história, fenomenologia e memoria conciliadora os olhares ......história, fenomenologia e memoria...
Post on 18-Jan-2021
8 Views
Preview:
TRANSCRIPT
História, Fenomenologia e Memoria conciliadora os olhares sobre a
biografia de Edith Stein Danilo Souza Ferreira
Resumo: A vida de Edith Stein se desenvolve entre os anos 1891-1942. Transcorre sua
existência num período marcado pelos fomentos da República de Weimar e pelo advento
do nazismo, de Adolf Hitler, líder do Partido Nacional Socialista. Edith Stein durante o
seu período de formação na Universidade de Breslau, havia escolhido disciplinas de
natureza humanística, além de filosofia e psicologia particularmente literatura e história.
Em sua filosofia, são delineados “os traços de uma filosofia no feminino”, que começava
a se fazer presente nos meios intelectuais alemães. Podemos perceber a presença desses
‘traços de uma filosofia feminina’, no período de 1913 em que se inscreve na Faculdade
de Filosofia de Gottingen , para ter aulas com Edmund Husserl, fazendo parte de um
grupo denominado Sociedade Filosófica, que sobre a orientação de Husserl, estavam
homens como Adolf Reinhard, Roman Ingarden, e Johannes Hering mais também
intelectuais mulheres como Rose Guttmann, e Hedwig Conrad-Martius com quem vai
desenvolver uma forte amizade é que será sua madrinha de batismo, quando se converte
ao cristianismo. As duas intelectuais Hedwig Martius apresentam trajetórias acadêmicas
semelhantes ambas as mulheres fazem a sua primeira formação em ciências do espirito
ambas escolheram os cursos de psicologia e história, uma faculdade que lhe fosse útil
também para o ensinamento. Ambas seguem a fenomenologia de Husserl e tentam
conciliar a ciências naturais das ciências do espirito. Apesar de um ponto de aproximação
entre as duas intelectuais ser o campo profissional ligado a educação em especial as
ciências do espírito, já que outras profissões eram limitadas a participação das mulheres
como o direito, mesmo nesse campo de atuação a educação é a filosofia era incomum a
participação feminina como Ângela Belo aponta eram ‘É, esse, um fenômeno singular,
de fato, se observarmos outros círculos filosóficos daqueles anos nos damos conta da
quase total falta de figuras femininas’. O projeto filosófico e biográfico de Edith Stein
despertou o interesse de ativistas em toda a Polônia que têm enfrentado os problemas de
representar a comunidade judaica da Polônia desde o colapso do comunismo em 1989.
Esses "ativistas da memória" escolhem objetos específicos da memória e caminhos
específicos da memorialização. Esta comunicação enfoca a lembrança de Stein na cidade
de Wroclaw. Argumenta que a abordagem ativista da memória da "reconciliação cultural"
é problemática, no caso de Stein, na medida em que se baseia em uma leitura errada do
judaísmo de Stein, depois de sua canonização na igreja católica por João Paulo II. A
comunicação defende uma abordagem alternativa “fronteiriça” que reconhece o papel
persistente da violência na construção de identidades e culturas.
Palavras-chave: Edith Stein, fenomenologia, história intelectual.
Nesta comunicação trazemos uma breve biografia de Edith Stein. Tal trabalho se
justifica por dois motivos: o primeiro é a apresentação da filósofa, que é pouco conhecida
pela academia brasileira, e o segundo motivo é a íntima relação entre a sua vida e os
acontecimentos históricos cruciais que marcaram a primeira metade do século XX,
principalmente a História da Alemanha no período moderno, bem como a Primeira
2
Grande Guerra, a República de Weimar e a ascensão do nazismo na Alemanha, além do
surgimento de correntes teóricas como a fenomenologia. Buscaremos em especial, neste
texto, descrever as fortes influências que Stein sofreu do psicólogo William Stern,
membro da escola de Wurzburg e professor em Breslau, e do fenomenólogo Edmund
Husserl, que ministrou aulas de Filosofia em Gottingen, e com quem ela desenvolveu a
sua reflexão sobre o papel da Empatia como constitutiva da relação entre os indivíduos,
bem como a sua relação com a História.
A vida de Edith Stein se desenvolve entre os anos 1891-1942. Transcorre sua
existência num período marcado pelos fomentos da República de Weimar (1919-1933) e
pelo advento do nazismo, de Adolf Hitler (1933), líder do Partido Nacional Socialista.
Por meio de sua história, podemos conhecer os fundamentos de uma vida familiar judia,
que permite o desenvolvimento de uma personalidade completa e harmônica, a
determinação interior diante das horas mais difíceis da existência; a evolução e a
estruturação de seu pensamento, sua atividade acadêmica e social, sua passagem do
judaísmo para o cristianismo e sua escolha para a vida religiosa como carmelita. Como
afirma Ângela Ales Bello: não é possível compreender (sua história de vida) sem
considerar este pano de fundo, (...) os eventos do seu tempo não foram passivamente
vividos por ela, mas incitaram tomadas de posição de um ponto de vista moral e social.
(BELLO,2003, p.14).
Diferente de seu orientador o professor Edmund Husserl, vinculado durante seus
anos de formação universitária às áreas de matemática e às ciências físicas, Edith Stein
durante o seu período de formação na Universidade de Breslau, havia escolhido
disciplinas de natureza humanística, além de filosofia e psicologia particularmente
literatura e história.
Além disso, não é secundária, principalmente na juventude, a sua atenção a
questões política e sociais, o que a faz entender como o mundo da vida, na multiplicidade
de seus aspectos, está presente nas suas preocupações teóricas e práticas, como nas
manifestações pelo voto feminino na Alemanha nas eleições de 1919 é o apoio ao Partido
Social- Democrata Alemão, sendo assim uma intelectual que buscou registrar as
transformações de seu presente como afirma L. Gelbe organizador da edição das obras
3
completas em italiano : “Quis (Edith) revelar também para nós a forma como olhava para
suas relações familiares mais íntimas”. (GELBE,1992, p.7)
Em 1933 no livro A estrutura da Pessoa Humana a filosofa Edith Stein, ao
refletir sobre as ciências humanas que compreendia como uma forma de ascensão
espiritual do “ente” em especial no momento em que o cientista social exerce a sua
função, isso é, ao escrever um texto o historiador além de sua fidelidade na análise
documental, busca dar vida ao texto, ao arquivo pela leitura que faz. E mesmo sendo sua
metodologia rigorosa, é sua sensibilidade que transparece em seu estilo e faz existir a
pessoa ou o momento histórico, descrito pelo historiador.
Se o conhecimento é uma captação espiritual de um ente, é lícito dizer que
conhecemos o modo de ser próprio de um homem: este modo de ser se mostra
através das múltiplas formas de expressão nas quais o “interior” se
“exterioriza” e nós compreendemos esta linguagem (...). O modo de ser próprio
de uma pessoa se expressa em formas que podem seguir existindo separadas
dela em sua letra, no estilo que se reflete em suas cartas ou em outras
manifestações literárias, em todas as suas obras, e também nos efeitos que
produziram em outros homens. (STEIN,2000,583)
Edith Stein descreve que durante a escrita ocorre um duplo movimento a primeira
uma expressão “interior” que é o conjunto de vivências e as subjetividades presentes que
compõe o autor e também a expressão “exterior” que são as formas de escrita, isso é, a
forma em que compõe o texto. Assim, o interesse dos historiadores pela pessoa e pela
variabilidade de suas formas em função da estrutura das sociedades faz parte de uma
sensibilidade pelo espaço subjetivo de reflexão e de interrogação
Recolher estas fontes e restos, do modo mais completo possível é o trabalho
preliminar do historiador. Sua tarefa principal é compreendê-los: penetrar na
individualidade por meio da linguagem desses signos (...). Em seguida vem a
missão ulterior de pôr ao alcance de outros a individualidade que se captou.
Não se pode lograr este fim dando à individualidade uma denominação
universal ou enumerando muitas características suas (por sua vez captadas de
modo universal). Ou tampouco vendo-a como a intersecção de diferentes tipos.
Tudo isso são apenas instrumentos que talvez tenham que ser usados. Mas o
importante na hora de permitir a alguém que capte uma individualidade quando
não se pode proporcionar um encontro vivo é assinalar o caminho pelo qual
alcançou a meta. Para que se possa executar o ato de compreender se deve
relatar traços especialmente eloquentes e sobretudo, sempre que possível,
oferecer expressões originais da pessoa em questão. Conseguir executar isto
reside a arte da exposição, na qual as tarefas do historiador e do artista
coincidem em boa parte assim como a arte da interpretação, isto é, a reflexão
acerca de expressões pessoais, que é comum a ambos. (STEIN,1996,584-585)
Podemos perceber que para Edith Stein a história, compreendida como oficio tem
como tarefa fundamental compreender o conjunto de fenômenos que compõe a
4
individualidade de cada personagem inserido, possibilitando desvelar a dignidade da
pessoa que compõem esses personagens históricos retratados no texto historiográfico,
assim aproximando o historiador da figura do artista, pois ambas as funções podem
revelar as expressões pessoais dos retratados.
Como Edith Stein realizou ao escrever a sua autobiografia intitulada História de
uma família judia. Traços autobiográficos: infância e os anos juvenis, redigido, em sua
maior parte, no ano de 1933, como reação após a tomada do poder político da Alemanha
pelo Partido Nacional Socialista dos Trabalhadores Alemão que e conseguintemente a
ascensão de Adolf Hitler, e do antissemitismo.
Eu quero fazer um relatório daquilo que tenho conhecido como humanidade
judaica. (...). Aquilo que irei escrever nestas páginas, não quer ser uma
apologia do judaísmo, e (nem menos da história de minha família). Para
desenvolver a ideia da religião judaica, ou escrever a história do povo judeu,
para tudo isso existe pessoas competentes. E quem gostaria de se informar a
propósito, encontrará uma ampla bibliografia. (STEIN,1992, p.24)
Edith Stein havia sido demitida do cargo de assistente universitária de Munster é
como não conseguiria se manter na cidade sem o emprego, retornou sua cidade natal
Breslau onde se dedicou durante seis meses (abril a setembro) a redação do primeiro
capítulo: Memórias de minha mãe. Continuando a escrever o segundo capítulo O mundo
de duas irmãs mais jovens, durante os seis meses sucessivos apenas interrompendo a
elaboração dessa obra em maio de 1935, a pedido de seus superiores, que a orientaram a
dar continuidade ao seu estudo filosófico é teológico, Ser finito e ser eterno, continuando
a elaboração deste trabalho até o dia 27 de abril de 1939, primeiro aniversário da morte
de Edmund Husserl é como tributo descrevendo a experiência vivenciada pelos dois no
dia da defesa de sua tese em Friburgo: ‘Husserl estava irradiante de alegria. O próprio
decano havia proposto a nota Summa cum laude. ’ (STEIN,1992, p.374). Sendo este os
último marco de sua trajetória descrita nessa autobiografia. Sendo interrompida, pela
tarefa confiada a ela de escrever um ensaio biográfico sobre São João da Cruz em ocasião
dos seus 400 anos de nascimento.
Além de biografa que buscava registrar o seu lastro histórico é de demais
personagens ligados a tradição judaica como os membros da sua família e da tradição
cristã como o cardeal John Henry Newman, São João da Cruz é Santa Teresa de Ávila a
intelectual Edith Stein, também atuou como sujeito de seu próprio tempo, como quando
5
se inscreve aos 20 anos de idade no dia 28 de abril de 1911, na universidade de Breslau,
é descreve que essa conquista pessoal , era fruto da conquista do movimento das mulheres
do século XX. Ela descreve:
Todos os pequenos auxílios, que a carteirinha de estudante nos garantia – os
descontos nos bilhetes para o teatro e para os concertos e assim por diante – eu
considerava com carinho o zelo que o Estado tinha para com seus filhos, e isso
suscitava em mim o desejo de retribuir e agradecer ao povo e ao Estado com
minha futura profissão. Ficava indignada com a indiferença com que a maioria
dos meus colegas estudantes se posicionava diante das questões de caráter
geral: a maior parte deles, durante o primeiro semestre, pensava apenas na
diversão, outros se preocupavam apenas com superar os exames e, em seguida,
certificar-se do pão cotidiano (alimento). Foram estes sentimentos fortes de
responsabilidade social que me levaram, também, a lutar pela causa do direito
de votos para as mulheres. (STEIN,1992, p.173).
1. A formação acadêmica literatura é fenomenológica de Edith Stein
Os escritos de Edith Stein percorrem temáticas femininas por meio de dados
históricos, interpretações e fontes variadas, bem como possibilitam conhecer seu
percurso, sua identidade, sua relação com a história familiar e a história do seu povo e
seu dilema na busca da “verdade”.
Rosvitha Blume Friesen descreve que somente a partir das primeiras décadas do
século XIX, com o advento do romanticismo possibilitou um gradual processo de
emancipação intelectual da mulher, apesar de que neste período era privilégio de algumas
poucas mulheres da classe social mais elevada, que buscavam reconhecimento ante um
vasto público leitor e perante a crítica literária. (BLUME FRIESEN,2000, p.718) esse é
o cenário herdado por Edith Stein.
Ela se apresenta como mulher que deixou uma herança intelectual, não apenas na
história da filosofia contemporânea, mas também na história do pensamento feminino.
Em sua filosofia, são delineados “os traços de uma filosofia no feminino” (BELO,2005,
p.199), que começava a se fazer presente nos meios intelectuais alemães.
Podemos perceber a presença desses ‘traços de uma filosofia feminina’, no
período de 1913 em que se inscreve na Faculdade de Filosofia de Gottingen , para ter
aulas com Edmund Husserl, fazendo parte de um grupo denominado Sociedade
Filosófica, que sobre a orientação de Edmund Husserl, estavam homens como Adolf
Reinhard, Hans Theodor Conrad, Mortiz Geiger, Alexandre Koyré, Roman Ingarden, e
Johannes Hering mais também intelectuais mulheres como Grete Ortmann, Érika Gothe,
6
Rose Guttmann, Betty Heymann, Dietricht von Hildebrand (MORAN,2011,p.59), e
Hedwig Conrad-Martius com quem vai desenvolver uma forte amizade e inspiração de
intelectual é que será sua madrinha de batismo, quando se converte ao cristianismo. Alles
Belo descreve Hedwig Conrand-Martius:
Hedwig Conrad-Martius nasceu em Berlim, morreu em Mônaco em 1966. Foi
uma das primeiras mulheres que completou os estudos universitários. Formou-
se em história e literatura na universidade de Rostock. De 1909 a 1912,
frequentou os cursos de filosofia, psicologia e história da arte em Mônaco e
em Gottingen; segue as aulas de fenomenologia com Edmund Husserl. Em
1912, preside a Sociedade Filosófica em Gottingen, e se forma em filosofia
sob a orientação de A. Pfänder. Casou-se com seu colega Hanns Theodor
Conrad. Em 1919, por causa das dificuldades de permanência das mulheres na
universidade, transfere-se para Bergzabern onde se dedica às suas pesquisas e
à preparação das suas conferências. Publica suas obras maiores na área da
filosofia da natureza e nas ciências, mantendo sempre presente a prospectiva
teológica. Seu grande mérito é ter encontrado uma articulação e não uma
separação entre as diferentes ciências. Examina os princípios da fé à luz da
fenomenologia (ALES BELLO; BREZZI, 2001, p. 28).
As duas intelectuais Hedwig Conrad-Martius apresentam trajetórias acadêmicas
semelhantes ambas as mulheres fazem a sua primeira formação em ciências do espirito
ambas escolheram os cursos de psicologia e história, uma faculdade que lhe fosse útil
também para o ensinamento. Ambas seguem a fenomenologia de Edmund Husserl e
tentam conciliar a ciências naturais das ciências do espirito. No caso de Edith Stein na
escolha de sua profissão, os familiares esperavam que escolhesse medicina ou direito, um
ramo que lhe oferecesse oportunidades econômicas, mas como naquele tempo as
mulheres não eram admitidas, nenhum familiar contrariou a escolha profissional:
Minha mãe abençoou com sua mão protetora. Ocasionalmente dizia ter
preferido se tivesse escolhido leis (direito). Mas se podia replicar que as
mulheres não eram ainda admitidas para o exame de direito. Para um trabalho
social nenhuma das duas pensavam. Por outro lado, a preocupação de minha
mãe era apenas uma discreta sugestão. Entendia me deixar livre: ‘Ninguém,
nunca te disse o que deves fazer, e não existe ninguém que possa fazê-lo. Faça
aquilo que achar justo’. Assim podia caminhar por minha estrada sem
preocupação. (STEIN, 1992, p.158).
Apesar de um ponto de aproximação entre as duas intelectuais ser o campo
profissional ligado a educação em especial as ciências do espírito, já que outras profissões
eram limitadas a participação das mulheres como o direito, mesmo nesse campo de
atuação a educação é a filosofia era incomum a participação feminina como Ângela Alles
Belo aponta eram ‘É, esse, um fenômeno singular, de fato, se observarmos outros círculos
7
filosóficos daqueles anos nos damos conta da quase total falta de figuras femininas’.
(ALES BELLO,2005, p. 199)
Assim apontamos a importância social é política que a reflexão de Edith Stein
sobre a questão feminina e o compromisso da mulher na sociedade remonta à experiência
vivida nos anos da universidade, este sentimento de responsabilidade social e de gratidão
com o Estado que impulsionará a jovem universitária a visitar as crianças internas no
instituto situado em Warteberg, próximo a Obernigk. Sua abertura com relação aos
problemas pedagógicos da atualidade a estimulava a buscar informações acerca das
instituições sociais e centros de formação para cegos, surdos e deficientes mentais.
De fato, Edith Stein, entre os anos 1922-1933, defenderá energicamente, em suas
conferências, a inserção e a ativa participação da mulher na vida do Estado. Como
universitária em Breslau, participa de vários movimentos e associações, empenhando-se
socialmente e, vive, não obstante o indiferentismo religioso, uma grande experiência
inter-religiosa. Já nas primeiras semanas na universidade de Breslau, conhece Kaethe
Schol, colega de estudos, proveniente de uma família protestante, membro do movimento
de mulheres, com a qual estreita uma forte relação de amizade.
Kaethe Schol participava de diversos círculos que iniciavam as damas da
sociedade para as questões filosóficas e históricas. A ‘diversidade de origem e
de confissão não incomodava nossa amizade’, pois também para Kaethe Schol,
não me parecia que a Escritura significasse algo de sagrado. (STEIN,1992,
p.172).
Os laços disciplinares da história e da filosofia aproximam Edith Stein, tanto das
intelectuais Kaethe Schol é do círculo das damas de alta sociedade de Breslau como
posteriormente em Gottingen a aproxima com Hedwig Conrad-Martius, assim o campo
disciplinar da história não é apenas um campo de atuação reflexiva mais também de
atuação política e social, que aproximavam esse grupo de intelectuais.
Durante o período em que estudou na universidade de Breslau fez parte do grupo
de mulheres de Kaethe Schol, que se encontrava todas as semanas, por duas horas, durante
a noite. Onde haviam conferências e debates cujo tema central era os assuntos
pedagógicos, eram convidados para ministrar as palestras eram os reitores e professores
das diversas disciplinas que compunham a universidade de Breslau. Quando não havia
palestrantes, o grupo escolhia alguns livros com os clássicos da literatura é ou de filosofia.
8
Para além da discussão e produção intelectual havia no grupo uma atuação social
através da visita a escolas auxiliares, institutos de cegos, surdos-mudos, colégios para
órfãos e abandonados e asilos de portadores de necessidades especiais e doentes mentais.
Além desde grupo pedagógico Edith Stein também participou da associação acadêmica
de estudantes afiliada pela sociedade Humboldt para a instrução popular, onde os
membros se colocavam à disposição para ministrar cursos e aulas para os trabalhadores
pobres, cursos diferentes daqueles ofertados, nas universidades populares. (STEIN,1992,
p.183).
2. A conferencista Edith Stein a Mulher na esfera da literatura
Em fevereiro de 1916, quando estava preparando sua tese de doutoramento, entrou
no magistério. O motivo era de ordem financeira, mas ela mesma conta que pesava ainda
mais a alegria e o interesse de ensinar. A essa altura, já estava habituada a assumir uma
posição docente diante de crianças e jovens.
Depois de vários estágios no liceu feminino em Breslau, ela deu durante uma
década as aulas de alemão no instituto das dominicanas em Speyer, tanto no seminário
para professoras quanto no liceu para moças. Posteriormente assumiu um cargo de
professora no Instituto Alemão de Ciências Pedagógicas em Münster; depois de um ano
e meio de atividade docente, ela teve que renunciar a esse cargo em consequência das
mudanças políticas ocorridas em 1933. Sua especialidade tinha sido o estudo da educação
feminina.
Cristina Ruiz Alberdi Fernández aponta que a sociedade alemã da década de 1920,
estavam testemunhando uma evolução social em que a questão feminina era debatida pela
maioria dos círculos intelectuais. Nessa época, Edith Stein era professora na escola
Dominicana de Spira, quando um aluno lhe perguntou por que havia tana conversa sobre
a atuação das mulheres, sobre a sua essência, e em quais espaços ela deveria atuar, levou
a Stein conversar com suas alunas das disciplinas de literatura e história, pois como
observa a discussão sobre o papel da mulher, despertava opiniões contraditórias que
deveriam ser discutidas:
Vemos mulheres na poesia hoje e nas últimas décadas como se ela fosse o
diabo do abismo. Em ambos os lados, temos uma grande responsabilidade.
Nosso senso e nossa vida são apresentados a nós como um problema.
(STEIN,1999, p.83).
9
Assim como educadora Edith Stein, compreende que é seu papel elucidar para as
suas alunas sobre o papel da mulher é investigar como estavam sendo representadas pela
sociedade, para a autora tentar alcançar a parte mais íntima do que ser mulher. Investigar
a alma feminina não é uma tarefa fácil. Sendo que a psicologia não conseguiu responder
às perguntas que foram levantadas. Porque era uma ciência incompleta pois procurava
estabelecer tipos universais de mulheres, não valorizando as singularidades assim como
a teologia e a filosofia que também não resolveriam o problema porque falavam da alma
em geral, a do ser humano por isso também de maneira universal.
Mesmo abstraindo das Individualidades, existe um tipo de mulher? O que
ainda existe em comum no tipo de mulher que encontramos em O Sino, de
Schiller, ou em Vida e Amor de Mulher, de Chamisso ou nas mulheres
retratadas por Zola, Strindberg, Wedekind? Toda a diversidade presente na
vida concreta pode ser subordinada a um denominador comum e esse
denominador comum, por sua vez. Pode ser diferenciado da alma masculina?
Aqui não é o lugar de provar filosoficamente que existe no âmbito do ser algo
que poderíamos chamar de espécie de alma feminina e que há uma função
especial de conhecimento que permite reconhecê-la. (STEIN,1999, p.107).
O caminho proposto por Edith Stein, para compreender a alma feminina é através
da literatura, pois não optem por uma prova filosófica que demonstra que existe um tipo
ideal de mulher. Portanto percebendo essa dificuldade em estabelecer um tipo mulher, ela
decide pesquisar na literatura, pois e no fazer literário que os ‘tipos’ femininos são
observados e idealizados.
Nesta tarefa de procurar por "tipos" femininos, ela escolhe três autores. Mas eles
não os escolhem aleatoriamente, mas de uma maneira muito significativa, uma vez que
os autores escolhidos são feministas ou de seu ambiente cultural. Esses escritores são:
Sigrid Undset (1882-1949), Henrik Ibsen (1828-1906) e Johann Wolfang Von Goethe
(1749-1932). Todos os três são relativamente contemporâneos a Stein.
Sigrid Undset a única mulher do grupo é norueguesa assim como o dramaturgo
Henrik Ibsen, como aponta Cristina Ruiz Alberdi Fernández os países nórdicos foram os
primeiros países em que o movimento feminista alcançou mais conquistas.
(FERNÁNDEZ,2010, p.217). Johann Wolfang Von Goethe é alemão como Edith Stein.
Cada um desses escritores oferece a ele uma personagem feminina para refletir: Undset,
Ingunn; Ibsen, Nora e Goethe, Ifigênia. Com eles Edith Stein elabora três tipos femininos.
3. Os Tipos de feminino em Undset, Ibsen e Goethe
10
Edith Stein escolhe do romance Olav Audunssön de Sigrid Undset a personagem
Ingunn que cresce em um sítio nórdico, durante a Idade Média, sem receber muitos
cuidados nem educação sofisticada. É educada para se tornar noiva de seu irmão de
criação, Olav, em cuja companhia e de outras crianças vagueia pelas redondezas, sem
disciplina de seus desejos e vontades.
O desejo afetivo e desperto aos 15 anos, e a ele cedem Ingunn e Olav , a vida deles se
resume a ceder ao insaciável desejo de amar , porem a família se opõem ao casamento e
separa o casal , embora ambos se considerassem unidos pelos vínculos do matrimônio.
Devido a proibição familiar, Ingunn vai encontrar compensação em seus sonhos por sua
felicidade perdida; causando crises nervosas e paralisia com o tempo se torna vítima de
outro sedutor. Ingunn através de uma intervenção divina, reconhece sua queda, reage e
põe fim à relação pecaminosa. Quando reencontra com Olav, faz uma confissão ao marido
que a assume como esposa e cria o filho e o torna herdeiro. Porém Ingunn, vive abatida
pela consciência de sua falta. O destino também não admite que ela seja feliz; e todos os
seus outros filhos nascem mortos. Durante anos, Ingunn e Olav aceitam o quadro trágico
em silêncio. Só perto do fim da vida de Ingunn, Olav começa a suspeitar que na alma de
sua mulher devia ter germinado algo mais do que uma afeição surda e irracional; deve ter
havido a compreensão de um mundo superior. Depois de falecida Olav continua no
romance a cuidar do filho de Ingunn.
Edith Stein compreende este romance como uma confissão de Sigrid Undset, que
busca representar o sentimento de culpa que uma mulher poderia ter. O personagem
Ingunn para Stein, simboliza a mulher que e instintiva, pois cresceu sem orientação
familiar como um animal selvagem, por isso não conseguia controlar os seus desejos.
Olav só observa a esposa Ingunn, no final da vida e nessa observação que percebe que a
mulher que ele amava tanto e que às vezes era caprichosa e frágil, brilhava uma luz divina
que ele devia ter trazido à tona.
Ingunn, portanto, poderia ser compreendida como a representação do tipo de
instintiva cuja vida sempre foi organizada pelas pessoas ao seu redor, sendo primeiro a
família, depois o sedutor e por último o marido Olav.
No caso de Sigrid Undset, ninguém pensará que o motivo tenha sido l'art pow·
l'art. Sua literatura é confissão sem concessões. Tem-se até a Impressão de que
ela sente uma verdadeira compulsão de expressar o que a realidade brutal lhe
impõe. E eu acho que todo aquele que observa a vida com sinceridade e
11
objetividade não pode negar que ela trabalha com tipos reais, mesmo que
tenham sido escolhidos com uma certa unilateralidade. Parece que essa
unilateralidade exprime uma determinada tendência: ela destaca o elemento
animalesco e instintivo em oposição a um idealismo mentiroso e um
intelectualismo exagerado que gostaria de elevar-se acima da realidade terrena.
(STEIN, 1999, p.111)
A segunda personagem que representaria um tipo de mulher que é elegida por Edith
Stein é Nora da peça teatral A casa de Bonecas de Henrik Ibsen, a escolha da personagem
serve como representação do oposto da selvagem Ingunn. Nora é criada em um ambiente
urbano e moderno, possui educação sistemática, mas é mimada pelo seu pai que a trata
como boneca, e será a boneca preferida de seu esposo, e tratara seus filhos como seus
bonecos.
O pai de Nora tem problemas burocráticos e o governo encarrega a Helmer que é
advogado, investigar o caso. Nora e Helmer se conhecem por causa dessa investigação e
se casam e tem três filhos. A situação econômica não é boa, mesmo assim Nora, espera o
extraordinário para a sua família.
Para Nora, a sua família em especial o seu marido e o centre de sua vida. Ele toma as
decisões, ela o obedece e, se algo lhe interessa muito, mesmo que Helmer não aprove, ela
o faz e depois se arrepende da decisão, e busca a orientação de sua amiga a Sra. Linde
que representa a mulher que vive na realidade, a quem Nora confidencia que teve que
solicitar um empréstimo ao banco, para pagar o tratamento de saúde do marido, mas este
teve que ser garantido pelo pai; Desde que acabara de morrer, ela forjou sua assinatura,
porém não havia contado a ele:
Sra. Linde- E então? Você nunca confiou em seu marido? -Nora- Deus não
permita! Como você teve essa ideia? Ele, tão severo por essas coisas! De resto,
Torvaldo (Helmer), com sua auto-estima como homem, acharia muito doloroso
e humilhante saber que ele me devia algo. Nossos relacionamentos teriam sido
estragados e a felicidade de nossa casa teria sido abandonada para sempre.
(IBSEN, 1999, p.27)
Nora é chantageada por Rank Krogstad que havia emprestado o dinheiro a ela, e exige
que fuja com ele mais é negado pois Nora e fiel ao marido Helmer. Com a negativa
Krogstad se vinga escrevendo uma carta para Helmer, relatando que ele quem concedeu
o empréstimo a Nora e sabe que a assinatura e falsa. Helmer recebe a carta e descobre a
verdade, porem sua reação é contra Nora, onde depois de disser que a despreza ficaria ao
seu lado apenas para manter as aparências sociais.
12
A partir da fala de Helmer que a condena por ter falsificado a assinatura, é diz que
apenas ficara ao seu lado para manter as aparências, Nora percebeu que o primeiro dever
é consigo mesmo. A despedida questiona se realmente existe um casamento real. Quando
Nora sai, Helmer a lembra do que costumava dizer, que um milagre pode acontecer. A
que Nora, com certo ceticismo, responde:
Helmer-Oh, é odioso!" Trair os deveres mais sagrados! -Nora- Como você
chama seus deveres mais sagrados. Helmer-Terei de lhe contar? Seus deveres
para com seu marido e filhos? - Nora-eu tenho outros deveres não menos
sagrados. (IBSEN, 1999, p.27)
Edith Stein ao analisar a personagem Nora, da peça de Henril Ibsen, queria estar
totalmente do lado das mulheres, endossando a causa feminista. Nora não aprendeu a
tomar decisões. A casa de Bonecas descreve a atmosfera típica de uma família de classe
média condicionada por preconceitos sociais. Ingunn e Nora estão cercados pelas
mentiras das pessoas ao seu redor. Nora tenta procurar a verdade, é por isso que ela quer
se encontrar. Ele percebeu seu grande vazio interior
Na desilusão, reconhece Nora a si própria e o marido descobrindo que o vazio
de sua convivência não merecia ser chamado de casamento. Afastado o risco
de um escândalo social, ele se dispõe a perdoar tudo e a restabelecer as coisas
em seu estado anterior. Mas agora ela já não pode voltar atrás, pois sabe que
precisa tornar-se outra pessoa antes de tentar outra vez ser esposa e mãe.
Também Robert Helmer precisaria trasnformar-se em ser humano, deixando
de ser apenas uma figura social, para que sua convivência pudesse transformar-
se em casamento. (STEIN, 1999, p.109).
A última obra literária analisada por Edith Stein é Ifigênia de Tauris, de Goethe, a
peça apresenta o enredo da filha de Agamenon e Clitemnestra, irmã de Electra e de
Orestes. Pertence a linhagem maldita dos tantálidas. Que foram condenados pela soberba
por Zeus a morrer de forma trágica. Agamenon e assassinado pela esposa a rainha
Clitemnestra. Orestes vinga a morte de seu pai matando a mãe e sento condenado pelas
Erínias, A irmã Ifigênia e salvada pela deusa Diana, quando seu pai decide oferece-la em
sacrifico aos deuses. Ela é transferida para o país dos citas, governado pelo rei Thoas. Lá,
ela vive no templo e se torna a sacerdotisa da deusa Diana. Ele cresce fazendo o bem a
todos, mas sua grande ilusão é retornar à sua terra grega, com a sua. Suas orações são
especialmente direcionadas ao irmão Orestes. O rei Thoas, vendo a bondade de Ifigênia,
sente-se atraído por ela e quer fazer dela sua esposa. Ifigênia com grande doçura diz que
não. Diante de tal desprezo, o rei se defende humilhando a mulher.
13
Rei Thoas- Embora eu devesse esperar. Ele não sabia, talvez, que estava
lidando com uma mulher? -Ifigênia- Não deprecie nosso pobre sexo, ó rei!
Armas não são como suas mulheres refulgentes; mas nem ignóbil. Acredite
que estou à sua frente em algo; em que sua felicidade é melhor do que você
imagina. Sem te conhecer ou me conhecer, você se dá a ilusão de que uma
união entre os dois mais próximos de ambos o faria feliz. Encorajados pela
melhor intenção e pela melhor vontade, você me incentiva a concordar; mas
agradeço aos deuses por me emprestarem a integridade necessária para recusar
uma união que eles não aprovam (GOETHE, 1869, p.1735).
Diferente dos tipos de representação de mulheres, analisadas por Edith Stein, isso é,
Ingunn e Nora a sacerdotisa Ifigênia, toma uma decisão ao responder ao rei Thoas em
defesa das mulheres. Ifigênia está convencida de continuar no treinamento do templo e
mantém a ilusão de que um dia ela poderá retornar à sua terra natal. Seu irmão Orestes e
sua amiga Pilades decidem resgatá-la do país cita. Eles chegam na praia e são pegos pelos
guardas do rei. Era costume naquele país que estrangeiros fossem sacrificados aos deuses.
Quando Ifigênia descobre que há dois homens sob sentença de morte, ela intercede
pelo rei. No começo, ela não os reconhece, mas Pilades fala com ela e diz quem são e o
que queriam quando a procuravam. O caráter de Orestes representa o homem que sofre
com o remorso do crime. Ele precisa ser libertado pelo perdão dos deuses. Pilades
conversa com Ifigênia para explicar que seu irmão precisa se libertar da angústia de seu
passado. Ifigênia, Pilades e Orestes estão convencidos de que o rei os matará quando
descobrir que eles foram procurar Ifigênia para levá-la com a deles, portanto planejam
escapar. Mas para isso é necessário roubar a imagem da deusa Diana, pois foi ela quem
libertou Ifigênia da morte. Ifigênia precisa tomar uma decisão que envolva a luta entre
verdade e mentira. É o grande teste que você precisa passar. Diga a verdade ao rei, apesar
do risco de morrer ou escapar. Ifigênia decide falar com o rei e dizer a verdade. A primeira
reação do rei é muito violenta, ele quer lutar contra Orestes; No entanto, a sinceridade de
coração que ele observa em Ifigênia o desarma de tal maneira que ele lhes permite retornar
à sua terra natal:
Ifigênia-Não! Essa prova sangrenta não é necessária, ó rei! Tire sua mão do
aço! Pense em mim e no meu destino. A breve luta imortaliza o homem; em
um instante ele cai e os poetas o elogiam em suas canções. Mas a prosperidade
silenciosamente passa as lágrimas, as infinitas lágrimas das mulheres que
sobreviveram abandonadas e o bardo de milhares de noites e dias não dizem
nada que, a planície consome uma alma mansa, dissolvendo-se em vão
invocações ao amigo prematuramente perdido, em meio a dores abrasadoras.
(GOETHE, 1869, p.1735)
14
Assim ao analisar a personagem Ifigênia Edith Stein, a descreve como um modelo
de representação da mulher que a descreve como capaz de tomar as suas decisões é que
foi possível de tomar essa atitude porque foi educada no templo de Diana. Sendo assim
pode realizar seu maior desejo que é de retornar aos seus familiares. Ela não quer ter laços
que o impeçam de fazer essa viagem, então ele rejeita a proposta de casamento do rei
Thoas. Você tem que passar nesse teste difícil. Seu medo é que, se ela escapar com seus
irmãos, essa ação a levará a perder sua liberdade, porque ela será vítima de remorso por
ingratidão em relação ao rei e a si mesma. Ela age assim porque acredita na bondade do
rei Thoas e que ela pode dialogar com ele. No final, ele alcança a vitória do bem sobre o
mal.
A trama clássica de Goethe, a grandeza singela e a ingenuidade sublime da
mais nobre de suas figuras femininas talvez pareçam ao homem moderno sinais
da maior irrealidade. E certamente estamos diante de uma idealização, mas
nem por isso trata-se de uma construção da fantasia, é uma imagem ideal
baseada, experimentada e sentida na vida. O grande plasmador deu forma
plástica àquilo que se lhe apresentou como humanidade pura e, ao mesmo
tempo, como é eterno feminino, destituído de qualquer intenção tendenciosa.
É por isso que nos sentimos comovidos de uma maneira que só o totalmente
genuíno e eternamente verdadeiro podem provocar. (STEIN, 1999, p.111).
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Na análise das três representações de ‘tipos’ de mulher presentes nas obras literárias
Edith Stein vê como traço comum entre as mulheres o desejo de dar e receber amor, isso
é, de viverem em comunidades e bem como a aspiração a serem tiradas de um meio social
que retirava delas a autonomia e consequentemente assumirem o controle da sua própria
vida. Tornar-se aquilo que se deve ser e deixar amadurecer pelo amor a humanidade
latente na forma individual especial que foi posta em cada mulher: eis o traço
característico da alma feminina, para Edith Stein. (STEIN,1999, p.113).
Assim na busca pela compreensão da especificidade feminina, Edith Stein procura
distingui-la da especificidade do masculino, demonstrando no ambiente cultural do teatro
e da literatura como estes descreve a singularidade dos diversos tipos de ‘mulher’ como
Undset, Nora e Ifigênia, mas ao mesmo tempo revela uma característica universal que é
a capacidade de transmitir amor.
Essa analise fenomenológica de Edith Stein, permite que defenda que o
amadurecimento no amor é a aspiração mais profunda do desejo tipicamente feminino,
ao passo que a aspiração tipicamente masculina parece dirigir-se mais aos efeitos
15
externos, à ação e ao desempenho objetivo do que ao ser pessoal tanto do próprio homem
como dos outros.
É claro que não se pode separar completamente as duas dimensões. Em sua estrutura
básica, a alma é de mesmo tipo para todo o gênero humano, mas a alma e o corpo
individuais produzem uma unidade sólida: sobre a base da sensorialidade, que é tanto
corpórea como psíquica, a singularidade de cada ente humano repousa também sobre uma
dimensão espiritual, a capacidade de autoconsciência, autorreflexão e abertura à
alteridade. É essa unidade radicalmente trina (psicofísico-espiritual) que permite a cada
um entrar no mundo objetivo dos valores e interferir no mundo pela vontade e de modo
criativo.
Assim os traços biográficos de Edith Stein como acadêmica que procurou refletir
sobre a importância das ciências humanas e do âmbito cultural, bem como o seu
posicionamento político em defesa da mulher, e sua inserção no mundo do trabalho e no
meio social, possibilitam que compreendamos que o corpo humano não é matéria
animada por uma alma; é um corpo de uma alma, um corpo típico de ser humano, dotado
da possibilidade de ver-se a si mesmo e ver a alteridade.
Assim, ao falar de ‘alma feminina’ e ‘tipos de representação da mulher’, Edith Stein
não pensa ao modo de um dualismo substancial de uma ‘alma de mulher’ inserida em
uma porção de matéria, nem ao modo de um dualismo de uma ‘alma de homem’ inserida
em outra porção de matéria. Ela pensa em modos de existir, em modos de ser totalmente
individuais, embora a individualidade seja uma forma de realizar o que há de comum na
espécie humana. A individualidade, numa palavra, contrai o universal da espécie em
unidades tipicamente femininas e tipicamente masculinas.
Se torna fundamental para Edith Stein, que as mulheres se percebam como indivíduos
e que possam manifestar as suas individualidades nos diversos modos de existir, sendo
uma forma de descrição dessas vivências a escrita literária e o teatro. Apresentando os
campos de análise cultural como uma forma da mulher manifestar a suas características
individuais e universais.
REFERÊNCIAS
16
BELLO, Angela Ales e BREZZI, Francesca. Il filo(sofare) di Arianna. Percorsi del
pensiero del Novecento. Milano: Associazione Culturale Mimesis, 2001.
BELLO, Angela Ales. Edith Stein e o nazismo. Roma: Città Nuova, 2005.
BELLO, Angela Ales. Edith Stein. La passione per la verità. Padova: Messaggero,2003.
BLUME FRIESEN, Rosvitha. Literatura alemã de mulheres e o novo movimento
feminista. In: Fragmentos. Florianópolis, Universidade Federal de Santa Catarina,
SC,n.18,2000.
FERNÁNDEZ, Cristina Mª Ruiz-Alberdi. El Pensamiento Feminista de Edith Stein: Sus
conferencias sobre la Mujer (Alemania 1930) y Nuestras Mujeres Mayores (España
2006-2007). Madrid, 2010
GELBER, Lucy. Prefácio dos Editores. In: STEIN, Edith. A mulher: sua missão segundo
a natureza e a graça. Bauru, SP: EDUSC, 1999.
GOETHE, Johann Wolfang Von. Ifigenia en Tauride. Madrid: Traducción Gaspar de
Cuellar,1869.
IBSEN, Henrik. Casa de muñecas. Madrid: Cátedra,1999.
SCHELER, Ferdinand Max. A posição do homem no cosmo. ed. Rio de Janeiro: Editora
Florense Universitária, 2003.
STEIN, Edith. A mulher: sua missão segundo a natureza e a graça. São Paulo. Ed:
EDUSC, 1999.
STEIN, Edith. Escritos Antropológicos y Pedagógicos: Magisterio de vida cristiana,
1926-1933. Madrid : El Carmem .2002.
STEIN, Edith. Escritos Filosóficos Etapa fenomenológica: 1915-1920. Madri: El
Carmen.2002.
STEIN, Edith. Estrellas Amarillas. Madri: Editorial de Espiritualidad.1996.
STEIN, Edith. Estrutura da pessoa Humana. Madrid: El Carmen.1933.
STEIN, Edith. La significacíon de la fenomenología como concepcíon del mundo. Em
STEIN, Edith. La Pasíon por la Verdad. Buenos Aires: Bonum.2012.
STEIN, Edith. Live in a Jewish Family - her unfished autobiographical account in The
Collectec Works of Edith Stein. Washington: Publications.1986.
STEIN, Edith. Vida de uma família judia e outros escritos autobiográficos. São Paulo.
Ed: Paulus, 2018.
17
UNDSET, Sigrid. Olav Audunssön. Barcelona: Editor José Janés.1956.
top related