apostila história v 2016

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HISTÓRIA DA MÚSICA V Após 1940 Prof. Marcos Holler UDESC/CEART - 2016

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Apostila de história da música do curso de licenciatura em música na udesc

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Page 1: Apostila História v 2016

HISTÓRIA DA MÚSICA V

Após 1940

Prof. Marcos Holler UDESC/CEART - 2016

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SUMÁRIO

Pág. Faixa Part. 1. PRINCÍPIOS DE ORGANIZAÇÃO 01 1.1 O SERIALISMO 01 1.2 MILTON BABBITT 01

Peça para Piano no 1 02 01 01 1.3 OLIVIER MESSIAEN 03

Quarteto para o fim dos tempos 04 02 02 Catalogue d'Oiseaux - L'alouette lulu 05 03 03 Mode de valeurs et d’intensités 05 04 04

1.4 PIERRE BOULEZ 08 Structures Ia 08 05 05

1.5 KARLHEINZ STOCKHAUSEN 09 1.6 IGOR STRAVINSKY 09 1.7 YANNIS XENAKIS 10

Metastasis 10 06

2. MUSIQUE CONCRÈTE, MÚSICA ELETRÔNICA, MÚSICA ELETROACÚSTICA

11

2.1 PIERRE SCHAEFFER 11 Etude aux chemins de fer 11 07

2.2 KARLHEINZ STOCKHAUSEN 12 O canto do adolescente 12 08

2.3 FLO MENEZES 14 PAN: Laceramento della Parola (Omaggio a Trotskij) 14 09

3. INSTRUMENTOS TRADICIONAIS E NOVAS SONORIDADES 15 3.1 EDGARD VARÈSE 15

Ionisation 16 10 06 3.2 JOHN CAGE 16

Sonata no. 5 para piano preparado 17 11 07 3.3 KRZYSTOF PENDERECKI 18

Trenodia para as vítimas de Hiroshima 18 12 08 3.4 GYÖRGY LIGETI 19

Lux Aeterna 19 13 09 Continuum 20 14 10

3.5 LUCIANO BERIO 20 Sequenza III 21 15 11

3.6 GEORGE CRUMB 23 Makrokosmos I 23 12 Apparition - 1.The night in silence under many a star 23 16 13

4. A MÚSICA ALEATÓRIA 24 4.1 JOHN CAGE 24

4’33” 25 14 4.2 KARLHEINZ STOCKHAUSEN 26

Klavierstück XI 26 17,18 15 5. MINIMALISMO 27 5.1 TERRY RILEY, STEVE REICH e PHILIP GLASS 27

Terry Riley - In C 28 19 16 Steve Reich - Piano phase 28 20 17 Steve Reich - Clapping music 29 Philip Glass - Two pages 30 21 Philip Glass - Opening 30 22

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6. TENDÊNCIAS DA MÚSICA ATUAL 31 6.1 TENDÊNCIAS DA SIMPLICIDADE 31

6.1.1 NOVA SIMPLICIDADE 32 Wolfgang Rihm - Dèpart 32 23 Arvo Pärt - Festina Lente 33 24

6.1.2 PÓS-MINIMALISMO 33 Morton Feldmann - Three Voices for Joan la Barbara 33 25 Michael Nyman - Trysting Fields 34 26-27 Antonio Pinto - Trilha sonora de Central do Brasil 35 28 Meredith Monk - Gotham Lullaby 35 29

6.2 MÚSICA ESPECTRAL 36 Ben Johnston - Sonata Para Piano Microtonal 36 30 Gérard Grisey - Partiels 37 31

6.3 TENDÊNCIAS DA COMPLEXIDADE 37 6.3.1 NOVA COMPLEXIDADE 37

Pierre Boulez 38 6.4 MÚSICA ACUSMÁTICA 39 6.5 POLIESTILÍSTICA 40

Luciano Berio - Sinfonia 41 32 Alfred Schnittke 42 Tan Dun 43

REFERÊNCIAS 45

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História da Música V ________________________________________________________ 1

1. PRINCÍPIOS DE ORGANIZAÇÃO Compositores: EUA Milton Babbitt (1916-2011) Igor Stravinsky (1882-1971) França Olivier Messiaen (1908-1992) Pierre Boulez (1925-2016) Alemanha Karlheinz Stockhausen (1928-2007) Grécia Yannis Xenakis (1922-2001) 1.1 O SERIALISMO GRIFFITHS, verbete “serialismo” em The New Grove Dictionary of Music and Musicians. “Método de composição no qual uma série de elementos é referencial. [...] O mais comum é que os elementos organizados na série são as 12 notas da escala temperada. Esta foi uma técnica introduzida por Schoenberg no início dos anos 20, e utilizada por ele na maioria de suas composições subseqüentes.[...] Esse método se disseminou rapidamente na década após a II Guerra, quando Babbit, Boulez, Nono e Stockhausen compuseram suas primeiras peças reconhecidas. Esses compositores e seus colegas algumas vezes estenderam o serialismo a outros elementos além da altura, como a duração, a dinâmica e o timbre. [...] Existem discussões sobre alguns dos problemas de percepção associados ao serialismo de aspectos não relacionados à altura, mas também a questão sobre o serialismo de alturas ser ou não perceptível ainda não foi solucionada. [...] Compositores seriais usualmente tomam três posicionamentos: que o procedimento serial não pode ser percebido pelo ouvinte [...]; que os procedimentos seriais não são percebidos conscientemente, mas que a música produz um efeito de coerência que o ouvinte não consegue explicar; ou que os procedimentos seriais podem ser percebidos, a partir da cooperação do ouvinte.” 1.2 MILTON BABBITT (1916-2011) MORGAN, pp. 464 e 465. “Antecipando não somente as primeiras tentativas seriais de Boulez e Stockhausen, mas também o Mode de Valeurs e d´Intensités de Messiaen, as 3 Peças para Piano (1947) de Milton Babbitt foram a primeira composição na qual outros elementos além da altura foram estritamente estruturados através de um processo de composição serial.“

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Milton Babbitt - Peça para Piano no. 1 (1947) Faixa 1, partitura 1 Complexo serial da Peça para Piano no. 1 de Babbitt1:

Dinâmicas:

o1 e o12 - mp ro1 e ro12 - mf

i3 e i8- f ri3 e ri8- p

Estrutura rítmica:

o1 e o12 - 5142 ro1 e ro12 - 2415

i3 e i8 - 1524 ri3 e ri8 - 4251

Exemplos da estrutura 5142 aplicada à série o1:

1 Análise do Prof. Sérgio Freitas

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1.3 OLIVIER MESSIAEN (1908-1992) O conceito “amétrico” de ritmo MORGAN, pp. 335 a 337. “O aspecto mais inovador das primeiras obras de Messiaen envolve o tratamento do ritmo. Ele se move na direção de um conceito essencialmente ‘amétrico’ ao substituir as noções de compasso e tempo pela sensação de uma nota de valor curto (por exemplo a semicolcheia) e sua multiplicação livre. A idéia central é a de ‘valores adicionados’, através dos quais padrões regulares adquirem grande flexibilidade rítmica: por exemplo, em lugar de

, usa-se (adicionando-se uma semicolcheia após a 3a nota), ou em lugar de

, usa-se . [...] Uma inovação característica de Messiaen é o chamado ‘ritmo não-retrógrado’, ou seja, uma sucessão de durações que continua a mesma quando tocada ao

contrário, como . Um trecho do Quarteto para o fim dos tempos (1940), ilustra aspectos dos procedimentos rítmicos de Messiaen. (No exemplo dado tem-se apenas a voz superior do piano; a voz inferior e os outros instrumentos simplesmente dobram esta parte.) Valores rítmicos adicionados surgem freqüentemente, e cada compasso consiste de um ritmo não-retrógrado.

Quarteto para o fim dos tempos, 6o. movimento, compassos 1 a 4.” Religiosidade MORGAN, p. 337. “Um ingrediente final que define o caráter musical de Messiaen é sua natureza profundamente mística e religiosa, o que contribui significantemente para o rigor estrutural de sua obra. Para Messiaen, a música constitui uma materialização ‘objetiva’ da beleza e perfeição do universo de Deus.”

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Cantos dos pássaros MORGAN, p. 337. “O material mais apropriado por Messiaen de forma mais conseqüente foram os cantos dos pássaros. A maior parte das suas obras faz referências a cantos de pássaros, mesmo que breves, e algumas delas têm quase todo o seu material melódico derivado desta fonte. Em quase toda a sua vida Messiaen anotou cantos de pássaros que encontrou em suas extensas viagens. [...] sua intenção não era a de ‘imitar’ os cantos dos pássaros, mas transformá-los de forma que eles passassem a ter significado musical. Em composições como Réveil des Oiseaux [Despertar dos pássaros], de 1953, toda a estrutura reflete as mudanças dos cantos de pássaros em um mesmo habitat durante um período de tempo (do meio-dia à meia-noite, neste caso).” Olivier Messiaen - Quarteto para o fim dos tempos (1941) I - Liturgie de cristal Faixa 2, partitura 2 DUCKWORTH, pp. 62 - 63. “É difícil imaginar um local mais inóspito para a estréia de uma peça de câmara do que um campo alemão de prisioneiros de guerra no inverno de 1941. Mas é o que ocorreu, para ser mais exato, no campo Stalag8, na Silésia. Foi lá que, em 15 de janeiro de 1941, o Quarteto para o fim dos tempos de Messiaen, escrito para violino, clarinete, violoncelo e piano, foi apresentado pela primeira vez. A maior parte das 5 mil pessoas na audiência eram prisioneiros, assim como os intérpretes: o violinista e o clarinetista tiveram permissão de manter seus instrumentos quando foram capturados; os alemães conseguiram um violoncelo com 3 cordas, e no último instante conseguiram um piano de armário para que Messiaen tocasse. Prisioneiro desde 1940, quando havia sido capturado após poucos meses de serviço militar, Messiaen escreveu todo os 8 movimentos do Quarteto quando estava preso. O significado do título pode ser visto de duas formas. Católico devoto, Messiaen tirou do Apocalipse a idéia original para a composição, e do anjo que faz o juramento de que quando soar a sétima trombeta, ‘não haverá mais o tempo’. Um outro sentido é mais pessoal. [...] Messiaen havia inventado uma nova linguagem para sua música, um método de se alongar o tempo musical usando técnicas que ele havia descoberto na música hindu. Nesse sentido, o título sugere sua tentativa de destruir as divisões de tempo da música tradicional, uma prática na qual ele se foi engajado por toda a vida.” Dedicatória na partitura: “En hommage à l’Ange de l’Apocalypse, qui lève la main vers le ciel en disant: ‘Il n’y aura plus de Temps’.” (Em homenagem ao Anjo do Apocalipse, que ergue a mão para o céu, dizendo: ‘Não haverá mais o tempo!’.)

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Movimentos: I - Liturgie de cristal II - Vocalise, pour l’Ange qui annonce la fin du temps III - Abîme des oiseaux IV - Interméde V - Louange à l’Eternité de Jésus VI - Danse de la fureur, pour les sept trompettes VII - Fouillis d'arcs-en-ciel, pour l'ange qui annonce la fin du temps VIII - Louange à l'Immortalité de Jésus O 1o. movimento, segundo Messiaen “1. Liturgia de cristal. Entre as 3 e 4 horas da manhã, o despertar dos pássaros: um rouxinol solista improvisa, entre notas de um som brilhante e um halo de trinados que se perde no alto das árvores. Transponha isso para o plano religioso: você encontra o silêncio harmonioso dos céus.” Olivier Messiaen - Catalogue d'Oiseaux (1956-1958) 3e livre - L'alouette Lulu Faixa 3, partitura 3 Indicação na partitura: VI – L´ALOUETTE LULU (Lullula arborea) Próximo ao Grand Bois em Saint-Sauveur em Rue, na floresta. À direita da estrada um bosque de pinheiros, à esquerda campos de pastagens. Do alto, da escuridão, a Lulu emite seu canto: uma melodia cromática descendente e líquida. Escondido em um arbusto, um Rouxinol responde. Contraste entre os ornamentos trêmulos do Rouxinol, e a voz misteriosa das alturas. A Lulu, invisível, se aproxima e se distancia. As árvores e os campos são escuros e tranqüilos. É meia-noite. Olivier Messiaen - Mode de valeurs et d´intensités (1949-1950) Faixa 4, partitura 4 O serialismo integral MORGAN, p. 338. “Para os jovens compositores europeus, a peça crítica de Messiaen foi o terceiro dos Quatro Estudos [de Ritmo], com o título de Mode de valeurs et d´intensités [1949-1950]. O prefácio da obra apresenta 3 séries de 12 elementos nas quais a composição se baseia exclusivamente. Cada elemento de cada série está associado a uma altura dentro de uma determinada oitava,

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uma duração, uma dinâmica e um tipo de ataque. As alturas compreendem 3 diferentes séries dispostas em um registro descendente. Na primeira série, que inicia com uma fusa, as durações são determinadas pela adição de uma fusa a cada nota sucessiva; a segunda série começa com uma semicolcheia e a cada nota é adicionada uma semicolcheia; a última série começa com um colcheia e a cada nota se adiciona uma colcheia. Os tipos de ataque (que também são em número de 12, sendo que um deles é a ausência de qualquer indicação) e os níveis de dinâmica (somente 7) são distribuídos livremente, e não seguem uma progressão. [...] A composição, entretanto, não é estruturada serialmente: as séries não são transpostas ou invertidas, nem seus conteúdos são apresentados em uma ordem pré-composicional. Somente os elementos musicais são determinados, não sua sucessão. (Como sugerido pelo título, o material é usado mais como um ‘modo’ do que como uma ‘série’). O que atraiu os jovens compositores foi o rígido ‘construtivismo’ da peça. [...] Embora a geração mais jovem tenha tomado este Estudo como um precedente para o serialismo integral, Messiaen seguiu um caminho diferente.[...] ele nunca adotou o serialismo.” Prefácio de Mode de valeurs et d´intensités (1949-1950) “Esta peça utiliza um modo de alturas (36 sons), de valores rítmicos (24 durações), de ataques (12 ataques) e de intensidades (7 nuances). É inteiramente escrita neste modo. Ataques:

(com o ataque normal, sem símbolo, são 12) Intensidades:

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Alturas: o modo se divide em 3 divisões ou conjuntos melódicos de 12 alturas. Cada modo se estende por diversas oitavas, e se cruzam entre si. Todos os sons de mesmo nome são diferentes como altura, valor e intensidade. Valores rítmicos:

As divisões:

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A opinião de Messiaen sobre o serialismo integral MESSIAEN, p. 47. “Me aborreceu muito a excessiva importância dada a uma pequena peça minha, de apenas 3 páginas, Mode de valeurs et d´intensités, porque ela supostamente deu origem à explosão serial na área de ataques, durações, intensidades, timbres, ou seja, de todos os parâmetros musicais. Talvez esta peça tenha sido profética e historicamente importante, mas musicalmente é próxima do nada.” 1.4 PIERRE BOULEZ (1925-2016) MORGAN, p. 342. “Estimulado pelo exemplo do 3o Estudo de Messiaen, Boulez trabalhou na direção de um serialismo completamente integrado, no qual características de ritmo, dinâmica e ataque era estritamente pré-determinados.[...] O que interessou a Boulez no Estudo foi a rejeição de categorias tradicionais da música, como melodia, acompanhamento e forma, e o mesmo tratamento a todos os elementos musicais. [...] As duas primeiras peças nas quais Boulez tentou uma abordagem mais rigorosa, o Livre pour Quatuor (1949) e Polifonia (1951), ele achou problemáticas e contidas. Sua próxima peça, Estruturas I para 2 pianos (1952), foi um marco na evolução do serialismo.” Pierre Boulez – Structures Ia (1952) Faixa 5, partitura 5 O serialismo integral segundo Boulez, em texto de 1963 BOULEZ, pp. 23 a 25. “Quando começamos a generalizar a série para todos os componentes do fenômeno sonoro, nós nos atiramos de corpo inteiro — ou melhor de ponta-cabeca — nos números, abarcando atabalhoadamente matemática e aritmética elementar; [...] Finalmente, de tanto pré-organizar o material, de "pré-constrangê-lo", desembocara-se no absurdo total: numerosas tabelas de distribuição necessitavam de tabelas de correção, em número mais ou menos equivalente, de onde resultaria uma balística da nota; para acertar, era preciso retificar! [...] As obras deste período manifestam uma extrema rigidez em todos os domínios da escrita; os elementos esquecidos na distribuição das grades pelo compositor e sua varinha mágica, no nascimento da obra, resistem, de maneira veemente, a ordem estranha, hostil, que lhes é imposta; vingam-se a sua moda: a obra não chega a se organizar segundo uma coerência probatória, ela soa mal; sua agressividade não é sempre deliberada.

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Encerrada nesta rede de opressões, seria difícil não se sentir um joguete da lei dos grandes números; finalmente, toda escolha não tinha senão uma importância relativa, chegando tão-somente a cortar uma fatia de acaso. Essa tentativa poder-se-ia chamá-la de uma transferência para os números; o compositor fugia de sua responsabilidade na escolha, a determinação, para transferi-la a uma organização numérica, bem incapaz disto; ao mesmo tempo ele se sentia maltratado por uma organização dessa natureza, no sentido de que ela o fazia depender de um absurdo constrangedor. [...] O diletantismo era aí justificado sob um novo pretexto, por uma espécie de pacto, de contrato renovado com a preguiça mental e a inconsistência intelectual. Desse modo, remendavam-se os mitos mais degenerados de um romantismo barato: restauravam, com efeito, a primazia da "fantasia", da "inspiração"; deixavam-se arrastar, absorver, engolir pelo acontecimento, pela revelação. Que estranho paradoxo! Esta eclosão de "liberdade" encobre a mesma ideologia dos piores desprezadores da expressão contemporânea!” 1.5 KARLHEINZ STOCKHAUSEN (1928-2007) MORGAN, pp. 345-346. “Juntamente com Boulez, o compositor europeu mais influente no desenvolvimento do serialismo integral foi o alemão Karlheinz Stockhausen (1928). Um momento de virada na carreira de Stockhausen foi sua participação no Curso de Nova Música em Darmstadt, onde ele ouviu os Quatro Estudos de Messiaen. [...] Stockhausen passou o ano de 1952 em Paris, onde estudou com Messiaen, travou amizade com Boulez, e trabalhou em 2 composições: Kontra-Punkte para orquestra de câmara e o conjunto de Peças para Piano I-IV, ambas completadas em 1953.” 1.6 IGOR STRAVINSKY (1882-1971) MORGAN, pp. 355-356. “Não se pode mencionar nenhuma indicação de serialismo nos anos 50 mais convincente do que sua adoção por Stravinsky, o único membro da geração de compositores que definiu desenvolvimentos musicais na 1a metade do século que viveu o bastante para desempenhar um papel importante também no segundo. Em 1939, pouco antes da ruptura da IIGM, Stravinsky emigrou para os EUA, estabelecendo-se em Los Angeles, que se manteve sua residência principal para o resto de sua vida. Ele veio a falecer em 1971, com 89 anos, e compôs até quase o final da vida. [...] Ele desenvolveu progressivamente sua abordagem pessoal do serialismo nas seguintes composições: Septeto (1953), 3 Canções para William Shakespeare (1953) e In Memorian Dylan Thomas (1954). Esta última obra, um arranjo de um poema de Thomas para tenor, quarteto de cordas e 4 trombones, foi sua primeira composição completamente serial, derivadas de uma série de 5 notas e suas permutações.”

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1.7 YANNIS XENAKIS (1922-2001) Yannis Xenakis - Metastasis (1954) Faixa 6 MORGAN, p. 392. “A preferência por blocos sonoros maciços também caracteriza a música do compositor grego Iannis Xenakis (1922 [-2001]) [...]. Como formação em engenharia e matemática, ele inicialmente seguiu carreira como assistente do famoso arquiteto Le Corbusier, e interessou-se na tradução de certos tipos de cálculos matemáticos para o design visual de projetos arquitetônicos.[...] [...] em 1950, pouco depois de ter conhecido Le Corbusier, ele retomou seus estudos de música com Messiaen. Interessado nas analogias próximas entre música e arquitetura, ambas vistas por ele como as realizações concretas de cálculos matemáticos abstratos, Xenakis se preocupou cada vez mais com questões de estrutura musical. Seu desenho para o Pavilhão Philipps foi na verdade uma realização alternativa, em um outro meio, de idéias originalmente desenvolvidas para uma composição orquestral, Metastasis (1954). [...] Buscando um tipo de causalidade apropriado a efeitos de massas sonoras, ele começou aplicando em música teorias matemáticas de probabilidade, especialmente as formuladas pelo matemático suíço do séc. XVIII Jacques Bernoulli. [...] Embora Xenakis use cálculos matemáticos para modelar estes eventos musicais ‘probabilísticos’ ou ‘estatísticos’ e para determinar sua distribuição através de uma composição, ele insiste que a ‘música deve dominar’. A matemática é somente uma ferramenta, e ao traduzir os cálculos em indicações precisamente notadas, Xenakis as ajusta para propósitos puramente musicais.” Gráfico para Metastasis:

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2. MUSIQUE CONCRÈTE, MÚSICA ELETRÔNICA, MÚSICA ELETROACÚSTICA

Compositores: Alemanha Herbert Eimert (1897-1978) Karlheinz Stockhausen (1928-2007) França Pierre Schaeffer (1910-1995) Pierre Henry (1927) Brasil Jorge Antunes (1942) Flo Menezes (1962) 2.1 PIERRE SCHAEFFER (1910-1995) Musique concrète MORGAN, Págs. 464 e 465. “O verdadeiro início da música eletrônica como um movimento composicional chave se deu após a II GM, quando novas tecnologias e novas atitudes uniram-se para fomentar seu avanço. As primeiras manifestações significantes deram-se em 1948 na Rádio Nacional Francesa, onde o técnico de som Pierre Schaeffer (1910 - 1995) começou produzindo breves estudos gravados em fita, baseados em transformações de sons ‘naturais’, como os de um trem ou de um piano. Os processos de transformação incluíam a edição de partes do som, a variação da velocidade de reprodução, a execução reversa do som e a combinação de sons diferentes. Já que todo som poderia ser tratado como ‘objeto sonoro’ (o termo de Schaeffer para um evento sonoro sujeito a tais manipulações), qualquer som servia como base para o material musical. Schaeffer chamou este tipo de música eletrônica de musique concrète, nome que se tornou padrão (no original em francês) para todo tipo de música gravada baseada em sons naturais ou ‘concretos’, diferente da ‘música eletrônica’, na qual os sons são produzidos artificialmente, ou seja, por meios puramente eletrônicos.” Pierre Schaeffer - Etude aux chemins de fer Faixa 7 GRIFFITHS, pág. 17. “Em maio de 1948 Pierre Schaeffer criou o primeiro exemplo do que seria conhecido como ‘musique concrète’: Etude aux chemins de fer, uma peça de 3 minutos feita através da manipulação de gravações de trens.”

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2.2 KARLHEINZ STOCKHAUSEN (1928-2007) A música eletrônica MORGAN, págs. 464 e 465. “O primeiro estúdio destinado a produzir música originada puramente de meios eletrônicos foi fundado em 1952 pelo compositor alemão Herbert Eimert (1897-1978) na Rádio da Alemanha Ocidental em Colônia. Além dos gravadores de fita, filtros, câmaras de eco, amplificadores e outros equipamentos encontrados nos estúdios de musique concrète, o estúdio de Eimert também continha equipamentos que geravam sons: osciladores e geradores de ruído. Com estes equipamentos, compositores podiam construir seu próprio material, e não dependiam mais de sons naturais com características timbrísticas pré-determinadas, que, mesmo quando modificadas, não poderiam ser completamente removidas. Para os compositores seriais esta era uma distinção crítica, pois eles viam na música eletrônica um meio de se controlar não somente alturas e durações, mas também o material sonoro. [...] Stockhausen, que se unira a Eimert em Colônia após ter trabalhado por um curto período com Schaeffer em Paris, expressou o seguinte em um artigo de 1952: ‘Para uma obra X somente existirão sons com um caráter X, porque os sons são o resultado de um processo composicional, e não de timbres pré-formados’. As primeiras composições de Stockhausen no estúdio de Colônia, Studie I (1952) e Studie II (1954) são os primeiros exemplos de música eletrônica pura. Elas exploram sistematicamente uma das técnicas básicas da antiga construção eletrônica de sons, a síntese aditiva, através da qual sons são criados combinando-se ondas sinoidais (tons ‘puros’, sem harmônicos) para criar estruturas artificiais de harmônicos, e assim, novos timbres. [...] Stockhausen e o princípio do serialismo total GRIFFITHS, págs. 45 e 46. “Em Studie I (1953) cada som é construído por até 6 freqüências puras tiradas de uma tabela baseada nas proporções 48:20:25:155/8:371/2:30, sendo que essa seqüência deriva das razões na sucessão da 10a menor descendente (12:5), 3a maior ascendente (4:5), 6a menor descendente (8:5), 10a menor ascendente (5:12), 3a maior descendente (5:4). A mesma seqüência governa a construção rítmica, e outras séries de 6 unidades, feitas com os 6 números inteiros, determinam outros aspectos: o número de tons sinoidais em cada som, suas intensidades, a curva de dinâmica aplicada e a duração de pausas.” Karlheinz Stockhausen - O canto do adolescente (1956) Faixa 8 A fusão entre musique concrète e música eletrônica MORGAN, págs. 465 e 466. A insatisfação que surgiu na metade dos anos 50 com as limitações de um serialismo aplicado rigorosamente foi seguido por um descontentamento com as possibilidades da síntese eletrônica pura. As vantagens da precisão e

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controle completo foram ofuscadas pela pobreza timbrística dos sons que poderiam ser conseguidos com as técnicas e equipamentos disponíveis na época. [...] Stockhausen estava cada vez descrente em uma abordagem rígida, na qual cada som era determinado antecipadamente, como resultado da ordem serial dos elementos. Sua próxima composição, Gesang der Jünglinge [Canto do adolescente] (1956), combina sons concrètes, baseados na gravação de um rapaz cantando, com sons puramente eletrônicos. [...] Dessa forma, Gesang lida com uma variedade muito maior de material sonoro do que os estudos anteriores. Além disso ela apresenta um elaborado uso de reverberação e de ‘movimento espacial’, produzido pela rotação do som por 5 alto-falantes independentes, colocados em círculo em torno do espaço de audição. A obra resultante, de grande riqueza, é um marco na história da música eletrônica, como a primeira obra-prima do gênero e a primeira composição a combinar elementos eletrônicos e concrète. Embora a próxima de Stockhausen, Kontakte (1960), fosse puramente eletrônica, todas as suas composições eletrônicas subseqüentes envolveram pelo menos algumas fontes concrète. Por volta da metade dos anos 50, a divisão entre musique concrète e música eletrônica pura, anteriormente vistas como dois métodos distintos baseados em filosofias composicionais essencialmente opostas, tornou-se meramente acadêmica.” O texto foi extraído de uma passagem da Bíblia, do Livro de Daniel: o rei Nabucodonosor lança três jovens ao fogo, por estes recusarem-se a adorar um ídolo; os jovens, porém entoam cânticos de louvor a Deus, e nada lhes acontece. Cânticos utilizados por Stockhausen: Preiset dem Herrn, ihr Werke alle des Herrn – lobt ihn und über alles erhebt ihn in Ewigkeit. Preiset den Herrn, ihr Engel des Herrn – preiset den Herrn ihr Himmel droben. Preiset den Herrn, ihr Wasser alle, die über den Himmeln sind – preiset den Herrn, ihr Scharen alle des Herrn. Preiset den Herrn, Sonne und Mond – preiset den Herrn, des Himmels Sterne. Preiset den Herrn, aller Regen und Tau – preiset den Herrn, alle Winde. Preiset den Herrn, Feuer und Sommersglut – preiset den Herrn, Kälte und starrer Winter. Preiset den Herrn, Tau und des Regens Fall – preiset den Herrn, Eis und Frost. Preiset den Herrn, Reif und Schnee – preiset den Herrn, Nächte und Tage. Preiset den Herrn, Licht und Dunkel – preiset den Herrn, Blitze und Wolken.

Criaturas do Senhor, louvai ao Senhor sobre todas as coisas, por toda a eternidade. Louvai ao Senhor, anjos do Senhor – Louvai ao Senhor, céus. Louvai ao Senhor, águas sobre os céus Louvai ao Senhor, rebanhos do Senhor Louvai ao Senhor, sol e lua Louvai ao Senhor, estrelas do céu Louvai ao Senhor, chuva e orvalho Louvai ao Senhor, todos os ventos Louvai ao Senhor, fogo e calor do verão Louvai ao Senhor, frio e inverno Louvai ao Senhor, orvalho e chuva Louvai ao Senhor, gelo e frio Louvai ao Senhor, gelo e neve Louvai ao Senhor, noites e dias Louvai ao Senhor, luz e escuridão Louvai ao Senhor, raios e nuvens

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2.3 FLO MENEZES (1962) Flo Menezes - PAN: Laceramento della Parola (Omaggio a Trotskij) (1987-88) Faixa 9 A obra segundo o compositor: Encarte do CD Música Eletroacústica - 1955-1993 “Foi a rigor a primeira vez em que derivei toda a forma musical da estrutura fonológica de uma determinada palavra-de-base, cujo processo denominei [...] forma-pronúncia. Nesse procedimento ao mesmo tempo formal, musical e verbal, uma determinada palavra, cujo significado demonstra ser importante para a concepção da obra, é radicalmente estendida no tempo, de modo concreto ou imaginário. [...] Nesse processo, tanto as proporções de durações quanto as características sonoras dos fonemas na pronúncia padrão da palavra em questão são levadas em consideração para a elaboração da forma musical, de modo que, a título de exemplo, um fonema oclusivo (como o /p/ da palavra pan) não perca sua identidade, apesar de sua extensão no tempo. No que se refere às vogais, caracterizadas acima de tudo pelas suas duas primeiras regiões formânticas, levar-se-ão em conta estas ambas formantes e, de acordo com sua localização freqüencial no espectro da vogal, procurar-se-ão projetar tais regiões formânticas no tempo cronológico, enquanto estruturas contrastantes. [...] Se a seconda prattica do barroco taxou a práxis vocal polifônica da Alta Renascença como uma espécie de dilaceração da poesia (laceramento della poesia), então a forma-pronúncia constitui-se intencionalmente como uma radical dilaceração da palavra (laceramento della parola). [...] No caso dessa composição, trata-se da pronúncia imaginária, estendida, da palavra PAN, do mito do panorama, da visão global, e com o qual associa-se a origem da música (flauta de Pã), do eco (através da procura de Pã por sua amada Eco), do pânico. Uma vez que o significado da palavra se perde com sua radical extensão no tempo, deve-se entender aqui a própria morte semântica do mito, mas ao mesmo o surgimento do Universo com sua explosão (momento /p/) e ressonância (momento /a/ - com suas duas formantes, respectivamente de 2’54” a 3’24” e de 3’36” a 3’52” e momento /n/). Por tal via elabora-se, igualmente, uma referência à verbalidade na música de Berio [...] quanto uma homenagem a Trotski, o maior revolucionário de nosso século: com efeito, a evolução da forma-pronúncia da palavra PAN remete-nos também ao golpe assassino em sua cabeça, em 1940. [...] Do ponto de vista técnico, a obra, originalmente quadrafônica, tem como origem 3 fontes, correspondentes aos 3 momentos fonológicos da palavra-de-base: som vocal inicial (som derivado de minha própria voz pronunciando o fonema /p/); sons sintéticos provenientes de síntese por modulação de freqüência; e sons de impulsos (oriundos de um antigo sintetizador ARP, no final da peça - momento /n/ - fazendo sombra ruidosa aos sons nasalizados do último acorde residente).[...] Devido à sua grande tensão inicial [...] e de sua posterior resolutividade refazendo a densidade inicial, não raramente essa obra, apresentada a amigos em circunstâncias ideais de concentração, levaram-nos em seus poucos 7’50” ao transe meditativo ou mesmo ao sono (e isso mesmo à luz do dia), constituindo, assim, um bom exemplo de terapia musical pela sugestividade dos sons eletroacústicos.”

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3. INSTRUMENTOS TRADICIONAIS E NOVAS SONORIDADES Compositores: EUA Edgard Varèse (1883-1965) John Cage (1912-1992) George Crumb (1929) Polônia Krzystof Penderecki (1933) Hungria György Ligeti (1923-2006) Itália Luciano Berio (1925-2003) 3.1 EDGARD VARÈSE (1883-1965) MORGAN, págs. 306-307. “Em 1915, com 32 anos, o compositor francês Edgard Varèse embarcou em um navio para os Estados Unidos para o que ele esperaria ser uma breve visita. O Novo Mundo tornou-se sua residência; ele se casou com uma americana, adquiriu cidadania e escreveu suas principais obras no novo país. Ele parece ter visto sua mudança para os Estados Unidos como uma rejeição simbólica ao seu passado europeu, como parte de uma busca por uma nova música. [...]. Praticamente todas as composições terminadas antes de sua chegada em Nova York perderam-se em um incêndio em Berlim ou foram destruídas pelo compositor. [...] Em uma entrevista de 1915, Varèse expressou o interesse que iria dominar seu pensamento a partir de então: ‘nosso alfabeto musical deve ser enriquecido. Necessitamos urgentemente de novos instrumentos... Musicistas deveriam envolver-se profundamente com esta questão, com a ajuda de especialistas em maquinaria. Eu sempre senti a necessidade de novos meios de expressão em meu trabalho. Eu me recuso a submeter somente a sons que já foram ouvidos. Estou procurando por novos meios técnicos que possam levá-los a toda expressão de pensamento’. [...] Os novos instrumentos que Varèse estava procurando nas primeiras décadas do século não eram meros produtores de novos sons. Ele imaginou sofisticadas máquinas eletrônicas que tornariam disponíveis possibilidades sonoras sem precedentes, como um âmbito contínuo de sons, incluindo todas as possíveis divisões da escala temperada, o que poderia ser precisamente controlado pelo compositor. [...] somente após a IIGM, quando começou a surgir a música eletrônica, Varése conseguiu colocar em prática suas idéias musicais radicais. Em suas primeiras obras, portanto, Varèse teve que se contentar com instrumentos existentes.”

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As “massas sonoras” MORGAN, pág. 312. “Em toda a música de Varèse, o foco principal está mais nos efeitos texturais e trimbrísticos do que em um motivo específico ou detalhes harmônicos. Não há distinção entre melodia e acompanhamento. As notas individuais são freqüentemente não concebidas como partes de ‘linhas’ ou ‘harmonias’, mas constituem o que o compositor chamava de ‘massas sonoras’, configurações inteiras de notas que agiam juntas para produzir um caráter sonoro geral. Assim a abertura de Intégrales pode ser vista como um ‘contraponto de massas’, no qual múltiplos planos de atividade musical interagem uns com os outros em variadas combinações. Os termos do compositor para as várias técnicas de combinação e oposição de tais materiais são esclarecedores: ‘colisão’, ‘penetração’, repulsão’, transmutação’, etc. [...] Partindo dos elementos mais básicos de seus materiais [...] ele tentou delinear contextos formais nos quais eles poderiam funcionar como ‘objetos sonoros’, como eventos plásticos a serem moldados, combinados e fundidos pelo compositor, como um escultor com materiais físicos. [...] Por 20 anos [após 1936] ele não apresentou nenhuma composição. Um motivo foi sua insatisfação com os instrumentos convencionais e suas restrições pelo que ele chamava de ‘tirania da escala temperada’.” A ênfase na percussão. MORGAN, págs. 307-308. “Varèse via a percussão como o único componente da orquestra que ainda oferecia oportunidades para uma significante expansão e para a introdução de novos timbres. [...] A ênfase na percussão, uma das características mais significantes do estilo de Varèse, não vem somente da sua busca por novos timbres. É também importante o fato de que em sua música a altura não é mais necessariamente o elemento musical mais significante.” Edgar Varèse - Ionisation (1931) Faixa 10, partitura 6 MORGAN, pág. 312 “Ionisation [1931] é freqüentemente considerada a obra mais revolucionária [de Varèse], pois foi a primeira peça de concerto escrita exclusivamente para percussão.” 3.2 JOHN CAGE (1912-1992) MORGAN, pág. 359. “Cage foi significantemente influenciado por Varèse. Em uma palestra de 1937, com o título de ‘O futuro da música:Credo’, ele apresentou dois princípios básicos de origem varésiana que norteariam seu desenvolvimento nas próximas décadas: em primeiro lugar, o princípio do conceito de música como

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‘organização de som’, sendo que ‘som’ é definido no sentido mais amplo possível, englobando todos os tipos de ruído, bem como eventos musicais ‘normais’; em segundo lugar, como conseqüência, o fato de que ‘os métodos atuais de escrita musical, principalmente aqueles que empregam harmonia como referência, serão inadequados para o compositor, que se deparará com todo o campo sonoro’.” A percussão DUCKWORTH, págs. 83 - 84. “A fascinação de Cage pela percussão e pelo ruído pode ter-se desenvolvido de duas fontes diversas. Uma foi o contato com Oskar Fischinger, um pioneiro do cinema abstrato, que tinha uma noção excêntrica de que todo objeto possuía uma alma, que se expressava somente quando este objeto produzisse algum som. A segunda foi sua crescente convicção de que a música para percussão, ou seja, a música sem uma referência fixa de altura, seria a transição da música do passado, influenciada pelo teclado, para a ‘música do futuro, de todos os sons’. Para Cage, o ruído, que está sempre presente em nossas vidas, perturba quando ignorado, mas é fascinante quando ouvido. Segundo ele próprio, ‘queremos capturar e controlar estes sons, usá-los não como efeitos sonoros, mas como instrumentos musicais’.” John Cage – Sonatas e interlúdios – Sonata no. 5 (1948) Faixa 11, partitura 7 O piano preparado DUCKWORTH, pág. 84. “Cage trabalhou com a percussão por quase uma década, [...] organizou um orquestra de percussão, encorajou compositores a escreverem novas peças, e deu vários concertos. Em Seattle, a dançarina Syvilla Fort pediu que ele escrevesse música para uma nova peça, que ela chamou de Bacchanale. Cage viu-se diante de um dilema, pois o local onde seria apresentada a peça era muito pequeno para sua orquestra de percussão, e o piano, com suas alturas definidas, era inadequado para a natureza da dança de Fort. A solução, encontrada somente alguns dias antes da apresentação, foi o piano preparado. Basicamente, o piano preparado é um piano de cauda comum cujo som é alterado com a colocação de objetos como parafusos, pinos e pedaços de madeira e borracha entre as cordas. O efeito é de uma alteração drástica das características acústicas do instrumento, até o ponto em que o som do piano se torna irreconhecível. Esta preparação criava uma série de sons, cada um com um timbre diverso, que iam das oitavas mais baixas às mais altas sem as características de altura de escalas ou modos. Cage imediatamente viu este novo instrumento como ‘uma orquestra de percussão sob o controle de um único instrumentista’.

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Sonatas e interlúdios DUCKWORTH, pág. 86 - 87. “A estréia de Sonatas e Interlúdios se deu em Janeiro de 1949, no Carnegie Hall de Nova York, com o pianista Maro Ajemian. Para muitas pessoas, sobretudo para platéias dos anos 50, uma performance das peças de Cage para piano preparado foi a experiência musical mais incomum e perturbadora que eles já haviam tido. A aparência do piano no palco não era diferente, assim como a entrada do pianista para tocar o instrumento, porém em vez de ouvir o som tradicional do piano, eles ouviram sons metálicos de chocalhos, baques e golpes - ‘ruídos’ ricos em som, mas fora de um contexto histórico ou cultural. Risos, raiva e espanto foram as respostas mais comuns.” 3.3 KRZYSTOF PENDERECKI (1933) Clusters MORGAN, pág. 387. “As composições mais antigas de Penderecki, como Salmos de David (1958) e Estrofe (1959), embora fossem de um caráter serial um pouco livre, já revelam uma preferência pela construção de segmentos de intervalos cromáticos através do acoplamento de cada nota com uma ou ambas das notas cromáticas vizinhas. Esta tendência levou Penderecki a desviar seu foco das alturas individuas para os ‘clusters’. [...] Penderecki usou os clusters como um ponto de partida para o desenvolvimento composicional, sujeitando-os a vários tipos de processos: variação através de mudança na registração, extensão ou densidade.” Krzystof Penderecki - Trenodia para as vítimas de Hiroshima (1960) Faixa 12, partitura 8 MORGAN, pág. 387. “A Trenodia para as vítimas de Hiroshima para 62 instrumentos de cordas, concluída em 1960, está entre as mais antigas composições com clusters de Penderecki. [...] Já que é impossível ouvir alturas individuais em tais faixas cromáticas, o ouvinte percebe somente uma massa indiferenciada, de uma determinada extensão e nível de dinâmica. O efeito é de ‘ruído’, e não de um grupo de alturas distintas. (Aqui a tendência do serialismo de reduzir as diferenciações de alturas e intervalos chegou a conseqüências radicais.) Na verdade, através desta obra e de outras escritas no mesmo período, Penderecki ignorou essencialmente todas as distinções entre altura e ruído, usando livremente um amplo espectro de sons disponíveis. Embora Trenodia tenha sido escrita para instrumentos de cordas normais, algumas técnicas especiais de execução são introduzidas para estender a gama de possibilidades sonoras, como tocar entre o cavalete e o estandarte, tocar atrás do cavalete ou no estandarte, bater na caixa sonora com as pontas dos dedos.

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Trenodia agrupa estes sons incomuns em vários padrões textuais, transformando, desenvolvendo e mediando entre eles para criar a forma geral. Noções tradicionais de melodia, harmonia e compasso medido são completamente ausentes. Indicações de ritmo são dadas pela referência do número de segundos ocupadas por um determinado segmento formal, e a posição precisa de cada evento dentro do segmento é designada somente de forma aproximada. Entretanto, muito em Trenodia continua sendo tradicional. O aspecto ‘imitativo’ [...] é uma das várias técnicas quase-canônicas usadas na partitura, e a forma da peça projeta claramente um padrão A- B- A: uma seção central concebida mais pontilhisticamente colocada entre duas seções dominadas por clusters.” 3.4 GYÖRGY LIGETI (1923-2006) STOLBA, pág. 678. “A significância de Ligeti vem do fato de ele ter se afastado de áreas que atraíam a atenção de muitos compositores da avant-garde, como o serialismo e suas conseqüências e a música eletrônica, e partido para desenvolvimentos técnicos que influenciaram toda uma nova geração de compositores.” György Ligeti - Lux Aeterna (1966) Faixa 13, partitura 9 Textura musical STOLBA, pág. 678. “Ele se concentrou no desenvolvimento de texturas musicais, de forma que a importância de outros elementos da música passaram para um segundo plano. Nas peças para orquestra Aparições (1959) e Atmosferas (1961) ele se concentrou em complexos cromáticos, com alturas em clusters sustentados, e evitou qualquer sensação de harmonia, pulso rítmico ou durações definidas. Entretanto, estas obras estão precisamente escritas em uma notação convencional.” GRIFFITHS, pág. 136. “Ligeti chegou a um desenvolvimento mais completo de sua técnica de clusters em Atmosphères para orquestra (1961) e Volumina para órgão (1961-2), nas quais não há mais tentativa de uso de unidades de altura, duração, dinâmica e timbre de uma forma serial, ou de qualquer outra forma. [...] O movimento rítmico é eliminado através de entradas irregulares dos instrumentos (uma técnica para a qual Ligeti criou o termo ‘micropolifonia’), da ênfase em sons sustentados (a obra é para uma orquestra sem percussão, incomum no período) e da inexistência de um sentido de pulso; a harmonia é mantida em suspensão com o uso de clusters. Todos estes efeitos em continuidade provocam uma experiência de som como textura - o tipo de experiência que Ligeti havia indicado em seu ensaio de 1960.”

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György Ligeti - Continuum (1968) Faixa 14, partitura 10 Indicação na partitura de Continuum: “Prestissimo - extremamente rápido, de forma que os tons individuais dificilmente possam ser percebidos, e se fundam em um continuum. Toque de forma muito uniforme, sem qualquer tipo de articulação. O andamento correto é atingido quando a peça dura menos que 4 minutos (sem contar a longa fermata no final). As linhas tracejadas verticais não são barras de compasso (não há métrica nessa peça), e servem somente como um meio de orientação.” 3.5 LUCIANO BERIO (1925-2003) Virtuosismo e as Sequenze Site do IRCAM: Instrumentação, data de composição e duração aproximada das Sequenze de Berio:

Sequenza I, para flauta 1958 6' Sequenza II, para harpa 1963 9' Sequenza III, para voz feminina 1966 8' Sequenza IV, para piano 1966 8' Sequenza V, para trombone 1966 6' Sequenza VI, para viola 1967 8' Sequenza VII, para oboé 1969 7' Sequenza VIII, para violino 1976 13' Sequenza IXa, para clarinete 1980 14' Sequenza IXb, para saxofone contralto 1981 13' Sequenza X, para trompete 1984 15' Sequenza XI, para violão 1988 14' Sequenza XII, para fagote 1995 25' Sequenza XIII, chanson, para acordeon 1995

GRIFFITHS, pág. 192. “Cada uma de suas obras para solistas, sejam solo ou concertantes, parecem surgir de forma direta do instrumento envolvido: do exercício físico de tocá-lo, e da sua história e repertório. O que se segue é que os efeitos técnicos são enraizados em como a música é: não são ornamentos nem arabescos de dificuldade acidental.” BERIO, pág. 76. “No conjunto das Sequenze há vários elementos unificadores, planejados ou não. O elemento mais óbvio e mais exterior é o virtuosismo. Tenho muito

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respeito pelo virtuosismo, ainda que essa palavra possa despertar risadinhas irônicas e possa até evocar a imagem do homem elegante e um pouco diáfano com os dedos ágeis e a cabeça oca. O virtuosismo nasce freqüentemente de um conflito, de uma tensão entre a idéia musical e o instrumento, entre o material e a matéria musical.[...] Outro elemento unificador da Sequenze é a minha própria consciência de que os instrumentos musicais não podem ser realmente transformados, nem destruídos, nem inventados.[...] um instrumento musical é por si mesmo uma parte da linguagem musical. Tentar inventar um novo instrumento é fútil e patético tanto quando qualquer outra tentativa de se inventar uma nova regra gramatical para nossa língua. O compositor só pode contribuir para a transformação dos instrumentos musicais usando-os e procurando entender, post factum, a natureza complexa das transformações.” Luciano Berio - Sequenza III per voce femminile (1966) Faixa 15, partitura 11 Sequenza III GRIFFITHS, pág. 192. “Todas as Sequenze são performances compostas.[...] Sequenza III é o arranjo de um curto poema de Markus Kutter, mas a preocupação principal [...] é mais com o comportamento vocal do que com o sentido verbal: as palavras, deliberadamente elementares, são para serem confundidas. [A partitura] mostra algo da variedade de estilos vocais que a peça exige, e também mostra o uso característico de Berio de indicações psicológicas (‘tenso’, ‘vertiginoso’, etc) sem justificativa no texto. A música não expressa uma situação dramática; ela é essa situação.” MORGAN, pág. 443 - 444. “Um outro exemplo inovador da escrita vocal recente pode ser encontrado na variedade imprecedente de recursos vocais empregados. Luciano Berio tem sido uma figura de destaque neste contexto. Em obras pioneiras como Circles para voz, harpa e 2 percussionistas (1960) [...] e Sequenza III para voz solo (1966) Berio estende as fronteiras da produção vocal consideravelmente além dos limites da canto ‘normal’. Esta última obra emprega uma gama de novos efeitos timbrísticos comparáveis àqueles introduzidos na mesma época na música instrumental. Sequenza III exige que o cantor produza sons respirando, arfando, fazendo ‘cliques’ com a boca, cantando com a mão sobre a boca, cantando com a boca fechada, sussurrando, rindo e falando, e também cantando normalmente.” BERIO, pág. 80-81. “De fato Sequenza III não apenas escrita para Cathy [Berberian], mas sobre Cathy. Fui sempre muito sensível, demais até, ao excesso de conotações que a voz tem em si. A voz, do ruído ao canto mais refinado, significa sempre alguma coisa, remete sempre para algo diferente dela e cria uma gama muito vasta de associações: culturais, musicais, cotidianas, emotivas, fisiológicas,

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etc. [...] A voz de um cantor ‘clássico’ parece-se com um instrumento de autor que, assim que se termina de tocá-lo, é guardado em um estojo, isto é, nada tem a ver com a voz que o mesmo grande cantor usa para comunicar-se na vida de todos os dias. [...] A experiência de Sequenza III foi muito importante para mim porque foi precisamente com ela que eu procurei assimilar musicalmente muitos aspectos da vocalidade cotidiana, mesmo triviais, sem renunciar porém a aspectos intermediários e mesmo ‘nobres’ da experiência musical vocal.” Texto de Markus Kutter: give me a few words for a woman to sing

a truth

allowing us

to build a house

without worrying

before night comes

Tradução: dê-me algumas palavras para uma mulher cantar

uma verdade

que nos permita

construir uma casa

sem preocupações

antes que a noite chegue

Algumas indicações na partitura: “A intérprete (cantora, atriz ou ambos) surge no palco murmurando, como não se desse conta de sua entrada. Ela cessa de murmurar pouco antes do término dos aplausos do público, e retoma após uma curta pausa (aproximadamente nos 11” da partitura). As ações vocais devem ser cronometradas de acordo com as divisões em 10” de cada página.” “Gestos das mãos, faces e corpo além dos especificados na partitura devem ser empregados a critério da intérprete, de acordo com as indicações de emoções e comportamento vocal (tenso, urgente, distante, sonhador, etc). A intérprete, entretanto, não deve tentar representar tensão, urgência, distância ou sonho, mas deve deixar essas indicações agirem como um fator condicionador para sua ação vocal (sobretudo os aspectos de cor e entonação) e atitudes corporais. Os processos envolvidos nesse condicionamento não devem ser convencionalizados, mas devem ser experimentados pela intérprete de acordo com seu código emocional próprio, sua flexibilidade vocal e sua ‘dramaturgia’ ”

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3.6 GEORGE CRUMB (1929) Instrumentação MORGAN, pág. 420. “George Crumb [...] utilizou uma variedade de instrumentos de outras tradições musicais [...], assim como instrumentos e efeitos vocais especiais (por exemplo, cantar para dentro de um piano aberto com o pedal de sustentação pressionado) que produzem efeitos exóticos e atmosféricos. A música de Crumb é notável por sua combinação de simplicidade formal e complexidade timbrística.” George Crumb – Makrokosmos I (1972) Partitura 12 Notação MORGAN, pág. 378. “A ênfase no valor gráfico em partituras recentes estimulou em alguns compositores uma preocupação sem precedentes com características puramente visuais de suas obras. [...] O americano George Crumb (1929), embora seja um compositor tradicional que se baseia quase que exclusivamente na notação convencional, geralmente arranja suas composições em padrões de efeito visual surpreendente, freqüentemente com um conteúdo simbólico explícito, como um círculo ou uma cruz.” George Crumb - Apparition (1979) 1. The night in silence under many a star Faixa 16, partitura 13 Apparition BLAND, William. Comentários para o encarte do CD com a obra. “Escrita em 1979, Apparition é sua primeira obra para voz solo e piano. O texto foi retirado de "When Lilacs Last in the Dooryard Bloom'd", um conjunto de poemas de Walt Whitman, escritos nas semanas que seguiram ao assassinato de Abraham Lincoln, em 14 de abril de 1865. Em Apparition, cada canção forma um tableau, e o material literário e musical se focam em metáforas concisas e contrastantes para existência e morte. Porém o ciclo de Crumb nos oferece alguma esperança, pois como nos versos de Whitman, a morte nunca é representada como um fim da vida, mas ao invés disso é circular, sempre um início ou retorno enriquecido a uma força vital universal. Na 1a canção, The Night in Silence under Many a Star (a noite em silêncio sob várias estrelas), o piano abre o ciclo com uma pulsante evocação da natureza, acompanhando a soprano que canta símbolos de eternidade: “a noite”, símbolo do universo físico; “o oceano” símbolo de movimento e tempo; “a alma”, representativa da consciência; e “o retorno do corpo a vós”, ilustrativo do ciclo de vida e morte. Com a apresentação desta simbologia coloca-se um cenário no qual surgirão outras visões pessoais da morte.”

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4. MÚSICA ALEATÓRIA Compositores: EUA John Cage (1912-1992) Alemanha Karlheinz Stockhausen (1928-2007) A Indeterminação: MORGAN, pág. 359. “Entre os desenvolvimentos mais significativos da música do pós-guerra encontra-se a indeterminação - o uso intencional do acaso na composição e/ou performance. [...] sua utilização remonta a pelo menos a Idade Média, porém a indeterminação na música surgiu como um fenômeno difundido e amplamente influente somente nos anos 50, e é portanto característica de um período extremamente recente da história da música. Sua aceitação por um grande número de musicistas durante os anos 50 deveu-se principalmente à atuação de um único compositor, o americano John Cage.” 4.1 JOHN CAGE (1912-1992) A indeterminação segundo Cage GRIFFITHS, págs. 24 e 25. “[...] os sons chegam na composição sem a vontade ou decisão do compositor, e sem nenhuma conexão deliberada com outros sons. Eles não seriam planejados, e nenhuma linguagem musical lhes conferiria algum sentido. A continuidade da composição é livre do gosto individual e da memória, e também da literatura e das ‘tradições’ da arte. Os sons entram no tempo-espaço centrados em si mesmos, desimpedidos de qualquer abstração, seus 360 graus de circunferência livres para uma gama infinita de interpretações. A natureza desta obra não permite julgamentos de valores com relação à composição, performance ou audição. A idéia de relação é ausente, tudo pode acontecer. A idéia de ‘erro’ não existe, pois desde que algo aconteça, esse ‘algo’ é autêntico.” MORGAN, pág. 362. “Em 1951 [Cage] chegou à crença de que o único modo de se criar uma música completamente não-intencional seria excluir completamente a intervenção humana do processo composicional, removendo o compositor ‘das atividades do som’ de forma que eles pudessem simplesmente ser eles mesmos. O compositor deveria ‘desistir do desejo de controlar o som, limpar sua mente de música, e começar a descobrir meios de deixar os sons serem eles mesmos, e não veículos para teorias artificiais ou expressões de sentimentos humanos’”.

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Composições MORGAN, pág. 362. “Esta crença levou Cage a introduzir elementos do acaso no processo composicional. Em Music of Changes (1951), para piano, todos os elementos da estrutura musical - altura, silêncio, duração, amplitude, tempo e densidade - eram escolhidos usando-se tabelas derivadas do I-Ching, o oráculo chinês, e atirando-se moedas. Em Music for Piano (1952-56), as alturas eram determinadas procurando-se imperfeições em um pedaço de papel, sendo que o acaso incluía decisões dos intérpretes: durações (notadas arbitrariamente como semínimas sem hastes) e níveis de dinâmica eram deixadas inteiramente ao impulso momentâneo do intérprete.[...] Das 7 composições chamadas de Variações, nas quatro primeiras (1958-63) os intérpretes têm pedaços de plástico transparente onde estão desenhados pontos, linhas e círculos, com instruções para que estes sejam sobrepostos, e as configurações gráficas resultantes são as indicações para a perfomance. A partitura de Concerto para Piano e Orquestra (1958), para piano solo e 13 instrumentistas, consiste de indicações puramente gráficas e indicações musicais distorcidas, que são interpretadas mais ou menos de acordo com a vontade de cada músico. John Cage – 4’33” (1952) Partitura 14 Tradução: “ 4’33” para qualquer instrumento ou combinação de instrumentos” “Nota: o título deste peça é a duração total de minutos e segundos da performance. Em Woodstock, N.Y., no dia 29 de agosto de 1952, o título era 4’33” e as 3 partes eram 33”, 2’40” e 1’20”. Foi interpretada pelo pianista David Tudor, que indicou o início de cada parte fechando a tampa do piano, abrindo-a nos finais. Depois da performance em Woodstock, uma cópia em notação proporcional foi feita para Irwin Kremen, e nessa cópia as durações dos movimentos eram 30”, 2’23” e 1’40”. Entretanto, a obra pode ser interpretada por qualquer instrumentista ou instrumentistas, e os movimentos podem ter qualquer duração.”

Influência de Cage MORGAN, pág. 364. “Cage influenciou o desenvolvimento da música após os anos 50 mais do que qualquer outro compositor americano, possivelmente mais do que qualquer outro compositor de qualquer nacionalidade. Embora talvez mais considerado como um filósofo musical do que um compositor, o conceito de Cage sobre o que a música poderia e deveria ser teve um profundo impacto em seus contemporâneos, incluindo muitos que escreviam uma música completamente diferente da sua”.

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4.2 KARLHEINZ STOCKHAUSEN (1928-2007) Karlheinz Stockhausen – Klavierstück XI (1956) Faixas 17 e 18 (2 versões), partitura 15 MORGAN, Robert P. Twentieth-Century Music. Pág. 371. “A turnê de Cage pela Europa [em 1954] estimulou Stockhausen e Boulez a abordar o serialismo de um modo mais livre e intuitivo. [...] Em Peça para Piano XI, sua primeira peça aleatória, Stockhausen colocou em uma mesma página 19 segmentos musicais separados e instruiu o intérprete a mover de um segmento a outro seguindo um impulso momentâneo; na conclusão de cada segmento ele colocou indicações para a interpretação do segmento seguinte, de forma que segmentos repetidos raramente soariam idênticos. A peça deveria terminar quando um segmento fosse tocado 3 vezes. Zyklus (1959), para percussão solo, tem uma diferente abordagem. A partitura é construída de forma que pode ser lida também ao contrário (de cabeça para baixo), e o intérprete pode começar a qualquer ponto da página. Porém, quando a direção e o ponto de início são decididos, toda seqüência de eventos é determinada, e a performance prossegue normalmente até que se atinja novamente o ponto de início, e a performance termina. [...] Embora o interesse de Boulez pela indeterminação tenha diminuído nos anos 60, Stockhausen a utilizou nessa década com crescente interesse. [...] Atingiu seu estágio máximo em Aus den sieben Tagen (Dos 7 dias, 1968), que foge completamente do uso de qualquer material ‘pré-formado’ e pede aos intérpretes que improvisem em textos puramente verbais fornecidos pelo compositor. Aqui está Intensidade, um dos 15 textos:

Toque os sons individuais Com tal dedicação até que Você sinta o calor Que irradia de você. Toque e sustente-os O tempo que puder.”

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5. MINIMALISMO Compositores: EUA Terry Riley (1935) Steve Reich (1936) Philip Glass (1937) O retorno ao tonal: MORGAN, pág. 423. “As influências do Oriente mostram-se em um outro desenvolvimento musical significante dos anos 60: a tendência a uma música mais simples e direta, despojada de complexidades técnicas e conflitos emocionais evidentes em várias formas da música ocidental. [...] Tecnicamente, ela envolve estruturas tonais estáticas, ritmos repetitivos, consistência e transparência textural, e constante repetição temática.” O Minimalismo: MORGAN, pág. 423. “Durante os anos 60 um grupo de jovens compositores americanos partiu para a exploração das possibilidades de trabalho com meios drasticamente reduzidos, limitando-se aos elementos musicais mais básicos. Embora todos tenham sido influenciados de certa forma por Cage, estes compositores, que incluíam La Monte Young, Terry Riley, Steve Reich e Philip Glass, desenvolveram-se independentemente. Não preocupados com a indeterminação, eles estavam mais interessados em trazer a música de volta a uma base mais elementar, libertando-a do peso acumulado das convenções ocidentais, começando de novo do zero. O movimento que iniciaram, chamado de minimalismo, tornou-se uma das mais forças mais influentes da música recente.” GRIFFITHS, pág. 209. “Minimalismo é um termo do qual nenhum compositor gosta, usado para designar um fenômeno que quase nenhum compositor ativo desde os anos 60 evitou. Suas características essenciais são duas: extrema redução e simplicidade de meios, e repetição.” 5.1 TERRY RILEY (1935), STEVE REICH (1936) e PHILIP GLASS (1937) GRIFFITHS, pág. 211. “Por volta da mesma época, Steve Reich (1936) e Philip Glass (1937) começaram a combinar repetição e processo. Ambos foram influenciados por tradições não-ocidentais: Glass trabalhou com Ravi Shankar [...] e também

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estudou as tablas com Alla Rakha antes de compor suas obras mais conhecidas, e Reich estudou percussão africana e gamelões balineses em Seattle, antes de embarcar em sua carreira de compositor e intérprete. Em nenhum dos dois casos, porém, a exploração da world-music levou a um abandono do conceito ocidental de arte, ou de afinação e instrumentação ocidentais. Segundo Reich, ‘qualquer um pode estudar as estruturas rítmicas da música não-ocidental, e deixar este estudo levá-lo onde desejar, e mesmo assim continuar usando instrumentos, escalas e qualquer outro som que se ouviu a vida toda’.” Terry Riley - In C (1964) Faixa 19, partitura 16 Steve Reich - Piano phase (1967) Faixa 20, partitura 17 STOLBA, pág. 682. “O interesse de Reich por figuras e padrões repetitivos levou-o ao minimalismo e um vocabulário harmônico consideravelmente reduzido em suas obras. Ele criou composições para um acorde (Four Organs, 1970) ou para poucas palavras (Come Out, 1966).” MORGAN, pág. 427 “Trabalhando com fita magnética [Steve Reich] ficou fascinado com as possibilidades de “defasagem”, ou seja, tocar dois ou mais trechos idênticos em velocidades ligeiramente diferentes de forma que as repetições gradualmente se separem (“fora de fase”) uma da outra e eventualmente voltem a se sincronizar. [...] A primeira peça para piano em que Reich incorporou a defasagem foi Piano Phase para dois pianos (1967). A primeira seção é inteiramente baseada em um único padrão melódico construído a partir de 5 alturas, distribuídas em uma figura rítmica que consiste de 12 semicolcheias sucessivas. [...] Um pianista começa sozinho, apresentando o padrão de 4 a 8 vezes, em seguida o segundo pianista entra, gradualmente atingindo o mesmo nível de dinâmica que o primeiro. Os dois pianos tocam em uníssono de 12 a 18 vezes, em seguida o segundo pianista gradualmente começa a acelerar (o que na partitura é indicado por pontos) enquanto o primeiro mantém o tempo original. [...]. Esse processo continua por toda a primeira seção, que termina quando o segundo piano finalmente completa o ciclo e está novamente em uníssono com o primeiro.

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Steve Reich - Clapping music (1972)

GRIFFITHS, pág. 211. “Nas primeiras obras de Glass o princípio básico da estrutura rítmica era o mais simples possível: o da adição, repetição ou remoção de unidades em um contexto de repetição e stasis harmônica.”

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Philip Glass – Two Pages (1969) Faixa 21

Philip Glass - Opening (1981) - trecho Faixa 22

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6. TENDÊNCIAS DA MÚSICA ATUAL2

6.1 TENDÊNCIAS DA SIMPLICIDADE

As tendências de simplificação de materiais sonoros e de processos de elaboração musical têm levado parte dos compositores atuais a empregar indiscriminadamente elementos derivados da música minimalista, tradições tonais (séc. XVII-XIX) e recursos modais (músicas antigas, orientais, medievais, culturas autóctones ou do Leste europeu) para a criação de novas narratividades musicais, através da combinação de sonoridades díspares ou conhecidas em novos contextos de significação. GRIFFITHS, p. 214-221: “O fato de que Ligeti em 1971 ter dado o título de Melodien a uma peça orquestral é um sinal de que o minimalismo foi parte de uma recuperação da simplicidade e definição em música - uma recuperação notável até mesmo em compositores explicitamente hostis ao minimalismo. [...] Stockhausen foi o compositor cuja restauração da melodia foi mais surpreendente, mais sistemática e mais consciente. Tendo usado a notação de forma aberta em suas obras do final dos anos 60, ele abruptamente apresentou uma partitura completamente notada em Mantra para dois pianistas e moduladores (1970). Tudo nessa obra com uma hora de duração é derivado de uma melodia - ou ‘fórmula’, para usar o termo de Stockhausen - sujeita a variação, e a contração e expansão rítmica.” MORGAN, pág. 374. “Apesar da evolução radical de Stockhausen durante os anos 60, [...] ele retornou a métodos composicionais mais tradicionais com Mantra (1970), uma extensa obra para dois pianos, inteiramente especificada e notada convencionalmente”. Site http://www.stockhausen.org “Após a passagem de Stockhausen pela música eletrônica nos anos 50 e pela indeterminação nos anos 60, Mantra, de 1970, para dois pianos e amplificação, é um retorno a recursos mais tradicionais de composição, como o uso da notação tradicional e ênfase na melodia. Toda a peça é baseada em um motivo de 13 notas (mantra), e se divide em 13 ciclos; cada ciclo é derivado das características de cada uma das 13 notas (duração, intensidade, etc). Stockhausen descreve como a idéia da composição lhe ocorreu durante uma viagem de carro de Madison a Boston (EUA): ‘Tive a idéia de uma única figura ou fórmula musical que se seria expandida por um longo período de tempo, 50 ou 60 minutos. E estas notas seriam os centros em torno dos quais eu continuamente apresentaria a mesma fórmula em uma forma menor...’.”

2 Baseado em material do Prof. Fernando Mattos

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COMPOSITORES • György Kurtág (Romênia, 1926) • Arvo Pärt (Estônia, 1935) • La Monte Young (EUA, 1935) • Frederic Rzewski (EUA, 1938) • Leo Brower (Cuba, 1939) • Klarenz Barlow (Índia, 1945) • Kevin Volans (África do Sul, 1949) • John Adams (EUA, 1947) • Walter Zimmermann (Alemanha, 1949) • Wolfgang Rihm (Alemanha, 1952) • Dave Heath (Inglaterra, 1956) • Dimitri Yanov-Yanovski (Ubequistão, 1963) • Régis Campo (França, 1968) • Thomas Adès (Inglaterra, 1971) • Lera Auerbach (Rússia, 1973) • Meredith Monk (EUA, 1943) • Michael Nyman (Inglaterra, 1944)

6.1.1 NOVA SIMPLICIDADE

Tendência de caráter subjetivo-intuitivo que se rebelou contra as correntes de vanguarda das décadas de 1950-60, nas quais predominavam a objetividade, o cálculo e a construção serial. Análoga a movimentos como o Pós-Minimalismo, Neotonalismo, o Ultraromantismo e a Nova Expressividade, a Nova Simplicidade surgiu em finais da década de 1970, em Colônia, na Alemanha, e permanece como uma das tendências mais fortes da música contemporânea.

Wolfgang Rihm (1952) - Dèpart (1988) Faixa 23 Wolfgang Rihm, em entrevista a Kirk Noreen e Joshua Cody, 2006:

“Eu sou um compositor intuitivo; e mesmo se não fosse, somente poderia escrever a minha própria música. Não se pode criar arte com tabus. Naturalmente, somente quebrando tabus também não se faz arte. Em ambos os casos, o que surge são objetos que se parecem com arte. [...]

De volta às tríades: eu não era, de forma alguma, o único a empregá-las. Talvez, em minha música, elas chocassem de forma mais provocativa, provavelmente porque não serviam ao propósito de garantir ‘beleza’, mas eram empregadas no mesmo nível que (quase) qualquer outra manifestação sonora, governadas por fluxos expressivos que não poderiam ser inteiramente analisados de modo racional. Isso era equivalente à alta traição, aos olhos dos modernistas”.

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Arvo Pärt (1935) - Festina Lente (1988/90) Faixa 24 Encarte do CD Miserere “Compositor estoniano, suas obras encontram grande divulgação no mercado fonográfico atual. Rejeitando as possibilidades que a tecnologia moderna oferece atualmente à produção musical, suas obras permanecem puras e despretensiosas, apresentando um caráter profundamente sacro, e uma simplicidade e despojamento que às vezes o aproxima do minimalismo. Festina Lente (1988/90) é um adagio para cordas com harpa ad libitum, onde Pärt relembra o início da Era Cristã.” A simplicidade segundo Pärt: DUCKWORTH, pág. 164 “Descobri que é suficiente quando uma simples nota é tocada de forma bela. Esta nota, ou uma pausa, ou um momento de silêncio, me conforta. Trabalho com pouco material, com uma voz, duas vozes. Construo a partir da matéria mais primitiva, de uma tríade, de uma determinada tonalidade.” 6.1.2 PÓS-MINIMALISMO Morton Feldmann (1926-1987) - Three Voices for Joan la Barbara (1982) Faixa 25 Encarte do CD com a obra Three Voices for Joan la Barbara: “Nascido em Nova York (EUA), e amigo de John Cage, [Feldmann] desenvolveu uma linguagem composicional intuitiva, livre de sistemas, trabalhando de momento em momento, de som em som. Three voices, de 1982, é uma série de pequenas peças a 3 vozes para uma só cantora (ela se apresenta com duas vozes gravadas por ela mesma). Todas as peças são baseadas em uma estrutura rítmica e melódica extremamente simples. Feldman diz: “Um dos meus amigos mais próximos, o pintor Philip Guston, acabara de falecer; Frank O´Hara havia falecido há vários anos. Eu vi a peça com Joan (Joan la Barbara, a cantora para quem Feldman compôs a peça) à frente e atrás dela os dois alto-falantes. Os alto falantes pareciam lápides de uma sepultura. Eu pensei na peça como uma troca da voz viva com as dos mortos - uma mistura dos vivos e dos mortos”.

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Michael Nyman (19440 - Trysting Fields, da trilha sonora de Drowning by Numbers (1988) Faixa 26

PWYLL AP SIÔN, verbete “Michael Nyman” em The New Grove Dictionary of Music and Musicians.

Embora Nyman se baseie em seu conhecimento e experiência do

minimalismo americano, elementos distintivos da sua linguagem musical o diferenciam dessas influências. Ele falou de sua abordagem mais "intuitiva" para o processo, no qual "o ouvido ao invés do processo é o árbitro inicial e final" (1977, p.7). Além disso, a proeminência do baixo em sua música, além de sugerir a influência de rock, cria uma estabilidade harmônica e um enraizamento mais característico na tradição tonal europeu do que no minimalismo americano. É essa confluência muitas vezes curiosa de ritmos e texturas de rock e funções harmônicas clássicas que caracterizam a música de Nyman como uma fusão rica e eficaz dos códigos das artes “elevada” e popular. Encarte do CD Drowning by numbers:

Michael Nyman compôs trilhas para vários filmes como “O Piano”, “A Última Tempestade”, “ O Cozinheiro, o Ladrão, A Mulher e seu Amante”, e peças para formações e instrumentos tradicionais, como quartetos, quintetos e concertos. No filme Drowning by numbers (Afogando em números), dirigido pelo inglês Peter Greenaway em 1988, são mostrados os números de 1 a 100, (às vezes de forma clara, como no número de uma casa ou na placa de uma carro, ou de forma velada, como na página de um livro ou na impressão minúscula em uma caixa de fósforos, mas sempre em seqüência), uma referência aos 100 minutos do filme.

Impressionado com a melodia breve porém encantadora do 2o movimento da Sinfonia Concertante de Mozart, Nyman a utilizou na composição da trilha do filme. Todas as faixas são baseadas em pequenos trechos deste movimento.

O exemplo abaixo mostra um trecho dos solos de violino e viola da Sinfonia Concertante, no qual podem ser reconhecidos vários motivos utilizados por Nyman na faixa Trysting Fields. Wolfgang Amadeus Mozart – Sinfonia concertante em mib maior K. 364 (1779) 2. mov - Andante Faixa 27

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Trecho da Sinfonia Concertante de Mozart:

Antonio Pinto - Central do Brasil (1997) Faixa 28

Filho do escritor e cartunista Ziraldo, Antonio Pinto estudou com o compositor Michael Nyman, e a influência das composições de Nyman pode ser percebida na trilha sonora do filme Central do Brasil, de 1997, que Antonio Pinto compôs junto com Jaques Morelenbaum. Meredith Monk (1943) - Gotham Lullaby (1977) Faixa 29 GRIFFITHS, págs. 274 - 275. “Meredith Monk começou a desenvolver um minimalismo de vozes - sua própria e de um pequeno grupo de musicistas treinados por ela - cantando geralmente sem acompanhamento, sem vibrato e em intervalos e motivos simples, como se o canto tivesse acabado de ser descoberto.”

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A voz segundo Monk: DUCKWORTH, pág 170 “Em cada canção, procuro a voz. Meu interesse é que cada som tenha um tipo particular de caráter. Não penso em ‘caráter’ necessariamente em um sentido literal, mas que isso, de certa forma, cria um mundo próprio. Então estou sempre tentando descobrir vozes novas. Não quero ouvir uma voz que eu já tenha feito.” 6.2 MÚSICA ESPECTRAL

A expressão Música Espectral foi usada pela primeira vez em um artigo de Hughes Dufourt: Música espectral: por uma prática das formas de energia (1979). A música espectral surge em oposição à extrema racionalização do período Pós-Guerra e à construção musical embasada em cálculos que prescindem das relações acústicas entre os sons. Assim, os compositores de música espectral retornam à análise das relações acústicas básicas existentes em um único som, geralmente com o auxílio de programas de computador e analisadores eletrônicos do espectro harmônico de sons fundamentais, buscam suas referências em autores antigos e modernos que analisaram a formação do som, desde Pitágoras, Mersenne e Helmholtz, até Busoni, Hindemith e Cowell. COMPOSITORES • Horatiu Radulescu (Romênia, 1942-set., 2008) • Iancu Dumitrescu (Romênia, 1944) • Gérard Grisey (França, 1946-1998) • Tristan Murail (França, 1947) • Claude Vivier (Canadá, 1948-1983) • Michaël Levinas (França, 1949) • Kaija Saariaho (Finlândia, 1952) • Magnus Lindberg (Finlândia, 1958) • Ana-Maria Avram (Romênia, 1961) • Julian Anderson (Inglaterra, 1967) • Joshua Fineberg (EUA, 1969)

Esses músicos fazem crítica tanto aos princípios da música tonal

tradicional quanto da música serial, ambas embasadas na divisão da oitava em 12 partes e propõem a divisão da oitava em tantas partes quantas possam ser audíveis e a organização desse material com base na análise do som propriamente dito, e não de cálculos exteriores à natureza sonora, com isso, ampliam as possibilidades da música microtonal e utilizam, muitas vezes, recursos eletrônicos para análise e manipulação dos sons ditos “naturais”.

Ben Johnston (1926) - Sonata Para Piano Microtonal (1964) - I. Allegro Faixa 30

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Ben Johnston (1926) sobre sua Sonata Para Piano Microtonal: “A Sonata, se apresentada como a bela ou como a fera, é uma parodia-

enigma monstruosa, alusiva, referencial, às vezes sarcástica, distorcida, um tecido de familiaridade em traje radicalmente estranho....Onde quer que o humor final venha à mente, é revestido com ironia e escárnio.

A seqüência de andamentos da Sonata coloca um desafio: rápido, mais rápido, lento, mais lento. Será que, no finale da Sonata, quando os nós forem finalmente desamarrados, ficará claro do que Houdini escapou?” Gérard Grisey (1946-1998) - Partiels (1975) para 18 músicos Faixa 31

Partiels (1975), de Grisey, faz parte de um ciclo denominado Les Espaces Acoustiques, sendo considerada a peça seminal da música espectral por ter influenciado vários músicos posteriores.

Segundo Fineberg, o início de Partiels está embasado na análise do sonograma do ataque de uma nota mi grave no trombone. O espectro sonoro dessa nota está distribuído entre os instrumentos da orquestra de forma a criar as primeiras transformações ocorrentes na música.

Devido ao uso de escalas e processos musicais derivados diretamente da ressonância acústica, os compositores espectrais interessam-se por culturas orientais e do Leste europeu. Isso deve-se, também, ao fato de que, entre os primeiros músicos espectrais, estão os romenos Radulescu, Dumitrescu e Avram. Na França, foi criado o Groupe de l’Itinéraire e na Romênia o Hyperion Ensemble, ambos dedicados à interpretação e divulgação de música espectral. Compositores espectrais também se dedicam às pesquisas eletroacústicas.

6.3 TENDÊNCIAS DA COMPLEXIDADE COMPOSITORES • Brian Ferneyhough (Inglaterra, 1943) • Michael Finnissy (Inglaterra, 1946) • Nigel Osborne (Inglaterra, 1948) • James Dillon (Escócia, 1950) • Franklin Cox (EUA, 1961) • Florivaldo Menezes Filho (Brasil, 1962) • Liza Lim (Austrália, 1966) • Aaron Cassidy (EUA, 1976)

6.3.1 NOVA COMPLEXIDADE

Movimento ultra-modernista que surgiu na Inglaterra, no início dos anos 1980, em reação direta às novas tendências de simplificação do material

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sonoro e das estruturas musicais, como o Minimalismo, o Neotonalismo e a Nova Simplicidade.

Considera-se que expressão tenha sido empregada pela primeira vez por Nigel Osborne, porém o uso em texto mais antigo conhecido é no artigo Quatro Facetas da Nova Complexidade (1988), do musicólogo Richard Toop. Os pioneiros da Nova Complexidade são Brian Ferneyhough e Michael Finnissy, que buscavam novos meios de seguir no caminho aberto pelo Atonalismo e pelo Serialismo, com base na chamada música estocástica de Xenakis e no princípio de modulação métrica de Carter. Suas principais referências são: • Elliott Carter (EUA, 1908-2012) • Iannis Xenakis (Grécia, 1922-2001) • Pierre Boulez (França, 1925-2016) • Luciano Berio (Itália, 1925-2003)

A Nova Complexidade caracteriza-se pela escrita musical extremamente

complexa, muitas vezes até impossível de decifrar. Esta é uma das intenções desses compositores: fazer com que os intérpretes se dediquem exaustivamente às suas obras.

Em termos de sonoridade, esta música apresenta vários elementos derivados das vanguardas do Pós-Guerra, tais como: técnicas instrumentais expandidas, ausência de linhas melódicas, ritmos irregulares e aperiódicos, combinações incomuns de instrumentos, contraponto intrincado e estruturas assimétricas, entre outras características.

Considera-se que, atualmente, há duas tendências derivadas da Nova Complexidade da década de 1980: - Atenção aos mínimos detalhes e às microestruturas sonoras, a partir de Ferneyhough; - Atenção à macroestrutura e à forma geral, tomada como um todo, com base nos ensinamentos de Finnissy. Pierre Boulez (1925-2016) Pierre Boulez, em entrevista a Michel Foucault, 1983: “As obras tenderam a se tornar acontecimentos singulares que têm certamente seus antecedentes, mas são irredutíveis a qualquer esquema condutor admitido, a priori, por todos, o que cria, certamente, um entrave para a compreensão imediata. Espera-se que o ouvinte se familiarize com o percurso da obra e que, para isso, ele deva ouvi-la um certo número de vezes [...]. Há cada vez menos chances de que o primeiro contato possa despertar a percepção e a compreensão. [...] Sei perfeitamente [...] que, para além de uma certa complexidade, a percepção se encontra desorientada em um caos inextricável, que ela se entedia e recua. [...] Certas modulações da escuta já se produzem, bem mal, aliás, além de certas delimitações históricas. [...] Essa profunda respiração dos séculos se situa no extremo oposto das tossidas asmáticas do passado que os fanáticos

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pelos reflexos fantasmáticos do passado nos fazem ouvir em um espelho embaçado. [...] Uma cultura é forjada, persiste e se transmite em uma aventura de dupla face: às vezes, a brutalidade, a contestação, o tumulto; às vezes, a mediação, a não-violência, o silêncio. Qualquer que seja a forma de aventura, é inútil ignorá-la; [...] há períodos agudos, em que a coincidência se dá mais dificilmente, em que tal aspecto da invenção parece sair totalmente daquilo que podemos tolerar ou razoavelmente absorver; existem outros períodos em que se produzem recaídas de uma ordem mais imediatamente acessível”. 6.4 MÚSICA ACUSMÁTICA Os discípulos de Pitágoras eram separados em dois grupos:

- Círculo dos iniciados (mathēmatikoi), que participavam diretamente dos debates com o mestre;

- Círculo dos ouvintes (akousmatikoi), que apenas participavam como ouvintes das preleções do mestre, o qual ficava atrás de uma cortina para não ser visto. Somente após um período de cinco anos, esses ouvintes eram aceitos no círculo dos iniciados.

Na publicação de 1966 de seu Tratado dos Objetos Musicais, Pierre

Schaeffer, um dos pioneiros da música concreta, empregou o termo acusmático, definindo-o como “um som que se escuta sem perceber quais são as causas que estão por trás de sua formação”. Assim, o autor pretende que a música produzida por alto-falantes – que, portanto, prescinde de executantes ao vivo – dirija-se diretamente à percepção do ouvinte, sem a interferência de aspectos visuais existentes em concertos convencionais.

Com base nessa redução fenomenológica, proposta por Schaeffer, vários autores posteriores propõem o direcionamento da percepção para a natureza do som em si mesma, de forma a tornar o ouvinte consciente do campo perceptivo que está em primeiro plano, na música: a audição. Utilizando como metáfora, o círculo dos ouvintes (akousmatikoi) pitagóricos, esses músicos consideram que, na música eletroacústica, a fonte sonora permanece velada pela cortina dos alto-falantes, direcionando a percepção aos seus aspectos audíveis. Chama-se isso de música acusmática. Michel Chion tornou essa expressão amplamente difundida.

A música acusmática é aquela em que o músico trabalha com o som, e somente o som, como material de construção musical. O material sonoro pode ser tanto registrado através de gravadores, com base em sons “naturais” (tanto sons da Natureza, quanto sons urbanos) ou em sons “musicais” (som de vozes ou instrumentos), como pode ser produzido sinteticamente através de aparelhos eletrônicos (sintetizadores). Os sons iniciais podem ser elaborados, transformados e combinados de formas infinitas para produzir a “organização sonora” final (E. Varèse).

PRECURSORES • Léon Theremin (1896-1993)

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• Edgard Varèse (França, 1883-1965) • Pierre Schaeffer (França, 1910-1995) • Iannis Xenakis (Grécia, 1922-2001) • Pierre Boulez (França, 1925-2016) • Pierre Henri (França, 1927) • Karlheinz Stockhausen (Alemanha, 1928-2007)

COMPOSITORES ATUAIS • François Bayle (Madagascar, 1932) • Dennis Smaley (Nova Zelândia, 1946) • Sergio Barroso (Cuba,1946) • Michel Chion (França, 1947) • Wende Bartley (Canadá, 1951) • Paulo Chagas (Brasil, 1953) • Roberto Carnevale (Itália, 1966) • Rodolfo Acosta (Colômbia, 1970)

6.5 POLIESTILÍSTICA

Movimento pós-modernista que se caracteriza pelo hibridismo estilístico,

realizado através de entrecruzamento de referências estéticas, materiais sonoros díspares, processos de composição derivados de diferentes épocas e lugares. A tendência poliestilística propõe a ruptura das diferenças entre estilos considerados elevados e baixos, estruturas simples e complexas, gêneros eruditos e populares, música do passado e música atual, música regional e universal, alta tecnologia e baixa tecnologia, etc.

Para Jonathan Kramer (EUA, 1942-2004), pós-moderno, em música, significa mais uma atitude sócio-cultural do que um estilo ou um período histórico. O autor enumera 16 características da música pós-moderna: • não é simplesmente um repúdio ao modernismo, pois possui tanto

aspectos de ruptura quanto de continuidade; • é irônico, de alguma forma e em algum nível; • não respeita fronteiras entre sonoridades e procedimentos do passado e

do presente; • desafia as barreiras entre estilos elevados e estilos baixos; • demonstra desdém em relação ao valor inquestionável da unidade

estrutural; • questiona a exclusividade mútua entre valores populistas e elitistas; • evita formas totalizantes, isto é, não espera que uma peça seja

inteiramente tonal ou serial, por exemplo, nem se preocupa com moldes formais prestabelecidos;

• não considera música como uma atividade autônoma, mas como parte relevante de contextos culturais, sociais e políticos;

• insere citações ou referências a músicas de diferentes tradições e culturas;

• considera a tecnologia não apenas como um meio de preservar ou transmitir a cultura, mas como estando profundamente implicada na produção e na essência da música;

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• inclui contradições; • despreza oposições binárias; • envolve fragmentos e descontinuidades; • engloba pluralismo e ecletismo; • sustenta a possibilidade de múltiplos significados e múltiplas

temporaliadades; • situa significados e estruturas nos ouvintes, mais do que nas partituras e

suas execuções, ou nos compositores; COMPOSITORES • Sofia Gubaidulina (Rússia, 1931) • Andrei Volkonsky (Suíça, 1933-set. 2008) • John Zorn (EUA, 1953) • Eduardo Seincman (Brasil, 1955) • Michael Gordon (EUA, 1956) • David Lang (EUA, 1957) • Tan Dun (China, 1957) • Julia Wolfe (EUA, 1958) • Osvaldo Golijov (Argentina, 1960) • Régis Campo (França, 1968) • Ciarán Farell (Irlanda, 1969) • Yitzhak Yedid (Israel, 1971) • Lera Auerbach (Rússia, 1973)

Luciano Berio (1925-2003) - Sinfonia (1969) Faixa 32

A obra de referência para a poliestilística é a Sinfonia (1969), de Luciano Berio (1925-2003). O próprio compositor enumera, entre as citações existentes na Sinfonia, trechos musicais de Bach, Berlioz, Brahms, Strauss, Mahler, Stravinsky, Schoenberg, Boulez e Stockhausen, fragmentos de Lévi-Strauss (O Cru e o Cozido) e Beckett (O Inominável), além de excertos de um discurso de Martin Luther King, pronunciado pouco antes de seu assassinato. A citação mais importante, porém, é o Scherzo da Sinfonia Nº 2 de Mahler, que aparece na terceira parte da obra como “um esqueleto que sempre surge de corpo inteiro cuidadosamente vestido e depois desaparece e torna a aparecer... Mas nunca está sozinho: acompanha-o a ‘história da música’ que ele próprio desperta em mim, com toda a sua pluralidade de níveis e abundância de referências” (Berio). A Sinfonia de Berio marca uma mudança de ponto de vista com relação aos critérios clássicos de unidade e variedade, pois seu princípio fundamental reside na “interação de uma variedade de coisas, situações e significados. De fato, o desenvolvimento musical da Sinfonia é constante e fortemente condicionado pela busca de equilíbrio e identidade entre as vozes e os instrumentos, entre a palavra falada ou cantada e a estrutura sonora como um todo.

É por isso que a percepção e a inteligibilidade do texto nunca são tomadas em si mesmas, mas, ao contrário, são inteiramente integradas à composição. Assim, os vários graus de inteligibilidade [...], juntamente com a

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experiência do ouvinte de quase falhar na sua compreensão, devem ser vistas como essenciais para a verdadeira natureza do processo musical.

O texto da quarta parte produz gesticulações, mais do que enuncia fragmentos verbais tirados das partes anteriores (com uma breve referência à Segunda Sinfonia, de Mahler, no início)”. MORGAN, pág. 412 - 413. “Um outro exemplo é o 3o movimento da Sinfonia de Berio para 8 vozes solistas e orquestra (1968). Através de todo movimento flui o scherzo da Sinfonia no. 2 de Mahler. Embora seja responsável por determinar a forma e a continuidade temporal, o scherzo fornece o principal substrato, funcionando como um ‘portador’ de materiais musicais adicionais, a maioria deles citações. Indo de Monteverdi a Stockhausen, estas citações adicionais são de natureza fragmentária, unidas como as peças de um quebra-cabeças. Berio descreveu a música de Mahler como ‘um rio que passa por uma paisagem em constante mudança, às vezes entrando pela terra e às vezes voltando à superfície em um lugar completamente diferente, às vezes bastante evidente em sua jornada, às vezes desaparecendo completamente, presente como uma forma completamente reconhecível ou como pequenos detalhes perdidos em uma multidão circundante de presenças musicais’.” Alfred Schnittke (1934-1998)

O ensaio As tendências poliestilísticas na música moderna (1989), do compositor Alfred Schnittke (1934-1998), também é um marco, no sentido da poliestilística:

“Apesar de todas as dificuldades e todos os perigos que encerram a poliestilística, seus benefícios indiscutíveis já são evidentes. Estes residem no alargamento da expressão musical, em uma maior facilidade para integrar os estilos ‘nobres’ e os estilos ‘comuns’, os estilos ‘banais’ e os estilos ‘refinados’, em uma palavra, em um universo alargado e em uma democratização de estilos.

A realidade musical pode ser objetivada de forma documental, pois não aparece unicamente como o reflexo do indivíduo, mas também através das citações (na terceira parte da Sinfonia de Berio, ouvimos uma advertência impressionante e apocalíptica com respeito à responsabilidade de nossa geração quanto ao futuro de nossa Terra, e isto é representado por uma colagem de citações de testemunhos musicais de diferentes épocas, o que lembra o cinema de orientação política dos anos 1970.”

Os compositores se apropriaram dos novos procedimentos para a exploração dramático-musical de questões eternas como a guerra, a paz, a vida e a morte.

A poliestilística na ópera de Bern Alois Zimmermann Os Soldados traz à luz para sempre a significação da idéia humanitária desta composição. É um protesto contra a máquina de guerra do século XVIII que foi responsavel pela destruição dos personagens da peça de Jakob Lenz, e igualmente contra o militarismo como tal, qualquer que seja o lugar ou o momento de sua aparição.

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A alma poliestilística da música – onde o estilo pessoal do compositor funde o jazz à música concreta, servindo-se do canto gregoriano, do coral protestante, das características polifônicas dos séculos XIV e XV – mostra as etapas da evolução como características, porém não somente de sua época.

No oratório de Sergei Slonimsky, Uma Voz do Coro, é alcançada uma elevação filosófica similar sobre o tempo, graças a meios poliestilísticos. Aqui, as profecias de Ernst Bloch a propósito do futuro do mundo são realizadas graças a uma multiplicidade de meios que vão de um moteto coral, no estilo da música do século XVI, até processos seriais e aleatórios.

Na realidade, seria difícil encontrar outra técnica musical que fosse tão bem adaptada quanto a poliestilística à expressão da idéia filosófica de continuidade”. Tan Dun (1957)

“Toda minha aldeia era doida. Tínhamos um grupo de carpideiras contratado para funerais e enterros… um coro xamanístico que dava o tom do luto. Em Hunan, onde cresci, as pessoas acreditam que serão recompensadas, após a morte, pelos seus sofrimentos. A morte era a ‘felicidade branca’ e os rituais musicais lançavam o espírito no território de uma vida nova. Os instrumentos musicais eram improvisados: potes e caçarolas, utensílios de cozinha e sinos. A celebração do retiro tinha por base em cada vida particular.

A tradição da ‘ópera fantasma’ tem centenas de anos. O participante da ‘ópera fantasma’ dialoga com sua vida passada e futura – um diálogo entre passado e futuro, espírito e natureza. É realmente muito bonito assistir a uma Ópera Fantasma. Uma grande tigela de vidro é colocada em um suporte e iluminada por baixo, produzindo reflexos fantásticos.

No primeiro movimento (Bach, Monges e Shakespeare Encontram-se na Água), o violinista fricciona um arco em um gongo que está na água e bate com a mão na água; os outros instrumentistas do quarteto de cordas tocam Bach; ouvem-se as exalações do monge fantasmagórico; Wu Man toca pipa. O som de uma canção tradicional chinesa se mistura a Bach.

O segundo movimento (Dança da Terra) inicia com sons distantes, em pizzicato, e termina com Bach; são acrescentados elementos naturais, que se tornam parte deles. O monge exala e orienta, mas não há som. Ele conduz o silêncio.

No terceiro movimento (Diálogo com a Couve-Flor), a canção folclórica inicia na pipa e viaja pelo violino, até que a música de Bach e a canção folclórica aparecem simultaneamente. Elas combinam perfeitamente duas eras distintas e, juntas, tornam-se algo totalmente diferente.

No quarto movimento (Metal e Pedra), os músicos do quarteto tocam todo tipo de pratos e pedras, golpeando uns contra os outros, levando-os à boca e movimentando as mãos para modificar a sonoridade: um trio de pedras. Então, os violinos imitam as pedras e os gongos, até que tudo se transforma em um quarteto de cordas.

Um gongo marca a transição para o quinto movimento (Canção de Papel). A “garotinha” (Wu Man) segura sinos e canta o lamento da Couve-Flor – uma menina que perdeu seus pais. Que canção estranha, melancólica. É a essência do espiritual. Pode-se falar com o passado, a pedra pode dialogar

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com o violino e a Couve-Flor pode cantar sua infelicidade. Um violinista recita o texto final e aparece um grande instrumento, feito de papel, que é tocado. Bach retorna, mas é partido em pedaços, combinado com os gongos de água, submergindo na água e desaparecendo.”

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