dumping social dano moral
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DUMPING SOCIAL E O DANO MORAL NA RELAÇÃO DE TRABALHO
Cláudia M. Ozorio1
RESUMO
O presente aborda o dumping social e o dano moral na relação de trabalho. O
dumping social refere-se a práticas de concorrência desleal a nível internacional, ou
seja, quando uma empresa vende o seu produto a um preço inferior num mercado
exportador do que no seu mercado doméstico. Os efeitos surgem quando as
empresas praticantes do dumping, ao desprezarem os direitos mínimos do
trabalhador, passam a reduzir, de forma considerável, o custo efetivo da mão de
obra, contribuindo para que o produto ou serviço seja lançado no mercado por um
preço muito menor que o daquelas que cumprem a legislação trabalhista. Faz-se
necessária a intervenção do Estado no sentido de reconhecer os danos provocados
pelo dumping social e moral, assim como implantar medidas de proteção e combate
a essa prática ilícita.
Palavras chave: Dumping social. Relações de trabalho. Dano moral. Dano social.
ABSTRACT
This addresses the social dumping and the moral damage in the working
relationship. Social dumping refers to practices of unfair competition at the
international level, that is, when a company sells its product at a lower price in an
export market than in its domestic market. The effects arise when dumping practicing
companies, flouting the minimum rights of the worker, reduces considerably the cost
of labor, contributing to the product or service to be launched on the market at a price
much lower than those companies which comply with the labor legislation. It is
necessary the intervention of the State in the sense of recognize the damage caused
by the moral and social dumping, as well as deploy protective measures and
1 Discente do Curso de Direito do Centro Universitário Lasalle - Unilasalle, matriculada na disciplina
de Trabalho de Conclusão II, sob orientação do Professor Doutor Marco Félix Jobim.
combating this unlawful practice.
Key words: Social Dumping. Working Relationships. Moral Damage. Social Damage.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO; 1 DUMPING SOCIAL; 1.1 Conceituando Dumping; 1.2 Quais os Requisitos para se Configurar um Dumping Social?; 1.3 Quais os Efeitos do Dumping?; 2 O DANO MORAL NA RELAÇÃO DE TRABALHO PELO DUMPING SOCIAL; 2.1 Diferença entre Relação de Trabalho e Relação de Emprego; 2.2 Dano Moral na Relação de Trabalho: Conceito e Pressupostos; 2.3 O Dano Moral na Relação de Trabalho com o Rechaço do Dumping Social; 3 CONSIDERAÇÕES FINAIS; REFERÊNCIAS.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho tem o objetivo de estudar acerca do dumping social na
esfera trabalhista e seus efeitos, levando em consideração que este pode ser uma
prática reiterada que visa eliminar a concorrência, sendo que após esta eliminação,
a empresa passa a elevar os preços normais com os quais vinha trabalhando.
Empresas essas, através de seus empresários, buscam a eliminação da
concorrência à custa dos direitos básicos de seu colaboradores/empregados.
Souto Maior, Mendes e Severo (2012), salientam que a expressão “dumping
social” foi utilizada para designer as práticas de concorrência desleal em nível
internacional, observadas a partir do rebaixamento do patamar de proteção social
adotado em determinado país, comparando-se a sua situação com a de outros
países, tendo como base o parâmetro fixado pelas Declarações Internacionais de
Direito, onde estão inseridos os Direitos Sociais2 como resultado do compromisso
assumido pela humanidade. Acordo esse onde fosse possível produzir,
concretamente, justiça social dentro de uma sociedade capitalista. No entanto, não
é, totalmente, equivocado identificar por meio da mesma configuração a adoção de 2 Os Direitos Sociais – Direito do Trabalho e Direito da Seguridade Social – constituem a fórmula criada para desenvolver o que se convencionou chama de capitalismo socialmente responsável. Sob o ponto de vista do positivismo jurídico pátrio, constata-se que os Direitos Sociais atingem outras esferas da vida em sociedade: o meio-ambiente, a infância, a educação, a habitação, a alimentação, a saúde, a assistência aos necessitados e o lazer, como forma de fazer valer o direito à vida na sua concepção mais ampla (SOUTO MAIOR, MENDES e SEVERO, 2012).
práticas ilegais para obtenção de vantagem econômica no mercado interno.
Sendo assim, ao se desrespeitarem de maneira deliberada, reiterada e
institucionalizada, os direitos trabalhistas que a Constituição de 1988 em seus
artigos compreendidos entre 7 e 11 (BRASIL, 1988), garante ao trabalhador
brasileiro, a empresa empregadora não apenas atinge a esfera patrimonial e pessoal
daquele empregado, como também compromete a própria ordem econômica,
assegurada na mesma constituição. Desta forma, atua em condições de
desigualdade com as demais empresas do mesmo ramo, uma vez que ela explora
mão de obra sem arcar com o ônus daí decorrente, praticando concorrência desleal
(SOUTO MAIOR, MENDES e SEVERO, 2012, p.10).
Daí a necessidade de o Direito Trabalhista demonstrar um cunho
eminentemente protetivo, uma vez que ele visa condenar as empresas e os
empresários que não respeitam os direitos mínimos dos empregados.
Sendo assim, este artigo tem como objetivo discutir acerca do dano moral
coletivo trabalhista com enfoque no dumping social.
1 DUMPING SOCIAL
O dumping social seria praticado por uma organização empresarial quando os
preços baixos das mercadorias resultam, entre outros do fato de não estarem sendo
os direitos mínimos dos trabalhadores reconhecidos não só nacional como
internacionalmente. Ou seja, esta prática está relacionada com situações em que
produtos de um determinado país são introduzidos no comércio de outros Estados,
apresentando um preço inferior ao do mercado interno, em conseqüência dessa prática,
a legislação trabalhista acaba sendo burlada, conforme será abordado neste artigo.
1.1 Conceituando dumping
Inicialmente, se faz necessária a conceituação de dumping, salientando que
este trata de uma prática privada entre empresa produtora e empresa exportadora,
onde um determinado produto é vendido a um preço inferior no mercado estrangeiro
ao do mercado interno.
Welber Oliveira Barral (2000) alerta que a concepção de dumping está
caracterizada pela grande abrangência na aplicação do termo e, também, pela
fragilidade de critérios técnicos, quando de sua caracterização na prática comercial,
sobretudo entre o público leigo. O que pode gerar uma compreensão diversa do
conceito não apenas no que diz respeito à linguagem jurídica e à linguagem
econômica, além disso, é empregado corriqueiramente para designar práticas, ou
situações, que tecnicamente não constituem dumping.
O que pode ser observado no entendimento de Rebono (2006) ao conceituar
dumping com uma prática desleal de comércio internacional a qual é condenada
pela Organização Mundial do Comércio – OMC.
Essa prática tem como objetivo eliminar concorrentes com menor potencial financeiro e consiste na venda de produtos por preços abaixo de seu custo real, cujos prejuízos imediatos são cobertos por reservas financeiras ou subsídios concedidos pelos governos dos países em que as organizações têm sede (REBONO, 2006, p.29).
A prática de dumping é considerada quando a exportação de um produto para
o Brasil tem preço (preço de exportação) inferior aquele que pratica para produto
semelhante nas vendas em seu mercado interno (valor normal). Desta forma, a
diferenciação de preços já é considerada uma prática desleal de comércio
(REBONO, 2006).
Ainda de acordo com Barral (2000), existem três particularidades que
acompanham o conceito do termo dumping:
a) o fato de estar sempre relacionado à ideia de prática desleal do comércio; b) não ter sido traduzido para qualquer idioma, sendo sempre utilizado o vocabulário em inglês; e c) envolver uma conotação pejorativa, induzindo ao sentido de comportamento negativo ou condenável (BARRAL, 2000, p.7-8).
A partir destas peculiaridades que se referem à ideia genérica do conceito e em
razão da evolução da legislação, Gabrielle Marceau registra que o nome pode ter
sua origem no islandês arcaico (thumpa), cujo significado é “atingir alguém”. Mais
tarde o termo foi utilizado como depósito temporário de munições. A utilização leiga
do termo, normalmente, é relacionada à ideia de prática desleal ou de concorrência
estrangeira (BARRAL, 2000).
Em termos legais, deve-se observar que a Constituição Federal de 1988
(BRASIL, 1988), ao constituir a ordem econômica como princípios, assim como
amparo do consumidor e a livre concorrência esclarece que:
A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre
iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: Da livre concorrência e da defesa do consumidor (art. 170, IV e V, da CF/88).
Quanto à questão do comércio internacional no Brasil, esse tem ampla
cobertura na mesma Constituição, que em seu art. 237 orienta a serem exercidos
pelo MF a fiscalização e o controle sobre o comércio exterior, essenciais à defesa
dos interesses fazendários nacionais. A iminência de dano à indústria doméstica
enseja a utilização de instrumentos de política comercial internacional comum, pelas
de proteção, instrumentos que regulam importações, materializados no direito
aduaneiro (ASSIS, 2002).
O dumping por si só, exige a venda de determinados produtos abaixo do preço
de custo, tendo este a intenção de afligir a concorrência, viabilizado pelo
descomedimento do poder econômico.
Visto que, deve-se adicionar ao conceito de dumping, o empresário que
aumentar de forma expressiva as suas importações como forma de obter lucros fica
notória a prática desleal de comerciar, porém, no caso em que o empresário pratique
preços abaixo de custo como forma de abrandar eventuais prejuízos sem obter
lucros excessivos, não terá por decorrência contravenção da ordem econômica.
No entanto, Barral (2000) salienta que o dumping nem sempre é passível de
punições, as quais somente poderão ocorrer quando a prática realmente trouxer
prejuízos para as indústrias do país importador ou retardar o estabelecimento da
indústria local, uma vez que nem sempre a venda de produtos do país exportador por um
preço abaixo do seu “valor normal” acarretará prejuízos ao mercado interno daquele que
está importando. Sendo assim, existem dois tipos de dumping, os quais foram adotados a
partir da leitura do Artigo VI, do GATT: o condenável e o não condenável.
O dumping condenável ocorre quando o dumping implicar dano à indústria
doméstica e o nexo causal entre o dano e a prática de dumping. Enquanto que o não
condenável seria a ocorrência de dumping sem que redundasse em efeitos
negativos para a indústria estabelecida no território de um país (BARRAL, 2000).
É oportuno salientar que a prática de dumping, por si só, não é considerada o
suficiente para a aplicação de medidas antidumping, pelo fato de que a legislação da
Organização Mundial do Comércio (OMC) estabelece requisitos que devem ser
atendidos para que se possam aplicar tais medidas.
1.2 Quais os requisitos para se configurar um dumping social?
Segundo o entendimento de Tomazette (2007), existem algumas tentativas de
ampliar o conceito de dumping de modo a abranger novos tipos de situações as
quais decorrem fundamentalmente de diferenças econômico-sociais entre os países
desenvolvidos e os países em desenvolvimento. Esses novos tipos seriam: o
dumping cambial, o ambiental e o social.
O dumping cambial seria pela manutenção de taxas cambiais que
desvalorizassem a moeda nacional, de modo que os produtos importados ficariam
muito caros e os exportados seriam mais baratos, facilitando a exportação dos
mesmos que chegariam ao mercado externo a um preço relativamente mais baixo.
O dumping ambiental seria a redução do preço de certas mercadorias em
razão da inexistência ou da existência de menores exigências ambientais para a sua
produção. Tal prática se relaciona normalmente com a transferência de indústrias
poluentes para os países em desenvolvimento, em geral menos rígidos em relação
ao meio ambiente. Diz-se que o dumping ambiental decorreria de uma “vantagem
comparativa ilícita advinda da degradação ambiental, nos países em
desenvolvimentos” (GOYOS JUNIOR apud TOMAZETTI, 2007, p. 209). Tal redução
de custos, em detrimento da proteção do meio ambiente, seria algo equivalente a
concessão de subsídios injustos para a exportação.
O dumping social representaria a “vantagem comparativa derivada da
superexploração de mão de obra nos países em desenvolvimento” (BARRAL, 2000,
p.14). Sendo assim, o dumping seria realizado em razão dos custos inferiores da
mão de obra e das menores garantias trabalhistas no país, que também seriam
capazes de baratear o custo dos produtos. Em tal situação, os custos mais baixos
do trabalho representariam, em tese, uma distorção da concorrência, na medida em
que permitiram a venda de produtos a preços bem mais baixos do que aqueles
produzidos em condições que tenham que obedecer a todas as garantias
trabalhistas.
Barral (2000) salienta que o principal argumento está no fato de que a
globalização econômica não implicou na extensão das garantias sociais do Estado
de bem-estar dos trabalhadores de países em desenvolvimento, mas sim na
redução de garantias para os trabalhadores dos países desenvolvidos, “acuados
pela ameaça crescente do desemprego e da transferência física do parque fabril”
(BARRAL, 2000, p.14).
As diferenças sociais entre os países-membros tais como remuneração e
direitos trabalhistas são consideradas causas que contribuem muito para a prática
do dumping social. O custo final do produto é bastante influenciado pelo custo da
mão de obra, resultando numa vantagem comparativa para os países em
desenvolvimento em relação aos economicamente desenvolvidos, por terem maior
oferta de pessoal. Todavia, esta vantagem pode ser compensada pela maior
produtividade dos países em desenvolvimento. Salários e condições de trabalho
variam muito de país para país, logo, uma uniformização disto no âmbito da OMC
seria praticamente impossível.
Apesar da sua importância, Silva (2005) entende que o tema não deve ser objeto
de análise pela OMC e sim da Organização Internacional do Trabalho (OIT), que trata,
entre outras coisas, da equalização da relação capital-trabalho entre os Estados. “A
tentativa de caracterização do dumping social é vista pelos países em desenvolvimento
como meio de justificar práticas protecionistas aos seus produtos” (SILVA, 2005, p.401).
Trata-se de um assunto a ser debatido com importante repercussão política,
mesmo que seus fundamentos econômicos não sejam unanimemente aceitos. Barral
(2000) assevera que a tentativa de conceituação de “dumping social” é vista, pelos
países em desenvolvimento como mais uma tentativa de criar novas barreiras
protecionistas à exportação de seus produtos.
Sendo assim, entende-se oportuno averiguar acerca dos efeitos – negativos ou
positivos – que o dumping apresenta.
1.3 Quais os efeitos do dumping?
Acerca dos efeitos causados pelo dumping, os quais podem ser analisados à
luz do âmbito econômico, quando as empresas praticantes do dumping, ao
desprezarem os direitos mínimos do trabalhador, passam a reduzir, de forma
considerável, o custo efetivo da mão de obra, contribuindo para que o produto ou
serviço seja lançado no mercado por um preço muito menor que o das empresas
que cumprem a legislação trabalhista. Dessa forma, a empresa pratica concorrência
desleal, uma vez que a mesma não está concorrendo em igualdade de condições
com as demais empresas que zelam pelos direitos do trabalhador.
Entende-se oportuno apresentar o entendimento de Pinto (2011, p.141),
quando o autor refere-se a efeitos colaterais da prática do dumping, pois para e
autor, a prática do dumping tumultua a ordem jurídica do mesmo modo que a social.
Isso ocorre com intensidade bem maior porque, “além dos danos diretos ou reflexos
que impõe aos sujeitos dos negócios jurídicos, deles se serve como ponte para
concretizar seu perverso projeto econômico”.
No entendimento de Pinto (2011, p.141):
O dumping atropela preferencialmente o Direito em três de seus mais importantes segmentos na dinâmica social moderna: civil, na medida em que invade a área das obrigações (contratos) e do direito de empresa; trabalhista, na medida em que manipula malignamente a relação individual de emprego; e consumerista, na medida em que tumultua as relações de consumo.
O autor acima referenciado salienta que, também, existe uma questão de
dimensão, pois na maior parte das vezes o que aparenta ser dumping é mera
malícia jurídica para obter vantagem do ilícito na execução do contrato, a forfait do
dano que possam sofrer o outro contratante ou terceiros em face dos negócios
jurídicos, além do próprio todo social (PINTO, 2011).
Importante para a tese que procuramos firmar é a veemente repulsa do Direito à confusão entre o fim e os efeitos dos atos que lhe incumbe disciplinar. Em hipóteses como a que analisamos, os efeitos do dumping e da inexecução abusiva dos contratos são muito próximos da similaridade, mas o fim de cada um denuncia naturezas totalmente distintas – sendo muito estranho e inadequado forçá-los a partilhar uma só identidade (PINTO, 2011, p.141).
Ainda acerca dos efeitos negativos da prática do dumping social, cita-se o
esclarecimento de Modena e Silva (2009) quando afirmam que o dumping social faz
com que os salários e demais encargos sociais diminuem para que o produto seja
competitivo no mercado internacional. Essa é uma prática prejudicial e condenável,
pois além de propiciar o desenvolvimento desleal do comércio, agride a dignidade da
pessoa humana. Os trabalhadores acabam submetidos a condições de trabalho
degradantes.
De acordo com Romita (apud MODENA e SILVA, 2009, p.5688):
Os salários e os chamados encargos sociais constituem componentes dos preços dos produtos e, sendo eles mais baixos nos países em desenvolvimento do que nos países desenvolvidos, colocam os primeiros em vantagem sobre os últimos. A prática do dumping social representa, portanto, forma de concorrência desleal, além de redundar frequentemente em violação dos direitos fundamentais dos trabalhadores.
Além disso, o reflexo da economia internacional sobre as forças nacionais
promove medidas que levam ao dumping social, ou seja, a competitividade dos
produtos num universo globalizado exige a reformulação dos preços internos,
levando a redução de salários e custos trabalhistas.
O abalo provocado pela globalização econômica na estrutura de proteção social alterou sensivelmente o perfil dos empregos, levando, dentre outros efeitos, às seguintes mudanças, enumeradas por José Eduardo Faria: a) emergência de novas profissões e especializações; b) mobilidade do trabalho e flexibilização de sua estrutura ocupacional entre setores, regiões e empresas, provocando o declínio dos salários reais; c) ampliação dos níveis de concentração de renda; d) acentuação do fosso entre os ganhos das várias categorias de trabalhadores; e) aumento do desemprego dos trabalhadores menos qualificados; f) esvaziamento da proteção jurídica contra o uso indiscriminado de horas extras, contra a modulação da jornada de trabalho e contra a dispensa imotivada; e g) redução dos benefícios de seguridade social, prestados pelo Estado e pelas empresas (MODENA e SILVA, 2009, p.5689).
Desta forma, essas circunstâncias abriram caminho para a deslegalização das
normas protetoras dos trabalhadores, além de proliferar o desemprego e o
subemprego, maior exploração do trabalho infantil e supressão de programas
empresariais de prevenção dos infortúnios do trabalho. Situação de redução dos
custos da produção e dos serviços reforçada não somente pela utilização de nova
tecnologia, mas também com a redução das despesas com pessoal (MODENA e
SILVA, 2009).
Continuando a reflexão acerca dos efeitos do dumping, têm-se os aspectos
positivos ou, como assevera Barral (2000), ao quais são aludidos à aplicação de
medidas antidumping3, embora não tenham sido previstos quando da elaboração
dessas normas. O primeiro dos benefícios citados por Barral (2000) apresenta-se a
partir da economia mundial, é que os produtores, por temerem a aplicação de
medidas antidumping, acabam evitando a discriminação de preços, possibilitando a
redução do preço e aumentando a produção no mercado monopolizado. O autor
entende que nesse caso a renda mundial se beneficiaria.
A segunda hipótese desenha-se sob a ótica do Estado importador, pois se
refere à possibilidade de aumento da renda tributária do Estado, através da
3 As medidas antidumping têm como objetivo neutralizar os efeitos danosos à indústria nacional causados pelas importações objeto de dumping. A investigação antidumping objetiva comprovar a existência de dumping, dano e relação causal entre o prejuízo e o dumping. Esta será conduzida de acordo com as regras estabelecidas pela Organização Mundial do Comércio (OMC). O procedimento administrativo relativo à aplicação de medidas antidumping no Brasil está disciplinado pelo Decreto nº. 1.602/95. O órgão competente para a instauração do processo administrativo é o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MELLO, ROMANICHEN e ANDRADE, 2009).
arrecadação de direitos antidumping, não comprometendo as obrigações assumidas
quanto às reduções tarifarias, nos acordos internacionais (BARRAL, 2000).
As medidas antidumping também podem servir como instrumento de comércio
estratégico, quando protegem indústrias nacionais com rendas monopolistas, mas
gerando externalidades positivas que não cruzam fronteiras nacionais (BARRAL,
2000).
Em resumo, pode-se salientar que as primeiras discussões a respeito do
dumping social ocorreram no final da Rodada Uruguai do Acordo Geral de Tarifas e
Comércio (GATT), pela argumentação dos países desenvolvidos em afirmar que:
[...] a baixa condição a que os trabalhadores dos países subdesenvolvidos estão submetidos leva a um aumento de competitividade desses países, no comércio internacional, que não se baseia em critério de eficiência econômica. Ao contrário, se o objetivo da eficiência foi visto como sendo o bem-estar social, essa vantagem será produto da ineficiência econômica (MASSI e VILLATORE, 2011, p.9-10).
Sendo assim, é possível observar que a prática do dumping social reflete numa
relação direta entre o desenvolvimento do país e as condições de trabalho a que
seus trabalhadores estão submetidos. Ou seja, quanto mais desenvolvido o país,
teoricamente mais direitos e benefícios os trabalhadores tendem a possuir. O oposto
também acontece: quanto menos desenvolvido um país, menores sãos os direitos e
benefícios trabalhistas a serem oferecidos aos seus nacionais. Dessa forma,
percebe-se o impacto que os direitos trabalhistas podem determinar no custo final do
produto. “assim, em países menos desenvolvidos, com legislação trabalhista branda
ou até mesmo inexistente, o custo da mão de obra atrelado ao custo final do produto
torna o preço altamente competitivo” (MASSI e VILLATORE, 2011, p.10).
Em suas reflexões acerca do dumping social na relação de emprego, Pinto
(2011) conclui que o descumprimento abusivo das obrigações trabalhistas pelo
empregador inflige um “dano material e moral direito” ao empregado ou
empregados, verdadeiro alvo da ilegalidade empresarial, sem embargo de produzir o
mesmo tipo de dano social colateral do dumping.
Barbosa Junior e Cabrera (2011) identificam dumping social também como
dano moral coletivo, sendo a violação de direitos de grupos sociais determinados ou,
até mesmo devido ao grau e a extensão dos direitos violados, da própria sociedade
como um organismo. Os autores acima complementam a ideia ressaltando que o
dumping social nas relações de trabalho decorre do reconhecimento dos direitos
sociais frente à sociedade como um só corpo detentora de direitos e obrigações.
Sendo assim, essa prática pode atingir tanto os indivíduos considerados como parte
integrante de um grupo quanto os direitos cuja titularidade o grupo em si detém.
Portanto, a lesão moral coletiva decorre não somente da violação de direito
difuso ou coletivo, mas de toda violação legal cuja gravidade apresente efeitos para
além de fronteiras do individualismo, causando indignação social.
Diante deste cenário passa-se a abordar o dano moral na relação de trabalho
tendo como base o dumping social.
2 O DANO MORAL NA RELAÇÃO DE TRABALHO PELO DUMPING SOCIAL
De acordo com Sarmento (2009), a doutrina civilista clássica conceitua dano
como toda diminuição dos bens jurídicos de uma pessoa em decorrência de atos
ilícitos praticado por terceiros. O dano pode ser patrimonial (material), ou moral
(extrapatrimonial). Classifica-se como patrimonial quando ocorre destruição,
depreciação, deterioração e privação de bens, lucros ou vantagens. Moral quando o
ato ilícito tem conseqüências psíquicas, afetivas ou sentimentais sobre a
personalidade da vítima.
O dano, para Reis (2009, p.71), “emerge de toda e qualquer lesão ocorrida no
patrimônio material ou imaterial da pessoa, em virtude da ação ou omissão
voluntária violadora de direito realizada pelo agente”.
O Código Civil de 1916, em seu art. 159, já conceituava dano como a violação
de direito, o prejuízo causado por outrem, por ação ou omissão voluntária,
negligência ou imprudência (SARMENTO, 2009).
Todavia, de acordo com Ferrari e Martins (2011), a noção e o conceito de dano
moral são muito amplos. Os autores utilizam a conceituação de Castelo (2007) para
confirmar sua ideia:
[...] a noção e conceito de dano moral, inclusive o laboral, são muito amplos, pois cobrem todo o espectro da personalidade humana, alcançando todos os atos ilícitos que causem, desnecessária e ilicitamente, desassossego, desconforto, medo, constrangimento, angústia, apreensão, perda de paz interior, sentimento de perseguição ou discriminação, desestabilização pessoal, profissional, social e financeira (apud FERRARI e MARTINS, 2011, p.22).
Identificado o agente pela ocorrência do dano, surge para vítima a pretensão
ao devido ressarcimento, e isso é previsto no Código Civil, Capítulo II do Título IX
para disciplinar a indenização, inclusive por danos morais (CC, art. 953).
Também se entende oportuno citar a classificação utilizada por Ferrari e
Martins (2011, p.23): “o dano moral poderá ser direto ou indireto”. O direto, pelo fato
de ser considerado pela doutrina e jurisprudência puro porque viola os direitos
inerentes à personalidade da pessoa, “como o direito à vida, a integridade
psicofísica, a liberdade, a honra, a intimidade, a imagem, a vida privada e outros
direitos que são protegidos pelo princípio da dignidade da pessoa humana”.
Enquanto que o indireto, segundo Birolli (apud FERRARI e MARTINS, 2011, p.23):
[...] consiste na lesão a um interesse tendente à satisfação ou gozo de bens jurídicos patrimoniais, que produz um menoscabo a um bem extrapatrimonial, devido a uma lesão a um bem patrimonial da vida. Deriva, portanto, do fato lesivo a um interesse patrimonial. P. ex.: perda de coisa com valor afetivo, ou seja, de um anel de noivado.
A inserção do dano moral no direito brasileiro teve seu marco na Constituição
Federal de 1988, exercendo seu papel relevante na consagração do instituto na
ordem jurídica nacional, de maneira incontroversa que o preceito inserto no artigo 5º,
incisos V e X, da referida Carta Magna, apontando para uma fronteira existente entre
o direito patrimonial e o extrapatrimonial (REIS, 2010).
No entanto, a preocupação relativa ao dano moral nas relações de trabalho é
relativamente recente no âmbito jurídico mundial. De acordo com Sarmento (2009),
os primeiros estudos foram feitos pelo alemão Heinz Leumann, que utilizou a
expressão “mobbing” para se referir ao psicoterror no ambiente de trabalho. Tendo
como pesquisas de campo, demonstrou que inúmeros trabalhadores desenvolveram
doenças físicas e mentais em razão de perseguições no emprego. A maioria das
doenças era fruto de atos praticados por superiores hierárquicos ou colegas de
trabalho com o objetivo de desestabilizar ou minar a autoestima da vítima.
Sarmento (2009) destaca os estudos desenvolvidos por Marie-France
Hyrigoyen, que cunhou a expressão “assédio moral4” para expressar a violência
perversa no cotidiano das pessoas, inclusive no ambiente de trabalho. O estudo
resultou da coleta de testemunhos de vítimas que passaram por experiências
traumáticas e, em conseqüência disso, elas acabaram desenvolvendo patologias
como depressão, dores de cabeça, insônia, tendências suicidas etc.
Conforme foi abordado até então, o instituto do dano moral é intrinsecamente
4 Assédio moral significa o abuso de poder ou a prática repetida de atos ofensivos, intimidatórios e discriminatórios que tenham por objetivo desvalorizar, humilhar, injuriar, caluniar ou subjugar um trabalhador (SARMENTO, 2009, p.89).
privado, no entanto, vem sendo coletivizado com o objetivo de atender as novas
demandas sociais, principalmente quanto às ofensas a direitos coletivos lato sensu,
ou seja, difusos, coletivos e individuais homogêneos (BROECKER, 2012).
Sendo assim, nos apropriamos do entendimento de Pinto (2011), quando o
autor aborda o dumping social na relação de trabalho, onde o mesmo utiliza a
extensão conceitual dumping social trabalhista para esclarecer que essa
corresponde à deterioração do contrato individual de emprego em benefício do lucro
do empregador com sacrifício das obrigações e encargos sociais tutelares do
empregado. O que, de certa forma, indiretamente atinge as empresas concorrentes,
mas fica muito distante do propósito de extermínio empresarial, o caracterizador do
dumping. Quando exercer o dumping é intenção, a relação de emprego aparece
como um dos meios possíveis para o êxito do resultado, por duas razões:
1ª As facilidades proporcionadas pela inexistência ou fragilidade da legislação social de determinados países, ou seu recorrente desrespeito num negócio jurídico em que a desigualdade econômica dos sujeitos torna um deles extremamente vulnerável às pressões ilícitas do outro. 2ª O considerável peso dos encargos contratuais e sociais da mão de obra na composição da planilha de custos do produto a ser oferecido ao mercado, devido a uma legislação preocupada em proteger a pessoa do trabalhador (FRAHM e VILLATORE apud PINTO, 2011, p.142).
No primeiro fator aparece, nitidamente, o aspecto da caracterização diferencial
entre o dumping e a simples execução contratual abusiva. O comportamento nele
firmado é oportunista da disparidade legislativa, no plano internacional, que move,
por exemplo, a empresa encerrar suas atividades num país para estabelecer-se
noutro, de onde passa a exportar seu produto a preço irresistível pela concorrência
interna, com o fim de extermínio.
2.1 Diferença entre relação de trabalho e relação de emprego
Um dos princípios fundamentais tratado na Constituição Federal de 1988 é o
trabalho5, em seu sentido amplo, dentre o qual a relação de emprego é apenas uma
de suas espécies. Nessa mesma Constituição observação que está elencada uma
série de dispositivos próprios relacionados ao emprego (art. 7º), caracterizando,
dessa forma, a proteção aos trabalhadores (art. 1º, inc. IV, art. 5º, inc. XIII, art. 6º,
caput, art. 7º, caput, art. 170 e art. 193).
5 [...] IV os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; [...] (BRASIL, 1988).
Ainda a mesma Carta Magna de 1988 considera o trabalho como fundamento
da ordem econômica e da ordem social, não só dignificando a expressão como
demonstrando a sua importância.
A partir dessas considerações acerca do trabalho, chegam-se as relações de
trabalho e de emprego, as quais se diferenciam no âmbito jurídico, especialmente,
em função da legislação aplicável e, em conseqüência, pela intenção do legislador
na forma de tutelar o “trabalho” (BASTOS, 2011).
De acordo com Godinho (apud BASTOS, 2011, p.1), a relação de trabalho
distingue-se da de emprego da seguinte forma:
A primeira expressão tem caráter genérico: refere-se a todas as relações jurídicas caracterizadas por terem sua prestação essencial centrada em uma obrigação de fazer consubstanciada em labor humano. Refere-se, pois, a toda modalidade de contratação de trabalho humano modernamente admissível. A expressão relação de trabalho englobaria, desse modo, a relação de emprego, a relação de trabalho autônomo, a relação de trabalho eventual, de trabalho avulso e outras modalidades de pactuação de prestação de labor (como trabalho de estágio, etc.). Traduz, portanto, o gênero a que se acomodam todas as formas de pactuação de prestação de trabalho existentes no mundo jurídico atual. [...]. A relação de emprego, do ponto de vista técnico-jurídico, é apenas uma das modalidades especificas de relação de trabalho juridicamente configuradas. Corresponde a um tipo legal próprio e específico, inconfundível com as demais modalidades de relação de trabalho ora vigorantes.
Também é oportuno citar o entendimento de Barros acerca da distinção entre
os termos relação de emprego e relação de trabalho:
Tanto a relação de trabalho como a relação de emprego são modalidades de relação jurídica, isto é, de “situação da vida social disciplinada pelo Direito, mediante a atribuição a atribuição a uma pessoa (em sentido jurídico) de um direito subjetivo e a correspondente imposição a outra de um dever ou de uma sujeição”. Sua estrutura é constituída de sujeitos, objeto, causa e garantia (sanção). [...]. A relação de emprego tem natureza contratual exatamente porque é gerada pelo contrato de trabalho (apud FARACHE, 2011, p.1).
Em se tratando de um contrato de trabalho, segundo Barros:
Os principais elementos da relação de emprego gerada pelo contrato de trabalho são: a) a pessoalidade, ou seja, um dos sujeitos (o empregado) tem o dever jurídico de prestar os serviços em favor de outrem pessoalmente; b) a natureza não eventual do serviço, isto é, ele deverá ser necessário à atividade normal do empregador; c) a remuneração do trabalho a ser executado pelo empregado; d) finalmente, a subordinação jurídica da prestação de serviços do empregador (apud FARACHE, 2011, p.1).
Sendo assim, a relação de trabalho, de uma forma mais genérica, abrange
todos os vínculos jurídicos caracterizados por objetivarem um labor humano.
Enquanto que a relação de emprego é um tipo de jurídico específico dentre aqueles
que a relação de trabalho abrange. Ou seja, a primeira é o gênero do qual a
segunda é a espécie.
No entanto, apesar do vínculo entre a relação de trabalho e de emprego -
gênero e espécie -, essas são tratadas pela legislação de forma especial e distinta.
Dessa forma, em se tratando de relações de emprego, as normas aplicáveis
são aquelas constantes na CLT e na legislação complementar.
2.2 Dano moral na relação de trabalho: conceito e pressupostos
Conforme já foi abordado anteriormente, a valorização do trabalho como parte
dos fundamentos Constituição Federal do Brasil vem assumindo um grau de
importância diante das garantias de afirmação dos direitos humanos de forma a
fortalecer o significado do Estado Democrático de Direito.
Sendo assim, o trabalho é parte integrante dos elementos da dignidade da
pessoa humana, fazendo com que a condição de trabalhador no contexto das
relações de trabalho deve ser reconhecido como função social por analogia à
condição de exercício pleno de cidadania (BARBOSA JÚNIOR e CABRERA, 2011).
O cabimento do dano moral faz já se encontra pacificado no direito brasileiro,
em seu aspecto individual, conforme aborda o texto constitucional de 1988 em seu
art. 5º, incisos V e X, quando assegura a reparação civil quando da violação de
certos direitos.
Acerca do termo dano, Reis (2010, p.71) assevera que: “O dano emerge de
toda e qualquer lesão ocorrida no patrimônio material ou imaterial da pessoa, em
virtude da ação ou omissão voluntária violadora de direito realizada pelo agente”.
Sendo assim, pode-se afirmar a expressão “dano moral” tem vários conceitos na
doutrina brasileira. Dentre esses, cita-se Florindo (apud FERRARI e MARTINS,
2011, p. 20) para definir:
[...] o dano moral como aquele decorrente de lesão à honra, a dor-sentimento ou física, aquele que afeta a paz interior do ser humano, enfim, ofensa que cause um mal, com fortes abalos na personalidade do indivíduo. [...] pode-se dizer com segurança que seu caráter é extrapatrimonial, contudo é inegável seu reflexo sobre o patrimônio. A verdade é que podemos ser lesados no que somos e não tão somente no que temos.
Também é importante apresentar o entendimento de Teixeira Filho (apud
FERRARI e MARTINS, 2011, p. 20), acerca da definição de dano moral como:
[...] o sofrimento humano provocado por ato ilícito de terceiro que molesta bens imateriais ou magoa valores íntimos da pessoa, os quais constituem o sustentáculo sobre o qual a sua personalidade é moldada e sua postura nas relações em sociedade é erigida.
O dano moral pode ser classificado como direto ou indireto. Sendo que o direto
é aquele considerado pela doutrina e jurisprudência puro porque viola os direitos
inerentes à personalidade da pessoa, como o direito à vida, a integridade psicofísica,
a liberdade, a honra, a intimidade, a imagem, a vida privada e outros direitos que
estão protegidos pelo princípio da dignidade da pessoa humana. Enquanto que o
indireto,
[...] consiste na lesão a um interesse tendente à satisfação ou gozo de bens jurídicos patrimoniais, que produz um menoscabo a um bem extrapatrimonial, ou melhor, é aquele que provoca prejuízo a qualquer interesse não patrimonial, devido a uma lesão a um bem patrimonial da vida. Deriva, portanto, do faro lesivo a um interesse patrimonial (BIROLLI apud FERRARI e MARTINS, 2011, p. 23).
Mais especificamente acerca dos danos morais nas relações de trabalho, de
acordo com Sarmento (2009), a preocupação é relativamente recente no cenário
jurídico. Os primeiros estudos foram feitos pelo alemão Heinz Leymann, que utilizou
a expressão mobbing para referir-se ao psicoterror no ambiente de trabalho. O
resultado de sua pesquisa identificou inúmeros trabalhadores que desenvolveram
doenças físicas e mentais em razão das perseguições no emprego. A maioria das
doenças era produto de atos praticados por superiores hierárquicos ou colegas de
trabalho que tinha como objetivo desestabilizar ou minar a autoestima da vítima.
Enfim, consagrados na Constituição Federal de 1988, os danos morais
ganharam status de ordem jurídica nacional, o que contribuiu para o surgimento dos
mais diversos institutos legais, tais como o Estatuto de Criança e do Adolescente e o
Código de Defesa do Consumidor, dentre outros, os quais confirmaram a
indenização dos danos morais (REIS, 2010).
2.3 O dano moral na relação de trabalho com o rechaço do dumping social
Conforme abordado até aqui, o dumping social é uma forma de agressão aos
direitos sociais que foram incorporados à Constituição como uma forma de proteção
essencial dos direitos básicos de toda a coletividade.
Diante da essencialidade desses direitos para garantir existência digna, as
atitudes que se demonstrarem contrárias ao que está disposto na lei podem ser
consideradas como atos ilícitos capazes de causar danos a toda a sociedade, e não
apenas aos empregados diretamente envolvidos. Nesse sentido, Souto Maior,
Mendes e Severo entendem que:
O desrespeito deliberado e inescusável da ordem jurídica trabalhista, portanto, representa inegável dano à sociedade, inclusive no que tange aos custos públicos para a manutenção do Judiciário Trabalhista que se vê obrigado a decidir dezenas e até centenas de vezes sobre as mesmas violações sobre as mesmas empresas (SOUTO MAIOR, MENDES e SEVERO, 2012, p.23).
Esse desrespeito pode ser exemplificado com o fato do não depósito do FGTS,
o qual pode ser utilizado para o custeio de casa própria. Desta forma acaba lesando
não somente o trabalhador como sua família e aqueles que dele dependem.
Portanto, o dumping social causa dano social em virtude do descumprimento
dos direitos fundamentais do trabalhador previstos na Constituição Federal,
prejudicando toda a coletividade.
A sociedade, pela sua natureza política constitui-se, na sua maioria, por grupos
que se organizam por diversos motivos, em decorrência desta união acabam
compartilhando direitos e obrigações comuns, ou seja, eles são sujeitos passivos de
agressões que refletem socialmente em toda a sociedade. Partindo desse
pressuposto, deve-se reconhecer o cabimento e a tutela do dão moral em seu
aspecto coletivo (BARBOSA JUNIOR e CABRERA, 2011, p.70). Desta forma,
[...] o reconhecimento do dumping social pela justiça brasileira pauta-se pela existência perceptível de uma moral decorrente de uma coletividade exposta e propícia a lesão, no sentido que direitos básicos são violados, vez que o sentimento de coletivização dos direitos oriundos da sociedade de massa solidifica-se a cada dia dentro do contexto social atualmente instituído.
Observando deste ângulo, a teoria do dumping social, no âmbito da Justiça do
Trabalho, tem sua origem no contexto de globalização da economia, da ampliação
dos mercados e da concorrência entre empresas diante da proteção individual e
coletiva dos trabalhadores.
A própria Associação Nacional dos Magistrados Trabalhistas (ANAMATRA),
demonstra preocupação com a questão do dumping social, quando estabeleceu o
seguinte:
As agressões reincidentes e inescusáveis aos direitos trabalhistas geram um dano à sociedade, pois com tal prática desconsidera-se, propositalmente a estrutura do Estado social e do próprio modelo capitalista com a obtenção de vantagem perante a concorrência (ANAMATRA apud BARBOSA JUNIOR
e CABRERA, 2011, p.71).
O dumping social ou dano moral coletivo, segundo Barbosa Junior e Cabrera
(2011, p.71), deve ser entendido “como sendo a violação de direitos de grupos
sociais determinados ou, até mesmo devido ao grau e a extensão dos direitos
violados da própria sociedade como um só organismo”.
Enfim, é importante salientar que a ideia de dumping social nas relações de
trabalho decorre do reconhecimento dos direitos sociais frente à sociedade como um
só corpo possuidora de direitos e deveres. Desta forma, esta prática pode atingir
tanto os indivíduos considerados como parte integrante de um grupo quanto os
direitos cuja titularidade o grupo em si detém.
O que resulta na lesão moral coletiva em decorrência não somente da violação
de direito difuso ou coletivo, mas de toda a violação legal cuja gravidade provocando
efeitos para além das fronteiras do individualismo, causando, assim, indignação
social (BARBOSA JUNIOR e CABRERA, 2011).
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por todo o aqui exposto, percebe-se que o dumping social vem ocorrendo em
todo o mundo, principalmente nos países em desenvolvimento. Em virtude da
importância e da essencialidade do trabalho em toda a sociedade, essa prática
acaba causando danos de natureza social e moral, prejudicando não apenas os
trabalhadores envolvidos, mas toda a sociedade.
Este trabalho procurou abordar de maneira resumida o dano moral nas
relações de trabalho, tendo como ênfase o dumping social, quando se pode concluir
que atos ilícitos cometidos pelos responsáveis das empresas importadoras são
capazes de causar danos não apenas aos empregados diretamente envolvidos,
mas, também, a toda a sociedade.
Daí o entendimento de quanto é essencial que se tenha em mente a
necessidade que urge de ousar para se garantir a efetividade dos direitos
fundamentais. Romita (2009) assevera que é preciso que sejam cumpridos os
preceitos estabelecidos nos direitos sociais com o intuito de obter a realização
prática do valor supremo da dignidade da pessoa humana.
E, de acordo com a fundamentação conferida até aqui, salienta-se que
conforme consta no parágrafo único do artigo 404 do Código Civil (2002) pode ser
aplicado ex officio diante das agressões reincidentes à legislação trabalhista, tais
como: não recolhimento de FGTS, salários pagos “por fora”, não concessão de
intervalo para refeição e descanso, trabalho em condições insalubres ou perigosas,
sem eliminação concreta dos riscos à saúde etc.
Assim sendo, e mais uma vez utilizando os ensinamentos de Souto Maior a
aplicação do dispositivo supracitado pode justificar tanto a fixação de uma
indenização ao trabalhador, de caráter individual, diante da ineficácia dos juros de
mora trabalhista, quanto serve para impor ao agressor contumaz de direitos trabalhistas
uma indenização suplementar, por dano social, que será revertida a um fundo público,
destinado à satisfação dos interesses da classe trabalhadora (apud SILVA, 2009).
Portanto, cabe ao judiciário, ter clareza em suas decisões dando grande
atenção ao fator punitivo e pedagógico das empresas praticantes do dumping social,
com o intuito de desencorajá-las a permanecer desrespeitando a legislação
trabalhista.
Para isto, se faz necessária a intervenção do Estado no sentido de reconhecer
os danos oriundos do dumping social, assim como implantar medidas de proteção e
combate a essa prática ilícita. Pois, enquanto o Judiciário ignorar os malefícios ou
efeitos colaterais do dumping social, os trabalhadores brasileiros continuarão sendo
explorados e submetidos a condições degradantes de trabalho, muitas vezes
tratados como escravo.
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