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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO - UFRJ
NÚCLEO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA – NESC
Projeto de Dissertação de Mestrado em Saúde Coletiva
Um estudo sobre os Efeitos Adversos à Saúde de uma População Infanto-Juvenil
exposta aos agrotóxicos usados no cultivo da cana-de-açúcar.
Mestranda: MARLEI ROMERO
Orientador: Volney de M. Câmara
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“ É dever da família, da Sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente,
com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, à convivência
familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência,
discriminação, exploração, crueldade e opressão.”
Constituição da República Federativa do Brasil, Art.227, 5.10.1988
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SUMÁRIO
RESUMO ................................................................................................................................................5 DEDICATÓRIA...........................................................................................................................................8 AGRADECIMENTOS ...................................................................................................................................8 1. INTRODUÇÃO.................................................................................................................................11 1.1 A TRAJETÓRIA DO ESTUDO ......................................................................................................11 1.2. A RELAÇÃO SAÚDE E TRABALHO NA ADOLESCÊNCIA ....................................................................14 1.3 JUSTIFICATIVA .................................................................................................................................15 2. O TRABALHO INFANTO – JUVENIL ..........................................................................................16 2.1 O QUADRO MUNDIAL ......................................................................................................................16 2.2 O QUADRO BRASILEIRO...................................................................................................................18 2.3 O DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ..................................................................................21 2.4. O ADOLESCENTE E SUAS TRANSFORMAÇÕES .................................................................................23 2.5 O ADOLESCENTE E O TRABALHO .....................................................................................................24 2.6. OS EFEITOS DOS AGROTÓXICOS NA SAÚDE DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE..................................26 3. IMPACTOS NO MEIO AMBIENTE...............................................................................................30 3.1 LEGISLAÇÃO ....................................................................................................................................33 3.2 LEGISLAÇÃO FEDERAL.....................................................................................................................34 3.3 LEGISLAÇÃO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO .................................................................................34 4. A NEUROPSICOLOGIA E OS EFEITOS ADVERSOS A SAÚDE................................................35 4.1 A ATENÇÃO .....................................................................................................................................35 4.2. A MEMÓRIA....................................................................................................................................37 4.3. MEMÓRIA VERBAL .........................................................................................................................38 5. O PROGRAMA PETI ......................................................................................................................40 5.1. ASPECTOS HISTÓRICOS E GEOGRÁFICOS DO MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ ...........................................40 5.2. A IMPLANTAÇÃO DO PETI NO MUNICÍPIO .....................................................................................42 6. MATERIAIS E MÉTODOS.............................................................................................................44 6.1. OBJETIVO GERAL ...........................................................................................................................44 6.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS ................................................................................................................44 6.3. DESENHO DO ESTUDO.....................................................................................................................44 6.4. ASPECTOS ÉTICOS..........................................................................................................................45 6.5. LOCAL ONDE FOI REALIZADO O ESTUDO.........................................................................................46 6.6. ETAPAS E PROCEDIMENTOS DO ESTUDO DE CAMPO..........................................................................47 7. OS INSTRUMENTOS ...........................................................................................................................51 7.1. QUESTIONÁRIO ESTRUTURADO PARA OS ADOLESCENTES ...............................................................51 7.2. TESTE NEUROPSICOLÓGICO BENDER .............................................................................................52 7.3. TESTE NEUROPSICOLÓGICO TCA VIS .............................................................................................54 8. RESULTADOS............................................................................................................................55
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9 ENTREVISTAS COM MORADORES LOCAIS ...........................................................................................68 10. CONCLUSÃO.................................................................................................................................78 11 BIBLIOGRAFIA .............................................................................................................................79 12 ANEXOS .........................................................................................................................................81
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RESUMO
Foi realizado um estudo seccional, comparativo, tendo como população alvo todas as
crianças e adolescentes de ambos os sexos, de 9 a 18 anos que participaram do
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil - PETI -, no município de Quissamã num
total de 55 crianças e adolescentes, moradores na área de Machadinha e sítios vizinhos.
O grupo controle foi constituído por crianças e adolescentes na mesma faixa etária e
condições sócio - econômicas semelhantes, que residem no perímetro urbano. As etapas
e procedimentos do estudo de campo incluíram: visitas de sensibilização; aplicação de
questionário; execução dos Testes Neuropsicológicos TCA Vis para medir a capacidade
atencional em tarefas repetitivas e monótonas; aplicação do Teste Bender para
identificar o nível de maturação da função Gestáltica visomotora; e, a realização de
entrevistas com moradores e trabalhadores na região. Entre os resultados obtidos,
destacam-se diferenças significativas em relação a ocorrência de acidentes de trabalho e
uma maior proporção de sintomas referidos no grupo estudo, sendo estatisticamente
significante as diferenças para desmaio, indisposição física, enjôo e dores abdominais.
No teste neuropsicológico TCA Vis o grupo estudo apresentou tendência maior para
erro por omissão e diferença significativa para erro por ação. No teste Bender o grupo
estudo apresentou reprodução diferenciada para todas as variáveis medidas: Normal,
estresse, memória imediata e memória tardia. Como conclusão, foi enfatizada a
necessidade de aprofundamento destes estudos, notadamente da avaliação
neuropsicológica.
Palavras-chave: Adolescentes; Agrotóxicos; Teste Bender; Teste TCA Vis; Saúde.
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ABSTRACT
A comparative seccional study was done, wich done, wich target, was the population of
children and adolescents of both sex, aged 9 to 18 years old, that participated in the “
PETI – Programa de Erradicação do Trabalho infantile” that means” infantile labour
eradication program”, in a total number of 55 children and adolescents, all living in area
called machadinha and neighborhood around, district of Quissamã, Rio de Janeiro State,
Brasil.
The Control group was formed by individuals with similar age and social conditions,
living in the urban area. The stage and procedures included: sensiilization visit; primer
list o questions answered by them, primer list of question answered by them,
neuropsychological TCA Vis test (to measure attention capacity in monotonous and
repeated tasks), bender test ( to identify level of maturation of visionmotor Gestaltic
function), and interview of local workers and inhabitants. The results showed
significants diference in conection with work accidents and great proportion of referring
symptoms among study group, being important statistically the differences for fait,
physical indisposition, nausea and abdominal pains. In the Neuropsychologic TCA Vis
test, the study group presented biger tendency to error/ mistake for omission and
significantive diference for action error. In the Bender test the study group showed
different and diferenciated results for all kinds of measures: norml, stress, recent
memory and late memory. As a conclusion, there is emphatically the need of deepen
this study, in special for neuropsychologic evaluation.
Key words: adolescents, agricultural of defensive, bender test, TCA Vis, health.
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Dedicatória
Aos meus pais pelo privilégio de ter tido uma vida cheia de amor e exemplo
humanitário, que contribuiu para que eu pudesse hoje estar atenta às questões sociais, e
ter recebido como herança um pouco da sensibilidade e generosidade, que acredito
tenha contribuído para me tornar um ser humano melhor.
A meus filhos, pela paciência e compreensão nas muitas horas de ausência, o que me
fez ver o quanto é grande o meu amor e a necessidade de tê-los sempre por perto.
Agradecimentos
Ao Volney, amigo e orientador, pela forma carinhosa com que me conduziu e pelo
exemplo a ser seguido.
À Malu, Maria Lucia Bosi, sempre amiga e incentivadora, seu exemplo de garra me
leva a querer mais.....
Ao Ronir, pelo exemplo que sempre foi, e disponibilidade de ajudar sempre, e ter o dom
de fazer a estatística parecer algo leve e fácil de ser compreendido; sem sua ajuda,
“jamais”.
Aos moradores de Machadinha, pelo acolhimento carinhoso e a disponibilidade de
contribuir sempre.
Aos profissionais do “Posto de Saúde de Machadinha” pela carinhosa ajuda durante o
trabalho de campo e a amizade ofertada generosamente e, verdadeiramente retribuída.
À Analice, Secretaria de Educação, pela amizade e incentivo, assim como as
Autoridades de Quissamã que disponibilizaram meios para que este estudo pudesse
acontecer.
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À grande amiga, Helena Fortes, que teve papel importantíssimo na direção dos rumos
que este trabalho tomou; com sua amizade, generosidade e o marco de estar no lugar
certo, na hora certa.
À Delvaci Santos, pela amizade, carinho e torcida, contribuindo para que a burocracia
não pesasse tanto...
À Beatriz Werdan, minha amiga e “anjo da guarda”, que sempre me socorreu com
paciência quando, ignorante em informática, lhe solicitava ajuda nas horas mais
impróprias; com todo carinho e disposição estava sempre disponível, obrigada pela
amizade...
Ao Alexandre Werdan, pelo socorro nas horas de “sufoco”, pacientemente, e obrigada
por trazer para o Brasil “três” preciosidades...
Ao Geraldo, Renato, Valéria e “tia Cleia”, sem vocês seria impossível ir adiante...
À Direção, professores, funcionários e alunos do Nesc, por tudo que me ajudaram a
construir.
Ao Cristiano Corrêa Pessanha que contribuiu generosamente, assim como todos da
Secretaria de Bem Estar Social.
Ao Nelson Reis, um amigo sempre valoroso em todas as horas.
Aos meus queridos Amigos, Andréa e Fernando, pelo carinho, hospitalidade e a certeza
da amizade para sempre...
Rita, Minha grande amiga e incentivadora, obrigada pela sua volta...
Nelma, pela amizade, colaboração e carinho, principalmente nos momentos difíceis.
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Aos meus colegas da Psicologia médica por entenderem e me incentivarem no período
que estive longe do convívio de vocês.
À Glória, em especial pela amizade, incentivo, e compreensão, quanto a minha ausência
“institucional” mas a presença sempre... no coração.
Aos mestres: Sérgio Schmidt pela orientação no caminho ainda inóspito da
Neuropsicologia no Brasil e a disponibilidade de seu precioso tempo...
Gilberto Britto por mostrar um caminho na ciência que poucos conseguem atingir como
verdadeiros cientistas, foi muito gratificante ter podido “roubar” um pouco do seu
precioso tempo.
Aos meus colegas e alunas do centro cultural, em especial a minha amiga Eliana, pela
forma simples com que encara as grandes vicissitudes da vida.
Ao Daniel, que me ajudou a organizou melhor os meus “escritos”, aguardando a sua
volta...
As minhas companheiras e amigas do Programa do PADI, pela compreensão quanto a
minha ausência, e o incentivo a mais esta jornada...
As minhas pacientes que sempre torceram carinhosamente para que eu estudasse mais.
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1. INTRODUÇÃO
1.1 A Trajetória do Estudo
Como primeira formação, a psicologia me levou por caminhos de atendimento nas
comunidades carentes, norteando sempre o meu trabalho para uma realidade que fazia
prevalecer os aspectos sociais e perceber, assim, as necessidades de prevenção. Sendo
minha maior atenção voltada para a infância e a adolescência. Posteriormente, tendo me
especializado em Saúde Pública, aproximei-me ainda mais desta área a qual hoje me
proponho a estudar.
O que me despertou para a pesquisa foi a busca da compreensão de como são os
acontecimentos; como as pessoas adoecem; e como contribuímos para tal, e ao mesmo
tempo buscamos caminhos para minimizar os estragos causados pelo próprio ser
humano.
A saúde pública sempre me fascinou, e, após ter feito o Curso de Especialização pela
Escola Nacional de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz – ENSP – em 1992,
passei a atuar quase que integralmente neste setor. Sempre me surpreendeu a forma
como as camadas sociais menos privilegiadas da população são capazes de criar
mecanismos de sobrevivência que muitas vezes fogem a nossa compreensão, apesar dos
descasos das autoridades públicas, o que as leva a manter um nível de miserabilidade e
doença elevado, colocando nosso país em destaque negativo e, assim nos fazendo
sempre ser reconhecidos como uma “inviabilidade” pelos países ditos “do primeiro
mundo”.
Construir um objeto de estudo para verificar este fenômeno também nos obriga a fugir
do senso comum, e a criar mecanismos de exploração que nos levem um pouco mais
próximo desta transformação. O que nos inspira a realizar este estudo é a vontade de
poder identificar os possíveis caminhos do adoecer de crianças e adolescentes que estão
buscando, assim como seus pais, avós etc... sobreviverem. E como o trabalho, que
garante esta sobrevivência, pode também trazer complicações para sua saúde, muitas
vezes crônicas e incapacitantes, não permitindo a estes indivíduos um futuro promissor,
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principalmente, quando interrompem a capacidade do exercício de suas atividades
laborais.
Tendo tomado conhecimento do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI -
, do governo federal e implantado em 1998, e sabendo através de amigos residentes na
região de Quissamã que o referido programa havia sido implantado naquele município,
elaborei um breve levantamento sobre o assunto. Um dado que me chamou a atenção foi
o fato de que as crianças e adolescentes contemplados pelo programa eram, em quase
toda sua totalidade, moradores da área rural, portanto, crianças que vinham
desenvolvendo suas atividades na agricultura, mais precisamente, na lavoura de cana-
de-açúcar. Senti-me muito atraída a desenvolver este trabalho, uma vez que me remetia
a minha própria infância e adolescência, pois nasci e fui criada no interior de São Paulo,
tendo como referência a vida no campo, muitas vezes como membro eventual de
equipes que trabalhava nas colheitas de lavouras nas safras de algodão, café, milho, bem
como em outras atividades agrícolas.
Naquela época, não tendo noção do agravo que o trabalho infantil poderia acarretar no
desenvolvimento de uma criança ou adolescente, via o mesmo como algo natural que
pudesse ser desenvolvido por qualquer pessoa, independentemente de idade ou estatura
física.
O que me recordo do trabalho na roça (que foi pouco, é verdade) não me vem nenhum
tipo de violência, ou qualquer revolta pelo pouco dinheiro que se ganhava. Acho que o
que fica oculto é o perigoso. Tudo é “mistério”, o que se usa na plantação para proteger
das pragas, o ser humano não se protege dos ferimentos, dos envenenamentos, dos
baixos salários, da necessidade de trabalhar mais do que “o corpo agüenta”, da pouca
comida, e do perigo de se deixar de sonhar.
A meu ver ocorriam três situações distintas, que hoje percebo claras, ou seja: o trabalho
como lazer; como responsabilidade; ou como tortura.
No entanto, desde a elaboração do Estatuto da Criança e do Adolescente, ficou definido
no capítulo V, Art. 60 que: “É proibido qualquer trabalho a menores de catorze anos de
idade, salvo na condição de aprendiz”. Enquanto que ocorre uma certa discrepância
segundo os diferentes órgãos que definem estes limites de idade, posto que a
Organização Internacional do Trabalho - OIT – afirma ser quinze anos a idade mínima
para o trabalho, sendo que em relação ao Brasil, para a instituição esta idade estaria em
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torno de dezesseis anos; e já a Constituição Federal Brasileira de 1988, coloca como
sendo este limite de doze anos. Tantas divergências dificultam dados mais precisos com
relação ao número de trabalhadores infanto-juvenis, assim como o cumprimento das leis
de proteção destes trabalhadores.
Outras definições do que é o trabalho infanto-juvenil são: 1) a denominada restrita,
porque exclui as tarefas domesticas não remuneradas e os serviços voluntários na
comunidade; 2) aquela denominada ampliada, que estabelece o trabalho infantil como
toda e qualquer atividade realizada por uma criança, que não seja educativa, formativa,
ou lúdica, equivalendo-se esta a uma atividade econômica, e impedindo a adequada
freqüência à escola, a convivência da criança com seus pares, ou por qualquer maneira
constrangendo seu adequado desenvolvimento biopsicossocial e 3) o trabalho
adolescente, que seria aquele realizado por pessoas, de ambos os sexos, maiores de 15
anos e menores de 18 anos.
A imprensa tem registrado algumas infelizes constatações como a de crianças em
atividades laborais, praticamente sem exceções, afastadas da escola ou em situação de
freqüência irregular; além disso, a maioria delas sujeitam-se a condições laborais
danosas à saúde (insalubres, perigosas, penosas e moralmente prejudiciais), muitas
submetidas a risco permanente de acidentes, sendo consideráveis os casos de
mutilações, queimaduras e doenças graves contraídas.1
Conforme dados do Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF - (1997)
estima-se que na América Latina uma em cada cinco crianças trabalha, e há indicações
de que esta projeção venha aumentando. A expansão deste quadro parece ter base na
crise econômica da década de 80, que atingiu duramente a América Latina, onde o
trabalho das crianças passou a ser considerado fundamental para a manutenção do
padrão econômico da família. Entre os fatores determinantes encontram-se as políticas
nacionais de contenção do déficit público, que levam no seu bojo o corte nos
investimentos sociais (saúde e educação), e a ausência de estratégias de
desenvolvimento social e de medidas que propiciem a melhoria na distribuição de
renda.
1 PGT Notícias: A exemplo da matéria que foi publicada no jornal Diário de Natal, no caderno Opinião do dia
21.10.2000 - http://www.pgt.mpt.gov.br/noticias/noticia17.html (25/01/2002) .
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Atualmente, vemos inúmeras crianças trabalhando no mundo “civilizado”, bem como,
crianças de comunidades indígenas, muitas delas, fazendo trabalhos superiores as suas
forças, o que não é visto em sua cultura como prejudicial a saúde e o desenvolvimento,
e que, para a maioria das pessoas no mundo inteiro, não se trata de assunto relevante.
Dessa forma, o meu engajamento neste projeto se deve a visão que tenho da importância
vital de haver trabalhos e estudos nesta área, focando a discussão para essa realidade,
que nos direciona para a busca do aperfeiçoamento das leis e conscientização de toda a
sociedade.
1.2. A Relação Saúde e Trabalho na Adolescência
Razões de ordem técnica e econômica propiciaram ampla utilização do trabalho infanto-
juvenil quando o processo de produção passou a se servir das máquinas a partir da
conhecida Revolução Industrial. O trabalho, até então, era realizado principalmente pelo
homem, por causa da necessidade da força bruta, o que a mulher e a criança não podiam
executar devido à sua “fraqueza natural”. A máquina deu amplo espaço para a utilização
de “meias forças”, da mão-de-obra da mulher adulta, de crianças e de adolescentes.
Em 1980 a OIT estimou que no mundo existiam em torno de 88 milhões de crianças
menores de 15 anos trabalhando, ou seja, 20% do total de crianças. De acordo com a
Organização das Nações Unidas – ONU –, 145 milhões de crianças eram
economicamente ativas em 1981. (OLIVEIRA, 1994).
Estudos, sobretudo os publicados pela OIT, revelaram que o trabalho infanto-juvenil
tem uma dimensão mundial, com uma distribuição desigual entre os países
desenvolvidos e os em desenvolvimento. De acordo com as últimas estatísticas, 250
milhões de crianças entre 5 e 14 anos de idade trabalham arduamente em atividades
econômicas nos países em desenvolvimento. Quase 50% destas crianças labutam em
regime de tempo integral, e as restantes dividem o tempo com atividades escolares e
outras atividades não econômicas (HUZAK e AZEVEDO, 2000).
A realidade brasileira é de crianças e jovens inseridos precocemente no trabalho, em
prejuízo do seu desenvolvimento físico, psicossocial e moral. Há um número
significativo de crianças trabalhando nas piores condições, por exemplo: na região do
sisal, na cultura de cana-de-açúcar, na citricultura, nas carvoarias e nas ruas.
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Assim sendo, o trabalho infantil e outras formas de exploração laboral merecem atenção
especial dos governantes e da população, como forma de promover a erradicação em
todos os países, bem como, a paralisação imediata das piores formas de trabalho das
crianças e adolescentes.
1.3 Justificativa
Este estudo visa pesquisar os efeitos sobre a saúde em um determinado grupo de
crianças e adolescentes, expostos ao agrotóxico, buscando identificar os potenciais
riscos à saúde e ao desenvolvimento biopsicossocial que acrescidas às cargas físicas,
emocionais e sociais que o trabalho acarretam, uma vez que as crianças e adolescentes
são mais vulneráveis aos riscos que estes transtornos acarretam à saúde, em ambientes
de trabalho insalubres, e desenvolvendo várias afecções que apresentam nexo causal
com o ambiente em que trabalham ou com as atividades que exercem. Entre os fatores
que concorrem para uma maior suscetibilidade para a ocorrência de efeitos adversos à
saúde, estão a imaturidade do sistema imune, e da capacidade enzimática de
metabolização das substâncias químicas e o aporte nutricional insuficiente associado ao
gasto calórico aumentado pela atividade laborativa (ASMUS, 2001).
Outra conseqüência perversa do trabalho infantil sobre a saúde é o acidente do trabalho,
o que se constitui na principal causa de morbi-mortalidade entre trabalhadores jovens,
assim como a exposição a produtos tóxicos sem que se tome conhecimento dos riscos a
que estão expostos, apresentando assim um grave problema de Saúde Pública.
Portanto, um estudo neste sentido se justifica, pois muito poderá contribuir para uma
maior compreensão das dimensões do problema, possibilitando ações mais adequadas,
tanto corretivas como preventivas.
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2. O TRABALHO INFANTO – JUVENIL
2.1 O Quadro Mundial
A utilização de crianças e adolescentes nas atividades laborais é bastante antiga. Têm-se
relatos de que desde a Idade Média as crianças já ajudavam seus pais em serviços nas
propriedades agrícolas, não possuindo este tipo de atividade, porém, um caráter rígido e
árduo.
Analisando os registros históricos, mais precisamente os bíblicos, encontramos muitas
passagens que relatam o trabalho de crianças cuidando de rebanhos; ajudando seus pais
em trabalhos de carpintaria; e, como o próprio evangelho noticia, a contribuição
decisiva para a formação do menino Jesus na convivência com seu pai José, da
linhagem de Davi, o qual lhe transmitiu conhecimentos acerca do ofício que abraçara.
“José amou a Jesus como um pai ama a seu filho, tratou dele, dando-lhe o melhor que
possuía, José, cuidando daquele Menino, como lhe havia sido ordenado, fez de Jesus um
artesão: transmitiu-lhe seu ofício” (Mons. Escrivá).
HUBERMAN (1986), tecendo considerações sobre o trabalho infantil antes da
Revolução Industrial, cita que: “as crianças trabalhavam em casa, sob a direção de seus
pais, com horários e condições por estes determinados. Naquele período, o trabalho era
visto como um meio de desenvolver habilidades onde o homem, ao mesmo tempo em
que exercia suas funções, também se divertia”.
Mesmo naquela época, não tendo noção do agravo que o trabalho infantil poderia
acarretar no desenvolvimento de uma criança ou adolescente, o mesmo era visto como
algo natural, que pudesse ser desenvolvido por qualquer pessoa independente de idade
ou estrutura física. Com a Revolução Industrial, a utilização da mão-de-obra infantil
intensificou-se em virtude do aumento da necessidade de produção em larga escala,
conjuntamente com o objetivo de se cobrir o mais rapidamente possível o investimento
efetuado com a compra de máquinas. Assim se justificava o uso do trabalho das
crianças pobres dos orfanatos, e mais tarde, como os salários dos pais e das mães
operários não eram suficientes para manter a família, também os filhos foram obrigados
a trabalhar nas fábricas. Nesse caso, as condições de trabalho a que os menores ficavam
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expostos eram extremamente penosas, chegavam ao absurdo de mais de 14 horas
seguidas nas fábricas. Além de tudo as crianças trabalhavam sob a direção de um
supervisor, cujo emprego dependia da produção que pudesse arrancar de seus pequenos
corpos, com horários e condições estabelecidos pelo dono da fábrica ansioso por lucros
(HUBERMAN, 1986).
Segundo TEIXEIRA (1996), a idéia de proteção integral à criança não é recente, já
havia sido adotada na maioria dos documentos internacionais relativos à infância e a
juventude, como, por exemplo, a Declaração de Genebra de 1924; a Declaração dos
Direitos da Criança de 1959; e, principalmente, a Convenção Internacional sobre os
Direitos da Criança datada de 1989, onde foi editada e ratificada pela quase totalidade
dos membros da ONU, excetuando-se apenas Somália e os Estados Unidos da América.
Também neste documento consta a exigência de uma idade mínima para o início da
atividade laboral. Por outro lado, se analisarmos as literaturas que tratam da história da
humanidade, constata-se que as ações efetivas em relação à proteção à criança são bem
recentes, tal idéia só obteve atenção a partir do século XX, d.C.
Em 1800, início do século XIX, as crianças eram tratadas como adultos pequenos, com
direitos inferiores, eram mãos-de-obra baratas, abundantes e descartáveis. Em 1959,
com a declaração dos direitos da criança, este quadro começou a mudar. Um dos
direitos mais importantes desta declaração é o direito a uma infância feliz – entende-se o
termo “infância feliz” como sendo o direito que toda criança tem a usufruir os
benefícios considerados justos e adequados ao seu pleno desenvolvimento. Esta infância
feliz é de alto interesse social, pois, segundo MELLO (2003), está provado que uma
criança que sofreu maus-tratos durante a formação de sua personalidade será, com
grande probabilidade, um adulto violento.
No âmbito da OIT, foram editadas as Convenções 138, sobre a idade mínima para a
admissão ao emprego e 182 sobre as piores formas de trabalho infantil. A primeira
estabelece a idade mínima de 15 anos para o trabalho, e a segunda reconhece a
existência de formas de trabalho infantil que devem ser combatidas prioritariamente.
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2.2 O Quadro Brasileiro
Durante muito tempo, o trabalho infantil no Brasil tem sido tratado como conseqüência
da pobreza, como solução para amenizar seus efeitos. A sociedade aceitava que o ideal
para as crianças e adolescentes das camadas sociais menos favorecidas seria aprender
uma profissão o quanto antes, de modo a contribuir para a renda familiar e evitar a
possibilidade de ingresso na marginalidade. E ainda hoje, se observa que boa parte da
população ainda continua com este pensamento.
Uma visão descrita no início da década de 1970 foi que:
No Brasil, a força de trabalho infantil vem sendo utilizada no campo e na cidade desde
longa data. Nos primórdios da industrialização, da mesma forma que durante o período
da Revolução Industrial na Inglaterra, as condições de trabalho das crianças na indústria
brasileira eram duríssimas: muitas estruturas que abrigavam não haviam sido
originalmente destinadas a essa finalidade. Além de pouca iluminação e ventilação, não
dispunham de instalações sanitárias. As máquinas se amontoavam ao lado uma das
outras e suas correias e engrenagens giravam sem proteção alguma. Os acidentes se
amiudavam porque os trabalhadores cansados, trabalhando, muitas vezes, além do
horário, sem aumento de salário e trabalho aos domingos, eram multados por indolência
ou erros cometidos se fossem adultos, ou surrados, se fossem crianças. Em 1917, uma
pessoa que visitou uma fábrica na Mooca, na capital [São Paulo], ouviu operários de
doze e treze anos de idade, da turma da noite, que se queixavam de serem
freqüentemente espancados e mostraram, como prova do que diziam, as equimoses e
ferimentos que traziam. Incluindo citações de fotografias tiradas ocasionalmente nos
revezamentos de turmas em fábricas, onde as descrições de crianças descalças, mal
vestidas, raquíticas e com rostos inexpressivos, demonstrando assim toda a fadiga e
desolação causada por trabalhos desgastantes por longas horas além da capacidade
suportável (DEAN, 1971).
Na zona rural, a participação de crianças no processo produtivo agrícola não constitui
um fato novo nem no Brasil nem no mundo. Estudiosos dos Estados Unidos afirmam
que no setor agrícola a participação de menores ocorre principalmente em atividades de
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colheita e semeadura, dando conta de que oitocentas mil crianças engajam-se
anualmente em atividades agrícolas juntamente com suas famílias (GALASSO, l993).
No Brasil a participação de crianças como trabalhadoras autônomas nas atividades
agropecuárias, principalmente a partir dos anos 70, tomou uma dimensão tal, que não
pôde mais ser ignorada, chamando a atenção inclusive para o crescimento também do
trabalho infantil nas atividades urbanas e em processos produtivos penosos e perigosos,
como por exemplo: trabalhos em canaviais, pedreiras, carvão, etc. Chamando assim a
atenção de organizações não governamentais internacionais, que passaram a pressionar
a abertura da discussão sobre o problema, levando o Governo Federal a criar um
programa de combate a erradicação do trabalho infantil no país, através do Ministério da
Previdência e Assistência Social em 2002.
Segundo a OIT/BRASIL (2001) o trabalho infantil “tem sido tratado ora como
conseqüência da pobreza, ora como solução para amenizar seus efeitos. A sociedade
concordava ou aceitava que o ideal para crianças e adolescentes das camadas sociais
menos favorecidas seria aprender uma profissão o quanto antes, de modo a contribuir
para a renda familiar e evitar a possibilidade de ingresso na marginalidade. A política
educacional, até recentemente ainda muito voltada para manutenção e privilégios,
contribuía para esta situação, ajudando a reproduzir o ciclo de desigualdade social”.
A partir da década de 1980, com o surgimento de movimentos sociais em favor dos
direitos das crianças e dos adolescentes, o quadro brasileiro começa a mudar,
principalmente em função de:
1988 – Promulgação da Constituição Federal;
1989 – Adução da Convenção das Nações Unidas Sobre os Direitos da Criança;
1990 – Aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA.
O governo federal, a partir de 1992, incluiu definitivamente o tema do combate ao
trabalho infantil na agenda nacional de políticas sociais e econômicas, tendo como
suporte técnico e financeiro o Programa Internacional para a Eliminação do Trabalho
Infantil – IPEC –, a Organização Internacional do Trabalho – OIT – e o Programa do
Fundo das Nações Unidas para a Infância – UNICEF.
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Estes programas culminaram com a criação, em 1994, do Fórum Nacional de Prevenção
e Erradicação do Trabalho Infantil – FNPETI –; integrado por entidades governamentais
e não-governamentais.
Estudos continuaram mostrando que, ainda que a legislação brasileira proíba o trabalho
de crianças e adolescentes, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio – PNAD –
do Instituto Brasileiro de Estatística – IBGE -, mostrou que a estimativa do número total
de crianças e adolescentes entre 5 e 17 anos de idade trabalhando no Brasil em 1998 era
cerca de 7,7 milhões e que este número vem diminuindo, pois em 1992 existiam 9,7
milhões de crianças e adolescentes exercendo algum tipo de atividade econômica.
Assim como estudos posteriores, do próprio PNAD, confirmavam a tendência positiva,
mas lenta, na redução do trabalho infantil, que baixou de 27% para 26% da população
de 10 a 17 anos no período. O PNAD evidenciou que o trabalho infanto-juvenil
concentra-se em atividades agrícolas e em famílias que atuam por conta própria, como
nos setores de comércio e serviços.
Segundo SCHWARTZMAN (2001), o problema apresenta-se tanto em estados pobres
quanto em áreas mais ricas do Brasil. Sendo comum que mais da metade das crianças
menores de 14 anos não receba pagamento pelos serviços os quais prestam, no entanto
esta situação começa a modificar-se a partir dos 17 anos, quando uma parcela de apenas
8% deste contingente passa a ser remunerada.
Ainda segundo SCHWARTZMAN, erradicar o trabalho infantil é hoje um dos
principais desafios no Brasil. Dadas às condições sociais que prevalecem, em boa parte
do país, esse não são um problema de fácil solução. Os ganhos dos menores que
trabalham quase sempre representam parte substancial da renda familiar já insuficiente,
e, se essas crianças e jovens deixarem de trabalhar, suas famílias não terão como mantê-
las e encaminha-las para a escola.
Além de se impor por questões humanitárias, sociais e legais, a erradicação do trabalho
infantil é importante do ponto de vista das negociações internacionais de comércio, pois
tem sido cada vez mais freqüente a utilização, por parte de representantes comerciais
dos países industrializados, o argumento do uso de mão-de-obra infantil como
justificativa para medidas contra a aquisição dos produtos exportados pelos países
emergentes.
21
Assim, como um novo esforço para reduzir o trabalho infantil no Brasil, o Ministério do
Trabalho e Emprego determinou, através da portaria nº 20, de 13 de Setembro de 2001,
e a convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho – OIT– por serem
consideradas perigosas, penosas, insalubres e degradantes, restringiu algumas atividades
que não poderão ser exercidas por menores, tais como:
Dirigir tratores e máquinas agrícolas;
Aplicar agrotóxicos;
Manejar objetos cortantes;
Colher cítricos;
Plantar, colher ou trabalhar no beneficiamento e na industrialização de açúcar e sisal; e
Trabalhar em manguezais e lamaçais ou em serviços que exijam mergulho, etc.
O quadro A.1 (Anexo I) descreve os locais e serviços considerados perigosos ou
insalubres para menores de 18 anos. Proposto na Portaria nº 20 de 13 de Setembro de
2001.
2.3 O Direito da Criança e do Adolescente
Os Programas de assistência social voltado para os grupos infanto-juvenis vêm
ocupando espaços significativos no país, através de uma política nacional dirigida
principalmente a programas desenvolvidos sob os auspícios do Estatuto da Criança e do
Adolescente − onde os maiores problemas estão concentrados nas famílias mais
carentes da população. “Assim, de uma visão vaga da política como um modo de acudir
os pobres através da ação assistencial, emergencial e benevolente do Estado ou da
filantropia, o conceito tende hoje a estar associado a um conjunto de ações públicas que
deve garantir o exercício dos direitos sociais básicos do cidadão: o direito a vida, a
saúde, a alimentação, a moradia e, especialmente para as crianças e adolescentes, o
direito ao desenvolvimento integral”, segundo o Programa de Erradicação do Trabalho
Infantil – PETI – sob a redação de Sônia Mirian Braibe.
Partindo do pressuposto que o trabalho infantil compromete as possibilidades de
desenvolvimento biopsicosocial da criança, as propostas do governo, para reverter este
22
quadro, incentivam programas que custeiam bolsas às famílias para que suas crianças
deixem o trabalho e, assim, busquem o reingresso e permanência nas escolas, assim
como também a criação de outras atividades que assegurem a alimentação, orientação
nos estudos, esporte e lazer. Dentre estes programas, se inclui o PETI.
O Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI – tem como coordenação, no
âmbito nacional, a Secretaria de Estado de Assistência Social do Ministério da
Previdência e Assistência Social, por intermédio da gerência do PETI; no âmbito
Estadual, o PETI é coordenado pela Secretaria Estadual de Ação Social, e no Municipal,
ele é coordenado pela Secretaria Municipal de Ação Social, ou órgãos equivalentes.
O PETI é um instrumento de ação política, envolvendo governos, empregadores,
sindicatos, associações e outras organizações da sociedade civil, pela qual seus
signatários assumem publicamente o compromisso de intervir na prevenção e na
erradicação do trabalho infantil de forma articulada como uma forma de pacto de todos
estes segmentos.
Apesar do programa visar à retirada das crianças e dos adolescentes do trabalho
perigoso, penoso, insalubre e degradante, o alvo de atenção é a família, que deve ser
trabalhada por meio de ações sócio educativas e de geração de trabalho e renda que
contribuam para o seu processo de emancipação; para sua promoção e inclusão social,
tornando-as protagonistas de seu próprio desenvolvimento social.
O Manual de Orientação de Erradicação do Trabalho Infantil, relativo ao PETI, reforça
que a família é um núcleo natural e fundamental da sociedade, sendo, portanto, o lugar
por excelência de proteção e inclusão social. Assim destaca, como perspectiva, os
serviços e as ações assistenciais como forma de fortalecimento dos laços familiares,
levando estas famílias a perceberem-se como sujeitos participativos e com direitos aos
bens e serviços produzidos pela comunidade.
Entretanto, a eficácia do PETI fica comprometida, pois, após terem sido retiradas as
crianças entre 07 e 13 anos de idade do trabalho, ao completarem 14 anos, elas
necessitam retornar aos mesmos trabalhos, pois são desvinculados do programa e,
devido às realidades sociais e econômicas dos pais, que se encontram, na grande
maioria das vezes, nas mesmas condições anteriores, não refletindo nenhum
crescimento substancial às suas famílias que permitisse mudar suas realidades. O
programa perde assim, muito de seus objetivos gerais e específicos.
23
Outro fator dificultante é o não cumprimento por parte do Governo em manter em dia os
pagamentos, fato este que “empurra” de volta para o trabalho crianças e adolescentes
em busca de subsistência básica, a qual é a de sobrevivência própria de seus familiares.
2.4. O Adolescente e Suas Transformações
O processo de desenvolvimento no adolescente tem como ponto principal o desabrochar
para uma nova vida, cheia de transformações. Sob esta ótica, não há problemas
determinados, “tudo pode ser problema”. Existem dimensões distintas a serem
fortalecidas enquanto o adolescente se encaminha para a vida adulta, que são; segundo
Maria Izabel de Oliveira Tongu:
a física, onde transformações acontecem sem que o indivíduo possa controlar;
a sensível, é a sua capacidade de sentir, ver, ouvir e reagir aos estímulos do mundo; e
a psíquica, quando principalmente sua capacidade de escolher o que lhe faz bem, de
pensar e buscar sua individualidade.
Falar da adolescência é falar de transformações, de mudanças, onde se entrevêem
grandes possibilidades, e onde se constatam enormes limitações. Portanto, não dá para
generalizar ou explicar a adolescência, e sim, ter a consciência de que existem
adolescentes cuja vida sempre tem alguma novidade imprevisível.
Para se interpretar, ou mesmo se explicar esta fase de transformações, temos que
entender o tripé que a natureza manifesta de uma maneira combinada: a biológica, a
psicológica e a cultural, que trazem ingredientes que fazem ter mobilidade e dinamismo,
que resulta na capacidade de pensar e gerar consciência. Preparando-se assim, para
viver as fases negativas, como: o desassossego, incerteza, excitabilidade, estranheza nos
movimentos, críticas do mundo em torno; assim como as fases positivas, que são:
afirmação do mundo e da vida, visão esperançosa do futuro e entusiasmo em busca
deste futuro.
Quando estas manifestações ocorrem de forma incontrolável, é a própria natureza se
manifestando. Não há como vivenciá-las de forma especial; há que se dar lugar a
responsabilidade de ter uma família dependendo do seu trabalho, da sua capacidade de
24
prover; e o menino, jovem e esperançoso, dá lugar a um ser fisicamente mal tratado pelo
esforço do trabalho, e desiludido por não poder “ousar” sonhar.
Os fatores de vulnerabilidade nesta idade constituem possíveis causas de danos, devido
aos efeitos de como se preparar para a vida; como cumprir com o dever da formação; ou
ainda, como cumprir o direito de ser cidadão.
2.5 O Adolescente e o Trabalho
Trabalho é um termo de difícil conceituação. Vários estudiosos buscaram uma
etimologia para a palavra, buscando sua conceituação. Porém a sua denominação
sociológica tem em sua tradição valores, ora depreciativos, ora penosos.
Através dos tempos o vocábulo veio sempre significando fadiga, esforço, sofrimento,
cuidado, encargo, portanto valores negativos, dos quais se afastavam os mais
afortunados; assim, MORAES FILHO (1956) diz que: “o trabalho pode ser visto de
vários ângulos, entre outros, o sociológico, o jurídico, o político, o econômico, o
filosófico. Porém, em geral, se dá mais ênfase ao trabalho sob o aspecto econômico,
como instrumento de produção, de bens e serviços. Em cada contexto histórico do
processo de produção, o trabalho assume características bem diferenciadas”.
OLIVEIRA (1994) traz uma luz sobre a historia do trabalho infanto-juvenil no Brasil e
no mundo, citando as dificuldades em se transitar leis nos parlamentos europeus que
visavam proteger o trabalho infanto-juvenil, datando de 1802 a primeira lei (Act for
Preservation of Health and Moral Apprentices Employed in Cotton and Others Mills)
assim como em 1867, dezessete leis inglesas foram editadas para proteção do trabalho
das crianças de 8 a 13 anos e dos jovens de 13 a 18 anos.
Porém, profissionais que deveriam apoiar estas leis, em nome de seus conhecimentos,
defenderam que crianças deveriam o mais cedo possível ser encaminhadas às minas.
Como o médico HANNOT, que dava um enfoque ideológico, reconhecendo que era
uma questão de “destin”, assim se expressou; segundo relato feito por Oliveira em
publicação da OIT (O Trabalho da Criança e do Adolescente).
“Eu vou mais longe e digo que é cruelmente útil fazer descer o quanto antes uma
criança que é destinada à profissão de mineiro porque, repito-o, a gente se acostuma
25
a tudo e é desde jovem, como aprovei, que se deve empenhar para aí chegar. Essa
criança se habituará a se alimentar de ar pobre de oxigênio; as posições incômodas,
que se é forçado a manter neste gênero de trabalho, tornar-se-lhe-ão familiares; ela
baseará cedo sua alimentação sobre sua respiração, cuja soma de atividade de
função será baseada sobre ela; sem peito não atingirá uma amplidão inútil e
perigosa para ela. Com efeito, eu fiz notar que os homens de tórax largo e
desenvolvido tornar-se-ão mais cedo asmáticos do que aqueles que o tem longo e
estreito. Estabelecer-se a um equilíbrio orgânico entre o meio no qual é chamado a
viver e a constituição física que lhe convier. Enfim, sua natureza será modelada por
seu gênero de vida, e ele adquirirá direito de douticelio nestas sombrias moradas
que, igual solo africano (para esta região ártica transplantado), mataria aqueles que
quisessem vir habitá-lo depois de certa idade (Neville, La condizion ouvrière ou XIX
emesiècle)”.
Os juristas se apossam de armas em seus arsenais intelectuais, para impedir que uma
legislação nova subverta várias liberdades; portanto em nome da ciência e da justiça
poderiam manifestar suas comiserações pelos pais que necessitavam do trabalho dos
filhos: as simpatias pelos entes sofredores e infelizes, e desejo de ir prontamente em seu
socorro com medidas enérgicas não podem fazer esquecer nem as liberdades do
comércio e da indústria, nem o respeito pela autoridade paterna, nem o respeito da
infelicidade própria; quem ousaria tirar de um pai ou de uma mãe sobrecarregados com
uma família numerosa, os socorros que podem receber de seus filhos? (BRAUN &
VALENTIN, 1989).
Muitas vezes o ser humano em nome de uma ideologia não se da conta da crueldade de
seus atos, e como bem temos visto na imprensa, ainda hoje encontramos trabalho
escravo; transgressão da lei onde são verificadas inúmeras crianças e adolescentes
trabalhando, o que deixa claro que o trabalho infantil está em expansão e não em
regressão como vimos através de percentuais oficiais de estudos que deixam fora várias
categorias de trabalhadores infanto-juvenis, tais como: trabalhador familiar não
remunerado, empregados domésticos, trabalhadores informais, serviços voluntários,
vendedores ambulantes.
26
Isto devido a dois fatores incontestáveis: explosão econômica e crise econômica,
somada a incapacidade crescente dos sistemas educacionais de incorporar todas essas
crianças e adolescentes em idade escolar e de lhes dispensar um ensino de qualidade,
primeiro pela inoperância do sistema; segundo pela condição físico-social destas
crianças, que em sua grande maioria carregam seqüelas de uma existência carente de
cuidados, nutrição, atenção a sua saúde e desenvolvimento.
2.6. Os efeitos dos agrotóxicos na saúde da criança e do adolescente
O uso de substâncias químicas, orgânicas ou inorgânicas, em agricultura, remonta a
antiguidade clássica. Escritos Romanos e Gregos mencionavam o uso de certos
produtos, como o Arsênico e o Enxofre, para controle de insetos nos primórdios da
agricultura. A partir do século XVI, até fins do século XIX, o emprego de substâncias
orgânicas como a Nicotina e Piretros extraídos de plantas eram constantemente
utilizados na Europa e EUA também com aquela finalidade (OMS-GENEBRA
1992.p.15)
A partir do início do século XX iniciaram-se os estudos sistemáticos buscando o
emprego de substâncias inorgânicas para a proteção de plantas, deste modo, produtos à
base de Cobre, Chumbo, Mercúrio, Cádmio, etc., foram desenvolvidos comercialmente
e empregados contra uma grande variedade de pragas, porém com limitada eficácia.
Todavia, a partir da Segunda Guerra Mundial, com a descoberta do extraordinário poder
inseticida do Organoclorado DDT e, Organofosforado SHARADAM, inicialmente
utilizado como arma de guerra, deu-se início à grande disseminação dessas substâncias
na agricultura.
Basicamente podemos classificar os efeitos dos agrotóxicos em agudos e crônicos,
sendo estes últimos ainda pouco pesquisados, embora devastadores para o organismo.
Há pelo menos 50 agrotóxicos que são potencialmente carcinogênicos para o ser
humano. Outros efeitos são de neurotoxidade retardada, lesões no Sistema Nervoso
Central, redução da fertilidade, reações alérgicas, formação de catarata, evidências de
mutagenicidade, lesões no fígado, efeitos teratogênicos entre outros, compõe o quadro
de morbimortalidade dos expostos aos agrotóxicos.
27
As principais lesões apresentadas, pelos expostos a ação direta ou indireta dos
agrotóxicos, geralmente utilizados na agricultura irrigada, segundo o médico Dr. Flávio
Zambrone, do Centro de Intoxicação da UNICAMP, estão relacionadas no Quadro I
(GARCIA, 1991).
28
QUADRO 1 – Ações ou lesões causadas pelos agrotóxicos ao homem
AÇÕES OU LESÕES CAUSADAS PELOS
AGROTOXICOS AO HOMEM TIPO DE AGROTÓXICO UTILIZADO
Lesões hepáticas Inseticidas organoclorado
Lesões renais
Inseticidas organoclorado
Fungicidas fenil-mercúricos
Fungicidas metoxil-etil-mercúrios
Neurite periférica Inseticidas organofosforados
Herbicidas clorofenóxis ( 2,4-D e 2,4,5-T)
Atrofia testicular Fungicidas tridemorfo (Calixim)
Esterilidade masculina por oligospermia Nematicida diclorobromopropano
Cistite hemorrágica Acaricida clordimeforme
Hiperglicemia ou diabetes transitória Herbicidas clorofenóxis
Hipertemia Herbicidas dinitrofenóis e pentaclorofenol
Pneumonia e fibrose pulmonar Herbicida paraquat (Gramoxone)
Diminuição das defesas orgânicas pela diminuição
dos linfócitos imunologicamente competentes
(produtores de anticorpos)
Fungicidas trifenil-estânicos
Reações de hipersensibilidade (urticárias, alergia,
asma) Inseticidas piretróides
Teratogênese Fungicidas mercuriais
Dioxina presente no herbicida 2,4,5-T
Mutagênese
Herbicida dinitro-orto-cresol
Herbicida trifluralina
Inseticida organoclorado
Inseticida organofosforado
Carcinogênese Diversos inseticidas, acaricidas, fungicidas,
herbicidas e reguladores de crescimento
Fonte: Garcia (1991)
29
A exposição continuada por período longo, em níveis relativamente baixos de
agrotóxicos, pode afetar a saúde humana, levando a casos crônicos, mal definidos, às
vezes extremamente graves , segundo Luna , Sales e Silva . (“Agrotóxicos:
Responsabilidade de todos”).
Casos de intoxicação por agrotóxicos são freqüentemente observados e relatados pelos
trabalhadores que não são capazes de entender as recomendações contidas nos rótulos
dos produtos, e que não utilizam o receituário agronômico como orientação técnica,
acarretando problemas de intoxicações agudas. Os problemas mais sérios estão nos
métodos de aplicação, na freqüência e quantidade utilizadas, geralmente maior que o
recomendado. O uso desordenado e excessivo desses produtos acarreta também impacto
econômico negativo aos agricultores, com nítidas repercussões sociais mais sérias
A ação neurotóxica retardada provocada pelos inseticidas do grupo dos organofosforado
foi comprovada recentemente em trabalho realizado no município de Vitória de Santo
Antão – PE, pelas fonoaudiólogas (TEIXEIRA e BRANDÃO, 1996), onde, dos 98
aplicadores de agrotóxicos pesquisados, 56 apresentaram perda auditiva e 42 foram
classificados dentro do padrão de normalidade , ainda segundo texto referido acima..
É importante ressaltar que, embora com riscos diretos e indiretos para os agricultores,
formuladores ou comerciantes, os agrotóxicos também estão presentes no nosso dia a
dia, através dos resíduos nos alimentos bem como nas formas domésticas de se conter
insetos, muitas vezes ignorando os riscos a que estão expostos seus familiares.
30
Avião em atividade a menos de 50 metros das residências de Machadinha – Foto tirada
durante o período de estudo.
3. IMPACTOS NO MEIO AMBIENTE
O maior e mais nocivo efeito do agrotóxico parece ser a falta de informação sobre seus
danos ao meio ambiente e o desrespeito às normas básicas de segurança no que se refere
ao seu manuseio e os excessos no ato de sua aplicação. Desenvolvidos para terem ação
biocida, são potencialmente danosos para todos os organismos vivos. Todavia, sua
toxidade e comportamento no ambiente varia muito. Esses efeitos podem ser crônicos
quando interferem na expectativa de vida, crescimento, fisiologia, comportamento e
reprodução dos organismos, e/ou ecológicos, quando interferem na disponibilidade de
alimentos, de habitantes e na biodiversidade, incluindo os efeitos sobre os inimigos
naturais das pragas e a resistência induzida aos próprios agrotóxicos. Sabe-se que há
interferência dos agrotóxicos sobre a dinâmica dos ecossistemas, como nos processos de
quebra da matéria orgânica e de respiração do solo, ciclo de nutrientes e eutrofização de
águas. Pouco se conhece, entretanto, sobre o comportamento final e os processos de
31
degradação desses produtos no meio ambiente. Os dados de contaminação ambientais
que mais parecem preocupar a opinião pública, nos países desenvolvidos, são as
contaminações do ar, do solo e, principalmente, das águas – Centro de Controle de
Intoxicações (UNICAMP,1991).
Há evidências de que algumas substâncias são transportadas a grandes distâncias pela
volatilização, retornando junto com a precipitação, contaminando áreas não tratadas,
tendo sido detectadas até em solos urbanos A maior parte dos agrotóxicos utilizados
acaba atingindo o solo e as águas principalmente pela deriva na aplicação, controle de
ervas daninhas, lavagem das folhas tratadas, lixiviação, erosão, aplicação direta em
águas para controles de vetores de doenças, resíduos de embalagens vazias, lavagens de
equipamentos de aplicação e efluentes de industrias de agrotóxicos.
A Constituição Federal em seu art. 24, inciso VI, atribui competência à União, aos
Estados e ao Distrito Federal legislar concorrentemente sobre: florestas, caça, pesca,
fauna, conservação da natureza, defesa do solo e dos recursos naturais, proteção do
meio ambiente e controle da poluição.
Segundo dados do Internacional Programme on Chemical Safety (IPCS) da Organização
Mundial da Saúde e do National Toxicology Program do National Institute of
Environmental Health Sciences (NTP/NIEHS), dos Estados Unidos, existem atualmente
mais de 750.000 substâncias químicas conhecidas. Aproximadamente 85.000 são
utilizadas quotidianamente e comercialmente, sendo que os possíveis efeitos e riscos,
para o homem e ambiente, são conhecidos somente para cerca de 7.000 destas
substâncias. Estima-se ainda, que com o grande desenvolvimento tecnológico alcançado
pela indústria química, nos últimos anos, cerca de 1.000 e 2.000 novos agentes químicos
são disponibilizados, anualmente, para os mercados: produtor e consumidor, sendo que
somente 1 a 2 % desses novos produtos têm a sua avaliação toxicológica realizada pelo
NTP, no período de um ano. (LUCIER & SCHECTEr,1998; PORTO &
FREITAS,1997).
A falta de informações e dados toxicológicos sobre as novas substâncias químicas,
devido ao ritmo acelerado de produção da industria química, levou o United Nations
Environment Programme (UNEP), através do International Registry of Potentially
Toxic Chemicals ( IRPTC), a estabelecer um registro internacional dos produtos
químicos, incluindo a avaliação de seus efeitos e toxicidade, juntamente com o IPCS.
32
Apesar da relação entre poluição ambiental e seus efeitos tóxicos à saúde humana e
ambiental ser conhecida há muitos séculos, o estabelecimento da relação de causa e
efeito entre a exposição aos diversos poluentes e a respectiva resposta do meio ambiente
e da saúde do homem somente pode ser concretizado através dos fundamentos
científicos da Toxicologia e Epidemiologia.
O homem custou a tomar consciência da íntima relação homem-ambiente-saúde, apesar
de Hipócrates, 300 anos a.C., já ter sinalizado sobre os efeitos da poluição ambiental na
saúde de uma população no seu livro Ares, Águas e Lugares. Somente em 1972, a partir
de 1ª Conferência Mundial sobre o Meio Ambiente, na Suécia, é que o homem passou a
se preocupar com a necessidade de preservar o meio ambiente. Em 1987, foi publicado
o Relatório Brundtland que apresentava uma nova abordagem integrada entre meio
ambiente e desenvolvimento econômico, também conhecido como crescimento
sustentável. A integração das questões de saúde e desenvolvimento social e econômico
com as questões ambientais foi referendada na 2ª Conferência Mundial sobre o Meio
Ambiente, realizada no Rio de Janeiro, em 1992.
Os poluentes ambientais, uma vez lançados ou introduzidos no meio ambiente
percorrem diferentes caminhos e rotas, a partir de sua fonte geradora, até alcançarem os
seus destinos finais, no ar, nas águas ou no solo. Este processo de difusão no ambiente e
o nível de concentração dessas substâncias, em cada ponto de percurso, dependerá da
taxa de emissão, das características de dispersão e da taxa de remoção através da
interação com agentes físicos, químicos e biológicos.
A bioacumulação pode ser definida como o processo pelo qual os organismos vivos
retêm as substâncias químicas nos seus tecidos em níveis maiores do que aquele
encontrado no meio ambiente, a partir de diferentes formas como, por exemplo, a água,
o solo e os alimentos. A bioconcentração, considerada como sinônimo de
bioacumulação, se refere ao acúmulo dos agentes químicos dissolvidos nos tecidos de
animais cujo habitat natural seja mares, rios, lagoas, como os peixes, por exemplo.
O conceito de que a toxicidade de uma substância química depende de sua respectiva
dose, conhecida como dose-resposta, tem sido melhor compreendido com o
conhecimento da toxicocinética. A toxicidade de um produto químico tem sido
determinada em função de sua concentração no seu específico sítio de ação, ou seja, no
órgão alvo. Embora esta concentração seja proporcional à sua dose, podemos observar
33
concentrações finais distintas entre compostos também diferentes, administrados na
mesma dose, em função das propriedades toxicocinéticas especificas de cada um deles.
Para a compreensão da toxicocinética, devemos entender os organismos como um
conjunto de compartimentos conectados entre si através do sistema circulatório, isto é,
dos vasos sanguíneos e linfáticos, de tal forma que as modificações ocorridas na
concentração das substâncias tóxicas absorvidas, em um período do tempo, permitam
inferir as variações correspondentes nos diferentes tecidos e órgãos, assim como na
biotransformação e eliminação dessas substâncias.
O uso indiscriminado de agrotóxicos continua matando pessoas e animais, destruindo
plantas e solo e comprovando o total descaso com as leis que regulamentam a questão.
Segundo o Documento da organização não-governamental (ONG) World Wildlife Fund
– WWF – Relatório Planeta Vivo (2002): “uma analise de saúde ambiental do planeta –
aponta para uma diminuição preocupante de espécies animais, geralmente causadas por
deformidades provocadas por pesticidas e outros poluentes. O uso de fertilizantes, no
mundo, quintuplicou nos últimos 30 anos. No Brasil, segundo dados do Ministério da
Agricultura, foram comercializados U$$ 1,6 milhão em agrotóxicos. A cifra saltou para
U$$ 2,5 milhões no ano passado”.
A notificação e investigação das intoxicações por agrotóxicos no Brasil são precárias.
Na maioria dos Estados, as notificações não são objeto dos sistemas de vigilância
epidemiológica e sanitária. A ausência de equipamentos de saúde pública e a
precariedade do sistema de atendimento ambulatorial contribuem para o sub registro
dessas intoxicações. Nos casos registrados, segundo o Ministério da Saúde, a faixa
etária entre 20 e 49 anos concentra mais de 50 % dos registros de intoxicação por
pesticidas agropecuários.
3.1 Legislação
A legislação que trata da questão dos agrotóxicos abrange, entre outros, os seguintes
instrumentos legais:
34
3.2 Legislação Federal
A Lei nº 6.894, de 16 de Dezembro de 1980 –Dispõe sobre a inspeção e fiscalização da
produção de fertilizantes, corretivos, inoculantes, estimulantes ou biofertilizantes,
destinados à agricultura, e dá outras providências.
A Lei nº 7.802, de 11 de Julho de 1989, regulamentada pelo Decreto nº 98.816, de 11 de
Janeiro de 1990 – Dispõe sobre a pesquisa, a experimentação, a produção, a embalagem
e rotulagem, o transporte, o armazenamento, a comercialização, a propaganda
comercial, a utilização, a importação, a exportação, o destino final dos resíduos e
embalagem, o registro, classificação, o controle a inspeção e a fiscalização dos
agrotóxicos, seus componentes e afins, e dá outras providências.
A Lei nº 9.605, de 12 de Fevereiro de 1998 – Dispõe sobre Crimes Ambientais.
A Portaria do Ministério do Trabalho nº 3.067, de 12 de Abril de 1988. Previa no Artº
13, da Lei nº 5. 889, de 05 de Junho de 1973. Normas Regulamentadoras Rurais –
Relativas à Segurança e Saúde dos Trabalhadores.
A Portaria nº 168, de 15 de Maio de 1997 da Secretaria de Vigilância Sanitária que
institui, no âmbito do Sistema Único de Saúde, o Programa de Vigilância Sanitária dos
Ambientes e das populações expostas a Agrotóxicos, com o objetivo de estabelecer o
controle do processo saúde-doenças relacionadas com a exposição aos agrotóxicos.
3.3 Legislação do Estado do Rio de Janeiro
A Lei nº 10.692, de 27 de Dezembro de 1991, regulamentada pelo Decreto nº 15.839, de
15 de Junho de 1992. – Dispõe sobre inspeção e fiscalização dos agrotóxicos,
corretivos, fertilizantes, inoculantes, estimulantes e biofertilizantes.
A convivência com os agrotóxicos e a falta de informação da população, tem gerado um
quadro dramático de intoxicações agudas, além de não existirem informações acerca da
morbidade resultante do uso desses produtos.
35
4. A NEUROPSICOLOGIA E OS EFEITOS ADVERSOS A SAÚDE
Não há uma resposta única e simples para o enigma cérebro/mente, mais muitas
respostas ligadas aos inúmeros componentes do sistema nervoso nos seus diversos
níveis de estrutura. A falta de respostas definitivas sobre as questões do cérebro e da
mente não constitui motivo de desespero e não deve ser vista como um sinal de fracasso
nos campos científicos que se encontram atualmente empenhados em saber com certeza
como é que o cérebro cria a mente: as constatações extraídas do livro: O Erro de
Descartes, DAMÁSIO (1994 ) coloca a impossibilidade de termos certezas quanto ao
funcionamento do cérebro, pois raciocinar e decidir pode revelar-se uma tarefa árdua,
especialmente quando estão em causa nossa vida pessoal e seu contexto social e
imediato.
Quando buscamos na Neuropsicologia respostas que não encontramos na
Neurofisiologia, estamos avançando para a busca da compreensão do raciocinar e
decidir num espaço pessoal e social, com a ajuda da emoção. Estamos falando da
memória, do raciocínio e da criatividade, cujo controle é inato, e quando perdemos essa
capacidade por algum motivo, nossa existência fica limitada.
4.1 A Atenção
Um dos fatores preocupantes com relação ao nosso estudo é a atenção e a memória,
fatores estes que ficam comprometidos quando submetidos a processos de intoxicação
aguda ou crônica com maior ou menor intensidade após exposição aos agrotóxicos.
O homem recebe um imenso número de estímulos, porém, entre eles seleciona os mais
importantes e ignora os restantes. A seleção destas informações necessárias, garantem a
segurança dos programas seletivos de ação e a manutenção de um controle permanente
sobre elas, convencionalmente chamados de atenção.
O caráter seletivo da atividade consciente, que é função da atenção, manifesta-se
igualmente na nossa percepção, nos processos motores e no pensamento. Quando não há
36
essa seletividade, a quantidade de informação seria tão desorganizada e grande que
nenhuma atividade se tornaria possível.
Pelo menos dois grupos de fatores asseguram o caráter seletivo dos processos psíquicos,
determinando tanto a orientação como o volume e a estabilidade da atividade
consciente:
O primeiro grupo caracterizará a estrutura dos estímulos externos (ou a estrutura do
campo exterior);
O segundo grupo diz respeito a fatores referentes a atividades do próprio sujeito, ou
seja, estrutura do campo interno:
O primeiro fator é a intensidade (força) e estimulo (grandeza, coloração, etc.);
O segundo fator determina o sentido da atenção, que é a novidade do estímulo ou
diferença entre este e os outros estímulos (incomum, novo). As duas referidas condições
determinam o sentido da atenção (LURIA, 1979).
A organização estrutural da atividade humana é de importância essencial para a
compreensão dos fatores que dirige a atenção do homem.
A psicologia distingue dois tipos básicos de atenção: o arbitrário e o involuntário.
A atenção arbitraria só é inerente ao homem. O principal fato indicador da existência de
um tipo especial da atenção no homem, consiste em que este pode concentrar
arbitrariamente a atenção ora em um, ora em outro objeto, inclusive nos casos em que
nada muda na situação que o cerca (LURIA, l979).
A atenção involuntária é aquela em que é atraída por um estimulo forte, quer por
um estimulo novo ou por um interessante (correspondente à necessidade). Os
mecanismos de atenção involuntária são comuns no homem e no animal. (LURIA,
l979).
O homem pode ir além do limite das leis naturais da percepção, sem se sujeitar
ao efeito de um fundo homogêneo, ou fortes estruturas perceptivas mais discriminadas,
mudando segundo sua vontade as estruturas que lhe são necessárias.
Esses mesmos fenômenos da atenção arbitrária podem ser observados na atividade
intelectual, quando o próprio homem se propõe determinada tarefa e esta determina o
sucessivo fluxo seletivo de suas associações.
37
O distúrbio da atenção é um dos mais importantes sintomas do estado patológico do
cérebro, e seu estudo pode acrescentar dados importantes ao diagnóstico das afecções
cerebrais.
Clinicamente, tem se dado especial importância aos distúrbios da atenção arbitrária.
Estes se manifestam no fato de que o individuo se abstrai facilmente com qualquer
estimulo secundário, mas é impossível organizar-lhe a atenção, atribuindo-lhe uma
tarefa determinada, ou lhe dando uma instrução verbal correspondente.
A instabilidade da atenção arbitraria não surge apenas nos estados patológicos expressos
do cérebro, mas também em estados do sistema nervoso, provocados por outros fatores.
4.2. A Memória
É sabido que cada deslocamento, impressão ou movimento nosso, deixa certo vestígio, e
este se mantém durante um tempo bastante longo e em determinadas condições,
reaparece, e se torna objeto de consciência. Por isto, entendemos por memória: o
registro, a conservação e a reprodução dos vestígios da experiência anterior. Registro
esse, que dá ao individuo a possibilidade de cancelar informações e operar com os
vestígios da experiência anterior após o desaparecimento dos fenômenos que
provocaram tais vestígios.
Todo o reforço dos conhecimentos e habilidades, e a capacidade de aproveitá-los,
pertencem à área da memória. Os fenômenos da memória podem pertencer igualmente
ao campo das emoções e ao campo das percepções, ao reforço dos processos motores e
da experiência intelectual.
O estudo da memória foi uma das primeiras partes da Psicologia à qual se aplicou o
método experimental: fizeram-se tentativas de medir os processos estudados e descrever
as leis a que eles se subordinam. Vários estudiosos então passaram a desenvolver
pesquisas buscando as leis básicas de reforço de reprodução dos vestígios da memória
no homem
As imagens sucessivas constituem a forma mais elementar de memória sensorial. Elas
se manifestam tanto no campo visual quanto no campo auditivo e sensitivo geral.
(LURIA 1979).
38
4.3. Memória Verbal
A memória verbal é a modalidade mais complexa e mais elevada do homem. Não
usamos as palavras apenas para nomear os objetos; o discurso verbal não apenas
participa da formação das concepções e da conservação da informação direta: o homem
recebe o maior volume de conhecimentos por meio do sistema verbal, recebendo
informação verbal, lendo livros, e conservando em sua memória o resultado dos dados
obtidos através do discurso.
A memória visual é em grau ainda menor de fixação imediata que as palavras, sendo
uma conservação das imagens por estas provocadas, uma fixação e conservação dos
resultados da experiência direta que se forma sob o aspecto de concepções.
A memória verbal é sempre uma transformação da informação verbal, uma
discriminação do que nesta há de mais substancial, abstraindo do secundário, sendo
ainda uma retenção não das palavras imediatamente percebidas mas das suas idéias
transmitidas pela comunicação verbal. (LURIA, 1979).
Isto significa que a memória verbal sempre baseia-se num processo complexo de
recodificação do material comunicado, processo este, vinculado ao de abstrações dos
detalhes secundários e de generalização dos momentos centrais da informação.
É por isto que o homem é capaz de “gravar na memória” o conteúdo de um vasto
material obtido de informações verbais e livros lidos, sendo ao mesmo tempo
absolutamente incapaz de conservar na memória o conteúdo literal dessas informações e
leituras.
A memória verbal é também denominada “associativa” ou “lógica”. Isto porque as
palavras nunca provocam em nós noções isoladas, mas cadeias e matrizes inteiras de
elementos associativos ou logicamente conexos.
Os estados patológicos do cérebro são muito amiúde acompanhados da perturbação da
memória. Mas, até recentemente, eram muito pouco conhecidas particularidades
psicológicas que distinguem as perturbações da memória em afecções cerebrais
diferentes pela localização, bem como, os mecanismos fisiológicos que lhe servem de
base. (LURIA 1979).
39
Pesquisas neuropsicológicas minuciosas permitiram fazer uma caracterização posterior,
tanto da estrutura psicológica dessas falhas de memória quanto da analise dos
mecanismos fisiológicos que servem de base às suas perturbações.
Assim podemos buscar uma compreensão melhor de como é importante uma boa saúde
para que a memória seja preservada. Neste sentido, torna-se relevante verificar o quanto
existe de alteração na atenção e memória de pessoas que permanecem por longos
períodos expostas aos efeitos de agrotóxicos.
40
5. O PROGRAMA PETI
Os objetivos do Programa em nível Nacional são: retirar crianças e adolescente do
trabalho perigoso, penoso, insalubre e degradante; Possibilitar o acesso a permanência e
o bom desempenho de crianças e adolescentes na escola; Fomentar e incentivar a
ampliação do universo de conhecimento da criança e do adolescente, por meio de
atividades culturais, esportivas, artísticas e de laser no período complementar ao da
escola, ou seja, na jornada ampliada; Proporcionar apoio e orientação às famílias por
meio da oferta de ações sócio-educativas; Promover e implementar programas e
projetos de geração de trabalho e renda para as famílias.
5.1. Aspectos históricos e geográficos do município de Quissamã
Segundo informações do Departamento de Geografia da Universidade do Estado do Rio
de Janeiro – UERJ – e da Prefeitura do Municipal de Quissamã, o município pertenceu
ao antigo distrito de Macaé, RJ; e foi emancipado em 12 de Junho de 1988 (RUA,
2000).
Quissamã Comporta uma área de 660 km2, e sua população é de aproximadamente
15.000 habitantes; situando-se a uma altitude de 19m acima do nível do mar, tendo
clima quente e úmido, com chuvas no verão, e seco no inverno. Com relação ao solo e a
vegetação, há o predomínio do solo pondolozo (massapé), o qual é ótimo para a cultura
de cana-de-açúcar. Sua faixa litorânea apresenta solo arenoso da restinga, onde estão
sendo desenvolvidas experiências de cultivo do coco, maracujá e do caju. Tendo ainda
muitos campos de vegetação rasteira e brejos, assim como inúmeros rios, canais e
lagoas.
A partir da emancipação, Quissamã adquiriu o direito de administrar seus próprios
recursos, advindos, sobretudo, dos repasses governamentais e dos “royalties” pagos pela
Petrobrás, que em 1991 representaram 96,1% da receita total do município. Havendo
assim, a oportunidade da população usufruir de serviços antes só obtidos nas cidades de
Campos e Macaé. Quissamã sempre teve vida própria, em torno da qual desenvolveu-se
um empreendimento agrícola bastante simples em sua organização, possuindo
características típicas da tradicional sociedade rural: de um lado os senhores de engenho
41
(fazendeiros), e do outro, os escravos. Sendo que em 1845 a população da Freguesia de
Quissamã girava em torno de 2500 habitantes, dos quais 1800 eram escravos.
Em Quissamã, o sistema fundiário é vigente desde o século XVIII, baseado na
monocultura canavieira, e foi o que ditou predominantemente a distribuição
populacional em seu território.
A industrialização da produção de açúcar se deu em 1877, quando foi estabelecido o
primeiro engenho central de toda a América do Sul, gerando a ampliação da produção
de cana, que embora sendo proprietários de grandes extensões de terras, preferiam
adquirir a matéria-prima proveniente dos ex-senhores de engenho que não haviam se
industrializado. A usina modifica as atividades da população; o caráter eminentemente
agrícola passa para o campo industrial sem, contudo, ser urbano. Em suma, o que se
encontra em uma usina é, de um lado, as vantagens econômicas peculiares ao grande
desenvolvimento industrial, e do outro, os problemas econômicos e sociais gerados por
este mesmo desenvolvimento. Modificando o espaço, a usina torna-se o eixo central, a
mola que movimenta, que sustenta a estrutura social, e até política na cidade e no
campo. Paradoxalmente, a própria usina-indústria se encontra no rural, cultivando a
terra e tornando-se agroindustrial. Assim, a principal característica da agricultura do
município é a sua integração com a indústria, pois a usina exerce seu poder hegemônico
na região, na medida em que domina todo o processo produtivo da cana-de-açúcar,
causando subordinação dos pequenos proprietários de terra, e o enfraquecimento dos
movimentos de trabalhadores. Assim, mesmo sendo considerada historicamente uma
das zonas agrícolas mais importantes do Estado, principalmente no século XIX, com a
agroindústria açucareira baseada no latifúndio monocultor, cujo arcaísmo produtivo
condicionou um relativo atraso econômico, conseqüentemente, a falta de investimentos
demográficos, como principalmente os relativos à área de saúde e educação.
Hoje, a diversificação de culturas incentivada pela prefeitura tem modificado esta
realidade, através de projetos incentivadores da fruticultura irrigada, como a plantação e
envasilhamento da água de coco, uma atividade em franco crescimento, o que muda
assim o quadro para uma nova realidade econômica.
Os 50 Km que separam Quissamã da cidade de Macaé determinam uma série de fatores
que revelam realidades distintas quanto à organização espacial, sobretudo pela condição
42
urbana que Macaé vem assumindo nas ultimas décadas, contra a realidade
dominantemente rural de Quissamã.
5.2. A Implantação do PETI no Município
O Município de Quissamã implantou o programa PETI - Programa de Erradicação do
Trabalho Infantil, do Governo Federal, e estendeu os seus benefícios até a idade de 18
anos a todos os participantes.
Desde Julho de 1998, crianças e adolescentes, ex-trabalhadores de canaviais, citricultura
e oleicultura, participam do programa; que atende hoje a 450 crianças e adolescentes
entre 07 e 18 anos. O programa PETI contribui com R$ 25 per capita, e a prefeitura com
mais R$ 25, perfazendo um total de R$ 50 para cada integrante do programa. A
prefeitura, além do ensino tradicional, mantém cursos profissionalizantes através de
convênios com o Serviço Brasileiro de Aprendizagem Industrial – SEBRAI - e Serviço
Nacional de Aprendizagem Comercial - SENAC - para atender estas crianças e
adolescentes.
A exploração do trabalho infantil é decorrente do não cumprimento da Constituição
Federal de 1988 e do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (Lei 8.069/90), e da
cultura perversa que consente o trabalho de crianças pobres, concorrendo com esses
problemas está a falta de fiscalização do trabalho por parte do governo, o fato de pais ou
responsáveis e/ou reivindicarem os direitos das crianças e adolescentes, levando assim a
existência de empregador/empreiteiro que visa somente o lucro com esta mão de obra e
as próprias condições sócio-econômicas das famílias de trabalhadores rurais. Tomando
por base esta realidade visível em Quissamã, o Programa de Prevenção e Erradicação do
Trabalho Infantil, em integração com os Governos Federal e Estadual assim como a
Sociedade Civil procura atender às famílias vulnerabilizadas pela pobreza e exclusão
com filhos na faixa-etária de 07 a 18 anos, que através da Prefeitura procura motivar a
permanência dos jovens nas escolas através de um segundo turno de atividades, onde as
unidades escolares ou de apoio, reforçadas com recursos humanos e materiais
asseguram a alimentação, orientação nos estudos, esporte, laser e desenvolvimento
cultural; pela Secretaria Municipal de Ação Social do Município de Quissamã, desde 12
de novembro de 2000 – Oficio-circular MPAS/SEAS.
43
A tarefa de tirar a criança e o adolescente do trabalho precoce e muitas vezes perigoso,
insalubre, penoso ou degradante não é só do Governo, mais deve se tornar uma
preocupação da sociedade brasileira como um todo. O trabalho precoce, principalmente
nas suas formas mais agressivas, tira da criança e do adolescente a oportunidade de se
desenvolver de forma integral, de estudar e de exercer sua cidadania.(Manual de
Orientações-PETI)-Secretaria de Estado de Assistência Social.
O objetivo do programa, ao oferecer a “bolsa criança cidadã”, é o de criar condições
mínimas para que a família possa prover suas necessidades básicas e completar sua
renda, embora haja muitos casos em que a bolsa seja o único meio de sobrevivência da
mesma.
Como resposta, se espera a dinamização da gestão municipal na área social,
buscando uma otimização de setores ligados a vocação econômica das regiões, através
de parcerias entre os diversos poderes e organizações da sociedade civil, com as três
esferas do governo e também do setor privado.
44
6. MATERIAIS E MÉTODOS
6.1. Objetivo Geral
Trata-se de um estudo para avaliar os efeitos nocivos à saúde de crianças residentes no
município de Quissamã, Estado do Rio de Janeiro, incluídas no Programa de
Erradicação do trabalho Infantil (PETI) causados pela exposição à agrotóxicos, usados
nas lavouras principalmente de cana-de-açúcar, na comunidade de Machadinha, área
rural daquele Município.
6.2. Objetivos Específicos
Avaliar a exposição de crianças e adolescentes aos agrotóxicos;
Levantar dados sócio-demográficos, atividades laborativas, saúde e lazer;
Verificar através de teste neuropsicológico possíveis efeitos causados a “atenção” pela
exposição aos agrotóxicos;
Verificar através de teste neuropsicológico possíveis efeitos causados a “memória” pela
exposição aos agrotóxicos;
Verificar a influência dos agrotóxicos usados na região, segundo a visão de moradores e
trabalhadores da região.
6.3. Desenho do estudo
Foi realizado um estudo seccional, comparativo, tendo como população alvo todas as
crianças e adolescentes de 9 a 18 anos que participam do Programa de Erradicação do
Trabalho Infantil – PETI -, num total de 55 crianças e adolescentes, de ambos os sexos,
moradores da área de Machadinha e sítios vizinhos na área rural, sendo chamado grupo
de estudo.
O grupo controle foi constituído por crianças e adolescentes na mesma faixa etária e
condições socioeconômicas, que residem no perímetro urbano de Quissamã e são
estudantes do CIEP, que fica no centro da cidade. Procuramos nos aproximar o mais
45
possível do grupo de estudo, sendo que os alunos eram solicitados aleatoriamente,
respeitando apenas a idade e sexo, garantindo assim, o mínimo de variabilidade entre os
grupos.
A escolha do grupo controle foi em razão da não exposição direta aos efeitos dos
agrotóxicos usados na região rural. A condição principal seria morar no perímetro
urbano desde o nascimento e nunca ter trabalhado em lavoura.
.
6.4. Aspectos Éticos
Como todos os projetos realizados no Curso de Mestrado em Saúde Coletiva do NESC,
este estudo incorpora os aspectos éticos recomendados pela Resolução 196/96 sobre
Pesquisa Envolvendo Seres Humanos, e não apresenta atividades que possam causar
danos de dimensão física, psíquica, moral, intelectual, social, cultural ou espiritual
nestas pessoas. Em anexo, estão apresentados os “Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido dos indivíduos”, devidamente assinados pelos participantes e seus
representantes.
O projeto contempla a divulgação dos resultados do projeto em primeiro lugar para os
sujeitos da pesquisa.
No tocante à análise crítica dos riscos e benefícios, o estudo verificou a existência de
transtornos para a saúde, que poderão subsidiar o encaminhamento para tratamento
específico, além de oferecer subsídios para programas preventivos tanto para o setor
saúde, como para o de educação formal, assim como educação ambiental. Cabe ressaltar
que o projeto não apresenta procedimentos que possam causar danos à dimensão física,
psíquica, moral, intelectual, social, cultural ou espiritual a estas pessoas.
As informações geradas serão de uso exclusivo da equipe de pesquisa e o pesquisador
responsável garante que nenhum estranho à equipe de pesquisadores terá acesso aos
dados, para que se preserve a confidencialidade das informações, quando for o caso.
Não obstante, a divulgação dos resultados da pesquisa deverá ser pública e em primeiro
lugar endereçada aos sujeitos da pesquisa.
Os sujeitos da pesquisa terão garantia de livre consentimento (modelo em anexo) após
total esclarecimento de todos os benefícios e possíveis riscos que poderão advir do
processo investigatório.
46
6.5. Local onde foi realizado o estudo
Machadinha, local do Município de Quissamã onde foi realizado o estudo, fica na área
rural do município e tem uma população entre 380 e 450 habitantes, e está em fase de
adaptação para transformação em pólo turístico, visto ser uma região onde a grande
maioria dos moradores é de descendentes de escravos, que trabalhavam nos canaviais,
abastecendo a 1ª usina de açúcar do país. E onde há um grande acervo Histórico a ser
mostrado naquela localidade, uma vez que esta população ainda cultiva muito da cultura
adquirida de seus antepassados.
Hoje, a prefeitura de Quissamã, tem um projeto para transformar Machadinha em um
pólo turístico, onde a intenção é preservar o conjunto representativo de um núcleo
cultural que conta com o tombamento da sede da Fazenda Machadinha, construída antes
da abolição da escravidão (l888), sendo que o conjunto era composto de fábrica,
engenho, senzala ou habitação de empregados e capela. A denominação do nome
Machadinha não fica totalmente esclarecida, visto ter três versões, sendo uma de que o
nome fora surgido após a descoberta de uma pedra muito antiga esculpida na forma de
um machado, a outra designação seria em função de um machado indígena, encontrado
na região e outra sugere ao nome de um grande proprietário de terras da região, no
século XVII, Capitão José de Barcelos Machado.
Danças como o Fado, Jongo, Fitas e Tambor, fazem parte da estória deste povo, assim
como suas comidas típicas, que são memórias de uma África muito próxima.
Quando os canaviais crescem ao redor de Machadinha, é como se fizessem um bordado
colorido no centro de uma grande toalha verde. E ai começam, hora, a chuva branca
vinda de um avião, hora, o vermelhão das queimadas chegando na época das colheitas, e
é exatamente neste período que acontecem as grandes mortandades de pequenos
animais que não conseguem escapar dos efeitos dos produtos químicos, jogados por
aviões em pelo menos duas épocas do ano, ou pelo fogo abrasador, levando junto, além
da fertilidade da terra a alma melancólica pela destruição.
Enquanto a usina esteve fechada, agravou-se o estado de miserabilidade na região,
assim como o agravamento do alcoolismo, uma vez que a demanda de trabalho gira em
torno do plantio e colheita da cana.
47
Logo que cheguei a Machadinha, conheci a restauradora Helena Fortes, da
Universidade de Viçosa que ali se encontrava fazendo um trabalho de restauração do
acervo histórico de toda as peças encontradas na região desde os tempos dos barões.
São muitas relíquias encontradas, peças raras que estavam quebradas ou se deteriorando
pelo mau estado de conservação. Como o trabalho é minucioso e a cada etapa da
restauração precisa ser documentada com fotos, portanto havia sempre uma máquina
fotográfica à disposição. E foi em uma manhã quando estávamos próximas à capela que
ouvimos o barulho de um “avião”, que pudemos fotografá-lo em plena atividade a
menos de trinta metros das residências no momento em que borrifava agrotóxico no
canavial ao redor de Machadinha. O avião quase tocava o solo ao executar sua
atividade, fazendo todo o entorno de Machadinha, como os relatos de moradores que já
estavam acostumados a identificá-los em suas atividades. Foi neste momento que
percebi que apesar das crianças e adolescentes estarem fora do trabalho nos canaviais,
não somente eles, mas todos os moradores de Machadinha estavam incontestavelmente
sendo contaminados pelos resíduos de agrotóxicos que ali são depositados
regularmente, em determinadas épocas, durante o plantio até a colheita nos canaviais.
6.6. Etapas e procedimentos do estudo de campo
As etapas do estudo de campo estão apresentadas a seguir:
Os principais procedimentos realizados em ambos os grupos incluíram a aplicação de:
.Visitas de sensibilização na comunidade e secretarias de Bem Estar Social, Educação e
saúde.
Aplicação de questionário para ambos os grupos, com a finalidade de confirmar ou não
a exposição aos agrotóxicos, assim como dados sócio-demográficos, atividades
laborativas, renda familiar, saúde, lazer, etc.
Execução do Teste Neuropsicológico, feito através do teste TCA VIS para medir a
capacidade de sustentar a atenção em tarefas repetitivas e monótonas;
Aplicação do Teste Neuropsicológico Bender para determinar o nível de maturação da
função Guestáltica visomotora, (memória);
48
Realização de entrevistas com moradores e trabalhadores na região.
Em um primeiro momento houve contato com os secretários responsáveis pelas
secretarias, em princípio de Bem-estar Social onde recebi informações do coordenador
do Projeto PETI Cristiano Corrêa Peçanha onde tive todo o apoio e as informações
necessárias para começar a estruturar o trabalho de campo.
Após informações sobre todas as comunidades onde o PETI atuava, suas características
e o número de crianças e adolescentes cadastrados no programa, ficou decidido que
começaria pela comunidade de Machadinha, por ser a que mais tinha crianças e
adolescentes que trabalhavam na lavoura e ser um local rodeado por canaviais e outras
plantações que fazem uso de agrotóxicos.
Nesta reunião ficou estabelecido que a secretaria disporia de um meio de transporte para
me levar a comunidade, o que foi feito durante todo o período em que o trabalho de
campo foi efetuado.
As visitas eram feitas as 2ª o dia todo e 3ª feira, até as 12 horas, para a coleta de dados.
A Secretaria de Educação atuou de forma importante no projeto, pois todas as crianças
participantes do PETI, devem freqüentar a escola, para receberem a bolsa que o
Governo Federal faz jus a cada um dos inscritos, foram também de suma importância
informações dadas pela direção da escola sobre as crianças inscritas no Programa PETI.
O apoio da Secretaria, assim como uma carta de recomendação me apresentando, e
facilitando o acesso a todas as escolas do município, tornou o trabalho mais fácil.
A Secretaria de Saúde também foi contatada, e se colocou a disposição,
disponibilizando espaço em qualquer unidade de saúde para que fosse viabilizado a
aplicação dos instrumentos na população em estudo (testes BENDER e TCAvis).
Um reconhecimento do lugar foi feito, onde pude estar no espaço onde atua o Programa
PETI, que é o mesmo da associação de moradores e onde acontece todos os eventos
importantes da comunidade. Fica em uma das casas de Senzala, com um salão, cozinha
e banheiro, até então uma área rural de Quissamã.
O posto de saúde também faz parte do complexo da senzala, fica situado onde foi o
armazém da fazenda Machadinha. Fica no mesmo terreno que a Capela (nos fundos).
Neste posto de saúde foi disponibilizada uma sala onde pude trabalhar. Inicialmente na
49
sala onde guardam medicações e posteriormente na sala do dentista, nos dias em que
não havia atendimentos odontológicos.
Foi feito um primeiro encontro com os responsáveis pelas crianças e adolescentes
participantes do programa PETI, a fim de que compreendessem que tipo de estudo seria
feito e que instrumentos seriam utilizados. Mesmo não sendo método invasivo, os
responsáveis receberam todos os esclarecimentos e assinaram o termo de consentimento
esclarecido (em anexo).
Para execução do Projeto na área de estudo fiquei sediada no município de Quissamã,
no centro, aonde chegava no domingo à noite, deslocando-me através de um carro
cedido pela Secretaria de Bem Estar Social, que me pegava na porta da prefeitura às 8h
de 2ªfeira me levando para a comunidade de Machadinha, onde permanecia até as 17
horas. Na terça ficava na comunidade ate 12 horas. Normalmente saíamos às 8h, da
prefeitura, junto com outros profissionais que participavam de outros programas e
ficavam em comunidades no trajeto para Machadinha, continuando a viagem por mais
30min. mais ou menos, e voltando com o mesmo carro às 17h.
Chegava por volta das 8:45, iniciando as entrevistas, sendo ajudada pelo agente de
saúde do posto (Marciano) que é morador e conhece todos os habitantes da comunidade,
podendo assim facilitar meu contato com as crianças e adolescentes. O local onde as
crianças tem atividades do PETI, fica há uns trinta metros do Posto de Saúde, onde eram
feitos os testes. Marciano (agente de saúde) avisava a monitora do PETI, e ela
encaminhava as crianças e adolescentes para que eu pudesse proceder a aplicação dos
testes, eram encaminhados dois alunos de cada vez.
Os mais jovens, de 12 e 13 anos, iam contentes atrás de novidades, as com mais idade
14 em diante eram mais resistentes, tinha receio e achava que ”aquilo” era para
descobrir se eram ”malucos”. Muitas vezes fui até o PETI, conversar e convencer os
adolescentes a fazerem o teste.
Apenas um garoto se recusou de início, mas ia sempre com os colegas (como
companhia) quando sugeri a ele que respondesse o questionário, e se depois não
quisesse fazer o teste, não insistiria. Após responder o questionário e ver que não estava
investigando se teria voltado a trabalhar, mesmo participando do Programa, (o que é
proibido, e existe uma fiscalização por parte do conselho tutelar), não mais ficou
50
resistente e fez todos os testes sem problemas. No total ficava com cada participante
entre 1 hora e 30 min. a 2horas.
É importante frisar que todos os instrumentos foram aplicados por mim, os apoios
recebidos foram apenas no sentido de facilitar meu trabalho.
As vezes os meninos resistiam em deixar o futebol para irem ao Posto de Saúde,
fazerem os testes, porem quando viam os colegas retornando, comentando como eram
os testes, a resistência era quebrada e eles mesmos pediam para fazerem os testes.
Inicialmente estava programado para irmos a todos os pólos do PETI, onde seria feito
uma amostra representativa da população alvo pertencente ao PETI. Eram crianças que
não estavam mais trabalhando na lavoura, pois uma das exigências do PETI é que não
mais trabalhassem, porem esta condição muitas vezes não pode ser cumprida pela falta
de pagamento do valor referente à bolsa, e as crianças e adolescentes voltavam para o
trabalho, como forma de sobreviverem, uma vez que o governo atrasa o pagamento das
bolsas, às vezes em até quatro meses, e não raro, este é o único recurso que a família
tem para sobreviver, quando os responsáveis pelo sustento da mesma encontram-se
desempregados.
Quando presenciei o avião borrifando agrotóxico tão próximo das residências, percebi
que mesmo não estando trabalhando na lavoura, estavam recebendo diretamente
resíduos do produto uma vez que todo entorno de Machadinha é de plantação de cana e
portanto, não há como escapar da contaminação. Nem todos os pólos do PETI, ficam
perto de lavouras, são outras atividades como a pesca, por exemplo, o que
comprometeria o estudo. Assim, após analisarmos a situação optei por fazer o estudo
apenas no pólo de Machadinha, com todas as crianças do PETI, com idade entre 9 e 18
anos, estruturando assim o “grupo de estudo”
Como havia iniciado por Machadinha, onde havia mais crianças que saíram de trabalhos
na lavoura, permanecia o dia todo na região, até as l7horas, quando a condução
destinada a me levar de volta chegava, ficando algumas vezes horas sem ter ninguém
para testar, uma vez que é freqüente terem que voltar para suas casas para fazer a
própria refeição e a dos irmãos mais novos, pois a maioria moram com os avós, ou com
o pai que trabalha na lavoura, sendo comum também os pais ou responsáveis serem
alcoólatras. Assim, tinham que sair mais cedo para fazerem os trabalhos domésticos, e
se aprontarem para pegar o ônibus que os levava para a escola, sendo que alguns deles
51
moravam em sítios longe de onde ficava a sede do PETI, tendo assim estas crianças seu
tempo limitado até as 10horas, o que me sobrava entre uma e duas horas, em cada
período para trabalhar com eles, às vezes conseguia entrevistar apenas duas ou três
crianças durante todo o dia.
Nos horários que não estava testando as crianças e adolescentes, ia conhecendo as
estórias fantásticas daquela comunidade de descendentes de escravos, que ainda hoje
vivem nas mesmas residências “Senzala” onde seus ancestrais viviam a mais de 350
anos, vivendo quase nas mesmas condições que eles, são as mesmas casas, ainda de
chão batido, as telhas originais, feitas pelos escravos “nas coxas”, hoje com telhado
precário onde a chuva penetra por buracos que o tempo se encarregou de fazer. E assim
continuam ainda preservando a mesma cultura no preparo dos alimentos, na forma das
danças e de organizarem suas festas, guardando suas estórias e lendas, passadas pelos
mais velhos. Machadinha é reconhecida como uma grande família, onde de alguma
forma quase todos são parentes. As brigas pelo poder relacionado à associação de
moradores, assim como os “casos de suicídio” que como reza a lenda, a cada geração
três vidas de jovens são necessários para acalmar os espíritos; não costumam ser
comentadas na comunidade, mas o relato das pessoas “de fora” que contam, sobre as
mortes, relatam que as mesmas são de maneira parecida, sendo porém um assunto que a
população não gosta de comentar. Por outro lado, ficam a vontade e satisfeitos de
contarem as estórias que ouviam de seus avós sobre o tempo da escravidão e a forma
com que viviam, e a opção por continuarem morando em machadinha mesmo depois de
serem libertados.
7. Os Instrumentos
7.1. Questionário estruturado para os adolescentes
Uma entrevista com cada participante do estudo, individualmente (semi-estruturada)
com dados sobre identificação, história ocupacional incluindo exposição aos
agrotóxicos e dados de morbidade. (questionário em anexo)
52
7.2. Teste Neuropsicológico Bender
O teste “Visual Motor Gestalt” foi desenvolvido por Lauretta Bender em 1938 a partir
de conceitos e materiais dos fundadores da Psicologia Gestalt: Max Wertheimer; Kurt
Koffka e Wolfgang Köhler. Bender escolheu desenhos de Wertheimer’s (1923),
baseados nos princípios da Psicologia Gestalt e foi usado principalmente como
ferramenta clínica para observar o desempenho de seus pacientes.
A facilidade da administração do teste Bender contribuiu para torná-lo popular e muito
aplicado pelos psicólogos. Ao longo do tempo modificações e revisões foram sendo
feitas, tendo sido feito uma variação do teste sob stress, por Lezak (1995) e padronizada
por Brito e Santos (em 1996), assim como estudos posteriores os levaram a acrescentar
em 1998, mais modalidades de administração: (imediata e tardia).
Estudos desenvolvidos a partir do teste Bender mostrou que a idade, classe social,
fatores sociais, grupo étnico e nível de escolaridade impacta significativamente no teste
(koppitz 1975), bem como, indicadores emocionais são medidas importantes (Brito e
colaboradores 1998), o que pode levar à detecção de dificuldades na aprendizagem,
tornando assim uma ferramenta importante para a neuropsicologia.
Os procedimentos de administração das modalidades do teste serão descritas a
seguir:
O examinado realiza uma tarefa gráfica com os modelos a mostra, conduzido pelo
examinador, após este receber todas as informações necessárias, como devera proceder,
sendo informado que é uma reprodução gráfica. O teste está associado a diversas
funções de inteligência, percepção visual, habilidade motora manual, memória,
conceitos temporais e especiais e capacidade de organização ou representação, podendo
medir no sujeito o nível de maturação da função guestaltiva visomotora através da copia
das figuras guestálticas, estabelecendo assim o nível de maturação do individuo; é usado
também como teste projetivo.
O teste é suscetível a diferenças, que são:
Atrasos globais na maturação,
Incapacidades verbais especificas,
Fenômenos de dissociação que perturbam o conjunto da personalidade,
Desordens dos impulsos,
Desordens perceptuais,
53
Desordens confusionais.
A guestáltica pode ser definida como aquela função do organismo integrado, o qual
responde a um conjunto de estímulos dada como um todo, sendo a mesma resposta a um
conjunto, um padrão, uma guestalt. Todos os processos integrados do sistema nervoso
se produzem em conjuntos, padrões e guestalt.
É importante ver como surgem genericamente as guestalts nas crianças e quais são os
processos de amadurecimento (maturação).
A psicologia da Guestalt, tal como foi desenvolvida por Wertheimer, Kohler e Koffka,
deu um novo impulso a psicologia guestalt, e com ela também uma nova compreensão
para apreender as relações entre o todo e suas partes, pois mostrou que a percepção não
pode ser interpretada como uma soma de sensações singulares (particulares).
O organismo não responde a estímulos locais com respostas locais. Responde o
conjunto de estímulos com um processo total, que é a resposta do organismo em seu
conjunto a situação total.
O teste tem 4 etapas de aplicação - normal, stress, memória imediata e memória tardia,
sendo composto por 9 (nove) pranchas cada uma com um desenho especifico.
1ª Normal – é solicitado a cópia do desenho que será mostrado através de pranchas,
uma a uma, para serem copiadas, sempre respeitando o tempo de cada indivíduo.
2º STRESS - O indivíduo é apresentado ao teste pela 2ª vez, mudando as instruções para
que faça o mais rápido que puder, ao mesmo tempo em que o aplicador vai interferindo
ruidosamente no ato da aplicação para gerar stress.
3º Memória Imediata – É solicitado que seja feito o desenho de todas as figuras,
anteriormente mostrado através das pranchas, utilizando somente a memória.
4º Memória Tardia - Após 30 minutos, solicitar que desenhe todas as figuras
representadas nas pranchas, novamente utilizando apenas a memória.
Todas as etapas são cronometradas e as atitudes dos pesquisados, atentamente
observadas acerca de reações diferenciadas. As evidências obtidas indicam que os
pacientes com disfunções consistem no exame da memória de recenticidade.
Nas disfunções apresentam uma dissociação entre a preservação da memória de
reconhecimento e um comprometimento da memória para a ordenação temporal dos
estímulos.
54
7.3. Teste Neuropsicológico TCA Vis
O teste neuropsicológico TCA Vis (Teste Computadorizado de Atenção Visual) foi
desenvolvido em 1999 por Schmidt e Manhans, com registro no Instituto Nacional de
Propriedade Industrial e reconhecido no ano de 2004 pelo Conselho Federal de
Psicologia, para uso clínico.
O TCA Vis foi o primeiro CPT (Continuos Performance Teste) para Windows no
mundo, e ele consta como um conjunto de testes usado por neuropsicólogos para medir
a atenção – que é um domínio cognitivo importante, assim como a linguagem, memória
e cognição em geral – em atividades monótonas e repetitivas. O teste é apresentado ao
examinando, tendo o mesmo um tempo de 5min. para um treinamento, que só iniciará
quando o testando se apresentar apto; e , apesar de ser um teste computadorizado, não é
necessário ter conhecimento prévio ou mesmo ter qualquer familiaridade com um
computador, é um teste de fácil aplicação.
O número de omissões, número de erros, tempo de reação e variabilidade do tempo de
reação são informações relevantes para se obter subsídios que nos levam a identificar
uma pessoa com déficit de atenção ou sua condição atencional no momento. Outro
fator que pode comprometer a atenção seria uma lesão cerebral difusa. É, portanto, o
primeiro nível de avaliação neuropsicológica e que abre caminho para se entender os
distúrbios de aprendizagem.
55
8. RESULTADOS
Participaram do estudo 110 crianças e adolescentes, sendo 55 de cada grupo (estudo e
controle). Pela Tabela 1 observa-se que estes dois grupos eram iguais para as variáveis
idade e sexo. Cada um dos dois grupos apresentou 63,3% dos menores na faixa etária de
9 a 14 anos e 36,4% de 15 ou mais. Quanto ao sexo 56,4% eram do sexo masculino e
43,6% do sexo feminino. O questionário foi aplicado em todos os 110 indivíduos do
estudo, no teste neuropsicológico TCAvis, foram aplicados no grupo de estudo em 44
indivíduos, sendo no grupo de comparação 45, por interferência de vários fatores como
o tempo em que permaneciam no pólo do PETI e que dificultaram a aplicação na
totalidade do universo pretendido.
Não houve diferença significativa em ambos os grupos, para a escolaridade, sendo
94.5% no grupo estudo e sua totalidade l00% no grupo controle, na categoria ensino
fundamental incompleto. Quanto ao tempo de vinculação ao PETI no grupo estudo,
63,5% dos adolescentes estavam vinculados entre 6 meses a 2 anos, 23% acima de dois
anos e 13,5% com até 6 meses de veiculação.
A Tabela 2 mostra a distribuição de variáveis sobre exposição a produtos químicos da
população infanto-juvenil estudada. Quanto ao contato com produtos químicos, 25,5%
dos entrevistados do grupo de estudo confirmaram ter tido algum tipo de contato, 27,3%
alegaram não ter tido nenhum contato e 47,3, são integrantes do PETI, embora nunca
tenham trabalhado na lavoura. Com relação a freqüência deste contato 23,6% relataram
ser eventual, 7,3% alegaram ser semanal este contato , sendo de apenas 1,8% o contato
diário, observando que variava a forma deste contato, uma vês que a maioria não
borrifava o produto mas ajudava na preparação ou na hora de guardar; o que fazia com
que a grande maioria ficasse confusa na hora de responder, 40% não usavam nenhuma
proteção durante o manuseio, sendo apenas 7.3% usavam algum tipo de proteção. A
proteção na cabeça em que 36,4% se referiam tratava-se simplesmente de um boné, e
quanto ao local em que eram guardados os produtos, 7,3% referiam ter um local
apropriado para fazê-lo, 16,4% relataram não ter um local específico para guardar o
56
produto e 10,9% afirmaram que o produto era guardado em suas residências, sem
nenhum cuidado especial.
Uma comparação da distribuição de variáveis sobre morbidade referida da população
infanto-juvenil estudada está apresentada na Tabela 3. Nota-se que o grupo de estudo,
num total de 23,6% referiram ter tido algum problema de saúde nos últimos 15 dias na
época do inquérito, e 76,4% alegaram que nenhuma ocorrência havia ocorrido neste
período, sendo muito próximo deste resultado o grupo de comparação com 27,3% para
sim e 73,7% para nenhuma ocorrência. Resultado semelhante também ocorreu para os
dois grupos, quando a pergunta foi para alguma ocorrência nos últimos 5 anos.
Houve diferença estatisticamente significante (Qui Quadrado Yates Corrected
X2 = 4,95 p< 0,02) em relação a ocorrência de acidente de trabalho durante a vida
produtiva, com uma maior proporção (27,3% para o grupo de estudo, e 9% no grupo
controle, que relataram apenas acidentes em pequenas tarefas caseiras).
Nas ocorrências com doenças causadas pelo trabalho, verificou-se um total de 21,8%
confirmando algum tipo de problema de saúde como conseqüência do trabalho, sendo
que 25,5%, alegaram não perceberam nenhum tipo de problema relacionado ao trabalho,
52, 7, nunca trabalharam, assim como o grupo comparação.
A Tabela 4 mostra uma comparação da distribuição das variáveis sobre sintomas
referidos entre os grupos estudo e comparação. Ocorreu uma maior proporção em todos
os sintomas referidos para o grupo estudo, sendo esta diferença significativa para a
variável desmaio (X2 = 3,64 p< 0,05) e para indisposição física (X2 = 3,66 p< 0,05) e
altamente significativa para as variáveis enjôo (X2 = 16.17 p< 0,001) e dores
abdominais (X2 = 33.85 p< 0,001).
Não descartando os possíveis sintomas relacionados a exposição aos agrotóxicos, temos
que levar em consideração a proximidade no que se refere as condições
socioeconômicas dos dois grupos, pois ambos estão sujeitos a inúmeros problemas de
saúde como: desnutrição, verminoses, anemias, gerados pela péssima qualidade de vida,
acrescidos com uma dieta pobre e ausência de saneamento na região em que ambos os
grupos residem, tornando assim esta população ainda mais vulnerável
57
TABELA 1: DISTRIBUIÇÃO DE VARIÁVEIS DE IDENTIFICAÇÃO DA
POPULAÇÃO INFANTO-JUVENIL ESTUDADA.
MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.
Grupo Estudo Grupo
Comparação
N % N %
Idade (anos)
9 a 14 anos 35 63.6 35 63.6
15 ou mais 20 36.4 20 36.4
Sexo
Masculino 31 56.4 31 56.4
Feminino 24 43.6 24 43.6
Escolaridade
Fundamental Incompleto 52 94.5 55 100
Fundamental 1 1,8 - -
2º Grau Incompleto 2 3,6% - -
Tempo Médio de Vinculação no Programa
Até 6 meses 10 13,5 - -
6 meses a 2 anos 33 63,5 - -
Acima de 2 anos 12 23,0 - -
58
TABELA 2: DISTRIBUIÇÃO DE VARIÁVEIS SOBRE EXPOSIÇÃO Á
AGROTÓXICOS DA POPULAÇÃO INFANTO-JUVENIL ESTUDADA
MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.
Contato com Agrotóxicos Número % Sim 14 25.5 Não 15 27.3 Não se aplica 26 47.3 Frequência de Contato Diário 1 1.8 Semanal 4 7.3 Eventual 13 23.6 Nenhum e não se aplica 37 67.3 Manuseio de Agrotóxicos Sim 13 23.6 Não 12 21.8 Não se aplica 30 54.5 Uso de Roupa Especial para Proteção Sim 4 7.3 Não 22 40 Não se aplica 29 52.7 Uso de Proteção Especial na Cabeça Sim 20 36.4 Não 6 10.9 Não se aplica 29 52.7 Local de Guarda dos Produtos Casa 6 10.9 Outro local não apropriado 9 16.4 Local Apropriado 4 7.3 Não se aplica 36 65.5
Das crianças e adolescentes que tiveram contato com agrotóxicos, apenas 12 tinham
função de trabalhar com o produto.
59
TABELA 3: DISTRIBUIÇÃO DE VARIÁVEIS SOBRE MORBIDADE REFERIDA
NA POPULAÇÃO INFANTO-JUVENIL ESTUDADA.
MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.
Grupo Estudo Grupo Controle
N % N %
Problema de Saúde nos Últimos 15 dias Sim 13 23.6 15 27,3
Não 42 76.4 40 73,7
Acidente de Trabalho durante Vida
Produtiva
Sim 15 27,3 00 0,0
Não 40 73,7 55 100,0
Internação nos Últimos 5 anos Sim 23 41.8 24 43.6
Não 23 41.8 22 40
Não se aplica 9 16.4 9 16.4
Ocorrência de Doença relacionada ao
Trabalho
Sim 11 21,8 - -
Não 14 25,5 - -
Não se aplica 29 52,7
Diferença estatisticamente significante através do teste de comparação de proporções
(Qui Quadrado Yates Corrected) para a variável acidente de trabalho durante a vida
produtiva X2 = 4,95 p< 0,02.
60
TABELA 4: DISTRIBUIÇÃO DE VARIÁVEIS SOBRE SINTOMAS REFERIDOS
DA POPULAÇÃO INFANTO-JUVENIL ESTUDADA –
MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.
Grupo Estudo Grupo
Sintomas Referidos N % N %
Dores de Cabeça 46 83.6% 43 78.2% Enjôo 36 65.5% 14 25.5%
Dores nas Costas 20 36.4% 17 30.9%
Dores Abdominais 48 87.3% 17 30.9%
Tontura 29 52.7% 19 34.5%
Desmaio 9 16.4% 2 3.6%
Falta de Ar 17 30.9% 16 29.1%
Indisposição Física 31 56.4% 20 36.4%
Diferenças estatisticamente significantes através do teste de comparação de proporções
(Qui Quadrado Yates Corrected) para as variáveis:
Enjôo: X2 = 16.17 p< 0,000;
Dores abdominais: X2 = 33.85 p< 0,000;
Desmaio: X2 = 3,64 p< 0,05;
Indisposição física: X2 = 3,66 p< 0,05;
61
RESULTADOS DO TESTE NEUROPSICOLÓGICO TCA Vis
Pela Tabela 5 e Gráfico 1, observamos que existe uma tendência do grupo estudo (3,2%
para 1,6%) em relação ao grupo comparação, referente ao Erro por Omissão, que
representa um estado de “distração” (Mann-Whitney = 802.500; Wilcoxon W =
1.837.500; Z = -1.583 p = 0,113).
Quanto ao Percentual de Erro por Ação (Tabela 6 e Gráfico 2), observa-se uma
diferença significativa entre o grupo de estudo e o de comparação, que representa um
estado de “impulsividade motora” (Mann-Whitney = 715.000; Wilcoxon W =
1.750.000; Z = -2.259 p = 0,024).
Pela Tabela 7 e Gráfico 3, pode-se verificar que não existe diferença significativa entre
os grupos estudo e comparação para a variável Tempo de Reação (Mann-Whitney =
915.000; Wilcoxon W = 1.905.000; Z = -0,616 p = 0,538).
No tocante à Variabilidade do Tempo de Reação (Tabela 8 e Gráfico 4), as diferenças
entre os dois grupos estudados não mostraram significância estatística (Mann-Whitney
= 838.500; Wilcoxon W = 1.873.500; Z = -1,243 p = 0,214).
Através destes quatro tipos de testes, pode-se concluir que a capacidade tensional do
grupo estudo está mais afetada que a do grupo comparação.
62
TABELA 5: PERCENTUAL DE ERRO POR OMISSÃO NO TESTE TCA Vis. –
MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.
PERCENTUAL DE ERRO
POR OMISSÃO
GRUPO ESTUDO (n = 44)
GRUPO COMPARAÇÃO
(n = 45)
Média 3,2 1,6
Desvio Padrão 7,7 2,9
Mínimo 0 0
Percentil 25 0 0
Mediana 1,1 0,6
Percentil 75 3,3 1,7
Máximo 48,9 14,4
GRÁFICO 1 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO PERCENTUAL DE ERRO POR
OMISSÃO
4544N =
Grupo
Não expostoExposto
Per
cent
ual d
e er
ro p
or o
mis
são
60
50
40
30
20
10
0
-10
65676276
5824
44
63
TABELA 6: PERCENTUAL DE ERRO POR AÇÃO NO TESTE TCA Vis. –
MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.
PERCENTUAL DE ERRO POR AÇÃO
GRUPO ESTUDO (n= 44) GRUPO COMPARAÇÃO (n = 45)
Média 9,7 7,2
Desvio Padrão 6,0 5,5
Mínimo 0,6 0,6
Percentil 25 5,2 3,1
Mediana 9,7 5,0
Percentil 75 13,0 11,7
Máximo 27,8 23,3
GRÁFICO 2 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO PERCENTUAL DE ERRO POR
AÇÃO
4544N =
Grupo
Não expostoExposto
Per
cent
ual d
e er
ro p
or a
ção
30
20
10
0
-10
43
64
TABELA 7: TEMPO DE REAÇÃO NO TESTE TCA Vis. –
MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.
TEMPO DE REAÇÃO
GRUPO ESTUDO (n= 44) GRUPO COMPARAÇÃO (n = 45)
Média 411 417
Desvio Padrão 104 54
Mínimo 39 298
Percentil 25 362 373
Mediana 407 403
Percentil 75 473 458
Máximo 840 552
GRÁFICO 3 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DO TEMPO DE REAÇÃO
4544N =
Grupo
Não expostoExposto
Tem
po d
e re
ação
1000
800
600
400
200
0
-200
13
44
65
TABELA 8: VARIABILIDADE DO TEMPO DE REAÇÃO NO TESTE TCA Vis. –
MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.
VARIABILIDADE DO TEMPO DE REAÇÃO
GRUPO ESTUDO (n= 44) GRUPO COMPARAÇÃO (n = 45)
Média 115 106
Desvio Padrão 43 42
Mínimo 57 52
Percentil 25 87 78
Mediana 113 96
Percentil 75 135 128
Máximo 228 296
GRÁFICO 4 – REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DA VARIABILIDADE DO TEMPO
DE REAÇÃO
4544N =
Grupo
Não expostoExposto
Var
iabi
lidad
e do
tem
po d
e re
ação
400
300
200
100
0
5844
66
RESULTADOS DO TESTE NEUROPSICOLÓGICO BENDER
Foram observadas diferenças para os quatro tipos de memória, com nítido agravamento
da capacidade de retenção de memória no grupo de estudo em relação ao grupo
comparação (ver Tabela 9).
Tabela 9 – RESULTADOS DO TESTE BENDER
MUNICÍPIO DE QUISSAMÃ, RIO DE JANEIRO, BRASIL, 2003.
GRUPO ESTUDO GRUPO COMPARAÇÃO
NORMAL
Média 1,2024 0,5710
Desvio Padrão 1,76355 1,29792
ESTRESSE
Média 0,7598 0,2463
Desvio Padrão 1,20558 0,95782
MEMÓRIA IMEDIATA
Média 0,5183 - 0,2317
Desvio Padrão 1,20184 0,90558
MEMÓRIA TARDIA
Média 0,4461 -0,1907
Desvio Padrão 1,64363 0,86661
A facilidade na aplicação e compreensão do teste Bender foi fundamental para a escolha
do mesmo no estudo, considerando que existem integradas disfunções patológicas no
produto final da reprodução viso-motora.
67
Os resultados analisados mostraram que o grupo de estudo teve reprodução
diferenciada, relativamente ao grupo de comparação, para todas as modalidades do
teste: Normal, Estresse, Memória Imediata e Memória Tardia, com significância
estatística para a modalidade Memória Imediata. As outras modalidades sugerem uma
diferença quando voltadas para uma análise mais qualitativa.
Quando fazemos uma análise mais complexa dos resultados, nos deparamos com um
olhar mais atento à representação dos erros apresentados durante o teste, que nos
permitem inferir as seguintes dificuldades neuropsicológicas: Planejamento pobre;
Incapacidade de organização; Uma instabilidade emocional, que resulta em um pobre
controle motor e escassa capacidade de integração; Tolerância menor à frustração;
Ansiedade e conduta retraída; Impulsividade e agressividade.
Os dados nos direcionaram a reconhecer que pessoas expostas a produtos químicos, têm
uma performance diferenciada na reprodução do teste, com tendência significativa para
transtornos neuropsicológicos.
68
Avião em atividade próximo de machadinha
9 Entrevistas com Moradores Locais
Foi buscada através das entrevistas a descrição do contexto comunitário a partir dos
dados não estruturados. Fiquei interessada em fazê-las buscando perceber o imaginário
dessas pessoas a respeito do tema em estudo. Este tópico não pretende ser exaustivo
como uma análise qualitativa, mas apenas servir como um olhar para ilustrar e inspirar
novos estudos ou apontar novos objetos.
Dessa forma, foram feitas sete entrevistas não diretivas, com seis moradores na
localidade e uma pessoa que lá trabalha. O número de entrevistas não foi estipulado a
priori, pois julgamos que em um determinado momento elas seriam suficientes, com
base na recorrência das categorias empíricas no discurso dos entrevistados.
No decorrer de todo o trabalho de campo, vivenciamos algumas situações que poderiam
ser descritas como surpresas. Sempre nos surpreendemos diante de questões onde o
fator humano está em foco.
69
São pessoas representativas da comunidade que moram e trabalham na região, e foram
escolhidos aleatoriamente entre os moradores que se dispuseram a colaborar conosco,
tendo a grande maioria nascido na comunidade de Machadinha, onde alem de morar
trabalham ali mesmo.
As mesmas serão identificadas apenas pelas iniciais dos nomes, visando sigilo para
maior tranqüilidade das mesmas. C...entrevista de n.01, é agente de serviços gerais, no
posto de saúde de Machadinha e mora na comunidade desde o nascimento, hoje com
36.anos.
M.R.P entrevista de n. 02, é agente comunitário de saúde, mora próximo a comunidade,
também em área rural, no sitio Santa Luzia, trabalha no Posto de Saúde da comunidade
e tem 26.anos.
M.H.S entrevista de n. 03 é agente comunitária de saúde, trabalha no Posto de Saúde da
comunidade e é uma das pessoas da comunidade descendente de escravos e tem direito
a posse em uma das casas da “senzala”, tem 46 anos.
C...entrevista n.04, morador da comunidade , hoje com 72 anos, aposentado, nasceu em
Machadinha, neto de escravos, e um dos mais antigos, conta as estórias que ouvia dos
avós que o criaram.
A.D.A entrevista n. 05, morador do bacurau, vizinha de Machadinha, é um dos
adolescentes que fazem parte do PETI, tem 15 anos.
G.R.A entrevista n. 06, nasceu e foi criada em Machadinha, neta de escravos, também
mora em uma das casas da “senzala”, atual presidente da associação de moradores,
respeitada pelos mais velhos e temida pelos mais jovens, tem 62 anos.
M.J.S.P entrevista n. 07, Professora a 7 anos em Machadinha, onde hoje é Diretora do
colégio municipal da região, localizado próximo a “senzala”, moradora de Quissamã,
área urbana, tem 48 anos.
As entrevistas nortearam-se por assunto objeto do estudo, tendo os resultados apontado
uma homogeneidade no que se refere as concepções das informações a partir do
material coletado.
A descrição se organiza em torno de um conjunto de aspectos que nos impactaram e
julgamos relevantes para complementar o estudo em questão. Parece-nos enfim,
enriquecedor pontuar os nós críticos articulados pelos entrevistados como uma
70
contribuição no sentido de pensarmos em mudanças futuras que valorizem a Saúde no
meio-ambiente enquanto preservação do ecossistema..
Em síntese, verificamos a visibilidade e o impacto no processo de pulverização dos
produtos tóxicos no cotidiano da comunidade.
“...É, quando o avião vem próximo a plantação que vai despejar o (veneno), dá pra
gente ver aquele jato saindo de trás dele, parecendo até esquadrilha da fumaça, aquele
jato bem forte dá pra vê visivelmente que está despejando (veneno) e solta muita
quantidade e bem próximo a lavoura(...)“(Entrevista 05).
Está descrito em Toxicologia Ambiental. Brasil/MS/Funasa... Que diariamente
inalamos, individualmente, cerca de 10 a 20 mil litros de ar contendo inúmeros tipos de
poluentes sob forma de gases e partículas respiráveis como fibras e até microorganismos
vivos. Enquanto outros são lançados e disseminados amplamente n atmosfera,
responsável pelo transporte e veiculação desses poluentes para os demais
compartimentos ambientais.
“...É duas vezes no ano, vários dias, porque uma vez eles colocam “veneno” pra mata
a cana pra fazer nova plantação, aí passam seis meses eles colocam de quatro a cinco
meses, “remédio” pra matar o mato, entendeu? Eles botam pra mata a cana, primeiro
“veneno”, depois eles botam quando a cana esta crescendo, “veneno”pra mata a cana
e até se usa o próprio avião pra bota adubo, enche de adubo e sai espalhando pelas
cana(...) (Entrevista 03).
“...Muitas vezes, já aconteceu comigo, que eu vinha pro trabalho e o avião passa
jorrando “remédio”, que eu chego aqui espirrando, de nariz entupido, com alergia, só
por causa do “veneno” que eles jogam na cana(...) Entrevista 03).
“...Várias pessoas reclamam que estavam parados e o avião passa, joga o “remédio”
que eles não têm nem cuidado de desligar aquela bombinha quando as pessoas estão
71
passando, ele não ta nem ai, direto com tudo, joga mesmo, não quer nem saber quem
esta lá embaixo, seja mato, que seja gente, eles jogam mesmo” (Entrevista 03).
Nestas falas, o primeiro aspecto a ressaltar é o reconhecimento da técnica, no uso dos
agrotóxicos. O segundo aspecto é o quão invasivo é esse processo, e os transtornos que
o mesmo acarreta na saúde da população. Continuando a preocupação com que se
estuda as formas de continuação do meio ambiente Brasil/MS/Funasa, coloca que, “em
se tratando de poluição ambiental, a utilização, única e simplesmente, dos limites de
concentração das substâncias tóxicas, presentes no meio ambiente, a fim de subsidiar
medidas e ações de controle dos riscos à saúde não tem se mostrado completamente
efetiva. Este tipo de controle dos níveis de poluentes no meio ambiente, baseado
somente nos limites máximos previamente estabelecidos pelos órgãos ambientais, sem
levar em consideração a quantificação da exposição da população, isto é, o
conhecimento dos hábitos populacionais quanto ao tipo de uso dos recursos do
ambiente, não contempla, como um todo, o entendimento do conceito de risco” (
Klaassen &Eaton, l99l).
Outro aspecto é a desinformação sobre a natureza do produto e as críticas quanto ao
descaso que a população enfrenta frente aos anseios de obter respostas sobre suas
reivindicações. Esse limiar entre reconhecimento & desconhecimento parece-nos um
dado importante que se manteve na fala dos entrevistados.
“... Mas acho que ninguém tem informação (...) o quê que é isto! Ninguém passo pra
gente o que é isso, pra que isso? Até aí eles fazem e gente sem saber de nada (...) de
onde é esse avião, pra quê? Eu acho que eles deveriam colocar esse veneno em
horário...sei lá! Mais cedo ou mais tarde “. (Entrevista 01).
“...Que é normal, que eles tem que usar, que muitas vezes fica sem resposta e continua
todo ano fazendo isso (...) todo ano”. (Entrevista 03)
A legislação estabelecida para limites de tolerância é regulamentada pela Portaria n-
3214 de 08 de junho de 1978 (NR-15, anexo n-11), do ministério do Trabalho. (essa
norma regulamentadora faz menção aos “agentes químicos cuja insalubridade é
72
caracterizada por limite de tolerância e inspeção no local do trabalho. (Livro Noções
gerais de toxicologia ocupacional, Paulo Eduardo de Toledo salgado pg 103).
Estas leis visam apenas a insalubridade dos trabalhadores, e qual lei, protegerá uma
população inteira de crianças, mulheres e idosos, expostos constantemente, sem
nenhuma informação sobre o que estão derramando sobre suas cabeças?
“...É ! Eu queria pedir que tomassem providência, que é proibido uso de aviões pra
botar esses “venenos” em plantações, que pode causar um prejuízo maior ao meio
ambiente, inclusive as crianças que estão brincando aí, tudo que é lugar e também no
caminho; Machadinha, sítio, está sempre o avião colocando esses “venenos”, pode
prejudicar a saúde de alguém mais grave, ninguém sabe o risco que a gente está
correndo, até mesmo um adubo”. (entrevista 02)
Verificamos que, entre nossos entrevistados houve um reconhecimento do impacto
ambiental pela observação empírica e experiência não científica, destacando os
prejuízos a Fauna, Flora, Água e ao Solo O homem ainda está longe de saber tudo o que
está entre o Céu e a Terra e existem muitas coisas que tecnicamente não se resolvem. O
ciclo da vida é fundamental; as plantas verdes com a ajuda de sua clorofila captam a luz
solar que, em presença do gás carbônico e água transforma em substância química, seja
a fotossíntese, ou quimiossíntese, em que o pigmento verde das plantas age como
catalisador, assim as plantas servem de alimento para animais e homens, que formam
seus corpos tanto com os minerais, bem como com substâncias orgânicas. Assim
pensamos a vida, na sua pureza ideológica, mas desde que o homem começou a sua
evolução na busca de tudo controlar, ele foi perdendo gradativamente a sua ligação com
a natureza, com Deus, com a religião e com a moral do livro agroecologia (Ana
Primavesi,1997)
“...Ah! isso ai, eu acho que pode ser benefício pra lavoura, mas acho uma agressão à
natureza, porque eu tenho notado que as árvores e os pássaros que haviam antes aqui,
deixou de existir. Muitas vezes você encontra passarinho morto por aí em conseqüência
desse “remédio”, algumas plantas poderiam nascer, não existem mais, principalmente
as árvores frutíferas de antigamente; a cana era mais distante da curva, daquela curva
73
pra lá, que eu me lembre, de lá não via cana. Esse campo era infestado de frutas; era
goiaba, laranja, arasas, frutas assim normais do campo. Não existe mais isso, então
com a chegada da cana pra perto da fazenda “Machadinha” e com esse envolvimento
(...) com essa “química que eles colocam aí, mudou muita coisa, inclusive pra saúde do
pessoal”. (Entrevista 04)
Com uma alimentação modificada adaptada à geração de lucros mas não à saúde,
culturas agrícolas, animais e o próprio homem degeneram, apesar de toda engenharia
genética. (livro Agroecologia (Ana Primavesi) pg 11.
“...Ah! na maioria das vezes, muitas vezes a gente esta lá em casa, seis horas da
manhã, o avião já ta botando “veneno” aí na cana, nas roças próximo, inclusive no
canal onde a maioria da população do sítio Santa Luzia pesca e , devido a esse
“veneno”, que eles colocam aí nas plantações, ocorre a morte de outros animais
silvestres, inclusive cobras que é um animal que vive escondido, o”veneno” é tão forte
que ocasiona a morte de muitos animais, já cansei de ver canário da terra morto por aí,
(...) é papa capim, tizil, biquim, vê muito passarinho desses mortos depois que eles
botam esse “inseticida” que eles colocam nos canaviais”. (Entrevista 02)
“...Aqui em Machadinha, várias vezes mesmo, dentro do poço. Teve uma época que a
gente tinha que compra plástico pra tapar, pro “veneno” não cair no poço, de verdade
mesmo, que já tava caindo”. (Entrevista 03)
“...Olha só (...) depois de uns tempos a gente passou a perceber que onde o avião
passou a plantação ficou toda queimada como se fosse um fogo (...) eu percebi isso
depois que esse avião passou ficou tudo queimado” (Entrevista a1)
Verificamos que surgiu, como de relevância os danos à saúde, ressaltando os sintomas
físicos mais facilmente percebidos como: dores de cabeça, alergias, enjôo, bronquite,
dores no corpo, acidentes com instrumentos de trabalho, e os neurológicos e
comportamentais como: aprendizagem, memória, atenção, agressividade e suicídio.
Assim as concepções sobre o adoecimento não são sempre ligados ao que causa o
74
problema de saúde, mas busca uma compreensão através das diferentes dimensões e
complexidades.
“...As vezes aparece com náuseas do cheiro do “herbicida”, muita gente aparece com
vômito e com enjôo. Várias crianças ficam com bronquite alérgica”. (Entrevista 01)
“...Ah! de adolescentes eu já vi caso de se queixarem muito de dores pelo corpo, dores
de cabeça, uma vez arranhão de arame, mexe com cerca, e por aí” (...) Entrevista 02
“...Ele trabalhava o dia todo a troco de um prato de comida, sem direito a café, aí eu
chamei ele pra ir lá pra casa e ele foi, e está lá até hoje, na verdade quando eu tirei ele
da roça, ele tava com sete anos na lavoura trabalhando”. (Entrevista 03)
“É! Você se corta com a folha e até mesmo com o próprio facão, você corre mais risco
de se cortar com o facão porque a palha pode escorregar o facão, e aí o facão (...)
corta a gente” ( Entrevista 03)
“...Olha, as crianças daqui têm um problema, que eu estou esse tempo todo e não
consegui constatar o porque disso, e sempre falo com os coordenadores, com os
professores que não sei porque que termina o ano como se eles aprendessem, aquela
coisa básica, aquele ensino que foi dado; quando retornam, eles voltam como se
nunca tivessem visto nada, nada...; até um pouco, um período assim, as férias de Julho,
que são 20 dias e não 30, porque estudam um pouco em Julho, né? Eu fico... (Gente, o
quê que é isso que essas crianças quando voltam, voltam na esta zero) E não é só os
pequenos não, são os maiores também; crianças que até sabe escrever o nome, seu
próprio nome, esquecem. Gente, eu não sei o quê que acontece com essas crianças, o
que disso, aí a gente fica conversando pra ver, pra fazer uma pesquisa , aí as
professoras já vem, aí eu aviso, faz um teste aí pra ver se.... –“Continua alguns,
continua sim, outros não tão legal”. Agora, a maioria é sempre os maiores, maior que
eu digo é assim, as crianças da segunda série, da terceira, da quarta,...até da quarta
75
série. Ainda brinco com eles, “(vocês estão comendo muita casca de queijo, tão ficando
muito esquecidos. Não é possível, vocês já viram tudo isso!”. (Entrevista 06)
“...Tem uma criança aqui, que é muito agressiva, quando ele se irrita, eu acredito que
seja porque ele mora com a avó. Não tem carinho da mãe; ele é até uma pessoa ótima
de se lida, mas depois que ele se irrita, não respeita ninguém, aí eu acredito que isso
seja falta de carinho”. (Entrevista 02)
A neurotoxicidade de alguns compostos químicos pode se manifestar através de
alterações e disfunções motoras, sensoriais, comportamentais, cognitivas, de memória e
de desenvolvimento. Exposições crônicas podem comprometer a velocidade de
condução dos nervos periféricos por afetar diretamente a bainha de mielina. Doença de
Parkinson e de Alzheimer, esclerose lateral amiotrófica e neuropatias periféricas graves
parecem estar correlacionadas com exposições crônicas às substâncias tóxicas
ambientais. Efeitos crônicos de compostos orgânicos voláteis podem ser avaliados
através de testes neurocomportamentais.(Brasil/MS/Funasa 2000 4.6 MR
“...Agridem não só com palavras, mas fisicamente, com soco no outro; semana passada
mesmo, eu tive que intervir, erram até primos, só porque um esbarrou, começo dando
murro na prima. Eu falei; “que é isso filho, não pode bater assim não, ainda mais que
vocês estudam na mesma escola, moram na mesma comunidade...” (Entrevista 06)
“...Você esta falando, e ele não quer te obedecer, perde mesmo o controle, você segura,
ele tenta te morder e não se controla não, não quer nem saber que sou eu, que é a
professora que está falando com ele, fica descontrolado. Melhorou um pouco, mas
ainda tem alunos assim, isso mais os maiores”. (Entrevista 06)
“...Recentemente, três suicídios, todos os três, enforcamento. O primeiro foi..., era
aluno do grupo da noite de jovens e adultos; ele estudava à noite e o terceiro ele era
menor; menos de 14, na época ele estava com quatorze anos, mas estudava de dia
conosco. Esse eu fui até o local e não gosto nem de lembrar como que, eu vi né? Não
parecia assim ter sido ele, uma coisa horrível! Não estava com o corpo totalmente
76
pendurado, estava com a metade do corpo no chão, só a cabecinha assim com a corda
no pescoço; numa árvore baixinha (...) Aí teve perícia, tudo assim, né; ficava todo
mundo –“Gente, cadê? não tem nada ali!” nada onde ele se bateu, nada, não parecia
nada, um troço muito incrível. Agora os outros foi em período de férias (eu não vi.)”
(Entrevista 06)
Observamos, ainda, que, na prática, a consistência e uniformidade na visão sobre o
processo do que causa os problemas de saúde, vêm no bojo também dos transtornos
causados na vida cotidiana; quando a informante se refere ao “banho de veneno” a que
foi exposta no trajeto de casa para o trabalho.
“...Eu ouvi um barulho de avião, vi que o avião veio se aproximando e pensei que ele
fosse parar de jogar o “veneno”, mas na verdade, ele não parou”
“...Ah, foi rápido que ele vinha e aí, ia até uma distância, eu tentava correr para ele
não voltar, ai depois ele voltou e não jogou, aí quando vinha, ele jogava”
“...Caiu na minha cabeça, caiu nos meus braços, minha roupa ficou cheia de pinguinho
branco; minha pele secou e ficou na minha pele”
“...Química que poderia me prejudicar, ter um câncer de pele, eu perder a visão, queda
de cabelo, pensei tudo isso na hora”(...) (Entrevista 01)
Os efeitos acumulativos se observam quando uma substância causa um efeito adverso
que é imperceptível por si mesmo, e, se elimina do sistema depois. Com freqüência a
soma destes pequenos efeitos somente são observados quando os danos já são
irreversíveis.( segundo livro de toxicologia ambiental –Lilia. Albert pg 9.)
Verificamos que a atividade se rendeu à variação do tempo. As concepções sabre o
adoecimento mudaram de foco; o que matava instantaneamente, continua, só que de
maneira gradativa e sem controle, porque agora vem junto com o ar que respiramos, é o
que nos faz pensar quando analisamos a fala de uma mãe que perdeu seu filho após um
77
dia de trabalho na lavoura, fazendo o que sempre fazia com uma “bomba” nas costas
passando inseticida.
“...O meu filho morreu disso, o meu filho morreu sobre o remédio dessa cana, porque
eles não davam leite (...) pra recompensar pelo “remédio”; e meu filho foi trabalhar
com o tal do (costal), posto nas costas; levava sua garrafa de leite, mas só uma latinha
ora 8 dias que a usina mandava dar; uma latinha pra oito dias. Se lá tinha pra oito
dias, dava o que com esse “remédio brabo; então eu sou um pouco revoltada com esse
remédio. Eu pedi a meus outros dois filhos, que tenho mais dois filhos homem, enquanto
eu existir viva, se tiver esse “remédio” pra eles (...) sai fora, não vão colocar este
“remédio”, porque eu perdi um filho com esse “remédio...
“...Ressecou a garganta, ressecou o peito do meu filho, atacou o coração do meu filho;
meu filho foi embora (...) É triste para uma mãe, um filho deixar um filho no ventre da
mulher sem poder conhecer. Acabou, meu filho não recebeu o direito dele, não recebeu
nada pra deixar pro próprio filho dele que estava no ventre da mãe, da mulher dele”
“...Eu, pra mim, achei que o avião pra mata, mato, foi um troço bom... porque
melhorou um pouco pra pessoa que trabalha só no braço, porque antes as pessoas
trabalhavam com aquela bombinha nas costa” (Entrevista 07)
I
78
10. CONCLUSÃO
Queremos salientar a riqueza que marcou a trajetória deste estudo, esperando trazer
algumas respostas e também despertar o interesse em novas pesquisas no campo da
Saúde Coletiva.
Verificamos através de testes neuropsicológicos e informações recebidas, a necessidade
de estudos mais aprofundados, com a finalidade de criar estratégias para interface entre
a Erradicação do Trabalho Infanto-juvenil e garantia de uma vida mais digna e sem
riscos para a saúde da população.
Consideramos que nosso estudo ofereceu uma dupla face, composta de um viés mais
estatístico e de um outro mais qualitativo, que se complementam. Acreditamos que os
resultados possam aprofundar os achados que, por ora oferecemos como de maior
relevância, quando apontam uma homogeneidade quanto às opiniões dos entrevistados
no que se refere aos malefícios do uso de agrotóxicos em plantações, com prejuízo para
a saúde da população. No discurso dos nossos entrevistados, fica patente a sua
percepção sobre os riscos a que aquela comunidade está submetida, assim como os
prejuízos verificados a saúde daquela população; o que nos traz um alto grau de
responsabilidade na condução de iniciativas que alterem este cenário.
Como profissionais da área de Saúde Coletiva, temos a missão de exercer o papel de
agentes da sensibilização das autoridades no que se refere ao cumprimento das leis já
existentes, que podem e devem interromper o uso criminoso e desenfreado dos
agrotóxicos.
A simplicidade das palavras e sensibilidade dos entrevistados, vem ao encontro dos
resultados obtidos por técnicas mais “científicas”. Dito isso, sintetizamos nossas idéias,
reafirmando a importância da abertura para novos paradigmas em Saúde Coletiva. É
imprescindível a aliança entre as várias ciências, para que juntas, possam encontrar
melhores caminhos na transformação dos problemas em desafios que nos possam prover
de coragem para enfrentá-los. Pois qualquer programa feito para aumentar a produção,
não tem, afinal, razão de ser senão colocado à serviço das pessoas. O objetivo tem de
ser reduzir desigualdades, combater discriminações, libertar o homem da servidão;
torná-lo capaz de, por si próprio, ser o agente responsável do seu bem estar material,
79
progresso moral e desenvolvimento espiritual... Portanto, é urgente começar a
transformação, pois são muitos os homens que sofrem, e aumenta a distância que separa
o progresso de uns da estagnação e, até mesmo do retrocesso de outros. O choque entre
as civilizações tradicionais e as novidades da civilização industrial, quebra as estruturas
que não se adaptam às novas condições, que chegam ao mesmo tempo oportuníssimas,
mas com um brado de alerta.
Para se colocar acima da técnica científica, os “valores fundamentais” como: Liberdade,
Dignidade, Justiça e Saúde, resultado de uma maneira própria de resolver os problemas
do homem de maneira consciente a fim de dar um conjunto de respostas à sua situação
tanto individual, como no mundo. E o propósito é que estes dados que foram
apresentados tragam uma série de reflexões sobre o assunto, para que não seja publicado
apenas mais um estudo onde se explicite não somente a perspectiva teórica, mas
também uma conduta a ser seguida.
11 BIBLIOGRAFIA
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trabalho. S.P., Savier, Cap. 17, 1980, pp. 511 - 69.
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12 ANEXOS
ANEXO I - QUADRO I - DESCRITIVO DOS LOCAIS E SERVIÇOS
CONSIDERADOS PERIGOSOS OU INSALUBRES PARA MENORES DE
18(DEZOITO) ANOS SEGUNDO A PORTARIA Nº 20, DE 13 DE SETEMBRO DE
2001
82
1 trabalhos de afiação de ferramentas e instrumentos metálicos em afiadora, rebolo ou
esmeril, sem proteção coletiva contra partículas volantes
2 trabalhos de direção de veículos automotores e direção, operação, manutenção ou limpeza
de maquinas ou equipamentos, quando motorizados e em movimento, a saber: tratores e
maquinas agrícolas, maquinas de laminação, forja e de corte de metais, maquinas em
trabalhos com madeiras, serras circulares, serras de fita e guilhotinas, esmeris, moinhos,
cortadores e misturadores, equipamentos em fabricas de papel, guindastes ou outros
similares, sendo permitido o trabalho em veículos, maquinas ou equipamento parados,
quando possuírem sistema que impeça o seu acionamento acidental
3 trabalhos na construção civil ou pesada
4 trabalhos em cantarias ou no preparo de cascalho
5 trabalhos na lixa em fabricas de chapéu ou feltro
6 trabalhos de jateamento em geral, exceto em processos enclausurados
7 trabalhos de douração, prateação, niquelação, galvanização, anodização de alumínio,
banhos metálicos ou com desprendimento de fumos metálicos.
8 trabalhos na operação industrial de reciclagem de papel, plástico ou metal.
9 trabalhos no preparo de plumas ou crinas
10 trabalhos com utilização de instrumentos ou ferramentas de uso industrial ou agrícola com
riscos de perfurações e cortes, sem proteção capaz de controlar o risco
11 trabalhos no plantio, com exceção da limpeza, nivelamento de solo e desbote; na colheita,
beneficiamento ou industrialização do fumo.
12 trabalhos em fundições em geral
13 trabalhos no plantio, colheita, beneficiamento ou industrialização do sisal
14 trabalhos em tecelagem
15 trabalhos na coleta, seleção ou beneficiamento de lixo
16 trabalhos no manuseio ou aplicação de produtos químicos de uso agrícola ou veterinário,
incluindo limpeza de equipamentos, descontaminação, disposição ou retorno de
recipientes vazios
17 trabalhos na extração ou beneficiamento de mármores, granitos, pedras preciosas, semi-
preciosas ou outros bens minerais
18 trabalhos de lavagem ou lubrificação de veículos automotores em que se utilizem
83
solventes orgânicos ou inorgânicos, óleo diesel, desengraxantes ácidos ou básicos ou
outros produtos derivados de óleos minerais
19 trabalhos com exposição a ruído continuo ou intermitente, acima do nível de ação previsto
da legislação pertinente em vigor, ou a ruído de impacto.
20 trabalhos com exposição a radiações ionizantes.
21 trabalhos que exijam mergulho.
22 trabalhos em condições hiperbáricas.
23 trabalhos em atividades industriais com exposição a radiações não-ionizantes
(microondas, ultravioleta ou laser).
24 trabalhos com exposição ou manuseio de arsênico e seus compostos, asbestos, benzeno,
carvão mineral, fósforo e seus compostos, hidrocarbonetos ou outros compostos de
carbono, metais pesados(cádmio, chumbo, cromo e mercúrio) e seu compostos, silicatos,
ou substâncias cancerígenas conforme classificação da Organização Mundial de Saúde.
25 trabalhos com exposição ou manuseio de ácido oxálico, nítrico, sulfúrico, bromídrico,
fosfórico e pícrico.
26 trabalhos com exposição ou manuseio de álcalis cáustico.
27 trabalhos com retirada, raspagem a seco ou queima de pinturas.
28 trabalhos em contato com resíduos de animais deteriorizados ou com glândulas, vísceras,
sangue, ossos, couros, pêlos ou dejeções de animais.
29 trabalhos com animais portadores de doenças infecto-contagiosas.
30 trabalhos na produção, transporte, processamento, armazenamento, manuseio ou
carregamento de explosivos, inflamáveis líquidos, gasosos ou liquefeitos.
31 trabalhos na fabricação de fogos de artifícios.
32 trabalhos de direção e operação de maquinas ou equipamentos elétricos de grande porte,
de uso industrial.
33 trabalhos de manutenção e reparo de maquinas e equipamentos elétricos, quando
energizados.
34 trabalhos em sistemas de geração, transmissão ou distribuição de energia elétrica.
35 trabalhos em escavações, subterrâneos, pedreiras, garimpos ou minas em subsolo ou a céu
aberto.
36 trabalhos em curtumes ou industrialização do couro.
84
37 trabalhos em matadouros ou abatedouros em geral.
38 trabalhos de processamento ou empacotamento mecanizado de carnes.
39 trabalhos em locais em que haja livre desprendimento de poeiras minerais.
40 trabalhos em locais em que haja livre desprendimento de poeiras de cereais(arroz, milho,
trigo, sorgo, centeio, aveia, cevada, feijão ou soja) e de vegetais(cana, linho, algodão ou
madeira).
41 trabalhos na fabricação de farinha de mandioca.
42 trabalhos em industrias cerâmicas.
43 trabalhos em olarias nas áreas de fornos ou com exposição a umidade excessiva.
44 trabalhos na fabricação de botões ou outros artefatos de nácar, chifre ou osso.
45 trabalhos em fabricas de cimento ou cal.
46 trabalhos em colchoarias.
47 trabalhos na fabricação de cortiças, cristais, esmaltes, estopas, gessos, louças, vidros ou
vermizes.
48 trabalhos em peleterias.
49 trabalhos na fabricação de porcelanas ou produtos químicos.
50 trabalhos na fabricação de artefatos de borracha.
51 trabalhos em destilarias ou depósitos de álcool.
52 trabalhos na fabricação de bebidas alcoólicas.
53 trabalhos em oficinas mecânicas em que haja risco de contato com solventes orgânicos ou
inorgânicos, óleo diesel, desengraxantes ácidos ou básicos ou outros produtos derivados
de óleos minerais.
54 trabalhos em câmaras frigoríficas.
55 trabalhos no interior de resfriadores,casas de máquinas, ou junto de aquecedores, fornos
ou alto-fornos.
56 trabalhos em lavanderias industriais.
57 trabalhos em serralherias.
58 trabalhos em indústria de móveis.
59 trabalhos em madeireiras, serrarias ou corte de madeira.
60 trabalhos em tinturarias ou estamparias.
85
61 trabalhos em salinas.
62 trabalhos em carvoarias.
63 trabalhos em esgotos.
64 trabalhos em hospitais, serviços de emergências, enfermarias, ambulatórios, postos de
vacinação ou outros estabelecimentos destinados ao cuidado da saúde humana em que se
tenha contato direto com os pacientes ou se manuseie objetos de uso destes pacientes não
previamente esterilizados.
65 trabalhos em hospitais, ambulatórios ou postos de vacinação de animais, quando em
contato direto com os animais.
66 trabalhos em laboratórios destinados ao preparo de soro, de vacinas ou de outros produtos
similares, quando em contato com animais.
67 trabalhos em cemitérios.
68 trabalhos em borracharias ou locais onde sejam feitos recapeamento ou recauchutagem de
pneus.
69 trabalhos em estábulos, cavalariças, currais, estrebarias ou pocilgas, sem condições
adequadas de higienização.
70 trabalhos com levantamento, transporte ou descarga manual de pesos superiores a 20
quilos para o gênero masculino e superiores a 15 quilos para o gênero feminino, quando
realizado raramente, ou superiores a 11 quilos para o gênero masculino e superiores a 7
quilos para o gênero feminino, quando realizado frequentemente.
71 trabalhos em espaços confinados.
72 trabalhos no interior ou junto a silos de estocagem de forragem ou grãos com atmosferas
tóxicas, explosivas ou com deficiência de oxigênio.
73 trabalhos em alturas superiores a 2,0 (dois) metros.
74 trabalhos com exposição a vibrações localizadas ou de corpo inteiro.
75 trabalhos como sinalizador na aplicação aérea de produtos ou defensiva agrícolas.
76 trabalhos de desmonte ou demolição de navios e embarcações em geral.
77 trabalhos em porão ou convés de navio.
78 trabalhos no beneficiamento de castanha de caju.
79 trabalhos na colheita de cítricos ou de algodão.
80 trabalhos em manguezais ou lamaçais.
87
ANEXO II – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
NÚCLEO DE ESTUDOS DE SAÚDE COLETIVA DA UNIVERSIDADE FEDERAL
DO RIO DE JANEIRO
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Declaro que estou esclarecida(o) de que:
O objetivo deste trabalho é avaliar os efeitos do trabalho na plantação de cana-
de-açúcar na saúde de crianças e adolescentes afastadas do trabalho através do
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil “PETI”, sendo coordenado pela Dra.
Marlei Romero.
Este estudo será realizado em crianças e adolescentes pertencentes ao Programa PETI e
estudantes das escolas municipais:
A realização desta atividade não oferece riscos para a saúde do meu (minha)
filho(a) e a qualquer momento posso recusar a participação dele(a) e contactar a
Comissão de Pesquisa do NESC através dos telefones: (21) 2562 6040 e 2562 6041.
Será marcada uma data para divulgação do resultado do estudo e, caso seja
detectada alguma anormalidade, meu (minha) filho(a) será encaminhado (a) para
avaliação clínica.
Sendo assim autorizo a participação de meu (minha) filho(a) através de entrevistas e
aplicação de teste psicológico para a realização desse trabalho.
Quissamã, de de 2002
Assinatura
88
Caso você assine este termo de consentimento livre e esclarecido, seu nome e de
seu filho será mantido em sigilo. Isto significa que a divulgação dos resultados da
entrevistas será realizada sem que seja possível identificar os participantes.
ANEXO III – QUESTIONÁRIO
Número ______________
População: 1= Nunca exposto 2 = Em exposição 3= Ex. exposto
Quanto tempo afastado de contato com pesticida? Ano/mês , idade anos
Sexo: 1= Feminino Escolaridade 1= Analfabeto
2= Masculino 2 = Fundamental
3 = Fund. Incomp.
4= 2º Grau
5 = 2º Grau incomp.
Endereço: _______________________________ Bairro:___________________
89
Há quanto tempo estar no programa PET? Ano/mês ,..
Com que idade começou a trabalhar? anos.
Seu primeiro trabalho foi agricultura? 1=Sim 2= Não
Quantos trabalhos teve até hoje?
Qual era seu ganho na época em que trabalhava? 1= Nenhum 2= até meio salário.
Seu último trabalho foi em canavial? 1= Sim 2= Não
Quantas horas por dia você trabalhava? 1= menos de 4 2= entre 4e 8 = 3 acima
de 8
Que horas iniciava seu dia de trabalho? ___________________________
Quanto tempo levava para chegar ao trabalho ______________________
Você tinha patrão ou trabalhava para família? 1= Patrão 2= Família
Qual o tipo de trabalho que fazia? _______________________________
Qual a meta a atingir na produção diária? _________________________
Qual o instrumento de trabalho que era utilizado?
Instrumento de trabalho 1: _____________________
Instrumento de trabalho 2: _____________________
Instrumento de trabalho 3: _____________________
Instrumento de trabalho 4: _____________________
Durante o período em que trabalhou teve contato com produtos químicos (veneno,
pesticida)? 1= Sim = Não
14a. Qual o tipo de contato? =1 Físico = 2 Exposição
15. Qual a freqüência de contato com estes produtos? 1= Diário 2= Semanal = 3
Eventualmente 9 = Nenhum
16. Você manuseava o produto? 1= Sim = Não
17. Na aplicação dos produtos químicos você continuava trabalhando?
1= Sim = Não
18. Você já fez aplicação de produtos químicos? 1= Sim = Não
19. Trabalhava com roupa especial? .................. 1= Sim = Não
20. Usava alguma proteção na cabeça? ............. 1= Sim = Não
90
21. Onde eram guardados os produtos químicos? 1= Local apropriado
2= Local improvisado
3= Em casa
22. Qual o instrumento usado para borrifar o produto químico?
23. Lembra o nome de algum produto químico que fazia uso?
24. Qual tipo de roupa usava para trabalhar normalmente?
25. Seus pais trabalhavam na lavoura também? 1= Sim = Não
26. Quantas gerações de sua família trabalha na lavoura: 1= Bisavós 2= avós
3= pais 9= não sabe
27. Você gostava de trabalhar na lavoura? ................... 1= Sim = Não
28. Teve algum problema de saúde nos últimos 15 dias? 1= Sim = Não
29. Quando trabalhava ficava doente com freqüência? 1= Sim = Não
30. Já sofreu algum acidente enquanto trabalhava? 1= Sim = Não
30a. Quantos acidentes?
30b. Que tipo de acidente?
_____________________________________
31. Esteve internado por problemas de saúde nos últimos cinco anos? 1= Sim =
Não
32. Enquanto trabalhava na lavoura teve algum destes sintomas:
1=dores na cabeça
2= enjôo
3= dores nas costas
4= dores abdominais
5= tontura
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6= desmaio
7= falta de ar
8= indisposição física
33. Já teve alguma doença que você acha que foi causada pelo trabalho?
1= Sim = Não
34. Você gostava de trabalhar na lavoura? ........................... 1= Sim = Não
35. Depois que você parou de trabalhar na lavoura, sua vida melhorou?
1= Sim = Não
36. Qual a renda familiar hoje? 1= menos um salário mínimo
2 = até dois salários mínimos acima de 3 salários mínimos
37. O que você faz hoje para se divertir? _________________________
38. No futuro você gostaria de voltar a trabalhar na lavoura ? 1= Sim = Não
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