aula 5 as doenças os doentes e os medicos

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AS DOENÇAS, OS DOENTES E OS MÉDICOS Profa. Dra. Tânia C. Oliveira Valente

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AS DOENÇAS, OS DOENTES E OS MÉDICOS

Profa. Dra. Tânia C. Oliveira Valente

VÍDEO 1

QUAL É OBJETIVO DA PRÁTICA MÉDICA?

Relação médico-paciente

TEMA COMPLEXO

o número pequeno de pesquisas nessa área

dificulta a determinação de princípios claros,

objetivos e bem fundamentados que norteiam a

relação com o paciente dizendo-nos a cada

momento: isto está errado, aquilo está certo

Subjetividade

A essência da relação médico-paciente é plenamente inserida no campo das ciências humanas, que lhe oferecem amplo referencial teórico.

Assim, esta relação tem bases tão científicas quanto a medicina do corpo e

das doenças orgânicas, podendo ser ensinada e aprendida, agregando

QUALIDADE, HUMANIDADE e EFICÁCIA ao ato médico.

Costa Ferreira et al, 2001

Fase inicial: mágico-religiosa, exercida por magos e sacerdotes

A Ciência e a Relação Médico-Paciente

Saúde X DOENÇA

ATÉ SEC XVIISEC XVIII EM DIANTE

•HOSPITAIS•MONOPÓLIO DO EXERCÍCIO DA MEDICINA PELOS MÉDICOS•INTERPOSIÇÃO DE TECNOLOGIAS ENTRE O DOENTE E O MÉDICO

A ARTE DE CURAR SE BASEAVA NO CONTATO COM O CORPO E A SUBJETIVIDADEDO DOENTE E NO RESGATE DO EQUILÍBRIO “PERDIDO”

REVOLUÇÃO INDUSTRIAL

SEC XIX EM DIANTE

• Urbanização , mudanças sociais e demográficas

• Desenvolvimento científico e tecnológico• Mercados consumidores de serviços médicos

e de tecnologias• Monopólio do exercício da profissão • Pactuação entre representantes formais da

medicina e representantes do Estado

Medicina Técnico-Científica

• Início da Era Hospitalar

• Medicina preventiva

• Medicina sanitária

• Conceito bacteriológico como fator causal das doenças

• Impacto da II Guerra Mundial

aceleração dos progressos técnico-científicos

Fatoresexternos ao

homem

SEC XX/XXI?• “CRISE” DA MEDICINA:

– Plano institucional – adequação de modelos– Plano ético – mercantilização e objetivização das

relações– Plano da eficácia institucional médica – perda do

papel milenar terapêutico da medicina em função da investigação sofisticada de patologias

– Bioética – até onde vamos?– Plano corporativo e das relações com a sociedade– Plano pedagógico – quem estamos formando?

Educador norte-americano que publicou um relatório

(1910) em que propõe profundas reformas na educação

médica nos Estados Unidos. Sua ampla repercussão deu

suporte intelectual à atuação dos profissionais de saúde na

maioria dos países do mundo ocidental

Abraham Flexner (1866-1959)Abraham Flexner (1866-1959)

MODELO BIOMÉDICO

Racional

Científico

Mecânico

Cuida do corpo como se fosse um conjunto de peças a serem consertadas

As dimensões psicológicas

e socioeconômicas das doenças e

exploração das emoções do

paciente são desestimuladas,

negligenciadas

Relação Médico-Paciente

• Dra. Ressonância Magnética

• Dr. Incor

• Dr. Bradesco/saúde

• Dra. Internet

• Dr. Fantástico

NovosATORES

Impacto da Tecnologia Aplicada à Medicina Contemporânea

MÉTODOS diagnósticos

laboratoriaisimagens

terapêuticos

Expressiva melhora na qualidade de vida

e aumento da sobrevida dos seres humanos

Impacto da Tecnologia Aplicada à Medicina Contemporânea

• Altos custos

• Acentua diferenças socioeconômicas

• Não democrática

• Dificuldade de acesso aos grandes centros tecnológicos

• Reforça o modelo organicista

• Médicos adictos da tecnologia

• Dificulta a relação médico-paciente

IMPACTO DA TECNOLOGIA APLICADA À MEDICINA CONTEMPORÂNEA

• Iatrogenia diagnóstica e terapêutica

• Visão focada na doença, desviando da pessoa doente

• Falsa expectativa do paciente

• Diminuição do prestígio da figura do médico

CAUSA DA DOENÇA

DIAGNÓSTICO = “anos” de teoria, internet, recurso aos “universitários”(celular),“pular”(encaminhamentos),“cartas” (palm).Anamnese, exame físico, investigação de órgãos, aparelhos e sistemas do paciente.Devo examinar com mais atenção este abdome? Peço ou não peço exames?Entro com medicação agora ou espero o resultado dos exames?

MODELO BIOMÉDICONo modelo biomédico, a tarefa do médico é buscar a causa das doenças.Remove-se a causa, cessa-se a doença.E quando não se acha a causa? Não há doença?

DOENÇA?

O QUE É DOENÇA?

• As doenças são “coisas” influenciadas por fatores culturais, econômicos e sociais relativos ao médico e ao paciente.

• Tem um caráter “convencional”• Clínica = “coisas” semelhantes entre as

doenças de vários indivíduos• Epidemiologia = “coisas” semelhantes entre as

populações

AS DOENÇAS SÃO ABSTRAÇÕES (CONSTRUÇÕES DO PENSAMENTO, TRANSFORMAÇÃO DE INFERÊNCIAS EM VERDADES), QUE EXCLUEM OS INDIVÍDUOS ACOMETIDOS E QUE AGRUPAM PROCESSOS QUE NA

VERDADE SÃO INDIVIDUAIS

Os doentes e seu sofrimento são dados da realidade, com o que o médico lida

diariamente.

Para o doente o sofrimento é um fato concreto, incapacitante de uma forma que

transcende sua capacidade de auto-cuidado, tornando necessária a intervenção de alguém

legitimado socialmente para este cuidado.

Para o médico o sofrimento é irrelevante e o paciente, fonte

de distorções. A relação do médico se dá com a doença e o

paciente é um mero canal de acesso a ela. Canal “ruim”, por

sinal, uma vez que produz “ruídos” em níveis insuportáveis.

xCatalogação

Classificação

Disease

“Ciência”

Verdadeiro ????

Sofrimento

Illness/Sickness

Mal estar

Subjetividade

Falso ????

• Ciência não é sinônimo de real nem de verdadeiro.• Procedimento de construção de modelos que nos

permitem interferir em determinados problemas com um mínimo de previsibilidade dos resultados das nossas ações.

• Medicina = “ofício” • Habilidades aprendidas com um mestre, na qual a

experiência tem um papel fundamental.• A habilidade individual da prática médica não pode

ser copiada. O que pode ser copiado é a repetição mecânica de condutas padronizadas.

• Diagnóstico – “escuta” do paciente• Formulação de hipóteses que vão sendo incluídas ou

descartadas ao longo da consulta• Terapeutica – Não é simples decorrência do

diagnóstico • Therapeutike – ato de curar, ato de servir, ato de

culto religioso• O tratamento continua sendo uma instância

individual, quer se pense em termos de médicos (cada médico tem a sua conduta), quer se pense em termos de pacientes (cada paciente adoece de uma forma particular)

Do que estamos falando?

SOFRIMENTO Busca de ajudamédica

Encontro de alterações fisiológicas

Ajuda para a resolução do sofrimento

Não encontro de alterações

Insatisfação das expectativas

DoenteReforço da condição de sofrimentoAngustia, ansiedade, depressão

Médico:Sensação de ImpotenciaAngústia/Ansiedadedepressão

Psicossomática

• A psicossomática tem como substrato o sofrimento humano, que necessariamente é influenciado por fatores não só biológicos, mas psíquicos, econômicos, ideológicos , sociais e espirituais entre outros.

• Sendo assim, este sofrimento não pode ser completamente explicado e solucionado com o aparato científico atualmente disponível.

A psicossomática não é exclusiva da Psiquiatria e/ou Psicanálise. Sua abordagem deveria estar inserida na grade curricular de todas os cursos de graduação e pós-graduação na área da saúde.

Sendo uma ideologia da saúde, a compreensão das relações psique-corpo, as formas de vulnerabilidade e os mecanismos de produção de sofrimento são os aspectos chave da Psicossomática.

Ou seja, a Psicossomática é de todos (e não é de ninguém!)

A abordagem do paciente em Psicossomática

• 2 tipos de pacientes: –Pacientes sem componente físico

constatável por exames = TRANSTORNOS SOMATOFORMES

–Pacientes com componente físico constatável por exames = DOENÇA PSICOSSOMÁTICA

SISTEMA SEM ALTERAÇÕES FÍSICASSOMATOFORMES

COM ALTERAÇÕES FÍSICASPSICOSSOMÁTICAS

CARDIOVASCULAR Palpitações ,dor, sensação de opressão, tonturas

Doença coronária, hipertensão arterial, arritmias

RESPIRATÓRIO Falta de ar, suspiro, tosse emocional, bolo na garganta

Asma, rinite alérgica, síndrome de hiperventilação

ENDÓCRINO Sintomas de hipoglicemia Hiper ou hipotireoidismo, hipo ou hiperfunção de paratireóides, hipoglicemia, diabetes

GINECOLÓGICO Alterações no ritmo e no fluxo menstrual, cólicas menstruais, vaginismo, dispareunia, dor pélvica

Displasia mamária, vaginites, herpes genital, endometriose

GASTROINTESTINAL Enjôo, má digestão, cólicas abdominais, queimação, boca amarga, acidez

Transtornos esofágicos, dispepsia, úlceras, sind. Colon irritável, retocolite ulcerativa

DERMATOLÓGICO Prurido essencial, queimação, formigamentos

Hiperhidrose, urticária, dermatite atópica, alopécia, herpes, vitiligo, caspa

REUMATOLÓGICO Dores nas costas, mãos, pernas Artrites

IMUNOLÓGICO Rinite, lupus, psoríase

OTORRINO Zumbido, tonturas, pigarro Labirintites

DOR CRÔNICA Dores generalizadas Fibromialgia, enxaqueca

Se você tivesse fraqueza nas pernas e seus exames fossem normais, você se sentiria ofendido se seu

médico dissesse que...DIAGNÓSTICO “OFFENSE”

SCORE (%)

“Coisa da sua cabeça” 93

Fraqueza histérica 52

Fraqueza psicossomática 42

Fraqueza sem explicação médica 35

Fraqueza associada à depressão 33

Fraqueza relacionada ao stress 20

Fadiga crônica 15

Fraqueza funcional 12

AVC 12

Esclerose múltipla 5Stone et al. BMJ 325: 1449-50)

Sintomas comuns na prática médica em nível primário:1000 pacientes, 3 anos, custos– 567 queixas relacionas a dor no peito, fadiga, tontura,

dor de cabeça, edema, dor nas costas, dispneia, insonia, dor abdominal, impotencia, perda de peso, tosse e constipação

– 38 % dos pacientes– Dor de cabeça ($7,778), dor nas costas ($7,263)– Tratamento em 55% – 53 % dos sintomas pioraram– Prognóstico favorável: etiologia organica, duração

menor que quatro meses e dois ou menos sintomas (Kroenke K Mangelsdorff AD AnnIntern Med 2001)

Exames realizados para a investigação diagnósticaem 73 pacientes portadores de Transtorno de Pânico

(exames normais)

ECG ECO ERGO HOLTER MAPA EEG TOMO AUDIO ENDO OUTROS

58 40 31 21 12 24 16 11 20 16

C.A.M. 45 anos

fem.10.06.2000

— Você não tem nada! Não encontramos nada de anormal no seu coração nem nos exames.

— O que devo fazer ?

— Quando apresentar a crise, tome um Lexotan.

rasgo meu diploma!

ECG,

TCE,

Eco,

Tiltest,

Cintilografia Miocárdica,

Mapa,

Função Pulmonar,

CINE

aperto no peito

Você não tem nada!

Diálogo médico-paciente

Diagnósticos

• Existem vários instrumentos de diagnóstico positivo de somatização

• Duas condições são necessárias para se estabelecer esse diagnóstico:

• a presença de vários (mais de 3) sintomas vagos ou exagerados em sistemas orgânicos diferentes

• essas queixas tenham uma evolução crônica de mais de 2 anos.

• Normalmente procuram o médico clínico• Muitas vezes querem ser encaminhados para especialistas.

Características sugestivas de diagnóstico de somatização

• Múltiplos sintomas, muitas vezes ocorrendo em diferentes sistemas orgânicos

• Sintomas que sejam vagos ou que excedam os achados objetivos

• Evolução crônica• Presença de um transtorno psiquiátrico• História de extensos exames para diagnóstico• Rejeição de médicos anteriores

Cuidar, não procurar curar• Não tentar eliminar completamente os

sintomas• Concentrar na convivência e nas funções

Condutas paciente somatizador

Conservadorismo diagnóstico e terapêutico• Analisar fichas antigas antes de pedir exames• Responder a solicitações como para os que não têm

preocupações somáticas• Marcar consultas e exames físicos freqüentes

(4 a 6 sem)• Não alterar a freqüência das consultas• Pensar em remédios benignos

Condutas paciente somatizador

Condutas paciente somatizador

Validação do sofrimento• Não refutar ou negar os sintomas• Não basear a relação médico-paciente nos

sintomas• Concentrar na história social

Obs.: Dar aos sinais físicos maior peso do que aos sintomas relatados.

Condutas paciente somatizador

Dando um diagnóstico• Enfatizar a disfunção, e não a patologia

estrutural• Descrever o processo de amplificação e

fornecer exemplo específico• Tranqüilizar com cautela

Condutas paciente somatizador

Consulta psiquiátrica• Diagnosticar comorbidade psiquiátrica• Recomendar opções de farmacoterapia• Providenciar psicoterapia

Terapia cognitivo-comportamental• Melhorar a convivência

Condutas paciente somatizador

• Evitar procedimentos e hospitalizações

• Tratamento como bem sucedido:

paciente mantido fora do hospital/ pronto-socorro

diminuição de sua exposição a complicações iatrogênicas

Enfoque Biopsicossocial

Mente

Meio externo, aspectos socioculturais e meio físico

Corpo

O SER

TOTAL

Processos mentais ou atividade

psíquica, níveis de processos

cognitivos (funções intelectuais) e níveis de processos

afetivos (funções integradas com a vida

vegetativa).

Morfologia e filosofia das células, tecidos, órgãos e sistemas, incluindo o Sistema Nervoso Central como estrutura.

PARA FINALIZAR...

VÍDEO 2

TODO ENCONTRO MÉDICO-PACIENTE É SIGNIFICATIVO PARA

O PACIENTE.

QUAL É OBJETIVO DA PRÁTICA MÉDICA?

O OBJETIVO DA PRÁTICA MÉDICA É O

ALÍVIO DO SOFRIMENTO

Equação da Ajuda

Habilidades técnicas

+ Habilidades interpessoais

+ Empatia

+ Disponibilidade

= AJUDA

SOFRIMENTO

illness

diseasesickness

subjetivo

objetivosocial

ideológicas

econômicas

políticas

filosóficas

culturais

ambientaistemporais

espirituaispsíquicas

Da primeira vez em que me assassinaram Perdi um jeito de sorrir que eu tinha...Depois, de cada vez que me mataram,Foram levando qualquer coisa minha...E hoje, dos meus cadáveres, eu souO mais desnudo, o que não tem mais nada...Arde um toco de vela amarelada...Como o único bem que me ficou!Vinde, corvos, chacais, ladrões da estrada!Ah! Desta mão, avaramente adunca,Ninguém há de arrancar-me a luz sagrada!Aves da noite! Asas do Horror! Voejai!Que luz, trêmula e triste como um ai, A luz do morto não se apaga nunca!

Mário Quintana

FINALMENTE A AULA

ACABOU!!!!!