as variÁveis metodolÓgicas no estudo das …w3.ufsm.br/engrup/iiengrup/pdf/t18.pdf · 5 até os...
TRANSCRIPT
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
1
AS VARIÁVEIS METODOLÓGICAS NO ESTUDO DAS ATIVIDADES NÃO-
AGRÍCOLAS E DA PLURIATIVIDADE: uma aplicabilidade aos Bairros Rurais do
Município de Presidente Prudente-SP1
Erika Vanessa Moreira2
Rosângela Aparecida de Medeiros Hespanhol3
Resumo
Este trabalho está pautado numa apreensão das variáveis metodológicas utilizadas no estudo
da pluriatividade e das atividades e rendas sem vínculos agrícola. Tratar-se-à sobre: a unidade
de análise (família rural); a escala de análise (bairros rurais); e as variáveis metodológicas
(Orna, Erna, Renda e Atividade). A adoção da família como unidade de análise se justifica
por ser uma instituição social dinâmica e essencial na busca de estratégias de reprodução
social. Os bairros rurais possuem um caráter dialético, múltiplo e heterogêneo, sendo o palco
dos acontecimentos e das transformações estruturais na organização das famílias rurais, em
especial com o crescimento da pluriatividade, das rendas e atividades sem vínculos agrícolas.
Tem-se como recorte espacial, para a aplicabilidade dessa discussão teórica, os Bairros Rurais
Aeroporto, Cedro, Córrego da Onça, Gramado e Ponte Alta, localizados no Município de
Presidente Prudente-SP. Adotou-se no trabalho as atividades e as rendas como variáveis
metodológicas em virtude de abarcar tanto as ocupações como os empregos, propiciando uma
análise profícua da situação socioeconômica das famílias rurais residentes nesses bairros
rurais.
Palavras-chave: Bairros rurais, Pluriatividade, Família, Rendas, Atividades agrícolas e não-
agrícolas.
1 As reflexões apresentadas neste texto fazem parte do trabalho de mestrado em fase de desenvolvimento, cuja temática central é a análise da pluriatividade, das atividades e rendas sem vínculo agrícola e do trabalho da mulher nos Bairros Rurais do Município de Presidente Prudente/SP. 2 Mestranda do Programa de Pós Graduação em Geografia da FCT/UNESP de Presidente Prudente, Bolsista FAPESP e Membro do GEDRA (Grupo Dinâmica Regional e Agropecuária) [email protected] 3 Professora Doutora dos Cursos de Graduação e Pós Graduação da FCT/ UNESP de Presidente Prudente. Coordenadora do GEDRA. [email protected]
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
2
1. Introdução
O espaço rural é heterogêneo e dialético. Essa heterogeneidade assevera a necessidade
de se compreender as estratégias de reprodução social e econômica adotadas pelos produtores
para permanecer no campo. A busca de renda(s) fora da agricultura e a combinação de
diferentes tipos de rendas e atividades (agrícolas e não-agrícolas) reforçam o caráter múltiplo
e plural dessas famílias.
Esse trabalho está pautado numa apreensão das variáveis metodológicas utilizadas no
estudo da pluriatividade e das atividades e rendas sem vínculos agrícolas. Outrossim, tem-se
como recorte espacial para a aplicabilidade dessa discussão teórica, os Bairros Rurais
Aeroporto, Cedro, Córrego da Onça, Gramado e Ponte Alta, localizados no Município de
Presidente Prudente-SP.
Para alcançar o objetivo enunciado torna-se fundamental um permanente levantamento
teórico sobre a temática, haja vista que a interlocução com os autores é essencial para a
distinção e a construção de um referencial metodológico e teórico. Além da pesquisa teórica,
foi utilizado, como procedimento metodológico, a pesquisa de campo (realizada por meio de
entrevistas e aplicação de questionário).
Não se tem a pretensão de esgotar, nesse texto, a temática proposta, uma vez que o
debate entorno da pluriatividade é recente na Geografia Agrária. Mas, incorporar nesse estudo
o caráter seu geográfico. Em outras palavras, demonstrar que a pluriatividade e a presença de
rendas e atividades não-agrícolas podem tanto ocasionar mudanças como também levar à
coexistência, à permanência e à adaptação4. O que vai determinar a intensidade das mudanças
não é apenas a estrutura interna (variáveis endógenas) da família e tampouco os elementos
externos (variáveis exógenas), mas a articulação de ambas.
O texto está, além dessa nota introdutória, estruturado em quatro partes. A apreensão
teórica da pluriatividade será o foco central na primeira seção. Debater-se-à, na segunda
seção, a unidade de análise, selecionando a família como a unidade mais adequada e coerente
para compreender as estratégias de reprodução social, como a pluriatividade e as atividades
não-agrícolas. Na terceira seção, buscar-se-à uma abordagem sobre os bairros rurais,
escolhidos como escala de análise. Na quarta seção, apresentar-se-ão os significados de
ORNA, ERNA, Atividade e Renda. A caracterização dos bairros rurais, as fontes de renda e
atividades das famílias residentes serão o eixo central da quarta seção. 4 Sobre a relação permanências e mudanças ver Moreira; Hespanhol (2005).
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
3
2. Apreensão teórica do conceito de pluriatividade
A busca de alternativas e estratégias de reprodução social e econômica permite ao
produtor familiar permanecer no campo e postergar sua expropriação diante da expansão do
capital. Contudo, os tipos de estratégias adotados pelos agricultores não estão atreladas
somente às atividades agrícolas, pois o desenvolvimento das atividades não-agrícolas ganhou
notoriedade nos últimos anos, tanto nos países desenvolvidos, como também nos países em
desenvolvimento, como é o caso do Brasil.
A pluriatividade, as rendas e as atividades sem vínculos agrícolas reforçam a
multifuncionalidade do rural, permitindo sua visão não apenas vinculado ao agrícola,
especialmente com a incorporação das dimensões social (moradia e segunda moradia),
econômica (lazer, agroindústria), simbólica (patrimônio cultural) e ambiental (preservação da
natureza, ecoturismo).
O conceito de pluriatividade começou a ganhar notoriedade nos meios acadêmico e
político no ano de 1984, através do documento “La Pluriactivité dans les Familles Agricoles”,
elaborado pela Associação dos Ruralistas Franceses. É notório esclarecer que, no início dos
anos de 1980, as organizações de produtores rurais da França, os sindicatos e as instituições
ligadas a este setor não certificavam a importância da pluriatividade para o desenvolvimento
rural, pois alegavam que esta seria um obstáculo à modernização agrícola e um elemento
prejudicial na produção agrícola do país.
A pesquisa Arkleton Research Project, criada em 1982 e consolidada em 1986, foi
marco conceitual dos estudos referente a pluriatividade nos países europeus. Tal pesquisa
defendia a “idéia de que a pluriatividade permite condensar, num só conceito, duas outras
noções fundamentais: a agricultura em tempo parcial e a diversificação econômica e
produtiva” (SACCO DOS ANJOS, 2003, p. 85). Essa pesquisa foi realizada em 24 regiões da
Europa, sendo constatado que 58% das famílias rurais desses países eram pluriativas no ano
de 1987.
Segundo Schneider (2003), a principal controvérsia estabelecida entre o part time
farming5 e a pluriatividade refere-se, no primeiro caso, a utilização do tempo de trabalho na
5 Até os anos de 1950, na Europa e nos E.U.A., colocava-se como objeto de análise o chefe da família, que estava à frente de seu estabelecimento e o responsável pela obtenção de renda. Assim, o termo part-time farming levou à idéia de que a unidade de análise era o operador (farm operator) e não a família. Dando a impressão de que os membros da família não exerciam outra atividade fora da propriedade rural.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
4
propriedade por parte do indivíduo, ao passo que a pluriatividade está relacionada à
combinação de uma ou mais fontes de renda ou a inserção profissional dos membros da
família fora das unidades produtivas.
Na visão desse autor, a pluriatividade comparece como uma forma de resistência e
adaptação ao modelo de agricultura dos anos de 1990, marcado pelo neoliberalismo e pela
ênfase no produtivismo agrícola.
O que vai caracterizar uma unidade produtiva como pluriativa ou não são: as atividades
para-agrícolas (processamento de alimentos, agregação de valor, produção de vinho etc.); as
atividades desenvolvidas na própria unidade sem vínculos agrícolas (chácaras de lazer,
pesque-pague, artesanato etc.); e, os trabalhos externos (empregos em diversos setores da
economia, indústria, comércio, prestação de serviço etc.).
Vale lembrar que a pluriatividade contemporânea distingue-se das atividades acessórias
exercidas pelos camponeses no período de transição entre o feudalismo e o capitalismo
(CARNEIRO, 1998), pois as mudanças ocorridas nas relações de trabalho e comerciais
levaram o agricultor a buscar novas formas de estratégias, não necessariamente vinculadas às
atividades agrícolas, mas relacionadas às atividades não-agrícolas. Outrossim, a renda obtida
com a agricultura pode passar a ser secundária em detrimento das outras fontes de renda sem
vinculo agrícola.
A pluriatividade apresenta-se como um fenômeno polifacético, passivo de fortalecer o
tecido produtivo local, o equilíbrio territorial, a preservação ambiental e a reordenação do
território. Ao mesmo tempo, pode ocasionar a precarização de algumas formas de trabalho
(domésticos, por exemplo) e a subproletarização do agricultor face as situações desfavoráveis
à atividade agrícola.
A pluriatividade constitui-se num fenômeno, no qual os rendimentos são obtidos por
meio do desenvolvimento de diferentes atividades tanto no “interior como no exterior da
própria exploração, através da venda da força de trabalho familiar, da prestação de serviços a
outros agricultores ou de iniciativas centradas na própria exploração” (SACCO DOS ANJOS,
2003, p. 90). Nesse sentido, a pluriatividade e a expansão das atividades não-agrícolas no
meio rural não devem ser concebidas como a panacéia, ou seja, o único remédio para todos os
males. Há locais em que as potencialidades garantem o desenvolvimento das atividades
agrícolas, enquanto em outros a expansão das atividades não-agrícolas permite postergar a
saída das famílias e, sobretudo, melhorar o seu bem-estar e a qualidade de vida.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
5
Embora sejam inúmeros os fatores que levam à prática da pluriatividade e das atividades
não agrícolas, eles convergem a um único objetivo, isto é, a busca de estratégias de
reprodução social para garantir a permanência no campo. É pertinente a concepção de
pluriatividade que Conterato; Schneider (2005, p.6) utilizam, caracterizando-a como a
“combinação das múltiplas inserções ocupacionais das pessoas que pertencem a uma mesma
família”. Tais inserções podem ser desde atividades agrícolas exercidas tanto dentro como
fora da unidade familiar, até as atividades não-agrícolas praticadas no interior ou não da
propriedade rural.
Apoia-se, então, na perspectiva de Conterato; Schneider (2005), Schneider (2003) e
Sacco dos Anjos (2003) sobre o equívoco de se associar a pluriatividade com formas
marginais e transitórias. Em outras palavras, como se a pluriatividade tendesse apenas à
proletarização e que o espaço rural se comportasse como homogêneo e unívoco. Ao contrário,
a pluriatividade se comporta como uma estratégia de reprodução social, na qual a família e os
indivíduos traçam decisões tanto no plano imediato como alicerçado num planejamento
racional.
A pluriatividade, portanto, não se trata de um fenômeno conjuntural, mas o resultado de
um amplo processo de transformação da agricultura, em correspondente sincronia com a
dinâmica da economia em geral e no marco da profunda reestruturação que atravessa o modo
de produção capitalista (SACCO DOS ANJOS, 2003, p. 91)
Utilizando as argüições de Etxezarreta mencionada por Sacco dos Anjos (2003, p. 88), a
pluriatividade deve ser analisada numa postura integradora entre as dimensões macro e micro,
pois a combinação de atividades e rendas não ocorre apenas pelas características internas da
família, mas “por el contexto econômico y social que le rodea y por las políticas econômicas
que le afectam”. Assim, a dimensão teórica e operacional da pluriatividade deve ser
apreendidas como um fenômeno que abarca elementos endógenos e exógenos à unidade
produtiva..
3. A pluriatividade, as atividades não-agrícolas e as variáveis metodológicas.
Ao realizar-se uma revisão teórica-metodológica da pluriatividade, deparou-se com
algumas inquietações, principalmente no caráter operacional e metodológico. A unidade de
análise está apoiada na família rural (extensa e não nuclear), haja vista que a pluriatividade
está relacionada às diferentes inserções ocupacionais dos membros de uma mesma família.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
6
Outra variável a ser questionada se pauta na escala de análise, na qual adotou-se, como
unidade socioespacial, os Bairros Rurais do Município de Presidente Prudente, marcados
pelas relações de vizinhança, por uma base físico-territorial, pelo sentimento de localidade
(identidade) e pela presença das relações dialéticas de cooperação e conflito.
Outro aspecto a ser tratado está centrado na definição das variáveis como ORNA
(Ocupação rural não-agrícola), ERNA (Emprego rural não-agrícola), Renda e Atividade não-
agrícola no meio rural. Para efeito de análise, adotou-se as rendas e as atividades
desenvolvidas pelas famílias residentes nos bairros rurais. Isso porque, a pluriatividade
permite a combinação e a diversificação de múltiplas fontes de rendas por parte dos membros
da família (SCHNEIDER, 2003).
3.1. Unidade de análise: a família rural6
Parafraseando Saffioti (1979), a família constitui-se numa instituição social, mutável as
mudanças econômicas, políticas, sociais e culturais.
Um dos pioneiros a utilizar como unidade analítica a família foi Chayanov (1974), que
realizou uma análise da organização interna da unidade camponesa, cotejando as dificuldades
e os desequilíbrios decorrentes da penetração do capitalismo no interior dessas unidades. Sua
abordagem é direcionada numa perspectiva de dentro, ou seja, apreender os elementos
morfológicos organizacionais da unidade familiar.
Com respaldo nesse autor, constatou-se que a família é a principal unidade de análise
para explicar os processos de tomada de decisões dos membros em relação à produção, à
alocação da força de trabalho e aos investimentos a serem feitos.
De fato, a família constitui-se numa unidade analítica para o estudo da pluriatividade,
mas não deve ser o único elemento. Isso porque, a utilização apenas de elementos endógenos
não permite uma noção abrangente das transformações no espaço rural como um todo.
Barthez citado por Kageyama (1998, p.5) reforça a importância de considerar a família
como um “conjunto” de indivíduos, pois a pluriatividade levou à ruptura da unidade familiar e
reforçou as inserções individuais. “Cada vez mais os membros da família agrícola estão
inseridos no universo profissional externo, num conjunto de relações mercantis que não se
confundem mais com o universo familiar”. 6 A família é a unidade central nos estudos de Schneider (2003), Carneiro (1998 e 2000), Del Grossi; Graziano da Silva (1998), Plein; Schneider (2004) e Woortmann (1998).
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
7
A família é entendida, assim, como uma categoria estruturante que orienta as lógicas de
reprodução social e transcende o indivíduo. Os esforços individuais são submetidos a um
cálculo coletivo, aos interesses familiares como um todo (TEIXEIRA, 1998).
Em relação à adoção da família como unidade de análise, consubstanciou-se na assertiva
de Carneiro (2000, p. 131) para justificar tal posicionamento: [...] eleger a unidade familiar ou o grupo doméstico, como unidade de observação revela-se um procedimento fundamental para a compreensão das transformações recentes no campo brasileiro, onde o aumento das atividades não-agrícolas, articuladas ou não à agricultura, exige um maior grau de complexidade.
A unidade familiar define-a como uma estrutura flexível, plástica, dinâmica, que não se
limita apenas ao “grupo de pessoas formado por laços de aliança ou consangüinidade, mas
que deve ser percebida como valor (próximo a um sentimento de identidade) que integra seus
membros, dando sentido as suas relações” (CARNEIRO, 2000, p. 130).
Na concepção de Kageyama (2003) a pluriatividade constitui-se numa das respostas das
famílias às transformações no meio rural, ou seja, “a pluriatividade não é um fato totalmente
individual e nem uma escolha puramente da lógica familiar”.
Em suma, a família é a unidade de análise coerente para o estudo da pluriatividade em
decorrência de três aspectos (CARNEIRO, 2000): a família é um agente integrador das
relações sociais no interior dos estabelecimentos rurais; a unidade familiar permite captar as
múltiplas racionalidades coexistentes no interior dos grupos domésticos; a família identifica
as relações de força entre os agentes sociais na esfera do parentesco e referente à produção.
Schneider (2003) utiliza a família rural como o elemento central na análise das
estratégias de reprodução social, destacando-se, dentre elas, a pluriatividade e as atividades
não-agrícolas, pois, no interior do grupo familiar, as relações sociais e as decisões são
estabelecidas e permitem a desagregação de atividades e o desenvolvimento de outras
ocupações, sobretudo aquelas desenvolvidas fora da agricultura, definidas como não-
agrícolas.
A família como instituição social dinâmica não ficou imune às transformações
ocorridas no campo, ao contrário, sofreu mudanças em sua organização e estrutura, frente aos
novos desafios, novos agentes sociais e novas funções.
3.2.. Unidade de escala: Bairros Rurais
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
8
Adotou-se como unidade de escala os bairros rurais a partir de dois pressupostos:
primeiro, porque é uma temática “esquecida” na Geografia; segundo, porque as
transformações no rural (atividades, funções, rendas etc) afetam diretamente a configuração
dessa unidade, seja na paisagem, na diversidade de atores sociais e na multiplicidade de
atividades e funções.
Considerar os bairros rurais como unidades geográficas significa concebê-los como
unidades heterogêneas, diversificadas, complexas e centradas nas relações de vizinhança, no
sentimento de localidade (identidade) e numa base físico-territorial. Essa tríade, por sua vez,
está respaldada nas relações de cooperação e conflitos, das transformações e mudanças. O
bairro não é uma unidade rígida e exclusiva, mas susceptível às mudanças e também com
resistência ao novo.
A sociabilidade não fica restrita apenas ao grupo familiar, mas extrapola os limites do
bairro. Estreitam-se os laços entre os vizinhos e os parentes. As formas de solidariedade e
atividades religiosas encontram na escala do bairro a sua base para materializar-se, seja por
meio de festas, troca de dias, ajuda mútua e reciprocidade entre os vizinhos.
Candido (2003, p. 81) define bairro rural como um grupo de vizinhança, que é
formado pelo agrupamento de algumas famílias, vinculado ao sentimento de apego ao lugar e
pelas formas de solidariedade. Os elementos topográficos, a delimitação territorial, a
identidade e a cooperação fazem parte dos bairros rurais. Fernandes (1972) destaca que
muitas vezes o bairro rural é confundido e utilizado como sinônimo de grupo de vizinhança,
pois os seus limites se confundem com os limites geográficos do bairro.
Concorda-se com a posição de Muller (1966, p. 129) quando ressalta a importância da
organização espacial e social, Bairro é todo conjunto de casas, suficientemente próximas para que se estabeleçam contatos sociais entre seus moradores. É uma célula de comunidade rural que existem certos tipos de parentesco ou de vizinhança, reforçados freqüentemente pela existência da venda, capela ou escola e cujo raio de ação marca os limite do bairro.
Os bairros rurais abarcam o núcleo e área periférica. O núcleo é composto por um
número variável de construções (escola, capela/igreja, salão comunitário, venda/armazém,
campo de futebol, bocha e algumas casas). É o nódulo de concentração do povoamento, “o
core área” do bairro, responsável pela sociabilidade entre os moradores (MULLER, 1966, p.
102).
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
9
O bairro rural indica uma área, com limites imprecisos, e uma forte relação nos laços de
vizinhança. A disposição dos habitats rurais varia muito, contudo, as casas localizam-se
próximas uma das outras. Fernandes (1972) menciona que o bairro rural representa, no Estado
de São Paulo, uma unidade elementar, social e espacial.
Deve-se frisar que o bairro rural não é definido apenas por uma aglutinação de casas
dispersas, ou meramente um conjunto de sítios como afirma Moura (1978), mas, pelas
relações que se estabelece entre os seus moradores.
Na perspectiva de geógrafas como Bombardi (2003, 2004) e Paulino (2004), o bairro
rural é apreendido como território: O bairro rural se configura como uma unidade territorial geográfica – a partir de identidade territorial – num entendimento de que se caracteriza como uma fração do território (diferente daquela produzida diretamente pelo capitalismo) que é resultado da articulação das unidades camponesas, que por sua vez, são determinadas pela liberdade e autonomia camponesas via o controle do tempo e do espaço, não só o de moradia, como e, sobretudo, o de trabalho (BOMBARDI, 2004, p. 62).
Os bairros rurais, na visão de Paulino (2003, p. 351), se apresentam como “ a expressão
maior de uma combinação singular de estratégias, com vistas a reprodução de classe”. Ou
seja, a presença de grandes propriedades rurais no entorno ou próximas aos bairros rurais não
leva à descaracterização dos bairros enquanto locus da diversidade e resistência.
Conceber os bairros rurais como o lugar das especificidades e das relações dialéticas
permite considerá-los “unidades que se caracterizam através da convicção das relações
simbólicas e das relações sócio-econômicas na perpetuação da tradição e da memória”
(SOUZA, 2004, p. 145).
Cabe reiterar que os bairros rurais possuem um caráter dialético, múltiplo e heterogêneo.
É, também, o palco dos acontecimentos e das transformações estruturais na organização das
famílias rurais, em especial com o crescimento da pluriatividade e das atividades não-
agrícolas.
3.3. Variáveis metodológicas: ORNA, ERNA, Renda e Atividade.
O terceiro aspecto em relação ao caráter operacional refere-se às variáveis
metodológicas, quais sejam: ORNA, ERNA, Renda e Atividade não-agrícola. Essa
preocupação em distinguí-las se justifica pelos equívocos e as associações errôneas que têm
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
10
sido observados em trabalhos que abordam as transformações estruturais nas relações de
trabalho no campo.
A ORNA refere-se à ocupação rural não-agrícola, sendo ‘exercida por pessoas
residentes na área rural e ocupadas em atividades fora da agricultura, sejam essas
desenvolvidas nas áreas rurais ou urbanas” (BALSADI, 2002, p. 62).
Del Grossi et al (2001) pontuam alguns fatores que contribuíram para o crescimento das
ORNAs no Brasil, são eles: a modernização da agricultura, que levou à redução do pessoal
ocupado em virtude da utilização de maquinários e implementos agrícolas; a queda dos
preços dos produtos agrícolas; o crescimento de atividades não-rurais, relacionadas ao lazer,
moradia, prestação de serviços entre outras.
As ORNAs distribuem-se em várias categorias: patrões ou empregadores, assalariados
privados, assalariados públicos, conta-própria e familiares não-remunerados. Predomina no
Brasil, dentre as ocupações rurais não-agrícolas, os empregados cuja representatividade se
aproxima de 2/3 da PEA rural total.
A segunda variável a ser tratada nessa seção refere-se ao ERNA, que constitui-se no
Emprego Rural Não-Agrícola, ou seja, é um componente da ORNA (Ocupações Rurais Não-
Agrícolas). Para Balsadi (2002), as ocupações rurais não-agrícolas abarcam dois principais
componentes: o emprego assalariado e as ocupações por conta-própria.
É importante mencionar que os empregos fazem parte das chamadas ocupações rurais
não-agrícolas, cujo diferencial está na categoria de empregado e, que, portanto, tem vínculos
empregatícios (carteira profissional assinada, contribuição previdenciária etc).
O ERNA pressupõe a inserção empregatícia de residentes rurais em empregos
assalariados (formais ou informais). Em nota introdutória, Schneider (2003b), baseado nos
resultados obtidos por Berdegué; Reardon; Escobar (2001), menciona a importância do
ERNA para os residentes rurais latino-americanos, pois 40% das rendas dessas famílias
dependem desse tipo de emprego. A pobreza rural e as conseqüências negativas da
transformação do setor agropecuário e da modernização técnico-produtiva seriam amenizadas
pela inserção dos residentes rurais nos ERNAs.
Veiga (2001) argumenta que a utilização de ocupação (ORNA) em detrimento ao
emprego (ERNA) se justifica pelas mudanças nas bases metodológicas e conceituais da
PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio) em 1992. Assim, antes de 1992, a
pessoa ocupada em atividade de autoconsumo ou autoconstrução era excluída da PEA
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
11
(restrita); contudo, com as mudanças mencionadas, as pessoas que trabalhassem igual ou
superior a 1 hora na semana de referência passam a ser contabilizada como PEA (ampliada).
Schneider (2003b) endossa que o emprego rural não-agrícola (ERNA) está associado às
alterações no mercado de trabalho e pautado em decisões individuais. E distingue-o da
pluriatividade, que está sustentada “na combinação das múltiplas inserções ocupacionais das
pessoas que pertencem a uma mesma família”.
Portanto, considerar as diferenças das variáveis estatísticas e os instrumentos
metodológicos é indispensável na análise dos dados e, sobretudo, no planejamento de
políticas publicas direcionada ao desenvolvimento rural.
O estudo dos empregos e dos empregados rurais não-agrícolas permite uma análise
acurada do grau de formalidade (carteira assinada, direitos previdenciários, etc), o nível de
escolaridade dos empregados, os diferentes níveis salariais, a extensão da jornada de trabalho,
averiguar a situação enfrentada pelos milhares de empregados, sobretudo, os assalariados que
residem no meio rural, mas que estão inseridos em outros setores da economia.
Segundo a análise de Del Grossi et al (2001), os empregados assalariados são as
ocupações rurais não-agrícolas que mais se disseminaram no meio rural, reforçando a
tendência de “abandono das atividades agrícolas não remuneradas pelas atividades não-
agrícolas remuneradas”, sendo o emprego doméstico a ocupação líder dentre as não-agrícolas,
mas com remuneração inferior às atividades agrícolas.
Nas palavras de Balsadi (2002), os empregos rurais não-agrícolas se mostram uma
forma de inserção de milhares de mulheres sem remuneração residente no campo. Embora os
trabalhos domésticos7 sejam penosos, precários e de baixa remuneração para muitas mulheres,
representam hoje a única fonte de emprego, pois as oportunidades de empregos no setor
agrícolas são escassas e destinadas ao gênero masculino.
Tanto a ORNA como o ERNA geram rendas, mas a obtenção desta não depende apenas
do desenvolvimento de uma determinada ocupação. Existem fontes de renda que não estão,
necessariamente, relacionadas ao exercício de uma atividade, como é o caso da aposentadoria,
do arrendamento, do aluguel de casas ou máquinas, benefícios sociais etc. Para Veiga (2001),
as famílias conta-própria são mais propicias a se tornarem pluriativas e as famílias de
empregados recorrem com maior probabilidade aos empregos e as ocupações não-agrícolas.
7 Balsadi (2002) aborda que os serviços domésticos não são trabalhos produtivos do ponto de vista social, mas uma forma de transferência de renda.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
12
As fontes de renda das famílias rurais são múltiplas, abarcando desde a renda agrícola,
renda não-agrícola, renda de transferência social, renda de outras formas de trabalho até
outras fontes de renda (CONTERATO; SCHNEIDER, 2005).
A obtenção de renda não está necessariamente articulada a uma atividade ou um
emprego ou ocupação desenvolvida. A aposentadoria, o aluguel de chácaras ou casas e os
programas assistenciais do Estado são exemplos de fontes de renda que não dependem
diretamente da inserção em uma determinada atividade produtiva.
As atividades e as rendas foram utilizadas como variáveis metodológicas porque
abarcam tanto as ocupações como os empregos e, conseqüentemente, propiciam uma análise
mais profícua da situação socioeconômica das famílias rurais residentes nos bairros rurais
localizados no Município de Presidente Prudente.
Além disso, as atividades permitem separar a pluriatividade e o crescimento de
atividades não-agrícolas. Isso porque, a pluriatividade refere-se à combinação de diferentes
inserções ocupacionais a partir das decisões adotadas pelos indivíduos em relação à família e
também do contexto econômico e social no qual estão inseridos. Já as atividades não-
agrícolas estão atreladas às ocupações em distintos ramos e setores da economia, sem vínculo
agrícola. As atividades não-agrícolas estão relacionadas às alterações no mercado de trabalho
e às novas ocupações da força de trabalho (SCHNEIDER, 2003, 2003a; CONTERATO;
SCHNEIDER, 2005).
A revisão bibliográfica apresentada nessa parte do texto, cujo eixo central se pauta nas
variáveis metodológicas, é de suma importância na compreensão da presença das atividades
não-agrícolas e da pluriatividade no âmbito das famílias residentes nos Bairros Rurais
Aeroporto, Cedro, Córrego da Onça, Gramado e Ponte Alta, localizados no Município de
Presidente Prudente.
4. Os Bairros Rurais Pesquisados no Município de Presidente Prudente
A formação socioespacial dos Bairros Rurais Aeroporto, Cedro, Córrego da Onça,
Gramado e Ponte Alta teve como base o retalhamento e a comercialização de parte das
Fazendas Montalvão e Pirapó-Santo Anastácio. O Bairro Gramado situa-se na porção
nordeste ao passo que os Bairros Córrego da Onça e Ponte Alta estão localizados na porção
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
13
sul, ou seja, nas terras da antiga Fazenda Montalvão. No caso dos Bairros Aeroporto e Cedro,
estes situam-se na porção sul, dentro dos limites da Fazenda Pirapó-Santo Anastácio.
O avanço da frente pioneira em direção ao oeste paulista ocasionou, com a expansão do
café, a busca por terras férteis, haja vista que este produto era visto como a fonte de riqueza
nesse período.
A constituição desses bairros rurais ocorreu com o início do processo de
comercialização dos lotes rurais e com a instalação das primeiras famílias em virtude da
frente pioneira. Em 1917, o Coronel Francisco de Paula Goulart, dono da Fazenda Pirapó-
Santo Anastácio, iniciou a comercialização das propriedades rurais e, mais tarde, a venda de
lotes no incipiente núcleo urbano. Alguns anos mais tarde, em 1919, o Coronel José Soares
Marcondes, proprietário de uma empresa de colonização, realizou o retalhamento e a
comercialização dos lotes referentes à Fazenda Montalvão, limítrofe à Fazenda Pirapó-Santo
Anastácio. O Coronel Marcondes organizou uma intensa propaganda em todo o Estado de São
Paulo, principalmente nas regiões de ocupação mais antiga, como Sorocaba. O café e as
culturas intercalares permitiram a ocupação efetiva da área e sua valorização, assim,
“centenas de pequenas e médias propriedades espalharam-se por toda região em ‘habitat’
disperso e, quase sempre linear” (LEITE, 1972, p. 58).
A crise do café associada aos incentivos das máquinas de beneficiamento levou à
expansão das plantas oleaginosas (amendoim e algodão), entre os anos 1940 e final dos anos
1960. Já nos anos 1970, a área cultivada com lavouras sofreu uma retração e foi substituída
pela expansão das pastagens. Na década de 1980 houve um crescimento no cultivo da batata-
doce, feijão e mandioca, além da pecuária mista (leite e corte). Atualmente, verifica-se, nos
bairros rurais pesquisados, uma diminuição da área cultivada para a comercialização, pois se
tem uma produção voltada ao autoconsumo e à venda esporádica.
É importante esclarecer que há a presença na área norte8 do Município de Presidente
Prudente, de loteamentos populares destinados à classe baixa9, construídos, em sua maioria,
pela ação do poder público. Na área sul, por sua vez, as propriedades apresentam uma
valorização superior quando comparada àquelas localizada na porção norte. Isso leva a uma
especulação maior para a aquisição de propriedades situadas ao longo dos Bairros Aeroporto e
Cedro. 8 Estão localizados os Bairros Córrego da Onça e Ponte Alta. 9 Morada do Sol (Antigo Km 7), Parque Alexandrina, Augusto de Paula, Brasil Novo, Humberto Salvador e Francisco Galindo.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
14
Guirro (2003), ao retratar as diferenças de assédio realizadas aos proprietários nos
bairros rurais situados nas porções sul e norte, observa que: A especulação imobiliária em Presidente Prudente é muito intensa, principalmente em se tratando da presença das empresas que buscam implementar novos loteamentos e condomínios fechados ou não. Quem se apresentou para comprar são empresas ligadas ao ramo da construção civil que buscam novas áreas para a implementação de novos bairros e conjuntos residenciais de alto padrão, como também de padrão popular, através do apoio do poder público municipal, ou diretamente pelos órgãos públicos constituídos. Os mais assediados para venderem suas propriedades, estão localizados na região sul/sudoeste do município. É nesta região que se encontram os principais investimentos ligados a pluriatividade do município (grifo nosso).
Para averiguar os tipos de atividades e rendas das famílias rurais residentes nos bairros
rurais estudados, selecionou-se uma amostra de 40 % do número total de propriedades rurais,
destes foram aplicados 26 questionários no Bairro Aeroporto; 16 no Gramado; 11 no Córrego
da Onça; 10 no Ponte Alta e, 05 no Bairro Cedro. Apresentar-se-á, por meio da tabela 01, o
tamanho das propriedades rurais visitadas na pesquisa de campo.
Tabela 01: Tamanho das propriedades rurais (hectares) nos Bairros Rurais do Município de
Presidente Prudente
Aeroporto Cedro Córrego da
Onça Gramado Ponte Alta Estratos de área
(hectares) % % % % %
menos de 1 hectare 42,4 20,0 0,0 0,0 0,0 de 1 a 3 hectares 23,1 20,0 0,0 0,0 0,0
de 4 a 10 hectares 23,1 0,0 9,1 37,5 0,0 de 11 a 19 hectares 0,0 40,0 27,3 37,5 50,0 de 20 a 29 hectares 3,8 20,0 27,3 6,25 0,0 de 30 a 39 hectares 3,8 0,0 0,0 6,25 40,0 de 40 a 50 hectares 3,8 0,0 36,3 12,5 10,0
Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 Fonte: Pesquisa de Campo - outubro/2005 a março /2006
Org: Erika Vanessa Moreira A tabela 01 evidencia um aspecto interessante: os bairros rurais mais próximos à
cidade (Aeroporto e Cedro) apresentam uma maior porcentagem de propriedades com até 10
hectares, ao passo que nos bairros rurais mais distantes da malha urbana, o tamanho das
propriedades variavam, em média, entre 11 e 50 hectares.
Enquanto 88,6 % das propriedades do Bairro Aeroporto e 40 % do Cedro abarcam até
10 hectares, os Bairros Ponte Alta e Córrego da Onça apresentam, respectivamente, 50,0 % e
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
15
63,6 % das propriedades com área entre 20 e 50 hectares. No caso do Bairro Gramado, a
maior parcela das propriedades situam-se entre 4 e 19 hectares, ou seja, 75% do total, sendo
importante esclarecer que uma parte desse bairro localiza-se nas proximidades da malha
urbana.
Para correlacionar o tamanho das propriedades e as principais atividades
desenvolvidas, a tabela 02 agrupa todos os tipos de atividades (agrícolas e não-agrícolas)
desenvolvidas pelos moradores dos bairros rurais.
Tabela 02: Principais atividades e rendas das propriedades rurais nos Bairros Rurais
do Município de Presidente Prudente
Aeroporto Cedro Córrego da
Onça Gramado Ponte AltaAtividades Desenvolvidas % % % % %
Agricultura 80,8 40,0 90,9 62,5 100,0 Pecuária 30,8 60,0 81,9 43,8 80,0
Apicultura 0,0 0,0 9,1 0,0 0,0 Para-agrícola 3,8 20,0 9,1 6,25 0,0
Trabalho eventual 11,5 0,0 9,1 6,25 20,0 Não-agrícola 69,2 60,0 27,3 43,8 60,0
nenhuma 3,8 0,0 9,1 0,0 0,0 Fonte: Pesquisa de Campo - outubro/2005 a março /2006
Org: Erika Vanessa Moreira
A agricultura é predominante em todos os bairros, tanto aquela destinada à
comercialização como aquela destinada ao autoconsumo. É predominante o cultivo de
hortaliças, mandioca, milho, cana-de-açúcar e batata-doce. Essa expressividade mostra que a
busca por atividades e rendas fora da propriedade não leva, necessariamente ao abandono
total da agricultura.
A tabela 02 ilustra que os Bairros Cedro (60%), Córrego da Onça (81,9 %) e Ponte
Alta (80%) apresentam a maior participação no desenvolvimento da pecuária, sobretudo a
pecuária leiteira. No caso do Cedro, a pecuária é em sua maioria utilizada para ocultar a
especulação imobiliária, haja vista que não há comercialização da carne e nem do leite.
A produção de mel comparece apenas no Bairro Córrego da Onça (9,1 %). As
atividades caracterizadas como para-agrícolas (beneficiamento, agregação de valor) aparecem
com expressividade no Cedro (20,0%), com a fabricação de doces e queijos artesanais; no
Córrego da Onça (9,1 %), ocorre a venda de verduras processadas e embaladas; no Gramado
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
16
em 6,25 % ocorre o processamento de alimentos para a venda na feira; no Aeroporto (3,8%),
com a lavagem, seleção, processamento de legumes (cortados e ralados) e o armazenamento
dos produtos em embalagens de isopor.
No caso do trabalho eventual, foram considerados aqueles que são exercidos
esporadicamente, sem vinculo empregatício, como pedreiros, empregados temporários e
diaristas. No Bairro Ponte Alta, a participação desse tipo de atividade corresponde a 20,0 %,
com destaque ao trabalho temporário em outra propriedade; no Bairro Aeroporto, a
participação dos 11,5 % que exercem algum tipo de trabalho eventual estão vinculados ao
trabalho doméstico e como pedreiros, ao passo que no Córrego da Onça ( 9,1 %) e Gramado
(6,3 %) são trabalhos eventuais praticados tanto na atividade agrícola como no serviço
doméstico na cidade.
Em relação às atividades não-agrícolas, houve uma participação significativa em todos
os bairros. De maneira decrescente, tem-se: Aeroporto (69,2%); Cedro (60 %); Ponte Alta
(60%); Gramado (43,8%) e Córrego da Onça (27,3 %). As propriedades que aparecem sem
nenhuma atividade referem-se aos moradores (ex-produtores rurais) aposentados.
Como já mencionado em passagem anterior, as fontes de rendas podem ser maiores
que o número de atividades desenvolvidas pelos membros da família, pois as aposentadorias e
o arrendamento, por exemplo, são fontes de renda obtidas sem a necessidade de se
desenvolver nenhum tipo de atividade. A tabela 03 apresenta as múltiplas fontes de renda das
famílias dos bairros rurais pesquisados.
Tabela 03: Fontes de renda das famílias residentes pesquisadas nos Bairros Rurais do Município de Presidente Prudente:
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
17
Aeroporto Cedro Córrego da
Onça Gramado Ponte Alta Fontes de Renda10 % % % % %
Renda agrícola 7,7 40,0 90,9 50,0 50,0 Renda agrícola e não-agrícola 53,8 20,0 27,3 37,5 40,0 Apenas renda não-agrícola 11,5 20,0 0,0 6,25 0,0 Renda não-agrícola obtida dentroda propriedade 3,8 40,0 9,1 6,25 0,0 Transferência social 46,2 40,0 72,7 37,5 50,0 Outras rendas 11,5 20,0 36,4 25,0 0,0 Rendas eventuais 11,5 0,0 9,1 6,25 20,0
Fonte: Pesquisa de Campo – outubro/2005 a março/2006 Org: Erika Vanessa Moreira
Como pode ser observado na tabela 03, ocorre uma proeminência nas rendas obtidas
por meio das atividades agrícolas e pelas transferências sociais. As rendas agrícolas
comparecem com expressividade nos bairros Córrego da Onça (90,9 %), Gramado (50,0%),
Ponte Alta (50,0%) e Cedro (40,0 %), ao passo que no Aeroporto a participação de renda
advinda de atividade agrícola é ínfima (7,7 %). Cabe ressaltar que no Bairro Aeroporto (80,8
%), embora haja o desenvolvimento de alguma atividade agrícola, a produção é direcionada
ao autoconsumo.
No que se refere às rendas de transferência social (aposentadoria, pensões), os dados
revelam a sua importância no orçamento das famílias, com destaque nos Bairros Córrego da
Onça (72,7 %) e Ponte Alta (50,0 %).
As famílias com rendas agrícolas e não-agrícolas também se revelam significativas em
todos os Bairros: no Aeroporto (53,8 %); no Ponte Alta (40,0 %); no Gramado (37,5 %); no
Córrego da Onça (27,3 %); no Cedro (20,0 %). Dentre as atividades não-agrícolas
desenvolvidas pelos moradores dos bairros rurais, destacam-se: funcionalismo público
(professores e seguranças); autônomo (vendedor sem registro em carteira); prestação de
serviço, comércio; emprego doméstico; serviços gerais e transporte.
O aluguel de casas na cidade, o arrendamento de terras são caracterizados como outras
rendas e são significativas no Bairro Córrego da Onça (36,4%), Gramado (25,0 %) e Cedro
(20,0 %). As rendas eventuais obtidas com os trabalhos esporádicos são expressivas nos
Bairros Ponte Alta (20,0%) e Aeroporto (11,5 %).
10 Essa tipologia foi baseada em Conterato; Schneider (2005).
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
18
Em suma, as informações levantadas na pesquisa de campo revelaram que as rendas das
famílias dos bairros rurais não estão apenas respaldadas no agrícola, mas na combinação de
diferentes tipos de atividades.
5. Considerações finais
A idéia apresentada nesse texto sobre as variáveis metodológicas do estudo da
pluriatividade e das atividades e rendas sem vínculo agrícolas, visa contribuir ao estudo dessa
temática no campo geográfico. Considerar a multiplicidade de fontes de renda e atividades no
espaço rural é admitir a heterogeneidade e a emergência de estudos que contemple esse tema.
Dois pontos merecem ser reforçados quanto à análise dos bairros pesquisados: a) a
proximidade da malha urbana permite uma maior mobilidade dos moradores entre a
propriedade e o local de trabalho (urbano), como ocorre nos Bairros Aeroporto e Cedro, mas
não é um fator decisivo na busca de atividade fora da agricultura, haja vista que no Bairro
Ponte Alta, o desenvolvimento de atividades não-agrícolas é expressivo, mesmo situando-se
entre 6 e 10 Km da malha urbana; b) a busca de atividades fora da propriedade não leva ao
abandono total da agricultura, mas o que de fato ocorre é a diminuição da área cultivada, já
que esta passa a ser direcionada apenas ao autoconsumo.
Verifica-se que nos Bairros Rurais Pesquisados no Município de Presidente Prudente,
que a multiplicidade de rendas está presente em todas as unidades socioespaciais pesquisadas,
com destaque à aposentadoria e a combinação de rendas agrícolas e não-agrícolas.
Em razão deste trabalho estar em fase de desenvolvimento, pretende-se realizar uma
análise mais acurada e crítica a partir das correlações entre rendas, atividades, estrutura
produtiva, estrutura fundiária e característica da família; enfim, compreender os fatores e os
mecanismos indutores da pluriatividade e das múltiplas fontes de renda nos bairros rurais do
Município de Presidente Prudente.
6. Referências Bibliográficas
BALSADI, Otavio Valentin. Mudanças rurais e emprego no Estado de São Paulo nos
anos 90. São Paulo: Annablume, 2002.
BOMBARDI, Larissa Mies. O Bairro Rural como identidade territorial: a especificidade da
abordagem do campesinato na geografia. Revista Agrária, São Paulo: USP/Laboratório de
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
19
Geografia Agrária da FFCLCH, 2004. nº 01, p. 55-95. Disponível em: <
http://www.usp.br/geografia. pdf> [texto para donwload]. Acesso em 29 de Junho de 2005.
CANDIDO. Antonio. Os Parceiros do Rio Bonito. 10º ed. rev. São Paulo: Duas Cidades/
Editora 34, 2003.
CARNEIRO, Maria José. O desenvolvimento rural e o “Novo Rural”. GRAZIANO DA
SILVA, José et al (org). O Novo Rural Brasileiro: Políticas Públicas. Jaguariúna:
EMBRAPA, 2000, v.4, p. 117-148.
CARNEIRO, Maria José. Camponeses, Agricultores e Pluriatividade. Rio de Janeiro:
Contra Capa, 1998, 228p.
CHAYANOV, Alexander V. La organización de la unidad económica camponesa. Buenos
Aires: Nueva Visión, (1925) 1974, p.96-131.
CONTERATO, Marcelo Antonio; SCHNEIDER, Sergio. Transformações agrárias, tipos de
pluriatividade e desenvolvimento rural: considerações a partir do Brasil. XXXLV Congresso
da Sociedade Brasileira de Economia e Sociologia Rural. Ribeirão Preto, 2005. Anais,...,
Ribeirão Preto, 2005. CD-ROM, 22 p.
DEL GROSSI, Mauro Eduardo; GRAZIANO DA SILVA, José. A pluriatividade na
agropecuária brasileira em 1995. Revista Estudos Sociedade e Agricultura, Rio de Janeiro, n.
1, 1998. Disponível em < http://www.eco.unicamp.br/rurbano/textos > Acesso em 10 de julho
de 2002.
DEL GROSSI, Mauro Eduardo et al. Diferencial de renda entre ocupações no meio rural
brasileiro. In: XXXIX Congresso da Sociedade Brasileira de Sociologia e Economia
Rural, Recife, 2001. Disponível em <
http://www.eco.unicamp.be/nea/rurnao/textos/congrsem/sober01/s0114.htm > Acesso em 17
de julho de 2005.
FERNANDES, Liliana Laganá. Bairros Rurais do Município de Limeira. São Paulo, 1972.
Tese (Doutoramento em Geografia). Departamento de Geografia da Universidade de São
Paulo.
GUIRRO, Mauro Sandro. Inserção da pequena propriedade rural no entorno da malha
urbana de Presidente Prudente/SP: Pluriatividade e agricultura part-time. Presidente
Prudente: FCT/UNESP, 2003. Monografia (Bacharelado em Geografia). Faculdade de
Ciências e Tecnologia, Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
20
KAGEYAMA, Ângela. Pluriatividade na agricultura: alguns aspectos conceituais. In: XXXVI
Congresso da Sociedade Brasileira de Sociologia e Economia Rural. Poços de Caldas, v.2,
1998.
LEITE, José Ferrari. A Alta Sorocabana e o espaço polarizado de Presidente Prudente.
Presidente Prudente: FAFI, 1972.
MOREIRA, Erika Vanessa; HESPANHOL, Rosângela Aparecida de Medeiros Hespanhol.
Um olhar sobre o lugar: reflexões sobre os Bairros Rurais no Município de Presidente
Prudente. VI Encontro Nacional da ANPEGE, Fortaleza, 2005. 15p. CD-ROM.
MOURA, Margarida Maria. Os herdeiros da terra: parentesco e herança numa área
rural. São Paulo: Hucitec, 1978, 100p.
MULLER, Nice Lecocq. Bairros Rurais do Município de Piracicaba/SP. Boletim Paulista de
Geografia. São Paulo, n. 43, julho/1966, p. 83-130.
PAULINO, Eliane Tomiasi. Terra e Vida: A Geografia dos Camponeses no Norte do
Paraná. Presidente Prudente, 2003. Tese (Doutorado em Geografia) Faculdade de Ciências e
Tecnologia, Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente.
QUEIROZ, Maria Isaura de Pereira. Bairros Rurais Paulistas: dinâmica das relações
bairro rural-cidade. São Paulo: Duas cidades, 1973, 152p.
SACCO DOS ANJOS, Flavio. Agricultura familiar, Pluriatividade e Desenvolvimento
Rural no Sul do Brasil. Pelotas: EGUFPEL, 2003. 374p.
SAFFIOTI, Heleithe Iara Bongiovani. A mulher na sociedade de classes: entre o mito e a
realidade. 2 ed. Petrópolis: Vozes, 1979.
SCHNEIDER, Sergio. A pluriatividade na agricultura familiar. Porto Alegre: UFRGS,
2003.
SCHNEIDER, Sergio. Rurbanização e Pluriatividade: o mercado de trabalho não-agrícola e a
pluriatividade das famílias em áreas rurais (um estudo de caso). In: CARVALHO, Fátima de;
GOMES, Marília Maciel; LIRIO, Viviane Silva (org). Desigualdades sociais: pobreza,
desemprego e questão agrária. Viçosa, 2003a, p. 151-188. Obtido via e-mail
[email protected] , data de envio 08 de agosto de 2005.
SCHNEIDER, Sergio. A abordagem territorial do desenvolvimento rural e suas articulações
externas. I Fórum Internacional Território, Desenvolvimento Rural e Democracia,
Fortaleza, 2003 b. Texto obtido via e-mail [email protected] , data de envio 08 de
agosto de 2005.
UNIVERSIDADE FEDERAL DE UBARLÂNDIA – UFU INSTITUTO DE GEOGRAFIA – IG
LABORATÓRIO DE GEOGRAFIA AGRÁRIA – LAGEA
II ENCONTRO DE GRUPOS DE PESQUISA
21
SOUZA, Paulo César. A resistência dos bairros rurais no Município de Martinópolis/SP.
2004. Dissertação (Mestrado em Geografia) – Faculdade de Ciências e Tecnologia,
Universidade Estadual Paulista, Presidente Prudente.
TEIXEIRA, Vanessa Lopes. Pluriatividade e agricultura familiar na região serrana do
Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1998. Dissertação (Mestrado em Sociedade e
Agricultura) - Curso de Pós-Graduação em Desenvolvimento Agrícola, Universidade Federal
Rural do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro. Disponível em <
http://www.eco.unicamp.br/nea/rurbano/tese/ > [pasta zipada]. Acesso em 10 de março de
2005
VEIGA, José Eli da. O Brasil Rural precisa de uma estratégia de desenvolvimento. Texto
para discussão, NEAD/MDA, agosto/2001 (mimeog.).
WOORTMANN, Ellen F. Herdeiros, parentes e compadres: colonos do Sul e sitiantes do
Nordeste. São Paulo/Brasília: Hucitec/Edunb, 1995.