valiaÇÃo do rograma ais Édicos: uma revisÃo...
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AVALIAÇÃO DO PROGRAMA MAIS MÉDICOS: UMA
REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA
CYNTHIA DE FREITAS MELO1
DARLI CHAHINE BAIÃO2
SUZETE LEÔNIDAS RODRIGUES3
Resumo: O Programa Mais Médicos é alvo de divergentes posicionamentos, necessitando de constante
avaliação. Objetivou-se apresentar uma revisão sistemática da literatura sobre o programa. Com método
pré-definido de busca no portal CAPES, BDTD e Google Acadêmico, localizou-se 105 documentos, dos
quais 16 foram utilizados. Entre os resultados observou-se que as diversas categorias confirmaram a
divergência de opiniões acerca do programa. Conclui -se que ainda há uma escassez na literatura sobre
avaliação do programa, sendo relevante que os pesquisadores se interessem por tal tarefa, gerando feedback
sobre os aspectos positivos e negativos.
Palavras-chave: Programa Mais Médicos. Avaliação de Programas e Projetos de Saúde. Médicos.
Revisão.
MORE DOCTORS EVALUATION PROGRAM: A
SYSTEMATIC REVIEW OF THE LITERATURE Abstract: The More Doctors Program is under a lot of diverging opinions which shows the need of its
constant evaluation. We have decided to pre defined a technical search method in sites like CAPES, BDTD
and Academic Google. Then, we came across to 105 documents. Sixteen of those, have been used to ground
our work. Among all those results, some technical categories has shown and confirm all the differences of
opinion about Program. It is admissible to assert that there is yet a shortage technical literature information
about the evaluation of the program, making necessary that more researchers should be interested in order
to generate feedback about the program and positive or negative aspects.
Key-words: More Doctors Program. Programs evaluation. Doctors. Review.
1 Doutora em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Professor do
Programa de Pós-Graduação e Psicologia da Universidade de Fortaleza (UNIFOR). E-mail:
cf.melo@yahoo.com.br 2 Psicóloga pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Doutoranda em Psicologia pela Universidade de
Fortaleza (UNIFOR). E-mail: darlibaiao@gmail.com 3 Fisioterapeuta pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR). Mestre em Psicologia pela Universidade de
Fortaleza (UNIFOR). E-mail: suzeterl@gmail.com
2
INTRODUÇÃO
Criado pela Lei Nº 12.871, de 22 de outubro de 2013, o Programa Mais Médicos
(PMM) faz parte de um amplo projeto de melhoria do atendimento aos usuários do
Sistema Único de Saúde, que prevê mais investimentos em infraestrutura dos hospitais e
unidades de saúde, além de levar uma maior quantidade de médicos para regiões onde há
carência e ausência de profissionais (BRASIL, 2013; GARCIA et al, 2014).
Trata-se de uma resposta do governo federal de Dilma Roussef às necessidades da
população, que sempre reivindicou a melhoria da saúde no país. Desta forma, pretende
proporcionar aos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) uma ampliação e melhoria
no atendimento, de forma digna e respeitosa, sobretudo, para quem mais precisa (JB,
2014).
Como ação imediata de maior destaque encontra-se o objetivo de amenizar os
problemas existentes na Atenção Básica relacionados à falta de médicos, atraindo mais
profissionais e promovendo sua melhor distribuição em municípios menos favorecidos
socialmente e Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEI) (BRASIL, 2013).
É importante ressaltar que o brasileiro possui cerca de 1,8 médicos/mil habitantes,
sendo essa proporção inferior a outros países (Cuba - 6,7; Espanha - 4,0; Argentina - 3,2;
Canadá - 2,0). Um problema encontrado não apenas na escassez de médicos, mas também
na distribuição desigual desses profissionais, pois 22 estados brasileiros apresentam um
índice abaixo da média nacional (BRASIL, 2013; CAMPOS, 2013).
Os números de julho/agosto de 2014 indicam que o programa contratou 14,4 mil
profissionais distribuídos em todas as unidades federativas brasileiras, 3,7 mil municípios
e em 34 distritos indígenas. Cerca de 75% dos médicos estão em regiões de grande
vulnerabilidade social, como o semiárido nordestino, a periferia de grandes centros e
regiões com população quilombola, expandindo a assistência a 50 milhões de brasileiros
(BRASIL, 2014a).
3
A oportunidade de ingressar no programa é oferecida tanto aos médicos formados em
instituições brasileiras (que têm preferência na alocação das vagas), como em instituições
estrangeiras, por meio de intercâmbio médico internacional, sem necessidade de revalidação
de diploma. Assim, os 14,4 mil médicos são de 48 nacionalidades (sendo 11,4 mil deles
cubanos) (BRASIL, 2013; GARCIA et al., 2014).
Alvo principal de divergentes opiniões da mídia e comunidade acadêmica, os
médicos estrangeiros, ao chegarem no Brasil, se concentram em oito capitais no país por
três semanas para participar do módulo de acolhimento e avaliação, com carga horária de
120 horas. O conteúdo do treinamento é relacionado à legislação, funcionamento e
atribuições do SUS, especialmente da atenção básica em saúde, e Língua Portuguesa
(BRASIL, 2013).
Após o módulo de treinamento, é aplicada a avaliação com intuito de testar os
conhecimentos sobre a língua, já em caso de reprovação, o médico intercambista será
imediatamente desligado do Programa. Por outro lado, se atestada a qualificação do
médico para participar do Programa, o Ministério da Saúde encaminhará documentação
para o Conselho Federal de Medicina para a emissão do registro profissional provisório
(BRASIL, 2013).
Além dos objetivos sociais, a iniciativa prevê também o aumento do número de
vagas de medicina ofertadas e de residência médica, além do aperfeiçoamento da
formação médica no Brasil. Partindo deste princípio, levar médicos para regiões mais
carentes é apenas uma vertente de uma cadeia de medidas estruturantes para aprimorar a
formação médica e diminuir a carência de profissionais médicos no país (BRASIL,
2014b).
De acordo com o Ministério da Saúde (2013), a partir do início de 2015, os alunos
que ingressarem na graduação em Medicina, terão que atuar por um período de dois anos
em unidades básicas e na urgência e emergência do SUS. Essa transformação na formação
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dos estudantes de Medicina vai aproximar ainda mais os novos médicos à realidade de
saúde do país.
Contempla-se, todavia, que, apesar de mostrar uma preocupação com a saúde
pública, o programa gerou um grande mal-estar entre a classe médica, que, em parte,
manifestou-se contra a vinda de estrangeiros, alegando que o PMM é uma medida
paliativa e ineficaz (SCREMIN; JAVORSKI, 2013). Sendo questionado, inclusive, a
eficiência do curso introdutório dos médicos estrangeiros em apenas 120 horas, nas quais
são discutidas várias temáticas importantes, especialmente o uso da Língua Portuguesa
(CARAMELLI, 2013). Por outro lado, existe também literatura apontando aspectos
positivos do programa, o que salienta as controvérsias existentes sobre o tema (GARCIA
et al, 2014; MEIRELLES, 2013).
Nesse cenário de divergências, a avaliação do programa, funciona como uma
ferramenta fundamental de feedback, para auxiliar nas futuras decisões no que diz respeito
à implementação, ao processo e aos resultados alcançados, contribuindo para o
direcionamento das intervenções necessárias (ALBUQUERQUE; MELO, 2010). Apesar
de pouco tempo de implementação do Programa Mais Médicos, faz-se necessária sua
constante avaliação, bem como a compilação dos estudos científicos já realizados,
visando contribuir para uma maior discussão acerca do programa, apresentando
informações que ampliam conhecimentos atrelados tanto às políticas intrínsecas ao “Mais
Médicos”, quanto aos profissionais que exercem suas atividades sobre custódia do
programa (BAIÃO, LEÔNIDAS, MELO; 2014).
METÓDO
TIPO DE ESTUDO
Para elaboração do presente estudo, optou-se pela realização de uma revisão de
literatura. Este tipo de pesquisa tem como característica a “análise e síntese da informação
disponibilizada por todos os estudos relevantes publicados sobre um determinado tema,
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de forma a resumir o corpo de conhecimento existente e levar a concluir sobre o assunto
de interesse” (MANCINI; SAMPAIO, 2006. p. 83).
Dentre os diversos tipos de revisão de literatura, escolheu-se a revisão sistemática
de literatura, um método de pesquisa que permite a busca, a avaliação crítica e a coleta
das evidências disponíveis do tema investigado, possibilitando a síntese do estado do
conhecimento de um determinado assunto, além de apontar lacunas do conhecimento que
precisam ser preenchidas com a realização de novos estudos (MENDES, 2008). Além
disso, a revisão integrativa possibilita aos profissionais de saúde dados relevantes de um
determinado tema, mantendo-os atualizados e promovendo as mudanças na prática como
consequência da pesquisa (MENDES, 2008).
CRITÉRIOS DE INCLUSÃO E EXCLUSÃO
Foram incluídos como referências artigos indexados em português e inglês
disponíveis no portal de periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de
Nível Superior (CAPES) (f=05), na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações
(BDTD) (f=0), e no Google Acadêmico (f=11), que apresentavam os descritores:
“Programa Mais Médicos” e “Mais Médicos”. A busca foi realizada no mês de julho e
agosto de 2014. Ao final desse processo, foram localizados 105 artigos. Foram excluídos:
artigos em que constavam o tratamento do Programa Mais Médicos sobre outra temática
sem contemplar a avaliação deste; os que apresentassem o descritor “Mais Médicos”
descontextualizado do programa, e os que citassem os descritores, mas que esses não
fossem o foco do estudo. É valido ressaltar que tomou-se como documentos de avaliação
do programa aqueles relacionadas a opiniões, discussões teóricas e análises de conteúdos
de jornais e revistas.
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SELEÇÃO DE ESTUDOS
A partir da leitura dos 105 trabalhos encontrados na pesquisa, foi verificado se os
mesmos preenchiam os critérios de inclusão. Os que se adequaram aos critérios acima
descritos tiveram seus conteúdos analisados e categorizados em classes temáticas para a
síntese de suas contribuições. Já os trabalhos que não satisfizeram os critérios de inclusão
foram listados entre os excluídos.
Destaca-se ainda que não houve a intenção de avaliar os artigos sobre aspectos
metodológicos, tendo como foco a busca pelas variáveis que pudessem trazer informações
sobre os objetivos específicos. Ao final desse processo, dos 105 trabalhos incialmente
encontrados, mantiveram-se 16 artigos aproveitados que seguiram em análise.
RESULTADOS E DISCUSSÕES
Foram selecionados 16 trabalhos que atendiam aos critérios de inclusão, sendo
todos eles publicados entre 2012 e 2014. Destaca-se, todavia, uma predominância de
publicações no ano em que o programa foi criado, 2013 (f=11), havendo, posteriormente,
uma redução de trabalhos. Quanto ao idioma, houve a predominância no idioma
português (f=14), existindo ainda 2 artigos em inglês, sendo ambos escritos por autores
brasileiros (quadro 1).
Quadro 1 Estudos analisados sobre avaliação do Programa Mais Médicos
Texto Título Autor Ano Tipo de
documento
1 Mais Médicos: Better Attention to the Population’s
Health? Amaral et al 2012
Editorial de
Revista
2 Funding, Flexible Management Needed for Brazil’s
Health Worker Gaps F. Campos 2013
Artigo -
entrevista
3 Revista de Gestão em Sistemas de Saúde Piscopo e
Biancolino 2013
Editorial de
Revista
4 Estudo Jurídico do Programa Mais Médicos Jorge 2013 Artigo
7
5 Os Médicos Estrangeiros: A Questão da Língua Caramelli 2013 Artigo
6 Programa mais Médicos: Um Estudo de Imagem a partir
da Revista Veja Segalin 2013
Trabalho
Conclusão
de Curso
7
Um Estudo sobre a Relação entre a Democracia Digital e a
Participação Política a partir do Debate sobre o Programa
mais Médicos no Facebook
Landim 2013
Artigo
8 A Saúde, o SUS e o Programa “Mais Médicos” Campos 2013 Artigo
9 O Direito do Cidadão à Saúde e a Polêmica do Programa
Mais Médicos
Neto e
Dienno 2013
Artigo
10 O Mais Médicos e o Futuro da Medicina Meirelles 2013 Artigo
11 O Que Falta Discutir sobre a Saúde Pública Brasileira Salles e
Srougi 2013
Artigo -
entrevista
12 O SUS Precisa de Mais Médicos e de Muito Mais! Diretoria
Nacional 2013
Editorial de
Revista
13 O Enquadramento das Notícias sobre os Estrangeiros do
Programa mais Médicos
Scremin e
Javorski 2013
Artigo
14 A Consolidação do Programa Mais Médicos na Opinião
Pública e na Cobertura Jornalística Carvalho 2014
Artigo
15 Programa Mais Médicos para o Brasil: Apresentação do
Programa e Evidências acerca de seu Sucesso
Garcia,
Rosa,
Tavares
2014
Artigo
16 Recursos Humanos: Fator Crítico para as Redes de
Atenção à Saúde
Gonçalves et
al 2014
Artigo
Observa-se ainda que os estudos foram realizados por profissionais de diferentes
áreas: saúde (9), direito (2), comunicação/marketing (4) e economia (1). Apesar desta
diversidade, todos apresentam o mesmo aporte metodológico: revisão de literatura.
Com a delimitação do número de estudos a serem analisados, foram realizadas
leituras aprofundadas dos conteúdos destes para a sistematização dos artigos em grupos,
divididos em 4 categorias e 11 subcategorias, atentando-se para dois pontos: a frequência
com que apareceram nos textos analisados e a possibilidade de um mesmo texto
contemplar mais de uma categoria e/ou subcategoria.
Para a divisão de categorias, levou-se em consideração a proximidade dos temas
abordados pelos textos científicos, de modo a permitir uma discussão dos resultados que
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possibilitasse a apresentação de convergências e divergências encontradas nos estudos.
Ao final da divisão chegaram-se às seguintes categorias: 1) Atendimentos no SUS; 2)
Ausência de médicos participantes do PMM; 3) Dicotomia entre médicos estrangeiros e
médicos brasileiros; e 4) Avaliação sobre o PMM (figura 1).
Figura 1 – Categorias emergidas nas análises dos documentos
CATEGORIA 1 - ATENDIMENTO NO SUS
A primeira categoria, “Atendimento no SUS”, engloba os trabalhos que abordam
as questões relativas ao SUS e aos programas que dele fazem parte, avaliando as
condições organizacionais de infraestrutura e recursos humanos disponíveis ao
atendimento da população e a contribuição do PMM para a melhoria desses, sendo
composta por duas subcategorias: (1.1) Infraestrutura e lotação dos hospitais (f=04); (1.2)
Médicos no SUS (f=05).
Sobre a infraestrutura e a lotação dos hospitais, Piscopo e Biancolino (2013),
ressaltam que constantemente aparecem notícias relacionadas à superlotação dos
hospitais e apontam a implantação do PMM, como uma tentativa de aprimorar os serviços
de saúde no Brasil, através de investimentos em infraestrutura em hospitais e unidades de
9
saúde. Em consonância, Salles e Srougi (2013) e Campos (2013), apresentam a falta de
infraestrutura dos hospitais como um grande gargalo encontrado pela saúde pública
brasileira.
Sobre Médicos no SUS, Campos (2013) e Garcia et al (2014), também contribuem
abordando os dois pontos mais contemplados: a falta e/ou a má distribuição de médicos
no SUS. Para o autor, o Brasil não só enfrenta uma escassez de médicos, mas também a
má distribuição desses profissionais, sendo este não apenas um problema do Brasil, mas
de muitos países, como mostrado pela Organização Mundial de Saúde (OMS).
Em consonância, o texto da Diretoria Nacional (2013) apresenta o resultado de
uma pesquisa feita pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) com a
população, observando que o principal problema do SUS é a falta de médicos. Amaral et
al (2012) e Meirelles (2013), também se enquadram nas categorias supracitadas, enquanto
o primeiro enfoca a má distribuição dos médicos, o segundo apresenta a falta de
assistência médica como uma realidade da população brasileira.
Percebe-se que a análise dos artigos que contemplam a primeira categoria
possibilita o entendimento de que as questões que permeiam os problemas da saúde
pública são anteriores à instalação do programa, evidenciando as dificuldades
encontradas principalmente no que diz respeito à falta de infraestrutura e mão de obra
médica e superlotação dos hospitais.
CATEGORIA 2 - AUSÊNCIA DE MÉDICOS PARTICIPANTES DO PMM
A categoria dois, “Ausência de médicos participantes do PMM”, ressalta a
dificuldade de encontrar médicos que se proponham a participar do programa por diversas
razões, divididas em três subcategorias: (2.1) Falta de condições no interior (f=04), (2.2)
Falta de estabilidade (f=04) e (2.3) Curta duração do programa (f=02).
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Os textos de Salles e Srougi (2013), da Diretoria Nacional (2013), Di Jorge (2013)
e Campos (2013) abordam as duas primeiras subcategorias, destacando a relação
intrínseca que possuem entre si. Observa-se que estes assuntos foram bastante
contemplados nos textos, principalmente nos elaborados por profissionais da área da
saúde e jurídica. Di Jorge (2013) defende a ideia de que o médico não tem condições de
estar no interior por uma ausência total do estado em criar nas regiões, condições, salários
e estabilidade, contemplando o tema principal abordado pelas duas subcategorias.
Complementando, Salles e Srougi (2013), fazem uma crítica alertando que nenhum
médico fez juramento de pobreza e que os médicos procuram trabalhar onde possam se
atualizar, onde tenham acesso aos congressos e eventos científicos que o façam crescer.
Deste modo, para os autores acima citados, não faltam apenas condições no
interior, sejam físicas ou de infraestrutura, mas também incentivos e garantias de
estabilidade a esses profissionais, que, na maioria das vezes, não querem largar a “vida
na cidade” para ir morar no interior.
Considera-se ainda que, Gonçalves et al (2014) e Campos (2013), apontam a
curta duração do programa como uma das razões pela qual os médicos resistem ao
programa. Para Gonçalves et al (2014), essa questão é alvo de questionamentos em
relação às recentes políticas públicas implementadas no país, o que incita a rotatividade
de profissionais nesses programas.
Contempla-se nessa segunda categoria três dos diversos entraves encontrados
pelos médicos brasileiros para atuar no SUS através dos programas de políticas públicas
que possuem tal finalidade. Diversas são as queixas e dificuldades encontradas, podendo
ser destacada a falta de estabilidade e condições físicas, sociais e culturais no interior e a
curta duração dos programas implementados.
11
CATEGORIA 3 - DICOTOMIA ENTRE MÉDICOS ESTRANGEIROS E OS
MÉDICOS BRASILEIROS
A terceira categoria, “Dicotomia entre médicos estrangeiros e os médicos
brasileiros”, faz um paralelo entre os dois tipos de médicos contratados pelo programa,
apresentando três subcategorias: (3.1) Dicotomias não trazem problemas (f=01); (3.2)
Dificuldades encontradas pelos médicos estrangeiros (f=02); e (3.3) Não necessidade de
validação do diploma estrangeiro (f=3).
Apesar de inúmeras críticas ao programa encontradas nas categorias anteriores,
Meirelles (2013) afirma que o PMM, apesar de possuir erros, vem ao encontro das
expectativas da população, que necessita de assistência médica e não se interessa por
argumentos, quer somente ter a presença de um médico. Para o autor, um médico,
independente da sua nacionalidade, vale no imaginário popular muito mais do que se
pensa.
Já na subcategoria sobre as dificuldades encontradas pelos médicos estrangeiros
verificou-se diversos pontos elencados. Caramelli (2013), aborda bem essas temáticas
quando indaga se 120 horas/3 semanas de treinamento serão suficientes para que um
médico estrangeiro aprenda sobre a atenção básica de saúde no Brasil, sobre a língua
portuguesa e sobre as doenças que assolam a nossa população. Completa o autor, “a
autorização para o exercício da Medicina de médicos sem treinamento adequado e sem
razoável ambientação cultural e linguística não está baseada nem em experiências
empíricas nem em evidências científicas. É um palpite. E palpites não tratam pessoas”
(CARAMELLI, 2013, p. 408).
Scremin e Javorski (2013) assinalam também o preconceito como uma das
dificuldades encontradas pelos médicos estrangeiros, que os autores denominam de
“imigrantes”.
Contemplando a questão da não necessidade de validação do diploma pelos
médicos estrangeiros, Neto e Dienno (2013), Carvalho (2014) e Caramelli (2013)
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apresentam uma crítica a não necessidade de validação do diploma estrangeiro para
atuação no programa, o que evidencia uma distinção em relação ao profissional brasileiro,
que se graduado em outro país tem que revalidar o seu diploma. Neto e Dienno (2013)
revelam ainda que o exercício da medicina no Brasil, para os graduados no exterior, exige
a revalidação de diploma, o que não acomete os profissionais do programa, possuindo
então uma regalia em relação ao profissional brasileiro, que no entender dos autores,
esbarra nos direitos de cidadania e isonomia.
Em resumo, observa-se que a categoria três evidencia os possíveis limites e
entraves existentes entre médicos bolsistas brasileiros e estrangeiros, destacando a falta
de necessidade de revalidação do diploma estrangeiro e a diferença na língua como
possíveis problemas existentes.
CATEGORIA 4 - AVALIAÇÃO GERAL DO PMM
A categoria quatro, “Avaliação geral do PMM”, apresentou três subcategorias:
(4.1) Programa com elementos positivos (f=05), (4.2) Programa como uma alternativa
insuficiente/inadequada (f=03) e (4.3) Críticas e polêmicas sobre o programa (f=6).
Os estudos de Meirelles (2013), Campos (2013), Garcia et al (2014), Neto e
Dienno (2013) e Scremin e Javorski (2013) falam dos elementos positivos do programa,
seja pelo ponto de vista dos autores ou da população, e sobre a sua importância no cenário
atual da saúde pública.
Campos (2013) destaca a importância de pensar na saúde pública desde a
faculdade, concordando com a exigência de que o primeiro ano de todas as residências
médicas seja feito em um ambiente de cuidados de saúde da família, o que, para o autor,
possibilitará, a partir de 2019, uma grande proporção de médicos qualificados para atuar
na atenção primária à saúde.
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Meirelles (2013), afirma que as pesquisas demonstram que grande parte da
população, dos formadores de opinião, são favoráveis ao programa, mesmo com algumas
ressalvas.
Para Neto e Dienno (2013), o programa está distante de resolver a caótica
conjuntura do Sistema de Saúde no Brasil, mas é uma realidade, sendo evidente sua
atuação, assim, embora o programa esteja sob condenações e polêmicas de todos os tipos,
ele tem se mostrado como um agir positivo do Estado.
Já os textos de Salles e Srougi (2013), Campos (2013) e Scremin e Javorski (2013)
abordam elementos que levam a uma perspectiva negativa do programa, principalmente
no que diz respeito à insuficiência e ineficácia do mesmo em solucionar os problemas
advindos do SUS.
Salles e Srougi (2013) ressaltam que a criação do Programa Mais Médicos foi uma
medida simples de grande apelo popular, mas acredita que essa solução é falaciosa porque
os grandes gargalos da saúde pública brasileira são a ausência de infraestrutura e de
gerenciamento eficiente, como também a falta de recursos financeiros, de interesse
sincero e de sensibilidade dos nossos governantes.
Por outro lado, como pode-se perceber, a subcategoria com maior frequência de
todas as quatros categorias apresentadas foi a que se refere às críticas e polêmicas sobre
o programa, o que confirma a diversidade de pontos de vista e opiniões críticas acerca do
PMM. Assim, a mesma merece um destaque, pois apresentou uma alta frequência, sendo
abordada em 6, dos 16 documentos analisados.
Nela, encontram-se os textos de Segalin (2013), Landim (2013), Neto e Dienno
(2013), Salles e Srougi (2013), Scremin e Javorski (2013) e Gonçalves et al (2014) que
enfatizam o caráter crítico do programa em diversos aspectos, como: a imagem negativa
na mídia, o PMM como algo paliativo, o forte viés político, a crítica ao governo vigente
e a falta de organização da implantação.
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O trabalho de conclusão de curso de Segalin (2013), pode ser utilizado como
exemplo desse caráter crítico, quando traz uma análise da imagem que o programa
assumiu nas reportagens da revista Veja e conclui que a credibilidade do PMM é bastante
afetada contribuindo para a rejeição por parte da população, principalmente pelo fato do
Programa já ser bastante rejeitado pela classe médica, o que mais uma vez aborda a
multiplicidade de opiniões sobre o programa.
Landim (2013) apresenta os debates existentes na rede social Facebook sobre o
Programa Mais Médicos, e, ressalta que existe, ainda, a presença de diversos aspectos que
merecem destaque como as diferenças culturais, enfatizando a região ou local em que se
fala e ocupa, sendo este elemento motivo de diferentes pontos de vista sobre o programa.
Apresenta também falas recortadas nas quais os médicos levantam insistentemente pontos
negativos sobre o Programa Mais Médicos.
Para Neto e Dienno (2013), uma melhor assistência à saúde é o desafio do Estado
e a população deve ser informada que o programa não veio para pôr um fim à celeuma, e
sim para atuar como um paliativo, para tentar estagnar o sangue, mas, não trazer a cura.
Percebe-se que a categoria quatro foi a que mais englobou temáticas dos artigos
analisados, o que pode estar relacionado com a necessidade de se emitir uma opinião
sobre o programa, mesmo que ainda não esteja concretizada ou embasada empiricamente.
CONCLUSÃO
Conclui-se que as informações contidas nos estudos apresentados neste trabalho,
mostram a diversidade de opiniões e avaliações sobre o PMM, sob as mais diversas
perspectivas e disciplinas, não restringindo apenas a área da saúde.
Apesar das divergências, converge-se na ideia da criação do programa como uma
medida para atrair médicos para a Atenção Básica, em outras palavras, como uma
“possível” e “parcial” solução proposta pelo governo federal, diante da problemática
15
sobre a falta de médicos. As críticas dividem-se em opiniões a favor e contrárias ao
programa, sendo este alvo constante de matérias em jornais e revistas, o que pode
influenciar na opinião dos leitores sobre o programa.
Percebe-se uma insatisfação em relação ao programa, colocada principalmente
pela classe médica, que apresenta críticas severas relacionadas à incapacidade do PMM
em resolver as demandas de falta de médicos do SUS, considerando-o insuficiente e
superficial.
É válido ressaltar que a problemática existente entre os médicos bolsistas
brasileiros e estrangeiros também é alvo constante de discussão, críticas relacionados à
insuficiência do treinamento e desconhecimento dos médicos estrangeiros para lidar com
os problemas de saúde do Brasil; à dificuldade com o idioma; à não revalidação do
diploma estrangeiro; à falta de incentivo e estabilidade aos médicos participantes do
programa, dentre outros. Por outro lado, parece ser notória, pelos pontos contemplados,
a satisfação por parte da população que quer ter médicos disponíveis para cuidar da sua
saúde.
Contempla-se que, devido ao pouco tempo de existência do programa (pouco mais
de um ano), há ainda uma escassez na literatura, especialmente de estudos
científicos/empíricos, sobre avaliações do programa. Observou-se, pois, que as
publicações ainda são em sua maioria de artigos de opinião sem, muitas vezes, destacarem
um embasamento, seja teórico, seja empírico. Por essa razão, reforça-se a importância da
contribuição do presente trabalho para os pesquisadores que pretendem iniciar pesquisas
empíricas na área, possibilitando uma ampliação do horizonte estudado, com o resgate de
teorias e a elaboração de ferramentas empíricas de cunho avaliativo.
REFERÊNCIAS
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