planejamento em saúde - mário testa
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Ministrio da SadeFundao Oswaldo CruzEscola Nacional de Sade Pblica
IDEOLOGIA E PODER NO PLANEJAMENTO ESTRATGICO EM
SADE: UMA DISCUSSO DA ABORDAGEM DE MARIO TESTA
Mestranda: Lgia Giovanella.
Orientador: Adolfo Horcio Chorny
Dissertao apresentada Escola
Nacional de Sade Pblica para obteno
do ttulo de Mestre em Sade Pblica.
Rio de Janeiro, 1989
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O produto deste meu trabalho dedico
mama Josefina pela coragem, ao papai
Eletto pela delicadeza e persistncia.
O esforo do meu trabalho dedico s
pessoas que tentam por em ao o
desejo de transformar e transformar-me.
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AGRADECIMENTOS
Ao Arouca que um dia disse a mim e ao Padilha: "Por que vocs nofazem o mestrado?" Dando-me coragem.
Ao Sergio Koifmann, meu primeiro "mestre" na ENSP.
Ao Chorny, orientador democrtico, acompanhador deste meu esforo.
A Jeni Vaitsman, Slvia Gerschman, Eliana Labra, Javier Uribe e Geraldo
Lucchesi, amigos e companheiros de trabalho, pelas discusso de alguns
contedos e pela solidariedade.
Aos professores e pesquisadores do DAPS - ENSP pela possibilidade da
minha maior dedicao realizao desta dissertao.
A Sonia, Graa, Dalva, Terezinha, Monireh, Nilton e Marcelo, apoio na
datilografia e xerox.
A Ismenia e Marisa pelo esmero na datilografia da ltima verso.
A Bia pelo auxlio na correo.
A R, G, Slvia, Neca o Ula; famlia alternativa, amigos persistentes,
pelo afeto.
A Em, analista.
Ao Roberto.
Lgia
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Sumrio
Agradecimentos ....................................................................................................................................................iv
Resumo.................................................................................................................................................................vii
INTRODUO INFORMAL A UM TRABALHO FORMAL ....................................................................... ix
INTRODUO.....................................................................................................................................................1
Pressupostos da proposta de Planejamento de Mario Testa ................................................................................ 4
A proposta de planejamento em sade. ............................................................................................................... 5
I. O PLANEJAMENTO DE SAUDE NA AMRICA LATINA ..................................................................... 15
II. FUNDAMENTOS DA PROPOSTA DE MARIO TESTA PARA O PLANEJAMENTO EM SADE .45
1. O planejamento como prtica histrica.........................................................................................................502. O postulado de coerncia .............................................................................................................................. 53
2.1. Os componentes do postulado ............................................................................................................... 54
2.2. As relaes entre os componentes do postulado .................................................................................... 55
3 - Os problemas de sade enquanto problemas sociais....................................................................................59
3.1. - 0 processo sade-doena ..................................................................................................................... 59
3.2. - A alocao de recursos para a sade ...................................................................................................61
4. - O Poder.......................................................................................................................................................69
4.1. Os resultados do exerccio do poder: .....................................................................................................74
4.2. Os tipos de poder"31..............................................................................................................................75
4.3. Recursos de poder..................................................................................................................................81
4.4. Os prazos e os tempos do poder.............................................................................................................81
4.5. As formas organizativas do poder41......................................................................................................83
4.6. Impacto das formas organizativas do Poder .......................................................................................... 85
4.7. A Constituio dos atores sociais e dos atores de sade ........................................................................ 89
4.8. Os atores em cena .................................................................................................................................. 92
III. A PROPOSTA DE MARIO TESTA PARA O PLANEJAMENTO EM SADE.................................105
1. Diagnstico de sade .................................................................................................................................. 1071.1. - Diagnstico administrativo................................................................................................................110
1.2. Diagnstico Estratgico.......................................................................................................................118
1.3. - Diagnstico Ideolgico......................................................................................................................127
1.4. - Sntese Diagnstica ...........................................................................................................................130
2. As Propostas programtico-estratgicas...................................................................................................... 136
2.1. - As propostas programtico-estratgicas enquanto processos. ...........................................................137
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2.2. - Os programas.....................................................................................................................................140
2.3. - As estratgias.....................................................................................................................................148
IV. COMENTRIO PROPOSTA E ELEIO DAS CATEGORIAS........................................................... 159
V. CONHECENDO O PODER........................................................................................................................... 169
VI. IDEOLOGIA................................................................................................................................................. 231
VII. CONCLUSO ............................................................................................................................................. 283
BIBLIOGRAFIA................................................................................................................................................. 295
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RESUMO
Entendendo-se os enfoques estratgicos de planejamento em sadecomo formulaes que rompem com a normatividade de um "deve ser" que se
impe sobre a realidade, nas quais os processos de planejamento propostosobjetivam alcanar o mximo de liberdade de ao a cada ao realizada e,aonde considera-se o problema do poder e admite-se o conflito entre forassociais com diferentes interesses e com uma viso particular sobre a situao-problema na qual se planeja, fazendo parte do processo de planejamento aanlise e a construo da viabilidade, postulada a existncia de trsvertentes desse enfoque, elaboradas por autores latino-americanos. Dessasvertentes, escolhida a proposio de Mario Testa para discusso. A partir deum estudo da produo terica recente desse autor (1983-6) so ordenados eapresentados os fundamentos e os contedos da sua proposta atual para oplanejamento em sade de juntar o clculo tradicional (o diagnstico e a
proposta administrativa) com as anlises da estrutura de poder setorial e dasrepercusses das aes planejadas sobre essa estrutura. Essa caracterizaono leva conformao de um mtodo de planejamento. Testa faz umaproposta acerca do planejamento em sade mas no prope um mtodo deplanejamento em sade: prope um modo de entender os problemas de sadee os processos de planejamento. Ao compreender os problemas de sade tantona situao de sade como na organizao setorial como socialmentedeterminados e, portanto, o setor como inseparvel da totalidade social, Testainteressa-se pelo comportamento dos atores sociais e pe nfase na anlisedas relaes de Poder e na considerao das prticas de sade enquantoprticas ideolgicas, conformadoras de seus sujeitos. Testa avana de umaproposta de planejamento estratgico em sade para um pensamento
estratgico, um pensar a ao poltica em sade. Suas compreenses de Podere Ideologia fundamentam esse pensar a poltica em sade, sendo, ento, essascategorias escolhidas como principais para a anlise de sua proposta. realizado, ento, um estudo sobre o Poder: o que , como se exerce e quaissuas determinaes, discutindo a compreenso de Testa. Discute-se, ento, oconceito, de Ideologia em Testa e tenta-se analisar a validade de suasproposies de novas formas organizativas para as prticas em sade comoconstrutoras de uma nova concepo de mundo e de uma tica desolidariedade e transparncia atravs de breve estudo sobre a conformao deconcepes de mundo e de quais prticas sociais, filsofos marxistas tmconsiderado como tendo essa potencialidade transformadora. Atravs desse
estudar o Poder e a ideologia ao mesmo tempo que so discutidas ascompreenses de Testa descobre-se parte do referencial terico quefundamenta sua proposta. Conclue-se que as prticas sade enquanto prticassociais afetam as concepes de mundo de seus sujeitos sendo difcil, porm,garantir a direcionalidade dessa mudana. E, argumenta-se favoravelmente aocontedo transformador da proposta de Testa para o planejamento em sadepor desvendar os contedos de Poder nas aes em sade no escamoteandoas bases reais da dominao e, por ser transparente nos deslocamentos dePoder que objetiva.
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Um departamento de
planejamento para fazer o pensamento
dos homens.
Frederick W. Taylor
Planejamento: mediao entre o
pensamento e a ao.
Carlos Matus Romo
Para acabar com a distncia entre
o pensamento e a ao.
Mario Testa
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INTRODUO INFORMAL A UM TRABALHO FORMAL
Uma histria pode ser contada de vrias maneiras. Uma "tese" pode ser
justificada de inmeras formas. "Assim se lhe parece", diz o texto de
Pirandello. Olhando agora o resultado final do meu trabalho, a escolha do
tema, o jeito como se conformou a discusso, as categorias que escolhi, vejo
que esta minha dissertao tem talvez um sentido principal: a reflexo e
fundamentao, por tortuosos caminhos, do meu prprio trabalho.
Motivada pela necessidade de fazer, pelo desejo de transformar, atirei-
me de ponta cabea na prtica. mpeto saudvel, mas ingnuo, pois tinha umaconscincia da realidade que, caricaturando um pouco, Bourdieu denominaria
de "quase sistematizao afetiva", um "ser contra os maus e os opressores"
pouco fundamentado.
Sabendo da necessidade da ao coletiva para uma possvel
transformao social, mas imaginando-me como potente impulsionadora dessa
transformao e agindo de forma muito imediatista no tendo uma viso
histrica, as dificuldades no trabalho e retrocessos polticos levaram a que
ficasse triste. Era preciso ento pensar, refletir, compreender melhor.
Recuperar a alegria. Mudei de cidade. Fiz o curso de Sade Pblica na Escola
Nacional de Sade Pblica. Entrei para o mestrado ainda cheia de dvidas.
Quando participei da seleo para o ingresso no ms trado escrevi um
relato sobre minha experincia de trabalho no Programa de Sade Comunitria
da Prefeitura de Lages. Nas concluses dessa descrio eu dizia: contradiescomo participar do Poder e ao mesmo tempo querer transform-lo podem ser
constatadas na prtica, mas no resolvidas nem compreendidas se no
conhece o que este Poder. No meu trabalho em Lages propunha
participao e democratizao: distribuio do Poder e transformao da
conscincia atravs de uma prtica participativa e educativa em sade. E c
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estou eu, guisa de discutir uma proposta de planejamento estratgico,
discutindo o que? Poder e Ideologia, democratizao e participao.
Atravs de voltas e desvios encontro as bases tericas daquele trabalho
e discuto aquela minha prtica, que realizei meio idealista e intuitivamente,
sem uma compreenso mais ampla da realidade que desejava transformar.
Lendo a prova que fiz para ingresso no curso bsico onde eu afirmava
categoricamente: comprovado que o nvel de sade da populao se eleva
com a melhoria das condies de vida e no com um maior nmero de servios
de sade ou com a utilizao de tcnicas mais sofisticadas para diagnstico e
tratamento; ou lembrando o curta-documentrio Lages: a Fora do Povo
onde afirmo que o problema da "sade da populao no uma questo
tcnica, uma questo poltica", percebo elementos que orientaram a escolha
do meu tema de dissertao.
Encantei-me com Mrio Testa porque na discusso do planejamento da
ateno sade, referia-se claramente questo poltica, juntava a poltica
com a ateno sade.
Se posso, agora, traduzir a relao condio de vida/sade pela
determinao social do processo sade-enfermidade e no excluir a ateno
sade de boa qualidade - com tecnologia apropriada com toda a sofisticao
necessria correspondente complexidade de cada caso como possibilidade de
alterao dos nveis de sade, essas so decorrncias do meu aprendizado.
Mas se insisto na poltica e na determinao social do processo
sade/enfermidade porque, como Berlinguer, acredito que na Reforma
Sanitria o revolucionrio a sade. E sade vida. Mudar a sade mudar a
vida: sempre buscar melhores formas de trabalho e de relaes entre as
pessoas.
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Por quais caminhos to estranhos andam os nossos desejos!
Penso ainda em todo o desenvolvimento deste meu trabalho, o incio do
estudo, a discusso do poder, os livros de Gramsci, Foucault e Poulantzas h
muito comprados e nunca lidos, as dificuldades a incerteza/insegurana, as
tardes de olhar pela janela no vazio sem poder ler ou escrever, o calor, as
conversas com o Chorny, as reclamaes pros amigos e amigas, a impotncia
e eu a tratar do poder. As grandes dvidas sobre a minha participao poltica,
o descrdito nas organizaes existentes, as grandes dvidas sobre a situao
do pas, a falta de expectativa sobre o futuro e eu a falar sobre "apenas a
transformao do mundo".
A no tinha santo que me fizesse andar com este trabalho! Sentava-me
na cadeira o obrigava-me; mas obrigada eu no fao e a emperrava, o
trabalho no andava, empacava. Mas mesmo empacada na ao, de algum
modo nesses momentos sempre ocorria uma metabolizao inconsciente do
que eu havia lido que possibilitava o desenvolvimento da dissertao.
Nesses tempos de fazer a tese muito pensei sobre a sade do
trabalhador intelectual. Desde as dores nas costas pela falta de boas condiesde trabalho uma cadeira ergonometricamente perfeita que possibilite uma
boa postura - at a alienao em seu trabalho. Se o trabalhador manual vende
a sua fora, o trabalhador mental vende/aluga o seu pensamento. No trabalho
manual controla-se principalmente o corpo mas ao proceder o seu trabalho
repetitivo e mecnico o trabalhador pode deixar voar seu pensamento e
continuar o trabalho (correndo o risco da mo decepada, sem dvida). O
trabalhador intelectual s exerce o seu trabalho pensando, se desvia o
pensamento no produz e a o namorado, a anlise, as questes da existncia
privada interferem na produo. Para desenvolver o seu trabalho fica, ento,
obrigado a no pensar nisso, alienado de sua prpria vida.
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Penso tambm na tentativa de tornar o escrito de Mrio Testa mais
acessvel pelo seu ordenamento e sntese. No que o tenha conseguido de todo
porque para ser simples sem simplificaes, necessrio um profundo
conhecimento do que se deseja tratar. Fundamental tambm conhecer a
linguagem do outro que eu interpelo. Sem isso a comunicao no ocorre, no
h interpelao. Ou melhor, h outro tipo de interpelao, outro discurso
chegou antes ao meu possvel interpelado impedindo a minha comunicao. A
linguagem do outro imaginava-me mais ou menos conhecedora porque eu
havia sido um outro que queria agora interpelar. At pouco tempo no tinha a
compreenso da realidade que tenho agora e o meu outro era um igual a mim
antes dessa compreenso o meu pblico o meu imaginvel leitor eram os
alunos dos cursos de especializao em Sade Pblica.
No alcancei o intento de ser simples sem grandes simplificaes
certo, mas talvez algumas vezes eu tenha conseguido e isto me alegra. Outras
vezes, nem fui simples, nem simplista. Devido complexidade do tema e
tendo clareza da distoro que produziria ao tentar transformar para uma
linguagem mais simples misturei-me linguagem do meu interpelador - o
autor do livro - o que resultou num texto meu apresentando matizes das
linguagens dos diferentes autores e termos utilizados destoaram do conjunto,resultando num contedo por vezes complexo (tomara que inteligvel pelo
menos para os iniciados).
Esta introduo to eu para contrabalanar este trabalho to os
outros, to o que eles dizem, to a verdade j reconhecida. Estatuto da
verdade dado pelo reconhecimento do mundo acadmico.
certo tambm que toda esta discusso da minha dissertao mesmo
sendo formal anlise da realidade. Tem substrato material, concreto
pensado. Outra parte de desejo, vontade de transformar. Outra parte, ainda,
de acreditar na possibilidade de construir e compartilhar uma tica moral
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diferente da instituda: uma tica onde o que vale a solidariedade e no a
estratgia.
Sinto-me como um pintor iniciante cujo estilo ainda no est bem
definido, falta muito, mas j tenho as tintas. Divirta-se em mistur-las mais
um pouco. No desista!
Que esse trabalho contribua em algo. Teve esforo e muito aprendi. Se
no tanto, como no fazer uma tese, certo aprendi, e isto j bastante.
Lgia
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INTRODUO
Para a realizao da minha monografia de concluso do mestrado,
inicialmente elaborei um projeto de dissertao no qual propunha-me a analisar
comparativamente os aspectos tericos e metodolgicos de dois enfoques de
planejamento estratgico em sade: o enfoque representado pela produo
terica de Mario Testa nos ltimos anos e o enfoque elaborado por Juan Jos
Barrenechea e Emiro Trujillo Uribe.1 Considerando o enfoque de Mario Testa como
elaboraes mais gerais acerca do planejamento de sade e a maior
instrumentalizao apresentada por Barrenechea e Trujillo, o problema que
buscava resolver, a partir da caracterizao e anlise de cada um dos enfoques ede sua comparao, era se os procedimentos elaborados no segundo enfoque
poderiam ou no complementar a proposta de Mario Testa. Entendia, que se isso
fosse possvel ao final do trabalho chegaria bem prximo a um mtodo de
planejamento de sade.
Quando da apresentao e discusso pblica do projeto foi sugerido que ao
invs de uma anlise comparada eu aprofundasse a discusso de uma dessas
vertentes o que me permitiria uma melhor anlise considerando o prazodisponvel para a realizao de meu trabalho. Aceitei a sugesto e passei a
estudar os trabalhos de Mario Testa, autor que realmente me interessava
discutir, objetivando ordenar sua proposta para o planejamento de sade.
Eu havia elaborado o projeto inicial a partir do que tinha estudado durante
o mestrado e que significava apenas parte da obra de Testa. O que havia lido
eram textos preliminares, por vezes reescritos pelo autor, e na sua maioria
atualmente compilados em PENSAR EN SALUD.
Dispus-me ento leitura sistemtica (no sistema de cabo a rabo) da obra
de Mario Testa. Ler, apreender e fichar o Pensar en Salud e Pensamiento
Estratgico. Lgica de Programacin. Essa foi a primeira tarefa que me coloquei.
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Ligia Giovanella2
A partir dessa leitura e apreenso geral da obra de Testa propus-me, num
primeiro momento, a caracterizar e ordenar a proposta de planejamento emsade que eu considerava estar a contida. Elaborei ento um roteiro para essa
caracterizao. 0 roteiro tinha por base um ordenamento do prprio Testa
apresentado em 2 artigos seqenciais publicados nos Cuadernos Mdico-Sociales
n. 38 e n. 39 em Rosrio, na Argentina, em 1986 sob o ttulo "Estratgia,
Coherencia y Poder en las Propuestas de Salud", parte I e II e, o ordenamento do
texto "Estratgia y Programacin . 0 primeiro artigo dos "Cuadernos" juno
de partes do contedo de Tendncias en Planificacin, captulo do "Pensar en
Salud", e do "Pensamiento Estratgico" e o segundo parte do "Estratgia y
Programacin".
Nos artigos acima referidos dos Cuadernos Mdico-Sociales Testa
apresenta o seguinte ordenamento:
1. Pensamento estratgico
O estratgico histrico
Poltica e estratgia
2. Postulado de coerncia
3. Poder
Poder tcnico Poder administrativo. Poder poltico Poder e mudana social
ENSP/FIOCRUZ
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Introduo 3
4. Propostas
tempos tcnicos e tempos polticos Programas de abertura, avano e consolidao Formas organizativas internas e externas.
Em Estratgia y Programacin o ordenamento de Testa o seguinte:
1. Coerncia entre estratgia e lgica.
2. Diagnsticos de sade
diagnstico administrativo diagnstico estratgico diagnstico ideolgico sntese diagnstica
3. Indicadores
tradicionais
estratgicos
4. Propostas (com o mesmo contedo do artigo anterior).
Estes textos, assim ordenados, fazem parte da produo recente de Testa:
1986. E nessa produo recente que baseio o meu estudo sobre sua proposta
de planejamento estratgico para o setor sade: 1983-6.
Na elaborao do roteiro para minha caracterizao da proposta de Testatentei seguir sua nova proposio acerca do planejamento: "integrar o clculo
tradicional (o diagnstico; e a proposta administrativa) com a anlise estratgica
da estrutura de poder setorial e das repercusses sobre a mesma, das aes
propostas2.
IDEOLOGIA E PODER NO PLANEJAMENTO ESTRATGICO EM SADE
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O meu roteiro era dividido em duas partes uma primeira parte, aonde
reunia o que considerava como pressupostos da proposta, e uma segunda parte
constituda pela proposta para o planejamento, propriamente dita.
Para a primeira parte do roteiro s bases que Testa colocava - itens 1, 2 e
3 do artigo da revista - agreguei a sua compreenso sobre sade: o conceito de
sade e o processo sade-doena, contidos em sua obra, e a determinao da
alocao de recursos para a sade, sntese realizada a partir de "Problemas
sociales y Questin Nacional", captulo do "Pensar en Salud". No sub-item
'Poder' alm dos tipos de poder coloquei sua compreenso e discusso sobre
Poder: contedo do "Pensamiento Estratgico". Tendo esses itens como
fundamentos ordenei ento a proposta de planejamento, a segunda parte do
roteiro: os trs diagnsticos, a sntese diagnstica e as propostas programtico-
estratgicas.
O roteiro era o seguinte:
1 PARTE: PRESSUPOSTOS DA PROPOSTA DE PLANEJAMENTO DE MARIO
TESTA
1. Introduo (cujo contedo eram os conceitos de estratgia e
poltica)
2. O planejamento enquanto prtica histrica (as estratgias de
transformao)
3. O postulado de coerncia
4. Sade
- O conceito de sade e a determinao do processo sade-doena.
- A alocao de recursos para a sade
5. Poder
ENSP/FIOCRUZ
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Introduo 5
2P
ARTE:A
PROPOSTA DE PLANEJAMENTO EM SADE.
1. Os diagnsticos
- Diagnsticos administrativo
- Diagnstico estratgico
- Diagnstico ideolgico
2. Sntese Diagnstica: identificao e anlise da estrutura de poder
setorial
3. As propostas programtico estratgicas enquanto processos: tempos
tcnicos e tempos polticos.;
- Os programas
Programas de avano Programas de abertura Programas de consolidao
- As estratgias (as formas organizativas internas e externas)
Democratizao interna Participao
Elaborado o roteiro em grandes itens e sub-itens, a partir da releitura das
minhas anotaes a cada sub-item agreguei contedos afins dispersos ao longo
dos textos. Dei, ento, incio caracterizao da proposta de Testa eu haviaordenado. Os textos que basicamente utilizei para a caracterizao da proposta
de Mario Testa foram as obras que recm acabara de ler e fichar: "Pensar en
Salud e Pensamiento Estratgico, Lgica de Programacin, Estratgia y
Programacin. Recorri a artigos anteriores, preliminares a esses textos, apenas
com o intuito de buscar uma melhor compreenso do que Testa queria dizer.
IDEOLOGIA E PODER NO PLANEJAMENTO ESTRATGICO EM SADE
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Esses textos principais correspondem produo de Testa entre 1983 e 1986
significando por vezes reelaboraes de textos anteriores.
No fiz uma caracterizao e anlise processual da obra de Testa nesseperodo. Processual no sentido de como o seu pensamento evoluiu/transformou-
se ao longo do tempo. Tomei os textos como se pertencessem a um mesmo
momento, pois no objetivava uma anlise de toda obra, mas a ordenao de
seus aportes para o que inicialmente considerava que pudesse vir a conformar-se
num mtodo de planejamento estratgico em sade.
Nessa caracterizao, como disse, segui a proposio de Testa de juntar o
clculo tradicional com a anlise da estrutura de poder setorial e da repercusso
das aes propostas sobre esta estrutura. Ao diagnstico administrativo, principal
componente do clculo tradicional da sua proposta, agreguei questes colocadas
na "lgica de programacin, referentes s diferentes lgicas dos recursos nos
diversos nveis, que auxiliam nesse clculo. Ao diagnstico administrativo
seguem-se os diagnsticos estratgico e ideolgico que representam o incio da
anlise da estrutura de poder setorial, completada com a identificao desta
estrutura na sntese diagnstica. As propostas programtico-estratgicassignificam proposies de realizao de aes em sade, pensadas desde a sua
viabilidade (anlise da estrutura de poder) e de seu impacto sobre as relaes de
poder, setoriais e extra-setoriais. Dessa anlise resultam seqncias de
programas a viabilidade e essa repercusso. A forma proposta para a realizao
das aes - as formas organizativas internas democrticas e externas
participativas do direcionalidade a todas as aes propostas no sentido da
mudana representada pela criao de uma nova tica de solidariedade e
transparncia, devido ao impacto que a realizao de prticas mais democrticas menos autoritrias e centralizadoras - causa na conscincia das pessoas.
Criao de uma nova tica que no entender de Testa resulta em novas prticas
transformadoras das relaes de poder.
ENSP/FIOCRUZ
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Introduo 7
Inicialmente tinha como propsito ordenar, sintetizar e apresentar de
forma clara o que considerei como proposta de Mario Testa para o planejamento
de sade. O objetivo/tentativa dessa caracterizao e ordenamento era produzir
um texto-Testa-condensado que facilitasse o acesso das pessoas, que iniciamna Sade Pblica, aos da proposta de planejamento estratgico de Mario Testa.
Ao mesmo tempo, objetivava o levantamento das principais categorias utilizadas
na conformao da proposta. A partir desse levantamento, a discusso da
proposta em grandes linhas e a anlise das categorias eleitas deveriam permitir
aportes para um mtodo de planejamento e uma reelaborao da proposta cujo
produto final seria um "Planejamento Estratgico em Mario Testa Modificado.
Falo em objetivo/tentativa porque tornar mais acessvel a proposta de
Testa significava no s participar de sua difuso mas tambm escrev-la de
forma mais simples, sem ser simplrio/simplista, a traduo de complexos
conceitos em linguagem mais informal e acessvel, s possvel pela profunda
compreenso de todos os conceitos e relaes a respeito de tudo o que se quer
falar. Muitas questes tratadas eram bastante complexas e o meu conhecimento
menor do que imaginava e disso resultou apenas uma tentativa pretensiosa.
Pretensiosa desde o inicio porque minha formao universitria foi em medicinaaloptica tradicional havendo entrado em contato com o sociologus-politiqus-
economs somente na ps-graduao o que significou um esforo para
apreenso das novas categorias. Fora esta dificuldade que produzira o desejo de
escrever de forma mais compreensvel. 0 resultado positivo dessa tentativa foi,
se no um texto claro e simples, o meu prprio aprendizado, minha melhor
compreenso de muitos conceitos.
Objetivo/tentativa tambm porque no era possvel ordenar a partir dosescritos de Testa um mtodo do planejamento em sade, mas apenas
pressupostos e elementos de um mtodo de planejamento, pois Mario Testa
prope mais uma maneira de pensar o planejamento de sade, pensar a atuao
em sade, do que um mtodo de planejamento. Possvel ordenao de
fundamentos e elementos de cuja discusso no poderia resultar j num primeiro
IDEOLOGIA E PODER NO PLANEJAMENTO ESTRATGICO EM SADE
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Ligia Giovanella8
momento (dentro das minhas limitaes de prazos e conhecimentos) na
proposio de um mtodo de planejamento.
O que realizei foi o ordenamento de uma proposta de Mario Testa para oplanejamento de sade e do que considerei como seus fundamentos, de forma
no muito sinttica. A importncia, sob meu ponto de vista, dos elementos da
proposta que selecionei, meu desejo de torn-los bem inteligveis, a juno de
contedos afins oriundos de diferentes textos, e o querer ser fiel a sua obra
levaram a que o meu resultado final fosse mais uma "traduo ampliada do que
uma "sntese ordenada".
Como o objetivo era uma sntese de toda a proposta e um texto acessvel
que auxiliasse na difuso da obra de Testa, pois eu gostava e concordava no
geral com as suas proposies, optei por um texto-Testa onde escrevia do lugar
dele, deixando ento para fazer a discusso e os comentrios a posteriori. Isso
trouxe-me dificuldades pois acabei por confundir-me com o autor o que
prejudicou a sntese e por certo perodo impossibilitou o distanciamento mnimo
necessrio para a discusso. Fez tambm com que eu demorasse mais tempo
nessa caracterizao.
Feita a caracterizao da proposta - a minha traduo ampliada - comecei
a metaboliz-la para a escolha das principais categorias. Metabolizao pode ser
uma palavra estranha mas pertinente, tem o sentido do perodo em que se
assimila aquilo que importa e exclue-se (elimina-se) o que no importa. Assim,
num primeiro momento surgiram Poder, Ideologia e Organizao como categorias
fundamentais3.
Durante o meu reescrever do Testa progressivamente fui tomando
conscincia que ele faz uma proposio para a ao poltica em sade, organiza o
raciocnio de como pensar a ao poltica em sade. Assim, como disse
anteriormente da minha proposta inicial, de a partir da leitura e anlise dos
textos de Testa ordenar de forma sinttica e clara o contedo de um mtodo de
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Introduo 9
planejamento em sade - que hipoteticamente supunha que esses textos
contivessem - tive como resultado no um mtodo ordenado mas elementos de
um mtodo e mais do que isso orientaes para pensar as questes relacionadas
sade. E nessas orientaes para o pensar a ao presente e futura em sadetrs grandes categorias esto inter-relacionadas: poder, ideologia e organizao.
Feita a escolha destas categorias passei leitura em diversos autores de
conceituaes e discusses acerca desses termos. Durante a leitura e fichamento
da bibliografia que selecionei para esse estudo, o meu processo de
"metabolizao" teve continuidade e acabei por excluir a compreenso de
"Organizao em Mario Testa como categoria que fundamenta a sua proposta,
como veremos a seguir.
Poder categoria que fundamenta e orienta o pensamento de Mario Testa
sobre planejamento, tanto na sua anlise sobre a sade como em suas
proposies para a ao em sade. Grande parte dos trabalhos de Testa tratam
da discusso do Poder: o que , como se exerce, suas relaes, impactos, como
qualific-lo e quantific-lo, como alterar a distribuio do Poder, acumular Poder,
transformar as relaes de Poder. Faz toda uma anlise desde o Poder enquantocapacidade at o Poder de Estado.
Na perspectiva da sua proposio de transformao da distribuio e das
relaes de poder, ideologia e organizao so categorias dele inseparveis.
Organizao categoria fundamental no pensamento de Mario Testa sob
dois aspectos: a organizao enquanto instituio - agrupamento de pessoas com
interesses comuns estabelecido e permanente - pela sua capacidade estruturantee de consolidao e, organizao enquanto as formas organizativas das prticas,
quer dizer, enquanto o jeito como esto organizadas as organizaes: suas
relaes internas e suas relaes externas.
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A importncia para Mario Testa da organizao enquanto instituio pode
ser bem apreendida partir do Postulado de Coerncia: relao necessria
entre os propsitos, mtodos utilizados e organizao encarregada de alcanar
esses propsitos. Nesse postulado, num segundo nvel, determinada pelahistria e condicionalmente da histria. Segundo Testa a principal caracterstica
na forma de funcionamento do postulado para pases capitalistas
subdesenvolvidos e dependentes a labilidade organizativa. Essa caracterstica
faz com que a organizao seja o componente, seja o componente do postulado
mais determinado e, explica o diferente modo de funcionamento do postulado
nesses pases, em relao aos capitalistas desenvolvidos
A transformao que se deseja, diz Testa, que a organizao passe a ter
uma relao biunvoca coma histria que significa dizer, ao mesmo tempo ser
determinada pela histria e determinar a histria.
A organizao tem assim capacidade estruturante estrutura estruturante
que determina a histria e o que deseja Testa a construo da histria no
sentido da. transformao das relaes de Poder. As organizaes que tm sido
consideradas por filsofos e cientistas polticos como tendo esta capacidade emsociedades cujo modo de produo hegemnico o capitalismo - so
organizaes partidrias de classe e este significado que Testa sugere para
organizao no Postulado de Coerncia. Organizao enquanto partido de classe
mais do que como uma categoria de anlise do pensamento de Testa
instrumento de transformao, determinante da transformao das relaes de
poder na sociedade. Organizao com esta potencialidade de transformao da
sociedade objetivo a ser alcanado em Mario Testa e no categoria que utiliza
no desenvolvimento de seu pensamento e por isso a exclui como categoria bsicade anlise de suas proposies.
Testa faz um caminho na sua reflexo sobre o Poder que do pensar,
inicialmente, a constituio da classe operria enquanto partido revolucionrio
como nica possibilidade de transformao social, avana para uma compreenso
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Introduo 11
que se poderia chamar foucaultiana do Poder. Nessa compreenso o exerccio
do Poder esta presente em todas as prticas sociais e se contra o Poder que se
luta, esta pode ocorrer em cada prtica cotidiana. E a, da prioridade dada
organizao partidria de classe do proletariado, no postulado de coerncia,avana para uma nfase nas formas organizativas das prticas: as formas como
exercem-se as relaes de Poder.
Enquanto formas organizativas das prticas, organizao tem o significado
das relaes que se estabelecem entre as pessoas e/ou grupos sociais para a
tomada de decises, a forma como se decide o que fazer cada dia, a forma como
se exerce a relao do Poder. Testa entende que a forma organizativa das
prticas constre a conscincia das pessoas, faz com que adquiram uma
concepo de mundo e uma postura de vida, uma forma de atuao social. As
formas organizativas das prticas so para Testa as formas de exerccio do Poder
e o exerccio do Poder causa impacto sobre a conscincia das pessoas: constri a
conscincia das pessoas. Essas relaes internas s organizaes - formas das
prticas no processo produtivo - externalizam-se pois a conscincia a formada
reproduz nas prticas sociais reprodutivas a relao de poder contida nesta
prtica.
Essa relao das formas organizativas das prticas com a criao da
conscincia o contedo de seu conceito de Ideologia. Ideologia entendida por
Testa enquanto um saber e uma prtica: um saber que uma concepo de
mundo e uma prtica que constri os seus sujeitos, cria uma conscincia em seus
sujeitos. O entendimento de Testa ideologia engloba ento as formas
organizativas das prticas, pois Testa entende Ideologia como um saber e uma
prtica cuja forma organizativa auto-constri seus sujeitos e em conseqnciaconsolida esta prtica: prtica que resulta na consolidao de uma tica.
Para Testa, ento, atravs de um processo de ideologizao que
produzem-se sujeitos sociais conscientes impulsionadores de novas prticas
sociais por sua vez ideologizantes. Sujeitos sociais individuais ou coletivos
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conscientes que participam do Estado ampliado constituindo-se em atores sociais
e disputando poder na sociedade.
O Poder Social, segundo Testa, mantm-se no apenas pela coero mastambm pelo consenso. Consenso determinado pela considerao das propostas
dominantes como legtimas conforme alguma tica. Trata-se, ento, da
conformao de uma nova tica que consolide uma vontade coletiva pela
transformao das relaes de Poder.
Ideologia , assim, categoria fundamental para a anlise do pensamento
de Testa pela considerao do Poder enquanto tal. Por compreender Ideologia
como concepo de mundo e prtica construtora de sujeitos esse conceito base
de suas proposies de novas formas organizativas para as prticas de sade,
Testa prope novas formas organizativas das prticas pela sua potencialidade de
transformao das relaes de poder na sociedade ao transformar a conscincia
dos sujeitos dessas prticas e ao promover a criao de organizaes
correspondentes a esse novo nvel de conscincia.
nessa interrelao de Poder e Ideologia que baseiam-se as proposiesde Mario Testa para a atuao em sade. E, por isso, a discusso de sua
compreenso acerca dessas categorias fundamental para o entendimento de
sua obra e anlise de suas propostas.
A partir do estudo da bibliografia selecionada fiz uma discusso da
categoria Poder em Mario Testa, cujo contedo j havia agrupado como um dos
fundamentos de suas proposies. Revi, ento, como apresenta Ideologia
em seus vrios textos e a partir da realizei uma discusso sobre o conceito deIdeologia em Testa e sobre a formao das concepes de mundo.
Foi nesse processo de leitura, reflexo, anlise e discusso comigo mesma
e principalmente com Chorny, meu orientador, mas tambm com Jeni Vaissman,
Slvia Gerschmarn, Eliana Labra, Geraldo Lucchesi, amigos e companheiros de
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Introduo 13
trabalho, que conformou-se o conjunto de perguntas que orientam a minha
dissertao e que apresento ao final do captulo I.45
Os resultados desse processo o que apresento a seguir inicialmente situoas proposies de Mario Testa no contexto do planejamento em geral e do
planejamento de sade na Amrica Latina, em particular. Seguem-se os
fundamentos da proposta; a proposta de Mario Testa para o Planejamento de
Sade, a discusso dessa proposta e escolha das categorias para anlise, a
discusso das categorias escolhidas e as concluses.
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NOTAS - INTRODUO
1. Apresentarei o que considero como vertentes do planejamento estratgico desade, elaboradas Ror autores e latino-americanos rio captulo I. Fao entouma breve anlise da proposta de "Medellin" elaborada por Barrenechea eTrujillo.
2. Mario TESTA, Estratgia, Coherencia y Poder en las Propuestas de Salud -Parte I, p. 24.
3. Metabolizao plgio de uma fala de Eleonor Conill.
4. Isso um agradecimento, no uma co-responsabilizao.
5. 0 processo de realizao do trabalho tambm no foi s esse. Teve maisvoltas. 0 captulo I com o breve histrico do planejamento de sade naAmrica Latina e a delimitao do objeto, por exemplo, foi escrito aps adiscusso das categorias. A elaborao de cada captulo teve idas e voltas.
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I. O PLANEJAMENTO DE SAUDE NA AMRICA LATINA
A noo mais simples de planejamento a de no improvisao. Uma
ao planejada uma ao no improvisada e nesse sentido fazer planos
coisa conhecida do homem desde que ele se descobriu com capacidade de
pensar antes de agir, estando relacionado a todo processo de trabalho, e
consequentemente a toda vida humana, pois o trabalho condio inerente
vida humana.
De forma mais abrangente enquanto clculo de futuro - agir tendo como
objetivo alcanar um fim determinado previamente - podemos considerar oplanejamento como decorrncia da calculabilidade e previsibilidade integrantes
da racionalidade concernente sociedade capitalista moderna1 2. Pensar o
futuro e calcular a ao presente e futura para atingir uma finalidade
genericamente a maximizao do rendimento em dinheiro o ethos da
sociedade moderna. Calculabilidade e previsibilidade integram o sistema de
disposies em relao ao mundo e ao tempo concernente a nova
racionalidade instituda com o desenvolvimento da sociedade industrial
passando a fazer parte da conduta razovel correspondente razo capitalista.
Calculabilidade e previsibilidade presentes no cotidiano de todos: no interior da
casa nos clculos de economia domstica e no pensar o futuro dos filhos, na
indstria, no comrcio, na especulao financeira.
Na sociedade tradicional - pr-capitalista - o que impera a previdncia:
pre-vidncia, antevidncia, um ver de antemo determinado pela tradio do
sempre foi assim e assim ser, como ciclos naturais que se repetem sempre damesma forma. Nessa sociedade, a riqueza vem da natureza, a terra produz o
valor. 0 trabalho vale em si e no pelo valor que produz: Um homem digno
um homem sempre ocupado. O resultado do trabalho campons, expressado
na colheita, depende da natureza e no do prprio trabalho, da ao pensada,
pois o futuro a Deus pertence. Pela tradio conserva-se o que , a mudana
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no cogitada. Previdncia na sociedade tradicional tem o significado de um
futuro imposto como o nico possvel.
Na sociedade moderna (capitalista a previso) resultado de um clculo
e pressupe um outro futuro possvel. O futuro no est predestinados j, no
pertence a Deus, mas resulta da ao de homens e mulheres sobre a natureza.
O valor - a riqueza - produto do trabalho e o esprito de clculo objetivando
maior produtividade e maiores ganhos so exigncias da prpria economia
capitalista.
Com a industrializao os processos de trabalho complexizam-se
fragmentam-se, especializam-se e sua organizao, racional impe-se. Cada
indstria precisa tornar-se uma mquina bem azeitada e cada vez mais os
processos vo sendo organizados. assim que as primeiras elaboraes
tericas mais sistematizadas sobre planejamento referem-se a organizao da
produo cientfica, quando em primrdios da administrao cientfica
quando em 1916 Henry Fayol ao editar o seu livro "Administrao industrial e
Geral coloca a PREVISAO como um dos elementos da administrao- Previso
entendida a enquanto projeo, clculo de futuro e a Programao objetiva
facilitar a utilizao de recursos e a escolha dos melhores meios a empregarpara atingir o objetivo desejado de mxima eficincia, mximo lucro.
enquanto funo administrativa que o planejamento tem o seu
desenvolvimento, e mtodos e tcnicas so elaborados. no interior da
empresa o seu locus. Inicialmente de maneira fechada e cada vez mais
levando em considerao as flutuaes do meio ambiente. Progressivamente
complexizam-se seus procedimentos chegando at a tcnicas de projeo de
diferentes cenrios. Quanto mais complexo o que se planeja - o objeto do
planejamento - maior o nmero de variveis a serem consideradas para o
clculo de futuro. impossvel conhecer e controlar todas as variveis e ainda
que conhecidas todas as variveis difcil estabelecer todas as relaes causais.
Impossvel esmiuar completamente o presente e antecipar o futuro e o
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I. O planejamento de sade na Amrica Latina 17
planejamento empresarial atual prope-se ento a diminuir esta variabilidade e
pensar probabilidades de atingir-se os resultados desejados.
Calculabilidade e previsibilidade so parte tambm da ao consciente
na construo da histria futura. E, se j a prpria revoluo sovitica resulta
de um processo onde o clculo e a previso esto presentes - a possibilidade
de um futuro diferente afirmada - aps a revoluo. o planejamento vem dar
racionalidade s transformaes revolucionrias almejadas para toda a
sociedade. E a primeira proposta de planejamento social surge na forma de um
plano setorial na Unio das Repblicas Socialistas Soviticas quando em 1918
elaborado o primeiro Plano Nacional de Eletrificao. Porm, somente aps
uma dcada de governo socialista elaborado o primeiro plano global: I Plano
Qinqenal (1928 a 1932). Na sociedade socialista com a instituio da
propriedade social dos meios de produo o plano vem pra substituir o
mercado como instrumento de alocao de recursos e distribuio de produtos
e estabelecer justas propores entre produo e consumo, oferta e demanda
e entre os vrios ramos da economia, com o propsito de satisfao das
necessidades de todos os membros dessas sociedades.33
Nas sociedades capitalistas baseadas nas livres leis de mercado noLaissez faire, o planejamento econmico e social s admitido ps crise
econmica mundial dos anos 30 - profunda e prolongada depresso. Por essa
poca John M. Keynes, economista ingls, prope uma maior interveno do
Estado na economia com o intuito de diminuir a importncia e freqncia das
crises. Para Keynes preciso dotar o Estado de instrumentos efetivos de
poltica econmica que lhe permitam regular a taxa de juros, aumentar o
consumo e expandir a inverso visando o pleno emprego. Keynes prope maior
dirigismo e racionalidade: prope planejamento estatal.4
Suas formulaes so assumidas na Europa principalmente aps o final
da segunda Guerra Mundial. Os primeiros planos so feitos em 1948 pelas
naes europias participantes do Programa de Recuperao Europia ou Plano
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Marshall. Nessa ocasio foram elaborados planos integrais para 4 anos com o
intuito de ordenar a produo e resolver a situao econmica e poltica nas
zonas devastadas. Resolver a situao poltica e econmica era tambm a
forma mais eficaz de contrapor-se ao avano do mundo socialista emergente e
presente no continente europeu aps a partilha da segunda guerra.5
Na Amrica Latina o planejamento introduzido a partir da dcada de
40 por influncia da ONU e de um pensamento prprio que entende ser
necessrio superar as diferenas econmicas com os pases capitalistas
centrais. o planejamento entendido enquanto instrumento para o
desenvolvimento, e desenvolvimento significa crescimento do produto
nacional, acelerao do ritmo deste crescimento. Desenvolvimento significa
industrializao, modernizao e a racionalidade do clculo econmico e do
planejamento acompanha-as.
principalmente atravs da Comisso Econmica para a Amrica Latina
- CEPAL - organismo internacional ligado a ONU, que difunde-se a noo do
planejamento enquanto necessidade para alcanar o desenvolvimento. Esta
noo baseada numa teoria que explica o subdesenvolvimento pela tendncia
deteriorao dos termos de troca entre os pases capitalistas centrais -economias industrializadas com produo diversificada e tecnicamente
homognea - e os pases perifricos - economias exportadoras de alimentos e
matrias-primas aos pases centrais com produo muito especializada e
tecnicamente heterognea.66 Na noo difundida considerava-se que atravs
do planejamento poder-se-ia romper com essa tendncia, promover a
industrializao, e atravs dela alcanar o desenvolvimento.
O planejamento , ento, introduzido na Amrica Latina enquanto
mtodo de seleo de alternativas que otimiza a relao entre objetivos e
instrumentos com o propsito de crescimento, pois dentro das teorias
desenvolvimentistas entende-se ser o crescimento a soluo para o
subdesenvolvimento. Somente a acelerao do crescimento pode diminuir a
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I. O planejamento de sade na Amrica Latina 19
distncia com os pases desenvolvidos: esta a compreenso que caracteriza o
planejamento da dcada de 50.7
As propostas de planejamento na Amrica Latina foram inicialmente
elaboradas para a economia, mas progressivamente o campo de atuao para
o planejamento ampliado sendo introduzido tambm nos setores sociais. Na
sade os primeiros programas surgem como decorrncia da carta de Punta del
Este. Em 1961 os EUA atravs da organizao dos Estados Americanos - OEA
promove uma reunio de Ministros da Interior dos pases das Amricas em
Punta del Este no Uruguai aonde lanado o Programa Aliana para o
Progresso. Este programa parte da poltica norte-americana do perodo
Kennedy que colocava nfase nos obstculos internos ao desenvolvimento.8
Considerava os problemas sociais e polticos como obstculos ao
desenvolvimento e entendia o subdesenvolvimento pelos seus ingentes
problemas sociais, como campo frtil para proliferao de idias aliengenas
socializantes. Com a Aliana para o Progresso, atravs do financiamento de
projetos sociais, pretendia-se contrapor expanso dessas idias, cujo exemplo
de Cuba no se queria deixar reproduzir. A Aliana para o Progresso surge
portanto como aliana para o desenvolvimento e contra o socialismo, com
clara inteno de controle social,
pois com essa inteno que na reunio de Punta del Este toma-se a
deciso de incorporar os setores sociais planificao do desenvolvimento.
Metas sociais so acordadas entre os pases participantes e o Banco
Internacional de Desenvolvimento e o Banco Mundial - Banco Internacional de
Reconstruo e Desenvolvimento sob a gide do FMI so encarregados de
financiar os projetos para o alcance dessas metas.
Para a rea da sade, a Carta estabelece objetivos, e, por vezes,
quantifica metas para o decnio prximo em relao a taxas de mortalidade
para certas idades e doenas previnveis, ao saneamento e alimentao,
organizao dos servios de sade e ao planejamento de sade.
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Comprometem-se os pases signatrios da Carta a: reduzir mortalidade de
menores de 5 anos de idade; erradicar a malria e a varola; intensificar o
controle da tuberculose e doenas entricas; melhorar a alimentao e a
nutrio aumentando a Ingesto de protenas; abastecer de gua potvel e
servios de esgoto pelo menos 70% da populao rural; melhorar a
organizao dos servios de sade e aumentar o seu rendimento procurando
que se atenda cada vez melhor um numero maior de enfermos com atividades
de preveno e cura; ampliar a formao de profissionais e auxiliares em
sade; criar nos ministrios de Sade unidades de planejamento integradas
aos organismos de planejamento do desenvolvimento econmico e social;
melhorar as estatsticas vitais e sanitrias; elaborar planos decenais nacionais
de sade; ter como meta geral o aumento de cinco anos na esperana de vida
ao nascer de cada pessoa.9
A Organizao Pan-Americana de Sade - OPAS fica encarregada de
avaliar os projetos elaborados objetivando o alcance dessas metas, e de ser a
fiadora destes frente s agncias financiadoras. Cabia ainda OPAS a funo
de assessorar os pases na elaborao de seus planos e de promover a
formulao de procedimentos Para o planejamento de sade, pois faltava um
mtodo para a elaborao dos planos.
At ento, na OPAS, trabalhava-se por projetos isolados e seus tcnicos
quase que desconheciam o planejamento no havendo um mtodo que
permitisse formular planos globais de sade e por isso Abraham Horwitz,
diretor da OPAS na poca, logo aps a reunio de Punta del Este dirige se a
Caracas para contatos com Jorge Ahumada diretor do Centro de Estudos do
Desenvolvimento da Universidade Central da Venezuela - CENDES-UCV.
Economista e professor de planejamento econmico, Jorge Ahumada, dispe-
se a participar da elaborao de um mtodo de planejamento de sade e
sugere que para tal seja tomado como base um trabalho realizado por Mario
Testa, quando aluno do mestrado de planejamento econmico no CENDES.
Ahumada estivera interessado em se o mtodo de planificao econmica
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podia ser aplicado a uma rea social e por isso solicitara a Mario Testa, que era
mdico, realizar um trabalho nesse sentido. O diretor da OPAS aceita a
sugesto sendo ento formada uma equipe de trabalho para a elaborao de
um mtodo de planejamento de sade. Dessa equipe Participaram o prprio
Ahumada e Maria Testa pelo CENDES, Alfredo Arreaza Guzmn, mdico
sanitarista venezuelano da Escuela de Salud Pblica, Mario Pizzi, mdica
chileno dedicado estatstica de sade e integrante do Ministrio de Sanidad y
Asistencia Social, e pela OPAS, Eduardo Saru tambm dedicado estatstica
mdica e Hernn Durn, sanitarista.10
Tomando como base o trabalho inicial de Testa e o modelo de
planejamento econmico esta equipe elaborou o mtodo de planejamento em
sade que ficou conhecido como mtodo CENDES/OPAS. Este mtodo foi
editado pela OPAS EM 1965 na sua publicao Cientfica nmero 111 sob o
ttulo Problemas Conceptuales y Metodolgicos de la Programacin de la
Salud.
Para a elaborao do mtodo CENDES/OPAS realizada uma
transposio rgida do planejamento econmico normativo, de linha cepalina,
para a sade, resultando num mtodo de planejamento de sade onde arealidade deve funcionar como norma e cujo objetivo otimizar os ganhos
econmicos obtidos com sade e/ou diminuir os custos da ateno sendo a
escolha de prioridades feita a partir relao custo/beneficio. Nesse mtodo a
formulao do plano iniciada com a realizao de um diagnstico: dos danos
e de seus condicionantes, dos recursos com sua forma de organizao
(instrumentao) e rendimento correspondente e, da alocao dos recursos
aos danos. A partir desse diagnstico feita uma seleo de prioridades e
proposta uma nova organizao de recursos relacionando-se ento os
instrumentos normalizados aos danos priorizados, com o intuito de alcanar
maior eficcia e eficincia nas aes de sade.
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Esta uma proposta tecnocrtica onde o planejador baseado em seus
conhecimentos tcnicos "neutros" faz o plano e estabelece prioridades. um
mtodo normativo e economicista onde a norma - o deve ser - tem como
fundamento principal a relao custo-benefcio.
No texto de apresentao do mtodo CENDES/OPAS inicialmente
prope-se a elaborao de um mtodo baseado nos anos de "capacidade
produtiva perdida". Idia que os autores dizem ser abandonada pelas
dificuldades de clculo e falta de dados disponveis. Prope-se pensar a
capacidade potencial produtiva - o nmero de anos/pessoa que dispe uma
comunidade, utilizvel em qualquer tipo de atividade - a partir da
determinao da esperana de vida para cada idade. A idia era verificar
quantos anos/meses de capacidade produtiva eram perdidos quando uma
pessoa ficava doente ou morria em tal ou qual idade. No esquecendo-se,
lgico, de verificar os recursos gastos pela sociedade na formao da pessoa.
Nessa concepo, se uma pessoa morreu, por exemplo, aos dezoito anos tem-
se uma perda maior do que com uma que morra aos 5 anos de idade, pois a
quantidade perdida de anos de capacidade produtiva potencial quase igual,
mas os recursos sociais investidos no. No jovem, a sociedade investiu por 18
anos recursos para a sua formao e ele mal comeou a produzir. Essa idia deanos de capacidade produtiva perdidos orienta o mtodo porm no so
apresentados procedimentos para esses clculos pela
dificuldade/impossibilidade que representam.
A norma geral para determinar a alocao de recursos nesse mtodo a
obteno de mxima produtividade, mxima eficincia: um mximo de produto
por unidade de recurso empregado e o problema na programao em sade
consiste ento em como melhor empregar os recursos ano por ano para
combater os distintos danos de forma mais eficiente.11 Para isso o
procedimento mais importante a determinao de quanto se gasta no total
no ataque a cada um dos danos e qual o custo por morte evitada e por caso
reparado. Anlise que, por ser complexa, deve ser feita apenas pra os danos
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principais selecionados a partir dos critrios de magnitude, transcendncia,
e vulnerabilidade aplicados s causas de morte.12
Para o clculo do custo unitrio do ataque a cada dano realiza-se
inicialmente um inventrio dos recursos disponveis e das aes realizadas. Os
recursos inventariados so relacionados aos seus usos atravs da sua
agrupao em instrumentos, tarefas e tcnicas. 13
Analisada a composio dos instrumentos e seu rendimento esses so
comparados com uma norma para a composio, grau de utilizao e
rendimento identificando-se possveis deficincias de instrumentalizao, baixo
rendimento etc.14 Desse modo so normalizados instrumentos e tarefas e so
estabelecidas metas de rendimento tendo-se um modelo normalizado da
organizao dos recursos.
Conhecendo-se a composio do instrumento em termos de recursos, o
custo da unidade dos recursos, e o tipo e nmero de tarefas e tcnicas
utilizadas pode-se calcular quanto custa o ataque a cada dano, qual o custo
por morte evitada.
Conclue-se a eleio de prioridades pela ordenao dos danos,
analisados segundo os custos, de forma crescente, sendo considerado
prioritrio o dano cujo custo para evitar uma morte o menor. Alocam-se
ento os recursos (instrumentos e tcnicas normalizados) ao dano prioritrio
at alcanar-se a mortalidade que permita essa tcnica mais eficiente,
passando-se subseqentemente para os danos de menor prioridade. Como
existem doenas no-redutveis cuja vulnerabilidade zero as exclue das
prioridades sugere-se separar-se recursos para sua ateno pois considera-se
esta demanda uma exigncia da comunidade.
Esses so, em sntese, os contedos principais do mtodo
CENDES/OPAS. Para a divulgao do mtodo, j antes de sua publicao, a
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OPAS promoveu em conjunto com o ILPES (Instituto Latino Americano de
Planificao Econmica e Social) a capacitao de funcionrios de rgos de
sade na utilizao do novo mtodo atravs da realizao de cursos em vrios
pases como Venezuela, Chile, Colmbia, Argentina e j a partir de 1963
sistemas de planejamento em sade comearam a funcionar. Em 1968 foi
criado Centro Pan-Americano de Planificao de Sade que passou a funcionar
junto ao ILPES em Santiago. Esse centro, que funcionou at 1975, intensificou
a capacitao de funcionrios de alto nvel e divulgou amplamente o mtodo.
A idia de que a formulao de planos nacionais era um pr-requisito
para obteno de financiamentos perdeu fora medida que a expectativa de
cooperao externa atravs da "Aliana para o Progresso" tambm se dilura15.
Mas a idia do planejamento vingou e muitos pases passaram ento a fazer
planos de sade utilizando em sua estrutura bsica, o mtodo CENDES/OPAS.
Cada pas apresentando, porm, peculiaridades nos seus sistemas de
planejamento e na aplicao do mtodo.
Quando os pases comearam a fazer planos, comearam tambm a
aparecer problemas que o mtodo no resolvia, o que levou incorporao de
algumas modificaes ao mtodo. Uma delas foi a incluso do diagnsticoinstitucional passando-se a considerar diferentes instituies prestadoras de
servios pois no mtodo inicial isto no ocorria. Propunham-se apenas divises
por regies e reas como se existisse um sistema nico de sade. Outra
incorporao foi a da Poltica como um fator interferente para a realizao
dos planos passando-se a considerar a de aumentar o apoio s propostas
governamentais.
Por vrios anos o mtodo foi desse modo aplicado ainda que sofrendo
crticas. No incio dos anos 70 h descontentamentos dos planejadores com o
mtodo pelas dificuldades para a sua aplicao, porque polticos e
administradores no seguiam os planos elaborados. No mtodo CENDES/OPAS
por ser um mtodo normativo - mesmo aps a incorporao da poltica
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enquanto um fator - considera-se que apenas um ator planeja com plenos
poderes supondo sempre o consenso ou quase-consenso. Desconsideram-se
conflitos e diferentes interesses. Desconsidera-se a existncia de interesses
contraditrios quanto a sade e sua ateno, como se houvesse uma deciso
poltica, a priori, favorvel ao emprego mais racional dos recursos visando
maior eficincia. Estando, ento, o tcnico-planejador encarregado de
implementar esta deciso. 0 planejador entendido como um tcnico a servio
do poltico. Acontece, porm, que essa deciso no existe a priori. A realidade
no se limita ao deve ser da norma. A situao de conflito e disputa pelo
poder e no de consenso e a poltica implantada o resultado de todo um
conjunto de disputas e acordos.
Os planos elaborados pelo mtodo CENDES/OPAS, cujo suposto objetivo
seria operacionalizar a deciso governamental de maior racionalidade numa
situao de consenso, no so executados pois no existe essa deciso e a
situao no de consenso. Ao no considerarem a variabilidade e
complexidade da realidade, os conflitos e os diferentes interesses, no do
conta dessa realidade tornando-se pouco teis para a interveno. Tornam-se,
apenas, livros-planos adormecidos no interior das gavetas. 0 mtodo cai,
ento, em descrdito e j em 1973 a prpria OPAS em sua PublicaoCientfica n. 272 assume o fracasso do mtodo.
Pode-se dizer que atualmente o CENDES/OPAS enquanto um mtodo de
programao como um todo no mais utilizado, porm, como resultado da
sua ampla divulgao alguns de seus componentes ainda permanecem e, se
no so aplicados, pelo menos ainda continuam sendo ensinados em variados
cursos. Um exemplo do que ficou a eleio de prioridades baseada nos
critrios de magnitude, transcendncia e vulnerabilidade, assumindo-se assim
ainda uma viso tecnocrtica da programao de sade. Tecnocrtico tem aqui
o sentido literal do termo: o poder da tcnica na definio de prioridades. Quer
dizer, a partir de um conhecimento tcnico e da avaliao que feita, tambm
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pelo tcnico, da importncia de um determinado grupo social so definidas
prioridades.
Por outro lado, tambm considero que alguns aspectos do mtodo
continuam atuais para a programao de sade pela sua adequao enquanto
procedimentos para uma anlise e clculo de recursos. o caso da definio
do instrumento e anlise de sua composio (a organizao dos heterogneos
recursos necessrios realizao de uma tarefa), da anlise do rendimento e
grau de utilizao dos instrumentos, da quantificao de tarefas realizadas, da
comparao desse observado com algum parmetro normativo.
O descrdito do mtodo CENDES/OPAS no advm apenas de problemas
internos ao mtodo - no est em questo apenas um mtodo de
planejamento de sade - o que est em discusso so as prprias teorias
desenvolvimentistas orientadoras das propostas de planejamento como
instrumento para a superao do subdesenvolvimento. Para o planejamento
econmico, j na metade dos anos 60, questionamentos comeam a ser feitos
pois verifica-se que um maior ritmo de desenvolvimento alcanado num pas
no fazia esse menos dependente nem levava soluo dos problemas
diagnosticados, como por exemplo, a concentrao de renda e o desemprego.Perguntas como: Qual a direo do desenvolvimento? Acelerao at onde?
so realizadas. Pensar na direo significava mudar os processos em curso.
Mudar os processos significa pensar no poltico, pensar uma estrutura de
relaes de poder, um sistema de decises, um padro de relaes com o
exterior, uma definio das relaes sociais de produo que caracteriza a
sociedade que se pretende construir.16 0 poltico precisa ento ser incorporado
ao planejamento no mais como um fator mas. como objeto do planejamento.
Comeam a as for formulaes de planejamento estratgico.
Carlos Matus poca diretor do Servio de Assessoria do Instituto
Latino-Americano de Planificao Econmica e Social - ILPES - partilha desses
questionamentos escrevendo em 1968 "Estratgia y Plan" texto publicado em
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1972. Neste trabalho Matus assume que a direcionalidade do desenvolvimento
deve ser a mudana de estruturas e, sugere um rumo para a abordagem dos
grandes problemas enfrentados pelo planejamento, propondo a formulao de
estratgias de desenvolvimento que apresentem a coerncia necessria entre
eficcia econmica e eficcia poltica.
Matus diferencia entre procedimentos normativos e procedimentos
estratgicos. Pelo procedimento normativo define-se um conjunto de aes
necessrias para cumprir um objetivo fixado a priori, impondo-se sobre a
realidade uma norma de conduta coerente com os objetivos. Nesse
procedimento a trajetria entre a situao inicial e o objetivo uma trajetria
eficaz que deve substituir o comportamento real. 0 procedimento estratgico
pressupe respostas do sistema s aes para sua alterao, e a norma o
ponto para o qual se quer encaminhar o funcionamento do sistema. A
trajetria flexvel sujeita a revises de acordo com as circunstncias, e a
busca da modificao do sistema baseia-se no conhecimento da realidade e
no numa imposio sobre a realidade.17
A norma, fundamento do procedimento normativo, diz Matus, uma
categoria do necessrio e a estratgia uma categoria do possvel em funodo necessrio.18 Na estratgia a conduo do processo no est dissociada de
sua orientao.19
A estratgia, para Matus, uma anlise e um propsito para o futuro
onde integra-se o econmico e o poltico social. O necessrio conflitivo , diz
ele, e a considerao do conflito, contradies, oposies, acordos - a anlise
de viabilidade poltica diferencia entre o procedimento estratgico e o
normativo. Prope a construo de um modelo que funcione como a realidade,
reagindo e dando respostas a simulaes/ensaios de fatos e perturbaes. Um
modelo que possa permitir a deduo de uma poltica vivel capaz de
aproximar-se dos objetivos perseguidos.20
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Essa discusso com alguma defasagem de tempo atinge tambm a rea
da sade. As crticas s teorias desenvolvimentistas e ao planejamento
econmico, decorrentes da situao poltico-econmica dos pases latino-
americanos, somadas problemas internos ao mtodo CENDES/OPAS produzem
descrdito desse mtodo.
Contribue tambm para esse descrdito as propostas de extenso de
cobertura dos servios de sade surgidas no incio dos anos 70. Na terceira
Reunio Especial de Ministros de Sade das Amricas, realizada em 1972,
prope-se a extenso dos servios de sade para populaes urbanas e rurais
at ento desassistidas.21 0 mtodo CENDES/OPAS no tem resposta a essa
proposta pois a anlise da capacidade instalada, sua expanso e tecnologia
no so suficientemente elaboradas para tal.
Em 1973 escrito pelo Centro Panamericano de Planficicin de la Salud
o documento Formulacin de Polticas de Salud. Neste documento as relaes
entre as foras sociais, os conflitos e a viabilidade do planejado so abordados.
A anlise de viabilidade parte integrante do processo de planejamento.
entendida enquanto possibilidade poltica do plano ser executado sendo, ento,
considerados possveis aliados e oponentes. Para a anlise de viabilidade soestudadas quais oposies surgiro ao plano e as formas de reagir frente a
estas e, quais acordos sero necessrios para alcanar a execuo do plano.
Neste documento estratgia tem o sentido da seleo de meios,
intensidade e oportunidades de ao e dissuaso, que exige a dialtica das
vontades enfrentadas22 0 planejamento situado no campo das decises
polticas. A anlise da poltica - dos processos que conduzem tomada e
execuo de decises - considerada fundamental para o planejamento.
Para Uribe o documento apresenta uma contradio bsica: o conflito
assumido no marco interpretativo do processo poltico desaparece no esquema
apresentado para a formulao de polticas " ... de maneira que este processo
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reduz-se a uma seqncia de etapas em que se afirma a vontade da
autoridade poltica (qualquer uma). 0 conflito s reaparece na anlise de
viabilidade (elaborao da estratgia) quando trata-se, no de modificar
substancialmente as proposies polticas j assumidas, mas de orden-las e
dos-las em conformidade com o estudo das reaes sociais...23
A principal contribuio do documento a proposio da anlise de
viabilidade, introduzindo a questo da estratgia no planejamento de sade.
Ainda que seja uma crtica ao planejamento de sade realizado at ento, o
documento apresenta uma viso funcionalista do que acontece na realidade.
Nesse documento prope-se certa normatividade da poltica, uma
operacionalizao tecnocrtica da problemtica da poltica. Sugere-se uma
srie de passos para a operacionalizao do poltico estabelecendo um deve
ser da poltica ao nvel das funes, onde o conflito advm da posse desigual
de bens pelos diferentes grupos sociais, no discutindo-se as determinaes
dessa posse desigual e vo sendo colocadas as contradies e interesses
antagnicos fundadores da sociedade de classes que o capitalismo.
O documento Formulacin de Polticas de Salud publicado em 1975
pelo Centro Panamericano de Planificacin de la Salud mas tem suadistribuio restringida/proibida pela OPAS que no assume o seu contedo
mais Poltico. Essa poca em que o avano significativo do movimento
popular em vrios pases da Amrica Latina foi sufocado por golpes militares
com a imposio de ditaduras, com o apoio norte americano, em todo o cone
sul.24
Com a derrota dos movimentos populares e a implantao das ditaduras
militares muitos dos profissionais e tericos do planejamento so afastados
dos nveis de interveno e vo reinserir-se em outros pases, geralmente em
instncias acadmicas, aonde dedicam-se a uma reflexo sobre as suas
atuaes e sobre o fracasso dos movimentos dos quais participaram.
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Carlos Matus, ex-ministro do governo socialista de Allende no Chile, faz
essa reflexo inicialmente nos crceres de Pinochet e depois em seu exlio na
Venezuela como assessor das Naes Unidas (UPES e PNUD) e do CENDES.
Mario Testa que ap6s trabalhar no CENDES, desenvolvendo o mtodo CENDES-
OPAS e na diviso de pesquisa do CPPS, deslocara seus interesses para os
movimentos populares que ocorriam na Argentina atuando no movimento
peronista, faz essa reflexo no exlio. A temtica de Testa e Matus a mesma.
Motivados pelo fracasso dos movimentos populares ambos discutem a questo
do poder.
Matus aprofunda a sua discusso iniciada no Estratgia y Plan fazendo
uma anlise globalizante do planejamento na economia. Inicialmente, enfatiza
a discusso sobre o poder e tenta desenvolver um rigoroso mtodo de
planejamento. Atualmente, porm, est mais preocupado com a
construo/elaborao de instrumentos de conduo que aumentem a
governabilidade de um sistema poltico.
Prope um mtodo de planejamento situacional onde o ator que planifica
est dentro da realidade e coexiste com outros atores que tambm planificam,
diferente do mtodo normativo onde o planejador um sujeito separado darealidade colocando-se fora dela e pretendendo control-la como se fosse seu
objeto. Situao o lugar aonde esto os atores e suas aes. a explicao
da realidade que realiza uma fora social em funo de sua ao e luta com
outras foras sociais.25
Nessa concepo a contradio e o conflito so assumidos e a
planificao situacional, diz Matus, necessariamente poltica pois um dos
recursos escassos que restringem o desenvolvimento de aes que promovam
mudanas so os recursos de poder. 26
Planejamento situacional um mtodo de planejamento constitudo por
quatro momentos no seqenciais, simultneos e em constante processo. Um
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momento explicativo equivalente ao diagnstico aonde so selecionados
problemas e discutidas suas causas ao nvel dos fenmenos (fenoestrutura) e
das estruturas sociais bsicas (genoestrutura). Um momento normativo: o
desenho do deve-ser. Um momento estratgico de anlise e construo da
viabilidade poltica: a discusso do poder. Um momento ttico- operacional de
tomada de deciso e de realizao da ao concreta . 27
Por refletir sua pr6pria experincia, o ator privilegiado, o governo.
Planejar, para Matus, conduzir o processo. tentar submeter vontade
humana o curso encadeado dos acontecimentos cotidianos fixando uma direo
e dando uma velocidade mudana que inevitavelmente acontece. mtodo
de conduo do governo para o alcance de seus objetivos.28 Planeja quem
governa: quem tem a capacidade de decidir e a responsabilidade de
conduzir.29
0 fracasso do planejamento tambm fracasso da conduo. Uma das
razes que Matus detecta para esse fracasso a falta de instrumentos,
procedimentos e tcnicas de conduo e por isso coloca a sua nfase,
desenvolvendo instrumentos para que quem tenha responsabilidade da
conduo consiga exerc-la. Preocupa-se ento em dotar o governo comelementos tcnicos que aumentem a governabilidade do sistema
(procedimentos para lidar com a incerteza, sala de situaes ...).
0 planejamento situacional uma evoluo do pensamento crtico dos
anos sessenta em relao ao planejamento econmico. Pode ser considerado
como uma vertente do planejamento estratgico de sade pois o pensamento
de Matus, pelo seu freqente trabalho como assessor da OPAS, tem sofrido
adaptaes para a sade. Essas, mesmo nem sempre bem sucedidas, tm
influenciado atuaes de planejamento em sade. 30
Mario Testa em sua reflexo e autocrtica, por sua participao na
poltica, pensa o problema do Poder como problema central do planejamento
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de sade. Sua reflexo e como participante de um movimento social desde
fora do governo. Seu ator privilegiado ento a classe/grupo fora
social/movimento, e no, como em Matus, o governo. Refere toda a sua
proposta luta pelo poder: a como produzir deslocamentos de poder em favor
das classes/grupos subordinados/dominados.
Ao considerar a determinao social do processo sade-enfermidade
identifica os problemas de sade como integrantes da totalidade social,
fazendo a ligao sade-totalidade social atravs das relaes de poder.
Prope um diagnstico da situao cuja sntese a identificao do setor
enquanto a estrutura do poder: relaes entre foras sociais com interesses
em sade e as tenses decorrentes do debate em sade. Sntese realizada a
partir da considerao do clculo administrativo tradicional (diagnstico
administrativo), das relaes de poder e suas determinaes na sociedade
(diagnstico estratgico) e das formas de conscincia social e sanitria (o
diagnstico ideolgico).
Baseado na sntese diagnstica, aonde foi identificada a estrutura de
poder setorial, formula propostas programtico-estratgicas que consideram a
anlise das repercusses das aes propostas sobre essa estrutura de poder.Na seqncia de programas sugerida, Testa considera a criao e a
manuteno da viabilidade poltica que garanta a realizao e consolidao das
mudanas propostas. Programas cujo contedo estratgico so suas formas
organizativas democrticas e participativas pois segundo Testa estas
estabelecem diferentes formas de relaes de poder dando direcionalidade s
suas proposies.
Mario Testa apresenta um quadro de anlise para pensar-se as questes
do planejamento. Suas proposies setoriais so acompanhadas de toda uma
discusso do Poder na sociedade, suas determinaes e possibilidades de
transformao. A preocupao de Testa com o setor subsidiria sua
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preocupao com o Poder como um todo, configurando sua produo um
quadro de anlise/um corpo de teoria a partir do qual pensar o planejamento.
Uma terceira linha do planejamento estratgico de sade desenvolve-se
a partir de uma reflexo promovida no interior dos prprios organismos
internacionais (OPS/OMS) dando uma certa continuidade a questes colocadas
no documento Formulacin de Polticas. Essa vertente apresentada
inicialmente nas Notas sobre las Implicaciones de la Meta SPT/2000, la
Estratgia de Atencin Primaria y los Objetivos Regionales Acordados para la
Planificacin y Administracin de los Sistemas de Servicios de Salud, um
documento borrador da OPAS de circulao restrita elaborado a partir de
debates em seminrios internacionais com especialistas em planejamento -
Medellin, Mrida e Rio de Janeiro - e de um curso realizado na Facultad
Nacional de Salud Pblica de Medellin. Em 1987, esse documento editado
como Salud para Todos en el Ao 2000: Implicaciones para Ia Planificacin y
Administracin de los Sistemas de Salud tendo como autores Emiro Trujillo
Uribe e Juan Jos Barrenechea. Trujillo, inicialmente aluno e depois consultor
do Centro Panamericano de Planificacin de La Salud at sua extino em
1975, foi diretor e professor de Planejamento na Escola de Sade Pblica em
Medellin na Colmbia at 1988 quando foi assassinado. Barrenechea foiparticipante de Cursos de Planejamento e Desenvolvimento Econmico na
CEPAL e ILPES e trabalhou em planejamento na OPAS de 1966 at 1980.
0 texto de Trujillo e Barrenechea mantm-se enquanto notas sobre
planejamento e administrao de sistemas de sade, no pretendendo-se, os
autores, a proposio de um mtodo de planejamento. Por suas origens, nas
discusses dos seminrios, o texto tem contribuies de vrios autores: Matus
e Testa, por exemplo, fazem parte de sua bibliografia de referncia. Mesmo
assim, apresenta uma especificidade em sua orientao. Sua racionalidade
basicamente sustenta proposies do planejamento estratgico empresarial e
por isso o considero uma terceira vertente.
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O planejamento estratgico e depois a administrao estratgica,
desenvolvidos para as grandes empresas desde de o final dos anos 60, diferem
do Planejamento normativo tradicional. Admitem a turbulncia do ambiente
externo e tratam de como as empresas devem orientar-se no processo de
adaptao ao ambiente. 0 comportamento estratgico considerado como um
Processo de interao com o ambiente acompanhado de um Processo de
promoo da modificao de aspectos dinmicos internos onde a turbulncia
externa e o poder configuram-se como influncias bsicas.31 Essas concepes
permeiam o texto de Barrenechea e Trujillo que estou considerando como uma
terceira vertente do Planejamento estratgico de sade.
O interesse desses autores o setor sade e sua preocupao principal
a instrumentalizao: como fornecer instrumentos, que auxiliem tcnicos
atuantes na linha de execuo, que rompam com o normativo e contribuam na
implementao das Estratgias SPT2000. Propem uma metodologia de
planejamento para ser utilizada por qualquer fora social que assuma a meta
SPT2000 e a estratgia de ateno primria.
Nesse enfoque o planejamento entendido como um Processo social
complexo que trata de influenciar as caractersticas de uma mudana social apartir da perspectiva de urna determinada fora social. Pressupe-se que,
para pensar a ao futura necessrio conhecer-se uma teoria poltica mas
esta teoria no explicitada nem discutida. Assim a existncia de interesses
conflitivos reconhecida, porm a determinao desses conflitos no
colocada. Diferenas entre grupos sociais quanto ao acesso aos servios e aos
riscos de agravo sade so constatados sem tambm explicitar-se a
determinao dessas desigualdades. Evidenciadas as diferenas, os
instrumentos elaborados para a interveno no setor sade direcionam-se aos
grupos sociais chamados de postergados objetivando diminuir essas
desigualdades.
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Barrenechea e Trujillo admitem: a complexidade do sistema de sade
como parte integrante do social pois o ambiente social turbulento e pouco
previsvel; a fragmentao - o desenvolvimento dos processos sociais de forma
brusca e no linear a dependncia do sistema de variveis fora de seu domnio,
fora de seu espao de controle; e a incerteza no tratar com o futuro. 32
Admitem a existncia de foras em oposio, a necessidade da negociao e
de procedimentos para tal, e colocam o plano como algo em permanente
elaborao e execuo quebrando em diversos nveis a base do planejamento
normativo tradicional.
Postulamos, assim, a existncia de trs vertentes de planejamento
estratgico em sade atualmente na Amrica Latina: o planejamento
situacional de Matus aplicado a sade, as propostas de Mario Testa e o enfoque
de Barrenechea e Trujillo.
Cabe, em primeiro lugar, um esclarecimento sobre o sentido aqui
empregado para ESTRATGIA pois esse um termo amplamente utilizado,
apresentando mltiplos significados. Estratgia arte de explorar condies
favorveis com o fim de alcanar objetivos especficos.33 meio para alcanar
um objetivo. proposio para futuro: o enunciado de diretrizes para o longoprazo (significado que aparece por exemplo em documentos das Naes
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