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AMARGO COMO FEL: AS RELAÇÕES DE SUPEREXPLAÇÃO NO CULTIVO DE CANA-DE AÇÚCAR NO MUNICÍPIO DE ITABERAÍ-GO
Ana Michelle Ferreira Tadeu dos Santos Universidade Estadual de Goiás-UFG/Unidade Universitária de Goiás
Francilane Eulália de Souza Universidade Estadual de Goiás-UFG/Unidade Universitária de Formosa
Resumo Esse trabalho visa retratar a atual situação do trabalhador canavieiro frente ao agronegócio sucroalcooleiro, cujo enfoque principal se dá entorno da precarização das condições dos trabalhadores que compõe o corte da cana-de-açúcar em moldes de superexploração. Como recorte local, temos o município de Itaberaí e suas implicações nesse contexto. Para concretizar essa análise, foi realizada a pesquisa bibliográfica, na internet, coleta de dados e informações em jornais, revistas e periódicos acadêmicos. Também foi realizado entrevista no sindicato dos trabalhadores rurais do município e entrevistas com trabalhadores que realizam o corte da cana. Assim, averiguamos que a dinâmica nos canaviais, é “doce” para os que comandam o agronegócio da cana-de-açúcar/álcool, e, “amarga como fel” para os trabalhadores que são obrigados a se sujeitarem a uma superexploração de sua força de trabalho para sobreviver. Palavras-chave: Trabalhador canavieiro. Precarização das condições de trabalho. Superexploração. Introdução A produção da cana-de-açúcar tem crescido no Brasil devido às demandas nacionais do
etanol (combustíveis) como das demandas de exportação do açúcar consolidando assim
o Agronegócio da cana no Brasil.
O Estado de Goiás se inseriu nesse cenário do agronegócio da cana-de-açúcar, sendo
que o município de Itaberaí tem se tornado uma das grandes referências no centro sul
goiano com a presença da produção da cana. Esse novo cenário agrícola nos levou a
buscar entender as singularidades presentes nos impactos sociais na produção da cana-
de-açúcar e também nos instigou a realizar análises ligadas às relações e, as condições
de trabalho que vem sendo constituída no processo de cultivo da cana de açúcar.
Nessa perspectiva o foco dessa pesquisa é analisar os impactos sociais causados pelo
cultivo da cana-de-açúcar, retratando a atual situação do trabalhador canavieiro no
panorama do cultivo da cana frente ao agronegócio no município de Itaberaí-Go.
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Desdobrando esse objetivo maior, a pretensiosa intenção aqui apresentada também é de
analisar com se constitui o agronegócio da cana no Estado de Goiás e no município de
Itaberaí, apontando e analisando as principais características da monocultura da cana-
de-açúcar no Estado de Goiás e no município de Itaberaí, ainda averiguando as relações
de trabalho, entre o produtor e o trabalhador braçal da cana no município de Itaberaí e
para tal analisaremos o contexto que cerca essas relações.
Desse modo, foi necessário realizar a pesquisa bibliográfica, pesquisa na internet para
ampliar as discussões, ligadas ao mundo trabalho no campo, além de coleta de dados
sobre a crescente demandado do cultivo de produção de cana-de-açúcar.
Também foi realizada coleta de dados e informações em jornais, revistas e periódicos
acadêmicos das quais foram tomadas para apontar e analisar as principais características
do cultivo da lavoura de cana-de-açúcar.
Em outro momento, foi realizado pesquisa de campo no município de Itaberaí,
particularmente, no Sindicato dos Trabalhadores Rurais para entender a relação de
trabalho presente no canavial. Averiguamos também, a partir de entrevistas com os
trabalhadores de cana, as relações entre o produtor e o trabalhador braçal, além de
buscar entender e apresentar a relação de trabalho que se confronto nesse território.
Vale ressaltar que essa pesquisa de campo foi essencial nesse trabalho, visto que foi ela
que nos proporcionou desvendar o doce amargo estabelecido nas relações de trabalho
impulsionado pelas lavouras canavieiras.
A expansão do território sucroalcooleiro no Estado de Goiás O cultivo de cana-de-açúcar, até a década de 1980, não havia adentrado terras do
Centro-Oeste, entretanto a expansão e os lucros que produtores-usinas têm conseguido
atualmente tem sido fator estimulante para essa produção agrícola. as instalação desses
produtores-usinas em Goiás é fruto de uma dinâmica nacional, e que Goiás tem
ganhado posição relevante entre os produtores brasileiros de açúcar.
Mais, o que tem atraído a expansão do cultivo de açúcar e usinas no Estado de Goiás?
Em primeiro lugar, a própria dinâmica do açúcar e do etanol, impressa nos carros bi-flex
que demandam o etanol para abastecer o mercado que se somam a voraz necessidade
dos lucros gerados pela produção em sistema de superexploração da mão de obra. Em
segundo, estão as várias disponibilidades e facilidades que o estado de Goiás
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proporciona, destacando-se fatores naturais e econômicos. Podemos assim destacar,
conforme a tabela 1, que em 2009 Goiás era o 4° produtor nacional.
Tabela 1 - Ranking de produção de cana-de-açúcar, segundo as 6 unidades da
federação-2000, 2008 e 2009
Unidade da federação
2000 2008 Variação (%) 2000/2008
2009 (1)
Cana-de-açúcar (t)
Part Ranking Cana-de-
açúcar (t)
Part Ranking
Cana-de-açúcar (t) (%) (%)
Brasil 326.121.011 100,00 743.290.212 100,00 127,92 690.181.094 São Paulo 189.040.000 57,97 1º 386.061.274 51,94 1º 104,22 400.539.320 Paraná 23.191.970 7,11 3º 51.244.227 6,89 2º 120,96 55.086.000 Minas Gerais 18.706.313 5,74 4º 47.914.898 6,45 3º 156,14 56.098.028 Goiás 10.162.959 3,12 6º 33.401.559 4,49 4º 228,66 41.437.849 Alagoas 27.798.034 8,52 2º 29.220.000 3,93 5º 5,12 27.077.552 Mato Grosso do Sul 5.837.456 1,79 9º 21.362.034 2,87 6º
265,95 32.874.624
Fonte: SEPLAN-GO / (2010). Adapt. - SANTOS, A. M. F. T. dos. (2011).
Diante desse quadro, podemos afirmar que em suma esses recursos naturais são
basicamente os solos férteis. Já entre os fatores econômicos Loyola (2010) cita o baixo
preço das terras que permitem arrendamentos e aquisições a um preço inferior as
tradicionais regiões produtoras já valorizadas. A ação do governo estadual por meio dos
programas, como o Programa de Desenvolvimento Industrial de Goiás (PRODUZIR),
pelo qual o governo reduziu o valor do ICMS mensal tendo como objetivo incrementar
a implantação; a expansão das indústrias para a promoção do desenvolvimento do
Estado além de reajustes tributários incentivam ainda mais esse setor.
Loyola (2010) ainda nos informa que outro fator que favorece a produção de cana-de-
açúcar no Estado de Goiás é a possibilidade de expansão desta cultura na região,
principalmente com as restrições de crescimento exibidas no Zoneamento Agroecológico
da cana-de-açúcar, aprovado em 2009 pelo Governo Federal, que veta a produção de
cana-de-açúcar na Bacia Amazônica, no Pantanal e na Bacia do Alto Paraguai.
Loyola (2010) também afirma que: [...] o crescimento na produção de cana-de-açúcar tem como principal base a expansão de área e não o aumento de produtividade, o que colocou a cultura da cana-de-açúcar em terceiro lugar dentre as mais cultivadas no país
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e gerou um deslocamento de parte da produção para a região Centro Oeste. (LOYOLA, 2010, p. 1, grifo nosso).
Diante dessa afirmação podemos inferir que o que configura o crescimento ou o Boom
do açúcar e seus derivados no Estado de Goiás, reconhecendo-o como parte
significativa do Centro-Oeste, não é o aumento da produtividade, mas sim sua inserção
em territórios dantes pertencentes tradicionalmente a pecuárias, a outras lavouras como
o sorgo e o milho, ao feijão, arroz, sendo esses últimos, em sua maioria, cultivados
pelos camponeses.
Ainda para Fernandes e Welch (2008, p. 49) “o sistema agrícola do agronegócio é
caracterizado pela monocultura, pelo trabalho assalariado e a produção em grande
escala”. Essas são as escalas que constitui as relações desse complexo e que são as bases
do cultivo da cana-de-açúcar. Nessas, o Sistema Agroindustrial da cana-de-açúcar é um
dos mais antigos do país, estando ligado aos principais eventos históricos do Brasil no
que se refere à agricultura.
Ainda a consolidação da agroindústria canavieira como um dos mais modernos
complexos agroindustriais brasileiros é constituído de preceitos capitalistas, referidos
por Thomaz: [...] a incorporação de novos conceitos gerenciais, o aperfeiçoamento da matéria prima e o acesso à tecnologia de equipamentos, que possibilitou o aumento da eficiência produtiva e a redução dos custos de produção, se devem em grande parte ao Proálcool, pois durante a vigência desse Programa o Estado tutorou o desenvolvimento do setor, via financiamentos subsidiados e vantagens creditícias. (THOMAZ JÚNIOR, 2009, p. 8).
Os arranjos e as formatações desencadeadas pelo capital agroindustrial canavieiro, nos
últimos anos, decorrem das inúmeras estratégias adotadas por essa personificação do
capital. O processo de reestruturação produtiva, as fusões, as aquisições de empresas
e/ou ações de empresas por vários grupos do setor são exemplos significativos que
configuram o fortalecimento do agronegócio.
O agronegócio tem em sua essência o constante revigoramento de antigas e novas
práticas de superexploração do trabalho e a destruição da sua principal força produtiva,
o trabalhador. Invariavelmente, a reprodução e a acumulação de capital não rompeu
com o que era considerado “atrasado”, sendo assim, sua própria dinâmica interna de
funcionamento necessita fortalecer e recriar constantemente as práticas ditas arcaicas,
ou formas regressivas de relações de trabalho para se reproduzir.
Sendo assim, as amarrações desencadeadas pelo agronegócio da produção da cana-de-
açúcar, dos quais acabamos de apontar, se sustentam nas relações que ocorrem na
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grande produção canavieira. Essas relações territoriais não são delimitadas somente pelo
espaço físico no qual ela adentra, mas pelo conjunto que engloba todo um território que
não se atenha espaços a limites fronteiríssimos, e acaba por adentrar em terras do Estado
de Goiás, reconfigurando a agricultura goiana e construindo na sua hegemonia estatal
uma dinâmica de desterrritorialização do trabalhador canavieiro.
Uma dinâmica de desterritorialização do trabalhador canavieiro A territorialidade do trabalhador canavieiro é constituída pelas relações que ele viveu e
vive cotidianamente no território: as relações com a família, com as autoridades
políticas, pela própria política na sua esfera coletiva e individual e principalmente pela
relação trabalho e o não-trabalho, sendo profundamente assimétrica e conflituosa com o
território do capitalismo.
Oliveira (2007) nos leva a uma reflexão sobre a dinâmica do território que conduz a
vertente de desterritorialização dos trabalhadores, sendo que essa visa beneficiar as
empresas agroindústrias. Oliveira diz:
Do ponto de vista do capital, a desterritorialização se dá num sentido positivo, tendo em vista que os capitalistas, nesse caso, os empresários agroindustriais canavieiros, encontram os mecanismos abstratos que consubstanciam a acumulação. Do ponto de vista do trabalho, a desterritorialização ocorre num sentido negativo, já que o trabalhador (nesse caso, o boia-fria), embora “livre”, é desprovido dos meios de produção e muitas vezes até mesmo das condições básicas de sobrevivência, sua e da família, sendo obrigado por força das circunstâncias a vender sua força de trabalho, reduzindo-se assim à força física para a produção canavieira. (OLIVEIRA, 2007, p.64, grifo nosso).
Nessa perspectiva, a mesma exemplifica outro preceito de desterritorialidade em uma
escala nacional: [...] seria o trabalhador “boia-fria” (migrante sazonal/temporário), que se desloca de vários estados do Nordeste e norte de Minas Gerais para o corte de cana nas lavouras do Centro-Sul, e que, ao encerrar a safra, retorna ao seu local de origem. Acreditamos que, nesse contexto de mobilidade, o trabalhador migrante vivencia distintos processos de (des) territorialização. O primeiro ocorre quando ele é privado das suas condições básicas de sobrevivência (sem emprego, expropriado de suas terras, ou impossibilitado de tirar da terra seu sustento e da família, por conta dos condicionantes climáticos) e forçado a migrar para as lavouras de cana no Centro-Sul. (OLIVEIRA, 2007, p.14).
A autora mostra dois pontos distintos onde a desterritorialização assume a postura de
beneficiar um único ser, o empresário sucroalcooleiro, o que implica na visão de
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desterritorialização do homem canavieiro. Ou seja, o trabalhador canavieiro é subjugado
nesse processo de territorialização da cana-de-açúcar. Enquanto a produção de cana-de-
açúcar toma territórios, o trabalhador canavieiro perde seus territórios ideológicos,
econômicos, identitários e sociais e culturais. Intensificando a produção da cana-de-
açúcar, desterritorizando o trabalhador, e nesse sentido que o agronegócio tem se
firmado.
Nessa dinâmica de desterritorialização a luta, do homem canavieiro, não é só contra a
distância de sua terra natal, a luta é contra a perda da sua identidade, pois é como sujeito
explorado que ele perde seu território.
Diante disso surge então a necessidade de entender como se confronto essa
problemática que envolve a superexploração do trabalhador canavieiro.
A superexploração do trabalhador canavieiro Antes de iniciarmos as discussões acerca da superexploração do trabalhador na lavoura
de cana-de-açúcar, destacamos que os envolvidos nos tratos culturais e na colheita da
cana-de-açúcar são em torno de um milhão de assalariados no Brasil, segundo fontes
empresariais publicados pelo mesmo estudo realizado e divulgado por Dieese (2007).
Esses tantos trabalhadores que estão envolvidos no agronegócio da cana são
superexplorados constantemente, principalmente no corte da cana e até no próprio
trabalho que realizam nas usinas. Nesse contexto, apontamos os principais problemas
ligados a essa exploração no Estado de Goiás no quadro 1.
Quadro 1 – Principais problemas ligados a exploração do trabalhador canavieiro no Estado de Goiás
Problemas
Detalhamento
Excesso de trabalho
Cargas horárias que chegam até 12 horas, buscando
maior produtividade
Irregularidades no transporte dos
trabalhadores
Falta de transporte adequado, sem segurança
Falta de instalações sanitárias
no campo
As empresas não se preocupam em oferecer condições
de higiene para os trabalhadores no campo
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Falta de locais para os
trabalhadores fazerem as refeições
Os trabalhadores fazem as refeições sentados no chão
ou em cima de galões de água, sem qualquer acomodação
Discriminação
Os trabalhadores são vistos pela sociedade como mera
mão-de-obra, descriminados como parte dessa sociedade
Máquinas sem proteção
A utilização de máquinas sem as devidas seguranças
Acidentes de trabalho no campo
Falta de treinamento para utilização de utensílios de
trabalhado, além da falta de equipamentos de segurança e até mesmo sem condição de uso
Falta de assistência médica
Não existe uma política médica que dê assistência aos
trabalhadores no campo BLUMENSCHEIN, C. Fiscalização pune usinas de álcool. Jornal O Popular, Goiânia, 5 de out. 2010. Caderno Cidades, p.4. Org. – SANTOS, A. M. F. T. dos. (2011).
Nesse quadro podemos observar que os problemas ligados a exploração do cortador de
cana são causados principalmente pela jornada excedente, falta de manutenção de
equipamentos e pelas várias situações relacionadas à saúde e segurança de
trabalhadores.
As empresas não têm a preocupação em oferecer qualquer tipo de assistência ao
cortador de cana-de-açúcar e isso tem causado muitos acidentes e até mortes nos
canaviais. Segundo a Superintendência Regional do Trabalhado e Emprego em Goiás,
em entrevista concebida em reportagem ao jornal “O Popular”, somente este ano já
ocorreram dezenas de acidentes graves do trabalho de corte de cana-de-açúcar,
resultando na morte de seis trabalhadores.
Os números que envolvem morte nos canaviais, amputações e até trabalho em situação
análoga são mascarados e de difícil acesso. O motivo mais provável é que não haja de
fato uma fiscalização que mensure de forma adequada esses casos ou que as empresas
disponibilizam dados errôneos. Os números mesmos mascarados apontam para uma
situação alarmante no setor relacionado ao corte de cana-de-açúcar.
Outro elemento da superexploração de relevância que nos foi informado pelo Sindicato
dos Trabalhadores Rurais de Itaberaí-GO1, é que além das empresas estabelecerem uma
meta de produção, como condição para a contratação e a permanência dos
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trabalhadores, no corte de cana-de-açúcar (de 12 a 15 toneladas), ainda utiliza
determinados artifícios para estimulá-los a aumentar sua produção.
Nesse sentido, podemos mencionar os sistemas de bonificação e de premiações
implantados pelas empresas agroindustriais canavieiras, para “agraciar” os
trabalhadores que conseguirem cortar mais toneladas de cana/dia.
Sobre o valor a ser pago pela cana-de-açúcar, a Convenção Coletiva de Trabalho no
Setor Canavieiro Goiano (2011) estabelece que os preços para devem ser estabelecidos
previamente entre as partes (trabalhador x produtor). Nesse processo muitos
trabalhadores são lesados e buscam incessantemente cortar mais para receber mais:
Os preços para o corte de canas “bisadas” (assim entendidas aquelas que, tendo atingido suas ideais condições para o corte, tenham ficado pendentes de uma safra para outra), e de cana crua para moagem e para plantio, negociados entre as partes, nos locais de trabalho, sendo facultada a participação dos representantes sindicais dos trabalhadores. Em não havendo acordo, a participação desses é garantida, caso solicitada pelos trabalhadores. (CONVENSÃO COLETIVA DE TRABALHO DO SETOR CANAVIEIRO GOIANO, 2010, p.10).
Inserido nessa lógica, e sem darem conta de que estão sendo tratados como máquinas,
esses trabalhadores alimentam falsas expectativas de que, trabalhando mais estarão
ganhando mais.
Nesse sistema, os trabalhadores - para perfazerem mais rendimentos - estão, de fato,
antecipando sua morte, em vista do grande dispêndio de energia e desgaste físico, que
não têm reposição à altura dos ganhos alcançados.
As reais condições de trabalho no campo são maquiadas, por meio do discurso da
certificação da empresa que se preocupa com a qualidade ambiental, com a saúde e com
a segurança dos trabalhadores.
Para essas empresas, é fácil adotar esse discurso, uma vez que se escondem
espertamente atrás de seus prepostos, e ainda, contam com a vantagem de que seus
fornecedores não são vistoriados pelas certificadoras, durante a vigência da certificação,
podendo, desse modo, até manipular dados e informações, para garantir a continuidade
da certificação durante as vistorias internas, além da corrupção presentes nas mais
distintas esferas públicas.
Para burlar a fiscalização, determinadas empresas se aproveitam estrategicamente da
foto de fornecedores, que contratam os “gatos”, os quais, por sua vez, contratam os
“subgatos”, que se deslocam para o Nordeste, a fim de buscar os trabalhadores. Quando
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esses aliciadores não vão até esses lugares, ligam para algum conhecido, alguém de
“confiança”, e pedem para reunir a turma de trabalhadores e encaminhar para as usinas.
As condições em que muitos desses trabalhadores chegam até as empresas
agroindustriais canavieiras do Centro-oeste são seriamente questionáveis. Muitos deles
viajam em condições subumanas. Ainda, os trabalhadores nordestinos são preferidos
pelas usinas do Centro-oeste, não apenas porque falta mão-de-obra local, mas,
sobretudo por estes apresentarem mais resistência física e maior “submissão” às
condições impostas. Oliveira (2009, p.72) afirma que algumas usinas preferem contratar
trabalhadores do Nordeste, que são menos politizados, entendam-se, mais susceptíveis
aos ditames do capital e, portanto, menos ameaçadores, do ponto de vista reivindicativo
de direitos, do que os trabalhadores locais.
Uma questão observada contraria a Convenção Coletiva de trabalho no setor canavieiro
goiano, da qual diz que os trabalhadores devem ser naturais dos municípios dos quais a
cana esta instalada, como discorre a cláusula décima - sétima: Os empregadores rurais darão preferência à contratação de trabalhadores dos municípios sedes das usinas e destilarias, do local da cana plantada e dos municípios vizinhos, desde que estes trabalhadores retornem ao seu município ao final da jornada diária de trabalho. (CONVENSÃO COLETIVA DE TRABALHO DO SETOR CANAVIEIRO GOIANO, 2010, p.17).
A Convenção Coletiva do Setor Canavieiro Goiano (2010) ainda normatiza a “eventual”
contratação de trabalhadores em municípios de outros Estados ou regiões, onde o
empregador deverá consultar nos sindicatos de trabalhadores rurais dos municípios da
área produtora para saber da disponibilidade de mão-de-obra para o trabalho.
Entretanto, inúmeros trabalhadores canavieiros são dos estados do nordeste do Brasil, o
que aumenta o contingente populacional de migrantes no território goiano. Não
discriminamos ou desprezamos a presença desses trabalhadores no Estado de Goiás,
mas esses sujeitos refletem as estatísticas gerais que acentuam de forma drástica a
marginalização dos nordestinos.
A carga horária de um trabalhador no Estado de Goiás é de 44 horas semanais, sendo 8
horas de segunda a sexta-feira, e 4 horas no sábado. O horário na semana é de 7 horas
até às 16 horas, sendo 1 hora de almoço, e no sábado dás 7 horas a 11 horas. A usina
prioriza a contratação do trabalhador que corte cerca de 10 e 14 toneladas por dia. Ou
seja, o trabalhador canavieiro carrega cerca de 10 a 14 toneladas de cana em uma única
jornada de trabalho.
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Refletindo sobre isso Alves (2006, p. 92) afirma que para cortar 6 toneladas de cana em
um dia, considerando uma cana de primeiro corte, de crescimento ereto, o comprimento
do eito deve ser de aproximadamente uma área total de 1.200 m² (200 m de
comprimento por 6 m de largura), nele o trabalhador realiza as seguintes atividades:
Corta a cana rente ao solo, desprendendo as varas das raízes;
Corta a ponteira da cana, que é a parte de cima, onde estão as folhas
verdes, que não têm sacarose e, portanto, não servem para as usinas;
Transporta a cana cortada em cada rua para a rua central;
Abraça a cana-de-açúcar para cortar uma quantidade razoável;
Arruma a cana em montes ou esteirada na rua central.
Por meio desses dados, podemos perceber as atividades diárias de um cortado de cana-
de-açúcar. Alves (2006, p.94) ainda diz que um cortador de cana pode ser comparado a
um atleta corredor fundista, de longas distâncias, e não a um corredor velocista, de
curtas distâncias. Os trabalhadores com maior produtividade não são necessariamente
os que têm maior massa muscular, tão necessária aos velocistas; para os fundistas, é
necessário ter maior resistência física para a realização de uma atividade repetitiva e
exaustiva, realizada a céu aberto, sob o sol, na presença de fuligem, poeira e fumaça,
por um período que varia entre 8 e 12 horas, em período de grande safra, pode ser até
mais.
Ainda o autor afirma que um trabalhador que corte 6 toneladas de cana, em um eito de
200 metros de comprimento por 6 metros, caminha a distância de aproximadamente
4.400 metros e despende aproximadamente 66.666 golpes de podão (podonsadas) por
dia de trabalho. Pode-se pensar que esses dados são exacerbados, mas ao analisar um
dia de trabalho de um cortador de cana é possível notar que em muitos casos esses
dados são até ultrapassados, uma vez que as usinas priorizam a contratação de
trabalhadores que cortam acima de 10 toneladas por dia, o que implica em dizer que
esses números praticamente dobram de valor.
Na foto 1 um cortador de cana depende podonsadas. E nesse sentido, podemos observar
a posição desconfortável e prejudicial a saúde na qual ele se encontra.
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Foto 1 – Trabalhador no corte da cana-de-açúcar em Itaberaí dando podonsadas
Autor - Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itaberaí (2010).
Sobre o intensivo desgaste físico, no qual o trabalhador canavieiro esta inserido, Xavier
e Barone (2008) atribuem a: [...] extensividade da jornada, nas péssimas condições de trabalho, no transporte inadequado e inseguro, na negligência do capital em relação aos EPI’s, no descumprimento dos contratos de trabalho e das normativas trabalhistas, na redução dos direitos sociais, nos alojamentos insalubres e desconfortáveis, que servem de abrigo para os trabalhadores, sobretudo os migrantes. (XAVIER E BARONE, 2008 p. 6).
A colheita da cana-de-açúcar demanda um esforço que chega a ser desumano. Tal
esforço acarreta em uma cruel realidade, em que a atividade do trabalhador canavieiro,
constituído pelo excesso de trabalho, leva a dores no corpo, câimbras, falta de ar,
desmaios e muitas mortes.
Ainda, como instrumento de trabalho o cortador de cana utiliza o facão, o podão, a lima
e a bainha do facão, além dos equipamentos de segurança como o bico de fera, botas
com bico de fero, manguete - manga, chapéus, luvas e óculos. Esta vestimenta faz com
que os trabalhadores transpirem abundantemente e percam muita água junto com os sais
minerais, levando à desidratação e à frequente ocorrência de câimbras.
Esses instrumentos devem ser oferecidos gratuitamente pela empresa, que tem como
obrigação trocá-los periodicamente de 2 em 2 meses. Entretanto é comum o
prolongamento do uso e até mesmo a falta desses. Por outro lado vale ressaltar que os
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usos desses equipamentos são de suma importância para a segurança do trabalhador,
uma vez que ao adentrar no canavial, o contato com a cana machuca, e esses
equipamentos servem para proteger, não só de arranhões, mas de lesões sérias.
Partes dos equipamentos estragam rápido e não são substituídos como se vê na foto 2,
levando o trabalhador a se expor a acidentes de trabalho.
Foto 2 – Botas sem condições de uso sendo utilizadas por trabalhador
Fonte-Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Itaberaí (2010).
É importante lembrar que é comum a ausência de treinamento para o manuseio desses
utensílios, uma vez que seria necessário, visto o risco de amputação de membros
inferiores e até a morte.
Pensando nesses riscos e na fragilidade de incidência relacionadas à saúde no canavial,
é necessária uma política de assistência médica, mas, nem fora e nem dentro do
canavial existe ela existe. No caso de o trabalhador se sentir mal, ele é encaminhado
para o hospital mais próximo, levado pela empresa de carro, o que nem sempre ocorre,
valendo a lei da omissão.
Existem várias incidências de moléstias que atingem o trabalhador canavieiro, das quais
podemos destacar: congestão devido o trabalhador não ter um período apropriado para
as refeições, e se alimentando de pouco a pouco para não parar de cortar cana buscando
sempre produzir; é frequente também a incidência de desmaios, devido o grande
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esforço físico feito para cortar determinada quantidade, além de câncer de pele, que,
mesmo com roupas cumpridas não impedem a incidência dos raios solares.
As tessituras das relações de trabalho no município de Itaberaí Segundo dados obtidos no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Goiás2, a cana-de-
açúcar no município de Itaberaí demanda mão-de-obra no campo de aproximadamente
400 trabalhadores, filiados e registrados no Sindicato dos Trabalhadores Rurais do
município. Destes atualmente trabalham 30 mulheres. Segundo informações do
Sindicato dos Trabalhadores Rurais do município de Itaberaí, essas mulheres não fazem
o mesmo serviço dos homens, elas catam bituca (restos de cana que cai dos caminhões
que transporta a cana cortada).
Grandes partes dos trabalhadores da cana-de-açúcar no município de Itaberaí são do
Nordeste do país: Piauí, Maranhão e Bahia, sendo poucos naturais do município.
Alguns trabalhadores trazem famílias, outros constituem suas famílias no próprio
município. Os trabalhadores canavieiros se situam no bairro periférico chamado
Fernanda Parque, conhecido pela violência e precariedade de estrutura física. Sobre isso
a Convenção Coletiva de Trabalho do Setor Canavieiro Goiano (2010, p.18) do qual é
vigente em todos os municípios goianos, estabelece no parágrafo quarto que “nos casos
de contratação de trabalhadores em municípios de outros estados ou regiões, o
empregador fornecerá alojamento gratuito, sem caráter salarial, observando as normas
de segurança, saúde e higiene”. Mas isso nem sempre ocorre, visto que segundo o
Sindicato dos Trabalhadores Rurais do município já houve caso em que cinco famílias
inteiras dividiam 1 casa pequena, com condições precárias.
Os trabalhadores são contratados inicialmente pela ajuda de “gatos” na primeira
contratação da cana, depois essa contratação é feita pela própria indústria, atrelada
muitas vezes ao sindicato dos trabalhadores que agem, de certa maneira como
“contratadores”. Essa prática antiga e muito comum nos canaviais brasileiros é
legalmente uma prática criminosa, visto os “gatos” são pessoas que possuem relação de
ganho com a contratação dos trabalhadores canavieiro, dos quais tem a função de aliciar
e coagir os trabalhadores com proposta de um ganho salarial justo.
A lei que proibi essa prática esta na cláusula décima oitava da Convenção Coletiva de
Trabalho do Setor Canavieiro Goiano (2010, p. 18) estabelecendo que “os
empregadores não poderão utilizar “gatos” na contratação de empregados para prestar-
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lhes serviços na lavoura de cana, devendo designar um proposto para representá-los
perante os empregadores”. Para essa questão, que se constitui como hábito nos
canaviais do município de Itaberaí, seria necessário utilizar expressões mais
emblemáticas, como ao invés de utilizar o termo “não poderão” por que não fazer uso
de termologia é “terminantemente proibido” a utilização de “gatos”. Entretanto, essa
questão e tantas outras não podem ficar em papéis, mas devem se tornar vivas no que se
refere a punição de empregadores com tais práticas criminosas.
Ainda, a Convenção Coletiva de Trabalho do Setor Canavieiro Goiano (2010)
estabelece que o piso salarial dos trabalhadores na lavoura canavieira não pode ser
inferior a R$ 606,77 mensais, ou seja, independente do que o trabalhador corte, o
salário dele não pode ser menor que esse piso. Mas o que se percebe como prática é
que para receber esse valor o trabalhador deve cortar diariamente mais de 14 toneladas
(média dos trabalhadores no município de Itaberaí) os que cortarem menos não serão
contratados pelo empregador rural, soma-se a isso o agravante de que o cortador de
cana-de-açúcar ganha por metro/pesado, acentuando as jornadas e os exercícios do
trabalho com base na exploração.
A jornada de trabalho no canavial no município de Itaberaí é de segunda a sábado,
perfazendo 44 horas semanais, onde de segunda-feira até sexta-feira o horário é das 7 às
16 horas, já no sábado o horário é das 7h ás 11h. Eles chegam ao Terminal do
Trabalhador para serem transportados às 5:30h da manhã, onde lá tomam um café.
Sobre o transporte, na maioria das vezes é de pouca qualidade. A Convenção Coletiva
de Trabalho do Setor Canavieiro Goiano (2010) afirma que os empregadores
forneceram transporte gratuito e seguro. O transportador deve evitar o excesso de
velocidade e terão como ponto de chegada o ponto original de saída.
No canavial o tempo para o almoço é de 1 hora, o que nem sempre acontece, pois
muitos dos trabalhadores vão comendo aos poucos, para não parar de cortar cana, ou até
mesmo não se alimentam, visando a renda mensal que é paga por produção, ou seja, o
foco nos canaviais não é o trabalho legitimado com direitos, mas pelos os “incentivos”
econômicos que mascaram a realidade de trabalho degradante.
Não podemos culpar os trabalhadores por quererem ganhar mais e prejudicarem a sua
integridade física, pois é o sistema, do qual o capital permite ter como lógica de
pagamentos salariais somente o “suficiente” para a subsistência do trabalhador, que o
condena a tal situação. Essa exposição do trabalhador ao trabalho degradante dos
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canaviais propícia, como já foi destacado congestão, desmaios frequentes, câncer de
pele e outros males que vão atingir esses trabalhadores durante o restante de suas vidas,
dessa maneira o capital constitui relações degradantes, desconsiderando o trabalho, e
logo os trabalhadores que sustentam tal sistema de produção.
Enquanto o trabalhador canavieiro esta na propriedade rural, em serviço, a
responsabilidade de sua segurança e saúde fica por conta do empregador. De acordo
com a Convenção Coletiva do Setor Canavieiro Goiano (2010) em caso do empregado
ficar doente ou sofrer acidente em serviço ele deve ser transportado gratuitamente para
o hospital credenciado à Previdência Social mais próxima das lavouras e após ser
atendido o trabalhador deverá retornar a empresa, quando possível ou a residência do
trabalhador.
Os canaviais não ficam perto de postos de saúde, muito menos de hospitais, por tal,
acidentes e até números de mortes nos canaviais poderiam ser amenizadas se no próprio
canavial houvesse algum tipo de assistência médica, o que serviria como prevenção.
Entretanto, os empregadores não tem muita preocupação com os trabalhadores que são
mão-de-obra pulsante da produção canavieira, visto que a legislação não fiscaliza e nem
pune os produtores que negligenciam a saúde física do trabalhador canavieiro.
No que se refere a medição da cana-de-açúcar cortada, a Convenção Coletiva de
Trabalho do Setor Canavieiro Goiano (2010) estabelece que será usada uma medida
padrão, sendo o compasso de 2 metros com ponta de ferro utilizado para medir “eito a
eito” da cana, essa medição para o trabalhador é realizada pelo fiscal ou coordenador de
turma. Isso, portanto, não legitima o trabalhador canavieiro, visto que ele não possui
instrumento nenhum para saber se a medição é correta. É necessário salientar que
normalmente esses fiscais ou coordenador tem uma predileção
Fica estabelecida também que os empregadores forneceram comprovante da produção
diária do trabalhador permanente, temporário e do diarista. O pagamento dessa
produção deve ser semanal ou quinzenal, realizado por meio de cheque, dinheiro ou
depósito em conta bancária, contando ainda com contra-cheque ou recibo de
pagamento. Surge então um questionamento que é de conhecimento de todos, mas é
sempre válido questionar: quem assegura que os trabalhadores recebem tais
comprovantes? Para responder tal questão não é plausível titubear, visto que não a nada
e nem ninguém que confira se eles recebem esses comprovantes de pagamento.
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A Convenção Coletiva de Trabalho do Setor Canavieiro Goiano (2010) não especifica
onde esses pagamentos devem ocorrem, contudo observamos em Itaberaí, que esse
pagamento é feito na sede do sindicato municipal de Itaberaí, o que aponta para
possíveis atrelamentos entre sindicato e produtores. Com essa atitude o sindicato perde
a sua finalidade que é de garantir e legitimar os diretos, condicionando melhores
condições de trabalho aos trabalhadores. Visto que para tal serviço os trabalhadores
pagam ao sindicato uma mensalidade, muitas vezes já descontada no salário.
Existem contradições emblemáticas na Convenção Coletiva de Trabalho do Setor
Canavieiro Goiano (2010) da qual rege e é instrumento do Sindicato do Trabalhador
Rural no município de Itaberaí. Dentre algumas temos a da cláusula vigésima –
condição especial para estudante da qual discorre que:
Fica assegurado ao empregado rural estudante o direito de ausentar-se do trabalho nos períodos de estágios ou outras atividades exigidas pela escola, considerando-se falta justificada, porém não remunerada, desde que o empregado comprove tal situação mediante declaração ou outro documento fornecido pela escola. (CONVENSÃO COLETIVA DE TRABALHO DO SETOR CANAVIEIRO GOIANO, 2010, p. 19).
Ora, tal cláusula é irrisória, visto que o cansaço e o ganho proporcionado por produção
não incentivam e muito menos permitem que os trabalhadores, muitos com pouca
escolaridade, freqüente o ensino escolar.
Se a intenção da Convenção é assegurar a escolaridade do trabalhador canavieiro, só
essa cláusula não da conta disse, visto que esse é um problema que não pode ser
solucionado com medidas paulatinas, mas com legislações sérias que ultrapassem a
teórica e se concretize na prática.
E ainda, no que se refere a Convenção Coletiva de Trabalho do Setor Canavieiro
Goiano (2010) a cláusula vigésima quinta dispõe que “fica proibida qualquer
discriminação em razão de idade e sexo, oferecendo-se igual oportunidade de trabalho a
todos e a todas”. Colocamos em destaque que o trabalho no canavial é por demasiado
exaustivo e por tal nem todos podem realizar esse trabalho, ocorrendo assim uma
natural discriminação.
As características descritas do trabalho no município de Itaberaí são base para uma
leitura local dos objetos dessa pesquisa, permitindo o contato e estabelecimentos com
as relações trabalhistas presentes no campo, ligadas a produção de cana-de-açúcar.
Essas características são o agronegócio que envolve as relações comerciais produtivas
estabelecidas na produção da cana-de-açúcar, a partir das relações de poder e suas
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implicações no espaço por meio da territorialidade canavieira, além do uso do
trabalhador canavieiro em um contexto de superexploração.
No município de Itaberaí as características que constituem o cultivo da cana, são
características hegemônicas da dinâmica sucroalcooleira em relação ao Estado de Goiás
e no Brasil. Tal quadro de exploração e degradação do trabalho intensifica os índices de
trabalho em condições análogos no que se refere ao setor sucroalcooleiro.
Não podemos justificar esse cenário meramente nas faltas de conhecimentos das leis
que de fato legitime os trabalhadores e na própria falta de leis que buscam regular o
trabalho no campo, visto que existem leis e convenções com esse intuito.
Considerações finais A postura do capital frente ao trabalhador sintetiza a visão do modo de produção
capitalista que afirma com as suas atitudes que o trabalhador é parte inferior do capital,
seguramente inferior as “possibilidades” do capital, sendo pequeno diante desse sistema
de produção.
Diante dessa dinâmica das relações trabalhistas no campo constituído no modo
capitalista, Fernandes e Welch (2008, p. 48) ressaltam que o “trabalhador é subalterno a
esse modelo de desenvolvimento capitalismo pelo fato de não possuir “poder” para
impor outro modelo de correlação de forças com o capital”, uma vez que a ela não resta
muito, a não ser tentar lutar ou, como é o que mais ocorre, ser sujeito ciente da sua
subalternidade.
Nesse contexto de subalternidade, dentre as características que constituem a dinâmica
das relações de trabalho estabelecidas na produção da cana-de-açúcar no município de
Itaberaí-GO, a partir das relações de poder e suas implicações no espaço, destaca-se o
uso do trabalhador canavieiro em um contexto de superexploração.
Essas características são bases para uma leitura que permiti o contato e estabelecimento
de características das relações trabalhistas presentes no campo com base no
assalariamento, ligadas à produção de cana-de-açúcar, assim, as relações de trabalho na
lavoura de cana-de-açúcar em Itaberaí vêm sendo marcadas principalmente por:
1. Falta de transporte adequado e sem segurança;
2. Falta de instalações sanitárias no campo;
3. Os trabalhadores fazem as refeições sem qualquer acomodação;
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4. Falta de treinamento para utilização de utensílios de trabalhado, de
equipamentos de segurança e até sem condição de uso.
5. Jornadas de trabalho excessivas, que não permite descanso;
6. Incidências de doenças relativas a saúde do trabalhador, como câncer de
pele por exemplo.
Ainda, constatamos que a maioria desses trabalhadores são oriundos de regiões pobres
do Brasil, como a Bahia, Piauí e o Maranhão. Por que esses trabalhadores deixam as
suas famílias e os laços identitários que possuem com a sua terra e são subalternizados
no corte da cana? Um trabalhador maranhense afirma que “lá não tem emprego, nem na
roça e nem na cidade. A gente fica passando fome e aí vem trabalhar na cana”. Diante
dessa fala contundente, observamos que a falta de condições para sobreviver faz com
que esses homens acabam por não ter escolha e são “encurralados” na trama do capital
que expropria o homem de condições humanas de trabalho.
Outro dado relevante é o baixo índice de escolaridade, variando da ausência total de
escolaridade até a escolaridade primária (1° a 4° série do Ensino Fundamental). Isso
implica em dificuldades para saber dos seus direitos e em uma maior facilidade para as
barganhas que se configuram, na maioria das vezes em exploração. Nesse contexto de
subalternidade, os trabalhadores canavieiros afirmam que o trabalho que eles realizam
beira a exaustivo o, visto que eles próprios afirmam que quando começaram a trabalhar
nos canaviais notavelmente perderam peso, reflexo do corte de cana-de-açúcar.
Com essa pesquisa constatamos que o cultivo da lavora de cana-de-açúcar é composto
por características em que o agronegócio, a partir das relações de poder constituídas
pelo domínio de um território, submete o trabalhador canavieiro em um contexto
massacrante de superexploração.
Ressaltamos que a partir da pesquisa em campo, concluímos que as relações de trabalho
estabelecidas e constituídas e constituintes do agronegócio da cana do município de
Itaberaí, são características da dinâmica sucroalcooleira que alimentam e fortalece o
agronegócio no Estado de Goiás.
Essas características, descritas nesse trabalho nos levam a concluir, que o cultivo da
lavora de cana-de-açúcar é composto pelo agronegócio, a partir das relações de poder
constituídas pelo domínio de um território, submete o trabalhador canavieiro em um
contexto massacrante de superexploração. Assim concluímos que as relações de
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trabalho estabelecidas e constituídas nos canaviais do município de Itaberaí, são
características hegemônicas da dinâmica sucroalcooleira.
Toda essa realidade produz e reproduz as dinâmicas nos canaviais, são consideradas
“doces” para os que comandam o agronegócio da cana-de-açúcar/álcool, e, “amargas
como fel” para os trabalhadores que são obrigados a se sujeitarem a uma
superexploração de sua força de trabalho para sobreviver.
Notas
______________ 1Informações obtidas em pesquisa de campo, no município de Itaberaí, com entrevista ao presidente José Jackson Ribeiro e ao secretário Romildo Silva de Assis no sindicato dos trabalhadores rurais do Município de Itaberaí-GO. (Informações verbais) Em: 28 de setembro de 2010 e em 23 de agosto de 2011.
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