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Desenvolvimento Sustentável e a Abordagem Grassroots:delineando caminhos convergentes
AUGUSTO MARCOS CARVALHO DE SENAUniversidade de Fortalezaamsena@unifor.br FÁTIMA REGINA NEY MATOSUniversidade de Fortalezafneymatos@unifor.br RAFAEL FERNANDES DE MESQUITAUniversidade de Fortalezafernandesrafael@live.com DIEGO DE QUEIROZ MACHADOUniversidade de Fortalezadiegoqueirozm@yahoo.com.br
XVI ENGEMA 2014 1
Desenvolvimento Sustentável e a Abordagem Grassroots: delineando caminhos
convergentes
Resumo
O objetivo deste trabalho é analisar a conjectura de convergência existente entre a concepção do
desenvolvimento sustentável tradicional – pilares econômico, social e ambiental – e a perspectiva do
desenvolvimento sustentável considerando o spectrum de resistência contido na abordagem grassroots
– economia solidária, movimentos sociais, ecologia política e identidade local. Mesclas entre os pilares
do desenvolvimento sustentável tradicional e o spectrum de resistência da abordagem grassroots – pilar
econômico com economia solidária, pilar social com movimentos sociais, pilar ambiental com ecologia
política, e pilar cultural (um novo pilar acrescido à concepção tradicional) com identidade local – são
conjecturadas de forma a evidenciar caminhos convergentes entre as abordagens analisadas, ensejando
um delineamento mais robusto para uma nova concepção de desenvolvimento sustentável.
Palavras-chave: Desenvolvimento Sustentável. Abordagem Grassroots. Resistência.
Sustainable Development and Grassroots Approach: outlining converging paths
Abstract
This article aims to analyze a convergence conjecture that there exists between the traditional approach
of sustainable development and a sustainable development perspective that considers a spectrum of
resistance coming from the grassroots approach – solidarity economy, social movements, political
ecology and local identity. Merging of the traditional sustainable development pillars and the resistance
spectrum of the grassroots approach – economic pillar with solidarity economy, social pillar with social
movements, environmental pillar with political ecology, and cultural pillar (a new pillar added to the
traditional conception) with local identity – is conjectured in order to evidence convergent paths
between the analyzed approaches, leading to a more robust structure for a new conception of
sustainable development.
Keywords: Sustainable Development. Grassroots Approach. Resistance.
Introdução
As últimas décadas do século passado e o início de século XXI têm sido marcados por intensas
transformações nas relações socioeconômicas, ambientais e culturais, resultantes de céleres mudanças
nos padrões técnicos, científicos e informacionais e nas interações multifacetadas que permeiam a
dinâmica das sociedades hodiernas. Isso, de algum modo, pode ser interpretado como nuanças da atual
fase do sistema capitalista que vislumbra a expansão das atividades produtivas em um intenso processo
de globalização multidimensional (BOSSLE, 2011).
Na dinâmica desse processo tem-se também observado a emergência de novos
encaminhamentos que o capitalismo tradicional não está apto a absorver – a forte tendência de
possibilidades produtivas que embutem preocupações sociais, ambientais e culturais em suas atividades
econômicas. Tal nova perspectiva é de importância crucial, como foco de resistência, em relação às
demandas por acumulação tradicional que, muitas vezes, forjam um imaginário social voltado ao
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consumismo material e difunde um padrão de vida social insustentável, com parte
substancial das populações ficando à margem dos benefícios.
A estrutura econômica do modo de produção capitalista tradicional caracteriza-se, no âmbito
das forças produtivas, pelo emprego da máquina e do trabalho coletivo, baseando-se na propriedade
privada dos meios de produção. Isso quer dizer que a partir da Revolução Industrial, só quem possui
capital, ou só quem o acumulou durante séculos, pode ser proprietário dos meios de produção.
Segundo Escobar apud Lander (2005), a economia é geralmente pensada como um sistema de
produção. Da perspectiva da antropologia da modernidade, entretanto, a economia deve ser vista como
uma instituição composta de sistemas de produção, poder e significação. Os três sistemas uniram-se no
final do século XVIII e estão inseparavelmente ligados ao desenvolvimento do capitalismo e da
modernidade ocidental. Devem ser vistos como formas culturais por meio das quais os seres humanos
são transformados em sujeitos produtivos. A economia não é apenas, nem sequer principalmente, uma
entidade material. É, antes de tudo, uma produção cultural, uma forma de produzir sujeitos humanos e
ordens sociais de um determinado tipo.
Tendo em vista o caráter crítico que envolve o debate sobre o capitalismo tradicional com suas
nuanças e as novas conjecturas produtivas que possibilitam um olhar socioambiental, político,
solidário, e cultural em atividades capitalistas (não tradicionais), o presente estudo engrossa a massa
crítica de contribuições que defendem sociedades menos desenvolvidas dos meandros do capitalismo
tradicional que, no mais das vezes, tenta impor padrões socioeconômicos e culturais completamente
alheios aos das comunidades locais.
Apenas considerando a primeira mescla, economia solidária com o pilar econômico do
desenvolvimento sustentável tradicional, pode-se sugerir uma conjectura de resistência que expande a
concepção tradicional a uma perspectiva bem mais promissora e adequada ao verdadeiro caráter
econômico do desenvolvimento sustentável, incluindo igualdade, cooperação, liberdade e autogestão,
valores-chave da economia solidária (NUNES, 2009). Assim, uma melhor forma de se referir a esse
pilar seria intitulá-lo “Pilar Econômico Solidário” e não apenas “Pilar Econômico”.
Diante do exposto, o objetivo deste trabalho é analisar a conjectura de convergência entre a
concepção do desenvolvimento sustentável tradicional e a perspectiva do desenvolvimento sustentável
considerando o spectrum de resistência contido na abordagem grassroots. Dessa forma, a concepção do
desenvolvimento sustentável padrão é apresentada de início. Para os três pilares (econômico, social e
ambiental), mais a adição do pilar cultural, são conjecturadas mesclas de modo a revestir a concepção
tradicional com a perspectiva de resistência da abordagem grassroots (ESCOBAR, 1995).
Concepção do Desenvolvimento Sustentável
A construção do conceito de desenvolvimento é um retrato da evolução da economia global,
dividindo-se em três fases: i) a que o coloca como sinônimo de crescimento econômico; ii) a que nega a
possibilidade de existir um efetivo desenvolvimento mundial; e iii) a que agrega o valor ambiental
como sustentáculo desenvolvimentista, dando destaque ao desenvolvimento sustentável
(MAGALHÃES; MOTA, 2012).
Segundo Sachs (2008), por tempos, a ideia de desenvolvimento confundia-se com crescimento,
tendo como base os fundamentos econômicos, como citado anteriormente. Entretanto, o crescimento
econômico parte da premissa de que quanto maior o progresso material, maior será a melhoria dos
padrões sociais de determinada população, ou seja, a elevação dos benefícios sociais seria uma
consequência natural do crescimento econômico. Tem-se uma visão de desenvolvimento que privilegia
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uma visão quantitativa do fenômeno econômico e seus impactos sociais, ao mesmo tempo
em que prega o não intervencionismo estatal, bem como a capacidade dos atores econômicos de se
autodeterminarem e de encontrarem o ponto de equilíbrio necessário à manutenção da saúde do cenário
econômico global.
Surgem então críticas ao associativismo do crescimento econômico e do desenvolvimento
sustentável, não negando a importância deste primeiro elemento para o desenvolvimento, entretanto, o
crescimento econômico deixa de ser encarado como um fim em si mesmo e tampouco como o único
caminho para se chegar ao desenvolvimento (VEIGA, 2005).
Segundo Magalhães e Mota (2012), a referida constatação nasce da observância do recorrente
descompasso entre desenvolvimento e crescimento econômico, que nem sempre é acompanhado de
mudanças sociais ocorridas na mesma proporção ou velocidade. Com efeito, em cenários de rápido
crescimento econômico, o desenvolvimento tem se mostrado uma exceção histórica e não a regra geral.
Outro fato muito criticado em relação ao crescimento econômico é o favorecimento à alta concentração
de riqueza e de renda nas mãos de poucas pessoas. Essa característica se mostra especialmente presente
em modelos econômicos que estimulam a criação de arquipélagos isolados de geração de riqueza,
propiciando padrões de crescimento excludente. Um exemplo desse arquétipo de arquipélago é a Zona
Franca de Manaus, cidade que há anos vem se situando entre os melhores índices do PIB brasileiro,
mas que também apresenta enormes e crescentes desigualdades sociais.
Diante dessas percepções, muitos teóricos se insurgiram contra a idealização do
desenvolvimento, dos quais destacamos aqui Arrigi (1998) e Sen (2000). Arrigi (1998), um dos grandes
expoentes dessa corrente ceticista, concebeu o chamado “padrão trimodal” para tentar explicar a
dinâmica econômica e social mundial para se atingir o desenvolvimento. Sen (2000), por meio da sua
obra, Desenvolvimento como liberdade, marca a nova fase da teoria do desenvolvimento, quando
afirma que o desenvolvimento consistiria na eliminação de tudo que limita as escolhas e as
oportunidades das pessoas. Ou seja, o desenvolvimento passa a ser associado não somente ao
crescimento econômico, mas aos direitos humanos fundamentais, promovendo a igualdade e
maximizando a vantagem daqueles que vivem em condições de subdesenvolvimento.
Segundo Magalhães e Mota (2012), uma das características que se sobressai desse novo
desenvolvimento é o deslocamento da visão quantitativa para uma visão qualitativa, a qual coloca em
segundo plano as temáticas como economia e contabilidade pública, para ceder lugar à governança de
cunho social.
Em 1990, a Organização das Nações Unidas (ONU), apresentou ao mundo um dos mais
conhecidos índices utilizados para aferir o nível de desenvolvimento: o Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH), que segue a fórmula baseada na média geométrica de três subíndices: expectativa de
vida, educação formal e renda per capita. Muitas críticas surgiram em torno do índice proposto pela
ONU, fundamentando-se na sua limitação dos critérios utilizados para medir o desenvolvimento, para
esses críticos, outros indicativos a par da educação, renda e saúde, mostram-se igualmente importantes,
a fim de se obter uma visão mais global e real do desenvolvimento. Um desses índices refere-se ao
meio ambiente, sendo considerado um direito fundamental, o acesso ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado, inaugurando assim, a fase do desenvolvimento sustentável (MAGALHÃES; MOTA,
2012).
Para Sachs (2008), o desenvolvimento sustentável é caracterizado pela integração das
dimensões humana e ecológica, visando à dignificação de todos os seres humanos por meio da
erradicação da pobreza e da realização de seus direitos fundamentais.
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Analisando o desenvolvimento sustentável, a partir de diferentes visões, níveis e
significados, buscando uma visão mais ampla com o objetivo de pontuar ações e metas, Sachs (2008,
p.15), definiu cinco dimensões de sustentabilidade:
a) Social: fundamental por motivos tanto intrínsecos quanto instrumentais, por causa da
perspectiva de disrupção social que paira de forma ameaçadora sobre muitos lugares problemáticos
do nosso planeta;
b) Ambiental: com as duas dimensões (os sistemas de sustentação da vida como provedores
de recursos e como “recipientes” para a disposição de resíduos);
c) Territorial: relacionado à distribuição espacial dos recursos, das populações e das
atividades;
d) Econômico: sendo a viabilidade econômica a conditio sine qua non para que as coisas
aconteçam;
e) Política: a governança democrática é um valor fundador e um instrumento necessário
para fazer as coisas acontecerem; a liberdade faz toda a diferença.
De acordo com as cinco dimensões propostas por Sachs (2008), daremos ênfase a seguir ao que
chamaremos de pilares econômico, social, ambiental, que são diretamente ligados ao desenvolvimento
sustentável, tratados por Elkington (2001) como a teoria dos três pilares do desenvolvimento
sustentável.
Pilar Econômico
Na visão convencional, o pilar econômico tem como elemento principal o lucro. A abordagem
requer uma busca de sustentabilidade econômica em longo prazo. Ao avaliar esse pilar levando em
consideração o conceito de desenvolvimento sustentável, é preciso incutir na ideia de capital
econômico, capital humano e intelectual, conceitos que, conforme Elkington (2001), gradativamente
foram incorporados ao entendimento de capital econômico, sem mencionar os conceitos de capital
natural e social que, no longo prazo, passam a ser fundamentais para avaliação do pilar econômico.
A definição clássica do desenvolvimento sustentável, expressa no chamado Relatório
Brundtland, é a do desenvolvimento que “satisfaz as necessidades do presente sem comprometer a
possibilidade das gerações futuras satisfazerem suas próprias necessidades” (DINIZ; BERMANN,
2012). O desenvolvimento econômico começa a ser repensado de uma nova forma, levando em conta a
igualdade entre as gerações. Até então, o desenvolvimento econômico tinha uma óptica um pouco mais
restrita e normalmente considerava os determinantes fundamentais do crescimento econômico sem
levar em conta o meio ambiente.
A análise econômica de questões relacionadas ao meio ambiente pode se dar tanto pelo lado da
microeconomia quanto pelo da macroeconomia. Com relação à microeconomia, pode-se, por exemplo,
verificar se a adoção de tecnologias menos poluentes ou mais eficientes é viável, ou se a adoção de
políticas energéticas em um país possui impactos sobre outros países. Com relação à macroeconomia,
pode-se pesquisar a relação entre o meio ambiente e o desenvolvimento econômico, ou seja, estuda-se
devidamente a questão da sustentabilidade. Dentro dessa linha de pesquisa, avalia-se, por exemplo, a
existência ou não de uma Curva Ambiental de Kuznets para um dado poluente, e se a presença de
poluentes interfere na convergência condicional dos países para uma renda per capita de equilíbrio e
em sua velocidade.
Um dos conceitos mais recentes agregados ao desenvolvimento sustentável é a noção de
economia verde. Define-se economia verde como aquela que resulta em melhoria do bem-estar humano
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e na equidade social, ao mesmo tempo em que reduz significativamente os riscos
ambientais e a escassez ecológica (UNITED NATIONS apud DINIZ; BERMANN, 2012).
Por fim, entendemos o pilar econômico como uma proposta de equidade socioeconômica e
ambiental que visa o bem da humanidade respeitando os recursos naturais, fortalecendo assim o
conceito de desenvolvimento sustentável.
Pilar Social
O pilar social, segundo Sachs (2008), abrange a visão de que as más situações sociais em
muitos lugares do mundo estão relacionadas ao descaso das autoridades, frente à desigualdade social
acumulada ao longo dos anos. Para alguns teóricos, segundo Estender e Pitta (2008) questões como a
da desigualdade social e da educação, entre outras, não fazem parte do conceito de sustentabilidade,
assim como a questão econômica e ambiental. Para esses autores o que realmente importa é se o
sistema social não estiver equalizado, isto é, não estiver progredindo equitativamente, a questão
ambiental e a econômica não irão progredir de maneira desejada.
O desenvolvimento sustentável, frente à sociedade, busca meios de equalizar as riquezas, como
já mencionado anteriormente, de modo a deter um tipo crescimento econômico concentrador. A
transparência proposta pela sustentabilidade proporciona um mix entre sociedade e organizações
levando à conscientização e ao anseio em participarem cada vez mais das ações pró-social, e assim
aumentar a capacidade de dissipar a desigualdade social.
Pilar Ambiental
Desde a pré-história, com o intuito de garantir sua sobrevivência, a humanidade teve que
transformar a natureza, pois as condições biológicas do homem não eram suficientemente favoráveis
para sua sobrevivência no ambiente hostil que ele habitava. Segundo Dias (2006), todas as estratégias
desenvolvidas pelo homem eram capazes de causar pequenas alterações no meio ambiente.
Com o advento da Revolução Industrial, aconteceu uma série de grandes transformações no
modo de produção, deixando de ser artesanal para tornar-se manufatureiro. Disseminavam-se
alterações no ambiente como um todo, pois os processos industriais necessitavam de grandes
quantidades de energia e de recursos naturais. De acordo com Dias (2006), vários foram os problemas
causados pela industrialização, tais como: urbanização acelerada e não planejada, alta concentração
populacional, consumo excessivo de recursos naturais não renováveis, contaminação do ar, água e solo,
desmatamento, dentre outros.
Os vários acidentes industriais causados pela busca desenfreada de uma produção despreparada,
onde os resíduos não recebem tratamento adequado para serem reabsorvidos pela natureza, tornaram-se
o principal motivo da conscientização da população em relação aos problemas causados no meio
ambiente, atuando como instrumento de sensibilização socioambiental.
Os principais problemas ambientais que preocupam a população estão intrinsecamente ligados
ao processo de produção capitalista, que afeta diretamente o meio ambiente, provocando em muitos
casos efeitos irreversíveis ou de difícil recuperação, como citam Bernardes e Ferreira (2003, p. 28):
[...] Hoje os riscos produzidos se expandem em quase todas as dimensões da vida humana,
obrigando-nos a rever a forma como agimos sobre o meio natural e as próprias relações sociais,
obrigando-nos a questionar os hábitos de consumo e as formas de produção material. Muitas
vezes a consciência dos riscos provocados pelas novas tecnologias no ambiente natural se torna
alarmista, mas ninguém pode negar a gravidade da situação.
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O desenvolvimento sustentável, neste contexto, propõe uma preservação dos recursos naturais,
onde o crescimento considere a continuidade e sustentação do ecossistema, fazendo-se necessário que
os padrões de consumo e de relacionamento levem em consideração a conservação do meio ambiente e
a melhora na qualidade de vida, aspectos essenciais para a continuidade da qualidade de vida humana.
Resistência e a Abordagem Grassroots
Diante das mudanças pós-revolução industrial, onde predominava o capitalismo, surgiu à
necessidade pela informação sobre diversos tipos de sociedades, incluindo as de acumulação, alvo
principal do capitalismo moderno que tinha como estratégia o globalocentrismo.
Segundo Peng (2008), a globalização pode ser considerada uma nova força que se move de
forma impetuosa pelo mundo; uma evolução histórica de longo prazo que ocorre desde a origem da
história humana; ou um pêndulo que balança de um extremo a outro. Uma visão crítica sugere que a
globalização é um novo fenômeno que surgiu no final do século XX, guiado tanto pelas recentes
inovações tecnológicas em transporte e comunicações como pela noção de uma suposta hipocrisia
ocidental das empresas multinacionais que pretendem explorar e dominar o mundo. O mundo do início
do século XXI guarda semelhanças em relação ao mundo do fim do século XIX, onde se via a
diminuição das barreiras do comércio e viagens, sendo os Estados Unidos a principal economia
emergente da época. Aquela fase histórica foi abruptamente encerrada com o advento das duas guerras
mundiais.
Dentro desse contexto, Peng (2008) ressalta ainda o surgimento do receio de economias
desenvolvidas, pois havia uma percepção de que as economias emergentes não estavam somente
tomando empregos, por meio da competição no setor de produção, mas também ameaçando alguns
empregos que requeriam alta tecnologia. Por outro lado, facções em economias emergentes reclamam
do ataque das empresas multinacionais, que supostamente destroem as companhias domésticas, as
culturas, os valores e o meio ambiente.
O capitalismo baseia-se na propriedade privada dos meios de produção. A partir da Revolução
Industrial, o poder era detido por quem possui capital, exclusivamente a burguesia, que era a
proprietária dos meios de produção. Nesta mesma época, ocorre uma completa separação entre o
capital e o trabalho, ou seja, o trabalhador, o produtor direto, não tem mais a propriedade dos meios de
produção. Eles são propriedade exclusiva dos detentores do capital. Como os meios de produção são de
propriedade privativa da burguesia, ela orienta toda a produção com vistas à obtenção do lucro. Isto
significa que, no Capitalismo, o único objetivo da produção é o lucro, não a necessidade.
Segundo Ramos Filho (2005) a existência de um movimento reivindicativo estável, organizado
e socialmente legítimo dos produtores diretos no modo de produção capitalista é uma possibilidade
virtualmente contida na macro-estrutura desse modo de produção, na qual se articulam uma
infraestrutura econômica dotada de produção socializada operada pelo trabalhador coletivo com uma
superestrutura jurídico-política produtora da ilusão de um coletivo nacional de indivíduos livres e
iguais. O movimento reivindicativo dos produtores diretos está potencialmente contido nessa
macroestrutura, mas, para impor-se à burguesia, depende, convém repetir, da luta pertinaz dos
produtores diretos. Essa luta não é mera realização daquilo que está virtualmente contido na estrutura;
ela opera um trabalho de transformação, uma distorção nas figuras e nas normas do direito burguês.
No plano do direito e do mercado, desaparecem as classes sociais e não existe, tampouco, a
distinção entre força de trabalho, que é a capacidade de trabalhar, e trabalho, que é a utilização efetiva
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daquela capacidade pelo capitalista. Nas condições normais do capitalismo, tudo se passa,
portanto, como se o aluguel da força de trabalho pelo capitalista fosse um contrato livre de compra e
venda no qual um indivíduo fornece, em troca de um pagamento que é o salário, o seu “trabalho”, uma
mercadoria que é propriedade sua, a outro indivíduo (MARX, 1982). No ato de venda, todo
proprietário de mercadoria deve receber, em pagamento, o justo preço pela mercadoria que aliena. É,
portanto mera atualização da estrutura jurídico-política do modo de produção capitalista a prática de o
trabalhador individual negociar com o capitalista o preço “do trabalho”, isto é, o seu salário. Isso não
significa que o trabalhador tenha sempre condições reais de negociar individualmente o seu contrato de
trabalho.
Desenvolvimento Sustentável e Resistência
Na procura de alternativas a estas formas universalistas de submissão e controle de todas as
dimensões da cultura e da vida, Escobar (1995) aponta para duas direções complementares: a
resistência local de grupos de base às formas dominantes de intervenção, e a desconstrução do
desenvolvimento (ESCOBAR apud LANDER, 2005 p. 222-223), tarefa que implica o esforço da
desnaturalização e desuniversalização da modernidade. Para este último item é necessária uma
antropologia da modernidade, que conduza a uma compreensão da modernidade ocidental como um
fenômeno cultural e histórico específico (ESCOBAR apud LANDER, 2005, p. 11). Isto passa
necessariamente pela desuniversalização dos âmbitos nos quais se partilhou a sociedade moderna.
Escobar (1995) contribui e defende que embora estejamos em meio à modernidade, com o
capitalismo cada vez mais forte diante das mudanças trazidas nos últimos séculos, é de extrema
importância que se preze pela humanidade, pelas culturas e história de cada região e a população que a
ela pertence.
Segundo Montero (1998), a partir de muitas vozes em busca de alternativas ao modo capitalista
de produção, é possível falar da existência de um modo de ver o mundo, de interpretá-lo e de agir sobre
ele que constitui uma episteme. As ideias centrais articuladoras deste paradigma são, para Montero
(1998), as seguintes:
a) uma concepção de comunidade e de participação assim como do saber popular, como
formas de constituição e ao mesmo tempo produção de uma episteme de relação;
b) a ideia de libertação por meio da práxis, que pressupõe a mobilização da consciência, e
um sentido crítico que conduz à desnaturalização das formas canônicas de aprender – construir – ser
no mundo;
c) a redefinição do papel do pesquisador social, o reconhecimento do outro como si mesmo
e, portanto, a do sujeito-objeto da investigação como ator social e construtor do conhecimento;
d) o caráter histórico, indeterminado, indefinido, inacabado e relativo do conhecimento. A
multiplicidade de vozes, de mundos de vida, a pluralidade epistêmica;
e) a perspectiva da dependência, e logo, a da resistência. A tensão entre minorias e
maiorias e os modos alternativos de fazer-conhecer;
f) a revisão de métodos, as contribuições e as transformações provocados por eles.
A contribuição dos autores citados anteriormente nos remete ao modo de produção sustentável,
ou seja, ao desenvolvimento sustentável que tem como uma das características o aumento da qualidade
de vida, principalmente para a maioria mais pobre. A sustentabilidade requer um padrão de vida dentro
dos limites da natureza, ou seja, deve-se viver dentro da capacidade do capital natural.
O desenvolvimento sustentável compreende quatro questões principais que chamaremos nesta
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pesquisa de “pilares”:
a) Econômico: voltado para a Economia Solidária;
b) Social: baseado nos movimentos sociais;
c) Ambiental: voltado para a ecologia ambiental, respeito e conservação das riquezas
naturais; e
d) Cultural: voltado para preservação da identidade local, da cultura de cada região.
Nesse estudo, trataremos com mais detalhes da abordagem desses pilares enfatizando a
economia solidária, os movimentos sociais, a ecologia política e a identidade local, sendo esta última
uma contribuição ao contexto do desenvolvimento sustentável, visto que se caracteriza como uma
resistência ao globalocentrismo, e a sua forma universalista de produção tão presente no modo de
produção capitalista tradicional.
Segundo Veiga (2006), o modelo de pensamento dominante na ciência econômica sempre foi
mecânico e fascinado pela ideia de equilíbrio. Entretanto, essa forma de pensamento ignorou a união
entre os sistemas econômicos e bióticos, além de desdenhar a existência de limites naturais. É dentro
desta abordagem que demonstramos na figura 1 a proposta de desenvolvimento sustentável baseados
nos quatros pilares citados anteriormente.
Figura 1 – Desenvolvimento sustentável e a abordagem Grassroots (Resistência)
Fonte: Elaborada pelos Autores (2014).
O Pilar Econômico e a Economia Solidária
Economia solidária é uma forma de produção, consumo e distribuição de riqueza centrada na
valorização do ser humano e não do capital. Tem base associativista e cooperativista, voltada para a
produção, consumo e comercialização de bens e serviços de modo autogerido, tendo como finalidade a
reprodução ampliada da vida (PESSOA, 2008). Os princípios e conceitos de Economia Solidária
surgiram em meados do século XVI, com as contribuições de autores como Claude Saint-Simon (1760-
1825), que defendia a busca do bem estar dos trabalhadores mediante a produção de coisas úteis à vida
e redistribuição da riqueza por meio das associações dos cidadãos. O conceito evoluiu à época da
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Revolução Industrial, quando muitos pensadores voltaram-se a tentativa de resolver os
crescentes problemas sociais trazidos à tona pelas práticas mecanicistas e capitalistas da época
(PESSOA, 2008).
Existem diferentes autores que se dedicam à conceituação da Economia Solidária, sendo seus
expoentes Paul Singer e Euclides Mance. Singer propõe que a Economia Solidária seja uma estratégia
possível de luta contra as desigualdades sociais e o desemprego:
A construção da economia solidária é uma destas outras estratégias. Ela aproveita a mudança
nas relações de produção provocada pelo grande capital para lançar os alicerces de novas
formas de organização da produção, à base de uma lógica oposta àquela que rege o mercado
capitalista. Tudo leva a acreditar que a economia solidária permitirá, ao cabo de alguns anos,
dar a muitos, que esperam em vão um novo emprego, a oportunidade de se reintegrar à
produção por conta própria individual ou coletivamente [...] (SINGER, 2002, p. 138).
Já de acordo com Mance (1999), o conceito de Economia Solidária vai além e agrega não
apenas a geração de postos de trabalho, mas sim uma colaboração solidária que visa à construção de
sociedades pós-capitalistas em que se garanta o bem-viver de todas as pessoas:
[...] ao considerarmos a colaboração solidária como um trabalho e consumo compartilhados
cujo vínculo recíproco entre as pessoas advém, primeiramente, de um sentido moral de
corresponsabilidade pelo bem-viver de todos e de cada um em particular, buscando ampliar-se o
máximo possível o exercício concreto da liberdade pessoal e pública, introduzimos no cerne
desta definição o exercício humano da liberdade... (MANCE, 1999 p. 178).
Godoy (2011) relata que foi durante o capitalismo industrial moderno que emergiram as
experiências e projetos de sociedade que estão mais ligados à noção de surgimento de uma economia
solidária, tais como as ideias defendidas pela ideologia associativas. Uma experiência que serve de
exemplo para o debate é o caso do cooperativismo embrionário do século XVI, que inspirou a
recuperação das ideias do trabalho coletivo sob o controle dos trabalhadores e que está presente na
noção atual da economia solidária. A economia solidária em diversos países do mundo surgiu diante da
crise industrial, onde a máquina fazia-se presente e em muitos casos substituindo os operários.
A partir do século XIX, principalmente nos países europeus e nos Estados Unidos, iniciativas
criadas por trabalhadores de cooperativismo e associativismo alavancaram o surgimento e
disseminação de experiências solidárias. No Brasil, a partir de 1980, mas ganhando força maior
somente na década de 1990, a economia solidária disseminou-se, tendo como marco histórico o
Encontro Brasileiro de Cultura e Socioeconômica Solidária, com o intuito de buscar apoio e
reconhecimento da sociedade e dos órgãos políticos competentes sobre os conceitos e objetivos da
economia solidária como um todo (PESSOA, 2008).
A economia solidária aponta para uma nova lógica de desenvolvimento sustentável com
geração de trabalho e distribuição de renda, mediante um crescimento econômico com proteção dos
ecossistemas. Seus resultados econômicos, políticos e culturais são compartilhados pelos participantes,
sem distinção de gênero, idade e raça. Implica na reversão da lógica capitalista ao se opor à exploração
do trabalho e dos recursos naturais, considerando o ser humano na sua integralidade como sujeito e
finalidade da atividade econômica.
De acordo com França Filho (2004), a expressão economia solidária (ES) adquire caráter de
conceito científico nos anos 90. Ele considera o aparecimento da ES, ou a sua noção, decorrente da
emergência de práticas socioeconômicas que primeiramente surgiram na Europa e que estavam
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relacionadas às iniciativas locais. O autor entende como “prática local” aquilo que é
representado pelos novos arranjos do emprego como serviço de proximidade ou serviços solidários.
Outros autores, como Icaza (2003), referindo-se à economia solidária no Brasil, ressaltam que,
pelo seu caráter de manter-se com poucos recursos e quase nenhum capital e por entender
principalmente os setores pobres, o conceito de economia solidária deve ser entendido como um
conjunto de práticas mais amplo: a economia popular. Neste contexto podemos dizer que a economia
solidária preconiza o entendimento do trabalho como um meio de libertação humana dentro de um
processo de democratização econômica, criando uma alternativa à dimensão alienante e assalariada das
relações do trabalho capitalista.
Além disso, a economia solidária possui uma finalidade multidimensional, isto é, envolve a
dimensão social, econômica, política, ecológica e cultural. Isto porque, além da visão econômica de
geração de trabalho e renda, as experiências da Economia Solidária se projetam no espaço público, no
qual estão inseridas, tendo como perspectiva a construção de um ambiente socialmente justo e
sustentável.
Desta forma podemos afirmar que a economia solidária é um jeito diferente de produzir, vender,
comprar e trocar o que é preciso para viver. Sem explorar os outros, sem querer levar vantagem, sem
destruir o ambiente. Cooperando, fortalecendo o grupo, cada um pensando no bem de todos e do
próximo. Para Castanheira e Pereira (2008), não é aceitável o conceito de competição, quando falamos
sobre os princípios da Economia Solidária, exige-se então uma mudança de comportamento, que seja
pautada na solidariedade, enfrentando assim um desafio de realização de uma reeducação coletiva.
Segundo Turcato (2011), a economia solidária capta perfeitamente o sentido de
desenvolvimento sustentável, quando o lado econômico é voltado para a economia solidária, e não a
uma economia cujos objetivos parecem destoar dos contextos mais puros de desenvolvimento
sustentável, que envolve várias dimensões e pensamentos mais holísticos do que somente a
fragmentação do mesmo.
O conceito de economia solidária e desenvolvimento sustentável nos remetem ao conceito do
comércio justo, que se entende como uma associação comercial orientada para um desenvolvimento
sustentável, propondo melhores condições comerciais para produtores excluídos ou em desvantagem.
Permitindo uma melhoria substancial na qualidade de vida das pessoas, tornando viável a vigência dos
direitos humanos e o respeito ao meio ambiente numa perspectiva de desenvolvimento humano,
solidário e sustentável (FRETEL; SIMONCELLI-BOURQUE, 2003).
Por fim, percebemos que a economia solidária e o comércio justo, podem ser considerados
como o pilar econômico do desenvolvimento sustentável e a abordagem grassroots, visando promover
a inserção dos produtores e consequentemente dos produtos, considerados excluídos ou em
desvantagem, evocando a ideia que uma vez consumindo esses produtos o consumidor está
participando de uma ação socialmente transformadora.
O Pilar Social e os Movimentos Sociais
A partir da década de 1960 os movimentos sociais ganharam visibilidade na própria sociedade,
enquanto fenômenos históricos concretos. O desenvolvimento de teorias sobre o social, e as teorias
sobre as ações coletivas ganharam novos patamares, em universos mais amplos, construindo uma nova
teoria sobre a sociedade civil. O Estado, por sua vez, passa a ser deslegitimado, criticado, frente à
globalização, o que proporcionou sua perda como regulador de fronteiras nacionais, controles sociais
etc (GOHN, 2007).
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Destacamos, segundo Gohn (2007), as principais teorias dos movimentos sociais
sobre ações coletivas na Era contemporânea frente a globalização:
– Teoria de Mobilização de Recursos: Defendiam que os movimentos sociais são
abordados como grupos de interesses. Enquanto tais são vistos como organizações e analisados sob a
ótica da burocracia de uma instituição. A Mobilização de Recursos é talvez a escola de pensamentos
não-marxistas mais bem estruturada, explicando os movimentos sociais não em âmbito individual mas
organizacional. A variável mais importante da Mobilização de Recursos é a dos recursos: humanos,
financeiros e de infraestrutura.
Várias críticas surgiram no decorrer dos anos 80 e 90, tendo como mais contundente à
Mobilização de Recursos, que se refere à sociedade que é vista não como uma organização composta
por classes sociais e suas relações, mas como arranjo estático das elites e não-elites, em que há grupos
incluídos e excluídos. O objetivo dos excluídos seria lutar para ser incluídos, visando uma sociedade
aberta, em que diferentes grupos terão sucesso conforme o grau de sua organização.
– Teoria da Mobilização Política: Destaca-se o desenvolvimento do processo político,
onde o campo da cultura foi reativado e a interpretação das ações coletivas foi enfocada como
processo. Passa-se a enfatizar a estrutura das oportunidades políticas, o grau de organização dos grupos
de mandatários, e a se aplicar a análise cultural na interpretação dos discursos dos autores dos
movimentos.
Por fim, a Teoria da Mobilização Política, reintroduziu a psicologia social como instrumento
para a compreensão dos comportamentos coletivos dos grupos sociais. Estabelecendo laços entre as
políticas institucionalizadas e os movimentos sociais propriamente ditos, encerrando uma ordem social
de equilíbrio ou desequilíbrio, mas promovendo um contexto político favorável ou desfavorável às
mobilizações.
– Teoria dos Novos Movimentos Sociais: Após a Teoria de Mobilização de Recursos e a
Mobilização Política, que agregou a cultura nas ações coletivas, em meio a um novo padrão de
sociedade chamado de Pós-Industrial, surge como reação às mudanças estruturais nas sociedades
capitalistas ocidentais, os Novos Movimentos Sociais. As características dos Novos Movimentos
Sociais são: os valores antimodernistas, as formas de ação não convencionais, a constituição formada
por grupos sensíveis aos resultados da modernização capitalista, as novas aspirações e a satisfação de
necessidades posta em risco pelas exigências da burocratização e aumento da industrialização que
acarretaram a perda de laços tradicionais e das estruturas de lealdades existentes.
Escobar (2001) identifica os novos movimentos sociais como uma contribuição para a
regeneração das pessoas em seus espaços, como forma de resistência e sobrevivência à Era do
capitalismo e modernismo. Defende movimentos sociais como símbolos de resistências às políticas
dominantes do conhecimento e organização do mundo, buscando alguns caminhos na direção da
preservação da cultura nas comunidades menos favorecidas, não se submetendo a consciência global
dominante.
In the long run, what is at stake, as far as Third World social movements is concerned, is the
generation of new ways of seeing, of renewing cultural self-descriptions by displacing the
categories with which Third World groups have been constructed by dominant forces. It is a
matter of contributing to regenerating people’s spaces or creating new ones by working with
those who have actually survived the age of modernity and development by resisting it or by
insinuating themselves creatively in the circuits of capital and modernization. (ESCOBAR,
1992, p. 421).
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Os movimentos sociais em meio ao capitalismo promoveram uma discussão e
defesa, para que as pessoas continuem a moldar o seu mundo por meio de tipos de ativismo políticos
que incluem a confecções de visões, símbolos e significados alternativos, considerando a cultura e a
política onde estão inseridas. É um combate a toda forma de imposição a um modelo que não condiz
com as práticas locais, promovendo a perda da identidade e sustentabilidade.
O Pilar Ambiental e a Ecologia Política
A revolução industrial e a crescente globalização no século XVIII, nos alertam para o processo
de reorganização na política, ecologia, relações culturais e econômicas. Nesta seção daremos foco na
Ecologia Política que embora nos traga uma ampla literatura, é fragmentada por várias disciplinas,
incluindo a geografia, a sociologia, antropologia, biologia e ecologia.
Boeira (2002), relata que autores como Jean-Pierre Dupuy (1980), André Gorz (1980), Jean
Dorst (1973), Cornelius Castoriadis e Daniel Cohn-Bendit (1981), Edgar Morin (1973), Lester Brown
(1983), Karl Deutsch (1977), Kenneth Boulding (1978), Ronald Inglehart (1977), Herman Daly (1977),
Georgescu-Roegen (1971), John Galtung (1977), Arnold Toynbee (1979), William Ophuls (1977),
Gregory Bateson (1986), Ignacy Sachs (1986), Lester Milbrath (1984), Barry Commoner (1980), Paul
Ehrlich (1968), Ivan Illich (1976), E.F. Schumacher (1983) e Roger Garaudy (1979) estão entre os
pioneiros da ecologia política entre a década de 1950 e meados dos anos 80.
Ainda segundo o mesmo autor, no Brasil uma análise ecopolítica e um resgate histórico dos
movimentos em defesa do meio ambiente ocorreram entre os anos de 1987 e 1992.
Daremos ênfase a dois autores que contribuíram com seus estudos para as questões da ecologia
política: Ramos Filho (2005) e Capra (2002). Boeira (2002) traça um paralelo entre Capra (2002) e
Ramos Filho (2005), pois ambos fazem uma crítica às sociedades industriais nascidas da Revolução
Industrial no século XVIII. A economia é o tema que aproxima as obras destes autores, onde ambos
criticam a supervalorização da dimensão econômica e a expansão totalitária dos valores de mercado.
Defendem a economia dual, isto é, a coexistência de sistemas de orientação mutuária, nos quais os
respectivos membros produzem para si mesmos uma grande parte dos bens e serviços que diretamente
consomem e de sistemas orientados para o lucro, onde os membros são detentores de empregos;
cooperativismo e o valor de uso – o que implica em descentralização (ênfase de Capra) e delimitação
(ênfase de Ramos Filho) do espaço-tempo da vida econômica. Ambos defendem a necessidade de uma
regulamentação da economia por uma política ecológica.
Diante da Era da máquina, a Revolução Industrial e a Globalização, já citadas anteriormente, as
relações entre a tecnologia e os recursos naturais merecem atenção, e ligam os autores no que se refere
à ecologia. Ambos defendem a utilização racional dos recursos não renováveis, visando reduzir os
impactos ambientais. Para eles as atividades econômicas devem estar subordinadas a certas diretrizes
da ecologia política, que visam o equilíbrio dinâmico entre sociedades humanas e o meio ambiente, o
qual implica um equilíbrio dinâmico no interior destas sociedades.
Escobar (1996) traçou as contradições entre a ecologia e o capitalismo em dois momentos, o
primeiro como sendo a lógica da cultura moderna e racionalizada, tendo como partida a crise marxista,
onde predominava a força da produção capitalista e a relação de produção. E em segundo momento, o
agravamento da crise ecológica e as formas sociais de protesto geradas por esta crise. This process is mediated by the state; indeed, the state must be seen as an interface between
capital and nature, including human beings and space. As far as human beings are concerned,
the disciplining and normalization of labour, the management of poverty and the rise of the
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socia12’ marked the beginning of the capitalization of life within the modern era,
while urban planning normalized and accelerated the capitalization of space. (ESCOBAR,
1996, p.333)
Escobar (1996) envolve a natureza ecológica e humana, onde a relação de trabalho deve
respeitar os limites e condições de ambas. Entende que o Estado deve exercer um papel fiscalizador,
visando defender a vida e as condições de produção contra excessos de capitais, além de buscar o
controle sobre as políticas para reestruturar as condições de produções.
O Pilar Cultural e a Identidade Local
O processo de globalização nos remete à massificação e homogeneidade da cultura, onde muitas
vezes são impostos padrões estratégicos de produção, perdendo-se a identidade local frente ao global
que busca padronizações de comportamentos e hábitos, principalmente de consumo.
Peng (2008) destaca como maior especialista do mundo em cruzamento de culturas, o professor
holandês Geert Hofstede (1997), definindo cultura como a programação coletiva da mente que
distingue os membros de um grupo ou de uma categoria de pessoas pertencentes a outros grupos ou
outras categorias. Destacamos a seguir as dimensões estratégicas da cultura segundo este autor:
a) Distância do Poder: enfatiza o grau de desigualdade social;
b) Individualismo x Coletivismo: refere-se à perspectiva de que a identidade do individuo é
fundamentalmente sua, ao passo que o coletivismo refere-se à ideia de que a identidade de um
individuo é baseada na identidade da comunidade a qual pertence;
c) Dimensões Masculina x Feminina: referem-se à diferenciação entre os papeis dos
diferentes sexos;
d) Aversão à Incerteza: refere-se ao ponto máximo até o qual membros de diferentes
culturas aceitam situações ambíguas e toleram a incerteza;
e) Orientação de Longo Prazo: enfatiza a perseverança e a economia visando a uma
melhoria no futuro.
Estas dimensões nos remetem a valorização das diferenças, ou seja, dos valores culturais e
sociais de cada região, uma vez que a questão do local passa a ser muito mais valorizada e a visão de
mundo torna-se até mais clara quando temos a noção dos benefícios e da valorização do espaço local,
onde estamos inseridos (TORCATTO, 2011).
Segundo Morin e Kern (2001), a partir e para além de suas identidades que o enraízam na terra
e o inscrevem no cosmos, o Homem produz as suas identidades propriamente humanas que são a
familiar, a étnica, a cultural, a religiosa, a social e a nacional. São as formas de pensamento e a reforma
moral que permitirão a todos e a cada um reconhecer em todos e em cada um a identidade humana.
A valorização da cultura local é o marco dos grandes movimentos sociais, onde grupos
defendem seus valores, religiões, éticas e, em meio à globalização, onde as sociedades modernas
acreditavam que o seu modo de produção capitalista deveria ser adotado por todos. Enfatizamos a
dimensão da cultura coletiva, estando intrinsecamente relacionadas nesta pesquisa como redes, que
visam defender as suas culturas, valores e os indivíduos que as compõem, além dos seus modos de
produções sustentáveis.
Para Escobar (2001), é de suma importância conhecer o “lugar” sob a globalização, é preciso ter
a sensibilidade para discernir as ajudas e óbices que envolvem as questões culturais e econômicas.
Prevalece o fato de que o “lugar” continua a ser importante na vida de muitas pessoas. No entanto, o
lugar caiu fora da vista na globalização, o que trouxe algumas consequências para nossa compreensão
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da cultura, do conhecimento, da natureza e da economia. As formas de resistência
propostas por Escobar não implicam na eliminação do espaço como um domínio de resistência e
autoridade, mas sim um questionamento sobre o espaço nas análises da dinâmica da cultura, poder e
economia (ESCOBAR, 2001).
No contexto da globalização, o capitalismo é apresentado como forma inerente ao espaço e
naturalmente mais forte do que as formas de economia não capitalistas (economias tradicionais e
socialistas), pois apresenta uma suposta capacidade de universalizar o mercado, envolvendo a violação
de outras formas não-capitalistas da economia. Dentro do contexto do local, é uma invasão e imposição
aos métodos capitalistas de produção, tornando estes locais subordinados ao capitalismo.
In the globalization script…only capitalism has the ability to spread and invade. Capitalism is
presented as inherently spatial and as naturally stronger than the forms of noncapitalist
economy (traditional economies, “Third World” economies, socialist economies, communal
experiments) because of its presumed capacity to universalize the market for capitalist
commodities… Globalization according to this script involves the violation and eventual death
of “other” noncapitalist forms of economy…All forms of noncapitalism become damaged,
violated, fallen, subordinated to capitalism…How can we challenge the similar representation
of globalization as capable of “taking” the life from noncapitalist sites, particularly the “Third
World”? (GIBSON-GRAHAM, 1996 apud ESCOBAR, 2001, p. 154).
Para Escobar (2001), diante da globalização e modo de produção capitalista, a estratégia de
localização baseia-se na formação de redes e movimentos sociais, que unidas buscam a preservação de
suas culturas e valores, não descartando o capital, mas respeitando os limites naturais e humanos de
cada região. As redes não são necessariamente hierárquicas, mas podem, em alguns casos, ser descritas
como auto-organização, não-linear e não hierárquica.
Considerações Finais
O revestimento que envolve a concepção tradicional do desenvolvimento sustentável com o
spectrum de resistência trazido da abordagem grassroots constitui-se principal contribuição teórica
deste ensaio, pois a partir da associação das forças de resistência aos pilares do desenvolvimento
sustentável, objetivo capital deste trabalho, algumas conclusões tornaram-se possíveis.
Dentro da concepção tradicional, o pilar econômico refere-se ao desenvolvimento sustentado na
satisfação de necessidades presentes sem a interferência negativa futura. O envolvimento das forças de
resistência a esta perspectiva associam-no aos conceitos de economia solidária, ampliando a extensão
de seu alcance às margens econômicas da sociedade, aos processos e consumos que se constituem per
si em ação transformadora.
Equalizar a distribuição de renda, promover a equidade e reduzir as disparidades sociais
compõem o quadro teórico do pilar social do desenvolvimento sustentável. Apoiada em movimentos
sociais, este alicerce pode constituir-se como uma forma de transformação, de regeneração das pessoas
em seus espaços, de aversão às políticas dominantes e ao modo de produção que as mantem, capitalista
e excludente.
O pilar ambiental sustenta-se na preservação do meio ambiente, nas formas de produção que
conservam e promovem a continuidade dos ecossistemas naturais. Para a ecologia política, vetor de
resistência aliado a este pilar, as relações de trabalho devem considerar os limites da natureza ecológica
e humana e o Estado deve ser o instrumento de fiscalização, evitando os excessos da lógica capitalista
que ultrapassam essas limitações naturais.
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Outra contribuição evidente à definição do desenvolvimento sustentável é o seu
pilar cultural enfatizando a preservação da identidade local em oposição ao globalocentrismo e aos
modos de produção que tentam universalizar culturas e impor padrões. Estas forças de resistência
manifestam-se como meios de preservação. O desenvolvimento sustentável apoia-se, assim, nos
movimentos de emancipação do domínio e autoridade de sistemas econômicos naturalmente mais
fortes enquanto promove esta transformação social.
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