-se outros nomes de pintores/decoradores que laboraram na olaria. É conhecido, para o ano de 1861 sob administração de Joaquim Maria Nunes, o nome do Mestre Manuel José Freitas256, mas outros nomes são conhecidos, principalmente por meio da assinatura das peças. É o caso do “A.M.S. (Tintureiro)” em peças datadas de 1937, do “Zino” e do pintor “Sousa”, este último com diversas peças assinadas desde 1947257. Horácio Oliveira, com produção identificada pela assinatura “H.o”, foi outro mestre pintor muito profícuo a que sucedeu Armando Oliveira, o último mestre pintor da olaria. Figura 61 | Horácio Oliveira no exercício das suas funções de pintor (J, Lucas, 1980).

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Figura 62 | Pote de farmácia e prato de parede pintados e assinados por Horário Oliveira: 20x11 cm / 2x40 cm (F. Formigo, 2015).

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Segundo o testemunho de Charles Lepierre258, nas olarias de Coimbra existiam apenas duas espécies de operários: os rodeiros e os pintores de louça, que contavam ainda com a presença dos aprendizes. De facto, no elevado número de cartas de examinação que constam nos livros da Câmara do século XVII, ficou registada esta destrinça entre os malegueiros de louça branca e os pintores de louça. Segundo Joaquim Martins Teixeira de Carvalho259, logo em 1607 é feita a indicação a um «pintor de lousa» e em 1609 a referência a um «malagueiro de louça branca». Se for assumido que os malegueiros de louça branca fabricavam louça com vidrado de estanho (faiança), estas serão as primeiras categorias profissionais conhecidas260. Num período inicial, em que uma média de seis pessoas laborava na olaria, seria provável a acumulação de funções, bem como a pouca diversidade de graus de especialização. Organização semelhante ter-se-á verificado na fase final de utilização dos fornos originais em que, segundo testemunhos laborais, o oleiro acumulava a sua função com a de forneiro. Fortunato Augusto Freire Themudo261 testemunha em 1905 o exercício profissional dos oleiros e pintores, mas também dos amassadores e dos coadores de barro, indicando o número de nove pessoas a laborar. Assim, se num período inicial, com um menor número de pessoas a laborar, seria mais frequente a ocorrência de operários a responsabilizarem-se por várias tarefas, com o aumento da mão-de-obra ter-se-á verificado uma maior distribuição das mesmas. Ainda assim, e tal como registado em testemunho na olaria, o próprio ritmo de trabalho e gestão dos tempos mortos poderia levar a uma acumulação de funções. O que acontecia com os forneiros que, com uma ocorrência quase mensal das cozeduras, entre elas desempenhavam outros papéis, como o de oleiro jaulista262. Seria ainda muito comum que o jaulista fizesse as peças à lastra, desempenhando ainda funções de acabador263, e que o decorador acumulasse

a função de vidrador264. Sendo o decorador o único que originalmente seria responsável pelo banho das peças enchacotadas, na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» era ainda responsável pela mistura da preparação do esmalte com a água. Daí que, para riscar o esmalte e assim verificar a sua espessura, o decorador tivesse o hábito de possuir sempre uma das suas unhas bastante longas. O acesso a este trabalho especializado, segundo José Amado Mendes265, passava por uma instrução profissional “(…) adquirida de forma essencialmente prática, nos próprios estabelecimentos industriais ao longo de vários anos, desempenhando a habilidade e imaginação dos operários papel preponderante ainda que frequentemente prejudicadas pela carência de conhecimentos básicos e pela própria rotina.” O tempo de aprendizagem do ofício seria por isso variável consoante o grau de dificuldade, a habilidade do candidato, a sua idade e o grau de exigência do mestre que o ensinava. Nos inícios do século XVII impunha-se ao malegueiro uma aprendizagem de seis anos266, um período que ter-se-á estreitado consoante a maior especialização das funções. A 30 de Setembro de 1942 foi determinado um período de três anos para se ser pintor, decorador, oleiro rodista ou forneiro, dois anos para se ser fornista, oleiro jaulista ou vidrador e um ano para todas as outras categorias267. Na revisão de 18 de Junho de 1962 fica decretado um período de quatro anos para se ser pintor, três anos para decorador, formista ou oleiro das diferentes classes, dois anos para acabador ou vidrador e um ano para todas as categorias profissionais com aprendizagem268. Períodos que não se alteram na regulamentação de trabalho de 29 de Junho de 1972269. Em termos de remuneração salarial de cada categoria profissional, embora seja desconhecida a que seria praticada pela olaria em estudo em cada período particular, é possível fazer uma extrapolação a partir daquela que seria a realidade das olarias coimbrãs. Segundo o registo de 1861 de Francisco

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nos 18$50, o do oleiro rodista e do oleiro formista entre os 14$50 e os 16$50, o do filtrador de barro nos 15$00 e o do amassador nos 13$50. Em 1962278 a remuneração mínima do pintor era entre 39$20 e 64$00, a do decorador entre 35$20 e 44$80, a do oleiro rodista seria entre 46$40 e 51$20, a do oleiro jaulista e do oleiro formista entre 37$60 e 41$60, a do forneiro entre 40$80 e 48$00, a do amassador era de 36 escudos e a do filtrador de pasta e do preparador de tintas era de 41$60. Em 1973279 o valor mínimo estabelecido para o salário do pintor era entre 114$00 e 132$00, a do decorador entre 100$00 e 108$00, a do oleiro rodista seria entre 98 e 114 escudos, a do oleiro jaulista e do oleiro formista entre 98$00 e 100$00, a do forneiro entre 94$00 e 100$00, e a do preparador de tintas de 100 $00, a do filtrador de pasta de 98$00 e a do amassador era de 94$00. Estes valores remuneratórios aplicados à mão-de-obra masculina foram distintos daqueles aplicados à mão-de-obra feminina, que era utilizada nas fases mais indiferenciadas e menos rigorosas do processo de produção e cujos jornais ou salários eram de valores inferiores. Segundo Fortunato Augusto Freire Themudo em 1905280, as mulheres tinham um jornal de 120 reis a 140 reis, que seria cerca de metade do menor valor pago a um homem. Sabendo que, com exceção de alguns ofícios que podiam ser mistos, a maior parte dos ofícios eram apenas para homens281, Joaquim Martins Teixeira Carvalho282 deixa claro que pelo menos já desde o século XVII que teríamos mulheres a desempenhar de forma assumida e reconhecida a importante função de forneira. De facto, em 1942283, às mulheres era permitido serem filtradoras de pasta, oleiras jaulistas, oleiras rodistas e forneiras. Com um número de categorias acessíveis mais restrito, em 1962284 era permitido serem oleiras jaulistas, pintoras e decoradoras com remunerações entre 29$60 e 49$60 e em 1973285 podiam ser pintoras, oleiras jaulistas, oleiras formistas e decoradoras com remunerações entre 104 $00 e 63$00.

Teixeira da Silva270 o salário dos oleiros rondava os 300 e os 360 reis. Em 1899, segundo Charles Lepierre271, o salário dos pintores regulava por 300 a 400 reis, os aprendizes recebiam entre 40 e 200 réis e os rodeiros trabalhavam «por obra», ganhando em média 500 reis por dia. Segundo Fortunato Augusto Freire Themudo em 1905272, os amassadores de barro teriam um jornal a regular entre 240 e 360 réis, os coadores de barro entre 320 e 400 réis, os rodistas entre 360 e 500 réis e os pintores entre 300 e 400 réis. Estes diferentes testemunhos atestam que as condições remuneratórias dos trabalhadores das olarias seriam baseadas na jorna, ou seja, por dia de trabalho. Contudo, não terá sido esta a única forma remuneratória dos oleiros, já que em 1899 seria “por obra”, indicando que esta dependeria da sua capacidade produtiva, um modo de pagamento que era já criticado nos inícios do século XVII, como prova uma determinação camarária de 1609 em que se refere que os oleiros deveriam ser pagos ao dia em vez serem pagos por uma «certa comtia por duzias de pesas»273, num trabalho de empreitada que permitia uma maior produção em menos tempo mas levava a uma diminuição da qualidade, resultando “grande prejuízo no fazer da dita louça”274. Uma prática declarada, em 1913, pelos industriais que em resposta ao pedido de aumento salarial por parte dos membros da Associação de Classe da Arte Ceramica afirmam que “Os operários da roda só receberão os seus salarios depois da louça feita e acabada (…) uma quantia baseada no trabalho que cada operário costuma produzir (…)”275. Para a diminuição do trabalho de empreitada terá contribuído a regulamentação do trabalho, já que fica estipulado a 30 de Setembro de 1942 que o trabalhador “em circunstancia alguma poderá ser remunerado com importância inferior à do salário de jornal a que o operário tem direito.”276. Estes contratos de regulamentação do trabalho permitiram ainda fixar os valores salariais mínimos. Em 1942277, o salario do forneiro foi fixado

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O número de mulheres a trabalhar em olarias terá sofrido um aumentado gradual já que, segundo o mapa da «Relacção das Fabricas e Officinas»286, entre 1 de Janeiro de 1837 e 11 de Janeiro de 1840, é apenas registada a presença de uma mulher a trabalhar numa olaria de louça branca, enquanto em 1905 eram já cinco287. Segundo as mesmas fontes, para os mesmos períodos, não foi registada a presença de mulheres a laborar na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.». A mão-de-obra feminina terá sido aí introduzida em período mais tardio, tendo sido utilizada exc1usivamente no processo de decoração da 1ouça288. Curiosamente, a olaria em estudo é novamente exemplo de um dos muitos casos de sucesso sob gestão feminina, normalmente, e também aqui, assumindo a viúva a administração do negócio por morte do marido mestre oleiro, como vemos acontecer desde pelo menos os inícios do século XVII, apesar de vereações como a feita pela Câmara de Coimbra em 1623, em que a mulher viúva não podia ter «(…) tenda aberta sem ter n'ella official examinado e approvado no officio que usar.»289. Foi neste período que, tal como referido anteriormente, se verifica uma viragem no tipo de produção da olaria, que terá conduzido à conquista de novos mercados e um aumento da mão-de-obra, que terá sido o reflexo do aumento da capacidade produtiva.

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CONSIDERAÇÕES SOBREA IMPORTÂNCIA DESTA

INDÚSTRIA EXTINTA

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A atividade oleira é detentora de uma grande tradição em Coimbra, bem documentada desde os inícios do século XVI. A importância e poder económico que assumiu são sugeridos pela disposição deste ofício na procissão do Corpus Christi. Os ofícios poderiam surgir associados às festividades como forma de suportar as despesas a ela inerentes290, que era uma das obrigações a que se comprometiam os oleiros aquando do seu juramento – “pagar para festas”. Esta contribuição para as festas da cidade era também uma dignificação da profissão. No caso da procissão do Corpus Christi, esta dignificação seria tanto maior quanto mais próximos os oficiais estivessem da «gaolla», e segundo o «Titulo do Regimento da festa do Corpo de Deos, e de como hamde ir os Oficios cada hum em seu logar»291 de 1517, os oleiros eram os detentores da sétima bandeira entre os 17 ofícios presentes no cortejo. Assim, não integrando o grupo dos mais abastados ou de maior estatuto no conjunto dos oficiais mecânicos da cidade, não podiam ser considerados detentores de fracos rendimentos292, tendo alguma representatividade naquele contexto. Pelo desenvolvimento da produção cerâmica na cidade estima-se que a adoção do fabrico de faiança na cidade tenha ocorrido de forma natural. Com a presença de uma vasta e bem organizada comunidade oleira, abundante disponibilidade de matéria-prima e excelente posicionamento para escoamento da sua produção – beneficiando do papel de plataforma comercial que a cidade sempre representou entre o interior e o litoral e o Norte e o Sul, com ligação indireta ao mar através do rio Mondego –, a cidade proporcionou as condições ideias para que a produção de faiança alcançasse uma grande importância socioeconómica e artística. Considera-se que a indústria da faiança já se encontrava implantada e organizada em Coimbra no período de transição para o século XVII, como prova o Regimento dos Oleiros e Malegueiros de 1623. Este é aliás o primeiro documento conhecido a regulamentar o ofício293. A existência deste

documento torna ainda mais provável que no final do seculo XVI o fabrico de faiança em Coimbra fosse já corrente294. Sobre este início de produção são vários os indiciadores de que o século XVII terá sido um período de sucesso para a produção de faiança coimbrã. Por determinação da Câmara, a 26 de Julho de 1603 tornou-se obrigatório que as chaminés dos fornos de louça tivessem que ser suficientemente altas para bem da vizinhança. Outros factos indicam a importância e já complexa organização desta indústria cerâmica nesta época em Coimbra, como as providências tomadas pela Câmara entre os anos de 1601 e 1609, nomeadamente contra os elevados preços da louça que estariam a ser praticados e que superariam os fixados; a existência de fornos de louça fora do sítio das olarias; a exploração de barro fora dos locais habituais; queixas sobre a laboração de fornos pequenos contrários à regulamentação; o cozimento de louça na caldeira dos fornos, etc.. Estes elementos são bem reveladores de que, no princípio do século XVII, a produção de faiança em Coimbra era já uma indústria plenamente desenvolvida e com intensa atividade295. Sabe-se ainda que o consumo da louça coimbrã se terá alargado, desde meados do século XVII – época em que se regista um aumento da atividade – a outras regiões, sobretudo através da exportação pelo porto da Figueira da Foz296, por meio de transporte intermédio que se faria a partir do “Porto dos Oleiros”, situado junto ao Bairro das Olarias, e que em pequenos barcos levariam a louça até ao sintomaticamente chamado “porto do Mondego”, na Figueira da Foz, onde era carregada em navios maiores, adequados à navegação atlântica. De facto, para António de Oliveira297, não faltam a Coimbra, entre 1537 e 1640, “adequadas vias de penetração e escoamento de produtos, meios indispensáveis ao desenvolvimento económico, à expansão do comércio”. A instalação estratégica das olarias em Coimbra, numa cidade com grande importância comercial, terá contribuído para que na primeira metade

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do século XVIII se verificasse um enorme crescimento da atividade, com um elevado número de indivíduos registados a participar nesta indústria – um número que chegou a quadruplicar em relação ao período anterior. Regista-se ainda, neste período, a chegada de vários oleiros vindos da capital, o que em parte se poderá explicar pela falta de mão-de-obra, fruto da crescente procura da louça coimbrã. A tendência de crescimento na primeira metade do século inverte-se significativamente na segunda metade do século XVIII, com um decréscimo que indicia uma decadência do sector298, ainda que o número de olarias a laborar mantenha uma certa estabilidade no primeiro quartel do século XIX em relação ao final do século anterior, assistindo-se mesmo a um crescimento do número de operários por olaria. A contínua procura da louça coimbrã devia-se, em grande parte, ao facto desta ser um produto com um reduzido valor de mercado e oferecer uma grande durabilidade, conseguida pelo maior espessamento das paredes e pela escolha de formas simples e robustas299. Deste modo dar-se-ia resposta às necessidades de quem possuía menor poder de compra, mas também aos que careciam de grandes quantidades louça de faiança de uso corrente, como era o caso das grandes casas aristocráticas, monásticas ou conventuais300. Logo, para além da abundância de matéria-prima e de um posicionamento geográfico estratégico do ponto de vista comercial, a cidade beneficiou com uma opção estratégica de produção, tal como referido para o caso particular da olaria em estudo, e que terá sido promotora do sucesso deste centro oleiro. Esta subsistirá ainda no século XIX, já que na opinião de Francisco Teixeira da Silva301, perante a análise que fez à indústria de Coimbra em 1861, «Estas [fábricas de louça] tambem pouco se hão adiantado, porque não podem competir com os produtos da fabrica da Vista Alegre (Aveiro). Limitam-se ao barato, para que esteja ao alcance do povo que não olha a perfeições», estratégica que se irá permanecer até às primeiras décadas do seculo XX, quando a baixa dos preços

dos produtos concorrentes vieram pôr em causa essa vantagem competitiva, conduzindo ao encerramento progressivo das olarias Coimbrãs. Este decaimento deveu-se ainda, segundo José Amado Mendes, aos meios de transporte e escoamento, que apesar de terem sofrido alguns progressos nos finais do século XIX e inícios do século XX, revelavam sérias limitações302. As insuficientes ligações das linhas de caminho-de-ferro levaram a que o transporte fosse feito preferencialmente, ainda em 1905, em carros de bois, a que acresceu o cíclico assoreamento do Mondego, com prejuízo da sua navegabilidade303. Coimbra, juntamente com Lisboa e Vila Nova (de Gaia), foi um dos três principais centros oleiros de faiança em Portugal até à segunda metade de setecentos. Contudo, mesmo nas cidades de Lisboa e Porto, irá consumir-se louça de Coimbra, que não tendo o mesmo valor de mercado, não se tornaria concorrente destes dois grandes centros oleiros. Assim, se por um lado a produção de um grande centro económico, comercial e político como Lisboa, onde o desenvolvimento da indústria oleira era mais propício, poderia ser destinada a uma clientela mais abastada, por outro lado a produção de Coimbra dedicou-se a satisfazer necessidades mais básicas com o seu carácter mais popular304. A produção de Vila Nova impõe-se neste caso pela diferença. Sem marga – “barro branco” – local para servir de matéria-prima, tendo que a importar de Lisboa, e sem uma forte prévia tradição oleira, desenvolveu-se tecnicamente sob influência de Lisboa e Coimbra, como se deduz pela migração de oleiros que inclusive por tal receberiam privilégios e isenções, baseando antes a sua localização no benefício da proximidade à intensa atividade comercial da barra do Porto para escoamento dos seus produtos. Da produção coimbrã escoada em mercado nacional, parte era absorvida pela própria cidade e povoações circunvizinhas, enquanto outra

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parte era destinada à região Norte, Beiras, Alentejo, Algarve e Ilhas, a núcleos onde um reduzido poder económico impunha um limitado acesso às louças de Lisboa e Vila Nova305. Relativamente ao escoamento para o mercado internacional, no século XVIII José Amado Mendes306, citando o livro Materiais para a história da Figueira dos séculos XVII e XVIII do ano 1954, da autoria de António dos Santos Rocha, faz referência à distribuição através da barra da Figueira da Foz para Inglaterra. Esta é atestada pelos Port Books, onde foram registados os movimentos dos portos ingleses desde o século XIV e até ao século XX, sendo aí claramente referenciados os núcleos de Lisboa, Figueira da Foz e Porto como exportadores de louça307. Já na passagem do século XVII para o século XVIII deu-se igualmente um grande incremento da exportação de faiança pela barra do Douro, de onde para além da louça de Vila Nova, saiu inúmera louça coimbrã, não só para as províncias ultramarinas portuguesas, mas igualmente para a América inglesa e Norte da Europa A par das provas documentais, grande parte da identificação dos centros importadores de faiança coimbrã tem sido possível por meio de estudos arqueológicos, permitindo associar o transporte e a exportação de faiança às rotas comerciais internacionais. Entre os séculos XVII e XVIII, a louça de Coimbra terá integrado, como produto complementar, as rotas do sal, do bacalhau e do açúcar308. É assim frequentemente encontrada no Norte de Espanha309 e colónias portuguesas das Ilhas Atlânticas, Brasil e Uruguai310.Fruto das relações comerciais com a Inglaterra, a faiança portuguesa foi transportada igualmente para as colónias inglesas, sendo uma ocorrência comum em escavações arqueológicas na costa Nordeste dos Estados Unidos da América e Sudeste do Canadá. Esta distribuição, quer pelo mercado interno, quer pelo mercado externo, contribuiu para que Coimbra se transformasse no centro produtor

de faiança com maior produção nacional e projeção internacional, presente em todos os continentes, com exceção da Oceânia, até novos dados arqueológicos o contradizerem. Uma produção que durou cinco séculos e que terá ocupado uma mesma malha urbana, mantendo a sua organização de cariz familiar, um dado que reflete a permanência do seu caracter artesanal311. No entanto, será graças a uma olaria que se afasta deste padrão que se irá perpetuar ainda mais esta a tradição do fabrico de faiança coimbrã. A «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», recuando as suas raízes aos inicos do século XIX, fora da malha urbana tradicionalmente ocupada pelas olarias e fora dos poucos núcleos familiares estabelecidos nesta produção – com relações estreitas entre si, muitas vezes favorecidas pela frequente prática do casamento endogâmico312 –, vai resistir às sucessivas mudanças de proprietários e às fases mais críticas de declínio desta produção, que ditaram o fim de outras olarias semelhantes. No entanto, se por um lado esta olaria foi um caso invulgar sob este ponto de vista, por outro lado é herdeira e representativa de um tipo de produção com tradições vincadas em Coimbra, multiseculares. Até à data da sua construção poucas alterações sofreram as olarias coimbrãs em relação ao século XVII, quer em termos das estruturas, quer materiais e processos de fabrico. Um aspeto que, tal como foi referido anteriormente, foi sobejamente criticado nos finais do século XIX e inícios do século XX, desenvolvendo-se a opinião generalizada de que esta industria sofria de uma imutabilidade que urgia alterar, que devia ser renovada de modo a acompanhar as dinâmicas de mercado e as inovações técnicas. Adelino das Neves e Mello313 refere que com os devidos melhoramentos «(…) podem as faianças de Coimbra equiparar-se ás melhores, sem terem na barateza competência». Enquanto António Augusto Gonçalves314 indica que essa estagnação se devia à «organização industrial, pela falta de educação, de elementos instuctivos e renovadores, pela incapacidade e endurecimento da temosia e da rotina, que se obstina em resistir às exigências

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continuando a ser produzida, mesmo quando a atividade já estava totalmente extinta nos restantes dois grandes centros de fabrico de Vila Nova (Gaia) e Lisboa, naquela que se tornou na última olaria tradicional de faiança em Portugal e num emblema de continuidade, quer das técnicas quer das tradições seculares que aí se praticaram.

da vida moderna, desvalorizando se pela inferioridade perante a economia domestica e a concorrência dos mercados». José Amado Mendes315 referiu-se a esta inadaptação afirmando que “A estrutura empresarial, de pequena indústria, característica do Antigo Regime económico, com um número de estabelecimentos razoável para o meio (entre 9 e 17) e um reduzido número de operários por cada um (por vezes inferior a 10), manteve-se desde final do século XVIII até ao fim da segunda década do século XX, aparentando assim uma considerável estagnação.” José Queirós em 1907 afirma que o movimento cerâmico de Coimbra estava a chegar à decadência316. Como tal, as tecnologias de fabrico utilizadas na olaria, não obstante serem encontrados alguns particularismos regionais, que se evidenciam em pequenas diferenciações – pequenas variações do material utilizado, distintas terminologias para os mesmos instrumentos ou diferente periodização das mesmas fases –, são também genericamente representativas do universo da produção tradicional de faiança portuguesa. De facto, as grandes diferenças entre os diferentes centros produtores eram a variabilidade no estilo e decoração, mais do que necessariamente nas formas ou nas técnicas de fabrico. A este nível, deve ser ainda considerado que a maior apetência das olarias coimbrãs para produções de menor qualidade não era sinónimo de uma insuficiência técnica, mas sim resultado apenas de uma opção comercial. Daí que a análise a esta olaria permita um maior conhecimento das técnicas de fabrico da faiança em Portugal, incluindo matérias-primas, sua transformação e aplicação, estruturas e processos de cozedura. Bastando para isso considerar que, atualmente, os fornos desta olaria são os únicos exemplares pré-industriais que se podem observar em território português ou, relativamente à distribuição dos espaços de produção dentro do edifício, esta ser a mais completa fonte, dada a sua aparente quase imutabilidade. A louça da «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» sobreviveu

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NOTAS

1 MENDES, 1984: 29.2 PAIS, et. al., 2007: 107.3 TAVARES, 1982: 15.4 LANGHANS, 1943: vol. I, XXIII, XXXII.5 LOUREIRO, 1960-1964: vol. II, 256-257.6 ALARCÃO, 2008: 186-187; LOUREIRO, 1955: 48-64; 1960-1964: vol. I, 292-297.7 ALARCÃO, 1979: 28-29; 2008: 33.8 Expressão utilizada numa escritura de arrendamento da fábrica de 1867. AUC, Tabelião José Maria da Silva Pereira de Melo Albuquerque, livro nº6 (1867-1868), fl. 25 – 26.9 AUC, RN, Tab. Justiniano Xavier Pinto da Silva, livro nº 5 (1823-1824), fl. 73v. – 74v.; AUC, Tabelião Justiniano Xavier Pinto da Silva, livro nº 5 (1823-1824), fl. 84v. – 86; AUC, Tabelião António Pádua e Oliveira, livro nº 16 (1854-1855), fl. 122v. – 123.10 AUC, RN, Tab. Justiniano X avier Pinto da Silva, livro nº 5 (1823-1824), fl. 73v. – 74v.11 AUC, RN, Tab. Justiniano Xavier Pinto da Silva, livro nº 5 (1823-1824), fl. 84v. – 86.12 AUC, RC, Freguesia de São João de Santa Cruz, livro nº7 (1812-1826).13 AUC, RN, Tab. Justiniano Xavier Pinto da Silva, livro nº8 (1826-1826), fl. 37v. – 38v.14 AUC, RN, Tab. Justiniano Xavier Pinto da Silva, livro nº 23 (1834-1835), fl. 36v. – 37.15 AUC, RN, Tab. Justiniano Xavier Pinto da Silva, livro nº 24 (1835-1835), fl. 24v. – 25v.16 AUC, GC, Copiador de correspondência expedida pela 2as e 3as repartições do Governo Civil para o Ministério do Reino (1839-1840), fls 128v.17 ALARCÃO, 2008: 186.

18 CAMPOS, 2012: 170-171.19 AUC, Tabelião José Pinto de Magalhães, livro nº 8 (1839-1840), fl. 81 – 82.20 AUC, Tabelião José Pinto de Magalhães, livro nº 8 (1839-1840), fl. 81 – 82.21 AUC, Tabelião José Pinto de Magalhães, livro nº 8 (1839-1840), fl. 81 – 82.22 AUC, RN, Tab. António Pádua e Oliveira, livro nº 16 (1854-1855), fl. 122v.-123.23 AUC, RN, Tab. António de Pádua e Oliveira, livro nº 19 (1857-1858), fl. 31-31v.24 AUC, RN, Tab. António de Pádua e Oliveira, livro nº 20 (1858-1859), fl. 198v.-200.25 SILVA, 1861: 18.26 AUC, RN, Tab. José Maria da Silva P. de Melo e Albuquerque, Livro nº6 (1867-1868), fls. 25 - 2627 AUC, RN, Tab. Joaquim Nobre Soares, livro nº 1 (1860-1873), fl. 34v.-36v.28 AUC, RN, Tab. Augusto Gomes Pimentel, livro nº8 (1873-1874), fl. 52v.-53. GREGÓRIO, 1991/92: 11.29 AUC, IO, Adelino Augusto Pessoa, maço 16, nº 1306, fl. 27v.30 MENDES, 1982: 35; PAIS, et. al., 2007: 151.31 AUC, RN, Tab. Joaquim António Rodrigues Nunes, livro nº 33 (1896-1897), fls. 65v-67. MENDES, 1982: 35.32 GREGÓRIO, 1991/92: 1233 LEPIERRE, 1899: 12.34 MENDES,1984: 17335 AUC, RN, Tab. Joaquim António Rodrigues Nunes, livro nº 36 (1898-1899), fls. 28v-29.36 AUC, RN, Tab. Joaquim António Rodrigues Nunes, livro nº 36 (1898-1899), fls. 29-31.37 MENDES, 1982: 35.38 QUEIRÓS,1907: 430.39 MENDES, 1982: 36.40 GREGÓRIO, 1991/92: 12.

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41 GREGÓRIO, 1991/92: 12.42 AUC, GC, «Estabelecimentos insalubres, incómodos e perigosos», processo nº99. MENDES, 1982: 36.43 AABPC, Cartas, Expediente Diverso, «País», B, 1924-1925.44 MENDES, 1982: 36.45 AUC, GC, Ministério do Comércio e das Comunicações, Direcção Geral das Industrias, «Indústrias insalubres, incómodas, perigosas ou tóxicas», processo nº 17, p. 861. GREGÓRIO, 1991/92: 13.46 DP, Carta, Segunda Circunscrição Industrial, nº 342, 19-1-1942 (policopiado).47 GREGÓRIO, 1991/92: 13.48 DP, «Diário de Coimbra», dia 8 de Janeiro de1965, pp. 1 e 11 (policopiado).49 AUC, RN, Tab. Américo Gomes de Andrade e Oliveira, (02-1965 a 04-1965), fl. 48-51.50 AUC, RN, Tab. Américo Gomes de Andrade e Oliveira, (02-1965 a 04-1965), fl. 49v.51 DP, RN, Tab. Américo Gomes de Andrade e Oliveira, (1965), fl. 160 (policopiado).52 Segundo nota na margem do documento: AUC, RN, Tab. Américo Gomes de Andrade e Oliveira, (02-1965 a 04-1965), fl. 48-49.53 PAIS, et. al., 2007.54 MENDES, 1982: 33; GONÇALVES, 1884: 40; MELLO, 1886: 35; LEPIERRE, 1899: 119 e 121; QUEIRÓS, 1949: 134.55 SEBASTIAN, 2010: 216.56 LEPIERRE, 1899: 119.57 Segundo o testemunho de Vitorino Miguel Ferreira que foi oleiro na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» e filho de Vitorino Ferreira, antigo forneiro e jaulista na mesma olaria.58 LEPIERRE, 1899: 119.59 THEMUDO, 1905: 79-80.60 Segundo o testemunho de Armando Oliveira que começou a trabalhar na

«Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» em 1966.61 LEPIERRE, 1899: 119.62 MELLO, 1924: 36.63 PAIS, 1998; SARDINHA, 1998; ALMEIDA, 1998.64 LEPIERRE, 1899: 119; PAIS, et. al., 1998: 27.65 LEPIERRE, 1899: 119.66 THEMUDO, 1905: 80.67 SILVA, 1804: 191.68 ESTEVES, 2003: 166.69 FERNANDES; REBELO, 2008: 171.70 THEMUDO, 1905: 80.71 Segundo o testemunho de José Duarte Lucas que trabalhou 10 anos na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.», tendo começado em 1970.72 BERNARDA, 2001: 33.73 LEPIERRE, 1899: 121-122.74 THEMUDO: 181.75 CUNHA, 2003: 28-32, 75-79.76 MELLO, 1924: 31.77 CARVALHO, 1921: 155-156.78 Arquivo da Câmara Municipal de Coimbra, «Vereações», 1576-1577, fls. 69v.º, 70, 70v.º e 7179 GONZÁLEZ: 1944: 25.80 O oleiro Brás Eanes solicita à coroa autorização para explorar uma mina abandonada, aparentemente rica em alcanfor, para seu emprego nos vidrados (DUARTE, 1995: 96).81 PAIS; MONTEIRO, 1998: 28.82 SEBASTIAN, 2010: 343.83 SILVA, 1804: 94; HAMER; HAMER, 1997: 18; FERNANDES, 2008b: 62, 66.84 CARDOSO, 1959: 61, 186-187.85 CARDOSO, 1959: 61, 186-187.86 THEMUDO, 1905: 81.

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87 SILVA, 1804: 93.88 XAVIER, 1805: 18-19.89 LEPIERRE, 1899: 126.90 THEMUDO, 1905: 181.91 Segundo o testemunho de Armando Oliveira, pintor na «Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.» Começou a trabalhar na olaria com 12 anos de idade, tendo 41 anos de casa, começados em 1966.92 PICCOLPASSO, 2007: 71; SILVA, 1804: 93-94; LÚCIO,1844: tomo IV, 334-335; XAVIER,1805: 18-19.93 SILVA, 1804: 93-94; XAVIER, 1805: 18; LEPIERRE, 1899: 121-122; THEMUDO, 1905: 81.94 LEPIERRE, 1899: 121-122.95 PICCOLPASSO, 2007: 76-77; XAVIER, 1805: 21.96 AUC, Tab. António de Pádua e Oliveira e António Maria de Oliveira, livro número 48, fls. 75v-76v. MENDES, 1982: 35.97 Ministério da Industria e Energia, «“Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.»», Processo nº 1, fl. 16.98 Ministério da Industria e Energia, «“Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.»», Processo nº 1, fl. 16.99 BERNARDA, 1992: 13.100 Ministério da Industria e Energia, «“Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda.»», Processo nº 1, fl. 16.101 GREGÓRIO, 1991/92: 47.102 LEPIERRE, 1899: 115.103 THEMUDO, 1905: 181.104 AUC, Tab. António de Pádua e Oliveira e António Maria de Oliveira, livro número 48, fls. 75v-76v.105 LEPIERRE, 1899: 128.106 BERNARDA, 1992: 13.107 CARDOSO, 1959: 73-74; HAMER; HAMER, 2004: 226-228.108 LEPIERRE, 1899: 130.

109 DUARTE, 1995: 78-79; VITORINO, 2002: s. n. p..110 CARDOSO, 1959: 264.111 XAVIER, 1805: 10; LEPIERRE, 1899: 120; CARDOSO, 1959: 105; RICE, 1987: 128-132; FERNANDES, 2008a: 27.112 FERNANDES; REBELO, 2008: 131.113 BIRINGUCCIO, 1540: Livro IX, Capítulo XIV, fl. 146; SMITH; GNUDI, 1990: 394, fig. 76; PICCOLPASSO, 2007: 58, 60-61; SILVA, 1804: Est. I, fig. 15, 16 e 17; XAVIER, 1805: Est. IV, fig. 1, 5, 6, 7 e 8; PROSTES, 1907: 136, fig. 69, 138, fig. 72.114 PROSTES, 1907: 155.115 XAVIER, 1805: 10-13.116 XAVIER, 1805, 11, 91, Est. IV, fig. 11; PROSTES, 1907: 137, fig. 70; RICE, 1987: 131-132; ELIAS, 1996: 11; FERNANDES; REBELO, 2008: 123.117 SILVA, 1804: 188.118 XAVIER, 1805: 91, Est. IV, fig. 9.119 PICCOLPASSO, 2007: 58, 65.120 SILVA, 1804: 61, 188, 196.121 XAVIER, 1805: 12; PROSTES, 1907: 136.122 BERNARDA, 2001: 35.123 CORREIA, 1965: 45-46; ELIAS, 1996: 12; FERNANDES, 2008a: 27-28; FERNANDES; REBELO, 2008: 131.124 RICE, 1987: 129.125 A boneca corresponde geralmente a uma bola de pano enchida com areia, podendo possuir ou não cabo de madeira.126 ESTEVES, 2003: 166.127 SILVA, 1804: 82-83; XAVIER, 1805: 15-16, 93, Est. V, fig. 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21; THEMUDO, 1905: 79; PROSTES, 1907: 164, fig. 89; CARDOSO, 1959: 105-106; FERNANDES, 2008a: 28-29; FERNANDES; REBELO, 2008: 139-140.128 CARDOSO, 1959: 105-106; FERNANDES; REBELO, 2008: 140.129 Segundo o testemunho de José Duarte Lucas.

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130 FERNANDES, 2008a: 27; FERNANDES; REBELO, 2008: 123.131 SILVA, 1804: 74.132 PROSTES, 1907: 56; CARDOSO, 1959: 106.133 XAVIER, 1805: 16-17.134 LEPIERRE, 1899: 122; THEMUDO, 1905: 80; MELLO, 1924: 35.135 SILVA, 1804, 96; BRAGA; SEABRA, 1967: 5; HAMER, 2004: 26.136 CANOTILHO, 2003: 83; ALARCÃO, 2004: 47.137 BERNARDA, 1992: 13.138 LEPIERRE, 1899: 67.139 RHODES, 1977: 36-37; RICE, 1987: 158-162; CANOTILHO, 2003: 83; ALARCÃO, 2004: 47.140 SMITH; GNUDI, 1990: 393.141 PICCOLPASSO, 2007: 74.142 LEPIERRE, 1899: 13; BRAGA; SEABRA, 1967: 5; RHODES, 1977, 83.143 SILVA, 1804: 15-16; PROSTES, 1907: 58; ESTEVES, 2003: 145.144 CANOTILHO, 2003: 95.145 RHODES, 1977: 93; CANOTILHO, 2003: 97-98.146 RHODES, 1977: 92-93; CANOTILHO, 2003: 104, 106, 109-111.147 RHODES, 1977: 93.148 SILVA, 1804: 86-90.149 CANOTILHO, 2003: 128.150 Planta de Fábrica de António Cardoso de Carvalho de 1915. AUC Governo Civil _ Licenças para estabelecimentos industriais 1915, Processo nº 99.151 LEPIERRE, 1899: 125.152 THEMUDO, 1905: 181.153 THEMUDO, 1905: 83.154 CARVALHO, 1917: 457- 458, Documento XLIII.155 THEMUDO, 1905: 81.156 LEPIERRE, 1899: 125.157 THEMUDO, 1905: 81.158 LEPIERRE, 1899: 125.

159 PICCOLPASSO, 2007: 74.160 LEPIERRE, 1899: 125.161 BERNARDA, 2001: 44.162 SMITH; GNUDI, 1990: 393.163 PICCOLPASSO, 2007: 74, 92.164 SILVA, 1804: 86- 90, 197.165 XAVIER: 19-20.166 SILVA, 1804: 98.167 LEPIERRE, 1899: 125.168 THEMUDO, 1905: 181.169 PROSTES, 1907: 207.170 CARDOSO, 1959: 243.171 PICCOLPASSO, 2007: 87.172 LÚCIO, 1844: tomo VI, 330; THEMUDO, 1905: 181; PROSTES, 1907: 206; CARDOSO, 1959: 244.173 PICCOLPASSO, 2007: 87.174 PICCOLPASSO, 2007: 87.175 PROSTES, 1907: 206.176 CANOTILHO, 2003: 40.177 CARDOSO, 1959: 255, 263-264.178 PROSTES, 1907: 231-232; CARDOSO, 1959: 252-254, 270; PAIS et. al., 2007: 126.179 THEMUDO, 1905: 79.180 PROSTES, 1907: 226, fig. 118.181 ESTEVES, 2003: 166.182 LEPIERRE, 1899: 124; THEMUDO, 1905: 80.183 LÚCIO, 1844: tomo VI, 324, 331; LEPIERRE, 1899: THEMUDO, 1905: 81; 125; PROSTES, 1907: 132; ESTEVES, 2003: 166-167.184 SILVA, 1804, 96; PROSTES, 1907: 192; BERNARDA, 2001: 38; ESTEVES, 2003: 167; PICCOLPASSO, 2007: 64.185 PROSTES, 1907: 132, 192; ESTEVES, 2003: 167.

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186 BERNARDA, 2001: 43-44.187 PROSTES, 1907: 134.188 BERNARDA, 2001: 38.189 LEPIERRE, 1899: 125.190 LEPIERRE, 1899: 125.191 CANOTILHO, 2003: 44-45.192 PROSTES, 1907: 188.193 HAMER; HAMER, 2004: 77.194 LEPIERRE, 1899: 129.195 PROSTES, 1907: 242; CARDOSO, 1959: 187; WATSON, 1986: 16; BERNARDA, 2001: 42; CANOTILHO, 2003: 37; PAIS et al., 2007: 126.196 CANOTILHO, 2003: 39-42.197 XAVIER, 1805: 19-20.198 BERNARDA, 2001: 44.199 CANOTILHO, 2003: 33.200 BERNARDA, 2001: 44.201 LEPIERRE, 1899: 125.202 AUC, GC, Copiador de correspondência expedida pela 2as e 3as repartições do Governo Civil para o Ministério do Reino (1839-1840), fls. 128v.203 AUC, RN, Tab. António de Pádua e Oliveira e António Maria de Oliveira, Livro Nº 48, fl. 75 - 76v.204 Revista Ilustrada da Exposição Distrital de Coimbra de 1884, Coimbra, Typ. de M. C. Silva, 1884.205 PAIS, et. al., 1998: 10.206 MENDES, 1982: 33.207 MENDES, 1982: 36.208 PACHECO, 2015: 85.209 PACHECO, 2015: 90.210 PACHECO, 2015: 96.211 PACHECO, 2015: 102-113.212 PACHECO, 2015: 89-131.

213 Segundo o testemunho de José Duarte Lucas, Armando Oliveira e Júlia Santos.214 PACHECO, 2015: 123.215 PACHECO, 2015: 35.216 SOARES, 1959: 140.217 PAIS, 2003: 298.218 PAIS, 2003: 215.219 PAIS, 2003: 227; SCHNYDER, 2003: 130-132.220 PACHECO, 2015: 58-64.221 PACHECO, 2015: 127.222 AUC, GC, Copiador de correspondência expedida pela 2as e 3as repartições do Governo Civil para o Ministério do Reino (1839-1840), fls 128v.223 SILVA, 1861: 18.224 THEMUDO, 1905: 82.225 Ministério da Industria e Energia, Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda., Processo nº1, Requerimento de Alfredo de Oliveira de 1926 para que o Alvará da fabrica seja averbado em seu nome. Citado por GREGÓRIO, 1991/92: 11.226 Ministério da Industria e Energia, Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda., Processo nº2 (…). Citado por GREGÓRIO, 1991/92: 11.227 Documento da Sociedade Cerâmica Antiga de Coimbra, Lda., dirigido ao Diretor da Delegação de Coimbra do Ministério da Industria e Tecnologia. Citado por GREGÓRIO, 1991/92: 11.228 Segundo o testemunho de José Duarte Lucas.229 GREGÓRIO, 1991/92: 11.230 LOUREIRO, 1937: 137.231 «Regimento da procissão do Corpo de Deus, acordado pelos Regedores da cidade em que se estabe-lece a ordem e a apresentação de cada grupo de ofícios» de 10 de junho 1517 (LOUREIRO, 1937)232 Na vereação da Câmara de Coimbra de 17 de Março de 1526 foi deliberado que as bandeiras dos ofícios «assim as velhas como as novas» passassem a ficar

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na Câmara (LOUREIRO, 1937:160-162). Na de 12 de Dezembro de 1750 foi deliberado que «os juízes mandassem fazer outra nova [bandeira] na forma do seu estilo» (O Conimbricense, nº 2431, 12 de Novembro de 1870: 3).233 QUEIRÓS, 1948: 44.234 OLIVEIRA, 1963: 557.235 AMC, Vereações, 1620-1624, fls. 238 v.º e segs.236 PATRIARCA, 1994: 805.237 Boletim do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, nº 18, 30 de Setembro de 1942: 456.238 Boletim do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, nº 18, 30 de Setembro de 1942: 456.239 Diário da República, série II, nº 143, 18 de Junho de 1962: 4355.240 BINTP, nº 24, 29 de Junho de 1972: 2480-2481.241 THEMUDO, 1905: 82.242 BINTP, nº 18, 30 de Setembro de 1942: 460243 DR, série II, nº 143, 18 de Junho de 1962: 4354; BINTP, nº 24, 29 de Junho de 1972: 2479.244 LEPIERRE, 1899: 115.245 THEMUDO,1905: 82.246 BINTP, nº18, 30 de Setembro de 1942: 460; DR, série II, nº 143, 18 de Junho de 1962: 4354; BINTP, nº 24, 29 de Junho de 1972: 2478.247 BINTP, nº18, 30 de Setembro de 1942: 460; DR, série II, nº 143, 18 de Junho de 1962: 4354; BINTP, nº 24, 29 de Junho de 1972: 2478.248 DR, série II, nº 143, 18 de Junho de 1962: 4354; BINTP, nº 24, 29 de Junho de 1972: 2478.249 DR, série II, nº 143, 18 de Junho de 1962: 4353; BINTP, nº 24, 29 de Junho de 1972: 1477.250 BINTP, nº18, 30 de Setembro de 1942: 460; DR, série II, nº 143, 18 de Junho de 1962: 4354; BINTP, nº 24, 29 de Junho de 1972: 2478.251 BINTP, nº18, 30 de Setembro de 1942: 460; DR, série II, nº 143, 18 de Junho de 1962: 4354; BINTP, nº 24, 29 de Junho de 1972: 2479.

252 LEPIERRE, 1899: 115.253 DR, série II, nº 143, 18 de Junho de 1962: 4354; BINTP, nº 24, 29 de Junho de 1972: 2479.254 THEMUDO,1905: 82.255 DR, série II, nº 143, 18 de Junho de 1962: 4354; BINTP, nº 24, 29 de Junho de 1972: 2477.256 SILVA, 1861: 18.257 PACHECO, 2015: 86-125.258 LEPIERRE, 1899: 115.259 CARVALHO, 1917a: 454.260 CARVALHO, 1918: 150; CARVALHO, 1921: 131.261 THEMUDO, 1905: 82.262 Segundo o testemunho de Vitorino Miguel Ferreira.263 Segundo o testemunho de José Duarte Lucas.264 Segundo o testemunho de Armando Oliveira.265 MENDES, 1982: 38.266 BMC, Vereações, vol. 45, fls. 238v-239v267 BINTP, nº18, 30 de Setembro de 1942: 460268 Diário da República, série II, nº 143, 18 de Junho de 1962: 4355.269 BINTP, nº 24, 29 de Junho de 1972: 2481270 SILVA, 1861: 18.271 LEPIERRE, 1899:115.272 THEMUDO, 1905: 82.273 AMC, Vereações, vol. 42, fl. 128v. Citado por OLIVEIRA, 1971, p. 48.274 AMC, Posturas e correções, título 229. Citado por OLIVEIRA, 1971, p. 486.275 UCBG, Gazeta de Coimbra, nº 179, 22 de Março de 1913.276 BINTP, nº18, 30 de Setembro de 1942: 458.277 BINTP, nº18, 30 de Setembro de 1942: 460.278 Diário da República, série II, nº 143, 18 de Junho de 1962: 4362-4363279 BINTP, nº 24, 29 de Junho de 1972: 2493-2494280 THEMUDO, 1905: 82.

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281 OLIVEIRA, 1971: 484-485.282 CARVALHO, 1917b: 226.283 BINTP, nº18, 30 de Setembro de 1942: 459.284 Diário da República, série II, nº 143, 18 de Junho de 1962: 4362-4363.285 BINTP, nº 24, 29 de Junho de 1972: 2493-2494.286 AUC, GC, Copiador de correspondência expedida pela 2as e 3as repartições do Governo Civil para o Ministério do Reino (1839-1840), fls 128v.287 THEMUDO, 1905: 82.288 GREGÓRIO, 1991/92: 22.289 AMC, Vereações, 1620-1624, fls. 238 v.º e segs. CARVALHO, 1917b: 204.290 PAIS, 2012: 155.291 AHMC, Livro da Correia, vol. I, 1554, fl. 176 e segs. Transcrito em LOUREIRO, 1936-1937: 141.292 OLIVEIRA, 1971: 415.293 MELLO, 1886: 29; CARVALHO, 1921: 144-145.294 PAIS, et. al., 2007: 31.295 CARVALHO, 1921: 145-146; PAIS, et. al., 2007: 32.296 TAVARES, 1982: 19; MENDES, 1982: 26.297 OLIVEIRA, 1971: 1.298 PAIS, et. al., 2007: 54-57.299 MENDES, 1982: 33; PAIS, et. al., 2007: 107-108.300 TAVARES, 1982: 19.301 SILVA, 1861: 5.302 MENDES, 1982: 37.303 MENDES, 1982: 37-38.304 PAIS, 2007: 64.305 TEIXEIRA, 1861: 5; MENDES, 1982: 36; DÓRDIO, et. al., 2001: 150; GOMES, et. al., 2013: 149.306 MENDES, 1982: 26.307 CASIMIRO, 2010: 724-726.308 GOMES, et. al., 2013.

309 DÓRDIO, et. al., 2001: 150; GOMES, et. al., 2013: 112.310 TEIXEIRA, 1861: 5; DÓRDIO, et. al., 2001: 150; ALBUQUERQUE, 2001; GOMES, et. al., 2013: 149.311 PAIS, et. al., 2007: 123.312 PAIS, et. al., 2007: 53.313 MELLO, 1886: 35.314 GONÇALVES, 1899: 16.315 MENDES, 1982: 40.316 QUEIRÓS, 2002: 134.

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FONTES

Manuscritas

•Arquivo da Universidade de Coimbra (AUC) Livros ■ Registos Notariais (RN) Tab. Justiniano Xavier Pinto da Silva - livro nº 5 (1823-1824) - livro nº8 (1826-1826) - livro nº 23 (1834-1835) - livro nº 24 (1835-1835) Tab. José Pinto de Magalhães - livro nº 8 (1839-1840) Tab. António Pádua e Oliveira - livro nº 16 (1854-1855) - livro nº 19 (1857-1858) - livro nº 20 (1858-1859) Tab. José Maria da Silva P. de Melo e Albuquerque - livro nº6 (1867-1868) Tab. Joaquim Nobre Soares - livro nº 1 (1860-1873) Tab. Augusto Gomes Pimentel - livro nº8 (1873-1874) Tab. Joaquim António Rodrigues Nunes - livro nº 33 (1896-1897) - livro nº 36 (1898-1899)

■ Registos de Casamentos (RC) Freguesia de São João de Santa Cruz - livro nº7 (1812-1826).

■ Governo Civil (GC) Correspondência - do Governo Civil para o Ministério do Reino (1839- 1840) “Estabelecimentos insalubres, incómodos e perigosos”, processo nº99 “Indústrias insalubres, incómodas, perigosas ou tóxicas”, processo nº 17

■ Inventários Orfanológicos (IO) Adelino Augusto Pessoa - Maço 16, nº 1306

Impressas

Boletim do Instituto Nacional do Trabalho e Previdência (BINTP) - nº 18, 30 de Setembro de 1942 - nº 24, 29 de Junho de 1972 Diário da República (DR) - série II, nº 143, 18 de Junho de 1962 Gazeta de Coimbra - nº 179, 22 de Março de 1913 O Conimbricense - nº 2431, 12 de Novembro de 1870

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BIBLIOGRAFIA

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(ALARCÃO, 2004)ALARCÃO, Jorge de - Introdução ao estudo da tecnologia romana. In Cadernos de Arqueologia e Arte. Coimbra: Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, Instituto de Arqueologia. n.º 7. 2004.

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ANEXOS

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1824 - Tabelião Justiniano Xavier Pinto da Silva, livro nº5, de 18 de Novembro de 1823 a 26 de Agosto de 1824, fl. 73v. - 74v.

Escriptura de arrendamento por tempo de dés anos que fás Joaquim Freire digo que fás António Freire de Macedo, Negociante desta Cidade como administrador dos bens de seu irmão Joaquim Freire de Macedo a Joaquim da Silva, Pintor de Louça desta Cidade

Saibão quantos este publico Instrumento e Contracto de arrendamento por tempo de dés anos conptados e acabados, obrigação fianssa e asseitassão ou como em Direito melhor dizer se possa e valido for virem que sendo no anno de Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil oitocentos e vinte e quatro aos dois de Junho do dito anno nesta Cidade de Coimbra, e loga de Negocio de Antonio Freire de Macedo Negociante da mesma honde eu Tabellião vim chamado ahi sendo o mesmo prezente e bem assim estava Joaquim da Silva Pintor de Louça desta mesma Cidade e ambos pessoas conhecidas de mim Tabellião e das testemunhas deste Instrumento no fim nomeadas e assignadas pelos proprios de que dou fé na prezença das quais pelo ditto António Freire de Macedo foi me dito que elle éra administrador dos bens de seu irmão Joaquim Freire de Macedo, e entre os quais lhe pertenssem há hum assim Huma caza que foi um Lagár ao fundo da Rua Direita desta dita Cidade, a qual pello prezente Instrumento na qualidade de administrador dos bens do dito irmão dá do arrendamento ao dito Joaquim da Silva para elle na mesma construir huma fabrica de loussa, por tempo de dés anos que hão de ter seo principio por dia de São João do corrente anno de mil oitocentos e trinta e quatro por preço em cada hum dos dittos annos de vinte mil reis metal por que pagando na forma pagarão do mais o rebate que então tiver a moeda papel, sendo os pagamentos em dois quarteis primeiro no Natal, e segundo por dia de São João

de cada hum dos ditos annos sem falta ou isterpulação de um para outro paga-mento, com declaração de que não abonará ao arrendatario despezas algumas que fassa para construir aquella Fabrica tão somente os reparos dos Telhados que quando forem precizos elle arrendatario lhe fará avizo para os mandar construir não sendo o estrago cauzado pelo mesmo arrendatario o que comprin-do este o que se declara e não fazendo máu uzo do Predio arrendado se obriga pelos bens que administra a fazer bom contracto ao dito arrendatario pellos annos que se declarão: e que sendo o ouvido pello mesmo arrendatario este na prezenssa das mesmas testemunhas me disse asseitava este arrendamento com as condissoens referidas esse obrigava a pagár como se declara a renda annual de vinte mil reis metal nos respetivos tempos que declarados ficão á satisfassão do que disse obrigava e hypotecava todos os seos bens moveis e de rais prezentes e foturos em geral, com declaração de que no fim do seo arrendamento não ficando na dita caza poderá della levár todos os arranjos que ai farão para o estabellecimento da Fabrica, ou querendo elle senhorio do Predio ficar com elles será obrigado a pagar-lhos pelo que legalmente for avaliado, e que oferecia por seo fiador e principal pagador seo irmão Vissente da Cunha Pintor de Louça desta dita Cidade o qual hé igualmente de mim conhecido e das ditas testemu-nhas de que dou fé e na presença destas me disse de sua propria livre vontade ficava por fiador e principal pagador do dito arrendatario pelo qual se obrigava a pagar renda anual de vinte mil reis metal pelo Predio que se declara nos dés anos de seo arrendamento e satisfassão do que disse obrigava a hypotecar todos os seus bens em expecial humas cazas na Rua Tinge Rodilhas desta Cidade que partem com Sebastiana Maria e com Joaquina da Costa e sua irmãa Maria da Costa desta Cidade, as quais érão suas proprias livres e dezembargadas e assim as daria á exemssão revendo-o com declaração de que esta expessial hypoteca não der rogue a geral dos mais seos bens e que se sujeitava ás mais condissões do contracto e ás Leis dos fiadores e principais pagadores – Assim o outorgarão

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A ÚLTIMA OLARIA DE FAIANÇA DE COIMBRA

e mandarão escrever nesta minha Nota de que concederão os treslados neces-sarios que asseitarão e eu lhe tomei estipulei e asseitei quanto em direito dono e posse testemunhas prezentes que assignarão com os outorgantes depois deste ouvirem ler Bento Joze Rodrigues Negociante desta Cidade e seo caixeiro Ma-noel Antonio Romão Justiniano Xavier Pinto da Silva Tabellião que o escrevi

Antonio Freire de MacedoJoaquim da SilvaVicente da Cunha

testemunhas Bento Joze Rodrigues Manoel Antonio Romão

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A ÚLTIMA OLARIA DE FAIANÇA DE COIMBRA

1824 - Tabelião Justiniano Xavier Pinto da Silva, livro nº5, de 18 de Novembro de 1823 a 26 de Agosto de 1824, fl. 84v. - 86.

Escriptura de Arendamento por tempo de 10 annos que fás o Reverendo Prior de Santa Justa Joze Ferreira Cardozo a Joaquim Ignacio e outros desta Cidade

Saibão quantos este publico Instrumento e Contracto de arendamento por tem-po de dés anos completos e acabados ou como em direito melhor dizer se possa e valido for virem que sendo no anno de Nascimento de Nosso Senhor Jesus Christo de mil oitocentos e vinte e quatro aos tres de Julho do dito anno nesta Cidade de Coimbra Rua Direita e cazas da residencia do Reverendo Doutor Joze Ferreira Cardozo actual Prior da Igreja de Santa Justa desta dita Cidade a honde eu Tabellião vim chamado ahi sendo o mesmo prezente e bem assim estava Joaquim Ignacio e seo irmão Joaquim a Silva, a Joanna de Mesquita e sua sobrinha Angelina Ludovina faltarias, todos pessoas conhecidas de mim Tabellião e das testemunhas no fim deste Instrumento nomeadas e assignadas pelos proprios de que dou fé na prezença das quais pelo dito Reverendo Prior me foi dito que elle pegado ás cazas de sua rezidencia tem hum Quintal com serventia para o Terreiro de Santa Justa a velha de que anda de posse e que fás parte da mesma sua rezidencia, e que assim e da mesma forma que o possue com aquella serventia estava justo e contratado com os ditos Joaquim Ignacio – Joaquim da Silva – Joanna de Mesquita e Angelina Ludovina de lho arren-dar como com efeito pelo prezente Instrumento arrendado tem por tempo de dés anos que hão de ter seo principio por dia de Sam Bartolomeu do prezente anno a findar em outro tal dia do anno de mil oitocentos e trinta e quatro, com preço em cada hum dos ditos anos de quarenta e oito mil reis dinheiro de metal pagos em dois pagamentos iguais de seis em seis mezes a contar daquele

dito dia, cujo Quintal hé para os ditos arendatários nelle construirem Barreiros, com comunicassão para a caza que outro tempo foi Lagar e pertence a Joaquim Freire de Macedo desta Cidade, onde os ditos arrendatarios vão construir huma Fabrica de Louça – cujo arrendamento lhe fazia na ditta forma com as condis-sões seguintes – Que os pagamentos da renda serão feitos impreterivelmente na dita forma de seis em seis mezes a cada um de vinte e quatro mil reis metal nos dés anos deste arrendamento que pagando algum delles na forma da Ley darão do mais o rebate que então tiver a moeda papel – Que os frutos pendentes per-tencem a elle senhorio – Que autoriza aos ditos arrendatarios para que possão fazer comunicarnal a Caza onde vão construir a fabrica com o Quintal abrindo para essa porta o qual findo este arrendamento taparão pondo a no estado em que antes de aberta se achava – Que tudo quanto fizerem no Quintal para os seos arranjos da Fabrica, tão bem no fim deste arrendamento tornarão a redu-zir ao estado em que oje se acha, e tudo isto como quaisquer obras que fassão à própria custa e despeza dellas arrendatarios sem obrigação delle senhorio por cazo algum lhe levar nada dessas despezas em conta – Que não poderão cortár as Parreiras, nem arvore alguma existente no dito Quintal o que com o moro razo que se vai a fazer do ditto Quintal, não deverá de forma alguma deteriorár as suas Arvores e Parreiras, as quais serão amanhadas nos devidos tempos, e a poda feita á vontade delle senhorio o que este poderá mandár fazer á sua vontade, e a despeza por conta delles arrendatarios, os quais serão obrigados por qualquer danno que lhe fizerem no dito Quintal, e que legitimamente for arbitrado, do qual deverão tratar com zello como se fosse seo – E que pela falta a qualquer das condissoens referidas poderá elle senhorio renovar este arren-damento por conta e risco delles arrendatarios se ouver deminuissão, porque se ouver aumento será para elle senhorio, mas que cumprindo com o que dito fica se obriga a fazer lhe este arrendamento bom por sua pessoa e bens – o que sendo ouvido pelos ditos arrendatarios por elles e por cada hum insolidum me foi dito

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A ÚLTIMA OLARIA DE FAIANÇA DE COIMBRA

na prezenssa das mesmas testemunhas que todos digo testemunhas asseitavão este arrendamento com todas as condissões e clauzulas que ficão declaradas que se obrigavão cumprir, e ao pagamento da renda anual e quarenta e oito mil reis metal nos tempos que se declarão cada hum pelo mais bem parado e todos obrigavão e hypotecavão todos os seos bens moveis e de rais prezentes e foturos em geral, e as ultimas duas outorgantes disserão que em especial obrigavão e hypotecavão = Humas cazas na Rua Direita desta dita Cidade de que partem de huma banda com Rua publica e da outra com Pateo das Cazas dos Castil-ho, cuja propriedade disserão éra sua própria livre e dezembargada e assim a darião á exemssão revendo-a com delcarassão de que esta especial hypoteca não derrogue a geral dos mais seos bens – E para maior segurança davão por seo fiador e principal pagador a Antonio Rodrigues Lucas Negociante desta Cidade o qual sendo prezente que hé igualmente de mim conhecido e das ditas testemunhas de que dou fé na presença destas por elle me foi dito que de sua propria e livre vontade como fiador e principal pagador dos ditos arrenda-tarios tomava em si a obrigassão destas sujeitandose a todas as clauzulas e condissoens deste contrato como elles se havião obrigado e ás Leis dos fiadores e principais pagadores e ao pagamento e satisfação de tudo disse obrigava e hypotecava todos os seus bens moveis e de rais prezentes e futuros em geral – assim outorgarão e mandarão escrever nesta minha nota de que concederão os treslados necessarios que asseitarão e eu lhe tomei estipulei e asseitei quanto em direito dono e posse – E porque duvidou obrigasse ao referido Fiador Antonio Rodrigues Lucas em lugar deste foi prezente Vicente da Cunha Pintor de Louça desta ditta Cidade que conhesso pelo proprio de que dou fé e na presença das testemunhas deste mesmo Instrumento me disse que de sua própria e livre vontade ficava por fiador e primeiro pagador dos ditos arrendatarios e toma-va sobre si a obrigação destes sujeitandose a todas as clauzulas e condissoens deste contracto como elles se havião obrigado a ás Leis dos fiadores e principais

pagadores – o que foi asseite pelo tido digo pagadores ao pagamento e satisfação do que disse obrigava e hypotecava todos os seos bens presentes e foturos em geral – o que ultimamente foi asseite pelo dito senhorio – nesta forma assig-narão sendo testemunhas prezentes os Bacharel Antonio Ferreira da Silva e Mello e Francisco Joze Leite ambos desta dita Cidade, e a rogo das outorgantes mulheres e arrendatarias por ella lho rogarem e dizerem não sabião escrever o assignou Antonio Joze Soares desta mesma cidade a todos depois deste ouvirem ler Justiniano Xavier Pinto da Silva Tabellião o escrevi

o Prior Joze Ferreira Cardozoa rogo das arrendatarias Antonio Joze Soares

Joaquim da SilvaJoaquim Ignacio

Vicente da CunhaAntonio Freire da Silva e Mello

Francisco Joze Leite

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A ÚLTIMA OLARIA DE FAIANÇA DE COIMBRA

1839 - Tabelião José Pinto de Magalhães, livro nº8, de 2 de Julho de 1839 a 6 de Maio de 1840, fl. 79v. - 80v.

Escriptura de contrato de cedencia que faz Joaquim da Silva e sua mul-her Marianna de Jezus, desta Cidade, com seu filho Leonardo Ferreira da Cunha, por ocazião do Cazamento que este tem contratado com Narciza Marcia da Silva Cortezão, do logar de Lavarrabos.

Saibão os que este publico Instrumento de contracto e cedencia na forma ao diante declarada ou como em Direito melhor dizer se deva e mais firme e valioso for virem, que sendo no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jezus Christo de mil oito centos e trinta e nove, aos dezanove dias do mez de Dezem-bro do dito anno nesta Cidade de Coimbra em meu Escriptorio apparecerão presentes, de huma parte Joaquim da Silva e sua mulher Marianna de Jezus, moradores na rua de Tinge Rodilhas, Freguezia de Santa Cruz, e da outra seu filho Leonardo Ferreira da Cunha, que vive na companhia dos ditos seus Paes, pessoas reconhecidas pelas próprias de mim Tabellião e das testemunhas deste Instrumento ao diante nomeadas e no fim assignadas de que dou fé; e perante estas por aquelle Joaquim da Silva e sua mulher, cada hum de persi e ambos e insolidum a mim Tabellião foi dito, que tendo seu filho o dito Leonardo Ferrei-ra da Cunha, contratado e justo o seu Cazamento conforme as Leis do Reino com Narciza Marcia da Silva Cortezão, filha de Joze da Silva Lobato Cortezão do Logar de Lavarrabos, elles Outorgantes não só davão o seu consentimento Esponsaes, por ser couza muito da sua vontade, mas tambem se obrigavão e por este publico Instrumento obrigados ficão a cooperar e suavizar os encargos de semelhante Matrimonio pela forma e maneira seguinte a saber: que se o dito seu filho chegar a effectuar o cazamento com a dita Narciza Marcia da Silva Cortezão, elles Outorgantes se obrigão a ter o dito seu filho com a dita

sua mulher, em sua caza e na sua companhia, dando-lhes elles Outorgantes de comer e beber, vistir e calçar, e tudo o mais necessario para a vida, por tempo de anno e meio somente, a contar do dia do seu recebimento á face da Igreja, e findo que seja este tempo, delle por diante, e desde já para então prometem ceder no dito seu filho a sua Fabrica de Louça branca com seus utensílios, de que são senhores e possuidores, sita ao fundo da rua direita, para o mesmo seu filho e sua mulher usofruir, sem que elles Outorgantes, ou outra alguma pessoa sua herdeira possa do mesmo seu filho haver rendimentos alguns, durantes o tempo e semilhante usofructo, o qual findará por morte somente de qualquer delles Outorgantes, e que por semilhante couza hajão de ser Inventariados os bens do Cazal, porque então a mesma fabrica entrará nos bens do monte para ser partilhada a quem por direito ella tocar, com a declaração porem de que semil-hante usofrutcto nunca em tempo algum será considerado como legitimo ao dito seu filho, mas sim querião que elle para o futuro entrasse na herança do cazal em partes iguaes com os mais herdeiros, como se elle tal usofructo não houvera tido, devendo o mesmo ser considerado como alimentos, que elles Outorgantes na verdade lhe prestão, attendendo as boas qualidades do dito seu filho, que por este mesmo Instrumento será obrigado a portar-se para o futuro com obedien-cia e bons costumes como atequi, e se assim o fizer, elles Outorgantes se obrigão a fazer em todo o tempo este contracto, bom, de paz e justo titulo, debaixo de obrigação de seus bens, e prometendo não revogar este Instrumento, para o que renunciavão os sessenta dias da Lei – O que tudo foi acceite pelo dito seu filho Leonardo Ferreira da Cunha, prometendo e obrigando-se por este mesmo In-strumento, a mostrar em todo o tempo a sua gratidão á generozidade dos ditos seus Paes, a quem conservaria para o futuro o maior respeito e obediencia como bom filho, não lhes desmerecendo em couza alguma, ao bom conceito que delle fazem – Em testemunho de verdade assim o quizerão e outorgarão estas partes e rogarão a mim Tabellião lhe escrevesse este Instrumento nesta minha Nota em

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que assignarão depois de o aceitarem; e a rogo da Outorgante mulher por dizer não sabia escrever e lho rogar de que dou fé, assignou Joze Luis Fernandes, Caixeiro de Joze Antonio Marques, sendo testemunhas presentes João Lopez da Silva, Caixeiro do mesmo, e moradores na Praça de SamSão, e Joaquim Anto-nio digo Joaquim da Silva Nogueira, morador na rua de Cruche, e todos assig-narão depois que este lhes foi lido e declarado por mim Tabellião Joze Pinto de Magalhães que o escrevi

Joze Luis FernandesJoaquim da Silva

Leonardo Ferreira da CunhaJoão Lopes da Silva

Joaquim da Silva Nogueira

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1840 - Tabelião José Pinto de Magalhães, livro nº8, de 2 de Julho de 1839 a 6 de Maio de 1840, fl. 81 - 82.

Escriptura de contracto, convenção e Dote que faz Joaquim da Silva e sua mulher Marianna de Jezus desta Cidade, a seu filho Leonardo Ferreira da Cunha, por ocazião do cazamento que este tem contratado com Narciza Marcia da Silva Cortezão, de Lavarrabos

Saibão os que este publico Instrumento de contracto, convenção e Dote, ou como em Direito melhor dizer se deva e mais firme e valioso f or, virem que sendo no anno de Nascimento de Nosso Senhor Jezus Christo de mil oito centos e quarenta, aos trez dias do mez de Janeiro do dito anno nesta Cidade de Coimbra e meu Escriptorio apparecerão presentes de huma parte Joaquim da Silva e sua mulher Marianna de Jezus, moradores ao fundo da Rua Tinge Rodilhas, Freguezia de Santa Cruz desta Cidade, e da outra seu filho Leon-ardo Ferreira da Cunha, que vive na companhia dos ditos seus paes, pessoas reconhecidas pelas proprias de mim Tabellião e das testemunhas deste Instru-mento no ao diante nomeadas e no fim assignadas de que dou fé; e perante estas por aquelle dito Joaquim da Silva e sua mulher, cada hum de persi, e ambos insolidum a mim Tabellião foi dito, que tendo seu filho o menciona-do Leonardo Ferreira da Cunha, contractado e justo o seu Cazamento com Narciza Marcia da Silva Cortezão, filha de Joze da Silva Lobato Cortezão, do Logar de Labarrabos, elles outorgantes davão o seu consentimento a estes Esponsaes, por ser este hum cazamento muito da sua approvação, e para os Noivos suportarem melhor os encargos do matrimonio, dotavão o Noivo seu filho, com a Fabrica de fazer Louça, de que são senhores e possuidores sita ao fundo da rua direita desta Cidade, com toda a caza, oficina e mais utensilios pertencentes á mesma Fabrica, isto no cazo do mesmo seu filho levar a efeito o

mencionado cazamento, com a dita Narciza Marcia; e para isso, por este publico Instrumento, e na melhor forma e via de direito, desde já cedem e transferem na pessoa do mesmo seu filho, todo o dominio e posse, direito e acção que na referida Fabrica tem, para que o mesmo a tenha logre e possua, desde o momen-to ou acto da celebração do seu cazamento, como sua que ficará sendo d’aquelle momento em diante, e da qual só para então poderá tomar posse judicial ou extrajudicial, e quer a tome quer não, de então para todo o sempre, lha havião por dada e tomada, pela clauzula = Constituti = pertencendo-lhe igualmente o produto do seu arrendamento que o mesmo filho receberá, e a quem por di-reito ficarão pertencendo taes productos, não podendo para o futuro os mais herdeiros ao Cazal pedir a semilhante respeito contas ao dito seu filho, nem do mesmo haver indeminização alguma de taes rendimentos, e quando por morte de algum deles Outorgantes haja de se fazer Inventario nos bens do Cazal, assim mesmo querião que a mencionada Fabrica ficasse cabendo em quinhão ao dito seu filho, de tal forma que se o vallor da mesma exceder ás forças dos bens que houverem de lhe pertencer elle será obrigado a repor em dinheiro, ou em outros bens a diferença que houver em proveito dos mais herdeiros, ou a haver delles pela mesma forma o que lhe faltar para se indemmizar, no cazo que o vallor da Fabrica não seja sufficiente para a sua ligitima, e alem disto, se obrigavão a ter dito seu filho na sua caza e companhia, depois de cazado pelo espaço de anno e meio a contar do dia dos seus Esponsaes, e por todo o mais tempo em diante que convencionaram com o mesmo, depois de cazado, dando-lhe e a sua mulher em todo o tempo que estiverem na companhia deles Outorgantes, tudo quanto lhes for necessario, como de comer e beber, vistir e calçar, com a decencia propria de suas pessoas, e que findo que seja o tempo do arrendamento da indicada Fabri-ca, e que o dito seu filho queira entrar para ella a fim de a administrar por sua conta, elles Outorgantes tambem se obrigão a entregar-lha prompta com todos os arranjos, utensilios necessarios ao trabalho della, e que prometião comprir

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todas as clauzulas deste Instrumento, debaixo da obrigação de seus bens, havidos e por haver em geral – O que sendo ouvido pelo dito Leonardo Ferreira da Cunha, presentes as mesmas testemunhas, disse acceitava o presente Instru-mento com todas as clausulas no mesmo exaradas, prometendo sua gratidão a bondade e generozidade dos ditos paes, prometendo tratalos para o futuro com obediencia e amor propria de hum filho – Em testemunho da verdade assim quizerão e Outorgarão estas partes e rogarão a mim Tabellião lhe escrevesse este Instrumento nesta minha Nota em que assignarão depois de o acceitarem, e a rogo da Outorgante por dezir não sabia ler nem escrever e lho rogar de que dou fé, assignou Joze Luiz Fernandes, morador na Praça de SamSão, sendo te-stemunhas presentes João Lopez da Silva, morador na mesma Praça, e Rodrigo da Silva Paes, morador ás Ameias, e Declaro, que elles Outorgantes disserão que o Barreiro que esta em frente da indicada Fabrica, e as competentes Cazas pegadas ao Barreiro, ficão pertencendo ao tido seu filho, da mesma forma que lhe fica pertencendo a Fabrica, e com todas as clauzulas acima estipuladas, e outro sim declaro, que o Outorgante filho Leonardo Ferreira da Cunha, não foi presente a este acto, por não ser necessaria a sua acceitação, e que seus paes dispensarão, e com esta declaração todos assignarão comigo Joze Pinto de Magalhães que o escrevi

Joze Luis FernandesJoaquim da Silva

João Lopes da SilvaRodrigo Antonio da Silva Paes

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SIGLAS E ABREVIATURAS

AMC – Arquivo Municipal de CoimbraAUC – Arquivo da Universidade de CoimbraAABPC – Arquivo da Agencia do Banco de Portugal de Coimbra AP – Arquivo PrivadoBINTP – Boletim do Instituto Nacional do Trabalho e PrevidênciaDR – Diário da RepúblicaRN – Registos NotariaisRC – Registos de CasamentosGC – Governo CivilIO – Inventário OrfanológicoUCBG – Universidade de Coimbra, Biblioteca Geral

fls. – foliosnº - númeroTab. – Tabelião v. – verso

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