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Saúde Pública com Ênfase em Saúde da Família Bioética Aula 6 Prof. Me. João Luiz Coelho Ribas

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Saúde Pública com Ênfase em Saúde da Família

Bioética

Aula 6

Prof. Me. João Luiz Coelho Ribas

Saúde Pública com Ênfase em Saúde da Família | Bioética | Aula 6

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Apresentação

Olá! Bem-vindos a esta aula!

Assista ao vídeo a seguir para conhecer os principais temas

que serão discutidos nesta aula:

Introdução

A vida e a morte são discutidas sob vários olhares: filosófico

ético, bioético, científico; e desde Sócrates supunha-se que se

iluminavam reciprocamente. No entanto, séculos depois, a morte foi

descrita como algo certo, cuja hora é incerta, em uma consciência

de finitude humana. Hoje, existem alternativas como a

hospitalização, as unidades de terapia intensiva, a popularização

dos transplantes e, sobretudo, as novas tecnologias médicas que

alteram totalmente os conceitos de morte e morrer. Essas técnicas

e procedimentos dão aos profissionais de saúde “poderes” de

retardar a hora da morte.

Colocar no centro das discussões bioéticas a sacralidade da

vida no desempenho potencial de sua autoconsciência, vontade e

relação interpessoal, centraliza o debate no conceito de “ser

humano”, de quando adquirimos esse título e de quando o

perdemos.

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Problematização

Colocamos aqui cinco questões-chave para você pensar:

quando se origina um ser humano?

quando morre um ser humano?

quando é ético deixar de tentar manter um ser humano vivo?

quando é ético continuar mantendo um ser humano vivo?

quando é ético retirar os órgãos de um ser humano com o

objetivo de transplantá-lo em outro?

São questões simples de se construir, mas muito complexas

de se responder ética e cientificamente.

Bioética e o Final da Vida

Apesar de aparentar ser um conceito extremamente simples,

a definição de morte é um problema que perdura por vários séculos.

O problema tradicional da definição desse termo é por ser, como

inúmeras outras definições tradicionais, circular, ou seja, a morte,

em última análise, é quando deixamos de viver, e,

consequentemente, deixamos de viver quando morremos.

Vários autores tentam definir o que é morte, no entanto, se

formos considerar várias dessas definições, podemos conceituá-la

como sendo o cessar irreversível:

do funcionamento de todas as células, os tecidos e os órgãos do

corpo;

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do fluxo espontâneo do ar;

do funcionamento do coração;

do funcionamento do cérebro, incluindo o tronco cerebral (morte

encefálica);

do funcionamento completo das porções superiores do cérebro

(neocórtex);

da capacidade de consciência.

Enfim, algo irreversível. No entanto, devemos sempre ter em

mente que a definição de morte não é puramente médica, devido

especialmente à enorme gama de tentativas de definição sobre

esse tema. Por isso, implicações morais e legais estão intimamente

envolvidas com essa questão. Somada a isso, a ideia, ou melhor, a

constatação da finitude da vida, traz à tona discussões envolvendo

o processo de envelhecimento e a “morte iminente”.

Assim como quando existe uma doença grave ou uma

condição de saúde – incluindo aspectos físicos, mentais ou

sociais – que acabam gerando sofrimento à pessoa e aos que a

rodeiam, a morte passa a ser não somente, única e exclusivamente,

uma probabilidade, mas também uma alternativa, que

bioeticamente nos coloca frente a uma questão básica sobre o ato

de morrer: o ser humano é proprietário de sua vida? Ele pode fazer

o que bem entender com ela?

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Vamos discutir sobre esse assunto? Então assista ao próximo

vídeo sobre o direito de morrer:

Se a resposta for sim, essa pessoa poderia, de diferentes

formas, colocar fim a sua existência sem problema algum em

relação aos preceitos morais, éticos e legais. No entanto, se a

resposta for não, aí sim temos um embate permeado especialmente

por doutrinas religiosas que consideram a vida um dom divino e,

sendo assim, caberia ao homem apenas a sua preservação e não a

decisão sobre seu início e, especialmente, seu fim.

Na tentativa de encerrar essas discussões em torno da morte,

seu conceito está sendo revisto, especialmente com o número

crescente de transplantes de órgãos e tecidos. Atualmente, o

motivo mais aceito para se colocar um fim na existência de um

indivíduo é o da morte encefálica, ou seja, a parada total e

irreversível das funções encefálicas.

Mas como é possível fazer esse “diagnóstico” de morte

encefálica?

De acordo com a Resolução nº 1.480/1997, do Conselho

Federal de Medicina (disponível no link http://www.bioetica.ufrgs.br/

cfmmorte.htm), a morte encefálica somente será caracterizada

como tal por intermédio da realização de exames clínicos

complementares, durante intervalo de tempo variável, sendo a

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morte consequência de um processo irreversível e de causa

conhecida.

Os parâmetros clínicos a serem avaliados para a

determinação da morte encefálica são: o coma aperceptivo com

ausência de atividade motora supraespinal e apneia, sendo que

devem ser realizadas pelo menos duas avaliações a esse respeito,

com intervalo mínimo dependente da idade do paciente, a saber:

sete dias a dois meses de idade – a segunda avaliação deverá

ser feita 48h após a primeira;

dois meses a um ano incompleto de idade – a segunda

avaliação deverá ser feita 24h após a primeira;

um ano a dois anos incompletos de idade – a segunda

avaliação deverá ser feita 12h após a primeira;

acima de dois anos de idade – a segunda avaliação deverá ser

feita 6h após a primeira.

Cabe aqui ressaltar que os exames complementares a serem

observados para a constatação inequívoca da morte encefálica

deverão afirmar, de forma irrefutável, a ausência de atividade

elétrica cerebral ou a ausência de atividade metabólica cerebral, ou

ainda, a ausência de perfusão sanguínea cerebral.

Todos esses critérios e os demais que compõem a Resolução

nº 1.480/1997, do Conselho Federal de Medicina, têm a finalidade

de caracterizar e documentar a morte encefálica de forma

irrefutável. Item esse essencial para que não se configure, em

hipótese alguma, ao se desligar os aparelhos ou ao se remover

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órgãos e tecidos, cuja vida somente é mantida pela utilização de

equipamentos de suporte, como sendo eutanásia.

Mas o que de fato é eutanásia e quais são suas principais

implicações bioéticas? Veja a reposta no vídeo a seguir:

Na história da medicina, a eutanásia já foi amplamente

utilizada em vários países, especialmente entre as décadas de 1920

e 1930. Nesses anos, ela foi utilizada basicamente como uma

medida eugênica, ou seja, com a finalidade de “melhoramento

genético”, matando-se doentes mentais, deficientes físicos e idosos

com a justificativa, na época amplamente aceita, de liberar a

sociedade do encargo que essas pessoas traziam.

No entanto, as reflexões e discussões sobre a eutanásia só

ganharam força a partir da década de 1960, com o enfoque firmado

especialmente frente aos avanços científicos e tecnológicos postos

à disposição dos profissionais de saúde, o que culminou na

alteração de sua definição e até mesmo nos critérios utilizados a

partir de então para o estabelecimento do termo “morte”.

O termo “eutanásia” pode ser definido como boa morte ou

morte apropriada, ou seja, geralmente, é quando uma pessoa

causa, deliberadamente, a morte de outra que está mais fraca,

debilitada ou em sofrimento. Nesse último caso, especialmente, a

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eutanásia seria justificada como uma forma de evitar um sofrimento

acarretado por um longo período de doença e de debilidade.

Em relação a essa concepção de eutanásia, podemos

classificá-la de várias formas, especialmente quanto ao seu tipo de

ação e ao seu consentimento por parte do paciente.

Em relação ao tipo de ação

Eutanásia ativa – é caracterizada como o ato deliberado de

provocar a morte do paciente, sem sofrimento, como sendo esse

ato concebido para fins misericordiosos;

Eutanásia passiva ou indireta – aqui a morte do paciente

terminal ocorre dentro de uma situação na qual não se inicia uma

ação médica ou se interrompe uma medida já utilizada, com o

único objetivo de reduzir o sofrimento;

Eutanásia de duplo efeito – quando a morte de um paciente é

acelerada, especialmente como consequência indireta das ações

médicas, que são executadas com a finalidade única de aliviar o

sofrimento de um paciente terminal.

Em relação ao consentimento do paciente

Eutanásia voluntária – quando a morte é provocada atendendo

a uma vontade explícita do paciente;

Eutanásia involuntária – quando a morte é provocada contra a

vontade do paciente;

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Eutanásia não voluntária – quando a morte é provocada sem

que o paciente manifeste sua posição em relação à morte, ou

seja, nem a favor e nem contra a eutanásia.

Especificamente, essas questões em relação ao

consentimento do paciente são discussões bastante antigas,

iniciada por volta de 1937, com o grande intuito de estabelecer

especialmente a responsabilidade do profissional de saúde que a

provocou.

No Brasil, em uma tentativa de classificação, o professor Ruy

Santos, em 1928, propôs que a classificação da eutanásia fosse de

acordo com quem executa a ação. Sendo assim, temos:

a eutanásia-homicídio – quando alguém realiza um

procedimento para interromper a vida de um paciente, podendo

ser um procedimento feito por um profissional de saúde ou por

um familiar;

a eutanásia-suicídio – quando o próprio paciente é o executor

ativo de sua morte, sendo essa a principal ideia do que hoje

concebemos como suicídio assistido.

Apesar da definição clara e de suas classificações, o termo

ainda é utilizado de maneira confusa e ambígua. Devido a essa

situação, conforme o tempo, novas palavras têm sido criadas para

evitar confusões de conceitos. No entanto, na maioria das vezes, ao

invés de esclarecer, a proliferação vocabular acaba criando mais

problemas conceituais. Entre esses novos termos utilizados

atualmente, podemos citar especialmente três: a distanásia, a

ortotanásia e a mistanásia.

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Distanásia: caracterizada pela morte lenta, ansiosa e com muito

sofrimento, ou seja, é o prolongamento do sofrimento físico ou

psicológico de um indivíduo lúcido;

Ortotanásia: caracterizada pela atuação correta frente à morte. É

tida como a abordagem adequada, com cuidados paliativos

suficientes aos pacientes em seus momentos finais;

Mistanásia: também denominada de eutanásia social. É

caracterizada pela morte miserável, fora e antes da hora. De

acordo com esse conceito, podemos focalizar três situações

típicas em que ela ocorre:

primeira situação – a grande massa de doentes e deficientes

que por motivos específicos, especialmente no que tange os

aspectos político, social e econômico, nem sequer chegam a

ser pacientes, pois infelizmente, por várias situações, não

conseguem ingressar efetivamente no sistema de saúde, nem

sequer conseguem uma consulta;

segunda situação – os doentes que, apesar das dificuldades,

conseguem ser pacientes, mas que em seguida são vítimas de

erro médico;

terceira situação – pacientes que acabam sendo vítimas de

má prática dos profissionais de saúde, seja ela por motivos

econômicos, científicos ou até mesmo sociopolíticos.

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No entanto, quando falamos em eutanásia propriamente dita,

além das discussões sobre pacientes com doenças terminais, a

eutanásia em idosos assume uma grande importância,

especialmente quando se refere às questões de respeito à

autonomia. Nesse caso, a decisão por parte de um idoso, em

relação à eutanásia, seria uma decisão plenamente consciente, que

não estaria sendo tomada devido a uma doença terminal debilitante,

nem a um estado depressivo acentuado.

Em toda essa análise, também devemos levar em conta um

ponto fundamental que diz respeito ao estabelecimento de limites

em um tratamento. No que diz respeito ao tratamento, podemos

caracterizá-lo como sendo uma medida ordinária, extraordinária ou

fútil. Esta é caracterizada pela ausência de motivo ou de resultado

útil em um processo diagnóstico ou de intervenção terapêutica; a

obstinação terapêutica é socialmente condenada, inclusive por

religiosos, os quais a caracterizam como o prolongamento indevido

do sofrimento natural. Essa é caracterizada por procedimentos

terapêuticos que somente podem ser obtidos com gastos, dor ou

incômodos excessivos e que, se de fato utilizados, não oferecem

uma possibilidade de benefício ao paciente. Aquela é caracterizada

como mandatória, ou seja, deve ser proposta e traz um potencial

benefício ao paciente, mesmo com os riscos associados ao

tratamento.

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A alimentação enteral por sonda nasogástrica é, na maioria

das vezes, uma medida ordinária, mas quando esse procedimento é

realizado em um paciente em estado vegetativo persistente e

irreversível, será que ela não passa de uma medida extraordinária

para mantê-lo vivo?

O limite de tratamento associado a essas medidas,

independente do valor ou do benefício envolvidos, é muito mais

aceito em pessoas idosas do que em jovens e crianças,

especialmente porque, nesses casos, a idade serve como um

atenuante de impacto bastante interessante. Utiliza-se esse critério

de idade para justificar situações que poderiam ser caracterizadas

não como a aceitação de limites terapêuticos, mas sim de

abandono terapêutico.

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Para refletir algumas questões sobre eutanásia, leia os textos

“Eutanásia: direito de matar ou direito de morrer”, “Bioética nas

questões da vida e da morte” e “Finitude e bioética do final da vida”,

respectivamente. Assista também a uma cena do filme “Menina de

ouro”.

Acesse: http://www.bioetica.ufrgs.br/eutange.htm

Acesse: http://www.scielo.br/pdf/%0D/pusp/v14n2/a08v14n2.

pdf

Acesse: http://www.inca.gov.br/rbc/n_58/v01/pdf/11_artigo_

opinicao_finitude_bioetica_fim_vida.pdf

Acesse: http://www.youtube.com/watch?v=JmxqAA7mbKk&

feature=related

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Bioética e Suicídio

Mas o que é o suicídio, de fato, sob a luz da Bioética?

Assista ao vídeo a seguir que apresenta o conceito de suicídio

e suicídio assistido, além de discutir sobre o direito do ser humano

ao suicídio, citando exemplos históricos:

O suicídio é caracterizado por um ato voluntário pelo qual o

indivíduo tem a intenção de provocar a própria morte e a faz de fato.

Nos últimos anos, o suicídio vem ganhando destaque a ponto

de se tornar um grande problema psicossocial, sendo considerado

uma das 20 principais causas de morte, mundialmente falando, em

todas as idades, aproximadamente um milhão de pessoas morrem

por suicídio todos os anos.

Atualmente, os principais fatores de riscos identificáveis para

o suicídio são especialmente doenças mentais, depressão primária,

desordens relacionadas ao álcool, violência e perda da base cultural

e social. No entanto, muito mais do que um atentado contra a

própria vida, o suicídio é uma grande questão filosófica que nos

remete a uma questão: decidir se a vida merece ou não ser vivida,

sendo considerado na história da humanidade como uma espécie

de metafísica, truque teológico, ou seja, uma tentativa desonesta de

escapar ao absurdo.

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Alguns filósofos contemporâneos veem o suicídio como uma

escolha pessoal e intransferível, sendo assim considerado um

direito humano (o direito que qualquer indivíduo teria de morrer) e,

além do mais, alegam que ninguém, absolutamente ninguém,

deveria ser obrigado a sofrer contra a sua vontade, por mais que

sua vontade esteja sendo influenciada por uma depressão, doença

mental, idade avançada ou condições explícitas de doenças

incuráveis, como câncer e HIV/Aids, nas quais a possibilidade de

melhoria é baixa ou inexistente.

Os defensores desse ponto de vista rejeitam qualquer

alegação de que o suicídio é um ato irracional, argumentando e

fomentando que ele pode ser o último recurso válido para dores

maiores e traumas persistentes. Nessa mesma ótica de direito

humano e escolha pessoal, o suicídio seria aceito, inclusive para

pessoas jovens e saudáveis, acreditando-se que elas têm plena

consciência racional para decidirem o rumo que querem tomar

sobre suas próprias vidas e escolhas.

Os tratamentos psicológico e psicoterápico são essenciais

para que os pacientes com risco iminente de cometerem suicídio,

ou que já passaram por tentativas de suicídio, sejam tratados com

dignidade e de forma correta. Inclusive o sigilo profissional, em caso

de tratamento de pessoas que manifestam seu desejo de suicídio a

um profissional de saúde, pode ser quebrado, até mesmo porque,

se a pessoa vier a se suicidar, o profissional corre grande risco de

ser culpado por omissão ou negligência, de acordo com o Código

Penal Brasileiro.

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Além do mais, cabe aqui uma reflexão bastante interessante a

respeito da recusa de tratamento como um ato de suicídio, levando

em consideração que esse tratamento seria essencial para a

manutenção de sua vida. Esse é o exercício de autonomia até o

final da vida, no entanto, se olharmos pelo lado da competência

técnica, como decidir? Ou, por outro lado, se o profissional decidir

pelo tratamento, mesmo contra a vontade do paciente, como

considerar o que é o princípio da beneficência? Quem decide?

Questões levantadas e discutidas pela Bioética que ainda estão

longe de serem consensualmente resolvidas.

Sobre esse raciocínio, surge uma questão amplamente

discutida atualmente: como dever ser o procedimento com o

suicídio assistido, que ocorre quando o indivíduo não consegue

concretizar sozinho sua intenção de morrer e solicita o auxílio de

uma outra pessoa, especialmente na figura de um profissional da

saúde, que, na maioria das vezes, é da classe médica?

Essa assistência ao suicídio de outra pessoa pode ser

realizada, por exemplo, com a prescrição de altas doses de

medicação e indicação de sua utilização ou de uma forma mais

passiva, simplesmente caracterizada pela persuasão ou pelo

encorajamento para tal ato.

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Para alguns questionamentos a respeito do suicídio, leia o

texto “Suicidio: ¿derecho de autodeterminación física o ejercicio de

la libertad com respecto a la própria vida?”.

Acesse: http://saber.ucv.ve/ojs/index.php/rev_ens/article/view

/534/483

Bioética e a Interrupção da Vida

Assista ao próximo vídeo com comentários sobre a questão

bioética e a interrupção da vida, definindo o que é vida, onde de fato

ela se inicia, e as consequências do aborto, além de abordar sobre

a discussão a respeito de bebês anencéfalos:

Para tratar desse assunto, devemos inicialmente nos

perguntar: “quando começa a vida de um ser humano, e a partir de

que momento ele passa a existir?”. Possivelmente a resposta para

essa pergunta vai revelar diferentes opiniões. No entanto, se

pensarmos com base em uma visão ética e científica, a partir da

união de um espermatozoide com um óvulo, denominada

fecundação, já existe um ser humano: o embrião, que é um

indivíduo totalmente novo, formado de “materiais” provenientes de

seres humanos. E, como tal, é um ser espiritual, pronto para se

desenvolver em harmonia com sua realidade material. Esse

Saúde Pública com Ênfase em Saúde da Família | Bioética | Aula 6

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desenvolvimento só será possível se forem dadas as condições

para tal durante a gravidez e, até mesmo, depois do nascimento.

E como definimos o termo gravidez?

A gravidez, também denominada de gestação, é caracterizada

como o período fisiológico compreendido entre o momento da

fecundação do óvulo (ou óvulos) até o nascimento ou a morte, ou a

expulsão de forma espontânea ou proposital do produto da

concepção. Sendo assim, a expressão “aborto” pode ser definida

pela morte do embrião ou feto, e pode ser de forma espontânea ou

provocada.

Anomalias cromossômicas, infecções, choques mecânicos,

fatores emocionais e intoxicação química acidental estão entre as

principais causas de aborto espontâneo, que ocorre em

aproximadamente 25% das gestações e independe da vontade da

gestante. Nesses casos, o aborto pode ocorrer até 20 semanas de

gestação, sendo o sangramento vaginal abundante um forte início

de sua ocorrência. Os abortos provocados consistem na interrupção

da gestação de forma intencional, e apesar de configurar crime,

mais de 50 milhões de mulheres submetem-se a tal ato, em termos

mundiais, por ano.

Sendo caracterizado como crime, o aborto é realizado em

clínicas (se é que podemos chamar de clínicas) ilegais oferecendo

um risco adicional à vida da gestante, que, infelizmente, na maioria

das vezes, acaba tendo sérias complicações relativas ao

procedimento, como infecções e perfurações uterinas, podendo

inclusive levar à morte da mulher.

Saúde Pública com Ênfase em Saúde da Família | Bioética | Aula 6

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Além dessas práticas, sabe-se que muitas mulheres recorrem

ao aborto utilizando-se de métodos “caseiros”, aumentando as

chances de complicações, como hemorragias e infecções. Tais

fatos, tanto em relação ao aborto realizado em clínicas clandestinas

quanto aquele por métodos caseiros, é caracterizado como um

grave problema de saúde pública.

No Brasil, o aborto é considerado crime pelo Código Penal,

independente se o ato é consentido ou não pela gestante. No

entanto, o profissional não será punido se o aborto for realizado

com o consentimento da gestante ou de seu representante legal, no

caso de incapazes, ou de não haver outro meio de salvar a vida da

gestante ou, ainda, quando o aborto é resultado de um estupro.

Entretanto, existe também outra situação em que o aborto pode ser

concedido legalmente: quando o feto possui graves e irreversíveis

anomalias físicas ou mentais, por exemplo, fetos anencéfalos,

desde que haja consentimento do pai e o problema irreversível seja

atestado por pelo menos dois médicos. Questão essa ainda muito

discutida em relação aos seus aspectos sociais, emocionais e

bioéticos.

Discussões sobre a temática do aborto, especialmente sobre

seu caráter bioético ou não bioético, geram muita polêmica devido à

complexidade do assunto. Argumentos como a interrupção da vida

de um inocente frente à irresponsabilidade de sua genitora versus a

integridade do filho, e a integridade da própria gestante diante de

uma maternidade não desejada versus a segurança física e mental

da futura mãe são quesitos sempre discutidos, mas sem um

consenso a respeito.

Saúde Pública com Ênfase em Saúde da Família | Bioética | Aula 6

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Nos últimos anos, agregado a isso, a publicação de artigos

pautados na adequação ética de matar recém-nascidos portadores

de malformação, doenças ou características físicas ou mentais que

possam gerar algum tipo de sofrimento ao próprio bebê e colocando

em risco a harmonia e o bem-estar familiar entra profundamente

nas discussões bioéticas, sendo denominado como aborto

pós-parto.

Esse aborto pós-parto teria sua linha de argumentação

pautada em três pontos básicos:

recém-nascidos e fetos não têm o mesmo estatuto moral das

pessoas reais;

afirmar que ambos, recém-nascidos e fetos, são pessoas

potenciais é moralmente irrelevante;

a adoção nem sempre ocorreria no melhor dos interesses.

Na verdade, essa questão faz um comparativo confuso e

ambíguo com o infanticídio e a eutanásia infantil. Fatos que por si

só já geram enormes discussões no campo da Ciência e da

Bioética.

Enfim, independente da opinião de cada indivíduo sobre o

aborto, o fato é que a educação sexual e a promoção de

atendimento à saúde de forma mais acessível, incluído o

acompanhamento familiar e psicológico, podem realmente ser

capazes de contornar consideravelmente essa questão.

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Para maior reflexão a respeito do tema, leia os textos “Aborto

de fetos anencéfalos”, “Bioética e direitos de personalidade do

nascituro” e “Aborto pós-parto: confusões e ambiguidades”,

respectivamente.

Acesse: http://journal.ufsc.br/index.php/ethic/article/view/19251/

18469

Acesse: http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/iuris/article/

view/11105/9819

Acesse: http://www.bioetica.ufrgs.br/abortopos.htm

Concluindo

A polêmica a respeito de quando adquirimos o título de “seres

humanos” e até quando devemos mantê-lo envolve muito mais do

que princípios religiosos ou morais, pois esbarra também em

questões ética e cientificamente muito complicadas de se

responder.

Por isso, são necessárias mais reflexões e discussões a

respeito dos limites da intervenção do homem sobre a natureza e a

vida humana, englobando, entre outros, os temas da eutanásia e do

aborto.

Saúde Pública com Ênfase em Saúde da Família | Bioética | Aula 6

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Devemos sempre agir eticamente de forma que nossos atos

não comprometam, em hipótese alguma, a natureza humana e o

meio de seu convívio.

Síntese

Para finalizar seus estudos, assista ao vídeo a seguir e

retome os principais assuntos abordados que enfatizam as

questões relativas à Bioética na vida e na morte:

1. Há muitos anos, um barco afundou ao se chocar contra um

iceberg. Um dos botes salva-vidas estava cheio e vazando, e

para reduzir a carga, jogaram 14 homens ao mar. Duas mulheres

que eram irmãs dos homens que foram jogados ao mar também

se atiraram. Os critérios utilizados foram que casais não seriam

separados e todas as mulheres seriam preservadas. Assim,

todos os que ficaram nos botes salvaram-se. O marinheiro foi o

único membro da tripulação processado por homicídio, pois o juiz

disse que seria necessário ter sorteado as pessoas que

deveriam ser salvas.

Saúde Pública com Ênfase em Saúde da Família | Bioética | Aula 6

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Sentença do juiz: “de nenhuma maneira, além desta (sorteio) ou

outra similar, eles teriam direitos iguais em bases iguais, e em

nenhuma outra forma é possível resguardar contra a parcialidade

e opressão, violência e conflito”.

A sentença do juiz foi criticada, baseada no argumento de que

esta situação de crise envolvia uma “aposta” muito alta para ser

simplesmente resolvida com uma “jogada”, e as

responsabilidades eram muito grandes para serem deixadas a

cargo do destino.

Sobre o caso descrito, assinale a alternativa que melhor se

aplica:

a. As duas irmãs que se atiraram ao mar executaram suicídio, de

forma voluntária e racional, e o marinheiro não poderia ter sido

responsabilizado pelas suas mortes.

b. Tratou-se de um caso de eutanásia voluntária, da qual se

causou a morte “apropriada” de pessoas mais fracas,

debilitadas ou em sofrimento, justificada pelos critérios de

escolha das pessoas que foram atiradas ao mar.

c. Ocorreu um caso de eutanásia-homicídio e voluntária por parte

dos 14 homens que foram atirados ao mar.

d. O critério do sorteio das pessoas que seriam lançadas ao mar,

como exposto pelo juiz durante o julgamento do marinheiro,

seria o mais justo, pois não se podia, nesta situação, decidir

pelo fim da vida de um ou outro de forma racional.

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2. Um residente de Ginecologia, que estava de plantão em um

grande hospital privado norte-americano, foi chamado à

meia-noite para atender uma paciente de 20 anos, em estágio

terminal, com câncer de ovário. A paciente não respondeu à

quimioterapia e estava recebendo apenas medidas de suporte,

sendo acompanhada pela mãe quando o médico chegou. Há

dois dias que não conseguia comer ou dormir; estava com 34 kg

de peso corporal e com vômitos frequentes. A paciente disse ao

médico, que não a conhecia até o momento, a seguinte frase:

“terminemos com isto”. O médico foi até a sala de enfermagem e

preparou 20 mg de morfina, voltou ao quarto e disse às duas

mulheres que iria dar uma injeção que possibilitaria à paciente

descansar e dizer adeus. A paciente nada disse, nem a sua mãe,

e em 4 minutos ela morreu. A mãe manteve-se erguida e

pareceu aliviada.

O procedimento efetuado no caso exposto foi:

I. Eutanásia ativa.

II. Eutanásia involuntária.

III. Eutanásia-homicídio.

IV. Eutanásia voluntária.

V. Eutanásia indireta.

Ao analisar os itens acima, qual a alternativa correta?

a. As alternativas I, IV e V estão corretas.

b. As alternativas II, III e V estão corretas.

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c. As alternativas I, III e IV estão corretas.

d. As alternativas I, III, IV e V estão corretas.

Referências

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biomédica. 4. ed. São Paulo: Loyola, 2002.

BUSSINGER, E. C. A.; LELLIS, I. B. R. Aborto: um diálogo entre

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GALVÃO, P. A ética do aborto: perspectivas e argumentos.

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