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ISSN 0524-4102 Revista do TRT6 Recife PE . 2010 . Vol 20 Nº 37 EJ Escola Judicial do Tribunal Regional doTrabalho da Sexta Região TRT6

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ISSN0524-4102

RevistadoTRT6

Recife PE . 2010 . Vol 20 Nº 37

Revis

ta doTRT6

Recife PE.

2010.

Vol 20

Nº 37

EJEscola Judicial doTribunal Regional doTrabalhoda Sexta Região

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Regiã

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TR

T6

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHOCais do Apolo, 739 Recife PE

PABX (81) 2129.2000www.trt6.gov.br

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COORDENAÇÃO EDITORIAL

Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da Sexta Região (EJ-TRT6)

DES. Pedro Paulo Pereira Nóbrega Diretor

JUIZ Agenor Martins PereiraCoordenador Geral

JUIZ Guilherme de MoraisMendonçaCoordenador Adjunto

EQUIPE TÉCNICA

Gutemberg SoaresJornalista DRT- PE 2475

Sofia VelosoBibliotecária

Eugenio PacelliRevisão

Andréa AlcantaraCapa e projeto gráfico

Siddharta CamposDiagramação

Stela MarisFoto de capa

APOIOThereza Christina Lafayette Bitu CanutoTatiane Fragoso Rocha de OliveiraFlorisvalda Rodrigues dos SantosSandra Gláucia Melo dos SantosSandra Ribeiro OliveiraSeverina Ramos Paes de Melo Lima

CORRESPONDÊNCIAAvenida Beberibe, 301, Encruzilhada, Recife, PE.CEP: 52.041-430Telefone: (81) 3242-0206 / Fax: (81) 3242-6259E-mail: [email protected]

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Conselho Editorial

ENEIDA MELO CORREIA DE ARAÚJODesembargadora Presidente do TRT da Sexta Região, professora universitária, doutora em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco – UFPE

EVERALDO GASPAR LOPES DE ANDRADEProcurador Regional do Trabalho aposentado, professor universitário, doutor em direito pela Universidade de Deusto, Espanha

DOMINGOS SÁVIO ZAINAGHIAdvogado, professor universitário, doutor em Direito pela Pontifícia Uni-versidade Católica de São Paulo – PUC, com pós-doutorado em Direito do Trabalho pela Universidad Castilla La Mancha, Espanha

GEORGENOR DE SOUSA FRANCO FILHODesembargador do TRT da 8ª Região, professor universitário, doutor em Direito pela Universidade de São Paulo – USP

GIANCARLO PERONE Jurista italiano, advogado e professor da Universidade de Roma

JOÃO MAURÍCIO LEITÃO ADEODATOAcadêmico, pesquisador, professor titular da UFPE, doutor em Direito pela Universidade de São Paulo – USP, com pós-doutorado pela Universidade de Maiz, Alemanha

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JOSÉ SOARES FILHOJuiz do Trabalho aposentado, professor universitário, doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE

JUAN MARIA RAMÍREZ MARTÍNEZJurista espanhol, professor catedrático da Universidade de Valência

SERGIO TORRES TEIXEIRAJuiz do Trabalho, professor universitário, doutor em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE

SOLÓN HENRIQUES DE SÁ E BENEVIDESProcurador do Estado da Paraíba, professor universitário, doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo – USP

YONE FREDIANIAcadêmica, pesquisadora, professora titular da Fundação Armando Álvares Penteado – FAAP, doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC

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Sumário

IMPERATIVIDADE DAS NORMAS LEGAIS TRABALHISTA E O PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DA RELAÇÃO DE EMPREGO: FORMAS DE MANIFESTAÇÃO DO POSTULADO NO ORDENAMENTO JURÍDICO TRABALHISTA BRASILEIROSergio Torres Teixeira

1

A INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL DA COMPETÊNCIA TERRITORIAL DAS VARAS DO TRABALHOMarcílio Florêncio Mota

2

INAPLICABILIDADE DA MULTA DO ART. 475-J DO CPC NA EXECUÇÃO TRABALHISTA COMO MEDIDA DE CELERIDADELuciana Paula Conforti

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68

92

Apresentação

Composição

Doutrina

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LOS DERECHOS DE LOS TRABAJADORES AUTÓNOMOS A LA SEGURIDAD YSALUD EN EL TRABAJO EN ELESTATUTO ESPAÑOL DE LOSTRABAJADORES AUTÓNOMOS:¿EFECTIVAMENTE UN PROGRESO? Juliana Cunha Cruz

5

AGENTES PÚBLICOS E RESPECTIVA TUTELA DA HIGIENE, SEGURANÇA E SAÚDE DO TRABALHO: QUESTÕES DE COMPETÊNCIABruno Santos Cunha

6

REFLEXOS DA INADMISSIBILIDADE DOS EMBARGOS DECLARATÓRIOS NO PRAZO DO RECURSO ORDINÁRIOJosé Geraldo da Fonseca

7O NOVO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO E A PRIVATIZAÇÃO DA PREVIDÊNCIAJuliana Teixeira Esteves

8ARTIGO 71 DA LEI 8.666/93 E SÚMULA 331 DO C. TST: PODERIA SER DIFERENTE?Tereza Aparecida Asta Gemignani

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AINDA O CONTRATO DE EXPERIÊNCIA: SUA CESSAÇÃO À LUZ DOSPRINCÍPIOS DA CONSERVAÇÃO DOS CONTRATOS E DA BOA FÉ Jólia Lucena da Rocha Melo

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231

303

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Jurisprudência

Acordãos

Súmulas

Sentenças

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Apresentação

A sociedade atual apresenta relações e conflitos so-ciais, em permanente expansão e transformação, que se mostram cada vez mais variados e intrincados. No tocante à esfera laboral, a superação de antigos sistemas de produção e a adoção de novas práticas e interações econômicas passam a impor aos juízes do trabalho uma compreensão transdisciplinar da complexidade dessa nova realidade. Desse modo, impressiona o vasto leque de habilidades cognitivas, funcionais e atitudinais que agora lhes são exigidas. De mais a mais, porque pautados por metas de produtividade e eficiência, já passou a época na qual deles se esperava apenas a capacidade de aplicar o direito abstrato aos casos concretos submetidos a sua apreciação e julgamento. Inspirados por planejamentos estratégicos organizacionais e baseados em técnicas de administração judiciária, bem como no compartilhamento de experiências em rotinas de serviço, tam-bém vêm adquirindo relevo suas atribuições enquanto gestores de pessoas, de processos judiciais e de processos de trabalho em unidade jurisdicional. Por conseguinte, sua formação inicial e

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continuada, da posse até o fim da carreira, não mais pode ficar cingida a estudos acadêmico-jurídicos, devendo, cada vez mais, também trafegar por outras áreas do conhecimento, abranger o aprendizado de caráter profissionalizante e levar em conta a educação corporativa.

Nesse panorama, por assumirem a missão constitu-cional de preparação e aprimoramento da magistratura, ganha destaque o papel das escolas nacionais de formação e aperfei-çoamento previstas pela EC n° 45, de 2004. No que se refere à Justiça do Trabalho, por força do disposto no art. 111-A, §2º, I, da Magna Carta, passou a funcionar, junto ao Tribunal Superior do Trabalho, a Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho – ENAMAT e, sob sua coorde-nação, a partir da criação ou consolidação de escolas judiciais vinculadas a cada um dos Tribunais Regionais do Trabalho, foi composto o Sistema Integrado de Formação de Magistrados do Trabalho – SIFMT (art. 19 da Resolução Administrativa nº 1156/2006 do TST).

Mais recentemente, de acordo com a Resolução nº 04 da ENAMAT, de 13 de abril de 2010, regulamentou-se as competências a serem adquiridas ou desenvolvidas pelos ma-gistrados do trabalho como esteio às ações formativas da escola nacional e das regionais. Embora o aprendizado seja realizado de maneira integrada e em sincronia, o conjunto de tais compe-tências, didática e pedagogicamente, foi subdividido em eixos teórico-práticos de competências gerais e de competências es-pecíficas, nos quais houve distribuição em diversos subeixos que abrigaram aquelas passíveis de tratamento análogo. Delineou-se, pois, as áreas temáticas que servem de referencial aos progra-mas nacionais e regionais de capacitação e aperfeiçoamento dos

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magistrados do trabalho.

Nesse contexto, a Revista do TRT6 também deve ser compreendida como importante material de apoio a essa forma-ção na medida em que representa bibliografia referencial para consulta, sendo repositório de textos cuja leitura é de significati-va relevância ao seu aprimoramento profissional e de selecionada jurisprudência da Sexta Região da Justiça do Trabalho.

Recife, 30 de novembro de 2010

PEDRO PAULO PEREIRA NÓBREGA

Desembargador Diretor

AGENOR MARTINS PEREIRA

Juiz Coordenador-Geral

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Composição

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ComposiçãoDESEMBARGADORES DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA SEXTA REGIÃO

PRESIDENTE

Eneida Melo Correia de Araújo

VICE-PRESIDENTE

André Genn de Assunção Barros

CORREGEDOR

Ivanildo da Cunha Andrade

TRIBUNAL PLENO

Gilvan Caldas de Sá BarretoNelson Soares JúniorJosélia Morais da CostaEneida Melo Correia de AraújoMaria Helena Guedes Soares de Pinho MacielAndré Genn de Assunção BarrosIvanildo da Cunha Andrade

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Gisane Barbosa de AraújoPedro Paulo Pereira NóbregaVirgínia Malta CanavarroValéria Gondim SampaioIvan de Souza Valença AlvesValdir José Silva de CarvalhoAcácio Júlio Kezen CaldeiraDione Nunes Furtado da SilvaDinah Figueirêdo BernardoMaria Clara Saboya Albuquerque BernardinoNise Pedroso Lins de Souza

Primeira Turma

PRESIDENTENelson Soares Júnior

Desembargadores Valéria Gondim SampaioIvan de Souza Valença AlvesDinah Figueirêdo BernardoNise Pedroso Lins de Souza

Segunda Turma

PRESIDENTEAcácio Júlio Kezen Caldeira

DesembargadoresJosélia Morais da CostaMaria Helena Guedes Soares de Pinho MacielValdir José Silva de Carvalho Dione Nunes Furtado da Silva

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Terceira Turma

PRESIDENTEGisane Barbosa de Araújo

DesembargadoresGilvan Caldas de Sá Barreto Pedro Paulo Pereira NóbregaVirgínia Malta CanavarroMaria Clara Saboya Albuquerque Bernardino

JUIZ OUVIDOR E CONCILIADOR DA SEGUNDA INSTÂNCIAGuilherme de Morais Mendonça

DIREÇÃO DA ESCOLA JUDICIAL DO TRIBUNAL REGIO-NAL DO TRABALHO DA SEXTA REGIÃO (EJ-TRT6)

DIRETOR

Desembargador Pedro Paulo Pereira Nóbrega

COORDENADOR GERAL

Juiz Agenor Martins Pereira

COORDENADORES ADJUNTOS

Juíza Ana Maria Aparecida de Freitas

Juiz Guilherme de Morais Mendonça

Juiz Virgínio Henriques de Sá e Benevides

CONSELHEIRAS

Desembargadora Gisane Barbosa de Araújo

Desembargadora Eneida Melo Correia de Araújo

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JUÍZES TITULARES DAS 61 VARAS DO TRABALHO DE PERNAMBUCO

Capital – Fórum Advogado José Barbosa de Araújo (Edifício Sudene)

1ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEYolanda Polimeni de Araújo Pinheiro

2ª VARA DO TRABALHO DO RECIFELúcia Teixeira da Costa Oliveira

3ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEMaria do Socorro Silva Emerenciano

4ª VARA DO TRABALHO DO RECIFERoberta Corrêa de Araújo Monteiro

5ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEHélio Luiz Fernandes Galvão

6ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEMilton Gouveia da Silva Filho

7ª VARA DO TRABALHO DO RECIFECarmen Lúcia Vieira do Nascimento

8ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEPatrícia Coelho Brandão Vieira

9ª VARA DO TRABALHO DO RECIFETheodomiro Romeiro dos Santos

10ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEAna Cristina da Silva Ferreira Lima

11ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEVirgínia Lúcia de Sá Bahia

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12ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEHugo Cavalcanti Melo Filho

13ª VARA DO TRABALHO DO RECIFELarry da Silva Oliveira Filho

14ª VARA DO TRABALHO DO RECIFE(vago)

15ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEGilvanildo de Araújo Lima

16ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEPaula Regina de Queiroz Monteiro G. Muniz

17ª VARA DO TRABALHO DO RECIFELígia Maria Valois Albuquerque de Abreu

18ª VARA DO TRABALHO DO RECIFESolange Moura de Andrade

19ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEFernando Cabral de Andrade Filho

20ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEAlberto Carlos de Mendonça

21ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEJosé Luciano Alexo da Silva

22ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEEdmilson Alves da Silva

23ª VARA DO TRABALHO DO RECIFEDaisy Anderson Tenório

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Região Metropolitana, Zona da Mata, Agreste e Sertão

VARA DO TRABALHO DE ARARIPINACarla Janaína Moura Lacerda

VARA DO TRABALHO DE BARREIROSRogério Freyre Costa

VARA DO TRABALHO DE BELO JARDIMMarcelo da Veiga Pessoa Bacallá

1ª VARA DO TRABALHO DO CABOBartolomeu Alves Bezerra

2ª VARA DO TRABALHO DO CABOMaria do Carmo Varejão Richlin

VARA DO TRABALHO DE CARPINAAmaury de Oliveira Xavier Ramos Filho

1ª VARA DO TRABALHO DE CARUARUAgenor Martins Pereira

2ª VARA DO TRABALHO DE CARUARUJosé Wilson da Fonseca

3ª VARA DO TRABALHO DE CARUARUMaria das Graças de Arruda França

VARA DO TRABALHO DE CATENDEAna Isabel Guerra Barbosa Koury

VARA DO TRABALHO DE ESCADAWalkíria Míriam Pinto de Carvalho

VARA DO TRABALHO DE GARANHUNSMurilo Augusto Araujo de Alencar

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VARA DO TRABALHO DE GOIANASérgio Vaisman

VARA DO TRABALHO DE IGARASSUIbrahim Alves da Silva Filho

1ª VARA DO TRABALHO DE IPOJUCASérgio Murilo de Carvalho Lins

2ª VARA DO TRABALHO DE IPOJUCARenata Lima Rodrigues

1ª VARA DO TRABALHO DE JABOATÃO DOS GUARARAPESMaria de Betânia Silveira Villela

2ª VARA DO TRABALHO DE JABOATÃO DOS GUARARAPESSergio Torres Teixeira

3ª VARA DO TRABALHO DE JABOATÃO DOS GUARARAPESAurélio da Silva

4ª VARA DO TRABALHO DE JABOATÃO DOS GUARARAPESAna Cláudia Petruccelli de Lima

VARA DO TRABALHO DE LIMOEIROPaulo Dias de Alcântara

VARA DO TRABALHO DE NAZARÉ DA MATARobson Tavares Dutra

1ª VARA DO TRABALHO DE OLINDAMayard de França Saboya Albuquerque

2ª VARA DO TRABALHO DE OLINDAMartha Cristina do Nascimento Cantalice

3ª VARA DO TRABALHO DE OLINDARoberto de Freire Bastos

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VARA DO TRABALHO DE PALMARESRenata Lapenda Rodrigues de Melo

1ª VARA DO TRABALHO DE PAULISTAMarcílio Florêncio Mota

2ª VARA DO TRABALHO DE PAULISTAMaria Consolata Rego Batista

VARA DO TRABALHO DE PESQUEIRAGenaro de Oliveira Pinheiro Menezes

1ª VARA DO TRABALHO DE PETROLINA(vago)

2ª VARA DO TRABALHO DE PETROLINAAndréa Keust Bandeira de Melo

VARA DO TRABALHO DE RIBEIRÃOAline Pimentel Gonçalves

VARA DO TRABALHO DE SALGUEIROBernardo Nunes da Costa Neto

VARA DO TRABALHO DE SÃO LOURENÇO DA MATACelivaldo Varejão Ferreira de Alcântara

VARA DO TRABALHO DE SERRA TALHADAAntônio Wanderley Martins

VARA DO TRABALHO DE TIMBAÚBAVirgínio Henriques de Sá e Benevides

VARA DO TRABALHO DE VITÓRIA DE SANTO ANTÃOAna Catarina Cisneiros Barbosa de Araújo

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JUÍZES SUBSTITUTOS

Andréa Cláudia de Souza Plaudenice Abreu de Araújo Barreto VieiraGeorge Sidney Neiva Coelho Patrícia Pedrosa Souto MaiorJudite Galindo Sampaio CurchatuzGuilherme de Moraes MendonçaAna Maria Soares Ribeiro de Barros Sohad Maria Dutra Cahú Gustavo Augusto Pires de Oliveira Juliana Lyra Barbosa Josimar Mendes da Silva Fábio José Ribeiro Dantas Furtado Tânia Regina Chenk Allatta Luciana Paula Conforti Maria José de Souza André Luiz Machado Ana Maria Aparecida de Freitas Walmar Soares Chaves Marília Gabriela Mendes Leite de Andrade Márcia de Windsor NogueiraKátia Keitiane da Rocha PorterRosa Melo Machado Regina Maura Maciel Lemos Adrião Cristina Figueira Callou da Cruz Gonçalves Danielle Lira PimentelEster de Souza Araújo Furtado Cláudia Christina Santos Rodrigues de Lima Gustavo Henrique Cisneiros Barbosa José Adelmy da Silva Acioli Saulo Bosco Souza de Medeiros Ilka Eliane de Souza Tavares Carla Santina de Souza Rodrigues Vanessa Zacchê de Sá

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Luiz Antônio Magalhães Maysa Costa de Carvalho AlvesAdriana Satou Lessa Ferreira Pinheiro Ana Cristina Argolo de Barros Armando da Cunha Rabelo NetoCeumara de Souza Freitas e SoaresMatheus Ribeiro Rezende Laura Cavalcanti de Morais BotelhoLucas de Araújo Cavalcanti Necy Lapenda Pessoa de Albuquerque de AzevedoGênison Cirilo Cabral Joaquim Emiliano Fortaleza de Lima Antônio Augusto Serra Seca Neto Evellyne Ferraz Correia de FariasJosé Augusto Segundo Neto Ana Catarina Magalhães de Andrade Sá Leitão Jammyr Lins Maciel Edson Luís Bryk Renata Conceição Nóbrega Santos Rafael Val NogueiraCamila Augusta Cabral Vasconcelos Cássia Barata de Moraes Santos Miriam Souto Maior de Morais Marta de Fátima Leal Chaves Eduardo Henrique Brennand Dornelas Câmara Katharina Vila Nova de Carvalho Mafra Liliane Mendonça de Moraes Souza Rodrigo Samico Carneiro Danilo Cavalcanti de Oliveira Roberta Vance Harrop

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DIRETORES ADMINISTRATIVOS

SECRETÁRIO-GERAL DA PRESIDÊNCIA José Alberto Alves Viana SECRETÁRIA DO TRIBUNAL PLENO Nyédja Menezes Soares de Azevedo

DIRETOR-GERAL DE SECRETARIA Wlademir de Souza Rolim

SECRETÁRIO DA CORREGEDORIA Antônio Castilhos Pedrosa

DIRETOR DA SECRETARIA DE INFORMÁTICA João Adriano Pinheiro de Sousa

DIRETOR DA SECRETARIA DE ORÇAMENTO E FINANÇAS Flávio Romero Mendes de Oliveira

DIRETORA DA SECRETARIA DE RECURSOS HUMANOS Eliane Farias Remígio Marques

DIRETOR DA SECRETARIA ADMINISTRATIVA Sérgio Santos de Lucena e Melo

DIRETORA DA SECRETARIA DE

DISTRIBUIÇÃO DOS FEITOS DA CAPITAL Daniela Satou Lessa Ferreira

DIRETOR DA SECRETARIA DE AUDITORIA E CONTROLE INTERNO Enoque de Souza e Silva Sobrinho

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DIRETOR DA SECRETARIA DE

DISTRIBUIÇÃO DE MANDADOS JUDICIAIS Ronaldo Soares de Souza

COORDENADOR DE SEGURANÇA, TRANSPORTE E TELEFONIA

Everson Lemos de Araújo

DIRETOR DO SERVIÇO DE CONTABILIDADE Airton Costa Cavalcanti

DIRETOR DO SERVIÇO DE ENGENHARIA

DE MANUTENÇÃO DA SECRETARIA ADMINISTRATIVA Durval Soares da Silva Júnior

DIRETOR DO SERVIÇO DE PAGAMENTO DE PESSOAL Humberto Galvão da Silva

DIRETOR DO SERVIÇO DE ADMINISTRAÇÃO DE PESSOAL Sérgio Mário do Nascimento Aguiar

DIRETORA DO SERVIÇO DE LICITAÇÕES E CONTRATOS Ana Lylia Farias Guerra

DIRETOR DO SERVIÇO DE SUPORTE E

DESENVOLVIMENTO DA SECRETARIA DE INFORMÁTICA Henrique de Barros Saraiva

DIRETOR DO SERVIÇO DE MATERIAL Murilo Gomes Leal Júnior

DIRETORA DO SERVIÇO DE PLANEJAMENTO FÍSICO DA

SECRETARIA ADMINISTRATIVA Tânia Virgínia Leitão Valois

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ASSESSOR DA ORDENADORIA DA DESPESA Juscelino Rodrigues de Carvalho

COORDENADORA DE DESENVOLVIMENTO DE PESSOAL Andréa Leite Guedes Pereira

COORDENADORA DE CADASTRAMENTO, AUTUAÇÃO E DISTRI-

BUIÇÃO DA SEGUNDA INSTÂNCIA Eugênia Maria Coutinho Tavares de Albuquerque

COORDENADORA DE SAÚDE Semírames Rocha de Oliveira

COORDENADOR DO FÓRUM ADVOGADO JOSÉ BARBOSA DE

ARAÚJO Esdras Ferreira Nogueira

COORDENADORA DE PRECATÓRIOS Wilma Lúcia Silva

COORDENADORA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL DA PRESIDÊNCIA Lydia Gomes de Barros

COORDENADORA DO GRUPO DE GESTÃO DOCUMENTAL Marcília Gomes

(atualizado até 31/10/2010)

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Doutrina

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Revista TRT 6 • DOUTRINA

3535

Sumário:1. Normas Trabalhistas e sua Imperatividade;2. Princípios Orientadores do Direito do Trabalho;3. Princípio da Continuidade da Relação de Emprego;4. Formas de Manifestação do Princípio da Continuidade;5. Princípio da Continuidade da Relação de Emprego e

Controle do Direito de Despedir do Empregador.

1. Normas Trabalhistas e sua Imperatividade

IMPERATIVIDADE DAS NORMAS LEGAIS TRABALHISTAS E O PRINCÍPIO DA CONTINUIDADE DA RELAÇÃO DE EMPREGO: FORMAS DE MANIFESTAÇÃO DO POSTULADO NO ORDENAMENTO JURÍDICO TRABALHISTA BRASILEIRO

Sergio Torres TeixeiraJuiz do Trabalho do TRT da 6ª Região, professor adjunto da UNICAP e da FDR/UFPE, doutor em direito e membro da Academia Nacional de Direito do Trabalho

1

Na seara do ordenamento jurídico trabalhista, a doutrina pátria1 destaca como a principal fonte de produção de normas

1 Vide Orlando Gomes Amauri Mascaro (Iniciação ao direito do trabalho. 29ª edição. São

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DOUTRINA • Revista TRT 6

36

trabalhistas o processo legiferante do Estado2. Enquanto regras disciplinadoras da relação entre empregado e empregador, compõem o conteúdo do contrato individual de trabalho normas negociais, consuetudinárias e jurisprudenciais, mas quase sempre em número reduzido em virtude da absoluta predominância de normas legais reguladoras das relações trabalhistas. No contexto do quadro empírico das relações laborais no Brasil, as desigualdades econômicas e sociais impuseram ao Estado a regulamentação normativa minuciosa do contrato individual de trabalho, com a finalidade específica de evitar ou diminuir o seu desvirtuamento. Igualmente podem

Paulo: LTr, 2003, p. 79) e Délio Maranhão (Instituições de direito do trabalho. Vol. I. 20ª edição. São Paulo: LTr, 2002, p. 155).

2 Para Miguel Reale (Lições preliminares de direito. 16ª edição. São: Paulo: Saraiva, 1988, p. 140), fonte de direito designa “os processos ou meios em virtude dos quais as regras jurídicas se positivam com legítima força obrigatória, isto é, com vigência e eficácia”. Pressupõe, portanto, a existência de um “poder capaz de especificar o conteúdo do devido, para exigir o seu cumprimento, não sendo indispensável que ele mesmo aplique a sanção penal”. Toda fonte de direito, por conseguinte, “implica uma estrutura de poder, pois a gênese de qualquer regra de direito (nomogênese jurídica) só ocorre em virtude da interferência de um centro de poder, o qual, diante de um complexo de fato e valores, opta por dada solução normativa com características de objetividade”. Vários são os critérios utilizados pelos doutrinadores para as enquadrar em diferentes modalidades. A classificação tradicionalmente apontada nas obras jurídicas é aquela que as divide em “fontes materiais” e “fontes formais”. Estas, também chamadas de “fontes de conhecimento ou de cognição”, seriam os meios pelos quais se estabelece a norma jurídica, ou seja, os canais pelos quais o intérprete conhece a norma de direito. Aquelas, por sua vez, igualmente conhecidas como “fontes reais ou de produção”, seriam as fontes potenciais do direito, compreendendo o conjunto de fenômenos sociais que contribuem para a formação da substância do direito. Miguel Reale critica a clássica distinção entre fonte formal e fonte material de direito, afirmando que tal divisão tem provocado grandes equívocos na seara da Jurisprudência. Tradicionalmente, fonte material (real ou de produção) corresponde aos fatos que condicionam o surgimento, definem o conteúdo e provocam as transformações das normas jurídicas. As fontes materiais apontam a origem do direito, configurando a sua gênese. Seriam os fatores sociais (históricos, políticos, econômicos, etc.) que iniciam o processo produtivo de uma regra de direito. Envolve, portanto, o estudo filosófico ou sociológico do fundamento ético da norma jurídica, o que, para Miguel Reale, situa-se fora do campo da Ciência Jurídica. Fonte formal ou de conhecimento, por outro lado, no sentido clássico traduz a acepção de processo através do qual se cria uma norma jurídica. Fontes formais, pois, são os modos de manifestação do direito, formas de expressão do direito positivo, os meios mediante os quais o operador do direito conhece e descreve a norma jurídica. Nesse sentido, segundo Miguel Reale, refere-se à verdadeira fonte de direito, como canal de manifestação das normas de direito e meio pelo qual a norma jurídica se positiva com legítima força obrigatória, isto é, com vigência e eficácia. E, como tal, deve absorver toda atenção do estudioso da ciência jurídica. Para Reale, destarte, no campo da Jurisprudência o termo fonte do direito deve ser utilizado para indicar apenas os processos de produção de normas jurídicas. De acordo com o entendimento do professor paulista, por conseguinte, são apenas quatro as verdadeiras fontes de direito: o processo legislativo do Estado, a atividade jurisprudencial dos tribunais, a prática consuetudinária e o poder negocial.

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compor o conteúdo do contrato de emprego normas convencionais, consuetudinárias e jurisprudenciais, mas na prática as normas legais formam praticamente toda a estrutura do pacto laboral.

A atividade negocial, exercida tanto no plano individual pelos sujeitos da relação de emprego como no plano coletivo pelas entidades sindicais, assume na prática uma postura supletiva, manifestando-se quase que exclusivamente dentro das lacunas da lei. A atividade judicante dos órgãos jurisdicionais3 e as práticas e costumes profissionais4, por sua vez, revelam posições de ainda menor relevância dentro do âmbito da criação de normas jurídicas trabalhistas.

Como conseqüência, a maior parte das normas disciplinadoras da relação empregatícia, e, portanto, do correspondente conteúdo do contrato de emprego, derivam diretamente da legislação estatal5. Em que pese a pluralidade de fontes de normas trabalhistas6, assim, apenas o processo legislativo do Estado assume verdadeira posição de destaque. A atividade legiferante, na prática, assume o monopólio da definição das condições de trabalho às quais se submetem os sujeitos da relação de emprego, permanecendo em segundo plano a atividade negocial (coletiva e individual), a prática consuetudinária e a atividade judicante dos tribunais.

As normas da legislação trabalhista, por sua vez, revelam

3 Mesmo que em menor grau, torna-se forçoso reconhecer que a criação de normas jurídicas abstratas atividade judicante dos tribunais do trabalho, integrantes da Justiça do Trabalho na estrutura brasileira do Poder Judiciário da União (artigos 111 a 117 da Constituição da República de 1988), notadamente pela chamada atividade sumular, uma manifestação comum aos demais ramos do Judiciário. Mediante a edição de Súmulas da Jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho, o órgão de cúpula do Judiciário Trabalhista sedimenta o entendimento dos seus ministros em súmulas que passam a servir de diretrizes para os juízes de instâncias inferiores (mesmo que sem efeito vinculante). Algumas Súmulas, como o de número 291 (que prevê uma indenização compensatória devida ao empregado na hipótese de supressão de horas extras prestadas habitualmente), exemplificam com perfeição tal atividade criadora.

4 José Martins Catharino (Compêndio de direito do trabalho. 3ª edição. São Paulo: Saraiva, 1982, p. 90), apesar de menor relevância atribuída à prática consuetudinária, sustenta que “um dos casos mais significativos de direito costumeiro no Brasil são os relativos aos chamados costumes profissionais”.

5 A atividade legiferante do Estado, merece ser salientado, é exercido primordialmente pelo Poder Legislativo, mas também há atividade normativa por parte do Executivo (edição de medida provisória, por exemplo), bem como pelo Judiciário (elaboração do regimento interno de um tribunal).

6 Vide Maurício Godinho Delgado (Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2002, p. 139).

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nítida índole imperativa e natureza de ordem pública. As normas de origem estatal se impõem sobre os sujeitos

do contrato de emprego, mesmo em face do princípio da autonomia da vontade. As regras estabelecidas nas leis de conteúdo laboral, portanto, são via de regra inderrogáveis e cogentes, sujeitando a vontade dos sujeitos da relação de emprego ao seu comando de forma irresistível. A regulamentação estatal das relações laborais por meio de leis trabalhistas, por sua vez, ocorre por intermédio de duas categorias básicas de normas: as de proteção mínima e as proibitivas.7 Estas, em menor número, revelam como finalidade vedar a prática de determinados atos trabalhistas como forma de resguardar, em última análise, o interesse público. Aquelas, compondo a grande massa de normas trabalhistas, almejam assegurar um mínimo de proteção ao empregado hipossuficiente, estabelecendo limites intransponíveis pela vontade das partes.8

A maior parte das normas legais de conteúdo laboral, por seu turno, exprimem um mínimo de garantias ao empregado hipossuficiente, estabelecendo limites dentro dos quais se admite a estipulação de outras condições de trabalho. Há espaço para a criação de normas mediante as demais fontes de direito, mas apenas no sentido de melhor beneficiar o prestador dos serviços. O legislador cria uma plataforma mínima, em cima da qual as outras fontes podem produzir normas que melhor atendem aos interesses dos empregados, e, em última análise, ao interesse público em proteger o hipossuficiente. A dinamicidade das fontes de normas trabalhistas se evidencia em tal sentido. Existindo a colidência, em uma mesma situação laboral concreta, entre normas de positivação distinta, ou seja, regras oriundas de fontes diferentes, prevalece aquela que melhor beneficia

7 Existe ainda uma terceira categoria, constituída por normas destinadas a estabelecer os contornos dos institutos do juslaboralismo. São as chamadas normas estruturais, como, por exemplo, as que fixam a definição legal de empregador e de empregado (artigos 2º e 3º da CLT, respectivamente).

8 Exemplo de norma proibitiva é a esculpida no artigo 7º, inciso XXXIII, da Constituição da República, que estabelece a “proibição de trabalho noturno, perigoso ou insalubre aos menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de quatorze anos, salvo na condição de aprendiz”. Exemplos de normas de proteção mínima são as previstas nos incisos IV e XIII do mesmo artigo constitucional, a primeira estipulando como contraprestação mínima a ser paga ao empregado o “salário mínimo, fixado em lei”, a segunda definindo o período máximo dentro do qual o empregador pode exigir que o empregado permaneça a sua disposição, ao estabelecer a “duração do trabalho normal não superior a oito horas diárias e quarenta e quatro semanais”.

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o empregado, desde que não haja a violação a interesse público. A regra, assim, é a superioridade da norma mais benéfica, seja qual for a sua fonte de produção. Norma legal, norma consuetudinária, norma jurisprudencial, norma convencional coletiva ou individual. Não importa a origem, desde que resguardado o interesse público9, prevalece aquela mais favorável ao hipossuficiente.10

A chamada hierarquia dinâmica das fontes do Direito do Trabalho, portanto, resulta do próprio caráter tutelar das suas normas.11

A lei impõe os limites mínimos, em cima dos quais podem ser criadas condições mais benéficas mediante as atividades consuetudinária e jurisprudencial, e, especialmente, pelo poder negocial das entidades sindicais e dos próprios sujeitos da relação de emprego. A imperatividade da legislação trabalhista, constituída em sua maior parte por normas cogentes, inderrogáveis e de ordem pública, se revela rígida apenas no sentido de resguardar o interesse público em proteger o empregado, admitindo-se a sua superação em função de normas mais favoráveis.

A margem deixada pelo legislador, entretanto, não se revela tão ampla quanto possa parecer à primeira vista. Mesmo que mais favorável ao empregado, não se admite cláusula contratual contrária ao interesse público. Nesse sentido, o artigo 444 consolidado, após

9 A prevalência do interesse público sobre o interesse individual do empregador ou do empregador, e, ainda sobre o interesse coletivo, é uma das peculiaridades da hierarquia dinâmica das fontes de normas trabalhistas. Prevalece a norma mais benéfica, desde que não ferido o interesse público. A aplicação de uma norma convencional mais favorável ao empregado, por exemplo, nem sempre será realizado em detrimento de uma norma legal menos favorável, caso haja interesse público na superioridade na observância da lei. É a hipótese do artigo 623 da CLT: “Será nula de pleno direito disposição de Convenção ou Acordo que, direta ou indiretamente, contrarie proibição ou norma disciplinadora da política econômico-financeira do Governo ou concernente à política salarial vigente, não produzindo quaisquer efeitos perante autoridades e repartições públicas, inclusive para fins de revisão de preços e tarifas de mercadorias e serviços”. O artigo 8º da Consolidação é claro ao estabelecer que as autoridades administrativas e jurisdicionais decidirão “sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público”. A hierarquia dinâmica das fontes de normas trabalhistas, portanto, encontra limites no que concerne à prevalência do interesse público. Normalmente, em virtude do caráter protecionista, o interesse público coincide com o interesse particular do empregado. havendo um choque entre ambos, entretanto, prevalece a norma que resguarda o domínio do interesse público.

10 Para uma análise minuciosa acerca da matéria, vide Maurício Godinho Delgado (Introdução ao direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1995).

11 Vide Sergio Torres Teixeira (“Hierarquia Dinâmica das Fontes do Direito do Trabalho” in Revista do TRT da 6ª Região. Vol. 11. nº 27. Recife, 1999/2000, p. 182-214).

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assegurar a “livre estipulação” das condições contratuais pelo sujeitos da relação de emprego, restringe tal liberdade ao limitar o poder negocial individual a “tudo que não contravenha às disposições legais de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que lhe sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes”. E, em idêntico sentido, o artigo 8º da CLT, a seguir transcrito:

Artigo 8º. As autoridades administrativas e a Justiça do Trabalho, na falta de disposições legais ou contratuais, decidirão, conforme o caso, pela jurisprudência, por analogia, por eqüidade e outros princípios e normas gerais de direito, principalmente do direito do trabalho, mas sempre de maneira que nenhum interesse de classe ou particular prevaleça sobre o interesse público.

A legislação laboral pátria, destarte, estabelece limites dentro dos quais as partes devem se portar, assegurando uma autonomia contratual subordinada às regras de proteção, considerando sempre a situação de desigualdade resultante da condição de hipossuficiência do empregado, mas à luz do interesse público em proporcionar tal proteção. A índole tutelar característica do sistema dogmático trabalhista, assim, permite a estipulação de condições contratuais pelas partes contratantes, mas apenas no âmbito de tais fronteiras.

E é exatamente tal natureza tutelar das normas trabalhistas, destarte, que faz prevalecer a índole institucionalista da relação de emprego. Corresponde a um contrato, firmado pelos seus dois sujeitos (empregado e empregador), mas de cunho predominantemente “estatutário”, pois seu teor objetivo é formado, primordialmente, por regras definidas pelo legislador. Em outras palavras, trata-se de um negócio jurídico cujo conteúdo é, na sua maior parte, constituído por condições oriundas de normas legais de índole protecionista.

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2. Princípios Orientadores do Direito do Trabalho

A índole tutelar e o cunho protecionista do Direito do Trabalho, portanto, representam características consagradas universalmente na doutrina e na legislação dos mais diversos países, sendo refletidos nos principais diplomas legais disciplinadores das relações laborais.12

As normas legais, no entanto, não representam os únicos elementos que compõem o teor de um ramo do Direito.

Nesse sentido, o conteúdo do modelo trabalhista brasileiro é composto em sua maior parte por normas oriundas da atividade legislativa do Estado, em virtude da natureza tutelar das diretrizes legais. A prevalência decorrente do monopólio estatal, contudo, não significa exclusividade. Conforme salientado anteriormente, ao lado da legislação laboral, além das normas oriundas das demais fontes de produção, igualmente integra o complexo de institutos do modelo jurídico trabalhista um elenco de princípios norteadores13, peculiares

12 Roberto Lyra Filho, entretanto, em artigo denominado “Direito do Capital e Direito do Trabalho”, publicado na coletânea Introdução crítica ao direito do trabalho (vol. 2, p. 62 a 75) discorda do entendimento dominante na doutrina nacional e estrangeira. No entender do mencionado autor, prevalece na sociedade brasileira um complexo de normas opressoras e retrógradas, chamado pelo mesmo de Direito do Capital, prejudicial aos trabalhadores hipossuficientes, sendo necessária a união de todos para chegar a “... uma sociedade em que todo Direito seja Direito do Trabalho, de honestos trabalhadores, sem medo e sem peias”.

13 Princípios, na lição de Miguel Reale (Lições preliminares de direito. 16ª edição. São Paulo: Saraiva, 1988, p. 299), “são verdades fundantes de um sistema de conhecimento, como tais admitidas, por serem evidentes ou por terem sido comprovadas, mas também por motivo de ordem prática de caráter operacional, isto é, como pressupostos exigidos pelas necessidades da pesquisa e da praxis”.Na linguagem comum, princípio é um ponto de partida, a causa primária, o momento no qual algo tem a sua origem. No sentido técnico, corresponde a um fundamento colocado na base de um ramo do saber humano, informando-o. Maurício Godinho Delgado (“Princípios do Direito do Trabalho”, in Revista LTr, abril de 1995, p. 472), leciona que “a palavra princípio traduz, de uma maneira geral, a noção de proposições ideais que se gestam na consciência das pessoas e grupos sociais a partir de certa realidade e que, após gestadas direcionam-se à compreensão, reprodução ou recriação dessa realidade. ... Nas ciências, a palavra princípio é apreendida com sentido similar, mas não exatamente idêntico. Aqui, os princípios correspondem à noção de proposições construídas a partir de uma certa realidade e que direcionam a compreensão da realidade examinada. Ou ‘proposições que se colocam na base de uma Ciência, informando-a’ (Cretella Jr.). Os princípios atuariam no processo de exame sistemâtico acerca de uma certa realidade - processo que é típico às Ciências - , iluminando e direcionando tal processo. ... Em conclusão, para a Ciência do Direito os princípios se conceituam como proposições ideias que informam a compreensão do fenômeno jurídico. São diretrizes centrais que se inferem de um sistema jurídico e que, após inferidas, a ele se reportam, informando-o”. Outro conceito de destaque é o de Américo Plá

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à seara jurídica das relações trabalhistas14.Representam, por sua vez, diretrizes orientadoras ou

enunciados lógicos, reconhecidos como alicerces de validade dos demais institutos componentes de determinado campo do saber humano. No âmbito da ciência jurídica, os princípios orientadores assumem um papel destacado. Cada um dos ramos autônomos do Direito apresenta o seu próprio elenco de princípios, que, por sua vez, não devem ser confundidos com as normas jurídicas que igualmente integram o seu conteúdo.

Os princípios constituem o fundamento do ordenamento jurídico, encontrando-se acima do direito positivo, servindo de inspiração aos preceitos legais. Atuam como os pressupostos lógicos, necessários aos frutos da atividade legislativa, ocupando a posição de alicerce da lei. Como diretrizes orientadoras, além de inspirarem os legisladores no processo de criação das normas jurídicas legais, igualmente informam o intérprete na compreensão do significado dos institutos e auxiliam o aplicador do direito na integração do ordenamento jurídico em face das lacunas da lei. Um princípio, assim, é um elemento mais geral, com maior grau de abstração em relação à

Rodriguez (Princípios de direito do trabalho. 2ª edição. São Paulo: LTr, 1993, p. 18), segundo o qual os princípios seriam “linhas diretrizes que informam algumas normas e inspiram direta ou indiretamente uma série de soluções, pelo que, podem servir para promover e embasar a aprovação de novas normas, orientar a interpretação das existentes e resolver os casos não previstos”. O conceito oferecido por Américo Plá Rodriquez, assim, destaca as funções primordiais dos princípios, englobadas na tríplice missão de exercer funções informadoras (inspirando o legislador, servindo de fundamento para o ordenamento jurídico), normativas (atuando como fonte supletiva, meio de integração do ordenamento jurídico nas hipóteses de lacunas na lei) e interpretativas (auxiliando na compreensão dos institutos, operando como diretriz orientadora do intérprete do direito).

14 Os princípios orientadores em análise não se confundem com os princípios gerais do direito. Enquanto estes são aplicados a todos os ramos da Jurisprudência, aqueles são postulados próprios de determinada ramificação da árvore jurídica. Junto com a afirmação acerca da autonomia científica do Direito do Trabalho, normalmente segue-se a afirmação sobre a existência de princípios peculiares ao ramo, distinto daqueles encontrados nos demais que compõem a constelação jurídica. Exatamente por possuir um domínio vasto, com doutrinas homogêneas precedidas por conceitos gerais comuns e marcadas por um método próprio, o ramo laboral da Jurisprudência revela o seu próprio elenco de princípios. O seu conteúdo, portanto, é composto de normas e de princípios peculiares, diferentes dos que caracterizam outros ramos. Como leciona Alfredo J Ruprecht (Os princípios do direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1995, p. 07), “Cada Direito, para ser autônomo deve ter seus princípios próprios que, no Trabalhista, são os que estão sendo analisados. Isso não quer dizer que os princípios gerais do Direito devem ser descartados in totum; valerão supletivamente e desde que não contrariem os princípios específicos da disciplina”.

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norma positiva, pois serve tanto para inspirar, como para interpretar, e, ainda, para suprir a ausência de um preceito legal. E, ressalta-se, executa tal mister perante um número indefinido de normas positivas.

É exatamente dentro do ordenamento positivo, entretanto, que são refletidos os princípios, retratados implicitamente no espírito das normas. Os princípios de um ramo do Direito, assim, surgem através de uma apreciação do conjunto normativo, mediante a consideração global dos preceitos positivos que formam o seu conteúdo. Apesar da influência mútua nutrida em relação às normas jurídicas que compõem o direito positivo, contudo, os preceitos positivos não se confundem com os princípios. Estes, além de revelarem um grau de generalidade consideravelmente superior ao das normas, não são encontrados escritos na própria legislação15, mas surgem de forma implícita, deduzidos por força da abstração. Existe apenas, destarte, um condicionamento recíproco entre os respectivos elementos, de forma a impedir uma independência completa entre os mesmos.

A importância dos princípios orientadores, por outro lado, cresce quando analisados à luz de um ramo do Direito ainda sem uma maturidade plena ou diante de institutos novos introduzidos num ramo cuja autonomia é inquestionável. Na primeira hipótese, a falta de uma maior consistência na esfera dos seus preceitos positivos, portanto, torna o recurso aos princípios uma constante necessidade do estudioso do respectivo campo do conhecimento jurídico. No segundo caso, por outro lado, os intérpretes são levados a utilizar os postulados como diretrizes orientadoras para melhor compreender o novel instrumento, logicamente distinto daqueles já consagrados definitivamente dentro do âmbito da respectiva ramificação do Direito.

Em que pese a reconhecida autonomia científica do Direito do Trabalho, assim, fatores como a origem relativamente recente e a falta de uma legislação adequada às incessantes mutações das relações trabalhistas, levam a maior parte da doutrina a considerá-lo ainda

15 Excepcionalmente, um princípio pode ser “positivado” pelo legislador, quando o postulado é consagrado expressamente num preceito legal. Tal hipótese ocorre, por exemplo, no caput do artigo 37 da Constituição da República de 1988, quando a obediência aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência é colocada de forma explícita no respectivo dispositivo constitucional. No caso da positivação de um princípio pelo legislador, assim, o postulado assume uma função nitidamente normativa, confundindo-se com um preceito positivo.

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em vias de amadurecimento. De igual forma, registra-se a constante introdução ao sistema positivo pátrio de novos institutos, oriundos da criatividade do legislador nacional ou da adoção de instrumentos alienígenas, e, ainda, da ratificação de tratados internacionais. Em virtude de tais circunstâncias, por conseguinte, o uso de princípios norteadores assume indiscutível importância prática.

Como ramo autônomo da ciência jurídica, por sua vez, o Direito do Trabalho apresenta o seu próprio elenco de princípios clássicos, considerados como universais pelos doutos.16

Apesar da diversidade encontrada nas relações apresentadas pelos autores na literatura pátria e estrangeira, uma lista de princípios

16 Tais princípios peculiares, por definição, incidem sobre um ramo específico da Ciência Jurídica. Não precisam ser exclusivos, mas de forma alguma podem ser aplicados a todos os ramos do Direito, pois então perderiam o seu caráter de peculiaridade. O reconhecimento da existência de princípios peculiares do Direito do Trabalho, ressalte-se mais uma vez, é pressuposto essencial à admissão da sua autonomia. A relevância da temática dentro do contexto do Direito do Trabalho é salientada pelos tratadistas laborais. Américo Plá Rodriguez (Princípios de direito do trabalho. 2ª edição. São Paulo: LTr, 1993, p. 11) afirma que “consideramos importante o tema, não apenas pela função fundamental que os princípios sempre exercem em toda disciplina, mas também porque, dada sua permanente evolução e aparecimento recente, o Direito do Trabalho necessita apoiar-se em princípios que supram a estrutura conceitual, assentada em séculos de vigência e experiência possuídas por outros ramos jurídicos”. Francisco Meton Marques de Lima (Princípios de direito do trabalho na lei e na jurisprudência. São Paulo: LTr, 1994, p. 09), invoca semelhante justificativa, ao sustentar na introdução à sua obra que “considerando a velocidade com que se modificam as relações econômicas e a tecnologia, entretanto a lei continua estática, indiferente aos avanços materiais; prega-se o emprego do método interpretativo PRINCIPIOLÓGICO, isto é, com respaldo nos princípios jurídicos, extraídos do próprio direito positivo nacional. Os princípios fundamentam a legislação, por isso, melhor compreenderá a lei quem lhe conhecer o embasamento teórico. Por sua vez, a jurisprudência interpreta a lei, segundo o direito especial.Logo, a exposição teórica dos princípios condensa toda a legislação dispersa em torno do mesmo tema e coleciona jurisprudência sobre o assunto em comento”. Em seguida, Francisco Meton Marques de Lima completa o seu raciocínio, ao afirmar que “o direito tem suas raízes fincadas nos princípios que o fecundam, orienta-se sob a sombra dos mesmos e de acordo com ele deve realizar-se. No tocante ao ramo do direito ora em tela, mais força ganha esta sentença, em face de se tratar de um direito novo, de doutrina ainda incipiente, jurisprudência discrepante e legislação oscilante”. Quanto à definição do rol de postulados que compõem a relação de princípios orientadores do Direito do Trabalho, entretanto, registra-se na literatura pátria e estrangeira, uma flagrante diversidade, tão manifesta que prima facie pode gerar dúvidas acerca da identidade do objeto focalizado. A análise das obras clássicas que compõem a literatura especializada revela que raras são as coincidências entre os elencos de princípios arrolados pelos autores. Novamente Américo Plá Rodriquez (Princípios de direito do trabalho. 2ª edição. São Paulo: LTr, 1993, p. 10), afirma que de 14 autores pesquisados, foram identificados 25 princípios distintos apresentados nas respectivas relações. As causas dessas divergências, no entender do professor uruguaio, são várias, começando pelo desdobramento de um em vários princípios ou a concentração de vários num só princípio. Vide ainda Luiz de Pinho Pedreira da Silva (Principiologia do direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1997).

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assume a posição de destaque em face da sua ampla aceitação por parte dos estudiosos da matéria trabalhista. É a relação elaborada pelo professor uruguaio Américo Plá Rodriguez17. No seu elenco de princípios peculiares do Direito do Trabalho, o mencionado doutrinador apresenta os seguintes postulados clássicos: princípio de proteção, princípio da irrenunciabilidade dos direitos, princípio da primazia da realidade, princípio da razoabilidade, princípio da boa-fé e princípio da continuidade da relação de emprego.

O princípio de proteção revela a raiz tutelar do Direito do Trabalho, se relacionando com o seu principal fundamento, cuja finalidade é assegurar uma maior proteção jurídica ao empregado economicamente hipossuficiente, para afinal alcançar uma igualdade proporcional entre os sujeitos da relação de emprego. Daí a natureza tutelar das normas que a compõem18.

O princípio da irrenunciabilidade, por seu turno, corresponde ao postulado segundo o qual o empregado não pode se despojar dos direitos trabalhistas previstos no sistema normativo, por serem indisponíveis e assegurados em normas de ordem pública, imperativas e inderrogáveis. Almejando proteger o hipossuficiente, o Direito do

17 Princípios de direito do trabalho. 2ª edição. São Paulo: LTr, 1993, p. 24. O autor uruguaio, entretanto, admite que o tema não está suficientemente sedimentado e tampouco consolidado na literatura especializada. Alfredo J Ruprecht (Os princípios do direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1995) apresenta a seguinte relação: princípio protetor, princípio da irrenunciabilidade de direitos, princípio da continuidade do contrato, princípio da realidade, princípio da boa-fé, princípio do rendimento, princípio da racionalidade, princípio da colaboração, princípio da não-discriminação, princípio da dignidade humana, princípio da justiça social e princípio da eqüidade. Dentre os doutrinadores brasileiros, se destaca a relação de Francisco Meton Marques de Lima (Princípios de direito do trabalho na lei e na jurisprudência. São Paulo: LTr, 1994), que inclui os seguintes princípios específicos: princípio da norma mais favorável ao empregado, princípio do in dubio pro operario, princípio da condição mais benéfica, princípio da irrenunciabilidade dos direitos trabalhistas, princípio da continuidade da relação de emprego, princípio da primazia da realidade, princípio da razoabilidade, princípio da imodificabilidade in pejus do contrato de trabalho, princípio da irredutibilidade salarial, princípio da igualdade de salários, princípio da substituição automática das cláusulas contratuais pelas disposições coletivas e princípio da boa-fé.

18 Tal postulado, considerado pelos juristas o mais importante do elenco, se expressa através de três regras básicas: a regra in dubio pro operario, correspondente ao critério segundo o qual o intérprete deve preferir a interpretação mais vantajosa para o empregado na hipótese de ser a norma suscetível de diversos entendimentos; a regra da norma mais favorável, determinando que, na hipótese de existir mais de uma norma aplicável a um caso concreto, deve ser escolhida pelo aplicador aquela mais benéfica ao hipossuficiente, mesmo quando contrário ao critério tradicional da hierarquia das normas jurídicas; e a regra da condição mais benéfica, correspondente ao critério segundo o qual a incidência de uma nova norma jamais deve prejudicar as condições mais favoráveis nos quais se encontra o empregado.

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Trabalho torna inadmissível a renúncia do empregado aos direitos que lhe são assegurados, perdendo o hipossuficiente a disponibilidade sobre tais bens em virtude do interesse público em sua manutenção. Via de regra, assim, a renúncia do empregado deverá ser considerada nula de pleno direito.

O princípio da primazia da realidade, por outro lado, significa que, na hipótese de colidência entre a realidade empírica e o que surge de documentos ou acordos, prevalece aquela, ou seja, predomina a realidade fática. De acordo com as suas diretrizes, assim, o intérprete deve dar preferência ao que ocorre no campo dos fatos, em detrimento das formalidades. É a primazia dos fatos sobre a aparência formal.

O princípio da razoabilidade, por sua vez, corresponde ao postulado que estabelece a prevalência da razão dentro do âmbito das relações trabalhistas, definindo a consagração da racionalidade dentro da esfera laboral. A premissa, portanto, é que o homem age conforme a razão, e não de forma arbitrária. Revela-se importante na interpretação da conduta dos sujeitos da relação de emprego, servindo de relevante subsídio nas hipóteses nas quais a norma abstrata não estipula os limites concretos a serem adotados.

O princípio da boa-fé, enquanto postulado do Direito do Trabalho, representa a suposição segundo a qual os sujeitos da relação de emprego, o empregado e o empregador, atuam de forma leal dentro da seara das suas obrigações contratuais. Ambas as partes do contrato individual de trabalho, portanto, devem cumprir o respectivo pacto de boa-fé.

Dentre os que integram o elenco clássico, entretanto, é o chamado princípio da continuidade da relação de emprego19 que revela estreita vinculação com o tema do presente estudo. E, em virtude de sua relevância no contexto da presente análise, será examinado à parte.

19 Para Mário de la Cueva, coube à Constituição mexicana de 1917 a consagração de tal princípio (sob a a denominação de estabilidad en el trabajo). Na sua obra El nuevo derecho mexicano del trabajo (Tomo I. 8ª edição. México: Porrúa, 1983, p. 219), sustenta o mais conhecido dos juslaboralistas mexicanos que “la idea de la estabilidad en el trabajo es una creación de la Asamblea Magna de 1917, sin ningún precedente en otras legislaciones, ni siquiera en la doctrina de algún escritor o jurista. Nació en Querétaro, sin que pueda dicerse quién fue su autor, como una idea-fuerza destinada a dar seguridad a la vida obrera y a escalar la meta tan bellamente expresada por Máximo Dursi en su cuento Bertoldo en la Corte: ‘viver sin temor es el destino del hombre’.”

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3. Princípio da Continuidade da Relação de Em-prego

Como um pacto de trato sucessivo, o contrato de emprego não é efêmero, não se esgota pela prática de um ato único ou mediante a prática de uma operação isolada, como um contrato de compra e venda. A relação de emprego, conforme anteriormente destacado, corresponde a uma relação de trabalho não eventual, ou seja, um liame laboral no qual a eventualidade da prestação de serviços não se enquadra. Pressupõe o prolongamento do vínculo, diferenciando-se, assim, do trabalho eventual ou esporádico20. A relação laboral correspondente, assim, é uma relação de débito contínuo, renovando-se diariamente em face da seguida prestação de serviços, sendo marcada pela permanência e durabilidade21. O contrato não se realiza imediatamente através de um único ato, mas perdura no tempo. Via de regra, portanto, a relação não revela um momento prédefinido para a sua terminação, com a sua dissolução correspondendo a uma operação delicada.

Sendo o contrato de emprego um pacto de execução continuada e de caráter intuitu personae em relação à pessoa do empregado (conseqüência natural da pessoalidade exigida pela legislação trabalhista para a configuração do vínculo), existe uma tendência lógica à formulação de instrumentos tendentes a assegurar a permanência do negócio jurídico, em que pese o desgaste natural decorrente dos efeitos do tempo sobre qualquer relação continuada.

20 Não se deve confundir eventual ou esporádico com intermitente. O empregado pode prestar serviços de forma intermitente (como, por exemplo, o atendente de um restaurante que funciona apenas nos finais de semana), desde que haja regularidade quanto à relação laboral em si. A questão da lavadeira ou faxineira que presta serviços apenas um ou dois dias por semana, entretanto, é polêmica, inexistindo um posicionamento uniforme na literatura especializada e tampouco na jurisprudência dos tribunais do trabalho. Enquanto parte dos juslaboralistas reconhece o vínculo de emprego em face da regularidade da prestação de serviços, uma outra corrente entende tratar-se de uma espécie de trabalhador autônomo, devido à falta de uma continuidade direta na execução das suas atividades, quando a Lei do Trabalhador Doméstico (Lei 5.5859 de 11.12.72) exige para a caracterização de tal modalidade especial de elo empregatício a prestação de serviços de natureza contínua e não apenas serviço não-eventual, como na relação de emprego normal disciplinada pela CLT.

21 Não se exige, entretanto, a prestação diária de serviços. Um empregado pode prestar serviços apenas em determinado(s) dia(s) da semana, desde que haja regularidade e fixação a tal fonte de trabalho. Exige-se para a configuração da relação de emprego normal, assim, apenas a não-eventualidade da prestaçao de serviços. Quanto à questão polêmica envolvendo a diarista doméstica, vide a nota anterior.

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Nessa linha de raciocínio, surge o princípio da continuidade da relação de emprego22.

O citado postulado corresponde a um dos alicerces fundamentais do moderno Direito do Trabalho, por visar a durabilidade do seu objeto nuclear. Manifesta a hodierna tendência do Direito do Trabalho em buscar proporcionar a maior durabilidade possível ao contrato de emprego23, evitando a ruptura do liame. O princípio em tela significa, assim, a tendência em se assegurar o prosseguimento da relação de emprego, almejando manter o contrato individual de

22 A denominação escolhida retrata a nomenclatura mais constantemente utilizada pela doutrina, seguindo as lições de Américo Plá Rodriguez. Alguns tratadistas, no entanto, preferem as expressões “permanência” (vide Alfredo J. Ruprecht, Princípios de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1995, p. 55) ou “estabilidade” (vide Mário de la Cueva, El nuevo derecho mexicano del trabajo (Tomo I. 8ª edição. México: Porrúa, 1983 ). Plá Rodriguez, ao defender a denominação princípio da continuidade da relação de emprego (Princípios de direito do trabalho. 2ª edição. São Paulo: LTr, 1993, p. 140), critica as demais expressões. Ao sustentar que continuidade, além de ser a nomenclatura mais utilizada, é a de conotação sumamente apropriada, por fazer alusão ao que se prolonga e se mantém no tempo (idéia central que se quer invocar com o princípio em tela), aponta as falhas das outras denominações, afirmando que enquanto a estabilidade designa especificamente um instituto concreto relacionado com o postulado (por proteger o empregado contra a dispensa), permanência e perdurabilidade revelam uma noção de perenidade que não caracteriza o contrato de emprego, cuja duração não é infinita.

23 Para Américo Plá Rodriguez (Princípios de direito do trabalho. 2ª edição. São Paulo: LTr, 1993, p. 142), tal princípio “expressa a tendência do Direito do Trabalho de atribuir à relação de emprego a mais ampla duração, sob todos os aspectos”. Francisco Meton Marques de Lima (Princípios de direito do trabalho na lei e na jurisprudência. São Paulo: LTr, 1994,, p. 100) sustenta que “o princípio em estudo consiste em estabelecer presunção iuris tantum da continuidade da vinculação de emprego”. Alfredo J. Ruprecht (Princípios de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1995, p. 55), após admitir que “a tendência para a existência e a conservação do contrato de trabalho manifesta-se em todas as legislações que o regulamentam”, acrescenta que “esse princípio tem hoje extrema importância. Atualmente, a atitude do sindicalismo tende, em primeiro lugar, a procurar preservar a fonte de trabalho, permanecer no emprego, e só depois vêm as outras considerações. Por outro lado, é a meta do Direito Trabalhista contemporâneo e os governos procuram atingi-la de diversas maneiras”. Mário de la Cueva (El nuevo derecho mexicano del trabajo (Tomo I. 8ª edição. México: Porrúa, 1983,, p. 219), por sua vez, leciona que “la estabilidade en el trabajo apareció en nuestro derecho como una de las manifestaciones más cristalinas de la justicia social, hondamente enraizada en el derecho del trabajo, porque su finalidad immediata es el vivir hoy y en el mañana immediato, pero al nacer miró apasionadamente hacia la seguridad social, porque su finalidad mediata es preparar el vivir del trabajador en la adversidad y en la vejez. De estas sus finalidades se desprende su esencia: la estabilidade en el trabajo es la certeza del presente y del futuro, una de las ideais que anuncia una vinculación más íntima y talvez una fusión futura del derecho del trabajo y de la seguridad social”. Merece ser salientado que, apesar das estreitas relações existentes entre o chamado princípio de proteção ao trabalhador e o princípio da continuidade da relação de emprego, não há como considerar este último uma simples derivação ou consequência daquele. Encontram-se vinculados, por terem a mesma finalidade (a tutela do hipossuficiente), mas são princípios independentes e autônomos, com conteúdos e fontes específicas.

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trabalho em pleno vigor durante o período de tempo mais longo possível, protegendo-o de atos destinados a provocar o seu término. A diretriz estabelecida pelo princípio da continuidade da relação de emprego, pois, é no sentido de assegurar a sua durabilidade e evitar a sua terminação.24

Os alicerces que sustentam a base fundamental do princípio da continuidade da relação de emprego são sintomáticos da natureza tutelar das normas trabalhistas, revelando ao mesmo tempo a fragilidade da posição do hipossuficiente e a necessidade da presença de mecanismos tendentes a diminuir a sua posição de inferioridade. A conservação da relação de emprego gera um sentimento de segurança para o trabalhador, transmitindo-lhe uma tranqüilidade de que certamente não desfrutaria, caso existisse a incerteza acerca do prosseguimento do contrato. Via de regra, é desejo do assalariado a manutenção da relação empregatícia existente, até o surgimento de uma outra oportunidade laboral mais interessante ou então até a sua aposentadoria pela seguridade social. Mediante medidas assecuratórias da manutenção do elo de emprego, assim, proporciona-se ao empregado uma estabilidade ao mesmo tempo social, psicológica e material. Torna-se necessário visualizar, assim, que, dentre as garantias conquistadas pelo trabalhador moderno, encontra-se o chamado direito ao trabalho, ou seja, o direito desfrutado por todo e qualquer cidadão a exercer uma atividade laborativa e se inserir na atividade produtiva do seu país. Tal direito, inclusive, se encontra assegurado pela Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948, cujo artigo XXIII, 1, ora se expõe:

Todo homem tem direito ao trabalho, à livre escolha do emprego, a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o

24 Segundo Maurício Godinho Delgado ((“Princípios do Direito do Trabalho”, in Revista LTr, abril de 1995, p. 477), “informa tal princípio que é de interesse do Direito do Trabalho a permanência do vínculo empregatício, com a integração do trabalhador na estrutura e dinâmica empresariais. Apenas mediante tal permanência e integração é que a ordem justrabalhista poderia cumprir satisfatoriamente o objetivo teleológico do Direito do Trabalho de assegurar melhores condições - sob a ótica obreira - de pactuação e gerenciamento da força de trabalho em determinada sociedade”.

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desemprego.

Ao empregado, nesse sentido, deve sempre ser assegurado o acesso à atividade laboral. Para tanto, deve o poder público adotar instrumentos destinados a manter a fonte de trabalho ao qual se encontra vinculado, ou, caso esteja sem trabalhar, deve o Estado promover medidas destinadas a diminuir e eventualmente eliminar o desemprego involuntário. Ao menos no campo ideológico, assim, a segurança social através da conservação da relação empregatícia constitui uma das principais metas de todo Estado moderno25. O princípio em tela, destarte, encontra seu principal fundamento na necessidade de segurança revelada pelo empregado hipossuficiente, segurança esta obtida apenas através da manutenção da fonte de trabalho que assegura o seu sustento e a sobrevivência da sua família, dado o caráter essencialmente alimentar da contraprestação percebida26.

O prosseguimento do contrato individual de trabalho garante uma idéia de segurança social, com o empregado se sentindo inserido na entidade patronal, integrado à sua atividade produtiva. A permanência do vínculo afasta os efeitos nocivos do desemprego e, conseqüentemente, os problemas psicológicos decorrentes da terminação não desejada da relação de emprego. Sem falar na instabilidade econômica que normalmente decorre do rompimento abrupto do liame laboral. O fator segurança, por sua vez, não representa o único fundamento do princípio da continuidade. Existem mais dois, um fundamento de ordem moral e outro de ordem técnica27.

25 Néstor de Buen ( Néstor de Buen (Derecho del trabajo. Tomo II. 4ª edição. México: Porrúa, 1981, p. 79), leciona que “en la medida en que constituye una preocupación social fundamental de nuestro tiempo el encontrar ocupación para todos, es obvio que el apoyo legal para la finalidad contraria solo podrá dar en circunstancias verdaderamente excepcionales”.

26 Leciona Alfredo Ruprecht (Princípios de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1995, p. 58) que “na realidade, o trabalho para a maioria das pessoas, é de vital importância, pois é sua única ou principal fonte de renda. Por outro lado, é prestado a empresas destinadas a existir indefinidamente - pelo menos em princípio - e, portanto, devem ser também permanentes as atividades dos trabalhadores que nelas se empregam”.

27 De acordo com o Francisco Meton Marques de Lima (Princípios de direito do trabalho na lei e na jurisprudência. 1ª edição. São Paulo: LTr, 1994, p. 101), “o fundamento de ordem técnica assenta no fato de que a continuidade no emprego proporciona o aperfeiçoamento do trabalhador, que renderá mais na função que exerce; permite ainda ao empregado conhecer melhor a filosofia de trabalho da empresa, conseqüentemente a incorporação dos ideais ali

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O primeiro refere-se ao mencionado direito ao trabalho, ou seja, o direito do qual cada indivíduo é titular no sentido de ter acesso a (e manter) uma fonte de trabalho, pois, via de regra, o cidadão necessita de uma ocupação para ter uma sensação de utilidade e de importância dentro da sociedade da qual faz parte. De igual forma, sustenta que existe um fundamento de ordem técnica, assentado no fato de que a continuidade do vínculo empregatício proporciona o aperfeiçoamento do empregado, permitindo um melhor rendimento na sua função laborativa. Constata-se, assim, que a rotatividade de fontes de trabalho por parte do hipossuficiente, passando de emprego a emprego de forma constante e indefinida, resulta em efeitos nocivos por gerar um sentimento de frustração em relação ao trabalho, prejudicando tanto o prestador como o tomador dos serviços, bem como, em última análise, toda a sociedade.28

O prolongamento da permanência do obreiro dentro da estrutura empresarial, portanto, também gera conseqüências favoráveis ao empregador. E não apenas no plano psíquico, mas também em termos materiais. Como, por exemplo, a melhor produtividade decorrente do aprimoramento da capacidade laborativa do obreiro através dos anos. O estímulo à antigüidade, mediante prêmios e gratificações oferecidas pelos empregadores, levando em consideração o tempo de serviço prestado à empresa, revela o interesse patronal no prolongamento dos contratos, evitando assim os riscos das experiências com novas contratações. A sociedade como um todo, por outro lado, igualmente se revela beneficiada pelo prosseguimento dos contratos laborais envolvendo os seus integrantes, uma vez que um dos seus objetivos primordiais é exatamente assegurar a todos o acesso ao mercado de trabalho.

reinantes, resultando mais fidelidade e amor ao trabalho. Mesmo a mudança de função não impedirá o aperfeiçoamento do empregado, que há muito conhece pormenores da empresa e não terá dificuldade na nova função. Aliás, o empregado sabendo que terá garantia no emprego e ascensão profissional, desde que desempenhe com zelo sua função, terá mais interesse pela empresa, a ela se dedicando como uma parte do seu patrimônio, nela vendo mais de que simples ganha-pão”.

28 Leciona Américo Plá Rodrigues (Princípios de direito do trabalho. 2ª edição. São Paulo: LTr, 1993, p. 139) que “tudo o que visa a conservação da fonte de trabalho, a dar segurança ao trabalhador, constitui não apenas um benefício para ele, enquanto lhe transmite uma sensação de tranqüilidade, mas também redunda em benefício da própria empresa e, através dela, da sociedade, na medida em que contribui para aumentar o lucro e melhorar o clima social das relações entre as partes”.

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Os benefícios do prosseguimento da relação de emprego, por conseguinte, extrapola a seara de interesses do empregado. As entidades empregadoras, bem como, em última análise, a própria coletividade, são igualmente beneficiadas, na medida em que a duração continuada contribui para a integração do empregado na empresa.

Revela-se importante ressaltar, entretanto, que o princípio em tela se encontra estabelecido primordialmente em favor do hipossuficiente. E, como tal, não pode ser suscitado em qualquer circunstância que não lhe seja favorável29.

Nesse sentido, a sua invocação constitui prerrogativa do empregado, podendo o obreiro optar pela violação à diretriz, como, por exemplo, mediante a ruptura do vínculo por sua iniciativa. Na mesma linha de raciocínio, não pode o empregador pretender o prosseguimento do contrato com base no mesmo princípio da continuidade, quando assim não deseja o empregado, exigindo o prosseguimento do liame contra a vontade do trabalhador, pois então estaria consagrado um “contrato de trabalho forçado”, à semelhança da escravidão. A incidência do princípio da continuidade da relação de emprego, destarte, ocorre sempre em virtude do interesse do hipossuficiente. Constata-se, assim, que o empregado sempre poderá denunciar o contrato e deixar de trabalhar para o tomador dos seus serviços. O inverso, ou seja, a denúncia por parte do empregador, por outro lado, encontra limitações nas diretrizes estabelecidas pelo princípio em tela, como será analisado adiante.

4. Formas de Manifestação do Princípio da Con-tinuidade

O princípio da continuidade da relação de emprego se manifesta de diversas formas, variando de acordo com as peculiaridades da legislação laboral de cada país. As peculiaridades dos diferentes sistemas normativos, assim, influem na fixação das regras atinentes à

29 De acordo com Alfredo J Ruprecht (Princípios de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1995, p. 55), “o princípio da continuidade do contrato aplica-se fundamentalmente em benefício do trabalhador. Uma vez que seu objetivo é evitar que este perca seu emprego, só poderá ser esgrimido por ele. Assim como o empregador não pode, de maneira alguma, impedir que o trabalhador faça uso desse princípio, tampouco pode utilizá-lo em seu favor, impedindo a saída do trabalhador”.

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manutenção da relação empregatícia. Algumas formas de manifestação do alcance do princípio

em tela, entretanto, revelam um certo caráter universal, demonstrado pela presença uniforme de alguns institutos nos diplomas legais de cunho trabalhista encontrados no estrangeiro. A preferência pelos contratos por tempo indeterminado, o reconhecimento de fatos geradores da suspensão ou da interrupção do contrato sem prejuízo à manutenção deste, bem como a determinação pelo seu prosseguimento, mesmo diante de alterações contratuais (inclusive quanto à figura do empregador) e de nulidades de algumas das suas cláusulas, correspondem a formas universais da manifestação do princípio em tela30. E a legislação laboral consubstanciada nas normas da Consolidação das Leis do Trabalho, segue tal diretriz orientadora.31

30 Vide Eneida Melo Correa de Araújo (As relações de trabalho: uma perspectiva democrática. São Paulo: LTr, 2003, p. 191).

31 Alfredo J. Ruprecht (Princípios de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 1995, p. 55) apresenta três conseqüências básicas do princípio da continuidade: a) preferência pelos contratos de duração indeterminada; b) manutenção do emprego; e c) manutenção da vigência do contrato. Américo Plá Rodriguez (Princípios de direito do trabalho. 2ª edição. São Paulo: LTr, 1993, p. 143), por sua vez, elenca as seguintes projeções do postulado em tela: 1) preferência pelos contratos de duração definida; 2) amplitude para a admissão das transformações do contrato; 3) facilidade para manter o contrato, apesar dos descumprimentos ou nulidades em que se haja ocorrido; 4) resistência em admitir rescisão unilateral do contrato, por vontade patronal; 5) interpretação das interrupções dos contratos como simples suspensão; e 6) manutenção do contrato nos casos de substituição do empregador. Na legislação trabalhista brasileira atualmente em vigor, são encontradas manifestações de todas essas projeções relacionadas por Américo Plá Rodriguez (como será posteriormente examinado de forma mais detalhada). Quanto à preferência pela contratação sem término definido, o artigo 443 da CLT admite o contrato por prazo determinado, mas o seu parágrafo 2o. estabelece apenas três hipóteses nas quais será válida a prévia estipulação do seu término (transitoridade do serviço a ser prestado ou então da própria espécie de atividade empresarial, e contratação por experiência), enquanto o artigo 445 estabelece a duração máxima dos mesmos (90 dias para o contrato de experiência, e dois anos para os demais contratos a prazo). Os artigos 451 e 452, por seu turno, estabelecem respectivamente hipóteses de transformação do contrato por prazo determinado em contrato por prazo indeterminado, caso haja a violação às suas regras, que proíbem mais de uma prorrogação do contrato e vedam a celebração de novo contrato a prazo no período de seis meses após o término de um outro contrato a termo, salvo exceções expressas. A recente Lei 9.601, de 21 de janeiro de 1998, introduziu ao ordenamento jurídico brasileiro um novo tipo de contrato por prazo determinado, denominado de “contrato temporário de trabalho”. Regulamentado pelo Decreto 2.490, de 4 de fevereiro de 1998, a nova modalidade supera algumas das restrições anteriores (admitindo-se, por exemplo, a renovação sucessiva do contrato). As citadas normas legais, entretanto, estabelecem uma série de requisitos necessários para a válida celebração de um contrato de tal espécie, dentre os quais se inclui a prévia autorização mediante negociação coletiva. No tocante à amplitude para a admissão das transformações do contrato e à facilidade para manter o mesmo apesar de descumprimentos ou nulidades, por outro lado, o artigo 469 da CLT é explícito ao admitir as alterações das cláusulas

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À luz do direito positivo pátrio, assim, o contrato de emprego, em regra, não prevê um período certo para a sua duração.

Normalmente, os celebrantes não estipulam uma delimitação quanto ao prazo de sua validade e, assim, pressupõe-se a vontade das partes de prosseguir com o liame por um período de tempo indefinido. A sua duração, via de regra, é indeterminada, inexistindo previsão quanto ao termo final do seu âmbito de vigência temporal.

De igual forma, o modelo trabalhista brasileiro assegura a manutenção do elo de emprego nos casos de suspensão e de interrupção do contrato de emprego, quando o empregado temporariamente deixa de trabalhar para a entidade patronal, como no caso de licenças autorizando o afastamento32. Nas hipóteses legais (ou contratuais) de paralisação da prestação de serviços, em virtude da suspensão ou da interrupção dos principais efeitos do contrato, este se mantém intacto, aguardando apenas o término do fato suspensivo ou interruptivo para voltar a produzir na íntegra todos seus efeitos normais. O afastamento temporário, nessas circunstâncias, destarte, não enseja a terminação do liame, reservando-se para o empregado afastado o posto empregatício enquanto perdurar o seu afastamento.

contratuais, desde que haja anuência das partes e inexistam prejuízos diretos ou indiretos ao empregado, cominando a pena de nulidade apenas à clausula infringente de tal garantia, sem prejuízo ao prosseguimento do liame laboral. Quanto à questão das interrupções e suspensões do contrato, o artigo 471 da CLT assegura ao empregado não apenas o direito de retornar ao seu antigo posto empregatício após o término da paralisação temporária operada, mas garante ao obreiro todas as vantagens que, em sua ausência, tenham sido atribuídas à categoria profissional a que pertence. No tocante à manutenção do contrato nos casos de substituição do empregador, as letras dos artigos 10 e 448, assegurando que a mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afeta os direitos adquiridos nem o contrato de trabalho dos empregados daquela, deixam em clarividência a presença na legislação pátria de tal forma de manifestação do princípio em tela. Quanto à questão acerca da resistência à resilição unilateral do contrato por vontade patronal, a temática será apreciada adiante.

32 Enquanto interrupção (suspensão parcial) do contrato significa a paralisação temporária da prestação de serviços sem prejuízo da percepção da contraprestação paga pelo empregador, a suspensão (suspensão total) do contrato implica na paralisação temporária das duas principais obrigações contratuais: a de trabalhar (pelo empregado) e a de remunerar o trabalho prestado (pelo empregador). Via de regra, a contagem do tempo de serviço ocorre apenas na hipótese de interrupção (há contagem, entretanto, nas suspensões causadas por acidente de trabalho ou serviço militar obrigatório, nos termos do artigo 4º parágrafo único, da CLT). Em ambos os casos, tanto o emprego do trabalhador como as vantagens conquistadas pela respectiva categoria profissional são asseguradas por ocasião do seu retorno, de acordo com o art. 471 da CLT: Ao empregado afastado do emprego, são asseguradas, por ocasião da sua volta, todas as vantagens que, em sua ausência, tenham sido atribuídas à categoria a que pertencia na empresa. A matéria voltará a ser abordada quanto do exame dos efeitos proporcionados pela reintegração no emprego, na segunda parte do presente trabalho.

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Outra forma de manifestação do princípio registrada na legislação brasileira é a tolerância a vícios decorrentes de pactuação ilícita ou da modificação irregular de cláusulas contratuais. Via de regra, havendo a alteração de uma condição objetiva do contrato, e sendo a nova cláusula transgressora da legislação laboral aplicável, a respectiva modificação não enseja a anulação de todo o pacto. O vício, pois, somente afetará a parte do contrato atingido. Mesmo em caso de uma mudança que implicar em violação expressa a uma norma legal trabalhista, não ocorre a ruína de todo o pacto, mas apenas da cláusula infringente.33

A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa, por outro lado, igualmente não provoca o rompimento dos contratos dos respectivos empregados, permanecendo íntegros os direitos dos trabalhadores, mesmo quando ocorre a alteração subjetiva do pacto em relação à entidade patronal. Representa, pois, outra forma de manifestação do princípio da continuidade no modelo trabalhista brasileiro.34

Registrada qualquer espécie de modificação estrutural externa ou interna, como a sua aquisição por outrem ou a sua transformação em outra entidade empresarial por via de cisão, incorporação ou fusão de empresas, por exemplo, o elo de emprego mantido com cada empregado prossegue sem solução de continuidade, mantendo-se intacto o contrato de emprego e inalteradas as suas condições objetivas. Na chamada “sucessão trabalhista”, assim, o contrato individual de trabalho em princípio é preservado, pois a empresa sucessora assume a responsabilidade referente a todos os encargos trabalhistas antes atinentes à empresa sucedida. É possível que o novo responsável pelo empreendimento empresarial não deseje o prosseguimento do vínculo com o antigo empregado, preferindo encerrar a relação empregatícia, mas a modificação registrada não

33 Artigo 468 da CLT “Nos contratos individuais de trabalho, só é lícita a alteração das respectivas condições por mútuo consentimento, e ainda assim desde que não resultem, direta ou indiretamente, prejuízos ao empregado, sob pena de nulidade da cláusula infringente desta garantia”. Vide ainda Emmanuel Teófilo Furtado (Alteração do contrato de trabalho. São Paulo: LTr, 1994).

34 Estabelecem os artigos 10 e 448 da CLT, respectivamente, que “Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por seus empregados” e “A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de trabalho dos respectivos empregados”.

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corresponde, per se, a uma causa justificadora de tal atitude. A terminação do pacto, em tal caso, não terá ocorrido em virtude da mudança efetivada, mas sim pela simples vontade daquela que assume a direção do negócio empresarial. 35

De uma forma ou de outra, contudo, o modelo brasileiro de legislação trabalhista assegura a proteção aos direitos do empregado hipossuficiente mediante a atribuição à entidade sucessora do cumprimento das respectivas obrigações trabalhistas. Ao lado dessas manifestações, encontra-se a principal forma de projeção do princípio: a resistência em admitir a resilição unilateral do contrato individual de trabalho por vontade exclusiva do empregador.

Nesse sentido, a mais importante manifestação do princípio de continuidade é o pertinente à resistência imposta ao empregador quanto ao rompimento do contrato por sua vontade exclusiva36. O postulado em tela, portanto, assume as suas feições mais nítidas na fase de encerramento da relação de emprego cuja conservação é almejada, especialmente no tocante à disciplina do chamado direito de despedir desfrutado pelo empregador.

Com o objetivo de assegurar a manutenção da relação de emprego e dificultar a terminação do contrato de emprego, o legislador moderno concebeu diversas medidas destinadas a estimular a permanência e inibir ou mesmo impedir o encerramento do vínculo entre empregado e empregador.

Inúmeros são os obstáculos enfrentados pela relação de emprego, desde o momento da sua concepção, e, de igual forma, imensuráveis são os perigos decorrentes dos empecilhos surgidos durante o seu desenvolvimento.

Tal situação, assim, exige do legislador a criação de inúmeros

35 Ocorrendo, assim, a alienação do patrimônio empresarial (como a compra da empresa ou uma mudança no seu quadro societário), a modificação do seu tipo societário (de sociedade anônima a empresas de cotas de responsabilidade, por exemplo) ou da sua estrutura jurídica externa (pela fusão, incorporação ou cisão de empresas) ou interna (pela modificação do objeto social), os direitos dos empregados são mantidos intactos e os contratos continuam em plena vigência, assumindo a empresa sucessora a responsabilidade antes da empresa sucedida. Esta, por sua vez, somente poderá ser responsabilizada na hipótese de fraude devidamente comprovada. De qualquer forma, não ocorre a terminação da relação pela alteração subjetiva realizada.

36 Nesse sentido, Américo Plá Rodriguez (Princípios de direito do trabalho. 2ª edição. São Paulo: LTr, 1993, p. 156).

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mecanismos capazes de fornecer as condições necessárias para a conservação do vínculo empregatício. E, dentre tais instrumentos, se inclui uma série cuja finalidade é dificultar ou mesmo impedir o término do contrato individual de trabalho por vontade unilateral do empregador. É na terminação do contrato de emprego, repete-se, que o princípio da continuidade da relação de emprego assume a sua mais notável manifestação, expondo a plenitude do seu fundamento de seguridade através das modalidades de sistemas de proteção à relação empregatícia.37

5. Princípio da Continuidade da Relação de Emprego e Controle do Direito de Despedir do Empregador

A natureza potestativa do direito de despedir do empregador é uma das características do sistema normativo trabalhista no Brasil. Em outras palavras, a dispensa independe da concordância do empregado, incumbindo ao empregador definir o momento e a forma de sua utilização. Corresponde a despedida, por conseguinte, a um ato unilateral, pelo qual a entidade patronal põe fim ao contrato individual de trabalho.

Tal liberdade, entretanto, não eleva a dispensa à categoria de direito absoluto. Não pode ser exercida à margem da lei. Admite-se, como regra, a dispensa sem justa causa e a despedida arbitrária. Mas de forma alguma pode tal modalidade de terminação contratual ser enquadrada como um ato cuja validade independe do exercício regular do respectivo direito.

37 É polêmica a questão da melhor denominação para ser utilizada como representativa de todas as formas de encerramento do contrato de emprego. Ao tratar da questão, José Martins Catharino (Compêndio de direito do trabalho. 3ª edição. São Paulo: Saraiva, 1982, p. 264) expressa categoricamente a sua preferência por dois dos vocábulos. Como expressão genérica das formas de encerramento do contrato individual de trabalho, José Martins Catharino defende o uso das expressões “terminação” e “cessação”, sinônimas, por serem juridicamente neutras e de compreensão instantânea e uniforme. Ambas significam “fim”, permitindo um entendimento geral sem risco de tumultos terminológicos. Argumenta ainda o doutrinador baiano que, conforme exposto por Orlando Gomes e Délio Maranhão, “dissolução” apresenta uma idéia de encerramento forçado e “extinção” indica o término normal, voluntário e bilateral de qualquer vínculo jurídico, sendo ambas as expressões inservíveis como termo de alcance genérico. Em virtude da perfeição técnica das nomenclaturas, destarte, prevalece o termo “terminação” e o seu sinônimo “cessação”, como as denominações representativas da generalidade de modalidades de encerramento da relação de emprego.

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Para a sua plena eficácia, assim, a despedida deve necessariamente ser praticada de forma normal, conforme ditado in abstracto pelo legislador. A licitude do respectivo direito subjetivo patronal, por conseguinte, se encontra condicionada ao seu legítimo exercício. Em que pese a sua expressa consagração no texto constitucional, o direito de despedir encontra limites no direito dogmático pátrio. Deve ser exercido, nesse sentido, dentro de certos parâmetros legais. Mesmo em face da sua potestatividade, portanto, a dispensa corresponde a um direito “relativo”, e não “absoluto”. É relativo, assim, no sentido de se encontrar sujeito às diretrizes estabelecidas pelo legislador para o seu válido exercício, estando condicionada a sua eficácia à observância da lei.

A relatividade do direito de despedir, portanto, decorre da sua sujeição à Lei. Enquanto exercido dentro das diretrizes da pena do legislador, o empregador se encontra livre para definir o futuro da relação de emprego mantida com o seu empregado. Ultrapassadas tais fronteiras, entretanto, a entidade patronal se sujeita às sanções decorrentes da desobediência ao padrão legal. Inclusive, em alguns casos, à própria anulação do ato resilitório praticado em arrepio da Lei.

Para alguns juristas, a relatividade em tela torna o direito de despedir uma espécie de direito-função, à semelhança do direito de propriedade, cujo exercício exige a observância de requisitos que visem a resguardar interesses sociais38. Nesse sentido, o empregador, por ter o seu direito regulado pelo ordenamento jurídico, somente pode validamente exercê-lo quando a sua conduta estiver em perfeita consonância com a função admitida pelo legislador. Qualquer desvio quanto à sua finalidade social, por sua vez, implicaria na prática irregular da dispensa. E, naturalmente, geraria as conseqüências decorrentes do uso anormal do respectivo direito.

Constituindo o resultado do exercício de um verdadeiro direito-função, mesmo em face da sua natureza potestativa, a despedida demonstra a sua índole relativa à luz do protecionsimo da

38 A Constituição da República de 1988, assegura tanto o direito de propriedade (artigo 5º, inciso XXII), como estabelece que “a propriedade atenderá a sua função social” (inciso seguinte do mesmo artigo). Os que defendem a dispensa como um direito-função, assim, fazem uma análise comparativa entre o direito de propriedade e o direito de despedir, já que o legislador constituinte, além de assegurar o direito à prática da dispensa nos termos do inciso I do artigo 7º, igualmente consagrou como fundamento da República Federativa do Brasil o valor social do trabalho (artigo 1º, inciso IV).

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legislação laboral. É o empregador quem define a conveniência da sua prática, mas submetendo-se aos ditames da Lei.

A dispensa, portanto, é exercida de acordo com a vontade patronal, mas esta é vinculada, pois a validade da despedida é condicionada à disciplina normativa estipulada pelo legislador. O maior ou menor grau de tal sujeição, variando de um sistema legislativo para outro, se vincula ao tipo de modelo de proteção à relação de emprego adotada pela legislação trabalhista de cada país.

O Direito do Trabalho no Brasil , como fruto do intervencionismo estatal nas relações laborais, revela uma raiz tutelar que se manifesta nos preceitos disciplinadores das relações laborais, em harmonia com os princípios da proteção e da continuidade da relação de emprego. Quanto mais protecionista for o direito dogmático do país, mais “relativo” se torna o direito de despedir, chegando a sofrer, em alguns casos, um controle ostensivo por parte do legislador mediante a imposição de normas disciplinadoras do seu exercício. Tais regras, por sua vez, podem ser aplicadas diretamente pelo empregador, de forma espontânea, ou, então, coercitivamente pelo Poder Judiciário, quando provocado pelo empregado lesado. A compreensão das conseqüências de tal espécie de intervenção legislativa, por sua vez, se revela de fundamental relevância para melhor visualizar o objeto do presente estudo.

Mediante a imposição de regras solenes acerca do exercício do direito de despedir, assim, o legislador estabelece medidas visando a dificultar, ou mesmo impedir, a ruptura do elo de emprego pela via da dispensa. Em muitas hipóteses, o tratamento legal acaba por transformar a dissolução do contrato por tal modalidade de terminação contratual numa operação extremamente delicada.

Quando a iniciativa da terminação contratual é do empregado, os sistemas normativos adotados pelos Estados modernos não impedem a concretização da vontade do trabalhador. É o caso do modelo trabalhista brasileiro. O princípio da continuidade da relação de emprego, salienta-se mais uma vez, manifesta-se de forma favorável ao trabalhador, sendo contrário ao postulado qualquer regra proibitiva do direito desfrutado pelo empregado de encerrar o contrato por vontade própria. À luz das diretrizes do mencionado princípio, portanto, é a vontade do trabalhador que deve prevalecer quando o mesmo deseja romper o elo que o liga ao seu empregador,

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sendo inadmissível a existência de normas que obrigam o empregado a manter a seu contragosto o contrato.39

Apesar de não estipular maiores empecilhos à cessação por vontade do empregado, o sistema normativo trabalhista brasileiro estabelece algumas regras regulamentando a formalização do distrato, almejando diminuir a probabilidade de fraudes no momento da terminação, evitando vícios como os registrados nas hipóteses nas quais o empregador coage o empregado a formalizar um pedido de demissão do emprego.

Nesse sentido, a legislação trabalhista brasileira, por sua vez, estipula um procedimento solene no caso de demissão do empregado, exigindo como requisito essencial à sua validade a homologação do respectivo instrumento, quando o empregado tem mais de um ano de serviço na empresa. De acordo com o artigo 477 da CLT, assim, a chancela do sindicato profissional do obreiro ou de autoridade do Ministério do Trabalho (ou, excepcionalmente, a homologação realizada pelo representante do Ministério Público, pelo Defensor Público ou pelo Juiz de Paz) é elemento essencial à eficácia da

39 De acordo com a legislação trabalhista pátria, contudo, em três situações o empregado é obrigado a observar regras que tendem a inibir a efetivação da resilição contratual por sua iniciativa. A primeira ocorre na hipótese de demissão do emprego, quando o empregado é obrigado a comunicar previamente ao empregador a sua pretensão resilitória com ao menos trinta dias de antecedência, sob pena de ensejar ao empregador o direito de descontar da quantia devida ao obreiro o equivalente a um salário mensal. É o chamado aviso prévio do empregado ao empregador, previsto no artigo 487 da CLT. Enquanto o caput e o seu inciso II do mencionado dispositivo consolidado estabelecem que “Não havendo prazo estipulado, a parte que, sem justo motivo, quiser rescindir o contrato deverá avisar a outra da sua resolução com antecedência mínima de ... II - 30 (trinta) dias ...”, o seu §2º estipula que “A falta de aviso prévio por parte do empregado dá ao empregador o direito de descontar os salários correspondentes ao prazo respectivo”. O instituto do aviso prévio será estudado mais adiante. A segundo hipótese se refere ao caso de empregado que procede à cessação antecipada e sem justo motivo de um contrato por prazo determinado, quando será então obrigado a pagar ao empregador uma quantia equivalente a metade dos salários do período contratual remanescente, a título de ressarcimento pelos prejuízos provocados pela dissolução prematura. Nesse sentido, estabelece o artigo 480, caput e § 1º, da CLT, o seguinte: “Havendo termo estipulado, o empregado não se poderá desligar do contrato, sem justa causa, sob pena de ser obrigado a indenizar o empregador dos prejuízos que desse fato lhe resultarem. § 1o. A indenização, porém, não poderá exceder àquela a que teria direito o empregado em idênticas condições”. E, por fim, a terceira hipótese de medida inibitória à terminação por iniciativa do empregado corresponde à exigência de obter o reconhecimento judicial da ocorrência de uma dispensa indireta, nos termos apreciados anteriormente. Em todos os casos, registra-se apenas uma forma de inibir a concretização da cessação contratual, sem contudo proibir a sua formalização. E, merece ser ressaltado, não há qualquer norma proibitiva da terminação, pois tanto diminuiria o empregado à condição de semi-escravo.

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demissão do empregado.40 A finalidade da estipulação de tais regras solenes, repete-se,

não é dificultar a efetivação da terminação contratual de iniciativa do empregado, mas apenas assegurar a prevalência da verdadeira vontade deste último, objetivando evitar possíveis vícios na formalização do ato resilitório. Quando a iniciativa do rompimento contratual parte do empregador, por outro lado, o legislador assume um novo rumo.

Na dispensa de um empregado, quando ocorre a terminação do contrato por ato patronal unilateral, incide uma série de normas disciplinadoras do exercício do respectivo direito, estabelecendo a fórmula legal da dissolução mediante a estipulação de exigências tanto quanto à questão da formalização do ato resilitório, como no tocante à temática acerca das obrigações pecuniárias decorrentes da terminação. E, em algumas hipóteses, o direito de despedir desfrutado pela entidade patronal sofre severas restrições, inclusive com a sua pura e simples vedação quando presentes determinadas circunstâncias.

A legislação trabalhista brasileira não apresenta exigências

40 Nas hipóteses de dissolução contratual por iniciativa do empregado, assim, a legislação pátria prevê diversas regras para a formalização da ruptura do vínculo. Na demissão, o §2º do artigo 477 da CLT (“O pedido de demissão ou recibo de quitação de rescisão do contrato de trabalho, firmado por empregado com mais de um ano de serviço, só será válido quando feito com a assistência do respectivo Sindicato ou perante a autoridade do Ministério do Trabalho”) exige para a validade do pedido demissionário de empregado com mais de um ano de serviço na empresa a homologação do respectivo instrumento escrito pelo sindicato profissional do empregado ou pela autoridade competente do Ministério do Trabalho. O §3º do mesmo artigo (“Quando não existir na localidade nenhum dos órgãos previstos neste artigo, a assistência será prestada pelo Ministério Público ou, onde houver, pelo Defensor Público e, na falta ou impedimento destes, pelo Juiz de Paz”) estabelece ainda que, na inexistência dos agentes homologadores retro citados, a formalização do pedido poderá ser realizada pelo representante do Ministério Público, pelo Defensor Público ou, na impossibilidade destes, pelo Juiz de Paz. Quando o empregado demissionário tiver menos de um ano na empresa, contudo, a homologação não se revela essencial à validade do ato. Em se tratando de empregado portador de estabilidade jurídica no emprego, por outro lado, o artigo 500 consolidado estabelece que “O pedido de demissão do empregado estável só será válido quando feito com a assistência do respectivo sindicato, e, se não houver, perante autoridade local competente do Ministério do Trabalho ou da Justiça do Trabalho”. Na hipótese de uma homologação realizada por um Juiz do Trabalho, assim, haverá uma manifestação de jurisdição voluntária da Justiça do Trabalho. No caso de uma “dispensa indireta”, conforme salientado anteriormente, a CLT exige o reconhecimento judicial da dissolução oblíqua, através de sentença proferida em demanda judicial ajuizada pelo empregado com tal intuito. Apesar de inexistirem na lei exigências semelhantes nas hipóteses de pedido de demissão de empregado com menos de um ano de serviço na empresa e de dissolução decorrente de desligamento voluntário após a concessão da aposentadoria, a solenidade da homologação é recomendada como forma de resguardar o ato de futuras alegações de vícios de vontade.

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minuciosas quanto à forma material da dispensa, salvo quando esta implicar a terminação contratual de um empregado portador de algumas modalidades específicas de estabilidade jurídica no emprego. Em tais casos, o legislador exige para a validade do ato resilitório a presença de um motivo justificador, previsto em lei. E, ainda, em algumas hipóteses especiais de estabilidade jurídica no emprego, é exigido um controle jurisdicional a priori, mediante o reconhecimento judicial da existência de uma falta grave praticada pelo empregado. Nestes últimos casos, inclusive, a autorização da Justiça do Trabalho mediante a respectiva declaração judicial configura pressuposto essencial à validade do exercício da dispensa.41

Nos demais casos, a legislação não impõe uma forma específica, prevalecendo a informalidade, sendo admitida (mas não recomendada) a efetivação da dispensa pela via verbal, sem a necessidade de identificar o motivo gerador da vontade patronal42. Não ocorre na despedida, assim, a exigência da solenidade da homologação, como na demissão de empregado.

As obrigações decorrentes da dispensa, entretanto, devem constar de instrumento escrito, sujeito a homologação como requisito de comprovação do cumprimento das prestações respectivas. A mencionada chancela do órgão homologador, contudo, não representa requisito formal do ato resilitório, ou seja, um pressuposto de validade

41 A legislação pátria em vigor estabelece a exigência de um procedimento solene, mediante um controle judicial a priori, para a formalização da resilição contratual por ato unilateral do empregador apenas quando o empregado é portador das seguintes modalidades de estabilidade jurídica: a) a chamada “estabilidade decenal” prevista no artigo 492 da CLT c/c artigo 14 da Lei nº 8.036 de 1990; b) a denominada “estabilidade sindical” estipulada nos artigos 543, §3º, da CLT c/c artigo 8º, VIII, da Constituição da República de 1988; c) a estabilidade do dirigente de cooperativa de empregados (Lei nº 5.664 de 1971); d) a estabilidade de empregado representante dos trabalhadores no Conselho Curador do FGTS e nos Conselhos Previdenciários, previstos na Lei nº 8.036 e Lei nº 8.213, respectivamente; e e) a estabilidade do representante dos empregados em comissão de conciliação prévia, prevista no artigo 625-B, §1º, da CLT. Em tais casos, o legislador exige, antes de se efetivar a dispensa, o pronunciamento jurisdicional acerca da matéria, mediante o reconhecimento da prática da falta grave apurada em inquérito judicial. Na hipótese da dispensa de um empregado público integrante do quadro de pessoal de uma entidade da Administração Pública Direta, por outro lado, as regras disciplinadoras da atuação do administrador público impõem a este a observância de algumas regras solenes. Todas essas formalidades serão analisadas de forma mais minuciosa no decorrer do presente trabalho.

42 A identificação do motivo da dispensa, contudo, pode ser de fundamental importância mesmo nas hipóteses nas quais o empregado não desfruta de alguma forma de proteção à relação de emprego.

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da própria dispensa. Corresponde, isso sim, a uma simples prova da quitação das obrigações pecuniárias respectivas.43

O principal método de controle abstrato do exercício do direito de despedir, portanto, ocorre por meio da estipulação de normas visando a inibir ou restringir a própria concretização da dispensa. São duas, assim, as categorias de medidas normativas. Primeiro, os instrumentos tendentes a inibir, sem, entretanto vedar, a prática da despedida. Segundo, os mecanismos destinados a restringir as hipóteses de admissibilidade da dispensa, mediante a sua vedação em circunstâncias tipificadas em lei.

Cada espécie de medida normativa, por sua vez, se revela peculiar a um modelo específico de controle legal sobre o exercício do direito de despedir. Ao conjunto de institutos disciplinadores da terminação contratual por ato unilateral do empregador, consagrado em determinado Estado soberano, a doutrina nacional e estrangeira costumam atribuir a denominação de “sistema de proteção à relação de emprego”. O conteúdo do modelo protecionista adotado em cada país, refletido na sua legislação trabalhista, por seu turno, é formado por mecanismos extraídos de dois modelos básicos: o da estabilidade própria (ou absoluta) e o da estabilidade imprópria (ou relativa).

Este último corresponde ao complexo de mecanismos que dificultam, mas não impedem, o distrato unilateral por ato patronal. É formado pelas chamadas medidas inibitórias à prática da dispensa. Dentro do modelo da estabilidade própria, por outro lado, se encontram as medidas restritivas do direito de despedir, através das quais a dispensa do empregado não é meramente inibida, mas sim efetivamente proibida em certas circunstâncias. Ambos os sistemas congregam meios destinados a manter o prosseguimento da relação de emprego, mas através do uso de métodos distintos. Enquanto os instrumentos da estabilidade imprópria tornam mais árduo e dispendioso o exercício da dispensa, sem contudo juridicamente impossibilitar a sua prática, os institutos de estabilidade própria

43 Normalmente, assim, o ato de dissolução contratual por vontade do empregador não é cercado de exigências formais. O artigo 477 da CLT estabelece a formalidade da homologação do termo de cessação contratual, mas, em se tratando de despedida de empregado, tal exigência atinge apenas o âmbito de quitação das obrigações retratadas no respectivo instrumento, não alcançando a esfera de validade do ato resilitório em si. A dispensa se efetiva, assim, mesmo sem a presença de um instrumento escrito em tais moldes. Via de regra, assim, não são exigidos requisitos solenes para a concretização da despedida.

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asseguram ao empregado o direito de permanecer no emprego, mesmo contra a vontade do empregador, quando a motivação resilitória deste último é proibida por lei, ou, então, enquanto não preenchidos requisitos previstos expressamente em norma legal, como a presença de causas justificadoras da ruptura do contrato e a observação de procedimento solene para a efetivação da dispensa.

Apesar de serem dois os modelos clássicos, com instrumentos internos inconfundíveis, raramente há a adoção, por parte de um país, de um ou de outro sistema na seu estado “puro”. Dificilmente ocorre, assim, a consagração exclusiva em determinada legislação trabalhista de instrumentos de apenas um dos modelos. A regra é a adoção, pelo legislador, de um sistema protecionista “misto” ou “híbrido”, constituído de uma mescla de mecanismos, oriundos de ambos os modelos. Normalmente, assim, ocorre uma convivência harmoniosa das duas modalidades de medidas normativas.

Mesmo no sistema protecionista pátrio, ocorre tal fenômeno, com a co-existência na legislação trabalhista brasileira de instrumentos que simplesmente inibem a prática da dispensa, e outros que realmente limitam a sua efetivação quando presentes determinados pressupostos.

Há no direito dogmático pátrio, destarte, um sistema de proteção à relação de emprego formado tanto por medidas inibitórias, como por medidas restritivas do direito de despedir.

As chamadas medidas inibitórias almejam persuadir o empregador a abandonar a sua pretensão resilitória através do uso de freios econômicos, ou seja, através da imposição de obrigações de pagar quantias em pecúnia. Tornam oneroso o exercício do direito de despedir. Objetivam dissuadir a entidade patronal, sem no entanto vedar a efetivação da dispensa. O empregador, caso escolha prosseguir com a dispensa, apenas terá que pagar ao empregado valores previstos em lei como devidos a título de verbas resilitórias.

Exemplo típico? A indenização compensatória prevista no artigo 7º, inciso I, da Constituição da República de 1988, disciplinada provisoriamente pelo artigo 10, inciso I, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, materializada na reparação paga pelo empregador ao empregado despedido de forma arbitrária ou sem justa causa, correspondente ao montante de 40% da quantia dos depósitos do FGTS recolhidos durante a vigência do contrato de emprego que

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estaria sendo resilido por meio de uma dispensa sem justa causa ou equivalente.

Ao se consubstanciar em obrigações de caráter pecuniário, as medidas de inibição não objetivam apenas evitar a concretização do ato resilitório em si, mas também atenuar as suas conseqüências na hipótese do efetivo exercício do direito de despedir, quando inocorre a presença de um motivo previsto em lei como justificador da conduta patronal. Com o pagamento dos valores previstos nos respectivos instrumentos, assim, se objetiva tornar menos traumatizante o rompimento do vínculo por ato unilateral do empregador.

A inobservância das medidas inibitórias, por sua vez, não enseja a ineficácia do ato resilitório. Se a entidade patronal não cumprir as obrigações pecuniárias previstas nas normas da legislação laboral como conseqüência da despedida, assim, o empregado não poderá postular a invalidação da dispensa, mas apenas caso não seja viável outra forma alternativa de resolução do conflito, ingressar em juízo com o intuito de ver o empregador condenado a pagar-lhe as respectivas verbas. Havendo descumprimento por parte do empregador, incumbirá ao empregado prejudicado provocar a tutela jurisdicional do Estado através do exercício do direito de ação, caso outra espécie de composição não seja possível. Não existe no âmbito de tal modelo, assim, uma verdadeira limitação ao exercício do direito. Ao menos no plano jurídico44.

As medidas restritivas, por outro lado, implicam na vedação da dispensa em determinadas hipóteses. Não há uma simples tentativa do legislador em inibir a sua prática. Representam tais instrumentos uma limitação jurídica ao exercício do direito de despedir, proibindo a sua concretização quando presentes pressupostos previstos em lei. A dispensa é efetivamente vedada, seja pelo fato do empregado ser portador de alguma espécie de estabilidade jurídica no emprego, seja em virtude do fundamento da dispensa constituir causa tipificada em lei como abusiva.

Exemplo típico? As várias modalidades de estabilidade jurídica no emprego, desde a estabilidade sindical prevista no artigo 8º, inciso VIII, da Constituição de República de 1988, até a estabilidade do acidentado prevista no artigo 118 da Lei 8.213 de 1991. Ambas

44 No plano econômico-financeiro, contudo, é em tese possível.

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vedando a dispensa do empregado a não ser no caso de existência de uma justa causa, sendo a primeira espécie (estabilidade sindical) igualmente exigida a apuração de uma falta grave (justa causa grave) por meio de inquérito judicial, conforme entendimento sedimentado na Súmula 197 do Supremo Tribunal Federal.

No caso de inobservância de uma medida restritiva, as conseqüências naturais serão a invalidação do ato resilitório. A regra é a ineficácia da dispensa, normalmente reconhecida em decisão judicial. As medidas restritivas, por conseguinte, representam uma verdadeira forma de limitar o exercício do direito de despedir. Seja mediante mecanismos que tornam oneroso o seu exercício sem justa causa, seja com a simples e pura proibição do seu exercício em determinadas circunstâncias, o legislador procura disciplinar a prática da despedida, visando a evitar o seu uso em termos absolutamente indiscriminados.

Em que pese o fato de constituir um direito potestativo do empregador, assim, a efetivação da dispensa do empregado encontra obstáculos dos mais variados graus, estabelecidos em observância aos ditames do princípio da continuidade da relação de emprego. A concretização da despedida, destarte, não se sujeita diretamente à vontade do empregado, mas necessariamente terá que enfrentar a resistência de uma série de instrumentos legais, criados com o intuito de dificultar a sua prática injustificada45.

45 Américo Plá Rodriguez (Princípios de direito do trabalho. 2ª edição. São Paulo: LTr, 1995, p. 156), cita frase celébre de José M. Almansa Pastor (El despido nulo, 1968): “na mecânica da relação individual de trabalho, a despedida constitui uma anomalia jurídica, porquanto atentaria contra o princípio da estabilidade no emprego, princípio que é chave no direito individual do trabalho, uma vez que a tendência natural da atividade profissional é precisamente sua continuidade e permanência no tempo até os limites da própria capacidade profissional”. Antônio Álvares da Silva (Proteção contra a dispensa na nova constituição. Belo Horizonte: Del Rey, 1990, p. 53), ao justificar o disciplinamento legal do exercício do direito de despedir, leciona que “os tempos modernos mostraram a inoperância do modelo clássico de autonomia da vontade na cessação do contrato de trabalho”. Em seguida, o professor da Faculdade de Direito de Belo Horizonte/MG, ao comentar as distinções entre a demissão e a dispensa quanto aos efeitos da resilição para as partes, sustenta que “do lado do empregador é ela o exercício de um direito sobre recursos e organização da empresa. Dispensa-se para aumentar a produção e melhor organizar a produtividade, não importando os motivos concretos (justa causa, racionalização, automação, desnecessidade do trabalho, etc.). O móvel dos interesses do capital, como fator de produção agregado ao contrato de trabalho, é econômico e não social. Do lado do empregado o fenômeno tem outra dimensão. Quando se demite, o ato significa a recuperação de sua liberdade pessoal. É o exercício de direito legítimo de afastar-se do emprego, pois a vinculação sem possibilidade de demissão equivaleria a uma nova forma de escravatura. Quando, porém, é dispensado (iniciativa de dissolução por parte do empregador), o fato adquire um outro significado. Fica o empregado privado do único meio de

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Constata-se, assim, que a despedida do empregado, por gerar a resilição contratual independentemente da vontade do hipossuficiente, é considerada um elemento nocivo aos interesses deste. E, assim, por representar uma medida oposta ao cânone acerca do prosseguimento do vínculo empregatício, se impõe a sua regulação pela atividade legislativa do Estado.46

O complexo de normas imperativas que disciplinam do ato de despedir executado pelo empregador, corporificando um controle por meio de medidas destinadas a inibir ou mesmo proibir a sua prática, representa a mais relevante forma de manifestação do princípio da continuidade da relação de emprego no âmbito do modelo dogmático trabalhista no Brasil.

subsistência que possui. Há, pois, uma ameaça à sua própria sobrevivência, podendo advir o desemprego, pois não é certa a recolocação, principalmente em momentos de crise e recessão econômica ... a dispensa ocasiona, pois, o desemprego, e são imensos os danos psicológicos e econômicos do trabalhador desempregado. Mas, em relação ao empregador, há também evidentes prejuízos. A dispensa provoca queda de produtividade, pois não se faz substituição sem adaptação do novo trabalhador. esta pode custar tempo e esforço. A rotatividade sempre foi um mal para ambas as partes. O interesse público também é lesado com a dispensa. O desemprego aumenta a carga do seguro social que, em última análise, é custeada pelo povo. Desemprego é sinônimo de queda de produção que, por sua vez, acarreta a diminuição do produto interno bruto. Há uma reversão de posições: os que trabalham custeiam os que não trabalham, gerando um aumento dos encargos sociais. O ganho líqüido diminui ou é eliminado e a conseqüência de todos estes fatores é o aumento geral da carga tributária que por sua vez acarreta o acréscimo de todos os encargos sociais. A dispensa prejudica, pois, o empregador e a própria coletividade”.

46 Apesar da referência expressa ao legislador estatal, não deve passar desapercebida a existência de obstáculos à dispensa criados pelas próprias partes do contrato (através de cláusula contratual ou regulamento interno da empresa) ou pelas suas entidades sindicais (mediante convenções, contratos ou acordos coletivos). Há ainda a possibilidade de estipulação de limitações através de sentenças normativas proferidas em dissídios coletivos de natureza econômica. As fontes de normas trabalhistas, destarte, revelam-se diversificadas. O presente estudo, contudo, por uma questão didática, será limitada à análise específica dos institutos previstos na legislação brasileira.

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A INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL DA COMPETÊNCIA TERRITORIAL DAS VARAS DO TRABALHO

Marcílio Florêncio MotaJuiz do Trabalho do TRT da 6ª Região, titular da 1ª VT de Paulista

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Sumário:1. Introdução;2. A Competência Territorial das Varas do Trabalho para os

Conflitos que decorrem da Relação de Emprego;3. A Competência Territorial das Varas do Trabalho para os

Dissídios que não decorrem da Relação de Emprego;4. O Conteúdo da Garantia Constitucional do Acesso à

Justiça;5. A Interpretação da Competência Territorial das Varas do

Trabalho no Contexto da Garantia do Acesso à Justiça;6. Conclusões;7. Referências.

1. INTRODUÇÃO

Discorremos, no presente texto, sobre a competência territorial das Varas do Trabalho, tema sobre o qual os manuais e cursos não se debruçam de modo a explorar toda a sua potencialidade, o que é justificável pelos objetivos dos cursos e manuais de processo

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do trabalho. Notamos, por outro lado, que no quadro atual da ampliação da competência da Justiça do Trabalho não houve uma consideração, por parte dos estudiosos, das possibilidades que surgiram para a definição da competência territorial das Varas, em vista de que as regras da Consolidação das Leis do Trabalho tratam da competência territorial para os conflitos que decorrem da relação de emprego, uma das espécies de relação de trabalho que agora são postas ao conhecimento da Justiça Especializada.

Assim, impulsionam-nos tanto a superficialidade no trato do tema pela doutrina, quanto a lacuna no tratamento da competência territorial para os conflitos que decorrem de relação diversa da relação de emprego.

A nossa abordagem, ademais, considera o tema no contexto do acesso à justiça propondo uma interpretação das regras vigentes em torno da competência territorial das Varas do Trabalho que tenha em vista a garantia constitucional.

Objetivamos, assim, aprofundar as idéias em torno do tema, suprir uma lacuna relativamente à competência das Varas para os conflitos que decorrem de relações de trabalho outras que não de emprego e contribuir para uma interpretação das regras que concretizem a garantia do acesso à justiça.

No capítulo inicial tratamos das regras que disciplinam a competência das Varas para as relações de emprego. Damos destaque, assim, às regras do art. 651 da CLT. Na sequência, discorremos sobre a competência territorial das Varas para os conflitos que não decorrem da relação de emprego, as quais desde a Emenda 45 estão postas ao conhecimento da Justiça do Trabalho.

Suscitamos, nesse ponto, a necessidade do preenchimento de lacuna normativa no processo do trabalho. Apresentamos, então, as situações para as quais será necessário o socorro das regras do processo civil comum.

No capítulo seguinte, consideramos o princípio-garantia do acesso à justiça buscando o seu significado e conteúdo.

No capítulo que antecede as nossas conclusões, propomos uma interpretação da competência territorial das Varas que tome em consideração o princípio-garantia do acesso à justiça, desde a

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consideração de que as regras celetistas e do processo civil comum têm a preocupação com o acesso à justiça do mais fraco na relação de direito material e a necessidade de obtenção de provas que permitam um julgamento justo.

É nesse capítulo, pois, que propomos uma interpretação que eventualmente ultrapasse a literalidade das regras; que reconheça o foro de eleição como possível nas contratações de trabalho; e que admita ao juiz do trabalho a pronúncia de ofício da competência territorial, desde que ajustes das partes em torno da competência tenham sido prejudiciais ao acesso à justiça do mais fraco na relação de direito material.

2. A COMPETÊNCIA TERRITORIAL DAS VA-RAS DO TRABALHO PARA OS CONFLITOS QUE DECORREM DA RELAÇÃO DE EMPRE-GO

Até o advento da Emenda 45, de 2004, a competência da Justiça do Trabalho era, primordialmente, para os conflitos que decorressem da relação de emprego, uma vez que a redação originária do art. 114 da Constituição Federal – CF - prescrevia que competia à Justiça do Trabalho a conciliação ou julgamento dos conflitos entre trabalhadores e empregadores.

Tínhamos, contudo, por previsão de regras infraconstitucionais, o estabelecimento da solução, pela Justiça Especializada do Trabalho, dos conflitos envolvendo os trabalhadores avulsos e de conflitos entre pequenos empreiteiros que trabalhassem diretamente e seus tomadores de serviço. As relações em questão não são de emprego, mas a Constituição de 1988 dizia que era possível, na forma que dispusesse a lei, que a Justiça do Trabalho tivesse competência para outros conflitos decorrentes das relações de trabalho.

A redação atual do inciso I do art. 114 da CF, dada pela Emenda 45, faz compreender na competência da Justiça do Trabalho todos os conflitos decorrentes da relação de trabalho, das quais a relação de emprego é espécie. Assim, segundo a redação atual do art. 114 da CF, compete à Justiça do Trabalho o conhecimento de todos os conflitos decorrentes das relações de trabalho e não apenas os que decorrem das relações de emprego.

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Anote-se, nesse ponto, que a Justiça do Trabalho surgiu da preocupação social específica com os conflitos decorrentes da relação de emprego, que é disciplinada pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT -, e a sua competência restrita a esse tipo de conflito persistiu como uma consequência dessa preocupação originária.

Nos dias atuais, contudo, tinha-se como incompreensível que a competência da Justiça Especializada fosse restrita a tais conflitos de interesses. Propugnava-se, assim, pela ampliação da competência para compreender nela todos os conflitos de trabalho.

Tendo em vista que a Justiça do Trabalho foi constituída com o objetivo de solucionar os conflitos decorrentes das relações de emprego, quase que exclusivamente, as regras que dispõem sobre a competência territorial dos órgãos de base dessa Justiça na CLT foram produzidas em se considerando apenas os conflitos decorrentes das relações de emprego.

Dessa forma, então, as disposições do art. 651 da CLT tratam, apenas, da competência do órgão de base da Justiça do Trabalho, atualmente Varas do Trabalho, para os conflitos que decorrem das relações de emprego. Observe-se, nesse ponto, que o caput do art. 651 diz que compete às Juntas de Conciliação e Julgamento (atualmente Varas do Trabalho) do lugar da prestação de serviços o conhecimento dos conflitos daí decorrentes.

A regra do caput fala de empregado e as demais disposições que se seguem nos parágrafos do referido artigo também consideram a existência de uma relação de emprego submetida ao Judiciário Trabalhista.

Assim, conforme a disposição do caput do art. 651 da CLT, a competência das Varas do Trabalho é determinada pelo local em que o empregado prestar serviços, ainda que tenha sido contratado noutro lugar, e independe do pólo que o trabalhador ocupe na relação processual. Sendo autor (reclamante) ou réu (reclamado), a Reclamação Trabalhista deve ser proposta no foro da prestação de serviços, em princípio.

Em sendo o caso de agente ou viajante comercial, pessoa em trânsito, a competência da Vara será determinada em se considerando se o empregado está ou não vinculado a uma agência ou filial - § 1º do art. 651 da CLT. Se o empregado não estiver vinculado a uma agência ou filial, a competência será determinada pelo local da residência ou

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domicílio do trabalhador.Nos casos em que o empregado é contratado numa localidade

para a prestação de serviços noutro e o empregador não executa atividade no local da contratação, a competência será da Vara do lugar da contratação ou da prestação de serviços, a critério do trabalhador, conforme a previsão do § 3º do referido art. 651.

Anote-se, nesse ponto, que a doutrina e a jurisprudência majoritárias repelem o foro de eleição na relação de emprego (LEITE, 2008; SCHIAVI, 2009; ZANGRANDO, 2007), não obstante o reconhecimento de que a competência relativa pode ser objeto de alteração por contrato, conforme as previsões dos arts. 78 do Código Civil – CC - e 111 do Código de Processo Civil – CPC -.

Vejamos decisão que evidencia a interpretação de repulsa ao foro de eleição na relação de emprego:

F O R O D E E L E I Ç Ã O . INADIMISSIBIL IDADE NO PROCESSO DO TRABALHO. A despeito de as regras de competência em razão de lugar serem relativas, aceitando derrogação pela vontade das partes, não se admite, no processo do trabalho, o foro de eleição, porque dificulta e, por vezes, inviabiliza o acesso do trabalhador à Justiça. (TRT 12ª R.; RO 02994-2008-016-12-00-4; Segunda Turma; Rel. Juiz Edson Mendes de Oliveira; Julg. 15/12/2008; DOESC 19/01/2009).

3. A COMPETÊNCIA TERRITORIAL DAS VA-RAS DO TRABALHO PARA OS DISSÍDIOS QUE NÃO DECORREM DA RELAÇÃO DE EMPREGO – Hipótese não contemplada na CLT

A redação atual do art. 114 da Constituição Federal estabelece para a Justiça do Trabalho a competência para todos os conflitos que decorrem das relações de trabalho, exceto, conforme a interpretação do Supremo Tribunal Federal, para aqueles que decorrem das relações regidas pelo Direito Administrativo. É que as pessoas de direito público mantêm com servidores relações regidas,

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na maioria das vezes, pelo Direito Administrativo.Anote-se, nesse ponto, que é possível a contratação de

emprego por pessoa de direito público e, nesses casos, a competência para o conhecimento de eventual dissídio é da Justiça do Trabalho, o que é incontroverso, conforme, inclusive, a interpretação literal do inciso I do art. 114 da CF.

Em vista da redação atual da Constituição de 1988, é da Justiça do Trabalho, por exemplo, a competência para os conflitos que envolvam a representação comercial, a prestação de serviços, o mandato e a empreitada, desde que o trabalho seja prestado por pessoa natural, condição a que tenhamos, no caso, uma relação de trabalho.

Ademais, por previsão, ainda, do art. 114 da Constituição, compete à Justiça do Trabalho o julgamento dos conflitos decorrentes do exercício de greve; os que decorrem de disputa por representação entre sindicatos; os que envolvam sindicato e empresa; e aqueles entre o trabalhador e o sindicato, entre outros.

Nesse ponto, então, veja-se, a propósito, que compete à Justiça do Trabalho o conhecimento do conflito que verse sobre posse de bem em decorrência do exercício do direito de greve de trabalhadores da iniciativa privada, conforme a Súmula Vinculante n. 23 do Supremo Tribunal Federal, o que significa a possibilidade do ajuizamento na Justiça do Trabalho, perante uma Vara do Trabalho, de interdito proibitório por uma empresa em face do sindicato da categoria obreira, por exemplo.

Para todos esses conflitos, destarte, a CLT não dispõe de regras em torno da competência territorial das Varas do Trabalho, já que a competência prevista no art. 651 da CLT, como já destacamos, é restrita aos conflitos que decorrem da relação de emprego. Verificamos, assim, lacuna normativa na CLT em torno da fixação da competência territorial das Varas do Trabalho, que decorre da ampliação da competência da Justiça do Trabalho pela Emenda 45, na medida em que não houve a aprovação de regras específicas para tais hipóteses no processo especial.

Diante, então, da lacuna em questão, devemos buscar, nas regras do processo comum, disposições que sejam aplicáveis às situações não disciplinadas pelo diploma especial, conforme o permissivo do art. 769 da CLT. Nesse contexto, destarte, são quatro

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as regras principais que devem ser consideradas nos casos possíveis.A primeira delas considera o lugar do domicílio do réu para

a fixação da competência da Vara do Trabalho, conforme estabelece o art. 94 do vigente Código de Processo Civil, quando o reclamado é pessoa natural. Esse critério é previsto num conjunto de possibilidades expressas em regras que completam o caput do art. 94 como, por exemplo, quando houver pluralidade de réus.

O lugar da sede da pessoa jurídica ou do funcionamento de agência ou filial, por sua vez, fixa a competência territorial para ações nas quais for ré pessoa jurídica – alíneas “a” e “b” do art. 100 do CPC.

O lugar do cumprimento da obrigação, por outro lado, será o competente quando o pedido for para o adimplemento de obrigação cuja previsão de cumprimento estava com a indicação de lugar para esse fim – alínea “d” do art. 100.

Por fim, será competente o lugar de ato ou fato para o pedido de indenização por dano material ou extrapatrimonial, conforme a alínea “a” do inciso V do art. 100 do Código de Ritos do Processo Civil Comum.

As regras acima referidas em torno da competência territorial serão aplicadas no processo do trabalho, como já dissemos, desde que o conflito não verse sobre relação de emprego.

Assim, exemplificando, se um representante comercial, pessoa natural, pretender acionar o representado, também pessoa natural, a competência será do lugar do domicílio do réu.

Na hipótese de o prestador de serviços ter necessidade de apresentar pedido ao estado-juiz em face do tomador dos serviços pessoa jurídica, a competência, por sua vez, será do lugar da sede da pessoa jurídica ou da localização da agência ou filial, conforme seja o caso.

Imaginemos, noutro ponto, que o representante comercial pretenda obter a satisfação de uma obrigação cujo lugar de adimplemento tenha sido ajustado previamente. É o caso, por exemplo, de um prêmio estabelecido para ser entregue na cidade de São Paulo para o caso de obtenção de meta por parte de um representante comercial. O representado prometeu premiar com um automóvel o representado que atingisse determinado nível de vendas. Não satisfeita a obrigação, caberá ao representante acionar

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o representado no lugar previsto para a entrega do automóvel, qual seja, na situação hipotética, na cidade de São Paulo.

Por fim, ainda discorrendo sobre as hipóteses do CPC aplicáveis ao processo do trabalho para conflitos que não sejam da relação de emprego, caso a pretensão seja uma indenização por dano material ou dano moral, a ação deverá ser exercida no foro da ocorrência do fato ou ato danoso.

Não há, nesse ponto, como deixar de ressaltar, que para conflitos que não sejam da relação de trabalho é possível a eleição de foro. É que a competência territorial pode ser objeto de ajuste entre contratantes, o que não ocorre com a competência determinada pela pessoa, matéria ou hierarquia. É nesse sentido a doutrina de Carlos Henrique Bezerra Leite (2008), tratando da questão especificamente no processo do trabalho.

Vejamos, por outro lado, decisões de nossos tribunais sobre a matéria:

FORO DE ELEIÇÃO. Não há como se aplicar a regra do artigo 651 da CLT, especialmente do seu parágrafo 3º, de modo que prevalece o foro de eleição outrora fixado pelos litigantes, a teor da cláusula décima quarta constante do contrato de prestação de serviços firmados pelos próprios (fl. 10). Incide, portanto, na espécie o comando do artigo 111 do CPC. O art. 651 da CLT, que dispõe acerca das regras de competência da Justiça do Trabalho, é aplicável apenas aos casos que envolvem relações de emprego, nas quais há a interação entre empregado e empregador. (TRT 17ª R.; RO 01700.2006.014.17.00.5; Ac. 5719/2008; Rel. Juiz Jailson Pereira da Silva; DOES 27/06/2008; Pág. 16).

F O R O D E E L E I Ç Ã O . A Ç Ã O D E C O B R A N Ç A D E H O N O R Á R I O S D E ADVOGADO. Havendo eleição de foro, o consentimento dos contratantes deve ser respeitado, aplicando-se a hipótese do artigo

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112, parágrafo único, do código de processo civil. Não incidem, pois, as restrições que regem a eleição de foro pelos empregados. Por outro lado, não se aplica a Instrução Normativa 27, do c. Tribunal superior do trabalho, porque diz respeito a normas procedimentais e não sobre competência; também, não é possível utilizar as hipóteses previstas no artigo 651, da CLT, em virtude de se referirem, apenas, às relações de emprego. (TRT 17ª R.; RO 01731.2006.014.17.00.6; Ac. 5633/2008; Rel. Juiz Cláudio Armando Couce de Menezes; DOES 26/06/2008; Pág. 6).

De tudo, destarte, resta que as regras da CLT sobre a competência territorial das Varas do Trabalho não se prestam à disciplina da competência para os conflitos que não decorrem de relações de emprego, o que implica necessidade, como dissemos, da aplicação supletiva do CPC no processo do trabalho.

4 . O CO N T E Ú D O DA G A R A N T I A CO N S T I T U -CIONAL DO ACESSO À JUSTIÇA

Nós encontramos o princípio do acesso à justiça ou da inafastabilidade do Poder Judiciário na norma do inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal. O princípio-garantia é também conhecido como princípio do direito a ação, o que não é a mesma coisa que princípio da ação (CINTRA, DINAMARCO E GRINOVER, 2009).

Nelson Nery Júnior (2009) destaca que a norma do inciso XXXV do art. 5º da CF é destinada, de início, ao Poder Legislativo, porém observa que o seu endereçamento não se restringe ao referido poder, já que ninguém pode impedir que qualquer pessoa proponha ao Poder Judiciário uma medida judicial que pretenda impedir ameaça ou que venha restaurar direito.

Marcelo Abelha Rodrigues (2010) observa, nessa linha, que a garantia do acesso à justiça é dirigida aos três poderes e ao jurisdicionado com um aspecto negativo, que é o constante da impossibilidade de criação de obstáculo ou impedimento ao acesso à

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justiça, e outro positivo, correspondente à necessidade de que sejam criadas condições para o concreto e efetivo acesso à jurisdição.

A constituição em vigor ampliou o princípio na medida em que não o restringiu à defesa de direitos individuais e o previu para a hipótese de ameaça a direito, o que na prática se tinha com a possibilidade das medidas cautelares e de antecipações de tutela, essas últimas para casos específicos até a alteração da regra do art. 273 do CPC.

Como bem registra a doutrina contemporânea (NERY JÚNIOR, 2009; CINTRA, DINAMARCO E GRINOVER, 2009), estão contemplados na defesa os interesses e direitos coletivos e os difusos, o que também prestigia o acesso à justiça na forma concebida por Cappelletti e Garth (1988).

Por outro lado, a previsão de petição contra ameaça revela a preocupação do legislador constituinte em que haja adequado e efetivo acesso ao Poder Judiciário, já que acesso após a consumação da lesão pode significar, em algumas situações, jurisdição sem resultado prático.

O acesso à justiça caracterizado por uma prestação jurisdicional adequada é o destaque que nós encontramos em Fredie Didier Júnior (2010). A adequação corresponde a que o Judiciário dê resposta correspondente à realidade da situação jurídico-substancial que lhe foi submetida.

Cândido Rangel Dinamarco (2005) relaciona, por seu turno, o acesso à justiça com a instrumentalidade do processo, sendo essa última uma concepção que se volta a tornar as pessoas mais felizes ou menos infelizes, na sua observação, em vista da eliminação dos conflitos nos quais estejam envolvidas, a partir de decisões justas. No que respeita ao acesso à justiça, Dinamarco ressalta que o princípio-garantia é mais que um princípio, sendo “a síntese de todos os princípios e garantias do processo”. O autor conclui que a idéia do acesso à justiça é o “pólo metodológico mais importante do sistema processual na atualidade, mediante o exame de todos e de qualquer um dos grandes princípios”.

Cintra, Dinamarco e Pellegrini (2009) desenvolvem uma compreensão sistemática do acesso à justiça, que não se identificaria com a mera admissão ao processo, ou seja, com a sua universalização, mas também com a efetivação do devido processo legal; a partir da participação dos litigantes no processo, com o que possam

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atuar decisivamente para a formação do convencimento do órgão jurisdicional; e pela possibilidade de que os litigantes participem em diálogo na preparação de uma solução judicial justa para o conflito.

Para Carlos Henrique Bezerra Leite (2008), o acesso à justiça pode ser compreendido nos sentidos geral, restrito e integral. O autor diz que o sentido geral da expressão é sinônimo de justiça social, que corresponde à concretização do ideal universal de justiça. No sentido restrito, para Bezerra Leite, acesso à justiça é expressão utilizada no aspecto dogmático de acesso à tutela jurisdicional, inserida no “universo formalístico e específico do processo”. Por fim, para Carlos Henrique Bezerra Leite, o sentido integral da expressão assume um caráter de acordo com a teoria dos direitos fundamentais e com os escopos jurídicos, políticos e sociais.

Por fim, ainda considerando a opinião da doutrina sobre o acesso à justiça, merece citação o destaque de Luiz Guilherme Marinoni (2008). Para o autor em questão:

O problema da “efetividade” do direito de ação, ainda que já fosse percebido, no início do século XX, tornou-se mais nítido quando da consagração constitucional dos chamados “novos direitos”, ocasião em que a imprescindibilidade de um real acesso à justiça se tornou ainda mais evidente. Como adverte Boaventura Souza Santos, os novos direitos sociais e econômicos, caso ficassem destituídos de mecanismos que fizessem impor o seu respeito, assumiriam a configuração de meras declarações políticas, de conteúdo e função mistificadores. Por isso logo se percebeu que a administração da justiça civil e os procedimentos judiciais não mais poderiam ficar reduzidos a uma dimensão meramente técnica e socialmente neutra, devendo investigar-se as funções sociais por ele desempenhadas e, em especial, o modo como as opções técnicas no seu seio veiculavam opções a favor ou contra interesses sociais divergentes, ou mesmo antagônicos.

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Como se vê, o conteúdo do princípio-garantia do acesso à justiça compreende a universalização do acesso ao Judiciário; a impossibilidade de que sejam criados impedimentos ou obstáculos ao acesso; a adoção de mecanismos para que o acesso seja eficaz, inclusive no que respeita aos direitos e interesses coletivos e à adoção de medidas de urgências, cautelares e satisfativas, para a salvaguarda de direitos; a necessidade de que a atuação do Poder Judiciário seja adequada e suficiente; a possibilidade de que as partes atuem no processo para a prevalência de suas posições jurídicas; e, o que nos parece de grande relevância, um mecanismo de concretização dos direitos consagrados a partir da Constituição Federal, revelando opções favoráveis aos interesses sociais.

5 . A I N T E R P R E TA Ç Ã O D A C O M P E T Ê N C I A T E R R I T O R I A L D A S VA R A S D O T R A B A L H O N O CO N T E X TO DA G A R A N T I A D O AC E S S O À JUSTIÇA

A interpretação da competência territorial das Varas do Trabalho para os conflitos que decorrem da relação de emprego destacam dois aspectos nas regras previstas na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT: o acesso à justiça; e a necessidade de obtenção das provas para o julgamento do conflito, o que também, no nosso entender, corresponde a uma expressão do acesso à justiça. Os estudiosos são unânimes na identificação de que o lugar da prestação de serviços – Caput do art. 651 da CLT - foi escolhido pelo legislador justamente em vista da necessidade de permitir o acesso à jurisdição trabalhista e às provas. É que o trabalhador-empregado busca residir perto do trabalho, o que se justifica por aspectos econômicos e de comodidade.

A residência perto do trabalho significa a ausência ou redução de custos com o transporte, quantias que comprometem o poder de compra do trabalhador. É preciso, nesse contexto, raciocinar com o juízo do trabalhador.

Estou certo de que a quase totalidade dos meus leitores não tem ou tiveram a necessidade de empreender tal raciocínio. O desafio, porém, é mais justificado quando é possível constatar o número de trabalhadores que se descola de bicicleta para o trabalho. A opção

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pela bicicleta, é evidente, não é determinada por questões de saúde ou porque o permite a estrutura viária. A julgar pela ausência de ciclovias, pela violência urbana e pela educação dos motoristas, não haveria a opção por esse tipo de transporte. A bicicleta é o recurso possível que o trabalhador tem para substituir o transporte público coletivo e, com isso, ter a sobra de dinheiro para a aquisição de pão.

Por outro lado, no que respeita à obtenção das provas, é no lugar da prestação de serviços que ela se apresenta mais oportuna. As testemunhas se deslocarão para o juízo com mais facilidade; o perito será do lugar e não terá necessidade de grandes deslocamentos para o exame, vistoria ou avaliação; e havendo necessidade de inspeção judicial, o juiz estará perto do lugar do trabalho e da vistoria.

Não desconhecemos a possibilidade, por óbvio, de que a prova se dê por expedição e cumprimento de carta precatória. O problema nesse caso será a demora na tramitação do processo e o impedimento a que o juiz da instrução seja o mesmo do julgamento. Relativamente a esse último aspecto, primado relevante do procedimento oral estará comprometido.

No que respeita à produção de provas, aliás, como já observamos, esse aspecto também tem relação com o acesso à justiça porque não é possível se falar de acesso à justiça sem que se reconheça aos litigantes a possibilidade de, pela produção de provas, influenciar no julgamento do conflito posto à jurisdição. O processo democrático corresponde a que as partes possam atuar em cooperação e em diálogo com o juízo o que, necessariamente, compreende a atuação probatória dos litigantes.

Relativamente às regras em torno da competência territorial das Varas do Trabalho para os casos que não são de relação de emprego, outra conclusão não podemos extrair: elas foram concebidas no Código de Processo Civil também para permitir o acesso das pessoas à jurisdição e tendo em vista a necessidade da obtenção de provas (RODRIGUES, 2010).

De tudo se ressalta, destarte, que o princípio-garantia do acesso à justiça deve presidir toda a interpretação das regras que fixam a competência territorial das Varas do Trabalho, independentemente de que estejamos num conflito de relação de emprego ou de relação diversa da relação de emprego.

Nesse diapasão, destarte, precisamos estabelecer algumas

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premissas: a) a necessidade de que sejam afastadas as interpretações literais das regras, em algumas hipóteses; b) a admissão da contratação de foro, desde que não seja prejudicial ao acesso de qualquer dos litigantes à justiça, sobretudo do trabalhador; ec) a necessidade de se reconhecer ao juízo a possibilidade de manifestação da incompetência relativa, de ofício, independentemente de estarmos diante de cláusula de contrato de adesão – Parágrafo único do art. 112 do CPC.

5.1. O afastamento de interpretações literais de regras de competência territorial

A interpretação de um fenômeno qualquer consiste na tentativa de determinar o seu significado e alcance. Relativamente ao fenômeno jurídico, de igual modo, o trabalho de interpretação corresponde à tarefa de compreender o significado e alcance da norma a partir da utilização de critérios a que se denomina de métodos de interpretação. Esses métodos são tratados, observe-se, como um conjunto unitário, ainda que complexo e dinâmico.

O primeiro dos métodos que merece menção é o gramatical ou filológico. Esse método considera que a norma se expressa por palavras e que o intérprete deve considerá-las tanto individualmente como no contexto da sentença em que ela se apresenta. Note-se que esse método reclama que o legislador tenha tido a capacidade de utilizar as expressões apropriadas para as idéias que ele veicula e que o intérprete também tenha a habilidade necessária com o idioma para extrair a interpretação que é possível a partir das palavras utilizadas pelo legislador.

O método lógico-sistemático considera que os dispositivos normativos não têm existência isolada, porém que se inserem organicamente num sistema, que corresponde ao ordenamento jurídico e que por isso devem ser interpretados com as demais regras e princípios que compõem o sistema jurídico.

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Nesses tempos de destaque da Constituição no estabelecimento da organização da vida social e, sobretudo, e o que nos é importante, na fixação de garantias processuais para todas as pessoas, ganha relevo a necessidade de que essa interpretação lógico-sistemática das normas processuais seja a partir da consideração delas no quadro dessas garantias.

O método histórico, por sua vez, tem em vista que o fenômeno jurídico é cultural e a norma, então, deve ser determinada no contexto de sua perspectiva histórica, ou seja, a partir da compreensão do conjunto de fatos sociais que a determinaram e tendo em vista os anseios sociais que lhe deram causa.

Nesse quadro, inclusive, é possível compreender uma defasagem histórica da regra, ou seja, que ela disciplinou uma conduta de tal modo porque não seria possível, do ponto de vista histórico, uma disciplina diferente, conforme a observação de Karl Larenz (1997).

Por fim, apresentamos o método finalístico e valorativo que considera que as normas possuem uma finalidade e valor que devem determinar o conteúdo e o alcance da interpretação que ela merece. Esse método permite a interpretação da norma segundo os anseios e valores vigentes, ou seja, que ela sofra um processo de atualização histórica que considere os valores de agora (DINAMARCO, 1995).

Ora, o processo de interpretação de uma regra jurídica, como já asseveramos, é ato complexo e dinâmico. Complexo porque a utilização de um único método entre os possíveis não será capaz de nos conceder, com segurança, o conteúdo e o alcance da regra. Assim, o intérprete terá de lançar mão do conjunto de métodos para obter a interpretação adequada do fenômeno regrado.

Por outro lado, a interpretação jurídica é um fenômeno dinâmico, uma vez que reclama do intérprete a identificação de eventual envelhecimento da regra e concepção de uma interpretação que seja capaz de atuar sobre os reclamos do seu momento histórico.

Nesse contexto, então, ressaltamos que a interpretação literal pode ser contra o sistema ou impedir que se concretizem os valores sociais que determinaram o seu surgimento ou que estejam em evidência por aperfeiçoamento das relações sociais.

Assim, pode ser o caso, por exemplo, de que a interpretação literal do caput do art. 651 da CLT, que pretende facilitar o acesso

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do trabalhador ao Poder Judiciário, se apresente como obstáculo ao acesso. Vejamos um exemplo: o empregado que tenha trabalhado apenas na cidade de São Paulo, local que também tenha sido o da contratação, terá de Reclamar na cidade de São Paulo. No entanto, se esse trabalhador for migrante e tiver retornado para a sua cidade natal, Salvador, por exemplo, ele terá obstado, no plano prático, o acesso à justiça, se houver prevalência da literalidade do caput do art. 651 da CLT.

Na hipótese, então, deve o intérprete afastar a interpretação literal e fazer prevalecer o “espírito” que está por trás da regra, ou seja, os seus fins sociais e exigências do bem-comum, autorizando que o empregado apresente reclamação no lugar de sua residência ou domicílio. Vejamos decisões que confirmam esta teoria:

C O M P E T Ê N C I A T E R R I T O R I A L . ATLETA PROFISSIONAL DE FUTEBOL. CEDÊNCIA. ACESSO À JUSTIÇA. 1. A competência territorial encontra-se regulada no art. 651 da CLT, segundo o qual o critério definidor dessa competência é o local da prestação de serviços pelo empregado (caput). Hipótese em que o autor, atleta profissional de futebol, estava vinculado ao Sport Club Internacional e foi cedido ao Paysandú Sport Club, de Belém do Pará. O local da contratação do demandante por este clube e a alegada prestação de serviços em diversas cidades do País, dada a sua participação em jogos de futebol, não o exclui da regra do caput do art. 651 citado, nem o inclui na hipótese de seu parágrafo 3º. 2. Não obstante tal realidade, o julgamento da ação por uma das Varas do Trabalho de Belém do Pará inviabilizaria o acesso do autor à Justiça, considerando-se residir atualmente nesta capital, já que não teria condições para arcar com os custos dos deslocamentos e demais despesas, frente à declaração da fl. 63

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(reclamante desempregado e sem condições de arcar com os custos do processo sem prejuízo de seu sustento). Na hipótese, é o clube-reclamado quem tem considerável estrutura e melhores condições financeiras para o deslocamento a esta cidade. Recurso do autor provido para declarar a competência da Comarca de Porto Alegre para julgamento da demanda. (TRT 04ª R.; RO 00231-2008-019-04-00-1; Sétima Turma; Relª Desª Maria Inês Cunha Dornelles; Julg. 26/11/2008; DOERS 04/12/2008).

INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E M AT E R I A I S D E C O R R E N T E S D E ACIDENTE DE TRABALHO. EXCEÇÃO D E I N C O M P E T Ê N C I A E M R A Z Ã O D O L U G A R . I N A P L I C A B I L I D A D E DO DISPOSTO NO AR TIGO 651, DA C O N S O L I D A Ç Ã O D A S L E I S D O TRABALHO. As regras de competência territorial devem ser lidas e compreendidas com o sentido e interpretação do princípio magno constitucional de “acesso à justiça”. A leitura ou interpretação de um texto legal não pode, em hipótese alguma, levar a uma situação que represente a negativa de acesso à jurisdição. A doutrina especializada nos fala em “ondas de acesso à justiça”, até porque a principiologia constitucional nos remete a sempre repelir interpretações que possam gerar situações que impeçam o jurisdicionado de ter o seu acesso ao Judiciário. Em razão disso, a aplicação estrita da regra inserta no art. 651 da CLT só se justifica quando se está diante de uma demanda trabalhista típica, ou seja, daquela demanda que era da competência da Justiça do Trabalho quando da elaboração dos critérios de competência

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territorial pela CLT. Tratando-se de ação decorrente de acidente de trabalho, cuja competência para a apreciação e julgamento só foi atribuída definitivamente à Justiça do Trabalho após a interpretação dada pelo Supremo Tribunal Federal ao inciso IV do art. 114 da CF, incluído pela Emenda Constitucional nº 45/04, não se pode cogitar da aplicação estrita da regra celetista de 1943, sem qualquer sopesamento, sem qualquer ponderação, dada a diversidade da dinâmica das partes postulantes, da multiplicidade e riqueza das situações e fatos que se originam dessa nova competência trabalhista. (TRT 03ª R.; RO 00416-2007-070-03-00-7; Primeira Turma; Rel. Juiz Manuel Cândido Rodrigues; Julg. 29/10/2007; DJMG 21/11/2007).

5.2. A admissão da contratação de foro, desde que não seja prejudicial ao acesso de qualquer dos litigantes à justiça, sobretudo do trabalha-dor

A doutrina e a jurisprudência apresentam diversos argumentos para a não aceitação da contratação de foro na relação de emprego.

Carlos Henrique da Silva Zangrando (2007) ressalta que a eventual admissão do foro de contratação redundaria, na prática, na criação de dificuldade ou de impedimento a que o trabalhador tenha acesso à justiça.

Mauro Schiavi (2009) lança mão do argumento da hipossuficiência e do estado de subordinação do empregado, o que o levaria a aceitar a contratação de foro prejudicial ao seu acesso à justiça.

Carlos Henrique Bezerra Leite (2008) e Renato Saraiva (2005) utilizam o argumento de que as regras sobre competência no processo do trabalho são de ordem pública e, pois, inderrogáveis pela vontade das partes. Renato Saraiva complementa o seu raciocínio dizendo que o art. 651 da CLT visa acesso do trabalhador à justiça, o

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que faria com que o foro de eleição fosse incompatível com o processo do trabalho.

Manoel Antonio Teixeira Filho (2009) aponta um caráter imperativo para as regras sobre competência na CLT o que, então, não propiciaria margem para a contratação de foro.

De nossa parte, propomos uma interpretação que não exclua a possibilidade do foro de eleição na relação de emprego, senão pelo evidente obstáculo ou dificuldade ao acesso à justiça que a eleição tenha criado para o mais fraco na contratação.

Nesse contexto, então, defendemos a possibilidade da regular contratação de foro de eleição, tanto nas relações de emprego, como nas demais relações de trabalho.

Não interpretamos, como o fazem Carlos Henrique Bezerra Leite (2008), Renato Saraiva (2005) e Teixeira Filho (2005) que as regras em torno da incompetência territorial sejam de ordem pública. Veja-se, quanto a esse aspecto, que a doutrina e a jurisprudência não admitem a declaração da incompetência relativa de ofício no processo do trabalho justamente sob o fundamento de que a nulidade decorrente da incompetência territorial é relativa, do interesse privado e não público.

Podemos dar um exemplo da possibilidade da contratação válida de foro na relação de emprego. Imaginemos que um empreendedor pretenda a contratação de um trabalhador especializado para a prestação de serviços em lugar diverso da residência e domicílio do empregado. Além do mais, a contratação seria no lugar da prestação de serviços.

Não interpretamos a ocorrência de qualquer irregularidade se o trabalhador, nesse caso, por sua força pessoal, conseguir eleger o foro de sua residência originária e permanente como sendo o competente para o conhecimento de eventual demanda em torno desse contrato. Esse foro, é evidente, terá sido contratado no interesse do trabalhador.

Ressalte-se, assim, que embora de difícil ocorrência prática para favorecer o trabalhador, a eleição de foro pode ter lugar, ao menos no plano teórico, para favorecer o trabalhador, o que a doutrina não pode desconsiderar.

Assim, do ponto de vista da interpretação das normas vigentes, não é possível excluir a eleição de foro em relação de emprego com

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base noutro argumento que não o da necessidade de assegurar o acesso à justiça ao trabalhador. Dispensam-se outros raciocínios interpretativos e que obstam, sem exceção, a eleição de foro.

5.3. A necessidade de se reconhecer ao juízo a possibilidade de manifestação da incompe-tência relativa, de ofício, independentemente de estarmos diante de cláusula de contrato de adesão – Parágrafo único do art. 112 do CPC

A incompetência absoluta é distinguida da incompetência relativa também pela possibilidade de que a incompetência absoluta seja pronunciada de ofício, o que não acontece com a incompetência relativa.

Até a Lei n. 11.280/2006, o juiz do processo civil comum não tinha qualquer exceção à regra da impossibilidade de manifestação da incompetência relativa de ofício. Com a lei em questão, o legislador introduziu o Parágrafo único no art. 112 permitindo a declaração de nulidade de cláusula de eleição de foro em contrato de adesão. A regra trazida pela Lei n. 11.280/2006 busca, justamente, que o juízo corrija de ofício a irregularidade na contratação do foro, sobretudo pela evidência de que a contratação, em contrato de adesão, é obstativa do acesso à justiça para um dos contratantes. Eram recorrentes os casos nos quais o acionamento da parte hipossuficiente ocasionava a impossibilidade de sua defesa em razão do foro de eleição, que não teria sido efetivamente contratado. No âmbito do processo do trabalho quase não encontramos vozes que afirmem a possibilidade da manifestação da incompetência relativa de ofício. Ou seja, a jurisprudência e a doutrina posicionam-se pela necessidade de que a incompetência relativa seja suscitada pela parte a quem aproveita, não obstante a regra do § 1º do art. 795 da CLT.

A admissão do foro de eleição nas relações de emprego e nas demais relações de trabalho, essa última prevalecendo na doutrina e na jurisprudência, nos confronta com a necessidade de investigar, no caso posto, se a contratação evidenciou efetiva intenção das partes e se não há dificuldade ou impedimento do acesso à justiça para o contratante hipossuficiente ou mais fraco, independentemente de

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estarmos diante de contrato de adesão. Assim, a constatação de que o foro eleito, diverso daquele que originariamente seria o do conhecimento do litígio, criou impedimento ou obstáculo ao acesso à justiça, cumprirá ao órgão jurisdicional pronunciar a incompetência relativa de ofício, mesmo quando não esteja diante de contrato de adesão e independentemente do caso posto à sua apreciação versar sobre relação de trabalho diversa da relação de emprego.

Aqui, há de prevalecer a garantia constitucional em detrimento da interpretação de que estaríamos diante de uma nulidade relativa, necessariamente manifestada pela parte.

Por outro lado, se não admitido o foro de eleição para a relação de emprego muito mais razões haverá para que o juízo pronuncie de ofício a incompetência relativa. Imaginemos o caso de uma Ação de Consignação em Pagamento ser proposta, para a quitação de verbas rescisórias e outros direitos, fora do lugar da prestação de serviços e com evidente obstáculo ou dificuldade de defesa para o credor-trabalhador. O juízo não deveria pronunciar a incompetência territorial de ofício diante da revelia do trabalhador? Negar ao juiz a possibilidade de pronunciar a incompetência de ofício seria, no caso, legitimar uma iniqüidade e negar efetividade à garantia do acesso à justiça.

6. CONCLUSÕES

A Justiça do Trabalho foi concebida para a solução de conflitos entre trabalhadores e empregadores, situação que permaneceu na legislação nacional até o advento da Emenda 45, que ampliou a competência da Justiça Especializada para todos os conflitos que decorrem das relações de trabalho, excluídas as relações de Direito Administrativo que as pessoas de direito público mantêm com servidores. A competência territorial das Varas do Trabalho, nesse passo, que data da década de 40 do século passado, foi prevista, então, para os conflitos que decorrem das relações de emprego. As regras que encontramos no art. 651 da CLT consideram que um empregado esteja num dos pólos da relação processual. Tendo em vista a ampliação da competência da Justiça do

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Trabalho e a lacuna na legislação específica em torno da competência territorial das Varas do Trabalho para os conflitos que decorrem de relações que não sejam de emprego, necessitamos da utilização das regras do processo comum, em caráter subsidiário por previsão do art. 769 da CLT, as quais consideram o local do domicílio ou residência do réu, o local da sede da pessoa jurídica ou da agência ou filial demandada, o local do adimplemento da obrigação cuja satisfação se busca e o local do ato ou fato para as ações de indenização por dano. O princípio-garantia do acesso à justiça, consagrado no item XXXV do art. 5º da Constituição Federal, é interpretado sob vários aspectos pela doutrina nacional.

A garantia é interpretada em seu aspecto negativo de impedir que o Poder Público e os particulares criem obstáculo a que qualquer pessoa tenha acesso ao Judiciário diante de uma ameaça ou lesão a direito. Por outro lado, também é apontada em seu aspecto positivo, como uma previsão que implica necessidade de que a sociedade crie condições de efetivo acesso à justiça de todos quantos tenham demanda por solução de conflito.

A constituição em vigor ampliou o princípio na medida em que não o restringiu à defesa de direitos individuais e o previu para a hipótese de ameaça a direito, o que na prática se tinha com a possibilidade das medidas cautelares e de antecipações de tutela, essas últimas para casos específicos até a alteração da regra do art. 273 do CPC.

Ademais, a doutrina considera que o acesso à justiça deve compreender a idéia de adequado acesso, ou seja, que corresponda à realidade da situação jurídico-substancial que lhe foi submetida.

Nesse contexto, destarte, merece destaque a posição de Cintra, Dinamarco e Pellegrini (2009), que desenvolvem uma compreensão sistemática do acesso à justiça, a qual não se identificaria com a mera admissão ao processo, ou seja, com a sua universalização, mas também com a efetivação do devido processo legal; a partir da participação dos litigantes no processo, com o que possam atuar decisivamente para a formação do convencimento do órgão jurisdicional; e pela possibilidade de que os litigantes participem em diálogo na preparação de uma solução judicial justa para o conflito.

A instrumentalidade do processo, que corresponde à concretização dos direitos pela via do acesso à justiça, é mais um

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destaque da doutrina nacional para a garantia do acesso à justiça, o que nos parece de grande relevância, na medida em que se ressalta o acesso como um mecanismo de concretização dos direitos consagrados a partir da Constituição Federal, revelando opções favoráveis aos interesses sociais.

A interpretação da competência territorial das Varas do Trabalho para os conflitos que decorrem da relação de emprego destacam dois aspectos nas regras previstas na Consolidação das Leis do Trabalho – CLT: o acesso à justiça; e a necessidade de obtenção das provas para o julgamento do conflito, o que também, no nosso entender, corresponde a uma expressão do acesso à justiça.

Relativamente às regras em torno da competência territorial das Varas do Trabalho para os casos que não são de relação de emprego, outra conclusão não podemos extrair: elas foram concebidas no Código de Processo Civil também para permitir o acesso das pessoas à jurisdição e tendo em vista a necessidade da obtenção de provas (RODRIGUES, 2010).

De tudo se ressalta, destarte, que o princípio-garantia do acesso à justiça deve presidir toda a interpretação das regras que fixam a competência territorial das Varas do Trabalho, independentemente de que estejamos num conflito de relação de emprego ou de relação diversa da relação de emprego e, assim, a necessidade de que sejam afastadas as interpretações literais das regras de competência, em algumas hipóteses; a admissão da contratação de foro, desde que não seja prejudicial ao acesso de qualquer dos litigantes à justiça, sobretudo do trabalhador; e a necessidade de se reconhecer ao juízo do trabalho a possibilidade de manifestação da incompetência relativa, de ofício, independentemente de estarmos diante de cláusula de contrato de adesão.

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça (tradução de Ellen Gracie Northfleet). Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1988. CINTRA, Antonio Carlos Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel; GRINOVER, Ada Pellegrini. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Malheiros, 2009.

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DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil – Teoria Geral do Processo e Processo de Conhecimento. Salvador: JusPodivum, 2010. DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo. São Paulo: Malheiros, 2005. LARENZ, Karl. Metodologia da Ciência do Direito. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1997. LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. São Paulo: LTr, 2008. MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. NERY JÚNIOR. Nelson. Princípios do Processo na Constituição Federal – Processo civil, penal e administrativo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. RODRIGUES, Marcelo Abelha. Manual de Direito Processual Civil. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010. SARAIVA, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho. São Paulo: Médoto, 2005. SCHIAVI, Mauro. Manual de Direito Processual do Trabalho. São Paulo: LTr, 2009. TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Curso de Direito Processual do Trabalho, vol I. São Paulo, 2009. ZANGRANDO, Carlos Henrique da Silva. Processo do Trabalho – Moderna Teoria Geral do Direito Processual. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007.

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INAPLICABILIDADE DA MULTA DO ART. 475-J DO CPC NA EXECUÇÃO TRABALHISTA COMO MEDIDA DE CELERIDADE

Luciana Paula ConfortiJuíza do Trabalho do TRT da 6ª Região, substituta da 17ª VT do Recife, mestranda da UFPE

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Resumo: Para conferir maior celeridade e efetividade ao processo trabalhista, incumbe ao Juiz do Trabalho, sempre que possível, proferir sentenças líquidas e iniciar a execução de ofício, inclusive com a determinação de bloqueio das contas bancárias do executado e não impor a aplicação de multa, no prazo de 15 dias, considerando que o prazo previsto para o cumprimento espontâneo da sentença pela CLT é de apenas 48 horas.

Palavras-chave: execução trabalhista, multa do art. 475-J do CPC, inaplicabilidade.

1. INTRODUÇÃO

A Lei 11.232, de 22 de Dezembro de 2005, introduziu alterações no Processo Civil, com o objetivo de torná-lo mais célere. Como resultado do sincretismo processual (cognição-execução), o processo autônomo de execução foi substituído pelo procedimento de “Cumprimento da Sentença”.

Desde então, muito se tem discutido sobre a aplicação da multa do art. 475-J do CPC nas execuções trabalhistas.

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Defendo a existência de incompatibilidade entre o procedimento previsto no CPC para o cumprimento da sentença e as disposições da CLT.

No processo do trabalho, a conseqüência do não pagamento espontâneo pelo devedor é a execução forçada e com prazo mais exíguo do que o previsto no CPC (art. 880 a 882 da CLT).

2. FUNDAMENTOS

Manoel Antonio Teixeira Filho se posiciona contrário à aplicação do CPC, quando a CLT tem regra própria. Sobre o mesmo tema (a propósito do art. 475-J, do CPC), confira-se a sua lição:

Todos sabemos que o art. 769, da CLT, permite a adoção supletiva de normas do processo civil, desde que: a) a CLT seja omissa quanto à matéria; b) a norma do CPC não apresente incompatibilidade com a letra ou com o espírito do processo do trabalho.1

A CLT não é omissa sobre a matéria e a execução trabalhista também é regida pela Lei 6.830/80. Ademais, existe conflito entre as disposições do art. 475-J do CPC e os artigos 880 a 884 da CLT.

Os defensores da aplicação da multa do art. 475-J do CPC na execução trabalhista argumentam que a medida dá maior efetividade ao título judicial porque acelera o seu cumprimento e assegura a observância do princípio constitucional da razoável duração do processo (art. 5º, LXXVIII).

Ocorre que o art. 475-J do CPC não apresenta medida de celeridade processual, tendo em vista que o prazo previsto no referido artigo é mais longo do que o concedido na CLT e que a execução trabalhista é impulsionada de ofício pelo juiz (art. 878 da CLT).

Para melhor ilustrar a matéria, importante trazer a transcrição dos dispositivos legais relacionados:

1 TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Processo do Trabalho. Embargos à execução ou impugnação à sentença? (A propósito do art. 475-J, do CPC), In Revista LTR 70-10/1180.

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Art. 475-J do CPC – Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não efetue no prazo de 15 (quinze) dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de 10% (dez por cento) e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614 , inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação. (...)

Art. 769 da CLT – Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título.

Art. 878 da CLT – A execução poderá ser promovida por qualquer interessado, ou ex officio, pelo próprio juiz ou presidente ou tribunal competente, nos termos do artigo anterior.

Art. 880 da CLT – Requerida a execução o juiz ou presidente do tribunal mandará expedir mandado de citação ao executado, a fim de que cumpra a decisão ou o acordo no prazo, pelo modo e sob as cominações estabelecidas, ou, quando se tratar de pagamento em dinheiro, inclusive de contribuições sociais devidas à União, para que o faça em 48 (quarenta e oito) horas, ou garanta a execução, sob pena de penhora. (...)

Art. 882 da CLT – O executado que não pagar a importância reclamada

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poderá garantir a execução mediante depósito da mesma, atualizada e acrescida das despesas processuais, ou nomeando bens à penhora, observando a ordem preferencial estabelecida no art. 655 do Código de Processo Civil.

Art. 883 da CLT – Não pagando o executado, nem garantindo a execução, seguir-se-á a penhora dos bens, quanto bastem ao pagamento da importância da condenação acrescida de custas e juros de mora, sendo estes, em qualquer caso, devidos a partir da data em que for ajuizada a reclamação inicial.

Art. 884 da CLT – Garantida a execução ou penhorados os bens, terá o executado cinco dias para apresentar embargos, cabendo igual prazo ao exeqüente para impugnação.

Art. 889 da CLT – Aos trâmites e incidente da execução são aplicáveis, naquilo em que não contrariem ao presente Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal.

Art. 1º da Lei 6.830/80 – A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias será regida por esta lei e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil.

De acordo com a CLT, caso o executado, após citado, não

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realize o pagamento ou a garantia da dívida, em 48 (quarenta e oito) horas, a execução terá início de imediato.

O art. 883 da CLT deve ser interpretado em harmonia com a ordem preferencial estabelecida pelo art. 655 do CPC, no qual o dinheiro está em primeiro lugar. Nesse contexto, incumbe ao juiz, de ofício, expedir ordem ao BANCO CENTRAL DO BRASIL, para o bloqueio das contas bancárias do devedor (art. 655-A do CPC), até o limite da execução.

Um dos princípios que norteiam o processo executório é o da menor onerosidade do devedor e a multa do art. 475-J do CPC possui natureza de punição (STJ, 3ª Turma, MC 13.395/SP, tel. Min. Nancy Andrighi, julg. em 09.10.2007, DJ 16.10.2007).

Como afirmam Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart:

A multa em exame tem natureza punitiva, aproximando-se da cláusula penal estabelecida em contrato. Porém, diversamente desta última, a multa do art. 475-J não é fixada pela vontade das partes, mas imposta – com efeito anexo da sentença – pela lei. Esta multa não tem caráter coercitivo, pois não constitui instrumento vocacionado a constranger o réu a cumprir a decisão, distanciando-se, desta forma, da multa prevista no art. 461, § 4º do CPC. O conteúdo coercitivo que pode ser vislumbrado na multa do art. 475-J do CPC é comum a toda e qualquer pena, já que o devedor, ao saber que será punido pelo descumprimento, é estimulado a observar a sentença.2

É certo que a ação trabalhista visa à execução de créditos

de natureza alimentar e que a efetividade do comando judicial depende da celeridade do processo. Mas diante da principal diferença entre a

2 MARINONI, Luiz Guilherme e ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil, vol. 3, Execução, 2ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 241.

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execução trabalhista e a execução cível, sendo a primeira realizada de ofício pelo juiz e no prazo de 48 (quarenta e oito) horas após a omissão do devedor, o que confere maior celeridade ao processo do trabalho não é a aplicação de multa, conduta que apenas impõe maior ônus ao devedor, mas a imediata execução de ofício, evitando, ainda, que o executado tenha a oportunidade de oferecer impugnação no prazo de 15 (quinze) dias, considerando que no processo do trabalho, em geral, a contestação dos cálculos apenas é feita após a garantia do débito exeqüendo e ainda assim, através dos embargos à execução, no prazo de 05 (cinco) dias.

O executado, no processo do trabalho, tem o direito de garantir a dívida para se opor a execução, o que reforça o entendimento de que a imposição de multa, pelo não pagamento espontâneo, viola o princípio da legalidade (art. 5º, II da CF).

O trabalhador, geralmente, é o exeqüente na reclamatória, todavia, ocorrem situações em que é o executado. Em tal caso, a imposição da multa de 10% agravaria a situação do trabalhador e a regra não poderia ser afastada, pelo princípio da proteção, sob pena de ofensa ao tratamento igualitário que deve ser dispensado aos litigantes (art. 5º, caput da CF).

Sem embargo, é indispensável a observância do devido processo legal e as garantias previstas ao devedor no processo trabalhista não podem ser afastadas porque não há omissão na CLT e a interpretação contrária à letra da lei, extensiva para a imposição de ônus, viola o devido processo legal (art. 5º, LIV da CF). O processo não pode ser pensado apenas sob a ótica do credor, tendo em vista que a justiça não se compatibiliza com medidas unilaterais.

O procedimento estabelecido na CLT não pode ser simplesmente desconsiderado com a aplicação do CPC e existem casos em que o procedimento do CPC tem sido adotado parcialmente, criando-se, destarte, procedimento totalmente diverso, o que acarreta insegurança jurídica aos litigantes.

O principal argumento para a imposição da multa do art. 475-J da CLT, que é a celeridade processual, não se sustenta em virtude de o prazo previsto para o pagamento na CLT ser mais exíguo e de a execução ser processada de ofício e de modo muito mais célere com o bloqueio de numerário, independentemente de qualquer requerimento do credor.

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O Tribunal Superior do Trabalho editou o Provimento 3/2003 (DJU de 26-9-2003, republicado em 23-12-2003), facultando a qualquer empresa do país, desde que de grande porte, e que, em razão disso, mantenha contas bancárias em várias instituições financeiras, a solicitar o cadastramento de conta especial apta a acolher os bloqueios on-line realizados por meio do sistema BACEN JUD (art. 1º).

Como assevera Manoel A. Teixeira Filho: “A Justiça do Trabalho, portanto, a contar da assinatura do convênio BACEN JUD, passou a contar com um sistema em tempo real de garantia da execução por quantia certa, qual seja, o bloqueio on-line.”3

Carlos Henrique Bezerra Leite também se posiciona de modo contrário à aplicação do art. 475-J ao Processo do Trabalho, afirmando que: “Como o processo do Trabalho possui regramento próprio a respeito da execução por quantia certa, haverá o obstáculo do art. 769 da CLT para aplicação subsidiária do novel art. 475-J do CPC, no particular.”4

Outra importante medida para o alcance da celeridade no processo trabalhista é a elaboração de sentenças líquidas. Caso a matéria pertinente aos cálculos não seja abordada no Recurso Ordinário, não poderá ser discutida na execução, exceto a relativa à adequação da conta, proveniente da reforma da sentença pela Instância Superior. De acordo com o § 1º do art. 879 da CLT: “Na liquidação, não se poderá modificar, ou inovar, a sentença liquidanda, nem discutir matéria pertinente à causa principal.” Nesse contexto, sempre que possível, o juiz deve proferir sentenças líquidas, para conferir maior efetividade à coisa julgada.

Nos casos em que a condenação líquida não é possível, pela ausência de algum documento indispensável, por exemplo, como o extrato da conta vinculada do obreiro ou de norma coletiva, a liquidação será processada na forma do art. 879, caput da CLT, que assim dispõe: “Sendo ilíquida a sentença exeqüenda, ordenar-se-á, previamente, a sua liquidação, que poderá ser feita por cálculo, por arbitramento ou por artigos.”

3 TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Curso de Direito Processual do Trabalho, processo de execução, vol. III, fev- 2009, São Paulo: LTr, p. 2183.

4 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho, 4ª ed. – fev-2006, São Paulo: LTr, p. 835.

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Também na fase de liquidação da sentença existem diferenças entre o processo do trabalho e o processo civil.

Igualmente a liquidação no processo do trabalho pode ter início de ofício pelo juiz.

Na execução trabalhista, a sentença de liquidação possui natureza interlocutória, não admitindo recurso. Assim, a decisão que homologa os cálculos não é recorrível de imediato, devendo ser antes impugnada perante o juiz de primeiro grau, após a garantia da dívida e na mesma ocasião, a penhora também poderá ser discutida, com a interposição de apenas um recurso (agravo de petição) por quem se julgar prejudicado.

A parte deve, na primeira oportunidade que tiver para falar sobre os cálculos, argüir todas as questões e matérias que entender devidas, sob pena de preclusão.

A partir da Lei 11.232/2005 a liquidação de sentença no processo comum se aproximou do processo do trabalho, transformando a decisão proferida na liquidação em interlocutória. Apesar do exposto, houve a criação do incidente de “impugnação”.

Como comenta Francisco de Antonio Oliveira5, a referida reforma foi tímida e em lugar do incidente de impugnação era preferível o uso dos embargos à execução e a possibilidade de apelação. A modificação poderia ter agilizado o processo executório, determinando a irrecorribilidade das decisões interlocutórias, com a possibilidade de revisão da matéria em futuro recurso de apelação.

Francisco Antonio Oliveira critica a forma como vem sendo adotada a legislação subsidiária, afirmando que não se pode simplesmente “civilizar” o processo do trabalho, em razão de ainda ser um processo mais célere, com as suas peculiaridades.6

O Tribunal Superior do Trabalho reiteradamente afastou a aplicação da multa do art. 475-J do CPC ao processo do trabalho, sob os seguintes fundamentos:

5 OLIVEIRA, Francisco Antonio. Execução na Justiça do Trabalho, 6ª ed., 2007, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 52.

6 OLIVEIRA, Francisco Antonio. Execução na Justiça do Trabalho, 6ª ed., 2007, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, p. 53.

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I – Agravo de Instrumento. Execução. Inaplicabilidade do art. 475-J do CPC ao processo do trabalho. Ante a possível violação ao art. 5º, inciso LIV, da Constituição da República, dá-se provimento ao Agravo de Instrumento para determinar o processamento do apelo denegado. II – Recurso de revista. Execução. Inaplicabilidade do art. 475-J do CPC ao processo do trabalho. 1. Segundo a unânime doutrina e jurisprudência, são dois os requisitos para a aplicação da norma processual comum ao processo do trabalho: i) ausência de disposição na CLT a exigir o esforço de integração da norma pelo intérprete; ii) compatibilidade da norma supletiva com os princípios do processo do trabalho. 2. A ausência não se confunde com a diversidade de tratamento: enquanto na primeira não é identificável qualquer efeito jurídico a certo fato a autorizar a integração do direito pela norma supletiva na segunda se verifica que um mesmo fato gera distintos efeitos jurídicos, independente da extensão conferida à eficácia. 3. O fato juridicizado pelo art. 475-J do CPC não-pagamento espontâneo da quantia advinda de condenação judicial possui disciplina própria no âmbito do processo do trabalho (art. 883 da CLT), não havendo falar em aplicação da norma processual comum ao processo do trabalho. 4. A fixação de penalidade não pertinente ao Processo do Trabalho importa em ofensa ao devido processo legal, nos termos do art. 5º, inciso LIV, da Constituição da República. Recurso de Revista conhecido e provido. (TST 3ª T. – número único RR – 765/2003-008-13-41. Relª. Min. Maria Cristina I.

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Peduzzi – DJ 22.2.2008).

Recurso de revista. Multa do art. 475-J do CPC. Incompatibilidade com o processo do trabalho. Regra própria com prazo reduzido. Medida coercitiva no processo do trabalho diferenciada do processo civil. O art. 475-J do CPC determina que o devedor que, no prazo de quinze dias, não tiver efetuado o pagamento da dívida, tenha acrescida multa de 10% sobre o valor da execução e, a requerimento do credor, mandado de penhora e avaliação. A decisão que determina a incidência de multa do art. 475-J do CPC, em processo trabalhista, viola o art. 889 da CLT, na medida em que a aplicação do processo civil, subsidiariamente, apenas é possível quando houver omissão na CLT, seguindo, primeiramente, a linha traçada pela Lei de Execução Fiscal, para apenas após fazer incidir o CPC. Ainda assim, deve ser compatível a regra contida no processo civil com a norma trabalhista, nos termos do art. 769 da CLT, o que não ocorre no caso de cominação de multa no prazo de quinze dias, quando o art. 880 da CLT determina a execução em 48 horas, sob pena de penhora, não de multa. Recurso de revista conhecido e provido para afastar a multa do art. 475-J do CPC (TST número único RR 668-2006-005-13-40 – DJ 28.3.2008 – Acórdão 6ª T. – Rel. Min Aloysio Corrêa da Veiga).

Inaplicabilidade do art. 475-J do CPC ao processo do trabalho – Existência de regra própria no processo trabalhista. 1. O art. 475-J do CPC dispõe que o não pagamento

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pelo devedor em 15 dias de quantia certa ou já fixada em liquidação a que tenha sido condenado gera a aplicação de multa de 10% sobre o valor da condenação e, a pedido do credor, posterior execução forçada com penhora. 2. A referida inovação do Processo Civil, introduzida pela Lei n. 11.232/05, não se aplica ao processo do trabalho, já que tem regramento próprio (arts. 880 e seguintes da CLT) e a nova sistemática do processo comum não é compatível com aquela existente no processo do trabalho, onde o prazo de pagamento ou penhora é apenas 48 horas. Assim, inexiste omissão justificadora da aplicação subsidiária do Processo Civil, nos termos do art. 769 da CLT, não havendo como pinçar do dispositivo apenas a multa, aplicando, no mais, a sistemática processual trabalhista. 3. Cumpre destacar que, nos termos do art. 889 da CLT, a norma subsidiária para a execução trabalhista é a Lei n. 6.830/80 (Lei da Execução Fiscal), pois os créditos trabalhistas e fiscais têm a mesma natureza de créditos privilegiados em relação aos demais créditos. Somente a ausência de norma específica nos dois diplomas anteriores, o processo civil passa a ser fonte informadora da execução trabalhista, naqueles procedimentos compatíveis com o processo do trabalho (art. 769 da CLT). 4. Nesse contexto, merece reforma o acórdão recorrido, para que seja excluída da condenação a aplicação do disposto no art. 475-J do CPC. Recurso de revista parcialmente conhecido e provido. (TST RR – 2/2007-038-03-00.0, julg. 14.5.2008, Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho, 7ª T., DJ 23.5.2008).

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Apesar do exposto, o tema tem sido freqüentemente discutido na doutrina, existindo diversos artigos publicados em defesa da compatibilidade do art. 475-J do CPC com o processo do trabalho, inclusive Acórdãos dos Tribunais Regionais do Trabalho e do próprio TST, como no julgamento, por maioria, do RR - 135800-87.2006.5.13.0006, pela primeira Turma7.

Favoravelmente à referida compatibilidade, posicionam-se Mauro Schiavi (Novas reflexões sobre a aplicação do art. 475-J do CPC ao processo do trabalho à luz da recente jurisprudência do TST – Revista LTr 72-03/271, março/2008 e Cumprimento da sentença trabalhista: imposição de multa para a obrigação de pagar. CLT, CPC ou ambos? - Revista LTr 74-03/301, março/2010) e Marcelo Rodrigues Prata (A multa do art. 475-J do CPC e sua aplicabilidade no processo trabalhista – Revista LTr 72-07/795, julho/2008), dentre outros.

Além da celeridade, outro argumento utilizado pelos defensores da aplicação da multa em referência no processo do trabalho é o de que a sua natureza seria coercitiva e não sancionatória. Nesse sentido Marcelo Rodrigues Prata, no artigo citado acima, com apoio na lição de Cássio Scarpinella Bueno. O fundamento básico exposto é o de que o pagamento espontâneo é etapa precedente à execução.

O mencionado autor assevera que na própria sentença deve constar a aplicação da multa, no prazo de 15 dias e após o trânsito em julgado da sentença, o que, no meu entender, não confere qualquer celeridade ao processo trabalhista, uma vez que mesmo antes do trânsito em julgado pode ter início a execução provisória e se após citado o executado não pagar ou garantir a execução, em 48 (quarenta e oito) horas, seguir-se-á a penhora.

No caso de recurso para a Instância Superior, Marcelo Rodrigues Prata defende que somente após a baixa dos autos à Vara de origem e da intimação do devedor, depois do trânsito em julgado, incidirá a multa de 10% prevista no art. 475-J do CPC.

No mesmo sentido se posiciona Mauro Schiavi e, no caso de sentença ilíquida, o autor defende que o prazo terá início após a intimação da homologação dos cálculos, citando as lições de Júlio

7 Relator Luiz Philippe Vieira de Melo Filho, publ. DEJT 04/12/2009.

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César Bebber e de Luciano Athaíde Chaves. Importante aqui fazer referência ao entendimento expresso

no julgamento proferido pelo Tribunal Superior do Trabalho, no processo RR 314/2005-023-03-41.0, de 17.9.2008, onde o Relator, o Min. Maurício Godinho Delgado, defende que a multa do art. 475-J do CPC teria incidência se após citado o executado não pagasse a dívida, seja através de depósito espontâneo ou por bloqueio através do BANCEN JUD. Nesse contexto, restou evidenciando no referido entendimento que a primeira providência a ser adotada pelo Juízo, quando do não pagamento da dívida pelo executado, é a determinação do bloqueio bancário, o que, no meu entender, vai de encontro à imposição da multa, como já foi exposto no presente trabalho.

No dia 01.06.2010, o STJ também se manifestou favorável à aplicação da multa do art. 475-J do CPC no processo trabalhista, no julgamento do Recurso Especial 1.111.686 - RN (2009/0041464-3), que teve como Relator o Ministro Sidnei Beneti.

Os fundamentos básicos expostos no referido julgamento foram os seguintes:

(...) No processo Civil, o fato gerador da multa prevista no artigo 475-J, se é que assim podemos chamar o inadimplemento espontâneo do devedor, situa-se em um momento temporal que antecede o início da fase de cumprimento da sentença, a qual, em rigor, apenas se inaugurada com o requerimento do credor, na forma do artigo 475-B. Bem por isso é preciso reconhecer que a multa prevista no artigo 475-J não constitui um instrumento de coerção inerente ao sistema unificado de processo adotado pelo CPC. Imagine-se que, no processo civil, ainda persistisse o processo de execução autônomo. Nesse caso estaria inviabilizada uma inovação legislativa semelhante àquela que se extrai do indigitado dispositivo para estimular o cumprimento voluntário da obrigação

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consignada na sentença condenatória? A resposta, naturalmente, só pode ser negativa. Do contrário ter-se-ia de admitir que outras medidas de coerção indireta também seriam incompatíveis com o processo autônomo de execução.

Na hipótese em testi lha, a incompatibilidade não ocorre, porque o fato gerador da multa em questão não está umbilicalmente ligado à fase de cumprimento de sentença ou ao modelo unificado de processo adotado pelo Código de Processo Civil. O instituto em questão é instrumento de coerção, e não de execução. Nesse sentido basta apenas dizer que o comportamento omissivo do devedor que dá ensejo à sanção destacada antecede o próprio início da fase de cumprimento de sentença. Não é possível afirmar, assim, que o artigo 475-J do Código de Processo Civil encerra um instrumento próprio da fase de cumprimento de sentença que existe apenas no Código de Processo Civil. Não se vislumbra a sustentada incompatibilidade sistêmica entre ele e o modelo de execução trabalhista, lastreado na existência de um processo autônomo.

(...) Para alguns, a penhora prevista no artigo 880 da CLT na hipótese de o devedor não pagar nem garantir a execução, já seria a sanção cominada pela lei trabalhista para o inadimplemento voluntário. Nesses termos não haveria que se autorizar a aplicação de um instrumento previsto no CPC para situação equiparada. Com a devida vênia dos que pensam assim, tem-se que a penhora de bens, no processo de

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execução (assim como sucede em uma fase de cumprimento de sentença), com vistas à satisfação do crédito reconhecido na sentença condenatória, não pode ser considerada uma sanção imposta ao executado. A penhora e posterior alienação dos bens que integram o patrimônio do devedor para a satisfação da dívida reconhecida na sentença reflete, pura e simplesmente, o caráter substitutivo da Jurisdição, isto é, o poder de império do Estado que, substituindo-se à vontade e à atuação concreta das partes, dá solução à lide e realiza, no mundo dos fatos a solução preconizada por ele como devida. Assim é que a penhora e posterior expropriação, em um processo de execução, constitui consectário natural do inadimplemento voluntário do devedor. Não representa, em absoluto, uma sanção ou um exortamento extra ao cumprimento da obrigação. Da leitura dos dispositivos legais antes transcritos não se extrai que a CLT tenha, de alguma forma, previsto uma medida de coerção indireta semelhante àquela insculpida no artigo 475-J do Código de Processo Civil. Tampouco se pode concluir que ela tenha, de alguma forma, excluído a possibilidade de aplicação, por analogia, do referido instrumento. Não se identifica no tratamento dispensado pelo legislador aquilo que em doutrina se costuma designar de “silêncio eloquente”. Aliás imaginar que tal tenha acontecido é mesmo ignorar os princípios que informam o processo do trabalho e que, naturalmente, emergem do próprio direito positivo. (...)”

Consoante se vê no Acórdão em comento, a coerção foi defendida como medida de celeridade e em etapa anterior à fase

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de cumprimento da sentença, sem qualquer manifestação acerca do prazo previsto para o cumprimento espontâneo da decisão no CPC ser superior à previsão de pagamento ou de garantia descrita na CLT, sobre o início da execução de ofício pelo juiz (e não com o requerimento do credor como mencionado nos fundamentos do voto) com a determinação de bloqueio de crédito ou acerca da inexistência de violação ao devido processo legal.

3. CONCLUSÃO

A aplicação da multa do art. 475-J do CPC é incompatível com o processo do trabalho. A CLT não é omissa quanto à matéria e o prazo concedido no referido diploma legal é mais exíguo. A execução no processo trabalhista pode ser iniciada de ofício e a sanção pelo não cumprimento espontâneo na sentença é a execução imediata, inclusive com determinação de bloqueio das contas bancárias do executado. A celeridade deve ser observada com a prolação de sentenças líquidas pelo Juiz do Trabalho e com a execução de ofício, através de bloqueio de numerário pelo BACEN JUD. A imposição de penalidade não prevista na CLT importa em ofensa ao devido processo legal e traduz exceção, considerando que, por ausência de omissão na CLT e absoluta incompatibilidade, é impossível a adoção integral do procedimento previsto no CPC na execução trabalhista.

4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LEITE , Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho, 4ª ed., São Paulo: LTr, 2006.

MARINONI, Luiz Guilherme e ARENHART, Sérgio Cruz. Curso de processo civil, vol. 3, Execução, 2ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.

OLIVEIRA, Francisco Antonio de. Execução na justiça do trabalho, 6ª ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.

PRATA, Marcelo Rodrigues. A multa do art. 475-J do CPC e sua aplicabilidade no processo trabalhista, Revista LTr 72-07/795, julho/2008.

SCHIAVI, Mauro. Novas reflexões sobre a aplicação do art. 475-J do CPC ao processo do trabalho à luz da recente jurisprudência do TST, Revista LTr 72-03/271, março/2008.

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_______________. Cumprimento da sentença trabalhista: imposição de multa para a obrigação de pagar. CLT, CPC ou ambos? Revista LTr 74-03/301, março/2010.

TEIXEIRA FILHO, Manoel Antonio. Processo do Trabalho. Embargos à execução ou impugnação à sentença? (A propósito do art. 475-J, do CPC), Revista LTR 70-10/1180.

_______. Curso de Direito Processual do Trabalho, vol. III, Processo de Execução, São Paulo: LTr, 2009.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. D.O.U. de 05/10/1988.

______. Lei n. 6.830/80, de 22 de setembro de 1980. Dispõe sobre a cobrança judicial da dívida ativa da fazenda pública e dá outras providências. D.O.U de 24/09/80.

______. Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. D.O.U. de 17/01/1973.

______. Decreto-lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. D.O.U. de 09/08/1943.

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AINDA O CONTRATO DEEXPERIÊNCIA: SUA CESSAÇÃO À LUZ DOS PRINCÍPIOS DA CON-SERVAÇÃO DOS CONTRATOS E DA BOA-FÉ

Jólia Lucena da Rocha MeloJuíza do TRT da 21ª Região, mestranda em Direito do Trabalho e Seguridade Social pela Faculdade de Direito da USP (FADUSP)

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1. Introdução;2. Um breve retorno à classificação dos contratos trabalhistas;2.1 Os contratos de experiência: significado, natureza jurídica

e peculiaridade;3. Os contratos de experiência e a “mutualidade de análises”;4. Ainda a questão da escolha;5. “Diferença” entre contratos de experiência e demais

contratos a prazo determinado e o princípio da boa fé: duas questões fulcrais;

6. Considerações finais;7. Referências bibliográficas.

Resumo: O texto tem por fito abordar controvérsias sobre a contratação experimental no direito trabalhista, a partir dos princípios da conservação contratual e boa-fé, sobretudo na adoção de motivação quando das dispensas findo período experimental. Pela natureza jurídica deste contrato busca-se diferenciar os demais contratos determinados com o elemento essencial atinente àquele: prova de aptidões técnicas e comportamento do empregado. Ademais, sustenta-se ausência de proteção neste tipo, pois pautado em falsa democratização

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e igualdade formal. Tal constatação, contudo, só é válida se ultrapassar o discurso e ocupar prática positiva nos julgados, na consideração de que o ser humano não é mercadoria.

Palavras-chave: Experiência – cessação – motivação – boa-fé – conservação.

1. Introdução

Centrado que o Direito do Trabalho se faz no princípio da continuidade, é natural que se confira um maior zelo quando do trato das questões que se voltam aos contratos de trabalho a prazo indeterminado, o que se observa no tocante à maior segurança que se confere em face das dispensas unilaterais pela própria Organização Internacional do Trabalho (Convenção nº 158) e do reflexo deste tratamento diferenciado também no seio do ordenamento jurídico pátrio.

A literatura jurídica também não dissente do anotado. Os escritos sobre a cessação dos contratos de trabalho a prazo indeterminado superam em número considerável o espaço em que se encarta o fenômeno de cessação dos contratos a prazo determinado.

É que imaginados em seu ideal, os contratos a prazo determinado têm a cessação efetivada a partir da satisfação das condições inicialmente acordadas: atingimento do prazo, feitura da obra ou da tarefa. Em outras palavras, a cessação idealizada ocorre de forma normal.

Nesse sentido, anota Délio Maranhão que enquanto o contrato a prazo determinado, excepcional, se extingue de modo normal, o contrato a prazo indeterminado, “tem um sentido normal, que lhe é próprio, de duração, de permanência. Sua execução é continuada. Seus objetivos não têm limitação temporal, perduram. A extinção, portanto, do contrato sem prazo é sempre anormal [...]”1.

E não se encontra de todo equivocada a literatura jurídica neste tocante, até porque em não se perfazendo o contrato a prazo

1 SÜSSEKIND, Arnaldo; MARANHÃO, Délio; VIANNA, Segadas; TEIXEIRA FILHO, João de Lima. Instituições de direito do trabalho, vol. 1. 19ª ed. São Paulo: LTr, 2000, p. 562.

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determinado, modo geral, da forma tal qual acertada quanto ao seu término, o princípio da conservação dos contratos, exercendo o seu papel, conduz a transformação do contrato a prazo determinado em contrato a prazo indeterminado2.

Nesta esteira, entretanto, não se pode olvidar a realidade um tanto distinta aos contratos de experiência, haja vista apesar de conduzidos sob a égide de contratos a prazo determinado, possuírem a característica peculiar de modificação de sua classificação a partir de dois condicionantes que devem agir simultaneamente: (não) atingimento das expectativas e atingimento do prazo experimental.

Entretanto, além de não ter sido esta a dicção do direito positivo aplicável à matéria, a atual situação globalizada vem fazendo deste tipo contratual campo cada vez mais fértil a precarização dos contratos de trabalho3.

É mais uma vez nesta arena dos embates do capital e trabalho que se firma a necessidade de uma atuação mais enérgica do Direito do Trabalho em sua função precípua de equilibrar tal relacionamento.

2. Um breve retorno à classificação dos con-tratos trabalhistas

O princípio da continuidade dos contratos trabalhistas é inserto como propiciador das classificações diferenciadas dos contratos. Na lição de Amauri Mascaro Nascimento:

[...] o direito do trabalho conhece contratos por tempo indeterminado e contratos a prazo certo, e a diferença entre ambos está na preexistência ou não de um termo final ajustado entre as partes

2 Cf. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de direito do trabalho. 22ª ed. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 613-622.

3 Cf. ROCHA, Jólia Lucena da. Precarização dos Direitos Trabalhistas: análise critica da legislação pró-capital. In Revista da ESMAT 13, João Pessoa: ano 2, n° 2, p. 392-428, novembro 2009. ISSN 1983-3830.

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já por ocasião da formação do contrato. Assim, quando esse termo é estabelecido pelos contratantes, a relação jurídica é a prazo certo, e em caso contrário é a tempo indeterminado4.

Pela via do princípio da continuidade, o contrato por tempo indeterminado se estabelece como regra nos ordenamentos jurídicos trabalhistas em geral, sendo, inclusive, o tipo promovido pela Organização Internacional do Trabalho, consoante se observa no teor da sua Recomendação nº 166, no sentido de limitar a previsão de contratos a prazo determinado aos casos em que o ajuste seja motivado pela essência do trabalho ou pelas condições a serem realizadas ou em razão dos interesses do trabalhador.

Neste sentido, centra-se o princípio da continuidade como o primeiro limite imposto à contratação com prazo final estabelecido.

Entretanto, não poderia a Organização Internacional do Trabalho recomendar, de forma absoluta, a adoção do princípio da continuidade dos contratos trabalhistas, haja vista a necessária flexibilidade que deve rondar as normas internacionais, sob pena dos Estados não se inclinarem ao seu cumprimento, sobretudo, diante da vertente capitalista excludente que cada vez mais se robustece.

Deste modo, as exceções ao princípio da continuidade se revestem através dos contratos a prazo determinado, os quais se identificam, segundo o ordenamento jurídico pátrio, em: a) contrato a prazo determinado previsto pela CLT – cuja vigência dependa de termo prefixado ou da execução de serviços especificados ou ainda da realização de certo acontecimento suscetível de previsão aproximada, desde que: o serviço cuja natureza ou transitoriedade justifique a predeterminação do prazo, as atividades empresariais sejam de caráter transitório ou se trate de contrato de experiência (§§ 1º e 2º do art. 433 da CLT); b) contrato a prazo determinado previsto pela Lei nº 9.601/1998; c) contrato de trabalho temporário (Lei nº 6.019/1974); e, d) contrato de trabalho por obra certa (Lei nº 2.959/1956).

Preconizou o legislador que todos guardam em identidade o conhecimento, pelas partes, do termo final do contrato (exato ou

4 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Op. cit., p. 613.

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aproximado) já no momento de seu limiar. Contudo, no tocante aos contratos de experiência, ao assim enquadrá-los, procedeu o legislador a uma presunção maléfica de inaptidão do trabalhador, conforme se verifica sequencialmente.

2.1. Os contratos de experiência: Significado, natureza jurídica e particularidade

São os contratos de experiência, como já se fez anotar, consubstanciados, pela legislação, como tipo de contrato a prazo determinado pela legislação, consoante se verifica da dicção do § 1º do art. 443 da CLT, fato que leva grande parte da literatura jurídica a tomá-los como contrato de natureza especial por distinto dos demais contratos a prazo determinado. Neste sentido se posiciona, exemplificativamente, Alice Monteiro de Barros5.

Outras teorias, além da referente ao contrato especial, são aventadas quando o assunto é a natureza jurídica dos contratos de experiência, a exemplo da teoria do contrato preliminar, da teoria do contrato pendente de condição resolutiva (prazo e avaliação negativa) e a teoria unitária dos contratos.

Pela teoria do contrato preliminar, o contrato de experiência se perfaria em contrato anterior a um contrato principal de emprego que seria realizado posteriormente, o que não coaduna com a realidade, tendo em vista que pela técnica de conservação dos contratos (com a transmudação de contrato de experiência em contrato a prazo indeterminado, de forma única, sem prejuízo do período anterior).

Contrapondo-se diretamente à teoria do contrato preliminar apresenta-se a teoria unitária dos contratos, utilizando-se justamente em sua argumentação da crítica lançada a teoria anteriormente anotada. Prega-se, nesta, que o essencial já se encontra no período de experiência6.

Por fim, há a teoria que vê o contrato de experiência como contrato de emprego pendente de condição resolutiva, em caso da

5 Cf. BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2005, p. 455-456.

6 BARROS, Alice Monteiro de. Op. cit., p. 456.

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experiência se conferir de modo insatisfatório, cuja defesa se encontra em Octavio Bueno Magano7, o qual nos filiamos.

É que o contrato de experiência, além de se diferençar dos contratos a prazo indeterminado, diferencia-se também dos demais tipos de contrato a prazo determinado justamente em um ponto essencial.

Enquanto os demais contratos a prazo determinado se enquadram na determinação exata ou aproximada do seu término, os contratos de experiência têm por essência a potencial determinação em caso de insucesso da experiência. Esta potencialidade não existe essencialmente nos demais contratos a prazo determinado, e é responsável por fazer este diferenciado tipo contratual oscilar entre os contratos a prazo determinado e a prazo indeterminado, conforme preconiza o princípio da conservação dos contratos.

É bem verdade que os demais contratos a prazo determinado podem transmutar-se em contratos a prazo indeterminado em caso de ilicitudes, o que se observa no não cumprimento do termo final especificado inicialmente. Entretanto, o que os diferencia do contrato de experiência é que neste o princípio da conservação não atua ante a ilicitude, como faz nos anteriores, mas decorre de ato efetivamente lícito e desejável o sucesso da experiência.

Assim sendo, consubstancia-se o contrato de experiência como um contrato especial distinto dos demais contratos a prazo determinado pelo seu traço marcante da tão só potencialidade de termo final em data prevista inicialmente, marca esta que se imprime pela essência experimental firmada em seu trato.

3. Os contratos de experiência e “a mutualida-de de análises”

Em meio ao princípio da continuidade preconizado no Direito do Trabalho, em sua função protetiva em relação ao empregado, é de se mencionar que os contratos de experiência se apresentam como meras exceções, justificadas pela essência experimental, devendo ser observado da forma mais consentânea possível com a proteção

7 Cf. MAGANO, Octavio Bueno. Contrato de prazo determinado. São Paulo: Saraiva: 1984, p. 51.

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do empregado, pelo que se constata que se costuma assentar que a experiência é mútua: do empregado e do empregador, vez que de outra forma fosse (com experiência apenas a favor do empregador) razão não haveria para a sua concepção diferenciada.

Não são raras, para não dizer excessivas, as abordagens conceituais dos contratos de experiência que cominam a estes uma feição de democracia econômico-trabalhista, na qual tanto o empregador quanto o empregado se examinam, o primeiro quanto a aptidões técnicas e comportamento do empregado e este quanto às condições de trabalho8.

Contudo, na relação assimétrica ainda hoje apresentada no enfoque trabalhista, não se verifica, no plano real, a mutualidade quanto à mencionada experiência9.

No cotidiano, nunca presenciei fato de que tenha surgido do empregado a intenção primeira de ser contratado experimentalmente e não à guisa de contrato a prazo indeterminado. Em que a “opção” pelo contrato de experiência beneficiaria ao empregado? O que o levaria a uma tendência pelo tipo diferenciado que o conduziria, certamente, ao desemprego, em razão de no máximo três meses?

Seria a resposta o fato de que o trabalhador receberia, ao final dos três meses, em não desejando permanecer, o 13º salário proporcional que não receberia em caso de pedido de demissão no contrato a prazo indeterminado e o cumprimento que teria que prestar quanto ao aviso prévio?

Não parece ser a resposta que mais coaduna com a realidade, eis que dificilmente um trabalhador ingressaria numa relação de emprego já pensando em pedir demissão e contabilizando o que seria melhor: se pôr fim a relação em um contrato de experiência pelo seu simples atingimento de termo final ou se pôr fim através do pedido de demissão num contrato a prazo indeterminado.

A situação do empregado, de uma forma geral, será a mesma em desistindo da continuação de um contrato de experiência

8 Alice Monteiro de Barros, a exemplo, afirma: “O contrato de experiência é modalidade de ajuste a termo, de curta duração, que propicia às partes um avaliação subjetiva recíproca [...]”. (sem negritos no original). (BARROS, Alice Monteiro de. Op. cit., p. 455).

9 Cf. ALMEIDA, Milton Vasques Thibau de. O contrato de experiência. In Curso de Direito do Trabalho – Estudos em memória de Célio Goyatá. Coord. Alice Monteiro de Barros. v. 1. 2ª ed. São Paulo: LTr, 1994.

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ou de um contrato a prazo indeterminado: deixará de receber os títulos autorizadores da dispensa pelo empregador. De outra mão, quando é o empregador que apresenta sua vontade de resilição, num contrato a prazo indeterminado, terá que arcar com o pagamento dos títulos autorizadores de mencionada resilição, ao passo que num contrato de experiência, a própria legislação já traduz a vontade do empregador como permitida pelo Estado, sem necessidade de qualquer outra verba autorizadora.

A matemática de custos, neste caso, é mais afeta à empresa, a qual parece contabilizar o não pagamento de aviso prévio e o não depósito da multa fundiária, caso simplesmente não queira que perdure a relação com aquele trabalhador.

Ainda neste âmbito de assimetria da relação empregatícia, há de se anotar que o empregado, ao se submeter a um contrato nessas condições, por si só já precarizantes, de saber que será testado por certo período e que poderá ser descartado ao fim deste, certamente não se envaidece da sua suposta opção de poder resilir o contrato caso “as condições de trabalho” não sejam consentâneas ao ansiado.

A resilição por parte do empregado existe a todo e qualquer momento, qualquer que seja o tipo de contrato. Deste modo, não se pode, à guisa de demonstrar benefício ao trabalhador, aduzir que este teria, no prazo do contrato de experiência, tempo para analisar as condições de trabalho. Este tempo ele tem não só no contrato de experiência, mas em todo o decorrer de qualquer tipo de contrato.

4. Ainda a questão da escolha

A preocupação trazida pelas dispensas sem justa causa e arbitrárias, propiciadas pelos empregadores no contrato a prazo indeterminado, insere-se como uma constante, não só no direito pátrio, mas em todos os ordenamentos jurídicos, uma vez que tais dispensas representam a base potencializadora da sujeição do empregado, com vilipêndio da dignidade da pessoa humana.

É que em se aceitar a resilição unilateral em um ordenamento jurídico, sem quaisquer motivações, pelo empregador, agrava-se a desigualdade entre as partes do contrato de emprego. O empregado se encontra ainda mais vulnerável por, a qualquer tempo,

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poder adquirir o status de desempregado.Nos contratos de experiência não há qualquer diferença

nesta perspectiva de vulnerabilidade. Por outro lado, em verdade, a submissão de um empregado a um contrato de experiência, apresentado nas condições anteriormente anotadas, se confere em virtude da sua própria situação de desamparo.

Não se trata de uma questão de escolha, pois o referido empregado não tem quaisquer condições de nada escolher: ou se emprega, precariamente, e tenta a sorte de uma continuidade do vínculo ou continua ao alvedrio do acaso na busca de outras e outras “oportunidades” de emprego.

Em sintonia perfeita à sorte dos trabalhadores, Amartya Sen discorre sobre a pobreza como privação de capacidades ao invés de meramente critério tradicional de identificação de pobreza. E nesse contexto anota:

Há provas abundantes de que o desemprego tem efeitos abrangentes além da perda da renda, como o dano psicológico, perda da motivação para o trabalho, perda da habilidade e autoconfiança, aumento de doenças e morbidez (e até mesmo taxas de mortalidade), perturbação das relações familiares e da vida social, intensificação da exclusão social e acentuação de tensões raciais e das assimetrias entre os sexos10.

Figurado referido quadro, infrutífero questionar que

opção tem o trabalhador entre escolher por um precário contrato de experiência e padecer no desemprego.

Memorável a lição de Márcio Túlio Viana: “enquanto a empresa pode escolher um empregado entre mil, o empregado só encontra uma empresa, entre mil, que lhe oferece um posto de

10 SEN, Amartya. Desenvolvimento como liberdade. Tradução Laura Teixeira Motta. São Paulo: Companhia das Letras, 2000, p. 117.

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trabalho. Assim, é ele, e não ela, que está sob sujeição”.11

Em que pese os entendimentos contrários de parte de expositores da literatura jurídica, o contrato de experiência se presta tão somente ao empregador que examinará a aptidão técnica e o comportamento do empregado. No que diz respeito ao possível exame de condições de trabalho a ser feito pelo empregado, resta sufocado diante da situação de submissão e de necessidade premente com a qual se depara o trabalhador.

Neste sentido, questiona-se: quantas vezes se teve notícia de termos de ajuste de conduta, ações civis públicas, dentre outras, concernentes ao meio ambiente laboral? Esse questionamento simplório já é o suficiente para observar o esmaecer de qualquer exame de condições de trabalho por força do recém-contratado a título precário. No mais, em desistindo o trabalhador da continuidade com um contrato a prazo indeterminado em virtude das condições de trabalho, fato este que dificilmente se concretiza, somente o próprio empregado será prejudicado ao continuar na cadeia do desemprego, apenas, mais uma vez, fazendo atingir os objetivos do empregador quanto ao menor custo na produção.

Urge, assim, resgatarmos o Direito do Trabalho, em sua essência, e pensarmos tais problemáticas mais pelo lado do ser humano e de sua exclusão, via técnicas como estas do contrato de experiência como atualmente tomado, que propriamente pelas compensações pecuniárias sempre presentes.

Não se deve aceitar o argumento de que através deste tipo de contrato o empregado examina as condições de trabalho quando este não está em posição de fazê-lo. Sem possibilidade de escolher, não há de se falar em escolhas válidas. Trata-se, mais uma vez, de um artifício de falsa democracia e igualdade formal, em que na realidade apenas a força do capital serve.

5. “Diferença” entre contratos de experiência e demais contratos a prazo determinado e o

11 VIANA, Márcio Túlio. Acesso ao emprego e atestado de bons antecedentes. 25.09.2006. Disponível em: <http: //www.amatra23.org.br/artigos/artigo.asp?cod=3>. Acesso em 02.02.2009.

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princípio da boa-fé: duas questões fulcrais

Ultrapassando as questões intricadas acerca da experiência como objeto promotor da escolha do empregado na continuidade da relação empregatícia, passa-se ao exame de dois espeques basilares quanto a tais contratos: sua análise sob o prisma da conservação dos contratos e da boa-fé.

O contrato de experiência, atualmente, longe de se prestar a seu papel primário, é instrumento de aniquilamento de direitos trabalhistas, uma vez que se desfaz como mero contrato a prazo determinado, com o diferencial de se dar por um tempo de no máximo noventa dias, não poder ser renovado nos mesmos termos e, observe-se, poder ser produzido em toda e qualquer situação laboral12.

Servisse a seu propósito idealizado, razão não haveria a criticar a possibilidade dos contratos de experiência poderem se prestar a todo e qualquer tipo de atividade. Contudo, o legislador parece ter apenas se preocupado com a motivação no termo a quo do pacto, em outras palavras, apenas exigiu a motivação para o início do contrato de experiência, facilitando o empresariado a proceder ao exame preliminar das atividades de um empregado. De forma intrigante, nada se buscou com o fito de impedir seu uso indiscriminado na análise do termo final do pacto, passando-se a entender, em mais uma séria constatação de concretização das vontades capitalistas, que o simples exaurimento do termo, diga-se o mero perpassar do prazo determinado sem qualquer justificativa, sem continuação de labor por parte do empregado, implica dizer da não satisfação com os serviços deste.

Não se tem a exigência de qualquer constatação da não serventia da mão-de-obra do indivíduo contratado a título de experiência. Usando mão de seu histórico poder de mando, o empregador simplesmente descarta o empregado depois de passado o

12 Distingue-se nesse ponto dos demais contratos a prazo determinado, os quais exigem alguma particular necessidade de ser o contrato assim firmado, uma vez que a imperiosidade jurídica é dos contratos contínuos. Observe-se ser a orientação da jurisprudência majoritária do TST a indistinção das atividades submetidas a este tipo de pacto: “Contrato de experiência. Caracterização. O contrato de experiência não impõe que a atividade profissional a ser desenvolvida seja de natureza técnica, especializada. Recurso desprovido” (TST – E-RR-4221/90.8 – Ac. SDI – 1462/92. Rel.: Min. José Calixto – DJU 21.08.1990, p. 12.901. FERRARI, Irany; MARTINS, Melchíades Rodrigues. Julgados trabalhistas selecionados. Vol. II. São Paulo: LTr, 1993, p. 203).

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prazo de experiência, ao mesmo passo que sem qualquer cerimônia já passa a um novo contrato de experiência com um segundo empregado, que fatalmente, no mais das vezes, terá repetido o destino do anterior. Temos, então, mais uma técnica capitalista de redução de custos e aumento de lucros, uma vez que o recém-contratado dará sempre mais que o seu melhor, nos curtos dias que o aguardam, com o sonho de sua atividade ser bem conceituada no contrato experimental e se vê ingressando nos quadros empresariais.

É neste ponto que se permeia a questão da boa-fé no contrato de experiência, enfocando-se tanto na seara coletiva, como exemplificado, quanto em seara individual.

Além da ausência de normativa específica condizente ao contrato de experiência, de forma a salvaguardar o trabalhador submetido a tal condição de incerteza (pois o melhor que fizer não será ainda suficiente, já que as razões são desconhecidas), se olvida da utilização do mecanismo tão claro a serviço da dignidade da pessoa humana e demais direitos fundamentais: o princípio da boa-fé objetiva, aplicado supletivamente ao direito do trabalho, por autorização expressa da CLT – art. 8º, parágrafo único.

Entrelaça-se o princípio da boa-fé com a questão de confiança, devendo se ter por certo que a boa-fé há de ser pressuposto essencial a todo o contrato, do início ao fim e, inclusive, nos períodos pré e pós-contratuais. Em lição de Menezes Cordeiro:

N a s s u a s m a n i f e s t a ç õ e s subjectiva e objectiva, a boa-fé está ligada à confiança: a primeira dá, desta, o momento essencial; a segunda confere-lhe a base juspositiva necessária quando, para tanto, falte uma disposição legal específica. Ambas, por fim, carreiam as razões sistemáticas que se realizam na confiança e justificam, explicando, a sua dignidade jurídica e cuja projecção transcende o campo civil13.

13 CORDEIRO, António Manuel da Rocha e Menezes. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2007, p. 1250.

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Nesse âmbito, a boa-fé deve perdurar do início ao fim do contrato, sobretudo, no que toca aos pontos centrais do pacto.

Assim, se no limiar do pacto de experiência tem-se por certo o objetivo contratual (aptidão técnica, comportamento e até mesmo, para quem insiste em acreditar, análise das condições de trabalho pelo empregado), ao final do prazo (e não do pacto), exigível se faz a observação do resultado: as condições de trabalho são satisfatórias? O empregado possui efetivamente aptidão técnica para o desempenho das atividades? Possui o empregado algum desvio de comportamento no que tange ao emprego?

Imprescindível assim, sob a ótica da boa-fé14, que o empregado seja informado qual dos requisitos necessários à continuação do pacto não foi implementado, sob pena de o arbítrio atuar.

Quem se submete a um exame, qualquer que seja, por óbvio quer saber não só do seu resultado, mas também como se chegou até mencionado resultado, seja para melhorar numa oportunidade futura em uma outra empresa, seja para ter a possibilidade de justificar eventual equívoco. Em não sendo assim, com pauta na dignidade da pessoa humana, por não poder ser o homem tratado como mercadoria e pela boa-fé objetiva que deve circundar não apenas o início do pacto, há de se entender como abusiva a rescisão operada.

É que os contratos de experiência inspiram, para o trabalhador, a expectativa de continuidade em caso de êxito na experiência. Contudo, da forma como se está a fazer, se opera de forma legitimada pelas interpretações dissonantes ao ferimento de deveres de informação e, sobretudo, a fórmulas precarizantes da prestação do trabalho.

Em outras palavras, se a regra é a proteção mediante o princípio da continuidade, com contrato a prazo indeterminado, e o fim do Direito do Trabalho é primar pela dignidade do trabalhador: o contrato de experiência, nos moldes de desnecessidade de justificativa

14 Em interessante e inovadora abordagem, a 2.ª Turma do E. TRT da 9.ª Região dispôs em aresto: “À semelhança do que se dá nas tratativas preliminares, em que se reconhece a responsabilidade pré-contratual permeada pelo princípio da boa-fé, também no contrato de experiência têm as partes o dever de lealdade e a conseqüente responsabilidade da parte que, depois de suscitar na outra a justa expectativa de celebração de um certo negócio, volta atrás e desiste de consumar a avença”. (TRT-PR-ROPS 1.234/2002. julgado em 08.04.03. Rel. Juíza Marlene T. Fuverki Suguimatsu).

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resilitória, é verdadeiro instrumento de vilipêndio aos direitos trabalhistas, tanto na ordem material como na ordem psíquica, ao contar com uma verdadeira rejeição se declarada por parte do empregador, vez que tal pacto se presta a testar o empregado em sua aptidão técnica e seu comportamento.

O princípio da conservação dos contratos trabalhistas, até pelo seu teor de função social, é aplicável não apenas em relação aos contratos indeterminados, mas também em relação aos contratos a prazo determinado e, inclusive, quanto aos contratos de experiência, cada qual conforme os seus ditames.

A proteção à dispensa, àquela mesma preconizada com o intuito mor de salvaguarda a relação de emprego em seu âmago democrático, como pondera Antônio Álvares da Silva, vincula-se à noção de continuísmo, “sob o fundamento de que o posto de trabalho, o emprego, não é apenas o meio de subsistência do empregado, mas também um ponto de referência fundamental em sua vida, fator de equilíbrio psicológico e social”15.

Ora, não é porque o contrato já é de certo modo precarizado, vez que não a ele se aplica a idéia de continuidade em potencial aplicada aos contratos a prazo indeterminado, que deve ter afastada toda e qualquer proteção e a idéia de conservação contratual em seus moldes16.

Somente se faz possível identificar se houve ou não escorreita finalização do contrato de experiência, e se esta não se deu de modo fraudulento, se o motivo da não continuidade for exteriorizado pelo empregador.

A motivação, se por falta de aptidão técnica, se o comportamento não é consentâneo com o esperado, deve constar especificamente do momento do término do prazo de experiência, pois o tão só término deste não deve implicar, à luz dos princípios da boa-fé e da continuidade dos contratos, a cessação contratual. Serve, assim, a motivação deste ato como instrumento e pressuposto para a realização dos ditames do Direito do Trabalho em sua essência.

15 SILVA, Antônio Álvares da. Proteção contra a dispensa na nova Constituição. Belo Horizonte: Del Rey, 1991, p. 61.

16 Acerca da diferença do princípio da continuidade para o princípio de conservação dos contratos, cf. NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Op. cit., p. 613-622.

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6. Considerações finais

O trabalho não é mercadoria, como em felicidade apregoa o Tratado de Versalhes, muito embora, no mais das vezes, a legislação reproduza, disfarçadamente, os anseios capitalistas e, à guisa do positivismo cego, a magistratura também o faça, em reflexo.

Devem os magistrados, chamando a si a responsabilidade, e arraigados no espírito constitucional e clarividente de humanismo, resgatar a função precípua do Direito do Trabalho, onde o homem, por valer mais que o dinheiro, não pode ser descartado sem quaisquer justificativas.

O contrato de experiência, por si só, é um verdadeiro ato atentatório ao princípio da proteção. Adicionado de desnecessidade de motivação quando do término do prazo firmado, a potencialidade da precarização se concretiza, passando o empresariado a ter em suas mãos um instrumento legalizado de descarte do ser humano.

A motivação deve ser sempre exigida, inclusive ao final dos contratos de experiência. Afigura-se como instrumento hábil a verificação do princípio da boa-fé e da conservação dos contratos. Sem aquela, não tem o trabalhador confiança na sua possível continuidade empregatícia, no seu papel de ser humano e, obviamente, confiança no Judiciário.

Exigi-la, mais que vinculação a uma determinada linha de pensamento acerca de natureza jurídica de institutos, é inspirar um ato de confiança do trabalhador à magistratura, e, numa situação como a apresentada, quem sabe poderão destemidos, em face da ameaça, bradar que “ainda existem juízes” por aqui.

7. Referências bibliográficas

ALMEIDA, Milton Vasques Thibau de. O contrato de experiência. In Curso de Direito do Trabalho – Estudos em memória de Célio Goyatá. Coord. Alice Monteiro de Barros, vol. 1. 2ª ed. São Paulo: LTr, 1994.

BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. São Paulo: LTr, 2005.

CORDEIRO, António Manuel da Rocha e Menezes. Da boa-fé no direito civil. Coimbra: Almedina, 2007.

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LOS DERECHOS DE LOS TRABAJADORES AUTÓNOMOS A LA SEGURIDAD Y SALUD EN EL TRABAJO EN EL ESTATUTO ESPAÑOL DE LOS TRABAJADORES AUTÓNOMOS: ¿EFECTIVAMENTE UN PROGRESO?

Juliana Cunha CruzAdvogada, doutoranda em Direito do Trabalho e em Direitos humanos pela Universidade de Salamanca – Espanha.

5

Sumário:1. Consideraciones primeras;2. El ámbito subjetivo de aplicación de la LETA;2.1 Los trabajadores autónomos en general;2.2 Los trabajadores autónomos económicamente

dependientes;3. El derecho del trabajador autónomo a la seguridad y salud

en el trabajo;3.1 Panorama español anterior a la LETA3.2 Perspectiva de las normativas comunitarias;3.3 El enfoque dado por la LETA;4. Consideraciones finales – Bibliografía;6. Conclusões;7. Referências

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1. CONSIDERACIONES PRIMERAS

Como bien resalta el preámbulo de la Ley 20/2007 del Estatuto del Trabajo Autónomo (LETA)1, en el siglo XX la forma preponderante de trabajo era la dependiente y asalariada, ajena a “los frutos y a los riesgos de cualquier actividad emprendedora”, así el trabajo autónomo era restringido y se limitaba a áreas de la actividad poco lucrativas y de reducida dimensión.

Actualmente, la situación es distinta, en cuanto al número de trabajadores autónomos, debido a las influencias del avance y difusión de la informática y las telecomunicaciones y también en virtud de las propias transformaciones en el proceso productivo, es cada vez mayor y hoy alcanza sectores de la actividad que tienen alto valor añadido. Hoy en España hay 2.091.733 trabajadores autónomos2 dados en alta en la seguridad social, lo que demuestra ser, desde luego, una parcela importante de la población activa española y consiguientemente desde hace tiempo merecía una atención mayor por parte de los legisladores.

No se quiere con eso decir que hasta la Ley 20/2007 el trabajador autónomo se encontraba al margen del ordenamiento, al revés, “el trabajador autónomo ha sido, de las dos grandes formas de articular una prestación laboral, el primero en ser objeto de regulación en el período histórico contemporáneo”3, además la legislación

1 Hasta el presente momento no fue establecida pacíficamente una sigla para representar esa ley en los textos jurídicos, como ocurre en el caso del Estatuto de los Trabajadores (ET). Algunos la llaman LETA, otros LETAU. Lo mismo ocurre con la sigla referente a los trabajadores autónomos económicamente dependientes que algunos llaman TADE otros TRADE o hasta incluso TRAUDE. Nosotros utilizaremos en este texto la sigla LETA y TADE para referirnos respectivamente a la Ley del Estatuto de los Trabajadores Autónomos y a los trabajadores autónomos dependientes económicamente, utilizando, así, por linealidad, apenas a la primera letra de cada palabra para formar la sigla. No obstante en las citaciones, podrá aparecer y ciertamente aparecerán otras siglas por una cuestión de fidelidad al texto transcrito.

2 Número actualizado hasta 31 de marzo de 2009 y que considera como autónomos “aquellos trabajadores afiliados a alguno de los regímenes por cuenta propia de la Seguridad Social y que no están integrados en sociedades mercantiles, cooperativas ni en otras entidades societarias. También se excluyen los que figuran como colaboradores familiares y los que están registrados formando parte de algún colectivo especial de trabajadores. (fuente: Ministerio de Trabajo y Inmigración de España <http://www.mtin.es/es/empleo/economia-soc/autonomos/estadistica/2009/1trim/PUBLICACION_RESUMEN_RESULTADOS.pdf>.

3 VALDÉS DAL-RÉ, 2007, p. 24.

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existente había seguido una “lógica sencilla” que es la de la dispersión, en virtud de la “diversidad normativa a la que han quedado sometidas las obligaciones de trabajar instrumentadas a través, precisamente, de una pluralidad de negocios jurídicos”4. Así, fue demasiado importante la llegada de la LETA para unificar el régimen jurídico del trabajo autónomo.

Entre las significativas innovaciones traídas por esa ley podemos destacar la que regula el trabajo autónomo económicamente dependiente, del cual hace parte un importante colectivo de trabajadores españoles que, sin embargo desarrollan su actividad de forma autónoma, tienen una importante y prácticamente exclusiva dependencia económica de uno de sus contratantes. Por esa situación de desventaja que este tipo de trabajador presenta ante su contratante, el legislador, “atento a las consecuencias sociales negativas”5 de una exclusión absoluta del manto protector del Derecho laboral a esa clase de trabajadores, optó por una “laboralización parcial de la institución”

6 y extendió a ellos algunos derechos propios de las relaciones laborales jurídicamente dependientes, como por ejemplo el derecho a interrupciones justificadas de la actividad laboral (art. 16 LETA).

En lo que se refiere a la protección de la salud y seguridad es cierto que la política y la legislación de prevención de riesgos laborales siempre estuvieron vinculadas a la regulación del trabajo asalariado, sin embargo estos riesgos afectan indistintamente a cualquier persona que realice una actividad profesional, independientemente de la naturaleza del vínculo en virtud del cual se realiza un trabajo.7

Asimismo, es indiscutible que los trabajadores autónomos siempre fueron abordados en esa leyes y políticas de prevención más como un factor de riesgo a la salud y seguridad de los trabajadores subordinados que compartiesen con él el mismo centro de trabajo de lo que como un sujeto digno de protección y eso no era una particularidad de la legislación Española, pues inclusive en la Directiva Marco no estaba incluido cualquier derecho a la protección de la salud y seguridad de los autónomos.

4 Ibidem, p. 24

5 PALOMEQUE LÓPEZ, 2007, p. 13

6 Ibidem, p. 13.

7 Cf. GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE, 2008, p. 196.

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Esa mentalidad tenía como base el hecho de que además de ser dueño de las herramientas y materias primas y del local de trabajo, es el propio trabajador autónomo quien organiza su trabajo. Así, no había a quien atribuir al derecho de protección de la salud y seguridad en el trabajo el deber correlativo de garantizarlo.

Con el aumento relevante de accidentes de trabajo envolviendo trabajadores autónomos, muchas veces en mayor volumen de los que ocurrían con trabajadores subordinados, empezó a quedar cada vez más clara la necesidad de salir del marco reparador de daños ocurrentes de accidentes de trabajo de los autónomos y pasar hacia un sistema preventivo. Así, las leyes empezaron a cada vez más a tratar el tema, no obstante sin deshacerse del perjuicio de tratar al autónomo más como causante de daños que como merecedor de protección.

Con la edición de un estatuto propio para regular el trabajo autónomo tenía el legislador una gran oportunidad de cambiar todo ese pensamiento y partir hacia una protección efectiva de esa clase de trabajadores. ¿Será que lo hizo? Esa es justamente la pregunta que pretendemos contestar con ese trabajo, no sin antes estudiar el ámbito subjetivo de aplicación de la LETA.

2. EL ÁMBITO SUBJETIVO DE APLICACIÓN DE LA LETA

2.1 LOS TRABAJADORES AUTÓNOMOS EN GENERAL

Uno de los grandes problemas que enfrentó el legislador para establecer la delimitación del ámbito de imputación de la LETA fue la existencia de diversos tipos de trabajos y de trabajadores autónomos, pues, como bien resaltan GARCÍA JIMÉNEZ y MOLINA NAVARRETE, el trabajo autónomo “se caracteriza por conocer en la práctica una extrema diversidad de modalidades que, a su vez, han ido promoviendo una amplia y variada, también dispersa, gama de régimen jurídicos de prestación de servicios profesionales en régimen de autonomía.”8 Es un claro ejemplo el hecho de que no había una definición universal del trabajador autónomo, sino tantas definiciones cuantas referencias legislativas, como podemos ver comparando el

8 GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE, 2008, p. 54.

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concepto bastante estricto presente en la ley de riesgos laborales en contraposición a la definición del trabajador autónomo en la ley de seguridad social que es muy amplia y flexible.

Así, el legislador tenía dos opciones al editar la LETA, la primera era trabajar con un concepto preciso y restringido, el cual excluiría de su ámbito de aplicación una gran parte de este colectivo de trabajadores, y la segunda era elegir un concepto flexible, amplio, capaz de abarcar un número mayor de situaciones y de adaptarse a la realidad presente y futura. Como veremos, el legislador optó por la segunda opción.9

De acuerdo con el artículo primero de la LETA, son trabajadores autónomos aquellas “personas físicas que realicen de forma habitual, personal, directa, por cuenta propia y fuera del ámbito de dirección y organización de otra persona, una actividad económica o profesional a título lucrativo, den o no ocupación a trabajadores por cuenta ajena”.

Tenemos, pues, como primer presupuesto exigido por la LETA para ser un trabajador autónomo, que además de ser una persona física, lo que es un dato obvio ya que no habría como considerar una persona jurídica trabajador autónomo, realice el trabajo de forma habitual. Aunque de inicio pueda parecer una exigencia sencilla no lo es, pues se trata de un concepto jurídico indeterminado. Según GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE el mayor problema está en entre la lectura que se hace de la habitualidad en el lenguaje ordinario y la que hacen los jueces, veamos:

El problema mayor reside en el salto producido entre su lectura en el lenguaje ordinario identificado con un criterio temporal – ejercicio continuado y no ocasional o esporádico, de una actividad económica -, y la lectura propuesta por Jueces (STS de 29 de septiembre de 1997) que la identificaran con un criterio económico: cuantía de la remuneración derivada del ejercicio de la actividad, sin duda de más fácil verificación – umbral del SMI – pero también más equívoca.10

Sin embargo, si bien esa cuestión trae influencias en el encuadramiento practico como autónomo, especialmente en el caso

9 Cf. Ibidem, p. 55.

10 GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE, 2008, p. 57-58.

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de concesión de autorización para trabajos a extranjeros o en caso de trabajadores familiares, la habitualidad no es un factor único y determinante, aunque importante, para establecer si un trabajador es o no autónomo, por lo que se puede decir que el legislador optó correctamente por utilizar un criterio flexible con relación a este requisito.

El segundo presupuesto caracterizador del trabajo autónomo es la prestación personal y directa de los servicios. De pronto, resáltese que eso no tiene nada que ver con el hecho de que el trabajo del autónomo sea personalísimo y de que él sea insustituible, al revés, la LETA expresamente admite la posibilidad de que el autónomo tenga contratados colaboradores para auxiliarlo en la ejecución de las tareas contratadas cuando al final del artículo primero usa la expresión “de o no lugar a trabajadores por cuenta ajena”. Lo que en verdad la LETA exige es que el autónomo sea una persona física, exceptuando incluso las sociedades de persona, y que él colabore en la realización de la actividad contratada, porque el trabajo es algo inherente a las personas y es justo por eso que para él se exige una especial protección. A ese respeto dijeron GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE:

Para el trabajador por cuenta propia significa que ha de ser una persona física, descartando toda organización colectiva – incluso si se trata de <<sociedades profesionales>> -, y comprometer su esfuerzo en la actividad, esto es, ha de implicar de manera inmediata sus capacidades y sus energías. Pero eso no quiere decir que no pueda valerse de colaboradores en el ejercicio de su, sea por vía laboral o mercantil. (…)

Ahora bien, en este caso bastará con que realice labores de dirección y gestión de la actividad emprendida (…)

En este sentido debemos insistir en que la dimensión personal del trabajo es, junto al paradigma del <<contratante débil>> o desequilibrio de prestaciones, la razón de ser de una tutela especial y diferenciada a la típica del Derecho Civil.11

La tercera exigencia es que el trabajo se haya desempeñado por cuenta propia, concepto que también trae muchas divergencias practicas. Segundo Alonso Olea, podemos entender por trabajo por

11 Ibidem, p. 58-59.

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cuenta propia aquellos cuyos frutos pertenecen a quien realiza el trabajo, veamos:

Hemos dejado dicho que la atribución directa e inmediata de los frutos del trabajo a quien lo ejecuta es definitoria del trabajo por cuenta propia; dentro de éste puede distinguirse según que el trabajador titular primero de los frutos sea también (1) quien los consuma o (2) los venda (los enajene, si se quiere expresión más amplia) a un tercero-cliente, que a su vez puede ser (2.1) su consumidor o usuario final, o (2.2) un <<intermediario>> que se encargue de su venta o de incorporarlo a su propio proceso productivo, comerciante el primero, industrial el segundo, en la terminología tradicional.12

Ya para Martín Valverde la idea de ajenidad en los frutos no se sostiene, porque cada vez más es posible verificarse en la práctica ajenidad sin dependencia, dependencia sin ajenidad y hasta mismo ajenidad sin remuneración, de modo que “una sola nota o elemento característico no bastan seguramente para describir esta relación cardinal en las sociedades contemporáneas en toda la variedad de sus manifestaciones”13.

En otra dirección encontramos los enseñanzas de Bayón Chacón que sustituye el criterio de la ajenidad en los frutos y distingue el trabajo por cuenta propia del por cuenta ajena en virtud de la ajenidad en los riesgos14, teoría esta que también fue objeto de innúmerables criticas.15 Rodirguez-Piñero, por su vez, entiende que la dependencia16 es el criterio fundamental17 y muchas otras teorías pueden ser verificadas en los textos de los grandes nombres del escenario jurídico laboral.

No se quiere aquí agotar esa discusión, tampoco llegar a una conclusión de cual criterio es el más apropiado para verificar en una situación práctica si el trabajo es por cuenta propia o por cuenta

12 ALONSO OLEA, 2002, p. 75

13 MARTÍN VALVERDE, 1996, p. 421-422.

14 Cf. RODRIGUEZ-PIÑERO, 1966, p. 154.

15 Ver em Ibidem, p. 154-157 y SANGUINETTI RAYMOND, 1987, 35-41.

16 En ese caso la distinción entre trabajador por cuenta propia y por cuenta ajena ya pasaría a la cuestión establecida en el próximo requisitos, cual sea, el de la independencia jurídico-organizativa y funcional.

17 Vide RODRIGUEZ-PIÑERO, 1966, p.157-161.

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ajena. Solamente trajimos esos datos para demostrar la complejidad que existe tras el presupuesto comentado, especialmente si hablamos de los autónomos económicamente dependientes.18

El próximo requisito para encuadrar a los trabajadores autónomos es el de la independencia jurídico-organizativa y funcional. De pronto, se puede ver que el legislador en la LETA utilizó el mismo criterio de la LET (art. 1.1), aún, en su sentido de negación. “Sin duda la opción es criticable (…) Su presencia termina ignorando cualquier relevancia típica al rasgo propio del autónomo, su libertad organizativa y de gestión, para confundirlo con el trabajo por cuenta propia”19.

Igualmente a la cuestión del trabajo por cuenta propia, esa suscita muchísimos problemas. El criterio de independencia jurídico-organizativa y funcional es muy flexible, el propio TS ya se pronunció en el sentido de que un trabajador puede prestar servicios por cuenta ajena, sujetarse a las instrucciones técnico organizativas del contratante, pero aún no ser un empleado en virtud de disponer de organización propia y de control sobre su tiempo de trabajo, como es el caso de los agentes mercantiles20.

No obstante todas las cuestiones controvertidas que existen a cerca del criterio dependencia/independencia, se puede perfectamente entender que la intención del legislador era de que se dejase claro que este tipo de trabajo, aunque realizado en las dependencias del contratante y sin embargo haya determinada dependencia económica, para ser un trabajo autónomo el prestador del servicios tiene que mantener determinada libertad técnica y funcional en el desarrollo de su actividad productiva.21

El siguiente presupuesto exigido por la LETA es el de que la prestación de servicios tenga carácter oneroso. Así, igual como se exige en el trabajo subordinado, para que un trabajador sea considerado autónomo es necesario que desarrolle su actividad con intención de obtener lucros, de ese modo y utilizando analógicamente el contenido del artículo 1.3 d) de la LET, se quedan excluidas del trabajo autónomo las actividades realizadas por benevolencia, amistad,

18 Para superar el problema práctico de constatación de autonomía o dependencia los Tribunales Españoles suelen utilizar el sistema de indicios de pruebas.

19 GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE, 2008, p. 60.

20 STS de 2 de julo de 1996, cf. Ibidem, p. 60.

21 En ese sentido ver GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE, 2008, p. 61

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bien como las relativas al autoconsumo.22

Además, es importante observar que la LETA no constituye ninguna exigencia de que la actividad autónoma sea única, principal, o que mantenga el trabajador y su familia, sólo se exige el pago por el servicio prestado, aunque se haga menester observar que la doctrina jurisprudencial ya trabajó la idea de habitualidad en razón de la cuantía de la contraprestación derivada del ejercicio de la actividad (STS 29 de septiembre de 1997).

Aún con relación a la contraprestación es importante observar que, a priori, el criterio de establecimiento de la contraprestación no es relevante, pudiendo ser por actividad o por resultado, así como a tanto alzado o periódica, aún, en el caso de los TADES la situación es distinta como veremos adelante.

El próximo requisito de configuración del trabajador autónomo es la voluntariedad jurídica. Para tratar ese requisito, primero se hace necesario tener en mente que es distinta la no manifestación de voluntad en el contrato en casos de fraude (falsos autónomos) con la presión socioeconómica que muchas veces no deja al trabajador otra elección sino trabajar autónomamente. La primera, indudablemente retira el carácter de prestación autónoma y puede generar vinculo de empleo entre las partes si el trabajador acude al juzgado social, por su vez la segunda no es una fraude en sentido propio, no hay vicio en la manifestación de voluntad, apenas hay factores externos a la relación contractual que son determinantes y que dependen, en general, de la elección de las partes contratantes.

En seguida, es relevante observar que esa manifestación de voluntad no es exigida únicamente en el acto de contratar, sino en toda la duración del contrato e incluso en su extinción. Por fin, deja al legislador el incuestionable hecho de que es posible al trabajador autónomo pueda añadir a su actividad la condición de empleador, de modo que “la concurrencia simultánea de la condición de trabajador autónomo y de empleador es un dato irrelevante a los efectos de la delimitación del ámbito de la LETAU”23. No obstante, cuando se trata del trabajador autónomo económicamente dependiente las cosas cambian, conforme veremos.

También, en el segundo párrafo del artículo 1.1, la LETA

22 En ese sentido ver Ibidem, p. 62.

23 Ibidem, p. 63.

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incluye en su ámbito de aplicación el trabajado realizado por familiares de autónomos de forma habitual y desde que no tengan la condición de trabajador por cuenta ajena conforme el establecido en el artículo 1.3 e) de la LET24. Como se ve, la LETA eximió estos trabajadores de cumplir los requisitos generales anteriormente estudiados, actuando explícitamente de forma protectora y trayendo una seguridad jurídica, al menos formal, para ese caso.

Es importante consignar que esos trabajadores familiares de autónomos siempre se situaron en una “zona gris” del derecho, ora pareciéndose con un trabajador autónomo, ora con una relación de empleo, pues el problema principal de este colectivo de trabajadores es el hecho de que actúan por cuenta propia pero de forma dependiente, pues “El carácter lucrativo de la actividad es evidente, aunque ciertamente también se trate de un modo difuso, por cuanto está claro que aun no percibiendo una remuneración concreta, especifica por la actividad, el familiar siempre actuará por cuenta propia, y no ajena, cuando los frutos o resultados de su actividad se destinan al fondo social o familiar común”25. Y, además, en este caso es común que la patria potestad actúe como un equivalente funcional del poder directivo común en los contratos de trabajo. Considerando, pues las particularidades de ese colectivo de trabajadores, se hacía, realmente, necesaria una mención del legislador a ese respeto, la cual se completa con el contenido de la Disp. Adic, 10ª de la LETA.

Asimismo, la LETA expresamente declaró incluidos en su ámbito de aplicación los siguientes sujetos: los socios industriales de sociedades regulares colectivas y de sociedades comanditarias; los comuneros de las comunidades de bienes y los socios de sociedades civiles irregulares, salvo que su actividad se limite a la mera administración de los bienes puestos en común; quienes ejerzan las funciones de dirección y gerencia que conlleva el desempeño del cargo de consejero o administrador, o presten otros servicios para una sociedad mercantil capitalista, a título lucrativo y de forma habitual, personal y directa, cuando posean el control efectivo, directo

24 Art 3. Se excluyen del ámbito regulado por la presente ley: e) Los trabajos familiares, salvo que se demuestre la condición de asalariados de quienes los llevan a cabo. Se considerarán familiares, a estos efectos, siempre que convivan con el empresario, el cónyuge, los descendientes, ascendientes y demás parientes por consanguinidad o afinidad, hasta el segundo grado inclusive y, en su caso, por adopción.

25 GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE, 2008, p. 65.

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o indirecto de aquélla, en los términos previstos en la disposición adicional vigésima séptima del texto refundido de la Ley General de la Seguridad Social aprobado por Real Decreto Legislativo 1/1994, de 20 de junio y los trabajadores autónomos económicamente dependientes.

Considerando que el legislador en esos caso exigió el cumplimento de todos los requisitos del artículo 1.1, se verifica claramente que era innecesaria esa declaración, pues aunque no lo hiciera el legislador ellos estarían protegidos por su contenido.

Por fin, en el artículo 1.2 e) el legislador acrecentó que también sería aplicado el contenido de la LETA “a cualquier otra persona que cumpla con los requisitos establecidos en el artículo 1.1 de la presente Ley”, con relación a esa redundancia innecesaria del legislador, hago mías las palabras de GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE: “A referencia inútil del legislador, silencio del comentarista.”26

Con eso, pasamos a estudiar el trabajo autónomo económicamente dependiente, delimitando ahora quien son los sujetos que ejercen este nuevo tipo de trabajo incluido en el ordenamiento jurídico por la LETA.

2.2. LOS TRABAJADORES AUTÓNOMOS ECONÓMICAMENTE DEPENDIENTES

Según el artículo 11 de la LETA son trabajadores autónomos económicamente dependientes “aquéllos que realizan una actividad económica o profesional a título lucrativo y de forma habitual, personal, directa y predominante para una persona física o jurídica, denominada cliente, del que dependen económicamente por percibir de él, al menos, el 75 por ciento de sus ingresos por rendimientos de trabajo y de actividades económicas o profesionales.”

De ese concepto se verifica que además de los requisitos que se exigen para los autónomos en general el legislador acrecentó dos elementos, el de que trabaje predominantemente para una persona física o jurídica, que la ley denominó cliente, y que de ella dependan por lo menos 75% de sus ingresos por rendimientos de trabajo y de actividades económicas profesionales, sin embargo en los presupuestos comunes podemos identificar algunas peculiaridades cuando se trata

26 GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE, 2008, p. 70.

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de trabajadores económicamente dependientes, por eso empezaremos por hacer un comentario acerca de ellas.

La primera observación que se puede hacer es que en el caso de los TADES el carácter personal y directo del trabajo tiene un significado más estricto, exigiéndose participación personal del autónomo en la prestación del trabajo. Eso queda claro en virtud de la prohibición del legislador de que el TADE tenga a su cargo trabajadores por cuenta ajena, así como de que él lance mano del instrumento de contratación o subcontratación de parte o de toda, la actividad (Art. 11.2 a).

En seguida, con relación a la habitualidad es importante resaltar que para los TADES además de una cuestión de desempeño permanente de la actividad económica, también está intrínseca a la idea de habitualidad, entendida como continuidad de la prestación de servicios para el cliente de quien se depende, lo que no quiere decir que se trate de la existencia de un único contrato de prestación de servicios.

En lo que se refiere a la independencia jurídica, que el legislador llamó para los autónomos en general de independencia jurídico-organizativa y funcional, en el caso del TADE es más importante aún, pues existiendo la dependencia económica, el trazo principal de su distinción para los trabajadores por cuenta ajena es justo la ausencia de subordinación jerárquica del TADE a su cliente.

Es verdad también que aunque sea un elemento importantísimo, la existencia o no de subordinación es más difícil aún de verificar en el caso de TADES, pues al desempeñar su actividad estos trabajadores se incorporan a la estructura productiva empresarial y por eso es inevitable una determinada adecuación de sus actividades a las reglas empresariales, especialmente cuando hay por atrás una dependencia económica y consecuentemente un poder de negociar bastante mitigado. Todavía esa relación jamás puede traspasar los límites de una coordinación en que se mantenga la libertad de decisión del TADE en torno de la ejecución de su trabajo, así como el control organizativo sobre ella.

En virtud de esa línea tenue y para evitar que la dependencia técnica no se confunda con subordinación jerárquica27

27 “es oportuno recordar que la dependencia económica de este tipo de trabajador

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el legislador previó expresamente que el TADE debe desarrollar su actividad con criterios organizativos propios, sin perjuicio de las indicaciones técnicas que pudiese recibir de su cliente y que no puede él ejecutar su actividad de manera indiferenciada con los trabajadores que presten servicios bajo cualquier modalidad de contratación laboral por cuenta del cliente. (art. 11.2 “b” y “d”).

Asimismo, para que no se utilice el TADE como una forma de fraude a la relación de empleo la LETA exigió que él disponga de infraestructura productiva y material propios necesarios para el ejercicio de la actividad e independientes de los de su cliente, siempre que dichos instrumentos de trabajo sean relevantes para su ocupación profesional.

Con relación a la onerosidad del trabajo, diferentemente de los autónomos en general, la contraprestación por los servicios realizados por un TADE ha de ser establecida en función del resultado de su actividad o del cumplimento del servicio contratado y asumiendo riesgos y venturas de él (art. 11.2 “e”).

Pasando a los requisitos particulares, podemos verificar que para la LETA el elemento esencial en torno al que gira la concepción del TADE es la dependencia económica frente a su cliente principal. Como se percibe en el artículo 11.1, la LETA no exigió que el TADE prestase servicios de forma exclusiva a un determinado cliente, sino que tuviera un cliente para el cual prestase servicios de forma preponderante. Además, estableció como criterio de apuración de esa preponderancia no el volumen de negocios, sino la dependencia económica generada en razón de ella, la cual se verifica cuando el cliente proporciona al trabajador un setenta y cinco por cien de sus ingresos por rendimientos de trabajo y de actividades económicas o profesionales.

Sin embargo, presente el cumplimiento de todos los requisitos anteriormente estudiados, jamás podrán ser clasificados como TADES28, por expresa determinación de la LETA (art. 11.3),

autónomo provoca que en sus decisiones intervengan significativamente las condiciones relativas a la realización del encargo recibido. (…) no ocurre una subordinación jerárquica sino una dependencia técnica entre dicho trabajador y la entidad que es destinataria preeminente de sus servicios.” (MORATO GARCÍA, 2007, p.91)

28 Resáltese que la restricción es para que sea considerado un autónomo económicamente dependiente, siendo perfectamente posible, cuando cumplidos los presupuestos, que ellos se

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los titulares de establecimientos o locales comerciales e industriales y de oficinas y despachos abiertos al público y los profesionales que ejerzan su profesión conjuntamente con otros en régimen societario o bajo cualquier otra forma jurídica admitida en derecho.

Por fin, con relación a las tres profesiones referidas en específico por la LETA hay que mencionar que con relación a los transportistas con vehículo propio desde que cumplan todos los requisitos de la disposición tercera de la LETA, podrán perfectamente ser encuadrados como TADES. En referencia a los agentes de seguros dice la disposición adicional decimoséptima de la LETA: “Los contratos celebrados por los agentes de seguros que cumplan con las condiciones establecidas en el capítulo tercero de la presente Ley y los supuestos en que dichos agentes quedarían sujetos al mismo se determinarán reglamentariamente sin afectar, en ningún caso, su relación mercantil.” Y, por fin, en lo que dice respeto a los representantes de comercio, la LETA excluye, cuando mantenga una relación de de dependencia económica con su cliente principal, la responsabilidad por los riesgos y venturas de sus relaciones de trabajo con el cliente principal.

Identificados los trabajadores autónomos en general y los autónomos económicamente dependientes pasaremos a estudiar como la LETA reguló su derecho a la seguridad y salud en el trabajo, no sin antes tratar, aunque rápidamente, el panorama legal anterior a la publicación de este Estatuto.

3. EL DERECHO DEL TRABAJADOR AUTÓ-NOMO A LA SEGURIDAD Y SALUD EN EL TRABAJO

Antes de trabajar con los textos legales en que se consagran el derecho a la seguridad y salud de los trabajadores autónomos en el trabajo, se hace necesario resaltar la dificultad práctica en aplicar una norma prevencionista a este grupo de trabajadores por la propia naturaleza de su relación de trabajo ya que el autónomo funciona al mismo tiempo en la condición de empresario y obrero.29 Así a diferencia del trabajador subordinado, no hay nadie a quien se pueda

encuadren en la condición general de trabajadores autónomos.

29 En este sentido ver LOZANO LARES, 2008, p 211.

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imputar de forma directa la obligación de asegurar la seguridad y salud del autónomo, sino a él mismo.

Eso todo se torna aún más complejo cuando el autónomo tiene otros trabajadores a su cargo, pues en este caso, además de ser el responsable directo por su propia seguridad y salud, él asume el deber de cumplir todas las obligaciones preventivas para con sus obreros como cualquier otro empresario.

Hechas esas consideraciones, pasamos a analizar la protección de la seguridad y salud laboral de los autónomos en la Ley de Prevención de Riesgos Laborales (LPRL).

3.1 EN LA LEY DE PREVENCIÓN DE RIES-GOS LABORALES

Es cierto que el derecho a la seguridad y salud en el trabajo está relacionado directamente con los bienes jurídicos de la persona del trabajador relativos a la vida, a la integridad física y moral, previstos en el artículo 15 de la CE, y el derecho a la protección de la salud, establecido en el artículo 43.1. Asimismo, aunque parezcan derechos meramente particulares de la persona y consecuentemente del trabajador, con la determinación en su art. 40.2 de que es un deber de los poderes públicos velar por la seguridad e higiene en el trabajo, el texto constitucional elevó a la categoría de interés general de la sociedad que el trabajador pueda desempeñar su trabajado en condiciones dignas y seguras.30

Sin embargo el texto del referido artículo 40.2 hace mención a un deber del Estado, en él “no se encuentra un reconocimiento expreso a favor de los trabajadores a disfrutar de una protección eficaz en materia de seguridad y salud en el trabajo”31. Solamente en el art. 19.1 del Real Decreto Legislativo 1/1995, que aprobó el Texto Refundido del Estatuto de los Trabajadores (ET) se vio por primera vez una referencia expresa ese derecho. Pero, aunque hubiese la previsión, este derecho no estaba debidamente reglamentado, así en respuesta a la determinación Constitucional y a los compromisos comunitarios (Directiva Marco, entre otras) e internacionales (Convenio n. 155 de

30 A ese respeto ver MARTÍN HERNÁNDEZ, 2006, p. 13, 59.

31 Ibidem, p. 59.

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la OIT) fue promulgada en España la ley 31/1995 de Prevención de Riesgos Laborales (LRPL).32

Según PALOMEQUE LÓPEZ33, la articulación jurídica de la protección de la seguridad y salud en el trabajo encomendada a los poderes públicos por la CE en su art. 40.2 se encuentra sostenida en cuatro pilares básicos, a saber: el primero es “la formulación legislativa del derecho subjetivo de los trabajadores a <<una protección eficaz en materia de seguridad y salud en el trabajo>> (…) como verdadero soporte del conjunto normativo dispuesto en este ámbito”34, el segundo es la imposición al empleador de un deber permanente, general y completo de protección correlativo al derecho del trabajador, exigiendo por tanto que el empresario utilice cuantas medidas sean necesarias para alcanzar esa protección eficaz estén esas legalmente previstas o no. El tercero es el establecimiento del contenido del deber de protección del empresario, que para el autor debe ser restringido al marco de las especialidades recogidas, no estableciéndose en una obligación ilimitada y excesiva como se suele plantear. Y por fin, el autor apunta como cuarto pilar la ampliación sucesiva del contenido del deber de protección que alcanza además del qué, el cómo se deben llevar a cabo las acciones preventivas y quienes deben participar en la misma, resaltando que él, aunque ampliado, sigue siendo determinable. 35

Dentro de ese marco de referencia general y considerando el contenido expreso del artículo 14.1 de la RPLR se puede verificar claramente que la legislación de protección de seguridad y salud fue pensada y editada para los trabajadores subordinados, el personal civil y los funcionarios públicos, incluyendo por excepción los socios de las cooperativas cuya actividad en ellas sea de prestación de trabajo personal. (art. 3.1 segundo párrafo LPRL).36

32 Sobre el tema ver Ibidem, p. 8-14.

33 PALOMEQUE LÓPEZ, 2007, p. 20

34 Ibidem, p. 22

35 Cf. Ibidem, p. 23-24.

36 “Esta precisión hay que interpretarla en coordinación con lo dispuesto en la Disp. Final ET, que (…) establece que la inclusión de los trabajadores autónomos en el ámbito de aplicación de la normativa laboral resulta excepcional y solo es posible cuando así lo señale expresamente la propia normativa laboral y en los términos específicos en que dicha normativa se establezca.” (MARTÍN HERNÁNDEZ, 2006, p. 151)

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Con relación a los autónomos en general, se verifica que LPRL no se dedica a tratar de ese colectivo en específico, refiriéndose al mismo más como un factor de riesgo en el proceso productivo desarrollado por una empresa de lo que como un destinatario de las reglas de seguridad. En las palabras de Martínez Barroso, la LPRL no contempla al trabajador autónomo exactamente como elemento aislado, ni siquiera como persona que puede correr riesgo a resulta de su trabajo, al menos en una primera aproximación; lo contempla más bien como una pieza añadida en el proceso productivo desarrollado por una empresa y, por tanto, como uno de los eslabones que hay que atender en ese contexto. No importa, por así decirlo, el trabajador en si mismo considerado, sino su participación en que puede generar riesgos laborales para otros y, en especial, para los asalariados implicados en la actividad empresarial correspondiente.37

En virtud de eso, el legislador se limitó a trabajar la cuestión de los autónomos en situaciones puntuales. Primeramente, en el artículo 3.1 LPRL se delimitó el ámbito de aplicación de esa ley a “los derechos y obligaciones que puedan derivarse a los trabajadores autónomos” lo que demuestra el ámbito restringido en que ella debe ser aplicada a ese colectivo de trabajadores, pues considerando el contenido de la Disposición final primera del ET que dice expresamente que “el trabajo realizado por cuenta propia no estará sometido a la legislación laboral, excepto en aquellos aspectos que por precepto legal se disponga expresamente” se puede concluir que con excepción de las referencias expresas del legislador, en todos los demás casos el trabajador autónomo está excluido del régimen de protección de la LPRL.

Asimismo, en dos casos excepcionales de inclusión del trabajador autónomo en el ámbito de protección de la LPRL se ve en común la situación de que el autónomo no solo estará expuesto a los riesgos que él propio produce en la realización de actividad laboral, sino a los riesgos producidos por los demás trabajadores que ocupen el mismo centro de trabajo del cual no es propietario. “Es decir se trata de supuestos en los que el trabajador autónomo, a consecuencia del cumplimiento de su actividad por cuenta propia, se va a encontrar expuesto a una serie de riesgos para su vida, su integridad física y psíquica y su salud que él por si mismo no está en disposición de

37 MARTÍNEZ BARROSO, 2006b, p. 214

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prevenir.”38

Además, en este mismo supuesto, el trabajador autónomo expondrá los demás trabajadores que compartan el mismo centro de trabajo a los riesgos que él mismo produzca en el desarrollo de su prestación de servicio, por lo que los empresarios de los demás trabajadores pasan a tener la obligación de proteger sus trabajadores por cuenta ajena de los riesgos derivados de la presencia del autónomo.

Fue precisamente este doble aspecto emanado de la presencia de un autónomo en un centro productivo que no sea de su propiedad que justificó su inclusión en parte en el ámbito protectivo de la LRPL. Los derechos, el trabajador autónomos los tendrá frente al empresario titular del centro productivo en que labore, así como a los demás autónomos y empresarios con los que concurra en el mismo centro de trabajo y ellos están orientados directamente a la prevención de los riesgos que le afectan y que no son creados por él. En contrapartida las obligaciones que les son atribuidas buscan evitar que los riesgos que produzca afecten los demás autónomos y los demás trabajadores por cuenta ajena que compartan el mismo centro de trabajo, viabilizando así que los empresarios de estos últimos cumplan con su obligación de proporcionarles una protección realmente eficaz.39

El artículo 24 de la LRPL que establece los derechos del autónomos en materia de seguridad y salud en el trabajo está reglamentado por el RD 171/2004 y esto texto legal confiere a ellos una serie de derechos y obligaciones que podemos resumir básicamente en torno de una sola palabra, cual sea, cooperación40. Así en ese real decreto no se transfiere la responsabilidad por la seguridad y salud del autónomo al titular del centro de trabajo o a los demás empresarios concurrentes en el sitio de cumplimiento de su trabajo, apenas se resalta el deber de cooperación que el empresarios principal y todos

38 MARTÍN HERNÁNDEZ, 2006, p. 151

39 Cf. Ibidem, p. 152.

40 Aunque la ley solamente hable expresamente en el deber de cooperar del trabajador entendemos que las obligaciones del empresario dueño del centro productivo y de los demás empresarios concurrentes en el lugar de prestación de servicios para con los trabajadores también se configuran como un deber de cooperación. Pues el autónomo coopera con ellos en la consecución de la prevención de la seguridad y salud eficaz de sus trabajadores por cuenta ajena y ellos cooperan con la actividad preventiva de los autónomos que sigue siendo una responsabilidad suya.

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los demás empresarios, incluso el autónomo tienen por compartir el mismo centro de producción.41

Solamente dentro de esa idea de cooperación el Real Decreto concede al trabajador autónomo derechos como el de que se le proporcione información necesaria sobre los riesgos que sean directamente derivados de las condiciones y organización del centro productivo y además sobre todas las medidas de seguridad adoptadas para prevenirlos. Así como le confiere obligaciones como la de que el autónomo coopere participando de la actividad preventiva en lo que sea necesario para prevenir eficazmente los riesgos laborales derivados de la concurrencia de todos esos sujetos en un mismo centro de trabajo.

Sin embargo, como sólo alcanzan a los autónomos las reglas de derecho del trabajo que expresamente se digan, no se puede atribuir a ellos los derechos conferidos exclusivamente para los trabajadores encuadrados como tal en el concepto previsto por la LRPL como por ejemplo el de participación y representación específica mediante órganos especializados al respecto, el derecho a recibir una formación sobre esas cuestiones, o el derecho a la vigilancia de su salud, etc.42

Para LOZANO LARES, los autónomos aún se encuentran implícitamente protegidos por el contenido del art. 41 LPRL donde se les garantiza el derecho a protección frente a los fabricantes, importadores y suministradores de maquinaria, equipos, productos y útiles de trabajo, en el sentido de que estos aseguren que sus artefactos no constituyan una fuente de peligro para el trabajador, pero aquí el mismo se encuentra protegido más en calidad de consumidor de lo que como trabajador.43

Por fin, es importante resaltar que solamente en el sector de la construcción ya había una mejor reglamentación acerca del derecho de los autónomos a seguridad y salud en su trabajo, pues considerando

41 Con el intento de robustecer ese deber de cooperación atribuido a los autónomos por la LPRL (art. 24.5) la LISOS tipificó en su art. 12.13 como infracción administrativa grave la no adopción de “las medidas de cooperación y coordinación necesarias para protección y prevención de riesgos laborales” por los empresarios y trabajadores autónomos que desarrollen actividades en un mismo centro de trabajo, así como tipificó como muy grave esa misma actitud cuando la actividad desarrollada sea reglamentariamente considerada como peligrosa o con riesgos especiales. (art. 13.7)

42 A ese respeto ver MARTÍN HERNÁNDEZ, 2006, p.153.

43 Cf. LOZANO LARES, 2008, p.214.

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los altos niveles de siniestralidad en el sector de la construcción para el cual concurre la masiva presencia de trabajadores autónomos y asalariados de distintos empresarios trabajando conjuntamente fue incluido en el Real Decreto 1627/1997 una serie de derechos y de obligaciones44 exigibles del autónomo en el desarrollar de su actividad productiva.45

Visto eso, pasaremos a verificar como se trata la protección del autónomo en relación a su seguridad y salud en el trabajado en el ámbito de las normativas comunitarias.

3.2 EN EL ÁMBITO COMUNITARIO

Como vimos, en general los autónomos están fuera del ámbito de protección contra riesgos laborales. Ocurre que eso no pasa solamente en España, sino en prácticamente todos los Estados de la Unión Europea. En general no se encontraba siquiera en las normativas comunitarias una preocupación con esta clase de trabajadores, lo que es prueba el hecho de que esa clase de trabajadores fue excluida de toda y cualquier referencia proteccionista por la Directiva Marco46.

Sin embargo como ya se ha dicho, la importancia del trabajo autónomo creció y aun crece en gran volumen y justo por la ausencia de medidas preventivas y formativas el número de accidentes entre los autónomos también son bastantes y cada vez más significativos. Así, en 18 de febrero de 2003 el Consejo de la Unión Europea recomendó que se mejorase en los Estado miembros la protección de la salud y de la seguridad de los trabajadores por cuenta propia, incitándoles a fomentar políticas públicas de prevención de accidentes y enfermedades profesionales, así como a promover la seguridad y salud de los trabajadores autónomos, considerando sus peculiaridades y los riesgos especiales existentes en determinados sectores.

44 Obviamente muchos más obligaciones que derechos.

45 A ese respeto ver LOZANO LARES, 2008, p.218.

46 Por eso bien resalta MARTÍN HERNÁNDEZ que “esta inclusión de los trabajadores autónomos en el ámbito de aplicación de la LRPL, aunque sea parcial y limitada, constituye una novedad en relación a la Directiva Marco ya que en los arts. 2 y 3 de la misma, relativos a su ámbito subjetivo de aplicación, solo se recogen entre los sujetos protegidos aquellos que realicen una prestación materialmente laboral, sea en el ámbito público o en el privado, pero no a los trabajadores autónomos” (2006, p. 159)

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Siguiendo esa tendencia, la Directiva 92/57/CEE al tratar acerca del trabajo realizado en obras de construcciones temporales o móviles previó la extensión de determinadas reglas relativas a la utilización de equipos de trabajo y de protección a los trabajadores autónomos. Igualmente en ese sentido se incluyó en la LETA disposiciones específicamente relacionadas a la protección de la salud y seguridad del trabajador autónomo las cuales en seguida analizaremos.

3.3 EN LA LEY DEL ESTATUTO DEL TRA-BAJO AUTÓNOMO

Siguiendo la dirección de las actuales estrategias de la Unión Europea en materia de Seguridad y Salud en el trabajo, la LETA, a ejemplo del ET, garantizó a los trabajadores autónomos un derecho individual a la integridad física y a una protección adecuada de su seguridad y salud en el trabajo, art. 4.3 LETA.

De hecho, esa es una situación novedosa, pues por primera vez hubo un reconocimiento formal del derecho del autónomo a la salud y seguridad laboral. Sin embargo, en la práctica, la determinación legal tropieza una vez más en el dilema de su doble condición de auto-empleador y auto-empleado.47 Así, a la hora de hablar acerca de las garantías de efectividad de ese derecho el legislador lo hizo de forma tímida e inadecuada apenas apuntando normas programáticas a las administraciones públicas y reiterando los términos de la LPRL en lo que se refiere a las hipótesis de trabajo en centro productivo de propiedad ajena al autónomo. Lo que se ve en verdad es más una intención del legislador de integrar el autónomo en la actividad preventiva de riegos que garantizar en la práctica esa protección.48

Primeramente, hay que resaltar que la LETA como forma de poner en práctica ese papel activo ordena en su artículo 8.1 que las Administraciones Públicas competentes promuevan además de una formación en prevención específica y adaptada a las peculiaridades de los trabajadores autónomos49, asesoramiento técnico y vigilancia

47 En ese sentido LOZANO LARES, 2008, p.222-223.

48 En ese sentido GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE, 2008, p. 202.

49 Con relación a la importancia de la cuestión preventiva dijo Martínez Barroso: “ Si no se establecen normativamente los instrumentos necesarios para sensibilizar a los autónomos en

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y control del cumplimiento de las reglas de prevención de riesgos laborales. Pero así como es verdad que el legislador fue atento al establecer este mandamiento, es cierto que no instituye medios de exigibilidad inmediata de esa protección.50

También orientando la función de esfuerzos en el sentido de reducir la siniestralidad y evitar la aparición de enfermedades profesionales en los respectivos sectores, la LETA responsabiliza a las asociaciones representativas de los trabajadores autónomos y las organizaciones sindicales más representativas a realizar programas permanentes de información y formación correspondientes a dicho colectivo promovidos por las Administraciones Públicas competentes en materia de prevención de riesgos laborales y de reparación de las consecuencias de los accidentes de trabajo y las enfermedades profesionales (12ª disposición adicional).

Además, el artículo 8.3 la LETA ratifica los deberes de cooperación, información e instrucción establecidos en los apartados 1 y 2 del artículo 24 de la LRPL cuando trabajadores autónomos y trabajadores de otra u otras empresas desarrollen actividades en un mismo centro de trabajo, así como cuando los trabajadores autónomos ejecuten su actividad profesional en los locales o centros de trabajo de las empresas para las que presten servicios. Todavía, como bien resalta LOZANO LARES es importante frisar?? que el supuesto de hecho contemplado por el artículo 8.3 de la Ley 20/2007, si bien abarca lo dispuesto en el artículo 24.1 LPRL, no se corresponde de igual modo, en cambio, con la descripción fáctica del artículo 24.2 LPRL, donde no se exige que las empresas concurrentes presten servicios al empresario titular del centro de trabajo, sino que basta con que desarrollen actividades en el mismo.(…) 51

Asimismo, el mismo autor observa que el legislador perdió la oportunidad de imponer el deber de vigilancia establecido en el artículo 24.3 LPRL a aquellos titulares del centro de producción que

el cumplimiento de las medidas de seguridad haciéndoles ver las consecuencias públicas que tiene el no hacerlo, difícilmente se va a conseguir una concienciación general de la prevención de riesgos laborales. Concienciación que no sólo tiene ventajas desde el punto de vista de las personas sino también de los costes económicos que suponen los accidentes de trabajo y las enfermedades profesionales.” MARTÍNEZ BARROSO, 2008, p. 138-139.

50 En ese sentido GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE, 2008, p. 203.

51 LOZANO LARES, 2008, p.225.

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contraten con autónomos obras o servicios que no estén directamente ligados a su propia actividad.52

Con relación al artículo 8.4 LETA, aunque a la primera vista parezca ser su contenido una repetición de lo ya establecido por la LPRL, en verdad no lo es, pues el legislador suprime una laguna existente al establecer un deber in vigilando para la empresa contratante, ya sea o no a su vez contratista o subcontratista, que, en cierto modo, la convierte en responsable solidaria de los incumplimientos del trabajador autónomo, que ve así reforzado su deber de autoprotección con un derecho de tutela cuyo garante no es otro que el titular del centro de trabajo.53

Es importante observar que el elemento clave para la configuración de ese deber de vigilancia no es indispensable que haya la formalización de un contrato civil o mercantil entre el contratante y el trabajador autónomo, sino que exista entre ellos una relación jurídica obligacional en razón de la cual esté el trabajador autónomo obligado a realizar una obra o servicio.54

Por su vez, el artículo 8.5 LETA obliga los empresarios a asumir las obligaciones del último párrafo del art. 41.1 LPRL cuando los autónomos ejecuten su trabajo con maquinaria, equipos, productos, materias o útiles proporcionados por la empresa para la que ejecutan su actividad profesional, en local distinto del centro de trabajo de tal empresa.

Como se nota, trata de una ampliación a los autónomos de las garantías de protección previstas en la LPRL con exclusividad para los trabajadores por cuenta ajena, todavía es importante observar que esa previsión solamente alcanza el derecho a recibir del empresario toda la información necesaria para que pueda manejar los artefactos sin la producción de riesgos para su seguridad y salud profesional.55

Ocurre que difícilmente se producirá la circunstancia de que el trabajador autónomo no esté integrado en el centro de trabajado de su contratante pero realice sus actividades con instrumentos de

52 Conferir en Ibidem, p.225.

53 Ibidem, 2008, p.226.

54 En ese sentido MARTÍNEZ BARROSO, 2008, 142.

55 Nese sentido LOZANO LARES, 2008, p.227.

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trabajo de propiedad de él, por eso afirma MARTÍNEZ BARROSO, la obligación en cuestión es una “obligación marginal”56.

Por su vez, el artículo 8.6 LETA prevé una penalidad para la hipótesis del empresario no cumplir con las obligaciones determinadas por los apartados 3 a 5 del artículo 8 LETA, que consiste en indemnizar el autónomo por los daños y perjuicios que sufra siempre y cuando haya relación causal directa entre tales incumplimientos y los perjuicios y daños causados. Asimismo, determinó el legislador que la responsabilidad por el pago de esa indemnización recaerá directamente sobre el empresario y será concedida con independencia de que el trabajador autónomo se haya acogido o no a las prestaciones por contingencias profesionales.

El contenido de ese artículo, según GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE 2008, es “un reflejo legal de una principio más general hoy y completamente asentado en la práctica judicial: la empresa que no adopta medidas adecuadas para prevenir un daño a la salud es plenamente responsable del mismo al margen de cual sea la conducta del trabajador – STSJ Madrid, Sala Social, de 28 de mayo de 2007-”.57

Por fin, se encuentra en la LETA (art. 8.7) una autorización legal para que el autónomo, siempre que se encuentre en situación de riesgo grave e inminente, cese la prestación de sus servicios y abandone el lugar de trabajo, lo que desde luego se nota trata de una garantía similar al ius resistentiae del trabajador subordinado. La principal consecuencia de esa regla es que el abandono del puesto de trabajo no puede caracterizar incumplimiento del contrato, tampoco motivo de interposición de una acción resolutoria del contrato por parte del contratante (art. 21.1 LRPL). A respeto de esa previsión legal dijo MARTÍNEZ BARROSO que al pie de la letra esta es una garantía innecesaria una vez que es totalmente aplicable a la relación de trabajo autónomo la figura del caso concreto y de la fuerza mayor “que excusaría con todo fundamento la ejecución del contrato”58, sin embrago la propia autora reconoce que en virtud de la importancia del objeto en discusión no se hace excesivo , hasta incluso se aconseja,

56 MARTÍNEZ BARROSO, 2008, 145.

57 GARCÍA JIMENEZ y MOLINA NAVARRETE, 2008, p. 206.

58 MARTÍNEZ BARROSO, 2008, 147.

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una previsión legal específica al respeto.

4. CONSIDERACIONES FINALES

Considerando lo que fue expuesto se puede concluir que fue un importante avance para los trabajadores autónomos en general la edición de la LETA, una vez que unificó el régimen jurídico del trabajador autónomo y consolidó una serie de derechos importantes que les garantizaran mejores condiciones de trabajo.

Además, también se puede considerar una conquista la regulación del trabajo autónomo económicamente dependiente, por el propio hecho de reconocer su existencia y asegurar derechos especiales, lo que demuestra la consciencia de su situación de desventaja frente al denominado cliente principal y la aptitud del derecho del trabajo de adaptarse a las nuevas realidades sociales y de acudir a las necesidades de laboralización de determinados institutos antes completamente alejados de él.

Sin embargo, el texto que se ha editado trae consigo muchas imprecisiones y previsiones cuestionables, especialmente en cuanto a los TADES, que merecen, aún más esfuerzos y atención de los laboralistas. En los textos escritos, que no son muchos, sobre todo por el corto tiempo de vigencia de la LETA se encuentran posiciones diametralmente opuestas lo que es inevitable e incluso saludable para que se hagan todas las reflexiones posibles y se analicen en todas las repercusiones prácticas que cada uno de los dispositivos de esta ley pueda traer.

Con relación a la garantía de protección a la seguridad y salud del trabajador se ve que la LETA no evolucionó cuanto podía y se mantuvo en la misma línea de pensamiento de que el autónomo por ser responsable por su propio trabajo es quien en verdad se debe responsabilizar por su salud y seguridad, apenas aumentando un poco esa garantía cuando él desarrolla su trabajo en compañía de otros trabajadores por cuenta ajena en un centro de trabajo que no es de su propiedad, lo que deja en evidencia que en esos casos se garantiza una protección mayor más en virtud de los riesgos que puede provocar de lo que por una cuestión de proteger su propia seguridad y salud.

Por otro lado, es importante observar que la atribución expresa de un deber a la Administración Pública de actuar activa y

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preventivamente en el sentido de garantizar una protección de la seguridad y salud laboral del trabajador autónomo fue un importante avance, el cual terminó por no tener las consecuencias prácticas necesarias en virtud de su omisión al no establecer claramente las funciones administrativas del Estado, especialmente las pertinentes a la delimitación de competencias. De ese modo, sugerimos que para suprimir esa laguna sean utilizadas subsidiariamente las reglas correspondientes presentes en la LPRL.

Urge, pues, que el trabajador autónomo, sobremodo el autónomo económicamente dependiente, sea observado por el legislador como un trabajador que al desarrollar su trabajo está sujeto a los mismos riesgos como cualquier otro trabajador y que en una gran cantidad de casos, él está en verdad integrado al centro productivo de su contratante de modo permanente, continuado, como cualquier de los trabajadores por cuenta ajena y que en virtud de eso merecen ser ampliadas su garantías de efectividad.

Asimismo, obsérvese que el contenido del artículo 40.2 de la CE no puede encontrar un obstáculo en la naturaleza del vínculo contractual para que sea efectivo, de modo que las Administraciones Públicas, considerando el contenido de la legislación vigente, lo que de momento puede y debe hacer para consagrar en la práctica ese derecho constitucional de los trabajadores autónomo es poner en práctica las orientaciones del artículo 8.1 LETA, pues sin duda la prevención es fundamental y es el primer paso a ser dado en dirección a garantizar a esa clase de trabajador una protección eficaz en materia de salud y seguridad en el trabajo.

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AGENTES PÚBLICOS ERESPECTIVA TUTELA DA HIGIE-NE, SEGURANÇA E SAÚDE DO TRABALHO: QUESTÕES DE COMPETÊNCIA

Bruno Santos CunhaAdvogado e Procurador do Município do Recife.

6Sumário:1. Nota Introdutória;2. O Judiciário Trabalhista e as repercussões advindas da

Emenda Constitucional n. 45/2004;3. Os agentes públicos. Amplitude da categoria e as relações

de trabalho e emprego: questões de competência;4. Tutela dos agentes públicos no que toca à higiene,

segurança e saúde do trabalho: o regime de emprego público e o regime jurídico-administrativo;

5. Conclusão;6. Bibliografia

1. NOTA INTRODUTÓRIA

Ainda dentro das repercussões advindas da Emenda Constitucional n. 45/2004 (Reforma do Judiciário), o presente estudo pretende analisar figura polêmica e pouco tratada da “nova” competência do Judiciário Trabalhista. Em específico, o que se busca é a definição da competência trabalhista, ou não, nos casos envolvendo julgamento de matéria atinente à tutela da higiene, segurança e saúde do trabalho de agentes públicos, sejam tais agentes vinculados ao ente

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público por regime de emprego (celetista), ou jurídico-administrativo (estatutário).

2. O JUDICIÁRIO TRABALHISTA E AS RE-PERCUSSÕES ADVINDAS DA EMENDA CONSTITUCIONAL N. 45/2004

Passados quase seis anos da promulgação da Emenda Constitucional n. 45/2004, as questões atinentes à competência da Justiça Laboral ainda são alvo de caloroso e incessante debate, seja na doutrina, seja na jurisprudência.

De fato – e no bojo da chamada Reforma do Judiciário –, tal Emenda Constitucional operou inúmeras alterações na estrutura organizacional do Judiciário Brasileiro, disciplinando de forma pormenorizada uma nova configuração orgânica em variados ramos do mesmo, o que implica, como consectário, o surgimento de inúmeras controvérsias, mormente no campo das parcelas de competência de cada partição orgânica do aludido Poder e em virtude da criação de novos institutos e instrumentos jurídico-processuais, no afã da efetividade e celeridade processual almejadas.

Logo de início – e como bem anotado por respeitada doutrina1 –, o que salta aos olhos com a nova configuração já falada – e advinda da já referida manifestação do constituinte derivado reformador – é o nítido crescimento das demandas a serem dirimidas, agora, pela Justiça Laboral, eis que a já consolidada disciplina do art. 114 da Constituição Federal foi, talvez, o maior alvo das alterações concernentes à repartição de competências jurisdicionais.

Desta feita, o que há de se discutir no presente estudo, em sentido amplo, é a questão da competência do Judiciário Trabalhista para as lides que envolvem os chamados agentes públicos, para então, em campo específico, adentrar na temática da tutela da higiene, segurança e saúde do trabalho em relação a tais espécies de atores, em um sentido pormenorizado.

1 Veja-se, por exemplo, a seguinte obra, que, com a colaboração de doutrinadores de escol, bem ressalta as especificidades das alterações ora debatidas: COUTINHO, Grijalbo Fernandes; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Justiça do trabalho: competência ampliada. São Paulo: LTr, 2005.

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3 . O S AG E N T E S P Ú B L I CO S . A M P L I T U D E DA C AT E G O R I A E A S R E L AÇÕ E S D E T R A -BALHO E EMPREGO: QUESTÕES DE COM -PETÊNCIA

Inicialmente, antes de adentrar especificamente na questão inerente às relações trabalhistas – em uma conotação dilatada – e à respectiva tutela jurisdicional, necessário que se proceda à exposição sintética acerca da categorização dos agentes públicos, delimitando as espécies distintas que, concebidas em suas intrínsecas determinações, compõem o gênero acima aludido.

De plano – e com espeque nas lições de Edmir Netto de Araújo –, tem-se que agente público pode ser assim considerado:

Com efeito, todo aquele que, de alguma forma, sob qualquer categoria ou título jurídico, desempenha função ou atribuição considerada pelo Poder Público como a si pertinente, seja em virtude de relação de trabalho (estatutária ou não), seja em razão de relação contratual, encargo público ou qualquer outra forma de função de natureza pública, será, enquanto a desempenhar, um agente público.2

No mesmo sentido, a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello, que assim inaugura capítulo de sua obra específico sobre a temática:

Esta expressão – agentes públicos – é a mais ampla que se pode conceber para designar genérica e indistintamente os sujeitos que servem ao Poder Público como instrumentos expressivos de sua vontade ou ação, ainda quando o façam apenas ocasional

2 ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 276.

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ou episodicamente.3

De qualquer sorte – e descendo à apreciação minuciosa – tem-se na doutrina administrativista certas discussões quanto às espécies dos chamados agentes públicos, sendo oportuno, por ora, adotar uma de tais classificações. Em específico – e com base na doutrina de Dirley da Cunha Júnior4 –, vislumbram-se as seguintes espécies de agentes públicos:

A G E N T E S P Ú B L I C O S – espécies:

1) agentes políticos – subordinando-se diretamente à Constituição da Republica, tais agentes, de certa forma, podem ser considerados, também, como detentores de vínculo jurídico-administrativo com o Estado (estatutários), eis que seu estatuto estaria fundado na própria norma constitucional de regência.

2 ) a g e n t e s o u s e r v i d o r e s administrativos do Estado, a abranger:

2.1) servidores públicos, que, a rigor da existência ou não de Regime Jurídico Único5, poderão ser estatutários (detentores de cargo público) ou celetistas (ocupantes de emprego público).

2.2) servidores empregados (ou empregados públicos, detentores de vínculo contratual celetista com o Estado – emprego público).

2.3) servidores temporários –

3 BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2005. p. 228.

4 Vide: CUNHA JÚNIOR, Dirley. Curso de direito administrativo. 8. ed. Salvador: Juspodium, 2009. p. 255-272.

5 Muito embora escape ao tema ora debatido, vale anotar que a questão do Regime Jurídico Único decorre do caput do art. 39 da CF/88 e suas ‘alterações’; inicialmente pela EC n. 19/98 e, mais tarde, com a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADI n. 2135-4, de 2/8/2007.

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contratados nos termos do art. 37, IX, da CF/88, naquilo que se costuma mencionar como regime especial de direito administrativo, a fim de atender necessidade temporária de excepcional interesse público.

2.4) servidores militares – também considerados em um regime jurídico especial em razão da natureza e peculiaridades de suas atividades.

3) agentes par ticulares em colaboração com o Estado – a abranger todos aqueles que, sem perder a qualidade de particular, exercem função pública, prestando atividade ao Estado, sem vínculo, com ou sem remuneração, ainda que eventualmente.

Resta claro, pois, que a categoria agente público abrange uma gama diferenciada de espécies de agentes ‘vinculados’ de alguma forma ao ente estatal. Entrementes, é válido destacar que, no bojo do presente estudo e ao que ora importa, a diferenciação fundamental há de ser tida em função da submissão ou não à jurisdição trabalhista, tendo-se em vista a vinculação existente entre Estado e Agente Público.

Em tal seara – e ficando adstrito às categorias que ora se busca confrontar, mormente os ditos servidores públicos e servidores empregados, na expressão de Dirley da Cunha Júnior –, fácil vislumbrar que, de há muito, houve a pacificação de uma separação na competência para julgamento das ações decorrentes dessas duas espécies de relação Estado x Agente. O que se viu, em breve síntese, foi a submissão dos detentores de cargo (regime jurídico-administrativo) à justiça comum (federal ou estadual), enquanto os ocupantes de emprego público (regime celetista) estariam adstritos à jurisdição trabalhista.

Nesse ponto, é de se mencionar que a já citada Emenda Constitucional n. 45/2004 houve por trazer novos caracteres ao debate, inovando as atribuições do Judiciário Trabalhista, que, em suma, subsumiu-se, durante muito tempo, às lides decorrentes da relação ‘empregado e empregador’, na forma originária do art. 114

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da Constituição Federal de 1988, in verbis:CF/88 – Art. 114. Compete à

Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre trabalhadores e empregadores, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta dos Municípios, do Distrito Federal, dos Estados e da União, e, na forma da lei, outras controvérsias decorrentes da relação de trabalho, bem como os litígios que tenham origem no cumprimento de suas próprias sentenças, inclusive coletivas.

Após tal caracterização originária, o que se deu foi a ampliação de competência com base em alteração do substrato básico de incidência da jurisdição trabalhista, substituindo-se a relação ‘empregador x empregado’ pelo conceito jurídico muito mais amplo de ‘relação de trabalho’, o que, obviamente, houve por trazer repercussão na seara dos agentes públicos, como se depreende da novel redação do dispositivo acima transcrito:

CF/88 – Art. 114. Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar:

I – as ações oriundas da relação de trabalho, abrangidos os entes de direito público externo e da administração pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios.

De qualquer forma – e baseado no nítido viés ampliativo da reforma constitucional –, o que há de ser dito é que tal alteração acirrou os debates quanto à submissão dos agentes públicos, em termos gerais, à jurisdição trabalhista, sobretudo porque, como já visto, inúmeras são as formas utilizadas pelo Estado a fim de arregimentar tais agentes, o que influirá na futura definição do órgão jurisdicional competente para as lides daí advindas – que, sem dúvidas, estarão

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albergadas dentro do conceito ‘relação de trabalho’.6

De fato, a dúvida surgida diante de tal reforma constitucional reside no alcance da expressão ‘relação de trabalho’, a abarcar ou não as lides advindas de agentes públicos de regime jurídico-administrativo, detentores de cargo público.

Em anotação sintética, vê-se que a celeuma instaurada quanto à tutela jurisdicional de tais agentes públicos foi dirimida pelo Supremo Tribunal Federal que, ao interpretar e dar a última palavra sobre o ordenamento jurídico-constitucional, travou posição no sentido de que “o disposto no art. 114, I, da Constituição da República, não abrange as causas instauradas entre o Poder Público e servidor que lhe seja vinculado por relação jurídico-estatutária”.7

Assim, muito embora pareça-nos finalizada tal celeuma – o que não é verdade8 –, ainda resta discussão em tal temática, sobretudo se trouxermos à baila a tutela da higiene, segurança e saúde do trabalho, naquilo que é concernente aos agentes públicos, conforme se discutirá a seguir.

4 . T U T E L A D O S A G E N T E S P Ú B L I CO S N O Q U E T O C A À H I G I E N E , S E G U R A N Ç A E SAÚDE DO TRABALHO: O REGIME DE EM -P R E G O P Ú B L I CO E O R E G I M E J U R Í D I CO --ADMINISTRATIVO

Passada a questão inicial da parcela de jurisdição competente para julgamento dos agentes públicos – sejam detentores de cargo ou ocupantes de emprego –, é de ver-se que, em atuação jurisdicional recente, o Supremo Tribunal Federal houve de enfrentar novamente a matéria, ao menos de forma reflexa, quando do julgamento de questão afeta à tutela da higiene, segurança e saúde

6 Ainda que se possam vislumbrar notórias discussões quanto à correta extensão do conceito jurídico de ‘relação de trabalho’ – seja na doutrina, seja na jurisprudência –, vale dizer que tais escapam ao âmbito deste estudo, que há de subsumir-se à questão dos agentes públicos.

7 Veja-se, para tal, a íntegra da ADI n. 3.395, proposta pela Associação dos Juízes Federais – AJUFE.

8 Bom anotar, no ponto, que muitos estudiosos de renome – sobretudo do âmbito trabalhista – ainda travam posição no sentido oposto ao que decidido pelo STF, embora este não seja o objetivo do presente estudo.

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do trabalho.Em específico, é de se dizer que tal matéria situa-se naquilo

que se costuma designar de tutela do meio ambiente do trabalho, a abranger a higiene, segurança e saúde, cujos fundamentos de proteção são trazidos, expressamente, na própria Constituição Federal9 e em legislação infraconstitucional.10

De todo modo – e voltando ao caso submetido ao crivo do Supremo –, o que se deu foi que, no julgamento da Reclamação n. 3.303/PI, da Relatoria do Ministro Carlos Britto, se discutiu novamente a submissão de agentes públicos à jurisdição trabalhista, mormente naquilo que concerne à já citada higiene, segurança e saúde do trabalho. Assim, para análise minuciosa da temática, eis trecho do relatório da presente ação constitucional, salientando resumo do pleito encartado na mesma.

O nobre Ministério Público do Trabalho, por sua Procuradoria Regional da 22ª Região, instaurou Inquérito Civil Público e, posteriormente, ajuizou Ação Civil Pública, com pedido de medida liminar, junto à 2ª Vara Federal do Trabalho de Teresina, em face do Estado do Piauí, pretendendo a observância por parte do réu de normas de saúde, segurança e higiene do trabalho, no âmbito do Instituto de Medicina Legal do Estado – IML, setor da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Piauí, órgão da Administração Direta estadual.

Em sua defesa, o Estado do Piauí, de logo, argüiu a ilegitimidade do Ministério Público do Trabalho, uma vez que suas atribuições visam à proteção de

9 Daí um dos supedâneos constitucionais a ensejar a interferência do Supremo em tais questões. Veja-se, por oportuno, uma referência expressa ao meio ambiente do trabalho na Constituição – a par de outras de incidência sistemática e/ou indireta: CF/88 – Art. 200 – Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições, nos termos da lei: VIII – colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalho.

10 Cite-se dentre outros, no ponto, a própria CLT, em seu Título II – Das Normas Gerais de Tutela do Trabalho, Capítulo V – Da Segurança e Medicina do Trabalho.

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direitos pertinentes às relações de emprego, em face de violação às normas celetistas, o que não ocorre no presente caso. Alegou, ainda, a incompetência absoluta da Justiça do Trabalho, em face do disposto no art. 114 da Constituição Federal, tendo em vista que o objeto da referida ação se referia à suposta violação de normas de saúde, segurança e higiene do trabalho em órgão da Administração Direta do Estado, que tem seus funcionários submetidos a regras de estatuto próprio de ordem administrativa e não celetistas. Em outras palavras, inexiste relação de emprego que justifique a competência daquela justiça especializada.

Não obstante toda argumentação desenvolvida nos referidos autos pelo Estado do Piauí, a douta Vara Federal do Trabalho reconheceu legitimidade ao Ministério Público do Trabalho para mover a referida ação, bem como se considerou competente para apreciar e julgar o presente.11

Logo após tal introdução, o Ministro Relator vislumbrou que os agentes públicos em questão – lotados no IML do Estado do Piauí – não detinham com o referido Estado uma vinculação de caráter estatutário, cravando nesse ponto – e ao menos como recurso para sua fundamentação para não acolher a Reclamação – a possibilidade de serem jurisdicionados pela Justiça Laboral no presente caso.

O que se vê, pois, é que no julgamento da citada Reclamação o STF houve por decidir que não houve afronta à competência por ele definida para o julgamento das relações advindas de agentes públicos estatutários (detentores de cargo público), mormente em cima de dois grandes conjuntos de argumentos, trazidos pelo Ministro Relator: 1) não haveria afronta à competência trabalhista, porquanto a ação civil

11 STF – Reclamação n. 3.303/PI.

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pública tinha como objeto exigir o cumprimento, pelo Poder Público Piauiense, das normas trabalhistas relativas à higiene, segurança e saúde dos trabalhadores; 2) as relações jurídicas mantidas entre os trabalhadores do Instituto Médico legal piauiense e o Estado não detinham caráter estatutário.

E tal foi assim, porque a estreita via da Reclamação enseja apenas o cotejo entre a decisão em controle de constitucionalidade (in casu, a ADI 3.395) e aquilo que alegado pelo Reclamante; desta feita, ou se respeitou a decisão provinda da jurisdição constitucional, ou não. No caso específico, teve-se que a mesma foi respeitada, eis que não se discutia na Ação Civil Pública originária intentada pelo Ministério Público do Trabalho a natureza do vínculo existente entre os agentes e o Estado do Piauí.

Assim, muito embora a saída dada pelo Tribunal tenha sido ligada ao processo constitucional da Reclamação e seu objeto, importa notar que, nos debates havidos naquela Corte Suprema, fora ao menos cogitada e ventilada a questão que ora se defende, qual seja: a competência do Judiciário Trabalhista para o deslinde das questões afetas à higiene, segurança e saúde do Trabalho, tanto de servidores estatutários como de celetistas, sobretudo porque em tais ações não se discute nada relacionado ao vínculo havido, mas sim às condições de trabalho, em sentido lato. Há de ser seguida, pois – e para todos agentes públicos –, a orientação dada na Súmula n. 736 do Supremo Tribunal Federal:

Súmula 736, STF – Compete à Justiça do Trabalho julgar as ações que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores.

Corroborando com tal entendimento, basta notar que, para os servidores detentores de cargo público (estatutários), a Constituição da República, em seu art. 39, §3º, traz a incidência do art. 7º, XXII, também constitucional, no seguinte sentido:

CF/88 – Art. 39, § 3º Aplica-se aos servidores ocupantes de cargo público o disposto no art. 7º, IV, VII, VIII, IX, XII,

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XIII, XV, XVI, XVII, XVIII, XIX, XX, XXII e XXX, podendo a lei estabelecer requisitos diferenciados de admissão quando a natureza do cargo o exigir.

CF/88 – Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

XX I I - re d u ç ã o d o s r i s co s inerentes ao trabalho, por meio de normas de saúde, higiene e segurança;

Resta clara, desta feita, a necessária tutela do meio ambiente do trabalho de tais agentes públicos, não obstante serem, in casu, classificados como estatutários ou não. Em adição, é de ver-se que os Ministros da Corte Suprema, ainda que em obiter dictum, anotam uma pretensa possibilidade de que o Ministério Público tutele, na Justiça Laboral, as condições do meio ambiente do trabalho, a despeito do vínculo havido entre agente público e Estado, principalmente com espeque nas atribuições e funções institucionais do órgão ministerial afetas à defesa da ordem jurídica, em sentido amplíssimo: vide art. 129, II, da CF/88:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:

II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;

Vejamos, por elucidativo, trecho dos debates travados na Corte quando do julgamento da precitada ação constitucional, a registrar e apontar tendência que, no presente estudo, entendemos salutar para o fiel desenvolvimento da ampla proteção ao trabalhador – e da sua dignidade, por óbvio –, de notório cunho constitucional e que, ademais, por sua longínqua especialização, não pode ser subtraída da competência trabalhista, a despeito da natureza do

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vínculo eventualmente existente entre agentes públicos e Estado12:O SENHOR MINISTRO CELSO

DE MELLO: Há um aspecto interessante: como se cuida de uma ação civil pública, o próprio Ministério Público do Trabalho, que a promove (e interveio nesse processo como interessado), destaca a inocorrência de ofensa à nossa decisão proferida na ADI 3.395/DF, ao salientar que a Súmula 736/STF reconhece a competência da Justiça do Trabalho para julgar ações – como esta – “que tenham como causa de pedir o descumprimento de normas trabalhistas relativas à segurança, higiene e saúde dos trabalhadores” (fls. 185).

Observou-se, ainda, que os trabalhadores do IML não têm vínculo estatutário nem estão submetidos a regime especial. Quer dizer, trata-se, no caso, de uma decisão judicial, proferida em sede de ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho, contra determinada entidade estatal, em decorrência de suposto descumprimento, pelo Poder Público local, de normas de saúde, de higiene e de segurança do trabalho. Descumprimento que, alegadamente, ocorreria no âmbito de uma determinada autarquia estadual ou mesmo no de um órgão da administração pública centralizada.

O fato é que essa “causa petendi” estaria a sugerir, longe de qualquer debate sobre a natureza do vínculo (se laboral, ou não, se de caráter estatutário, ou não), que se

12 De qualquer sorte, nem se mencionam, por ora, as correntes doutrinárias – já aludidas alhures – que trazem uma expressão notadamente ampliativa da jurisdição trabalhista, com espeque na interpretação do conceito jurídico de ‘relação de trabalho’ disposto no art. 114, I, da CF/88, mas tão somente a questão da tutela da higiene, segurança e saúde do trabalho, a quem quer que seja.

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pretende, na realidade, e numa perspectiva de pura metaindividualidade, provocada pela iniciativa do Ministério Público, saber se normas referentes à higiene e à saúde do trabalho estariam sendo observadas, ou não, por determinado ente público.

O E X C E L E N T Í S S I M O S E N H O R M I N I S T R O M E N E Z E S DIREITO: Exatamente por esse aspecto o Relator não enfrentou a questão do vínculo. Examina-se, na realidade, apenas a justiça competente para julgar uma ação civil pública relativa à higiene do trabalho.

O S E N H O R M I N I S T R O CARLOS BRITTO (RELATOR): Que seria a Justiça do Trabalho.

O E X C E L E N T Í S S I M O S E N H O R M I N I S T R O M E N E Z E S DIREITO: Nesse sentido, o precedente não foi violentado, por isso a reclamação é julgada improcedente.13

5. CONCLUSÃO

Bem de ver, ante o exposto, que as expressões acima fomentam e reiteram o posicionamento aqui explanado e defendido, tendo-se como possível – e até recomendável – a incidência da jurisdição trabalhista aos agentes públicos em casos que tais; seja pela notória especialização da qual se reveste o Judiciário Trabalhista (e seus próprios agentes) para as lides que versam sobre a tutela do meio ambiente do trabalho, seja – e ora com muito mais peso – pelo fato de que tais lides prescindem da verificação do vínculo havido entre o agente e o Estado, eis que a proteção é direcionada ao meio ambiente do trabalho – de estatura constitucional –, como legítimo

13 STF – Reclamação n. 3.303/PI.STF – Reclamação n. 3.303/PI.

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bem jurídico a ser tutelado.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARAÚJO, Edmir Netto de. Curso de direito administrativo. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010.

BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de direito administrativo. 18. ed. São Paulo: Malheiros, 2005.

BARRO, Alice Monteiro. Curso de direito do trabalho. 2. ed. São Paulo: LTr, 2006.

CAIRO JÚNIOR, José. Curso de direito do trabalho: direito individual e direito coletivo do trabalho. 4. ed. Salvador: Juspodium, 2009.

COUTINHO, Grijalbo Fernandes; FAVA, Marcos Neves (Coord.). Justiça do trabalho: competência ampliada. São Paulo: LTr, 2005.

CUNHA JÚNIOR, Dirley. Curso de direito administrativo. 8. ed. Salvador: Juspodium, 2009.

MARTINS, Sérgio Pinto. Direito do trabalho. 21. ed. São Paulo: Atlas, 2005.

SARAIVA, Renato. Curso de direito processual do trabalho. 7. ed. São Paulo: Método, 2010.

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REFLEXOS DA INADMISSIBILIDA-DE DOS EMBARGOSDECLARATÓRIOS NO PRAZO DO RECURSO ORDINÁRIO

José Geraldo da FonsecaDesembargador Federal do Trabalho do TRT da 1ª Região - Rio de Janeiro

7Sumário:1. Introdução;2. Etimologia e Origem Histórica dos Embargos Declaratórios;3. Quem pode embargar;4. Natureza Jurídica dos Embargos Declaratórios;5. Efeitos dos Embargos Declaratórios;6. Reflexos da Inadmissibilidade dos Embargos Declaratórios

no Prazo do Recurso Ordinário

1. Introdução

Nada é mais difícil de enxergar do que o óbvio. Talvez por isso se dispense aos embargos declaratórios tão pouca atenção doutrinária. A banalização do seu uso é tanta que os juízes, de regra, recebem sua interposição não como uma oportunidade rara de aclarar a decisão com novos subsídios para que a jurisdição se complete, mas como postergação, ou uma reprimenda velada, uma espécie de puxão de orelhas pela contradição interna do julgado, pela dicção capenga ou por se ter deslembrado de examinar ponto litigioso sobre o qual se reclamou um expresso juízo de valor.

Embora a lei diga que embargos são recursos, nem mesmo isso é pacífico entre os doutores. Objeta-se, com razões de sobra, que

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o fato de, por opção legislativa, estarem topograficamente localizados no capítulo dos recursos, não os faz recursos, porque daqueles não têm os pressupostos mínimos.

Dos efeitos naturais da interposição dos embargos declaratórios, um, em especial, merece dobrada reflexão pelas consequências que traz ao devido processo legal: a interrupção do prazo para a interposição do recurso subseqüente. Alguns juízes trabalhistas têm emprestado aos embargos declaratórios interpostos contra sentenças e acórdãos um tipo de efeito que eles não têm, ou lhes negado efeito que efetivamente têm. Esses juízes sustentam que os embargos de declaração não conhecidos por falta de um ou mais requisitos intrínsecos ou extrínsecos de admissibilidade não interrompem o prazo para a interposição do apelo subseqüente — no caso do processo do trabalho, o recurso ordinário de que trata o art. da CLT —, e, fiando-se nisso, denegam seguimento ao recurso interposto após a intimação da sentença que julga os embargos.

Até que ponto isso é correto?É disso que este estudo trata.

2. Etimologia e Origem Histórica dos Embar-gos Declaratórios

“Embargo” provém do verbo latino imbarricare, que significa prender a barra, embaraçar, estorvar, opor obstáculo1. Embargar é impedir que a decisão judicial passe de logo em julgado e cumpra a sua finalidade essencial. De raízes romanas2, os declaratórios chegaram até nós por mãos portuguesas, previstos, inicialmente, nas três Ordenações reinóis3 e, depois, nos arts. 641 a 643 do Regulamento nº 737, de 1.850, e na Consolidação Ribas. Posteriormente, foram disciplinados nos arts. 682, 683 e 687 do D.nº 3.083, de 5 de novembro de 1858 e, por último, no art.683 do D.nº 3.084, de 1898, já então com o perfil mais próximo ao do que temos hoje. A Constituição de 1891

1 BORGES, Marcos Afonso. Embargos infringentes. Ed. Saraiva, SP, 1992, p.15.

2 A origem romana dos embargos declaratórios não é aceita por Manoel Antonio Teixeira Filho, Sistema dos Recursos Trabalhistas, Ed. LTr, SP,5ª edição, 1991,p.309 nem por Sérgio Pinto Martins, Direito Processual do Trabalho, Ed.Atlas, SP., 23ª edição, p.485.

3 Nas Afonsinas, Livro II, t.69,§4º; nas Filipinas, Livro II, t.66,§6º; e nas Manuelinas, Livro II, t.50,§5º.

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permitia aos Estados-membros legislarem sobre direito processual e, por conta disso, os embargos declaratórios tiveram disciplina díspar nos diversos Códigos estaduais, dentre esses o do Rio Grande do Sul4; o da Bahia5; o de Minas Gerais6; o do Distrito Federal7; o de São Paulo8; o do Rio de Janeiro9; o de Pernambuco10; o de Santa Catarina11; o do Ceará12 e o do Paraná13.

A Constituição de 1934 reservou à União competência exclusiva para legislar sobre direito processual e, a partir daí, editou-se o DL nº 1608, de 18/11/39, que instituiu o primeiro código unitário de direito processual, revogado, em 11/1/73, pela L. nº 5.869, que instituiu o Código de Processo Civil e passou a regular os embargos declaratórios nos arts. 463,II, 464, 465 e 535 a 538, segundo sejam interpostos contra sentença ou acórdão.

Até a edição da L. nº 2.244, de 23/6/54, a CLT era omissa sobre embargos. Com a nova redação do art.702, II, letra “e” e §2º, letra “d”, os embargos passaram a ser admitidos contra acórdãos do Tribunal Pleno ou das Turmas do TST. Atualmente, sua previsão está no art.897-A da CLT. Nos embargos declaratórios não se quer que o juiz redecida, mas que reexprima14, para que somente então a prestação jurisdicional seja completa, ainda que, do ponto de vista da parte, não inteiramente satisfatória. Nessa medida, ainda que com nítida natureza integrativa15, concorrem para a efetivação do due process of law16.

4 L.nº15, de 16/1/1908, art.510.

5 L. nº 1.271, de 21/8/1915, arts.1239 a 1241.

6 Código de Processo Civil e Comercial, arts.1439 a 1441.

7 Decreto nº 16.752, de 31/12/1924.

8 L. nº 2421, de 15/1/1930, art.335.

9 L. nº 1.580, de 20/1/1919, art.2333.

10 Arts.1434 a 1438.

11 Código Judiciário de Santa Catarina, art.1385.

12 Art.1401.

13 L. nº 915, de 23/2/1920, arts. 697 e 756.

14 PIMENTEL, Wellington Moreira. Comentários ao Código de Processo Civil, São Paulo, RT, 2ª edição, vol.III, p.531.

15 CPC, arts.463 e 535

16 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Omissão judicial e Embargos de Declaração. Ed. RT,

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3. Quem pode embargar

Podem interpor embargos declaratórios todos quantos, de modo direto ou indireto, possam ser alcançados pelos efeitos da decisão17. O prazo de interposição, antes de 48h contra sentenças18, e de cinco dias contra acórdãos19, é de 5 dias contra aquelas e estes20, interponíveis contra sentenças terminativas ou definitivas, decisões, em sentido lato ― por expressa autorização da Orientação Jurisprudencial nº 74 da SBDI-II do C. TST, até mesmo contra “despacho monocrático”, em rigor decisões monocráticas, que não são, tecnicamente, sentenças ― e acórdãos, não com a natureza de recurso, mas de meio de esclarecimento do julgado, simples incidente processual cujo objetivo é o aperfeiçoamento da decisão21. É pobre de fundamentos a tese de que o Ministério Público e as entidades referidas no DL nº 779/69 dispõem de prazo dobrado para embargos22. Esse privilégio não está nos arts. 897-A da CLT e 536 do CPC, não bastasse pesar contra tal tese a evidência de que embargos não são recursos23.

4. Natureza Jurídica dos Embargos Declarató-rios

Não há consenso na doutrina sobre a natureza jurídica

São Paulo, 2005, p.18.

17 CPC,art.499: Partes, o assistente, simples ou litisconsorcial, o perito, o Ministério Público etc.

18 CPC, art.465. CPC, art.465.

19 CPC, art.536. CPC, art.536.

20 CLT,art.897-A e CPC, art.536. CLT,art.897-A e CPC, art.536.

21 MARTINS, Sérgio Pinto, Direito Processual do Trabalho, Atlas,SP.,23ª Ed.,2005,p.486.

22 MARTINS, Sérgio Pinto, op.cit.,p.490.

23 DIDIER JR, Fredie; DA CUNHA, Leonardo José Carneiro, op.cit.,p.200, dizem: “Em se tatando de parte representada por defensor público, o prazo será contado em dobro, pois o defensor público dispõe dessa prerrogativa de prazos em dobro(L.nº 1.060/50,art.5º, §5º). O Ministério Público e a Fazenda Pública dispõem igualmente de prazo em dobro para a oposição dos embargos declaratórios(CPC,art.198). Havendo litisconsorte com procuradores diferentes, o prazo para opor embargos declaratórios também deve ser computado em dobro”.

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dos embargos de declaração24. Por opção legislativa, são recurso25. Conceitualmente, não o são. É preciso separar o joio. Com essa natureza ― recurso ―, não há instituto semelhante no direito comparado26, e até mesmo a legislação portuguesa, que nos serviu de semente, não mais lhes empresta tal27. A presença dos embargos declaratórios no sistema recursal parece ter como fundamento a garantia constitucional de que aquele que se socorre do Judiciário tem o direito de ver a sua questão decidida de modo claro, fundamentado e justo.

“Recurso” provém de recursus, de recurrere, que significa retorno, regresso, caminho de volta, retroação, refluição. O sentido é daquilo que tem o curso ao contrário, aquilo que regressa ao ponto de partida, que retoma ― re ― o seu curso ― cursus―, o seu caminho28. Por embargos não se pede modificação do julgado, ou sua substituição, mas esclarecimentos. São meio posto ao alcance da parte para pedir ao juiz que torne clara a decisão. Todo recurso tem princípios e pressupostos que precisam ser de antemão satisfeitos, e que, por certo, não estão presentes nos embargos de declaração29, por isso o dissenso sobre a sua natureza jurídica. Em sentido amplo, recurso é o remédio jurídico adequado para que o vencido, total ou parcialmente, possa obter, dentro do mesmo processo, a reforma, a invalidação, o esclarecimento ou a integração da prestação jurisdicional consubstanciada na sentença ou no acórdão. É o meio processual estipulado pelo legislador para permitir à parte o reexame de determinada decisão e obter a sua anulação, reforma total ou parcial, ou a sua substituição30. Está implícita na expressão recurso a idéia de que a situação que se quer corrigir por meio dele fugiu

24 VALENTIM CARRION, Comentários à CLT, Ed. Saraiva, SP, 2002,23ª ed, p.742 e SÉRGIO PINTO MARTINS,op.cit.,p.486 não reconhecem natureza recursal aos embargos.

25 L.nº. 8.950/94.

26 MAZZEI, Rodrigo Reis. Embargos de Declaração in Dos Recursos ― Temas Obrigatórios e Atuais, v. II, publicação do Instituto Capixaba de Estudos, Vitória,ES, 2002, p.287.

27 MAZZEI, Rodrigo Reis, op.cit., p.288.

28 MARTINS, Sérgio Pinto,op. cit, p.398.

29 Assim, por exemplo, o duplo grau de jurisdição, o preparo, a sucumbência, a voluntariedade, a dialeticidade, a complementariedade, a non reformatio in pejus, a consumação, o “tantum devolutum quantum appellatum”, entre outros.

30 MARTINS, Sérgio Pinto, op.cit.,p.389.

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à sua destinação natural. Se a L. nº 8.950/94 pôs fim à controvérsia sobre sua natureza jurídica e os apelidou recurso31, o que, de resto, já estava no art.496 do CPC, com a redação da L. nº 8.038/90, o conforto de se achar que algo é porque alguém ou alguma coisa diz que é tem o incômodo de esconder a essência das coisas, e dar primazia ao nome em vez do conceito. A natureza recursal dos embargos é atípica, anômala, restrita, porque não têm a mesma finalidade dos demais recursos previstos do art.496 do CPC, ou dos admitidos em leis extravagantes, ad esempio os do art.34 da L. nº 6.830/8032 e os do art.42 da L. nº 9.099/9533. Seriam, se tanto, “recursos de fundamentação vinculada”, na medida em que aquele que embarga somente pode fazê-lo nas hipóteses expressamente taxadas na lei, isto é, omissão, obscuridade e contradição e, excepcionalmente, como forma de exigir do juiz a correção de erro material, ou examinar vício acerca de matéria de ordem pública34. Enquanto nos recursos, em sentido estrito, o sucumbente quer a reforma, a modificação, a invalidação ou a ampliação do conteúdo do ato decisório, o que pede por meio dos declaratórios não é a substituição da decisão guerreada, mas a sua integração. Ainda quando se empreste aos embargos efeitos infringentes, isto é, modificativos, de modo que a sentença ou o acórdão sejam parcial ou totalmente absorvidos pela nova decisão neles proferida, tecnicamente não se quis a sua substituição ou reforma, mas a sua integração, que, em determinadas circunstâncias, pode mudar radicalmente a conclusão do julgado. Mesmo nessa hipótese, em que o efeito infringente dos embargos declaratórios altera radicalmente a conclusão do julgado embargado, entende-se que a alteração de conteúdo é simples efeito secundário da integração pretendida nos declaratórios. Afirma-se que o julgador, ao dar provimento aos embargos de declaração e esclarecer, completar ou integrar o conteúdo decisório do primeiro julgamento, altera as premissas de seu raciocínio para concluir que a integração pretendida pelo embargante é de tal modo substancial que o obriga a consignar na decisão de embargos aquilo que, efetivamente, desejou, sem êxito,

31 CPC, art.496, IV.

32 Lei de Execução Fiscal.

33 Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais.

34 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim, op.cit.,p.63.

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remarcar na primeira decisão35.

5. Efeitos dos Embargos Declaratórios

Os efeitos mais elementares de qualquer recurso são o devolutivo ― a apelação devolve ao tribunal o conhecimento de tudo aquilo contra o qual se apela —, o suspensivo ― o apelo obsta os efeitos da sentença e a formação da coisa julgada até o trânsito em julgado da decisão — e o substitutivo — a decisão sobre o mérito do apelo substitui inteiramente a decisão recorrida36—, mas a doutrina também refere ao translativo ― o julgador “ad quem” pode julgar fora dos limites da apelação nos casos das matérias de ordem pública ou que deva conhecer de ofício ― e ao expansivo — vencido o juízo de admissibilidade, o órgão “ad quem” pode proferir decisão mais abrangente do que o simples reexame da matéria impugnada trazida pelo mérito do recurso37 —.

Foi dito que a jurisdição é inerte38. O efeito devolutivo dos embargos é a revelação de seu caráter dispositivo. O que a desperta é o ato de disposição da parte. Por outro lado, o juiz deve julgar a lide nos limites do pedido, e estes são fixados pela petição inicial39. Quando embarga, a parte deduz frente ao juízo prolator da decisão hostilizada não um pedido novo, mas um pedido de aclaramento da decisão anterior, cujos contornos haviam sido fixados na petição inicial. Os embargos declaratórios não deixam de ter efeito devolutivo apenas por

35 MAZZEI, Rodrigo Reis, op.cit.,p.302.

36 CPC, art.512.

37 NERY JR,Nelson, Princípios Fundamentais — Teoria Geral dos Recursos, Ed.RT, SP,4ª edição,404/405 informa, ainda, que a doutrina usualmente fala também em efeito expansivo interno e efeito expansivo externo. Dá exemplos: ao apreciar apelação (ou, no caso do processo do trabalho, recurso ordinário) interposta contra sentença de mérito, o tribunal dá-lhe provimento e acolhe preliminar de litispendência. Essa decisão, sobre questão preliminar, expande-se por toda a sentença, invalidando-a, pois o resultado efetivo do julgamento é a extinção do processo sem resolução do mérito, na forma do art.267, V, do CPC. O efeito expansivo externo dá-se no julgamento do agravo de instrumento, ad esempio. Em regra, agravos não têm efeito suspensivo, mas, provido o agravo pelo tribunal, todos os atos processuais praticados no interregno que vai de sua interposição ao julgamento serão inválidos se incompatíveis com a nova decisão proferida nesse agravo, e devem ser repetidos. Assim, também, nos casos de execução provisória de sentença cujo recurso foi recebido apenas no efeito devolutivo.

38 CPC,art.2º. CPC,art.2º.

39 CPC, arts.128 e 460 CPC, arts.128 e 460

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que são interpostos para o mesmo juízo prolator da decisão recorrida. Como dito, sua função essencial é aclarar a decisão, e não reformá-la. Como regra, ao apreciar embargos o juízo sentenciante não profere novo julgamento, e sim aclara a decisão anterior. Excepcionalmente, quando supre omissão, o caráter infringente dos embargos autoriza o juiz a prolatar nova decisão, “pois diz mais do que continha a decisão anterior”40.

O efeito suspensivo é uma qualidade do recurso que posterga a produção dos efeitos da decisão embargada para o momento do trânsito em julgado41. A suspensividade somente pode ocorrer se a decisão embargada for recorrível, o que não é o caso, por exemplo, das sentenças de alçada42. Embora na constância da suspensividade não se possa, como regra, praticar atos de sequência do procedimento, o juiz pode determinar providências urgentes, que visem à conservação da coisa ou a evitar o perecimento do direito43.

O efeito substitutivo dos embargos declaratórios somente estará presente nos casos de conhecimento, ainda que não se lhes dê provimento de mérito44. Superado o exame dos pressupostos de admissibilidade dos embargos, o órgão julgador pode dar-lhes provimento, no todo ou em parte, ou simplesmente negar-lhes provimento. Se modifica a decisão, aclarando-a, esta nova decisão substitui a anterior, porque é a única que passa a valer no processo. A substitutividade dos embargos se dá mesmo que o órgão julgador lhes negue provimento. Assim é porque o que passa a valer no processo não é a decisão embargada, mas a proferida nos embargos, que confirma a decisão recorrida por não vislumbrar nos embargos qualquer das condições do art.535 do CPC45. Penso que não se possa aplaudir a lição de que o efeito substitutivo do recurso — e aqui me refiro especificamente aos embargos declaratórios — somente se dá quando se tratar de recurso contra error in judicando, ou contra error in procedendo ao qual se nega provimento. Segundo esse entendimento,

40 NERY JR, Nelson. NERY JR, Nelson. op. cit, p.369.

41 NERY JR, Nelson, op.cit.,p.376. NERY JR, Nelson, op.cit.,p.376.

42 L. nº 5584/70. L. nº 5584/70.

43 NERY JR, Nelson, op.cit.,p.378/379. NERY JR, Nelson, op.cit.,p.378/379.

44 NERY JR, Nelson, op.cit.,p.4l5/416. NERY JR, Nelson, op.cit.,p.4l5/416.

45 NERY JR, Nelson., op.cit.,p.416. NERY JR, Nelson., op.cit.,p.416.

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quando se dá provimento aos embargos interpostos contra decisão com error in judicando, substitui-se a decisão anterior, por outra. O mesmo efeito ocorreria nos casos de improvimento de embargos contra sentença com error in procedendo porque, nesse caso, se manteria incólume a sentença embargada. Mas, na hipótese de se dar provimento aos embargos contra sentença com error in procedendo, o julgamento posterior anularia a sentença atacada, e não haveria o que substituir46. Intuo que mesmo que se acolha a tese de error in procedendo e se anule a sentença, o efeito substitutivo estará presente justamente porque essa nova decisão substitui a antiga, e é a única que prevalecerá no processo. Tratando-se de embargos declaratórios, a natureza infringente, de que podem ser dotados, permite essa alteração, o que mais reforça a evidência de que o efeito substitutivo pode estar presente mesmo no caso de error in procedendo. O art.897-A, parte final, da CLT, cogita de outro fundamento para cabimento do efeito modificativo da decisão por embargos, além dos de omissão e contradição no julgado. Fala em “manifesto equívoco no exame dos pressupostos extrínsecos do recurso”, isto é, preparo, tempestividade e regularidade formal47.

6. Reflexos da Inadmissibilidade dos Embargos Declaratórios no Prazo do Recurso Ordinário

Quando diz que nenhum juiz prestará a jurisdição senão depois de provocado48, a lei quer dizer que a jurisdição é inerte49. O ato de reclamar o exercício da atividade jurisdicional é, por assim dizer, primal, o que inaugura a jurisdição, desperta a jurisdição da sua inércia. O exame da validade desse ato postulatório é o exame da validade do próprio procedimento, do qual esse ato faz parte50. Todo ato postulatório, qualquer que seja, se sujeita a um duplo exame

46 NERY JR, Nelson, op.cit.,p.416. NERY JR, Nelson, op.cit.,p.416.

47 DIDIER JR, Fredie e CARNEIRO DA CUNHA, Leonardo José, Curso de Direito Processual Civil ― Meios de Impugnação às Decisões Judiciais e Processo nos Tribunais, v. III, Ed. Podivm, 6ª ed.,2008,p.45.

48 CPC, art. 535.

49 CPC, art.2º. CPC, art.2º.

50 DIDIER JR, Fredie e CARNEIRO DA CUNHA, Leonardo José, op.cit.,p.43.

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pelo juiz da causa. Num primeiro juízo, verifica-se se o conteúdo da postulação é possível: trata-se de juízo de admissibilidade ou de inadmissibilidade. No segundo, se, sendo possível, a pretensão procede ou improcede: trata-se de juízo de procedência ou de improcedência. Somente se chega ao segundo juízo ― se a pretensão procede ou improcede ― se superado, com êxito, o juízo de admissibilidade51. Quando o órgão julgador não pode superar o juízo de admissibilidade do recurso, diz-se que o apelo não foi admitido, ou não foi conhecido. O juízo de admissibilidade opera no plano da validade dos atos jurídicos52, pertence à teoria geral do processo e se aplica ao procedimento53. Apóia-se em pressupostos de admissibilidade, que se dividem em intrínsecos e extrínsecos. Os intrínsecos dizem respeito à própria existência do poder de recorrer: cabimento, legitimação, interesse e inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer. Os extrínsecos, referem-se ao modo de exercitar o direito de recorrer: preparo, tempestividade e regularidade formal54. Como todo recurso, os embargos declaratórios sujeitam-se a esses dois juízos.

Questão que ainda desafia a doutrina trabalhista diz respeito aos efeitos do não-conhecimento dos embargos declaratórios na contagem do prazo de interposição do recurso ordinário. Na antiga redação dos arts.464 e 535 do CPC, a interposição dos embargos declaratórios suspendia o prazo de interposição do recurso seguinte. Hoje, embargos interrompem o prazo de qualquer outro recurso, mesmo para a parte que não embargou55. Na suspensão, o prazo peremptório para o aviamento do recurso subseqüente fluía inexoravelmente, mesmo em face da interposição dos embargos, de sorte que a parte, dispondo de oito dias para interpor o recurso ordinário, ou de quinze para o de apelação, e tendo aviado embargos no 3º dia do prazo, somente poderia dispor dos cinco dias sobejantes para manejar o recurso próprio, se se tratasse do recurso ordinário do processo do trabalho, ou de doze, se se tratasse de apelação do

51 MOREIRA, José Carlos Barbosa. Comentários ao Código de Processo Civil, Forense, RJ, 2003, 11ª edição, v. V, p.262.

52 DIDIER JR, Fredie e CARNEIRO DA CUNHA, Leonardo José,op.cit.,p.41.

53 NERY JR, Nelson. Teoria geral dos recursos.Ed. RT,SP, 2004,6ª Ed.,p.255.

54 DIDIER JR, Fredie e CARNEIRO DA CUNHA, Leonardo José, op.cit.,p.45.

55 O art.50 da L. nº 9.099/95(Lei dos Juizados Especiais Cíveis) diz que os embargos suspendem o prazo de qualquer outro recurso.

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processo civil. Com a interrupção, todo o prazo é-lhe devolvido por inteiro a partir da intimação da sentença que julgar os embargos.

Questão interessante, já examinada em concreto56, diz com a extensão da expressão “para todos os outros recursos”, constante da regra de direito. Imagine-se que, proferida uma sentença, um dos litigantes interpõe embargos de declaração. Como está no art.538 do CPC, esse ato faz interromper o prazo de qualquer outro recurso para ambas as partes, inclusive para aquela que não embargou. Seria possível que, após a decisão desses embargos, e já que o prazo de qualquer outro recurso está suspenso para todos, a parte que não embargou interpusesse embargos de declaração não contra a sentença que decidiu os embargos do adversário, mas contra a sentença originária, que inicialmente não havia embargado? O STJ decidiu que sim, mas a solução não é bem-vinda na doutrina57. O correto — concordo — seria admitir embargos declaratórios apenas contra a sentença que decidiu os embargos, pela própria parte ou pela parte contrária, até porque a parte que embargou não pode, depois de julgados os seus embargos, continuar embargando a sentença já embargada, ainda que por outros fundamentos, mas apenas a sentença que decidiu os embargos de declaração58.

A L. nº 8.950/94 modificou a disciplina dos declaratórios para restringir seu cabimento aos casos de omissão, obscuridade ou contradição, não mais admitindo embargo por dúvida, e dizendo, expressamente, que a sua interposição interrompe o prazo de interposição de qualquer outro recurso59. Não está na lei nem em qualquer compêndio de doutrina que o não-conhecimento dos embargos, por falta de qualquer dos pressupostos de admissibilidade, impede a interrupção do prazo de interposição do recurso subseqüente. Como dito, no juízo de admissibilidade o juiz verifica a satisfação dos pressupostos intrínsecos(cabimento, legitimação, interesse e inexistência de fato impeditivo ou extintivo do poder de recorrer) e extrínsecos (preparo, tempestividade e regularidade formal) de admissibilidade dos embargos. Ainda que esses embargos não possam

56 STJ — REsp. nº 444.162-GO. STJ — REsp. nº 444.162-GO.

57 DIDIER JR, Fredie; CARNEIRO DA CUNHA, Leonardo José, op.cit.,p.188.

58 DIDIER JR, Fredie; CARNEIRO DA CUNHA, Leonardo José Carneiro, op.cit.,p.189.

59 CPC, art.538. CPC, art.538.

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ser conhecidos, por falta de um ou mais desses pressupostos, o prazo para a interposição do recurso subseqüente estará automaticamente interrompido60. A única hipótese em que os embargos não-conhecidos não interrompem o prazo do recurso seguinte é aquela em que os próprios embargos foram interpostos fora do prazo legal, ainda que dentro do prazo de interposição do recurso subseqüente. Nesse caso, como não se interrompe prazo extinto, e os embargos declaratórios foram aviados de modo tardinheiro, o prazo de interposição do recurso subseqüente ao de embargos continuou fruindo normalmente a partir da intimação da sentença. Se a parte interpuser o recurso próprio, fiando-se na ilação de que os seus embargos, embora intempestivos, interromperam o prazo do recurso principal, muito provavelmente terá deixado escapar o prazo legal e permitido a formação da coisa julgada material. Mesmo aqui, há divergência. Doutrina muito aplaudida diz que a interposição dos embargos declaratórios interrompe o prazo dos recursos mesmo se feita a destempo. Segundo esse entendimento, os embargos declaratórios somente não interromperiam o prazo do recurso se viessem após o decurso do prazo do próprio recurso cabível contra a sentença que se pretendeu embargar. Como não se interrompe prazo já escoado, essa seria, em rigor, a única hipótese em que não haveria interrupção. Fora disso, e desde que o recurso próprio seja interposto dentro do prazo legal, haveria interrupção. Assim, por exemplo, se a parte dispõe de cinco dias para interpor embargos de declaração, e de oito para recorrer ordinariamente no processo do trabalho, haverá interrupção mesmo que interpostos embargos declaratórios no sexto dia, desde que o recurso ordinário seja aviado até o oitavo dia61.

60 VILHENA,Paulo Emilio Ribeiro.Recursos Trabalhistas e Outros Estudos de Direito e de Processo do Trabalho, Ed. LTr, SP, 2001,p.56, diverge: “Se a parte entra com os embargos declaratórios intempestivamente(CLT,art.897-A)e, depois de seu julgamento(que deverá ocorrer na “primeira audiência ou sessão”, presteza que serve tanto a um rito quanto ao outro), volta ela com o recurso ordinário ou o de revista, mas dentro do prazo de 8 dias da decisão de embargos, pode-se perguntar qual decisão transitou em julgado ou quando se deu a coisa julgada.É evidente que a coisa cosa julgada operou-se já ao tempo da interposição dos embargos de declaração, que, não conhecidos, não têm o condão de ressuscitar o momento processual perdido e as questões decididas”.

61 CARNEIRO, Athos Gusmão. Dos Embargos de Declaração e seu inerente efeito interruptivo do prazo recursal. Revista Síntese de Direito Civil, Porto Alegre (10):5-9,mar/abr/2001.

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O NOVO CAPITALISMOCONTEMPORÂNEO E A PRIVATIZAÇÃO DAPREVIDÊNCIA

Juliana Teixeira EstevesAdvogada, doutora em Neoconstitucionalismo pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)

81. Introdução;2. A globalização - novos caminhos do capitalismo

contemporâneo;3. O triunfo do capitalismo - do Estado liberal para o welfare

state – breve evolução histórica;4. Etapas da acumulação financeira;5. A financeirização do sistema previdenciário;6. A precarização das relações de trabalho e a previdência

social;7. A privatização da previdência - um novo mercado para

a globalização;8. Críticas ao sistema de fundos de pensão;9. Conclusão;10. Referências bibliográficas

Resumo: O capitalismo passou por várias fases e a mais recente consiste na financeirização do sistema previdenciário. O mundo globalizado construiu um novo sistema securitário de previdência baseado em três pilares. Previdência complementar é hoje, o principal pilar desse sistema. A partir da evolução do capitalismo e dos caminhos por ele trilhados, o texto mostra como a privatização da previdência pode ser prejudicial ao próprio sistema e aos indivíduos que dele dependem.

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1. INTRODUÇÃO

A contínua deteriorização do mundo do trabalho na década de 90 significa um processo de uma nova configuração estrutural das relações de trabalho, gerando, inclusive, alterações para o sindicalismo tão atuante em momentos anteriores ao período neoliberal. As alterações dos paradigmas das relações estatais levaram a Organização Internacional do Trabalho (OIT) a aprovar, em junho de 1998, a Declaração da OIT sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho e seu seguimento, que fixa orientações para que o crescimento econômico venha em conjunto com justiça social. Dentre os princípios relativos aos direitos fundamentais do trabalho está o da eliminação da discriminação em matéria de emprego e ocupação. Para promover a Declaração, a OIT estabeleceu um programa que tem dentre os seus três objetivos o de promover medidas políticas que conduzam à prática desses princípios, segundo as condições características de cada país. É claro que esta Declaração tem um caráter promocional, somente vinculando os países que a ratificaram e não havendo sanção para aqueles que não a aplicarem. A Constituição Brasileira tem em seu escopo princípios já previstos na referida Declaração, servindo, portanto, de referência à uma comunidade internacional e em especial à comunidade legisladora. É nesta abordagem que se inicia o trabalho. Assim, com o fim da ditadura militar, o Brasil entrou na rota da globalização mundializada, iniciando as privatizações de estatais e realizando políticas que determinaram o rumo que a economia brasileira tomaria na próxima década. A nova política, entretanto, não conseguiu conter os efeitos devastadores do neo-liberalismo.

Em meio a essa realidade começam a crescer no Brasil as multinacionais e o mercado financeirizado de ações incrementando um mercado já precarizado no setor público e desejado pelos investidores – o mercado da previdência complementar. O presente estudo tem por objetivo analisar o sistema de pensões que pode ser organizado mediante dois critérios: a estrutura do sistema e segundo a metodologia adotada para estabelecer os níveis de contribuição e benefício. Dentro do primeiro critério, o sistema pode ser de capitalização, que acumula fundos para o financiamento dos benefícios futuros, capitalizando contribuições dos trabalhadores, ou pode ser disciplinado mediante a repartição, que pressupõe a manutenção do equilíbrio financeiro

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permanentemente, inexistindo acumulação de fundos. No segundo critério a metodologia estabelece duas possibilidades dos fundos serem esquematizados: por contribuição definida, nos quais os níveis de contribuição são estabelecidos desde o princípio, ficando os níveis de benefícios vinculados aos resultados financeiros, ou por benefício definido, onde os valores dos benefícios são predeterminados e as contribuições são reajustadas de forma a garantir o financiamento. Há, ainda, um terceiro esquema, os de contribuição e benefícios definidos, onde os dois parâmetros são previamente fixados, havendo, entretanto, necessidade de um bom estudo demográfico e econômico que assegure a sua estabilidade financeira.

Os sistemas previdenciários da América Latina em sua grande parte organizaram-se sob o regime de capitalização coletiva parcial, que foram gradativamente alternados para o esquema de repartição, tendo alguns retornado ao sistema de capitalização nos anos 90. Esses processos foram desenvolvidos numa época de grande instabilidade econômica, institucional e política, que contribuiu para a deficiência da gestão do modelo previdenciário de então. As várias crises financeiras ocorridas no planeta serviram de justificativa para a reforma dos parâmetros da seguridade social. Taxas de contribuição aumentaram e o valor dos benefícios sofreu redução. Objetivando solucionar as crises financeiras provocadas pelo sistema previdenciário, vários países iniciaram as reformas de base da previdência social. Também as idéias de flexibilização, desregulamentação e privatização de vários setores do Estado surgiram neste momento. O capitalismo não estava mais amparado somente nos meios de produção industrial e a nova crise capitalista trazida pela globalização trouxe a necessidade de descoberta de outras fontes de capital e uma dessas fontes estaria no capital salarial dos empregados. Paralelamente, a difícil situação financeira do sistema previdenciário fez com que se considerasse a possibilidade de serem criados novos sistemas, com elementos privados e organizados segundo o esquema de capitalização, criando-se condições para uma maior participação dos trabalhadores na previdência. Para justificar o “acesso” aos salários dos empregados utiliza-se como argumento a principal preocupação dos cidadãos – como assegurar os níveis básicos de rendimentos para a fase idosa da vida? Tenta-se privatizar o sistema previdenciário e transferir ao trabalhador a responsabilidade de custear a sua própria aposentadoria, sem qualquer interferência estatal, exceto na condição

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de regulamentador e fiscalizador do sistema. Para que isso seja possível é necessário que o trabalhador poupe valores a partir da idade considerada ativa utilizando-os após certa idade e quando se tornar inativo. Surgem, então, as seguradoras e os investidores do capital alheio. Tais quantias são, normalmente, aplicadas no mercado de ações, que a longo prazo têm apresentado rentabilidade positiva. Mas, quais as garantias de que a aplicação da futura aposentadoria dos trabalhadores será suficientemente remunerada1 a ponto de resguardar o valor real após trinta anos, por exemplo?

Nesse trabalho estuda-se o sistema dos fundos de pensão, que nada mais são do que o sistema previdenciário fechado, restrito a empregados de determinadas empresas e financiado a partir de parte dos salários desses trabalhadores. É aqui que se identifica o interesse do empresariado estrangeiro e sua influência nas instituições brasileiras por meio das instituições financiadoras de programas sociopolíticos. O cenário mundial globalizado é historicamente construído para o bem-estar do capital. Será apresentada a previdência na perspectiva das teorias da acumulação do capital, ou da financeirização das empresas, e a importância que essa poupança previdenciária tem para o sistema financeiro. Com isso, demonstram-se as principais características que fazem da previdência privada um sistema a ser aplicado somente em sociedades amplamente igualitárias, com um desenvolvido senso de justiça e responsividade dos gestores. A previdência complementar fechada, ou fundo de pensão, destina-se à consumidores-cidadãos, trabalhadores ou não, em condições financeiro-econômicas suficientes e capazes de contribuir para um sistema privado previdenciário por capitalização. Tudo isso, dentro de um sistema em que a lucratividade está atrelada à constante diminuição de custos e onde está presente o aumento da precarização do trabalho humano e com ela a redução dos salários reais.

2. A GLOBALIZAÇÃO – NOVOS CAMINHOS DO CAPITALISMO CONTEMPORÂNEO

A mudança em todo o sistema de produção desde os anos 70 provocada pelo início do estado neoliberal, até a recente globalização

1 Foram muitos os fundos de pensão norte-americanos que faliram com a crise financeira iniciada em 2008.

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acarretou profundas mudanças nas relações de trabalho de todo o mundo. Analisando as alterações sofridas pelo sistema capitalista, que, aparentemente, fortaleceu-se, avaliaremos as condições de trabalho restadas para o homem neste século vinte e um, que se diferenciam substancialmente das relações de trabalho mantidas durante o período chamado fordista. Durante este período as relações de trabalho eram baseadas na subordinação direta ao empregador, que detinha o poder diretivo da empresa e cujas normas asseguravam os direitos sociais e os benefícios trabalhistas dos empregados. A arquitetura do capitalismo mudou de estrutura e o modelo de estado neoliberal não mais se coaduna com a realidade. O sistema toyotista de produção (que sucedeu o modelo fordista) acarretou um desemprego observável em todo o planeta, dos países subdesenvolvidos aos desenvolvidos. As novas formas de produção (modelo toyotista), objetivando a redução de custos e aumento da performance, ajudou no desenvolvimento da tecnologia, e esta, por sua, e substituiu os homens nas funções mais básicas do mercado. Inicia-se neste período a idéia de um poder capitalista internacional único, com a formação de blocos econômicos, com soberania política e até jurídica, acima dos poderes dos seus estados-membros.

No Brasil, as reformas realizadas pelos governos Collor e Cardoso seguiram a tendência mundial a fim de adequar o mercado brasileiro às novas normas de competição do mercado internacional, principalmente até o ano de 1997, período em que a expansão capitalista denominou-se de globalização. Neste período houve grande expansão dos países desenvolvidos, e até dos países em desenvolvimento, mas a taxa de emprego não aumentou na mesma proporção. A abertura comercial das exportações e a sobrevalorização da moeda real geraram no final dos anos 90 a falência e fusão de grande número de empresas. Assim, a recente política de competitividade provocada pela globalização associada às políticas neoliberais da economia pós 1994 (quebra das cadeias de produção), fizeram crescer o índice de desemprego no Brasil. Em 2000 o índice de desemprego diminuiu, mas o poder de compra da moeda brasileira caiu. A diminuição da renda média representou o aumento do desemprego nos anos 90, e também a informalização crescente do mundo do trabalho. Por exemplo, em 2000, o IBGE salientou que, dos 822 mil empregos criados nas seis regiões metropolitanas, apenas 62 mil foram com carteira registrada, ou seja, 7,5% do total (MENOS EMPREGO,

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2000; ANDRADE, 2005) .Esta contínua deteriorização do mundo do trabalho

na década de 90 (neoliberal) significa um processo de uma nova configuração estrutural das relações de trabalho, gerando, inclusive, alterações para o sindicalismo tão atuante na fase anterior ao período neoliberal. As normas estatais do mundo moderno não mais conseguem assegurar a estabilidade social de seus cidadãos. Deste modo, diante da possibilidade da mudança dos paradigmas do mundo do trabalho após os anos 90, o objetivo deste ensaio é apresentar os principais aspectos que demonstram a mudança do Estado-Modelo, no tocante a sua concepção clássica de soberania e de limites político-territoriais definidos face à mundialização e constituição dos blocos econômicos, e a necessidade de rever o papel do Estado na segurança do direito social ao trabalho e ao bem-estar social. No exemplo da União Européia, a regulamentação da integração regional com a livre circulação de trabalhadores e mercadorias dentre os estados-membros, a existência de um órgão soberano à soberania dos estados modificam o conceito de Estado e apresentam novas relações laborais. O mesmo está acontecendo com a constituição da ALCA e do MERCOSUL. Em breve as barreiras alfandegárias entre os estados-membros do Mercosul não mais existirão. É provável ainda que a circulação de trabalhadores entre estes países se torne livre, sem limites territoriais que imponham a aplicação da legislação do país. O avanço da tecnologia não será interrompido e novos empregos serão criados e mais empregados serão substituídos pelas máquinas informatizadas. As alternativas buscadas pelo mercado nos últimos anos para diminuir os encargos legais incidentes sobre a mão-de-obra fez com que novas relações trabalhistas surgissem, mas sem que houvesse subordinação entre o contratante e o contratado, a exemplo das cooperativas de trabalho, as empresas de terceirizações de serviços, os negócios virtuais realizados pela internet, entre outros.

3. A FINANCEIRIZAÇÃO DO SISTEMA PREVIDENCIÁRIO

Um novo ciclo apresenta-se no mundo financeiro através da acumulação de riquezas. As empresas necessitam elevar o seu capital rotativo e para não recorrerem aos bancos criam os fundos de renda própria, que é a oportunidade dos empregados participarem

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dos ganhos desta mesma empresa por meio da compra de espécies de títulos de capitalização. Para que isto ocorra, tais títulos hão de ser negociados na bolsa de valores. Os estudos demonstram que os analistas financeiros estabelecem comissões na negociação para os acionistas-investidores, além de metas preestabelecidas as empresas no intuito de maximizar os seus ganhos e valorizar as ações no mercado, o que se reflete sobre os empregos. Assim questiona-se: - quem realmente se beneficia com a criação dos fundos de pensão?

Os fundos de renda própria globalizaram-se e a América Latina vêm reformando os seus sistemas previdenciários desde o início dos anos oitenta, e o Brasil não esteve fora dessas reformas. Além das reformas na previdência dos trabalhadores do setor privado e do público, foram aprimoradas as legislações acerca da previdência complementar, com intuito de regulamentar a atividade das empresas já havidas e atuantes no país e de complementar a renda dos trabalhadores a ser usufruída na velhice ou incapacidade, ou pelos beneficiários na morte do titular. Esse quadro de reformas está em consonância com o esquema de reformas previdenciárias sugerido pelo Banco Mundial e outros organismos internacionais. Apesar das previdências complementares existirem no Brasil há várias décadas, o estudo das mesmas é necessário face ao impacto que têm na renda do trabalhador ativo e na economia do país como um todo, haja vista ser de suma importância o adequado e suficiente desenvolvimento econômico gerador de emprego e renda para que o trabalhador possa contribuir com sua própria aposentadoria. Além disso, mas não menos importante, o fato de que a previdência complementar na forma apresentada nos dias presentes, dentro de um sistema capitalista financeirizado, exerce o papel de gerador de renda capitalista e não de um benfeitor que objetiva acrescer vantagens às que o Estado fornece ao cidadão. Outro ponto, mas secundário, é que a composição da plataforma política do PT na época eleitoral de 2002, admitiu as previdências complementares

“como complemento ao sistema público universal, para os trabalhadores tanto do setor público como do privado que aspirem a aposentadorias superiores às oferecidas pelo teto do orçamento publico, haverá um sistema de planos

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complementares, com ou sem fins lucrativos, de caráter facultativo, e sustentado por empregados e empregadores”.2

A implantação dos sistemas complementares vem sendo feita, inclusive, com subsídios federais por meio das reduções nas alíquotas de cobrança do Imposto sobre Renda. O que devemos responder é se é a Previdência Social que está falindo ou se é o capitalismo que precisa do capital produtivo dos trabalhadores. Seria a Previdência Social um estorvo ao crescimento/sustentação do capitalismo? Os fundos de pensão são vistos como uma alternativa de recuperação do capitalismo acionarial e manutenção do regime de acumulação financeira. E, estando o fenômeno inserido num contexto capitalista, há necessidade de ser observado também sob essa ótica. Alguns estudiosos do meio internacional, dentre eles Esther Jeffers, Catherine Sauviat, Dominique Plihon e François Chesnais analisam a financeirização das empresas como forma de elevação dos ganhos e redução de custos do empresariado, pretendendo-se analisar a ciranda gerada pelo sistema de acumulação de capitais que é: (i) investimento do montante arrecadado dos empregados no mercado de ações ou contratação de um especialista em investimentos; (ii) o mercado de ações, por sua vez requer maximização do valor financeiro da empresa; (iii) a empresa para “valer mais” precisa elevar os seus ganhos e o meio mais eficaz para elevar ganhos diante da crise mundial do capitalismo é reduzir os custos; (iv) e a redução de custos passa pela redução do montante da folha de pagamentos e essa redução pode significar demissões e outras formas de diminuição de direitos.

Assim é que a recente crise do sistema capitalista leva as empresas a caminharem para o novo modelo de acumulação, a financeirização das empresas, acarretando, dentre outras coisas, a instituição de fundos de pensão das empresas que visam a partir de agora ao aumento do valor de suas ações no mercado. Para isso, realizam desde a simples especulação até o enxugamento do quadro de funcionários, como forma de cortar gastos. Este enxugamento se dá não só através de demissões, mas também por meio da precarização das relações de trabalho, como a terceirização e a flexibilização

2 Plataforma do Partido dos Trabalhadores publicada no sítio www.pt.org.br, acessada em 20/01/2006.

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das leis do trabalho. A precarização das relações de trabalho vem sendo construída aos poucos, através de modificações na legislação. A flexibilização das leis do trabalho associada à terceirização de serviços no setor público e privado é apresentada pelo empresariado como prerrogativa de solução para o desemprego e o conseqüente crescimento da economia. Ao lado da preocupação com o desemprego está a necessidade de manutenção do sistema econômico capitalista.

4. A PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO E A PREVIDÊNCIA SOCIAL

Junto com as reformas vieram as idéias de flexibilização, desregulamentação e privatização de vários setores do Estado, partindo-se do pressuposto de que o mercado livre é mais competente para dar destino aos recursos do que o Estado. Vários países latinos absorveram a teoria e iniciaram o longo processo de abertura da economia aos mercados internacionais, privatizando empresas públicas e racionalizando a administração pública.

Durante as décadas de 80 e 90, dentre os anseios por privatização e redução do intervencionismo estatal nas relações privadas, houve discussões acerca da desregulamentação do Direito do Trabalho, sendo este último a variável freqüentemente utilizada como o ator principal na arena das crises econômicas da época (e resistente até os dias atuais). Com o argumento de elevar a contratação e rotatividade de mão-de-obra, algumas pequenas reformas foram realizadas neste período em vários países, inclusive no Brasil. Mas o desemprego não diminuiu como o previsto. Uma curiosidade deve ser observada: apesar da falta de emprego ser observada em vários lugares e em períodos de crise e recessão econômica, verifica-se também que alguns setores da economia têm estado em franca ascensão e com lucros expressivos. Mesmo assim continuam com elevado número de dispensas de empregados, objetivando a redução dos custos e aumento de lucros elevando a cotação das ações na bolsa de valores. É possível observar ainda que os índices de desemprego e de exclusão social permaneceram intactos nos países em que houve a desregulamentação das leis trabalhistas. A crise capitalista juntamente com a globalização trouxe a necessidade de descoberta de novas fontes de capital e uma dessas fontes estaria no capital salarial dos empregados. Paralelamente, a difícil situação financeira do sistema previdenciário fez com que

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fosse considerada a possibilidade de se criarem novos sistemas de natureza previdenciária, com elementos privados e organizados segundo o esquema de capitalização, criando-se condições para uma maior participação dos trabalhadores na previdência complementar. Para justificar o “acesso” aos salários dos empregados utiliza-se como argumento a principal preocupação dos cidadãos – como assegurar os níveis básicos de rendimentos para a fase idosa da vida? Desde então se tenta privatizar o sistema previdenciário e transferir ao trabalhador a responsabilidade de custear a sua própria aposentadoria, sem qualquer interferência estatal, exceto na condição de regulamentador e fiscalizador do sistema. Para que isso seja possível é necessário que o trabalhador poupe valores a partir da idade considerada ativa utilizando-os após certa idade e quando se tornar inativo. Para que esses valores poupados tenham uma rentabilidade capaz de atender aos anseios do trabalhador no futuro, é necessário aplicar a verba no “instrumento” correto. Surgem então as seguradoras e os investidores do capital alheio. Tais quantias são, normalmente, aplicadas no mercado de ações, na bolsa de valores. Então, quais as garantias de que a aplicação da futura aposentadoria dos trabalhadores será suficientemente remunerada a ponto de resguardar o valor real após trinta anos, por exemplo? quais as garantias que o Estado tem de que não precisará dar assistência aos cidadãos abandonados pelo sistema capitalista, acaso o sistema previdenciário venha a ser totalmente privatizado como orientam algumas Organizações Internacionais, a exemplo do Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial?

Importante observar que o atual regime previdenciário brasileiro contribui de sobremaneira para o crescimento da economia de previdência privada. Temos um sistema público fundado no sistema de repartição, mas com contribuições definidas, chamado no meio internacional de PAYG – pay as you go - que freqüentemente alarda a impossibilidade de pagar os benefícios futuros dos contribuintes presentes, e que por causa disso vê-se diante da necessidade de elevar as alíquotas de contribuição, reduzir e limitar o valor dos benefícios, elevar a idade e o tempo de serviço para aposentadoria, e ainda desvincular o pagamento dos inativos dos que estão na ativa. Observe-se que tais ações são prerrogativas do Banco Mundial previstas no Averting Old Age: Polices to Protect the Old and Promote Growth. Com o aumento da idade para aposentadoria e a redução e limitação dos valores a serem pagos aos aposentados, os cidadãos vêem-se

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empurrados a contratar um regime de previdência complementar, seja individualmente (aberta), seja coletivamente (fechado), que integram o sistema privado, também fundado no sistema de capitalização.

O Estado regulou a matéria previdenciária permitindo que os planos de previdência privada circulem livremente, repercutindo significativamente na vida brasileira. A título de exemplo, planos de previdência complementar aberta estão sendo usados como uma maneira de burlar os impostos cobrados na transmissão dos bens por causa mortis34 Até 2004 as empresas de previdência complementar ainda argumentavam na Justiça o direito de não pagar impostos alegando serem entidades sem fins lucrativos assemelhadas a associações ou fundações, e, portanto não deveriam pagar impostos. Mas o STJ entendeu pelo não enquadramento das referidas empresas na condição de “sem fins lucrativos” e que, portanto, devem pagar os impostos sobre os lucros.

5. A FLEXIBILIZAÇÃO - O EFEITO DA GLOBALIZAÇÃO NA EMPREGABILIDADE MUNDIAL

A recente crise do sistema capitalista leva as empresas a caminharem para o novo modelo de acumulação, a financeirização das empresas, acarretando, dentre outras coisas, a instituição de fundos de pensão das empresas que visam a partir de agora ao aumento do valor de suas ações no mercado. Para isso realizam desde a simples especulação ao enxugamento do quadro de funcionários como forma de cortar gastos. Este enxugamento é realizado não só através de demissões, mas também por meio da precarização das relações de trabalho, como a terceirização e a flexibilização das leis do trabalho.

O Direito do Trabalho pode ser classificado em fases. A primeira é chamada de manifestações incipientes ou esparsas, que iniciou-se no Peel`s Act inglês (destinado a restringir o uso do trabalho infantil na Inglaterra) de 1802 até 1848. A segunda fase ocorre

3 A lei permite que seja cobrado até 8% de imposto de transmissão causa mortis sobre o valor de mercado do bem. O saldo da previdência complementar pode ser sacado imediatamente pelo beneficiário, pagando-se somente o CPMF (0,38%) e IR (até 27,5% sobre os rendimentos) se devido.

4 O art. 55 da MP 252 – MP do Bem – ratifica que a transmissão dos recursos investidos em fundos de previdência complementar independem de inventário.

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entre 1848 e 1919 e denomina-se sistematização e consolidação do Direito do Trabalho. A terceira – institucionalização do Direito do Trabalho – remonta aos anos 1919 e vai até meados dos anos setenta. A quarta e última fase, e que iremos introduzir neste trabalho foi iniciada em 1979/1980 e está presente até os dias atuais e consiste na crise e transição do Direito do Trabalho. A crise ocasionada pelo petróleo entre 1973/1974 acentuou a concorrência inter-empresarial e também as taxas de desocupação/desemprego no mercado de trabalho. Paralelamente o Estado via-se numa crise fiscal e os cientistas de então começaram a questionar o papel provedor de políticas sociais do Estado. Ao lado de tudo isso a renovação tecnológica apresenta a robotização, microeletrônica e a microinformática, agravando a redução dos postos de trabalho e emprego em várias áreas da economia, especialmente a da indústria. Neste instante surgem as primeiras inovações na forma de trabalho, falando-se em teletrabalho e trabalho em casa, quebrando barreiras geográficas até então existentes, permitindo que o trabalho fosse realizado independentemente de questões de tempo e espaço. Começa-se a falar em reestruturação da gestão empresarial, defendendo-se a descentralização da administração dos negócios, e fazendo crescer a figura da terceirização nas relações de trabalho.

Neste contexto econômico o sistema capitalista ganha força para quebrar o pensamento do Estado de Bem-Estar Social, através das vitórias de Margaret Thatcher (1979), Ronald Reagan (1980) e Helmut Kohl (1982). Em meio a todo esse desejo de desregular as políticas sociais e as regras jurídicas limitadoras da atuação capitalista, encontra-se, inevitavelmente, o Direito do Trabalho. Assim, para continuar o trabalho proposto pelos defensores capitalistas era preciso modificar a lei e a concepção de proteção do trabalhador. Devemos lembrar que o modelo juslaboral vigente em vários países ainda hoje, foi construído com base na exploração do ser humano promovida pelos anseios de riqueza do capitalismo, e de fato construiu uma inquestionável intervenção na economia, favorecendo, via de regra, a distribuição social dos ganhos econômicos. As duas últimas décadas do século XX foram marcadas pela flexibilização quando não pela desregulamentação das leis do trabalho, objetivando, em tese, a produzir mais postos de trabalho e reduzir o impacto que a revolução tecnológica gerou no mercado laboral. Mormente após o início dos anos noventa, verificou-se que a profecia da sociedade sem trabalho não se concretizou, apesar de terem havido acentuadas reduções

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nos índices de empregabilidade. Ocorreu, sem dúvida, uma grande desregulamentação e informalização do trabalho, especialmente nos países ditos em desenvolvimento e subdesenvolvidos.

Nesse momento histórico algumas das mais importantes alterações sofridas pelo ordenamento jurídico brasileiro ocorreram no serviço público. Em 1998, a Emenda 19 alterou a norma e criou a figura do emprego público passando a permitir expressamente a investidura em cargo ou emprego público de comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração. Em 2000, o TST garantiu aos órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional o direito de contratar sem vínculo empregatício mediante empresa interposta e permitiu a contratação de serviços de vigilância, de conservação e limpeza, e serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador de serviços também sem vínculo empregatício. Tal consideração permite que órgãos públicos não sejam responsabilizados pelos atos de seus gerenciadores quando estes burlam a legislação e contratam pessoal sem o concurso público.

A regulamentação do então chamado emprego público trouxe à baila uma nova figura de empregado público, que não possui a estabilidade garantida dos servidores públicos – regidos por Estatuto próprio – mas participam do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS. Em 1998, foi aprovada a Lei 9.601 instituindo no Brasil a hipótese do contrato a tempo parcial e o chamado banco de horas, já experimentado no Direito estrangeiro. A proposta era de uma flexibilização jus trabalhista com o objetivo de gerar novos postos de trabalho, não tendo obtido o sucesso pretendido. No Direito Internacional, a OIT promulgou a Convenção n. 158, proibindo a dispensa de empregados de forma arbitrária. Os argumentos neo-liberais afirmam que a flexibilização seria o melhor caminho para a crise provocada pelos altos custos de contratação e demissão de pessoal no Brasil. Contudo, o que comumente se observa é uma confusão de idéias acerca do conceito de desregulamentação e da flexibilização do Direito do Trabalho no Brasil.

6. A PRIVATIZAÇÃO DA PREVIDÊNCIA – UM NOVO MERCADO PARA A GLOBALI-ZAÇÃO

O mundo tem acompanhado de perto a mudança na

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seguridade social de diversos países. A distância entre população economicamente ativa e os aposentados tem se tornado menor e, em outras palavras, o mundo está ficando mais velho. Apesar da longevidade ter sido almejada durante séculos pelo homem, hoje ela é vista como um problema. A solução apresentada, contudo, rompe com décadas de conquistas sociais da humanidade, como a garantia do direito de uma aposentadoria mantida pelo Estado após anos de trabalho.

A reforma da previdência social é apontada pelo Banco Mundial como indispensável ao sustento dos Estados nos próximos trinta anos. A reforma (ou contra-reforma como preferem alguns) (GRANEMANN, 2003) estaria sustentada em três pilares abaixo explicados. O regime fechado é o que será tratado neste trabalho e consiste na participação dos trabalhadores em fundos de pensão constituídos nas empresas onde trabalham, por meio de espécies de títulos de capitalização, que seriam/serão revertidos em seu próprio benefício no momento da aposentadoria. O modelo apresentado como ideal pelo Banco Mundial prevê que o sistema público assegurará tão-somente àqueles realmente necessitados, assim declarados por lei complementar, uma renda mínima assistencial, financiada por impostos. O segundo pilar consiste na obrigatoriedade na participação em fundos de pensão (fechados); e por último a participação facultativa em planos de previdência complementar.

O governo Lula aparentemente adotou o projeto do Banco Mundial da previdência de três pilares e está implementando, gradativamente, as mudanças ali previstas e iniciadas por FHC. O sistema facultativo privado (ou sistema complementar aberto) terminou por se incorporar a nossa realidade quando ocorreram as mudanças nos tetos de pagamento de aposentadorias recentemente, tanto no Regime Jurídico Único (RJU) quanto no Regime Geral de Previdência Social (RGPS) que forçam o trabalhador a “voluntariamente” realizar poupanças complementares geridas por seguradoras autorizadas por lei.

Não obstante os argumentos dos defensores da necessidade de inclusão da iniciativa privada na gestão e pagamentos das aposentadorias, há aqueles que apontam o déficit do sistema capitalista e as quedas das bolsas de valores como fatores geradores da necessidade de criar os fundos de pensão (sistema complementar

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fechado). O regime financeiro das empresas tem mudado em muitos países, passando de uma economia de endividamento (overdraft economy) para uma auto-economia, ou economia de fundos próprios que consiste na emissão de ações e formação de economia. Durante o período fordista o regime empresarial predominante era baseado no modelo tradicional de empresa – stakeholder - em que os dirigentes detinham todo o poder sobre a empresa, em detrimento dos acionistas. O novo modelo de economia de fundos próprios ou shareholder, dá prioridade aos interesses dos acionistas. Em termos de análises econômicas o método utilizado era o MEDAF - Modelo de Equilíbrio dos Ativos Financeiros, no qual o valor da empresa é igual ao valor atualizado da seqüência de investimentos futuros (ex post). O modelo de fundos próprios rege-se pelo método EVA (Economic Value Added) medido pelo resultado econômico da empresa, uma vez que se tenha remunerado o conjunto de capitais investidos, recursos alheios e fundos próprios (ex ante). O rendimento exigível não se determina a partir das características próprias da empresa, mas em função da capacidade de pressão que a estrutura de mercado de ações pode exercer sobre ela.

Este novo regime caracteriza-se pela relação entre a distribuição do valor arrecadado em favor das empresas, a elevação da importância dos acionistas e dos fundos de investimentos estrangeiros e, ainda, a financeirização da gestão das empresas, que adveio da necessidade de as empresas terem a rentabilidade financeira gerada sobre o desenvolvimento de sua atividade ou dos empregos.

Esses novos paradigmas desmistificam, por outro lado, os conceitos de soberania e de territorialidade e trazem uma nova concepção de Estado. As reformas realizadas pelos governos Collor e Cardoso5 seguiram a tendência mundial, a fim de adequar o mercado brasileiro às novas normas de competição do mercado internacional. Neste período, houve grande expansão dos países desenvolvidos, e de países em desenvolvimento como os asiáticos, contudo a taxa de emprego não aumentou na mesma proporção6. No final dos anos 90

5 A reforma do Estado para as autoridades brasileiras fundava-se num ajuste fiscal, por meio da privatização de empresas estatais, acreditando-se que um Estado menor e com menos dívidas seria mais eficiente. Este ajuste também corresponde às exigências do liberalismo.

6 Com o aperfeiçoamento da tecnologia e introdução de novos meios de produção, aumentou-se a quantidade de bens produzidos com o menor número possível de mão de obra.

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a abertura comercial das exportações e a sobrevalorização da moeda real geraram a falência e a fusão de grande número de empresas e conseqüentes dispensas de empregados. Algumas grandes empresas brasileiras ingressaram no mundo da financeirização e da bolsa de valores com a participação do capital investido pelos trabalhadores. Mas, como já foi dito, esta financeirização está prevista num plano de recomendação do Banco Mundial (BM) – “Averting the Old Age: Polices to Protect the Old and Promote Growth7” que prevê a interferência do setor privado na administração dos fundos de pensão. Neste mesmo documento o BM propõe as três formas de fundos apresentadas anteriormente e apresenta como fator principal do empobrecimento do sistema previdenciário dos países o crescimento da proporção entre pessoas idosas (acima de 60 anos) e a redução da taxa de natalidade8. Apresenta, ainda, como solução, a introdução de mecanismos privados para sustentar os idosos do futuro.

O trabalhador assalariado da atualidade, em muitas empresas, está comprometido com o empregador por meio dos benefícios obtidos através da participação nos Fundos de Pensão. Estudos realizados nos Estados Unidos (COGGIOLLA, 2004) permitem observar que trabalhadores com baixos salários estão prolongando o seu tempo de vida ativa, trabalhando mais tempo e em condições cada vez mais precárias em virtude de perdas sofridas com os Fundos de Pensão. No Brasil, isso também ocorreu e a mais recente alteração de idade adveio das reformas previdenciárias de 1998 e 2003. Aparentemente, os critérios exigidos pelos acionistas-investidores (administradores) geram extinção de postos de trabalho, e, conseqüentemente, elevam a taxa de desemprego.

No sistema de acumulação de capitais os trabalhadores objetivam desenvolver o seu trabalho para garantir um emprego e satisfazer-se socialmente; já os acionistas conseguem perceber os prismas dos riscos do rendimento do capital. Diante do lema colocado e desenvolvido pelo capitalismo, segundo o qual “o trabalho dignifica

7 “Prevenir a crise do envelhecimento: políticas para proteger as pessoas idosas e promover o crescimento”

8 A teoria pode ser falsificada quando averiguam-se os dados reais fornecidos por órgãos oficiais como sindicato dos auditores federais e dos auditores previdenciários, que apresentam a previdência pública brasileira superavitária.

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o homem”, o trabalhador vê o fator trabalho como satisfação pessoal e social. Não vê o trabalho como um bem negociado na bolsa de valores. Com a inserção da figura do trabalhador na participação da economia empresarial surge a necessidade de efetuarem-se reformas jurídicas quanto à legislação trabalhista e legislação comercial, re-enquadrando o trabalhador na gestão empresarial. Tal reforma far-se-ia necessária, em tese, mas contrariamente às posições do Banco Mundial e demais organismos internacionais, em vista da exposição do empregado aos ditames patronais e às conveniências do mercado financeiro, o que também reforçaria o poder controlador do Estado e das autoridades responsáveis no sistema bancário e financeiro9. Mas, como mencionado, a posição internacional é no sentido de tornar as relações trabalhistas exclusivamente privadas, sem qualquer intervenção do setor público, inclusive no que diz respeito ao pagamento de aposentadorias.

7. CRÍTICAS AO SISTEMA DE FUNDOS DE PENSÃO

Apesar dos organismos mundiais declararem que a previdência em três pilares é o melhor sistema que um país pode ter, evidencia-se ainda nos anos 2000 o colapso do sistema privado de previdência. Nos Estados Unidos algumas empresas já não têm como pagar o benefício aos seus aposentados. Isso porque no momento em que as empresas tinham grandes lucros nas bolsas de valores decorrentes dos ganhos obtidos com os investimentos dos empregados em papéis da própria empresa, nos anos 1990, elas não aumentaram a contrapartida devida para a previdência dos funcionários, efetuando somente o pagamento mínimo necessário à manutenção do sistema.10 Com a queda do valor nominal das ações nas bolsas de valores, as empresas diminuíram o seu capital e também o dos empregados que estava aplicado, não tendo de onde obter recursos para pagar. Essa bola de neve levou a empresa General Motors a declarar em 21 de novembro de 2005 a extinção de 30 mil postos de trabalho além do fechamento de várias fábricas nos Estados Unidos. As empresas

9 A descoberta da contabilidade fraudulenta de algumas empresas (Enron, por exemplo) gerou a crise da Bolsa de Valores em 2002.

10 A antiga lei ERISA dos EUA estabelece que a previdência privada será financiada com recursos dos empregados e empregadores.

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americanas possuem uma agência federal de seguros de pensão e, conforme noticiado pela a revista New York Times, em 16 de novembro de 2005, no artigo intitulado Pension board says déficit is steady for now, de Mary Williams Walsh, o déficit até 30 de setembro de 2005 é de US$23,1 bilhões enquanto em 2004 foi de US$ 23,5 bilhões.

Após analisar-se os sistemas de pensões constatou-se que o sistema privado, além de não apresentar garantias futuras ao trabalhador, é um sistema injusto onde somente quem pode trabalhar poderá ingressar nele, e dentre estes há ainda o fator discriminação de gênero que há muito é observado pelos mesmos organismos internacionais que tentam impor os três pilares da previdência como o milagre previdenciário. Os fundos das empresas podem também ser administrados por elas mesmas. De acordo com dados coletados, algumas empresas investem o capital em suas próprias ações, a exemplo da General Electric, que tem 75% e da Coca-Cola, 78% em ações de seus empregados por meio dos Fundos de Pensão, o que representa um grande risco ou uma grande chance de lucros para os empregados. A Enron – empresa comerciante de gás e eletricidade nos EUA – aplicou 60% das ações de seus empregados nela própria e faliu.

A figura dos acionistas-investidores, que são particulares responsáveis por administrar os ativos financeiros através de empresas especializadas, chamados de investidores institucionais, tornou-se mais importante do que a figura dos diretores de empresas. Estes investidores, em sua maioria estrangeiros à empresa, impõem critérios de gestão às carteiras de ações como forma de igualar-se à condição dos diretores das empresas11. Os critérios comumente adotados pelas empresas para que o valor de suas ações seja maximizado são: qualidade da informação administrada aos acionistas; proteção dos acionistas minoritários por meio da garantia de direitos e obrigações oriundas da quantidade de ações - uma ação, um voto; conselho de administração devidamente remunerado, separando as funções de presidente e diretor-geral; ausência de medidas anti-OPA12; definição da forma de remuneração dos diretores incentivando a maximização

11 O diretores detém todas as informações necessárias sobre o desempenho da empresa. Os acionistas exigem transparência como forma de reduzir as “assimetrias na informação” (Dominique Plihon, in Las trampas de las finanzas mundiales)

12 Medidas destinadas a impedir a compra de uma empresa através da bolsa seguindo o procedimento da oferta pública de aquisição.

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das ações. Para exemplificar a aplicação dos critérios acima, a ALCOA anunciou em 2005 que demitiria 6.500 empregados, cerca de 5% (cinco por cento) em sua segunda fase da reestruturação e tal declaração fez as ações da empresa caírem em 2,68% (dois vírgula sessenta e oito por cento) na bolsa de valores. Mormente o Executivo-chefe, Alain Belda, declarou querer “se livrar” de US$ 62 milhões nos custos anuais até o final do ano. Ainda segundo ele, a empresa estava se adequando à nova estrutura internacional de negócios e procurando melhorar sua eficiência. (O VALOR, 2005, p.B9, n.1)

Os instrumentos utilizados para elevar o valor das ações das empresas (shareholder value) são classificados por Dominique Plihon em (1) fusões e aquisições de empresas – importando quase sempre em demissões de empregados; (2) Retorno para as atividades básicas da empresa – reduzindo o quadro de empregados da empresa; (3) Re-engineering de processos concentrando a atividade da empresa nos segmentos mais rentáveis – com o reenquadramento das atividades os empregados são destinados às chamadas empresas terceirizadas. Tais empresas normalmente precarizam as condições laborais e comumente, no Brasil, infringem as leis trabalhistas; (4) Redução do capital – redução da quantidade de títulos ofertados na bolsa de valores como forma de valorizar a procura pelos mesmos.

Em meio à globalização, fusões e incorporações multinacionais, reformas previdenciárias e capital de empregados aplicados em bolsas de valores, duas observações podem ser feitas: (a) O capital de um país pode terminar no estrangeiro através das bolsas de valores; e (b) Os investidores-diretores podem ditar regras direcionadas à exploração do trabalhador para maximizar os ganhos. A acumulação de capitais restaura ainda um velho problema que é o desemprego. É certo que a figura o pleno emprego dificilmente retornará aos países que o implantaram face a grande substituição de mão-de-obra pelas máquinas e computadores, mas o anseio por novos meios de capitalizar dinheiro leva às privatizações e por conseguinte à extinção de postos de trabalho.

8. CONCLUSÃO

Os Sistemas Públicos de Previdência e de Seguridade Social, mesmo que tenham origens muito remotas, consolidaram-

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se a partir da instituição do Estado do Bem-Estar Social. Esta arquitetura política foi concebida e instituída em virtude das crises que se instalaram nas primeiras décadas do século XX, especialmente, a Primeira Guerra Mundial, o surgimento do nazi-fascismo, a Grande Depressão, a Segunda Guerra Mundial e, sobretudo, o aparecimento do Socialismo Real. Em resumo, ela surgiu porque era vital “humanizar” o sistema capitalista de produção e dar uma nova configuração ao modelo de Estado Liberal e da sociedade centrada no individualismo contratualista.

O Estado do Bem-Estar, por seu turno, somente teve sustentabilidade, em face de uma alternativa de Sociedade do Trabalho pautada no Pleno Emprego e na idéia do trabalho subordinado protegido. A partir das Crises do Petróleo desencadeadas na década de 70 do século passado; dos governos ultraliberais de Reagan e Tatcher, na década de 80, e do desemprego estrutural - produto da inserção maciça das novas tecnologias - começa a desvanecer-se o Estado Social e, com ele, os sistemas públicos de seguridade social de caráter marcadamente contributivo – por empregados e empregadores. Mesmo que os sistemas privados de seguridade também tenham sido concebidos em épocas remotas, surgem eles, a partir daí, como sistema não somente alternativo, senão também como sistemas substitutivos da previdência e da seguridade públicas, na esteira da ideologia ultraliberal.

Esta nova concepção de seguridade foi alardeada porque houve a substituição ou inversão dos sistemas econômicos: o capital financeiro se sobrepondo ao capital produtivo. Na América Latina foi o Chile o primeiro país a introduzir a concepção privada de seguridade social, como marco privilegiado das relações entre capital e trabalho.

No contexto da sociedade Pós-industrial, verifica-se que o sistema público de previdência e de seguridade sociais vem sendo ideologicamente questionado, a fim de atender a voracidade do sistema financeiro internacional. Por isso, constituiu-se como pauta referencial do Consenso de Washington e vem sendo ainda disseminado pelo Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional. Na segunda parte do trabalho foi possível observar a convergência idealizada a fim de fazer o dinheiro fluir para as bolsas de valores: modificações nas leis trabalhistas, modificação das leis de acesso à bolsa de valores, modificações da lei das S/A, entre outras. No Brasil, o sistema público

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de previdência e de seguridade social vem sofrendo um desgaste sem precedentes e abriga, em seu conjunto, vários fatores: o desemprego estrutural, o desvio de recursos da previdência para satisfação de outros interesses políticos; a inadimplência; a resistência dos setores públicos e privados, inclusive, de grupos econômicos poderosos, em contribuir regularmente para manutenção do sistema. Já os sistemas privados sofrem as vicissitudes dos mercados, uma vez que estão condicionados aos pêndulos dos mercados financeiros. Dependem ainda da sua boa ou má administração e, por último, como têm um caráter contributivo, tornam-se também prisioneiro da instabilidade do mercado de trabalho. A aposentadoria das pessoas foi colocada no mercado de risco e isso não pode ser apresentado como um benefício para os trabalhadores, pois o mercado não pode ser responsabilizado por infortúnios sofridos pelos trabalhadores. Já o Estado pode, ele existe juridicamente. Os fundos de pensão obedecem às orientações do mercado financeirizado e se for considerado o benefício econômico de um trabalhador isolado, deve-se também observar o sacrifício de tantos outros quantos foram necessários para elevar os lucros das empresas participantes do sistema.

Após analisar o funcionamento conclui-se que os dois sistemas de previdência estão sujeitos aos mesmos problemas de taxa de contribuição e à longevidade dos contribuintes/beneficiários, principalmente por causa do desemprego estrutural que se formou no planeta de forma irreversível. Isto porque, em vista das peculiaridades demográficas dos grupos de funcionários, a partir de determinado intervalo uma quantidade bem maior de cotistas passará para a condição de aposentados, deixando de contribuir e passando a receber dos fundos. E esse fato já pode ser evidenciado na economia americana.

Observou-se que os dois sistemas estão basicamente amparados no regime de contratação subordinada ou na relação de emprego, onde o empregador contribui tanto quanto o empregado para a futura previdência. É possível observar-se, também, que, a teoria econômica do Banco Mundial considera que a proposta de pagamento de uma renda mínima para os cidadãos que não possuíram condições de poupar durante a vida ativa para o seu próprio sustento na idade avançada em ou casos de invalidez involuntária já é aplicada no Brasil e de forma bastante ineficiente (através da LOAS). É certo que a privatização da previdência está servindo de capital de investimento

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das empresas financeirizadas aumentando significativamente o seu valor e contribuindo para o enriquecimento de poucos às custas do empobrecimento e até desemprego de muitos.

As empresas beneficiárias das transações assim como o mercado financeiro poderiam ser onerados com o pagamento de impostos calculados sobre as negociações realizadas pelas empresas, especialmente aquelas que transportam a força de trabalho de serviço técnico especializado de seu país, para um outro com custos menores. As empresas mais ricas contribuiriam para o funcionamento da seguridade social de onde as empresas pobres também se beneficiariam, em troca do capital humano e do capital financeiro que lhes é gentilmente fornecido. A taxa TOB poderia ser uma saída para o desenvolvimento das economias mais atrasadas, fornecendo mais consumo para o sistema capitalista e ajudando a sustentar a globalização de forma mais humanitária e possível neste século. A insistência da OMC – Organização Mundial de Comércio – em não viabilizar tal taxação somente reforça a tese de que os empresários não estão dispostos a recuar diante da total financeirização de suas economias em prejuízo do mercado de consumo dos países mais pobres.

Os fundos de pensão espelham uma lógica social em que a definição de seu “real significado” é objeto de disputa de vários agentes coletivos. Esses agentes podem ser facilmente representados por seus tradicionais dirigentes, que tiveram sua representação ampliada durante os mandatos de FHC, e os dirigentes sindicais que, em função da diminuição de importância e com a queda da inflação neste mesmo período, tentaram inserir-se novamente na administração das entidades. A “sapiente” teoria neo-liberal dos fundos de pensão é falsa, visto que as gerações posteriores pagarão de qualquer forma a aposentadoria das gerações presentes, seja sob a forma da repartição, seja sob a forma injusta de uma adversa divisão dos rendimentos da atividade econômica do futuro, pressionando lucro contra o salário, uma vez que a capitalização é produzida pela remuneração dos capitais investidos nas atividades referenciadas pelos fundos de pensão. Na perspectiva dos defensores da capitalização esta é melhor, também porque os agentes que a controlam não estão subordinados aos governos e à política e, por isso, administram de forma mais eficiente o capital que lhes é entregue. Já os partidários do sistema de repartição apontam fatos em que gestores de fundos privados são

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adjetivados como “depositários infiéis”, a fim de demonstrar que não há diferença fática entre as capacidades de gestão dos dois tipos de regime. Uma defesa dessa contracorrente encontra-se em Nikonoff (NIKONOFF, 1999).

9. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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ARTIGO 71 DA LEI 8.666/93 E SÚMULA 331 DO C. TST: PODERIA SER DIFERENTE?

Tereza Aparecida Asta GemignaniDesembargadora do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região- Campinas. Doutora em Direito pela Universidade de São Paulo - USP

“ Uma coisa é um país, outra um ajuntamento.

Uma coisa é um país,outra um regimento.”

Affonso Romano

(Que país é este ?)

Resumo: A Súmula 331 do TST reputa constitucional o artigo 71 da Lei 8.666/93, vedando a transferência da responsabilidade patronal conforme explicitado em seu inciso II, caminhando o inciso IV nesta mesma direção ao prever a observância do benefício de ordem, quando fixa a responsabilidade subsidiária. Considera que nas terceirizações cabe ao ente público, tomador dos serviços prestados, acompanhar o cumprimento das obrigações trabalhistas pelo empregador. O fato desta contratação ter ocorrido mediante processo licitatório não o desonera do encargo legal de fiscalizar a atuação do contratado, nem afasta a aplicação do artigo 186 do Código Civil. O comportamento negligente e omisso, que

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permite a lesão aos direitos fundamentais do trabalhador que atuou em seu benefício, configura culpa in vigilando e viola o interesse público albergado nos princípios da legalidade, moralidade e eficiência elencados no artigo 37 da CF/88, que exigem a atuação pautada pela boa governança e accountability na gestão da coisa pública.

Palavras-chave: Constitucionalidade do artigo 71 da Lei 8.666/93 e Súmula 331 do TST. Cláusula de reserva de plenário. Boa governança e accountability. Responsabilidade subsidiária de ente público. Benefício de ordem.

Sumário:1. Introdução;2. O sentido da supremacia do interesse público sobre o

particular;3. O artigo 71 da Lei 8.666/93;4. Inconstitucionalidade. A Súmula Vinculante nº 10;5. A aferição dos limites da aplicação da lei implica o

controle difuso da constitucionalidade?6. O balizamento de conduta. Boa governança. Accountability;7. A cláusula de reserva de plenário;8. Poderia ser diferente?;9. Conclusão;10. Referências Bibliográficas

1. Introdução

Em relação aos entes públicos, o inciso XXI do artigo 37 da CF/88 estabeleceu que os serviços prestados por terceiros devem ser contratados mediante processo de licitação. O artigo 71 da Lei 8.666/93 fixou que nestes casos a responsabilidade do empregador pelos débitos trabalhistas não seria transferida para a Administração Pública.

Nos últimos anos, em decorrência de significativas alterações que vêm ocorrendo na atuação dos entes estatais, esse tipo de contratação tem se intensificado, notadamente em relação às atividades-meio da Administração. A questão trazida para o Judiciário

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trabalhista surge quando o empregador deixa de pagar o empregado e de recolher as contribuições fundiárias e previdenciárias.

Neste caso, o disposto no artigo 71 supra referido poderia ser considerado salvo-conduto para afastar qualquer responsabilidade do ente público?

Provocado por um número significativo de processos em que esta situação jurídica é questionada, o Tribunal Superior do Trabalho editou a Súmula 331 que fixou dois parâmetros distintos:

A- Face às exigências previstas no inciso II do artigo 37 da CF/88, quanto à necessidade de prévia aprovação em concurso público, estabeleceu que a “contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta,não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional”, preservando a não transferência prevista no artigo 71 da Lei 8.666/93

B- Atento à necessidade de conferir efetividade à legislação trabalhista, fixou o entendimento de que o “inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador de serviços”, o que exige a observância do benefício de ordem, mantendo assim essa mesma diretriz legal.

Entretanto, tal orientação jurisprudencial vem sendo objeto de reiterados questionamentos junto ao STF, tendo o Ministro Marco Aurélio Mello manifestado divergência por ocasião do julgamento da ADC 16/ DF e deferido liminar na Reclamação 9016, ajuizada pelo Estado de Rondônia, por entender que a decisão judicial que adota a Súmula trabalhista teria exarado manifestação implícita de inconstitucionalidade do artigo 71 da Lei 8.666/93, sem observar a cláusula de reserva de plenário prevista no artigo 97 da CF/88, assim desrespeitando a Súmula Vinculante nº 10.

Tendo em vista a significativa repercussão desta decisão na seara trabalhista, o presente artigo se propõe a trazer idéias e reflexões, que possam contribuir para o debate da matéria.

2. O sentido da supremacia do interesse público sobre o particular Uma das argumentações contra a diretriz adotada pela

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Súmula 331 consiste na alegação de que o interesse particular de um trabalhador, ou de um grupo de trabalhadores, não poderia prevalecer sobre o interesse público, de modo que a atribuição de responsabilidade subsidiária ao ente público, quando houve a contratação dos serviços mediante licitação, violaria o princípio da legalidade.

Será?Maria Sylvia Zanella di Pietro1 explica que os “dois

princípios fundamentais e que decorrem da assinalada bipolaridade do Direito Administrativo - liberdade do indivíduo e autoridade da Administração - são os princípios da legalidade e da supremacia do interesse público sobre o particular... essenciais, porque, a partir deles, constroem-se todos os demais”.

Entretanto, é interessante observar como a doutrinadora descola a idéia de interesse particular do conceito de direitos fundamentais. Com efeito, ao discorrer sobre as tendências atuais do direito administrativo brasileiro, ressalta que entre as inovações trazidas pela Constituição Federal de 1988 está o “alargamento do princípio da legalidade (para abranger não só a lei, mas também princípios e valores)”, de modo que o Estado Democrático de Direito passa a vincular a lei aos ideais de justiça, submetendo o “Estado não apenas à lei em sentido puramente formal, mas ao Direito, abrangendo todos os valores inseridos expressa ou implicitamente na Constituição,” notadamente os que foram albergados nos artigos 1º a 4º, entre os quais se destacam a dignidade da pessoa humana, o valor social do trabalho e da livre iniciativa, a moralidade, publicidade e impessoalidade.

Destarte, a discricionariedade administrativa será por estes limitada “o que significa a ampliação do controle judicial, que deverá abranger a validade dos atos administrativos não só diante da lei, mas também perante o Direito”. Portanto, o princípio da legalidade, referido no inciso II do artigo 5º da CF/88, deve ser entendido como um conjunto de leis, valores e princípios agasalhados também nos direitos fundamentais, que estabelecem limites à atuação administrativa, exigindo submissão ao Estado de Direito.

1 Di Pietro, Maria Sylvia Zanella- Direito Administrativo- 21 ª edição- Editora Atlas S.A.- São Paulo- 2008- págs. 62 e seguintes.

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Ao discorrer sobre os direitos fundamentais na Carta de 1988, Gilmar Ferreira Mendes2 enfatiza que a “colocação do catálogo dos direitos fundamentais no início do texto constitucional denota a intenção do constituinte de emprestar-lhe significado especial...ressalta a vinculação direta dos órgãos estatais a esses direitos e o seu dever de guardar-lhes estrita observância”. Explica que os direitos fundamentais ultrapassam a órbita subjetiva, alçando uma dimensão maior na perspectiva da ordem constitucional objetiva, assim formando a base do ordenamento jurídico de um Estado Democrático de Direito. Trazendo à colação doutrina desenvolvida por Jellinek,quanto a Teoria dos quatro “status”, ressalta que os direitos fundamentais cumprem diferentes funções na ordem jurídica. Não se restringem mais à concepção tradicional de direitos de defesa, consagrando também direitos “que tanto podem referir-se a prestações fáticas de índole positiva (faktische positive Handlungen) quanto a prestações normativas de índole positiva (normative Handlungen)” por parte dos entes públicos.

Explica que na condição de direito de defesa impõem ao Estado o “dever de agir contra terceiros”, resguardando o indivíduo também “contra abusos de entidades particulares, de forma que se cuida de garantir a livre manifestação da personalidade, assegurando uma esfera de autodeterminação do indivíduo”. Ademais, “reconduzidos ao status positivus de Jellinek, implicam uma postura ativa do Estado, no sentido de que esse se encontra obrigado a colocar à disposição dos indivíduos prestações de natureza jurídica e material”.

Com base na doutrina e jurisprudência da Corte Constitucional Alemã, explica Gilmar Mendes que o dever de proteção abrange também deveres de segurança que impõem ao Estado a obrigação de “proteger o indivíduo contra ataques de terceiros mediante adoção de medidas diversas” e o dever do Estado “atuar com objetivo de evitar riscos” para o cidadão, de modo que a inobservância do dever de proteção configura lesão a direito que a Carta Constitucional reputou fundamental.

Portanto, a definição do âmbito de abrangência do direito de proteção exige um “renovado e constante esforço hermenêutico”, concluindo que, face a sua importância como viga de sustentação da

2 Mendes, Gilmar Ferreira- Direitos Fundamentais e controle de constitucionalidade- estudos de direitos constitucional- Editora Saraiva – 2004- 3ª edição- São Paulo- págs 1 a 12

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Carta Política de 1988, os direitos fundamentais “somente podem ser limitados por expressa disposição constitucional ( restrição imediata) ou mediante lei ordinária promulgada com fundamento imediato na própria Constituição”.3

Neste contexto, as lúcidas observações de Luigi Ferrajoli4 ao rejeitar também a análise da questão sob o estereótipo da maioria/minoria, ressaltando que os direitos fundamentais “correspondem às faculdades ou expectativas de todos os que definem as conotações substanciais da democracia e que são constitucionalmente subtraídos ao arbítrio da maioria como limites ou vínculos indissociáveis das decisões governamentais”, porque o reconhecimento jurídico desses direitos é intrínseco à condição de cidadão/sujeito, assim entendida como a superação da situação de súdito/objeto de dominação.

Na mesma senda trilhou Luis Roberto Barroso5 ao enfatizar que o “o público não se confunde com o estatal” pois atuam em planos diversos, chamando atenção para a importância de “reavivar uma distinção fundamental e pouco explorada”, que divide o conceito de interesse público entre primário e secundário. Explica que o interesse público primário é a razão de ser do Estado e está sintetizado nos fins que lhe cabe promover: justiça, segurança e bem-estar social, enquanto o interesse público secundário corresponderia ao interesse estatal da “pessoa jurídica de direito público que seja parte em uma determinada relação jurídica- quer se trate de União, quer se trate de Estado-membro, do Município ou das suas autarquias.

Sem afastar a importância do interesse estatal secundário, pondera que “em nenhuma hipótese será legítimo sacrificar o interesse público primário com o objetivo de satisfazer o secundário”. Ressalta, ademais, que num “Estado democrático de direito, assinalado pela centralidade e supremacia da Constituição, a realização do interesse público primário muitas vezes se consuma apenas pela satisfação de determinados interesses privados. Se tais interesses foram protegidos por uma cláusula de direito fundamental” não remanesce

3 Mendes, Gilmar Ferreira – Direitos fundamentais e controle da constitucionalidade- pag. 14 e 28

4 Ferrajoli, Luigi- Direito e Razão- 3ª edição- Editora Revista dos Tribunais- São Paulo- 2010- págs 814/815

5 Barroso, Luis Roberto- Curso de Direito Constitucional contemporâneo- Editora Saraiva-1ª edição 2009- págs. 61, 69 e seguintes

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nenhuma dúvida, pois configurados na constituição como “formas de realizar o interesse público, mesmo quando o beneficiário for uma única pessoa privada. Não é por outra razão que os direitos fundamentais, pelo menos na extensão de seu núcleo essencial, são indisponíveis”. Assim, o interesse público secundário - i.e., o da pessoa jurídica de direito público, o do erário - jamais desfrutará de supremacia, condição ostentada pelo interesse público primário, por consubstanciar os valores fundamentais que devem ser preservados, notadamente o princípio da dignidade à pessoa humana, conceito de “corte antiutilitarista, pretende evitar que o ser humano seja reduzido à condição de meio para a realização de metas coletivas” (grifos acrescentados).

Ao analisar o conteúdo essencial dos direitos fundamentais sob uma dimensão objetiva, Virgílio Afonso da Silva6 destaca que “deve ser definido com base no significado deste direito para a vida social como um todo. Isso significa dizer que proteger o conteúdo essencial de um direito fundamental implica proibir restrições à eficácia deste direito que o tornem sem significado para todos os indivíduos ou boa parte deles.”

Nesta perspectiva, exigir que a Administração Pública fiscalize o cumprimento da legislação trabalhista pelo empregador contratado, não atende apenas ao direito de um indivíduo ou de um grupo de trabalhadores, mas visa proteger o conteúdo essencial de um direito fundamental e seu significado como valor fundante da república brasileira, nos termos estabelecidos pelo inciso IV do artigo 1º da CF/88.

As ponderações de Daniel Sarmento 7 também caminham nesta direção ao destacar que uma das conseqüências mais importantes da “dimensão objetiva dos direitos fundamentais é o reconhecimento de sua eficácia irradiante. Esta significa que os valores que dão lastro aos direitos fundamentais penetram por todo o ordenamento jurídico, condicionando a interpretação das normas legais e atuando como impulsos e diretrizes para o legislador, a administração e o Judiciário. Através dela, os direitos fundamentais deixam de ser concebidos

6 Afonso da Silva, Virgílio- Direitos Fundamentais- conteúdo essencial, restrições e eficácia- Malheiros editores- 2ª edição- São Paulo- pag 185.

7 Sarmento, Daniel- Direitos fundamentais e relações privadas- 2ª edição- 2ª tiragem- Lúmen Júris Editora- Rio de Janeiro 2008- págs 124 e seguintes

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como meros limites para o ordenamento e se convertem no norte do direito positivo, no seu verdadeiro eixo gravitacional” o que implica numa filtragem constitucional, na reinterpretação dos institutos legais “sob uma ótica constitucional”. Conclui que “a dimensão objetiva dos direitos fundamentais prende-se ao reconhecimento de que neles estão contidos os valores mais importantes de uma comunidade política” que penetram “por todo o ordenamento jurídico, modelando suas normas e institutos e impondo ao Estado deveres de proteção. Assim, já não basta que o Estado se abstenha de violar os direitos humanos. É preciso que ele aja concretamente para protegê-los de agressões e ameaças de terceiros, inclusive daquelas provenientes dos atores privados.”

Tais reflexões trazem subsídios importantes para a análise da controvérsia.

Se o ente público efetua contratação para a realização de um serviço, só porque tal se deu através de um processo licitatório estaria desobrigado de fiscalizar e exigir que este empregador cumpra suas obrigações trabalhistas, fundiárias e previdenciárias?

Se o Estado de Direito mantém a estrutura de uma Justiça Especializada Trabalhista como garantidora, por que iria permitir que um ente público se mantivesse inerte, precisamente quando a lesão é praticada contra aquele trabalhador que atua em seu benefício?

O marco normativo exige que o ente público acompanhe e fiscalize se o empregador contratado está cumprindo as obrigações patronais trabalhistas, fundiárias e previdenciárias, a fim de preservar o conteúdo essencial dos direitos trabalhistas instituídos como fundamentais pela Carta Política de 1988.

Com efeito, num Estado Democrático de Direito, como sustentar que a Administração Pública aufira proveito dos serviços de um trabalhador, mas lave as mãos em relação aos seus direitos trabalhistas, que detém natureza alimentar, efetuando o pagamento ao empregador sem fiscalizar se houve o efetivo cumprimento da norma fundamental prevista no artigo 7º da CF/88, e fique tudo por isso mesmo?

Acaso o artigo 71 da lei 8.666/93 desobriga a Administração Pública de respeitar os direitos fundamentais daquele que presta serviços em seu benefício?

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3. O artigo 71 da lei 8.666/93

Vejamos o que diz o texto legal.Estabelece o caput do artigo 71 da Lei 8.666/93 que:O contratado é responsável pelos encargos trabalhistas,

previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.

E o parágrafo 1º:A inadimplência do contratado, com referência aos encargos

trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o registro de imóveis

Acertadamente dispôs o preceito legal, pois cabe mesmo ao contratado a responsabilidade pelos encargos trabalhistas em decorrência de sua situação de empregador, condição que não se transfere ao ente público, porque nestes casos a Administração Pública está constitucionalmente impedida pelo inciso II do artigo 37 da CF/88 de atuar como empregadora, conforme observado pela Súmula 331 do C. TST ao dispor no inciso II:

A contratação irregular de trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou fundacional (art. 37 II da CF/88).

Agora, situação jurídica diversa é a referida pelo inciso IV da mesma Súmula, ao tratar da responsabilidade da Administração Pública pela omissão e negligência, quando deixa de exigir e fiscalizar o cumprimento da legislação trabalhista pelo empregador contratado, fixando que:

O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial ( art. 71 da lei 8.666/93)

Este é o texto que tem sido objeto de vários questionamentos

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perante o STF, como passaremos a examinar.

4. Inconstitucionalidade. A Súmula Vinculante nº 10

O Ministro Marco Aurélio Mello abriu divergência por ocasião do julgamento da ADC 16/ DF (ainda não concluído). Ao apreciar a Reclamação 9016 deferiu liminar, asseverando que a decisão proferida com esteio nesta diretriz jurisprudencial teria incorrido em declaração implícita de inconstitucionalidade do artigo 71 da Lei 8.666/93, sem observância da cláusula de reserva de plenário, com flagrante violação da Súmula Vinculante nº 10, que estabeleceu:

“Viola a cláusula de reserva de plenário ( CF, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte”.

Assim, é preciso analisar primeiramente a seguinte questão:A diretriz jurisprudencial estabelecida no inciso IV da

Súmula 331 do TST afastou a incidência do disposto no artigo 71 da Lei 8.666/93?

Penso que não. Em nenhum momento a constitucionalidade do referido

dispositivo legal foi questionada, nem mesmo de forma implícita. Pelo contrário, explicitamente se partiu do pressuposto de sua constitucionalidade, como demonstra o verbete sumular que faz menção expressa ao texto legal em seu inciso IV.

Ademais, a diretriz jurisprudencial trabalhista não estabeleceu a transferência dos encargos patronais do empregador para a Administração. Pelo contrário, não houve transferência de responsabilidade, pois o empregador permanece como o principal responsável pelo adimplemento da obrigação, de modo que aplicação do disposto no artigo 71 da Lei 8.666/93 foi observada também pelo inciso IV deste verbete.

Por outro lado, não se pode desconsiderar que a Lei 8.666/93 teve o objetivo de instituir normas para licitações/contratos da Administração Pública e não para disciplinar a responsabilidade advinda da conduta omissiva e negligente dos entes estatais.

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Ao estudar o instituto da licitação, Vladimir da Rocha França ressalta 8 que em relação à matéria os “princípios constitucionais não podem ser compreendidos como compartimentos estanques, tal como gavetas num armário. Tais normas jurídicas ganham maior intelecção e efetividade quando são conjugadas, no esforço de conferir harmonia, coerência e racionalidade à aplicação das regras do sistema do direito positivo. Nas licitações, os princípios jurídicos funcionam como bússolas na concretização das regras jurídicas que disciplinam a matéria no plano constitucional e infraconstitucional. Cabe ao gestor público justamente empregar esses preceitos fundamentais para otimizar a seleção da melhor proposta e a preservação da garantia da isonomia” evitando que haja a “ violação a um princípio jurídico durante a formação ou desenvolvimento da licitação”

Ora, o artigo 71 da Lei 8.666/93 não isentou a Administração Pública do dever de acompanhar e fiscalizar a atuação da empresa contratada quanto ao efetivo cumprimento das obrigações legais trabalhistas.

Nem pode ser interpretado como permissivo legal que possibilite a adoção de conduta negligente por parte do ente público, que permite a violação de princípios jurídicos e cause lesão aos direitos fundamentais do trabalhador, que presta serviços em seu benefício.

A responsabilidade subsidiária não transfere à Administração Pública a responsabilidade que é própria do empregador, tendo em vista que em seu conceito está implícita a observância do benefício de ordem e a possibilidade de ação regressiva.

Destarte, a interpretação sistemática do disposto no caput do artigo 71 e seus parágrafos respalda a fixação da responsabilidade subsidiária da Administração Pública, nos termos estabelecidos na Súmula 331 pelo Tribunal Superior do Trabalho, que assim atua no legítimo exercício de sua competência constitucional exclusiva (art. 111 e seguintes da CF/88).

Interessante analisar as razões de decidir exaradas no voto proferido pelo Ministro César Peluso no julgamento da ADC 16/ DF, em que o Distrito Federal busca a declaração de constitucionalidade

8 França, Vlademir da Rocha- Considerações sobre a legalidade e demais princípios jurídicos da licitação- in Princípio da legalidade: da dogmática jurídica à teoria do Direito- coordenadores Cláusio Brandão, Francisco Cavalcanti e João Mauricio Adeodato- Editora Forense- Rio de Janeiro- 2009- pags. 395 a 416

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do artigo 71 da Lei 8.666/93 em face da aplicação da referida Súmula. Ponderou este Relator que não havia sentido em apreciar o pedido, pois a presunção de constitucionalidade do referido dispositivo não estava em cheque, sendo que além de assegurar a satisfação dos débitos trabalhistas, mediante a responsabilidade subsidiária do ente público tomador de serviço, a Súmula do TST preservou o constante do parágrafo 1º do artigo 71 da Lei 8.666/93, cuja menção expressa consignou no referido verbete, concluindo não ter sido demonstrada a existência de controvérsia sobre a constitucionalidade da norma. O Ministro Marco Aurélio apresentou divergência e o julgamento foi suspenso por pedido de vista do então Ministro Menezes Direito.

5. A aferição dos limites de aplicação da lei implica no controle difuso de constitucionali-dade?

Ante tal panorama, o exame da questão exige que seja apreciado o seguinte ponto nodular da controvérsia:

A aferição dos limites de aplicação de um determinado dispositivo legal implica controle difuso de constitucionalidade?

Quando os Tribunais do Trabalho procedem à interpretação sistemática, a fim de aferir os limites de aplicação de diferentes dispositivos legais, tal configura, por si só, controle de constitucionalidade?

Ao apreciar a Reclamação 6665/ 2008, apresentada em relação a decisão proferida pelo TRT da 2ª Região no P. 01663.2005.291.02.00-1, o Ministro Joaquim Barbosa julgou improcedente o pedido, ponderando:

“A simples ausência de aplicação de uma dada norma jurídica ao caso sob exame não caracteriza, tão-somente por si, violação da orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal. Por exemplo, é possível que dada norma não sirva para desate do quadro submetido ao crivo jurisdicional pura e simplesmente porque não há subsunção”. Para caracterização da ofensa ao artigo 97 da Constituição, que estabelece a reserva de plenário (full bench) para declaração de inconstitucionalidade, é necessário que a causa seja decidida sob critérios diversos, alegadamente extraídos da Constituição, de modo a levar ao afastamento implícito ou explícito da norma por

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incompatibilidade com a Constituição.Ademais, é importante lembrar que não se exige a reserva

estabelecida no artigo 97 da constituição sempre que o Plenário, ou órgão equivalente do Tribunal já tiver decidido a questão.

...é importante salientar que a Súmula 10 desta Corte não se refere às exceções à observância da cláusula de reserva de plenário (art. 97 da CF/88). A súmula explicita e veda uma forma indireta de burla ao disposto no artigo 97 da CF/88. Desse modo, permanecem hígidas no sistema as exceções legalmente previstas à cláusula de reserva de plenário” (RCL 7.874, Rel Min Joaquim Barbosa, decisão monocrática DJ de 23.04.2009)

Conforme ressaltado, a interpretação sistemática, ínsita a todo julgamento, efetuada com o escopo de aferir qual a norma apta a possibilitar a subsunção necessária para obter a solução de determinada controvérsia, não configura controle difuso de constitucionalidade dos demais dispositivos legais, que não se destinavam a disciplinar a situação jurídica em conflito.

A Lei federal 8.666/93, promulgada para estabelecer “normas gerais sobre licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios”, disciplina as relações entre licitante e licitado, mas nada dispõe sobre a responsabilização da administração Pública pela conduta negligente que viole direitos fundamentais do trabalhador que atua em seu benefício, de modo que não há como ampliar sua aplicação à situação jurídica diversa daquela que visou regular.

Ademais, como bem pondera Maria Sylvia9, o procedimento licitatório decorre do “princípio da indisponibilidade do interesse público” e se constitui numa “restrição à liberdade administrativa

9 Di Pietro, Maria Sylvia Zanella- obra citada- pag. 335

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na escolha do contratante; a Administração terá que escolher aquele cuja proposta melhor atenda ao interesse público”. Deste modo, desatende aos princípios da moralidade e probidade, referidos nos artigos 89 a 99 da Lei 8.666/93, a Administração Pública que deixa o contratante atuar sem fiscalização, permitindo que descumpra a legislação trabalhista mesmo recebendo recursos públicos para tanto, assim lesando também o interesse público.

A diretriz jurisprudencial fixada pela Súmula 331 não trata da constitucionalidade, ou não, do artigo 71 da Lei 8.666/93, mas da sua observância nos termos em que foi estabelecido, o que afasta a interpretação ampliativa e aplicação do referido dispositivo a situação jurídica que não visou disciplinar, como a referente à responsabilidade do ente público que paga sem fiscalizar se as obrigações patronais trabalhistas do empregador contratado foram satisfeitas, adotando flagrante conduta negligente, que viola os direitos trabalhistas.

Neste contexto, o marco normativo que permite a subsunção do fato (conduta lesiva por omissão da Administração Publica) está posto no artigo 186 do Código Civil ao dispor :

Art. 186 - Aquele que, por ação ou

omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Tal imputação não caracteriza a transferência vedada pelo artigo 71 da Lei 8.666/93, porque o empregador continua a deter com exclusividade a responsabilidade patronal contratual. A responsabilidade da Administração Pública deriva de fato gerador diverso, ex lege, tendo a Súmula 331 observado tal disposição legal ao atribuir-lhe a conotação de subsidiária, em que é de rigor a observância do benefício de ordem e a possibilidade de ação regressiva, de sorte que se trata de uma questão de subsunção do fato à norma, uma questão de legalidade, que em nenhum momento resvalou para o exame da constitucionalidade, o que afasta a aplicação da exigência contida na Súmula Vinculante nº 10.

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6. O balizamento de conduta. Boa governan-ça. Accountability

Como anteriormente ressaltado, o argumento de que a responsabilidade subsidiária do Estado não poderia subsistir, pois o interesse público tem supremacia sobre o particular, da forma como foi construído não se sustenta, por se revelar falacioso.

Com efeito, não se trata de fazer valer o direito de um indivíduo ou de um grupo de empregados, mas de preservar o conteúdo essencial dos direitos trabalhistas, cujo cumprimento se reveste de inequívoco interesse público por se tratar de norma fundamental, assim instituída pela Lei Maior em seu artigo 7º.

Ademais, como considerar que uma conduta omissa e negligente por parte da Administração Pública possa ser considerada preservadora do interesse público?

Os preceitos infraconstitucionais que disciplinam a licitação se referem à situação jurídica diversa e não afastam o interesse público, nos termos em que foi conceituado pela Constituição quanto ao respeito ao marco normativo trabalhista, estabelecido sob a matriz fixada nos princípios fundantes estabelecidos nos incisos III e IV do artigo 1º da Constituição Federal de 1988.

Como bem pondera Maria Sylvia Zanella di Pietro10 a “preocupação com a proteção do interesse público nasceu com o Estado Social. E não nasceu para proteger um interesse público único, indeterminado, difícil ou impossível de definir-se”, mas “para proteger os vários interesses das várias camadas sociais.” Conhecido também como princípio da finalidade pública “vincula a autoridade administrativa em toda a sua atuação” e tem o objetivo primordial de atender ao bem-estar coletivo. Assim, se a lei concede à Administração o poder/dever de processar uma licitação, tal expediente não pode ser usado como salvo conduto para burlar as leis trabalhistas, pois tal configura abuso de poder que viola o interesse público.

Neste sentido as lúcidas reflexões de Celso Antonio Bandeira de Mello11 ao ressaltar que “sendo interesses qualificados

10 Di Pietro, Maria Sylvia- obra citada pag. 37 e seguintes; 63 e seguintes.

11 Mello, Celso Antonio Bandeira de- Curso de Direito Administrativo- Malheiros- São Paulo – ano 2010- pags. 73/74

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como próprios da coletividade - internos ao setor público - não se encontram à livre disposição de quem quer que seja, por inapropriáveis. O próprio órgão administrativo que os representa não tem disponibilidade sobre eles, no sentido de que lhe incumbe apenas curá-los - o que é também um dever - na estrita observância do que dispuser a intentio legis”.concluindo que a Administração Pública tem natureza instrumental, não detendo o Juízo de disponibilidade para escolher quais dos interesses públicos confiados a sua guarda e realização deverão ser observados, ou não, sob pena de ter que responder pela omissão.

O nexo causal justificador da responsabilização é a conduta omissiva e negligente do ente público, que se beneficia da força de trabalho de alguém e remunera seu empregador sem fiscalizar se este cumpriu com suas obrigações trabalhistas. Destarte, a construção jurisprudencial contida no inciso IV da Sumula 331 foi explicitada secundum legem, escorada no artigo 186 do Código Civil, aplicável por compatível com o Direito Trabalhista, restando plenamente observado o princípio da legalidade, tendo o Tribunal Superior do Trabalho assim atuado no desempenho de sua função constitucional, com o escopo de proceder à necessária uniformização da jurisprudência.

Mas não é só.Produz efeito que se espraia por toda a sociedade como

balizador de conduta, ao sinalizar que a Administração Pública deve proceder com mais cautela, fiscalizando e acompanhando a prestação de serviços em prol do interesse público, dever legal que não pode ser afastado pelo simples fato da contratação ter ocorrido mediante processo licitatório.

Neste sentido, trago novamente à colação as reflexões de Celso Antonio Bandeira de Mello, ao pontuar que o princípio da finalidade está encartado na legalidade, pois não se “compreende uma lei, não se entende uma norma, sem entender qual é o seu objetivo. Donde não se aplica uma lei corretamente se o ato de aplicação carecer de sintonia com o escopo por ela visado. Implementar uma regra de direito não é homenagear exteriormente sua dicção, mas dar satisfação a seus propósitos. Logo só se cumpre a legalidade quando se atende a sua finalidade. A atividade administrativa desencontrada com o fim legal é inválida e, por isso, judicialmente censurável”

O processo licitatório tem a finalidade de escolher a melhor

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proposta em igualdade de condições, em prol do interesse público.A responsabilização da Administração pelo acompanhamento

e fiscalização dos serviços contratados emerge, portanto, da própria finalidade da lei. Ademais, se reveste de inequívoco efeito moralizador dos procedimentos administrativos, conferindo-lhes maior lisura. Com efeito, cientes de que haverá efetiva fiscalização pelo ente público, os interessados só participarão de um processo licitatório se tiverem condições de honrar a proposta apresentada em sua integralidade, o que inclui o cumprimento das conseqüentes obrigações trabalhistas.

O argumento de que a responsabilidade subsidiária do Estado não poderia subsistir em tais casos, pois o interesse público tem supremacia sobre o particular, também se revela insustentável por ser antitético.

Como vislumbrar que está sendo priorizada a supremacia do interesse público, se houve a escolha de proposta menos vantajosa por apresentar números e valores irreais, já contando com o posterior inadimplemento das obrigações trabalhistas, assim viciando o próprio processo licitatório ao elidir a igualdade de condições?

Como sustentar que está sendo atendido o interesse público, quando tal situação via de regra leva a uma paralisação dos serviços pelos trabalhadores que deixam de receber seus direitos, mesmo quando o empregador já foi pago pela Administração com recursos públicos?

Ora, é precisamente o contrário!A responsabilização subsidiária do Estado visa preservar o

interesse público sobre interesses outros, nem sempre confessáveis, daqueles que participam de um processo licitatório apresentando propostas fictícias, já contando com futura inadimplência de certas obrigações. Trata-se de cumprir o princípio da legalidade e fazer valer a finalidade do ordenamento jurídico, evitando que a licitação seja usada para auferir vantagens e burlar a legislação trabalhista pelo contratante, causando pesado ônus para a sociedade como um todo, que arcará com os custos da máquina judiciária a ser movimentada pelos trabalhadores para o recebimento de seus direitos, além dos prejuízos causados pela falta de recolhimento das contribuições devidas.

O ordenamento jurídico do país não está fatiado em comportamentos estanques. As leis se articulam como vasos

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comunicantes, tendo por escopo o balizamento da conduta social. Ao exigir que o ente público fiscalize a atuação do contratado, quanto ao cumprimento das obrigações trabalhistas, a lei está sinalizando que o processo licitatório é prá valer e não uma peça de ficção. Está evidenciando que o Estado que exige o cumprimento da lei trabalhista através da Justiça do Trabalho é o mesmo Estado que fiscaliza tal cumprimento na prestação de serviços por parte de terceiros, ou seja, o padrão de conduta exigível dos cidadãos é o mesmo, conferindo maior legitimidade ao próprio processo licitatório, por sinalizar aos participantes que atuará durante a prestação de serviços para evitar que tais parâmetros sejam infringidos de forma transversa.

A maioridade do país, como nação, exige que tais marcos paradigmáticos sejam respeitados por todos, sem excluir a Administração Pública, que detém responsabilidade fiscalizadora durante a prestação dos serviços contratados.

É dizer, a lei não vale só para os outros, mas para a Administração Pública também, e com muito mais razão. O ordenamento jurídico não ampara a interpretação que possibilita a negligência e omissão do próprio ente público, reduzindo-o a triste figura de acobertador da conduta ilícita do empregador contratado.

Com efeito, qual o fundamento jurídico para sustentar que ao atuar como tomador o ente público estaria dispensado de exigir e fiscalizar o efetivo cumprimento da lei trabalhista, se a força de trabalho foi prestada em seu benefício?

Como admitir que teria obrigação de ressarcir o dano provocado por ato ilícito, praticado contra terceiros, conforme prevê o parágrafo 6º do artigo 37 da CF/88, mas estaria desobrigado de responder pelo ilícito praticado contra um trabalhador, de cuja atuação auferiu proveito?

Com percuciência pondera Maria Sylvia 12 que quando “a administração pública recorre a terceiros para a execução de tarefas que ela mesma pode executar, ela está terceirizando. Embora se trate de contratação que obedece às regras e princípios do direito administrativo, a terceirização acaba, muitas vezes, por implicar burla aos direitos sociais do trabalhador da empresa prestadora do serviço, o que coloca a Administração Pública sob a égide do direito

12 Di Pietro, Maria Sylvia Zanella- obra citada- pag 325

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do trabalho. Daí a necessidade de sujeitar-se às decisões normativas da Justiça do Trabalho.”

Luis Roberto Barroso13 caminha nesta mesma direção ao ressaltar que a cabe à Constituição de um Estado democrático “veicular consensos mínimos, essenciais para a dignidade das pessoas e para o funcionamento do regime democrático, que envolvem a garantia dos direitos fundamentais.”

Neste contexto, o fato de ter ocorrido um processo de licitação isenta a Administração Pública de responder pelos atos ilícitos praticados?

Poderia ser utilizado o artigo 71 da Lei 8.666/93 como salvo-conduto para justificar conduta negligente e respaldar a irresponsabilidade da Administração Pública, quando todo o ordenamento jurídico aponta em sentido inverso?

Ao aplicar as balizas reitoras explicitadas no artigo 186 do Código Civil e 37 da CF/88, notadamente quanto à observância dos princípios da finalidade como informador da legalidade, moralidade, publicidade e eficiência, exige-se que Administração Pública atente para as regras da boa governança, para a observância da accountability, conduta que irradiará seus efeitos por todo o tecido social, estimulando a ética concorrencial no processo licitatório, o que redundará na prestação de um serviço público de melhor qualidade, agora sim, em benefício da coletividade e do interesse público da nação.

7. A cláusula de reserva de plenário

A decisão proferida com espeque na diretriz jurisprudencial consignada na Súmula 331 viola a cláusula de reserva de plenário?

Ao disciplinar a matéria, estabeleceu a Constituição Federal em seu artigo 97:

“Somente pelo voto da maioria absoluta de seus membros ou dos membros do respectivo órgão especial poderão os tribunais declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público”.

Trata-se, portanto, de exigência a ser observada quando se

13 Barroso-Direito constitucional contemporâneo- págs 90/91

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questiona a inconstitucionalidade de uma lei.Não é esse o caso, pois a Súmula 331 do C. TST faz

expressa menção ao artigo 71 da Lei 8.666/91, reconhecendo sua constitucionalidade.

Ademais, não se pode perder de vista que este entendimento jurisprudencial advém de uma Súmula expedida pelo Plenário de um Tribunal Superior, que tem competência para tanto, assim atraindo a aplicação do disposto no artigo 557 do CPC, compatível com o processo trabalhista, que preceitua:

“O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal ou de Tribunal Superior.

Se a edição de Súmula pelo Tribunal Superior (TST) produz fundamentos judiciais suficientes para respaldar uma decisão monocrática, por que deixaria de gerar efeitos quando se trata de uma decisão de Colegiado, quando a lei sinaliza exatamente em sentido contrário como consta do parágrafo 2º deste artigo?

Tal raciocínio foi claramente explicitado pelo Ministro Ayres Brito ao apreciar reclamação com o mesmo questionamento, decidindo nos seguintes termos:

“Trata-se de reclamação constitucional, aparelhada com pedido de medida liminar, proposta pelo Estado de Minas Gerais, contra acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região. 2. Argúi o autor que a Quinta Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, ao negar provimento a recurso ordinário em reclamação trabalhista, afastou a aplicabilidade do § 1º do art. 71 da Lei nº 8.666/93. Isto sem que houvesse pronunciamento do Plenário do tribunal acerca da inconstitucionalidade do dispositivo legal. (...) E o fato é que essa súmula foi objeto de análise pelo Plenário do Tribunal Superior do Trabalho no Incidente de Uniformização de Jurisprudência nº 297.751/96, em

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11 de setembro de 2000. Não houve, portanto, nenhuma violação à reserva de plenário (art. 97 da Constituição Federal). Digo isto porque me parece, neste juízo provisório, aplicável ao caso a disciplina do parágrafo único do art. 481 do Código de Processo Civil, in verbis: “Parágrafo único. Os órgãos fracionários dos tribunais não submeterão ao plenário, ou ao órgão especial, a argüição de inconstitucionalidade, quando já houver pronunciamento destes ou do plenário do Supremo Tribunal Federal sobre a questão (...)”

(STF-Rcl-8216- MC/MG, Rel. Min. Carlos Ayres Britto, publicado no DJ de 19.05.09) (grifou-se).

“(...) Ademais, não me parece razoável que o relator, nos termos do art. 557 do Código de Processo Civil (O relator negará seguimento a recurso manifestamente inadmissível, improcedente, prejudicado ou em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do respectivo tribunal, do Supremo Tribunal Federal, ou de Tribunal Superior) possa, monocraticamente, com supedâneo em súmula ou jurisprudência dominante de tribunal superior, julgar improcedente um recurso (que, lembre-se, não raro ataca sentença em que se tenha declarado a inconstitucionalidade de lei), sem que se confira a mesma prerrogativa às Turmas ou Câmaras dos tribunais. Daí a leitura conjunta que há de se fazer do parágrafo único do art. 481 e do art. 557, ambos do Código de Processo Civil (...)”

(STF-Rcl-7219- MC/MG, Rel. Min. Carlos Ayres Britto, publicado no DJ de 13.02.2009) (grifou-se).

Importante ressaltar os termos em que foi exarado posicionamento, quando analisada a matéria referente à Súmula

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Vinculante nº10, conforme registro dos debates que constam da 15ª e 16ª Sessões Plenárias do STF - DJe nº 172/2008 Divulgação: quinta-feira- 11 de setembro Publicação: sexta-feira - 12 de setembro, cujo texto a seguir transcrevo, com grifos ora acrescentados:

DEBATES QUE INTEGRAM A ATA DA 15ª (DÉCIMA QUINTA)

SESSÃO ORDINÁRIA, DO PLENÁRIO, REALIZADA EM 11 DE JUNHO DE 2008

D E B AT E S PA R A A A P R O VA Ç Ã O D A S Ú M U L A VINCULANTE Nº 7

O SR. MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) – Senhores Ministros, talvez em relação a esses dois casos, a Súmula nº 648, e em relação também à reserva de Plenário, nós pudéssemos elaborar uma Súmula, ouvido o Procurador-Geral, e depois poderíamos chegar a um texto, porque parece que são matérias pacíficas.

Em relação à Súmula nº 648, claro, já se trata de entendimento sumulado.

Em relação à reserva de Plenário, com as ressalvas que nós conhecemos e que a jurisprudência do Supremo encaminhou, e depois foram incorporadas inclusive pelo legislador, nos arts. 481 e 482 do CPC, também é uma matéria bastante pacífica. Acho que não há nenhuma dúvida em relação a isso.

DEBATES QUE INTEGRAM A ATA DA 16ª (DÉCIMA SEXTA)

SESSÃO ORDINÁRIA, DO PLENÁRIO, REALIZADA EM 18 DE JUNHO DE 2008

D E B AT E S PA R A A A P R O VA Ç Ã O D A S Ú M U L A VINCULANTE Nº 10

O SR. MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - Penso já ter sido distribuída a proposta de súmula que deliberamos na sessão anterior sobre a questão da reserva de Plenário. Houve aprovação, mas a Ministra Ellen Gracie, agora, nos submete essa

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proposta. Vou ler o texto (Questão de Ordem no RE 580.108): “Viola a cláusula de reserva de plenário (Constituição Federal, artigo 97) a decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de norma, afasta a sua incidência no todo ou em parte”.

O SR. MINISTRO MARCO AURÉLIO - Presidente, claro que podemos deixar de aplicar uma lei por ser também inadequada à espécie em termos de regência. Agora, no caso a premissa é única, a declaração - diria -“escamoteada” de inconstitucionalidade da lei. Penso que a percepção dessa premissa está na cláusula, embora não declare expressamente, ou seja, afasta, para aplicar a Constituição Federal, sem levar o incidente a órgão especial ou ao Plenário. Sendo esse o sentido, estou de pleno acordo. Presidente, apenas mais uma colocação, para que fique documentado, inclusive quanto ao meu ponto de vista. Aqui também não está apanhada a situação em que, em processo subjetivo, já houve a declaração de inconstitucionalidade da lei pelo Supremo.

O SR. MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - Ou mesmo pelo órgão especial do Tribunal porque o CPC faz essa ressalva.

O SR. MINISTR O MAR CO AURÉLIO - Havendo decisão do próprio Tribunal, claro que não têm de ocorrer sucessivos incidentes.

O SR. MINISTRO GILMAR MENDES (PRESIDENTE) - Que são aquelas hipóteses em que a própria lei ressalva.

A S R A . M I N I S T R A E L L E N G R A C I E - S e n h o r Presidente, eu gostaria apenas, como autora da proposta, de sugerir uma pequena alteração, que me foi alcançada pelo colega Ministro Carlos Britto. Na redação que Vossas Excelências têm em mãos, quando se diz: “não declare expressamente a inconstitucionalidade de norma” substitua-se esse termo “norma” por “lei ou ato normativo do poder público”. Com isso estaremos reproduzindo o texto do art. 97 da Constituição. Acato essa ponderação do Ministro Carlos Britto, penso que enriquece a redação.”

..........................................Portanto, esta será a Súmula Vinculante nº10:“Viola a cláusula de reserva de plenário (CF, artigo 97) a

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decisão de órgão fracionário de tribunal que, embora não declare expressamente a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do poder público, afasta sua incidência, no todo ou em parte.”

Destarte, como a ressalva quanto à aplicação do preceituado nos artigos 481 e 482 do CPC foi devidamente destacada nos debates, e a interpretação da Súmula Vinculante nº 10 não pode ultrapassar as balizas postas pelo artigo 97 da CF/88, onde estaria a violação da cláusula de reserva de plenário na decisão que adotou o entendimento contido na Súmula 331?

Após apreciar inúmeros processos, nos quais ficou evidenciado o comportamento negligente do ente público, quando deixa de fiscalizar o cumprimento da legislação trabalhista pelos contratados, que atuavam como empregadores dos trabalhadores que prestavam serviços em seu benefício, o Tribunal Superior do Trabalho reputou constitucional o artigo 71 da Lei 8.666/93 nos termos em que foi promulgado. Assim, manteve o ali disposto quanto à impossibilidade de transferência das obrigações patronais, estabelecendo expressamente na Súmula 331 que não há vínculo de emprego ente o ente público e o trabalhador. Ao aplicar o referido verbete as Câmaras ou Turmas mantêm este entendimento quanto à vedação de transferência, de modo que em nenhum momento se coloca em questão a inconstitucionalidade, nem mesmo implícita, do artigo 71 da Lei 8.666/93

8. Poderia ser diferente?

Ao constatar que o comportamento negligente da Administração Pública provoca lesão aos direitos fundamentais do trabalhador, respaldado na diretriz constitucional prevista no inciso IV do artigo 1º e no parágrafo 6º do artigo 37, ambos da CF/88, bem como artigo 186 do Código Civil, cuja aplicação considera compatível com o direito trabalhista, o TST vem reconhecendo a responsabilidade subsidiária pela reparação da lesão, o que implica a observância do benefício de ordem e possibilita ação regressiva.

Portanto, não há qualquer transferência das obrigações empregatícias.

O empregador continua, como sempre, detentor da responsabilidade patronal. A responsabilidade do ente público decorre

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de fato gerador distinto, ex lege, qual seja, o comportamento culposo por negligência.

E poderia ser diferente?A Justiça Trabalhista poderia ignorar que um número

expressivo de entes públicos deixam de cumprir seu dever de fiscalizar a prestação de serviços pelos contratados, efetuando pagamentos sem antes exigir a comprovação de que houve a observância das obrigações patronais trabalhistas?

Poderia admitir que a omissão do ente público redunde num enriquecimento ilícito do empregador, que se apodera dos valores referentes às verbas trabalhistas, deixando de efetuar os pagamentos de natureza alimentar devidos ao seu empregado, além de sonegar os recolhimentos fundiários e previdenciários ?

A Constituição pode ser reduzida a um simples ajuntamento de normas, com o descumprimento das regras de boa governança e accountability que instituem o devido processo legal administrativo, sob o descarado argumento de que o agente público se limitou a seguir os trâmites de um procedimento licitatório?

Os direitos fundamentais, estabelecidos como vigas de edificação da República Brasileira pela Carta Constitucional, podem ser rebaixados a condição de mero regimento?

A Carta Constitucional é bússola que fixa a diretriz, o caminho a ser percorrido pelo ordenamento jurídico para preservar o conteúdo essencial dos direitos fundamentais, que sustentam institucionalmente o país, preservando sua vitalidade como nação.

Assim é porque a Constituição atua como “fonte de Direito (constitucional) e também conjunto normativo que disciplina as demais fontes do direito”, como pontua André Ramos Tavares14

Cabe ao intérprete promover a análise sob tal perspectiva, para garantir a harmonia que propicia a efetividade do sistema. Para tanto, não se pode deixar de acompanhar Luis Roberto Barroso 15 quando ressalta que a ordem jurídica é um sistema dotado de unidade e harmonia. “Os diferentes ramos do direito constituem subsistemas

14 Tavares, André Ramos- Teoria da Justiça Constitucional- Editora Saraiva- São Paulo- 2005- pag. 45

15 Barroso, Luis Roberto- obra citada- págs 294/295

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fundados em uma lógica interna e na compatibilidade externa com os demais subsistemas” sendo a Constituição um “fator de unidade do sistema como um todo, ditando os valores e fins que devem ser observados e promovidos pelo conjunto do ordenamento”. Por isso, o Direito “existe para realizar determinados fins sociais, certos objetivos ligados à justiça, à segurança jurídica, à dignidade da pessoa humana e ao bem-estar social”, princípios albergados na Constituição que se irradiam por todo o sistema jurídico do país.

Poderia ser diferente ?

9. Conclusão

A regra posta no artigo 71 da Lei 8.666/93 estabeleceu que os deveres patronais próprios do empregador não se transferem para a Administração Pública, mas não excluiu sua responsabilização pela preservação dos direitos fundamentais do trabalhador, base de sustentação do ordenamento jurídico de um Estado de Direito, cuja exigibilidade se reveste de interesse público, de sorte que falacioso e incabível o argumento que pretende restringir a dimensão da controvérsia a um simples confronto entre público e privado.

Ademais, em cumprimento aos princípios da legalidade, moralidade e eficiência albergados no artigo 37 da CF/88, a Administração Pública tem obrigação legal de pautar sua atuação pela boa governança e accountability na gestão da coisa pública, de modo que lhe cabe fiscalizar o empregador contratado para que cumpra com suas obrigações trabalhistas. O fato desta contratação ter ocorrido mediante processo licitatório não elide tal conclusão, pois não afasta a aplicação do artigo 186 do Código Civil quando o comportamento negligente e omisso do ente público possibilita a violação e lesão aos direitos fundamentais do trabalhador, que atuou em seu benefício.

Assim sendo, ao consignar que as obrigações patronais do empregador não se transferem ao ente público, mas não impedem a sua responsabilização pela conduta culposa in vigilando, por omissão e negligência, imputando-lhe a responsabilidade subsidiária, que implica a observância do benefício de ordem e possibilita a ação regressiva, a diretriz jurisprudencial traçada na Súmula 331 pelo TST não tratou da constitucionalidade, mas da legalidade, da subsunção do fato à norma apta para discipliná-lo, inexistindo na decisão pautada

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por tal diretriz qualquer descumprimento da cláusula de reserva de plenário preceituada no artigo 97 da CF/88 e referido na Súmula Vinculante nº 10.

10. Referências Bibliográficas

DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella- Direito Administrativo- 21 ª edição- Editora Atlas S.A.- São Paulo- 2008- MENDES, Gilmar Ferreira- Direitos Fundamentais e controle de constitucionalidade- estudos de direitos constitucional- Editora Saraiva – 2004- 3ª edição- São Paulo- FERRAJOLI, Luigi- Direito e Razão- 3ª edição- Editora Revista dos Tribunais- São Paulo- 2010- BARROSO, Luis Roberto- Curso de Direito Constitucional contemporâneo- Editora Saraiva-1ª edição 2009- AFONSO DA SILVA, Virgílio- Direitos Fundamentais- conteúdo essencial, restrições e eficácia- Malheiros editores- 2ª edição- São Paulo- SARMENTO, Daniel- Direitos fundamentais e relações privadas- 2ª edição- 2ª tiragem- Lumen Juris Editora- Rio de Janeiro 2008- FRANÇA, Vlademir da Rocha- Considerações sobre a legalidade e demais princípios jurídicos da licitação- in Princípio da legalidade: da dogmática jurídica à teoria do Direito- coordenadores Cláudio Brandão, Francisco Cavalcanti e João Mauricio Adeodato- Editora Forense- Rio de Janeiro- 2009 MELLO, Celso Antonio Bandeira de - Curso de Direito Administrativo- Malheiros- São Paulo - ano 2010- TAVARES, André Ramos- Teoria da Justiça Constitucional- Editora Saraiva- São Paulo- 2005-

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Jurisprudência

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AcórdãosPROC. Nº TRT - 00327-2009-000-06-00-5

ÓRGÃO JULGADOR: TRIBUNAL PLENO

RELATOR: DESEMBARGADOR PEDRO PAULO PEREIRA NÓBREGAIMPETRANTE: ANDRÉA FERNANDA GONÇALVES DA SILVAIMPETRADA: JUÍZA DA 1ª VARA DO TRABALHO DO RECIFELITISCONSORTES: LOSANGO PROMOÇÕES DE VENDAS LTDA. E HSBC BANK BRASIL S.A. – BANCO MÚLTIPLOADVOGADO: IVAN BARBOSA DE ARAÚJO

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA – JUNTADA DE DO-CUMENTAÇÃO DE CONTEÚDO JURISPRUDENCIAL – INDEFE-RIMENTO PELO “A QUO” – VIOLAÇÃO A DIREITO LÍQUIDO E CERTO – CONFIGURAÇÃO – CONCESSÃO DA SEGURANÇA. 1. A expressão ilegalidade utilizada no texto constitucional tem sentido amplo. Resulta, outrossim, que o ato contra o qual se insurge a parte impetrante deve ser, na realidade, manifestamente ilegal, entendida dita palavra, de modo extenso, como serviente a designação de procedi-mento oficial contrário à lei, abrangente nessa contemplação não só o ato efetivamente praticado nessa condição, como também aquele de previsão inexistente. “In casu”, apesar de o conteúdo encerrado na documentação – cuja juntada foi indeferida pelo “a quo” – consubs-tanciar o posicionamento adotado por outros órgãos judiciários em outros feitos, mas sobre o mesmo direito objetado na reclamatória em apreço, entendo que a pretensão da impetrante conta com apoio na legislação e sobretudo na tradição do nosso direito pátrio. Tanto é assim que a jurisprudência representa uma fonte do Direito do Trabalho,

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relevando o fato de que, na realidade, essa manifestação não obriga nem vincula os magistrados, que são livres para decidir conforme seu convencimento e a interpretação dos ditames contidos na lei. Todavia, partindo do pressuposto de que muitos direitos trabalhistas somente surgiram na formatação legal após reiteradas decisões judiciais que os reconheceram, entendo que a jurisprudência é uma importante fonte do Direito, especificamente em se tratando da seara trabalhista, haja vista os numerosos verbetes sumulares expedidos pelo TST. No aspecto, aliás, o artigo 397 do CPC, é enfático em exortar que as par-tes poderão apresentar documentos em qualquer fase do processo. Assim sendo, não havendo vedação legal para juntada de documentos nos autos – desde que observado o momento oportuno para tanto, como ocorreu na hipótese a trato –, claro que muito menos haverá com relação às decisões proferidas sobre a matéria objeto da ação, as quais – repita-se – podem trazer fatos elucidativos ao seu julgamento. Nestes termos, qualquer impedimento quanto à realização desse ato processual gera e induz transgressão a direito líquido e certo da parte, defensável por intermédio do mandamus. 2. Segurança concedida.

Vistos etc.

Mandado de Segurança impetrado por ANDRÉA FERNANDA GONÇALVES DA SILVA, contra ato praticado pela JUÍZA TITULAR DA 1ª VARA DO TRABALHO DO RECIFE, nos autos da Reclamação Trabalhista nº 00689-2009-001-06-00-2, ajuizada contra LOSANGO PROMOÇÕES DE VENDAS LTDA. e HSBC BANK BRASIL S.A. – BANCO MÚLTIPLO, consistente no indeferimento de juntada aos autos de cópias de decisões proferidas em outros processos que tramitaram em juízos trabalhistas diversos.

A petição inicial (fls. 02/28) veio acompanhada do instrumento de mandato de fl. 29, além dos documentos de fls. 30/105, que representam a prova pré-constituída, os quais contam com a declaração de autenticidade de fl. 08, firmada pelo advogado que subscreveu a exordial, fulcrada na atual redação do artigo 830 da CLT, sendo suficientes à compreensão da matéria fático-jurídica que envolve o presente mandamus.

Alegando haver demonstrado a presença dos requisitos

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legais, o impetrante requereu, como medida liminar, “a suspensão do ilegítimo ato judicial, da Exmª Srª Drª Juíza Titular, da MM. 1ª Vara do Trabalho do Recife, Drª Yolanda Polimeni de Araújo Pinheiro, objeto do presente ´writ`, assegurando-se, por conseguinte, a efetiva manutenção, no bojo dos autos processuais de nº 00689-2009-001-06-00-2, referentes à ação trabalhista, ali proposta, pela ora requerente, de todas as fotocópias de decisões legitimamente, lá apresentadas, pela ora impetrante, com o fito de prestarem-se, durante todo o seu curso, em nível de subsídios jurisprudenciais (artigo 8º da CLT)” (fl. 26).

Considerando a relevância dos fundamentos desta ação mandamental, bem assim, a demonstração do perigo da demora, deferi a providência postulada, para suspender os efeitos da aludida ordem judicial (fls. 108/111).

Ao apreciar a liminar acima referida, determinei, também, fosse oficiada a autoridade impetrada para prestar as informações previstas no inciso I do artigo 7º da então vigente Lei nº 1.533/51, as quais vieram aos autos em 24.08.2009, consoante expediente de fls. 119/121, em que foram relatados os acontecimentos que geraram a emissão do ato hostilizado.

Os litisconsortes, apesar de regularmente notificados (fls. 114 e 115), não apresentaram resposta ao presente mandamus, conforme certificado à fl. 123.

O Ministério Público do Trabalho, através do Procurador Aluísio Aldo da Silva Júnior, emitiu o parecer de fls. 125/126, opinando pela denegação da segurança.

É o relatório.

VOTO:

1. DA MATÉRIA OBJETO DA PRESENTE

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SEGURANÇA

Trata-se de mandado de segurança contra ato praticado pela Juíza Titular da 1ª VT do Recife, que, como dito antes, indeferiu a juntada, aos autos, de cópias de decisões proferidas em outros processos e oriundos de juízos trabalhistas diversos, cujos elementos, no dizer da impetrante, tinham como escopo servir de subsídios jurisprudenciais.

Respeitada a asserção externada pelo a quo, inclusive já veiculada no Informativo “Isto Posto”, página 9 da edição julho/agosto/2009, da nossa entidade associativa de classe – cuja circulação, aliás, ocorreu no início do mês de setembro de 2009 –, entendo configurada a violação a direito líquido e certo, nos termos noticiados na exordial da presente ação.

Com efeito, a expressão ilegalidade utilizada no texto constitucional tem sentido amplo. Resulta, outrossim, que o ato contra o qual se insurge a parte impetrante deve ser, na realidade, manifestamente ilegal, entendida dita palavra, de modo extenso, como serviente a designação de procedimento oficial contrário à lei, abrangente nessa contemplação não só o ato efetivamente praticado nessa condição, como também aquele de previsão inexistente.

In casu, apesar de o conteúdo encerrado na documentação – cuja juntada foi indeferida pelo a quo – consubstanciar o posicionamento adotado por outros órgãos judiciários em outros feitos, mas sobre o mesmo direito objetado na reclamatória em apreço, entendo que a pretensão da impetrante conta com apoio na legislação e sobretudo na tradição do nosso direito pátrio.

Tanto é assim que a jurisprudência representa uma fonte do Direito do Trabalho, relevando o fato de que, na realidade, essa manifestação não obriga nem vincula os magistrados, que são livres para decidir conforme seu convencimento e a interpretação dos ditames contidos na lei.

Todavia, partindo do pressuposto de que muitos direitos trabalhistas somente surgiram na formatação legal após reiteradas decisões judiciais que os reconheceram, entendo que a jurisprudência

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é uma importante fonte do Direito, especificamente em se tratando da seara trabalhista, haja vista os numerosos verbetes sumulares expedidos pelo TST.

E na exordial da presente ação mandamental, dita assertiva conta com relevo na fundamentação trazida à apreciação, à medida em que a impetrante justifica que a “apresentação, para juntada, foi levada a efeito, à guisa, apenas, de subsídios jurisprudenciais, com o específico objetivo destarte, de também passarem a compor os autos processuais” (fl. 04).

Ao contrário de tudo quanto dito, o que conta como entrave no âmbito jurídico, no particular, é a indicação lacônica das fontes jurisprudenciais que respaldam o direito vindicado em juízo, o que levaria o julgador, forçosamente, a efetivar pesquisas para tomar conhecimento do respectivo conteúdo, providência que, parafraseando a autoridade coatora, atentaria contra “os princípios da economia e celeridade processuais, bem a eficiência da administração pública” (fl. 120).

De mais a mais, conduzindo a questão para a melhor conceituação doutrinária do que encerra a prova material que compõe os autos de uma ação, documento não é apenas o papel que registra a ocorrência de um fato ou ato de cujo conteúdo se deseja fazer a publicidade em juízo para corroborar a tese acusatória ou defensiva.

Assim, toda decisão, à exceção daquelas em que a matéria tratada seja apenas de direito, há questões de cunho fático, e, portanto, ao contrário do que consta nas informações prestadas pela autoridade dita coatora, podem, sim, servir como elemento de prova, auxiliando, por conseguinte, na elucidação dos fatos que permeiam a hipótese objeto de exame, especificamente, quando existente, nas ações, identidade do polo passivo ou ativo. Agora, se o magistrado se aterá ou não ao seu conteúdo, isso, sim, é uma questão que se insere no princípio da livre persuasão racional do juízo, o qual não comporta qualquer dissensão.

Releva sobressaltar que a ata colacionada à fl. 81 do

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presente caderno processual, que precede a prática do ato tido por ilegal, contém comandos de característica contraditória: embora, em um primeiro momento o a quo conceda às partes “o prazo comum e preclusivo de 05 (cinco) dias para juntada de toda a prova documental”, em um segundo, discrimina quais espécies poderão vir aos autos nessa condição, ao vedar “a juntada de cópia de decisão”.

No aspecto, aliás, o artigo 397 do CPC é enfático em exortar que as partes poderão apresentar documentos em qualquer fase do processo. Assim sendo, não havendo vedação legal para juntada de documentos nos autos – desde que observado o momento oportuno para tanto, como ocorreu na hipótese a trato –, claro que muito menos haverá com relação às decisões proferidas sobre a matéria objeto da ação, as quais – repita-se – podem trazer fatos elucidativos ao seu julgamento.

Nestes termos, qualquer impedimento quanto à realização desse ato processual gera e induz transgressão a direito líquido e certo da parte, defensável por intermédio do mandamus.

Deste modo, analisando os dispositivos processuais que disciplinam a apresentação de documentos em juízo, a exemplo daquele acima mencionado, não há qualquer alusão no sentido de que a produção ou exibição de documento deva ser justificada ou fundamentada para sua admissão. Entendimento em contrário consubstancia puro exercício arbitrário de hermenêutica.

Portanto, sem prejuízo da redundância, os elementos jurisprudenciais em apreço, sopesados o seu caráter informativo, destinam-se a demonstrar, tecnicamente falando, a existência ou inexistência de um ato ou fato que não escapa, porém, ao sublime e impostergável exercício de direito legalmente conferido às partes.

E reportando-me às informações prestadas pela autoridade dita coatora (fls. 119/121), nelas vislumbro o cunho social de que se revestem, especificamente porque essas mesmas considerações, como antes mencionado, foram objeto de um artigo escrito no Informativo “Isto Posto”, da Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da Sexta Região, edição julho/agosto de 2009, de autoria da autoridade impetrada, Juíza Yolanda Polimeni de Araújo Pinheiro, Titular da 1ª Vara do Trabalho do Recife.

Dentro deste contexto, relevo merecem as suas reflexões quando explana que, efetivamente, uma das grandes preocupações

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da humanidade hoje é a preservação do meio ambiente, sendo muitos os defensores dessa tese de natureza ecológica, no sentido de que “a utilização de papel vai de encontro aos anseios sócio-ambientais da atualidade” (fl. 119). Disso não discordo, e faço minhas as suas palavras.

Mas tal, contudo – pelo menos enquanto não for destinado, à parte, outro meio de apresentar em juízo as suas deduções e pretensões jurídicas, como, por exemplo, através da tecnologia digital –, ainda não se sobrepõe ao direito que consagradamente lhe assiste para esse mesmo desiderato.

Nestes termos, tenho que o pedido da impetrante procede inteiramente, pelo que, suspendendo a eficácia da determinação contida à fl. 104 destes autos, torno-a sem efeito.

2. DA CONCLUSÃO

Diante do exposto, ratificando a liminar deferida às fls. 108/111 destes autos, concedo em definitivo a segurança para determinar a suspensão da ordem judicial que emana do despacho de fl. 173, alusiva ao indeferimento da juntada de cópias de decisões de cunho jurisprudencial, apresentadas pela impetrante nos autos da Reclamação Trabalhista nº 00689-2009-001-06-00-2, da 1ª VT do Recife.

Custas pelos litisconsortes, no importe de R$10,00, calculadas sobre o valor atribuído à causa na exordial (R$500,00 - fl. 28).

Dê-se ciência desta decisão à Excelentíssima Juíza da 1ª Vara do Trabalho do Recife, através de ofício, consoante determina o artigo 11 da Lei nº 12.016/2009.

ACORDAM os Desembargadores do Tribunal Regional do Trabalho da Sexta Região, em sua composição Plena, por maioria, ratificando a liminar deferida às fls. 108/111 destes autos, conceder em definitivo a segurança para determinar a suspensão da ordem judicial que emana do despacho de fl. 173, alusiva ao indeferimento da juntada de cópias de decisões de cunho jurisprudencial, apresentadas pela impetrante nos autos da Reclamação Trabalhista nº 00689-2009-001-06-00-2, da 1ª VT do Recife/PE; contra os votos da Desembargadora

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Virgínia Malta Canavarro e da Juíza Convocada Carmen Lúcia Vieira do Nascimento, que denegavam a segurança. Custas pelos litisconsortes, no importe de R$10,00 (dez reais), calculadas sobre o valor atribuído à causa na exordial (R$500,00 - fl. 28). Dê-se ciência desta decisão à Excelentíssima Juíza da 1ª Vara do Trabalho do Recife, através de ofício, consoante determina o artigo 11 da Lei nº 12.016/2009.

Recife, 11 de fevereiro de 2010.

PEDRO PAULO PEREIRA NÓBREGADesembargador Federal do Trabalho

Relator

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PROC. Nº TRT - 00167.2009.000.06.00.4 (AR)

ÓRGÃO JULGADOR: TRIBUNAL PLENO

RELATORA: DES. MARIA CLARA SABOYA A. BERNARDINOAUTOR: JOSÉ GUEDES DE MELO – MERÉU: JOSÉ ROBERTO MONTEIRO DA SILVAADVOGADOS: MARCOS AURÉLIO FERREIRA DE LIMA E OUTROS (2)PROCEDÊNCIA: TRT/6ª REGIÃO

EMENTA: AÇÃO RESCISÓRIA. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. ARTIGO 7º, INCISO XXIX, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. APLI-CAÇÃO DE OFÍCIO. ARTIGO 219, § 5º. DO CÓDIGO DE RITO. PROCESSO DO TRABALHO. EM SEDE DE EXECUÇÃO. Envolvendo a controvérsia sub judice o momento e (mais importante) o mecanismo processuais adequados para se arguirem os efeitos da prescrição, não se verifica desrespeito frontal à norma contida no artigo 7º, inciso XXIX, da Carta Magna, que nada dispõe a respeito. Tem ela como escopo definir os limites à proteção do direito de ação, mister para o qual o legislador constituinte estabeleceu prazos prescricionais a serem observados. Por sua vez, a incidência ou não do artigo 219, § 5º, da Lei Processual Civil, que disciplina a aplicação de ofício dos efeitos prescricionais, no processo do trabalho, é, estreme de dúvida, matéria controvertida nas esferas doutrinária e jurisprudencial, o que, por si só, afasta a possibilidade do corte rescisório, por violação literal à disposição de lei, por este ângulo da questão, na linha das Súmulas nºs 83, do Tribunal Superior do Trabalho, e 343, do Supremo Tribunal Federal. Sim, porque a violência à literalidade da lei, capaz de autorizar a desconstituição do julgado, pressupõe, sempre, agressão direta, no sentido de que tenha sido ofendida a letra expressa do texto legal, consoante regra inserta no artigo 485, inciso V, do Código de Processo Civil, ao negar-se vigência a disposição legal ou deixar-se de aplicá-la. Significa dizer, em outras palavras, que não se busca corrigir injustiça da decisão, nem muito menos, eleger, dentre as interpretações possíveis, a prevalente na jurisprudência. Ação Rescisória improcedente.

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Vistos etc.Trata-se de ação rescisória proposta por JOSÉ GUEDES

DE MELO – ME, respaldada no artigo 485, inciso V, do Código de Processo Civil, com vistas à desconstituição de sentença prolatada nos autos da reclamação trabalhista nº 00167-2007-231-06-00-7, ajuizada por JOSÉ ROBERTO MONTEIRO DA SILVA.

Amparando-se nos artigos 219, §5º, e 485, inciso V, do Código de Processo Civil; 189, 153, 205 e 206, do Código Civil de 2002; e 7º, inciso XXIX, da Constituição Federal, objetiva o autor, mediante a presente ação, rescindir o decisum supra mencionado, que implicou o reconhecimento do interregno contratual alegado pelo reclamante, de 1º.03.1982 até 30.09.2006, ou seja, vinte e quatro anos e sete meses, e deferiu verbas referentes a todo o período, inclusive férias e 13º salários, desrespeitando, no seu entender, a prescrição qüinqüenal estabelecida na Constituição Federal. Assevera que essa prescrição deve ser declarada de ofício pelo juiz. Pondera que tentou ver reparado o lapso do Magistrado Sentenciante através de diversas petições e embargos, mas não conseguiu êxito. Informa que teve penhorado bem que foi levado a hasta pública, e que, se for arrematado, causará transtornos e danos quase irreparáveis à empresa. Argumenta que, diante da impossibilidade de interpor recurso, na época própria, deixou transcorrer o prazo recursal, restando-lhe, apenas, o presente remédio para buscar a retificação da decisão do Juízo monocrático. Invoca os artigos 273, inciso I, e 489, do CPC e requer concessão de liminar para suspensão da execução, e consequente retirada dos bens da hasta pública. Pede a procedência da ação, com a rescisão da sentença hostilizada, e um novo julgamento da lide, desta feita, aplicando-se a prescrição qüinqüenal.

Depósito prévio devidamente realizado (fl. 10).A ação foi instruída com os documentos de fls. 11/36.Mediante o despacho de fls. 39/40, a Exma. Relatora

Originária ordenou a intimação do autor para autenticação das peças; emenda à inicial com relação ao valor da causa; e juntada de documento complementar. Determinação devidamente cumprida (fl. 41).

À fl. 44, o autor peticionou, sanando os vícios apontados pelo Juízo.

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Liminar indeferida, nos termos da decisão de fls. 48/49.Apesar de regularmente notificado, o réu não apresentou

contestação (fl. 52).O Ministério Público do Trabalho, por intermédio do Dr.

Waldir de Andrade Bitu Filho, opinou, às fls. 54/56, pela improcedência da ação rescisória.

À fl. 60 determinei a notificação do autor para indicação expressa do dispositivo legal que entende violado.

Pronunciamento da parte autora às fls. 63/65.Novo parecer do Ministério Público do trabalho, às fls.

68/71, pela improcedência da ação rescisória.É o relatório.

VOTO:

Trata-se de ação rescisória calcada no artigo 485, inciso V, do Diploma de Rito, por meio da qual denuncia a parte autora violação aos artigos 7º, inciso XXIX, da Carta Política Nacional; 219, § 5º, do Código de Processo Civil; e 189, 193, 205 e 206, do Código Civil de 2002, onde objetiva a declaração de ofício dos efeitos prescricionais, em relação aos créditos trabalhistas reconhecidos judicialmente na Ação Trabalhista – Processo nº 00167-2007-231-06-00-7, movida por José Roberto Monteiro da Silva, ora réu, ora em execução.

Registre-se, inicialmente, que a violência à literalidade da lei, capaz de autorizar a desconstituição do julgado, pressupõe, sempre, agressão frontal, no sentido de que tenha sido ofendida a letra expressa do texto legal, consoante regra inserta no artigo 485, inciso V, do Código de Rito, ao negar-se vigência a disposição legal ou deixar-se de aplicá-la. Significa dizer, em outras palavras, que não se busca corrigir injustiça da decisão, nem, muito menos, eleger, dentre as interpretações possíveis, a prevalente na jurisprudência.

Sérgio Sahione Fadel, ao examinar o tema – ação rescisória, alicerçada no permissivo contido no artigo 485, inciso V, do Digesto processual Civil – enfatiza que: “não se discute a justiça ou injustiça da sentença, nem se tergiversa sobre a melhor ou mais adequada interpretação. Há que se configurar a violação expressa da norma legal, e mesmo assim não em função do interesse particular ou privado da

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parte, mas em atenção à defesa de uma norma de interesse público” (Código de Processo Civil Comentado, Tomo III, Konfino, 1974, p.78).

Nessa linha, leciona Manoel Antonio Teixeira Filho, in Ação Rescisória, Parte Específica, LTr, 1999, p. 17, que: “conforme havíamos afirmado, o inciso V, do art. 485, do CPC, pressupõe a inequívoca violação da norma legal, como requisito para o exercício da ação rescisória. Com isso, o legislador visou a preservar a supremacia da ordem legal. Consequentemente, se a decisão rescindenda se baseou em uma das interpretações possíveis do texto legal, não se pode dizer que ela haja perpetrado lesão ao senso literal inequívoca da norma.”

Feitas as digressões acima, examino o caso concreto.

DA VIOLAÇÃO LITERAL À DISPOSIÇÃO DE LEI – ART. 485, INCISO V, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL.

a) Da violação ao artigo 7º, inciso XXIX, da Carta Federal

A discussão envolve o momento e (mais importante) o mecanismo processuais adequados para se arguirem os efeitos da prescrição. A norma constitucional emoldurada nesta ação, contudo, nada dispõe a respeito. Tem ele como escopo definir os limites à proteção do direito de ação, mister para o qual o legislador constituinte estabeleceu prazos prescricionais a serem observados, a saber:

“Ar t . 7º . São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(...)XXIX – ação, quanto aos créditos

resultantes das relações de trabalho, com prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho;”

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Não há, portanto, como se vislumbrar, a partir da exposição constante na atrial, agressão direta à norma constitucional, eis que, repita-se, o que está em foco, no caso concreto, é a obrigatoriedade, na visão parte autora, da aplicação de ofício da prescrição quinquenal, regulamentada no artigo 219, § 5º, do CPC, ao processo trabalhista, mesmo após o trânsito em julgado da sentença de conhecimento, isto é, em sede de execução.

Sobre esse ângulo, destarte, improspera o pedido de corte rescisório.

b) Da violação ao artigo 219, § 5º, do Código de Processo Civil

À época da prolação da sentença, estava em vigor a nova redação do § 5º, do artigo 219, do CPC, conferida pela Lei nº 11.280/06, que determina, a meu ver, a pronúncia pelo juiz de ofício da prescrição ocorrente. Entretanto, existe dúvida nas esferas doutrinária e jurisprudencial quanto à aplicação desse dispositivo ao processo do trabalho.

No campo doutrinário preleciona Melchíades Rodrigues Martins que “As disposições da Lei n. 11.280/06 aplicam-se no processo, quer no comum, quer no trabalho, tendo por fundamento o princípio constitucional da igualdade de tratamento (art. 5º, XXXV). Ademais, se a Constituição Federal Brasileira estipula que os créditos resultantes das relações de trabalho estão sujeitos ao prazo prescricional de cinco anos, para os trabalhadores urbanos ou rurais, e até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho (art. 7º, XXIXX), os atores sociais a ela vinculados também estarão obrigados a observá-los, sob pena de ferir a segurança jurídica e a confiança em que se deve inspirar todo o Estado de Direito. O princípio da proteção não deve ser analisado isoladamente no trato de matéria de regência constitucional, mas em conjunto com os da segurança e da salvaguarda dos interesses da gestão empresarial em virtude do interesse maior preconizado no art. 7º, XXIX, da Carta Magna, que visa acima de tudo a paz social e a estabilidade jurídico-social” (LTr 74-03/274).

Trilha o mesmo caminho, consoante artigos doutrinários publicados na Revista LTr, dentre outros, os juristas José Augusto Rodrigues Pinto (LTr 70-04/395), Manoel Antônio Teixeira Filho (LTr

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70-3-/298) e Francisco Antônio de Oliveira (LTr 70-05/519).Em sentido diametralmente oposto ensina Jorge Luiz

Souto Maior:

“que a aplicação de ofício da prescrição compromete toda a existência teleológica do Direito do Trabalho, uma vez que ofende o princípio basilar de toda estrutura justrabalhista – o princípio protetivo. A proteção conferida ao trabalhador tem por escopo atenuar, pelo menos na esfera jurídica, a desigualdade socioeconômica existente no plano fático da relação de emprego. Desta forma, a inserção do § 5º do artigo 219 do CPC nas lides trabalhistas seria beneficiar o empregador inadimplente, extirpando com os direitos do trabalhador de forma precária e açodada” (LTR 70-08/920).

Na esfera jurisprudencial prevalece, ainda hoje, a controvérsia quanto à aplicação de ofício da prescrição, disciplinada no artigo 219, § 5º, do Código de Processo Civil ao processo do trabalho.

Decisões favoráveis:

E m e n t a : I ) P r e s c r i ç ã o - Declaração de Ofício - Possibilidade – Art. 219, § 5º, do CPC. 1. A nova regra do art. 219, § 5º, do CPC, de aplicação imediata aos processos pendentes, à luz do art. 1.211 do mesmo diploma legal, prevê a declaração de ofício da prescrição, aplicando-se necessariamente nesta Justiça Especializada. Para tanto, basta verificar o preenchimento das condições previstas no art. 769 da CLT sobre aplicação subsidiária da legislação processual civil na esfera trabalhista, quais

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sejam, a omissão e a compatibilidade da regra civil com o Processo do Trabalho. 2. In casu, a legislação trabalhista é omissa sobre a iniciativa para declaração dos efeitos da prescrição, pois o diploma consolidado apenas estabelece prazo prescricional (CLT, art. 11). Ademais, a nova regra não é incompatível, tampouco exclui o princípio da tutela do hipossuficiente que fundamenta o Direito do Trabalho, pois a fragilidade do trabalhador em relação ao empregador é apenas econômica, já tutelada pela legislação substantiva, não se justificando privilégio suplementar processual nesse campo, o qual implicaria ofensa ao art. 125, I, do CPC, que exige o tratamento isonômico das partes em juízo. O magistrado trabalhista deve aplicar de forma imparcial uma legislação material que já é protetiva do trabalhador. 3. Importante registrar que a declaração de ofício da prescrição contribui para a efetiva aplicação dos princípios processuais trabalhistas (garantia da informalidade, da celeridade, do devido processo legal, da economia processual, da segurança jurídica, bem como do princípio constitucional da razoável duração do processo e da dignidade da pessoa humana), impedindo a prática de atos desnecessários, como por exemplo, nas demandas em que o direito material discutido já se encontra fulminado pela prescrição. 4. Finalmente, é mister frisar que o próprio dispositivo anterior, que previa a necessidade de argüição, pela parte interessada, da prescrição de direitos patrimoniais tinha sede civil e processual civil (CC, art. 194; CPC, art. 219, § 5º), e era aplicada subsidiariamente na Justiça do Trabalho à míngua de regramento próprio

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desta. Mudando a legislação que disciplina o modo de aplicação da prescrição (revogação do art. 194 do CC e alteração da redação do § 5º do art. 219 do CPC), a repercussão é inexorável na esfera laboral. Pretender a não-aplicação da regra processual civil ao Processo do Trabalho, nessa hipótese, deixa sem respaldo legal a exigência judicial da argüição, pela parte, da prescrição, como condição de seu acolhimento, o que atenta contra o princípio da legalidade (CF, art. 5º, II). 5. Nem se diga que a norma civil revogada subsiste no Processo do Trabalho como princípio, uma vez que, havendo norma legal expressa em sentido contrário, não há possibilidade de remissão a princípio carente de positivação, mormente em matéria processual, que se norteia por regras claras e expressas. As próprias regras do CPC de 1939 que ainda subsistem como princípios sob a égide do CPC de 1973 (v.g., arts. 809 e 810, prevendo os princípios da variabilidade e fungibilidade recursais) são apenas aquelas que não foram expressamente contrariadas por dispositivos que estabelecessem procedimento diverso. Agravo de instrumento desprovido. RR - 6306/2007-661-09-00 – (AC. 7ª T.) – Rel. Min. Ives Gandra Martins Filho. DJe/TST n. 241/09, 28.5.09, p. 1548/9.”

Ementa: “Prescrição. Apreciação de ofício. Regência da lei 11.280/2006. Princípio do isolamento dos atos processuais. Aplicabilidade no processo do trabalho. No sistema do isolamento dos atos processuais, os atos já praticados de acordo com a lei antiga são válidos e a lei nova se aplica aos posteriores. A prescrição, que era exceção

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de mérito em sentido estrito e que deveria ser necessariamente alegada pela parte, com a alteração legislativa passou a ter natureza de objeção, que o magistrado deve conhecer de ofício, tal como ocorre com a decadência, em qualquer tempo e grau de jurisdição. A natureza das demandas trabalhistas, bem como o caráter alimentar do salário dizem respeito ao Direito Material e não se mostram aptos para afastar os princípios da igualdade das partes e da imparcialidade do magistrado que rege o ramo processual, portanto, perfeitamente compatível com o Processo do Trabalho a regra do art. 219, § 5º, do CPC... Processo extinto com resolução do mérito pela aplicação da prescrição total na forma do art. 219, § 5º, do CPC com a redação dada pela Lei n. 11.280/2006” TRT 10ª Reg. RO 01112-2005-005-10-00-8 – (Ac.1ª T./06) – Relª. Juíza Cilene Ferreira Amaro Santos. DJU3 14.7.06, p.13”

E M E N TA - P R E S C R I Ç Ã O . Não obstante os princípios basilares que alicerçam o Direito do Trabalho, como o da proteção ao trabalhador, a prescrição é norma de ordem-pública prevista no art. 7º, XXIX, da Constituição da República e, como tal o seu reconhecimento não pode ser afastado pelo Juiz. Eventual, hipossuficiência de uma das partes da relação jurídica de direito material, não tem o condão de excepcionar a aplicação da disposição legal em questão” TRT 11ª Região, RO-1798-2007-351-11-00 – (AC. 1ª T. 7753/08) – Relª Vera Lúcia Câmara de Sá Peixoto. DO/JT do TRT 11ª Reg. Ed. 79, 5.8.08, p.30

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Decisões contrárias:

E m e n t a : R E C U R S O D E R E V I S T A - P R E S C R I Ç Ã O - D E C R E T A Ç Ã O D E O F Í C I O - INAPLICABILIDADE DO ART. 219, § 5º, DO CPC NA ESFERA TRABALHISTA. A prescrição é instituto de direito material, cuja aplicação na esfera trabalhista está condicionada às condições estabelecidas no art. 8º e parágrafo da CLT. A disposição contida no art. 219, § 5º, do CPC, ao determinar a decretação de ofício da prescrição, não se compatibiliza com os princípios que regem o Direito do Trabalho, notadamente o da proteção, que busca reequilibrar a disparidade de forças entre reclamante e reclamado. Nesse sentido já se manifestou a SBDI-1 desta Corte Superior. Recurso de revista não conhecido. TST-RR-665/2008-151-17-00-7 – (Ac. 1ª T.) – Rel. Min. Luiz Philippe Vieira de Melo Filho. DJe/TST n. 356/09, 12.11.09, p. 508.”

E M E N T A : P r o c e s s o d o Trabalho - Prescrição ex offício - artigo 219, § 5º, do CPC - Incompatibilidade - A decretação ex offício da prescrição vai de encontro à espinha dorsal do direito do trabalho, na medida em que relega ao esquecimento o princípio da proteção ao hipossuficiente, cujo objeto é o de minorar a desigualdade sócio econômica do trabalhador na esfera jurídica. Trata-se de regra do processo comum que afronta à própria essência da Justiça do Trabalho, razão porque está fora do alcance da supletividade prevista no artigo 769 da

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CLT. Recurso provido. (TRT 15ª Região - Campinas/SP - AP 3856-1998-038-15-00-0- AC 73773/08-PATR, 10ªC. - Rel. Luiz José Dezena da Silva, DOE 14/11/2008, pág 62).

E M E N TA - P R E S C R I Ç Ã O . P R O N Ú N C I A D E O F Í C I O . INAPLICABILIDADE, NO PROCESSO D O T R A B A L H O . A p r o t e ç ã o a o hipossuficiente - princípio basilar do Direito do Trabalho - tem por escopo atenuar, na esfera jurídica, a desigualdade sócio-econômica e de poder existente, no plano fático da relação de emprego. Diante disso, pode-se afirmar que a norma do parágrafo 5º, do artigo 3º, do CPC, é incompatível, com tal princípio protetivo, visto que a pronúncia da prescrição, de ofício, pelo Juiz do Trabalho, beneficiará, apenas, um dos sujeitos da relação empregatícia - no caso, o empregador inadimplente. Conclui-se, portanto, pela inaplicabilidade, no processo trabalhista, da nova regra do processo comum, em face de sua incompatibilidade, com os princípios que informam o Direito do Trabalho – sob pena de comprometer-se a própria essência da função teleológica desse ramo jurídico especializado (TRT 3ª Região, 1ª Turma, Processo n. 00081-2006-029-03-00-7 RO, Relator: Manuel Cândido Rodrigues, 18.10.06, p.5).

Assim, demonstrado à saciedade o dissenso jurisprudencial quanto à incidência do artigo 219, § 5º, da Lei Processual Civil, ao processo trabalhista, o que, por si só, afasta a possibilidade de desconstituição do julgado, na linha das Súmulas 83, do Tribunal Superior do Trabalho, e 343, do Supremo Tribunal Federal.

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c) Da violação aos artigos 189, 193, 205 e 206, do Código Civil Brasileiro em vigor

A discussão, na verdade, reside, unicamente, no momento próprio para arguição de prescrição (CC, art. 193). A sentença rescindenda, por óbvio, não tratou da matéria. Por outro lado, inexiste prova nos autos de sua arguição na execução do julgado e seu indeferimento. Deixo assentado, porém, sua possibilidade de arguição no processo de conhecimento, na instância ordinária, consoante regra insculpida no artigo 193, do Código Civil de 2002, cristalizada na Súmula nº 153, do Tribunal Superior do Trabalho, que giza: “Não se conhece de prescrição não arguida na instância ordinária”.

Comentando o artigo 193, do Código Civil, assevera Maria Helena Diniz que:

“a prescrição poderá ser arguida na primeira instância, que esta sob a direção de um juiz singular, e na segunda instância, que se encontra em mãos de um colegiado de juízes superiores. Pode ser invocada em qualquer fase processual: na contestação, na audiência de instrução e julgamento, nos debates, em apelação (JTJ, 179:219), em embargos infringentes, sendo que no processo em fase de execução não é cabível a arguição de prescrição, exceto se superveniente `a sentença transitada em julgado” (Código Civil Anotado, p. 203 – sem os destaques).

No caso dos autos, admitindo-se a arguição dos efeitos prescricionais na execução, não demonstrada, repita-se, mais uma vez, a tese expendida pelo autor, agride, visceralmente, o princípio da segurança jurídica e o caso julgado, proclamados constitucionalmente (CF, art. 5º, caput, e inciso XXXVI). Preclusa, portanto, sua invocação.

Destarte, tenho, também, como não feridos os artigos 189, 193, 205 e 206, do Código Civil, o que importa na improcedência da ação.

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Em suma, só é rescindível decisão contra legem em sua literalidade, e assim é porque o objetivo da jurisdição é garantir a ordem jurídica. Desse modo, a motivação da ação, na espécie, é, sem dúvida, a violação do texto legal e não sua exegese, salvo, obviamente, se dessa interpretação restar agredida, frontalmente, a letra da lei, o que não é, em absoluto, o caso em julgamento.

CONCLUSÃO:

Ante o exposto, julgo improcedente a presente ação rescisória.

Custas, pela parte Autora, no importe de R$ 1.078,98 (hum mil e setenta e oito reais e noventa e oito centavos), calculadas sobre o valor dado à causa R$ 53.948,79 (cinquenta e três mil novecentos e quarenta e oito reais e setenta e nove centavos).

Reverta-se o depósito prévio em favor do Réu (no caso de julgamento unânime).

ACORDAM os Desembargadores do Tribunal Pleno, por unanimidade, julgar improcedente a presente ação rescisória. Custas, pela parte Autora, no importe de R$ 1.078,98 (hum mil e setenta e oito reais e noventa e oito centavos), calculadas sobre o valor dado à causa R$ 53.948,79 (cinquenta e três mil novecentos e quarenta e oito reais e setenta e nove centavos). Reverta-se o depósito prévio em favor do Réu (no caso de julgamento unânime).

Recife, 11 de maio de 2010.

MARIA CLARA SABOYA A. BERNARDINODesembargadora Relatora

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PROC. TRT - 00259-2009-000-06-00-4

ÓRGÃO JULGADOR: TRIBUNAL PLENO (COMPETÊN-CIA ORIGINÁRIA).

RELATOR: DESEMBARGADOR NELSON SOARES JÚNIOR.AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO.PROCURADOR: MORSE LYRA NETO.RÉUS: ENGENHO AMORINHA E JANDELSON GOUVEIA DA SILVA.ADVOGADOS: JOSE FERNANDO DE SOUZA MOURA E FRAN-CISCO FERREIRA SALES DE MELO.

EMENTA: AÇÃO RESCISÓRIA. COLUSÃO DAS PARTES A FIM DE FRAUDAR A LEI. PROPOSITURA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. ÔNUS SUBJETIVO DA PROVA. PREVALECÊNCIA DO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DA INOCÊNCIA. O Ministé-rio Público –– instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, à qual constitucionalmente incumbe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis –– tem indubitável legitimação para ajuizamento de ação rescisória, em caso de colusão entre as partes com o fito de fraudar a lei, cabendo-lhe poderes e ônus idênticos aos outros jurisdicionados. Essa é a exegese do disposto nos artigos 81 e 487, inciso III, letra “b”, do Código de Processo Civil. Entretanto, se ele não demonstra, de forma efetiva –– em razão do princípio constitucional da presunção de inocência ––, que as partes incorreram nessa prática de falsidade ideológica (artigo 299, caput, do Código Penal), a medida jurisdicional que se impõe é a declaração da improcedência da ação rescisória.

Vistos etc.

Cuida-se de ação rescisória, proposta pelo Ministério Público do Trabalho com fundamento no inciso III artigo 485 do Código de Processo Civil (CPC), em face do Engenho Amorinha (pertencente ao espólio de João Gouveia da Silva) e Jandelson Gouveia da Silva, contendo pedido de desconstituição da sentença do Excelentíssimo Juiz da Vara do Trabalho de Ribeirão (PE), proferida

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nos autos do processo nº. 00876-2006-261-06-00-3, que implicou o acolhimento parcial dos pedidos.

O autor sustenta, em síntese, que a sentença foi resultante de reclamação simulada, pelos réus desta relação processual, com a finalidade de apropriarem-se do fundo agrícola e fraudarem os direitos trabalhistas dos credores do espólio de João Gouveia da Silva, ou seja, dos antigos empregados do Engenho Amorinha. Afirma que o autor da reclamação trabalhista, Jandelson Gouveia da Silva, e o irmão João Gouveia da Silva Filho foram flagrados, pelo Grupo Especial de Fiscalização Móvel da Secretaria de Inspeção do Ministério do Trabalho e Emprego, administrando os Engenhos Amorinha e Manhoso com a utilização dos trabalhadores em situação análoga à de escravos. Destaca que o conhecimento da mencionada reclamação, por intermédio do Excelentíssimo Juiz da Vara do Trabalho de Ribeirão, ocorreu apenas na oportunidade da propositura de uma ação preparatória. Salienta que, em razão da atuação daquele grupo especial de fiscalização –– composto por auditores fiscais e apoiado também pelo Ministério Público Federal, Defensoria Pública da União e Polícia Federal ––, celebrou Termo de Ajustamento de Conduta com o réu Jandelson Gouveia da Silva, o Espólio de João Gouveia da Silva e o herdeiro João Gouveia da Silva Filho. Esclarece que na execução da sentença trabalhista, sem nenhuma oposição dos herdeiros, houve a penhora do Engenho Amorinha. Por isso, supõe que o intuito dos herdeiros é de adjudicação do fundo agrícola, para eliminar a garantia dos verdadeiros credores trabalhistas, com lesão à ordem jurídica. Para demonstrar esse fato, articula o seguinte: a) o segundo réu, que então era prefeito do Município de Escada pela segunda vez, não informou aos auditores fiscais a existência da reclamação proposta em desfavor do Engenho Amorinha –– havendo silêncio idêntico por parte dos demais co-herdeiros nos depoimentos prestados no procedimento instaurado pelo grupo especial de fiscalização; b) a testemunha,

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ouvida na instrução processual, era servidor do Município de Escada desde o primeiro mandato de prefeito do autor da reclamação; e c) o então reclamado se limitou, na contestação, a fazer impugnações genéricas, não havendo produzido prova contrária aos interesses do então reclamante. Com base nesses fatos, com fundamento no artigo 40 do Código de Processo Penal, requer a remessa de cópias das peças processuais ao Ministério Público Federal e ao Ministério Público Estadual, a fim de serem apurados os ilícitos previstos nos artigos 342 e 347 do Código Penal e na Lei nº 8.429/92. Finalmente pede a desconstituição da sentença e, em novo julgamento, a extinção do processo relativo à reclamação trabalhista, sem resolução do mérito, conforme Orientação Jurisprudencial nº 94 da “SDI-II” do Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Às fls. 292/3, indeferi o requerimento de natureza cautelar, formulado pelo Ministério Público do Trabalho na petição inicial, porém, em julgamento de agravo regimental, este plenário determinou a suspensão da execução da sentença rescindenda até o julgamento desta ação rescisória.

Na contestação, o segundo réu suscitou preliminar de inépcia da petição inicial, prejudicial de decadência e pediu a declaração de improcedência da ação rescisória (fls. 298/319); o primeiro réu –– citado por meio da senhora Jaildes Gouveia da Silva Meira (uma herdeira do espólio) –– não se pronunciou. No entanto, a herdeira Jaceilda Gouveia da Silva, utilizando-se do nome do espólio entre parênteses, contestou a ação e requereu a realização de nova citação sob a alegação de não estar, à época, ainda investida do múnus de inventariante (fls. 332/41).

À fl. 344, convertendo o julgamento em diligência, requisitei cópia das peças do processo originário à Diretora de Secretaria da 1ª Vara do Trabalho de Ribeirão, as quais foram juntadas às fls. 347/530 –– idênticas, em parte, às anexadas pelo Ministério

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Público do Trabalho às fls. 128/255

Regularmente intimados, apenas o autor apresentou razões finais (fls. 537/541).

Por força da determinação documentada à fl. 545, as partes pronunciaram-se sobre os supracitados documentos às fls. 547, 550, 553 e 556.

É o relatório.

VOTO:

DA PREJUDICIAL DE DECADÊNCIA DO DIREITO À AÇÃO RESCISÓRIA SUSCITA-DA PELO RÉU JANDELSON GOUVEIA DA SILVA

Senhor presidente, de acordo com os termos constantes do item VI da Súmula 100 do Tribunal Superior do Trabalho (TST), em se tratando de denúncia “(...) de colusão das partes, o prazo decadencial da ação rescisória somente começa a fluir para o Ministério Público, que não interveio no processo principal, a partir do momento em que tem ciência da fraude.”

No caso em apreciação, não obstante o Ministério Público do Trabalho tenha, por força de determinação judicial expressa, sido intimado da decisão rescindenda e recebido cópia da reclamação trabalhista e da respectiva contestação em abril de 2007, somente obteve ciência dos fatos, narrados como indícios da colusão entre as partes, em 2009, ou seja, a partir da fiscalização realizada pelo Ministério do Trabalho e Emprego no Engenho Amorinha. Portanto, como o ajuizamento da ação rescisória ocorreu no mesmo ano, não se há de falar da consumação da decadência do direito à ação rescisória, uma vez que foi exercido no biênio previsto no artigo 495 do CPC.

Por essas razões, rejeito essa prejudicial.

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DA PRELIMINAR DE INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL SUSCITADA PELO RÉU JANDEL-SON GOUVEIA DA SILVA

Senhor presidente, o réu Jandelson Gouveia da Silva suscitou preliminar de inépcia da petição inicial, sob a alegação de que não existe comprovação do trânsito em julgado da decisão rescindenda, mas não lhe assiste razão.

De fato: ele incorreu em erro conspícuo, ao fazer essa sustentação no caso em análise, porque há certidão do trânsito em julgado da decisão rescindenda à fl. 170.

Dessa forma, rejeito também essa preliminar.

DO MÉRITO

Senhor presidente, inicialmente destaco a desnecessidade de renovação da citação do Engenho Amorinha, porque, no âmbito da Justiça do Trabalho, não há obrigação dessa espécie de ato processual operar na pessoa de representante legal.

Registro ainda que, não obstante o supracitado fundo agrícola não haja respondido aos termos da ação rescisória, que lhe foi proposta pelo Ministério Público do Trabalho, uma co-proprietária, herdeira do espólio de João Gouveia da Silva, apresentou contestação cujos termos serão considerados, oportunamente, porque não houve oposição das partes.

Demais, além de a contestação do segundo réu impedir a presunção de veracidade dos fatos descritos na petição inicial (artigo 320, inciso I, do CPC), em se tratando de ação rescisória, que é julgamento de julgamento, não há espaço jurídico-processual para aplicação dessa sanção ao réu revel.

Portanto, inexistindo necessidade de conversão do

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julgamento em diligência, passo ao exame do mérito da ação rescisória.

Senhor presidente, conforme relatei, para postular a desconstituição da decisão rescindenda, o Ministério Público do Trabalho afirmou que ela foi fruto de colusão entre as partes. No entendimento que ele expressou na petição inicial, na relação processual originária os réus simularam a reclamação trabalhista, com a finalidade de apropriarem-se do fundo agrícola e fraudarem os direitos trabalhistas dos credores do espólio de João Gouveia da Silva, ou seja, dos antigos empregados do Engenho Amorinha.

Para demonstração do conluio, ele asseverou que o segundo réu, então prefeito do Município de Escada pela segunda vez, não declarou aos auditores fiscais a existência da reclamação trabalhista, proposta em desfavor do Engenho Amorinha, e que houve idêntico silêncio, por parte dos demais co-herdeiros, nos depoimentos constantes do procedimento instaurado pelo grupo especial de fiscalização. Em seguida, asseverou que a testemunha, ouvida na relação processual originária, era servidor do Município de Escada, desde o primeiro mandato de prefeito do autor da reclamação trabalhista, e que o então reclamado se limitou, na contestação, a fazer impugnações genéricas, não havendo produzido prova contrária aos interesses do então reclamante.

Pois bem, conquanto eu exija demonstração de fraude à lei –– pois, aliando-me ao professor José Carlos Barbosa Moreira, entendo que, na hipótese em causa, não basta “(...) a intenção de prejudicar terceiro(s)” 1 ––, passo desde logo à investigação do conluio, denunciado pelo autor da ação rescisória, em face da tendência generalizada que todos têm, no âmbito desta justiça especializada, de ombrear as duas espécies de fraude. Antes, porém, saliento que a

1 Cf. Comentários ao Código de Processo Civil. 3. ed. rev. e atua. Rio de Janeiro: 1978; vol. V, p. 150.

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farei com base na prova indiciária, porque, conforme o disposto no revogado artigo 252 do CPC de 1939 (cuja idéia está compreendida no atual artigo 332 do CPC 2), “o dolo, a fraude, a simulação e, em geral, os atos de má fé poderão ser provados por indícios e circunstâncias.”

Feita essa observação, destaco que o primeiro argumento do Ministério Público do Trabalho é, data vênia, de todo inconsistente porque o silêncio do réu e do irmão, que não é parte desta relação processual, sobre a existência da reclamação trabalhista em desfavor do Engenho Amorinha, decorreu, obviamente, da inexistência de perguntas nesse sentido. No ponto, o equívoco dele é de fácil percepção porque não se tratou, na hipótese em causa, de depoimentos prestados em investigação sobre a existência de causas perante a Justiça do Trabalho ––malgrado do relatório da fiscalização conste um item, à fl. 87, em que há alusão àquela ação trabalhista ––, mas sim a respeito das condições de trabalho do pessoal empregado no fundo agrícola.

O segundo argumento do Ministério Público merece análise em maior profundidade, porque envolve inclusive a imputação de crime de perjúrio à testemunha Vanildo Bertoldo da Silva. Examinando os elementos de convicção, observo que, na época em que esse cidadão prestou depoimento na relação processual originária (6 de março de 2007), ele era servidor do Município de Escada, pois havia sido contratado pelo segundo réu. Ocorre que esse fato não é indício de conluio entre as partes porque não foi negado pelos réus nem pelo próprio, quer em juízo, quer extrajudicialmente (fls. 257, 270/1, 298/307 e 332/41).

Quanto a esse aspecto, convém recordar esta lição do professor Egas Moniz de Aragão sobre a análise correta dos indícios: “A eles se aplica o conselho encampado pelo legislador francês em

2 Cf., por todos, E. D. Moniz de Aragão. Exegese do Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: AIDE, 1984, vol. IV, p. 74.

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relação às presunções hominis: não podem ser admitidos senão quando graves, precisos e concordantes (Cód. Civil, art. 1.353)”. Isso porque, conforme ele adverte, “a não ser tomada essa elementar cautela, o emprego da prova indiciária constituirá perigo seriíssimo, pois dará margem a abusos de difícil reparação; entronizará os julgamentos por mera suspeita, fundados em mexerico, diz-que-diz” 3.

Mas há outro fato relacionado à testemunha pelo Ministério Público: a existência de divergências nos depoimentos prestados, respectivamente, perante a Justiça do Trabalho e o grupo especial de fiscalização. No primeiro, diz ele, a testemunha declarou que a CTPS fora assinada; no segundo, que não sabia; no primeiro, trabalhar para o Engenho Amorinha; no segundo, para o fundo agrícola e para o gabinete do prefeito de Escada (situação que perdurou até abril de 2009); e, no primeiro, que o reclamante trabalhava das 6 às 18 horas, todos os dias, na safra e entressafra. Daí, o Ministério Público do Trabalho arremata que houve crime de falso testemunho e que estaria demonstrada a simulação da reclamação trabalhista, pelos réus, com o fim de apropriarem-se do fundo agrícola em detrimento dos interesses de terceiros. Ocorre, com o devido respeito, que essas conclusões não resistem à análise científica.

Com efeito, não fosse o operoso grupo especial de fiscalização –– apoiado pelo Ministério Público do Trabalho, Ministério Público Federal, Defensoria Pública da União e Polícia Federal –– um notório fator de inibição a qualquer pessoa leiga –– fato que justifica satisfatoriamente a hesitação da testemunha na declaração concernente à assinatura da CTPS ––, em relação aos outros pontos há necessidade de observar-se, inicialmente, conforme advertiu Giorgio Tesoro, “(...) que a testemunha não é uma máquina que reproduza exatamente aquilo que viu e ouviu, mas, um ser pensante

3 Op. cit., p. 74.

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que julga e elabora todas as suas sensações e, por isto, mais ou menos conscientemente, deforma o que viu e ouviu” 4.

Por outro lado, sem esquecimento de que a testemunha respondeu apenas às perguntas que lhe foram feitas –– fato que explica, razoavelmente, os acréscimos constantes do segundo depoimento, por meio do qual se pretendeu, de forma imprópria, municiar o Ministério Público do Trabalho de recursos para propositura da ação rescisória, uma vez que as indagações feitas à testemunha nada tinham a ver, em sua grande maioria, com as condições de trabalho do pessoal empregado no Engenho Amorinha ––, é igualmente imprescindível se verificar, no caso em apreciação, se tais acréscimos revelam, conjunta ou isoladamente, a colusão entre as partes a fim de fraudar a lei. E a resposta, para meu espírito, é negativa.

Aliás, mesmo se a ação rescisória houvesse sido proposta com base no disposto no inciso VI do artigo 485 do CPC (sentença fundada em prova falsa), nem assim eu vislumbraria verossimilhança na alegação do Ministério Público do Trabalho, uma vez que na decisão rescindenda, após acolher parcialmente a prescrição quinquenal, suscitada pelo réu na contestação, o juízo rejeitou o pedido do então reclamante, de retificação da data de admissão constante da CTPS, sob o fundamento de que a testemunha ouvida “(...) sequer sabia a própria data de admissão” (fl. 159).

E mais: a alegação do Ministério Público do Trabalho, de que a testemunha cometeu crime de perjúrio, não é de ser acatada simplesmente pela eventual existência de divergências nas declarações, prestadas perante a Justiça do Trabalho e o grupo especial de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego, por força do disposto no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição da República.

4 Cf. La psicologia della testimonianza, p. 2. Apud: ROSA. I. Borges da. Questões Essenciais de Direito e Nulidades Processuais. 2. ed. Rio de Janeiro: Borsoi, 1959, vol. 1, p. 147.

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De fato, sobre a presunção de inocência –– cristalizada nesse preceito constitucional –– assim se expressa Alexandre de Morais: “A Constituição Federal estabelece que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, consagrando a presunção de inocência, um dos princípios basilares do Estado de Direito como garantia processual penal, visando a tutela da liberdade pessoal. Dessa forma, há necessidade o Estado comprovar a culpabilidade do indivíduo, que é constitucionalmente presumido inocente, sob pena de voltarmos ao total arbítrio estatal. A presunção de inocência é uma presunção JURIS TANTUM, que exige para ser afastada a existência de um mínimo necessário de provas produzidas por meio de um devido processo legal e com a garantia de ampla defesa. Essa garantia já era prevista no art. 9º, da Declaração Francesa dos Direitos do Homem e do Cidadão, promulgada em 26.08.1789 (...)” (Cf. Constituição do Brasil Interpretada. 7. ed. Rio de Janeiro: Atlas, p. 339 e s.).

Ora, essa “presumption of innocence” (como a denominam os norte-americanos) –– garantia prevista inclusive na Declaração Universal dos Direitos Humanos (artigo 11) ––, conquanto seja interpretada de forma diferente nos diversos sistemas jurídicos do mundo contemporâneo, é aplicável plenamente, em nosso país, em toda a espécie de processo, conforme o plenário do Supremo Tribunal Federal proclamou, dentre outros, no julgamento da ADPF nº 144 (DF). O seu conteúdo foi bem resumido na ementa do acórdão do HC-95.886, relatado pelo Ministro Celso de Mello, desta maneira:

“ O P O S T U L A D O C O N S T I T U C I O N A L D A P R E S U N Ç Ã O D E I N O C Ê N C I A I M P E D E Q U E O E S T A D O T R AT E , C O M O S E C U L PA D O F O S S E , A Q U E L E Q U E A I N D A N Ã O S O F R E U C O N D E N A Ç Ã O P E N A L I R R E C O R R Í V E L . - A prerrogativa jurídica da liberdade - que possui

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extração constitucional (CF, art. 5º, LXI e LXV) - não pode ser ofendida por interpretações doutrinárias ou jurisprudenciais, que, fundadas em preocupante discurso de conteúdo autoritário, culminam por consagrar, paradoxalmente, em detrimento de direitos e garantias fundamentais proclamados pela Constituição da República, a ideologia da lei e da ordem. Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática de crime indigitado como grave, e até que sobrevenha sentença penal condenatória irrecorrível, não se revela possível - por efeito de insuperável vedação constitucional (CF, art. 5º, LVII) - presumir-lhe a culpabilidade. Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado. O princípio constitucional da presunção de inocência, em nosso sistema jurídico, consagra, além de outras relevantes conseqüências, uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados, definitivamente, por sentença do Poder Judiciário. Precedentes” (cf. Ementário do STF, vol. 02385, III, p. 00599).

No voto-condutor do acórdão proferido no supracitado julgamento da ADPF nº 144, o Ministro Celso de Mello teceu as seguintes considerações:

“(...) Nem se diga que a garantia fundamental de presunção de inocência teria pertinência e aplicabilidade unicamente restritas ao campo do direito penal e processual penal.Torna-se importante assinalar, neste ponto, Senhor Presidente, que a presunção de inocência, embora historicamente vinculada ao processo penal, também irradia os seus efeitos, sempre em favor das pessoas, contra o abuso de poder e a prepotência do Estado,

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projetando-os para esferas processuais não-penais, em ordem impedir, dentre outras conseqüências no plano jurídico –– ressalvada a excepcionalidade de hipóteses previstas na própria Constituição ––, que se formulem, precipitadamente, contra qualquer cidadão, juízos morais fundados em situações jurídicas ainda não definidas (e, por isso mesmo, essencialmente instáveis) ou, então, que se imponham, ao réu, restrições aos seus direitos, não obstante inexistente condenação judicial transitada em julgado.”

Pelas razões até este momento expostas, senhor presidente, concluo que o Ministério Público –– instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, à qual constitucionalmente incumbe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis –– tem indubitável legitimação para ajuizamento de ação rescisória, em caso de colusão entre as partes com o fito de fraudar a lei, cabendo-lhe poderes e ônus idênticos aos outros jurisdicionados. Essa é a exegese do disposto nos artigos 81 e 487, inciso III, letra “b”, do Código de Processo Civil. Entretanto, se ele não demonstra, de forma efetiva –– em razão do princípio constitucional da presunção de inocência ––, que as partes incorreram nessa prática de falsidade ideológica (artigo 299, caput, do Código Penal), a medida jurisdicional que se impõe é a declaração da improcedência da ação rescisória.

De fato: essa conclusão é inexorável, na hipótese em julgamento, porque, mesmo se fosse inexigível –– quanto a esse aspecto do conflito de interesses (a falsidade ideológica que o Ministério Público do Trabalho classificou erroneamente como crime de fraude processual) –– decisão penal transitada em julgado, e ponderássemos apenas com o princípio da desconsideração prévia da culpabilidade dos réus, remanesceria, em prol deles, o benefício da dúvida porque os indícios não são absolutos: sequer revelam fraude

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contra terceiros.

A propósito, assim me expressei no indeferimento do pedido de natureza cautelar:

“(...) no exercício deste juízo sumário e provisório de cognoscibilidade, não vejo como a execução da decisão rescindenda, proferida em processo trabalhista de 1º de novembro de 2006, implique a fraude de créditos trabalhistas previstos em Termo de Ajuste de Conduta (documento extrajudicial dotado de eficácia executiva), de 21 de maio de 2009, em que figuram justamente como obrigados o Espólio de João Gouveia da Silva (proprietário do fundo agrícola) e Jandelson Gouveia da Silva (beneficiário da decisão rescindenda).”

Com essas considerações, julgo a ação rescisória improcedente: é como voto.

ACORDAM os juízes do Tribunal Regional do Trabalho da Sexta Região, em sua composição plena, por unanimidade, rejeitar a prejudicial de decadência do direito à ação rescisória, suscitada pelo réu Jandelson Gouveia da Silva; por unanimidade, rejeitar a preliminar de inépcia da petição inicial, suscitada pelo réu Jandelson Gouveia da Silva; e, no mérito, ainda por unanimidade, julgar a ação rescisória improcedente e declarar, com fundamento no disposto no artigo 790-A da Consolidação das Leis do Trabalho, a isenção do Ministério Público do Trabalho em relação ao pagamento das custas processuais.

Recife, 29 de junho de 2010.

NELSON SOARES JÚNIOR

Desembargador relator

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PROC. TRT Nº 0201800-47.2009.5.06.0301 (RO)

ÓRGÃO JULGADOR: PRIMEIRA TURMA

RELATORA: DESEMBARGADORA NISE PEDROSO LINS DE SOUSARECORRENTE: COMPANHIA INDUSTRIAL DO NORDESTE BRA-SILEIRO (MASSA FALIDA)RECORRIDAS: MANOEL PEREIRA DA FONSECA E COOPERATIVA AGRÍCOLA HARMONIAADVOGADOS: JOSÉ PEDRO SOARES LIRA, FRANCISCO JOSÉ GOMES DA COSTA E JOSÉ PEDRO SOARES LIRAPROCEDÊNCIA: VARA DO TRABALHO DE CATENDE/PE

EMENTA: MASSA FALIDA. CONTINUIDADE DA ATIVIDADE. CONTRATO DE TRABALHO FIRMADO ANTES DA DECRETAÇÃO DA FALÊNCIA. Contratado a reclamante antes da decretação da falên-cia e permanecendo a trabalhar mesmo após a quebra da empresa, de modo que, mantendo o falido a continuidade da atividade empresarial nos mesmos moldes dos anos anteriores à decretação da falência e beneficiando-se da prestação de serviços da obreira, mantém-se a deci-são que determinou que a execução dos créditos trabalhistas referentes ao período pós-falência seja processada perante a Justiça do Trabalho, não se sujeitando à habilitação perante o Juízo Falimentar. Inteligência do artigo 84, da Lei nº 11.101, de 09.02.2005. Recurso não provido.

Vistos etc.Cuida-se de recurso ordinário interposto pela

CO M PA N H I A I N D U S T R I A L D O N O R D E S T E B R A S I L E I R O (MASSA FALIDA), em face de decisão proferida pelo MM. Juiz da Vara do Trabalho de Catende/PE que, às fls. 92/95, julgou procedentes, em parte, os pedidos formulados na reclamação trabalhista ajuizada por MANOEL PEREIRA DA FONSECA, condenando a recorrente ao pagamento das parcelas descritas no referido título judicial.

Em suas razões de recurso, às fls. 102/105, cinge-se o inconformismo da recorrente, diante da determinação contida no decisum, de que a execução seja processada nesta Justiça Especializada, defendendo deva ser habilitado o crédito exequendo

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junto ao Juízo Falimentar, de modo a evitar o pagamento a um credor trabalhista em detrimento aos demais. Cita entendimento jurisprudencial e doutrinário em defesa de sua tese, objetivando, em suma, que seja procedida a habilitação do crédito nos autos do processo da falência, nos termos do art. 265, VI, do CPC, evitando-se prejuízo à universalidade dos credores.

Contrarrazões apresentadas pelo autor, às fls. 113/117..A espécie não exige intervenção obrigatória do Ministério

Público do Trabalho (art.49, do Regimento Interno da Corte).

É o relatório.

VOTO:

Pretende a recorrente obter a reforma da sentença que determinou que a execução de parte dos valores devidos à reclamante seja processada perante esta Justiça Especializada, de modo que o crédito obreiro seja habilitado junto ao Juízo Falimentar, evitando-se lesão à universalidade dos credores.

Não procede a irresignação.Em que pese ser fato público neste Estado a decretação de

falência da Usina Catende S/A, atualmente denominada Companhia Industrial do Nordeste Brasileiro (Massa Falida), é incontroverso nos autos que o reclamante foi contratado em 13.03.1992 e continuou prestando serviços à recorrente, mesmo após a decretação da falência, ocorrida em 17 de maio de 1995.

O Juízo de primeiro grau reconheceu a procedência de vários títulos vindicados na reclamação trabalhista, decretando a prescrição quinquenal sobre aqueles anteriores a 30.09.2004, salvo em relação aos depósitos fundiários por submeterem-se á prescrição trintenária, nos termos da Súmula 362, do C. TST. Determinou, em seguida, que parte do crédito deferido, referente ao período anterior à decretação da falência (17.05.1995), deverá ser habilitado junto ao Juízo Falimentar e a parte restante, ou seja, aquela referente à prestação de serviços posterior à quebra, será processada perante a Justiça do Trabalho.

Não há qualquer ilegalidade na determinação perpetrada

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pelo Juízo de primeiro grau.Sobre o tema, aliás, colho excerto do voto proferido pelo

juiz Bartolomeu Alves Bezerra, quando do julgamento do agravo de petição nº 00964-2008-301-06-00-1, interposto pela mesma recorrente, verbis:

“E M E N T A: MASSA FALIDA. CONTINUAÇÃO DO NEGÓCIO. SUCESSÃO DE EMPREGADORES – Embora, como regra, a massa falida não tenha a livre administração de seus bens e, portanto, não lhe seja lícito escolher a quem pagar primeiro, a hipótese dos autos é diferente, porque houve continuação da atividade empresarial. Nessa situação, apesar de o acionante ter sido contratado antes do decreto de quebra, ele continuou trabalhando para a massa, em indisfarçado processo de sucessão de empregadores. Em conseqüência, a massa responde pelos créditos de rescisão e tudo quanto deixou de ser pago ao empregado, independentemente de habilitação. Agravo de petição improvido.

(...)

VOTO:

Tenho que não assiste qualquer razão à recorrente.De fato, embora, como regra, a massa falida não

tenha a livre administração de seus bens e, portanto, não lhe seja lícito escolher a quem pagar primeiro, a hipótese dos autos é diferente, porque houve a continuidade do negócio da empresa falida sob a condução do síndico da massa. EDUARDO GABRIEL SAAD (in CLT Comentada, 29ª ed., 1996, LTr, pág. 304, nota 2 ao art. 449), esclarece que “A falência, necessariamente, não põe fim ao contrato de trabalho. Se o síndico houver por bem dar continuidade às atividades econômicas do falido, ficam os contratos de trabalho preservados”.

Quando se dá a continuidade da atividade empresarial

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do falido, sob a batuta do síndico que representa os credores, onde o comerciante continua comprando, vendendo e fazendo o troco, segundo a inteligência dos arts. 10 e 448 da CLT, ocorre verdadeira sucessão de empregadores. E, neste caso, cabe à massa responder pelos créditos de rescisão e tudo quanto deixou de ser pago ao empregado, independentemente de habilitação.

Logo, nego provimento.”

Note-se que o procedimento adotado pela magistrada sentenciante encontra guarida no art. 84, I da Lei nº. 11.101, de 09 de fevereiro de 2005 (Lei de Falências e de Recuperação de Empresas), que assim dispõe, textual:

“Art. 84. Serão considerados crédito extraconcursais e serão pagos com precedência sobre os mencionados no art. 83 desta Lei, na ordem a seguir, os relativos a:

I – remunerações devidas ao administrador judicial e seus auxiliares, e créditos derivados da legislação do trabalho relativos a serviços prestados após a decretação da falência”

O posicionamento ora adotado, aliás, converge com o entendimento deste E Regional, que, em sua composição plenária, por ocasião do julgamento do MS nº. 0031400-30.2009.5.06.0000, cuja relatoria incumbiu ao eminente Juiz Bartolomeu Alves Bezerra, em decisão recente, publicada em 30.03.2010, assim se pronunciou, verbis:

M A N D A D O D E S E G U R A N Ç A . D Í V I D A TRABALHISTA CONTRAÍDA PELA MASSA FALIDA. C R É D I T O E X T R A C O N C U R S A L . I N E X I G Ê N C I A DE HABILITAÇÃO – Em se tratando de condenação trabalhista decorrente de liame empregatício contratado após o decreto de falência, isto é, contratado já pela massa e não pelo empresário falido, não existe nenhum direito líquido e certo ao procedimento de habilitação no

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juízo universal. Na espécie, trata-se de um crédito extra concursal (art. 124 do Decreto-lei nº 7.661/1945 e art. 84 da Lei n º 11.101/2005) e, portanto, sujeita-se à execução particular em favor do credor e está afeta à competência da Justiça do Trabalho, já que se trata de uma sentença proferida por esta Especializada. Segurança denegada.

Outros, igualmente, são os precedentes de todas as turmas que compõem esta Corte, retratados em acórdãos lavrados nos autos dos processos números 00376-57.2008.5.06.0301; 0035000-63.2008.5.06.0301; 0028500-15.2007.5.06.0301 – 2ª Turma; 00964-78.2008.5.06.0301, - 3ª Turma; e 0015600-63.2008.5.06.0301; 0070400-41.2008.5.06.0301; 0075800-36.2008.5.0301; 0080500-89.2007.5.06.0301, - 1ª Turma, onde, em todos estes figura como reclamada a empresa Companhia Industrial do Nordeste Brasileiro, ora recorrente.

Conclui-se, pois, que os créditos cuja competência executória está afeta a esta Justiça Especializada limitam-se àqueles denominados extraconcursais, decorrente de prestação de serviços posteriores à decretação da falência, em consonância com o disposto no inciso I, do artigo 84, da Lei nº 11.101/2005, estando a decisão a quo em perfeita harmonia com a legislação que regula a espécie.

Nada a reformar, portanto.

CONCLUSÃO:

Ante o exposto, nego provimento ao recurso.

ACORDAM as Desembargadoras e o Juiz convocado da Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Sexta Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso.

Recife, 01 de julho de 2010.

NISE PEDROSO LINS DE SOUSADesembargadora Relatora

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PROC. Nº. TRT – 0074600-60.2009.5.06.0009(RO)

ÓRGÃO JULGADOR: SEGUNDA TURMA

RELATOR: DESEMBARGADOR ACÁCIO JÚLIO KEZEN CALDEIRARECORRENTE: DISTLOG DISTRIBUIDORA DE JORNAIS E REVIS-TAS LTDA. RECORRIDO: JOEL OTÁVIO MIGUEL DA SILVAADVOGADOS: SÍLVIO FERREIRA LIMA E DANIEL HENRIQUE MONTEIRO FERNANDESPROCEDÊNCIA: 9ª VARA DO TRABALHO DO RECIFE-PE

EMENTA: SALÁRIO MÍNIMO E REGIME DE TEMPO PARCIAL. PROPORCIONALIDADE. Havendo contrato de trabalho em regime parcial, é lícito o pagamento do salário mínimo proporcional ao tempo trabalhado. A hipótese está assegurada pelo art. 58-A, da CLT, podendo o salário ser pago de forma proporcional ao número de horas trabalha-das em jornada reduzida, não havendo que se falar em afronta ao art. 7º, VII, da C.F, visto que a norma constitucional estabelece o limite da jornada de trabalho de oito horas diárias e quarenta e quatro semanais.

Vistos etc.Recorre ordinariamente DISTLOG DISTRIBUIDORA

DE JORNAIS E REVISTAS LTDA. de decisão proferida pelo MM. Juízo da 9ª Vara do Trabalho do Recife-PE, que julgou PROCEDENTES, EM PARTE, os pedidos formulados na reclamação trabalhista ajuizada por JOEL OTÁVIO MIGUEL DA SILVA em face da recorrente, nos termos da fundamentação de fls. 96/100.

Embargos declaratórios opostos pela reclamada, às fls. 101/104, e rejeitados conforme decisão de fl. 105.

Razões do recurso, às fls. 108/112, nas quais se insurge contra o decisum que a condenou na diferença salarial entre o salário recebido pelo reclamante em regime de tempo parcial e o mínimo constitucionalmente estabelecido. Aduz que a r. sentença violou o art. 58-A, da CLT, eis que o contrato estabelecia o regime de tempo parcial. Salienta que o referido contrato não foi especificamente impugnado e que as provas dos autos respaldam a tese patronal.

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O reclamante, embora devidamente notificado, não apresentou contrarrazões, conforme certificado à fl. 117.

Desnecessária a remessa dos autos à Procuradoria Regional do Trabalho, porquanto não vislumbro interesse público no presente litígio (art.49 do Regimento Interno deste Sexto Regional).

É o relatório.

VOTO:

Das diferenças salariais

Afirma a recorrente em seu apelo que o reclamante foi contratado em regime de tempo parcial, não podendo receber as diferenças salariais para o mínimo legal, sob afronta ao artigo 58-A, da CLT.

Pois bem. O reclamante, na peça vestibular, afirmou que recebia a

título de salário mensal a quantia de R$ 207,90, inferior ao mínimo constitucionalmente estabelecido que era de R$ 465,00.

Por sua vez, a reclamada alegou na peça de defesa que o reclamante foi contratado para trabalhar como promotor de entregas no regime de 25 horas semanais, recebendo a remuneração à base da hora trabalhada, consoante cláusula constante no item “2” do contrato de trabalho firmado entre as partes.

O M.M Juízo condenou a reclamada no pagamento de diferença salarial, por entender que mesmo trabalhando por hora em tempo parcial, não existe possibilidade de um empregado perceber abaixo do salário mínimo constitucionalmente protegido, conforme art. 7º, IV, da Lei Maior.

Pois bem.Data venia, do juízo a quo, razão parcial assiste à reclamada.Inicialmente cumpre asseverar que restou incontroverso

nos autos, que o reclamante foi contratado para trabalhar em regime de tempo parcial, conforme contrato de trabalho de fl. 86.

A Carta da República estabelece no art. 7º, inciso IV, que é

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direito dos trabalhadores urbanos e rurais receberem salário mínimo que atenda às necessidades básicas do trabalhador e de sua família. E complementa a Lei Maior no inciso VII, do mesmo artigo, que não pode haver salário inferior ao mínimo fixado em lei para os que recebem remuneração variável.

Por sua vez, o art. 58-A, § 1º, da CLT, reza que: “ O salário a ser pago aos empregados sob o regime de tempo parcial será proporcional à sua jornada, em relação aos empregados que cumprem, nas mesmas funções, tempo integral.”

No caso dos autos, o autor foi contratado em regime de tempo parcial para receber um valor fixo correspondente a R$ 1,89 por hora trabalhada, com duração total limitada a 25 horas semanais e 8 horas diárias. E esse valor pago a título de salário por hora trabalhada equivale proporcionalmente à metade do que seria pago a um empregado que trabalhasse em tempo total, sendo igual ao valor de um salário mínimo.

É de sabença, que o regime de tempo parcial está inserido no ordenamento jurídico pátrio, através da Consolidação das Leis do Trabalho, vigorando plenamente nos contratos de trabalho.

O art. 58-A, e seu § 1º, da CLT, é claro no sentido de conferir o regime de trabalho parcial de, no máximo, 25 horas semanais, sendo proporcional à jornada integral, inclusive em relação ao salário.

Neste diapasão, se enquadrando o autor nos moldes do art. 58-A, consolidado, deve o mesmo receber salário proporcional àquele trabalhador que recebe, ao menos, o mínimo legalmente estabelecido, não havendo que se falar em receber valor inferior ao salário mínimo, eis que, do contrário, o artigo consolidado se tornaria letra morta.

Em verdade, as garantias trabalhistas, ao longo do tempo, tem procurado restringir a utilização máxima da mão de obra do trabalhador, no entanto, não dificulta o labor em jornada reduzida ou moderada. Neste sentido, nota-se que a legislação pátria tem limitado a duração da jornada de trabalho por dia, semana ou mês, mas não prevê limites para a redução das horas de trabalho, com rendimentos proporcionais acordados.

A despeito de tal fato, o salário mínimo constitucionalmente assegurado, utilizou-se não apenas do critério valorativo de garantia, mas, também, do número de horas laboradas pelo trabalhador. A esse

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respeito, discorre com grande propriedade o doutrinador Maurício Godinho Delgado (CURSO DE DIREITO DO TRABALHO, Editora LTr, pág. 885:

“De fato, as garantias trabalhistas construídas ao longo da História têm buscado restringir fundamentalmente a utilização máxima da força de trabalho (no dia e semana, principalmente), não inviabilizando, é claro, seu uso moderado ou pouco intenso. É o que se percebe, por exemplo, nas regrais legais que estipulam duração máxima para o labor a cada dia (ou duração semana máxima), não proibindo, em contraponto, duração reduzida com vantagens trabalhistas proporcionalmente ajustadas. Nessa linha, a idéias prevalecente de fixação do salário obreiro em função de parâmetros temporais distintos (hora, dia ou mês) é funcional, exatamente por permitir o cálculo das verbas trabalhistas em comparação com as horas pactuadas de labor (por exemplo, jornadas de 5 horas, correspondendo a uma duração mensal do trabalho de 150 horas, já incluídos os dias de repouso – tudo isso com salário horário, diário e mensal equivalentes).

Do mesmo modo, a garantia de salário mínimo sempre foi construída tendo por critério de aferição a real duração do trabalho pactuada com o empregado (salário mínimo horário, diário ou mensal). Por esta razão sempre foi possível falar-se, validamente, em meia jornada (com durações semanais e mensais equivalentes à metade do padrão vigorante), correspondendo a meio salário mínimo (na verdade, salário mínimo correspondente à duração reduzida do labor).”

Corroborando este entendimento, segue decisão do C. TST, no AIRR-1695/2002-025-03-00.7, 1ª Turma, de relatoria do Min. Walmir Oliveira Costa:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO D E R E V I S TA . P R O C E D I M E N TO S U M A R Í S S I M O.

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EMPREGADO DOMÉSTICO. JORNADA REDUZIDA. S A L Á R I O M Í N I M O . P R O P O R C I O N A L I D A D E . O art. 7º, IV, da Constituição da República garante o salário mínimo como sendo a menor remuneração paga ao trabalhador. Todavia, a interpretação desse dispositivo deve ser feita considerando o inciso XIII do referido dispositivo constitucional, o qual estabelece o limite da jornada de trabalho de oito horas diárias e quarenta e quatro semanais. Nesse sentido, se a jornada de trabalho contratada do empregado, ainda que trabalhador doméstico, é inferior àquela constitucionalmente estipulada, o salário pode ser pago de forma proporcional ao número de horas trabalhadas em jornada reduzida.”

Cabe ressaltar, que o regime de tempo parcial somente pode ser aplicado a trabalhadores inseridos na jornada normal de 08 horas ao dia, naturalmente não abarcando aqueles trabalhadores com jornada especial.

Desta forma, havendo contrato de trabalho com regime de tempo parcial reconhecidamente válido, o salário pago por hora trabalhada proporcionalmente à do salário mínimo, está amparado pela CLT, podendo ser aplicado no presente caso.

Todavia, compulsando-se os autos, observo que o vínculo empregatício ocorreu no período compreendido entre 10.08.2008 à 06.04.2009. E que o salário mínimo cujo valor era de R$ 415,00, até 31.01.2009, correspondente à R$ 1,89 (um real e oitenta e nove centavos), a hora trabalhada, foi reajustado à quantia de R$ 465,00, equivalente à R$ 2,11 (dois reais e onze centavos), a hora laborada.

A despeito de tal fato, a própria recorrente confirmou que sempre pagou a título de hora trabalhada o valor de R$ 1,89, conforme se observa no contrato de trabalho em regime de tempo parcial, à fl. 86, e ficha de registro de empregados, fl. 91, não tendo, a partir de 01.02.2009, reajustado o salário do trabalhador para o novo valor proporcional ao salário mínimo.

Assim sendo, dou provimento parcial ao recurso patronal para reconhecer a validade do contrato por tempo parcial, e excluir do condeno o pagamento de diferença salarial e sua repercussão, no período compreendido entre 10.08.2008 à 31.01.2009. Quanto ao

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período de 01.02.2009 à 06.04.2009, limito a condenação ao pagamento da diferença do salário recebido por hora trabalhada de R$ 1,89 ao valor de R$ 2,11 e suas repercussões nas férias + 1/3, 13º salário, aviso prévio e FGTS + 40%.

CONCLUSÃO:

Ante o exposto, dou provimento parcial ao recurso para excluir da condenação o pagamento de diferença salarial e repercussões, no período compreendido entre 10.08.2008 à 31.01.2009. Quanto ao interstício de 01.02.2009 à 06.04.2009, limito a condenação ao pagamento da diferença do salário recebido por hora trabalhada de R$ 1,89 ao valor de R$ 2,11 e suas repercussões nas férias + 1/3, 13º salário, aviso prévio e FGTS + 40%. Ao decréscimo condenatório arbitro em R$ 4.500,00 (quatro mil e quinhentos reais).

ACORDAM os Membros integrantes da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Sexta Região, por unanimidade, por unanimidade, dar provimento parcial ao recurso para excluir da condenação o pagamento de diferença salarial e repercussões, no período compreendido entre 10.08.2008 à 31.01.2009. Quanto ao interstício de 01.02.2009 à 06.04.2009, limitar a condenação ao pagamento da diferença do salário recebido por hora trabalhada de R$ 1,89 ao valor de R$ 2,11 e suas repercussões nas férias + 1/3, 13º salário, aviso prévio e FGTS + 40%. Ao decréscimo condenatório arbitra-se em R$ 4.500,00 (quatro mil e quinhentos reais).

Recife, 14 de abril de 2010.

ACÁCIO JÚLIO KEZEN CALDEIRADesembargador Federal do Trabalho

Relator

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PROC. Nº. TRT – 0033100-93.2009.5.06.0015 (00331-2009-015-06-00-2)

ÓRGÃO JULGADOR: SEGUNDA TURMA

RELATOR: DESEMBARGADOR VALDIR CARVALHORECORRENTE: EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRA-FOS - EBCTRECORRIDO: ERIK CÉSAR CARVALHO DA SILVAADVOGADOS: HEITOR DE A. PICANÇO P. NETO E CASSIUS GUERRA VAREJÃO DE ALCÂNTARAPROCEDÊNCIA: 15ª VARA DO TRABALHO DO RECIFE/PE

EMENTA: EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELÉGRAFOS – EBCT. BENEFICIÁRIA DOS FAVORES DA FAZENDA PÚBLICA. DISPENSA IMOTIVADA. IMPOSSIBILIDADE. Em que pese as Empresas Estatais (Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista), por força de norma inserta no artigo 173, §1º, inciso II, da Carta Política Nacional, estejam sujeitas, em matéria trabalhista, “ao regime jurídico próprio das empresas privadas”, em face do disposto no art. 12, do Decreto-lei n. 509/69, a demissão, sem causa, de empregados da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – EBCT, requer motivação, consoante Orien-tação Jurisprudencial nº 247, item II, da SDI – 1, do Tribunal Superior do Trabalho: “A validade do ato de despedida do empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) está condicionada à motivação, por gozar a empresa do mesmo tratamento destinado à Fazenda Pública em relação à imunidade tributária e à execução por precatório, além das prerrogativas de foro, prazos e custas processuais.” A tese empresarial é de que o demandante violou Regulamento Disciplinar de Pessoal (item 2, “f”) em razão de haver silenciado sobre o recebimento indevido do benefício auxílio creche pela sua companheira, à época, também em-pregada da reclamada. Esse entendimento, contudo, discrepa da ordem jurídica constitucional (direito ao silêncio - art. 5º, LXIII, CF). É que, em face do direito fundamental que protege contra a auto-incriminação, previsto no art. 5º, LXIII, CF (o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado), considerando que embora aludindo ao preso, a interpretação da regra constitucional deve ser no sentido de que a garantia abrange toda e qualquer pessoa, e, ainda, que o art. 406, I, do CPC, na mesma linha, dispõe que “a testemunha não é obrigada a

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depor de fatos que lhe acarretem grave dano, bem como ao seu cônjuge e aos seus parentes consangüíneos ou afins, em linha reta, ou na colateral em segundo grau”, não pode ser considerado ato de indisciplina ensejadora de quebra de fidúcia o fato do demandante não haver comunicado sua empregadora sobre irregularidade praticada na empresa pela sua companheira. “o direito à não-auto-incriminação constitui uma barreira intrasponível ao direito à prova de acusação; sua denegação, sob qualquer disfarce, de representará um indesejável retorno às formas mais abominá-veis da repressão, compromentendo o caráter ético-político do processo e a própria correção no exercício da função jurisdicional” (Antonio Magalhães). Em concreto, as circunstâncias apresentadas pela demandada como motivadoras da rescisão contratual do demandante, silêncio quanto à fraude perpetrada por sua companheira, não configura motivo dis-ciplinar capaz de quebrar a fidúcia inerente ao contrato de emprego, a justificar a dispensa sem justa causa do obreiro. Tenho, pois, como não afrontado o item 2, “f”, do Regulamento Disciplinar de Pessoal da reclamada, o que autoriza o decreto de reintegração no emprego. Recurso ordinário improvido.

Vistos etc.Recurso ordinário interposto por EMPRESA BRASILEIRA

DE CORREIOS E TELÉGRAFOS - EBCT, em face de decisão proferida pela MM. 15ª Vara do Trabalho do Recife/PE, que, às fls. 726/736, julgou procedente, em parte, a reclamação trabalhista nº 0033100-93.2009.5.06.0015, contra ela ajuizada por ERIK CÉSAR CARVALHO DA SILVA, ora recorrido.

Embargos de declaração opostos pela reclamada às fls. 737/743, acolhidos às fls. 745/746.

Em suas razões às fls. 753/763, pugna a reclamada pela reforma da sentença que declarou a nulidade da dispensa do autor e determinou a sua reintegração no cargo que exercia quando de sua demissão, bem como o pagamento dos salários vencidos da data da dispensa até a efetiva reintegração, com suas repercussões. Sustenta, inicialmente, que, ao contrário do que declarou o Juízo de Primeiro grau, a demissão do reclamante, embora não tenha sido por justa causa, foi devidamente motivada, nos estritos termos da OJ 247, da SDI – 1, do Colendo TST. Aduz que o obreiro não gozava estabilidade

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provisória e que, através do processo administrativo no qual foi respeitado o contraditório e a ampla defesa, restou demonstrado que o reclamante tinha conhecimento da irregularidade no recebimento do benefício auxílio creche por parte de sua companheira, que na época também trabalhava para a ré, o que ensejou a quebra da fidúcia indispensável na relação de emprego e, conseqüentemente, motivou a demissão do autor. Informa, por fim, que o dever de retidão de conduta, civilidade e moralidade devem estar acima das relações afetivas ou de parentesco. Pede provimento ao apelo.

Contrarrazões apresentadas às fls. 767/772. A Procuradoria Regional do Trabalho, por meio do parecer

da lavra do Procurador Regional Waldir de Andrade Bitu Filho, às fls. 775/778, opinou pelo improvimento do recurso ordinário.

É o relatório.

VOTO:

Pretende a reclamada, ora recorrente, a reforma da sentença de primeiro grau que declarou a nulidade da dispensa do autor por falta de motivação e determinou a sua reintegração ao emprego, com pagamento dos salários vencidos e vincendos.

O reclamante ajuizou a presente demanda trabalhista postulando sua reintegração no emprego, alegando ter estabilidade sindical em razão da sua condição de delegado sindical, assim como, asseverando que “não houve motivação para sua demissão, devendo este Juízo considerar inválido o procedimento realizado pela reclamada por ser eivado de vício.” (fl. 08). Aduz, que foi dispensado sob a acusação de que fora conivente com sua namorada, Sra. Elisabete Lins Barros de Melo, a qual, por sua vez, foi acusada de ter recebido indevidamente o auxílio creche e que, ao ser interrogada, afirmou que o obreiro não tinha conhecimento do fato da filha da depoente não estar mais estudando. Sustenta que por ser Delegado Sindical, conforme Acordo Coletivo de Trabalho (cláusula 19), só pode ser dispensado motivadamente, mediante apuração dos fatos justificadores da demissão, em procedimento próprio, assegurada assistência sindical e ampla defesa, o que informa não ter sido observado na hipótese, uma vez que o sindicato não lhe assistiu em seu depoimento.

A postulada informa que o reclamante foi dispensado sem

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justa causa, porém, com motivação, eis que, após regular processo administrativo, concluiu-se pela participação do autor, ainda que de forma passiva, em fraude praticada pela sua companheira, à época também empregada da ré, no recebimento do benefício auxílio creche, asseverando, ainda, que tendo o demandante sido nomeado para o cargo de Delegado Sindical, jamais gozou estabilidade provisória pretendida, a qual é prevista, apenas, àqueles eleitos para cargo de administração sindical.

O cerne da discussão, nos presentes fólios, diz respeito à validade da demissão sem justa causa do reclamante.

Necessário consignar, inicialmente, que a alegação de estabilidade provisória de Delegado Sindical foi escorreitamente rejeitada na sentença guerreada (fl. 730), de conformidade com entendimento do TST, consubstanciado na OJ nº 369, da SDI-1, nada mais havendo a ser apreciado, portanto, neste particular.

O reclamante é empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – EBCT, empresa pública, integrante da Administração Indireta Federal, a quem compete “executar e controlar, em regime de monopólio, os serviços postais em todo o território nacional” (artigo 2º, inciso I, do Decreto-lei n. 509/69), com capital constituído unicamente por recursos provenientes da União Federal e, como tal, submetida ao disposto no artigo 37, da Constituição Federal. Goza a demandada dos privilégios assegurados à Fazenda Pública, “quer em relação à imunidade tributária, direta ou indireta, impenhorabilidade de seus bens, rendas e serviços, quer no concernente a foro, prazos e custas processuais”, nos moldes do artigo 12, do retromencionado decreto, recepcionado pela Constituição Federal de 1988, como, aliás, proclamou o Plenário do Excelso Supremo Tribunal Federal no julgamento do Recurso Extraordinário 220.906, do qual foi condutor do acórdão o Ministro Maurício Corrêa, e seus empregados gozam de garantia no emprego nos moldes do artigo 165, da CLT.

Logo, em que pese as Empresas Estatais (Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista), por força de norma inserta no artigo 173, §1º, inciso II, da Carta Política Nacional, estejam sujeitas, em matéria trabalhista, “ao regime jurídico próprio das empresas privadas”, em face do disposto no art. 12 do Decreto-lei n. 509/69, a demissão de empregados da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – EBCT, requer motivação, consoante

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Orientação Jurisprudencial nº 247, item II, do Tribunal Superior do Trabalho, in verbis:

Nº 247 SERVIDOR PÚBLICO. CELETISTA CONCURSADO. DESPEDIDA IMOTIVADA. EMPRESA P Ú B L I C A O U S O C I E D A D E D E E C O N O M I A MISTA. POSSIBILIDADE. Inserida em 20.06.2001 (Alterada – Res. nº 143/2007 - DJ 13.11.2007) I - A despedida de empregados de empresa pública e de sociedade de economia mista, mesmo admitidos por concurso público, independe de ato motivado para sua validade; II - A validade do ato de despedida do empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) está condicionada à motivação, por gozar a empresa do mesmo tratamento destinado à Fazenda Pública em relação à imunidade tributária e à execução por precatório, além das prerrogativas de foro, prazos e custas processuais.(grifei)

Acerca da questão, importa salientar que os motivos ensejadores de dispensa por justa causa elencados no art. 482, Consolidado, não se confundem com a motivação do ato administrativo de dispensa de empregado de empresa estatal que goza dos privilégios assegurados à Fazenda Pública, caso dos autos, motivação esta indispensável, em respeito aos princípios da impessoalidade e legalidade, consagrados no artigo 37, caput, da Constituição Federal.

Assim, na condição de empregado da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos – EBCT, o autor é detentor de garantia no emprego. No caso das denominadas garantias no emprego, à exceção de dirigente sindical (CLT, artigo 543, § 3º), que têm idêntico procedimento ao do empregado portador de estabilidade decenal, inexiste exigência de procedimento legal específico, a exemplo dos casos de cipeiro, onde é necessário, apenas, motivar a decisão, nos termos preceituados no artigo 165, Consolidado, que giza:

“Os titulares da representação dos empregados nas CIPA(s) não poderão sofrer despedida arbitrária, entendendo-se como tal a que não se fundar em motivo disciplinar, técnico, econômico ou financeiro.”

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A tese empresarial é de que o demandante violou Regulamento Disciplinar de Pessoal (item 2, “f”) em razão de haver silenciado sobre o recebimento indevido do benefício auxílio creche pela sua companheira, à época, também empregada da reclamada. Esse entendimento, contudo, discrepa da ordem jurídica constitucional (direito ao silêncio - art. 5º, LXIII, CF).

É que, em face do direito fundamental que protege contra a auto-incriminação, previsto no art. 5º, LXIII, CF (o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado), considerando que embora aludindo ao preso, a interpretação da regra constitucional deve ser no sentido de que a garantia abrange toda e qualquer pessoa, e, ainda, que o art. 406, I, do CPC, na mesma linha, dispõe que “a testemunha não é obrigada a depor de fatos que lhe acarretem grave dano, bem como ao seu cônjuge e aos seus parentes consangüíneos ou afins, em linha reta, ou na colateral em segundo grau”, não pode ser considerado ato de indisciplina ensejadora de quebra de fidúcia o fato do demandante não haver comunicado sua empregadora sobre irregularidade praticada na empresa pela sua companheira. No caso, amparado o vindicante na prerrogativa contra a auto-incriminação presente no ordenamento jurídico pátrio.

No campo da doutrina, Alexandre de Moraes ensina que “A expressão preso não foi utilizada pelo texto constitucional em seu sentido técnico, pois o presente direito tem como titulares todos aqueles, acusados ou futuros acusados (por exemplo: testemunhas, vítimas), que possam eventualmente ser processados ou punidos em virtude de suas próprias declarações.

Comentando o direito ao silêncio, Antonio Magalhães expõe que:

‘o direito à não-auto-incriminação constitui uma barreira intrasponível ao direito à prova de acusação; sua denegação, sob qualquer disfarce, de representará um indesejável retorno às formas mais abomináveis da repressão, compromentendo o caráter ético-político do processo e a própria correção no exercício da função jurisdicional” (Direito à prova no processo penal. São Paulo : Revista dos Tribunais, 1997. p. 114).’” (Direitos Humanos e Fundamentais, Teoria Geral, Comentários aos

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arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil, Doutrina e Jurisprudência, 4ª edição, editora Atlas S/A – fls. 286/287)

Nesse sentido, no julgamento do Habeas Corpus nº 78.708-SP, o Ministro Sepúlveda Pertence assinalou que “I. O direito à informação da faculdade de manter-se silente ganhou dignidade constitucional, porque instrumento insubstituível da eficácia real da vetusta garantia contra a auto-incriminação que a persistência planetária dos abusos policiais não deixa perder atualidade. II. Em princípio, ao invés de constituir desprezível irregularidade, a omissão do dever de informação ao preso dos seus direitos, no momento adequado, gera efetivamente a nulidade e impõe a desconsideração de todas as informações incriminatórias dele anteriormente obtidas, assim como das provas delas derivadas.”

A propósito, assim decidiu o STF:

“COMISSÃO PARLAMENTAR INQUÉRITO. R I V I L É G I O CO N T R A A AU TO - I N C R I M I N A Ç Ã O. DIREITO QUE ASSISTE A QUALQUER INDICIADO U TESTEMUNHAL. IMPOSSIBILIDADE DE O PODER PÚBLICO IMPOR MEDIDAS RESTRITIVAS A QUEM EXERCE, REGULARMENTE, ESSA PRERROGATIVA. MEDIDA LIMINAR CONCEDIDA.

- O privilégio contra a auto-incriminação – que é plenamente invocável perante as Comissões Parlamentares de Inquérito – traduz direito público subjetivo assegurado a qualquer pessoa que deva prestar depoimento perante órgãos do Poder Legislativo, do Poder Executivo ou do Poder Judiciário.

-O exercício do direito de permanecer em silêncio não autoriza os órgãos estatais a dispensarem qualquer tratamento que implique restrição à esfera jurídica daquele que regularmente invocou essa prerrogativa fundamental. Precedentes.

- Ninguém pode ser tratado como culpado, independentemente da natureza do ilícito penal que lhe possa

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ser atribuído, sem que exista decisão judicial condenatória transitada em julgado. O princípio constitucional da não-culpabilidade consagra, em nosso sistema jurídico, uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados definitivamente por sentença do Poder Judiciário. Precedentes.” HC 79.812-8 – SP, STF/pleno, RT 788/520 e RTJ 176/805)

Em concreto, as circunstâncias apresentadas pela demandada como motivadoras da rescisão contratual do demandante, silêncio quanto à fraude perpetrada por sua companheira, não configura motivo disciplinar capaz de quebrar a fidúcia inerente ao contrato de emprego, a justificar a dispensa sem justa causa do obreiro. Tenho, pois, como não afrontado o item 2, “f”, do Regulamento Disciplinar de Pessoal, o que autoriza o decreto de reintegração no emprego.

No ponto, endosso parte dos fundamentos da respeitável sentença impugnada, “in verbis”:

“Constitui garantia constitucional do cidadão que nenhuma pena passará da pessoa do condenado.

No caso presente, a imputação de fraude no recebimento de Auxilio Creche fora imputada a Sra. Elisabete, que também era funcionária da reclamada. Fora ela quem requereu o benefício junto à reclamada. Era ela quem apresentava os recibos e quem recebia da reclamada o auxílio.

O fato de o reclamante manter com a mencionada ex-empregada um relacionamento amoroso não o torna cúmplice, nem conivente com a alegada fraude imputada a ela.

A própria Elisabete, no depoimento prestado nos autos da sindicância, às fls. 56, afirma que o Erick (reclamante) não faz o papel de pai dos seus filhos menores e que com relação à criação, educação, rendimento escolar

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de seus filhos e tudo o que se relacionava a eles era de responsabilidade dela, tendo omitido do reclamante o fato de haver retirado da escola sua filha.

Por outro lado, ainda que tivesse conhecimento da fraude praticada pela companheira, o reclamante, como companheiro da Sra. Elisabete, não estaria obrigado a denunciar o fato a reclamada, pois estaria denunciando a própria companheira, não sendo razoável exigir-se do mesmo tal postura.” (fls. 729/730)

O argumento apresentado pela empresa para justificar a rescisão contratual do recorrido, portanto, é inservível para tolher o seu direito a manter-se no emprego.

Feitas tais considerações, tenho por ilegal o ato de demissão do autor, mantendo-se, pois, a sentença que determinou a reintegração do trabalhador no emprego e pagamento dos salários vencidos e vincendos.

Ante o exposto, nego provimento ao recurso ordinário.

ACORDAM os Desembargadores da 2ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Sexta Região, por unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário.

Recife-PE, 17 de março de 2010.

VALDIR CARVALHODesembargador Federal do Trabalho

Relator

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PROC. N.º TRT. RO – 0004600-08.2009.5.06.0018

ÓRGÃO JULGADOR: TERCEIRA TURMA

RELATORA: DES.ª VIRGÍNIA MALTA CANAVARRORECORRENTES: PP – PARTIDO PROGRESSISTA (DIRETÓRIO NA-CIONAL) E MARIA IRECE BEZERRA ANDREOTTIRECORRIDOS: OS MESMOS E PP - PARTIDO PROGRESSISTA (DI-RETÓRIO ESTADUAL)ADVOGADOS: LUCIANA FERREIRA GONÇALVES, CARLOS HUM-BERTO RIGUEIRA ALVES E ELIAS MANOEL DA SILVAPROCEDÊNCIA: 18ª VARA DO TRABALHO DE RECIFE–PE

EMENTA: I – DIREITO DO TRABALHO. RECURSO ORDINÁRIO DO RECLAMADO. RECLAMAÇÃO CONTRA PARTIDO POLÍTICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS DIRETÓRIOS NACIONAL E ESTADUAL. Mesmo dispondo de CNPJs distintos, é inequívoco que tanto o Diretório Nacional quanto o Estadual são órgãos de direção e de ação do Partido, não havendo como negar a responsabilidade soli-dária do Diretório Nacional em relação às obrigações assumidas pelo Diretório Estadual. A situação assemelha-se à do grupo econômico, que se caracteriza quando há controle de uma empresa sobre as demais, numa relação vertical ou de hierarquia, ou ainda entre empresas que possuem apenas uma relação de coordenação horizontal. Não resta a menor dúvida de que trabalham ambos, Diretório Nacional e Esta-dual, em prol do Partido, havendo uma relação de coordenação para possibilitar uma atuação partidária mais efetiva.II – RECURSO ORDINÁRIO DA AUTORA. CONTESTAÇÃO GE-NÉRICA. DEFERIMENTO DO PLEITO COM ADEQUAÇÃO AOS ELEMENTOS DE PROVA COLIGIDOS AOS AUTOS. Ainda que o re-clamado não tenha apresentado contestação específica contra a jornada de trabalho declinada na inicial deve o julgador, ao fixar a condenação, adequá-la aos elementos carreados aos autos, especialmente as decla-rações da testemunha trazida aos autos pela parte autora.

Vistos etc.R e c o r r e m o r d i n a r i a m e n t e o P P – PA R T I D O

PROGRESSISTA (DIRE TÓRIO NACIONAL) E MARIA IRECE

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BEZERRA ANDREOTTI de decisão proferida pelo MM. Juízo da 18ª Vara do Trabalho de Recife-PE, que julgou PROCEDENTES EM PARTE os pedidos formulados na ação trabalhista ajuizada pela segunda em face do primeiro recorrente e do PP - PARTIDO PROGRESSISTA (DIRE TÓRIO ESTADUAL) , nos termos da fundamentação de fls. 182/183.

Recurso Ordinário do 2º Réu

Razões do recurso às fls. 199/214. Argúi, inicialmente, a sua ilegitimidade passiva ad causam e ausência de responsabilidade solidária. Diz que é fato incontroverso que a autora busca uma relação de emprego que alega ter sido mantida com o Diretório Estadual do partido e não com o Diretório Nacional, pessoas jurídicas distintas, inclusive com CNPJs distintos. Ressalta que não se trata de uma simples Comissão Provisória, pois existe o Diretório Estadual que atualmente conta com uma Comissão Provisória para sua administração, conforme autoriza o art. 38, inciso XVIII do Estatuto do Partido. Salienta que a própria existência de uma Comissão Provisória para a administração do Diretório Estadual já faz prova suficiente de que não havia ingerência do Diretório Nacional no citado órgão, sendo parte ilegítima para figurar no polo passivo da presente reclamação. Argumenta que inexiste qualquer possibilidade de eventual condenação solidária do recorrente, haja vista que, por imposição legal, o Diretório Nacional não pode ser responsabilizado por qualquer dos pleitos aduzidos pela recorrida, que pretende o reconhecimento de vínculo empregatício que alega ter mantido com o Diretório Estadual. Afirma que repassou regularmente o Fundo Partidário devido ao Diretório Estadual de Pernambuco e, assim, não pode responder pelo não cumprimento de obrigações assumidas por aquele Diretório, pois a legislação é absolutamente clara ao dispor que a responsabilidade cabe exclusivamente ao órgão partidário (municipal, estadual ou nacional) que tiver dado causa ao não cumprimento da obrigação. Requer a extinção do processo sem resolução de mérito a teor do disposto no art. 267-VI do CPC. Renova a arguição da prescrição quinquenal, alegando que se encontram prescritos os direitos postulados exigíveis até janeiro de 2005. Diz também que a reclamante foi dispensada em 12.04.1999, há mais de dez anos, estando precluso seu direito de

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ajuizar reclamação trabalhista. Insurge-se contra o reconhecimento da existência de vínculo empregatício sob a alegação de que a recorrida jamais manteve qualquer vínculo empregatício seja com o recorrente ou com o Diretório Estadual do Partido. Afirma que a autora não juntou qualquer documento que comprovasse que tenha prestado algum tipo de serviço para ele após sua demissão ocorrida em 14.04.1999, não tendo mantido qualquer vínculo empregatício com ou reclamado ou com o Diretório Estadual após esse período. Frisa que durante os períodos de campanha eleitoral é comum os diretórios dos partidos contratarem prestadores de serviços nas mais diversas áreas. Invoca o disposto no art. 100 da Lei nº. 9.504/97. Alega que a mão-de-obra contratada para prestação de serviços nas campanhas eleitorais não gera vínculo empregatício. Frisa que a própria reclamante aduziu na inicial que o Diretório Estadual está funcionando como uma Comissão Provisória, no entanto após o último pleito eleitoral não teve qualquer funcionamento na sede do Diretório Estadual. Diz que em momento algum restou demonstrada a exclusividade na prestação dos serviços, habitualidade e subordinação. Não se conforma ainda com a condenação no pagamento de indenização por danos moral e material. Insiste inicialmente na negativa do vínculo empregatício razão pela qual não poderia ter havido qualquer ação ou omissão que pudesse causar dano à reclamante. Argumenta também que não há nos autos qualquer comprovação de que a autora tenha sido vítima de acidente de trabalho passível de fundamentar o pleito. Destaca que a própria demandante afirma ser vítima de um câncer de mama, não sendo a hipótese de doença profissional ou advinda de um acidente de trabalho, não havendo que se falar em obrigação do empregador quanto aos custos com o tratamento médico. Pontua que ainda que a recorrida fosse empregada dos reclamados na ocasião, o que até então não se comprovou, ainda assim o empregador não é obrigado a custear tratamento de saúde de seus empregados com relação a doenças não relacionadas à atividade profissional, improcedendo o pedido de dano material. Quanto ao dano moral, diz que cabe à reclamante demonstrar inequivocamente que entrou em depressão em razão da doença, porque se viu desamparada sem poder usufruir dos benefícios da Lei nº. 8.213/91. Argumenta que a autora não demonstrou que as atividades exercidas teriam agravado o seu estado de saúde, não podendo os reclamados ser responsabilizados pelo fato de a reclamante ter entrado em processo depressivo ao descobrir a

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doença. Ressalta que a demandante não mantinha qualquer vínculo com o Diretório Nacional, não contribuindo para os danos que ela alega ter sofrido. Busca, alternativamente, a redução do valor arbitrado à indenização. Diz que o arbitramento no importe de R$ 20.000,00 se mostra exorbitante.

Recurso Ordinário da Autora

Razões do recurso às fls. 222/231. Busca, inicialmente, a ampliação da condenação no pagamento de horas extras, a serem calculadas com base na jornada descrita na exordial, haja vista que, no particular, a contestação foi apresentada de forma genérica, eis que limitada à negativa da relação de emprego, aplicando-se à hipótese o disposto no art. 302 do CPC. Insurge-se contra a aplicação, de ofício, da prescrição quinquenal. Alega incompatibilidade do disposto no § 5º do art. 219 do CPC com o processo trabalhista. Por fim, pretende o acréscimo à condenação do reajuste do salário com base no INPC. Diz que a remuneração percebida nunca sofreu qualquer reajuste, havendo perda de compra do salário.

Contrarrazões apresentadas pela autora às fls. 234/249, pelo segundo réu às fls. 276/282 e pelo primeiro réu às fls. 284/291.

Desnecessária a remessa dos presentes autos à d. Procuradoria, em face do disposto no art. 50 do Regimento Interno deste Regional.

É o relatório.

VOTO:

Preliminar de não conhecimento do recur-so do reclamado por deserção, arguida pela reclamante

Rejeito.

Embora pessoalmente divirja de tal posicionamento, o fato é que o C. TST vem entendendo que o depósito recursal

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efetuado na Guia para Depósito Judicial Trabalhista, como ocorreu na espécie (fls. 216), supre a exigência do art. 899, § 4º, da CLT e da sua Instrução Normativa nº. 18/99, haja vista que o depósito encontra-se à disposição do juízo e perfeitamente identificado, vinculado ao processo. Alcançada a sua finalidade, não há porque deixar de ser conhecido o apelo.

A propósito:

RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI N.º 11.496/2007. RECURSO ORDINÁRIO. DEPÓSITO RECURSAL. GUIA DE DEPÓSITO JUDICIAL TRABALHISTA. DESERÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. Afigura-se regular o depósito recursal para fins de recurso quando efetuado mediante guia de depósito judicial trabalhista, observados o prazo e valor legais, e encontrando-se consignados na guia respectiva o nome do Reclamante e do Reclamado, a Vara do Trabalho em que tramitou o feito e o número do processo, além da autenticação do Banco recebedor da quantia. Não caracteriza a deserção do recurso o fato de o depósito ter sido efetuado em guia diversa da GFIP e fora da conta vinculada do FGTS. Recurso de embargos conhecido e não provido.- (TST-E-ED-RR-3630/2006-047-12-00.8, Redator Designado Lelio Bentes Corrêa, SBDI-1, DEJT 7/8/2009.)

-RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO SOB A VIGÊNCIA DA LEI N.º 11.496/2007, QUE DEU NOVA REDAÇÃO AO ART. 894 DA CLT. - RECURSO DE REVISTA - CONHECIMENTO E PROVIMENTO – DEPÓSITO RECURSAL - RECOLHIMENTO - COMPROVAÇÃO - GUIA DE DEPÓSITO DIVERSA DA PREVISTA NA INSTRUÇÃO NORMATIVA N.º 26/2004/TST - VALIDADE - Não obstante a Instrução Normativa 26/2004 aluda à utilização da Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social - GFIP para

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recolhimento do depósito recursal, previsto no artigo 899 da CLT, é válida a utilização da Guia para Depósito Judicial Trabalhista, para o recolhimento respectivo, porque não há previsão legal no sentido de a incorreção da Guia de Recolhimento do Depósito Recursal gerar a deserção do recurso e, ainda, porque o equívoco havido não impossibilitava a identificação para que se destina o depósito, alcançando, na hipótese, o princípio da finalidade essencial do ato processual. Recurso de Embargos conhecido e desprovido.- (TST-E-ED-RR-486/2005-026-09-00.2, Rel. Min. Carlos Alberto Reis de Paula, SBDI-1, DEJT 27/3/2009.)

Preliminarmente:

Suscito o não conhecimento das contrarrazões de fls. 276/282, apresentadas pelo segundo réu ao recurso ordinário apresentado pela autora, por intempestividade.

Notificado para contra-arrazoar o recurso ordinário interposto pela autora em 13.10.2009 (fls. 267.v), uma terça-feira, iniciada foi a contagem do prazo no dia seguinte, 14.10.2009, estendendo-se até 21.10.2009, uma quinta-feira. As contrarrazões, porém, só foram protocoladas em 23.10.2009 (fls. 276), fora do prazo.

Recurso Ordinário do 2º Reclamado

Da ilegitimidade passiva ad causam

Da ilegitimidade passiva ad causam, argüida pelo recorrente

Sem razão o recorrente.É legitimado a figurar no polo passivo da ação aquele

contra quem é deduzida a pretensão inicial ou é chamado a responder solidária ou subsidiariamente pelos créditos pretendidos.

Assim, não há que se cogitar em ilegitimidade do recorrente, haja vista que foi chamado pela autora para integrar o polo passivo da ação. A questão alusiva à responsabilidade solidária exige

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incursão meritória, razão porque com ele será apreciada.

Da responsabilidade solidária

Argumenta que inexiste qualquer possibilidade de eventual condenação solidária do recorrente, haja vista que, por imposição legal, o Diretório Nacional não pode ser responsabilizado por qualquer dos pleitos aduzidos pela recorrida, que pretende o reconhecimento de vínculo empregatício que alega ter mantido com o Diretório Estadual. Afirma que repassou regularmente o Fundo Partidário devido ao Diretório Estadual de Pernambuco e, assim, não pode responder pelo não cumprimento de obrigações assumidas por aquele Diretório, pois a legislação é absolutamente clara ao dispor que a responsabilidade cabe exclusivamente ao órgão partidário (municipal, estadual ou nacional) que tiver dado causa ao não cumprimento da obrigação.

Analisando a questão alusiva à responsabilidade da recorrente pelos títulos da condenação assim se manifestou o juízo de 1º grau:

“(...) À priori, há de se observar que a Lei 9.096/95 que rege a matéria acerca dos Partidos Políticos já deixa evidenciado que o Partido Político é uno, indivisível, visto adquirir personalidade jurídica quando tem seus atos constitutivos registrados junto ao Cartório de Registro de Títulos e Documentos e esses são ratificados perante o TSE, isto é, na sede em Brasília; de forma que os demais Partidos dele ramificados nos Estados e Municípios, constituem-se em meros órgãos de direção e ação, mas indivisível, cuja fonte que os origina é oriunda do Partido Nacional. De igual forma, para a apreciação acerca da situação desses dois Partidos, de cunho Nacional e Estadual, respectivamente, há de se analisar o Estatuto do Partido Progressista, colacionado aos autos às fls. 114. Pois bem, o próprio Estatuto do Partido Progressista, de cunho Nacional, deixa clara essa indivisibilidade desses Partidos Nacional e Estaduais. Veja-se o que dispõe as cláusulas desse Estatuto, in verbis:

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“CAPÍTULO IVDOS ÓRGÃOS DO PARTIDO.Art. 7º. São órgãos do Partido, nas respectivas

áreas jurisdicionais:(...)II - De direção e de ação:(...)b) os Diretórios Estaduais.”

“CAPÍTULO VIIID O D I R E T Ó R I O E D A C O M I S S Ã O

EXECUTIVA NACIONAL.(...)Art. 36. Compete ao Diretório Nacional:(...)VIII - julgar os recursos que lhe forem

interpostos de atos e decisões da Comissão Executiva e dos demais órgãos partidários estaduais e municipais encaminhados pela referida Comissão:”

“CAPÍTULO IXD O S D I R E TÓ R I O S E DA S CO M I S S Õ E S

EXECUTIVAS ESTADUAIS.(...)Art. 42. Compete à Comissão Executiva

Estadual exercer todas as atividades do Diretório Estadual ad referendum deste e, ainda:

(...)XI - elaborar e remeter, semestralmente, ao

Diretório Nacional, relatório das atividades político-partidárias;

XII - remeter ao Diretório Nacional cópia das atas de eleição do Diretório Estadual, de eleição dos Delegados à Convenção Nacional, de eleição da Comissão

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Executiva e da indicação dos candidatos do Partido aos cargos eletivos;”

(...)

SEÇÃO IIDo Orçamento e da Contabilidade(...)Art. 102. Os Diretórios Estaduais receberão as

contas dos Diretórios Municipais que as encaminharão, juntamente com as suas, ao Diretório Nacional, ao qual competirá a prestação de contas ao Tribunal Superior Eleitoral, salvo disposição de lei em contrário.”

Nesses aspectos, analisando essas determinações do Estatuto do Partido Nacional, observamos a total vinculação do Partido Estadual, como um só Partido Progressista. Primeiramente, o Diretório Nacional trata o Diretório Estadual como um órgão de direção e ação desse Partido. Em segundo aspecto, demonstra sua superioridade sobre os Partidos Estaduais ao determinar que lhe cabe, em última instância, julgar as deliberações desses Partidos Estaduais. Em contrapartida, define dentre as atuações dos Partidos Estaduais a prestação de contas mensais para com o Partido Nacional; bem como, a prestação de contas semestrais, mediante envio do relatório das atas de eleição e demais deliberações a nível estadual. Tais atos demonstram, de forma induvidosa, que de fato os Partidos Estaduais estão intrinsecamente ligados ao Partido Nacional, mediante dependência financeira e política; sendo, portanto, ambos os Partidos (Nacional e Estadual), solidariamente responsáveis pelos débitos oriundos da vinculação empregatícia da reclamante.” Fls. 183/184.

Incensurável o decisum.

Com efeito, mesmo dispondo de CNPJs distintos, é inequívoco que tanto o Diretório Nacional quanto o Estadual são órgãos de direção e de ação do Partido, não havendo como negar

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a responsabilidade solidária do Diretório Nacional em relação às obrigações assumidas pelo Diretório Estadual. A situação assemelha-se à do grupo econômico, que se caracteriza quando há controle de uma empresa sobre as demais, numa relação vertical ou de hierarquia, ou ainda entre empresas que possuem apenas uma relação de coordenação horizontal. Não resta a menor dúvida de que trabalham ambos, Diretório Nacional e Estadual, em prol do Partido, havendo uma relação de coordenação para possibilitar uma atuação partidária mais efetiva.

Nada a reformar quanto a este item.

Do vínculo empregatício

Insurge-se contra o reconhecimento da existência de vínculo empregatício sob a alegação de que a recorrida jamais manteve qualquer vínculo empregatício seja com o recorrente ou com o Diretório Estadual do Partido.

Alegou a reclamante na inicial que foi admitida em 02.01.1997 pelo diretório regional estadual do Partido Progressista Brasileiro, hoje Partido Progressista, para exercer a função de gerente administrativo. Disse que em 12.04.1999 foi dada baixa no contrato de trabalho, embora tenha permanecido, de forma clandestina, a prestar serviços nas mesmas condições anteriores, sem qualquer solução de continuidade.

Defendendo-se, nega o 1º reclamado a prestação de serviços após o desligamento no ano de 1999 (fls. 81).

A testemunha trazida pela reclamante, Sr. Rinaldo da Silva Valença, declarou:

“Que confirma seu depoimento firmado na ata do processo 1668/08-3, da 3ª VT do Recife; que os fatos relacionados ao depoente mencionados naquela ata também ocorreram com a Reclamante, isto é, que a Reclamante também trabalhou para o Diretório Estadual desde 1997 até depois das eleições de 2008, por volta do mês de outubro/2008, sendo que desde junho de 2008 que o Diretório ficou sem pagar os salários do pessoal,

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incluindo o depoente e a Reclamante; (...) que a Reclamante ausentou-se alguns dias em fevereiro de 2008 para tirar os nódulos da mama; que novamente se submeteu a outra cirurgia em maio de 2008 para retirada da mama; que nesse período, o Diretório pagou os salários da Reclamante, mas a Reclamante estava clandestina e, por isso, ela e a família dela tiveram que arcar com as despesas dessas cirurgias; que a Reclamante de vez em quando, viajava para Brasília para as Convenções do Diretório Nacional; que o Diretório Nacional enviava recursos do Fundo Partidário mensalmente para o Diretório Estadual e esse prestava contas anualmente; que a Reclamante era Gerente Administrativa, fazendo todos os serviços na Reclamada; que o depoente teve a baixa em sua CTPS em 2000 e também continuou clandestino, que a Reclamada não justificou esse ato; que a maioria dos funcionários tiveram a baixa em suas CTPSs nessas épocas, inclusive a Reclamante teve em 1999, mas todos continuaram trabalhando de forma clandestina nos mesmos serviços; (...) que a Reclamante ia para Brasília a pedido de algum deputado federal do Partido ou para alguma Convenção; que o Diretório Nacional pagava as passagens” (fls. 153/154).

Como se vê, diferentemente do que alega o recorrente, a testemunha apresentada pela recorrida, de modo firme e convincente, comprova a prestação de serviços de forma clandestina após a baixa indevida procedida na CTPS em 12.04.1999 (fl. 20). Prestação que se deu nos mesmos moldes anteriores, ou seja, com todos os elementos do art. 3º da CLT. Reforçam tal conclusão os cheques de fls. 42/43 e as correspondências de fls. 27/41.

Mantenho o decisum também nesse aspecto.

Da prescrição

Renova a arguição de prescrição quinquenal, alegando que se encontram prescritos os direitos postulados exigíveis até janeiro de 2005. Diz também que a reclamante foi dispensada em 12.04.1999, há mais de dez anos, estando precluso seu direito de ajuizar reclamação

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trabalhista.Carece o recorrente de interesse recursal quanto à

prescrição quinquenal, já acolhida pelo juízo de primeiro grau fl. 183. Quanto à prescrição total bienal, mantido o reconhecimento do vínculo empregatício até janeiro de 2009, não há que se cogitar em prescrição total do direito de ação.

Nada a deferir.

Da indenização por danos moral e material

Requereu a reclamante, em aditamento à inicial, a condenação dos reclamados no pagamento de indenização por danos moral e material. Alegou que em fevereiro de 2008 foi acometida de câncer de mama e como era empregada clandestina deixou de ser encaminhada ao INSS deixando de receber o auxílio-doença, bem como o tratamento especial e o direito de se aposentar. Disse que sofreu prejuízo de ordem moral em razão do desamparo a que foi submetida pelo ex-empregador, chegando a sofrer processo depressivo. Afirmou que, igualmente, sofreu prejuízo de ordem material, pois arcou com todos os custos do tratamento (fl. 73/74).

Afastou o juízo de origem o pedido de indenização por dano moral, haja vista que “a enfermidade da autora não teve qualquer nexo de causalidade com a função exercida, não havendo como compelir a reclamada ao pagamento de uma indenização por danos morais à autora por conta disso” (fl. 187), carecendo o recorrente de interesse recursal no particular.

Deferiu, contudo, a indenização por danos materiais sob o argumento de que “Houve, de fato, um constrangimento à autora quando se viu totalmente desamparada ao se deparar com essa enfermidade mas, sem qualquer plano de saúde ou apoio junto ao INSS, por ser clandestina na reclamada; sequer pôde a reclamante gozar do benefício previdenciário ou postular uma aposentadoria especial, porque a reclamada havia deixado a autora clandestina durante vários anos; esse fato, sim, gera à autora uma indenização por danos materiais e pelos constrangimentos que sofreu deles consequentes. Destarte, defere-se à reclamante uma indenização pelos danos materiais e consequentemente, morais, que sofreu em decorrência dos fatos acima aduzidos, ora arbitrados em R$ 20.000,00 (vinte mil reais); valor esse

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que servirá para atender, pelo menos em parte, os anseios da autora e não levar as reclamadas à insolvência.” (fl. 187).

À primeira vista parece haver contradição no julgado de 1º grau. É que indeferiu o pedido de indenização por dano moral por ausente a existência de nexo de causalidade entre a enfermidade que acometeu a reclamante e as funções por ela desempenhadas. Depois, deferiu “indenização por danos materiais e consequentemente morais” tendo em vista que sendo “clandestina na reclamada; sequer pôde a reclamante gozar do benefício previdenciário ou postular uma aposentadoria especial”. Os fundamentos, contudo, são pertinentes ao dano moral e não material.

Pois bem.Como já salientou o juízo a quo, a reclamante foi acometida

de doença que não possui qualquer relação com a sua atividade laboral, sendo indevido o pleito de indenização por dano moral sob esse ponto de vista.

No que pertine à indenização por danos materiais, o fato de ter sido a demandante mantida na clandestinidade por dez anos não constituiria óbice ao tratamento pelo SUS, haja vista que desde a promulgação da nova Constituição a assistência médica oficial foi universalizada, atendendo indistintamente trabalhadores contribuintes da previdência oficial ou pessoas a ela não vinculadas. Assim, o fato de a reclamante ter custeado o tratamento médico na rede particular de hospitais não decorre da sua condição de empregada clandestina. Portanto, o reclamado não pode ser responsabilizado pelo fato de a reclamante, não possuindo plano de saúde (o que não decorre da clandestinidade do serviço), ter custeado o seu tratamento particular.

Por outro lado, a testemunha da reclamante afirmou que os salários do período de afastamento da autora para o seu tratamento de saúde foram pagos pelo reclamado (fl. 153). Sendo assim, a autora não teve prejuízo financeiro em decorrência do seu afastamento do serviço, uma vez que o empregador arcou com o pagamento do salário mesmo sem a prestação dos serviços, assumindo o papel que, no caso de empregado registrado, seria do INSS.

No que diz respeito à obtenção de aposentadoria especial, deve ser ressaltado que o reconhecimento da existência de tempo de serviço clandestino acarretará o recolhimento das contribuições previdenciárias relativas ao período, viabilizando a obtenção da

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aposentadoria especial, caso verificadas as condições para tanto.De todo o expendido, resulta indevida, a meu ver, a

indenização por danos materiais.Devida, contudo, a indenização por dano moral. Inequívoco

o sofrimento a que foi submetida a recorrida em decorrência das inseguranças geradas com a irregularidade do seu contrato de trabalho, considerando o seu estado de saúde. Mesmo que tenha ela optado pelo tratamento particular, não há dúvida quanto à preocupação com a falta de amparo previdenciário.

Desse modo, ainda que não reconheça o direito à indenização por danos materiais, entendo ser devida a indenização por dano moral. Afastada a indenização por danos materiais, reduzo o valor da indenização ao importe de R$ 10.000,00 (dez mil reais), quantia que considero razoável.

A condenação do recorrente decorre da sua responsabilização subsidiária pelos títulos da condenação.

Isto posto, dou provimento parcial ao recurso do reclamado para excluir da condenação a indenização por danos materiais, arbitrando em R$ 10.000,00 o valor da indenização por dano moral.

Recurso Ordinário do Reclamante

Das horas extras

Busca, inicialmente, a ampliação da condenação no pagamento de horas extras, a serem calculadas com base na jornada descrita na exordial, haja vista que, no particular, a contestação foi apresentada de forma genérica, eis que limitada à negativa da relação de emprego, aplicando-se à hipótese o disposto no art. 302 do CPC.

Disse a autora na inicial que nos períodos eleitorais (de junho até a véspera da eleição de cada ano eleitoral) ela trabalhava das 08h até 01h/02h do dia seguinte, de segunda a domingo, inclusive feriados, com 30 minutos de intervalo.

A contestação centrou-se na negativa do vínculo empregatício, não apresentando contestação específica quanto à jornada de trabalho declinada na exordial (fl. 87).

A testemunha apresentada pela demandante disse que a

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reclamante cumpria a mesma jornada de trabalho por ele informada em seu depoimento como autor do processo utilizado como prova emprestada, textualmente: “que nos anos em que havia eleição, desde o mês de junho até a véspera da eleição, o horário era das 08:00h à 00:00/01:00h, com 30 minutos de intervalo e 01 folga por semana” (fl. 155).

Deferiu o juízo de origem 56 horas extras semanais no período eleitoral, nelas já computadas as horas extras decorrentes da concessão parcial do intervalo e a redução da hora noturna.

O que resulta dos elementos coligidos aos autos (falta de contestação específica quanto às horas extras e depoimento da testemunha apresentada pela própria reclamante) é uma jornada média, no período eleitoral, das 08h às 24h30, com meia hora de intervalo e uma folga semanal. Nessa jornada se constata a prestação de 8 horas extras diárias (isso sem considerar a redução das horas trabalhadas das 22h às 24h30), de segunda a sexta-feira, e mais uma hora extra de intervalo, sendo que no sábado havia mais quatro horas extras, totalizando na semana 52 horas extras (a observar ainda a redução da hora noturna) e mais 6 horas do intervalo intrajornada, o que perfaz um total de mais de 58 horas extras semanais, computando-se a redução da hora noturna, superior ao fixado na sentença (56 horas extras semanais).

Assim, provejo o recurso nesta parte para determinar que as horas extras, horas de intervalo e adicional noturno sejam apurados com base na jornada média das 08h às 24h30, com 30 minutos de intervalo e uma folga semanal, isso apenas nos períodos eleitorais imprescritos, ou seja, de junho até a véspera das eleições de 2004 e 2006.

Da aplicação ex-officio da prescrição

Insurge-se contra a aplicação, de ofício, da prescrição quinquenal. Alega incompatibilidade do disposto no § 5º do art. 219 do CPC com o processo trabalhista.

Qualquer razão lhe assiste.Ao contrário do que alega a recorrente, houve, sim, arguição

de prescrição, tanto a bienal total quanto a parcial quinquenal (fls. 80

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e 96), não havendo que se cogitar em aplicação de ofício da prescrição.

Do reajuste dos salários

Pretende o acréscimo à condenação do reajuste do salário com base no INPC. Diz que a remuneração percebida nunca sofreu qualquer reajuste, havendo perda de compra do salário.

O pedido foi julgado inepto pelo juízo de 1º grau “visto que não há fundamentação legal a tal pretensão, nem tampouco, foi colacionada Norma Coletiva indicando essa majoração salarial perseguida; de forma que prevalece como verba salarial o valor invariável de R$2.000,00 mensais, conforme aduzido na inicial” (fl. 186).

Com efeito, não indica a reclamante qual o fundamento legal para pleitear o reajuste do salário com base no INPC. Não serve de embasamento ao pleito a simples alegação de que este é o índice utilizado nas negociações coletivas levadas a efeito entre sindicatos de empregados e empregadores. A se exigir do empregador a aplicação de reajuste salarial teria que ser indicada a existência de norma legal ou convencional nesse sentido, mas nada foi apontado.

Confirmo a sentença.Isto posto, dou provimento parcial ao recurso da reclamante

para determinar que as horas extras, horas de intervalo e adicional noturno sejam apurados com base na jornada média das 08h às 24h30, com 30 minutos de intervalo e uma folga semanal, isso apenas nos períodos eleitorais imprescritos, ou seja, de junho até a véspera das eleições de 2004 e 2006.

Conclusão

Diante do exposto, rejeito a preliminar arguida pela reclamante de não conhecimento do recurso do reclamado por deserção; ainda preliminarmente, suscito o não conhecimento das contrarrazões apresentadas pelo segundo reclamado por intempestividade. No mérito, dou provimento parcial ao recurso do reclamado para excluir da condenação a indenização por danos materiais, arbitrando em R$ 10.000,00 o valor da indenização por dano moral; e dou provimento parcial ao recurso da reclamante para

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determinar que as horas extras, horas de intervalo e adicional noturno sejam apurados com base na jornada média das 08h às 24h30, com 30 minutos de intervalo e uma folga semanal, isso apenas nos períodos eleitorais imprescritos, ou seja, de junho até a véspera das eleições de 2004 e 2006. Considerando o provimento parcial de ambos os recursos, deixo de arbitrar novo valor à condenação.

ACORDAM os Juízes da Terceira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida pela reclamante de não conhecimento do recurso do reclamado por deserção; ainda preliminarmente, não conhecer das contrarrazões apresentadas pelo segundo reclamado por intempestividade. No mérito, por igual votação, dar provimento parcial ao recurso do reclamado para excluir da condenação a indenização por danos materiais, arbitrando em R$ 10.000,00 o valor da indenização por dano moral; e dar provimento parcial ao recurso da reclamante para determinar que as horas extras, horas de intervalo e adicional noturno sejam apurados com base na jornada média das 08h às 24h30, com 30 minutos de intervalo e uma folga semanal, isso apenas nos períodos eleitorais imprescritos, ou seja, de junho até a véspera das eleições de 2004 e 2006. Considerando o provimento parcial de ambos os recursos, deixa-se de arbitrar novo valor à condenação.

Recife, 14 de abril de 2010.

VIRGÍNIA MALTA CANAVARRODesembargadora Relatora

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Revista TRT 6 • SÚMULAS

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SúmulasSÚMULA Nº 01 SUCESSÃO TRABALHISTA - ALIENAÇÕES DE ESTABELECIMENTOS BANCÁRIOS DECORRENTES DA EXECUÇÃO DO PROER - PROGRAMA DE APOIO À REESTRUTURAÇÃO E AO FORTALECIMENTO DO SISTEMA FINANCEIRO - CARACTERIZAÇÃO (REQUISITOS)Nas alienações de estabelecimentos bancários decorrentes da execução do PROER - Programa de Apoio à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema financeiro, caracteriza-se sucessão trabalhista (artigos 10 e 448 da Consolidação das Leis do Trabalho) mesmo nas hipóteses em que o bancário não tenha prestado trabalho ao sucessor, sendo, outrossim, irrelevante a tal configuração o fato de a instituição sucedida não ter sido extinta, ou seja, de estar submetida a regime de liquidação extrajudicial. RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA TRT 08/2000 - 3ª PUBL. DOE-PE: 22/07/2000

SÚMULA Nº 02BANCÁRIO - CONTRATAÇÃO DE HORAS EX TRAS À DATA DA ADMISSÃO - EXEGESE DOS ARTIGOS 224 E 225 DA CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO A contratação do serviço suplementar, quando da admissão do trabalhador bancário, é nula. Os valores assim ajustados apenas remuneram a jornada normal, sendo devidas as horas extras com o adicional de, no mínimo, 50% (cinqüenta por cento). RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA TRT 08/2000 - 3ª PUBL. DOE-PE: 22/07/2000

SÚMULA Nº 03 DIFERENÇAS DE REMUNERAÇÃO DE REPOUSOS SEMANAIS - NATUREZA JURÍDICA DA PRESTAÇÃO - MATÉRIA DISCIPLINADA PELO

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SÚMULAS • Revista TRT 6

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ARTIGO 10 DO REGULAMENTO APROVADO PELO DECRETO Nº 27.048, de 12 DE AGOSTO DE 1949 As diferenças de remuneração de repousos semanais, decorrentes de horas extras, implicam o direito à complementação do pagamento de aviso prévio indenizado, férias, gratificação natalina e depósitos de fundo de garantia do tempo de serviço - FGTS, em razão da natureza salarial definida pelo artigo 10, caput, do regulamento aprovado pelo Decreto nº 27.048, de 12 de agosto de 1949”. RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA TRT 08/2000 - 3ª PUBL. DOE-PE: 22/07/2000.

SÚMULA Nº 04 JUROS DE MORA - DEPÓSITO EM GARANTIA DO JUÍZO - EXEGESE DO ARTIGO 39, § 1º, DA LEI 8.177/91 - RESPONSABILIDADE DA PARTE EXECUTADA Independentemente da existência de depósito em conta, à ordem do Juízo, para efeito de garantia, de modo a possibilitar o ingresso de embargos à execução e a praticar atos processuais subseqüentes, os juros de mora - que são de responsabilidade da parte executada - devem ser calculados até a data da efetiva disponibilidade do crédito ao exeqüente. RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA TRT 04/2001 - 3ª PUBL. DOE-PE: 22/06/2001

SÚMULA Nº 05(Cancelada pela RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA TRT - 003/2003 DOE/PE: 25.02.03) CUSTAS PROCESSUAIS – PAGAMENTO – IMPOSIÇÃO À PARTE VENCIDA EM JULGAMENTO DE AÇÃO DE EMBARGOS DE TERCEIRO – IMPOSSIBILIDADE Tratando-se de espécie de tributo cuja exigência depende de previsão legal, e havendo os artigos 702, inciso I, alínea “g”, e 789, § 2º, da Consolidação das Leis do Trabalho sido revogados pela Emenda Constitucional nº 1 de 1969 – conforme proclamado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 116.208-2, de que foi relator o Eminente Ministro Moreira Alves -, não há possibilidade de o magistrado trabalhista, em julgamento de ação de embargos de terceiro, condenar a parte vencida ao pagamento de custas processuais. RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA TRT 19/2001 - 3ª PUBL. DOE-PE: 22/12/2001

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SÚMULA Nº 06FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO – FGTS – PRESCRIÇÃODurante a vigência do contrato de trabalho e até dois anos após a sua extinção, é trintenária a prescrição do direito de reclamar a efetivação dos depósitos do FGTS, relativamente às parcelas de natureza salarial percebidas pelo empregado. RESOL. ADMINISTRATIVA TRT - 004/2003 (DOE/PE de 13,14 e 15.03.2003)

SÚMULA Nº 07 GRATIFICAÇÃO DE FUNÇÃO – INTEGRAÇÃO NA BASE DE CÁLCULO DAS HORAS EXTRASEm consonância com o disposto no artigo 457 da CLT, a gratificação percebida habitualmente em razão do exercício de função tem natureza salarial e, por conseqüência, integra a base de cálculo das horas extras prestadas. RESOL. ADMINISTRATIVA TRT - 004/2003 (DOE/PE de 13,14 e 15.03.2003)

SÚMULA Nº 08 GRATIFICAÇÃO SEMESTRAL – QUITAÇÃO EM PARCELAS MENSAISInclusão na base de cálculo para remuneração das horas extras. A parcela denominada gratificação semestral, quando paga mensalmente, possui natureza salarial, consoante diretriz traçada no artigo 457, § 1º da CLT, integrando a base de cálculo das horas extras. RESOL. ADMINISTRATIVA TRT - 004/2003 (DOE/PE de 13,14 e 15.03.2003)

SÚMULA Nº 09 TAXA ASSISTENCIAL – EMPREGADOS NÃO SINDICALIZADOS – INEXIGIBILIDADE É nula, por afrontar o princípio da liberdade sindical, a cláusula de instrumento normativo que obriga empregados não sindicalizados ao pagamento da taxa assistencial. RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA TRT nº 14/2005 Publ. DOE/PE: 31.08.2005 página 33

SÚMULA Nº 10 MANDADO DE SEGURANÇA – DE TERMINAÇÃO JUDICIAL DE BLOQUEIO DE CRÉDITOMesmo que se processe em execução provisória, o ato judicial que

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determina o bloqueio de crédito não fere direito líquido e certo do devedor, considerando-se o disposto nos artigos 889 e 882 da CLT, bem como a ordem de gradação estabelecida pelo artigo 655 do CPC, e, ainda, o disposto no artigo 588, caput, inciso II e § 2º do CPC, acrescidos pela Lei nº 10.444/2002, superveniente à edição da Orientação Jurisprudencial nº 62 da SDI-II do TST. RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA TRT nº 14/2005 Publ. DOE/PE: 31.08.2005 página 33

SÚMULA Nº 11 AÇÃO ANULATÓRIA – LEGITIMAÇÃO ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO – COMPETÊNCIA FUNCIONAL Em consonância com o disposto no artigo 83, IV, da Lei Complementar nº 75/93, o Ministério Público do Trabalho está legitimado para ajuizar ação anulatória envolvendo previsão contida em contrato de trabalho, convenção ou acordo coletivo.2. É da competência originária do Tribunal Regional do Trabalho o julgamento de ação anulatória ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho, com o objetivo de desconstituir cláusula resultante de negociação coletiva, desde que as bases territoriais dos sindicatos convenentes ou acordantes não extrapolem a sua circunscrição. RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA TRT nº 15/2005 Publ. DOE/PE: 31.08.2005 página 33

SÚMULA Nº 12CONTRATO DE EMPREGO. ILICITUDE DO OBJETO. TRABALHO VINCULADO AO JOGO DO BICHO. CONTRAVENÇÃO PENAL. NULIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE DECLARAÇÃO COM EFEITOS RETROATIVOSConfigurados os requisitos do contrato de emprego, hão de ser assegurados ao trabalhador os direitos constitucionais por força dos princípios da dignidade humana, da irretroatividade da declaração das nulidades no âmbito do Direito do Trabalho e da primazia da realidade por tratar-se, o jogo do bicho, de atividade socialmente arraigada e tolerada pelo Poder Público.RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA TRT 17/2008 - 3ª PUBL. DOE/PE: 28/01/2009

SÚMULA Nº 13EMPREGADO PÚBLICO. ESTABILIDADE FINANCEIRA. ÍNDICE DE REAJUSTE

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Ao empregado público, que adquiriu o direito à incorporação de gratificação pelo exercício de função comissionada, em razão do princípio da estabilidade financeira, assegura-se o reajuste salarial geral, mas não a vinculação aos mesmos índices e critérios de revisão aplicados à remuneração dos cargos e funções comissionados.RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA TRT 17/2009 - 3ª PUBL. DOE/PE: 28/08/2009

SÚMULA Nº 14CONTRIBUIÇÕES PREVIDENCIÁRIAS. MOMENTO DE INCIDÊNCIA DE JUROS E MULTA.A hipótese de incidência da contribuição social prevista no artigo 195, inciso I, alínea “a”, da Constituição da República Federativa do Brasil ocorre quando há o pagamento ou o crédito dos rendimentos de natureza salarial decorrentes do título judicial trabalhista, razão pela qual, a partir daí, conta-se o prazo legal para o seu recolhimento, após o que, em caso de inadimplência, computar-se-ão os acréscimos pertinentes a juros e multa mencionados na legislação ordinária aplicável a espécie.RESOLUÇÃO ADMINISTRATIVA TRT 25/2009 - 3ª PUBL. DOE/PE: 02/10/2009

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Sentenças

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Revista TRT 6 • SENTENÇAS

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PODER JUDICIÁRIO DA UNIÃOJUSTIÇA DO TRABALHOTRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 6ª REGIÃO9ª VARA DO TRABALHO DO RECIFE-PE

Processo nº 0000455-96.2010.5.06.0009

C O M PA N H I A P E R N A M B U C A N A D E S A N E A M E N T O – COMPESAConsignante

JOSIAS CAVALCANTI AMORIMConsignado

SENTENÇA

VISTOS, ETC... I – Ação de consignação em pagamento proposta por C O M PA N H I A P E R N A M B U C A N A D E S A N E A M E N T O – COMPESA contra JOSIAS CAVAL-CANTI AMORIM, ambos qualificados nos autos, pelos fatos e fundamentos jurídicos expostos na inicial de fls. 0303/05, que veio acompanhada pelos documentos de fls. 06/38v, através da qual alegou ter admitido o consignado em 16 de junho de 1998, para exercer a função de operador de sistema I, o tendo despedido, sem justo motivo, em 22 de março de 2010, concedendo-lhe aviso prévio na modalidade indenizada. Acrescentou que o réu se recusou a firmar o termo de rescisão; a submeter-se ao exame médico demissional e a receber as verbas rescisórias, razão pela qual propôs a consignação, com o fito de adimplir as obrigações decorrentes do desate contratual e desonerar-se dos efeitos da mora. O depósito da importância consignada foi realizado em fl. 41. Frustrada a tentativa de conciliação, o consignado apresentou a resposta de fls. 44/56, instruída pelos documentos de fls. 57/70. Aduziu que foi admitido através de concurso público; que ajuizou duas ações judiciais contra a consignante; que foi despedido sem ter cometido qualquer falta funcional, depois de ter denunciado

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SENTENÇAS • Revista TRT 6

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perante o Juízo da MM 15ª Vara do Trabalho da Capital que o perito nomeado por aquele juízo para realizar perícia técnica havia realizado o laudo sem comparecer ao local de trabalho do obreiro, fato confirmado pelo operador que estava de plantão quando a perícia foi supostamente realizada; que, por causa disso, o consignado e o operador de plantão no dia em que teria sido realizada a suposta perícia foram demitidos; que o sindicato conseguiu reverter a demissão do operador, mas não a do réu; que foi justa a sua recusa em aceitar a demissão arbitrária; e que goza de estabilidade no emprego. Requereu o benefício da gratuidade da justiça e pugnou pela improcedência da consignação. Apresentou ainda, o trabalhador, reconvenção em fls. 71/83, que é cópia idêntica da contestação, exceção feita aos pedidos que deduziu. Colacionou ainda os documentos de fls. 84/88. A reconvinte contestou às fls. 102/108. Negou que houvesse demitido o obreiro por causa das ações que ajuizou e da denúncia que noticiou na defesa à consignação e na reconvenção. Disse que exerceu direito potestativo de demitir seu empregado, sem motivação de qualquer tipo. Invocou a proteção da Súmula 390 do TST e pediu a improcedência da reconvenção. À alçada foi atribuído o valor de R$ 3.816,39. Na data designada para prosseguimento da audiência, dispensei os depoimentos pessoais das partes e a produção de provas, com a anuência dos litigantes, deferi a juntada posterior de uma carta de preposição e encerrei a instrução. Os litigantes aduziram razões finais e não conciliaram. É O RELATÓRIO.

II – Defiro ao consignado reconvinte o benefício da gratuidade da justiça, com fundamento no art. 790, § 3º da CLT. Da solução de três questões depende o julgamento desta ação. A primeira é responder se o empregado público é detentor de estabilidade no emprego. A segunda é definir se as empresas públicas e sociedades de economia mista integram a Administração Indireta e, em caso de resposta positiva, se os seus dirigentes ou órgãos colegiados podem praticar atos desprovidos de motivação. E a terceira consiste em debater sobre a conveniência de se emprestar eficácia ao novel princípio da indenidade, como forma de proteção da dignidade do

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trabalhador e, principalmente, de consagrar a dignidade constitucional do princípio do livre acesso ao judiciário. Os três temas serão apreciados na ordem em que foram apresentados. A resposta à primeira indagação é negativa. Não, os empregados públicos não gozam de estabilidade no emprego, somente reservada pela Constituição aos servidores públicos, stricto sensu, depois de cumprido o estágio probatório, na disciplina do caput do art. 40 da CRFB. Na mesma linha, o item II da Súmula 390 do TST:

“Ao empregado de empresa pública ou de sociedade de economia mista, ainda que admitido mediante aprovação em concurso público, não é garantida a estabilidade prevista no art. 41 da CF/1988”.

E é normal que seja assim porque, imperando na administração o princípio da legalidade estrita, somente é permitido ao administrador praticar os atos expressamente autorizados pela lei, não se podendo emprestar interpretação extensiva ao caput do art. 41, da CRFB, que tem redação extremamente precisa e restritiva:

“São estáveis após três anos de efetivo exercício, os servidores nomeados para cargos de provimento efetivo em virtude de concurso público”.

Passemos ao exame da segunda indagação: as empresas públicas e as sociedade de economia mista integram a Administração Pública e, em caso de resposta positiva, podem os administradores e órgão colegiados, praticarem atos que não sejam fundamentados? A resposta ao primeiro questionamento é positiva e ao segundo é totalmente negativa. A organização da Administração Pública Federal Indireta esta disposta no art. 4º, II do Decreto Lei 200, de 25 de fevereiro de 1967:

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“Art. 4° A Administração Federal compreende:I - A Administração Direta, que se constitui dos serviços integrados na estrutura administrativa da Presidência da República e dos Ministérios.II - A Administração Indireta, que compreende as seguintes categorias de entidades, dotadas de personalidade jurídica própria:a) Autarquias;b) Emprêsas Públicas;c) Sociedades de Economia Mista.d) fundações públicas. (Incluído pela Lei nº 7.596, de 1987)”.

Não há dúvida de que a COMPESA integra a Administração Indireta do Estado de Pernambuco, na condição de sociedade de economia mista, instituída pela Lei Estadual nº 6.307, de 29 de julho de 1971. Logo, os atos dos seus dirigentes estão submetidos aos requisitos de validade dos atos administrativos.

A acionada confirmou a alegação autoral, invocando o amparo do inciso II, do § 1º, do art. 173 da Carta Política.

É de todo impertinente a defesa. Com a devida vênia dos respeitáveis entendimentos em

sentido contrário, a regra constitucional mencionada tem dupla função: (i) definir o regime jurídico das relações de trabalho do quadro de pessoal das empresas públicas, sociedades de economia mista e de suas subsidiárias, (ii) e garantir que concorram, na atividade econômica, quando for o caso, em igualdade de condições com as empresas privadas, de forma a anular qualquer tipo de privilégio concorrencial.

Não há qualquer dúvida de que os atos praticados pelos agentes da administração em geral, seja a direta, seja a indireta, não prescindem de motivação.

A propósito do assunto, pontifica o administrativista Hely Meirelles:

“A motivação dos atos administrativos vem se impondo dia a dia, como uma exigência do Direito Público e da

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legalidade governamental. Do Estado absolutista, em que prepondera a vontade pessoal do monarca com força de lei –‘quod principi placuit legis hebet vigorem’-, evoluímos para o Estado de Direito, onde só impera a vontade das normas jurídicas.(...)No Direito Público, o que há de menos relevante é a vontade do administrador. Seus desejos, suas ambições, seus programas, seus atos, não têm eficácia administrativa, nem validade jurídica, se não estiverem alicerçados no Direito e na Lei. Não é a chancela da autoridade que valida o ato e o torna respeitável e obrigatório. È a legalidade a pedra de toque de todo ato administrativo.Ora, se ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei, claro está que todo ato do Poder Público deve trazer consigo a demonstração de sua base legal.(...)Nesse sentido é a lição dos modernos publicistas, a começar por Bielsa, neste passo: ‘Por princípio, as decisões administrativas devem ser motivadas formalmente, vale dizer que a parte dispositiva deve vir precedida de uma explicação ou exposição dos fundamentos de fato (motivos-pressupostos) e de direito (motivos-determinantes da lei)’. E, rematando, o mesmo jurista reafirma: ‘No Direito Administrativo a motivação –como dissemos- deverá constituir norma, não só por razões de boa administração, como porque toda autoridade ou Poder em um sistema de governo representativo deve explicar legalmente, ou juridicamente, suas decisões.O excelente Jèze já acentuava, de há muito, que, ‘para se ter a certeza de que os agentes públicos exercem a sua função movidos apenas por motivos de interesse público da esfera de sua competência, leis e regulamentos recentes multiplicam os casos em que os funcionários, ao executarem um ato jurídico, devem expor expressamente

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os motivos que o determinaram. É a obrigação de motivar. O simples fato de não haver o agente público exposto os motivos do seu ato bastará para torná-lo irregular; o ato não motivado, quando o devia ser, presume-se não ter sido executado com toda a ponderação desejável, nem ter tido em vista um interesse público da esfera de sua competência funcional.Entre nós, Bilac Pinto, invocando a mesma passagem de Jèze, expõe que ‘o princípio da motivação dos atos administrativos constitui moderna tendência do Direito Administrativo dos países democráticos.(...)A motivação, portanto, deve apontar a causa e os elementos determinantes da prática do ato administrativo, bem como o dispositivo legal em que se funda. Esses motivos afetam de tal maneira a eficácia do ato que sobre eles se edificou a denominada teoria dos motivos determinantes, delineada pelas decisões do Conselho de Estado da França e sistematizada por Jèze”.(In Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Malheiros, 22ª ed., págs. 182/183, sem os sublinhados)

Da mesma forma, o festejado Celso Antônio Bandeira de Mello:

“Deve-se também considerar, também, como postulado pelo princípio da legalidade o princípio da motivação, isto é, o que impõe à Administração Pública o dever de expor as razões de direito e de fato pelas quais tomou a providência adotada. Cumpre-lhe fundamentar o ato que haja praticado, justificando as razões que lhe serviram de apoio para expedi-lo.Isto porque, sobretudo quando dispõe de certa liberdade (discricionariedade administrativa) para praticar o ato tal ou qual, não haveria como saber-se se o comportamento que tomou atendeu ou não ao princípio da legalidade, se foi deferente com a finalidade normativa, se obedeceu

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à razoabilidade e à proporcionalidade, a menos que enuncie as razões em que se embasou para agir como agiu”.

E ainda:

“Dito princípio implica para a Administração o dever de justificar seus atos, apontando-lhes os fundamentos de direito e de fato, assim como a correlação lógica entre os eventos e situações que deu por existentes e a providência tomada, nos casos em que este último aclaramento seja necessário para aferir-se a consonância da conduta administrativa com a lei que lhe serviu de arrimo.

(...)O fundamento constitucional da obrigação de motivar –como se esclarece em seguida- implícito tanto no art. 1º, inciso II, que indica a cidadania como um dos fundamentos da República, quanto no parágrafo único deste preceptivo, segundo o qual todo o poder emana do povo, como ainda no art. 5º, XXXV, que assegura o direito à apreciação judicial, nos casos de ameaça ou lesão a direito. È que o princípio da motivação é reclamado, quer como afirmação do direito político dos cidadãos ao esclarecimento do ‘porque’ das ações de quem gere negócios que lhes dizem respeito por serem titulares últimos do poder, quer como direito individual a não se assujeitarem a decisões arbitrárias, pois só têm que se conformar às que forem ajustadas às leis.

(...)Assim, atos administrativos praticados sem a tempestiva e suficiente motivação são ilegítimos e invalidáveis pelo Poder Judiciário toda vez que sua fundamentação tardia, apresentada apenas depois de impugnados em Juízo, não possa oferecer segurança e certeza de que os motivos aduzidos efetivamente existiam ou foram aqueles que embasaram a providência contestada”,

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(In Curso de Direito Administrativo, Ed. Malheiros, 4ª ed., págs. 28 e 57/58, sem os sublinhados)

E ainda o didático texto de autoria de Andréa Kugler Batista Ribeiro:

“1. DO CONCEITO DE ATO ADMINISTRATIVO

Com o escopo de servir como sustentáculo a posterior argumentação, faz-se necessário tecer, brevemente, alguns comentários acerca de ato administrativo, da sua classificação quanto à margem de escolha do administrador, bem como, estabelecer a diferenciação entre motivo e motivação.Assim, traz-se à cola, inicialmente, um breve conceito de ato administrativo, como sendo o ato jurídico decorrente do exercício da função administrativa, sob um regime de direito público ou, como prefere Marçal Justen Filho (JUSTEN FILHO, Marçal, 2005, p.185), “é uma manifestação de vontade funcional apta a gerar efeitos jurídicos, produzida no exercício de função administrativa”.

2. ATO VINCULADO E ATO DISCRICIONÁRIO

Ultrapassada a noção preliminar de ato administrativo, é pertinente mencionar que ele possui inúmeras classificações, que muitas vezes diferem de acordo com o posicionamento dos doutrinadores.Uma das classificações é quanto a liberdade da Administração na prática do ato (ou seja, quanto à margem de escolha do administrador); segundo a qual os atos administrativos podem ser discricionários ou vinculados.Contudo, cumpre mencionar que há uma parcela da doutrina pátria que desconsidera a existência de atos

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discricionários, sob égide do argumento de que nenhum ato pode ser assim considerado em sua íntegra.Todavia, a maioria doutrinária leva em consideração a classificação em pauta.Assim sendo, ato discricionário é aquele que a Administração pratica com certa margem de liberdade de decisão, visto que o legislador, não podendo prever de ante-mão qual o melhor caminho a ser tomado, confere ao administrador a possibilidade de escolha , dentro da lei.É pertinente salientar, no entanto, que não se confunde margem de escolha com liberdade absoluta, pois o ato discricionário deve sempre respeitar os limites legais e, segundo aduz Odete Medauar (MEDAUAR, Odete, 2003, p. 162) “o próprio conteúdo tem de ser consentido pelas normas do ordenamento; a autoridade deve ter competência para editar; o fim deve ser o interesse público”. Portanto, o administrador não possui total liberdade, estando sempre balizado pelas imposições legislativas.

Em outro diapasão, ato vinculado é aquele em que a Administração não possui qualquer margem de liberdade de decisão, visto que o legislador pré-definiu a única conduta possível do administrador diante da situação, sem deixar-lhe margem de escolha.Após a noção geral acerca de ato discricionário e ato vinculado, é pertinente tecer um panorama geral acerca de um dos elementos (ou requisitos) do ato administrativo, qual seja, o motivo.

3 . M O T I V O E M O T I V A Ç Ã O D O A T O ADMINISTRATIVO

Neste sentido, faz-se necessário mencionar que o motivo caracteriza-se como as razões de fato e de direito que autorizam a prática de um ato administrativo, sendo

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externo a ele, o antecedendo e estando necessariamente presente em todos eles.Contudo, cumpre esclarecer que motivo não se confunde com motivação.A motivação feita pela autoridade administrativa afigura-se como uma exposição dos motivos, a justificação do porquê daquele ato, é um requisito formalístico do ato administrativo. De acordo com Celso Antonio Bandeira de Mello (MELLO, Celso Antonio Bandeira de, 2003, p. 366-367) “é a exposição dos motivos, a fundamentação na qual são enunciados (a) a regra de direito habilitante, (b) os fatos em que o agente se estribou para decidir e, muitas vezes, obrigatoriamente, (c) a enunciação da relação de pertinência lógica entre os fatos ocorridos e o ato praticado”.

4. TEORIA DOS MOTIVOS DETERMINANTES

No esteio das diferenças estabelecidas entre motivo e motivação, surge a teoria dos motivos determinantes, segundo a qual o motivo é um requisito tão necessário à prática de um ato, que fica “umbilicalmente” ligado a ele, de modo que se for provado que o motivo é falso ou inexistente, por exemplo, é possível anular-se totalmente o ato, ou seja, os motivos se integram à validade do ato.Desta forma, uma vez enunciados os motivos pelo seu agente, mesmo que a lei não tenha estipulado a necessidade de enunciá-los, o ato somente terá validade se os motivos efetivamente ocorreram e justificam o ato.

5. DA NECESSIDADE DA MOTIVAÇÃO

Neste palco, surge a debatida discussão acerca de quando é ou não necessária a motivação de um ato administrativo.Há variados posicionamentos a respeito do assunto,

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como: o de alargar a extensão de incidência da necessidade de motivação dos atos administrativos; o da obrigatoriedade de motivação apenas quando a lei impor; o da motivação ser sempre obrigatória; e, o da necessidade de motivação depender da natureza do ato, exigindo ou não a lei.Com o escopo de sanar a discussão acerca do tema, é criada a Lei nº 9784 de 1999, estabelecendo em seu artigo 50 as situações em que os atos deverão necessariamente ser motivados:

“Art. 50. Os atos administrativos deverão ser motivados, com indicação dos fatos e dos fundamentos jurídicos, quando:I – neguem, limitem ou afetem direitos ou interesses;II – imponham ou agravem deveres, encargos ou sanções;III – decidam processos administrativos de concurso ou seleção pública;IV – dispensem ou declarem a inexigibilidade de processo licitatório;V – decidam recursos administrativos;VI – decorram de reexame de ofício;VII – deixem de aplicar jurisprudência firmada sobre a questão ou discrepem de pareceres, laudos, propostas e relatórios oficiais;VIII – importem anulação, revogação, suspensão ou conval idação de ato administrativo.”

Embora a lei disponha expressamente os casos em que deve haver motivação, acredita-se que todo o ato discricionário deve ser necessariamente motivado.No que tange ao ato vinculado, a lei já pré-definiu qual a

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única possibilidade de atuação do administrador diante do caso concreto. Assim, nas hipóteses não esculpidas na lei, em não havendo motivação, mas sendo possível se identificar qual o motivo, não há que se falar em vício, não havendo efetiva necessidade de motivação.Entretanto, no que concerne aos atos discricionários, entende-se pela sua necessária motivação, independente de designados ou não na lei; caso não motivado, estará eivado de vício, pendendo à conseqüente invalidação.Defende-se tal posicionamento pois, no ato discricionário o administrador possui uma margem de liberdade de atuação e, como não se encontra na qualidade de detentor da coisa pública, mas de mero gestor dos anseios da coletividade, deve explicação à população como um todo, fazendo valer o princípio da publicidade sempre que houver qualquer margem de liberdade na tomada de decisões. Afinal, o fato de vivermos em um Estado Democrático de Direito confere ao cidadão o direito de saber os fundamentos que justificam o ato tomado pelo administrador.Ressalta-se ainda que, se todas as decisões do Poder Judiciário, bem como as decisões administrativas dos Tribunais, devem necessariamente ser fundamentadas; há de ser motivado também o ato administrativo, principalmente o discricionário.Ademais, destaca-se que a motivação deve ser sempre anterior ou concomitante a execução do ato, caso contrário, abrir-se-ia margem para a Administração, após a prática do ato imotivado e diante da conseqüente possibilidade de sua invalidação, inventar algum falso motivo para justificá-lo, alegando que este foi considerado no momento de sua prática.Diante do exposto, defende-se a necessária motivação de todo o ato discricionário, de modo a fazer valer os princípios e valores basilares da Constituição pátria, como a democracia, a moralidade, a probidade administrativa e a publicidade, entre outros”.(In http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.

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asp?id=1399, sem os sublinhados)

Resta bem claro, portanto, que a demissão imotivada do obreiro, configurou violação aos incisos I e VIII do art. 50 da Lei nº 9.784 de 29 de janeiro de 1999, primeiro por ter negado o direito do consignado ao empregado e depois, por ter configurado revogação do ato administrativo de sua nomeação para o emprego depois de submissão a certame público.

Naturalmente, não desconheço as muitas e respeitabilíssimas decisões judiciais em sentido contrário, conferindo às pessoas jurídicas integrantes da Administração Indireta a faculdade de despedir arbitrariamente seus empregados.

No entanto, sempre houve decisões no sentido inverso, do que são exemplos as que se seguem:

Processo nº TRT- RO - 1444/00Órgão Julgador: 3ª TurmaJuíza Relatora: Eneida Melo Correia de Araújo“EMENTA: Sociedade de Economia Mista - Princípios da Administração Pública - Observância - À luz do que enunciam os princípios que regem o Direito Administrativo, entre os quais se inclui o da motivação, não pode o administrador público dispensar seus servidores de forma desfundamentada. As balizas que limitam as sociedades de economia mista são as mesmas em que se orientam os Órgãos da Administração Pública Direta, tais como o respeito da legalidade, moralidade, publicidade, impessoalidade. É mister que haja uma causa de interesse público demonstrável para que o administrador dispense seus trabalhadores”.

Processo nº TRT RO-0689-2002-001-22-00-9ACÓRDÃO TRT Nº 1101/2003“ E M E N TA : E M P R E S A P Ú B L I C A – D E N Ú N C I A VAZIA DO CONTRATO DE TRABALHO – PRÁTICA ILEGAL – Integrando a empregadora a Administração

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Pública, impossibilitada resta-lhe a prática da denúncia vazia do contrato de trabalho, em virtude dos princípios impostos no art. 37 da CF/88, precisamente, os princípios da moralidade e da impessoalidade e o ingresso mediante concurso público, que reclamam, sempre, a prática de ato motivado para a dispensa. Logo, inexistindo fator justificador da despedida, correta a conclusão do comando judicial que a declarou nula, bem como determinou a reintegração do empregado”.

Concluo, portanto, pela nulidade do ato de demissão do reconvinte, porque desprovido de motivação, transformando a discricionariedade administrativa na mais pura e simples arbitrariedade. Finalmente, alcançamos a terceira e última indagação, tão importante e fundamental quanto a anterior. Em memorável conferência que ministrou no último Encontro Regional da AMATRA VI, o Ministro Augusto César Leite de Carvalho, do Tribunal Superior do Trabalho, expôs para os congressistas sua tese de doutorado sobre o princípio da indenidade que consiste, em breve síntese, na garantia de emprego para o trabalhador que ajuíza ação contra sua empregadora, como instrumento de garantia da efetividade dos direitos trabalhistas e de acesso ao Poder Judiciário, blindando o hipossuficiente contra os atos de retaliação arbitrária do poder econômico. Para melhor explicar a tese, sirvo-me de artigo doutrinário do insigne colega Eduardo Sérgio de Almeida, juiz do Trabalho da 13ª Região, pós-graduado em Filosofia e mestre em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco, doutorando pela Universidade Castilla La-Mancha em Ciudad Real (Espanha), publicado no sítio http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10095.

“I - INTRODUÇÃO

O objetivo do presente ensaio é o de demonstrar que a garantia de indenidade do trabalhador que demanda perante a Justiça do Trabalho, contra seu empregador,

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visando a corrigir uma situação que esse trabalhador entende ser violadora dos seus direitos, é perfeitamente compatível com o ordenamento jurídico brasileiro e está amparada pelos princípios de não discriminação e de dignidade da pessoa humana, além do principio de cidadania, que são fundamento e objetivo da Republica Federativa do Brasil, constantes da Constituição brasileira. O substantivo indenidade vem do adjetivo indene, que segundo o Dicionário Houaiss é aquele que não sofreu dano, que se encontra livre de prejuízo, sendo indenidade a isenção de dano. Do ponto de vista jurídico, mais particularmente do ponto de vista do Direito do Trabalho, garantia de indenidade significa que está assegurado ao trabalhador que demanda contra o seu empregador perante a Justiça que o mesmo não pode sofrer qualquer sanção ou discriminação patronal pelo exercício desse direito de ação judicial.Entre os especialistas, costuma-se afirmar que a Justiça do Trabalho brasileira é, na verdade, uma Justiça do ex-empregado, devido à circunstância de não haver, na nossa legislação, impedimento para que o empregador despeça o empregado que busca o amparo do Judiciário contra ato patronal hipoteticamente violador de direito seu. Ousamos discordar do ponto de vista estabelecido, porquanto entendemos que, no nosso ordenamento jurídico, encontram-se normas positivadas que garantem a indenidade do trabalhador, enquanto demandante contra seu empregador, uma vez que o exercício de um direito fundamental, como o direito de ação, não pode ser objeto de retaliação por parte do empregador, sem que o Estado-Juiz, quando provocado, venha em socorro do retaliado, declarando nulo o ato violador dessa garantia e penalizando o empregador que transgride uma das garantias básicas da cidadania. Para alcançar nosso objetivo, discorreremos brevemente sobre a noção de princípios e direitos fundamentais, bem como faremos um ligeiro exame da doutrina e jurisprudência espanhola a respeito do tema. Também

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examinaremos a jurisprudência brasileira a respeito do principio de não discriminação.

II - DOS PRINCÍPIOS E DIREITOSFUNDAMENTAIS

A questão dos princípios e dos direitos fundamentais tem-se constituído motivo gerador de lutas políticas e sociais de ontem e de hoje. No início da idade moderna, com as doutrinas jusnaturalistas e, posteriormente, com a inclusão nas constituições dos Estados Liberais, dos direitos e garantias fundamentais, o tema, de ordem filosófica e política foi e continua sendo fundamental para a consolidação do Estado de Direito. Aqui não nos interessa a discussão da origem histórica do tópico. A nossa preocupação é de ordem dogmática e tem em vista as disposições a respeito do assunto na Constituição brasileira, que, não obstante ser a nossa lei fundamental, contém princípios e regras que o próprio texto constitucional denomina de fundamentais, em face da importância basilar das normas que tratam da justificação da existência do Estado, isto é, das bases filosóficas que norteiam essa existência, e dos direitos e garantias do cidadão. Logo no artigo 1° da Constituição, é asseverado que a Republica Federativa do Brasil constitui-se em Estado de Direito e tem como fundamentos: I – a soberania; II – a cidadania; III – a dignidade da pessoa humana; IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; V – o pluralismo político. O art. 3° dispõe: constituem objetivos fundamentais da Republica Federativa do Brasil: I – construir uma sociedade livre, justa e solidária; II – garantir o desenvolvimento nacional; III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; IV – promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e qualquer outras formas de discriminação.Ao contrário do que ocorria antes da Segunda Guerra

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Mundial, o entendimento atual é de que esses princípios, dentre outros contidos no texto constitucional, não são simplesmente políticos, meras regras programáticas, dirigidas ao legislador futuro. Ao contrário, são normas jurídicas positivas dotadas de validez e legitimidade, conseqüentemente de aplicação obrigatória pelo Legislador, pelo Administrador e pelo Juiz nas tarefas que competem aos titulares de cada uma das três funções do Estado.Conforme assevera o Min. do STF Marco Aurélio, “em relação aos direitos e às garantias individuais, a Carta de 1988 tornou-se, desde que promulgada, auto-aplicável, cabendo aos responsáveis pela supremacia do Diploma Máximo do País buscar meios de torná-lo efetivo”.De acordo com a moderna doutrina, de origem alemã, denominada Drittwirkung, hoje amplamente aceita, inclusive no Brasil, os direitos fundamentais, reconhecidos na Constituição, têm eficácia frente a terceiros e não somente frente ao Estado. Segundo esta construção doutrinária, os direitos fundamentais não são só os direitos de liberdade frente ao poder público, senão também direitos de liberdade ou de ação exercitáveis em todos os âmbitos da vida social. No dizer de Bonavides, “direitos fundamentais que já não se circunscrevem à esfera subjetiva, confinada ao confronto indivíduo-Estado, numa relação onde se patenteia sempre a exterioridade do ente individual frente ao Estado, em antagonismo com este, isto é, em oposição ao seu poder... Como se vê, havia dantes o direito fundamental do status negativus, mas agora o que há é um direito fundamental incorporando à sua caracterização a dimensão objetiva...”

III - DIREITO DE AÇÃO COMO DIREITO FUNDAMENTAL

Entre os direitos fundamentais assegurados a todos os brasileiros e aos estrangeiros residentes no país, previstos no art. 5° da Constituição Federal, encontra-se aquele elencado no inciso XXXV, que garante a todos a apreciação,

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pelo Poder Judiciário, de lesão ou ameaça a direito. Esta regra já se encontrava consagrada no ordenamento constitucional anterior à Constituição de 1988, uma vez que a Constituição de 1967, no § 4° do art. 153, dispunha: “A lei não poderá excluir da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão de direito individual”. Comentando tal dispositivo Frederico Marques afirma: “Primeiramente, se a lei não pode subtrair da apreciação do Poder Judiciário qualquer lesão a direito individual, daí se segue que o direito de ação está consagrado como direito fundamental do indivíduo no Direito Constitucional brasileiro”.Ora, se o direito de ação, como direito subjetivo público, está consagrado como direito fundamental, toda conduta, mesmo legalmente prevista, que vise a impedir o exercício desse direito, fere um direito subjetivo concreto e, mais grave ainda, atenta contra a organização do Estado brasileiro, na medida que atinge princípios e objetivos fundamentais da nossa república, viola, portanto a Constituição.Então, tendo em vista os dispositivos constitucionais acima referidos, muito embora o direito positivo brasileiro não contenha, expressamente, qualquer norma que obstaculize o empregador de adotar represálias contra o seu empregado que lhe aciona perante a Justiça, esse impedimento pode ser deduzido do princípio constitucional de não discriminação e do princípio constitucional da dignidade da pessoa humana, pois conferir ao cidadão o amplo acesso ao Poder Judiciário, sem cercar esse direito de garantias mínimas, permitindo ao empregador dificultar ou mesmo impedir o empregado de buscar a proteção do Estado-Juiz, equivale a negar essa proteção e, por via de conseqüência, negar um direito fundamental previsto na Constituição. E não se diga que o empregado tem liberdade para pleitear reparação de possível lesão de seu direito, por parte do empregador, sendo as retaliações patronais conseqüência dessa liberdade, pois no direito, que trata de relações intersubjetivas, não interessa aquele conceito de liberdade, que é dos antigos, como autodeterminação absoluta. Nessa acepção, até um homem preso ou acorrentado

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seria livre, pois não seria possível prender ou acorrentar o seu espírito. Tal conceito, além de filosoficamente indefensável, não serve como guia de uma sociedade pluralista como as existentes nos países democráticos. Devemos ter em conta o conceito moderno de liberdade política, liberdade em sentido negativo, que vê a liberdade como não impedimento. Nas palavras de Berlin, “se pode dizer que sou livre quando nenhum homem ou grupo de homens interfere em minha atividade. Nesse aspecto a liberdade política é o espaço em que alguém pode atuar sem ser impedido por outros. Se outros me impedem de fazer algo que antes podia fazer, sou, nesta medida, menos livre. Se, porém, o impedimento vai mais além do normalmente admissível, posso dizer que estou sob coação ou até que estou sendo escravizado”. É o próprio Berlin que exemplifica duas situações em que não há liberdade, do seguinte modo: “Se em um estado totalitário traio um amigo, sob ameaça de tortura ou se atuo de determinado modo com medo de perder o emprego, posso afirmar que não agi livremente”. Mesmo que se entenda não haver aplicabilidade direta dos direitos fundamentais entre particulares, mas aplicabilidade indireta ou reflexa, que é na atualidade a doutrina prevalecente na Alemanha, haveria que ser impedida qualquer represália do empregador ao empregado que o aciona, mesmo não havendo norma específica a respeito, baseado nos deveres de proteção que tem o Estado em relação aos seus cidadãos, prevista no caput do art. 5° da Constituição Federal. Segundo Canaris, “o direito privado pode permanecer aquém da medida de proteção ordenada pela Constituição. Aqui o legislador viola, portanto, um direito fundamental e isto não na sua função de proibição de intervenção, mas sim na sua função de mandamento de tutela... . Os direitos fundamentais podem conduzir a uma complementação e correção do Direito Privado pela via do desenvolvimento judicial do direito”.

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IV - LIMITAÇÕES AO DIREITO PATRONAL DE DESPEDIR EMPREGADOS

No Brasil, vigora o direito de o empregador despedir o empregado sem motivar essa despedida, bastando que pague os valores indenizatórios previstos em lei, que não são mais do que a multa de 40% sobre o valor do Fundo de Garantia depositado em conta vinculada desse trabalhador, e a obrigação de avisar-lhe, previamente, dessa despedida, com prazo mínimo de 30 dias, ou de pagar-lhe o valor do período do pré-aviso. Diz-se que o empregador tem direito potestativo de despedir o trabalhador. Seria, entretanto, absoluto tal direito? A resposta é não. O direito brasileiro contém limites ao poder patronal de despedir trabalhador. Caso do trabalhador eleito para cargo de direção de entidade sindical ou de membro eleito como representante dos trabalhadores nas Comissões Internas de Prevenções de Acidentes (CIPA). Caso da mulher grávida, a partir da confirmação da gravidez até cinco meses após o parto. Caso do trabalhador em gozo de licença para tratamento de saúde. A lei concede estabilidade no emprego a esses trabalhadores, que só poderão ser despedidos, enquanto perdurar a situação garantidora da estabilidade, em casos excepcionais, como, por exemplo, por justa causa ou pela extinção do estabelecimento em que trabalham. Recentemente, a jurisprudência trabalhista brasileira vem entendendo que a dispensa do trabalhador portador do vírus HIV, caso se dê de forma arbitrária, afronta o caput do art. 5° da Constituição Federal, sendo, por isso, vedada pelo nosso ordenamento jurídico. Tal entendimento não se constitui, porém, em uma nova forma de estabilidade mas é, tão somente, uma maneira de evitar que o despedimento se dê de maneira discriminatória, com a violação de um direito fundamental. São inúmeras as decisões do Tribunal Superior do Trabalho − TST − nesse sentido, a exemplo do acórdão cuja ementa se transcreve a seguir:

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EMPREGADA PORTADORA DO VÍRUS HIV. DISPENSA DISCRIMINATÓRIA

A SDI-I do TST firmou posicionamento no sentido de que, ainda que não exista, no âmbito infraconstitucional, lei específica asseguradora da permanência no emprego do empregado portador do vírus HIV, a dispensa de forma arbitrária e discriminatória afronta o caput do art. 5º da CF/88.O art. 5° da Constituição Federal, logo no caput, estabelece: “Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

A despedida ou outra qualquer punição do trabalhador que recorre ao Judiciário visando assegurar um direito supostamente violado pelo seu empregador constitui também, indubitavelmente, atitude discriminatória, violadora da liberdade do trabalhador e de direito fundamental assegurado na Constituição pelo inciso XXXV do art. 5°. Tal direito não é meramente programático, como seriam aqueles que asseguram ser direito social o direito a moradia, ou o direito a um salário mínimo capaz de atender às necessidades vitais básicas do trabalhador e de sua família, pois para tornar exeqüível tal dispositivo − o que assegura amplo acesso ao Judiciário − o inciso LXXIV do art. 5° da Constituição prevê a prestação de assistência judiciária gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Como se vê, o legislador constituinte procurou tornar o acesso ao Judiciário uma garantia real. É efetiva esta garantia ao trabalhador se não se veda ao empregador adotar medidas retaliatórias contra o empregado que o demanda perante o Judiciário? Obviamente que não, pois o receio do revide patronal, que pode variar da transferência

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de função ou do lugar de prestação de serviços e da supressão de gratificação, até a despedida pura e simples, em geral é suficiente para demover o trabalhador de buscar os seus direitos, que julga violados, perante a Justiça. Se o acesso à Justiça não é assegurado efetivamente ao trabalhador, na vigência do pacto laboral, resta comprometida a principal função social do Direito do Trabalho que, segundo López “repousa em um delicado equilíbrio estrutural entre a liberdade de empresa e o poder empresarial, de um lado e a proteção e tutela do trabalho assalariado, mediante a compensação das desigualdades do contratante débil e dos grupos sociais dependentes, por outro lado”.

E DIREITO V - DIREITO ESPANHOL BRASI-LEIRO

Sobre o assunto que vimos discutindo, penso que será útil trazer a cotejo o exemplo do direito espanhol. Na Espanha, o Estatuto dos Trabalhadores prevê dois tipos de invalidade das despedidas de empregados: a despedida nula e a despedida improcedente. A primeira está prevista no art. 55 do Estatuto; quando uma despedida é declarada nula, o empregador terá que readmitir imediatamente o trabalhador, pagando-lhe os salários deixados de perceber desde a despedida até a efetiva readmissão. Na despedida declarada improcedente, prevista no art. 56 do Estatuto, o empregador poderá optar entre a readmissão do trabalhador, com o pagamento dos salários no período de afastamento do trabalho ou o pagamento de uma indenização de 45 dias de salário por cada ano de trabalho e mais a soma dos salários deixados de perceber desde a data da despedida, até a notificação da sentença que declare a improcedência ou até que o trabalhador tenha arranjado outro emprego, neste caso se a nova colocação for anterior à sentença.No direito brasileiro, não há igual distinção. Nas despedidas sem justa causa em que não haja impedimento legal ou

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contratual ao poder patronal de despedir o seu empregado, são devidas apenas as reparações legalmente previstas, que são, como já assinalado, muito poucas e francamente insuficientes para constituir-se em empecilhos para os despedimentos e para a tão criticada rotatividade de mão-de-obra, reconhecidamente causadora de nefastos efeitos sociais e econômicos. No caso das denominadas estabilidades no emprego (a de empregado eleito diretor sindical ou membro de CIPA, a da gestante, a do trabalhador em gozo de licença para tratamento de saúde), havendo despedidas, estas podem ser anuladas pelo juiz, com a conseqüente obrigatoriedade do empregador readmitir o empregado, pagando-lhe a remuneração vincenda, do momento da despedida até a data da efetiva readmissão ou, caso mais freqüente, considerando-se as circunstâncias da existência de incompatibilidade entre as partes da relação de emprego, a condenação do empregador ao pagamento de uma indenização ao empregado e a remuneração do período que mediou entre a despedida e a data da prolação da sentença.Assim sendo, sustentamos que no Brasil também deve ser garantida a indenidade do trabalhador que demanda perante a Justiça contra o seu empregador, por suposta violação de um direito, desde que tal demanda não seja artificialmente forjada com o intuito de impedir uma demissão já prevista ou anunciada com base em critérios técnicos, econômicos ou de conveniência do empresário. Nosso entendimento está embasado no direito interno brasileiro, conforme vimos argumentando e encontra respaldo ainda no Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), que tendo sido aprovado pelo Decreto Legislativo n° 226 de 12/12/1991 e promulgado pelo Decreto Legislativo N° 592 de 06/12/1992, também é direito interno. Nesse pacto, os Estados se obrigam a criar mecanismos judiciais aptos a garantir os direitos sociais, com a conseqüente reparação no caso de violação dos mesmos.Na Espanha, inexiste, igualmente, dispositivo expresso

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em norma legal que preveja a garantia de indenidade do trabalhador frente a represálias do empregador, no caso de demanda judicial proposta por aquele contra este, o que não impediu o Tribunal Constitucional de decidir, em inúmeros julgados, que o direito de acesso ao Judiciário, como direito fundamental, estaria prejudicado em sua eficácia caso o trabalhador pudesse ser penalizado pelo empregador por ter ajuizado ação contra este. Merece transcrição o trecho seguinte da Sentença do Tribunal Constitucional N° 55/2004.

“En suma, el derecho fundamental a la tutela judicial efectiva consagrado por el art. 24.1 de la Constitución Española quedaría privado en lo esencial de su eficacia si la protección que confiere no incluyera las medidas que puede llegar a adoptar un empresario como reacción represiva frente a una acción judicial ejercitada por un empleado ante los Tribunales. El temor a tales medidas podría disuadir a los trabajadores de hacer valer sus derechos y, por tanto, poner en peligro gravemente la consecución del objetivo perseguido por la consagración constitucional de la efectividad de la tutela judicial, retrayendo a los trabajadores de hacer uso de su derecho a la protección jurisdiccional ante los órganos del Poder Judicial”.

O entendimento da Corte Constitucional espanhola a respeito da matéria em discussão é pacífico na atualidade, sendo a garantia de indenidade devida não apenas ao trabalhador que já se encontra demandando contra seu empregador, senão também àquele que dá início a atos preparatórios de demanda judicial, como é o caso da sentença cujo trecho se transcreveu retro, como se lê da sua parte final, abaixo reproduzida:

“ha de concluirse que el despido del demandante de amparo se conectaba directamente con una actuación tendente a la evitación del proceso, lo que, en los términos

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antes señalados, constituye una vulneración de la garantía de indemnidad contraria al art. 24.1 CE”.

Para Álvarez Alonso, que escreveu inspiradora obra monográfica sobre o assunto, “parece evidente que o reconhecimento de um direito deve conter não só a possibilidade de exercitá-lo, senão também a tutela de quem o exercita, frente a quem poderia ver-se afetado por seu exercício, isto é, no caso do empregado que demanda contra seu empregador, direito constitucionalmente previsto, deve ser assegurada ao trabalhador a garantia de não sofrer represálias por parte do seu empregador, afetado pela demanda do trabalhador”. A dependência do trabalhador frente ao empregador, característica da relação de trabalho, não pode ser agravada com a falta de garantia do exercício do direito de ação por parte do hipossuficiente, sob pena de transformar-se a garantia constitucional de amplo acesso ao Judiciário em letra morta, ao menos em relação ao trabalhador-empregado que necessitar recorrer ao Estado-Juiz, para ter assegurado um direito hipoteticamente violado por seu empregador. Deste modo, essa garantia há que estar contida no ordenamento jurídico brasileiro, uma vez que seria incoerente a existência de uma garantia, da natureza de direito fundamental, sem a possibilidade real do seu exercício. Como afirma o Professor Luiz Roberto Barroso, “A Constituição não é apenas parâmetro de validade das normas de hierarquia inferior, senão também vetor de interpretação de todas as normas do sistema”. Voltando ao exemplo espanhol, é novamente Álvarez Alonso que nos vem em socorro quanto afirma: “A garantia de indenidade não faz mais que reafirmar algo já pressuposto nas relações jurídicas. O fazer valer as próprias posições ou interesses no lugar e momento correspondentes, inclusive em sede judicial, não comporta qualquer tipo de censura ao trabalhador,seja como sanção, ou sequer desprezo ou desconsideração”.

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Perfeitamente cabível, em face do ordenamento jurídico brasileiro, o mesmo entendimento que têm a doutrina e a jurisprudência espanholas em relação à garantia de indenidade do trabalhador frente represálias patronais pelo exercício do direito de ação.

VI - CONCLUSÕES

Dos argumentos expostos, concluímos que no ordenamento brasileiro encontram-se normas que garantem a indenidade do trabalhador frente a represálias patronais pelo exercício do direito de ação contra esse mesmo empregador, pois entendimento em sentido diverso leva à dedução de que o direito brasileiro tolera o desrespeito a vários princípios constitucionais, sobretudo o desrespeito ao princípio da não discriminação, ao princípio da igualdade, ao princípio da dignidade da pessoa humana, e tolera a violação frontal de um dos fundamentos do Estado Brasileiro, o da cidadania. Se não há efetiva garantia de acesso ao Judiciário, por parte do trabalhador empregado, consagra-se, na prática, a existência de dois tipos de cidadãos, ou melhor, consagra-se a existência de uma sobrecidadania e uma subcidadania, ferindo-se de morte a dignidade do trabalhador reduzido, neste aspecto, à condição de servo do patrão; faz-se tábula rasa do princípio republicano, que identifica a liberdade com ausência de dependência do indivíduo da vontade arbitrária de outros homens.Portanto, devem ser consideradas nulas quaisquer represálias tomadas pelo empregador contra o empregado que buscar o amparo do Judiciário, em contraposição ao seu patrão, visando a corrigir uma hipotética lesão ao seu direito, uma vez que tais atos patronais violam frontalmente os já referidos princípios constitucionais e o disposto no art. 9° da CLT, que comina nulidade de pleno direito aos atos destinados a desvirtuar, impedir ou fraudar os preceitos protetores do hipossuficiente. No caso de despedida, deve ser determinada a reintegração do empregado, com o conseqüente pagamento da remuneração do período que

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decorreu desde a data do afastamento até a reintegração, assegurando-se todos os demais direitos decorrentes do contrato de trabalho. Na construção da democracia que almejamos, como nação civilizada anelada, não podemos ter uma parcela significativa da nossa população à qual se confere certos direitos fundamentais, impossibilitada de exercê-los efetivamente por conta da vontade arbitrária de outrem. Opus iustitiae pax”.

Ora, depois de longos anos de serviço, sem qualquer mácula funcional, o vindicante e seu colega operador foram dispensados sem motivação de qualquer natureza, depois de ajuizarem reclamações contra a empregadora e denunciarem a realização de perícia em tese, uma vez que não houve comparecimento do perito ao local de trabalho dos obreiros. É mais do que justificado que se presuma que a dispensa resultou de ato de retaliação da empregadora, justificando que se garanta ao obreiro, sua indenidade, porque não pode sofrer punição por exercer direito fundamental assegurado pela Carta Magna. Tudo isso bem considerado, julgo improcedente a ação de consignação em pagamento e procedente a reconvenção, declarar nula a demissão do reconvinte e determinar a sua imediata reintegração ao emprego, independentemente do trânsito em julgado desta sentença, no prazo de um dia depois de intimada a reconvinda, sob pena de pagamento de multa de R$ 1.000,00 (um mil reais) por dia de atraso no cumprimento da obrigação de fazer, bem como a pagar os salários e vantagens pessoais, férias e gratificações natalinas devidas durante o período de afastamento e ainda a recolher o FGTS em sua conta vinculada.

Os honorários advocatícios são devidos, nos termos da Lei 5.584/70, Súmulas 219 e 329 do TST e OJ 305 da SBDI-I, por estar configurada a assistência sindical, em valor equivalente ao percentual de 15% (quinze por cento) sobre o montante bruto do crédito do reconvinte.

Liquidação por cálculos, com base na evolução salarial do reconvinte. Atualização monetária, na forma da Súmula 381 do TST.

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Juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, pro rata die, desde 7 de abril de 2010. Tudo até a data do efetivo pagamento, como disciplinado pelo art. 39 da Lei 8.177 de 1º de março de 1991 e pela Súmula 04 do TRT da 6ª Região.

Imposto de renda pelo recconvinte, sobre o montante das parcelas tributáveis do seu crédito, devendo ser recolhido pela Secretaria, tão logo ocorra o fato gerador. A obrigação de recolher a contribuição social é da reconvinda, sendo certo que ela será ressarcida pelo trabalhador, na hipótese de haver contribuição suplementar do segurado a ser recolhida.

ISTO POSTO

III – Julgo IMPROCEDENTE a ação de consignação em pagamento proposta por COMPANHIA PERNAMBUCANA DE SANEAMENTO – COMPESA contra JOSIAS CAVALCANTI AMORIM; e, no mais, julgo PROCEDENTE a reconvenção ajuizada por JOSIAS CAVALCANTI AMORIM contra COMPANHIA P E R N AM B U C A N A D E S A N E AM E N TO – CO M P E S A, p a ra condenar a reconvinda a reintegrar o reconvinte ao emprego e a pagar-lhe a pagar os salários, vantagens pessoais, férias e gratificações natalinas devidas durante o período de afastamento e ainda a recolher o FGTS em sua conta vinculada, no prazo de 48 horas depois de liquidada a presente, com acréscimo de juros moratórios e correção monetária, observados os limites estabelecidos na fundamentação. Custas processuais provisórias pela reclamada, de R$ 40,00, calculadas sobre R$ 8.000,00, valor atribuído à condenação. Determino o recolhimento da contribuição social e do imposto de renda. Intimações desnecessárias. Recife, 30 de julho de 2010.

Juiz do Trabalho Theodomiro Romeiro dos Santos

Titular da 9ª Vara do Trabalho do Recife

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PODER JUDICIÁRIO DA UNIÃOJUSTIÇA DO TRABALHOTRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 6ª REGIÃO5ª VARA DO TRABALHO DO RECIFE-PE

PROCESSO N° 00564-2008-005-06-00-7

S A I N T- G O B A I N D O B R A S I L P R O D U TO S I N D U S T R I A I S E PARA CONSTRUÇÃO LTDA.Ré

M A R I A R I T A M A R C U L I N O R E S E N D E G O N Z A G A , SE VERINA MARIA MAR CULINO, DALVANY DE GUSMÃO MARCULINO, KELDA BEATRIZ DE GUSMÃO MARCULINO, B R AY N E R D E G U S M Ã O M A R C U L I N O , S Ô N I A M A R I A M A R C U L I N O, J A N D I R A M A R G A R I D A M A R C U L I N O D E C E R Q U E I R A , M A R I A A L D E N I R M A R C U L I N O F R AT E L E S , R ITA DE FÁTIMA DOS SANTOS MAR CUL I NO e K A I QUE DOUGLAS DOS SANTOS MARCULINOAutores

SENTENÇA

VISTOS, ETC.

I – RELATÓRIO

MARIA RITA MARCULINO RESENDE GONZAGA, SE VERINA MARIA MAR CULINO, DALVANY DE GUSMÃO MARCULINO, KELDA BEATRIZ DE GUSMÃO MARCULINO, B R AY N E R D E G U S M Ã O M A R C U L I N O , S Ô N I A M A R I A M A R C U L I N O, J A N D I R A M A R G A R I D A M A R C U L I N O D E C E R Q U E I R A , M A R I A A L D E N I R M A R C U L I N O F R AT E L E S , R ITA DE FÁTIMA DOS SANTOS MAR CUL I NO e K A I QUE DOUGLAS DOS SANTOS MARCULINO, qualificados nos autos,

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ajuizaram ação indenizatória por danos materiais e morais em face de BRASILIT INDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA. (antiga denominação da empresa ré).

Em síntese alegam que são descendentes do Sr. JOSÉ MARIANO MARCULINO, ex-empregado da ré, o qual teria adquirido enfermidade relacionada ao trabalho prestado à demandada (complicações decorrentes do contato com o asbesto), tanto que em vida o de cujus firmou instrumentos de transação com a empresa prevendo indenização, todavia percebeu valores aquém dos corretos, bem ainda que o falecimento do obreiro lhes causou ofensa imaterial e a empresa não custeou as despesas com o funeral.

Por essas razões perseguem a decretação da nulidade de cláusulas dos instrumentos de transação firmados entre o ex-empregado e a acionada, bem ainda o pagamento das despesas com a casa funerária e indenização por danos morais.

Devidamente citada, a ré compareceu à audiência designada na qual, recusada a conciliação, apresentou contestação em 78 laudas, suscitando preliminares de incompetência, irregularidade de representação, carência de ação e inépcia para, no mérito, negar as obrigações postuladas na exordial, aduzindo que adotou as providências para eliminação dos riscos no longínquo período em que o de cujus lhe prestou serviços, que já indenizou o ex-empregado em vida e que não há nexo causal para com as ofensas sugeridas no libelo.

Os autores se manifestaram sobre a defesa e os documentos.Proferida antecipadamente a sentença de fls. 223/226

declinando da competência em favor da Justiça Estadual.Através de recurso ordinário o E. TRT modificou o

entendimento e afirmou a competência desta Justiça Especializada para a causa, determinando o retorno dos autos a esta Vara para prolação de nova sentença.

Determinei a juntada de certidão de dependentes do de cujus perante o INSS, o que cumprido com a juntada do documento de fl. 314.

A empresa se manifestou a respeito e os autos vieram conclusos para julgamento.

Era o que importava relatar.PASSO A DECIDIR.

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II – FUNDAMENTAÇÃO

PRELIMINARMENTE

Do julgamento do processoConsoante acima relatado, o presente processo teve

sentença prolatada após a manifestação dos demandantes sobre a defesa e a prova documental produzida pela ré, não tendo sido produzidas outras provas. O E. TRT da 6ª Região reformou a decisão de piso e ordenou o retorno dos autos a este Juízo para novo julgamento, sendo certo que a instrução processual não foi reaberta.

Quando da baixa dos autos, determinei providências para identificar a legitimidade ad causam.

No tangente a novas provas, as partes nada mais requereram. Logo, considerando que o acórdão regional não reabriu a instrução e que inexiste de pleito superveniente para colheita de novas provas, resolvo julgar a causa com os elementos de convicção já disponíveis nos autos.

Da gratuidade da JustiçaConcedo a gratuidade da Justiça aos demandantes, na

forma do art. 790, § 3o, da CLT, presumindo verdadeira, pois não suplantada por evidência em contrário, a declaração de que não podem demandar sem prejuízo à subsistência.

Da competênciaA incompetência ex ratione materiae suscitada pela

defesa foi repelida pelo E. TRT da 6ª Região e somente as instâncias extraordinárias poderão deliberar em contrário, se encontrando superado o tema nesta oportunidade.

Da legitimidade ativa para postular as reparações patrimoniais

As prestações requeridas pelos autores desta ação são: a) declaração de nulidade das cláusulas 2ª e 9º da transação firmada entre o de cujus e a demandada; b) pagamento das diferenças dos

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valores pactuados entre o falecido José Mariano Marculino e a ré; c) o ressarcimento das despesas com o funeral; d) indenização por danos morais decorrentes da morte do Sr. José Mariano Marculino.

A petição inicial afiança que todos os autores estão legitimados para a lide porque seriam descendentes e únicos herdeiros do de cujus.

A informação não está totalmente correta.As autoras Dalvany de Gusmão Marculino e Rita de Fátima

dos Santos Marculino são noras do Sr. José Mariano Marculino. Logo, diversamente do invocado na peça inaugural, não são sucessoras do falecido, nos termos do art. 1.829 do Código Civil, já que o vínculo que as unia ao de cujus era por afinidade.

Considerando que a própria inicial vinculou a legitimidade ativa à vocação hereditária, as noras do falecido carecem de legitimidade.

Decido excluir da lide as demandantes Dalvany de Gusmão Marculino e Rita de Fátima dos Santos Marculino, na forma do art. 267, VI, do CPC, sendo certo que continuarão no feito apenas na qualidade de representantes legais de seus filhos incapazes.

Já os demais postulantes, com efeito, são herdeiros do Sr. José Mariano Marculino, porquanto são filhos e netos do de cujus (cujos pais também faleceram).

Firmado esse pressuposto, os pedidos de (a) nulidade das cláusulas contratuais que impediriam a postulação de diferenças da indenização paga pela ex-empregadora ao falecido em vida e (b) o pagamento dessas diferenças observam o disposto no art. 1º da Lei n° 6.858/80, segundo o qual a legitimidade cabe aos dependentes do de cujus perante a previdência social ou, na falta deles, aos sucessores previstos na lei civil, independentemente de inventário e arrolamento.

In casu a certidão de fl. 314 demonstra que o extinto não deixou dependentes previdenciários, de forma que estão legitimados para as reparações patrimoniais todos os sucessores do obreiro: os filhos por força do art. 1.829, I, do Código Civil; os netos dos filhos já falecidos pelo direito de representação assegurado nos arts. 1.851, 1.852, 1.854 e 1855 do Código Civil.

Destarte, rejeito a preliminar de ilegitimidade para os

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pleitos dos itens “b-1” e “b-2” do rol postulatório da peça vestibular.Quanto às “despesas da casa funerária” (item “b-4” dos

pedidos), trata-se de dano não ao de cujus, e sim àqueles que custearam o sepultamento, de natureza emergente.

Os documentos de fls. 84/85 demonstram que apenas Carlos José Marculino, um dos filhos de José Mariano Marculino, custeou o funeral do genitor, ou seja, nenhum outro filho do falecido teve gastos com o funeral. Logo, a legitimidade para requerer o pagamento das despesas com a casa funerária era exclusivamente de Carlos José Marculino, único a experimentar o dano patrimonial.

Ocorre que o Sr. Carlos José Marculino também veio a óbito, no dia 25.11.2005, e deixou os filhos Kelda Beatriz de Gusmão Marculino e Brayner de Gusmão Marculino (netos de José Mariano Marculino), ambos autores desta ação. São somente esses netos de José Marculino os legitimados a requerer o ressarcimento das despesas com o funeral, enquanto sucessores de Carlos José Marculino, na forma do art. 1.829, I, do Código Civil. Por consequência, os demais requerentes não têm legitimidade ativa para o pedido de ressarcimento de despesas com o funeral.

Decreto a extinção do pedido do item “b-4” (despesas com a casa funerária) sem resolução do mérito, na forma do art. 267, VI, do CPC, quanto aos autores MARIA RITA MARCULINO R E S E N D E G O N Z A G A , S E V E R I N A M A R I A M A R C U L I N O, D A LVA N Y D E G U S M Ã O M A R C U L I N O, S Ô N I A M A R I A M A R C U L I N O, J A N D I R A M A R G A R I D A M A R C U L I N O D E C E R Q U E I R A , M A R I A A L D E N I R M A R C U L I N O F R AT E L E S , R ITA DE FÁTIMA DOS SANTOS MAR CUL I NO e K A I QUE DOUGLAS DOS SANTOS MARCULINO, remanescendo para análise meritória a postulação de Kelda Beatriz de Gusmão Marculino e de Brayner de Gusmão Marculino.

Sobre a indenização por danos morais derivados da morte do familiar, os autores não requerem alguma indenização que seria devida ao falecido (pai e avô), e sim a reparação do dano que eles próprios – filhos e netos – dizem haver experimentado como consequência do sofrimento e da perda do ente querido. Inaplicável ao caso, portanto, toda a argumentação da vindicada sobre não ser transmissível o direito à indenização por danos morais, já que não se está diante da hipótese de transmissão da indenização extrapatrimonial. Os autores

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estão legitimados, eis que são os pretensos ofendidos pela doença e morte do familiar. Indefiro in totum a preliminar de ilegitimidade neste particular.

Da regular representação em JuízoAo revés do articulado pela empresa defendente, os autores

KELDA e KAIQUE não subscreveram isoladamente as procurações de fls. 49 e 55. Ao lado da assinatura de ambos estão as assinaturas de suas mães. Logo, regular a outorga de poderes ao advogado subscritor da petição inicial. Preliminar indeferida.

Do interesse de agirSem razão a empresa ao alegar a falta de interesse

processual quanto ao pedido de nulidade da transação celebrada entre ela e o de cujus.

As partes têm, neste ponto, interesses contrapostos, o que caracteriza litígio que somente pode ser resolvido em Juízo e não pelo uso das próprias forças dos litigantes, na medida em que rejeitaram a conciliação.

O processo é útil e necessário para se alcançar o fim almejado pelos autores. Logo, está presente o interesse de agir.

O mais há de ser analisado no mérito da causa e não como preliminar.

Da inépciaIndefiro a argüição de inépcia da petição inicial alegada

pela defesa, pois a peça vestibular preenche os requisitos do art. 840, § 1º, da CLT, c/c o art. 282 do CPC, em especial uma breve exposição dos fatos que originaram o litígio, estando o processo apto para o julgamento de mérito.

Da impugnação à prova documentalAs partes não apontaram nenhuma inexatidão concreta de

conteúdo nas cópias de documentos juntadas ao caderno processual. Alia-se a isto a circunstância de que aqueles que realmente importam à solução da lide são reproduções de documentos comuns aos

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litigantes. Repele-se toda a qualquer impugnação à prova documental com fundamento no art. 830 da CLT. E nenhum documento deve ser desentranhado dos autos, visto que servem à formação do convencimento do julgador.

NO MÉRITOAntes dos pedidos propriamente ditos, é necessário dirimir

a controvérsia acerca da incidência do cutelo prescricional.

Da prescriçãoDe acordo com o princípio da actio nata, ocorrida a violação

de um direito nasce para o seu titular a pretensão de reparação. Trata-se de princípio normatizado no sistema jurídico pátrio pelo art. 189 do Código Civil.

Na esteira desse pressuposto, impende definir qual prescrição a aplicar ao caso vertente, se a civil ou a trabalhista.

Consoante a jurisprudência do C. TST, a data da ocorrência do fato danoso em combinação com a vigência da Emenda Constitucional n° 45 definem a espécie de prescrição a adotar. Confira-se:

TST-RR-640/2005-013-17-00.6Recorrente: COMPANHIA VALE DO RIO DOCE - CVRD Recorrido: JOÃO VIEIRA CARNEIRO A C Ó R D Ã O 7ª TURMA INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS - PRESCRIÇÃO APLICÁVEL AOS CASOS EM QUE A LESÃO SOFRIDA PELO EMPREGADO É ANTERIOR À EDIÇÃO DA EMENDA CONSTITUCIONAL 45/04. 1. Na esteira do atual entendimento da SBDI-1 desta Corte ( TST-E-ED-RR-1.112/2005-005-10-00.8, Rel. Min. Lelio Bentes Corrêa, DEJT de 16/10/09; TST-E-RR-56/2007-009-18-00.8, Rel. Min. Maria Cristina Peduzzi, DEJT de 21/08/09; TST-E-RR-1.993/2005-005-18-00.3,

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Rel. Min. Brito Pereira, DEJT de 21/08/09), aplica-se a prescrição cível às ações de indenização por danos materiais e morais decorrentes de acidente de trabalho ou doença ocupacional quando a lesão sofrida pelo empregado ou a sua ciência é anterior à edição da Emenda Constitucional 45/04. 2. Assim sendo, a tese defendida pela Reclamada, no sentido de ser aplicável à presente reclamação trabalhista a prescrição do art. 7º, XXIX, da CF, contada a partir da data em que sustenta ter o Obreiro tomado ciência da sua perda auditiva (maio de 1998), encontra óbice da Súmula 333 desta Corte, descabendo cogitar de violação constitucional ou de divergência jurisprudencial, uma vez que já foi atingido o fim precípuo do recurso de revista. Recurso de revista não conhecido.

Pois bem, de acordo com essa diretriz, as supostas lesões ao patrimônio do de cujus, consistentes no recebimento a menor das indenizações previstas nos instrumentos de transação firmados com a ré, ocorreram em 12.07.2002 e no dia 27.05.2004, quando assinados os documentos de fls. 13/17 do volume apartado e de fls. 70/73 dos volumes principais.

A EC n° 45 teve vigência a partir do dia 31.12.2004. Essas lesões, portanto, lhe são anteriores e, consequentemente, o prazo aplicável no particular é o do direito comum.

Rejeito o argumento da empresa pela aplicação do prazo trabalhista bienal para os pedidos dos itens “b-1” e “b-2” do libelo.

Fixado isto, o lapso temporal para se postular a nulidade e as diferenças da indenização por danos pactuada via transação era de três anos, conforme preconiza o inciso V do art. 206 do Código Civil, a contar de 27.05.2004, aplicando-se a regra de transição do art. 2.028 do referido Digesto para com o primeiro instrumento.

No caso em foco, o prazo para se postular a nulidade e as diferenças do primeiro instrumento de transação escoou em 12.07.2005, ainda durante a vida do Sr. José Mariano Marculino. Fulminada está a pretensão relativa ao primeiro instrumento de transação.

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Decreto a extinção do processo com resolução do mérito no tocante aos pedidos de nulidade das cláusulas do Instrumento Particular de Transação firmado em 12.07.2003 e da diferença da indenização prevista nesse mesmo instrumento, nos termos do art. 269, IV, do CPC.

De outra via, o prazo para invalidação e diferenças do segundo instrumento de transação iniciou perante o de cujus José Mariano Marculino e continuou a correr contra seus sucessores, nos termos do art. 196 do Código Civil, salvo os incapazes, por força do art. 198, I, do mesmo Codex. Findou para os capazes em 27.05.2007 (triênio posterior à assinatura do instrumento de transação), ao passo que se mantém para os incapazes.

Por oportuno, destaco que se trata de pretenso direito divisível, na medida em que o bem é fungível e o art. 1º da Lei n° 6.858/80 estabelece o pagamento do crédito em quotas destacadas do total, não sendo caso de litisconsórcio ativo necessário (já que a lei assim não prevê), de forma que a regra do art. 198, I, do Código Civil não aproveita os capazes.

De ser salientada, também, a natureza relativa da nulidade arguida, visto que o negócio jurídico sub examine era lícito em sua motivação e objeto, foi celebrado por pessoas capazes, não dependia de forma ou solenidade especial, não configura simulação e não era vedado por lei, ou seja, trata-se de negócio meramente anulável por algum dos defeitos previstos no art. 849 do Código Civil.

Proposta a presente ação só em 25.04.2008, decreto a extinção dos pedidos dos itens “b-1” e “b-2” da petição inicial com resolução do mérito, nos termos do art. 269, IV, do CPC, salvo quanto aos autores Kelda Beatriz de Gusmão Marculino e Kaique Douglas dos Santos Marculino.

Já para os pedidos de ressarcimento de despesas com o funeral e de indenização por danos morais, ambos são decorrentes da morte do ex-empregado e estão fundados na tese de que o óbito decorreu da doença profissional adquirida pelo operário. Embora os alegados prejuízos tenham nascido com a morte do trabalhador em 10.10.2005, a postulação se assenta no nexo de causa para com os serviços prestados à demandada. Assumem feição de créditos com origem na relação de emprego, derivados da morte por moléstia adquirida no trabalho.

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A lesão moral – morte do familiar – e o prejuízo patrimonial – custos com o funeral – são posteriores à vigência da EC n° 45. A prescrição aplicável a esses pleitos é a trabalhista bienal, conforme o art. 7º, inciso XXIX, da CF/88, na medida em que o contrato de trabalho se encontrava extinto à época da morte e a prescrição quinquenal só tem lugar durante a vigência do pacto de emprego.

Mas, não poderia nunca ser contada a partir data de extinção do contrato de trabalho. Afinal, só com a morte do ex-empregado os autores experimentaram os prejuízos moral e material, de acordo com o princípio da actio nata. O dies a quo da prescrição é 10.10.2005. Indeferida a argumentação da ré em contrário.

Neste caminhar, o prazo fatal para propositura da ação pelos sucessores plenamente capazes do falecido era até 10.10.2007, o qual restou inobservado, porque esta ação veio a ser proposta em 25.04.2008.

Entretanto, a prescrição em apreço não atinge os incapazes, nos moldes do art. 198, I, do Código Civil. Ressalto que o art. 440 da CLT se aplica quando está em discussão crédito de menor de 18 anos na condição empregado e não para hipóteses como a presente em que os menores são herdeiros. Incide, pois, a regra civil.

Destaco que o autor Brayner de Gusmão Marculino, nascido em 29.08.1987, completou 16 anos em 2003 e 18 anos em 29.08.2005, antes do óbito do seu avô e da morte de seu pai (Carlos José Marculino), de modo que a prescrição contra ele correu normalmente.

Deste modo decido: a) decretar a extinção, com resolução do mérito, do pedido do item “b-4” (despesas com o funeral) quanto ao autor Brayner de Gusmão Marculino, permanecendo a análise do pleito para com a autora Kelda Beatriz; b) decretar a extinção do pedido do item “b-3” (indenização por danos morais) da petição inicial com resolução do mérito relativamente a todos os postulantes, exceto os autores Kelda Beatriz de Gusmão Marculino e Kaique Douglas dos Santos Marculino.

Tudo consoante o art. 269, IV, do CPC.A aplicação da prescrição em desconformidade com o acima

decidido é rejeitada.Resolvida a questão prejudicial, alcanço, em seguida, os

pedidos.

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Da nulidade do segundo instrumento de transação e da diferença dos valores pactuados

Prima facie, é necessário relembrar que o operário e a acionada firmaram dois instrumentos de transação.

O primeiro datado de 12.07.2002 e repousa às fls. 13/17 do volume apartado dos autos processuais e nele o operário havia sido enquadrado na Classe III do Anexo III do Instrumento, pelo que recebeu R$ 19.519,50, de acordo com a previsão da clausula 4ª, § 3º.

Esse instrumento acabou cancelado e as partes entabularam nova transação encartada num segundo instrumento, exatamente aquele que os autores juntaram às fls. 70/73 do volume I do caderno processual, ocasião em que o trabalhador foi reclassificado para a Classe V do Anexo III daquele novo Instrumento, passando a ter direito à indenização de R$ 50.000,00, tendo recebido R$ 26.633,20 conforme o recibo de fl. 80.

Os pedidos de nulidade das cláusulas do primeiro contrato e de diferença de R$ 19.519,50 para R$ 20.000,00 estão prescritos, restando analisar a situação do segundo Instrumento Particular de Transação.

Pois bem, as cláusulas que se pretende anular são a 2ª e a 9ª, as quais estabelecem renúncia expressa a qualquer reivindicação relacionada a dano proveniente da exposição à poeira de amianto.

Analisando o teor dos instrumentos e a prova dos autos, tenho que não prospera a insurgência dos vindicantes pela nulidade. O pedido de lastreia em suposta coação ao de cujus na assinatura do instrumento de fls. 70/73, que teria sido “obrigado” a subscrevê-lo. Contudo, inexiste nos autos qualquer evidência de que o obreiro tenha sido coagido a concordar com a transação. A hipossuficiência do trabalhador não conduz, por si só, a tal conclusão, especialmente no caso em apreço, pois o instrumento de fls. 70/73 foi celebrado muito tempo depois do encerramento do contrato de trabalho que o Sr. José Mariano Marculino manteve com a então Brasilit Indústria e Comércio Ltda. Deste modo, a empresa não exercia qualquer poder ou influência sobre o trabalhador.

Não se cuida, outrossim, de contrato de adesão. Na verdade, o trabalhador havia sofrido um dano à saúde em decorrência da exposição ao asbesto e a empresa lhe propôs o pagamento de

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uma indenização cumulada com um plano de saúde vitalício. Em contrapartida o trabalhador renunciaria a outros direitos advindos desse fato. Típica transação prevista no art. 840 do Código Civil.

Veja-se, ainda, que assinaram o instrumento de fls. 70/73, como testemunhas, dois filhos do de cujus, os quais certamente prestaram alguma assistência e esclarecimento ao pai.

Frente a esse quadro, não encontro elementos para invalidar o negócio jurídico em tela e julgo improcedente o pedido de nulidade das cláusulas 2ª e 9ª do Instrumento Particular de Transação subscrito pela ré e pelo Sr. José Mariano Marculino no dia 27.05.2004.

O pleito de pagamento da diferença de R$ 26.633,20 para R$ 50.000,00 segue o mesmo caminho da improcedência.

Isto porque o segundo instrumento de transação substituiu o primeiro (de fls. 13/17 do volume apartado) e promoveu a reclassificação de autor para um patamar de moléstia mais grave, consequentemente majorando o valor previsto na primeira avença para a indenização.

Ocorreu uma novação, na forma do art. 360, I, do Código Civil.

Por conseguinte, a indenização pactuada foi uma só e as quantias previstas nos dois instrumentos – R$ 19.519,50 e R$ 50.000,00 – não devem ser somadas para se alcançar seu total. A indenização integral ajustada importou em R$ 50.000,00, montante acertado no segundo instrumento e que substituiu, pela novação, o primeiro valor. O total da indenização, então, não era de R$ 69.519,50, e sim R$ 50.000,00.

Estabelecida essa premissa, tem-se que o Sr. José Mariano Marculino recebeu da demandada o valor nominal de R$ 46.152,70, sendo R$ 19.519,50 em 13.08.2002 (fl. 24 do volume apartado), mais R$ 26.633,20 em 11.06.2004 (fl. 80 dos volumes principais).

Porém, a promovida justificou a contento que atualizou monetariamente a quantia paga em 13.08.2002 para R$ 23.366,80, o que resultou na diferença de R$ 26.633,20. Sendo a correção monetária a recomposição da moeda frente à inflação, correto o proceder da empresa.

A quantia paga em 13.08.2003, atualizada, e o valor pago em 11.06.2004, totalizam a indenização de R$ 50.000,00 estabelecida

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no último instrumento de transação, não havendo diferença a saldar.

Das despesas com o funeralPedido de análise meritória restrita à autora Kelda Beatriz

de Gusmão Marculino, filha menor de Carlos José Marculino e neta de José Mariano Marculino.

Neste particular, se discute o direito ao ressarcimento das despesas suportadas com o sepultamento do obreiro José Mariano Marculino.

Os documentos de fls. 84/85 revelam que o Sr. Carlos José Marculino pagou à casa funerária o importe de R$ 710,00, correspondente a uma coroa de flores e à prestação do serviço do corpo do seu genitor José Mariano Marculino.

A suplicada comprovou, com o recibo de fl. 58 do volume apartado, o ressarcimento dessas despesas.

Julgo improcedente o pedido em apreço, por nada mais haver a ressarcir ou indenizar a título de despesa com o funeral.

Da indenização por danos moraisOs menores impúberes Kelda Beatriz de Gusmão Marculino

e Kaique Douglas dos Santos Marculino reclamam indenização por danos morais em virtude do sofrimento e morte do avô, José Mariano Marculino, por pretensa responsabilidade da acionada, dado que o obreiro foi exposto aos efeitos do amianto durante os anos que prestou serviços à ré.

A promovida, em resumo, afiança que sempre observou as normas de saúde e segurança do trabalho, adotando as providências úteis à eliminação dos riscos à saúde de seus empregados, além de ter realizado os exames cabíveis à época, não tendo agido com dolo ou culpa, inexistindo responsabilidade e não sendo verdadeira a assertiva de que o ex-empregado José Mariano Marculino faleceu por força exclusiva de mesotelioma, doença que não se enquadraria como oriunda do trabalho.

Posto isto, não é demais ressaltar que os danos materiais são aqueles que atingem o patrimônio, um bem de natureza econômica, enquanto os danos morais violam bens imateriais, da personalidade.

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Quem quer que, por ação ou omissão voluntária ou culposa, ofenda tais bens ou direitos, deverá suportar a reparação do dano moral, na forma do que dispunha o art. 159 do Código Civil de 1916 e também consoante o Estatuto Civil de 2002, arts. 186, 187 e 927. Para a configuração do dano, portanto, é imprescindível que estejam conjugados a ação ou omissão do agente, o prejuízo a um bem material ou imaterial e a relação de causalidade a uni-los. O dano normalmente há de ser injusto, sem estar acobertado por excludente da responsabilidade do agente e da reparabilidade do prejuízo, adotando o ordenamento jurídico a teoria clássica, assentando-se no conceito da culpa, salvo as hipóteses previstas em lei para a responsabilidade objetiva.

Cabe determinar, ainda, que o dano moral há de ser efetivo, sólido, plausível e consistente, não podendo se restringir a conclusões exclusivamente subjetivas de alguém com personalidade mais frágil ou delicada e susceptível a melindres e sensibilidades, sendo necessário que se materialize à luz da razoabilidade e do senso comum médio de todos os que vivem em sociedade.

Afinal a interação social é composta pela cooperação, mas também pela competição e por conflitos, nem todas as pessoas se agradando mutuamente, existindo agruras e irritações normais oriundas da relação social que não caracterizam dano moral.

No caso em apreço, o de cujus laborou para a demandada entre 22.03.1954 e 07.03.1961, um total de 6 anos, 11 meses e 16 dias, época de vigência do Código de 1916.

A primeira conclusão é de que não há espaço para aplicação de responsabilidade objetiva, ainda que os efeitos da ação/omissão viessem a ser produzidos na vigência do Código Civil atual.

Então, para o deslinde da controvérsia se faz necessário determinar: a) a doença, enquanto dano extrapatrimonial, do ex-empregado da empresa; b) o nexo de causa da doença do obreiro para com o trabalho à requerida; c) a culpa da ex-empregadora; d) o nexo causal entre a morte do trabalhador e a doença supostamente adquirida no trabalho; e) o dano experimentado pelos autores em razão do falecimento do avô.

Neste passo, o dano concretizado pelo surgimento da doença e seu nexo causal para com o trabalho, assim como a culpa da empresa, estão demonstrados por intermédio dos exames médicos

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e pela transação firmada entre a ré e o de cujus (Relatório de fl. 66 diagnosticando a doença oriunda do contato com o asbesto e sugerindo o encaminhamento do paciente para o oncologista, o contrato de fls. 70/73 e a ficha médica e os exames de fls. 5 a 13 do volume apartado).

Afinal, se a promovida não houvesse constatado a existência da moléstia e sua origem na exposição ao amianto não teria celebrado com o ex-empregado a transação pela qual custeou plano de saúde vitalício e o indenizou ainda em vida relativamente aos danos à saúde. Lembre-se que o obreiro foi enquadrado na Classe V do Anexo III do Instrumento de Transação subscrito, na qual se incluem as neoplasias pleuro-pulmonares.

O próprio surgimento da enfermidade vinculada ao asbesto é prova de que a ex-empregadora não adotou os meios suficientes para eliminação do risco à saúde.

E isto aconteceu não apenas com o demandante, mas também com inúmeros outros “colaboradores” da acionada, fato notório até em face do conteúdo dos instrumentos de transação trazidos à baila, que contemplam cinco classes de prejudicados pela poeira de amianto, demonstrando que as implicações não aconteceram com algum trabalhador isoladamente, e sim com um grupo de ex-empregados, bem ainda diante das causas que se avolumam na Justiça sobre o tema.

Culpa grave, registre-se, em virtude da nocividade do agente causador e da gravidade da doença.

Reconhecido o dano, seu nexo causal para com o trabalho executado em favor da vindicada e a culpa patronal, resta definir se a morte do Sr. José Mariano Marculino teve como causa a doença ocupacional.

De acordo com os elementos disponíveis nestes autos, várias foram as causas da morte apontadas na certidão cuja cópia repousa à fl. 82: a) insuficiência respiratória; b) septicemia; c) infecção respiratória; d) mesotelioma pleural direito; e) insuficiência renal; f ) hipertensão arterial; g) diabetes e; h) coronariopatia.

O falecido obreiro ainda fumou por cerca de trinta anos, fato comprovado pelo documento de fls. 05/06 do volume apartado, certamente contribuindo para sua morte.

O mesotelioma pleural direito é compatível com o Relatório

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de fl. 66 e com os resultados dos exames acostados ao volume apartado.Mas, não há nestes fólios elementos para se vincular

todas as demais doenças do aparelho respiratório do de cujus ao mesotelioma.

Ainda foram apontadas na certidão de óbito a septicemia, a insuficiência renal, a hipertensão arterial, o diabetes e a coronariopatia, que não aparentam vinculação com o trabalho.

Assim, o mesotelioma pleural, doença ocupacional adquirida pelo operário em virtude da exposição à poeira do amianto, é definido como concausa da morte do Sr. José Mariano Marculino, na inteligência do art. 21, I, da Lei n° 8.213/91.

Apesar de não poder ser isoladamente responsabilizada pelo óbito do ex-empregado, emerge para empresa o dever de indenizar aqueles que experimentaram dano com a morte do familiar, na proporção de sua culpa. Dentre os ofendidos se incluem seus netos.

Preleciona Maria Helena Diniz (in Curso de Direito Civil Brasileiro, 7º V., Saraiva, 2007):

“Como a ação ressarcitória do dano moral funda-se na lesão a bens jurídicos pessoais do lesado, portanto inerentes à sua personalidade, em regra, só deveria ser intentada pela própria vítima, impossibilitando a intransmissibilidade sucessória e o exercício dessa ação por via subrogatória. Todavia, há forte tendência doutrinária e jurisprudencial no sentido de se admitir que pessoas indiretamente atingidas pelo dano possam reclamar sua reparação.

No caso do dano moral, pontifica Zannoni, os lesados indiretos seriam aquelas pessoas que poderiam alegar um interesse vinculado a bens jurídicos extrapatrimoniais próprios, que se satisfaziam mediante a incolumidade do bem jurídico moral da vítima direta do fato lesivo. Ensina-nos De Cupis que os lesados indiretos são aqueles que têm um interesse moral relacionado com um valor de afeição que lhes representa o bem jurídico da vítima do evento danoso. P. ex.: o marido ou os pais poderiam pleitear indenização por injúrias feitas à mulher ou aos filhos, visto que estas afetariam também pessoalmente o

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esposo ou os pais, em razão da posição que eles ocupam dentro da unidade familiar. Haveria um dano próprio pela violação da honra da esposa ou dos filhos. Ter-se-á sempre uma presunção juris tantum de dano moral, em favor dos ascendentes, descendentes, cônjuges ou conviventes, irmãos, inclusive de criação (RT, 791:248), em caso de ofensa a pessoas da família. Essas pessoas não precisariam provar o dano extrapatrimonial, ressaltando-se a terceiros o direito de elidirem aquela presunção. Os demais parentes, amantes (sendo impuro o concubinato), noiva (RT, 790:438), amigos, poderiam pleitear indenização por dano moral, mas terão maior ônus de prova, uma vez que deverão provar, convincentemente, o prejuízo, como consequência direta da perda sofrida, e demonstrar que se ligavam à vítima por vínculos estreitos de amizade ou de insuspeita afeição.”(Sem grifos no original)

Adoto o entendimento de que o dano experimentado pelos autores prescinde de prova, pois decorre do próprio fato – morte do familiar, sendo certo que a empresa não apresentou sequer algum indício em contrário.

A dor não pode ser aquilatada. No entanto, os demandantes merecem receber uma indenização como meio de compensar ou minimizar de alguma forma o sentimento de perda com a doença e a morte do avô, assim como a indenização assume o caráter profilático para com a empresa, observando-se a sua capacidade financeira.

Para fins de fixação do quantum, tem-se de um lado a culpa grave da empresa ao expor o trabalhador a tão nocivo agente insalutífero e não adotar as medidas necessárias à neutralização dos efeitos do asbesto, assim como a morte de alguém próximo implica em sofrimento intenso e priva a convivência com o familiar.

Os valores desembolsados pela acionada com a indenização e o tratamento do de cujus repararam danos diretos ao trabalhador e não aqueles postulados nesta ação, de modo que não interferem na quantificação da indenização aos seus netos, embora não se possa negar a boa-fé da empresa.

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Do outro vértice, a pretensão da exordial alcançou um milhão de reais para os dez autores, o que implica em cem mil reais para cada um, e está arrimada na tese de que o falecimento do Sr. José Mariano Marculino derivou unicamente da doença do trabalho.

Logo, de acordo com as limitações da causa de pedir e do pedido (arts. 128 e 460 do CPC), a indenização requerida em favor de cada demandante é de R$ 100.000,00, levando-se em consideração na proemial que a doença pulmonar teria sido a causa isolada do óbito.

Todavia, conforme definido alhures, as complicações oriundas do asbesto, embora graves e relevantes, não foram a única causa da morte de José Mariano Marculino, o que já deve reduzir a estimativa da peça vestibular.

Além disto, de regra a perda de um avô, apesar de intensa, não tem o mesmo impacto na vida de uma criança que a morte de um genitor. Normalmente uma pessoa convive menos tempo com os avós e a proximidade não é a mesma em comparação com os pais.

Por fim, há de se considerar o contido no Decreto n° 3.266, de 29.11.1999, da Presidência da República, segundo o qual um homem brasileiro com 70 anos em 2000 (como o de cujus) possuía esperança de vida por mais 12,9 anos. O Sr. José Mariano Marculino, nascido em 29.05.1930, faleceu com 75 anos, quase oito anos antes da estimativa estatal.

Conjugando todos esses fatores, reputo razoável e adequada ao panorama retratado nestes autos uma indenização para cada neto no valor de R$ 51.000,00, equivalente a cem salários mínimos atuais, no que fica condenada a empresa ré.

Dos honorários sucumbenciaisQuanto aos honorários advocatícios, embora concedida a

gratuidade da Justiça aos promoventes, isto não abarca o pagamento de honorários advocatícios de sucumbência, mas apenas as demais despesas processuais, a exemplo de custas e honorários periciais.

Isto porque, no processo laboral, a assistência judiciária é prestada pelo sindicato profissional e os honorários somente são pagos em tal hipótese, ainda que os autores sejam pobres na forma da lei. Como resolveram contratar advogado particular, renunciaram aos honorários de sucumbência. A assistência sindical não aconteceu

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no caso em tela.Inexiste, ainda, incompatibilidade entre o disposto na Lei

nº 5.584/70 e o que dispõe o art. 133 da Constituição da República, sobre o papel do advogado na administração da Justiça, vez que este artigo apenas reconheceu a importância da função do advogado, da mesma forma que é essencial a função do Ministério Público, o qual, contudo, também não tem intervenção obrigatória em todas as lides, nenhuma novidade trazendo ao sistema jurídico nacional.

Não estão revogadas as disposições da Lei n° 5.584/70 e nem os artigos 791 e 839 da CLT, relativos ao jus postulandi das partes na Justiça Laboral.

Indefiro o pedido de honorários advocatícios, em consonância com o teor das Súmulas 219 e 329 do C. TST.

Rejeito, ainda, o pleito de honorários em favor da empresa, não apenas em virtude da parcial procedência da ação, mas principalmente pela falta de previsão legal no processo do trabalho para pagamento de honorários pelo trabalhador ou seus sucessores.

Da litigância de má-féRejeito o pedido dos demandantes pugnando pelo

reconhecimento da litigância de má-fé da suplicada, por não vislumbrar conduta da parte ré prevista no art. 17 do CPC, que exerceu seu direito de defesa, até o momento, sem cometer excesso ou abusos.

Da inexistência de recolhimentosNão incide à condenação o imposto de renda, uma vez que

a indenização deferida é oriunda de acidente de trabalho. Do mesmo modo não incidem contribuições previdenciárias, por não ser parcela incluida no rol legal do salário-de-contribuição.

Dos juros moratóriosOs juros moratórios – remuneração do capital pelo atraso

na quitação da dívida - são devidos à base de 1% ao mês, conforme o art. 883 da CLT e art. 39, § 1o., da Lei n° 8.177/91 e até o efetivo pagamento do débito, devendo ser cumprido o Enunciado 04 do E. TRT da 6a. Região, in verbis:

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“JUROS DE MOR A - DEPÓSITO EM GAR ANTIA DO JUÍZO - EXEGESE DO ARTIGO 39, § 1º, DA LEI 8 .177/91 - RESPONSABILIDADE DA PAR TE EXECUTADA - Independentemente da existência de depósito em conta, à ordem do Juízo, para efeito de garantia, de modo a possibilitar o ingresso de embargos à execução e a praticar atos processuais subseqüentes, os juros de mora - que são de responsabilidade da parte executada - devem ser calculados até a data da efetiva disponibilidade do crédito ao exeqüente. Sala de Sessões do Pleno, 17 de maio de 2001 (quinta-feira). ANA MARIA SCHULER GOMES - Juíza Presidente do TRT da 6ª Região.”

Da correção monetáriaNo tocante à correção monetária, devem ser utilizados os

índices fornecidos pela Corregedoria do E. TRT da 6a. Região, a partir da data de prolação desta sentença, pois o quantum indenizatório leva em conta o valor que representa na presente data. Não é viável considerar a data do trânsito em julgado do decisum, posto que eventuais recursos poderiam fazer que um grande hiato temporal ficasse sem a recomposição da moeda.

III – DISPOSITIVO

Frente a todo o exposto, e considerando o mais que dos autos consta, DECIDO:

1. Julgar a causa no estado em que se encontra e com os elementos de convicção já disponíveis nos autos;

2. Conceder a gratuidade da Justiça aos demandantes, na forma do art. 790, § 3o, da CLT;

3. Dar por prejudicada a arguição de incompetência absoluta neste grau de jurisdição;

4. Excluir da lide as demandantes Dalvany de Gusmão Marculino e Rita de Fátima dos Santos Marculino, na forma do art. 267, VI, do CPC, as quais continuarão no feito apenas na qualidade de representantes legais de seus filhos incapazes;

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5. Decretar a extinção do pedido de item “b-4” (despesas com a casa funerária) da petição inicial sem resolução do mérito, na forma do art. 267, VI, do CPC, quanto aos autores MARIA RITA M A R C U L I N O R E S E N D E G O N Z A G A , S E V E R I N A M A R I A MARCULINO, DALVANY DE GUSMÃO MARCULINO, SÔNIA MARIA MARCULINO, JANDIRA MARGARIDA MARCULINO DE CERQUEIRA, MARIA ALDENIR MARCULINO FRATELES, R ITA DE FÁTIMA DOS SANTOS MAR CUL I NO e K A I QUE DOUGLAS DOS SANTOS MARCULINO;

6. Rejeitar a preliminar de ilegitimidade com relação aos demais pedidos e autores;

7. Indeferir as demais questões preliminares suscitadas pelas partes;

8. Pronunciar a prescrição e decretar a extinção do processo com resolução do mérito no tocante aos pedidos de nulidade das cláusulas do Instrumento Particular de Transação firmado em 12.07.2003 entre o de cujus e a empresa ré e da diferença da indenização prevista nesse mesmo instrumento, nos termos do art. 269, IV, do CPC;

9. Pronunciar a prescrição e decretar a extinção dos pedidos dos itens “b-1” e “b-2” da petição inicial com resolução do mérito, na forma do art. 269, IV, do CPC, salvo quanto aos autores Kelda Beatriz de Gusmão Marculino e Kaique Douglas dos Santos Marculino;

10. Pronunciar a prescrição e decretar a extinção, com resolução do mérito, do pedido do item “b-4” (despesas com o funeral) somente quanto ao autor Brayner de Gusmão Marculino, de acordo com o art. 269, IV, do CPC;

11. Pronunciar a prescrição e decretar a extinção do pedido do item “b-3” (indenização por danos morais) da petição inicial com resolução do mérito, nos moldes do art. 269, IV, do CPC, relativamente a todos os postulantes, exceto os autores Kelda Beatriz de Gusmão Marculino e Kaique Douglas dos Santos Marculino;

12. Indeferir a incidência da prescrição quanto ao mais;13. Julgar parcialmente procedente a postulação remanescente

de Kelda Beatriz de Gusmão Marculino e Kaique Douglas dos Santos Marculino em face da SAINT-GOBAIN DO BRASIL PRODUTOS INDUSTRIAIS E PARA CONSTRUÇÃO LTDA., para condenar esta

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a pagar a indenização por danos morais de R$ 51.000,00 (cinquenta e um mil reais) para cada um dos autores, com incidência de juros e correção monetária.

Tudo consoante a Fundamentação supra, que passa a integrar este dispositivo como se nele estivesse transcrita.

Custas processuais pela demandada, sucumbente no objeto da ação em seu conjunto, na melhor interpretação do art. 789 da CLT, no montante de R$ 2.040,00 (dois mil e quarenta reais), calculadas sobre R$ 102.000,00 (cento e dois mil reais), valor arbitrado à condenação, para fins de direito.

P. R. I.CUMPRA-SE.Recife (PE), 22 de janeiro de 2010.

GUSTAVO AUGUSTO PIRES DE OLIVEIRAJuiz do Trabalho