aula 1 - seminário 1

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PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU FACULDADE DE DIREITO DO LARGO SÃO FRANCISCO UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO DISCIPLINA “O PAPEL POLÍTICO DO JUDICIÁRIO NO DIREITO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO EM VIGOR” SEMINÁRIO 1 (17/03/2015): A relação entre Cortes Constitucionais e Constituição Textos obrigatórios: 1. SCHMITT, Carl. O guardião da Constituição. Belo Horizonte: Del Rey, 2006 (Cap. III – O Presidente do Reich como guardião da Constituição); 2. KELSEN, Hans. Jurisdição constitucional. São Paulo: Martins Fontes, 2003 (Quem deve ser o guardião da Constituição? – p. 237-298). Textos complementares: 1. BERCOVICI, Gilberto. Carl Schmitt, o Estado total e o guardião da Constituição. Revista Brasileira de Direito Constitucional, São Paulo, n. 1, p. 195-201, jan./jun. 2003. LORENZETTO, Bruno Meneses. O debate entre Kelsen e Schmitt sobre o guardião da Constituição. Anais do XVIII Congresso Nacional do CONPEDI, São Paulo (SP), nov. 2009. p. 1924-1944. 3. SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma revolução democrática da justiça. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2011. Grupo: Ana Flávia Alves Canuto – NUSP 7541448 Gabriel Lino de Paula Pires – NUSP 7541066 Horival Marques de Freitas Junior – NUSP 4947790 1

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Seminário 1

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Page 1: Aula 1 - Seminário 1

PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU

FACULDADE DE DIREITO DO LARGO SÃO FRANCISCO

UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

DISCIPLINA “O PAPEL POLÍTICO DO JUDICIÁRIO NO DIREITO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO EM VIGOR”

SEMINÁRIO 1 (17/03/2015): A relação entre Cortes Constitucionais e Constituição

Textos obrigatórios: 1. SCHMITT, Carl. O guardião da Constituição. Belo Horizonte: Del Rey, 2006 (Cap.

III – O Presidente do Reich como guardião da Constituição); 2. KELSEN, Hans. Jurisdição constitucional.

São Paulo: Martins Fontes, 2003 (Quem deve ser o guardião da Constituição? – p. 237-298).

Textos complementares: 1. BERCOVICI, Gilberto. Carl Schmitt, o Estado total e o guardião da

Constituição. Revista Brasileira de Direito Constitucional, São Paulo, n. 1, p. 195-201, jan./jun. 2003.

LORENZETTO, Bruno Meneses. O debate entre Kelsen e Schmitt sobre o guardião da Constituição.

Anais do XVIII Congresso Nacional do CONPEDI, São Paulo (SP), nov. 2009. p. 1924-1944. 3. SANTOS,

Boaventura de Sousa. Para uma revolução democrática da justiça. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2011.

Grupo:

Ana Flávia Alves Canuto – NUSP 7541448

Gabriel Lino de Paula Pires – NUSP 7541066

Horival Marques de Freitas Junior – NUSP 4947790

PARTE I – BREVES DESTAQUES PONTUAIS DOS TEXTOS OBRIGATÓRIOS

Carl Schmitt – O guardião da Constituição

1. “O presidente do Reich encontra-se no centro de todo um sistema de neutralidade e

independência político-partidárias, construído sobre uma base plebiscitária. O ordenamento

estatal do atual Reich alemão depende dele na mesma medida em que as tendências do sistema

pluralista dificultam, ou até mesmo impossibilitam, um funcionamento normal do Estado

legiferante. Antes que se institua, então, para questões e conflitos relativos à alta política, um

tribunal como guardião da Constituição e, por meio de tais politizações, se onere e coloque em

risco a justiça, dever-se-ia, primeiramente, lembrar desse conteúdo positivo da Constituição de

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Weimar e de seu sistema constitucional. Consoante o presente conteúdo da Constituição de

Weimar, já existe um guardião da Constituição, a saber, o Presidente do Reich. Tanto o

elemento relativamente estático e permanente (eleição por 7 anos, difícil revocabilidade,

independência de maiorias parlamentares alternantes), quanto o tipo de seus poderes ([...]

dissolução do parlamento do Reich [...], e instituição de plebiscito [...], assinatura e promulgação

de leis [...], execução pelo Reich e proteção da Constituição [...]) têm o objetivo de criar um

órgão político-partidariamente neutro devido a sua relação direta com a totalidade estatal, o

qual, como tal, é o defensor e guardião da situação constitucional e do funcionamento

constitucional das supremas instâncias jurídicas e, em caso de necessidade, está dotado de

poderes eficientes para uma proteção efetiva da Constituição. É expressamente determinado

pelo artigo 42 que por meio de seu juramento o Presidente do Reich “defenderá a

Constituição”. O juramento político sobre a Constituição faz parte, segundo a tradição do

direito constitucional alemão, da “garantia da Constituição” e o texto escrito do regulamento

constitucional vigente qualifica o Presidente do Reich, de forma nítida o suficiente, de

guardião da Constituição [...];

2. O fato de o presidente do Reich ser o guardião da Constituição corresponde, porém, apenas

também ao princípio democrático, sobre o qual se baseia a Constituição de Weimar. O

presidente do Reich é eleito pela totalidade do povo alemão e seus poderes políticos perante

as instâncias legislativas [...] são, pela natureza dos fatos, apenas um “apelo ao povo”;

3. Por tornar o presidente do Reich o centro de um sistema de instituições e poderes

plebiscitários, assim como político-partidariamente neutro, a vigente Constituição do Reich

procura formar, justamente a partir dos princípios democráticos, um contrapeso para o

pluralismo dos grupos sociais e econômicos de poder e defender a unidade do povo com uma

totalidade política. [...] A Constituição busca, em especial, dar à autoridade do presidente do

Reich a possibilidade de se unir diretamente a essa vontade política da totalidade do povo

alemão e agir, por meio disso, como guardião e defensor da unidade e totalidade

constitucionais do povo alemão.” (p. 232-234).

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Hans Kelsen – Jurisdição constitucional

1. Kelsen ressalta a relevância de se estabelecer um adequado sistema de garantias de obediência

à própria Constituição, afirmando que tal exercício corresponde ao “princípio da máxima

legalidade da função estatal” (p. 239);

2. Em seguida, adverte, porém, que o exercício de “tal controle não deve ser confiado a um dos

órgãos cujos atos devem ser controlados”, exatamente porque seria tal órgão quem possuiria,

“primordialmente, a oportunidade jurídica e o estímulo político para vulnerá-la” (p. 240);

3. O autor critica veementemente a doutrina que pretendeu imputar o poder de garantia última da

Constituição ao monarca, de modo que Kelsen enxergava subjacentes a esse entendimento

intenções “de compensar a perda de poder que o chefe de Estado havia experimentado na

passagem da monarquia absoluta para a constitucional” e de “impedir uma eficaz garantia da

Constituição” (p. 240);

4. Kelsen também sustenta seu entendimento frisando que tanto o Parlamento quanto o governo

exercem poder político, não se podendo enxergar no monarca uma terceira instância, detentora

de poder neutro (p. 241);

5. Critica ainda a aplicação da doutrina de Benjamin Constant à hipótese, realçando o risco à

Constituição e aos direitos se não se vislumbrar o próprio chefe de Estado como um potencial

violador das disposições constitucionais (p. 247);

6. Passa, então, ao enfrentamento da questão de ser ou não benéfico se atribuir a função de

guardião da Constituição a um tribunal independente (p. 248). Nesse raciocínio, Kelsen reafirma

o caráter jurisdicional da função de controle de constitucionalidade e, para afastar o

pensamento de Schmitt, reconhece de maneira categórica o caráter político da jurisdição em

geral e assim também da jurisdição constitucional (p. 248 e seguintes). O autor enxerga função

de criação do direito na jurisdição (p. 258), reafirmando sua teoria do gradualismo e a diferença

meramente quantitativa entre legislação e execução (administração e jurisdição) (p. 260);

7. Inicia-se, a seguir, a abordagem das questões fundamentais ligadas às características

fundamentais do Estado alemão, cuidando Kelsen de rechaçar as ideias de Schmitt com relação

à passagem do Estado alemão para um “Estado total”, ainda assim abarcando a noção de

pluralismo. A unidade sustentada por Schmitt em função do conceito de Estado total faria

desaparecer também a divisão do poder entre o Parlamento e o Governo, de modo a se

propiciar que o monarca exerça validamente o controle de constitucionalidade dos atos do

legislador (p. 267 e seguintes).

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PARTE II – QUESTÕES PARA DEBATE

A) As características intrínsecas da jurisdição, assim como seu regime e seus efeitos jurídicos,

possibilitam designar tal função como política? Há diferença qualitativa entre a atividade de

jurisdição e a atividade de legislação? E entre a função jurisdicional exercida por qualquer órgão

judiciário e a jurisdição constitucional de natureza concentrada/objetiva? As decisões de caráter erga

omnes proferidas nas ações de controle concentrado de constitucionalidade e as súmulas vinculantes

podem ser compreendidas como atividades políticas?

B) No Brasil, a função de controle de constitucionalidade de atos e comportamentos dos entes estatais

é exercida pelo Supremo Tribunal Federal e pelo Poder Judiciário de maneira geral. Corremos o risco

de incorrer no equívoco apontado por Kelsen, de enxergar na atuação do Poder Judiciário apenas um

guardião da Constituição e assim não vislumbrar que o próprio poderia, por extrapolar suas funções

precípuas, afrontar as disposições constitucionais? As situações de possível abuso de tal direito pelo

Judiciário dar-se-iam com maior ênfase na invasão de espaço reservado ao Poder Executivo ou ao

Poder Legislativo?

C) Talvez a maior crítica de Schmitt ao tribunal constitucional como guardião da constituição decorra da

suposta falta de "legitimidade democrática" de magistrados não eleitos (sendo que o presidente do

Reich seria eleito pelo povo, de modo plebiscitário). No Brasil, isso teria sido resolvido pela forma de

composição do Supremo Tribunal Federal, mediante indicações do chefe do poder executivo

chanceladas pelo poder legislativo, havendo conciliação com a essencial neutralidade decorrente das

garantias jurisdicionais, incluindo vitaliciedade do cargo. Porém, a forma de investidura dos Ministros

do Supremo Tribunal Federal efetivamente influencia, amplia ou afeta a legitimidade da jurisdição

constitucional exercida por tal Corte no Brasil? Por outro lado, diante de tal composição, o Supremo

Tribunal Federal não seria um órgão inadequado como instância final de jurisdição para questões

outras que não o controle de constitucionalidade (recurso ordinário, competências originárias, etc),

justamente em razão da sua expressiva politização, desde a investidura?

D) É possível garantir a neutralidade político-partidária do Executivo, como afirmado por Schmitt, ou de

qualquer outro órgão que se destine a analisar a Constituição, ainda mais se considerando que esta é

um documento político e fruto de uma decisão política, na própria concepção do autor?

E) A discussão acerca de quem seria legítimo para ser o guardião da Constituição não seria secundária

diante da necessidade – real, importante e atual – de se definir limites a esta atuação, uma vez que

não raro o guardião não apenas a defende e interpreta, mas também altera, cria e ignora preceitos,

vindo a violá-la ao invés de guardá-la?

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