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II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte Avaliação e Julgamento como ferramenta para seleção produtiva de bovinos de corte William Koury Filho Diretor da BrasilcomZ Zootecnia Tropical www.brasilcomz.com [email protected] Introdução A seleção de zebuínos no Brasil passou por várias fases, inicialmente era baseada em características qualitativas, principalmente relacionadas à caracterização racial e, somente a partir de meados do século XX, é que foram implantados processos seletivos para características de produção, tais como: controle ponderal, controle leiteiro, provas de ganho em peso e testes de progênie. Na última década, muitas raças bovinas de corte, além da Nelore, implementaram programas de melhoramento no Brasil. Esses programas utilizam, principalmente, características de crescimento, tais como: pesos padronizados em diferentes idades, ganhos de peso e dias para atingir determinados pesos. Essas características são de fácil obtenção, e de acordo com a literatura, apresentam variância genética aditiva direta de magnitude média a alta, portanto, respondem bem à seleção, argumentos que justificam a grande aceitação por parte dos produtores. A Figura 1 corresponde a representação simplificada de curvas de crescimento de dois biotipos distintos tardio e precoce. Os pontos A e B sinalizam o início da desaceleração do crescimento e início da deposição de gordura de acabamento. Vale ressaltar que existem indícios que a precocidade em deposição de gordura coincide fisiologicamente com a precocidade sexual nas fêmeas. Figura 1. Representação rudimentar de curvas de crescimento de diferentes biótipos Fonte: www.brasilcomz.com).

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II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

Avaliação e Julgamento como ferramenta para seleção produtiva de bovinos de

corte

William Koury Filho

Diretor da BrasilcomZ – Zootecnia Tropical

www.brasilcomz.com – [email protected]

Introdução

A seleção de zebuínos no Brasil passou por várias fases, inicialmente era

baseada em características qualitativas, principalmente relacionadas à caracterização

racial e, somente a partir de meados do século XX, é que foram implantados processos

seletivos para características de produção, tais como: controle ponderal, controle

leiteiro, provas de ganho em peso e testes de progênie.

Na última década, muitas raças bovinas de corte, além da Nelore,

implementaram programas de melhoramento no Brasil. Esses programas utilizam,

principalmente, características de crescimento, tais como: pesos padronizados em

diferentes idades, ganhos de peso e dias para atingir determinados pesos. Essas

características são de fácil obtenção, e de acordo com a literatura, apresentam variância

genética aditiva direta de magnitude média a alta, portanto, respondem bem à seleção,

argumentos que justificam a grande aceitação por parte dos produtores.

A Figura 1 corresponde a representação simplificada de curvas de crescimento

de dois biotipos distintos – tardio e precoce. Os pontos A e B sinalizam o início da

desaceleração do crescimento e início da deposição de gordura de acabamento. Vale

ressaltar que existem indícios que a precocidade em deposição de gordura coincide

fisiologicamente com a precocidade sexual nas fêmeas.

Figura 1. Representação rudimentar de curvas de crescimento de diferentes biótipos

Fonte: www.brasilcomz.com).

II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

A estrela apresentada na Figura 1 destaca o momento em que as curvas se

cruzam. Exatamente nesse ponto os animais estão com o mesmo peso, e a balança –

simples interpretação do peso – diria que esses indivíduos são iguais, mas na realidade

caracterizam biotipos completamente diferentes. Essa situação pode ocorrer em

pesagens de um programa de melhoramento, provas de ganho em peso e levar a

conclusões e decisões de seleção não necessariamente corretas – a balança mede o peso,

mas é cega.

Figura 2. Animais de biotipo distintos com o mesmo peso no momento da foto. (Fonte:

Agropecuária Jacarezinho).

Na Figura 2 podem ser observadas diferenças morfológicas bastante

significativas entre as duas novilhas, é notório o quanto a rês da esquerda é mais

profunda de costelas, além de apresentar maior volume de massas musculares quando

comparada a rês da direita, que representa o biótipo mais exigente, tardio ou “pernalta”.

Os conceitos apresentados reforçam a necessidade de que seleção em bovinos de

corte não deve ser pensada exclusivamente na balança, mas sim na composição do peso,

que basicamente é o resultado da distribuição/proporção dos tecidos: músculo, osso e

gordura.

Contudo, o maior prejuízo econômico da seleção exclusivamente por peso, deve

ser o comprometimento do desempenho reprodutivo das matrizes, pois a reprodução

tem grande impacto econômico, e só ocorre quando as fêmeas estão em bom estado de

escore corporal, condição necessária para que a vaca crie bem seu produto e volte a

emprenhar – ano a ano (Figura 3). Esse conceito é explicado pela maior exigência de

mantença de vacas muito altas e pesadas, que podem estar em desarmonia com o

sistema de produção em que estão sendo criadas, uma vez que, no Brasil, as terras

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menos férteis ou de fronteiras são aquelas mais utilizadas pela pecuária bovina, em

sistemas de produção preponderantemente à base de pastagens tropicais.

Figura 3. Representação, por analogia, relacionando as canecas com uma matriz e o

preenchimento do líquido pelo sistema de produção de acordo com a ordem de

necessidades/funções fisiológicas da vaca. (Fonte: Adaptado de Hill 1995).

Em trabalho publicado em 1999, Vargas e colaboradores classificaram matrizes

em pequenas, médias e grandes, utilizando o “frame size” baseado na altura de

posterior. Por essa classificação foram observadas diferenças significativas em

desempenho reprodutivo entre os três grupos de diferentes tamanhos, com vantagens

adaptativas, em ambientes a pasto, daquelas matrizes de menor e médio “frame size”.

Trabalhos similares apresentaram resultados parecidos, o que coincide com observações

de campo em zebuínos no Brasil.

Avaliando características distintas, os escores visuais e a ultrassonografia têm

sido ferramentas utilizadas, com eficácia, em programas de melhoramento genético com

o objetivo de selecionar por composição de peso.

Figura 4. Representação das curvas de crescimento de diferentes frames e suas

respectivas composições de peso. (Fonte: Adaptado por Velloso 2011).

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Escores Visuais

Utilizado desde o início do processo de domesticação dos animais, o olho

humano é a mais antiga ferramenta de seleção de bovinos que atende as características

almejadas pelo homem. Nos dias atuais, a avaliação visual empírica continua sendo

utilizada em inúmeras situações, tais como: critério de compra e descarte de animais;

concessão de registros genealógicos por técnicos de associações das mais diversas raças

bovinas; no julgamento comparativo nas pistas de exposições agropecuárias; e também

em acasalamentos dirigidos, em que muitos profissionais analisam o exterior dos

animais em complemento a genealogia, ao desempenho fenotípico e às avaliações

genéticas.

Os exemplos citados ilustram situações em que o homem utiliza a apreciação

visual de maneira empírica, com margem para preferências e interpretações particulares

– embora haja arquétipos preconizados pelas associações de raças.

Outra situação é a aplicação de avaliações visuais em programas de

melhoramento genético para bovinos de corte. Nesse caso, os escores visuais são

coletados por metodologias definidas por conceitos replicáveis, identificando diferenças

morfológicas de maneira menos subjetiva. O método procura minimizar a influência

pessoal do avaliador e, desta forma, gerar dados apropriados para compor o universo de

características analisadas pelas avaliações genéticas.

No Brasil o grande mestre e incentivador do uso de escores visuais em

programas de melhoramento genético foi o Dr. Luiz Alberto Fries. O zootecnista relatou

que a utilização de escores visuais no país coincide com a implantação do PROMEBO

(Programa de Melhoramento de Bovinos) em 1974, que preconizava além das pesagens

em fases estratégicas, a avaliação visual dos animais baseada em duas metodologias:

Escores de Conformação (EC) do U.S.D.A. (Departamento de Agricultura dos Estados

Unidos), BEEF (1974), que utilizava escala absoluta com 17 graus, e cada um deles

subdividido em 3 sub-graus; e o Sistema de Avaliação Ankony (LONG, 1973), também

baseado em referências absolutas, utilizando escores com escala de 1 a 10 para cinco

características: ausência de gordura excessiva (G); musculosidade (M); tamanho do

esqueleto (T); aprumos e estrutura óssea (A) e caracterização racial e sexual (C).

Fries afirmou que o programa funcionou bem nas propriedades que seguiam

seriamente as recomendações do PROMEBO, no entanto a consequência da seleção por

peso aliada a identificação de animais de carcaça mais magra, pela característica G da

metodologia do sistema Ankony, resultou em tipos morfológicos com grande velocidade

de crescimento, porém tardios.

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A solução apontada pelos técnicos foi a seleção visando identificar o outro

extremo da escala para a característica G, então denominada Precocidade de terminação

(P). Desta maneira fora iniciada a atual configuração para a metodologia que avalia

escores de Conformação, Precocidade e Musculatura conhecida por CPM.

No Programa Natura foram realizadas expressivas mudanças conceituais no ano

de 1990. A partir de sugestões dos técnicos de campo a escala foi reduzida para 5

classes de escores, e a avaliação passou a ser relativa ao lote. Escores conceituais e

relativos ao grupo de contemporâneos, com escala de 1 a 5, é a metodologia atualmente

utilizada em zebuínos pela Conexão Delta G, PAINT, Nelore de Produção, Nelore IRCA

e também no PROMEBO com raças britânicas e sintéticas. Na Agropecuária CFM e

Nelore Qualitas a escala também é relativa e varia de 1 a 6.

Geneplus e Nelore Lemgruber avaliam apenas para Conformação Frigorífica –

uma característica traduzida por um índice empírico de musculatura, gordura de

acabamento e peso.

Técnicos da Associação Brasileira de Criadores de Zebu (ABCZ) desenvolveram

metodologias interessantes de avaliação visual de tipo para descrever um animal, as

mais recentes foram o DERAS e o PHRAS, (JOSAHKIAN & MACHADO, 1998). A

avaliação era baseada em referência absoluta, com escala de 1 a 5 em relação ao ideal

da raça. Na prática os resultados apresentavam pouca variabilidade e eram altamente

influenciados pelo sistema de produção e preferências pessoais.

Dr. Fries dizia que sistemas de escores absolutos tendem a constranger os

avaliadores, e resultam em conjunto de dados extremamente concentrados em torno de

um valor considerado como bom, por isso sugeriu sistemas de notas conceituais e

relativas ao grupo de manejo/contemporâneos, procurando conseguir melhores

distribuições dos escores.

Dando sequência ao trabalho de Koury Filho (2001), Koury Filho &

Albuquerque (2002) propuseram a metodologia EPMU(RAS) com base em estudos e/ou

experiência de campo com as metodologias PROBOV, MERCOS, PHRAS, Sistema

Ankony e, principalmente, CPMU.

Existem muitos estudos abordando diferentes metodologias e modelos

estatísticos, com o objetivo de melhorar as estimativas dos parâmetros genéticos. Mais

abundantes são os trabalhos que estimam parâmetros genéticos de características de

relevância em programas de melhoramento. Porém, escassos são os estudos que

analisam a eficiência na coleta dos dados, e a qualidade dos mesmos para a avaliação

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genética, embora seja consenso entre os melhoristas que quanto melhor for a qualidade

dos dados, mais acurados serão os resultados das estimativas dos valores genéticos.

O assunto é ainda mais delicado ao se referir a dados de escores de avaliações

visuais, que não são mensurados por nenhum tipo de máquina, dependendo de

treinamento e aptidão dos técnicos de campo, e também da clara definição da

metodologia.

Após defendida a tese de Koury Filho (2005), a Associação Nacional de

Criadores e Pesquisadores (ANCP), em parceria com a BrasilcomZ®, adotou a coleta

de dados de EPMU pelo padrão de qualidade denominado SAM® - Sistema de

Avaliação Morfológica, que atualmente geram DEPs morfológicas para o programa

Nelore Brasil. Como o Nelore Brasil possui a maior base de dados em zebuínos que

concilia escores visuais e medidas de ultrassonografia, este programa será o estudo de

caso mais utilizado para discorrer sobre o tema proposto.

Características morfológicas avaliadas pelo SAM

Estrutura Corporal (E) – Sinaliza o tamanho do animal, é avaliado pela área

(abrangência visual) do mesmo observado de lado, baseado na altura e comprimento do

esqueleto – considerando as pernas. Indivíduos com DEPs mais elevadas levam à

progênies com maior estrutura corporal. Somente com a utilização em conjunto com as

DEPs de Precocidade e Musculosidade, é que se pode ter uma melhor percepção do

biotipo da progênie.

Precocidade(P) – Avaliada pela relação entre a profundidade de costelas e

comprimento dos membros, considerando ainda a altura da virilha. Animais com DEPs

elevadas favorecem a diminuição do tempo de engorda e melhor adaptação a sistemas

de produção a pasto. A correta visualização da progênie depende da análise conjunta

com as DEPs de Estrutura e Musculosidade.

Musculosidade (M) – Verifica-se distribuição muscular do animal, volume e

comprimento dos músculos. Animais com DEPs mais elevadas são indicados, tendo em

vista a produção de progênies com maior rendimento de carcaça.

As avaliações visuais a desmama são coletadas a partir dos 6 meses (150 dias)

até 9 meses de idade (270 dias), tendo como referência a data base, em torno de 7 meses

(210 dias). O momento próximo a desmama é uma boa oportunidade para avaliar os

bezerros antes que ocorra qualquer seleção – comum em muitos rebanhos.

Ao sobreano as avaliações são coletadas a partir dos 12 meses (365 dias) até 20

meses de idade (610 dias), tendo como referência a data base, em torno de 16 meses. O

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sobreano é uma boa oportunidade para avaliar a adaptação do animal ao sistema de

produção praticado pela expressão das características. As DEPs morfológicas estimadas

atualmente pela ANCP são: Estrutura Corporal ao Sobreano (DES), Precocidade ao

Sobreano (DPS) e Musculosidade ao Sobreano (DMS).

Fenotipicamente são atribuídos escores de 1 a 6, relativos aos grupos de manejo

avaliados, para as características E, P e M. Assim os escores 1 e 2 conceitualmente são

conferidos para os animais que menos expressam a característica (fundo), 3 e 4 para os

intermediários (meio) e 5 e 6 para os indivíduos que mais se destacam (cabeceira).

Figura 5. Representação didática de diferentes biotipos e respectivos escores de EPM,

atribuídos com relação a um grupo de manejo fictício. (Fonte: www.brasilcomz.com).

Interpretação das DEPs para Características Morfológicas pelo ANCP – SAM

As DEPs morfológicas de Estrutura Corporal (tamanho), Precocidade

(comprimento de costelas) e Musculosidade (arqueamento de costelas e evidência de

massas musculares) devem ser interpretadas em conjunto para a visualização do biotipo.

DEPs com valores altos para Estrutura (E) e baixos para Precocidade (P) e

Musculosidade (M) indicam biotipo exigente (tardio) – de tamanho elevado, pouca

profundidade de costelas e pobre de musculatura. DEPs baixas para E e altas para P e

M, indicam progênies compactas, muito profundas e musculosas. Os extremos

apresentados demonstram que com a correta compreensão das DEPs morfológicas, o

criador pode direcionar seu rebanho para o biotipo desejado através de acasalamentos

dirigidos e seleção.

As DEPs morfológicas são expressas em escala de probabilidade. Dessa forma valores

inferiores a 50% são negativos, e superiores a 50% são positivos.

II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

Figura 6. Figura que descreve as características de EPM no reprodutor. Suas respectivas

DEPs morfológicas estimadas é que indicarão a probabilidade que sejam transmitidas

aos seus descendentes. (Fonte: www.brasilcomz.com).

AVALIAÇÕES VISUAIS EM PROGRAMAS DE MELHORAMENTO

GENÉTICO DE ZEBUÍNOS

Avaliações visuais são utilizadas em programas de melhoramento genético, em

bovinos de corte, para selecionar por composição de peso. Por consequência, a

utilização destas tecnologias pode alterar a curva de crescimento com resultados

positivos em ganho nas precocidades de terminação e sexual, o que se traduz numa

pecuária de ciclo mais curto e ganho em eficiência produtiva e ambiental.

Resultados de pesquisa apontam eficácia e viabilidade no uso tanto das

avaliações visuais como ferramenta para discriminar os animais quanto à

composição/qualidade da carcaça (May et al., 2000; Koch et al., 2004).

Outro ponto fundamental para que possam ser utilizadas em programas de

melhoramento é que as características avaliadas apresentam herdabilidades estimadas

em populações zebuínas, de moderadas a altas – portanto respondem bem a seleção

(Koury Filho, 2005; Yooko et al.; 2009, Faria et al., 2009; Koury Filho et al., 2010)

Na Tabela 2 são apresentados parâmetros genéticos estimados em rebanhos da

raça Nelore que evidenciam a resposta a seleção para EPM. Os rebanhos analisados

neste estudo são todos pertencentes ao programa Nelore Brasil (Rancho da Matinha,

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Naviraí Agropecuária, Nelore Colonial, Genética Aditiva, Nelore Sandim e Fazenda

Bacuri).

Tabela 2. Componentes de variância e parâmetros genéticos obtidos em análises uni-

característica de Estrutura Corporal (E), Precocidade (P), Musculosidade (M), Altura de

Posterior (AP) e Peso ao Sobreano (PS) (Koury Filho, 2010).

*2

a = variância genética aditiva; 2

e = variância residual; 2

p = variância fenotípica

** h2 = coeficiente de herdabilidade; e

2 = proporção da variância fenotípica devida aos

efeitos residuais

Na tabela 3 são apresentados resultados do mesmo estudo que permitem

considerações interessantes. A primeira é a alta correlação genética entre precocidade e

musculosidade, o que faz sentido, já que animais com curvas de crescimento para ciclo

curto tendem a expressar a musculosidade em idades mais precoces, pois param de

crescer mais jovens. Outro resultado esperado é o da correlação positiva da altura de

posterior com E, e negativa da altura com P e M, ou seja, selecionar para altura significa

ganho para E, mas também perda em precocidade e musculosidade. Para fechar, E, P e

M possuem correlação positiva com peso, o que permite dizer que é possível selecionar

para biotipo, e continuar a evoluir no peso.

Tabela 3. Estimativas de correlações entre os efeitos genéticos aditivos (acima da

diagonal) e entre efeitos residuais (abaixo da diagonal) entre as características Estrutura

Corporal (E), Precocidade (P), Musculosidade (M), Altura de Posterior (AP) e peso ao

Sobreano (PS), obtidas em análises bi-característica (Koury Filho, 2010).

Característica

E P M AP PS

E - 0,49 ± 0,17 0,63 ± 0,15 0,57 0,83

P 0,43 ± 0,10 - 0,90 ± 0,05 -0,29 0,42

Característica

Componentes de variância* Parâmetros genéticos**

2

a 2

e 2

p h2 e

2

E 0,429 1,385 1,814 0,24 ± 0,09 0,76 ± 0,09

P 1,498 0,888 2,386 0,63 ± 0,12 0,37 ± 0,12

M 0,962 1,048 2,009 0,48 ± 0,11 0,52 ± 0,11

AP 4,968 8,465 13,434 0,37 ± 0,08 0,63 ± 0,08

PS 230,744 554,915 785,659 0,29 ± 0,07 0,71 ± 0,07

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M 0,44 ± 0,08 0,56 ± 0,10 - -0,33 0,50

AP 0,49 0,22 0,30 - -

PS 0,68 0,58 0,62 - -

Interpretações

Embora chamada de Precocidade, a avaliação visual para esta característica não

observa diretamente a espessura de gordura subcutânea, como a medida de

ultrassonografia, o que se avalia é o biotipo. Via de regra, os animais precoces

coincidem com aqueles que apresentam maior profundidade de costelas, virilha baixa e

de porte compacto a mediano – existem exceções. Já aqueles com menos profundidade

de costelas e maior altura correspondem ao outro extremo em biotipo e são

considerados tardios – também chamados de pernaltas.

Na prática os animais que expressam P e M como cabeceira em relação ao lote

avaliado são sadios e bem adaptados ao sistema de produção em que estão sendo

mantidos – avaliação relativa. Essa melhor adaptação ao ambiente deve refletir também

em eficiência da performance reprodutiva – principalmente em relação às fêmeas

(Figura 3).

O proprietário do Rancho da Matinha, que tem a precocidade sexual como um

de seus principais objetivos de seleção, é um adepto da ultrassonografia. O Sr. Luciano

Borges, que somente a dois anos passou a coletar sistematicamente os escores visuais,

relata que mesmo não tendo selecionado diretamente por P e M, aquelas matrizes que

emprenhavam no desafio precoce, e principalmente as que reconcebiam na estação de

monta seguinte apresentavam costelas profundas, eram grossas e de frame moderado, o

que fez com que o rebanho fosse adquirindo consistência para o biotipo mais precoce.

Outro exemplo é o dos programas CEIP (Figura 13) que pela forte pressão de

seleção por fertilidade, associado a um índice de seleção que contempla escores visuais,

vem obtendo resultados muito expressivos para rendimento e acabamento com um perfil

de rebanho diferenciado com relação ao biotipo e mais consistente quando comparado

com a grande variabilidade existente na raça Nelore.

II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

Figura 13. Touros selecionados por índices que contemplam avaliações visuais (Fonte:

Programas CFM e Conexão Delta G.)

Existem ganhos em selecionar para qualidade de carne, mas economicamente a

seleção para composição de peso, em raças zebuínas (“puras”), deve apresentar maior

impacto na adaptabilidade dos animais aos sistemas de produção praticados no país e,

consequentemente, seu reflexo em características reprodutivas e encurtamento do ciclo

de produção.

Muitas características são utilizadas como critério de seleção no país. Como

consultores precisamos definir a estratégia para se atingir um determinado objetivo.

Particularmente, sempre penso em um índice que deve equilibrar características

associadas ao desempenho com outras que segurem o tamanho e desenhem o biotipo

que poderá variar, em específico, em função do sistema de produção e objetivos de

mercado do cliente.

Mesmo em programas de melhoramento bem delineados, a interpretação de

informações genéticas e morfológicas são necessárias para aprimorar a eficiência

produtiva e proporcionar melhores resultados financeiros.

As reflexões apresentadas neste artigo têm um grande componente empírico

baseado em experiência prática de campo. Mais estudos devem ser conduzidos para que

algumas das hipóteses expostas possam ser comprovadas cientificamente.

Referências Bibliográficas

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www.ancp.org.br

BEEF – GUIDELINES. For Uniforme Beef Improvement Programs. Animal & Dairy

Science Departament, The University of Georgia, Athens, GA. 1974.

BrasilcomZ – Zootecnia Tropical. 2012 Site: www.brasilcomz.com

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gado de corte. In: SEMINÁRIO NACIONAL- REVISÃO DE CRITÉRIOS DE

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JOSAHKIAN, L.A.; MACHADO, C.H.C.; KOURY FILHO, W. Programa de

melhoramento genético das raças zebuínas – Manual de Operação. Uberaba, MG:

ABCZ, 2003. 98 p.

II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

KOCH, R. M.; CUNDIFF, L. V.; GREGORY, K. E.; VAN VLECK, L. D. Genetic

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J. Anim. Sci., 82:668-682. 2004.

KOURY FILHO, W. Análise genética de escores de avaliações visuais e suas

respectivas relações com desempenho ponderal na raça Nelore. Pirassununga, 2001. 82

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KOURY FILHO, W.; ALBUQUERQUE, L.G.; Proposta de metodologia para coleta de

dados de escores visuais para programas de melhoramento. In: CONGRESSO

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KOURY FILHO, W. Escores visuais e suas relações com características de crescimento

em bovinos de corte. Jaboticabal: Universidade Estadual Paulista, 2005. 80p. Tese

(Doutorado em Zootecnia) - Universidade Estadual Paulista, 2005.

KOURY FILHO, W.; ALBUQUERQUE, L. G.; ALENCAR, M. M.; FORNI, S.;

CHIQUITELLI NETO, M. Genetic parameter estimates of visual score traits and their

relationship with growing traits in Brazilian Nelore cattle. In: WORLD CONGRESS

ON GENETICS APPLIED TO LIVESTOCK PRODUCTION, 8., 2006, Belo

Horizonte. Proceedings… Belo Horizonte: Instituto Prociência, 2006. 1 CD-ROM.

KOURY FILHO, William ; ALBUQUERQUE, L. G. ; ALENCAR, Mauricio Mello de ;

FORNI, Selma ; SILVA, J. A. I. V. ; LOBO, Raysildo Barbosa . Estimativas de

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38, p. 2362-2367, 2009.

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II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

Para dar sequência sobre ao conteúdo e abordar a temática do julgamentos em

exposições agropecuárias será utilizado um artigo crítico intitulado: "O Brasil é off

road" que fala sobre exposições e pecuária a pasto, publicado em junho de 2011como

matéria de capa de uma revista de circulação nacional sobre agronegócio.

O Brasil é Off Road

Pista de Julgamento e Fórmula 1: uma semelhança questionável.

É freqüente ouvirmos a comparação das pistas de julgamento com a F1. A

analogia, realmente, faz muito sentido, tanto pelo ambiente tecnológico quanto pela

performance dos animais. Contudo, é preciso aprofundarmos nessa reflexão.

Desde jovem, a arte de olhar para o gado de maneira crítica (julgar, classificar,

apartar e selecionar) me fascina. Criado numa família que vive da pecuária, assisti

meu pai freqüentando pistas na década de 1970, e tatersais de leilões desde os

primeiros anos de 1980. Também acompanhei o deslocamento da atividade da família

do Estado de São Paulo para o Mato Grosso do Sul, deixando as pistas e focando na

comercialização de touros. Em meados da década de 1990, subimos no mapa

alcançando o Mato Grosso. Lá, aumentamos o rebanho, e com a implementação de

novas tecnologias em melhoramento genético imprimimos maior pressão de seleção.

Durante 42 anos observei a pecuária bovina do Brasil pela janela de casa,

interagindo com a perspectiva de muitos mestres (com ou sem formação acadêmica).

É por isso que eu sempre destaco a importância da Universidade conciliada à prática

de campo na escola da vida.

Acredito ser muito importante que técnicos, jurados, criadores e associações,

juntos, conduzam discussões sadias em prol do sucesso das criticadas pistas de

julgamento. Na minha opinião as pistas são um momento único de apreciação da

qualidade morfológica detalhada dos animais de uma determinada raça e têm a função

de apontar para modelos morfológicos a serem adotados para desempenhar uma

determinada função na pecuária nacional.

O problema é que a maioria das associações tem se omitido em apontar um

biotipo, e, também em definir prioridades nos critérios de julgamento, jogando toda

essa responsabilidade para os jurados.

Nas pistas o discurso é de equilíbrio entre profundidade de costelas e altura de

membros, de tamanho moderado e de funcionalidade. Mas na prática não é bem

assim.

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Bezerros com muita profundidade de costelas e pouca perna param logo de

crescer e podem não dar o peso adequado de abate, assim como animais adultos com

50% de costelas e 50% de pernas são tardios para qualquer raça bovina. Então o que

é um animal equilibrado?

E aquelas críticas sobre o animal que estava se desenvolvendo bem, mas

parou de crescer? O que se deseja são animais precoces ou tardios? Se precoces,

talvez o bom mesmo é o que para de crescer (ponto B), apresentando uma curva de

crescimento diferenciada, adequada para uma pecuária de ciclo curto.

E sobre o tamanho moderado: será que os animais da raça Nelore que ganham

as atuais pistas são medianos?

Citei como exemplo a raça porque neste mês julguei Brahman e Guzerá ao

lado da pista de Nelore, em Uberaba e em Curvelo, respectivamente, e pude ver o

quanto os animais desta raça estão grandes. É muita perna!

Particularmente hà alguns anos eu considerava que um animal poderia ser até

de porte maior, contanto que tivesse boas proporções em suas medidas. Hoje,

trabalhos científicos demonstram que animais de porte grande são mais exigentes em

ambiente e que a maior necessidade de mantença se reflete no desempenho

reprodutivo quando não se tem aporte nutricional suficiente.

II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

Demonstração de canecas fazendo analogia com a performance reprodutiva de uma

vaca.

Uma das maiores dificuldades que temos num julgamento é não impressionar

com o tamanho dos animais que foram criados num sistema de produção muito

diferente da realidade brasileira. O ideal é premiar aqueles indivíduos que realmente

possam ter bom desempenho a campo, pois a competitividade mundial da nossa

pecuária deve-se, em grande parte, ao capim e seus baixos custos para a produção

de carne e leite. O número de animais terminados em confinamento é crescente, mas

a manutenção das matrizes e a recria dos animais são a pasto.

O ambiente de pasto vem melhorando nos últimos anos, com suplementos e

pastagens melhor manejadas, mas está cada vez mais distante da tecnologia aplicada

nas cocheiras, que utiliza rações que chegam a custar mais de R$100,00 o saco, além

de suplementos requintados, de instalações, tratadores, apresentadores e

casqueadores que podem definir, no detalhe, a performance de um time de ponta.

Pois é, parece mesmo uma equipe de F1, onde embora muito importante, não

basta a habilidade do piloto, também conta o volume de investimento, o combustível, o

pneu ou um detalhe tecnológico que pode definir a equipe campeã naquele ano.

A difícil tarefa do julgamento – Interação Genótipo x Ambiente

Nas exposições, independente das sinalizações anteriores de tabelas de peso

máximo, ou mesmo colocando algumas regras para que seja alcançado um mínimo

em desempenho reprodutivo, os animais de ponta têm que corresponder muito bem

como grandes ganhadores de peso. Situação análoga acontece na F1 onde se busca

velocidade em um circuito que possui muitas curvas, ou seja, não basta maior rapidez

nas retas, é também necessário um carro com estabilidade para obter também melhor

desempenho nas curvas.

No entanto, os autódromos são perfeitos quanto à qualidade do asfalto, com o

mínimo de irregularidades que possam comprometer o desempenho dos carros.

Sendo assim, dá para imaginar um carro de F1 nas rodovias convencionais da Europa

ou dos Estados Unidos? E nas estradas de asfalto mal conservadas da região Centro-

Oeste do Brasil? E na terra?

II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

O fato é que, enquanto o rebanho de quase 200 milhões de animais no Brasil

tem que pegar muita poeira e lama nas estradas de chão (ambiente a pasto), o

preparo para a pista está cada vez mais sofisticado. O resultando é um gado com

performance nos autódromos (cocheira), mas incapaz de obter bom desempenho em

estradas precárias, sob seca ou chuva, onde tem lama, existem buracos, e faz muita

poeira e trepidação nas “costelas de vaca”.

Esse distanciamento pode ser observado no tamanho ou frame size das

matrizes e reprodutores da raça Nelore que geram os atuais campeões. O resultado

dos touros líderes do ranking para esta raça, e seus desempenhos médios em

programas de melhoramento, é uma comprovação técnica. Esses animais vão muito

bem na reta (DEPs de crescimento ou peso), mas quando vão para as curvas (DEPs

de perímetro escrotal e habilidade materna) se complicam. Além disso, se precisarem

ir para estradas esburacadas ou de terra, aí constatamos que de fato tem muita coisa

a se modificar no motor, suspensão, chassi e aerodinâmica, ou seja o desenho e

proporções corporais (DEPs morfológicas e de carcaça) deverá ser muito diferente.

Algumas raças estão com o tamanho e desenho mais distantes do biótipo que

apresenta saúde no campo (proporções corporais – relação entre comprimento,

profundidade de costelas, altura de pernas, arqueamento de costelas, abertura de

peito, perímetro torácico, musculosidade e características sexuais secundárias). Isso

que estamos chamando de “saúde” no campo é adaptabilidade, chamada por alguns

de rusticidade, ou seja, é o que garante a eficiência em reprodução.

Mesmo com toda a dificuldade da interação genótipo-ambiente, que favorece

determinadas linhagens em situações privilegiadas, as associações de raças deveriam

estudar mais o assunto, compor comissões com técnicos e criadores (mercado) e

propor um desenho, uma referência de tamanho. É necessário atentar para as

características indicadoras de fertilidade, para a cria ao pé e quanto a qualidade do

produto deveria influenciar na premiação da matriz.

No encontro de fevereiro passado promovido pela ABCZ, o assunto modelo a

ser adotado veio à tona, mas respostas mais objetivas não surgiram ainda.

Um caso bem atual é o do Gir Leiteiro, que definiu que a função de produzir

leite era o principal atributo a ser ponderado. O mercado respondeu muito bem,

animais que não apresentaram produção de leite perderam valor, independente da

“beleza estética”. Inicialmente, o trabalho passou por cima de detalhes raciais -

embora não abrindo mão do enquadramento racial - mas assumindo que a aptidão de

produção leiteira era o objetivo primordial. Foram realizados estudos morfométricos no

II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

campo e proposto uma referência de modelo de vaca com desenho produtivo,

estrutura forte sem exagero, tamanho moderado, feminina e perfeita no padrão racial.

Seguindo o exemplo do Gir Leiteiro, o momento é muito oportuno para que o

biotipo ideal nas diferentes raças zebuínas seja proposto por dois importantes motivos:

o primeiro é que contamos com programas de melhoramento genético gerando DEPs

e valores moleculares cada vez mais precisos; o outro fator é aproveitar a chegada de

variabilidade genética importada da Índia. No entanto o material genético não deverá

acompanhar o desempenho em ganho de peso dos animais líderes dos atuais

rankings de pista (selecionados para ambiente ultra privilegiado). Mesmo assim os

indianos podem contribuir, além de heterose, para características de adaptação,

fertilidade e raça, já que no pais de origem são duramente colocados a situações de

ambiente restritivo.

Sei que não é fácil propor critérios de julgamento e apontar para uma

referência de animal “ideal” (True Type), e que cada raça tem suas qualidades e

defeitos específicos a serem trabalhadas num espaço de tempo, mas não se pode

negar a distância da genética utilizada nas pistas de hoje, por exemplo na raça Nelore,

com a genética de melhores resultados a campo.

Assim, a tecnologia desenvolvida na F1 (pistas) tem que chegar aos carros de

passeio (campo). Retorno econômico aos patrocinadores, espaço nas mídias e

valorização da marca pagam a conta na F1. Nas raças bovinas, isso se faz com a

venda de touros e sêmen que serão utilizados no universo de 70 milhões de vacas no

Brasil. Estamos lidando com um país onde, sem dúvida, a vocação produtiva é a

pasto, onde o ambiente é totalmente Off Road.

Para fechar o assunto, é oportuno a leitura do artigo "Ranking &

Sumários" que também foi matéria de capa de revista da área publicado

também em 2011e retrata uma situação que continua igual ou, pelo menos,

muito parecida.

Ranking & Sumários

Interpretando DEPs e compreendendo diferenças

A proposta deste artigo é exercitar a compreensão entre o resultado do

ranking de reprodutores da raça Nelore e sua relação com as avaliações

genéticas.

II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

Um dos pontos em comum entre ambos é terem se transformado em

acirradas competições, na busca frenética do Topo, do TOP e do POP.

A escolha pela raça Nelore para esta reflexão não foi por acaso, mas,

sim, por oferecer dois sumários em que os reprodutores, objeto de estudo,

apresentam alta acurácia nas estimativas de suas DEPs.

Na última atualização do colegiado de jurados promovido pela ABCZ, em

fevereiro deste ano, saudáveis colocações foram apresentadas pelos

palestrantes e plenário. Ao chamar a atenção sobre os riscos do gigantismo, o

Dr. Enoch Filho apresentou exemplos do problema em inúmeras raças bovinas

e até em outras espécies animais. Ainda mais preocupantes foram as

colocações do Dr. Antônio Rosa que, com toda sutiliza que lhe é peculiar,

expressou o risco do rebanho chamado de “elite” se descolar da pirâmide que

representa a pecuária de corte no país.

O alerta dos pesquisadores diz respeito a duas situações frequentes na

atividade. Primeiro: técnicos e criadores, nos bastidores, criticam as vacas de

mais de uma tonelada, embora tais matrizes, muitas vezes, sejam progenitoras

de animais que se destacam nas pistas. Segundo: vários profissionais relatam

publicamente que, no momento de acasalar, trabalham com duas linhas bem

distintas, uma para pista e outra para o pasto.

Diante do exposto serão apresentados alguns questionamentos e

esclarecimentos sobre pistas de julgamento e avaliações genéticas.

Conhecendo as DEPs

As DEPs utilizadas neste estudo são informações públicas e podem ser

obtidas nos sites da ANCP e ABCZ. Aqui, em razão de ser mais didático

apresentar como os touros estão perante o programa, a qualidade genética não

está representada por valores das DEPs. Foram utilizados os TOPs, que é o

percentil que o animal ocupa com relação à população base avaliada.

Interpretar o TOP é bem simples: se o animal é 0,1% significa que é

melhor em cada 1000, se é 1%, melhor a cada 100 outros animais

considerados na base do programa, se 10% ainda está na frente de 90% da

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base avaliada. Agora se é de 51 a 100%, significa que está entre os piores para

aquela característica ou índice.

Os valores dos TOPs, que são diretamente associados às DEPs, foram

destacados por diferentes cores, metodologia que facilita a leitura de

qualidades e limitações genéticas de um animal numa rápida batida de olho.

Os TOPs de 0,1 a 1% foram destacados pela cor azul, e significa que

são excepcionais para a característica em questão; de 2 a 10% pelo verde,

significando que são muito bons; de 11 a 29% pelo branco, dizendo que são

bons; de 30 a 50% de amarelo, alertando sobre a característica; e de 51 a

100% pelo vermelho, indicando animal abaixo da média, sendo TOP 100%,

entre os 1% piores. Somente foram consideradas DEPs com acurácia acima de

50%. O alerta fica sobre o cuidado ao interpretar DEPs específicas, pois a

característica em questão pode não ser um problema para raça ou para o

rebanho em particular (Tabelas 1 e 2).

Tabela 2 - ANCP 2011

Nome MGT MP120 DP210 DP450 DPE450

BITELO 10 5 3 10 50

BASCO 40 4 10 15

BIGBEN 10 100 1 2 100

JERU 15 80 2 3 90

HELIACO 0,5 20 0,5 2 10

BVLGARI 10 20 15 100

GUINCHO 40 2 30 100

ENLEVO 10 40 20 25 2

GANDHI 20 40 25 20 20

RANCHI 40 70 15 20 90

FAJARDO 10 15 10 10 70

1646 2 10 10 4 30

EDHANK 80 60 20 30 100

HOCK 50 15 4 100

ATMA 25 100 1 0,5 100

MÉDIAS 24 49 10 12 65

Tabela 1- PMGZ 2010

Nome IQG MP120 DP240 DP420 DPE420

BITELO 0,5 2 1 2 35

BASCO 3 68 1 3 0,1

BIGBEN 2 91 1 1 17

JERU 0,5 52 0,5 0,5 6

HELIACO 0,5 27 1 2 6

BVLGARI 1 29 2 4 22

GUINCHO 0,5 14 2 3 22

ENLEVO 3 29 7 6 0,1

GANDHI 3 15 12 10 6

RANCHI 10 54 5 8 28

FAJARDO 0,5 4 4 3 42

1646 0,1 0,5 3 2 28

EDHANK 9 50 7 8 96

HOCK 5 90 4 4 84

ATMA 3 99 0,5 0,5 78

MÉDIAS 3 42 3 4 31

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A primeira DEP apresentada é a Maternal (MP120), avaliada através do

peso aos 120 dias de idade, onde se estima a produção de leite que deverá ser

transmitida para os descendentes, manifestado no “ambiente materno” das

filhas do touro e refletindo em seus netos. Touros com valores altos nas DEPs

são os mais indicados para produção de fêmeas de reposição boas de leite.

Em média, os líderes de sumário estão amarelos para esta característica, TOP

42% PMGZ e TOP 50% na ANCP.

As DP240 e DP210, analisada pelos pesos padronizados aos 240 e 210

dias, avaliam a capacidade de crescimento dos bezerros. São indicadas DEPs

elevadas, pois não se consegue um “boi”, ou prenhes precoce, sem que se

tenha um bezerro bem desmamado. Nesse quesito, os touros mencionados

estão muito bem. Destacados em verde, são em média TOP 3% e 10%

respectivamente no PMGZ e ANCP.

Para os pesos padronizados aos 420 e 450 dias, que expressam o

potencial de ganho em peso no período pós-desmama, animais com DEPs

elevadas são os mais indicados. Para essas características os reprodutores

citados possuem também média muito boa, 4% PMGZ e 12% ANCP.

O Perímetro Escrotal aos 420 e 450 dias (DPE420 e DPE450), além de

fácil mensuração, possui herdabilidade de média a alta magnitude, e apresenta

associação genética favorável com precocidade sexual e fertilidade. Para esta

característica os líderes do ranking, em média, amarelaram no PMGZ (TOP

31%) e avermelharam na ANCP (TOP 65%).

Os índices genéticos neste estudo são: IQG – PMGZ e MGT – ANCP.

Ambos buscam o melhor balanço entre as DEPs que estimam, mas ainda são

empíricos e definidos sem a realização de estudos específicos para buscar o

retorno econômico (Tabelas 3 e 4).

Tabela 3 - Características e ponderações que compõem o IQG – ABCZ/EMBRAPA

Características Ponderação Peso à fase materna (MP120) 10% Peso a desmama (DP240) 15% Total maternal do peso a desmama 20% Peso ao sobreano (DP420) 15% Ganho de peso pós-desmama 15% Idade ao primeiro parto 15% Intervalo entre 1 e 2º partos 5%

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Perímetro Escrotal ao sobreano (DPE420) 5%

Fonte: www.abcz.org.br

Tabela 4 - Características e ponderações que compõem o MGT - ANCP

Características Ponderações Habilidade Maternal (MP120) 20% Peso aos 365 dias de idade (DP365) 20% Peso aos 450 dias de idade (DP450) 20% Perímetro Escrotal aos 365 dias (DPE365)

10%

Perímetro Escrotal aos 450 dias (DPE450)

10%

Idade ao primeiro parto 15% Período de gestação 5%

Fonte: www.ancp.org.br

Para o IQG, os líderes de sumário são muito bons, em média TOP 3%, e

para MGT bons, TOP 24%. Baseado somente nos índices, a interpretação de

que está tudo bem pode ser equivocada, levando a crer que ranking e

avaliações genéticas estão caminhando harmoniosamente na mesma direção.

As DEPs de pesos para efeito direto evidenciam que esses reprodutores

apresentam grande potencial para crescimento, bem como nos índices,

principalmente o IQG.

Outro ponto que cabe interpretação é a estrutura dos dados que compõe

o arquivo analisado pelos programas, pois o resultado das DEPs pode levar a

interpretações equivocadas de alguns touros, principalmente os de sêmen mais

raros. Tais reprodutores podem ter tido acasalamentos privilegiados, assim

como pré-seleção das progênies informadas para os centros de processamento

das avaliações genéticas.

Composição de Peso

Para melhor interpretação das características genéticas dos touros

líderes de sumário, serão apresentados resultados de outro grupo de DEPs

analisadas pela ANCP (Tabela 5).

Tabela 5

Nome Ed Pd Md Es Ps Ms DAOL DACAB

BITELO 10 100 40 10 100 100 100 100

BASCO 10 70 20 50 80 90 100 90

II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

BIGBEN 30 70 40 40 80 50 1 10

JERU 0,1 50 5 1 100 70 HELIACO 10 50 10 10 80 25 4 100

BVLGARI GUINCHO 10 30 10 15 80 80 70 100

ENLEVO 20 70 60 40 90 100 50 100

GANDHI 90 70 90 40 10 20 70 90

RANCHI 30 25 15 70 40 30 80 100

FAJARDO 10 80 60 20 100 100 10 1

1646 30 20 15 20 40 20 20 100

EDHANK 30 70 20 90 100 100 HOCK

ATMA 3 25 20 10 15 50 80 4

MÉDIAS 22 56 31 32 70 64 53 72

DEPs para características morfológicas (ANCP–SAM®)

Primeiramente, é preciso entender um pouco sobre as DEPs

morfológicas. Os dados de EPM (Estrutura, Precocidade e Musculosidade) à

desmama são ajustados para 210 dias de idade, e os de sobreano para 550

dias. São informações coletadas com o padrão de qualidade ANCP – SAM, que

já analisou mais de 100 mil escores visuais.

1) Estrutura Corporal (E) ao Desmame e Sobreano (Ed e Es) são

DEPs que sinalizam o tamanho. DEPs mais elevadas indicam que o touro

deverá gerar produtos “grandes”, enquanto os valores baixos correspondem às

estimativas de progênies de menores tamanhos.

2) Precocidade (P) são DEPs analisadas pela relação entre a

profundidade de costelas e altura dos membros, considerando ainda a prega

da virilha. Maiores profundidades de costela e virilha mais baixa apontam para

o biotipo que tende a ser mais precoce em acabamento e sexual. Animais com

DEPs mais elevadas são indicados, principalmente, para sistemas de produção

a pasto.

3) Musculosidade (M) são DEPs obtidas por escores baseados na

distribuição, volume e comprimento dos músculos. Animais com DEPs mais

elevadas são indicados, tendo em vista à produção de progênies com maior

rendimento de carcaça.

II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

As DEPs morfológicas devem ser interpretadas em conjunto, com uma

visão simultânea do que se espera na progênie para E (tamanho), P

(comprimento de costelas) e M (arqueamento de costelas e evidência de

massas musculares).

A interpretação do “desenho” das progênies dos reprodutores na

cocheira e no campo pode ser uma grande ferramenta para ajudar o

entendimento do desempenho dos diversos biótipos em diferentes sistemas de

produção.

Os escores de EPM atribuídos ao indivíduo é sempre relativo ao seu

grupo de manejo, onde ele pode se enquadrar como cabeceira, meio ou fundo

para cada uma das características de E, P e M. Assim, animais que não

expressam tamanho recebem notas baixas para E; se não expressam costelas

profundas, notas baixas para P; e caso não expressem arqueamento e

evidência de massas musculares o escore de M será baixo.

Podemos concluir que, em média, as progênies dos touros na fase de

desmama apresentam: tamanho bom Ed 22%, pouca profundidade de costela

e virilha mais alta Pd TOP 56% e Md mediana, TOP 31% e amarelo. Já na fase

de sobreano, em que não dispõem do leite materno, e que já passaram por um

período de seca, os animais demonstram serem menos adaptados ao sistema

de produção ao apresentarem desempenho ainda piores. Para Es são em

média TOP 32%, destacado em amarelo, para Ps 70% em vermelho e para MS

também em vermelho, TOP 64%.

DEPs para características de carcaça

Os dados de ultrassonografia seguem um padrão de qualidade

internacional preconizado pela AVAL, parceira da ANCP.

1) Área de Olho de Lombo (DAOL), obtida em idade de 576 dias. Está

relacionada com o rendimento da carcaça. Animais com DEPs médias a altas

são preferidos. Os líderes do ranking apresentam média TOP 53%, cor

vermelha.

II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

2) Acabamento de Carcaça (DACAB) a DEP do touro a ser preferido

vai depender do sistema de produção. Os touros líderes do ranking apresentam

média TOP 72%, cor vermelha.

Conclusões

A partir da interpretação dos resultados apresentados fica evidente que,

em média, os campeões do ranking são bons para DEPs de crescimento

relacionadas ao tamanho e ao peso, mas deixam a desejar nas avaliações

genéticas que consideram características importantes do ponto de vista de

funcionalidade, adaptabilidade e retorno econômico, tais como nas DEPs

maternais, de perímetro escrotal, morfológicas e de carcaça.

Últimas reflexões

Retornando a colocação feita no simpósio da ABCZ sobre o risco do

gado de “elite” se descolar da pirâmide produtiva, é oportuno lembrar casos de

outras raças bovinas – que enfrentaram esse problema – para que não

aconteça as mesmas conseqüências na raça Nelore.

Quem não se recorda de alguma raça taurina continental, que

impressionava ao apresentar indivíduos enormes e pesadíssimos nas

exposições. Embora fosse um “belo” show, aquele animal grande, musculoso e

bem apresentado não tinha grande função para pecuária brasileira, e se

limitava a atender uma pequena população em volta das pistas de julgamento –

sem potencial de expansão para grandes rebanhos a campo.

Observa-se, atualmente, uma crescente procura e aumento nas médias

de preços dos touros CEIP. Programas como a Conexão Delta G, CFM, PAINT

e Qualitas, mesmo sem registro da associação, apresentam eficiência

produtiva e econômica. Os resultados obtidos por essas empresas estão sendo

clientes satisfeitos e fidelizados.

II SIMBOV – II Simpósio Matogrossense de Bovinocultura de Corte

Muitos rebanhos nelore PO também estão em evidência no mercado,

ofertando reprodutores funcionais e produtivos, porém, diferentes da

genealogia dos animais que ainda estão ganhando nas pistas.

O que faz uma raça forte é a possibilidade de sua genética atingir uma

boa fatia do rebanho comercial, que apresenta uma base de aproximadamente

70 milhões de matrizes – só nelore e aneloradas são cerca de 45 milhões de

vacas. Um bom exemplo, além do nelore funcional, é a raça Angus, que possui

características e funções tão bem fixadas, que conquista cada vez mais um

nicho de mercado exigente por suas qualidades específicas.

Se a genética de pista não gerar reprodutores eficientes no campo, seu

mercado ficará restrito a uma pequena fatia de “colecionadores”,

retroalimentando o universo em torno das competições, mas perdendo a

conexão com aqueles tantos milhões de matrizes citadas anteriormente.

Por isso, criadores e investidores deverão somar forças para que o

rebanho chamado de “elite” esteja coincidente com o rebanho seleção, e não

se desconecte da pirâmide produtiva.

Fontes: www.brasilcomz.com ; www.boicombula.com.br ; www.abcz.org.br e

www.ancp.org.br

Agradecimentos

À Equipe BrasilcomZ, pelas frequentes colaborações;