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GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ
Análise dos aspectos econômicos e
constitucionais da legislação relacionada à
atuação do Grupo Eletrobrás
Nivalde José de Castro
Victor José Ferreira Gomes
Rio de Janeiro, Junho de 2007
1
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ
ÍNDICE
Introdução ................................................................................................... 3 1. Caracterização e breve histórico da Eletrobrás.................................. 4 2. Razões econômicas para alteração do âmbito de atuação do Grupo Eletrobrás ..................................................................................................... 9 3. Aspectos constitucionais do novo estatuto jurídico da Eletrobrás13
3.1. Formação de consórcios empresariais ........................................13 3.2. A participação do Grupo Eletrobrás em consórcios sem o aporte de recursos e com o poder de controle..................................17 3.3. A Eletrobrás e a participação em consórcios no exterior .........18 3.4 A participação em consórcios em atividades indiretamente ligadas à produção e transmissão de energia elétrica .....................20
Conclusão ..................................................................................................23 Referências bibliográficas........................................................................25
2
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ
Análise dos aspectos econômicos e constitucionais da
legislação relacionada à atuação do Grupo Eletrobrás
Nivalde José de Castro1
Victor José Ferreira Gomes2
Introdução
A dinâmica econômica no setor de infra-estrutura de energia
elétrica brasileiro tem um histórico que demonstra e atesta a atuação
estratégica do Estado como um dos elementos decisivos para a
construção, estabilização e equilíbrio da criação e ampliação da
capacidade produtiva, sem a qual a economia brasileira não teria
atingido o estágio atual. A sanção da Lei no 11.651, de 7 de abril de
2008, originária da Medida Provisória 396/2007, que altera atuação
do Grupo Eletrobrás3, permitindo mais liberdade e igualdade de
condições em relação às empresas e grupos privados merece uma
análise mais profunda, em função das críticas econômicas e jurídicas
desta medida adotada pelo governo federal e aprovada no
Congresso Nacional. Nestes termos, o presente artigo tem um 1 Professor Doutor do Insti tuto de Economia da UFRJ. Coordenador do GESEL- Grupo de Estudos do Setor Elé tr ico, do Ins t i tuto de Economia da Univers idade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ . n ivalde@ufr j .br . 2 Pesquisador do GESEL-UFRJ. 3 Neste t raba lho, usa-se o termo “Grupo Eletrobrás” , apesar de não haver a convenção de grupo nos termos do ar t igo 265 da Le i 6 .404/76 (Le i das S .A. ) . Além de cons iderar que a Eletrobrás e suas subs id iár ias formam um “grupo de fa to”, já que combinam esforços para rea l ização dos respect ivos objetos ( inc lus ive com obr igações neste sent ido d ispostas nos estatutos soc ia i s da contro ladora e contro ladas) , usa-se esta denominação também com o intu i to de prover um sent ido mais econômico na aná l i se . Esta denominação também é a mais usua l entre os prof iss iona is e agentes atuantes no setor e lé tr ico bras i le i ro e no governo federa l para se refer i r à Eletrobrás e suas subs id iár ias , sendo que também pode ser usada a expressão “S is tema Eletrobrás” .
3
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ duplo objetivo: analisar as causas e justificativas econômicas da
alteração de atuação do grupo Eletrobrás no setor elétrico e
examinar a constitucionalidade de alguns aspectos sensíveis da
referida norma, procurando estabelecer um primeiro marco analítico
e conceitual, sem pretender esgotá-lo, dada a complexidade e
controvérsia do assunto. O trabalho está estruturado em três partes.
Na primeira será apresentado um pano de fundo histórico, breve e
conciso sobre assunto já bastante explorado. Na segunda parte são
examinadas as causas econômicas tendo como elemento de base o
atual modelo de estruturação do setor. A terceira parte tem como
foco analítico a análise jurídico-constitucional de algumas novidades
trazidas pela lei. Ao fim são apresentadas as conclusões mais
substanciais do presente estudo. Elas apontam para a necessidade
estratégica do Estado capacitar o Grupo Eletrobrás de instrumentos
de atuação e de competitividade mais flexíveis e ágeis, frente ao
cenário de crise mundial de energia e dos desafios de investir
recursos cada vez maiores na ampliação da oferta de energia elétrica
para o Brasil, com o intuito de garantir plenamente o oferecimento
deste insumo básico e estratégico para a sociedade brasileira,
buscando simultaneamente a preservação da modicidade tarifária
do setor.
1. Caracterização e breve histórico da Eletrobrás
A Eletrobrás é uma sociedade de economia mista federal que
teve autorizada sua constituição pela Lei no 3.890-A, de 1961 e
4
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ aprovada pelo Decreto CM 1.178, de 1962. Seu objeto social, de
acordo com o artigo 2º da Lei 3.890-A, é a:
“realização de estudos, projetos, construção e operação de usinas produtoras e linhas de transmissão e distribuição de energia elétrica, bem como a celebração dos atos de comércio decorrentes dessas atividades”.
Estruturada no formato de “holding”, a Eletrobrás, passados
mais de 40 nos de sua criação, controla parte significativa do
segmento de geração de energia elétrica (39%), linhas de
transmissão que cobrem todo o território nacional (65,9%) e algumas
poucas empresas de distribuição como herança do modelo de
privatização que perdurou de 1994 até 2003. A Eletrobrás atua em
todos estes segmentos por meio de seis subsidiárias: Chesf, Furnas,
Eletronorte, Eletronuclear, Eletrosul e CGTEE. Além disso, detém
metade do capital social da empresa Itaipu Binacional e é
controladora de uma subsidiária que promove pesquisas sobre
energia elétrica: o Centro de Pesquisas de Energia Elétrica - CEPEL.
A origem da Eletrobrás está no Plano Nacional de Eletrificação
(PNE) enviado ao Congresso Nacional, em 1954, durante o segundo
governo Vargas. O PNE, de acordo com Castro, “deve ser
considerado um marco no processo de intervenção estatal, pois foi a
primeira manifestação concreta e completa de planejamento
econômico a nível nacional aplicada ao setor.”4 Implica assim
4 CASTRO, Nivalde José de. O Setor de Energia Elétrica no Brasil : a transição de propriedade privada para propriedade a pública (1945-1961) . Tese: Mestre em Ciências (Economia Industrial) . Instituto de Economia da UFRJ. Rio de Janeiro, 1985, p. 153.
5
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ assinalar que a Eletrobrás foi criada em um contexto histórico
desenvolvimentista, quando o Estado teve que assumir a
responsabilidade direta na construção de grandes projetos de infra-
estrutura. No setor de energia elétrica, a Eletrobrás tornou-se
gradativamente o principal instrumento de política econômica para
a construção, financiamento, operação e planejamento de um dos
sistemas elétricos mais eficientes do mundo, baseado em grandes
usinas hidroelétricas – energia renovável e não poluidora – e
integrado por grandes extensões de linhas de transmissão.
De acordo com Loureiro e Castro, o objetivo da concepção da
estatal Eletrobrás:
“foi originalmente concebida não como (mais) uma empresa de energia elétrica no cenário nacional, para uma atuação episódica e pontual, mas, sim, como o braço executivo da União Federal, capaz de garantir unicidade e organicidade ao que à época já vinha tomando a forma de uma abrangente política pública. Esta idéia de uma ação orgânica e envolvente foi inicialmente formulada e delineada pelo Plano Nacional de Eletrificação (PNE) elaborado no segundo governo Vargas” 5.
Nas décadas de 60 e 70 do último século, a Eletrobrás foi o
principal instrumento da política de energia elétrica brasileira e
contribuiu fortemente para a ampliação da capacidade instalada e
da configuração física do setor elétrico brasileiro (grandes usinas
hidrelétricas e linhas de transmissão que interligam grande parte do
território nacional). Para financiar a expansão da capacidade
5 LOUREIRO, Luiz Gustavo Kaercher; CASTRO, Nivalde José de. Empresas estatais e contratos de concessão: uma equação não bem resolvida no direito brasileiro – reflexos possíveis na prorrogação das outorgas. IFE n.º 2.250, Rio de Janeiro, 28 de abril de 2008, p. 4.
6
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ instalada e das linhas de transmissão, foram instituídos o
empréstimo compulsório, pela Lei no 4.156, de 1962 e a Reserva
Global de Reversão (RGR), por meio da Lei no 5.655, de 1971,
cabendo à Eletrobrás a aplicação e administração destes tributos.
Assim, a capacidade instalada do setor elétrico brasileiro dobrou na
década de 1970 e chegou a 39.000 MW em 1982.
A crise econômica mundial agravada pela crise do México em
1982, deu início a uma fase de desequilíbrio macroeconômico no
Brasil que impactaram negativamente o equilíbrio econômico-
financeiro de toda a cadeia produtiva do setor elétrico. Dada a
fragilidade macroeconômica derivada da alta exposição aos
empréstimos externos, o Brasil adotou um processo de ajuste em
que um dos seus fundamentos maiores foi a privatização das
empresas estatais, incluindo o setor elétrico. O pressuposto desta
política de privatização era gerar receitas extra-orçamentárias para
diminuir o custo da dívida intera e externa. O instrumento legal da
desestatização foi a Lei no 8.031, de 1990, que criou o Plano Nacional
de Desestatização (PND).
Enquanto outros setores foram totalmente privatizados como
siderurgia e telecomunicações, a Eletrobrás conseguiu sobreviver,
em parte, à privatização, dada a complexidade e magnitude do setor
elétrico e às constantes crises internacionais que provocavam ajustes
nas taxas internas de juros. A crise do “Apagão” de 2001
demonstrou segundo Castro e Fernandez, que o modelo de
privatização pura propugnado para o setor elétrico apresentava
falhas estruturais, sendo a principal delas a transferência do
7
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ planejamento para as empresas privadas.6 O fim deste modelo se
deu com a retirada da Eletrobrás do PND através da Medida
Provisória 144/2003, convertida na Lei no 10.848, de 15 de março de
2004, a chamada “Lei do Novo Modelo do Setor Elétrico”.
Em 2008, foi sancionada a Lei no 11.651, que em seu artigo 2º,
alterou um dispositivo (artigo 15, §1º) da lei que autorizou a
constituição da Eletrobrás - Lei no 3.890-A/1961. Textualmente, as
mudanças foram pontuais. Nada obstante isso, foram incluídos
vocábulos no dispositivo alterado, assinalados abaixo em negrito,
que alteram significativamente as possibilidades de participação do
Grupo Eletrobrás no desenvolvimento do setor elétrico brasileiro e
no exterior.
Art. 15, § 1o A Eletrobrás, diretamente ou por meio de suas subsidiárias ou controladas, poderá associar-se, com ou sem aporte de recursos, para constituição de consórcios empresariais ou participação em sociedades, com ou sem poder de controle, no Brasil ou no exterior, que se destinem direta ou indiretamente à exploração da produção ou transmissão de energia elétrica sob regime de concessão ou autorização. (grifos dos autores)
O sentido e justificativa econômica destas alterações serão o
objeto analítico da próxima parte deste trabalho.
6 CASTRO, Nivalde José de; Fernandez, Paulo Cesar . A Reestruturação do setor elétrico brasileiro: passado recente, presente e tendências futuras. In:Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica , Rio de Janeiro: Furnas, 14-17 out 2007, p. 2 .
8
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ 2. Razões econômicas para alteração do âmbito de atuação do Grupo Eletrobrás
O Novo Modelo de estruturação do setor elétrico, consagrado
na Lei no 10.848/2004, tem como objetivo basilar a expansão da
capacidade instalada com modicidade tarifária. Para atingir este
objetivo estratégico, foi modelado um mecanismo de leilão por
unidade produtiva de usinas de geração e de linhas de transmissão
de energia elétrica, criando assim um ambiente competitivo que
garante e converge para a modicidade tarifária. De acordo com
Castro e Bueno, a permissão de participação das empresas do Grupo
Eletrobrás e de empresas estaduais nos leilões de linhas de
transmissão fizeram com que o patamar médio de deságios passasse
de 5% para 30% entre 2002 e 2003, quando as estatais voltam a atuar
nos leilões.7 No segmento de geração, este movimento de deságio foi
menor, dada a maior complexidade dos projetos e em especial
devido às incertezas em relação aos custos ambientais. No entanto,
os leilões das duas usinas do complexo do rio Madeira, na região da
Amazônia, mostraram o quanto é importante a participação das
empresas estatais. A presença das subsidiárias do Grupo Eletrobrás
em todos os consórcios, garantindo menor risco aos
empreendimentos e determinando maior concorrência inter-
consórcios levou, a maiores e surpreendentes deságios no preço
final do MWh. Nestes termos, as empresas estatais são um
importante instrumento de ação e de política econômica que o
7 CASTRO, Nivalde José de & Bueno, Daniel . Leilões de linhas de transmissão e o modelo de parceria estratégica pública – privada . Revista GTD , São Paulo, n. 15, 5 p. , ago 2006.
9
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ Estado teve e tem para garantir e viabilizar maior oferta de energia
elétrica com as menores tarifas possíveis. Este resultado é
extremamente positivo para os cenários macroeconômicos do Brasil.
Em função da crescente importância que a questão da energia
vem assumindo no século XXI, sinalizando um cenário de crise
mundial, onde preço do barril do petróleo é o indicador mais
visível, o Brasil apresenta condições excepcionais em função das
descobertas de reservas de petróleo, gás natural e, no âmbito
analítico do presente trabalho, um dos maiores potenciais de
hidroeletricidade do mundo. Deste potencial estimado em 160.000
MW, a maior parte se localiza na região da Amazônia e implicará a
construção de grandes usinas hidroelétricas, com destaque para
aquela de Belo Monte com mais de 11.000 MW.
Frente a este desafio de investimento de capital intensivo e
longo prazo de maturação, o Grupo Eletrobrás sofria restrições à sua
participação em novos empreendimentos do setor elétrico. Dentre
elas, uma de grande importância era a impossibilidade de ter acesso
às linhas de financiamento do BNDES caso tivesse participação
majoritária nos consórcios. Esta limitação deixava a Eletrobrás sem
capacidade de competição nos grandes empreendimentos dado do
diferencial de custo financeiro entre financiamentos deste banco e de
outros agentes financeiros8.
Assim, uma justificativa econômica para a mudança no texto
legal no que concerne ao aumento do âmbito de atuação da estatal
8 A origem desta l imitação é derivada do esforço de equil íbrio f iscal do governo, onde as empresas estatais são contribuidoras l íquidas do superávit f iscal .
10
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ federal (participação majoritária em consórcios) é possibilitar,
quando necessário e estratégico for, um maior equilíbrio nas
participações públicas e privadas no setor elétrico, para evitar as
distorções e riscos potenciais. Desta forma, o Estado amplia a
capacidade de ação e de política econômica setorial, podendo usar
este instrumento quando e onde necessário for.
Outra possível linha de ação importante está vinculada à crise
energética (e geopolítica) em países da América do Sul como
Argentina, Uruguai, Paraguai e Chile. O caso argentino ilustra
claramente esta problemática e as possibilidades do Brasil iniciar um
processo de integração energética. Neste processo o Brasil pode criar
novas oportunidades de investimentos em energia elétrica nestes
países, beneficiando a economia brasileira através das empresas
nacionais de engenharia, de consultoria, de equipamentos, e
contando com linhas de financiamento do BNDES. O importante é
que nestes investimentos sejam construídas linhas de transmissão
ligadas ao Sistema Interligado Nacional (SIN), o que daria mais
flexibilidade de ajuste ao consumo e produção de energia elétrica.
O principal problema para os investimentos, vinculado a um
processo de integração energética com estes países, é o risco político.
O caso mais recente é no Paraguai, onde a eleição levou ao poder
um presidente que pretende usar a hidroelétrica de Itaipu como
instrumento de pressão para aumentar o desenvolvimento
econômico de seu país. Os casos dos contratos da CIEN para
importação de 3.000 MW de energia da Argentina9 e dos
9 Para si tuar o lei tor , a CIEN (Companhia de Interconexão Energética) pertence ao grupo Endesa, e é responsável pela interconexão entre Brasi l e
11
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ investimentos na Bolívia, demonstram a dificuldade e mesmo
impossibilidade dos agentes econômicos privados assumirem os
riscos políticos. O encaminhamento das soluções para os conflitos
da Bolívia versus Petrobrás e Paraguai versus Eletrobrás mostra o
quanto é mais segura e rentável a posição de empresas estatais neste
tipo de conflito e disputa, já que o problema passa a ser de Estado.
Deste modo, pode-se concluir que é necessária a atuação do
Grupo Eletrobrás. Esta atuação tende a se tornar rapidamente um
instrumento estratégico para a promoção de uma política de
integração energética na América do Sul, mitigando os riscos de
crise energética e abrindo espaço para a consolidação do Brasil como
potencia econômica regional.
Uma terceira razão para alterar o estatuto econômico da
Eletrobrás é a possibilidade de participar em atividades que se
destinem indiretamente à produção e transmissão de energia
elétrica. O vocábulo “indiretamente” pode conter inúmeros
significados, o que abriria, em tese, a atuação deste grupo estatal
para diversas atividades. Um exemplo possível e certamente
recomendável, seria a atuação do Grupo Eletrobrás em
empreendimentos de gás natural. Esta poderia ser uma forma de
garantir suprimento para as usinas termoelétricas em condições
mais estáveis e com menores custos, já que esta é uma tendência
previsível de mudança da matriz de energia elétrica. A inclusão
desta possibilidade na nova redação da lei de constituição da Argentina, por meio de l inhas de transmissão nos dois países e das conversoras Garabi I e I I . A empresa também é agente de importação de energia advinda da Argentina. Entretanto, nos últimos meses, a Argentina, devido à crise energética, não tem enviado para o Brasi l a energia prevista no contrato da CIEN.
12
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ Eletrobrás dá e abre ao Estado possibilidades potenciais para definir
e executar estratégias de desenvolvimento do setor elétrico dentro
dos parâmetros do modelo: expansão com modicidade.
3. Aspectos constitucionais do novo estatuto jurídico da Eletrobrás
O objetivo desta parte é examinar a constitucionalidade da
nova redação do artigo 15, §1º, da Lei no 3.890-A/1961, alterada pelo
artigo 2º da Lei no 11.651/2008 que, conforme assinalado
anteriormente, amplia de forma significativa a capacidade de
atuação do grupo Eletrobrás no espaço econômico nacional e
internacional. Neste sentido, serão examinados os aspectos
constitucionais referentes a quatro questões: 1) a participação de
empresas estatais em consórcios empresariais para a prestação de
serviços públicos; 2) a participação do Grupo Eletrobrás em
consórcios sem o aporte de recursos e com o poder de controle; 3) a
participação do Grupo Eletrobrás em consórcios no exterior; 4) a
participação do Grupo Eletrobrás em consórcios para atividades
indiretamente ligadas à geração e transmissão de energia elétrica.
3.1. Formação de consórcios empresariais
Há uma parte da doutrina que considera inconstitucional a
participação de empresas estatais em consórcios empresariais para a
prestação de serviços públicos. De acordo com Marçal Justen Filho:
13
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ
“... o serviço público prestado pelo Estado (em nome próprio ou por suas entidades da Administração Indireta) não comporta exploração por meio de consórcio com a iniciativa privada. A concessão para consórcio de que participasse entidade administrativa somente se admite quando versar sobre atividade econômica em sentido estrito.10’’
A justificativa do autor para tal interpretação é de que não há
interesse jurídico primário compatível com a Constituição Federal
que autorize a formação de consórcios empresariais entre empresas
estatais e privadas para a prestação de serviços públicos, pois se o;
“...Estado deliberou outorgar um serviço público para o desempenho privado, está reconhecendo que a atividade pode ser efetivada fora de sua órbita. (...) Não há justificativa para, em seguida, o Estado associar-se com os particulares para continuar a prestar o serviço.11’’
Uma interpretação oposta à deste renomado autor parte da
justificativa de que a formação de consórcios empresariais na
prestação de serviços públicos atende não somente uma lógica
econômica, mas também, no caso de serviços públicos, à própria
viabilização do empreendimento e também à modicidade tarifária.
No caso do setor elétrico brasileiro, há formação de inúmeros
consórcios empresariais entre as subsidiárias da Eletrobrás e
empresas privadas para a participação em leilões de geração e
transmissão de energia elétrica, promovidos pela Aneel, sendo que
os empreendimentos derivados destes leilões podem ou não ser
10 FILHO, Marçal Justen. Teoria Geral das Concessões de Serviço Público . São Paulo: Dialética , 2003, p. 143. 11 Idem.
14
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ considerados serviços públicos12. As empresas privadas que
participam destes consórcios somente conseguem financiamento em
quantidade e condições compatíveis com o investimento necessário
graças à formação dos consórcios. Esta possibilidade permite
determinar risco baixo e assim uma remuneração menor e
compatível com o risco. Desta forma, a empresa estatal participando
do consórcio, sendo majoritária ou minoritária, mitiga as incertezas
quanto à viabilização e remuneração do investimento, pois o risco
regulatório, financeiro e mesmo ambiental é menor. Assim, os
agentes privados aceitam remuneração para o empreendimento do
consórcio menor, pois a taxa de retorno é inversa ao risco/incerteza.
Nestes termos, a participação estatal se mostra estratégica, de
um lado por poder permitir a viabilização do empreendimento, e de
12 De acordo com Walter Álvarez, a energia elétrica pode ser t ida como serviço público ou como atividade privada. Configurará a primeira hipótese quando – em qualquer fase – se destinar a atendimento externo, desimportando a qualidade dos terceiros destinatários. ( . . . ) Será atividade econômica privada a quando voltada exclusivamente para o atendimento das necessidades de seu produtor. ( . . . ) Consoante com isso, são concessionárias de serviço público os primeiros e autorizados (salvo os aproveitamentos de pequena potência para uso próprio que até de autorização prescindem) os segundos. (LOUREIRO, Luíz Gustavo Kaercher. A Indústria Elétrica e o Código de Águas : o regime jurídico das empresas de energia entre a concess ion de service publ ic e a regulat ion of publ ic ut i l i t ies . Porto Alegre: Sergio Fabris Ed. , 2007. p. 315) Deste modo, os empreendimentos resultantes dos lei lões de energia nova promovidos pela Aneel , em que se formam consórcios empresariais , são serviços públicos, pois destinam energia a atendimento externo. E mesmo que não haja a nomenclatura “serviço público”, mas sim o “uso de bem público” na outorga ou no contrato de concessão derivados destes lei lões , estes empreendimentos são considerados serviços públicos, pois se presentes os requisi tos para tal configuração, esta passa a ser obrigatória , com todas as suas conseqüências jurídicas. Deste modo, esclarece Marçal Justen Fi lho: “Mesmo na atualidade, tem sido usual promover-se concessão de uso de bem públicos para hipóteses em que o particular assumirá o dever de gerar energia elétrica a partir de potenciais hidráulicos públicos. Rigorosamente, a cessão de uso de bem público é mera condição para o desempenho do serviço público. O vínculo jurídico existente, nesses casos, deve ser qualif icado corretamente, ignorando-se a denominação formal adotada”. (FILHO, Marçal Justen. Teoria Geral das Concessões de Serviço Público. São Paulo: Dialética, 2003, p. 106.)
15
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ outro, se este for viabilizado, contribui efetivamente para a
diminuição das tarifas cobradas dos usuários dos serviços públicos.
Também se pode assinalar que desonera os gastos públicos e o
impacto no superávit primário, pois não há a necessidade da
empresa estatal se responsabilizar pela totalidade dos
investimentos.
Deste modo, entende-se que há um interesse jurídico primário
compatível com a Constituição para a formação de consórcios entre
estatais e empresas privadas para a prestação de serviços públicos.
Esta formatação empresarial pode até mesmo determinar a
viabilização de empreendimentos, como foi o caso dos leilões do rio
Madeira.
Cabe lembrar que serviços públicos são “destinados à
satisfação de necessidades diretamente e imediatamente
relacionadas com a dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III, CF)
ou a finalidades políticas essenciais.”13. Assim, a atuação que
permite a própria viabilização destes serviços e ainda contribui para
a modicidade tarifária é plenamente compatível com o texto
constitucional, nele encontrando o interesse jurídico primário para
esta atuação (artigo 1º, III, e artigo 170, V, da Constituição Federal).
Corroborando com a interpretação acerca da
constitucionalidade de prestação de serviço público por meio de
consórcios empresariais com a participação de estatais, Floriano de
Azevedo Marques Neto assevera, em consulta feita pelo Ministério
13 FILHO, Marçal Justen. Teoria Geral das Concessões de Serviço Público. São Paulo: Dialética , 2003, p. 46.
16
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ das Cidades acerca da constitucionalidade de projeto de lei versante
sobre consórcios públicos, que se
“a Constituição admite a prestação de serviços públicos a particular, tanto menos poderia impedir a delegação entre entes integrantes da Administração Pública (...) Pode outrossim, cometer o seu exercício a outro órgão da Administração, ainda mais se deste órgão integrar administração direta ou indireta do ente detentor da competência.”14
Assim, se é permitida a delegação a particular, e não pode ser
impedida a delegação a entes da Administração Pública, tampouco
pode ser impedida a delegação a consórcios formados por entes
integrantes da Administração Pública indireta e por privados.
3.2. A participação do Grupo Eletrobrás em consórcios sem o aporte de recursos e com o poder de controle
Quanto à participação em consórcios e sociedades sem o
aporte de recursos, e com o poder de controle, não há razão para
que tais expressões sejam consideradas inconstitucionais, pelos
mesmos argumentos apresentados no item anterior e pelas razões
apontadas no item 2 deste artigo. Autorizar a Eletrobrás e suas
subsidiárias a participarem de consórcios e sociedades de propósito
específicos (SPE) sem o aporte de recursos e com o poder de controle
deve ser entendido como uma política estratégica para evitar
desequilíbrios entre a oferta e a demanda deste setor tão importante 14 MARQUES NETO, Floriano de Azevedo. Os consórcios no direito brasileiro . [Parecer requisi tado pelo Min. Das Cidades] Acesso em: 17 jun 2008. Disponível em: <http://www.manesco.com.br/artigo.asp?id=79>
17
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ da economia. Na base desta decisão estão duas motivações. A
primeira foi a crise do “apagão” de 2001-2002, que, de acordo com
Castro e Fernandez (2007), teve como causa central a falta de
investimentos em geração de energia elétrica causada por
fragilidades e inconsistências no modelo de privatização que
propunha a eliminação completa da participação do Grupo
Eletrobrás no setor elétrico15. A segunda motivação está diretamente
associada ao volume de investimento e o tipo de empreendimento
que o setor elétrico tem que realizar para garantir e suportar o
crescimento econômico. Desta forma, o Estado busca com estas
alterações ter um instrumento passível de ser usado em caso de
necessidade frente aos desafios que o cenário macroeconômico
colocará ao setor elétrico. Trata-se de um mecanismo semelhante a
um hedge, uma garantia. O que tem prevalecido desde 2003 até a
presente data são as parcerias estratégicas entre grupos privados e o
Grupo Eletrobrás com a participação minoritária estatal. Mas no
caso de faltar interesse ou se os grupos privados vierem a exigir
taxas de retorno muito elevadas que coloquem em risco a expansão
da capacidade instalada com modicidade tarifária, esta nova
legislação permitirá a ação do Grupo Eletrobrás.
3.3. A Eletrobrás e a participação em consórcios no exterior
15 CASTRO, Nivalde José de & Fernandez, Paulo Cesar . A reestruturação do setor elétrico brasileiro: passado recente, presente e tendências futuras. In:Seminário Nacional de Produção e Transmissão de Energia Elétrica , Rio de Janeiro: Furnas, 14-17 out 2007, p. 2 .
18
GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ
Do ponto de vista constitucional, pode ser questionada a
possibilidade de a Eletrobrás participar de consórcios e sociedades
no exterior. Para examinar a questão, é necessário investigar se há
(ou não) um permissivo constitucional para tal atuação e o regime
jurídico desta.
O permissivo constitucional para a atuação da Eletrobrás no
exterior dependerá da finalidade da ação da Eletrobrás, caso a caso.
No item 2 deste artigo, foi demonstrado que a atuação da Eletrobrás
no exterior é estratégica para o Brasil, principalmente na América do
Sul, na medida que esta atuação teria o escopo de mitigar uma crise
energética de grandes proporções no continente e também para
afirmar a posição de liderança brasileira econômica e geopolítica na
América Latina. Assim, o caso de a Eletrobrás atuar na América
Latina com o fim de promover a integração latino americana por
meio de uma integração energética encontraria o permissivo
constitucional no artigo 4º, caput, da Constituição Federal, ou então,
no artigo 3º, II, da Constituição Federal, já que estes
empreendimentos podem garantir o desenvolvimento nacional.
Outros empreendimentos que visem a garantia do desenvolvimento
nacional também terão como permissivo constitucional o artigo 3º,
II, para a atuação da Eletrobrás.
Em relação ao regime jurídico da atuação da estatal, este não
será determinado pela Constituição brasileira, mas sim, pela
Constituição do país em que ocorrer a atuação. Entretanto, a relação
entre a Eletrobrás e a União Federal se dará com base nos princípios
do direito administrativo brasileiro.
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Em face disso, é necessária uma interpretação conforme a
Constituição para a aplicação material da expressão “exterior”
contida na nova redação do artigo 15 da Lei no 3.890-A. Deste modo,
é necessária uma investigação caso a caso no sentido de que se há
um permissivo constitucional para a atuação da Eletrobrás nos
consórcios que forem formados no exterior.
3.4 A participação em consórcios em atividades indiretamente ligadas à produção e transmissão de energia elétrica
Como exposto no item 2, a expressão “indiretamente” contida
no artigo 15 da Lei no 3.890-A abriria, em tese, a atuação da estatal e
suas subsidiárias para diversas atividades que sejam ligadas à
produção e transmissão de energia elétrica, devido à vagueza da
expressão contida na lei.
Para esclarecer quais atividades poderiam ser enquadradas
nesta expressão, convém transcrever o artigo 21, XII, b, da
Constituição Federal, in verbis:
Art. 21. Compete à União: (...) XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão: (...) b) os serviços e instalações de energia elétrica e o aproveitamento energético dos cursos de água, em articulação com os Estados onde se situam os potenciais hidroenergéticos;
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Deste modo, o termo “indiretamente” contido na lei nos leva a
uma série de situações se interpretado conjuntamente ao artigo 21,
XII, b, da Constituição Federal:
a) a atuação pode ocorrer, no Brasil, em atividades que sejam
indiretamente destinadas à produção e transmissão de
energia elétrica, e estas atividades são classificadas como
serviços e instalações de energia elétrica (como exemplo
podem ser citados os serviços ancilares e os serviços de
medição).
b) A atuação pode ocorrer, no Brasil, em atividades que sejam
indiretamente destinadas à produção e transmissão de
energia elétrica, porém, estas atividades não são
classificadas como serviços e instalações de energia elétrica
(como exemplos podem ser citadas a exploração de gás
natural, petróleo ou produção de cana de açúcar).
c) A atuação pode ocorrer no exterior em atividades que sejam
indiretamente destinadas à produção e transmissão de
energia elétrica, pouco importando se são ou não serviços e
instalações de energia elétrica.
Para cada uma das três situações descritas acima, há uma
interpretação acerca da constitucionalidade da expressão
“indiretamente” contida na lei. A situação “c” já se encontra
suficientemente abordada no tópico anterior (participação em
consórcios no exterior).
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Na situação “a”, a atuação se mostra plenamente
constitucional, pois se trata de atividade econômica de titularidade
da União. A União, neste caso, pode atuar diretamente ou delegar a
execução a terceiros. Como a Eletrobrás é uma sociedade de
economia mista federal, a atuação nesta situação seria direta.16
Na situação “b”, a atuação do Grupo Eletrobrás passará a ser
regida pelo artigo 173 da Constituição Federal, pois se tratará de
atividade econômica strictu sensu, sendo necessária a comprovação
de relevante interesse coletivo ou imperativos de segurança nacional
para a atuação. O artigo 173, caput, da Constituição Federal dispõe:
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.
O artigo 173, caput, trata-se de norma constitucional de
eficácia contida, de acordo com a classificação de José Afonso da
Silva.17 Mesmo que não exista a lei regulamentadora, esta possui
aplicabilidade imediata. Deste modo, o Estado somente poderá
explorar atividade econômica strictu sensu se esta exploração for
16 A questão sobre a atuação da Eletrobrás ser direta e não delegada, nos termos do artigo 175 da Constituição Federal, está aprofundada no artigo publicado pelos professores Luiz Gustavo Kaercher Loureiro e Itiberê Rodrigues (LOUREIRO, Luiz Gustavo Kaercher; RODRIGUES, Itiberê de Oliveira Castellano. Que papel cabe às empresas estatais no setor elétrico brasileiro? Uma perspectiva de direito constitucional. In: II Seminário Internacional – Reestruturação e Regulação do Setor de Energia Elétrica e Gás Natural, 2007, Rio de Janeiro. Disponível em: <http://www.nuca.ie.ufrj.br/gesel/seminariointernacional2007/artigos/pdf/luizgustavokaercherloureiro_quepapelcabeasempresas.pdf>. Acesso em: 18 jun 2008.) 17 Normas constitucionais de eficácia contida são “aquelas em que o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a determinada matéria, mas deixou margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do Poder Público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais nela enunciados” (SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais. 6a ed., São Paulo, Malheiros, 1998. p. 116)
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GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ necessária aos imperativos de segurança nacional ou ao relevante
interesse coletivo, cabendo à interpretação sistemática da
Constituição Federal, à doutrina ou à jurisprudência a conceituação
e delineamento destas expressões, enquanto não for editada a lei
regulamentadora.
Deste modo, é necessária a demonstração de relevante
interesse coletivo ou imperativo de segurança nacional para a
atuação da Eletrobrás para atividades indiretamente ligadas à
produção e transmissão de energia elétrica que não sejam
classificadas como serviços e instalações de energia elétrica, sendo
que a demonstração de relevante interesse coletivo ou imperativo de
segurança nacional é necessária ser feita caso a caso.
A título exemplificativo e como também explicado no item 2
deste artigo, a participação em consórcios para a exploração de gás
natural pode ser uma destas atividades e esta é comprovadamente
de relevante interesse coletivo, pois está intrinsecamente ligada à
garantia de suprimento de energia elétrica no Brasil atualmente.
Assim, igualmente à atuação da Eletrobrás no exterior, a
expressão “indiretamente” necessita de uma interpretação conforme
a Constituição quando materialmente aplicada, pois devido à
vagueza da expressão, esta pode sofrer interpretações incompatíveis
com a própria Constituição.
Conclusão
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A análise da fundamentação econômica e constitucional do
artigo 15, §1º da Lei no 3.890-A, modificado pela Lei no 11.651, de
2008, deve necessariamente partir do fato concreto e objetivo de que
a energia elétrica é um insumo essencial para vida econômica, social
e política da nação e qualquer desequilíbrio no setor pode trazer
conseqüências gravíssimas para o país como a crise do “apagão”
demonstrou. Soma-se a esta constatação o cenário de crise mundial
de energia que vem levando e obrigando os governos de nações
desenvolvidas e emergentes a atuarem em prol da segurança
energética, modificando regulamentos, normas, leis e mesmo
influenciando a atuação das agências reguladoras e órgãos de defesa
da concorrência, tudo em sentido contrário à política de
liberalização do setor elétrico iniciada em fins dos anos de 1980. A
América latina e a União Européia estão plenas de exemplos desta
nova tendência.
Neste sentido, o Brasil não pode ficar exposto e sujeito a
desequilíbrios internos e externos no setor elétrico que possam vir a
comprometer o seu desenvolvimento, a partir do qual será possível
superar as desigualdades sociais e econômicas ainda latentes e
presentes.
Esta é a base de sustentação econômica que respalda e justifica
as alterações na legislação brasileira em relação à atuação do Grupo
Eletrobrás.
Por outro lado, nas alterações da lei, há algumas expressões
que são plenamente constitucionais, e outras que necessitam de uma
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GESEL - Grupo de Estudos do Setor Elétrico - UFRJ interpretação conforme a Constituição quando forem materialmente
aplicadas.
Neste sentido, buscou-se demonstrar a constitucionalidade da
formação de consórcios empresariais entre empresas estatais e
privadas para a prestação de serviços públicos e a
constitucionalidade da participação da Eletrobrás e subsidiárias em
consórcios sem o aporte de recursos e com o poder de controle.
Entretanto, para a participação no exterior, torna-se necessária a
busca de um permissivo constitucional em cada consórcio em que a
Eletrobrás participar. E em atividades que são ligadas indiretamente
à produção e transmissão de energia elétrica (quando não são
serviços e instalações de energia elétrica), torna-se necessária a
comprovação de relevante interesse coletivo ou imperativos de
segurança nacional, nos termos do artigo 173, caput, da Constituição
Federal. Com base nos argumentos econômicos do item 2 deste
trabalho, há fortes indícios de que se pode encontrar o permissivo
constitucional para a atuação no exterior e o relevante interesse
coletivo ou imperativo de segurança nacional para a atuação do
Grupo Eletrobrás em grande parte dos empreendimentos direta ou
indiretamente ligados à produção e transmissão de energia elétrica.
Referências bibliográficas
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