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B. Indústr. anim., Nova Odessa, SP, 42(2) :255-63, jul./dez. 1985 ALIMENTAÇÃO ESTIMULANTE DE ABELHAS SUPLEMENTADA COM PROTEfNA E SEU EFEITO NA PRODUÇÃO DE MEL (1 ) (Estimulative bee feeding supplemented with protein and its effect on honey production) ETELVINA CONCEiÇÃO ALMEIDA DA SILVA f) e RONALDO MÁRIO BARBOSA DA SILVA (3) RESUMO: Em ensaio realizado na Estação Experimental de Zootecnia de Pindamonhan- gaba, SP, no per íodo de outubro de 1979 a outubro de 1980, procu ro-se verificar se a alimentação estimulante com xarope de açúcar, feita no período de seis a sete semanas anteriores à florada principal, pode proporcionar melhor resultado em aumento de pro- dução de mel, quando adicionada de um suplemento protéico. A idéia subjacente é que, mesmo quando as abelhas dispõem de pólen para colher no campo, as quantidades obti- das diariamente podem não ser suficientes para suprir a demanda da colônia, intensifi- cada em conseqüência da alimentação estimulante. Se tal acontecer, a expansão da ninha- da será limitada por essa relativa escassez de pólen e a colônia deixará de atingir o pleno desenvolvimento e capacidade produtiva no momento da florada. O experimento, em blocos casualizados, constou de quatro tratamentos e quatro repetições. Os tratamentos foram: A = colônias alimentadas com xarope de açúcar mais suplemento protéico, feito de farinha de soja com 25% de pólen; B = colônias alimentadas com xarope somente; C = colônias alimentadas com o suplemento; eD = colônias testemunha não alimen- tadas. Os resultados, em produção de mel de uma florada foram: o tratamento B produ- ziu 70% a mais do que o D e o tratamento A, 85% a mais do que o D. A análise estatística indicou serem siqnificativas (P < 0,05) as diferenças entre A ou B e a testemunha. Con- cluiu-se que embora a alimentação estimulante somente com xarope aumente a produção de mel, a adição de um suplemento protéico proporciona resultado melhor e mais seguro (prevenção de prováveis períodos de escassez de pólen). INTRODUÇÃO Sabe-se que o apicultor não apenas espera que suas abelhas obtenham a quantidade de ai i- mento de que necessitam para sua subsistência, mas, também, um apreciável excedente, o qual constituirá a produção do apiário. Tal fato porém, não elimina a conveniência e, em algumas oca- siões, a necessidade do fornecimento de alimento para as abelhas. Revendo o assunto, JOHANSSON & JOHANS- SON 8 detectaram as segu intes razões ou su bjetivos para o apicultor alimentar as abelhas: Alimentação suplementar: quando, por ra- zões acidentais, alguma colônia se apresenta pobre em reserva de alimento, o que poderá trazer pro- blemas futuros, comprometendo seu desempenho. (1) Projeto IZ-063. Recebido para publicação em junho de 1984. (2) Da Estação Experimental de Zootecnia de Pindamonhangaba. (3) Da Seção de Apicultura, Divisão de Zootecnia Diversificada. 255

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B. Indústr. anim., Nova Odessa, SP, 42(2) :255-63, jul./dez. 1985

ALIMENTAÇÃO ESTIMULANTE DE ABELHAS SUPLEMENTADACOM PROTEfNA E SEU EFEITO NA PRODUÇÃO DE MEL (1 )

(Estimulative bee feeding supplemented with protein and its effect on honey production)

ETELVINA CONCEiÇÃO ALMEIDA DA SILVA f) e RONALDO MÁRIO BARBOSA DA SILVA (3)

RESUMO: Em ensaio realizado na Estação Experimental de Zootecnia de Pindamonhan-gaba, SP, no per íodo de outubro de 1979 a outubro de 1980, procu ro-se verificar se aalimentação estimulante com xarope de açúcar, feita no período de seis a sete semanasanteriores à florada principal, pode proporcionar melhor resultado em aumento de pro-dução de mel, quando adicionada de um suplemento protéico. A idéia subjacente é que,mesmo quando as abelhas dispõem de pólen para colher no campo, as quantidades obti-das diariamente podem não ser suficientes para suprir a demanda da colônia, intensifi-cada em conseqüência da alimentação estimulante. Se tal acontecer, a expansão da ninha-da será limitada por essa relativa escassez de pólen e a colônia deixará de atingir o plenodesenvolvimento e capacidade produtiva no momento da florada. O experimento, emblocos casualizados, constou de quatro tratamentos e quatro repetições. Os tratamentosforam: A = colônias alimentadas com xarope de açúcar mais suplemento protéico, feitode farinha de soja com 25% de pólen; B = colônias alimentadas com xarope somente;C = colônias alimentadas com o suplemento; e D = colônias testemunha não alimen-tadas. Os resultados, em produção de mel de uma florada foram: o tratamento B produ-ziu 70% a mais do que o D e o tratamento A, 85% a mais do que o D. A análise estatísticaindicou serem siqnificativas (P < 0,05) as diferenças entre A ou B e a testemunha. Con-cluiu-se que embora a alimentação estimulante somente com xarope aumente a produçãode mel, a adição de um suplemento protéico proporciona resultado melhor e mais seguro(prevenção de prováveis períodos de escassez de pólen).

INTRODUÇÃO

Sabe-se que o apicultor não apenas esperaque suas abelhas obtenham a quantidade de ai i-mento de que necessitam para sua subsistência,mas, também, um apreciável excedente, o qualconstituirá a produção do apiário. Tal fato porém,não elimina a conveniência e, em algumas oca-siões, a necessidade do fornecimento de alimentopara as abelhas.

Revendo o assunto, JOHANSSON & JOHANS-SON8 detectaram as segu intes razões ou su bjetivospara o apicultor alimentar as abelhas:

Alimentação suplementar: quando, por ra-zões acidentais, alguma colônia se apresenta pobreem reserva de alimento, o que poderá trazer pro-blemas futuros, comprometendo seu desempenho.

(1) Projeto IZ-063. Recebido para publicação em junho de 1984.(2) Da Estação Experimental de Zootecnia de Pindamonhangaba.(3) Da Seção de Apicultura, Divisão de Zootecnia Diversificada.

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Alimentação de emergência: quando, comoocorre algumas vezes na primavera, em clima tem-perado, as abelhas ficam impossibilitadas de apro-veitar as primeiras floradas devido ao mau tempo,ou quando ocorre um retardamento no in íciodessas fi oradas.

Alimentação estimulante: também chamadaespeculativa, destina-se a estimular a postura darainha, no período de cinco a oito semanas ante-riores ao in (cio previsto da florada principal.Espera-se, com isto, que ao iniciar a floradaa colônia esteja no máximo de sua capacidade pro-dutiva, ou seja, populosa e com alta proporçãode abelhas em idade de campeira.

Alimentação estimulante outonal: destinadaa estimular o crescimento de uma colônia tardianão mais para a produção do ano, mas para quepossa suportar o inverno e apresentar-se em boascondições no ano seguinte.

Alimentação substitutiva: como parte deuma variante de manejo, na qual o apicultorretira não apenas o mel "excedente" como todasas provisões da colônia. Seu objetivo é substituiressas provisões, necessárias à sobrevivência dafam í1ia, durante o inverno ou o período do ano noqual não há flores.

Alimentação para forçar a acumulação demel nas melgueiras: feita pouco antes do in ícioda florada, destina-se a encher o ninho, de formaa impedir que as abelhas, após iniciarem a colheita,depositam parte do mel no ninho, fazendo-osomente nas melgueiras.

Alimentação experimental com substânciasbiologicamente ativas: alimento suplementado comvitaminas, hormônios, antibióticos, etc., visando aaumentar o vigor ou desenvolvimento da colônia e,por este meio, elevar sua produtividade.

Tal relação não exaure o assunto, visto nãoincluir a alimentação de recrias ou quarentenas,núcleos de fecundação, etc .. Seu enfoque é o daalimentação, como um dos passos do manejo doapiário para a produção de mél. Neste aspecto,a mais importante, pela extensão em que é prati-cada e pelas conseqüências para a indústria ap ícola,é, sem dúvida, a alimentação estimulante.

Essa prática é recomendada ou pelo menoscitada por tratadistas ap ícolas de todos os lugarese em todas as épocas. Segundo lANGSTROTH! 3,já na antiguidade Columela enfatizava o valor daalimentação artificial e dava instruções detalhadasa respeito. O A. recomenda "para ativar a postura"o fornecimento de mel aquecido e ligeiramentedilu (do com água. lEMAI R E!4 é de opinião que"a alimentação é útil ... para estimu lar a postu rada rainha e a produção de ninhada, o que permiteobter, na ocasião oportuna, uma forte população".

Opinião análoga é a de WHITEHEAD24:. o apicultor pode manter a produção de ni-

nhada com uma alimentação judiciosa, assegurandoassim o desenvolvimento de colméias fortes nasépocas do ano em que o néctar, matéria-primapara a elaboração do mel, é abundante".

Tratando desse mesmo assunto, DADANT4

enuncia o seguinte axioma: "Devemos criar novasabelhas operárias para a colheita e não du rante acolheita".

Entre trabalhos mais recentes, vale lembrarCAI llAS3: " ... ao fim do inverno uma colô-nia . .. normal possui cerca de 15.000 operárias.Esta colônia deverá, 75 dias após, ter pelo menosde 40.000 a 50.000 operárias . .. para estarem condições de produzir e dar lucro. .. Parachegar a este resultado, a intervenção do apicul-tor é absolutamente necessária". Mais adiante,o A. assinala: "esta intervenção se faz de váriasmaneiras, todavia a principal é o fornecimento dealimento estimulante ... ",

AA. nacionais como BARROS!, KERR &AMARAl9 e VAN TOl FllH023, embora menosentusiastas, não deixam de se referir à alimentaçãoestimulante.

O alimento fornecido às abelhas para esti-mulo é um xarope, que pode ser preparado commel e água a 1:1, ou açúcar e água a 1:1,2(CAlllAS3). BARROS! recomenda que o xaropeseja preparado com mel e água a 2:1, ou açúcar,mel e água a 3:2:5. O xarope estimulante pode serainda preparado com açúcar ou mel e água, na pro-porção de 1:2 (KERR & AMARAl9).

Porém, apesar do grau de difusão e aceita-ção da técnica de alimentação estimulante, algunsAA. tem dúvidas quanto à sua eficácia. ECKERT& SHAW6, por exemplo, reservam sua prescriçãopara localidades ou ocasiões em que há necessi-dade de desenvolver as colônias mais rapidamente

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do que o normal. Cumpre notar, entretanto, quea alimentação estimulante tem como objetivo ime-diato o aumento da prole. Se ela o atinge, leva cer-tamente a um aumento quase proporcional nacolheita do mel, pois SOLLER & BAR-COHEN2o

verificaram haver correlação positiva significativaentre a quantidade de cria e a produção de mel deuma colônia de abelhas. Parece que nem sempre seobtém o resultado esperado e a relação das objeçõescompiladas por JOHANSSON & JOHANSSON8

pode ajudar a visualisar as limitações do méto-do. São elas:

a) Uma colônia não pode criar larvas em nú-mero maior do que aquele que as abelhas nutrizesexistentes podem alimentar (limitação da criapela população de abelhas);

bl Alimentação com xarope só tem efeitona quantidade de cria em anos maus (quando omau tempo ou a falta de flores no campo impedeas abelhas de obterem o alimento por si mesmas);

c) ~ difícil prever com exatidão o in ício daflorada, pois de ano para ano pode haver anteci-pação ou atraso de duas a três semanas (se houveratraso, as abelhas atingirão seu clímax de desen-volvimento e não terão néctar para colher, dandopreju ízo e talvez enxameando; se houver anteci-pação, o efeito da alimentação só aparecerá tardedemais para compensar a despesa com maior pro-dução);

d) O desenvolvimento precoce das colôniasnem sempre leva a uma melhor produção de mel,particularmente quando o pólen não é abundan-te;

..e) A intensificação da atividade de criação

reduz a longevidade das abelhas de inverno levandoa escassez de campeiras;

f) A partir do momento em que uma colôniaacumula cinco quilos de mel operculado, a alimen-tação não acelera a predisposição natural paraexpandir a ninhada, dentro do limite permitidopelas condições climáticas ou estacionais;

g) Um fluxo contínuo de xarope de açúcarpor si só não é, aparentemente, um estímulo. ~ apresença de amplas reservas de mel operculado ede pólen que encoraja a colônia a expandir aninhada;

h) A alimentação pode ajudar a colônia aatingir seu pico mais cedo, o que aumenta a pro-babilidade de enxamear;

i) Em um ensaio, colônias muito populosasalimentadas na primavera não apresentaram desen-volvimento ulterior; as colônias pequenas (oitoquadros ou menos) apresentaram aumento de 36%na população e de 55% na quantidade de cria, emrelação ao grupo controle.

A primeira conclusão a que se chega é,evidentemente, a de que a alimentação estimulantenão deve ser considerada ou executada comotécnica isolada, mas como etapa do manejo produ-tivo do apiário. Corolário desta conclusão é quea técnica por si só não assegura maior produção.Entre os diversos fatores que intervêm no processo,cuja atuação pode impedir que a colônia respondafavoravelmente à alimentação estimu lante, figuraa escassez de pólen.

Conforme acentuam TODO & BISHOp21 ,

o pólen é a principal fonte de todos os nutrientesrequeridos pelas abelhas, com exceção dos carboi-dratos fornecidos pelo néctar e da água. Do pólenprovém o material de que são feitos os músculos,órgãos vitais, glândulas, pêlos, asas, etc. e tambémpara a reposição de tecidos desgastados. Por essarazão, o pólen é essencial para o crescimento dosindivíduos e para a reprodução e desenvolvimentodas colônias.

Estudando o papel do pólen na economiada colônia, aqueles AA. verificaram que o pico dapostura coincide com o pico da entrada de pólenna colméia. Isto os levou a admitir que as abelhasparecem ter a tendência de expandir a ninhadaaté o limite permitido pelas reservas de alimento.

À primeira vista, este achado parece contra-dizer a teoria corrente. Ou seja: o estímulo para apostura proviria do pólen e não do néctar ou mel.A propósito, TODO & VANSELL22 reportamseu insucesso na tentativa de estimular a produçãode cria no inverno através da alimentação-xarope,até o momento em que adicionaram pólen ao xaro-pe, o que fez com que a postura se iniciasse 12 horasdepois.

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Revendo a questão das respostas das abelhasà alimentação, DIETZ5 cita resultados obtidos porBarker (1971), segu ndo os quais a intensidade decoleta de pólen pelas abelhas está relacionada coma quantidade de cria aberta presente na colméia;além disso, confirmam o conceito segundo o qualo estimulante para a postura é derivado do néctarou do mel.

O confronto entre esses resultados indicaque o estímulo primário para a postura provém dapresença ou do ingresso de carboidratos (néctar,mel ou açúcar) na colméia. Iniciada (ou ativada)a postu ra, su rge a necessidade do pólen para aalimentação das larvas. Assim, os carboidratosatuariam como estimulante e o pólen como fatorregulador ou limitante da produção de cria.

Observações de PARKER17 parecem darapoio a este ponto de vista: em colônias privadasde pólen, mas com pleno acesso tanto a mel comoa xarope de açúcar, durante o início da primaverae antes da época normal, a postura começou econtinuou ininterruptamente até o final do experi-mento, embora as larvas invariavelmente morressementre o segundo e o terceiro dias de vida. Ou seja:embora a ausência de pólen impedisse a produ-ção de ninhada, o estímulo dado pelos carboidra-tos fornecidos promoveu e manteve a postu ra.

Resumindo: o fornecimento de xarope esti-mula a postura, mas os ovos somente se desenvol-verão em larvas e abelhas se houver alimento pro-téico suficiente para nutri-Ias

As abelhas não armazenam pólen na colméiaem quantidades tão significativas como o fazemcom o mel. Segundo PARKER17, essa diferençaseria devida ao fato de que o mel é consumidodurante o ano todo e o pólen somente quando háprodução de cria, e esta atividade é normalmentelimitada ao perfodo em que o pólen está dispon ívelno campo. Uma conseqüência da limitação dasreservas normais de pólen na colméia é a escassezque a colônia pode sofrer, quando suas necessi-dades aumentam (na primavera, em clima tempe-rado) ou quando sobrevém alguma anormalidadeno ciclo anual do florescimento das espécies poli-n íferas da área.

Conforme LANGRIDGE & RUFFORD-SHARPEI2

, a deficiência temporária de pólen,causando fome às abelhas, ocorre em uma épocaou outra na maior parte do mundo. Observaçõessemelhantes têm sido feitas por outros AA., comoCAI LLAS2, PARKER1 7 e TODD & BISHOp21.

O problema da limitação do desenvolvi-mento das colônias pela carência de pólen já foireconhecido por estudiosos e tratadistas ap ícolashá muito tempo, o que os levou a recomendar ainclusão de pólen ou algum sucedâneo nas ali-mentações suplementares ou de emergência. Porexemplo, já em 1918, LEMAIRE15 aconselhavafornecer às colônias, a partir de fins de fevereiro,um "pólen artificial" confeccionado com farinhade centeio. Em anos mais recentes, o problemamereceu a atenção de muitos pesquisadores.Veja-se, a propósito, a revisão de DI ETZ5 . Vale ci-tar, em especial, o trabalho de LANGRIDGE1 o,no qual um grupo de colméias que recebeu suple-mento de pólen aumentou em 54,6% a quanti-dade de cria, enquanto o grupo testemunha areduzia em 19,9%. Por outro lado, o grupo tratadoproduziu 39,5% a mais de mel do que o grupocontrole.

Todas as informações e dados compiladosparecem deixar claro que, a deficiência de pólen,com seus conhecidos efeitos negativos no desen-volvimento e produtividade das abelhas, é umapresença ou, ao menos, ameaça constante e univer-sal. E mais: o risco é maior no período de desen-volvimento das colônias, ou seja, quando a suademanda é maior.

Deste fato se origina o objetivo de presentetrabalho.

Tendo como certo que à alimentação esti-mulante antecipa e aumenta o consumo de pólen,a sua escassez em colônias estimuladas ocorrerácom maior freqüência e intensidade, atuandocomo limitante do crescimento da colônia, redu-zindo ou até mesmo anulando os benefícios quepoderiam ser obtidos.

Na literatura consultada, embora abundemtrabalhos relacionados a pólen na alimentação decarência ou suplementar com pólen e sucedâneos,não foram encontrados resultados experimentaisque se referissem especificamente aos efeitos daalimentação estimulante. Parece, como referidoao início, ser a sua aceitação tão generalizadaque não necessita de comprovação experimental.Sem embargo, e procurando testar a hipótese darelativa escassez de pólen, este trabalho visou aobter indicações quanto ao resultado prático daalimentação estimulante, com e sem suplementa-ção protéica.

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MATERIAL E M~TODOS

o trabalho foi executado na Estação Experi-mental de Zootecnia de Pindamonhangaba, SP, noperíodo de outubro de 1979 a outubro de 1980.Foram utilizadas dezesseis colônias de abelhasmestiças, tão uniformes quanto possível no quese refere à idade das rainhas, população, cria eprovisões. Com elas foram compostos quatroapiários de quatro colônias cada um, em diferenteslocais da Estação.

Como alimento estimulante foi fornecidoxarope preparado segundo KERR & AMARAL9,

e como suplemento protéico foram utilizados"bolos" de pólen e farinha de soja desengordurada,na proporção de 1 :3, embebidos em xarope deaçúcar a 1 :2, preparados conforme as indicaçõesdeSCHAEFER &FARRARI8.

O pólen utilizado foi colhido localmenteem coletores frontais e desidratado em estufa a360C. Este processo de conservação, segundoLANGRIDGE & GOODMANII não afeta aspropriedades nutritivas e palatabilidade. O pólenpermaneceu na estufa por quatro dias, tempo indi-cado por WOOD ROw2

5 como necessário e sufi-ciente para a desidratação.

O xarope foi fornecido por meio de alimen-tadores tipo Boardmann, com capacidade para1,00 kq, reabastecidos duas vezes por semana.Para fornecimento do suplemento protéico utili-zou-se o método descrito em LANG RIDGE10,

considerando simples e satisfatório: colocar os"bolos" de suplemento sobre os quadros, em umdisco de papel impermeável provido de uma fendacentral, para facilitar o acesso das abelhas. O su-plemento foi fornecido quinzenalmente, naquantidade aproximada de 0,35 kg/colméia.

Após o estabelecimento dos apiários,observou-se um período de adaptação de trintadias antes do início dos tratamentos, o que ocor-reu no dia 17 de dezembro de 1979, ou seja,seis a sete semanas antes do in ício previsto do flu-xo nectarífero no local, o qual, segundo SI LVAI 9,

ocorre nos primeiros dias de fevereiro.As colônias se apresentavam quase unifor-

mes, com três a quatro quadros de cria, sete aoito cobertos de abelhas, um a dois, de mel opercu-lado,e meio a um, de pólen.

O delineamento experimental adotado foide blocos ao acaso, com quatro tratamentos equatro repetições. Os tratamentos consistiramem:

A = Fornecimento de alimento estimulantee de suplemento de pólen.

B = Fornecimento de alimento estimulante.

c = Fornecimento de suplemento de pólen.

D = Testemunha, não alimentada.

Concluída a fase de estimulação, as colôniasentraram no período da florada, durante o qualforam manejadas uniformemente, como apiáriode produção de mel, com inspeções quinzenais,para verificação do desenvolvimento e colocaçãode sobrecaixas conforme a necessidade.

No início de junho de 1980 o mel foi colhidoe a produção determinada individualmente, peladiferença entre o peso das melgueiras e quadros,antes e após a centrifugação dos favos.

RESULTADOS

Os resultados são apresentados no quadro 1,em quilogramas de mel por colônia e em média deprodução por tratamento.

A análise da variância da produção de melrevelou significância para tratamentos (F = 5,80*).O efeito dos blocos não foi significativo. A compa-

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ração das médias pelo teste de Tukey mostrou queo ,tratamento A (xarope mais suplemento) foisuperior ao tratamento O (testemunha). A aplica-ção do teste de Duncan indicou diferenças- signi-ficativas aó nível de 5% de probabilidade éntreos tratamentos A e D, 'B e O, e A e C. Ouseja: o xarope com ou sem pólen foi melhor doque a .testernunha e xarope mais pólen foi melhordo que o pólen somente.

Tendo em vista que o coeficiente de varia-ção foi bastante elevado (CV = 29,4 7%). uma

,'- segunda análise foi feita, com os dados transfor-

-Ouadro 1. Quilogramas de mel fornecidos por colméia

mados pela relação V x + y,. Os novos resulta-dos, todavia, pouco diferiram dos obtidos naprimeira análise: a variância foi significativa aonível de 5% (F = 7,1932* ). O efeito dos blocosnão foi -significativo. À aplicsção do teste deTukey a diferença entre asmédias ( L::::,. = 1,2459)indicou que o tratamento A foi superior ao teste-mu'nha (A - O = 1,4468*). Pelo teste de Ouncanforam significativas, ao nível de 5%, as diferençasentre A e O (04 = 0,9115). pois A - O = 1,4468~e entre Be 0(03 = 0,8995). pois B - D = 1,1964 ~O coeficiente de variação baixou para 14,29%.

Tratamentos Bloco I Bloco II Bloco 111 Bloco IV Média detratamentos

A= Xarope + suplemento 41,945 33,172 25,709 24,108 31,233

B = Xarope 35,165 27,152 24,368 26,324 28,552

C = Suplemento 22,829 24,022 21,721 20,630 22,301

O = Testemunha 17,097 18,651 19,173 12,490 16,a53

DISCUSSÃO

Entre a enunciação do argumento dotrabalho e a instalação do experimento no campo,numerosas opções tiveram de ser feitas e o critérioadotado predominantemente foi o de maior sim-plicidade e facilidade de aplicação nas condiçõesnormais de apiário de produção.

Essa a razão de escolha do alimentador tipoBoardmann, muito difundido e cuja utilizaçãoem nada interfere com as atividades normais dasabelhas. Também a forma de fornecimento dosuplemento protéico foi a mais simples possível,não necessitando nenhum equipamento especial.

A escolha do suplemento baseou-se emidênticas considerações. Sabe-se que não há subs-tituto perfeito para o pólen. A extensa revisãode OIETZ5 mostra quanto esforço tem sido feitopara a compreensão das necessidades nutricio-nais das abelhas e para o desenvolvimento de suple-mentos e substitutos adequados para o pólen na-tural. Todavia, os resultados ainda não são abso-lutos e não se conseguiu criar larvas de abelhascom dietas artificiais. Por outro lado, não seriaprático nem econômico, em apiário comercial,suplementar as colônias com pólen puro. Nem

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mesmo necessário, pois nas condições do experi-mento as abelhas tiveram oportunidade de forra-gear pólen fresco. O suplemento adotado é o maissimples, barato e fácil de ser obtido. Ademais,apresenta boa palatabilidade (MOELLER16

) e temsuficiente valor nutritivo para manter a produçãode cria (SCHAEFER & FARRAR18). O grupode colônias que recebeu suplementação protéicae alimentação estimulante, produziu cerca de10% a mais do que o grupo que recebeu apenasxarope. Essa diferença não foi estatisticamentesignificativa. O que, porém, não significa, neces-sariamente, que não tenha havido vantagem, masque há probabilidade maior do que 5% de que talvantagem seja devida não à suplementação, masao acaso, ou seja, a outros fatores não controlados.Assim, só a execução de novos ensaios similarespoderá propiciar resposta definitiva à essa ques-tão. De resto, não eram de se esperar diferençasmarcantes, dado que as colônias tinham reservasde pólen nas colméias e tiveram' acesso à fontesnaturais de pólen. Em um experimento algo simi-lar em 1966, FORSTER7, fornecendo diferentessuplementos de pólen a três grupos de colôniasao lado de um grupo testemunha, todas elas tendoacesso a pólen natural, obteve diferenças desprez í-veis em quantidade de cria. Antes, porém (19641,LANGRIDGE & RUFFORD-SHARPE12 nãoobtiveram resultados significativos em experi-mentos de suplementação de pólen, porqueum " . .. adequado suprimento de pólen naturalesteve dispon ível às abelhas du rante todo o expe-rimento ... " . Parece certo, portanto, que o for-necimento de suplemento protéico somente dáresultados siqnificativos no desenvolvimentoe produção das colônias se houver carência dessealimento, como no experimento relatado porLANGRIDGE10.

Mesmo assim, vale frisar, a hipótese testadanesse experimento não foi a da possibilidade deestimular as colônias a produzirem mais mel doque sua capacidade genética e do que o permitia adisponibilidade de néctar na área, mas a de pre-venção de restrição no seu desempenho produtivo.causada por possível carência de pólen. der.orrentedo emprego da alimentação estimulante. Que estaresulta em aumento da demanda de pólen já estáverificado experimentalmente. JOHANSSON &JOHANSSON8 relatam que as "colônias coletavammais pólen enquanto estavam sendo alimentadascom xarope". Como é irnpossfvel saber de antemão

e com certeza se haverá ou não abundância de pólenno campo, que possa suprir as necessidades aumen-tadas das colônias devido à alimentação estlrnu-lante, parece mais seguro adicionar-lhe um suple-mento protéico. Se o pólen não faltar, mesmoassim um pequeno aurnento da produção cobriráo custo da suplementação; se faltar, não se perderáo investimento feito na estimulação.

Quanto às objeções à alimentação estimu-lante referidas por JOHANSSON & JOHANS9JN8,

podem os resultados desse experimento dar algu-mas respostas?

As letras dos comentários correspondem àsutilizadas na introdução:

bl Mesmo em anos bons, a alimentaçãoestimulante deve ter efeito na criação, pois a pro-dução dos grupos estimulados foi superior à dogrupo testemunha. Em anos maus, certamente oefeito da estimulação deverá ser maior, particular-mente quando suplementada com proteína.

d) Mesmo que o pólen (natural) seja escasso,o desenvolvimento das colônias, acelerado pelaalimentação com xarope e suplemento protéico,não sofrerá interrupção, proporcionando condi-ções de produzir o máximo que os fatores exter-nos, como intensidade de fluxo, concorrência econdições meteorológicas permitirem.

f) Nas condições do experimento não houveacumulação de xarope nos favos. Aparentemente,o alimento foi rapidamente convertido em larvase abelhas.

h) Não ocorreu enxameação durante o expe-rimento. No entanto é admissIvel Que as medidasde prevenção de enxameação devam ser tomadassempre que haja colônias em desenvolvimentono apiário.

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CONCLUSÕES

1. A estimulação da postu ra pelo forneci-mento de xarope de açúcar, no período de seissemanas que antecedem a florada principal' pro-porcionou aumento da colheita de mel da ordemde 70%, em real ação às testemunhas não estimu-ladas.

2. A estimulação com xarope acrescida desuplemento protéico levou ao aumento de 85%em relação às testemunhas.

3. A alimentação com suplemento protéicoresultou no aumento da produção de mel emcerca de 30%, diferença que não foi estatistica-mente significativa.

4. A diferença de produção entre o grupoestimulado apenas com xarope e o grupo que re-cebeu xarope mais suplemento indica a possibi-lidade, a ser verificada em novos experimentos,de terem ocorrido fases de escassez de pólen duran-te o período em que as colônias receberam alimen-to estimulante.

5. O experimento confirmou a vantagemeconômica da estimulação das colônias antes daflorada e indicou a possibilidade de aumentar asegurança de obtenção de boas colheitas, pela pre-venção de prováveis períodos de escassez de pólenatravés da adição de um suplemento protéico aoalimento estimulante.

SUMMARV: This paper reports a field trial carried out in the Estação Experimentalde Zootecnia de Pindamonhangaba, State of São Paulo, Brazil, from October 1979, toOctober 1980, intended to know if the feeding honey beecolonies with sugarsyrup, du ringthe 6 - 7 weeks prior the nectar flow can result in even better honey yield whensupplemented with protein. The underlying assumption was that, even when the beeshave free accessto natural pollen, the daily intake can remain in a levelinadequate tosupply the increased demand caused by the expansion of brood rearing. This wouldcurtail brood rearing and prevent the colony from reaching full strength and productive-ness. The experiment followed a randomized block design with 4 treatments and 4replications. Treatments were: A . = feeding with sugar syrup plus protein supplementmade of soybean flour with 25% of pollen; B = feeding with sugar syrup only;C = colonies fed only protein supplement; D = contrai colonies, not fedoThe results,in honey production of one seasonwere: group B yielded 70% more than group D andgroup A, 15% more than B. Statistical analysis showed to be significant (P < 0.05)the difference between A ar B and D. It was concluded that, although stimulativefeeding alone boosts the honey yield, the addiction of protein supplement will lead tobetter and safer result.

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