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PROJETO “A CÂMARA VAI ÀS ESCOLAS”: EDUCAÇÃO POLÍTICA ATRAVÉS DO INSTITUTO HISTÓRICO DE DUQUE
DE CAXIAS
NASCIMENTO, Ana Paula Cavalcante Lira do, LIMA, Jacqueline de Cassia Pinheiro de
Foz do Iguaçu PR: UNIOESTE, 8 a 11 de
dezembro de 2015, ISSN 2316-266X, n.4
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PROJETO “A CÂMARA VAI ÀS ESCOLAS”: EDUCAÇÃO POLÍTICA
ATRAVÉS DO INSTITUTO HISTÓRICO DE DUQUE DE CAXIAS
NASCIMENTO, Ana Paula Cavalcante Lira do
Profª. Ms. em Letras e Ciências Humanas(Unigranrio) /Profª. da rede pública federal do RJ (CBNB)
apcln@hotmail.com
LIMA,Jacqueline de Cassia Pinheiro
Profª. Drª. em História, Coord. do Programa de Pós Graduação em Humanidades, Culturas e Arte
(Unigranrio). Bolsista de Produtividade em Pesquisa UNIGRANRIO/FUNADESP
jpinheiro@unigranrio.edu.br
RESUMO
Neste trabalho pretendemos apresentar e analisar o projeto “A Câmara vai às escolas” desenvolvido pelo
Instituto Histórico de Duque de Caxias,através da Câmara de Deputados. De forma resumida são
apontados os principais objetivos do projeto ligados a preservação do patrimônio local e na formação
política de crianças e adolescentes da rede pública de ensino do município de Duque de Caxias.
Iniciamos com um breve histórico, buscando contextualizar as instituições indicadas no trabalho.
Através da fundamentação teórica buscou-se responder as questões: Como museu e escola trabalham
juntos? De que maneira esse trabalho ajuda ou não na formação política de futuros cidadãos mais
esclarecidos? Qual a relevância desse trabalho através dos olhos de quem o realiza para o público
pretendido?A pesquisa foi realizada através de observação, entrevista e análise de publicações da
Câmara Municipal de Duque de Caxias.
Palavras-chave: Educação. Política. Patrimônio.
ABSTRACT
In this paper we intended to present and analyse the project called “A Câmaravaiàsescolas” developeded
by the Historical Institute of Duque de Caxias, throughout the House of Representatives of Duque de
Caxias. In brief we pointed the project’s principal goals: the preservation of local heritage and the
training of children and teenagers from the public education network in politics. We had started with a
brief background to put these institutions into context. The theorical basis used tried to answer the
questions: How can museum and school work togheter? Does this project help to ensure the training in
politics of future citizens? To the social agents is this project relevant? Observation work, interviews
and publications from the House of Representatives of Duque de Caxias were analysed.
Key-words: Abstract. Article. Text
PROJETO “A CÂMARA VAI ÀS ESCOLAS”: EDUCAÇÃO POLÍTICA ATRAVÉS DO INSTITUTO HISTÓRICO DE DUQUE
DE CAXIAS
NASCIMENTO, Ana Paula Cavalcante Lira do, LIMA, Jacqueline de Cassia Pinheiro de
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INTRODUÇÃO
A proposta deste trabalho tem como objetivo principal apresentar o projeto “A
Câmara vai às escolas”, uma das atividades realizadas pelo Instituto Histórico de Duque de
Caxias. O IHDC é considerado um dos patrimônios culturais do referido município e faz parte
da Câmara Municipal. Entre as diversas atividades desenvolvidas nesse espaço criou-se em
abril de 2013 o projeto “A Câmara Municipal vai às escolas”. Esse projeto é o foco de nossa
pesquisa, pois tem por finalidade participar da formação política de crianças e adolescentes da
rede pública de ensino de Duque de Caxias.As questões que nortearam o trabalho foram: Como
museu e escola trabalham juntos? De que maneira esse trabalho ajuda, ou não, na formação
política de futuros cidadãos mais politizados? Qual a relevância desse trabalho através dos
olhos de quem o realiza para o público pretendido?
A fundamentação teórica baseia-se em autores que discutem as relações entre educação
e política, museu e escola, identidade e patrimônio. O artigo foi estruturado de maneira que na
primeira parte apresentamos um breve relato histórico do local de pesquisa. Em seguida,
trazemos as contribuições de Halbwachs (1990) e Le Goff (2003) sobre as relações entre
história, memória e memória coletiva. Partindo para as reflexões de Paulo Freire (2001; 2005)
sobre a intrínseca relação entre o campo político e a área educacional apresentadas nos livros
“Pedagogia do Oprimido” e “Educação e Política” e finalizando com os trabalhos de
Wagensberg (2005) e Costa (2013) que apontam as potencialidades de ações desenvolvidas em
espaços educacionais não formais, especialmente os museus. Dentre os potenciais destacados,
um diálogo mais efetivo entre a realidade de vida do público ao qual se destina e a consolidação
de processos que promovem um engajamento social em ações educativas, culturais e políticas.
Na última parte do artigo apresentamos alguns dados estatísticos do projeto, alguns
recortes das entrevistas realizadas com os agentes do projeto e uma breve análise do material
coletado durante as visitas de observação do local pesquisado.
1. A CÂMARA MUNICIPAL E O INSTITUTO HISTÓRICO DE DUQUE DE CAXIAS
Duque de Caxias é um dos municípios que formam a Baixada Fluminense do Estado do
Rio de Janeiro. Foi elevado a categoria de município em 1943. Tem 467,619 km2, dividido em
quatro distritos sendo, respectivamente: Duque de Caxias (centro), Campos Elíseos, Imbariê e
Xerém. De acordo com o levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
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(IBGE) de 2014, Duque de Caxias aparece como o 18º município mais populoso do Brasil, com
uma população de 878.402 habitantes.
A representação política do município acontece inicialmente com a eleição de Gastão
Reis, primeiro prefeito eleito por voto popular, em 1947. A instituição do Poder Legislativo no
município tem início na mesma época com a instalação da Câmara Municipal de Duque de
Caxias (CMDC)em um prédio na antiga Estrada Rio-Petrópolis (hoje Av. Gov. Leonel de
Moura Brizola). O prédio atual foi inaugurado em 1969, na Rua Paulo Lins. Atualmente, a
Câmara está em sua 17ª Legislatura (01/01/2013 a 31/12/2016), composta por 29 vereadores e
presidida pelo vereador Eduardo Moreira.
Em artigo publicado na Revista Pilares da História, Vinícius Marcelo Silva (2012)
apresenta um resumo da criação do Instituto Histórico de Duque de Caxias. De acordo com
Silva, em 1961, sob a presidência do vereador Elias Lazaroni, foi criada, no prédio da Câmara,
uma biblioteca pública chamada José do Patrocínio. Várias pessoas buscavam informações
sobre a história da cidade. Mas, de acordo com Dalva Lazaroni,“não havia nada (...), ninguém
sabia muito da história da Baixada Fluminense”. Essa demanda popular incentivou a criação do
que seria um embrião do atual Instituto Histórico. O acervo histórico tem início com doações
importantes que foram recebidas pela biblioteca e criou-se um departamento de História e
Geografia que pudesse atender a comunidade, tanto de estudantes quanto pesquisadores
interessados na história do município. Com o progressivo aumento das doações o espaço foi
ficando reduzido. Essa nova demanda fez com que o Instituto Histórico Vereador Thomé
Siqueira Barreto fosse criado em 31 de janeiro de 1973.
O IHDC é um espaço aberto à comunidade caxiense. Das muitas atividades
desenvolvidas pelo Instituto podemos elencar as relacionadas à história, educação e cultura. Em
relação ao primeiro temos a guarda de um acervo que reúne cerca de 7.000 fotografias, 4.000
documentos textuais, 1.000 livros/periódicos, 5.000 jornais e recortes, 300 plantas de
loteamento, 200 quadros, 450 posteres, 250 objetos de uso pessoal e vestuário, dentre outros
objetos.Quanto a cultura, o IHDC apoiaexposições de artistas locais, lançamento de livros,
cordéis e vídeos.
Na área educativa, além de apoio a pesquisadores interessados na historiografia da
Baixada Fluminense e, especialmente, de Duque de Caxias, a promoção de seminários,
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conferências e encontros; a publicação da Revista Pilares da História e o desenvolvimento do
projeto “A Câmara vai às escolas”.
1.1. “A Câmara vai às escolas”: o projeto
Diversas atividades e projetos foram surgindo ao longo dos anos de atuação do Instituto.
Entre eles, o projeto “A Câmara vai às escolas” que surgiu de uma parceria entre o Instituto e a
Secretaria de Educação de Duque de Caxias. O autor da iniciativa é o Sr. Eduardo Moreira
(atual presidente da CMDC) e a responsável pelo programa é a diretora do IHDC, Profª. Tania
Maria da Silva Amaro de Almeida. As atividades do projeto iniciaram-se no dia 25 de abril de
2013 e a unidade escolar escolhida para iniciar essa atividade foi a Escola Municipal Doutor
Ely Combat, localizada em Xerém. Na época, a região escolhida havia sofrido grandes estragos
causados por fenômenos naturais, o que motivou a escolhado Sr. Alexandre Cardoso, atual
prefeito do município. Além dos nomes já citados, a inauguração contou com a participação do
Ten. Cel. Marcello Silva da Costa (Secretário municipal de Defesa Civil), da Srª. Marluce
Gomes da Silva (Secretária Municipal de Educação) e da Srª. Ana Cristina Lopes (Conselheira
Tutelar do município).
A abertura desse trabalho foi divulgada no Jornal da Câmara, ano 1, número 1, de junho
do mesmo ano. De acordo com os dados divulgados no periódico, o projeto tem como objetivo
principal: facilitar o acesso dos estudantes de Duque de Caxias às informações sobre o Poder
Legislativo.
Figura 2 – Capa do Jornal da Câmara de Duque de Caxias
Fonte: CMDC (2015).
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Foram escolhidos alunos das turmas do 8º e 9º anos. De acordo com as informações
disponíveis no periódico da CMDC, o projeto consiste em uma aula organizada com a
apresentação de um vídeo que narra a história do município e a distribuição de uma cartilha
“feita especialmente para o projeto que explica, numa divertida história em quadrinhos o
funcionamento e a importância da Câmara”.
Duque de Caxias conta com uma rede escolar de 177 escolas municipais, 89 estaduais, 2
federais e 294 privadas. O objetivo do projeto é contemplar todas as escolas municipais.
Várias opiniões são apresentadas. Para o idealizador do projeto, o presidente da Câmara,
o município vai “formar cidadãos mais conscientes dos seus direitos e deveres” e, assim,
“mudar a forma como a população enxerga a Câmara, estreitando a relação entre os vereadores
e os cidadãos”, de forma que os moradores da região entendam “que tem na Câmara Municipal
um aliado para a construção de um mundo melhor”.
A secretária de Educação acredita que é uma complementação “das aulas regulares
sobre política”. A conselheira tutelar destacou que através que “as informações sobre o
Legislativo, além de alcançar as crianças e adolescentes, também chegarão às famílias dos
jovens, através do conhecimento transmitido por eles”.
Entrevistada pelo Jornal da Câmara, a aluna P., 13 anos, afirma que“entendendo melhor
a política eu tenho certeza de que nós, jovens, teremos o nosso espaço conquistado”.
Na apresentação da cartilha intitulada “Conheça nossa Câmara Municipal”, o presidente
da CMDC ao explicar a finalidade da publicação afirma que o objetivo é “colaborar para que as
futuras gerações possam participar ativamente nas decisões políticas da sociedade e isso
somente é possível por meio da informação e entendimento de que o exercício da cidadania tem
início na compreensão do papel de cada um de nós”.
Ainda, que “os direitos sociais são imprescindíveis para uma sociedade permeada por
justiça, mas os deveres de cada um de nós como cidadãos ativos e conscientes é o que faz a
diferença para a formação democrática”.
Ressalta o desejo de fomentar ações que permitam a “troca de ideias e da união para
uma sociedade mais justa”, para “que possamos aprender juntos e ensinar uns aos outros, pois
com informação, educação e cultura, poderemos realmente exercer a cidadania plena”.
1.2. A cartilha
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Editada pelo Instituto Histórico de Duque de Caxias a edição 2013 traz uma
apresentação do presidente da Câmara Municipal. Em seu conteúdo temos um início
explicativo do funcionamento dos Três Poderes (Legislativo, Executivo e Judiciário) e seus
respectivos endereços no município de Duque de Caxias. Aparecem os personagens: Edu, João
e Ana. O primeiro é um “especialista em Câmara” e decide mostrar aos outros amigos tudo o
que sabe em uma visita a “Casa de Leis”. Durante o passeio ele vai explicando o trabalho dos
vereadores através dos projetos de lei, a relação do Legislativo com o Executivo, como são
realizadas as sessões (incluindo os dias e horário), a Lei Orgânica do município e a relação que
deve ser estabelecida entre os vereadores e os cidadãos (atendimentos individualizados, de
associações e acesso às galerias da Câmara). Seguem-se alguns passatempos (labirinto, palavra
cruzada e colorir), um mapa do município e um resumo da história de Duque de Caxias.
Figura 1 – Capa da Cartilha “Conheça nossa Câmara Municipal”
Fonte: CMDC (2013).
Na contracapa encontra-se as fotos com os respectivos nomes do vereadores da 17ª
Legislatura. A cartilha, exceto capa e contracapa, tem 22 páginas em preto e branco para serem
coloridas pelas crianças e adolescentes.
2. UM POSSÍVEL DIÁLOGO ENTRE O PROJETO E ALGUMAS BASES TEÓRICAS
O início do trabalho realizado parte da análise da representação do Instituto Histórico de
Duque de Caxias para esse município da Baixada Fluminense. Partindo da história dessa região
percebeu-se que, dos núcleos de historiografia dos municípios da Baixada, o IHDC foi o que
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permaneceu mais “vivo” e ativo em detrimento de outros institutos históricos e geográficos que
foram perdendo os investimentos e parcerias necessários à manutenção dos mesmos.
Destacamos os casos de áreas adjacentes como: São João de Meriti e Nova Iguaçu.
Ao conceituar a memória, Le Goff(1990, p. 419) afirma que esse fenômeno ultrapassa o
indivíduo, tendo um caráter social, independe da “presença ou ausência” da escrita e que, além
disso, é “objeto da atenção do Estado que, para conservar os traços de qualquer acontecimento
do passado, produz diversos tipos de documento/monumento, faz escrever a história e acumular
objetos”.
Embora surgido de uma demanda da sociedade civil, o IHDC é objeto de atenção da
esfera política. Tem sob a sua guarda os traços do passado enquanto busca um diálogo com o
presente, na intenção sempre futura de construção do cidadão que valorize o local onde reside.
Para Halbswachs (1990, p. 55) não existe memória pura e simples, e sim memórias que
são construídas no coletivo, no plural, pois dependem da relação do sujeito com os outros, num
processo que parte do exterior eque vaiinternalizando e formando o ser social.Tanto Le Goff
quanto Halbswachs nos apontam que, na balança da nossa construção como sujeitos, pesa
muito mais o nosso lado cultural/social do que o biológico.
É difícil encontrar lembranças que nos levem a momentos em que nossas
sensações eram apenas reflexos dos objetos exteriores, em que não
misturássemos nenhuma das imagens, nenhum dos pensamentos que nos
ligavam a outras pessoas e aos grupos que nos rodeavam. (HALBSWACHS,
idem, p. 43)
A preservação da memória e a história é o objetivo principal do Instituto Histórico de
Duque de Caxias. O trabalho desenvolvido visa não apenas atingir indivíduos, mas contribuir
para que a sociedade civil aproprie-se dessa memória coletiva e construa uma identidade mais
afirmativa.
Como apontado anteriormente, há uma variedades de atividades desenvolvidas pelo
IHDC. Mas, o trabalho realizado em parceria com as escolas do município nos levam a refletir
sobre a relação entre esses dois espaços educativos. Se entendemos aEducação da perspectiva
da relação entre ensinar e aprender, podemos afirmar que esta pode ser realizada em múltiplos
espaços sociais.
Em seu livro “Educação e Política”, Freire (2001, p. 16) afirma que a prática educativa
não pode ser prisioneira de procedimentos escolarizantes burocráticos. Ao contrário, deve
possibilitar tanto o ensino dos conteúdos quanto a tomada de consciência do sujeito que
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assume-se como um sujeito de busca. O senso comum, da pura experiência, deve ser cada vez
mais transformado em um saber mais crítico e menos ingênuo. Portanto, a prática educativa
também é uma prática política.
Wagensberg (2005, p. 2), afirma que o ser humano busca a compreensão da realidade
através da ciência. E o que entende-se por realidade? Construção ou relação entre objetos
(materiais que formam o espaço) e os fenômenos (mudanças vivenciadas pelos objetos). Porém,
essa relação é “disciplinarizada” pelo universo educativo formal (escolas e universidades). O
museu seria uma realidade concentrada uma vez que possui em abundância o material
primordial para captar essa realidade.
Para Costa (2007, p. 2) a função educativa também não pode ser aprisionada nos muros
da escola. Essa função é desenvolvida por “múltiplos e heterogêneos canais, dentre os quais
encontra-se o museu, espaço privilegiado dentro do campo da educação não formal”. Para ela,
os museus contribuem na aprendizagem e ampliação do nível cultural social. Eles podem inserir
tanto os sujeitos engajados na cultura escolar como aqueles que não fazem/ou nunca fizeram
parte da escola.
Wagensberg afirma que não há restrições em um espaço como um museu de ciência. É
permitido lecionar, informar, instruir, entreter. No entanto, para ele, nada disso é prioridade. A
função principal ou ideal de um museu é promover estímulo, provocar uma diferença
comportamental no sujeito que seria um antes e outro depois da visita. Um sujeito que saia
“com mais questionamentos do que quando entrou”.
“O museu é uma ferramenta para a mudança, para a mudança individual e,
portanto, para a mudança social também. O museu é insubstituível no estágio
mais importante do processo cognitivo: o início. Saindo da indiferença para a
vontade de aprender. E não há nada como a realidade”. (WAGENSBERG,
2005, p. 3)
A mudança individual gerada poderia produzir uma mudança social, já que o indivíduo
está inserido em uma sociedade. Wagensberg fala especificamente do museu de ciência, porém
esse objetivo não seria de todos os locais que se propõem a serem espaços educativos não
formais?
Para Freire (2001, p. 39), a educação é um fenômeno social e coletivo, pois “ninguém
educa ninguém, nem tampouco ninguém se educa a si mesmo: os homens se educam em
comunhão” sob a mediação do mundo e dos objetos cognoscíveis. Esses objetos não devem ser
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“possuídos” pelo educador e depositados em educandos passivos que apenas arquivam as
narrações ou depósitos feitos pelo educador. Em um processo educativo conduzido dessa forma
não há produção verdadeira de cultura e nem de conhecimento.
Quanto à proposta de formação da consciência política dos futuros cidadãos que
compreendam o papel do poder público e tenham uma participação mais efetiva na sociedade
civil podemos concordar com Freire (2001,p. 12) quando afirma que educar é um movimento
permanente e um ato político. É influenciado por exigências ideológicas, políticas e
econômicas. Porém,
Não basta dizer que a educação é um ato político assim como não basta dizer
que o ato político é também educativo. É preciso assumir realmente a
politicidade da educação. (...) Não posso reconhecer os limites da prática
educativo-política em que me envolvo se não sei, se não estou claro em face
de a favor de quem pratico. (FREIRE, 2001, p. 25)
O caráter político da educação nesse contexto da Baixada Fluminense é fundamental na
formação de um cidadão mais crítico e consciente. Essa região do Estado do Rio de Janeiro
abriga uma numerosa população, em sua maioria carente de tudo, mas, principalmente, da
apropriação do capital cultural.
Da mesma forma que a educação sofre as influências apontadas anteriormente, também
podemos reconhecer que, de acordo com Freire (idem, p. 28), apesar da prática educativa e
política ter seus limites, “ela tem uma certa eficácia”. Não pode ser compreendida como “sendo
a alavanca da transformação profunda da sociedade”, mas ela “pode algo no sentido desta
transformação”.
Costa acredita em um trabalho conjunto entre espaços educativos formais e não formais.
Por isso, apóia que sejam construídas fortes parcerias entre museus e escolas, a fim de
popularizar o trabalho desses espaços não formais.
“Afinal, a escola é uma instituição que, por sua grande capilaridade na
sociedade, tem maior capacidade de promover um processo educativo de
forma sistematizada e contínua. Portanto, a cooperação entre o museu e a
escola amplia os potenciais destas instituições exercerem com mais eficiência
as suas funções sociais”.(COSTA,2007, p. 7)
As abordagens teóricas utilizadas até aqui refletem que o projeto desenvolvido pelo
Instituto Histórico de Duque de Caxias propõe um diálogo interdisciplinar entre as áreas de
história, educação, política e ciência. Os autores utilizados, em suas diversas áreas contribuem
para um projeto de formação crítica e de sujeitos atuantes no cotidiano das relações sociais.
Entendendo, a partir da ótica de Freire (2001, p. 25), que “se faz necessário, neste exercício,
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relembrar que cidadão significa indivíduo no gozo dos direitos civis e políticos de um Estado”.
Porém, mais do que formar apenas o cidadão, urge contribuir no processo permanente de
construção da cidadania que “tem a ver com a condição de cidadão, quer dizer, com o uso dos
direitos e deveres de cidadão”.
3. O PROCESSO ATRAVÉS DE QUEM O REALIZA
A pesquisa realizada no Instituto Histórico deu-se a partir de três visitas para
reconhecimento do local, acesso ao acervo e realização de entrevistas. Foram coletados dados
estatísticos do projeto. A tabela abaixo demonstra o quantitativo de alunos atendidos
anualmente.
Tabela 1 – Número de alunos atendidos pelo projeto – 2013/2015
Nº de alunos atendidos em Escolas visitadas pelo
IHDC
Nº de alunos atendidos em Escolas que visitaram o IHDC
Soma dos alunos
atendidos
2013 1400 510 1910 2014 1087 471 1558 2015 2390 375 2765 Total 4877 1356 6233
Fonte: IHDC (2015).
Os números apresentados tem referência anual, porém, o projeto acontece anualmente
entre os meses de abril a novembro. Percebe-se um aumento significativo nos atendimentos
desse ano.
Além disso, foram realizadas entrevistas com 06 funcionários do Instituto.Todas as
entrevistas seriam individuais. No entanto, para não prejudicar o andamento dos trabalhos
diários no local, tivemos que refazer o plano inicial e, ao final, conseguimos realizar duas
entrevistas individuais e duas entrevistas em duplas. O intuito na coleta de informações nas
entrevistas é, além da produção de fontes orais, valorizar a escuta de quem põe em prática o
projeto e o funcionamento cotidiano desse espaço educativo não formal. Quem são eles? O que
pensam desse trabalho?
A maioria dos entrevistados tem formação em História e julgam essencial o trabalho de
formação política junto aos alunos e professores da rede municipal. Em alguns trechos
percebe-se que a valorização da comunidade local passa por sua própria história.
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“Quando eu passei a descobrir a história da Baixada Fluminense, a história de
Caxias, eu consegui me reconhecer, reconhecer a minha identidade e gostar
ainda mais de Caxias. Quando eu vou em algum lugar eu sempre lembro de
algo que li. E eu acho esse trabalho importante para as pessoas que moram
aqui para conhecer o lugar que você vive. Você precisa admirar o lugar que
você vive.É uma relação de identidade do povo com o seu local”. (Taís –
funcionária do IHDC)
Para outros a ênfase está no conhecimento, no entendimento do processo histórico, mas
também do funcionamento da esfera pública. Os funcionários tem grande facilidade na
orientação da visita e apresentam o esquema do trabalho com as escolas.
“A gente recebe as crianças e apresenta o espaço. Fala sobre o Instituto: a
importância dele e para que serve. Também explica sobre o funcionamento da
Câmara e trabalho dos vereadores”. (Diego – funcionário do IHDC)
E para outros, a construção da identidade e a formação cultural são pontos essenciais do
trabalho. “A gente tem esse projeto “A Câmara vai às escolas”. Lá, nós apresentamos
um pouquinho da história local e regional. Falamos também do Legislativo
tentando aproximar esse espaço para despertar a consciência políticas das
crianças desde cedo. A gente vê um prédio público como algo muito distante
do povo, como se esse prédio não fosse lugar para mim. Onde eu não posso
entrar. Não sabem como se portar, nem sabem que é nosso. E que a gente não
só pode, como deve entrar. Ainda tem muita gente que não conhece o
Instituto. Acho que essa distância é cultural e não apenas de divulgação.Eu
acho muito bacana o projeto porque o que se leva para a escola é uma ideia
muito errada da História, como a dos grandes feitos (...). Todo esse trabalho
que a gente faz é para desconstruir essa ideia de que a história é dos grandes
homens. Ao contrário, é a nossa história que é importante. E, a medida que a
gente não preserva essa história a nossa identidade fica comprometida”.
(Elisangela – funcionária do IHDC)
Infelizmente não houve tempo para a escuta dos alunos, além do depoimento da aluna
Paloma apresentado no Jornal da Câmara.Mas, percebe-se a ênfase da importância do projeto
para os agentes. Soa uma convicção, não confundida com um simples otimismo, de que esse
trabalho de base política pode, futuramente, auxiliar no processo de formação de uma sociedade
civil mais esclarecida. E que, não há como formar cidadãos politicamente atuantes excluindo-se
a memória coletiva e a construção da identidade local.
CONSIDERAÇÔES FINAIS
As conclusões sobre a pesquisa apontam que há um forte movimento de saída de
espaços de educação não formais para o público escolar. Essa relação de parceria tem agradado
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as instituições escolares e atingido um público que se encontra, de muitas maneiras, ainda
excluído desses espaços.
Nas representações de funcionários e estudantes, a formação política é imprescindível
na formação do cidadão, ainda mais quando agregada à própria história do município de
residência, num processo de valorização e de aumento da autoestima.
O IHDC, nesse sentido, cumpre o que Wagensberg (2005) chama de “exigência
democrática”, um centro no qual os sujeitos podem desenvolver uma identificação coletiva
através da história que é comum a todos.
Como também assinalado por ele, as pesquisas com o público em museus ainda busca
uma forma ideal de saber se o estímulo encontrado nesse espaço gerou alguma mudança. Mas,
ainda não há como comparar o antes e o depois da visita. Fica ainda em aberto essa questão em
relação ao projeto.
Não pretendemos afirmar que o projeto desenvolvido pelo Instituto Histórico de Duque
de Caxias é desprovido de intencionalidade, visto a natureza política do projeto e o vínculo
deste a um órgão governamental. Sabemos que não existe neutralidade na prática educativa,
seja no ambiente formal ou não formal. Também não ousamos afirmar que ele propõe-se a
refletir uma prática pedagógica progressista defendida por Paulo Freire. Mas, podemos atestar
que é um caminho desafiante. Para Freire (2005, p. 40), é a partir daproblematização, que os
educandos “como seres no mundo e com o mundo, tanto mais se sentirão desafiados” e
“obrigados a responder ao desafio”. A problematização conduz a uma resposta, a uma ação que
pode resultar futuramente num processo de superação da alienação e gerando, em contrapartida
a esta, atitudes de engajamento, de compromisso e de empoderamento.
REFERÊNCIAS
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