artigo: toré potiguara: dança, crença, e tradição

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1 O TORÉ POTIGUARA: DANÇA, CRENÇA, E TRADIÇÃO Aline Almeida de Lima José Romildo Araújo da Silva 1 RESUMO O foco deste artigo consiste em analisar o ritual do Toré Potiguara a partir da bibliografia consultada. O nosso objetivo foi compreender os símbolos, a origem e os significados deste ritual que de acordo com nossa compreensão, representa a vida, a grandeza, e a beleza desta etnia. Tivemos por base uma pesquisa bibliográfica, mas também fizemos uso de algumas análises etnográficas a partir de nosso contato com os Potiguara. Buscamos apresentar nossa compreensão do universo cultural e religioso em que o Toré está inserido. E concluímos que a este ritual convergem inúmeras e preciosas tradições, vivifica-se a ancestralidade, unifica-se o povo entorno de um universo sagrado. Fortalecidos espiritualmente os índios conseguem lutar pela sua etnia, e defender seu território. O Toré Potiguara historicamente vem se estabelecendo como símbolo de identificação e autenticidade étnica, um verdadeiro tesouro cultural repassado de pai para filho desde tempos imemoriais através da vivência e da oralidade. Valemo-nos de alguns teóricos, como: BARCELLOS, SILVA, e VIEIRA, dentre outros, para dar suporte a partir dos dados coletados na nossa pesquisa. É visível o esforço que vem sendo realizado nas aldeias, afim de preservar esse legado milenar, presente no ritual do Toré. Assim, acreditamos que esta pesquisa contribua para que o leitor conheça a mística do ritual que é praticado, e também vivenciado pelos índios Potiguara. PÁLAVRAS-CHAVES: Toré; Potiguara; Cultura. 1- INTRODUÇÃO Neste artigo analisaremos o Toré Potiguara buscando compreender o que este ritual representa dentro da espiritualidade, cosmovisão e religiosidade desta etnia. Primeiramente, faremos uma contextualização histórica dos índios Potiguara e de sua religiosidade; em segundo, mostraremos os aspectos mais relevantes que envolve a prática do ritual (ritos e símbolos); prosseguiremos apresentando a relação do ritual do Toré na Religiosidade Potiguara; e nas considerações finais, faremos uma síntese das conclusões que obtivemos a partir desta pesquisa. 1 Alunos concluintes do curso de Licenciatura em História da Universidade Vale do Acaraú/UVA/Unavida.

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Artigo que trata sobre a religiosidade dos índios Potiguara da Paraíba, em especial sobre os principais elementos do Toré.

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Page 1: Artigo: Toré Potiguara: Dança, Crença, e Tradição

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O TORÉ POTIGUARA: DANÇA, CRENÇA, E TRADIÇÃO

Aline Almeida de Lima

José Romildo Araújo da Silva1

RESUMO

O foco deste artigo consiste em analisar o ritual do Toré Potiguara a partir da

bibliografia consultada. O nosso objetivo foi compreender os símbolos, a origem e os

significados deste ritual que de acordo com nossa compreensão, representa a vida, a

grandeza, e a beleza desta etnia. Tivemos por base uma pesquisa bibliográfica, mas

também fizemos uso de algumas análises etnográficas a partir de nosso contato com os

Potiguara. Buscamos apresentar nossa compreensão do universo cultural e religioso em

que o Toré está inserido. E concluímos que a este ritual convergem inúmeras e preciosas

tradições, vivifica-se a ancestralidade, unifica-se o povo entorno de um universo

sagrado. Fortalecidos espiritualmente os índios conseguem lutar pela sua etnia, e

defender seu território. O Toré Potiguara historicamente vem se estabelecendo como

símbolo de identificação e autenticidade étnica, um verdadeiro tesouro cultural

repassado de pai para filho desde tempos imemoriais através da vivência e da oralidade.

Valemo-nos de alguns teóricos, como: BARCELLOS, SILVA, e VIEIRA, dentre

outros, para dar suporte a partir dos dados coletados na nossa pesquisa. É visível o

esforço que vem sendo realizado nas aldeias, afim de preservar esse legado milenar,

presente no ritual do Toré. Assim, acreditamos que esta pesquisa contribua para que o

leitor conheça a mística do ritual que é praticado, e também vivenciado pelos índios

Potiguara.

PÁLAVRAS-CHAVES: Toré; Potiguara; Cultura.

1- INTRODUÇÃO

Neste artigo analisaremos o Toré Potiguara buscando compreender o que este

ritual representa dentro da espiritualidade, cosmovisão e religiosidade desta etnia.

Primeiramente, faremos uma contextualização histórica dos índios Potiguara e de sua

religiosidade; em segundo, mostraremos os aspectos mais relevantes que envolve a

prática do ritual (ritos e símbolos); prosseguiremos apresentando a relação do ritual do

Toré na Religiosidade Potiguara; e nas considerações finais, faremos uma síntese das

conclusões que obtivemos a partir desta pesquisa.

1 Alunos concluintes do curso de Licenciatura em História da Universidade Vale do

Acaraú/UVA/Unavida.

Page 2: Artigo: Toré Potiguara: Dança, Crença, e Tradição

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Compreendemos que o indígena carrega no seu sangue a herança dos

antepassados, e que tem a responsabilidade de perpetuar as tradições que vão sendo

repassadas de geração em geração. Nesse mesmo foco, percebemos que existem

inúmeras possibilidades que envolvem a dimensão religiosa Potiguara na prática do

Toré como: o recebimento de forças provenientes de Tupã2, da Mãe-Natureza3, dos

ancestrais, e dos Encantados4 para dissipar males, resolver intrigas, curar doenças,

restaurar energias, vivificar tradições, e fortalecer a luta pela terra unificando a etnia.

Verificamos que nas aldeias existem muitas tradições, algumas bem estudadas e

conhecidas como o ritual do Toré, e outras nem tanto, por acontecerem discretamente na

intimidade das famílias como as rezas, os ritos para entrar na mata, nos rios, nas furnas,

no mangue, na reverência às árvores, nas oferendas aos encantados.

Em qualquer lugar do território Potiguara, você poderá encontrar

essas e muitas outras práticas religiosas e haverá sempre um

índio Potiguara cultuando a Deus, orando, pagando promessa,

falando em língua ou dançando Toré quer seja, na sua aldeia,

dentro da área indígena ou, muito provavelmente, no seu

entorno, nos municípios paraibanos de Baía da Traição,

Marcação, Rio Tinto, Mamanguape, Mataraca, podendo chegar

até a João Pessoa e a outras cidades da região. (BARCELLOS,

2005, p. 01)

Fizemos estudos de campo, realizamos entrevistas, e coletamos dados a partir de

nossa vivência com os Potiguara afim de apresentar também uma perspectiva de dentro

para fora, comparando nossas experiências com a bibliografia estudada, e desta forma

compreender melhor todos os aspectos da religiosidade Potiguara sintetizada no Ritual

do Toré.

2- O POVO POTIGUARA E SUA RELIGIOSIDADE

Os Potiguara fazem parte dos povos da família linguística Tupi. Hoje, falam o

português e estão revitalizando o tupi na educação escolar indígena.

2 Segundo Clastres (1978), Tupã é o nome inventado pelos brancos para chamar a divindade dos índios de

Deus. 3 Segundo Barcellos (2005), Na cosmovisão indígena, a Mãe Natureza constituem os elementos: terra,

águas, matas, furnas, cachoeiras e tudo que integra os lugares sagrados onde moram os espíritos e os

ancestrais. 4 Segundo Vieira (2010) Os Potiguara descrevem os encantados como os habitantes de locais específicos

como a mata, o mangue, e as aguas e os definem pelo atributo da invisibilidade e por dois predicados

específicos: a humanidade e a imortalidade.

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E como todos os povos que vivem no Nordeste, possuem uma longa história de

contato com a sociedade não indígena sendo provavelmente, os únicos dentre os povos

indígenas situados no Brasil a viver no mesmo lugar desde a chegada dos colonizadores

há mais de 500 anos. Os Potiguara habitam o norte do estado brasileiro da Paraíba, junto

aos limites dos municípios de Rio Tinto, Marcação e Baía da Traição. O conjunto das

32 (trinta e duas) aldeias5 estão localizadas em três Terras Indígenas (TIs). A TI

Potiguara6 (população de 8.109 pessoas), a TI Jacaré de São Domingos7 (população de

449 pessoas) e a TI Potiguara de Monte-Mór8 (população de 4.447 pessoas). Este grupo

social constitui-se uma das maiores etnias indígenas do Brasil com a população de

aproximadamente 19 (dezenove) mil indígenas, 13 (treze) mil encontram-se aldeados,

enquanto o restante vive fora da área indígena, principalmente nas cidades próximas,

mas também nas grandes capitais como: João Pessoa, Rio de Janeiro e São Paulo.

(CARDOSO, 2012, p.15)

Conhecidos historicamente desde 1501, os Potiguara ocupavam

um território que se estendia pela costa do Nordeste, entre as

cidades de Fortaleza/CE até João Pessoa/PB, [...] Na Paraíba,

ocupavam todo o Vale do rio Mamanguape, do litoral até a atual

Serra da Raiz (na época, Serra da Cupaoba). De acordo com

Baumann (1981), os índios possuíam 50 aldeias na terra do caju

azedo, também conhecida como Acakutibiró, hoje, Baía da

Traição. (BARCELLOS, Op. cit., p. 42)

Seus primeiros aliados europeus foram os franceses com quem resistiram as

diversas tentativas de conquista do Rio Paraíba. Até que com a ajuda dos índios

Tabajaras, os portugueses conseguiram conquistar a região e fundaram em 1585 a vila

de Nossa Senhora das Neves (atual cidade João Pessoa). Nas décadas seguintes, os

Portugueses prosseguiram avançando rumo ao norte afim de consolidar o domínio sobre

toda capitania até que em 1599, esgotados por uma epidemia de varíola os Potiguara se

renderam aos lusitanos que logo iniciaram os trabalhos de colonização e catequização

deixando aos indígenas apenas três opções:

5 As localidades consideradas aldeias são: Akajutibiró, Bemfica, Bento, Cumaru, Forte, Galego, Lagoa do

Mato, Laranjeira, Santa Rita, São Francisco, São Miguel, Silva da Estrada, Tracoeira no município de

Baía da Traição; Brejinho, Caieira, Camurupim, Carneira, Coqueirinho, Estiva Velha, Grupiúna de Baixo,

Grupiúna de Cima, Ybyküara, Jacaré de César, Jacaré de São Domingos, Lagoa Grande, Tramataia, Três

Rios e Vau em Marcação; Boréu, Jaraguá, Monte-Mór e Silva de Belém em Rio Tinto. 6 TI Potiguara: possui 21.238ha que foram demarcados em 1983 e homologados em 1991. 7 TI Jacaré de São Domingos: 5.032 ha, cuja homologação ocorreu em 1993. 8 TI Monte-Mór: 7.100 há, com 7.487 ha, em Marcação e Rio Tinto, demarcada em 2007.

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“Ou se tornavam cristãos, ou escravos, para alcançarem a salvação através do

sofrimento, ou, pelo contrário, sendo irredutíveis em seus corações, a morte” (SILVA,

2011, p.34). Em meados do século XVII os holandeses, trouxeram consigo a religião

reformada, e o povo Potiguara se dividiu na guerra entre portugueses e holandeses pelo

controle da economia açucareira.

Pedro Poti é um dos primeiros indígenas Potiguara a aceitar ser

cristão evangélico, a tal ponto de morrer sem renunciar sua fé,

mesmo com as torturas sofridas, após sua captura. Hoje muitos

Potiguara também seguem a mesma ideologia religiosa do

parente distante Pedro Poti, professam a fé segundo os

ensinamentos evangélicos. (SILVA, 2011, p.104)

Após a expulsão dos holandeses, os índios que não foram exterminados foram

reunidos em torno de aldeamentos missionários por todo o litoral do Nordeste. Na

Paraíba, na região do Mamanguape foram criados os aldeamentos da Preguiça9 (na atual

TI de Monte-Mór) e o de São Miguel da Baia da Traição. Nestes locais os Potiguara

foram catequisados de acordo com a fé Católica, sua cultura e sua religiosidade

sofreram grandes transformações através dos trabalhos realizados pelos missionários,

principalmente carmelitas, e franciscanos que contribuíram para apagar grande parte da

cultura, crenças e tradições indígenas vistas como pagãs, demoníacas e inferiores. Com

a extinção dos aldeamentos missionários no final do século XVIII, e as posteriores

formações de vilas e municípios, os índios sofreram maior contato com a população

não-indígena estabelecida na região. A demarcação das Terras Indígenas Potiguara

ocorreu a partir da visita do Imperador Dom Pedro II à Paraíba em 1859. Em sua visita a

Vila Mamanguape o imperador tratando sobre a nova Lei de Terras teria ordenado a

demarcação das antigas Sesmarias de Monte-mór, e de São Miguel, este trabalho foi

efetuado na década seguinte pelo engenheiro Antônio Gonçalves da Justa Araújo.

É importante lembrar que enquanto em São Miguel, as terras permaneceram de

posse coletiva dos índios, em Monte-mór as terras além de demarcadas foram divididas

em 150 (cento e cinquenta) lotes e entregues as famílias de índios casados que se

apresentaram para receber sua parte. Este fator facilitou a venda e a usurpação dos lotes

de terras ao longo do século XX, principalmente por parte da família Lundgren, donos

da Companhia de Tecidos Rio Tinto (CTRT) estabelecida na região a partir de 1917.

9 Preguiça refere-se a um animal mamífero presente na fauna da região.

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A cidade de Rio Tinto com todo seu parque industrial foi construída por

Frederico Lundgren sob as terras ocupadas por indígenas do aldeamento Monte-Mór.

Neste mesmo período, os índios da Baía da Traição passam a ficar sob administração do

Serviço de Proteção aos Índios (SPI).

O quadro político na área da Baía da Traição tendeu a se

acomodar na situação que Oliveira Fº (1988) chamou de

indianidade, com o predomínio da atuação tutelar da agência

indigenista sobre os grupos familiares e a constituição de um

campo político onde esta tutela desempenha um papel central no

controle da distribuição de recursos para índios e não-índios, dos

papéis políticos e de uma visão muito própria do que deveria ser

a cultura indígena. [...] Já na área de Monte-Mór, a Companhia

Rio Tinto exercia o seu controle com mão de ferro ou, no dizer

dos índios, ela casava e batizava. O processo de esbulho das

terras indígenas foi muito violento, gerando um clima de terror e

perseguições, com incêndios de casas, prisões, torturas,

assassinatos e fugas de famílias inteiras no que poderíamos

chamar de diáspora Potiguara. (PALITOT; SOUZA JÚNIOR,

2004, p.159)

Com a falência da CTRT, em meados dos anos de1980, a cidade de Rio Tinto

passou a experimentar um período de estagnação econômica. As terras expropriadas dos

índios foram vendidas a usinas de álcool e açúcar. Neste período a Baía da Traição

experimentou um crescimento com o incentivo ao turismo, em Marcação cresceu a

partir de um pequeno entreposto de comercialização de caranguejo, estagnado pelo

desaparecimento dessa espécie dos mangues do rio Mamanguape. Antes da retomada da

TI de Monte-Mór, era como uma ilha de casas em meio ao mar sufocante dos canaviais.

O processo de regularização das Terras Indígenas Potiguara seguiu

paralelamente ao processo de emergência étnica do grupo, que também teve início anos

de 1980 com a disputa pela Terra Indígena (TI) Potiguara de Baía da Traição. Contudo,

foi apenas depois da promulgação da Constituição Brasileira de 1988, que os índios

passaram a expressar com maior segurança os sinais diacríticos que confirmam sua

especificidade étnica, principalmente o Toré, as pinturas corporais, e as tradições.

Atualmente a fé dos Potiguara é disputada por diversas igrejas cristãs e por

sistemas de crenças espirituais articulados em torno dos cultos afro-brasileiros regionais

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como: a Umbanda e o Culto a Jurema, frequentemente tratados de forma pejorativa

como macumba, catimbó ou feitiçaria10.

Neste contexto, podemos dizer a religiosidade indígena Potiguara sintetizada no

Toré, exprime a força, a beleza, e a complexidade desta etnia que embora disputadas

pelas diversas religiões, permanecem preservando seus rituais, crenças e tradições

característicos de sua etnia.

3- DANÇANDO O TORÉ: ANCESTRALIDADE E VIDA

Para dar início ao ritual é preciso de um local apropriado, que pode ser no

interior de uma oca, um terreiro, o interior de uma furna, um pavilhão, ou até mesmo na

rua, o que importa é que haja um momento de transição e contato com o mundo sagrado

dos espíritos, o que ocorre quando os índios pisam o chão com os pés descalços em um

contato íntimo com a mãe natureza.

A mãe terra é lugar sagrado onde acontece o Toré - o grande

ritual Potiguara. O contato com o pé no chão gera uma

integração do índio com a terra e com os espíritos. “Todo Toré é

dançado com o pé na mãe terra. Ninguém dança calçado não.

Todo mundo tem que dançar com o pé no chão, sentindo a mãe

terra” (Pedro Ka‟aguassú, jun. 2003). Nesse instante, uma

invisível energia contagia os presentes que passam a evocar,

sentir e a entregar-se completamente à mãe terra.

(BARCELLOS, Op. cit, p. 79)

Ao som das repetidas batidas do zabumba, e dos maracás os índios são

convocados a reunirem-se para dar início ao ritual. Atraídos pelo som dos instrumentos

os participantes posicionam-se em forma de círculos, neste momento os ancestrais dos

índios também são convidados a participar daquele momento sagrado. Geralmente

saúdam o Pai do Céu (Tupã), a Mãe Terra, os Espíritos de Luz, oram em pensamento, e

rezam o Pai Nosso em Tupi, ou em Português, mas sempre uma autoridade indígena faz

uso da palavra.

Para iniciar o Toré, o cacique, deixando-se conduzir pelos

espíritos de luzes, anuncia com o maracá que é chegado o

momento do ritual. Todos se prostram diante da mãe terra e a

10 Para ver melhor sobre o tema catimbó e feitiçaria entre os Potiguara, consultar VIEIRA. 2010.

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veneram pedindo à mãe natureza proteção e permissão para a

grande louvação do Toré. Em algumas situações, o Cacique faz

um louvor em voz alta, em outros momentos, reza o Pai Nosso,

mas, em geral, é no silêncio que os índios entram em sintonia

com a sua divindade e com os Encantados. Quando todos estão

na sua intimidade, o som do maracá, seguido da batida do

bombo, aprofunda essa dimensão de deixar-se seduzir pela mãe

natureza. Alguns minutos depois dessa eternidade, o maracá

tocado pelo Cacique, num ritmo um pouco mais acelerado e

complementado pela batida envolvente do bombo, convida

todos a ficarem de pé, para iniciar a grande solenidade

sagrada[...]No centro, ficam os tocadores que irradiam som em

todas as direções e envolvem os presentes. As lideranças ficam

bem próximas, servindo-lhes de proteção, luz e guia para os

vários círculos concêntricos formados em seu redor

(BARCELLOS, Op. cit., p. 233-234)

O Ritual do Toré proporciona aos Potiguara um momento singular de contato e

interação com os espíritos dos ancestrais. É celebrada a vida, e a presença dos índios

que já partiram para o mundo misterioso dos “encantados”, e que ainda interagem com

os índios ajudando em questões pessoais do cotidiano, nas lutas coletiva pela defesa do

território, e na preservação de sua memória, danças, crenças e tradições. O Toré é

dançado em diversas ocasiões, como em encerramento das atividades programadas nas

escolas, nas igrejas, nas aldeias, nos encontros, nas assembleias, e nos seminários. Em

todas essas situações, o Toré segue sempre o mesmo cerimonial.

Os instrumentos utilizados são: os bombos, caixas, gaitas e maracás. O bombo e

a caixa, são instrumentos de percussão, um com som mais agudo e o outro com o som

mais grave, a gaita é um instrumento de sopro, semelhante à flauta. E o maracá é um

instrumento chocalhante usado por quase todos os participantes, também utilizado pelo

cacique para dar vida ao ritual, onde várias pessoas dançam com o maracá na mão.

‘‘sem maracá ninguém dança [...] quando a gente está tocando a gente tá agradecendo a

Deus Tupã pela saúde, pela paz, pela educação dos nossos curumins [...]’’ (Cacique

Djalma, In: BARCELLOS, 2005, p. 103).

O vestuário usado no ritual é preparado de forma cuidadosa, normalmente se

dança a caráter, com traje ou trajo. São os saiotes (feitos da casca de uma árvore

chamada jangada) usados pelos homens, mulheres e crianças. As mulheres geralmente

usam bustiê, que pode ser feito de pano ou de jangada, ou um sutiã de quenga de coco.

Os Potiguara usam também penacho ou cocar, que podem ser feitos de palha ou

de penas de aves.

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Outros adornos são os colares usados no pescoço, nos braços, no tornozelo; as

pulseiras, os brincos, objetos que são colocados no nariz, o tacape, a lança, a borduna, o

arco, a flecha, etc.

A pintura Potiguara é outro elemento primordial cheio de significados que

envolvem todo um misticismo e espiritualidade. Utilizam a cor preta (extraída do fruto

do jenipapo) que pode representar a terra, e a cor vermelha (extraída do urucum) o

sangue, ou a guerra. Os Potiguara através da pintura corporal expressam beleza, e

diferenciação étnica. Atualmente os professores de Arte e Cultura Potiguara elaboram e

repassam pinturas padronizadas que caracterizam a etnia. São desenhos tão bem

detalhados, que tornou-se comum não-índios pedirem para serem pintados,

principalmente nos dias de Toré. Os significados e a fontes de inspiração na elaboração

das pinturas encontram-se principalmente na fauna, e na flora da região. Em anexo

podemos observar algumas pinturas e seus significados ensinados nas escolas indígena.

3.1 RITOS

Todos os povos indígenas tem seu jeito se ser, cada um com sua musicalidade,

dança, coreografia e várias formas de estabelecer contato com os ancestrais que estão

constituídos no ritual do Toré.

O rito refere-se, pois, à ordem prescrita, à ordem do cosmo, à

ordem das relações entre deuses e seres humanos e dos seres

humanos entre si. Reporta-se ao que rima e ao ritmo da vida, à

harmonia restauradora, à junção, às relações entre as partes e o

todo, ao fluir, ao movimento, à vida acontecendo. A busca pela

ordem e o movimento são elementos constitutivos dos rituais.

(VILHENA, 2005, p. 21).

A dimensão cultural e religiosa do ritual do Toré é vista dentro de uma

perspectiva política que são compreendidas a partir da cultura, e novas abordagens são

lançadas sobre os processos de investigação das tradições e do que estava sendo

processado com as correntes culturais. As religiões especificadamente dos potiguara,

mostram-se repletas de ritos sacros, mas também existem aqueles que se misturam com

o cotidiano como tomar banho no rio, pedir a benção aos parentes mais velhos, nos ritos

de Sabedoria, de Morte, ou de Partilha.

Page 9: Artigo: Toré Potiguara: Dança, Crença, e Tradição

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3.2 SÍMBOLOS

No espaço sagrado que envolve o Toré podemos observar símbolos cristãos

(cruzeiros, e santos); símbolos indígenas como o vinho da jurema11, artesanatos,

alimentos cultivados (mandiocas, e milho) estes artefatos presentes nos locais onde o

ritual é realizado demonstram a comunhão e complementaridade, no espaço físico e

simbólico do grupo. Contudo, é através do conteúdo da letra das músicas que podemos

compreender melhor a dinâmica de ressignificação destes símbolos.

Faremos uma breve análise de algumas músicas entoadas no Toré Potiguara

afim de compreender melhor este processo. Em anexo podem ser analisadas outras

músicas.

Quem pintou a louça fina, Foi a Flor da Maravilha.

Pai e Filho e Espírito Santo, Filho da Virgem Maria.

Salve o Sol, salve a lua, salve São Sebastião

Salve, São Jorge guerreiro, dai a nós sua proteção12

Nestas duas músicas podemos destacar dois elementos culturais que se

contrastam, o primeiro diz respeito a vivência indígena presente na arte da cerâmica

Potiguara (louça fina) conhecida pelos índios antes da chegada dos portugueses. Época

em que o sol, e a lua eram seres míticos reverenciados sem nem uma restrição. O outro

elemento que compõe estas músicas diz respeito ao evidente sucesso na tentativa de

conversão dos índios ao catolicismo evidenciados na reverencia a trindade, aos santos e

aos padroeiros, contudo esta conversão não ocorreu sem resistência por parte dos índios,

pelo contrário as tradições Potiguara foram preservadas dentro das imposições exercidas

pelo cristianismo dominante.

Em cada aldeamento desenvolveram-se formas de celebração

aos santos católicos onde se faziam presentes elementos que

aludiam às tradições indígenas, criando um sentido de unidade

entre as famílias nativas, o santo padroeiro, o território do

aldeamento e os protetores espirituais dos índios. Essas práticas,

quando realizadas em espaços públicos, eram mostras

eloqüentes do sucesso do empreendimento colonial, que

transformava índios selvagens em súditos cristãos e servia para

ilustrar os limites de uma categoria étnica dentro do mundo

colonial, a dos caboclos civilizados. Por outro lado, nas relações

11 A jurema é um arbusto encontrado no litoral. Das partes da árvore (casca, tronco, folha e raiz) é

preparada a bebida. Existe também uma mística envolvendo a Cabocla Jurema na cosmovisão Potiguara. 12 As letras transcritas apresentada neste trabalho são frutos de uma riqueza transmitida oralmente, de

geração em geração coletados durante nossa pesquisa de campo.

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familiares, essas práticas conviviam com a crença, o contato e o

recurso aos espíritos das matas, servindo como lastro afetivo que

contrabalançava as tendências de adesão e diluição do grupo na

sociedade mais ampla. (PALITOT; SILVA JÚINOR, 2004, p.

164)

Guarapirá esta na praia, está pegando seus peixinhos

Dando viva a São Miguel13, e a Deus pequenininho

Os caboclos não quer briga os caboclos não que guerra

Salve, Salve a padroeira14, Monte-Mór é nossa Terra

Sou Tupã, sou Tupã. Sou Potiguara

Sou Potiguara nesta terra de Tupã,

Tenho arara, craúna e xexéu, todos os pássaros do céu

Quem me deu foi Tupã, foi Tupã, sou Potiguara.

Nestas outras músicas podemos destacar outros elementos como a fauna, a

territorialidade, a religiosidade indígena expressa em uma referência direta a Tupã e

finalmente a autoafirmação étnica ao expressarem o orgulho de ser Potiguara.

A Jurema Sagrada tem grande valor simbólico para os índios Potiguara esse

valor é expresso nas músicas que enaltecem ‘‘a força que a Jurema dá’’; o uso do vinho

e do defumador usado para dispersar as energias ruins e atrair as energias positivas.

Outras músicas que podem ser observadas são: Cantigas para amarrar o catimbó,

adaptações de músicas de outras etnias, letras de composições recentes, e ainda músicas

de Toré realizados pela igreja Batista Potiguara.

4- O TORÉ: TRADIÇÃO E DIMENSÃO RELIGIOSA

O Toré é um ritual praticado pela maioria dos povos indígenas do nordeste e

serviu de base para o reconhecimento da indianidade dos grupos em relatórios

realizados pelos órgãos do governo Federal como o SPI (Serviço de Proteção ao Índio) e

a FUNAI (Fundação Nacional do Índio). Em 1913, o funcionário do SPI Alípio

Bandeira, em seu relatório, faz os primeiros escritos sobre as práticas culturais dos

Potiguara, mostrando traços de etnicidade.

Nas suas festas domésticas é que, sobretudo, se apanha o apego

dos Potiguara aos seus ancestrais. Eles dançam e cantam como

13 São Miguel é o Padroeiro dos Potiguara, e o santo protetor de todo o território indígena. 14 A padroeira referida na letra da música é nossa Senhora dos Prazeres, padroeira da aldeia Monte-Mór.

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índios. Usam instrumentos de música, mas instrumentos

indígenas... O zambê‟ e o puita‟ são acompanhadores prediletos

de suas canções e dos seus sambas [...] com essa música

elementaríssima folgam noites inteiras, dando a quem os

contempla, a impressão de um rito bárbaro em plena selva

(MAIA, In: MARQUES, 2012, p. 179)

Através dos símbolos exibidos no Toré podemos ter a ideia da amplitude

cosmológica das crenças, tradições e da religiosidade Potiguara. Tradições estas que

permanecem vivas através da adoção e ressignificação de símbolos. A respeito dessas

tradições Silva relata que:

Da antiga cultura indígena, registrada pelos cronistas do século

XVI, ela foi ao longo dos tempos tomando outros significados,

passando por metamorfoses e se integrando às condições atuais.

Há muito tempo falam somente a língua portuguesa, porém hoje

está implantada nas escolas do ensino fundamental de 1ª e 2ª

fase a disciplina língua tupi, nas escolas municipais que estão

nas aldeias dos três municípios (Baía da Traição, Marcação, Rio

Tinto) [...] Muitos elementos culturais são cultivados e

permanecem vivos, tais como a dança do Toré, os cânticos, a

pintura corporal, a medicina natural, as comidas típicas (beiju,

cauim ou cuaba), o artesanato, as várias formas de ritos

“domésticos”, cultivados no seio das famílias, como os ritos

para entrar na mata, nos rios, nas furnas, no mangue, na

reverência às árvores (“mestres”, tratadas como sagradas), os

espíritos da natureza e dos antepassados. (SILVA, 2011. p. 34)

A respeito dos indígenas que seguem religiões afro-brasileira como: a Umbanda

e o Culto a Jurema, observamos que eles participam também do ritual do Toré

Potiguara, entretanto alguns índios associam os ritos destas religiões como práticas de

catimbó, e feitiçaria.

Para boa parte da comunidade estes ritos são próximos ao toré,

mas bastante perigosos e negativos, já que não trabalham do

mesmo modo que os índios. A proximidade entre os cultos é

realizada através da mediunidade que determinadas pessoas têm.

Uma vez que toré e umbanda são formas de estabelecer contato

com o mundo espiritual, qualquer médium que esteja presente a

esses rituais pode sentir as forças espirituais se aproximando.

Todavia, afirmam, as forças que se manifestam no toré são mais

sutis e poderosas que aquelas da Umbanda. (PALITOT; SOUZA

JÚNIOR, 2004, p. 168)

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Todos os Potiguara que tivemos conhecimento declararam-se cristãos,

principalmente católicos, e evangélicos. Atualmente, os padres católicos demonstram

respeito a cultura indígena e aceitam que seus membros participem dos rituais

Potiguara, além disso, estão presentes dando suporte aos índios nos momentos de maior

importância. Por outro lado, entre os evangélicos foi notado que pouquíssimos

participam do ritual e que se envolvem diretamente nas questões indígenas. Existem

relatos inclusive de pastores mais tradicionais que pregam abertamente contra a prática

do Toré e de outros elementos da cultura indígena como: a pintura corporal o uso de

adornos, e as crenças ancestrais.

Se nós adorávamos espíritos, fazíamos preces àquelas coisas

erradas antigamente e totalmente diferente da palavra de Deus,

hoje a gente aprendeu pela Bíblia que é diferente aquilo. A gente

tenta hoje tirar aquelas pessoas, destas coisas que, antes nós

ingressava nela ou vivia nela. Mas hoje a gente tenta tirar

aquelas pessoas porque aquilo ali não é verdade, verdade é a

palavra de Deus. (Pastor Rosildo, In: BARCELLOS, 2005, p.

149-150).

Também foi observado que nas igrejas evangélicas Betel brasileiro, e na Batista

Potiguara seus dirigentes locais demonstraram ser mais conscientes quanto a

importância que a cultura tem para os índios: Traduziram hinos evangélicos para a

língua Tupi, cantam louvores fazendo referências a vivência Potiguara, e realizam (na

igreja Batista) seu próprio “Toré Santo’’, ritual adaptado para adorar à divindade

segundo a perspectiva evangélica, conforme podemos observar na seguinte música:

Quem Pintou a louça fina, foi a flor da maravilha

Pai, Filho, Espírito Santo. Todos na mesma alegria

Eu tenho um rei, eu tenho um rei que é Jesus

Eu tenho um rei, que por mim morreu na cruz.

Ele de longe um atalaia nos mandou

Seu recado seu amor nos entregou

Eu quero cantar para meu rei

Quero louvar batendo palma

Que teu sangue possa lavar

Toda tribo Potiguara15

15 Letra de músicas concedidas em entrevista realizada em Marcação pelo pastor da Igreja Batista

Potiguara João Santana (Ago. 2015)

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Portanto, podemos concluir que independente da confissão religiosa, permanece

em cada índio as crenças e as tradições ancestrais próprias de sua etnia, e que estas

tradições confluem para o momento de realização do Toré. Segundo Barcellos, os

Potiguara sabiamente declaram-se cristãos, contudo atualizam-se, diante do não-índio,

demonstrando o relacionamento entre as duas culturas:

Por muito tempo, ali, a adoção de elementos do cristianismo não

decorreu de um real confronto de dois sistemas religiosos, mas

reflete uma estratégia para melhor conservar as crenças e os

valores tradicionais. É uma forma de conceder para não ceder.

(CHEROBIM, In: BARCELLOS, 2011, p. 34)

5- CONCLUSÃO

Através deste estudo podemos afirmar que a essência da religiosidade indígena

Potiguara é manifesta na ritualística do Toré, e que este ritual representa e delimita as

fronteiras étnicas, evidencia os sinais diacríticos, e dar forças na luta pela terra. O Toré

faz um elo com o passado, o presente e o futuro, uma verdadeira arma de guerra contra

a aculturação, os estigmas e os preconceitos.

Nos momentos em que observamos, e participamos do ritual podemos sentir a

energia que emana da batida do pé descalço na terra, a força do ritmo dos tambores,

maracás, e gaitas que impulsionam, cadenciam, e animam a dança. Imaginamos a dança

dos índios ancestrais, quando ouvimos e entoamos as músicas cantadas em Tupi, lingua

dos Potiguara e símbolo de orgulho para etnia.

Desfrutamos do aroma suave dos defumadores. Nos admiramos com beleza da

dança das crianças, posicionadas no primeiro círculo, representando a continuidade da

etnia. Observamos também, não-indígenas participando do ritual, dançando na mesma

sintonia, participando da luta, e comemorando suas conquistas. Concluímos que

palavras não são suficientes para descrever todo universo simbólico representado no

Toré. E as sensações e percepções são diferentes entre quem apenas estuda e quem

também participa do ritual. No que se refere aos estudos e as análises buscamos

apresentar para o leitor segundo nossas capacidades, o que significa o Toré e a

religiosidade Potiguara.

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6- BIBLIOGRAFIA

ANDRADE, Antonio Ricardo Pereira de. Cultura e Sustentabilidade: a sociedade

potiguara e um novo malestar na civilização. Tese (doutorado), Universidade Federal

Rural do Rio de Janeiro, Instituto de Ciências Humanas e Sociais. 2008, 174 f.

BARCELLOS, Lusival. Práticas educativo-religiosas dos Potiguara da Paraíba.

João Pessoa: Editora da UFPB, 2014.

CLASTRES, Hélène. Terra Sem Mal. São Paulo: Brasiliense, 1978.

NASCIMENTO, José Mateus (Org). Etnoeducação potiguara: pedagogia da

existência e das tradições. João Pessoa: Ideia, 2012. 162p

CARDOSO, Thiago Mota; GUIMARÃES, Gabriella Casimiro. (Orgs.).

Etnomapeamento dos Potiguara da Paraíba. Brasília:

FUNAI/CGMT/CGETNO/CGGAM, 2012. 107 p. Ilust.

PALITOT, Estêvão Martins e SOUZA JÚNIOR, Fernando Barbosa. TODOS OS

PÁSSAROS DO CEÚ: O toré Potiguara. In: TORÉ Regime Encantado do Índio do

Nordeste. Rodrigo de Azeredo Grünewald (Org.), Pernambuco: Massangana, 2004. 292

p.

MARQUES, Amanda Christinne Nascimento. Território de Memória e

Territorialidades da Vitória dos Potiguara da aldeia Três Rios. João Pessoa, 2009.

SILVA, Almir Batista da. Religiosidade potiguara: tradição e ressignificação de

rituais na aldeia São Francisco da Baía da Traição-Pb. Dissertação (Mestrado)

UFPB/CE. João Pessoa, 2011.

VIEIRA, José Glebson. Amigos e competidores: política faccional e fentiçaria nos

Potiguara da Paraíba. Tese de doutorado em Ciência Social (Antropologia Social).

São Paulo: Universidade de São Paulo, 2010. 365 p.

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ANEXO

LETRA DE MÚSICAS DO TORÉ POTIGUARA

a. Vivência indígena e o Cristianismo:

Quem pintou a louça fina, foi a flor da maravilha

Pai e Filho e Espírito Santo, Filho da Virgem Maria

Eu estava na minha casa, e mandaram me chamar

No dia de Santo Reis, na casa de João Pascal

b. Natureza:

Guarapirá está na praia, está pegando seus peixinhos

Dando viva a São Miguel, e a Deus pequenininho

A camisa do meu mano, não se lava com sabão

Se lava com ramo verde, a raiz do coração

c. Territorialidade:

Os caboclos Potiguara nessa Terra ele nasceu

Ela é santa, ela é mãe. Ela é do Índio, ela é de Deus.

Os caboclos não quer briga, os caboclos não quer guerra

Salve, salve a Padroeira. Monte-Mór é nossa Terra.

d. Autoafirmação étnica:

Potiguara são guerreiro. Potiguara é que vão guerrear.

Guerreia na terra, guerreia no mar. Potiguara é que vão guerrear.

Sou Tupã, sou Tupã, Sou Potiguara.

Sou Potiguara nesta terra de Tupã

Tenho arara, craúna e xexéu, todos os pássaros do céu

Quem me deu foi Tupã, foi Tupã, sou Potiguara.

e. Em Tupi:

Xe Tupã, xe Tupã, xe Potigûara Xe Potigûara Kó Tupã endé pupé Oru arara Akaraúna

Aru xxéu opaguyra ibakygara Aîm’eng Tupã xebe.

Xe rera Potiguara Xe retã, xe Abaeté Aba-pe „ara-pora o-îkobé ixé îabé Xe retama i

porang Xe anama turusú Xe aba-eté Xe aba-atãngatu

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f. Jurema Sagrada:

Chama a cabocla de pena, eu chamei ela pra vir me ajudar

Pra ver a força da jurema, cadê a força que a jurema dá

Cabocla de pena, cabocla de pena, tem pena, de mim tem dó

Caboquinha da jurema, eu dancei o seu toré,

Para me livrar da flecha dos tapuias Canindé.

Rei canindé, oh Rei Canindé Palmas de jurema pra o rei canindé

Tava sentado na Pedra Fina, o Rei dos índios mandei chamar

Caboca índia, índia guerreira, caboca índia do jurema.

Com meu bodoque eu sacudo a flecha, com meu bodoque eu vou atirar

Caboca índia, índia guerreira, caboca índia do jurema

No pé do cruzeiro jurema

Eu danço com meu maracá na mão

Pedindo força ao meu Jesus Cristo,

Que abençoe a todos os irmãos

O pisa nessa terra, o pisa devagar

Pisa devagarinho no galho do Jurema

A Jurema deu a Jurema dá

Caboclo bom para trabalhar

Nossa Senhora da Conceição é uma santa uma Santa milagrosa

Abençoa as caboclas de Pena. Que Ela vai chegando agora

Ela vai chegando agora com a sua coroa de pena

Arreia, caboca agora na cidade da Jurema

g. Evangélica:

Quem pintou a louça fina, foi a flor da maravilha

Pai, Filho, Espírito Santo. Todos na mesma alegria

h. Sobre amarrar o catimbó:

Baía terra de coco de azeite de dendê

A água do coco é doce, eu também quero beber

Tapuia minha tapuia, tapuia do canindé

Peguei minha machadinha, minha flecha, meu coité

Vamos dançar amarrar o catimbó, amarrar o inimigo na pontinha do cipó

.

i. Adaptações de outras etnias: (Xucuru)

Vai, meu irmão, que uma noite não é nada

Já chegou os Potiguaras no romper da madrugado

Vamos ver como é que acaba; O resto da empreitada

Fonte: acervo pessoal

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PINTURAS CORPORAIS POTIGUARA

a. Natureza:

Camarão Colmeia Folha da Jurema

Guarapirá Matas

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b. Territorialidade:

Caminhos de Monte-Mór Coral Salamanta

c. Ancestralidade:

Os quatros elementos

Cerâmica dos índios ancestrais

Fonte: acervo pessoal.