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PRODUÇÃO ARTESANAL DO VINHO DE AÇAÍ (Euterpe oleracea)

RESUMO

Cristineide Maria Costa Ferro'Ozelito Possidônio de Amarante Junior"

Arão Pereira da Costa Filho •••

Este trabalho se propõe a mostrar a viabilidade da produção artesanalde vinho de açaí. Desde o preparo do pé-de-cuba até o engarrafamento,todas as operações foram realizadas com total higiene e foi obtido umproduto de coloração característica de vinhos tintos, com aroma easpectos gerais excelentes.

SUMMARY

Palavras-chave: açaí, vinho, fermentação, etanol, produção artesanal.

This work proposes to show the viability of the handmade productionof the açai wine. From the prepare of the foot-of-vat to the jam, all theoperations were accomplished with plenty of hygiene and it wasobtained a product of characteristic coloration of the dyed ones andof excellent aroma and general aspect.

key-words: açai, wine, fennentation, ethyl a1cohol, homemadeproduction.

1 INTRODUÇÃO

Não se sabe ao certo quando eonde o primeiro vinho foi obtido. Hárelatos muito antigos de seu uso, comopor exemplo o citado no capítulo 9 dolivro de Gêneses da Bíblia cristã, ondeNoé, após ter desembarcado os animaisda arca, plantou um vinhedo do qual fezvinho, bebendo-o e embriagando-se.Esta bebida também está relacionadaà mitologia grega (HISTÓRIA ...1999). Este preparado fermentado tem

sido estudado exaustivamente, tendosuas propriedades terapêuticas confir-madas por vários estudos, com aplica-ções em vários tratamentos. A partirdo século XX, a elaboração dos vinhostomou novos rumos com o desenvolvi-mento tecnológico da vinicultura e daenologia, o cruzamento genético de di-ferentes cepas de uvas e o desenvolvi-mento de cepas de levedurasgeneticamente selecionadas, além dacolheita mecanizada, a fermentação afrio na elaboração dos vinhos brancos,

* Estudante de Mestrado em Alimentos pela Universidade Federal do Ceará.** Estudante de Mestrado em Química da Universidade Federal do Maranhão.*** Professor do Departamento de Tecnologia Química da Universidade Federal do Maranhão.

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entre outros (AQUARONE, 1983,p.153). O vinho é definido como umabebida fermentada, de constituição com-plexa, formada de água, álcool, sais di-versos, predominando tartaratos etanatos, alguns ácidos, e matéria corantedenominada enocianina (nos vinhos tin-tos). Sua coloração pode variar do tin-to violáceo ao branco, passando portodas as nuanças intermediárias(AQUARONE, 1983, p.159). A legis-lação vigente permite o uso do nomevinho para os produtos obtidos pela fer-mentação alcóolica de frutas frescas,maduras, obedecendo os mesmos pre-ceitos para a vinificação (BRASIL.Ministério da Agricultura, 1994).

O açaí (Euterpe oleracea), co-nhecido no Maranhão como Juçara, éuma fruta referenciada por suas pro-priedades nutritivas e que, recentemen-te, foi descoberta pela mídia,tomando-se muito apreciada entre osadeptos da cultura da saúde efreqüentadores de academias. Sua co-lheita é feita durante o ano todo. Nomês de outubro, época da máxima co-lheita, na cidade de São Luís se come-mora a festa da Juçara. Nas regiõesamazônicas, principalmente no Estadodo Pará, o fruto do açaizeiro é umaimportante alimentação das populaçõeslocais (SCHNEIDER, 1985, p. 552).

Chama-se mosto ao suco de fru-tos que serão destinados à fermenta-ção. Mostos pobres em sais minerais eem substâncias protéicas necessitam deuma adição de sais minerais e compos-tos orgânicos para se tomarem favorá-

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veis ao desenvolvimento racional dosmicrorganismos. Os sais mais usadossão: fosfato de amônio, carbonato dearnônio, tartarato de amônio, tartaratode potássio, ácido tartárico, ácido cítri-co, entre outros (LIMA, 1975, p. 112).

A acidez dos vinhos é um fatorimportante não só para o bom paladardo vinho como também para sua con-servação. Daí a correção que se faznecessária quando o mosto com quetrabalhamos tem acidez insuficiente ouentão excessiva (LIMA, 1975, p. 135).

A sulfitagem do mosto é uma prá-tica bastante importante e necessáriana vinificação. No início, essa práticaera usada contra a oxidação. As van-tagens de utilização de anidridosulfuroso, ou S02' são várias. O S02constitui uma proteção entre o oxigê-nio do ar e o mosto ou vinho. Sendooxidável, recebe oxigênio e protege omosto da oxidação. O efeito seletivodo S02 é duplo. Bem dosado, ocasionaa seleção entre as leveduras, favore-cendo o desenvolvimento das elípticase inibindo as espécies poucoalcoogênicas, apiculadas e Torulopsis.Ele provoca também a seleção levedu-ra-bactéria, sendo estas muito mais sen-síveis que aquelas (LIMA, 1975, p.146). A sulfitagem apresenta algumasinconveniências quando empregada emdoses elevadas. O primeiro inconveni-ente é retardar ou impedir a fermenta-ção maloláctica. Outro inconvenienteé tido como precursor de gosto desulfeto de hidrogênio, de mercaptanas,nos vinhos novos, que permanecem

muito tempo sobre suas borras (LIMA,1975, p. 146). O S02 deve ser empre-gado à medida que se vai enchendo acuba, e não em várias vezes durante afermentação. Essa observação é mui-to importante para uma boa seleção deleveduras. A legislação brasileira per-mite a dose máxima de 350 mg/L deS02 total em vinhos (BRASIL. Minis-tério da Agricultura, 1994).

Este trabalho objetivou produzirvinho utilizando o fruto do açaizeirocomo substituto da uva, além de verifi-car sua aceitação ao paladar, frente aoutras bebidas provenientes da fermen-tação.

2 PARTE EXPERIMENTAL

2.1 Materiais e reagentesutilizados

Utilizaram-se como equipamentosalguns fermentadores (garrafões de 5,10 e 20 litros), além de materiais como:mangueiras e seringas descartáveisesterilizadas, luvas esterilizadas, algo-dão hidrófilo, garrafas esterilizadas;sendo necessário, também, instrumen-tos como: sacarímetro de Brix; funil devidro e alcoômetro de Gay-Lussac.Foram empregadas as seguintes subs-tâncias: açúcar cristalizado;metabissulfito de potássio; fosfato deamônio; fermentos biológicos.

2.2 Obtenção da matéria-prima

O concentrado da polpa de açaí foiobtido nas feiras de São Luís, oriundade frutos maduros e com manipulaçõesrelativamente higiênicas.

2.3 Preparo do mosto

Para o preparo do mosto, utiliza-ram-se 5 L de concentrado de açaí di-luídos para um volume total de 10 Lcom água mineral. Desinfetou-se ofermentador e acondicionou-se no mes-mo a mistura diluída.

2.4 Determinação daconcentração de açúcar

Foi empregado o sacarímetro deBrix, que forneceu diretamente a quan-tidade percentual de açúcar do mosto,visto que possui uso fácil, sendo encon-trado facilmente no comércio, em ca-sas especializadas. De posse dapercentagem de açúcar, sabendo-seque uma concentração de 17,5 g/L deaçúcar fornecem 1% de álcool, deter-mina-se a quantidade de açúcar aacrescentar. Realizou-se, ainda, a cor-reção do açúcar, tendo sido medida aconcentração inicial, e adicionando-se2,56Kg de açúcar ao volume total damistura.

2.5 Determinação de acidez

Realizou-se uma titulação, à par-te, para determinar-se a necessidadede correção da acidez do mosto. De-terminou-se a necessidade de adiçãode 5,12g de ácido cítrico por litro demosto.

2.6 Sulfitagem

Adicionaram-se 3g de K2Sps namistura para seleção das leveduras.

2.7 Preparo do pé-de-cuba

Antes de provocar a fermentação

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de todo o mosto, preparou-se, com 24h de antecedência. o pé-de-cuba, o qualfoi feito pela retirada de 1 L de mostojá corrigido e sulfitado. Ao pé-de-cubafoi adicionada uma quantidade de fer-mento equivalente a 2 g/L do mosto afermentar. É importante ressaltar quea levedura utilizada deve ser totalmen-te dissolvida no pé-de-cuba para auxili-ar no processo de multiplicação, ouseja, seu crescimento acelerado. Apóseste período, observou-se que a fermen-tação era relativamente vigorosa. Apartir desse ponto, onde o pé-de-cubajá encontrava-se em plena atividade,inoculou-se o mosto com o mesmo.

2.8 Inoculação

Inoculou-se o pé-de-cuba nofermentador contendo o restante domosto. O pH foi mantido entre 3,0 e4,0; a temperatura não excedeu 29° C.

2.9 Fermentação

Depois de inoculado, o mosto so-freu fermentação progressiva e, ao ter-ceiro dia, estava em atividade máxima,o que foi evidenciado pela grande pro-dução de CO2 e aroma característicode fermentação alcoólica. À medidaque a fermentação se processava, me-dia-se o teor de açúcar do mosto como sacarímetro de BRIX e observava-se o seu decaimento e crescente au-mento de álcool, concomitantemente.No 2° dia de fermentação, foi adicio-nado 0,2 g/L de fosfato de amônio,(NH4)3P04' como nutriente, ao mosto.Durante a fermentação, o pH e a tem-peratura não sofreram alteração.

2.10 Trasfegas e filtração

Trasfegas são transferências delíquidos de um recipiente para outro,separando-se ao mesmo tempo, o mostoclaro, das borras formadas e que sedepositam ao fundo do garrafão. A pri-meira trasfega foi realizada após a fasetumultuosa da fermentação. Utilizaram-se para tal finalidade, mangueiras este-rilizadas. A segunda trasfega foirealizada após a fase complementar doprocesso fermentativo, a qual ocorreuao final de cerca de 20 dias. Nesse tem-po, o vinho apresentou-se já caracte-rístico, de bom aroma e uma coloraçãoexuberante. A terceira trasfega foi fei-ta cerca de 30 dias após o início da fer-mentação e, a partir daí, optou-se pornão fazer a quarta trasfega, uma vezque já se dispunha de um vinho límpidoe praticamente acabado.

O produto foi então filtrado váriasvezes em algodão hidrófilo e engarra-fado em recipientes apropriados edesinfetados, arrolhados com cortiça emantidos em posição horizontal, em lo-cal adequado, ao abrigo do calor e daluz, a fim de envelhecer, isto é, sofreras transformações químicas espontâ-neas responsáveis pelo "buquê" final.

3 RESULTADOS EDISCUSSÃO

3.1 Composição média da polpa

A composição média da polpa deaçaí encontrada é apresentada na Ta-bela 1.

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TABELA 1 - Composição média conside-rando-se 100g de polpa de açaí.

Calorias 247

Proteínas 3,80 g

Fibra 16,90 g

Cálcio 118,00 mg

Fósforo 58,00 rng

Ferro 11,80 mg

VitaminaBj 0,36 rng

Vitamina B, 0,01 rng

Niacina 0,40 rng

Vitamina C 9,00 rng

3.2 Presença de borra durante afermentação

O grande problema para o traba-lho com o açaí, na vinificação, é seualto teor de borras no mosto, o que cau-sa pequenos problemas ao processo detrasfegas e filtração; daí a necessidadede várias repetições dessa operação.

3.3 Característicasorganolépticas

O vinho obtido apresentou-se combom aspecto e paladar característicono que diz respeito ao fruto. O saborfinal, evidentemente, mostrou-se dife-rente dos tradicionais vinhos tintos deuvas, mas não tão acentuado ao pala-dar quanto o sabor original do fruto.Apresentou aroma amadeirado, cor bri-lhante e violácea, exuberante, semelhan-te àquela apresentada por vários vinhostintos de uvas.

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3.4 Teor alcoólico, teor de açúcare pH

o grau alcoólico do vinho obtidoacusou lOoGL, que está dentro dos pa-drões de identidade e qualidade paravinho de frutas. O teor de açúcar finalestabeleceu-se em 0,16% de açúcar,estando dentro dos padrões estabeleci-dos para estes tipos de vinhos (BRA-SIL. Ministério da Agricultura, 1994).O pH fmal do vinho produzido ficou em3,5, um bom indicador contra infecçõesdo vinho.

3.5 Rendimento

Foi obtido rendimento de 65%. Istosignifica que para 10 L de mosto, pro-venientes da dissolução de 5 L de pol-pa, foram obtidos 6,5 L de vinho. Estarecuperação, se compa~ada ao volumeinicial de polpa, apresenta-se como em130%, o que é um rendimento conside-ravelmente elevado.

4 CONCLUSÃO

Pode-se concluir que a produçãodo vinho de açaí é viável, podendo serfabricado em grande escala, uma vezcaracterizada a riqueza de composiçãodo fruto,os valores culturais associa-dos a ele no estado do Maranhão, obaixo custo e as satisfatórias proprie-dades organolépticas. O processo érelativamente simples e de fácil opera-cionalização, desde que seja conduzidocom assídua higiene. Quando bem pre-parado o mosto, e após ser inoculadocom o pé-de-cuba, a fermentação pros-seguiu normalmente, e o produto finalapresentou-se com ótimo aspecto.

Por ser um produto novo, o vi-

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nho de açaí poderá tornar-se umatrativo no comércio de São Luís,dentro do circuito turístico de nossacidade. O baixo custo é, sem dúvida,um atrativo adicional, pois para todoo vinho produzido, foram gastos R$

10,00 em frutos, açúcar e fermento.Devendo-se incluir, obviamente, oscustos com instalações, pode-se ob-ter um produto comercial de preçoacessível.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

ACADEMIA DO VINHO. História dovinho. Belo Horizonte. 2000. Disponí-vel em: <http://www.academia-dovinho.corn.br/>. Acesso em 16 novo2000.

AQUARONE, E. Alimentos e bebidasproduzidos por fermentação. São Pau-lo: Edgard Blücher, 1983. 352p.

BRASIL. Ministério da Agricultura.Complementação dos padrões de iden-tidade e qualidade para bebidas e vi-nagres. Brasília, DF, 1994. 20p.

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SCHNEIDER, E. A cura e a saúde pe-los alimentos. São Paulo: CasaPublicadora Brasileira, 1985. 673p.

GRANDE manual Globo de agricultura,pecuária e receituário industrial. 5. ed.,[S.I.] Ed. Globo, 1983. 845p. V6.

LIMA, A. U. Biotecnologia: tecnologiadas fermentações. São Paulo: EdgardBIücher, 1975. 329p. VI.

Cad. Pesq., São Luís, v. 11, n. 2, p. 45-50, jul.Zdez: 2000.

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