biologia da-polinizacao

532
André Rodrigo Rech Kayna Agostini Paulo Eugênio Oliveira Isabel Cristina Machado (Organizadores) Biologia da Polinização

Upload: dolossandro-levino-dos-santos

Post on 11-Aug-2015

77 views

Category:

Science


2 download

TRANSCRIPT

  1. 1. Andr Rodrigo Rech Kayna Agostini Paulo Eugnio Oliveira Isabel Cristina Machado (Organizadores) Biologia da Polinizao
  2. 2. Biologia da Polinizao
  3. 3. Biologia da Polinizao 2014 Rio de Janeiro 1 edio Andr Rodrigo Rech Kayna Agostini Paulo Eugnio Oliveira Isabel Cristina Machado (Organizadores) Ilustrao: Raoni Rebouas
  4. 4. Nota dos Organizadores Os organizadores desta obra envidaram os seus melhores esforos para referenciar todas as fontes bibliogrficas e virtuais consultadas, bem como creditar todas as fotografias e ilustraes utilizadas e, colocam-se a disposio para corrigir quaisquer eventualidades em uma prxima edio. BIOLOGIA DA POLINIZAO 1 edio Copyright 2014 dos Organizadores A reproduo desta obra livre e irrestrita, desde que citadas as fontes. Fotos da Capa Ivan e Marlies Sazima Organizadores Andr Rodrigo Rech ([email protected]) Kayna Agostini ([email protected]) Paulo Eugnio Oliveira ([email protected]) Isabel Cristina Machado ([email protected]) Revisores Ceres Belchior Comit Editorial do Ministrio do Meio Ambiente Comit Editorial de Reviso (nominados ao final do livro) Servios Editoriais Editora Projeto Cultural ([email protected]) DADOS INTERNACIONAIS PARA CATALOGAO NA PUBLICAO (CIP) Ficha catalogrfica elaborada pela bibliotecria Lioara Mandoju CRB-7 5331
  5. 5. Seo de Abertura Prefcio .......................................................................................................................................................................................................... 9 Palavra dos organizadores ..................................................................................................................................................................... 11 Mensagens laudatrias ........................................................................................................................................................................... 13 Seo 1. Fundamentos Captulo 1. Biologia da polinizao: uma sntese histrica ............................................................................................................ 27 Andr Rodrigo Rech e Christian Westerkamp Captulo 2. A Flor: aspectos morfofuncionais e evolutivos ............................................................................................................ 45 Simone de Pdua Teixeira, Cristina Ribeiro Marinho e Juliana Villela Paulino Captulo 3. Sistemas reprodutivos ....................................................................................................................................................... 71 Paulo Eugnio Oliveira e Pietro Kiyoshi Maruyama Captulo 4. Reproduo assexuada ...................................................................................................................................................... 93 Ana Paula de Souza Caetano e Priscila Andressa Cortez Captulo 5. Flores no tempo: a florao como uma fase da fenologia reprodutiva ................................................................ 113 Mauricio Fernndez Otrola e Mrcia Alexandra Rocca Seo 2. Recursos e Atrativos Captulo 6. Recursos florais ................................................................................................................................................................. 129 Kayna Agostini, Ariadna Valentina Lopes e Isabel Cristina Machado Captulo 7. Atrativos .............................................................................................................................................................................. 151 Isabela Galarda Varassin e Lercio Peixoto do Amaral-Neto Seo 3. Polinizadores Introduo. Sndromes de polinizao: especializao e generalizao .................................................................................. 171 Andr Rodrigo Rech, Rubem Samuel de Avila Jr. e Clemens Schlindwein Captulo 8. Polinizao abitica ......................................................................................................................................................... 183 Andr Rodrigo Rech, Pedro Joaquim Bergamo e Rodolfo Antnio de Figueiredo Captulo 9. Polinizao por abelhas .................................................................................................................................................. 205 Mardiore Pinheiro, Maria Cristina Gaglianone, Carlos Eduardo Pereira Nunes, Maria Rosngela Sigrist e Isabel Alves dos Santos Captulo 10. Polinizao por lepidopteros ....................................................................................................................................... 235 Reisla Oliveira, Jos Arajo Duarte Junior, Andr Rodrigo Rech e Rubem Samuel de Avila Jr. Captulo 11. Polinizao por besouros ............................................................................................................................................. 259 Hiplito Ferreira Paulino-Neto Sumrio
  6. 6. Captulo 12. Polinizao por dpteros ............................................................................................................................................... 277 Tarcila de Lima Nadia e Isabel Cristina Machado Captulo 13. Polinizao por vespas .................................................................................................................................................. 291 Rodrigo Augusto Santinelo Pereira Captulo 14. Polinizao por vertebrados ........................................................................................................................................ 311 Erich Fischer, Andra Cardoso de Araujo e Fernando Gonalves Captulo 15. Polinizao por engodo ................................................................................................................................................ 327 Fbio Pinheiro Seo 4. Perspectivas Introduo. Fronteiras do conhecimento em ecologia da polinizao: novas ferramentas e perspectivas de abordagens integradoras ...................................................................................................................................................................... 345 Rogrio Gribel Captulo 16. Seleo fenotpica mediada por polinizadores ....................................................................................................... 349 Santiago Benitez-Vieyra, Marcela Mor e Felipe W. Amorim Captulo 17. Interaes planta-polinizador e a estruturao das comunidades .................................................................... 373 Leandro Freitas, Jeferson Vizentin-Bugoni, Marina Wolowski, Jana Magaly Tesserolli de Souza e Isabela Galarda Varassin Captulo 18. Interaes entre plantas e polinizadores sob uma perspectiva filogentica .................................................. 399 Andr Rodrigo Rech, Aline Cristina Martins e Fernanda Baro Leite Captulo 19. Ecologia cognitiva da polinizao .............................................................................................................................. 417 Vincius Brito, Francismeire Telles e Klaus Lunau Captulo 20. Gentica nos estudos com polinizao ..................................................................................................................... 439 Jaqueliny Zocca Canuto, Alessandro Alves-Pereira e Marina Corra Crtes Captulo 21. Economia e polinizao: custos, ameaas e alternativas ...................................................................................... 461 Mrcia Motta Maus Captulo 22. Polinizao e demografia de espcies vegetais ...................................................................................................... 483 Silvana Buzato Captulo 23. Conservao dos polinizadores .................................................................................................................................. 493 Isabel Alves dos Santos, Marcelo Aizen e Cludia Ins da Silva Corpo editorial de reviso .......................................................................................................................................................................... 527 Sumrio
  7. 7. Foto: Thomas Lewinsohn Seo DE ABERTURA
  8. 8. Prefcio A polinizao considerada um servio ecossistmico bsico e que suporta os outros servios ecossistmicos disponibilizados pela natureza, como aumento da produo agrcola, do controle biolgico e da eroso do solo, ciclagem de nutrientes, conservao da vida selvagem etc. Nos ltimos anos, as alteraes antrpicas, ou seja, os impactos causados pelo homem na sua utilizao dos recursos naturais, levaram ao decrscimo de populaes de alguns polinizadores fundamentais para a produo de alimento no mundo. Como consequncia, um alerta geral sobre a importncia do tema surgiu nos cenrios cientfico e econmico. O valor da polinizao na agricultura mundial foi estabelecido em aproximadamente 10% do valor econmico dos produtos agrcolas. O assunto passou a ser abordado em muitos setores e foram feitas projees econmicas de acordo com as externalidades de mercado e as ambientais. O valor da polinizao bitica, entretanto, que compreende a polinizao pelos animais (insetos como abelhas, mariposas, besouros, borboletas; pequenos vertebrados, destacando-se algumas aves e os morcegos), foi estabelecido para as poucas espcies que compem a maior parte da alimentao humana comercializada. Mas a estimativa mais recente de que a polinizao por animais favorece cerca de 87,5% das espcies botnicas conhecidas (308.000 espcies aproximadamente), portanto o seu valor para a manuteno da biodiversidade incalculvel. Neste momento da vida do planeta, as interaes entre plantas e polinizadores e o impacto na biodiversidade so de vital importncia e focalizados, nesta dcada da biodiversidade, como prioridade. No Brasil, os pesquisadores Marlies Sazima e Ivan Sazima estabeleceram um grupo de estudos de polinizao de nossas plantas nativas, na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), na dcada de 1980. Foi um trabalho pioneiro, bem estruturado, de alta qualidade e que trouxe frutos importantes, entre eles a formao de uma gerao bem preparada de bilogos da polinizao, que continuam multiplicando este conhecimento. A atividade acadmica da Dra. Marlies Sazima, que alvo desta homenagem ao completar seus 70 anos, se reflete na produo cientfica e na formao de excelentes pesquisadores, que ocupam posies de destaque em universidades e centros de pesquisa de todo o pas e no exterior. Este livro, cuidadosamente preparado para esta ocasio, o mais importante e atual sobre Biologia da Polinizao publicado no Brasil, em portugus, e est entre os melhores da literatura internacional. Destaca- se a abordagem evolutiva, precisa e ao mesmo tempo simples. Os captulos foram bem elaborados, utilizaram ampla literatura e nos trazem um panorama muito completo sobre o que conhecido atualmente sobre a
  9. 9. polinizao. A leitura muito agradvel e permeada de dados histricos para a construo dos conceitos. As figuras apresentadas so de muita qualidade e ilustram muito bem o texto. Ser certamente um clssico da literatura cientfica brasileira. Um livro com a sntese do conhecimento est entre as mais preciosas homenagens que alunos e colaboradores podem prestar a uma cientista. Ele reflete de maneira clara e objetiva a enorme contribuio acadmica da Dra. Sazima, um exemplo a ser seguido. Sem dvida, a sua utilizao trar um grande avano para o desenvolvimento da rea no Brasil. Conheci Marlies e Ivan quando ainda ramos alunos do curso de Cincias Biolgicas, no Instituto de Biocincias da Universidade de So Paulo (USP). Os estudos sobre polinizao e os lindos slides apresentados por eles, alm da preciso da informao, nos encantavam. Eu trabalhava com as abelhas e eles, com os sistemas de polinizao. Comportamento animal era o nosso interesse comum. Mais tarde, a polinizao e, mais diretamente, focalizar as abelhas como os polinizadores muito importantes para a biodiversidade brasileira fizeram parte da minha rotina de estudos e trabalho. Durante essa longa trajetria, foi sempre um prazer ler os trabalhos publicados, acompanhar a produo dos alunos e compreender a teia da construo do conhecimento, com flores, abelhas e outros animais. Este livro ter um lugar de destaque na nossa biblioteca e no dia a dia de pesquisadora e professora. Fiquei muito sensibilizada com essa importante contribuio e com a possibilidade de externar aqui o meu respeito e a minha considerao por todos os autores e, especialmente, por Marlies Sazima. Vera Lucia Imperatriz-Fonseca (Universidade de So Paulo) Prefcio
  10. 10. O projeto que culminou com a redao desse livro nasceu da preocupao coletiva de dispormos de um material de relevncia acadmica na rea de biologia da polinizao acessvel aos estudantes de todo o Brasil. Iniciamos os trabalhos com conversas isoladas entre estudantes na sala de uma repblica de Baro Geraldo, em Campinas. Aps algumas discusses j era fato que integrvamos um projeto muito maior, sonhado muitas vezes por muitos dos autores. medida que as ideias foram tomando corpo, muitas pessoas comearam a acreditar nessa proposta e, com o passar dos meses e muitos e-mails, logo tnhamos uma equipe de excelncia e entusiasmada agregando a empolgao que nunca tivramos imaginado. Com o apoio de todos ficou claro que estvamos em busca de uma obra que primasse pela qualidade tcnica e que tivesse tambm coerncia conceitual e sntese cientfica. Ao longo de trs anos de trabalho intenso buscamos chegar o mais prximo possvel do almejado. Planejamos escrever um livro dividido em captulos que constitusse ao mesmo tempo uma sntese do que j se sabe sobre os diversos tpicos no Brasil em consonncia com as discusses internacionais dos temas. Primamos por uma abordagem na perspectiva ecolgico-evolutiva em detrimento de estudos de caso especficos. Ao longo de 23 captulos oferecemos uma abordagem introdutria sincronizada com a identificao de lacunas e caminhos para cobri-las. Aps muitas tentativas de organizar os captulos de forma lgica e conectada resolvemos apresentar o livro em quatro sees. Na primeira so tratados a histria, os aspectos morfoanatmicos das estruturas florais, os sistemas sexuais e reprodutivos e a fenologia. Na segunda seo so abordados os temas recursos e atrativos. A terceira parte consta de uma introduo especfica das principais ideias sobre evoluo de sistemas de polinizao, e os captulos seguintes se prestam a apresentar e discutir os grandes grupos de polinizadores conhecidos atualmente. A Seo 4 tambm inicia com uma introduo geral sobre o que consideramos novas abordagens em biologia da polinizao, ao que se seguem os captulos tratando especificamente de cada um desses campos de estudo na rea. Esperamos que este livro-texto possa ser um estmulo s pesquisas em biologia da polinizao no Brasil. Entendemos que, apesar dos muitos esforos de cada autor e revisores, restar o que ser melhorado em verses futuras, no entanto entendemos tambm que a publicao desta obra no significa apenas um avano terico para leitores da lngua portuguesa, mas concretiza igualmente a integrao de um grande grupo de pesquisadores interessados no avano do ensino e da pesquisa no Brasil. Por fim, fazemos deste livro uma singela homenagem Palavra dos organizadores
  11. 11. carreira de ensino e pesquisa dos Professores Marlies e Ivan Sazima, mestres e referncias, que fundaram o campo de pesquisas no Brasil e desde o incio primaram pela qualidade e relevncia de suas investigaes. Mais do que isso, na figura integradora e sempre disposta a acolher da Professora Marlies que esperamos orientar o futuro da biologia da polinizao no Brasil. Andr Rodrigo Rech (Professor Adjunto na Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri) Kayna Agostini (Professora adjunta na Universidade Federal de So Carlos) Paulo Eugnio Oliveira (Professor associado na Universidade Federal de Uberlndia) Isabel Cristina Sobreira Machado (Professora titular na Universidade Federal do Pernambuco) Palavra dos organizadores
  12. 12. O s professores Marlies e Ivan Sazima fundaram, no Brasil, a escola de Biologia da Polinizao, razo pela qual lhes homenageamos com este livro na ocasio do aniversrio de 70 anos da Professora Marlies. Embora o casal represente com propriedade a cincia brasileira de qualidade, seu reconhecimento vai muito alm de nossas fronteiras. Nas pginas a seguir apresentamos os comentrios de lderes mundiais no campo da Biologia da Polinizao acerca do trabalho de Marlies e Ivan Sazima e sobre este livro que lhes dedicado. esquerda, o casal Marlies e Ivan retornando de uma das excurses mensais ao campo em Picinguaba, litoral de So Paulo, e, direita, com os sorrisos que eles deixam na memria de todos aqueles que com eles convivem. Fotos de Lorena Coutinho Neri da Fonseca. Mensagens laudatrias (Traduo por Gleiton Matheus Bonfante) Como um colega, que nutre j h quase trinta anos uma relao acadmica e de amizade com Marlies e Ivan Sazima, uma grande alegria e uma honra poder contribuir com uma pequena introduo para este coerente compndio. O volume traz uma viso sinttica e contempornea dos aspectos atuais de nossa cincia, os quais tambm so de significativa relevncia econmica. Vrios colegas e um conjunto de no menos que cinquenta pesquisadores prepararam (Verso original em alemo) Als einem Kollegen, der Marlies und Ivan Sazima seit beinahe dreiig Jahren in wissenschaftlicher und freundschaftlicher Verbindung steht, ist es fr mich eine Freude und Ehre, diesem ausgewogenen Kompendium das Geleit geben zu drfen. Der Band gibt auf hohen Niveau einen zeitgemen berblick ber alle aktuellen Aspekte unserer Wissenschaft, die auch von erheblicher wirtschaftlicher Bedeutung sind. Kollegen und ein Ensemble von nicht weniger Stefan Vogel, Diviso de Botnica Estrutural e Funcional, Universidade de Viena Austria
  13. 13. esta obra como uma homenagem pela ocasio de sua aposentadoria depois de tantos anos devotados Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) um empreendimento redacional impressionante. O livro um atestado da estima por Marlies Sazima como professora e pesquisadora. H duas dcadas realizando pesquisa de campo engajada na regio Sudeste do Brasil, compreendendo a Serra do Cip, a Serra do Japi e at o Pantanal, ela difundiu, tanto no Brasil como no exterior, mais de trinta publicaes sobre o fenmeno da polinizao. Assim, ela conseguiu reconhecimento e admirao em todo o mundo graas qualidade de suas anlises e ao seu engajamento sem descanso na empresa cientfica. Devido a suas contribuies claras e objetivas, ela vigora como pioneira em seu campo e como fundadora de uma escola exemplar em seu pas. So dignas de destaque as muitas e complicadas expedies noturnas para o estudo e esclarecimento das flores polinizadas por morcegos, as quais, para sua execuo, contaram com a colaborao de estudantes e de seu marido, o zologo Ivan Sazima. O mesmo sucesso obtido como pesquisadora pode ser visto no seu comprometimento com a famlia e com o ensino. Ela tambm colaborou intensivamente com a produo do conhecimento acerca de plantas ornitfilas e da polinizao por insetos no Sudeste do Brasil, levando em considerao aspectos da competio entre agentes polinizadores, compatibilidade e relaes biticas. Ela ajudou na coleo de conhecimentos que servem classificao e definio das peculiaridades ecolgicas dos seres vivos e que em grande medida so relevantes tambm taxonomia. Marlies Sazima no vai cessar sua produo frutfera. De fato, o inventrio cientfico da flora als fnfzig Schlern haben Marlies Sazima dieses Werk als Hommage aus Anlass ihrer Emeritierung an der Universitt von Campinas gewidmet - ein beeindruckendes redaktionelles Unternehmen. Allein dies zeugt von der Wertschtzung von Marlis Sazima als Professorin und Forscherin. Sie hat seit zwei Jahrzehnten, von Jugend auf spontan engagiert, im engeren und weiteren Umkreis des sdlichen Brasiliens, ausgedehnt auf die Serra do Cip, Serra do Japi, und das Pantanal, Feldforschung betrieben und mehr als dreiig, im In- und Ausland erschienenen Publikationen zum Bestubungsgeschehen herausgegeben. Dadurch hat sie Anerkennung und Verehrung in aller Welt dank der Qualitt ihrer Analysen und ihres rastlosen Engagements in unserer Wissenschaft verdient. Sie kann mit ihren klaren und objektiven Beitrgen als Pionierin in diesem Feld und als Begrnderin einer vorbildlichen Schule in ihrem Land gelten. Allein die vielen, nicht unproblematischen nchtlichen Expeditionen zur Aufklrung der Fledermausblumen, die sie zum Teil unter Mitwirkung ihres Mannes, des Zoologen Ivan Sazima, und einigen Studenten durchgefhrt hat, sind hervorzuheben, und das bei aller Beanspruchung durch Familie und Lehre. Sie trug auch intensiv zur Kenntnis ornithophiler Pflanzen und Insektenbestubung in Sd-Brasilien bei; mit Bercksichtigung von Aspekten der Bestuberkonkurrenz, Kompatibilitt, biocnotische Beziehungen u.a. Sie half, Erkenntnisse zu erzielen, die auch zur klaren Bestimmung und Definition der kologischen Eigenschaften der Lebewesen dienen, die in steigendem Mae in die Diagnosen der Taxonomie Eingang finden. Marlis Sazima wird nicht aufhren, ihr fruchtbares Wirken fortzusetzen. Unerschpflich bleibt ja der Mensagens laudatrias
  14. 14. Sou colega e amigo de Marlies e Ivan Sazima desde os idos tempos de mestrado. Como ela fui estagirio e depois orientado do Professor Ailton Joly trabalhando com algas. Passamos muitos momentos de tima convivncia coletando nossos materiais em Ubatuba e escrevendo nossos mestrados. Depois o Dr. Joly convidou-nos para contribuir com a fundao do ento Departamento de Botnica da Unicamp que naquele tempo estava sendo estruturada. Ento viemos eu, Marlies e Ivan ser professores do Instituto de Biologia da Unicamp. Aqui na Unicamp contribumos para a formar e ensinar taxonomia, ecologia e polinizao no Brasil. Marlies foi uma excelente companheira Joo Semir, Instituto de Biologia, Universidade Estadual de Campinas Brasil Regine ClaSSen-Bockhoff, Institut fr Spezielle Botanik, Johannes Gutenberg-Universitt Mainz Alemanha de preparao de aulas e ensino. Aprendemos muito juntos enquanto nos organizvamos para dar nossas aulas. Alm disso, tambm fomos juntos quase todos os meses por um longo tempo para o campo na Serra do Cip. Foram muitas caminhadas, muitas conversas, muitas alegrias... Minha admirao pela Marlies vai muito alm da qualidade incrvel que a marca registrada de seus trabalhos. A Marlies tem alm da competncia, o empenho na qualificao de cada um dos seus alunos, o que os leva a terem um carinho visvel por ela. Enfim, falar da Marlies, falar de uma Amiga, Professora e Orientadora por quem tenho profunda admirao e respeito. (Verso original em ingls) Scientists have friends all over the world. Even if they live far away, they know there is somebody who shares the same interest and enthusiasm on a specific subject. Your field of interest is the interaction of plants and pollinators and your scientific work is now honored with a wonderful book on pollination ecology in Brazil. Without your longtime efforts in research and teaching such a book would be unthinkable. It will affect students, stimulate research projects and provide knowledge (Traduo) Os cientistas possuem amigos em todo o mundo e, mesmo morando longe, sabem que h algum que compartilha o mesmo interesse e entusiasmo sobre um tema especfico. O campo de interesse neste caso a interao das plantas e polinizadores, e o trabalho desses pesquisadores agora homenageado com um livro maravilhoso sobre a ecologia da polinizao no Brasil.Semosseusesforosdelongosanosempesquisa eensino,estelivroseriaimpensvel.Eleinteressaraos alunos,estimularprojetosdepesquisaeproporcionar Mensagens laudatrias brasileiracontinuainesgotvel.Olivroemmosalcana seu objetivo de levantar informaes relevantes para a rea e incita o entusiasmo e a criatividade no amplo campo da biologia da polinizao. wissenschaftliche Fundus der brasilianischen Flora. Der Leitfaden mge sein Ziel erreichen, Information zu liefern und zur Begeisterung und Kreativitt im weiten Feld der Bltenbiologie anzuregen.
  15. 15. (Traduo) O estudo da biologia da polinizao fornece os exemplos mais fascinantes de como detalhes da histria natural so fundamentais para entender a evoluodabiodiversidadeesuamanuteno.Biologia da Polinizao uma reviso abrangente que une estes detalhes com atraentes interpretaes. O volume representa uma homenagem aos Profs. Marlies e Ivan Sazima, um casal entre os mais influentes bilogos especialistas em polinizao tropical e naturalistas perspicazes. Seus estudos detalhados sobre as plantas e os polinizadores brasileiros servem como modelo, inspirao e guia para muitos pesquisadores em todo o mundo. Este livro uma iniciativa que oportunamente, de alguma forma, estende sua herana para as novas geraes de ecologistas de polinizao. (Verso original em ingls) The study of pollination biology provides the most fascinating examples of how natural history details are central to understand the evolution of biodiversity and its maintenance. Biologia da Polinizao is a comprehensive review that bridges these details with insightful interpretations. The volume represents an homage to Prof. Marlies and Ivan Sazima, a couple among the most inuential tropical pollination biologists and two keen naturalists. Their detailed studies with Brazilian plants and pollinators are a model, inspiration and guide for many researchers worldwide. And this textbook is a timely initiative that somehow extends their heritage to new generations of pollination ecologists. (Traduo) Muitos bilogos especialistas em polinizao estavam esperando esta excelente e necessria atualizao do trabalho reunido neste manual por uma escola efervescente de eclogos(as) neotropicais. Mas este trabalho tambm deve ser considerado uma (Verso original em ingls) Many pollination biologists were waiting this excellent and necessary update of the work gathered in this manual by a school of effervescent Neotropical ecologists. But this work must also be considered as a part of the rich legacy that Marlies Pedro Jordano, Estacin Biolgica de Doana Espanha Luis Navarro, Universidade de Vigo Espanha Mensagens laudatrias o conhecimento dos processos evolutivos para os programas de conservao da natureza. Estou muito feliz por poder parabeniz-los pela dedicao e ansiosa por um contato amigavelmente contnuo e uma inspiradora troca de conhecimentos. from evolutionary processes to nature conservation programs. I am very happy to congratulate you on the dedication and I am looking forward to a continuing friendly contact and inspiring exchange of knowledge.
  16. 16. (Traduo) Marlies e Ivan Sazima so certamente dois dos poucos ecologistas de polinizao completos. O mais emocionante de interagir com Marlies que no s o seu enorme conhecimento sobre a polinizao partilhado, mas tambm o seu entusiasmo com o estudo da biologia da polinizao. O livro Biologia da Polinizao apenas uma consequncia disso. (Verso original em ingls) Marlies and Ivan Sazima are certainly two of the few complete pollination ecologists. Most exciting to interact with Marlies is that you do not only share her enormous knowledge about pollination but also her enthusiasm for the study of pollination biology. Biologia da Polinizao is but one consequence. Klaus Lunau, Heinrich-Heine Universitt Dsseldorf Alemanha John N. Thompson, Department of Ecology and Evolutionary Biology, University of California Estados Unidos (Traduo) Os estudos inovadores dos professores Sazima ao longo de muitos anos ajudaram a todos ns, que estudamos interaes entre espcies, a perceber que as formas como as plantas coevoluem com polinizadores e os manipulam so ainda mais diversificadas do que suspeitvamos. (Verso original em ingls) Profs. Sazimas innovative studies over many years have helped all of us who study species interactions to see that the ways in which plants coevolve with pollinators, and manipulate pollinators, are even more diverse than we suspected. Mensagens laudatrias parte do rico legado que Marlies e Ivan Sazima nos trazem. Os diferentes captulos deste livro resgatam a essncia da curiosidade sobre o conhecimento que ambos tm transmitido a inmeras geraes de pesquisadores, principalmente os brasileiros. Sentimo-nos fortemente atrados por suas descries da beleza espetacular deste mundo de interaes entre plantas e polinizadores que nos legaram com a sua grande vocao naturalista. Quando comecei a explorar o universo de interaes, a descoberta de seus trabalhos se tornou diretamente ligada escolha da minha carreira profissional, a qual eu adoro. and Ivan Sazima bring to us. The different chapters of this book recover the essence of curiosity of knowing that both have transmitted to several generations of researchers. Mainly, Brazilians, but also elsewhere, we have felt strongly attracted by their descriptions of the spectacular beauty of this world of interactions between plants and pollinators that have bequeathed with their great naturalist vocation. When I started to explore the universe of interactions, the discovery of their work, had much to do with my choice of my professional career which I adore.
  17. 17. Mensagens laudatrias (Traduo) O livro Biologia da Polinizao, organizado por Andr Rodrigo Rech, Kayna Agostini, Paulo Eugnio Oliveira e Isabel Cristina Machado, representa uma homenagem trajetria dos Profs. Marlies e Ivan Sazima, j que a maioria dos autores se formou com eles. Marlies seguramente sentir-se- feliz vendo como tantos orientados prepararam esta sntese sobre polinizao de 528 pginas, abrangendo, entre tantos outros, aspectos ecolgicos e evolutivos sobre a conservao dos polinizadores. Sua grande dedicao boa cincia, sua generosidade permanente e a infinita pacincia para escutar, conversar e sugerir sutilmente os possveis caminhos acadmicos e na vida que cada um de seus orientados escolheu e seguiu tambm esto implcitas na dedicao com que cada autor estampou seu conhecimento em cada captulo do livro. Trata-se de um livro valioso, principalmente para aqueles que esto iniciando no fascinante mundo da polinizao e ainda no tm conhecimento suficiente em lngua inglesa para apreciar as sutilezas dos conceitos e a amplitude temtica deste belo campo de estudo. Quando evoco Marlies em minha memria, a primeira imagem que aparece o seu lindo sorriso, que transmite sua profunda percepo e grande inteligncia. Marlies um exemplo de vida desenvolvido em um equilbrio entre suas extraordinrias dedicao e paixo para desenvolver conhecimento cientfico de excelncia e a possibilidade de cultivar encantadoras relaes humanas com sua famlia, colegas, orientados e alunos. Sinto-me muito privilegiado de fazer parte da grande famlia de Marlies. (Verso original em espanhol) El libro Biologia da Polinizao organizado por Andr Rodrigo Rech, Kayna Agostini, Isabel Cristina Machado y Paulo Eugnio Oliveira representa un homenaje a la trayectoria de los Profs. Marlies e Ivan Sazima, ya que la mayora de los autores se ha formado con ellos. Marlies seguramente sentir felicidad viendo como tantos orientados pueden construir esta sntesis sobre polinizacin de 528 pginas, cubriendo aspectos ecolgicos, evolutivos, sobre la conservacin de los polinizadores, entre tantos otros. Su gran dedicacin a la buena ciencia, su generosidad permanente e infinita paciencia para escuchar, conversar y sugerir sutilmente los posibles caminos en lo acadmico y en la vida en que cada uno de sus orientados fue eligiendo y recorriendo, tambin subyacen en la dedicacin con que cada autor plasm su conocimiento en cada captulo del libro. Es un libro valioso, principalmente para todos aquellos alumnos que se inician en el fascinante mundo de la polinizacin y aun no tienen el suficiente nivel en lengua inglesa para apreciar las sutilezas de los conceptos y la amplitud temtica de este hermoso campo de estudio. Cuando evoco a Marlies en mi memoria, lo primero que aparece es su imagen con una hermosa sonrisa, la cual transmite su profunda percepcin y gran inteligencia. Marlies es un ejemplo de vida, desarrollada en un equilibrio entre su extraordinaria dedicacin y pasin para desarrollar conocimiento cientfico de excelencia, y la posibilidad de cultivar encantadoras relaciones humanas con su familia, colegas, orientados y alumnos. Me siento muy privilegiado de formar parte de la gran familia de Marlies. Leonardo Galetto, Universidad Nacional de Crdoba Argentina
  18. 18. (Verso original em ingls) The biology of South American plants and their pollinators has proven to be richer and more complex than we could ever have predicted, and Brazilian scientists, as well as those from other countries, continue to make new discoveries that highlight the international importance of these regions. Against this backdrop, the contribution of Marlies and Ivan Sazima to Brazilian science cannot be underestimated, both for the quality of their work and for the inspiration they have provided to younger colleagues. It is a legacy that demonstrates the best of Brazilian ecological research. (Traduo) Marlies e Ivan Sazima tm sido um modelo e uma inspirao para muitos alunos e colegas pelo excelente trabalho no campo da biologia da polinizao. Desejamo-lhes muitos anos bem-sucedidos em seus empreendimentos cientficos. (Traduo) Marlies Sazima provavelmente a pessoa que mais contribuiu individualmente para a nossa compreenso dapolinizaoneotropical,eelatemsidoumainspirao paraosestudantesdehistrianaturalnoBrasileemoutros pases.Emseutrabalho,osSazimamisturaramobservao detalhada com compreenso ecolgica aguada para Jeff Ollerton, University of Northampton Inglaterra Peter e Mary Endress, Institut fr Systematische Botanik, Universitt Zrich Sua Scott Armbruster, University of Portsmouth Reino Unido, e University of Alaska Estados Unidos (Traduo) A biologia de plantas da Amrica do Sul e seus polinizadores tem provado ser mais rica e mais complexa do que poderamos ter previsto e os cientistas brasileiros, assim como os de outros pases, continuam a fazer novas descobertas que destacam a importncia internacional dessas regies. Neste contexto, a contribuio de Marlies e Ivan Sazima para a cincia brasileira no pode ser subestimada, tanto pela qualidade do trabalho quanto pela inspirao que forneceram para os colegas mais jovens. um legado que demonstra o melhor da pesquisa ecolgica brasileira. (Verso original em ingls) Marlies and Ivan Sazima have been a role model and an inspiration for many students and colleagues by their outstanding work in the field of pollination biology. We wish them many more successful years in their scientific endeavours. (Verso original em ingls) Marlies Sazima has probably contributed more to our understanding of neotropical pollination than any other single person, and she has been an inspiration for students of natural history both in Brazil and further afield. In their work, The Sazimas have blended detailed observation with keen Mensagens laudatrias
  19. 19. (Traduo) Em 1976, pouco depois de me tornar chefe do departamento de Biologia Vegetal da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) (naquele tempo chamadodeDepartamentodeMorfologiaeSistemtica Vegetais),fuiabordadoporMarlieseIvanSazima,que perguntaramseeupoderialerumtrabalhoquetinham acabado de finalizar. Eu antecipei que poderia ser uma tarefa rdua, porm mais tarde, naquele mesmo dia, eu encontrei-melendocomcrescenteinteresseumrelato competentemente produzido reportando de forma meticulosa observaes de campo na polinizao de morcegos em Passiflora mucronata. Em contraste com flores com formato de pincel ou de sino dos estudos clssicosdepolinizaocommorcegos,existeaespcie Passiflora,comfloresapenasligeiramentemodificadase cincoestames,masqueabriunoiteeatraiumorcegos. Eu mal percebi, no momento, que esse trabalho seria a minhaintroduoparaumasriemaisoumenoscontnua deestudoscuidadosamentepesquisadossobrebiologia da polinizao que Marlies, Ivan e seus colaboradores produziriam durante quase quatro dcadas. (Verso original em ingls) In 1976, shortly after I had taken over as Head of the department of Plant Biology at Unicamp (at that time the ineptly named Departmento de Morfologia e Sistemtica Vegetais) I was approached by Marlies and Ivan Sazima who asked if I would read through a paper they had just completed. I anticipated that this might be a bit of a chore, but later that day I found myself reading with growing interest a very competently constructed paper reporting meticulously carried out field observations on bat-pollination in Passiflora mucronata. In contrast to the brush or bell-shaped flowers of classic bat-pollination studies, here was Passiflora species with only slightly modified flowers and just five stamens, but which opened at night and attracted bats. Little did I realize at the time that this paper would be my introduction to a more or less continuous series of carefully researched studies in pollination biology that Marlies, Ivan and their collaborators would produce over almost four decades. Mensagens laudatrias Peter Gibbs, Plant Science Laboratories, University of St. Andrews Esccia desvendar algumas das histrias de polinizao mais emocionantesqueconhecemos.,portanto,extremamente apropriado que este importante livro sobre polinizao emecossistemas(principalmente)doBrasilsejadedicado a Marlies e Ivan Sazima. Espero que esta obra inspire a prximageraodebilogosespecialistasempolinizao tropical tanto quanto os Drs. Sazima tm inspirado a gerao anterior. Este trabalho de alta qualidade sobre apolinizaonoBrasilsercadavezmaisimportanteno futuroprximo,vistoqueenfrentamoscrescentesameaas detransformaodapaisagem,perdadebiodiversidade e servios ecossistmicos. ecological understanding to unravel some of the most exciting pollination stories we know of. It is thus tremendously fitting that this important book on pollination in (mostly) Brazilian ecosystems be dedicated to Marlies and Ivan Sazima. I hope this book will inspire the next generation of pollination biologist as much as Drs. Sazimas have inspired the previous. Such high-quality work on pollination in Brazil will be increasingly important in the near future as we face increasing threats of landscape transformation and loss of biodiversity and ecosystem services.
  20. 20. E que srie! A gama de vetores por si s impressionante moscas sirfdeas, besouros, abelhas, pssaros, mariposas falco, gambs, morcegos e lagartos embora, eu tenha detectado certa predileo por Trochilidae. Este trabalho abrange estudos focados em espcies de cerca de 37 famlias de angiospermas. Marlies e seus colaboradores tambm foram pioneiros em vrias vertentes: eles logo perceberam que estudos one off de uma espcie de planta e seus polinizadores tm suas limitaes, por isso iniciaram estudos sobre as comunidades florestais, efeitos de zonao altitudinal, fenologia de florao, redes de polinizadores, eficcia do visitante floral e sistemas de reproduo abrangentes (autoincompatibilidade, distilia, dioicia). Em pouco tempo os estudos foram publicados em revistas internacionais, e alguns adotaram a moda universal americana com ttulos peculiares: Nctar de dia e de noite..., Pica-pau desfruta refrigerantes... e Pequenos drages preferem flores a donzelas... so os meus favoritos. A alta qualidade dos estudos dos Sazima incentivou a colaborao internacional de diversos pesquisadores ao longo dos anos Stefan Vogel, Leonardo Galetto, Andrea Coccuci e Jeff Ollerton so apenas alguns exemplos que me vm mente. Entretanto o mais importante, o cerne da misso acadmica, talvez seja a abordagem de Marlies aos estudos de biologia de polinizao, o que atraiu um grande fluxo de timos ps-graduandos, imbudos da importncia de um trabalho de campo de qualidade e da necessidade de lucidez em documentos escritos, e que posteriormente construram suas prprias carreiras em diversas universidades brasileiras. Tenho tido a sorte de contar com alguns desses produtos da escola dos Sazima e t-los como meus amigos. And what a series! The range of vectors alone is impressive, from syrphid flies, beetles, bees, humming and passerine birds, hawk moths, opossums, bats and lizards although I detect a certain predilection for the Trochilidae. And equally amazing, these papers encompass studies focused on species of some 37 angiosperm families. Marlies et al. were also pioneers in various ways: they soon perceived that one off studies of a flowering plant species and its pollinators have their limitations, and they initiated studies on forest communities, effects of altitudinal zonation, flowering phenology, pollinator networks, floral visitor effectiveness, and embraced breeding systems (self-incompatibility, distyly, dioecy). And very soon the studies were published in international journals, and some adopted the then American but soon to be universal fashion for quirky titles: Nectar by day and by night... and Woody woodpecker enjoys soft drinks... and Little dragons prefer flowers to maidens... are my favourites. The high quality of the Sazimas studies encouraged international collaboration over the years with diverse researchers Stefan Vogel, Leonardo Galetto, Andrea Coccuci, Jeff Ollerton are just a few that come to mind. But perhaps most importantly, because it lies at the heart of the academic quest, Marlies approach to pollination biology studies attracted a stream of first class post-graduate students who were in turn imbued with the importance of good quality fieldwork, and need for lucidity in written papers, and who subsequently forged their own careers in diverse Brazilian Universities. I have been fortunate to count some of these products of the Sazima and Ivan school as friends. Mensagens laudatrias
  21. 21. Mensagens laudatrias Alguns acadmicos se aposentaram e deixaram o mundo acadmico para fazer outras coisas. Outros se aposentaram, mas continuam a fazer pesquisas. EsperamosqueMarliesSazimaescolhaasegundaopo. Some academics retire and leave the University world for other things. Others retire but continue to do research. We must hope that Marlies Sazima will take the latter option.
  22. 22. Biologia da Polinizao Ilustraes: Raoni Rebouas
  23. 23. Seo 1 Fundamentos Foto: Leonardo R Jorge
  24. 24. * Captulo 1 * Biologia da polinizao: uma sntese histrica Andr Rodrigo Rech1 e Christian Westerkamp2 1 Instituto de Biologia, Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Rua Monteiro Lobato, 255 CEP: 13083-970 Campinas- SP Brasil Caixa postal 6190. e-mail: [email protected] 2 Agronomia, Universidade Federal do Cariri Rua Vereador Sebastio Maciel Lopes, s/n Bairro So Jos CEP: 63133-610 Crato-CE Brasil. Nesse captulo tratada a evoluo do conhecimento em biologia da polinizao. Destacamos a relao da humanidade com as flores desde a constituio de grupos tribais at a contemporaneidade. Quanto ao aspecto cientfico apresentamos a histria da biologia da polinizao desde os primeiros registros formais at seu desenvolvimento ao longo do sculo XX. Apresentamos o cenrio europeu com as primeiras investi- gaes e debates tericos, bem como a expanso das pesquisas em biologia da polinizao para alm dessas fronteiras. No Brasil chamamos a ateno para a figura de Fritz Mller, um investigador simples e dedicado, que produziu uma vasta gama de dados e conceitos, utilizados inclusive no suporte teoria da evoluo de Charles Darwin. No mbito mais recente percebe-se um avano contnuo tanto na quantidade quanto na qualidade das pesquisas com a temtica que vem sendo desenvolvida no pas. Acreditamos que a histria da biologia da polinizao, permeada por muitas relaes de amizade e informaes debatidas entre pares com entusiasmo, servir de exemplo orientador do futuro dessas pesquisas no Brasil. No sei ver nada do que vejo; vejo bem apenas o que relembro e tenho inteligncia apenas nas minhas lembranas. (Les Confessions Jean Jacques Rousseau) Ilustrao: Raoni Rebouas
  25. 25. 28 Biologia da polinizao: uma sntese histrica Pinturas nas paredes de cavernas sugerem que as flores encantam os seres humanos desde os tempos pr-his- tricos (Goody 1993). Entre os ndios brasileiros, flores so parte das explicaes acerca do surgimento dos seres humanos na Terra, revelando sua importncia esttica e representativa (Fig. 1.1; Pereira 1985). Mais do que fascinantes, as flores possuem uma funo que vai muito alm do deleite que podem proporcionar aos seres humanos. no mecanismo de polinizao, uma interao ecolgica que conecta mais de um milho de espcies de organismos, garante a perpetuao das angiospermas e fornece boa parte dos itens da dieta humana, que reside a invisvel importncia das flores (Waser & Ollerton 2006). Nesse captulo, apresentaremos parte da histria de como as flores passaram a ser entendidas como a unidade reprodutiva e dos processos que permeiam a polinizao. De maneira geral, a ecologia da polinizao con- tribuiu e continua a contribuir de forma significa- tiva para o entendimento do mecanismo evolutivo e do cenrio natural no qual os organismos esto inseridos (Allan 1977, Willmer 2011). Estudos com cruzamentos de plantas estiveram na base de grandes revolues cientficas e econmicas, como a teoria evolutiva e a revoluo verde. Pensadores como Aristteles, Darwin, Mendel e tantos outros dedi- caram boa parte do seu tempo ao entendimento do processo reprodutivo em plantas e suas descobertas tiveram implicaes em inmeras outras reas do conhecimento. Como registro histrico, os babilnios foram os primeiros a dar importncia a pequenos animais que possivelmente auxiliassem na produo de figos (Goody 1993). No entanto Herdotus, quando viajou ao Oriente, provavelmente foi o primeiro a trazer o reporte de um evento de polinizao em palmeiras. Entre os assrios ele descreveu ter presenciado uma cerimnia religiosa relacionada com o que mais tarde se chamou polinizao. Nessa cerimnia, um homem subia em uma palmeira (provavelmente tamarei- ra) com flores masculinas e trazia as flores para um sacerdote que as colocava em contato com flores femininas e assim abenoava as colheitas da estao com a induo da frutificao (Maheshwari 1950). Atualmente no Oriente Mdio, especialmente no Iraque e nos Emirados rabes Unidos, a poliniza- o das tamareiras feita quase que exclusivamente de forma artificial. Nesses locais possvel cultivar apenas indivduos femininos e adquirir o suplemento de plen necessrio para polinizao diretamente de mercados locais (Iddison 2011). Em um contexto investigativo, provavelmente Aristteles foi o primeiro a mencionar o mecanismo reprodutivo das plantas. No entanto, ao faz-lo, ele no reconheceu a presena de sexos diferentes em plantas (Maheshwari 1950). A maioria dos escritos da biblioteca de Aristteles foi repassada ao seu discpulo Theophrastus, que foi o primeiro a mencionar deta- lhadamente as flores. Em seu livro Investigaes sobre plantas (traduo livre) ele enfocou especialmente a fenologia e alguns aspectos morfolgicos das plantas que ocorriam na Grcia daquele tempo (Capps et al. 1916). Theophrastus abordou tambm a produo de odores em diversas partes das plantas, especialmente nas flores, bem como a diversidade de cores entre flores de ervas e de rvores. Ao descrever a interao entre abelhas melferas e o manjerico, ele recomenda a erva para a produo de mel (Capps et al. 1916). Essa foi, provavelmente, a primeira recomendao prtica decorrente de um estudo de interaes entre plantas e polinizadores. Embora Theophrastus, Herdotus e Plnio tenham mencionado a possvel existncia de sexo em plantas, aps seus escritos o tema permaneceu adormecido por muito tempo. Durante os scu- los XV e XVI a questo de sexo em plantas foi
  26. 26. Andr Rodrigo Rech Christian Westerkamp 29 Figura 1.1 Breve resumo do mito sobre a origem da humanidade na cosmovi- so Irntxe-Manoki (retirado de Pereira 1985). No incio, todos os humanos vi- viam dentro de uma rocha. Um dia um ndio resolveu ver o que havia fora da pedra, ento transformou-se em uma ave (Urubuzinho) e saiu voando por uma abertura no alto da rocha. L fora ele viu animais, mata, campos e o que mais lhe chamou a ateno: as flores. Para demonstrar aos demais a beleza do mundo exterior ele coletou a flor que mais lhe impressionou, a flor da caro- binha (Jacaranda decurrens). Quando retornou para dentro da pedra ele es- condeu o ramo florido embaixo da perna e, embora explodindo de felicidade por dentro, manifestou um rosto triste, pois estava novamente vendo a realidade de dentro da rocha. Explicou ento a to- dos como l fora era lindo e cheio de possibilidades e como dentro era um mundo sem graa. Para dar mostras do que falava, ofereceu aos irmos a flor que trouxera. Todos ficaram empolgados querendo tambm sair dali. Um velho enrugado lhes advertiu que ali dentro havia paz, sade e no se corriam riscos, enquanto l fora tudo era incerto e havia muita guerra. Os animais que de fora ouviram o desejo dos ndios de sair da pedra, resolveram ajudar. A paca, a cutia e a lavadeira tentaram roer a pedra, mas no conseguiram. Veio ento o pica-pau- de-cabea-vermelha e com seu bico forte abriu uma fenda na pedra. Comearam ento a sair os povos indgenas e no in- dgenas, cada um abrigando-se embaixo de uma rvore especfica. Ilustrao de Raoni Rebouas.
  27. 27. 30 Biologia da polinizao: uma sntese histrica novamente negada e at considerada um assunto obsceno (Maheshwari 1950). Nesse perodo, estames foram considerados rgos secretores. Foi apenas aps o invento do microscpio que Grew (1682), no livro Anatomia de plantas, retomou a descrio de estames como rgos masculinos das flores. Porm, apesar do avano quanto ao estame, o gro de plen continuava sendo considerado portador do eflvio vivificador, que, ao repousar sobre o estigma, induzia o ovrio a converter-se em fruto (Maheshwari 1950). A primeira abordagem experimental da poliniza- o veio com Rudolph Jakob Camerarius, quando ele se tornou diretor do Jardim Botnico de Tbingen, em 1687 (Maheshwari 1950). Camerarius observou que amoreiras (Morus) femininas, quando cresciam afastadas de indivduos com flores masculinas, for- mavam apenas frutos com sementes abortivas. Com base nessa observao, ele cultivou alguns indivduos de flores pistiladas de Mercurialis annua, outra es- pcie dioica, em potes completamente isolados de indivduos de flores estaminadas, obtendo apenas frutos estreis. Os mesmos resultados foram obtidos ento com plantas hermafroditas de Ricinus communis (mamona) e de Zea mays (milho). Como concluso ele afirmou: No reino vegetal, a produo de sementes, que so o mais perfeito presente da natureza e o meio geral de manter as espcies, no acontece a menos que as anteras preparem, previamente, a planta jovem contida no ovrio. Essas observaes esto contidas na epstola: De sexu plantarum (Camerarius 1694), que configura o primeiro tratado experimental na histria da ecologia da polinizao. Embora Camerarius tenha apresentado dados consistentes, suas concluses no foram unanime- mente aceitas. Johann Jakob Dillenius, ao descrever a cleistogamia (polinizao no interior de flores que no se abrem) em 1732, utilizou-a como um argumento a favor da inexistncia de sexo em plantas. Os estudos reafirmando as concluses de Camerarius continua- ram sessenta e cinco anos depois, com Joseph Gottlieb Klreuter. O cenrio em que viveu Klreuter foi o do sculo XVIII, no qual destacou-se a taxonomia alavancada por Linnaeus. Alm de demonstrar a exis- tncia de sexos em plantas, Klreuter buscou provar a epignese (desenvolvimento de estruturas morfolgicas apenas aps a fecundao) em seus primeiros traba- lhos (Mayr 1986). Depois de seis anos trabalhando em So Petersburgo, na Rssia, Klreuter retornou Alemanha, onde foi diretor do Jardim Botnico de Baden. Na posio de diretor ele enfrentou conflitos com o chefe dos jardineiros; sem acesso ao jardim botnico, ele transferiu os experimentos para o jardim de sua casa, o que se encerrou aps casar-se e mudar-se para uma casa sem jardim (Mayr 1986). Uma das marcas da obra de Klreuter foi a falta de hierarquizao da importncia de suas descobertas, o que tornou sua obra prolixa. Prova de sua minucio- sidade pode ser vista no teste da hiptese acerca da necessidade de fermentao do nctar para a forma- o de mel. Para isso ele coletou nctar de milhares de flores de laranjeira e as colocou para desidratar, verificando que no era necessria a fermentao. No entanto, para ampliar o poder da concluso, testou o mesmo experimento para outras 10 espcies (Mayr 1986). Testando a polinizao de uma espcie de Hibiscus, ele descobriu que algo como cinquenta a sessenta gros de plen eram suficientes para po- linizao. Mais do que sessenta no aumentava o nmero de sementes, porm menos de cinquenta o diminua progressivamente. Como uma flor produz muito mais gros de plen do que vulos, nascia a a ideia de competio sexual em plantas, a qual foi formalizada apenas no sculo XX. Klreuter tambm se interessou pela hibridao, processo que igualmente despertou a ateno de Linnaeus. No entanto, muito do que foi classificado
  28. 28. Andr Rodrigo Rech Christian Westerkamp 31 como hbrido mostrou-se mais tarde ser espcie. Linnaeus ficou to convencido da importncia da hibridao na diversificao das angiospermas, que reformulou sua hiptese sobre a criao das espcies, tentando torna-l mais natural, mais conectada ao que ele via acontecer na natureza. Para ele, Deus teria, agora na nova verso, criado apenas a cate- goria taxonmica classe, e todas as infracategorias teriam surgido por hibridao. Klreuter discordou de Linnaeus por razes filosficas e religiosas. Como essencialista, Klreuter acreditava que o gro de plen continha a essncia masculina e a superfcie do estigma, o fluido feminino. Para testar isso, ele removeu a umidade do estigma de uma espcie e transferiu o lquido de outra espcie. Em seguida ele polinizou o tal estigma e constatou que, prova- velmente, o lquido retirado era incuo. Embora sua hiptese no tenha sido corroborada, ele permaneceu com ela e deixou o mecanismo aguardando por novos resultados (Mayr 1986). Uma teoria anteriormente proposta por Theophrastus e Caesalpino afirmava que, na fe- cundao, a me prov a medula e o pai, o crtex. Klreuter, cruzando hbridos nos dois sentidos (ambos sendo pais e mes), revelou que ambos contribuem da mesma forma; para ele isso era uma evidncia de que as essncias se misturavam completamente (Mayr 1986). Com os resultados ele concluiu que era possvel transformar uma espcie em outra, o que consonava com as ideias da alquimia de trans- formao de metais em ouro, um forte paradigma da poca. O trabalho de Klreuter influenciou tambm os botnicos Michel Adanson, Grtner (pai e filho) e, especialmente, Darwin com a teoria evolutiva. No livro The variation of animals and plants under domestication, Darwin citou Klreuter 32 vezes. Talvez o maior mrito da obra de Klreuter tenha sido sua influncia nas pesquisas de seu contemporneo Christian Konrad Sprengel. Na obra chamada Das entdeckte Geheimniss der Natur im Bau und der Befruchtung der Blumen, que literalmente sig- nifica: O mistrio descoberto da natureza na construo e polinizao das flores, Sprengel fez aluso forma como Klreuter se referia polinizao por insetos, revelando a conexo terica entre ambos. Na obra de Sprengel, percebe-se a extrema modernidade com que lidou com polinizao h mais de duzentos anos. Guias e contineres de nctar, dicogamia (tambm tratada por Klreuter), hercogamia, polinizao por vibrao, flores que enganam e cognio em insetos polinizadores foram temas que perpassaram a sua obra e o evidenciaram como um cientista frente de sua poca (Vogel 1996). No incio, a obra de Sprengel tambm foi te- leolgica, marca do paradigma vigente na poca e da sua formao familiar religiosa (Zepernick & Meretz 2001). Uma de suas primeiras indagaes no primeiro captulo de seu livro diz: Continuo sem entender por que a natureza sempre tem apenas suas principais propostas em mente... deixando cada flor existir meramente pelo tempo necessrio para a fertilizao... to logo o carpelo fertilizado todos os ornamentos florais so lanados fora... porque agora eles no tero mais serventia (Sprengel 1793). No possvel ler a obra de Sprengel sem situ-la na sua histria de vida. Sprengel estudou teologia e filosofia e apenas interessou-se por botnica aps seu mdico, reconhecendo que ele era hipocondraco, recomendar-lhe como tratamento que evitasse am- bientes fechados (Zepernick & Meretz 2001, Vogel 1996). Sprengel acabou dedicando mais tempo botnica do que sala de aula, o que lhe trouxe problemas com pais e diretores do colgio onde tra- balhava. Para Wichler (1936), Sprengel jamais teria feito o trabalho que fez se tivesse estudado botnica na academia alem da poca. Como autodidata e
  29. 29. 32 Biologia da polinizao: uma sntese histrica com alto nvel educacional, estava em uma posio na qual podia pensar livre e intuitivamente. Como seu trabalho foi feito com nada mais do que uma lupa de bolso em ambientes naturais, ele nunca dependeu de financiamentos para suas pesquisas. Pesquisas ao ar livre eram algo inovador para a poca e Sprengel disse que tentava capturar a natureza em ao (Vogel 1996). Essas marcas do trabalho de Sprengel fazem um alerta no contexto atual de pesquisas, no qual, dadas as presses intitucionais, muitos pesquisadores tm preferido a produtividade em detrimento da criatividade, ousadia e profundidade dos trabalhos. No fim de sua vida, devido sua baixssima aceitao no contexto cientfico, Sprengel voltou-se novamente para a filosofia, que era a sua formao, e abandonou completamente a botnica. A princi- pal razo de sua baixa repercusso na poca era o paradigma de que as plantas no devessem evitar a autopolinizao. Uma de suas frases a natureza parece no permitir que flor alguma seja fertilizada pelo seu prprio plen (traduo livre de Sprengel 1793, p. 34) soava extremamente inadequada. Uma vez que flores, assim como toda a natureza, teriam sido criadas em perfeita harmonia, interpret-las com uma viso materialista com finalidade em si mesmas era realmente ousado. Sprengel ainda menciona in- setos tolos sendo enganados, pilhagem de recursos e ideias que sugeriam certa desordem no sistema, o que era amplamente controverso para a poca. Sprengel definiu a si mesmo como um filsofo botnico, sendo o primeiro a pensar em ecologia fun- cional na polinizao (Vogel 1996). No entanto ele nunca conseguiu se desvencilhar completamente de suas convices religiosas. Percebe-se, na descrio das estruturas e dos ajustes morfolgicos com polinizado- res, a nfase na expedincia. Na perspectiva filosfica de Toms de Aquino e Spinoza, a expedincia era a demonstrao clara da existncia de um deus criador. A controversa influncia do pensamento criacionista o impediram, por exemplo, de entender flores que no produzem nctar mas oferecem apenas plen como recurso; nesse caso ele no conseguia entender a coexistncia da criao perfeita e o fato de uma mesma estrutura (plen) servir para duas funes distintas (Vogel 1996). medida que os trabalhos de Sprengel e Klreuter evidenciaram a importncia do gro de plen, comeou-se a perguntar qual era exatamen- te sua relao com o vulo. Aparece a a figura do matemtico e astrnomo Giovanni Battista Amici, que, observando a superfcie estigmtica de Portulaca oleracea, acidentalmente viu um gro de plen ini- ciando a germinao. Ao observar uma estrutura em crescimento, ele permaneceu trs horas ininterruptas ao microscpio para descrever o que estava aconte- cendo. Foi assim que ele viu tambm o deslocamento de grnulos (ncleos celulares), ento se distraiu e perdeu as estruturas de vista. Na sequncia ele iniciou uma srie de estudos com tubos polnicos que lhe renderam a admisso na Academia de Cincias de Paris. Embora tenha feito estudos promissores, Amici encontrou forte oposio s suas ideias no grupo li- derado por Matthias Jakob Schleiden, que retomou o debate acerca da inexistncia de sexos em plantas com base tambm em estudos com tubo polnico (Maheshwari 1950). Em uma reunio na Itlia, Amici tentou provar que o embrio no vinha do gro de plen, mas do vulo. Essa discusso seguiu com os debatedo- res de nimos exaltados at que, em 1847, Amici produziu evidncias mais convincentes estudando Orchis. A proposta de Amici foi apoiada por Wilhelm Hofmeister (1849) a partir de observaes em outras 38 espcies, mostrando que a clula que d origem ao embrio materna. Embora houvesse evidncias con- trrias, o grupo de pesquisa de Schleiden continuou
  30. 30. Andr Rodrigo Rech Christian Westerkamp 33 insistindo nas suas ideias sobre fecundao, recebendo inclusive um prmio da Universidade de Amsterd (The Imperial Institute of the Netherlands). Para finalizar o debate, Radlkofer (1856) escreveu uma monografia apoiando Hofmeister e, a partir da, Schleiden, entendendo a situao como uma derro- ta, mudou-se para Dresden, abandonou a pesquisa e passou a ensinar histria e filosofia (Maheshwari 1950). Percebe-se desse captulo da histria que o progresso cientfico bastante destoante de uma perspectiva linear e neutra, como acreditam alguns pesquisadores ingnuos. Boa parte dos paradigmas somente so superados com a substituio daqueles que os pensaram. A embriologia vegetal de maneira geral avanou muito na segunda metade do sculo XIX. Strasburger (1877) confirmou a presena de dois ncleos no gro de plen de angiospermas. Em 1875, o zologo Oscar Hertwig definiu pela primeira vez a fertilizao (unio dos ncleos das clulas masculina e feminina). Aps quase vinte anos, a dupla fecundao em plantas foi descrita por Nawaschin (1898) e por Guignard (1899). Antes disso, Mottier (1897) j tinha obser- vado o segundo ncleo masculino prximo aos dois ncleos polares do vulo, no entanto interpretou como acidente o que poderia ter sido a descrio da fuso tripla. Mais interessante ainda foi quando Finn (1940), reanalisando lminas do pesquisador W. Arnoldi preparadas muito antes de 1898, iden- tificou claramente a fuso tripla, o que, no entanto, passou despercebido para Arnoldi (Maheshwari 1950). Esse ltimo fenmeno demonstra que descobertas no carecem apenas de serem observadas, mas tambm de conhecimentos prvios e de um arcabouo terico que permita sua interpretao. Nas palavras da professora de cincias Anne Martins, que despertou cedo na vida do primeiro autor desse texto o interesse pelo estudo da vida, no basta ver, preciso enxergar.... No campo da ecologia da polinizao propria- mente dita, aps os trabalhos de Klreuter e Sprengel, o conhecimento avanou lentamente, revelando a no linearidade do progresso cientfico. Apenas se- tenta anos mais tarde seus trabalhos foram redes- cobertos e amplamente promovidos por Charles Darwin. Alm de Darwin, nessa fase destacaram- se tambm os nomes de Hermann Mller, Severin Axell e Friedrich Hildebrandt, na Europa, Asa Gray e Charles Robertson, na Amrica do Norte, e Fritz Mller no Brasil. Das 7.700 pginas publicadas por Darwin, 1.100 trataram de biologia floral (Schneckenburger 2009). O livro sobre orqudeas (Darwin 1862) foi o primeiro do autor a tratar de flores e desencadeou uma avalan- che de trabalhos nesta rea quando se avalia a lista de referncias contidas na traduo do livro de Hermann Mller (1883; ver tabela em Schneckenburger 2009). Um caso muito divulgado deste livro o da flor de Angraecum, cujo polinizador foi sugerido por Darwin, embasado no comprimento do esporo floral, e descoberto apenas 21 anos depois (e fotografado visitando a flor muito mais tarde, Wasserthal 1997). No entanto, mesmo antes da descoberta e do registro fotogrfico do polinizador de Angraecum, Fritz Mller j havia encontrado uma mariposa sul-americana com lngua to longa que demonstrava a existncia de bichos semelhantes quele previsto por Darwin (Mller 1873a, b). O livro The different forms of flowers on plants of the same species foi o primeiro de Darwin a abordar os polimorfismos e a evoluo da dioicia em plantas (Darwin C. 1877). Foi em 1842, devido a problemas de sade, que Darwin e a famlia se mudaram para Down, em Kent (hoje um subrbio de Londres). Com mais espao e mais reas abertas, Darwin comeou ento a estudar plantas. Os estudos com plantas assumiram tamanhas propores que, mais tarde,
  31. 31. 34 Biologia da polinizao: uma sntese histrica ele despendia mais tempo s plantas do que a outros organismos (Allan 1977). Embora usando plantas para responder a numerosas perguntas, Darwin nunca se considerou um botnico. No livro citado anteriormente, Darwin escre- veu: infinita diversidade de estruturas... para atingir exatamente o mesmo fim, a saber, a fertilizao de uma flor pelo plen de outra planta (Darwin 1877, p. 284). Esse trabalho marca o incio do seu interes- se em cruzamento de flores. Seguindo o texto, ele prope o grmen do que veio depois a ser a hiptese de segurana reprodutiva, explicando a evoluo da autocompatibilidade em Ophrys apifera dentro de um grupo de espcies autoincompatveis. Darwin usou redes para excluir os visitantes florais em cinquenta e sete espcies de cinquenta e dois gneros e depois considerou o desempenho da prognie, concluindo que a autopolinizao produzia uma prole de menor vigor. No entanto ele mesmo reconheceu um vis em seus experimentos: foi um grande lapso do meu tra- balho o fato de no ter experimentado naquelas flores em que era difcil faz-lo (Darwin 1876, p. 387). Como estava interessado em polinizao cruzada, ele excluiu o grupo que lhe daria a melhor resposta, que seriam as plantas completamente autocompatveis. Entre os fatores que pesaram na escolha das plantas erradas estava o fato de terem corolas grandes e fceis de manipular, um problema que, segundo Barrett (2010), perdura pelas geraes de pesquisa- dores subsequentes. Como demonstrao da ateno que dedicou s plantas, a seguinte frase de Darwin parece bastante conclusiva: Eu no acredito que algo em minha vida cientfica tenha me dado mais satisfao do que entender o significado das estruturas das flores heterostlicas (Barlow 1958, p. 134). Um problema que deixou Darwin intrigado por muito tempo foi a heteranteria (diferentes tipos de anteras em uma mesma flor). Esse fenmeno ocorre em mais de 20 famlias e Darwin o estudou por mais de 20 anos. Em uma carta para Asa Gray ele escreveu: Eu estou agora tentando um experimento com Melastomataceae; eu suspeito muito de que os dois conjuntos de anteras possuem diferentes fun- es (Darwin 1887). No mesmo ano, dessa vez para Hooker, ele escreveu: com relao aos dois tipos de anteras... Estou muito decepcionado, gastei um tempo e um trabalho enorme com elas e no consi- go vislumbrar o significado dessas partes (Darwin 1887). Foram os irmos Fritz e Hermann Mller que esclareceram o assunto (Mller 1881a, 1881b, 1882, Mller 1883). Baseando-se em muitas observaes no Brasil, feitas por Fritz, eles falaram em anteras de alimentao e de polinizao como uma diviso de trabalho na flor. Vallejo-Marin et al. (2009) usaram um experimento simples, colando os poros dos dois tipos de anteras, e confirmaram a hiptese dos ir- mos Mller. Esse exemplo mostra como problemas antigos muitas vezes carecem apenas de criatividade para serem solucionados. medida que a teoria evolutiva de Darwin come- ou a ser divulgada e aceita, outros pesquisadores co- mearam a considerar sua utilizao na interpretao de seus resultados. Um deles foi Frederico Delpino, que, embora se autodenominando evolucionista, integrou suas explicaes com a participao da in- teligncia psicovitalstica. Ao mesmo tempo em que tentava usar os princpios da teoria de Darwin, Delpino permanecia com uma teleologia equivalente de Sprengel (Aliotta & Alliota 2004). Delpino refinou a classificao ecolgica de Sprengel e criou termos como ornitofilia, melitofilia e assim por diante. Delpino e Hermann Mller trabalharam basicamente com o mesmo objeto de estudo, mas divergiram na abordagem, o primeiro mais interessado em padres e o segundo mais interessado em autoecologia. Essa
  32. 32. Andr Rodrigo Rech Christian Westerkamp 35 divergncia suscitou boa parte das crticas de Mller s concluses de Delpino (ver introduo da Seo 3 deste livro). Delpino dividiu com Sprengel tambm o fato de ser professor e a recomendao de trabalhar em ambientes abertos como o jardim em decorrncia de problemas de sade (Mancuso 2010). Ele planejou uma viagem de estudos ao redor do mundo, mas por falta de recursos financeiros a viagem foi interrompida antes do final planejado; no entanto ele esteve no Brasil e realizou coletas no Rio de Janeiro. Em seus estudos com asclpias e orqudeas, apoiou Thomas Andrew Knight e Charles Darwin, reafirmando que nenhuma espcie deveria ser autopolinizada indefi- nidamente. A esse princpio Darwin chamou Lei de Knight (Faegri & Pijl 1979). Alm disso, ele tambm mostrou claramente que o hermafroditismo no im- plicava necessariamente autopolinizao (Aliotta & Aliotta 2004). Em sua primeira classificao das plantas con- forme o modo reprodutivo, Delpino as separou em anemfilas e zofilas. Mais tarde refinou a segun- da categoria em subcategorias, como: entomfilas, ornitfilas e malacfilas, entre outras. Alm disso, tambm ofereceu explicao para a existncia de cores em flores e as classificou em: ordinrias, brilhantes, metlicas e pretas (Aliotta & Aliotta 2004). Props ainda uma hierarquia de percepo das cores basean- do-se no contraste com um plano de fundo verde na seguinte ordem: branco, amarelo, vermelho, vermelho vibrante, prpura e azul, bem como inferiu que a mudana de cores de acordo com a idade das flores teria importncia na sinalizao aos polinizadores (Aliotta & Aliotta 2004). Com relao aos odores, Delpino classificou 45 tipos e abordou inclusive uma possvel funo re- pelente, o que o contextualiza em uma discusso extremamente atual sobre a funo de odores florais (Junker & Blthgen 2010). Para os atrativos criou onze categorias, destacando nctar e plen, os quais, neste livro, so tratados como recursos (Captulo 6). Alm disso, props a criao das reas de pesquisa de biologia vegetal, dedicada a estudar a questo funcio- nal e a biologia floral, que seria dedicada apenas s flores. Ele defendia que a morfologia nunca deveria ser estudada sem uma abordagem funcional. Nas suas palavras: sem o suporte da biologia, o que a morfo- logia seno a mera e estril contemplao de formas e metamorfoses... (Delpino apud Mancuso 2010). Contempornea a Delpino e Darwin, por uma feliz coincidncia no Brasil, se fez a trajetria de Fritz Mller, que estudou um grande leque de interaes entre organismos (Westerkamp 2013, Westerkamp et al. 2013). Em comparao com o seu irmo, ele fez uma contribuio modesta na rea de ecologia da po- linizao, no entanto estimulou muitas pesquisas com as suas primeiras observaes do uso, por exemplo, da coleta de nctar em membracdeos por abelhas; de abelhas que pilham colnias de outras espcies em vez de visitarem flores; de abelhas que usam carne em decomposio em vez de plen; de abelhas que coletam leos gordurosos e de abelhas cujos machos coletam perfumes (detalhes em Westerkamp 2013). Um trabalho que se destacou e ainda citado, at mesmo literalmente (Weiss 1991) foi o da mu- dana de cores durante a antese em Lantana (Mller 1877a, 1877b), especialmente nesse trecho: apenas as flores jovens de cor amarela so frteis, possuem nctar e valem visitas. As flores mais velhas (verme- lhas) permanecem na inflorescncia e, pelo contraste, deixam as poucas flores frteis mais vistosas (traduo dos autores). Em feijoa (Acca sellowiana, Myrtaceae), ele descobriu a polinizao por grandes pssaros fru- gvoros. As aves devoram as bagas brancas (ptalas suculentas) que circundam o androceu vermelho com
  33. 33. 36 Biologia da polinizao: uma sntese histrica o qual contrastam fortemente (detalhes em Sazima & Sazima 2007). Na verdade, o primeiro a obser- var os polinizadores (aves do gnero Thamnophilus popularmente conhecidas como chocas) foi seu neto Hans Lorenz, ento com quase cinco anos, colocado pelo av ao lado da planta para esperar os visitantes (Mller 1886). Assim, podemos dizer, hoje, que o mais jovem eclogo da polinizao do mundo nasceu no Brasil. Fugitivo da Alemanha porque viveu seguindo rigorosamente as suas convices ideolgicas e por isso no conseguiu emprego, Fritz recomeou a vida em plena Mata Atlntica no Brasil. Como colono bem formado viveu de olhos atentos na mata, conectado floresta, observando-a continuamente. Estudou a natureza, sempre com questes inovadoras que nasciam da observao atenta, do raciocnio criati- vo e da enorme capacidade de sntese. Fritz Mller demonstrou, na prtica, como chegar ao conheci- mento sem aparelho algum. Um bom exemplo o estudo da descarga explosiva de plen em Posoqueria (Rubiaceae), no qual ele at conseguiu determinar o ngulo e a velocidade do disparo, utilizando apenas ferramentas caseiras simples (Mller 1866). Com um bom conhecimento em matemtica, ele sempre acumulou grande nmero de repeties, s vezes milhares, antes de descrever um novo caso (Westerkamp 2013). Foi o primeiro a usar uma argumentao matemtica na biologia de popula- es quando estudou um novo tipo de mimetismo (Mller 1879), posteriormente chamado de mime- tismo mlleriano. O modelo matemtico criado por ele to simples, que Zillig (2011) ousou republicar os nmeros originais na sua coluna em um jornal dirio no sul do Brasil. J Hermann Mller foi, provavelmente, o maior observador das interaes entre flores e insetos (Proctor et al. 1996). Depois do doutorado, ele se destacou como coletor de musgos e colepteros (Schmidt-Loske et al. 2013). Em 1873, ele publi- cou o primeiro de dois livros importantes, alm de inmeros artigos cientficos (Hxtermann & Schneckenburger 2010). Em um dos seus artigos, discute as ideias sobre a viso em cores das abelhas melferas (Mller 1882). O primeiro livro: A ferti- lizao das flores por insetos e as adaptaes mtuas de ambos; uma contribuio para o conhecimento da relao causal na natureza orgnica (traduo livre), traz, pela primeira vez, o que ele descobriu sobre as adaptaes de insetos s flores e vice-versa tudo isso na perspectiva de um morador da Europa Central, j que Hermann nunca viajou para alm desta rea. Insetos e flores foram tratados equivalentemente pela primeira vez por isso seu trabalho representa o primeiro livro sobre ecologia floral. No livro ele trata intensamente a coadaptao ou coevoluo de flores e insetos sem ainda usar estes termos (Schneckenburger 2010). Darwin o achou to impor- tante, que mandou traduzi-lo para o ingls (Mller 1883). A obra em ingls no representa uma simples traduo, sendo na verdade uma reviso crtica que contm muitos novos resultados, os quais podem ter sido, inclusive, introduzidos sem conhecimento do autor. Darwin e os irmos Mller formaram uma rede mais ntima de troca de informaes, o tringulo Down-Blumenau-Lippstadt, no qual os trs influen- ciaram-se mutuamente (Schneckenburger 2013). Fritz Mller foi um dos mais importantes informantes de Darwin, atrs apenas de Hooker (Darwin 1899). No caso de Hermann Mller, foi o irmo Fritz que o dirigiu para a ecologia floral. Sabendo dos seus inte- resses em entomologia e em botnica, ele o estimulou a estudar as interaes entre insetos e flores com a frase: L, com certeza, ainda h uma imensido
  34. 34. Andr Rodrigo Rech Christian Westerkamp 37 de novidades para se descobrir (carta de FM para HM, 1/7/1866). Essa frase com toda certeza pode ser repetida aos eclogos da polinizao brasileiros, pois aqui tudo isso continua vlido mesmo cento e cinquenta anos depois de a frase ter sido dita. Quando Fritz soube que o irmo continuava titubeando, ele lhe escreveu na prxima carta sugerindo um proje- to vitalcio de pesquisa, o qual utilizava o livro de Sprengel como ponto de partida (carta de FM para HM, 29/10/1866) a dica do livro veio do prprio Darwin, que j o conhecia desde 1841, por indicao de Robert Brown (Darwin 1887, p. 258). O tringulo Down-Blumenau-Lippstadt chama ateno para a importncia da discusso amigvel entre pares para o avano do conhecimento. Um antecessor importante de Hermann Mller, tambm correspondente de Darwin e Fritz Mller, foi Friedrich Hildebrand (Schneckenburger 2010). Ele aproveitou as sugestes de Darwin sobre a sexualidade das flores (Junker 2011) e estudou a distribuio dos sexos nas plantas e a lei da autofertilizao evitada e desvantajosa (Hildebrand 1867), tema que tornou- se ttulo do seu primeiro livro. Ele tambm foi o primeiro a ter uma ideia sobre a fsica da retirada de plen por vibrao (Hildebrand 1865): no seu texto, ele imitou, onomatopaicamente (e convincentemente), as diferentes frequncias do zumbido de Bombus em voo e coletando plen. No desenvolvimento das pesquisas com ecologia da polinizao, a virada para o sculo XX foi marcada no mbito europeu pela obra monumental de Paul Knuth: Handbuch der Bltenbiologie (Knuth 1898a, 1898b, 1898c), continuada aps sua morte por Otto Appel e Ernst Loew (Knuth et al. 1904a, 1904b). Ao longo das 2.972 pginas dessa obra, os autores sin- tetizaram o que se sabia at ento acerca da ecologia da polinizao para plantas. O perodo histrico que se sucedeu morte de Paul Knuth foi politicamente agitado na Europa, especialmente na Alemanha, em tempos de Primeira e Segunda Guerras Mundiais. Nesse contexto, os principais avanos cientficos se deram nas reas de fsica, qumica e fisiologia, no entanto a ecologia, ento nascendo como cincia, incorporou ferramentas e ideias das reas em franco desenvolvimento e aos poucos consolidou-se como uma fonte de importantes conhecimentos. Carl von Hess, em 1912, usando conhecimen- tos da fisiologia humana, fez um trabalho no qual defendia que as abelhas no enxergavam cores. Essa hiptese era revolucionria, uma vez que falseava as ideias de Sprengel, Delpino e Darwin acerca das cores como atrativos sujeitos a seleo natural. Dessa forma, suas ideias foram a motivao para o surgimento da linha de pesquisa de cognio em polinizadores (Captulo 19). Nessa linha de pesquisa destacou-se Karl von Frisch, que fez inmeras descobertas, entre elas provou que as ideias de Hess eram equivocadas (Meeuse 1961). Estudando a viso em abelhas melferas, Frisch props que elas enxergam quatro categorias de cores, o que serviu de motivao para que ele buscasse na natureza as combinaes que fossem mais facilmente detectveis por elas. Aps estudar flores de noventa e quatro espcies, encontrou as combinaes que ele havia pressuposto como mais contrastantes na maioria delas. Esse achado corroborou as ideias de Hermann Mller de que os padres de cores na natureza no eram coincidncias. Igualmente para o paladar, Frisch demonstrou que abelhas podem diferenciar quatro categorias. Ele descobriu ainda que, quando em ina- nio, abelhas so capazes de detectar quantidades pequenas de acar diludo em gua, embora nem mesmo assim se comparem s borboletas, que seriam ainda mais sensveis a quantidades muito diludas (Meeuse 1961).
  35. 35. 38 Biologia da polinizao: uma sntese histrica A abordagem experimental em laboratrio foi a marca clara dos trabalhos de Frisch. Em experi- mentos de treinamento com abelhas melferas, teve sucesso com quase todos os odores testados, embora nunca tenha conseguido atrair e treinar abelhas para substncias com cheiro de carne em decomposio ou peixe. Teria sido uma surpresa para Frisch ver os estudos de Fritz Mller, descrevendo espcies de abelhas-sem-ferro que utilizam carne como fonte proteica no lugar de plen. Para entender a distino na percepo de cores e odores, ele desenvolveu os experimentos com amputao de antenas, os quais revelaram que as abelhas no percebem apenas os odores, mas tambm a forma das estruturas que cheiram (Meeuse 1961). O achado mais famoso na carreira de Frisch foi a descrio da dana utilizada pelas abelhas europeias (Apis mellifera e hoje se sabe tambm por algumas espcies de Meliponini) para informar outras forrageiras dentro da colmeia acerca da localizao de fontes de alimento (Frisch 1927). Na poca da publicao o trabalho no foi levado muito a srio, mas terminou por render Frisch, juntamente com Nikolaas Tinbergen e Konrad Lorenz, o prmio Nobel de Fisiologia em 1973. Em paralelo ao desenvolvimento dos trabalhos de Frisch, Fritz Knoll iniciou uma srie de estudos denominada Insetos e flores, investigando cognio em moscas e borboletas. Usando cmaras de vidro, ele identificou o papel de cor e odor na atrao de Bombylius fuliginosus (Diptera). Em parceria com Dora Ilse descobriu que Macroglossa stellatarum en- xerga cores no espectro do vermelho, alm de possuir preferncias inatas (Captulo 19). Knoll tambm investigou a funcionalidade de guias de nctar uti- lizando um experimento muito criativo. Para tes- tar a capacidade de mariposas detectarem guias de nctar e as utilizarem na localizao do recurso, ele utilizou duas chapas de vidro e prensou flores entre elas, mudando a posio das flores e das partes flo- rais isoladamente. No momento em que a mariposa tocava a placa de vidro, a probscide deixava uma marca nela, a qual era depois corada para interpre- tao. Os resultados sugeriam a funo claramente indicativa do nctar pelas guias. Posteriormente, Aubrey Manning demonstrou que as guias de nctar eram detectadas apenas em distncias muito curtas, eliminando assim a possibilidade de que elas funcio- nassem como atrativos florais em geral (Meeuse 1961). Contemporaneamente a Frisch e Fritz Knoll na Alemanha, Frederic E. Clements e Frances L. Long, nos Estados Unidos, formalizaram o que pode ser entendido como o primeiro tratado metodolgico da ecologia da polinizao, preocupados especial- mente com o desenho experimental para coleta e anlise de dados na rea. O livro Polinizao experi- mental: uma viso geral da ecologia de flores e insetos (Experimental pollination: an outline of the ecology of flowers and insects) consiste em estudos de casos com espcies alpinas e nfase clara na tomada de dados e no suporte experimental das afirmaes de cunho ecolgico. Com relao ao uso indiscriminado de listas de espcies para interpretaes de interaes ecolgicas os autores afirmam: impossvel indicar a importncia de insetos para uma flor usando listas de espcies, porque o esforo para aumentar a lista incorre no exagero da importncia de espcies raras e casos excepcionais (Clements & Long 1923, p. 6, traduo livre). Ao longo do sculo XX vrios outros livros foram dedicados a orientaes metodolgicas em ecologia da polinizao (e.g., Faegri & Iversen 1989, Dafni 1992, Kearns & Inouye 1993, Dafni et al. 2005). Voltando-se para o cenrio dos trpicos, um dos temas que praticamente surgiu e foi desenvolvido ao longo do sculo XX foi a polinizao por vertebrados (Captulo 14). Antes desse perodo, apenas alguns
  36. 36. Andr Rodrigo Rech Christian Westerkamp 39 comentrios isolados so encontrados na literatura. Georg Eberhard Rumpf (tambm latinizado como Georgius Everhardus Rumphius) e Mark Catesby j haviam reportado aves em visitas a flores antes da segunda metade do sculo XVIII, mas no fize- ram associao alguma com polinizao. A primeira descrio nesse sentido foi feita por Thomas Belt, que relatou a polinizao por aves em Marcgravia nepenthoides no livro O naturalista na Nicargua (Belt 1874). Em detrimento dos comentrios feitos previamente acerca da polinizao por vertebra- dos, Otto Porsch e Stefan Vogel figuram entre os principais nomes no estudo desses polinizadores, especialmente morcegos e aves, ao longo do sculo XX nas regies tropicais. Outras contribuies importantes no entendi- mento da ecologia da polinizao de espcies tropicais foram feitas por Herbert G. Baker. Os destaques vo para estudos com polinizao por morcegos na frica, mimetismo e polinizao por engano em flores de uma mesma espcie, sistemas reprodutivos e fenologia de espcies tropicais (Koptur 2006). Baker atuou tambm no entendimento da produo, com- posio e ecologia de nctar e nectrios, tema que Stefan Vogel tambm estudou brilhantemente (Vogel 1997). A regra de Baker, nomeada em aluso s suas ideias (Stebbins 1957), postula que espcies hbeis a colonizar ambientes insulares devem ser autocom- patveis (Baker 1955). Essa regra foi posteriormente adaptada para explicar colonizao de novas reas, no apenas ilhas, englobando tambm generalizao da polinizao, e no apenas flexibilizao do sistema reprodutivo (Faegri & Pijl 1979). Na segunda metade do sculo XX, pode-se dizer que o conhecimento em biologia da polinizao avan- ou em duas frentes, uma focada em padres e outra, em processos. Na frente baseada em processos houve um esforo de reaproximao dos conceitos genticos, com os quais a ecologia da polinizao dialogou muito pouco na primeira metade do sculo, quando as ideias de Mendel foram redescobertas. Nesse cenrio des- tacaram-se os nomes de Eric Charnov, David Lloyd, Debora e Brian Charlesworth, entre outros. Entre os principais temas estudados estiveram a heterostilia, a seleo sexual em plantas, a biogeografia baseada em dados moleculares e as bases genticas do mecanismo de seleo natural. A frente baseada em padres obviamente no ignorou os processos, mas os deduziu a partir dos padres encontrados. Nessa perspectiva estiveram Leendert van der Pijl, Knut Faegri, Stefan Vogel, Otto Porsch, entre muitos outros. Nesse programa de pesquisa est provavelmente um dos assuntos mais discutidos na biologia da polinizao nos lti- mos vinte anos: as sndromes de polinizao e seus mecanismos evolutivos (ver a Introduo da Seo 3 desse livro). Enquanto os livros didticos de Meeuse (1961), Kugler (1970), Faegri & Pijl (1979), Barth (1982, 1991) e Willmer (2011) foram construdos a partir de compilaes, os trabalhos de Vogel se destacam pela originalidade e pela formulao de novos conceitos. Ele comeou a estudar as interaes entre flores e os seus polinizadores no subcontinente sul-africano com a meta de descobrir as conexes entre sistemtica e radiao adaptativa (1954, 2012). Posteriormente, dedicou-se mais e mais a exemplos europeus e ao Neotrpico (sem desconsiderar o Paleotrpico), s vezes seguindo informaes iniciais dos trabalhos de Fritz Mller. Seu interesse pelos sistemas de poliniza- o neotropicais o levou a ser orientador e conselheiro de muitos colegas brasileiros. Foi ele quem definiu de- talhadamente a quiropterofilia no Neotrpico (Vogel 1958, 1968, 1969a, 1969b), descobriu osmforos e as suas interaes com polinizadores (Vogel 1966, 1990), acrescentou leos gordurosos aos recursos das
  37. 37. 40 Biologia da polinizao: uma sntese histrica flores (Vogel 1974, 1986, 1990) e tambm descobriu e caracterizou a polinizao por Mycetophilidae (Vogel 1978), entre tantos outros pontos. Como uma feliz coincidncia na histria da po- linizao no Brasil, Fritz Mller nasceu no mesmo ano em que o pas nascia com sua independncia: 1822 (Westerkamp 2012). Provavelmente foi ele o primeiro a dedicar-se ecologia funcional da polini- zao no pas, hoje uma rea com muitos pesquisa- dores dedicados a ela. Deu um bom exemplo para os estudantes atuais da ecologia floral: demonstrou que para comear no so necessrios aparelhos caros ou experimentos complexos. Basta que se abram todos (!) os sentidos e se iniciem as observaes, avanando com ideias e perguntas criativas, experimentos bem desenhados e muitas discusses entre pares. A histria da polinizao no Brasil s comeou. Quem dar futuro a este assunto somos ns hoje. Dedicatria Dedicamos esse captulo ao Dr. Stefan Vogel, em homenagem ao brilhantismo de sua carreira e quantidade de novas informaes que descobriu. Alm disso, homenageamos tambm sua humildade e entusiasmo com a pesquisa em biologia da polini- zao, caractersticas com as quais cativou seus pares e sedimentou seu lugar de respeito entre os grandes pesquisadores do sculo XX no mundo. Referncias bibliogrficas Aliotta, G. & Aliotta, A. 2004. Federico Delpinos scientific thought and the birth of modern biology in Europe. Delpinoa. 46, 85-93. Allan, M. 1977. Darwin and his flowers. The key to natural Selection. London, Faber and Faber. 318pp. Baker, H.G. 1955. Self-compatibility and establishment after long-distance dispersal. Evolution, 9, 347-48. Barlow, N. 1958. The autobiography of Charles Darwin 1809-1882. With the original omissions restored. Edited and with appendix and notes by his grand-daughter Nora Barlow. London, Collins. Barrett, S.C.H. 2010. Darwins legacy: the forms, function and sexual diversity of owers. Phil. Trans. R. Soc. B., 365, 351-368. Barth, F.G. 1982. Biologie einer Begegnung Die Partnerschaft der Insekten und Blumen. Stuttgart: Deutsche Verlags-Anstalt. Barth, F.G. 1991. Insects and owers. The biology of a partnership. Princeton, NJ, Princeton University Press. Belt, T. 1874. The naturalist in Nicaragua. London: John Murray, 403pp. Camerarius, R.J. 1694. De sexu plantarum epistola. Reissued in: Ostwalds Klassiker der exakten Naturwissenschaften 105 (1899). Capps, E.; Page, T.E. & Rouse, W.H.D. (eds.) 1916. Enquiry into plants and minor works on odours and weather signs Theophrastus. London: William Heinemann, New York: G.P. Putnams Sons, 499pp. Clements, F.E. & Long, F.L. 1923. Experimental pollination: an outline of the ecology of flowers and insects. Publications of the Carnegie Institute, 336, 1-274. Dafni, A. 1992. Pollination ecology: a practical approach. New York, Oxford, University Press, 250p. Dafni, A., Kevan, P.G. & Husband, B.C. 2005. Practical pollination biology. Ontario, Canada, 590pp. Darwin, C. 1862. On the various contrivances by which British and foreign orchids are fertilised by insects, and on the good effects of intercrossing. London, John Murray. Darwin, C. 1876. The effects of cross and self fertilization in the vegetable kingdom. London, John Murray, 482p. Darwin, C. 1877. The different forms of flowers on plants of the same species. London, John Murray. Dowrick, 352p. Darwin, F. 1887. The life and letters of Charles Darwin, including an autobiographical chapter. 3 vols. London, J. Murray, 1: 395 p., 2: 393 p., 3: 418 p. Darwin, F. 1899. The botanical work of Darwin. Annals of Botany, 13, ix-xix. Faegri, K. & Iversen, J. 1989. Textbook of pollen analysi