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Odete Esteves de Carvalho Aspectos da repartição do rendimento em Portugal: análise no período dos I e II Planos de Fomento Tendo-se estudado, em artigo anterior, a repartição pessoal do rendimento em Por- tugal, analisa-se agora a repartição funcio- nal entre o factor trabalho e os restantes factores, a nivel global e por actividades Examina-se também a acção correctiva (re- distribuição) exercida através dos impostos e das contribuições para a segurança social. Finalmente, faz-se a análise da aplicação dos recursos nacionais no consumo e no in- vestimento. Todo o estudo se refere, essen- cialmente, ao período 1953-1964. A. ANALISE DA REPARTIÇÃO FUNCIONAL — SALÁRIOS E OUTROS RENDIMENTOS 0. Introdução A repartição funcional traduz a forma como se remuneram os factores produtivos que contribuem para a formação do pro- duto nacional, nomeadamente o trabalho, o capital, a terna e a empresa. As remunerações desses factores designadas por sa- lários, juros, rendas e lucros, respectivamente, cabem aos agen- tes da produção em contrapartida do trabalho que fornecen- do capital que emprestam ou utilizam, e da actividade empresa- rial a que se dedicam, perfazendo a sua soma o rendimento na- cional.

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OdeteEsteves

deCarvalho

Aspectos da repartiçãodo rendimentoem Portugal:análise no períododos I e II Planos de Fomento

Tendo-se estudado, em artigo anterior, arepartição pessoal do rendimento em Por-tugal, analisa-se agora a repartição funcio-nal entre o factor trabalho e os restantesfactores, a nivel global e por actividadesExamina-se também a acção correctiva (re-distribuição) exercida através dos impostose das contribuições para a segurança social.Finalmente, faz-se a análise da aplicaçãodos recursos nacionais no consumo e no in-vestimento. Todo o estudo se refere, essen-cialmente, ao período 1953-1964.

A. ANALISE DA REPARTIÇÃO FUNCIONAL — SALÁRIOSE OUTROS RENDIMENTOS

0. Introdução

A repartição funcional traduz a forma como se remuneramos factores produtivos que contribuem para a formação do pro-duto nacional, nomeadamente o trabalho, o capital, a terna e aempresa. As remunerações desses factores designadas por sa-lários, juros, rendas e lucros, respectivamente, cabem aos agen-tes da produção em contrapartida do trabalho que fornecen-do capital que emprestam ou utilizam, e da actividade empresa-rial a que se dedicam, perfazendo a sua soma o rendimento na-cional.

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A repartição funcional constitui, por assim dizer, a estruturabásica da repartição pessoal, pois os rendimentos disponíveis dosparticulares resultam da redistribuição efectuada sobre o rendi-mento dos factores produtivos por intermédio dos impostos e dastransferências. Daí a importância fundamental do problema da re-muneração e posse, por parte dos agentes económicos, dos váriosfactores produtivos e a necessidade de investigar as medidasmais eficazes para o estabelecimento de uma repartição funcionaltanto quanto possível adequada à estrutura sócio-económica dopaís e aos objectivos últimos de uma política de repartiçãoequitativa do rendimento nacional, de molde a tornar efectiva-mente possível o acesso de todos os membros da comunidade aosbens e serviços indispensáveis ao seu desenvolvimento integral.

Estudos analíticos da repartição funcional que englobem atotalidade enumerada de factores são, em geral, escassos mes-mo nois paísies evoluídos, dado que exigem ia disponibilidade deelementos estatísticos muito detalhados sobre o rendimento dasempresas, da propriedade rústica e do capital, elementos esses que,normalmente, isão de difícil obtenção, sobretudo quando se pre-tendam resultados com uma margem de erro reduzida. Em Por-tugal, as únicas estimativas de que se tem conhecimento sãorelativas a 1950 e 1960 \ O facto de os elementos disponíveisnão permitirem, por enquanto, uma redução das margens de erroque aqueles números certamente contêm e os laboriosos cál-culos que implicaria uma actualização daquela estimativa, feitanos mesmos moldes, para 1964, conduziu à solução de se reduzira presente análise à estimativa da participação do rendimentodo trabalho e do conjunto dos rendimentos dos restantes fac-tores (lucros, rendas e juros) no rendimento nacional. Esteconjunto designar-se-á, de forma genérica, por rendimento resi-dual líquido e englobará, simultaneamente, a remuneração da em-presa, da propriedade rústica e do capital2.

A análise efectuar-se-á a nível global e sectorial e, dentrodo critério estabelecido anteriormente, o estudo da repartiçãofuncional incidirá fundamentalmente sobre a média dos anos quedelimitam aproximadamente os dois primeiros Planos de Fomen-to, ou seja, 1953/4,1958/9 e 1963/4.

O rendimento do factor trabalho resultou do produto das re-munerações médias apresentadas no quadro A. 3, pela população

1 «A Repartição do Rendimento em Portugal Continental» de OdeteEsteves de Carvalho e João Moura — Caderno n.° 8 do F. D. M. O., 1966.

2 Note-se, contudo, que no caso da propriedade rústica o seu rendimentoaparece mais ou menos isolado na medida em que ele corresponde, pratica-mente, ao rendimento residual líquido da Agricultura.

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empregada por conta de outrem estimada para a respectiva ac-tividade. O rendimento residual líquido é, por sua vez, a dife-rença do rendimento do trabalho para o produto líquido da cor-respondente actividade segundo as Contas Nacionais 3.

Não é possível prolongar a análise até ao nível regional pornão se dispor de de um mínimo de elementos.

1. Repartição funcional do rendimento nacional entre o factor tra-balho e os restantes factores, a nível global e por actividades

Da observação do quadro B. 1 — onde se apresentam as per-centagens do Rendimento nacional que cabem ao factor traba-lho e aos restantes factores — conclui-se que a participação dofactor trabalho no rendimento nacional foi, em 1963/4 de44,3% tendo-se registado um ligeiro aumento em relação às per-centagens verificadas no início do I e do II Planos (em 1953/4foi de 39,6 % e em 1958/9 de 41 %). Estas percentagens nãodiferem sensivelmente das já apresentadas em trabalhos ante-riores, as quais se transcrevem por ordem cronológica da suapublicação.

115III

195039,3%

1953/4

39,5%

1953/5

41,6 %

1958/9

41,0%

196041,4%

1959/61

43,8 %

1963/4

44,3%

Em relação aos últimos números publicados (II), as per-centagens que agora se apresentam, apesar da não coincidênciade períodos, poderão conduzir à conclusão de que as actuaisestimativas das remunerações do trabalho são, provavelmente,mais baixas do que aquelas. A diferença resulta, porém, não des-se facto, mas sim de alterações sensíveis nos valores das ContasNacionais que serviram de base aos respectivos cálculos 6.

s O produto líquido de cada actividade corresponde, por sua vez, aoproduto bruto deduzido das respectivas amortizações.

* Caderno n.° 8 do F. D. M. O., já cit.s «Estrutura e Tendências da Repartição Funcional do Rendimento

Português», João Cruzeiro e Alexandre Borrego, — Análise Social n.° 15,vol. IV, 3.° trimestre 1966.

6 A estimativa das Contas Nacionais agora utilizada é a mais recentee apresenta valores para o Rendimento Nacional sensivelmente mais elevadosdo que os publicados anteriormente.

Comparação entre os valores absolutos que serviram de base ao cálculodas percentagens de II e às actuais estimativas, para o mesmo período (milcontos).

Rendimento Nacional Rendimento do trabalho

586

1953/551959/61

/ /42 38659 685

III45 186,762 969,3

/ /17 62426158

/ / /17 825,726 401,4

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Estimativa da repartição funcional e sua evolução por divisões da actividade

económica. Percentagem do rendimento do trabalho e do rendimento residual

líquido em relação ao produto líquido da respectiva actividade

QUADRO B. 1

Actividades(C. A. E.)

1

0 — Agricult., Silvi-cultura, Caça e

PescaAgricult., Silvi-

cultura, CaçaPesca

1 — Indústrias ex-tractivas

2/3 — Indús t r i a sT r a n sf ormadoras

4— Construção eObras Públicas .. .

5 — Electricid., Gás,Água, e Serv. Sa-neamento

6 — Comércio, Ban-cos, seguros, op.sb. Imóveis

ComércioBancos, Seguros

e op. sb. Imó-veis

7 — Transp., Arma-zenagem e Comu-nicações

8 — Serviços

Rendimento Interno

Rendimento Nac i o -nal

Média dos anos1953/54

Rendi-mento

do tra-balho

2

24,5

22,775,2

33,8

34,5

81,2

26,8

26,722,2

54,6

73,7

65,9

39,6

39,5

Rendi-mento

residuallíquido

3

75,5

77,324,8

fifí 9

65,5

18,8

73,2

73,377,8

45,4

26,3

34,1

60,4

60,5

Média clos anos1958/59

Rendi-mentodo tra-balho

4

25,8

23,777,7

7^ A

33,3

80,6

25,2

29,024,0

55,2

76,3

66,0

41,0

41,0

Rendi-mento

residuallíquido

5

74,2

76,322,3

9Á &

66,7

19,4

74,8

71,076,0

44,8

23,7

34,0

59,0

59,0

Média dos anos1963/64

Rendi-mentodo tra-balho

6

29,3

27,269,4

\J\JfO

33,4

77,0

26,6

33,228,5

61,2

67,3

75,5

44,3

44,3

Rendi-mento

residuallíquido

7

70,7

72,830,6

66,6

23,0

73,4

66,871,5

38,8

32,7

24,5

55,7

55,7

% d€ aumen.to dos em-pregados porconta de ou-trem entre1953/54 e

1963/64

8

— 12,7

—13,57,5

1 A 1— 14,1

21,5

44,6

38,8

30,023,9

79,7

12,0

7,0

7,4

FONTE: I. N. E. — Elementos revistos das Contas Nacionais.Estatística IndustrialEstatística das SociedadesAnuário EstatísticoRecolha de elementos sobre mão-de-obra realizada, em Janeiro de 1965, pela Divi-

são de Estatística do F. D. M. O. {Suplemento ao Boletim n.° 11/12).Orçamento Geral do EstadoEstimativa dos empregados por conta de outrem, feita a partir do censo de 1960.

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As várias estimativas apresentadas vêm confirmar que, narealidade, a participação do factor trabalho no rendimento na-cional não devia ter-se afastado sensivelmente dos 45 % nosanos 1963/4, percentagem esta que, quando comparada com avigente nos países evoluídos, onde o coeficiente de capitalizaçãoé sem dúvida mais elevado7, e mesmo com a processada empaíses com nível de desenvolvimento económico semelhante aode Portugal, se pode considerar francamente desfavorável a estefactor8. Aliás, nesta deficiente repartição funcional se encontra,basicamente, uma das causas das baixas remunerações médiasdos trabalhadores, já constatadas atrás e detalhadamente anali-sadas. A acentuada diferença em 1963/4, entre a capitação anualda remuneração do factor trabalho (13,99 contos) e a capitaçãoanuiail de rendimento dos restantes factores8 (76,18 contos) con-firma esta afirmação.

Apesar de, globalmente, a posição do trabalho em relaçãoao rendimento nacional denotar uma certa melhoria ao longodo período 1953/4 a 1963/4, importa ter presente que parte desseaumento se deveu à elevação do número de trabalhadores quefoi de cerca de 7,4 % entre 1953/4 e 1963/4.

7 Por coeficiente de capitalização entende-se, neste caso, o peso do factorcapital em relação ao factor trabalho.

8 Percentagem do rendimento do factor trabalho em relação ao Rendi-mento Nacional em alguns países.

Países

Reino UnidoEstados UnidosAlemanhaFrançaBélgicaEspanha (a)

Percentagens1960

74,170,166,064,962,055,1

(a) Percentagem referente a 1964

Estas percentagens incluem no «rendimento do factor trabalho» aparcela correspondente aos descontos das entidades patronais para a segu-rança social, enquanto a percentagem referida no texto para o caso poirtuguesnão contém esta verba. Para que seja possível estabelecer uma comparaçãoimporta adicionar aos 44,3 % cerca de 4 % que corresponde ao montante dascontribuições patronais para a Previdência em relação ao Rendimento Nacio-nal. Assim, a percentagem que, no caso português, deverá ser tomada paratermo de comparação com as atrás citadas para outros países deverá ser48,3 %.

9 A capitação dos rendimentos dos restantes factores resultou do quocientedo rendimento residual líquido pelo total de patrões e isolados. Evidentementeque esta estimativa é grosseira e, em rigor, não é completamente comparávelcom a da remuneração do trabalho na medida em que muitas outras pessoasnão activas beneficiam do rendimento desse capital.

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A repartição funcional processada ao nível da actividadeeconómica difere sensivelmente de sector para sector. Enquanto,em 1963/4, na Electricidade e na Agricultura foram atribuídos aofactor trabalho apenas cerca de 27 % do produto líquido do sector,nas Indústrias Transformadoras a percentagem foi de 33,4%chegando a atingir os 77 % na Construção10. Esta gama detipos de repartição funcional não define propriamente posiçõesrelativas dos sectores no que se refere a uma melhor ou piorrepartição funcional, pois a combinação dos factores produtivos,que tem uma influência determinante no tipo de repartição,varia de actividade para actividade, isto é, o peso do volume damão-de-obra em relação ao montante de capital investido em cadasector difere sensivelmente entre eles1X pelo que, para formular umjuízo de valor quanto ao tipo de repartição mais correcto emcada caso se torna indispensável um estudo mais profundo sobreoutros problemas, nomeadamente a percentagem, em relação aocapital investido, da remuneração deste factor em cada actividade.Como não se dispõe de elementos elucidativos sobre estes proble-mas far-se-ão apenas algumas considerações acerca da evoluçãodas percentagens do rendimento nacional que, ao longo do perío-do, couberam a cada factor na respectiva actividade e do signifi-cado dessa evolução à luz dos objectivos inerentes a uma repartiçãoequitativa.

10 Enquanto a nível global as diferenças entre as percentagens doRendimento Nacional atribuídas ao trabalho agora estimadas e as publicadasem «Estrutura e Tendências da Repartição Funcional do Rendimento Portu-guês», não diferem sensivelmente, o mesmo não acontece quando se comparamas referidas percentagens ao nível da actividade económica, nomeadamente noque se refere às Indústrias Extractivas, à Electricidade, ao Comércio e aosServiços. As diferenças resultam não só das correcções introduzidas posterior-mente nos valores das Contas Nacionais mas ainda das estimativas do empregoe, provavelmente, das próprias remunerações médias. No caso do Comércio,foi possível verificar que o principal motivo foram as actualizações dasContas Nacionais. Nos restantes, para além deste facto verificaram-se aindadiferenças acentuadas nos totais das remunerações, não sendo porém possívelavaliar qual dos elementos teve maior importância, se a estimativa do empregoou das capitações das remunerações, na medida em que, naquele trabalho, nãofiguram especificamente valores para cada um deles.

11 É provável que a combinação de factores produtivos (capital investidoe número de trabalhadores) difira sensivelmente, por exemplo no sector daElectricidade e nos Serviços, sendo de prever pelas próprias característicasespecíficas das actividades que, no primeiro caso, a importância da mão-de--obra seja relativamente menor que no segundo e, portanto, se possa admitira hipótese de terem efectivamente idêntico nível de repartição apesar dasdiferenças constatadas na estrutura da repartição. Daí que esta combinaçãode factores surja como um elemento muito importante que se deverá ter emconta na análise comparativa da repartição funcional processada nos váriossectores com vista ao estabelecimento de uma remuneração equitativa dessesmesmos factores.

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Assim, é provável que, dinamicamente, o benefício da remu-neração do factor trabalho na Agricultura e nas Indústrias Ex-tractivas tenha sido efectivamente mais elevado do que o su-gerido pela evolução das respectivas percentagens, na medidaem que, ao longo do período, se reduziu o contingente de mão-de--obra que nelas trabalhava. No caso das Indústrias Transforma-doras, da Construção, dos Transportes e da Pesca verificou-seo contrário: a um aumento do número de trabalhadores corres-pondeu uma redução na percentagem que lhe foi atribuída dorespectivo produto líquido, donde se conclui que a deterioraçãoda posição relativa da remuneração do factor trabalho foi aindamais acentuada que a revelada pelas percentagens do quadro B. 1.Aliás, como já se salientou anteriormente, isto é um reflexo dofacto já constatado de a produtividade ter evoluído nestes sec-tores mais do que proporcionalmente em relação aos salários.As conclusões desta análise, embora restritas, vêm aliás con-firmar a necessidade de intervir no sentido de garantir ao factorprodutivo trabalho uma mais elevada participação, sendo dedesejar que atinja rapidamente pelo menos 50 % do P. I. L. im-pondo-se essa actuação, principalmente, nos sectores das Indús-trias Transformadoras e na Construção pelo facto de os saláriosserem relativamente baixos e, simultaneamente, estes sectoresterem uma importância crescente na economia nacional.

B. ANALISE DA REDISTRIBUIÇÃO

0. Introdução.

Normalmente, não se chega a uma repartição dos rendimen-tos aceitável sob o ponto de vista social apenas através do livrejogo dos mecanismos económicos. Mesmo que se pense que aestrutura desses mecanismos estaria em condições de asseguraruma distribuição equitativa, o livre funcionamento das forçaseconómicas dá origem, na prática, a muitos desvios que atingemdirectamente a repartição dos rendimentos. Este é um facto evi-dente, tão evidente que se pode constatar imediatamente em todasas economias que, sem uma intervenção considerável dos pode-res públicos para operar uma redistribuição, a estrutura de rendi-mentos que resulta do jogo normal dos mecanismos económicosé injusta 12.

12 Afirmações expressas em «Les Revenus Non-Salariaux et Ia Politiquedes Prix» — O.C.D.E., 1966.

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Os poderes públicos têm presentemente ao seu dispor instru-mentos apropriados, nomeadamente a fiscalidade e a segurançasocial, para corrigir as consequências daqueles desvios e redis-tribuir mais equitativamente o rendimento nacional. Esta actua-ção efectiva-se num duplo aspecto:

— uma acção conrectiva básica, sobre os desequilíbriosexistentes quer na formação dos rendimentos (repartição fun-cional) quer na sua própria posse por parte dos indivíduos(repartição pessoal), acção essa que se exerce através do es-tabelecimento de impostos e contribuições quando vão retiraraos possuidores de rendimentos mais vultosos uma parcelados mesmos;

— uma acção redistributiva, que atenue ainda mais aque-les desequilíbrios, na medida em que os poderes públicos apli-quem as receitas assim obtidas em favor das classes de ren-dimentos menos elevados, quer por meio de uma tsimples trans-ferência monetária quer pondo ao seu dispor certos bense serviços fundamentais.

Quanto ao primeiro tipo de acção, ela pode exercer-se prio-ritariamente na própria fase da formação dos rendimentos, istoé, em relação ao rendimento do factor trabalho e dos restantesfactores produtivos; ou já na fase da repartição pessoal, ou seja,sobre o rédito do indivíduo. Em regra, as acções são paralelase as suas consequências são complementares, uma vez que, me-lhorando-se a repartição funcional, essa actuação se fará sentirna determinação da própria repartição pessoal.

Por outro lado, a acção redistributiva, numa perspectiva so-cial, é o complemento lógico e o meio eficaz para se atingiremos fins da repartição do rendimento, cujo objectivo último não épropriamente diminuir o nível de bem-estar de algumas camadasda população, mas antes oferecer possibilidades a todos os ho-mens de ascenderem aos benefícios do desenvolvimento socio-eco-nómico. Daqui resulta a importância fundamental que assume omodo como são utilizadas as receitas derivadas dos impostos econtribuições.

Dentro do esquema de análise que se tem vindo a utilizar jul-ga-se agora de interesse a observação, embora sumária, do siste-ma português de impostos e de contribuições para a segurançasocial, a fim de se determinarem as suas linhas essenciais quan-to à acção correctiva exercida sobre a repartição funcional e arepartição pessoal dos rendimentos e qual a sua possível eficá-cia sobre as principais distorções básicas observadas nas alíneasanteriores. Com vista a facilitar a análise consideram-se, em se-parado, os impostos e contribuições correctivos da repartição fun-cional e os da repartição pessoal; os primeiros serão designados

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por impostos e contribuições directamente imputáveis aos rendi-mentos dos factores produtivos e os segundos por impostos econtribuições que recaem sobre os rendimentos pessoais13.

No que se refere à acção redistributiva, isto é, à aplicação,por parte dos poderes públicos, das receitas provenientes dosimpostos e das contribuições para a segurança social14, levan-tam-se várias dificuldades tanto de carácter estatístico como aténo relativo à formulação e harmonização de conceitos teóricos,dificuldades essas que ainda não foi possível ultrapassar e queconduziram a solução de se abordar apenas o problema global-mente quando se estudar a aplicação das receitas públicas emdespesas de consumo e em investimento segundo os elementos dasContas Nacionais.

1. Acção correctiva exercida através dos impostos e das contri-buições para a segurança social

A totalidade dos impostos e de contribuições para a segu-rança social representava em relação ao P. I. L. 7,8% em 1953e 9,5 % em 1964. Segundo se depreende do quadro C. 1, desdeo início do período em estudo até 1960 o valor desta percen-tagem elevou-se apenas de 1 % acentuando-se ligeiramente o ritmodeste crescimento nos últimos quatro anos considerados.

13 Como directamente imputáveis aos rendimentos dos factores produtivosconsideram-se as contribuições industrial, predial, rústica e urbana; o impostoprofissional, os impostos de capitais, de camionagem, de compensação, detrânsito; o imposto complementar sobre pessoas colectivas; os impostos sobreespectáculos e divertimentos públicos, sobre a fabricação e consumo de cerveja;sobre minas e águas minerais; a sisa; e as contribuições para a Previdênciae para o Fundo de Desemprego.

Consideram-se como impostos imputáveis aos rendimentos pessoais oimposto complementar sobre pessoas singulares e o imposto de sucessões edoações.

14 Para se fazer uma ideia da importância que esta acção redistributivapoderá assumir no caso português vejam-se os valores que constam dos qua-dros C. 1 e C. 4, colunas 2 e 6, respectivamente, e que traduzem a amplitudeda capacidade dos poderes públicos neste aspecto.

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Impostos e contribuições para a segurança social, percentagem em relaçãoao P. I. L. e sua evolução

QUADRO C.

i

195319541955195619571958195919601961196219631964

1

Total dos im-postos e das

t*CkYl "f*T*1 Til! 1 /»Aí>Q

em relação aoP. I. L.

2

7,88,08,18,18,28,88,88,79,19,39,59,5

Impostos emrelação ao

P. I. L. (a)

3

4,64,74,74,74,75,25,14,95,05,05,14,9

Contribuições para a Segurança Social emrelação ao P. I. L.

Total

4

3,23,33,43,43,53,63,73,84,14,34,44,6

Previdência(b)

5

2,82,93,03,03,13,23,33,43,73,93,94,1

Fundo de De-semprego (c)

6

0,40,40,40,40,40,40,40,40,40,40,50,5

FONTE: Anuário Estatístico das Contribuições e ImpostosBoletim dó Comissariado do DesempregoEstatística da Organização Corporativa e Previdência SocialI. N. E. — Elementos revistos das Contas Nacionais(a) Impostos profissional e complementar; impostos de capitais, de camionagem,

de compensação, de trânsito e de sucessão; impostos sobre espectáculos e di-vertimentos públicos, sobre a fabricação © consumo da cerveja e sobre minase águas minerais; sisa. Em 1962, 1963 e 1964 foi incluído o imposto para adefesa e valorização do Ultramar. Em 1964 foi ainda considerado o impostosobre a indústria agrícola.

(b) Contribuições dos trabalhadores do sector privado, das entidades patronais edos funcionários públicos.

(c) Contribuições dos trabalhadores e da entidade patronal.

Comparando a parcela do P. I. L. retirada pelos poderespúblicos através dos vários impostos directos e o montante quefoi obtido com as contribuições para a segurança social cons-tata-se que, em 1964, as percentagens são praticamente idênticas— os impostos representavam 4,9 % e as contribuições 4,6 %das quais 4,1 % se destinaram à Previdência15 e 0,5 % ao Fundode Desemprego. Evolutivamente, desde 1953 a 1964, pode con-cluir-se, pelo mesmo quadro, que tanto as parcelas" retiradaspor meio do imposto como as obtidas através do Fundo de De-semprego foram, em proporção ao P. I. L., praticamente está-veis ao longo do período; apenas a percentagem referente à Pre-vidência evoluiu sensivelmente — elevou-se de 2,8% em 1953para 4,1 % em 1964.

15 Inclui os descontos dos funcionários públicos e do sector privado.

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A acção correctiva da repartição dos rendimentos efectivadapelos poderes públicos através do lançamento de impostos e con-tribuições para a segurança social realiza-se prioritariamente,na fase de formação dos rendimentos (repartição funcional) pois,por um lado, as contribuições incidem, exclusivamente, sobre ostrabalhadores e as entidades patronais e, por outro, no que serefere a impostos, embora alguns deles recaiam directamente so-bre os rendimentos pessoais (como os impostos complementar ede sucessões e doações), a sua importância no conjunto é nãosó pouco significativa como se tem reduzido ligeiramente desde1961 — em 1964 o montante de impostos sobre os rendimentos pes-soais representou apenas 0,8% do P I . L. (quadro C. 2).

Percentagem, em relação ao PXL., do total dos impostos que recaem sobreo rendimento dos factores produtivos e sobre os rendimentos pessoais

QUADRO C.2

Anos

1

195319541955195619571958195919601961196219631964

Percentagem do totaldos impostos em rela-

ção ao P.I.L.

2

4,64,74,74,74,75,25,14,95,05,05,14,9

Percentagem'. dos im-postos que recaem so-bre os factores produ-tivos, em relação ao

P.I.L. (a)

3

3,53,63,53,53,63,93,83,63,73,83,94,1

Percentagem dos im-postos que recaem so-

bre os rendimentospessoais em relação ao

P.I.L. (6)

4

1,11,11,21,21,11,31,31,31,31,21,20,8

FONTE: Anuário Estatístico das Contribuições e Impostos I.N.E. Elementos revistos dasContas Nacionais.

(a) Imposto ProfissionalContribuição predial, contribuição industrial, imposto de capitais, imposto comple-mentar (pessoas colectivas), sisa, imposto sobre espectáculos e divertimentos públicos,impostos de camionagem, de compensação e de trânsito, imposto sobre minas e águasminerais, imposto sobre a fabricação e o consumo de cerveja e o imposto para valo-rização e defesa do Ultramar desde 1962.

(6) Imposto complementar (pessoas singulares) e imposto de sucessões e doações.

No que diiz respeito à repartição funcional observa-se, peloquadro C. 3 que, na realidade, através do sistema fiscal se temprocurado corrigir, em parte, os efeitos da deficiente repartiçãoatrás referida uma vez que a tributação sobre os rendimentos do

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factor capital16 é, em proporção, mais elevada (cerca de 6,4%em 196217) que sobre os rendimentos provenientes do trabalho(0,5% no mesmo ano). No caso da segurança social a diferençada importância das respectivas contribuições em relação aos ren-dimentos provenientes de cada um dos factores é sensivelmentemais reduzida (as contribuições para a Previdência e Fundo deDesemprego provenientes do capital e do trabalho representa-vam 4,7% e 3,9 %, respectivamente, em 1962). Isto resulta, porum lado, da diferença existente nas taxas praticadas pelo fiscoe pela segurança social pois, no primeiro caso, a percentagem>era de 2% sobre as remunerações de 15 contos até 60 contosanuais e de 3 % para as superiores a este montante, estabele-cendo-se ainda pela recente reforma fiscal taxas mais reduzidaspara os escalões até 80 contos anuais18 enquanto que no se-gundo caso, a taxa é, em média, de 5,5 %. Por outro lado, aquelesresultados são determinados pela diferença existente no sistemade isenções vigente no fisco e na segurança social pois, enquan-to o imposto profissional, em 1962, só incidia sobre os traba-lhadores com rendimentos superiores a 15 contos anuais 19 (o queequivalia a abraníger apenas cerca de 156 mil trabalhadores), ascontribuições para a segurança social incidem sobre todos os tra-balhadores da indústria e serviços qualquer que seja a sua re-muneração e, muito embora não abranja os rurais e os pescado-res, o número dos que pagavam contribuições atingia cerca de1500 mil.

16 Por factor capital entende-se a totalidade de factores produtivos, comexcepção do trabalho, ou seja, o conjunto de terra, capital e empresa.

17 Indicam-se as percentagens para este ano de 1962 em virtude de, apartir de 1963, as estatísticas não apresentarem, em separado, as parcelas dosimpostos que recairam sobre as remunerações dos empregados por conta deoutrem e sobre as profissões1 liberais.

18 As taxas fixadas pela recente reforma fiscal são de 1 % sobre asremunerações anuais situadas entre 18 e 40 contos; 2 % para as compreendi-das entre 40 e 80; 3 % para as do escalão delimitado por 80 e 120 contos;b% entre 160 e 200; 6% entre 200 e 250; 7% entre 250 e 300 e 8% paraas remunerações superiores a 300 contos anuais.

19 A nova reforma fiscal eleva o limite de isenção para 18 contos.

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Percentagem do total dos impostos e das contribuições para a segurança social que recaem sobre

o rendimento do trabalho e dos outros factores produtivos em relação ao respectivo rendimento

QUADRO C.3

Anos

1

195319541955195619571958195919601961196219631964

Perc. dos impostos e das contribuições para a SegurançaSociai pagos pelos trabalhadores em relação ao total do

rendimento do trabalho

Total

2

3,63,64,04,04,04,04,04,04,24,44,4 (a)4,7 (a)

Imposto profis-sional (traba-lhadores porconta de ou-

trem)

3

0,40,40,40,40,40,40,40,40,40,50,5 (a)0,7 (a)

Previdência

4

2,62,62,92,92,92,93,03,03,13,23,23,2

Fundo dedesemprego

5

0,60,60,70,70,70,70,60,60,70,70,70,8

Perc. dos impostos e das contribuições para a SegurançaSociai pagos pela entidade patronal em relação ao total

do rendimento residual líquido dos outros factores

Total

6

8,68,98,88,79,19,99,99,8

10,511,111,412,1

Impostos

7

5,55,65,55,45,66,36,15,96,26,4Qfi (b)7,0 (b)

Previdência

8

2,93,13,13,13,33,43,63,74,04,44,54,8

Fundo dedesemprego

9

co c

o'co

'co

to to

to to

to to

to t

o

FONTE: Anuário Estatístico das Contribuições e ImpostosBoletim do Comissariado do DesempregoEstatística da Organização Corporativa e Previdência SocialI.N.E. — Elementos revistos das Contas Nacionais

(a) Inclui o imposto profissional sobre profissões liberais.íb) Não inclui o imposto profissional sobre profissões liberais.

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Para avaliar o efeito correctivo exercido na repartição fun-cional através do lançamento de impostos e de contribuições paraa segurança social apresenta-se no quadro C. 4 a evolução daspercentagens do produto interno líquido que cabem ao factortraJbalho e aos outros faictores lanstes e depois dle lhes serem reti-radas as parcelas dos impostos e das contribuições.

Da sua observação conclui-se que, embora depois de reti-rados os impostos, se atenuem ligeiramente as diferenças entre aparcela do rendimento destinada a remuneração do factor tra-balho e a atribuída aos outros factores produtivos, continua asubsistir um desequilíbrio em desfavor do factor trabalho.

Evidentemente que, como já se salientou, esta acção correcti-va só se completará com a fase de redistribuição destas receitasefectivada pelos poderes públicos e só se fosse possível conhecertotalmente a sua nova imputação se poderia formar uma ideia dosresultados globais da política redistributiva até agora processada.Mas sobre este ponto já se referiram no final de 1. as dificul-dades existentes.

Percentagem do produto interno liquido atribuída ao factor trabalho e aosrestantes factores antes e depois do pagamento dos impostos e das con-tribuições para a segurança social que recaem sobre o respectivo rendimento

QUADRO C.4

ANOS

1

195319541955195619571958195919601961196219631964

Percentagem do totalde remunerações em relação

ao P.I.LAntes do paga-mento dos im-postos e con-

tribuições2

39,539,839,338,939,640,141,941,442,543,043,845,0

Depois do pa-gamento dos

impostos e con-tribuições

3

38,038,337,837,338,038,540,239,840,741,2

Percentagem do totalde rendimento residual

liquido em relação ao P.I.LAntes do paga-mento dos im-postos e con-

tribuições

4

60,560,260,761,160,459,958,158,657,557,056,255,0

Depois do pa-gamento dos

impostos e con-tribuições

5

55,354,855,355,854,954,053,352,851,550,7——

Percentagemdo total de

impostose contribuições

em relaçãoao P.I.L.

6

6,76,96,96,97,17,57,57,47,88,18,38,7

FONTE: I.N.E. — Elementos revistos das Contas NacionaisAnuário Estatístico das Contribuições e ImpostosEstatística da Organização Corporativa e Previdência SocialBoletim, do Comissariado do Desemprego

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A par da análise global teria ainda interesse ver como seactuou a nivel sectorial sobre a repartição funcional dos ren-dimentos. Não é possível um estudo detalhado sob este aspecto,uma vez que o imposto profissional e os descontos para a segu-rança social não são apresentados nas estatísticas oficiais ao ní-vel da actividade quer no que se refere aos trabalhadores queràs entidades patronais. Sendo assim, a análise terá que restrin-gir-se à observação da importância relativa da incidência dosimpostos sobre os rendimentos líquidos residuais dos vários sec-tores, isto é, sobre a remuneração dos factores produtivos comexcepção do factor trabalho, havendo ainda necessidade, em cer-tos casos, de proceder a ajustamentos indispensáveis para o en-quadramento dos vários tipos de impostos nos respectivos sectoresda actividade.

Dentro destas limitações, pode concluir-se pelo quadro C. 5que as actividades onde se registaram maiores taxas de impostosobre o rendimento residual nos últimos dois anos, foram os Ser-viços Privados, os Transportes e os Bancos, enquanto entre asmais baixas se destacam a Agricultura, a Pesca e a Electricidade.

Comparando a evolução das taxas de imposto com a evoluçãoda repartição funcional em cada sector (quadro B. 1) destacam--se particularmente as Indústrias Extractivas, em relação às quaisa política fiscal se afigura deveras anómala, uma vez que, até àúltima reforma fiscal, a um aumento de salários relativamenteelevado (que, como já se verificou, contribuiu para uma correcçãobastante acentuada da repartição funcional) se somou ainda oagravamento da taxa do imposto pago sobre o rendimento resi-dual, isto quando a evolução da produtividade revelava uma re-gressão económica do sector (gráfico A. 4). De salientar, porcontraste, o caso das Indústrias Transformadoras onde a par deuma deterioração da repartição funcional a favor do factor ca-pital se constata, cumulativamente, um abrandamento do peso doimposto que incidiu sobre o rendimento deste factor; isto denota,evidentemente, que a política fiscal processada em relação a estesector não foi de molde a corrigir a tendência evolutiva da re-partição funcional básica, sendo até provável que, pelo contrá-rio, tivesse conduzido a um agravamento da repartição funcio-nal existente no início do período (depois de deduzidos os im-postos).

Nos sectores da Pesca e dos Transportes e Comunicações,onde também se verificou uma deterioração da repartição fun-cional base entre 1953/4 e 1963/4 mas motivada, nestes ca-sos, por uma elevação da percentagem do rendimento do factorcapital a partir de 1958/9, constata-se que, até esta data, a umaredução da percentagem do produto líquido do sector imputadoao capital, correspondeu um aumento da taxa de imposto en-

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quanto, posteriormente, se deu o contrário. Parece, portanto, vá-lida a conclusão de que, a nível sectorial, a tendência evolutivada actuação da política fiscal não foi de facto correctiva da evolu-ção da repartição funcional, pelo menos nos sectores onde severificou existir um agravamento dessa repartição a favor dofactor capital e onde, paralelamente, se constata um afrouxa-mento do peso relativo dos impostos sobre esse rendimento, so-bretudo a partir de 1958/9.

Também teria todo o interesse proceder-se a uma análisea nível regional da incidência de impostos e contribuições sobrea repartição funcional dos rendimentos mas, pelo menos por en-quanto, não se dispõe dos elementos indispensáveis.

C ANÁLISE DA APLICAÇÃO DOS RECURSOS NACIONAIS

0. Introdução.

Uma das questões fundamentais que estão na base da re-partição dos rendimentos é a aplicação dos recursos nacionais,ou seja, o modo como se deve repartir o Produto Bruto do paísentre o consumo e o investimento com vista a conseguir, si-multaneamente, um (aumento do bem-estar da população presentee uma taxa de crescimento económico relativamente elevada, umavez que o nível de vida de uma população depende da massade bens de consumo efectivamente consumidos e a taxa de cres-cimento económico é reflexo directo do volume de capital in-vestido.

Atendendo a que os recursos disponíveis são limitados, umdos aspectos importantes a ter em conta ao planear é exactamen-te a opção que é necessário fazer quando se define o montante dosrecursos que deve ser destinado ao investimento e o que deveser aplicado para satisfazer as necessidades imediatas. Estaescolha, difícil em qualquer caso, assume especial acuidade nos paí-ses menos desenvolvidos, onde, simultaneamente, se impõe comonecessidade premente a elevação do nível de vida da população pre-sente (que se caracteriza por uma escassa satisfação das suasnecessidades essenciais) e se torna imprescindível efectuar umvolume de investimento suficiente para assegurar um ritmo dedesenvolvimento económico aceitável.

Além da resolução deste problema, são indispensáveis outrasopções com incidências directas na repartição do rendimento, es-pecificamente no que respeita tanto à distribuição do consumo edo investimento entre a satisfação de necessidades individuaise colectivas, como quanto à entidade que efectiva esta satisfação(privada ou pública).

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Por exemplo, no que se refere às necessidade® colectivas asatisfazer pelos poderes públicos observa-se que, em geral, a par-cela do consumo público é destinada, efectivamente, à satisfaçãodessas necessidades imediatas, designadamente educação, saúde,investigação científica e técnica, segurança social, etc. De igualmodo, o investimento público corresponde, normalmente, ao im-perativo de satisfazer as necessidades colectivas futuras prima-cialmente aquelas que dizem respeito a sectores de fraca ren-tabilidade a curto prazo e que, por tal motivo, apresentam es-cassas possibilidades de atrair o capital privado como, por exem-plo, a construção de hospitais e escolas, e de habitações para fa-mílias com níveis de rendimento baixos; a montagem de infra-es-truturas em material de transporte e urbanismo, etc. Estas res-ponsabilidades dos poderes públicos são tanto mais pesadas quantoa população nacional cresça a um ritmo mais rápido e, como conse-quência, se imponha a necessidade de garantir um bem estarfuturo a um maior número de jovens. Para que estas tarefaspossiam ser cumpridas toma-se indispemisável, por outro lado, oaproveitamento intensivo das riquezas nacionais com vista a as-segurar-se um crescimento económico contínuo. De tudo isto de-riva a necessidade de uma distribuição equilibrada entre as dife-rentes aplicações dos recursos nacionais e a selecção cuidadosados investimentos de acordo com as prioridades impostas pelasexigências de uma política sócio-económica que deverá ter emconta o estádio de satisfação das necessidades presentes e o seugrau de desajustamento em relação ao mínimo de bem-estar in-dispensável (mínimo vital) e desejável de toda a população.

Dada a variedade de condicionalismos específicos que carac-terizam os vários estádios sócio-económicos, torna-se difícil tirarconclusões totalmente válidas da comparação entre as diferentesmodalidades de aplicação do produto efectuadas em vários países.Por outro lado, os estudos sobre o problema da repartição, aindaincipientes sobne esite aspecto, não permitem traçar, apriori, linhasde orientação quanto ao modo mais aconselhável de despender oproduto com vista a satisfazer todos os imperativos que o desen-volvimento socio-económico exige no que respeita a uma repartiçãoentre a satisfação do bem-estar da comunidade presente e futura.No entanto, surgiram já algumas tentativas de análise dos elemen-tos contabiiisticos de alguns países, procurando encontrar ligaçõesentre o estádio de desenvolvimento, as modalidades de aplicaçãodos recursos, a taxa de crescimento económico e os tipos de repar-tição dos acréscimos do produto.

Nesses estudos20, pretendeu-se comparar os elementos das20 «La Repartition des Fruits du Développement Économique»— Félix

Paukert, Revue Internationale du Travail, B.I.T., Maio 1965;«Distribuição dos Frutos de Desenvolvimento Económico em Portugal

Continental», Maria Madalena Ramalho — Caderno n.° 20 do F.D.M.O., 1967.

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Contas Nacionais de 21 países em vias de desenvolvimento e de 12países industrializados. As conclusões a que se chegou revelam que:

— os países em vias de desenvolvimento, de uma maneirageral, dedicam ao consumo privado uma parcela do seuProduto Interno Bruto Utilizado no País21 superior à dospaíses industrializados, enquanto que, nestes últimos, aspercentagens dedicadas ao consumo do Estado e ao inves-timento são mais elevadas;

MEDIANAS-2 DAS PERCENTAGENS ATRIBUÍDAS ÀS DIFE-

RENTES APLICAÇÕES DO P. I. B. U. P. NOS VÁRIOS PAÍSES

Grupo de países em vias Grupo de paísesde desenvolvimento industrializados

Consumo ... 74,1% 66,0%Estado (Consumo público) 10,0% 14,3%Investimento ... ... 16,6% 19,5%

-não se verificam diferenças acentuadas entre as taxas decrescimento dos países industrializados e dos países emvias de desenvolvimento no período 1950-1961. Nbs pri-meiros, a taxa de crescimento médio foi de 4 % e nos segun-dos de 4,5'%. Ê evidente que estas taxas conduziram aaumentos em valor absoluto muito diferentes, mas a suaposição em relação ao rendimento dos respectivos paísesfoi da mesma ordem de grandeza;

- existe, no entanto, uma grande diferença quanto à maneiracomo esseis novo& necuirsos fbiram repartidos! e utilizados,

21 Por Produto Bruto Utilizado no País —P.I.B.U.P., —entende-se osomatório das despesas em consumo privado, consumo público (Estado) einvestimento, que por sua vez, engloba a formação bruta de capital fixo e avariação das existências. A autora achou ipref erível utilizar este conceito ao doProduto Nacional Bruto com vista a evitar as oscilações a que o saldo docomércio externo está sujeito e que poderão falsear as comparações.

22 Conforme nota de F. Paukert, esclarece-se que se consideram asmedianas por serem os valores mais típicos e não se encontrarem afectadospelos valores extremos. Note-se que, contrariamente à soma das médias, a somadas medianas não perfaz o total de 100%, embora de ordinário se aproximedesse valor.

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MEDIANAS DAS PERCENTAGENS ATRIBUÍDAS ÀS DIFE-RENTES APLICAÇÕES DOS ACRÉSCIMOS DO P. I. B. U. P. NOS

VÁRIOS PAÍSES

Países em vias de p £ industrialiZadosdesenvolvimento

População23 ... 55,7% 19yl|%Consumo 31,9% 45,7%Investimento ... * 12,5% 19,1%Estado (Consumo público) 6,9% 6,5%

-os factores que influenciam a estrutura da aplicação dosacréscimos da riqueza são, entre outros, a taxa de cresci-mento populacional, o nível de desenvolvimento económico,a taxa de crescimento do produto e a própria estrutura darepartição básica da despesa nacional;

- o factor que, fundamentalmente, determina o tipo de repar-tição dos aumentos do produto nos países em vias de desen-volvimento e nos industrializados é o elemento população.Uma vez que esta cresce, em média, a uma taxa acentuada-mente mais elevada nos primeiros (2,5% ao ano) do quenos segundos (0,8%), isso implica que os países em viasde desenvolvimento tenham necessariamente que retirardo rendimento criado uma percentagem muito maior(55,7%) que os industrializados (19,1 %) para garantirema toda a população o mesmo nível de bem-estar que usu-fruía. Daí que as parcelas dedicadas ao aumento per capitado investimento e do consumo privado e público (Estado)acusem diferenças acentuadas nos dois casos.

A percentagem destinada ao aumento per capitado investimento é superior nos países industrializados(19,1%), à dos restantes países (12,5%). Nota-se, porém,que essa diferença se reduziria se a taxa de crescimentoda população dos países em vias de desenvolvimento fosseigual à dos industrializados, facto que pormitMa a elevaçãoda percentagem de 12,5 % para 15,4 %.

Também a parcela do acréscimo do produto dedicadoao aumento do consumo per capita é maior nos países in-dustrializados (44,7%) do que nos outros (31,9%). Mas,

23 A A. viu vantagem em isolar a parte desses aumentos que foinecessário despender para assegurar à população existente no final do períodoo nível de rendimento per capita que usufruía a população existente no iníciodo período, uma vez que a população deverá ser considerada como o quartoemprego possível dos acréscimos do desenvolvimento. A separação destapa,rcela permite também determinar quais os acréscimos per capita de quebeneficiam efectivamente cada uma das três rubricas da Despesa Nacional— consumo privado, consumo do Estado e investimento.

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neste caso, ao contrário do que se verificou com o investi-mento, a igualização da taxa de crescimento populacionalmostra que, se estes países não tivessem de fazer face aum acréscimo de população relativamente muito mais ele-vado, destinariam uma percentagem ao aumento do con-sumo privado per capita ainda superior à atribuídia nospaíses industrializados (59,5% e 45,7%, respectivamente).

Quanto às despesas em consumo público (Estado),são-lhe atribuídas percentagens relativamente pequenas dosacréscimos de produto nos dois grupos de países (cerca de7 %), embora uma redução da taxa de crescimento popula-cional nos países em vias de desenvolvimento pudesse per-mitir uma elevação sensível da parcela que lhe é atribuída(10,9%);

- um outro factor que se verificou ter influência na estruturada repartição dos acréscimos do produto é o nível de desen-volvimento económico do país.

As correlações encontradas revelam que os países commais altas capitações do produto (ou seja os mais desen-volvidos economicamente) tendem a consagrar uma partemais elevada da riqueza criada ao aumento do investimentoper capita e, embora de uma maneira menos significativa,ao aumento do consumo (correlação de+0,48 no primeirocaso e de+0,25 no segundo). Por outro lado, verifica-se queé nos países de mais baixas capitações que se encontram aspercentagens mais elevadas atribuídas aos elementos popu-lação e Estado (correlação de — 0,47 no caso da populaçãoe de — 0,43 no caso do Estado) ;

-quanto à influência da taxa de crescimento económico nomodo como se repartem os aumentos da riqueza criada,as correlações obtidas são do mesmo sinal das observadasem relação ao nível de desenvolvimento económico, muitoembora a influência que o primeiro factor exerce sobre apercentagem atribuída ao investimento ( + 0,79) seja muitomais acentuada do que a verificada no caso anterior.Também em relação ao consumo a correlação encontrada émaior que a anterior (+0,47). Para o elemento Estadoobserva-se uma correlação negativa (—0,31), o que indicaque, a medida que se verificam taxas de crescimento econó-mico maiores, as parcelas dedicadas ao aumento per capitadas despesas do Estado representam partes cada vez meno-res do acréscimo do produto;

- o último factor analisado foi a estrutura existente na repar-tição básica da despesa nacional. As correlações encontra-das entre as percentagens imputadas a cada rubrica da

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despesa, em relação ao total desta, no período base e aspercentagens do aumento do produto despendidas nessasrubricas são relativamente fracas. Apenas em relação aoconsumo a correlação reveste algum significado e permiteconcluir que, os países onde eram atribuídas maiores par-celas ao consumo tiveram tendência para consagrar partesrelativamente mais pequenas do acréscimo do produto aoaumento do comsumo per capita (correlação de — 0,74).

As conclusões apresentadas traduzem a exigência que é postaaos países menos desenvolvidos (onde as necessidades mínimas dapopulação actual estão longe de ser satisfeitas) de procuraremelevar o nível de bem-estar existente, de preferência a intensificarexcessivamente o ritmo de crescimento económico. Esta atitude,no entanto, é coerente com a satisfação das necessidades básicasimposta pela justiça equitativa, que impede sacrificar, pura e sim-plesmente, a obtenção do mínimo de bem-estar a que a populaçãopresente tem direito a imperativos meramente económicos aindaque disso advenha o bem-estar da população futura. Quando oestádio de desenvolvimento económico já permite garantir à popu-lação uma maior capitação do consumo nota-se a tendência dedestinar ao investimento parcelas dos acréscimos do produtorelativamente maior.

Quanto ao problema da repartição do consumo e investimentoentre a entidade pública e privada, que, como já se salientou, estáligado, respectivamente, à satisfação das necessidades colectivas eindividuais, as análises feitas nos referidos estudos ao focar apenaso aspecto da repartição do consumo em privado ou público, dãoum escasso contributo para o seu esclarecimento. Apesar disso, osnúmeros revelam que a parcela do P.I.B.U.P. destinada às despesasdo Estado é relativamente mais elevada nos países industrializados,mas as percentagens dos acréscimos do produto que lhe são impu-tadas são relativamente maiores nos países de mais baixas capita-ções. Isto mostra a preocupação destes últimos em ir correspon*dendo, dentro do possível, aos imperativos de ordem social e decarácter redistributivo resultante da obrigação de satisfazer asnecessidades colectivas (que dizem respeito, em geral, às camadaspopulacionais de mais baixos rendimentos) imperativos essesque, além disso e simultaneamente, são motores do próprio desen-volvimento socio-económico.

_ Deste modo, o grau de satisfação das necessidades da popu-lação, quer individuais quer colectivas, o seu desajustamento emrelação ao mínimo desejável e a obtenção duma taxa mínima decrescimento do produto que assegure não só a satisfação das neces-sidades resultantes do acréscimo populacional mas igualmente uma

605

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indispensável melhoria concreta do bem-estar de toda a populaçãofutura, são aspectos fundamentais a ter em atenção quando sepretenda efectivar uma repartição equilibrada das despesas.

Ao delinear a aplicação dos recursos nacionais deverá ter-secomo objectivo último, dentro dos limites estabelecidos pelas con-dicionantes anteriores, a obtenção do máximo de bem-estar e domaior ritmo de crescimento económico.

1. Aplicação dos recursos nacionais, no período 1953-1964

Como já se salientou anteriormente, o modo como são aplicadosos recursos nacionais tem grande importância numa óptica derepartição; por tal motivo, julga-se do maior interesse tentar fazeruma análise, tanto quanto possível objectiva, da aplicação do Pro-duto durante os períodos que corresponderam, aproximadamente, àvigência do I e II Planos de Fomento a fim de concluir algo sobreos resultados da política seguida, e, a partir dessa experiência,procurar delinear as orientações futuras mais consentâneas comos objectivos da repartição e com o estádio de desenvolvimentoactual do país.

 semelhança do que se fez anteriormente servirão de basepara a análise os números das Contas Nacionais relativos à médiados dois anos que constituem o início, o meio e o fim do período1953-1964, com vista a reduzir as possíveis oscilações fortuitasinerentes à utilização de apenas um ano.

O conceito utilizado foi o de Produto Interno Bruto Utilizadono País24, que, como já se disse, corresponde à soma dos totais doconsumo e do investimento (formação bruta de capital fixo e va-riação das existências) e difere do Produto Nacional Bruto por nãose entrar em linha de conta com o saldo do comércio externo embens e serviços. Pensa-se que este conceito será o mais apropriadoaos objectivos em vista, uma vez que se pretende analisar o modocomo se repartiu o Produto Utilizado no País pelo consumo e inves-timento.

Procurar-se-á concluir algo sobre a estrutura da aplicação dosrecursos e a sua evolução no que se refere: ao consumo e investi-mento; às entidades que promoveram a sua utilização (privadas epúblicas); à maneira como foi aplicado o consumo público (emsaúde, educação, segurança social e restantes serviços), e ao modocomo foi aplicado o capital segundo o tipo de investimentos (pre-dominantemente económicos, sociais ou económico-sociais).

24 F . Paukert, obra cit.

606

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Utilização dos tecursos nacionaisQUADRO D.l Preços de 196È

Utilização dos RecursosNacionais

CONSUMO . . . . . . . .

Privado . . . . . .Público (Estado) . . .

INVESTIMENTO

Formação B r u t a deCapital Fixo

Empresas .Estado (Sector públi-co) . . . . . . . . . . .

Variações d a s E x i s -tências

PRODUTO I N T E R N OB R U T O UTILIZADONO PAÍS .

SALDO DO COMÉR-CIO EXTERNO

( E x p o r t a ç õ e s menosimportações em bense serviços)

PRODUTO NACIONALBRUTO A P R E Ç O SDE MERCADO

Média dos an1953/4

T o t a l Capitação

mil contos! contos

50 773,5

44 414,06 359,58 347,5

7 406,0 \6 431,5.

974,5

941,5,

59121,0

6,4

5,60,8

1,0

0,90,8

0,1

0,1

7,4

- 2 199,5j —0,3

56 921,5 7,1

Percenta-gem rela-

ção aoP.I.B.U.P.

85,9

75,110,8

14,1

12,510,9

1,6

1,6

100,0

Média dos anos1958/9

Total

mil contos

61 025,5

53 239,57 786,0

10 528,5

10 739,59 318,0

1 421,5

— 211,0

71 554,0

- 3 032,0

68 522,0

Capitação Percenta-gem rela-

ção aoP.I.B.U.P.contos

7,4 j 85,3

6,50,9

1,3

1,31,1

0,2

0

8,7

— 0,4

8 Q

74,410,9

14,7

15,013,0

2,0

— 0,3

100,0

Média dos anos1963/4

Total

mil contos

Capitação Percenta-gem rela -

ção aoP.I.B.U.P.contos

80 259,0 j

67 600,512 658,516 474,5

16 064,5

13 270,5

2 794,0

410,0'

9,47,91,52,0

1,91,6

0,3

0,1

96 733,5] 11,4

- 4 379,5| —0,5

92 354,0' 10,9

10

83,0

69,913,1

17,0

16,613,7

2,9

0,4

100,0

Somatório de todosos anos do período

1953-1958 1959-1964Percenta-gem rela-

ção aoP.I.B.U.P.

11

86,075,310,7

14,0

13,111,3

1,8

0,9

100,0

Percenta-gem rela-

ção aoP.I.B.U.P.

12

83,3

70,712,6

16,7;

16,113,8

2,3

0,6

100,0

FONTE: I.N.E.,— Elementos revistos das Contas Nacionais.— valor inferior à unidade adoptada»

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Evolução, em percentagem, da utilização dos recursos nacionais

QUADRO D.2 Preços de 1963

Utilização dos RecursosNacionais

Período1953/4 — 1958/9

Percentagemdo

aumento

Total Capita-ção

Taxa médiade crescimento

anual

Total Capita-ção

Período1958/9 — 1963/4

Percentagemde

aumento

Total Capita-ção7

Taxa médiade crescimento

anual

Total

8

Capita-ã

Período1953/4 — 1963/4

Percentagemde

aumento

Total

10

Capita-ção

11

Taxa médiade crescimento

anual

Total

12

Capita-ção

13

Perc. deaumentoentre o

somatóriodos anos1953al958e somató-

rio de1959al964

14

CONSUMO . . . . . . .Privado ,Público (Estado) . ,

INVESTIMENTO . .Formação B r u t a deCapital Fixo . . .

Empresas ,Estado (Sector públi-co)

Variação d a s E x i s -tências (a) . . . .

PRODUTO I N T E R N OBRUTO UTILIZADO

NO PAÍS

SALDO DO COMÉRCIOEXTERNO

( E x p o r t a ç õ e s menosimportações em bense serviços)

PRODUTO NACIONALBRUTO A P R E Ç O SDE MERCADO

20,219,922,4

26,1

45,044,9

45,9

-122,4

21,0

37,8

20,4

15,715,418,0

21,4

39,739,5

40,7

• 130,0

16,5

3,83,74,1

4,8

7,7, 7>7

7,8

.24,5

3,9

3,02,93,4

4,0

6,96,9

7,1

-26,0

3,1

31,527,062,6

56,5

49,642,4

96,6

294,3

35,2

26,722,356,<?

5,9 44,4

15,3 3,8 3,0 34,8

44,137,2

89,6

266,7

30,2

25,0

31,3

5,64,9

10,2

9,4

8,47,3

14,5

58,9

6,2

7,6

6,2

4,94,19,4

8,6

7,66,5

13,7

53,3

5,4

58,152,299,0

97,4

116,9106,3

186,7

- 5 6 , 0

63,6

4,6 99,1

5,4 62,2

46,641,284,7

83,0

101,391,3

166,7

— 50,0

51,7!

66,7

51,4

4,74,37,1

7,0

8,17,5

11,1

— 5,6

5,1

7,1

5,0

3,93,56,3

6,2

7,36,7

10,3

— 5,0

4,3

5,2

4,2

30,526,558,3

61,7

67,0

65,4

77,3

— 10,7

34,0

FONTE: Quadro D. 1(a) Taxas simples.

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1.1. Consumo e investimento

No decurso de 1953/54 a 1963/64 a taxa média acumulada doacréscimo do Produto Nacional Bruto a preços constantes foi de5 % ao ano.

Esta percentagem é ligeiramente mais elevada do que a veri-ficada, em média, quer nos países desenvolvidos (4 %) quer nospaíses em vias de desenvolvimento (4,5%). De salientar, contudo,que a taxa de aumento foi maior no período que correspondeu aoII Plano de Fomento (6,2%) que no decurso do I (3,8 %) (qua-dro D.2).

Comparando a estrutura da aplicação do Produto25 no iníciodo período em estudo, 1953/4, e no final, 1963/4, (quadro D. I)verifica-se que se registou uma ligeira alteração na percentagemdestinada ao consumo e ao investimento. Em 1953/4 o consumoabsorvia cerca de 86 % do Produto, enquanto em 1963/4 a suaposição relativa se reduziu para 83%; em contrapartida a par-cela destinada ao investimento elevou-se de 14,1% no início doperíodo para 17% no seu final.

A modificação desta estrutura deveu-se ao facto de, evoluti-vamente, entre 1953/4 e 1963/4, a percentagem de aumento doinvestimento (97,4%) ter sido bastante mais acentuada que aregistada pelo consumo (58,1%) (quadro D. 2 coluna 10). Desalientar, porém, que a alteração de estrutura se efectivou pra-ticamente no decurso da vigência do II Plano26 pois, durante oI verifica-se que houve uma evolução bastante harmónica entreas três rubricas (consumo, investimento e produto) enquanto en-tre 1958/9 e 1963/4 se observa uma evolução da percentagem des-tinada ao investimento muito mais elevada que a aplicada em con-sumo 27. Isto porque, certamente, se pretendeu obter um ritmode desenvolvimento económico mais acentuado que no período an-terior o que, com efeito, se conseguiu conforme revela a taxa re-lativamente elevada do aumento médio anual do Produto (6,2%).

Dentro da linha dos princípios atrás enunciados esta evoluçãoafigura-se correcta uma vez que, em 1953/4, a estrutura da apli-cação do Produto era a característica da existente nos países emvias de desenvolvimento dado que ao consumo privado se desti-

25 Passar-se-á a utilizar a designação «Produto» como equivalente aP.I.B.U.P.

26 Conforme revelam os números do quadro D. 1, colunas 4, 7 e 10 rela-tivos aos extremos dos períodos de 1953/4 —1958/9 e 1958 —1963/4 e con-firmam as estruturas obtidas para a totalidade dos anos de vigência dosrespectivos Planos (col. 11 e 12).

2? Entre 1953/4 e 1958/9, a um aumento de 21 % do P.I.B.U.P., corres-ponderam acréscimos de 20,2 % no consumo e 26,1 % no investimento; enquantono período 1958/9 —1963/4 a um aumento de 35,2 % corresponderam acrésci-mos de, respectivamente, 31,5 % e 56,5 % (quadro D. 2, colunas 2 e 6).

609

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navam cerca de 75 % daquele Produto28. Apesar de, à primeiravista, esta percentagem se poder afigurar excessiva a sua apre-ciação só pode ser feita em face da capitação do consumo privadovigente naquela data que atingia o escasso valor de 5,6 contosanuais. O baixo nivel desta capitação justifica, portanto, quese não tivesse processado uma alteração substancial da estruturade 1953/4 no sentido de obter uma posição relativamente mais ele-vada da verba aplicada em investimento uma vez que isso impli-cava necessariamente um sacrifício do consumo.

Durante o II Plano, como já se salientou, o aumento relativoda verba aplicada em investimento foi bastante mais acentuadado que a destinada ao consumo total (quadro D. 2 col- 6) donderesultou que, no fim do período, a percentagem do investimentoem relação ao Produto se elevasse de 14,7% para 17% enquantoa do consumo baixou de 85,3% para 83% (quadro D. 1 col. 7e 10). Apesar disso, observou-se uma elevação do nível de vidana medida em que a média anual das capitações do consumo cres-ceu a uma taxa de cerca de 5% e o consumo privado de, apro-ximadamente, 4% uma vez que se destinou ao aumento do con-sumo privado per capita cerca de 51 % do lajcréscimo do pro-duto obtido nesse período (quadro D. 3).

O facto que possibilitou, simultaneamente, a aplicação demaiores percentagens do acréscimo do P. I. B. U. P. em investi-mentos e a garantia de um aumento relativamente razoável doconsumo privado e público (o que se impunha dado o baixo nívelde satisfação das necessidades ainda existentes em 1958/9 — acapitação do consumo total era de 7,4 contos e a do consumoprivado de 6,5 % 29 —) foi a reduzida taxa de crescimento da po-pulação registada em Portugal (0,7% ao ano), taxa essa aindainferior à dos países industrializados (0,8 % ao).

Numa óptica de repartição afigura-se ainda de interesse sa-lientar a importância que foi dada, no decorrer do II Plano, aoaumento das despesas em consumo do Estado e em investimentorealizado pelo sector público, cujo crescimento anual foi da ordemde 10,2 % e 14,5 % respectivamente; enquanto no decurso do I Pla-no essas taxas foram apenas de 4,1 % e 7,8 %. Esta evoluçãofoi, de facto, mais rápida do que a das restantes rubricas (ex-ceptuando a variação das existências), o que pode ser revelador

28 Os países em vias de desenvolvimento des t inam ao consumo pr ivado,em média , 74 % e os indust r ia l izados 66 %.

29 A t a x a de crescimento da população foi idêntica no decurso do I e I IP lanos . O facto de, no pr imeiro período t e r sido necessário r e t i r a r 14,4 % doaumento do Produto e, no segundo essa percentagem se t e r reduzido p a r a8,5 % (quadro D. 3) resul tou de, em proporção, o aumento do Produ to , emvalor absoluto, t e r sido maior que o aumento da capi tação mul t ip l icada peloacréscimo de população.

so A preços de 1963.

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de uma tentativa no sentido de elevar o nivel de satisfação dasnecessidades colectivas.

Repartição dos aumentos do produto interno bruto utilizado no País

QUADRO D.3

Países

1

PORTUGAL1953/4 a 1958/9 . . .1958/9 a 1963/4 . . .

PAÍSES EM VIAS DEDESENVOLVIMENTO

(Medianas)

PAÍSES INDUSTRIA-LIZADOS(Medianas)

Parcela des-tinada a ga-rantir aoacréscimode popula-

ção a capita-ção do Pro-duto exis-

tente no pe-ríodo inicial(População)Percentagem

2

14,48,5

55,7

19,1

Parcela des-tinada ao

aumento doconsumo

privado percapita dapopulação

total(Consumo)

Percentagem

3

59,9

50,9

31,9

45,7

Parcela des-tinada ao

aumento doconsumo pú-blico per ca-pita da po-pulação to-

tal(Estado)

Percentagem

4

10,018,4

6,9

6,5

Parcela des-tinada ao

aumento doinvestimentoper capitada popula-

ção total

(Investimen-to)

Percentagem

5

15,7

22,3

12,5

19,1

Total do au-mento do

Produto In-terno BrutoUtilizado no, País

Percentagem

6

100

100

Z 100

Z 100FONTE: «Distribuição dos Frutos do Desenvolvimento Económico em Portugal Continental»de Maria Madalena Ramalho — Caderno n.° 20 do' F. D. M. O.I.N.E. — Elementos revistos das Contas Nacionais.

Note-se, contudo, que estes índices globais apenas podem sertomados como indicadores que fazem prever a existência de umapromoção social e de uma acção redistributiva, mas Q seu resul-tado concreto só poderá ser avaliado através de uma análise de-talhada da forma como foi despendido esse dinheiro e do tipode necessidades contempladas.

Observando as estruturas características dos países em viasde desenvolvimento e dos industrializados (quadro D. 4) e com-parando-as com a maneira como foram aplicados os recursos na-cionais em 1953/4 e em 1963/4 pode concluir-se que a estruturaexistente no início do período era semelhante à dos países emvias de desenvolvimento, enquanto a do fim do período em causase aproxima mais da existente nos países industrializados. Comojá se referiu foi a baixa taxa de crescimento populacional quepossibilitou uma repartição dos acréscimos dos frutos do de-senvolvimento económico de modo a aumentar a parcela destinada

611

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ao investimento sem sacrificar demasiadamente o aumento de con-sumo per capita (quadro D., 3).

Muito embora o tipo de repartição dos acréscimos do Pro-duto efectivado durante o II Plano tivesse sido bastante seme-lhante ao verificado nos países industrializados (quadro D. 3)o que, como já se salientou, ocasionou, em 1963/4, uma estru-tura da aplicação dos recursos bastante próxima da característicadestes países (quadro D. 4), isto não implica que seja esta a es-trutura mais apropriada ao caso português e que, portanto, sedeva necessariamente procurar igualá-la no futuro. Na repartiçãoda riqueza criada há que ter presentes as diferenças que cer-tamente existem nios níveis de bem-estar da população de Por-tugal e dos países industrializados.

Utilização dos recursos em Portugal, nos países em vias de desenvolvimento

e nos industrializados

QUADRO D.l

Utilização dos RecursosNacionais

X

Consumo

PrivadoPúblico

Investimento

Produto interno bruto uti-lizado no pais

Portugal

Média dos anos1963/4

Percentagem

2

85,9

75,110,8

14,1

100

Média dos anos1963/4

Percentagem

3

83,0

69,913,1

17,0

100

Países em viasde desenvolvi-

mento

Medianas

Percentagem

4

84,1

74,110,0

16,6

rioo

Países indus-trializados

Medianas

Percentagem

5

80,3

66,014,3

19,5

Z 100

FONTE: I.N.E. — Elementos revistos das Contas Nacionais.

A capitação do consumo privado em Portugal era, em 1963/4,de 7,9 contos e a do consumo total (público e privado) de 9,4contos, o que equivale a uma despesa diária em bens de con-sumo de, respectivamente, cerca de 22 e 26 escudos. Estes va-lores, por si sós, são reveladores de um baixo nível de bem-estare quando se têm presentes os acentuados desníveis observados narepartição pessoal do rendimento (que conduzem, certamente,

612

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a desigualdades semelhantes na capitação do consumo31), torna-seevidente que, para além de acções redistributivas, directamente li-gadas à repartição pessoal, com vista a reduzir os desníveis exis-tentes nas capitações do consumo, importa assegurar ao consumoprivado e público uma evolução tanto quanto possível rápida.Assim, julga-se importante actuar no sentido de elevar a per-centagem de 51 % do acréscimo do Produto atribuído ao consumoprivado durante a vigência do II Plano (quadro D. 3) ou, pelomenos, garantir os 51 % se se admitir uma elevação da taxapopulacional, que obrigue a retirar uma parcela da riqueza criadapara assegurar à nova população uma capitação idêntica à queusufruia no início do período, superior à verificada durante oII Plano (8,5%).

No que se refere ao consumo do Estado, dada a acção re-distributiva que este pode exercer, também se julga aconselhá-vel manter a parcela destinada ao aumento do consumo per capitada população total verificada na vigência do II Plano (18,4%),embora seja acentuadamente superior à observada tanto nos paí-ses em vias de desenvolvimento (6,9 %) como nos industrializados(6,5%). Deverá, contudo, ter-se presente que a eficácia dessaacção depende da maneira como se aplicar esse produto, especial-mente no que diz respeito às verbas destinadas à saúde, educação,segurança social, etc.

1.2 Consumo

Um dos indicadores vulgarmente utilizados para detectar onível de bem-estar médio da população de um país é a parcelado produto destinada ao consumo e, particularmente, a que cor-responde ao consumo privado. Ê evidente que também o consumopúblico pode, efectivamente, contribuir para a elevação desse ní-vel, uma vez que se destina a proporcionar a toda a comunidadea disponibilidade de certos bens e serviços de que a mesma ne-cessita, podendo ainda assumir uma importância especial comoinstrumento de redistribuição, na medida em que esses bens e ser-viços procurem satisfazer, especialmente, as necessidades das clas-ses de rendimento mais baixo.

Salienta-se, porém, que a utilização do indicador global doproduto atribuído ao consumo privado e público, por si só, é insu-ficiente para traidtóiír o nível dle bem-esfbair dfc um país,, pois só oseu desdobramento específico poderá revelar que tipo de necessi-dades são satisfeitas e de que maneira os diferentes estratos dapopulação beneficiam desses consumos a fim de possibilitar a de-

3i É provável que os desníveis da capitação do rendimento sejamamortecidos no caso do consumo uma vez que quanto mais baixo for o rendi-mento menor será também a possibilidade de poupança.

BIS

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finiçao de medidas eficazes para atingir uma repartição equili-brada. No caso português, a escassez de elementos estatísticosnão permite uma análise da distribução do consumo privado porescalões de rendimento nem da estrutura da aplicação desse con-sumo no que se refere a alimentação, vestuário, etc, bem como damaneira como estes tipos de despesas se repartem segundo osníveis de consumo. Apenas no que diz respeito ao consumo públicose fará uma tentativa de análise da maneira como têm sido dis-tribuidas as verbas pelas principais rubricas a fim de procurardetectar qual o tipo de necessidade que se tem procurado sa-tisfazer, embora com a limitação de não ser possível dispor deelementos relativos a sua atribuição segundo os escalões de ren-dimento da população, o que certamente seria útil para aferir doseu efeito redistributivo.

Distribuição, em percentagem, das despesas de consumo público segundaas principais aplicações

QUADRO D.5

Rubricas

1

Saúde e Educação (a) .Acção Social e Corpora-

tiva (b)Protecção e Informação

(a)Outros Serviços

Total (a) . . .

Média dosanos

1953/4

2

15,3 (b)

10,9

33,040,8

100

Média dosanos

1958/9

3

19,2

9,9

31,039,9

100

Média dosanos

1963/4

4

15,4

8,7

46,429,5

100

Totalidade das despesasefectuadas no período

1953 — 1958

5

16,9

10,5

32,440,2

100

1959 — 1964

6

17,0

8,7

42,032,3

100

FONTE: (a) I.N.E. — Elementos revistos das Contas Nacionais.(6) Estatística Financeira,

A distribuição das despesas de consumo público pelas prin-cipais rubricas que os elementos disponíveis permitiram discri-minar apresenta-se no quadro D. 5. De entre elas, as que re-vestem maior significado sob um ponto de vista de promoçãosocial e de acção redistributiva são a saúde e educação e a se-gurança social32.

a2 Por segurança social entende-se, neste caso, assistência social, previ-dência social (pensões, reformas, subsídios diversos, etc), os serviços corpora-tivos de assistência social, abonos de família, acidentes em serviço etc, ouseja, o conteúdo que a Estatística Financeira apresenta na rubrica «acçãosocial e corporativa».

614

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A verba destinada à saúde e educação representava, no iníciodo I Plano, 15,3 % 3 do total das despesas de consumo públicoelevando-se para 19,2 % em 1958/9 e descendo de novo para15,4% no final do II Plano. Por outro lado, a percentagem doconsumo total aplicada através da acção social e corporativa queera de cerca de 11 % em 1953/4 tem vindo a decrescer (9,9 % em1958/9 e 8,7% em 1963/4).

Apesar de se ter reduzido a importância da posição relativada despesa com a saúde e educação no total do consumo público,o seu montante, em valor absoluto, registou um aumento 34. Ve-rifica-se que, a preços constantes, as despesas com a saúde e aeducação aumentaram de 55-%, entre 1953/4 e 1958/9, de 33,0 %,entre 1958/9 e 1963/4, e de 106,1 %, na totalidade do período 33.Porém, a apreciação destas percentagens só poderá ser feita emface das necessidades impostas pelo acréscimo populacional e pelopróprio desenvolvimento socio-económico.

Evolução da capitação das despesas públicas nos períodos de vigênciado I e n Planos

QUADRO D.6

Períodos

1

1953/4 — 1958/91958/9 —1963/41953/4 — 1963/4

Percentagem de aumento

Total dasdespesaspúblicas

2

18,056,699,0

Despesascom a saú-de e educa-

ção

3

49,128,291,1

Despesascom a se-gurança

social

4

8,840,653,3

Preços de 196S

Taxa média de crescimento anual

Total dasdespesaspúblicas

5

3,49,46,3

Despesascom a saú-de e educa-

ção

6

8,35,16,7

Despesascom a se-gurança

social

7

1,77,14,4

FONTE: I.N.E. —Elementos revistos das Contas Nacionais.Estatística Financeira.Estimativa da população residente.

33 Dado que as es t imat ivas das Contas Nacionais referentes às despesascom saúde e educação, só foram fei tas a p a r t i r de 1958 houve necessidade de,para os anos anteriores (1953/4), recorrer à Estatística Financeira. Note-seporém que, entre 1959 e 1964, os valores apresentados nas Contas Nacionais,para esta rubrica, são superiores aos da Estatística Financeira e, portanto,é possível que a percentagem relativa a 1953/4, que figura no quadro D. 5,esteja também por excesso.

34 I s to porque o to ta l das despesas públ icas se elevou, em proporção , m a i sacen tuadamen te que as despesas com saúde e educação.

3 5 A preços correntes o aumento foi de 65,1 % no pr imeiro período, de43,2% no segundo e de 136,5 % en t r e 1953/4 e 1963/4.

615

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Tomando em consideração o acréscimo populacional, o quadroD. 6 revela que, para um aumento anual da capitação do totaldas despesas públicas de 3,4% e 9,4'%, respectivamente no pri-meiro e no segundo períodos, o crescimento anual das capita-ções das despesas em saúde e educação foi apenas de 8,3 % ede 5,1 %. Conclui-se, portanto, que foi exactamente no período emque as despesas públicas registaram maior acréscimo que se re-duziu a taxa de crescimento das despesas destinadas a esta fina-lidade.

Em face dos números anteriores, a evolução das despesas coma saúde e educação afigura-se insuficiente para garantir um au-mento eficaz do bem-estar da população sob este aspecto.

Em relação à capitação das despesas com a segurança social,a sua evolução foi, no decurso do segundo período, ligeiramentesuperior à verificada com a saúde e educação, muito embora setivesse mantido, mesmo assim, ainda inferior à evolução das des-pesas totais (quadro D. 6). De salientar, ainda, o facto de tersido no decorrer do II Plano que se verificou, em proporção, oaumento mais acentuado na capitação das despesas com a segu-rança social (a taxa média anual foi de 1,7% entre 1953/4 e1958/9, e de 7,1% entre 1958/9 e 1963/4).

Os números analisados revelam que, no decurso do II Pla-no, apesar de se terem elevado consideravelmente as despesas doEstado, destinando-se-lhes uma percentagem do aumento do Pro-duto acentuadamente superior à verificada, em média, nos outrospaíses (quadro D. 3), a sua aplicação parece não se ter traduzidonum aumento proporcional do bem-estar da comunidade, pelomenos no que se refere à satisfação das necessidades de saúdee educação, nem exerceu uma eficaz acção redistributiva, pelo me-nos através das rubricas analisadas.

Dadas as distorções observadas na estrutura actual das des-pesas do Etstadb, a concretização do objectivo de uma repiairitiçãòequitativa dos rendimentos que se traduza numa elevação do nívelde bem-estar de toda a população impõe a necessidade de destinarà saúde e educação e à segurança social uma parcela das des-pesas públicas proporcionalmente superior à efectivada no perío-do analisado, pelo que se torna indispensável garantir, de futuro,uma evolução da taxa de crescimento das verbas destinadas aestes fins, superior à das despesas totais do Estado. A determi-nação dessa taxa deverá depender, fundamentalmente, do grau dedesajustamento existente em relação às necessidades mínimas queurge atender.

1.3 Investimento

Fez-se referência anteriormente à importância que assumem,numa óptica de repartição, as opções respeitantes à distribuição

616

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do capital petos diversos tipos de investimento, bem como à na-tureza da entidade investidora.

Todo o investimento tem, simultaneamente, efeitos de or-dem económica e social, mas sem dúvida que algumas aplicaçõestêm repercussões sociais mais directas que outras. Deste modo, etendo em atenção as características predominantes do sector emcausa, poderão destacar-se essencialmente três tipos de investi-mentos: económicos, aqueles que se destinam à produção de bens;sociais, os que vão influenciar mais directamente a promoção socialda população; e económico-sociais, os destinados à criação de in-fra-estruturas necessárias quer ao desenvolvimento económico querao social.

Dentro das limitações derivadas da arrumação de actividadesutilizada na Contabilidade Nacional36, pode fazer-se uma distri-buição dos vários sectores pelos três tipos de investimentos re-feridos:

— investimentos económicos: Agricultura, Silvicultura,Caça, Pesca, Indústria e Construção;

— investimentos sociais: Educação, Saúde, AdministraçãoPública, Outros Serviços e Casas de Habitação;

— investimentos económico-sociais: Electricidade, Agua,Gás e Serviços de Saneamento, Transportes e Comunicaçõese Comércio, Bancos e Seguros.

Quanto à natureza das instituições que realizam o inves-timento — privadas ou públicas — convém notar que a entidadeprivada aplica os seus capitais de preferência nos sectores demais alta rentabilidade, enquanto à entidade pública cabe, em prin-cípio, investir em actividades que, sendo fundamentais para odesenvolvimento socio-económico do país, se propõe a satisfaçãode necessidades colectivas sem fim lucrativo ou de que a iniciativaprivada se desinteressa (por a rentabilidade ser baixa ou porqualquer outra razão). Os poderes públicos também devem in-vestir em actividades essenciais ao desenvolvimento quando sereconheçam benefícios evidentes, para a comunidade, na execuçãode tais investimentos por parte da entidade pública.

Conjugando a finalidade lucrativa ou não lucrativa do inves-timento e o tipo de instituição que o realiza, adoptou-se a classi-ficação seguinte:

Investimento das empresas privadas — efectuado pelasempresas privadas que tenham por objectivo a produção debens e serviços destinados a serem vendidos a um preço que, emprincípio, ultrapasse o respectivo custo de produção.

w Estas limitações resultam de as diversas rubricas das Contas Nacio-nais terem uma discriminação insuficiente, não permitindo um agrupamentoexacto dos sectores, de harmonia com o critério estabelecido.

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Investimento das empresas públicas—-realizado por em-presas que são propriedade dos poderes públicos ou estão sobo seu controlo e que tenham um objectivo idêntico ao dasempresas privadas87.

Investimento do sector público — efectivado pelos servi-ços públicos quer pertencentes à administração central querà local, com excepção das classificadas como empresas públi-cas 38.

Uma vez que através dos investimentos sociais e da orien-tação dos investimentos públicos se poderá exercer uma actua-ção redistributiva eficaz desde que se consiga pôr à disposiçãodas classes economicamente menos favorecidas reais possibili-dades de promoção social39, assume especial interesse para oproblema da repartição a análise da importância daqueles in-vestimentos e da referida orientação.

A estrutura da aplicação dos investimentos40 segundo assuas incidências predominantemente económicas, sociais ou econó-mico-sociais no decurso dos I e II Planos, figura no quadro D. 7.

Como se pode ver, a utilização prioritária dos capitais nosdiversos tipos de investimento é idêntica no decurso dos doisPlanos, tendo sido aplicada a maior parcela nos investimentoseconómicos e a mais reduzida nos sociais. Observa-se, apesardisso, uma diferença sensível entre a estrutura dos dois períodos:a percentagem destinada, de 1953 a 1958, aos investimentos sociaisfoi de 31,3%, enquanto em 1959 e 1964 atingiu somente 28,2 %,Esta contracção foi beneficiar, exclusivamente, o sector económicodado que a percentagem respeitante aos investimentos económico--sociais foi praticamente igual (cerca de 33%).

3? Segundo «Estudos n.° 34» do I.N.E., são consideradas como empresaspúblicas todas as empresas incluídas no Orçamento Geral do Estado, os Ser-viços e Fundos Autónomos, os Serviços Municipalizados e municipalizáveis, aPrevidência (apenas no que se refere a Casas de Habitação) e a OrganizaçãoCorporativa, incluindo Organismos Corporativos e de Coordenação Económica.

ss Corresponde à formação bruta de capital fixo do Estado.89 Não se pode dizer que é dada uma real possibilidade de promoção a

toda a população desde que, por exemplo, se construam escolas, liceus e uni-versidades em número suficiente mas não se estabeleça um regime de frequên-cia gratuita para a população com mais baixo nível de rendimento e não seconcedam, até, subsídios quando tal se justifique.

40 A noção de investimento utilizada até agora iclentifica-se com a somada «formação bruta de capital fixo» e da «variação das existências» maspara uma análise mais detalhada da estrutura da aplicação dos recursos desti-nados ao investimento passa a utilizar-se esta designção no sentido mais res-trito de «formação bruta de capital fixo». Isto, porque, além de se não disporde elementos discriminados da rubrica «variação das existências» ao nível dosector de actividade, a sua eliminação não afecta as conclusões pois, além deser uma parcela diminuta não tem uma influência directa no ritmo de cresci-mento económico, que é determinado, fundamentalmente, pela «formação brutade capital fixo».

618

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Distribuição, em percentagem, da totalidade do capital fixo formadono período 1953-1964, segundo o tipo de investimentos

QUADRO D.7Investimentos

1

EconómicosEconómico-sociaisSociais

Total . .

1953 — 1958

2

35,832,931,3

100,0

Preços de 196»

1959 — 1964

3

39,532,328,2

100,0

FONTE: I.N.E. — Elementos revistos das Contas Nacionais.

Isto permite concluir que a orientação perfilhada durante oII Plano se caracterizou pela aplicação do capital fixo nos sec-tores mais reprodutivos a curto prazo41 com vista à obtençãodo máximo Produto e ao aumento da taxa de crescimento eco-nómico, objectivo este que, na realidade, se alcançou, como jáse viu atrás.

Mas se é inegável o benefício que a comunidade aufere coma elevação da taxa de aumento do Produto é, sem dúvida, maisimportante que esse aumento se traduza num efectivo acréscimodo bem-estar da população. Ora esse bem-estar não depende, emexclusivo, do crescimento económico mas, fundamentalmente, dodesenvolvimento social e só poderá ser obtido desde que se actueno sentido de satisfazer, na medida do possível, as necessidadesessenciais^ de carácter social, nomeadamente no que se referea habitação, saúde, educação, serviços de saneamento, etc, poden-do por vezes justificar-se, e até impor-se, uma redução da taxade crescimento do Produto a curto prazo, quando a sua obten-ção implique a necessidade de sacrificar, excessivamente, os in-vestimentos sócias.

Observando mais detalhadamente a estrutura dos investi-mentos sociais e económico-sociais realizados no decurso da vi-gência dos I e II Planos, verifica-se que os sectores relativa-mente mais sacrificados foram, exactamente, o da Habitaçãoque absorvia 21,3 % do total do capital investido no primeiroperíodo e que passou a dispor de 18,9% no segundo; a Saúdee Educação, que baixou de 3,7% para 2,9%; a Electricidade,

41 Observa-se que, enquanto para os investimentos económicos a relaçãocapital/produto obtida nos anos de 1953 a 1964 foi de 2,3, para os económico--sociais aquela relação foi de 4,1 e para os sociais de 5,6.

619

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Formação bruta do capitai fixo privado e público por sectores de actividade

QUADRO D. 8

ACTIVIDADES

INVESTIMENTOS ECONÓMICOS

Agricultura, Silvicultura e Caça

Pesca

Indústrias Extractivos

Indústrias Transformadoras

Construçõo

INVESTIMENTOS ECONÓMICO-SOCIAIS

Elect.,Gás,Água e Serv.de Saneamento

Comércio,Bancos,Seguros e Op.sb/ lmóv.

Transportes e Comunicações

INVESTIMENTOS SOCIAIS

Outros Serviços

Administração Pública e Defesa

TOTAL

2730,5

926,5

101,0

147,0

1 480,5

75,5

2373,0

399,0

1 147,0

2302,5

168,0

299,5

7406,0

Média dos

Privodo

Privados

2504,0

724,0

101,0

138,0

1 465,5

75,5

1906,0

350,0

817,5

1681,0

146,0

6091,0

anos 1953/1954

•Público

Total

226,5

202,5

15,0

467,0

49,0

329,5

621,5

22,0

299,5

1315,0

EmpresasPúblicas

15,0

-

15,0

279,0

49*0

152,0

46,5

2,5

-

340,5

SectorPúblico

211,5

202,5

188,0

_

177,5

575,0

19,5

299,5

974,5

3907,0

1038,0

192,5

2381,0

142,0

3567,5

596,5

1854,0

3265,0

158,5

498,0

10739,5

Média dos

Privodo

Privadas

3598,0

765,5

192,5

2358,5

142,0

2711,5

558,5

1204,5

2 329,5

132,0

8639,0

anos 1958/1959

Público

Total

309,0'

272,5

22,5

-

856,0

38,0

649,5

935,5

26,5

498,0

2100,5

EmpresasPúblicas

22,5

-

22,5

581,0

38,0

388,0

75,5

0,5

679,0

SectorPúblico

286,5

272,5

275,0

_

261,5

860,0

26,0

498,0

1421,5

6116,0

1216,0

135,0

4381,0

289,5

5180,5

1001,5

2657,0

4668,0

245,0

807,0

15964,5

Média dos

Privodo

EmpresasPrivados

5 646,0

820,0

135,0

4 360,0

254,0

3458,5

937,5

1 187,5

3082,0

224,0

-

12186,5

anos 1963/1964

Público

Total

470,0

396,0

21,0

35,5

1722,0

64,0

1 469,5

1586,0

21,0

807,0

3 778,0

Públicos

56,5

-

21,0

35,5

607,5

64,9

361,5

320,0

3,0

-

984,0

SectorPúblico

413,5

396,0

1114,5

_

1108,0

1266,0

18,0

807,0

2794,0

17

18009

5719

943

951

9763

633

16558

2793

8173

15 744

927

2260

50311

To ta

1953 a

Privado

Empresas

Privodas

18

16411

4305

943

8£6

9644

633

12 848

2551

5423

11232

808

-

40491

idade do

958

capital

Público

Totol

19

1598

1414

65

119

-

3710

242

2750

4512

119

2260

9820

Públicas

20

119

-

119

2436

242

1550

411

8

-

2966

Público

1479

1414

65

1274

_

1200

4101

111

2 260

6 854

ixo rea irado, no

un

período

Preços didade: m

e 1963

1959 a 1964

33139

•6341

904

845

23 819

1230

27168

4 827

14064

23710

1169

4214

84017

Privodo

Privodcs

31222

4729

904

746

23684

1159

19 300

4521

7966

15948

159

1050

-

66470

Público

Total

1917

1612

-

99

135

71

7 868

306

6098

7 762

2257

119

4214

17547

EmpresasPúblicas

206

-

-

135

71

3989

306

2284

1202

30

5397

Público

1711

1612

-

99

-

3 879

65

3814

6560

89

4214

12150

FONTE: I. N. E. — Elementos revistos das Contas Nacionais.

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Distribuição, em percentagem, da formação bruta do capital fixo privado e público por sectores de actividade

QUADRO D. 9

Preços de 1963

ACTIVIDADES

1

Agriculturo, Silviculturo • Coço

Pesca

Indústrias Extractiva»

Indústrias Tronsformodorai

Construção

INVESTIMENTOS ECONÓMICO-SOCIAIS

Elect., Gás, Agua e Serv. de Saneamento

Comércio, Bancos, Seguro» a Op.sb/lmóvelt

Tronsportes a ComunícoçCe»

INVESTIMENTOS SOCIAIS

Saúde e Educação

Administração Pública e Defesa

Casas de Habitação

T O T A L

2

12,5

1,4

2,0

20,0

1,0

32,1

11,2

15,5

31,0

3,7

2,3

4,0

21,0

100

Médio do

Privado

EmpresasPrivadas

3

11,9

1,7

2,3

24,1

1,2

31,2

12,1

13,4

27,6

0,4

24,8

100

sanos 1953/1954

Público

Totó!

4

15,4

0,7

1,1

-

35,5

6,7

,25,1

47,3

19,5

22,8

3,3

100

EmpresasPúblicas

5

_

4,4

-

81,9

22,9

44,6

13/7

-

12,9

100

SectorPúblico

6

20,8

-

19,3

1,1

18,2

59,0

26,3

30,7

-

100

7

9,7

1 fi

22,2

1,3

33,2

10,4

17,3

30,4

3,3

4,6

21,0

100

Média do

Pr ivedo

EmpresasPrivadas

8

8,9

2,2

27,3

1,6

31,4

11,0

13,9

27,0

0,2

25,3

100

1958/1959

Público

Totol

9

13,0

1,1

-

40,7

8,0

44,6

16,0

1,3

23,7

3,6

100

Empresa.Públicas

10

_

3,3

-

85,5

22,8

11,2

-

_

11,1

100

SectorPúblico

11

19,2

19,4

1,0

60,4

23,6

1,8

35,0

-

100

12

7,6

0,8

27,4

1,8

32,5

9,5

79,7

3,0

1,5

5.1

19,6

100

Média d.

Privodo

EmpresesPrivacfa.

13

6,7

1,1

35,8

2,1

28,4

10,9

25,3

0,3

1,8

23,1

100

1963/1964

Público

Total

14

10,5

0,5

0,9

45,6

5,0

42,0

11,7

21,4

8,4

100

EmpresesPúblicas

15

2,1

3,6

61,7

18,5

32,5

-

-

32,2

100

SectorPúblico

14,2

0,6

-

39,9

0,2

45,3

15,8

28,9

-

100

Total

11,4

1,9

19,4

1,3

32,9

11,1

31 3

4,5

21,3

100

Totolidode do c

1953 o

Privodo

prZr;

10,6

2,3

23,1

1.4

31,8

12,1

27,7

0,3

-

25,4

100

958

pitai f i .

Público

Total

14,4

1,2

37,8

7,3

45,9

23,0

4,1

100

EmpresasPúblicos

_

4 ,0

-

82,1

21,7

13,9

13,6

100

SectorPúblico

20,6

1,0

-

18,6

1,1

59,8

25,2

33,0

-

100

o real

Total

7,5

1,1

1,0

28,4

1,5

32,3

9,9

?fí 7

5,0

18,9

100

"zodo no per ÚxJo

1959 a 1

Privodo

EmpresasPrivadas

23

7,1

1,4

1,1

35,6

1,7

29,0

10,2

24,0

_

22,2

100

964

Público

Total

24

9,2

0,6

0,8

0,4

44,8

6,3

44,2

24,0

6,6

100

Públicas

25

2,5

1,3

73,9

25,9

42,3

22,3

-

_

21,7

100

SectorPúblico

26

13,3

0,8

-

31,9

0,5

31,4

54,0

18,6

0,7

34,7

100

FONTE: Quadro D. 8.

Page 39: Aspectos da repartição do rendimento em Portugalanalisesocial.ics.ul.pt/documentos/1224254418F4qTI1tw2Sm34TR0.pdf · empregada por conta de outrem estimada para a respectiva ac-tividade

Gás, Agua e Serviços de Saneamento, que desceu de 11,1 % para9,9% (quadro D. 9, colunas 17 e 22). Estes decréscimos re-sultaram de uma evolução nitidamente desfavorável do montantede investimentos realizado nestes sectores que foi, em média,muito inferior a dos investimentos totais: a um aumento de 67%no total de investimentos realizados no decurso do segundo pe-ríodo em relação ao primeiro, correspondeu apenas um aumentode cerca de 48% tanto nas casas de Habitação como na Electri-cidade, Gás, Agua e Serviços de Saneamento, e de 29,6 % nosServiços de Saúde e Educação (quadro D. 10, coluna 17).

A menor importância atribuída ao desenvolvimento destessectores, nomeadamente no relativo à Saúde e Educação, implica,como é evidente, graves consequências; não só dificulta a soluçãodo problema social como tem, simultaneamente, repercussões nopróprio desenvolvimento económico que será seriamente afectado,sobretudo pela falta de preparação cultural e técnica da po-pulação.

Observando, seguidamente, o volume de investimentos se-gundo a entidade que os efectiva — privada ou pública — con-clui-se que a maior parcela dos capitais é aplicada pelas em-presas privadas, apesar de se ter vindo a constatar uma dimi-nuição na sua posição relativa; os investimentos privados atin-giam, em 1953/4, 82,2% do total; essa percentagem desceu para80,5 % em 1958/9 e para 76,3 % em 1963/4 (quadro D. 11, colu-nas 3, 7 e 11). Esta evolução resultou do facto de a taxa decrescimento médio anual dos investimentos privados de 1953/4a 1963/4 ter sido, em média, bastante mais fraca (7,2%) doque a dos investimentos públicos (11,1%), (quadro D. 10, colu-nas 13 e 14).

Convém ainda realçar o facto de no período 1953/4 a 1958/9a taxa de crescimento médio anual do investimento privado tersido semelhante à do período 1958/9 a 1963/4, enquanto os in-vestimentos públicos aumentaram a uma taxa sensivelmente maisacentuada neste último (9,8% entre 1953/4 e 1958/9 e 13,1%entre 1958/9 e 1963/4).

Tal evolução do investimento público resulta, em princípio,de se tornar indispensável satisfazer as necessidades crescentesda população relativamente a equipamentos colectivos. Todavia,há que ver qual a prioridade que foi estabelecida na utilizaçãodos capitais públicos e em que medida essa aplicação melhorou aestrutura do investimento privado e influenciou as característicasda estrutura global.

Os capitais privados, dada a finalidade lucrativa que oscaracteriza, são investidos de preferência nos sectores mais ren-táveis que coincidem, em geral, com os sectores classificadoscomo predominantemente económicos, enquanto que os capitais

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Distribuição, em percentagem, da totalidade do capital fixo,público e privado, formado no período 1953-1964

QUADRO D.12

Investimentos

1

EconómicosEconómico-sociaisSociais

Total . . .

1953 — 1958

EntidadesPrivadas

2

40,631,727,7

100,0

EntidadesPúblicas

3

16,337,845,9

100,0

1959 — 1964

EntidadesPrivadas

4

47,029,024,0

100,0

EntidadesPúblicas

5

10,944,844,3

100,0

FONTE: I.N.E. — Elementos revistos das Contas Nacionais.

públicos se repartem principalmente pelos investimentos sociaise económico-sociais.

De salientar que os investimentos sociais das entidades pri-vadas se destinam quase na sua totalidade à construção de Ca-sas de Habitação (92%).

Considerando agora os vários sectores, verifica-se que as acti-vidades onde se realizaram maiores investimentos públicos fo-ram (quadro D. 9, colunas 19 e 24):

1953 — 1958 1959 — 1964

Transportes e Comunicações 28,0% 34,8%Administração Pública e Defesa ... 23,0% 24,0%Saúde e Educação 17,6% 12,9%Agricultura 14,4% 9,2%Electricidade, Gás, Água e Serviços

de Saneamento 7,3% 8,3%Casas de Habitação 4,1% 6,6%Outros Sectores 5,6% 4,3%

TOTAL 100,0 100,0

Tais estruturas do investimento público mostram que existiuno decorrer do II Plano, uma nítida preocupação de aumentara já acentuada percentagem de capitais destinados ao sector dosTransportes e Comunicações, com sacrifício evidente das verbasdestinadas à Saúde, Educação e à Agricultura.

; Quanto à acção no sentido de melhorar a estrutura do inves-timento privado, desde que se comparem as percentagens de acrés-cimo que se referem à totalidade de capital fixo, público e pri-vado, realizado de 1953 a 1958 e de 1959 a 1964 (quadro D. 10,

623

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Taxas médias de crescimento anual da formação bruta de capital fixo, pri vado e público, por sectores de actividade

QUADRO D. 10

ACTIVIDADES

1

.INVESTIMENTOS ECONÓMICOS-

Agricultora, Silvicultura e Coça

Pesca

Indústrias Extractivas

Indústrias Transformadoras

Construção

INVESTIMENTOS ECONÓMICO-SOCIAIS

Elect. ,Gás,Aguo e Serv, de Saneamento

Comércio, Bancos,Seguros e O p . sb/Imóveis

Transportes e Comunicações

INVESTIMENTOS SOCIAIS

Saúde e Educação

Outros Serviços

Administração Pública • Defesa

Casas de Habitação

TOTAL

Período de 1953/4 a 1958/9

Total

2

7,43

2,30

13,77

0,87

9,97

13,47

8,50

6,20

8,38

10,08

7,24

4,75

-1,17

10,74

7,72

7/72

Privado

EmpresasPrivadas

3

7,52

1,12

13,77

0,22

9,98

13,47

7,31

5,13

9,80

8,06

6,74

-8,96

-2,04

7,61

7,24

Público

Total

4

6,41

6,12

9,24

8,45

12,88

13,74

-5,22

14,54

8,52

5,59

3,79

10,74

11,26

9,82

EmpresasPúblicas

5

8,45

8,45

15,80

14,72

-5,22

20,61

10,18

- 1

-37,97

11,26

14,80

SectorPúblico

6

6,26

6,12

9,24

7,91

5,16

8,06

8,40

5,59

5,92

10,74

7,84

Total

7

9,38

3,22

-7,36

-10,19

12,97

15,31

7,75

*,38

10,92

7,46

7,41

6,61

9,10

10,14

6,77

8,25

•eríbdo de

Privado

EmpresasPrivadas

8

9,43

1,38

-7,36

-12,62

13,08

12,33

4,99

7,05

10,92

-0,28

5,76

23,97

11,16

5,23

7,12

1958/9 a 1963/4

Público

Total

9

8,75

7,76

4,56

-1,39

15,00

.2,27

10,99

17,74

11,14

5,59

-4,76

10,14

33,41

13,05

Empresa»Públicas

10

20,22

-1,39

4,56

3,27

10,99

-1,42

33,49

43,10

33,41

7,70

SectorPúblico

11-

7,62

7,76

4,56

32,30

-15,74

33,48

8,04

5,59

-7,63

10,14

14,47

Período de 1953/4 a 1963/4

Total

12

8,40

2,76

2,94

-4,52

11,46

14,38

8,12

6,29

9,64

8,74

7,32

5,68

3,85

10,42

7,24

7,99

Privado

EmpresasPrivadas

13

8,47

1,25

2,94

-6,01

11,52

12,90

6,14

6,09

10,35

3,81

6,25

6,67

4,37

6,41

7,18

Público

Total

14

7,56

6,94

6,88

3,42

13,94

7,86

2,71

16,13

9,82

5,59

-0,47

10,42

21,83

11,13

EmpresasPúblicas

15

14,18

3,42

8,09

8,84

2,71

9,05 "

21,28

1,84

21,83

11,20

SectorPúblico

16

6,94

6,94

6,88

19,48

-4,91

20,10

8,21

5,59

-0,81

10,42

11,11

Percencapitaa 1964

Total

17

84,0

10,9

-4,1

-11,1

144,0

94,3

64,1

48,0

72,8

72,1

50,6

29,6

26,1

86,5

48,8

67,0

agem de aumentofixo realizado ncem relação ao re

do de 1953

Privado

EmpresasPrivadas

18

90,3

9,8

-4,1

-15,8

145,6

83,1

50,2

39,8

77,2

46,9

42,0

18,7

30,0

43,2

64,2"

do totalidade doperibdo de 1959

jlizado no perib-i 1958

Público

Total

19

20,0

14,0

52,3

13,4

112,1

103,9

26,4

121,7

72,0

30,5

0,0

86,5

190,8

78,7

FmpresasPúblicas

20

73,1

13,4

63,8

117,2

26,4

47,4

192,5

275,0

190,8

82,0

SectorPúblico

21

15,7

14,0

52,3

204,5

-12,2

217,8

60,0

30,5

-19,8

86,5

77,3

FONTE: Quadro D. 8.

Page 42: Aspectos da repartição do rendimento em Portugalanalisesocial.ics.ul.pt/documentos/1224254418F4qTI1tw2Sm34TR0.pdf · empregada por conta de outrem estimada para a respectiva ac-tividade

Importância relativa da formação bruta de capital fixo nas empresasprivadas e públicas, e no sector público, por actividades

QUADRO D. 11

ACTIVIDADES

1

INVESTIMENTOS ECONÓMICOS

Agricultura, Silvicultura e Coça

Pesco

Indústrias Extractivos

Indústrias Transformado*vs

Construção

INVESTIMENTOS ECONÓMICO-SOCIAIS

Elect., Gás, Agua e Serv. de Saneamento

Comércio,Bancos, Seguros e Op» sb/imóveis

Transportes e Comunicações

INVESTIMENTOS SOCIAIS

Saúde e Educação

Outros Serviços

Administração Pública • Defesa

Casat de Habitação

T O T A L

Média dos

Total

2

100

8 8

8 8

8

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

Privado

EmpresasPrivodas

3

91,7

78,1

100

93,9

99,0

100

80,3

89,3

87,7

71,3

73,0

7,786,9

97,2

82,2

inos 1953/1954

Público

EmpresasPúblicas

4

0,6

'?11,8

9,412,3

13,3

2,0

1/5

2,8

4,6

SectorPúblico

5

7,7

21,9

6,1

7,9

1,3

15,4

25,0

92,3

11,6

100

13,2

Média dos anos 1958/1959

Total

6

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

Privado

EmpresasPrivadas

7

92,1

73,7

100

90,9

99,1

100*

76,0

84,9

93,6

65,0

71,4

4,0

83,3

96,7

80,5

Público

EmpresasPublicas

8

0,6

0,9

16,3

13,9

6,420,9

2,3

0,3

3,3

6,3

SectorPúblico

9

7,3

26,3

7,7

1,2

14,1

26,3

96,0

16,4

100

13,2

Média dos anos 1963/1964

Total

10

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

Privado

EmpresasPrivadas

11

92,3

67,4

100

81,5

99,5

87,7

66,8

87,6

93,6

44,7

66,0

8,5

91,4

89,9

76,3

Público

EmpresasPúblicas

12 '

0,9

0,512,3

11,7

12,0

• 6,413,6

6,9

1,2

10,1

6,2

SectorPúblico

13

6,8

32,6

18,5

21,5

0,4

41,7

27,1

91,5

7,4

100

. 17,5

Totalidade do capital fixo realizado no período

Total

14

100

8 8

8 8

8

100

100

100

100

100

100

100

100

100

100

1953

Privado

EmpresasPrivodas

15

91,1

75,3

100

93,2

98,8

100

77,6

87,2^

91,3*

66,3

71,3

7,2

87,1

96,2

80,5

a 1958

Público

EmpresasPúblicas

16

0,7

1,2

14,7

11,5

8,7

19,0

2,6

0,9

5,9

SectorPúblico

17

8,2

24,7

• 6,8

7,7

1,3

14,7

26,1

92,8

12,0

100

13,6

Total

18

100

100

roo100

100

100

100

100

100

.100

100

100

100

100

100

100

1959

Privado

EmpresasPrivodas

19

94,2

74,6

100

88,3

99,4

94,2

71,0

82,3

93,7

56,7

67,2

6,6

89,8

92,6

79,\

a 1964

Público

EmpresasPúblicas

20

0,6

0,65,8

14,7

16,9

6,3

16,2*f

5,1

2,6

7,4

6,4

SectorPúblico

21

5,2

25,4

11,7

14,3

0,8

27,1

27,7

v93,4

^ 7,6

100

14,5

FONTE: Quadro I. St.

Page 43: Aspectos da repartição do rendimento em Portugalanalisesocial.ics.ul.pt/documentos/1224254418F4qTI1tw2Sm34TR0.pdf · empregada por conta de outrem estimada para a respectiva ac-tividade

colunas 18 e 19), constata-se que, de facto, foi nas actividadesonde se verificaram acréscimos menos sensíveis dOS investimen-tos privados que mais se elevaram, proporcionalmente, os inves-timentos públicos e vice-versa. Note-se, porém, que essa acção cor-rectiva só foi concretizada, de facto, quanto aos investimentoseconómico-sociais, pois no que respeita aos investimentos sociais,apenas em relação ao sector da Habitação se actuou com certaeficácia42.

Em relação à Agricultura, ramo de laotividade a que estão li-gados cerca de 41,5 %43 da população activa e que, por isso, as-sume grande importância sob o ponto de vista da repartição derendimentos, a acção dos poderes públicos foi nitidamente insu-ficiente para assegurar uma taxa de investimentos aceitável4*o mesmo acontecendo com o sector da Saúde e Educação.

A utilização dos capitais públicos, independentemente da ac-ção correctiva e orientadora que pode exercer na determinaçãoda estrutura da distribuição dos investimentos globais, pode tam-bém ser um meio eficaz de redistribuição, na medida em que es-tabeleça uma infra-estrutura social que atenda às necessidadesdos estratos da população mais desfavorecidos economicamente.Essas necessidades dizem respeito especialmente aos sectores daSaúde e Educação, à Habitação e Electricidade, Gás, Agua eServiços de Saneamento. Apesar de se poder admitir que qual-quqr inviesrtiimjetníto púMlco> traz taeíDjefííclibs para toda a comu-nidade e muito embora os números disponíveis não possibilitemuma análise detalhada no relativo às suas repercussões directassobre as várias classes de rendimento, é evidente que os investi-mentos de capitais públicos naqueles sectores se traduzem nummaior benefício para populações de mais baixos rendimentos43

do que, por exemplo, os investimentos em Transportes e Comu-nicações.

Da observação dos números conclui-se que a aplicação aecapitais públicos em Casas de Habitação, e nos sectores da Saú-

42 O aumento do investimento público no sector da Habitação no período1958-1964 em relação ao período anterior, foi da ordem dos 191 % o que sepode considerar elevado em valor relativo; como, porém, o investimento pr i-vado, que representava 96 %, só aumentou de 43,2 %, registou-se, apesar disso*um decréscimo da posição relativa do investimento nesse sector; de 21,3 % querepresentava no primeiro período baixou para 18,9 % no período 1959/1964.

43 Percentagem relativa a 1960.44 Muito embora o aumento de capitais públicos aplicados nesta activi-

dade tenha sido relativamente maior ( 1 4 % ) que o aumento dos capitais priva-dos (9,8 %) o aumento global do investimento na Agricultura foi muito escasso(10 ,9%) .

45 Em geral, as classes com níveis de rendimento mais elevados utilizam,de preferência, ou a elas são part icularmente destinados os investimentos dasempresas privadas aplicados em habitações, hospitais e colégios e t c , dada a suafinalidade lucrativa.

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de, Educação e Electricidade correspondia, no seu conjunto, a29% do total no primeiro período analisado e a 27,8% no se-gundo período, sendo essa redução devida, exclusivamente, aosector da Saúde e Educação; enquanto o sector dos Transportes eComunicações absorveu, só por si, cerca de 28% e 35%, respec-tivamente (quadro D. 9, colunas 19 e 24).

Daqui se conclui que a repercussão social e redistributivaresultante da aplicação dos investimentos públicos foi, certa-mente, muito escassa, sendo de salientar, no entanto, que deentre os investimentos com maiores incidências sociais foramos problemas da habitação e da distribuição de electricidade, gás,água e serviços de saneamento que, na vigência do II Plano, me-receram maior atenção por parte dos poderes públicos-

Até tagora o obpectivo da análise tem sido o estudo da es-trutura dos investimentos efectivamente realizados nos períodosque corresponderam ao I e II Planos de Fomento segundo oselementos das Contas Nacionais; afigura-se, porém, de muitointeresse observar qual a estrutura dos investimentos realizadosou, pelo menos, previstos concretamente ao abrigo dos Planosde Fomento que até agora foram elaborados.

O montante de investimentos cuja realização se enquadravana execução do I e II Planos representava, respectivamente, cer-ca de 20% e 25% do capital fixo efectivamente formado no pe-ríodo de vigência de cada Plano.

Os investimentos programados no I e II Planos destinam-se,principalmente, à formação de infra-estruturas económico-so-ciais conforme se observa no quadro D. 13, apesar de, em rela-ção ao segundo, se ter dado uma menor importância ao sectorda Energia a favor dos investimentos económicos. A aplicaçãode capitais em investimentos de carácter social representou ape-nas cerca de 3 % e refere-se exclusivamente ao sector do En-sino e Investigação.

Quanto ao Plano Intercalar, para 1965/67, a estrutura dosinvestimentos prevê já algumas realizações de carácter socialcujas rubricas não apareciam sequer nos Planos anteriores, no-meadamente no que se refere às Casas de Habitação e ao sectorda Saúde, e que passaram a representar cerca de 9% do to-tal muito embora se observe, por outro lado, uma preferêncianítida pelos investimentos de carácter económico. Deverá ter-sepresente, por exemplo, a acentuada diminuição da percentagematribuída aos Transportes e Comunicações, e à Energia. Note-seporém que, dessa redução, apenas uma escassa parcela se des-tinou aos investimentos sociais, mantendo-se quase idêntica apercentagem de 3 % que no I e II Planos foi atribuída à Edu-cação e Investigação, e representando as parcelas destinadas àSaúde, e Habitação apè&as 1,0% e 5,4%, respectivamente.

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Estimativa dos investimentos previstos nos Planos de Fomento

QUADRO D.13

Investimentos

1

Agricultura, Silvicultura e Pe-cuária

Outros sectores

E c o n ó m i c o - S o d a i s . . . . . . . . .

Produção e Distribuição de Ener-gia

Transportes e Comunicações . . .

Sociais

SaúdeEnsino e InvestigaçãoCasas de Habitação

Total . . .

I Plano de Fomento

Previsto(inicialmente) (a)

Contos

2

2 170 000

1 290 000880 000

5 156 800

2 736 0002 420 800

215 000

215 000

7 541 800

%

3

28,8

17,111,7

68,4

36,332,1

2,8

2,8

100

Realizado (6)

Contos

4

2 707 570

1 089 1321618 438

7 306 418

4 545 8352 760 583

333 000

333 000

10 346 988

%

5

26,2

10,515,7

70,6

43,926,7

3,2

3,2

100

II Plano de Fomento

Previsto (a)

Contos

6

9 400 000

3 630 0005 770 000

10 970 000

4 500 0006 470 000

630 000

630 000

21 000 000

%

7

44,8

17,327,5

52,2

21,430,8

3,0

3,0

100

Preços correntes

Plano Intercalar

Previsto (a)

Contos

8

19 442 910

2 829 00016 613 910

11 927 645

5 668 0006 259 645

3 076 900

356 000874 000

1 846 900

34 447 455

%

9

56,4

8,248,2

34,7

16,518,2

8,9

1,02,55,4

100

FONTE: (a) — Relatórios dos Planos de Fomento.(ò)—I Plano de Fomento (parecer da Câmara Corporativa).

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Estes números revelam que riem nos Planos anteriores nemno próprio Plano Intercalar foi dada a devida importância aosaspectos sociais, facto que, certamente, veio a repercutir-se nasanomalias verificadas na própria estrutura global do capitalfixo formado no período que correspondeu à vigência dos doisprimeiros Planos. Esta lacuna torna ainda mais premente a ne-cessidade de, nos próximos Planos, se actuar de modo a garantir,no futuro, um ritmo de crescimento dos investimentos sociaissuperior ao previsto para o total dos investimentos.

No que se refere à Saúde e Educação, deverá procurar-seque o montante de investimentos atinja, pelo menos, a percen-tagem de 4% do total, percentagem esta que corresponde à quelhe foi atribuída no decurso do I Plano, sendo ainda de desejarque os investimentos públicos destinados a estes sectores se ele-vem mais que proporcionalmente em relação ao respectivo totalde modo a, pelo menos, atingirem os 18»% que lhe foram atri-buídos entre 1953 a 1958 (quadro D. 9, colunas 17 e 19).

No caso da Habitação, embora no decurso do II Plano setenha elevado a percentagem dos capitais públicos nela inves-tidos e o próprio Plano Intercalar lhe tivesse destinado algu-mas verbas, importa garantir uma taxa de crescimento dos ca-pitais públicos nela aplicados pelo menos idêntica à do total deinvestimentos públicos, sem a qual não se julga ser possívelcomeçar a solucionar com maior eficácia o problema da habita-ção das populações de mais baixos rendimentos.

A mesma orientação parece aconselhável no caso da Electri-cidade, Gás, Água e Serviços de Saneamento.

Também em relação à Agricultura se deverá dedicar parti-cular atenção ao montante de investimentos a realizar neste sec-tor, sobretudo no que se refere especificamente aos investimentospúblicos, dada a importância da actividade e ao efeito redistri-butivo que assim se conseguirá.

Note-se porém que, em qualquer dos casos, na determina-ção das taxas de crescimento dos capitais investidos em cada sec-tor se deverá: atender ao grau de desajustamento entre as ne-cessidades já satisfeitas e as necessidades mínimas que importasatisfazer; assegurar um desenvolvimento equilibrado de todos ossectores; e garantir, simultaneamente, a obtenção de uma taxaelevada de crescimento do produto.

Em ordem a alcançar-se, simultaneamente, uma repartiçãoorientada para a satisfação das necessidades fundamentais detoda a comunidade e a máxima expansão económica, na selecçãodos investimentos deverão ter-se presentes as seguintes condi-cionantes:

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—- o total dê necessidades a, que, futuramente, importasatisfazer e que deverão ser definidas segundo as prioridadesestabelecidas com vista ao desenvolvimento integral de todaa população46;

— o tipo e o volume de necessidades que só podem ser sa-tisfeitas através dos investimentos efectuados no própriopaís, como é o caso das relativas à educação, saúde, habita-ção, montagem de infra-estruturas e, em regra, todas as re-lacionadas com os investimentos sociais e económico-sociais;

— o volume de capitais destinado a investimentos emactividades não incluídas no caso anterior — isto é, em secto-res produtores de bens que também podem ser importados— e que terá de ser aplicado de acordo com o critério damáxima reprodutividade ainda que tal actuação conduza ànecessidade de recorrer à importação. Deste modo, atravésda exploração das riquezas potenciais do país e do melhoraproveitamento das condições estruturais existentes, serápossível obter a máxima taxa de crescimento do produto47.Por outro lado, o acréscimo de produtividade que resultarádessa actuação permitirá à comunidade elevar o seu nívelde satisfação uma vez que poderá usufruir de maior quanti-dade de bens;

— a necessidade de garantir o pleno emprego, dado que épor meio da retribuição do factor produtivo trabalho que,para a quase totalidade da população (os activos e os quepertencem ao seu agregado familiar), se tornará possívelparticipar na repartição do rendimento criado, participa-ção essa cujo nível, por sua vez, dependerá do facto de severificar um maior ou menor aproveitamento da capacidadeprodutiva de cada trabalhador48;

— a localização dos investimentos deverá verificar-se dede forma a diminuir os desequilíbrios económico-sociais quese observam entre as diversas regiões do país e que traduzema existência de condições de vida sensivelmente diferentespara as respectivas populações;

4« A concretização de tais prioridades está dependente: por um lado, donível de desajustamento entre o grau de satisfação e o que importa satisfazerrelativamente a cada necessidade essencial — alimentação, vestuário, habitação,saúde, recreação, e t c ; por outro lado, dos recursos que a comunidade possui.

A determinação daquele nível de desajustamento exige: a enumeração dasnecessidades fundamentais; a definição do nível desejável para cada umadelas; o conhecimento do nível de satisfação existente.

47 Para tal torna-se indispensável uma inventariação global dos recursospotenciais e um estudo económico sobre as possibilidades da exploração decada um deles.

48 É evidente que o aproveitamento da capacidade produtiva do traba-lhador se l iga também com os investimentos no sector da educação, saúde eformação profissional.

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— a aplicação dos capitais disponíveis, em especial osque se destinam a investimentos sociais, deverá fazer-se comvista à obtenção da máxima reprodutividade, daqui resul-tando, como é evidente, a necessidade de dar maior preferên-cia às uitiiizaçõea nualte funicibiníaíis dio quie às sumptuáiriias. Istto,porque os recursos são limitados e é necessário alcançasse omáximo desenvolvimento económico-social no mais curtoprazo.

Novembro de 1967.

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