breve anÁlise da mÚsica bananas, do grupo titÃs …lise... · aspectos positivos e negativos da...
TRANSCRIPT
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
BREVE ANÁLISE DA MÚSICA BANANAS, DO
GRUPO TITÃS – UM OLHAR SOBRE OS
ASPECTOS POSITIVOS E NEGATIVOS DA
IMAGEM CULTURAL DO BRASIL
Giselda Fernanda Pereira
UNIVERSIDADE PRESBITERIANA MACKENZIE
1
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Agenda
Objetivo
A música
Base teórica
Título
Primeira, segunda e terceira estrofes
Conclusão
Referências bibliográficas
2
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Objetivo
- Apresentar uma pequena investigação sobre as imagens culturais,
positivas e/ou negativas do Brasil, possivelmente, presentes na letra da música
“Bananas” do grupo brasileiro de rock “Titãs”.
- Procuramos verificar os tipos de ocorrências intertextuais e os recursos
usados pelos produtores do texto que resultaram em imagens acerca da
identidade cultural do brasileiro e do Brasil. O propósito da música vai além do
prazer estético e do entretenimento, e nos fornece um retrato pitoresco da
história do país.
3
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Bananas
5
Yes, nós temos pierrôs
O arco de Oxóssi nas mãos do Cristo Redentor
Temos ioiô e iaiá
Minha terra tem palmares onde gorjeia o mar
Yes, nós somos o carnaval
Temos o corpo blindado, não tem nada igual
Temos a Carmen Miranda
Temos café e também temos o samba
Yes, nós temos o amanhã
A Virgem Maria sem culpa, e sem sutiã
Yes, nós temos a lua
Quadra de tênis e meninos de rua
Yes, nós somos mulatas
Temos loirinhas, rios e matas
Aqui sempre dá o que quer que se plante
Temos roleta-russa e roda gigante e a bossa nova
Temos bananas, temos bananas
E temos o sol pra rasgar nossas retinas
Temos bananas, temos bananas
E temos o céu pra agradar nossas meninas
"A minha esperança é um sol que brilha mais
Este sol iluminará nossos passos
Pela harmonia universal dos infernos
Chegaremos a uma civilização"
Temos bananas, temos bananas
E temos o sol pra rasgar nossas retinas
Temos bananas, temos bananas
E temos o céu pra exorcizar nossa ruína
https://www.youtube.com/watch?v=R11TC9VU3Ww&feature=kp
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
“A palavra é uma espécie de ponte lançada entre mim e os outros.”
7
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Ingidore Koch considera a intertextualidade como “um elemento
constituinte e construtivo do processo de escrita e leitura e
compreende as diversas maneiras pelas quais a produção/recepção
de um dado texto depende de conhecimento de outros textos por
parte dos interlocutores” (KOCH, 2008, p.86).
8
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
A intertextualidade em sentido amplo – condição de existência do
próprio discurso – pode ser o que se denomina por interdiscursividade,
segundo a Análise do Discurso (KOCH, 2001, p.47-48).
9
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Em sentido restrito – relação de um texto com outros textos previamente existentes –,
ela divide a intertextualidade em tipos.
Intertextualidade temática: a de conteúdo ocorre entre textos científicos de uma
mesma área ou corrente do conhecimento;
Intertextualidade estilística: a de forma/conteúdo, quando o autor de um texto imita
ou parodia; frequentes em textos que reproduzem a linguagem bíblica, jargão
profissional ou estilo de um determinado gênero;
10
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Intertextualidade explícita: quando um fragmento de outro enunciador é citado
no texto, acontece em casos de citação, resumo, referências, resenhas, traduções,
menções, textos argumentativos para se empregar o recurso de autoridade;
Intertextualidade implícita: acontece sem citação expressa da fonte, cabendo ao
interlocutor recuperá-la, como ocorre com as alusões, as paródias, e certos tipos
de paráfrase e de ironia, o produtor do texto espera que o leitor ouvinte
reconheça o intertexto ao ativar o texto fonte em sua memória discursiva.
11
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
O título
Banana é uma fruta bastante conhecida e fartamente
presente no Brasil; é a segunda fruta mais produzida no
país; em 2004, a produção nacional fora de 6,5 milhões de
toneladas, colocando o Brasil em terceiro lugar entre os
maiores produtores do mundo.
12
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Muito antes disso, quando o viajante português Pero de Magalhães
Gândavo esteve no Brasil, provavelmente, entre 1558 e 1572, em seu relato
“A História da Província Santa Cruz”, a terra, a flora e a fauna é descrita,
indicando que a fruta é abundante e representa ganho comercial aos
habitantes da terra.
13
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Ainda sobre a banana, nos anos 40, foram produzidos vários filmes comerciais,
para incentivar o consumo da fruta.
O cartunista norte-americano Dik Browne criou uma personagem para os
comerciais, Miss Chiquita, inspirada na “Brazilian Bombshell”, a “Bomba
Brasileira”, como era conhecida Carmen Miranda com seus chapéus
extravagantemente decorados com frutas.
14
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Banana é ainda uma forte referência na expressão “República
das bananas” que talvez tenha sido instaurada com a tragédia,
conhecida por “Massacre das Bananeiras”, envolvendo a empresa
United Fruit Company (alvo das propagandas de Miss Chiquita)
em solo colombiano (CARO, 2011).
15
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
O termo fora cunhado por O. Henry, um humorista norte-americano, ao
referir-se a Honduras, e apresentado no livro de contos Cabbages and
Kings, de 1904, ambientado na América Central, um ano antes da chegada
da United Fruit Company à Colômbia.
16
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Muitas expressões circulam o universo de sentidos para o título. Podemos ainda
citar a expressão “a preço de banana”, indicativo de baixo preço, incitado pela
facilidade em encontrar o produto.
17
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
É também possível relacionar o título à música do carioca Carlos
Alberto Ferreira Braga, conhecido por Braguinha, “Yes, nós temos
bananas”, de 1938, cujo verso “bananas pra dar e vender”
também revelam quão comum e abundante é o produto. Em 1949,
Braguinha fizera a marchinha “Chiquita Bacana”, citando a ilha
paradisíaca no Caribe e o produto nacional brasileiro.
18
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Primeira
estrofe
Ocorrências
intertextuais:
- temática
- estilística
- implícita
Yes, nós temos pierrôs
O arco de Oxóssi nas mãos do Cristo Redentor
Temos ioiô e iaiá
Minha terra tem palmares onde gorjeia o mar
Yes, nós somos o carnaval
Temos o corpo blindado, não tem nada igual
Temos a Carmen Miranda
Temos café e também temos o samba
19
A intertextualidade mais evidente, sem dúvida, é a que
segue no quarto verso, e que de certa forma estrutura
todo o texto de “Bananas” – “Minha terra tem
palmares onde gorjeia o mar” dialoga com o poema
“Canção do Exílio de Gonçalves Dias”, de 1843.
Primeira estrofe
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Na música, os autores optam por utilizar na maioria das vezes o verbo
na primeira pessoa do plural, do Presente do Indicativo, e o valor
etimológico do verbo cujo sentido concreto é o de possuir, recebe
outros valores semânticos, e pelo contexto social da música, opera
como veículo para uma extensão metafórica de novos sentidos: existir,
conseguir, mostrar, etc.
20
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Outro dado interessante, no poema de Gonçalves Dias, há a
declaração, nas três quadras e nos dois sextetos, dos elementos
presentes nas terras (a do exílio e a natal), e uma descrição.
Na música, a repetição sonora é ainda mais reforçada pela repetição
de palavras, e a marca do “nós” remete mais às questões de
identidade que propriamente de posse.
21
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Num quadro de noções possessivas, o verbo ter de “Canção do Exílio” expressa
posse permanente (“tem palmeiras”, “tem mais estrelas”, “têm mais flores”,
etc.) e na música “Bananas”, há um constante domínio abstrato (“temos
pierrôs, “temos o corpo blindado”, “temos a Carmen Miranda”, “temos o
amanhã”, “temos a lua”), por duas vezes contrapostos a um “somos” (“somos o
carnaval”, “somos mulatas”) que aparecem somente no quinto verso, nas
primeira e segunda estrofes
22
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Segunda Estrofe
Um das alusões – esta, de cunho político – está em “Aqui
sempre dá o que quer que se plante”.
Em 26 de abril de 1500, realizou-se a 1ª missa no Brasil. Em 1º de
maio de 1500, foi a vez da primeira ação de “marketing” do
Brasil. Pero Vaz de Caminha escreveu ao rei dom Manuel o
relato da viagem, com o seguinte trecho: “Nela, até agora, não
pudemos saber que haja ouro, nem prata, nem coisa alguma de
metal ou ferro; nem lho vimos. Porém a terra em si é de muito
bons ares, assim frios e temperados (...) Águas são muitas;
infindas. E em tal maneira é graciosa que, querendo-a aproveitar,
dar-se-á nela tudo, por bem das águas que tem”.
23
Segunda
estrofe
Ocorrências
intertextuais:
- temática
- estilística
- implícita
Yes, nós temos o amanhã
A Virgem Maria sem culpa, e sem sutiã
Yes, nós temos a lua
Quadra de tênis e meninos de rua
Yes, nós somos mulatas
Temos loirinhas, rios e matas
Aqui sempre dá o que quer que se plante
Temos roleta-russa e roda gigante e a bossa nova
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
“Dar-se-á nela tudo” – muitas vezes divulgado por um erro de
citação como “em se plantando, tudo dá” – o trecho traduz o fato
de não terem encontrado imediatamente o que estavam
interessados, o ouro, que seria descoberto somente em 1698, por
Antônio Dias de Oliveira, em Ouro Preto.
No entanto, o termo ficou famoso e foi um recurso
propagandístico usado pelo próprio governo brasileiro e por
empresas na década de 70.
24
Fonte:
<http://www.propagandaemrevista.com.br/pr
odutos/403/Corporativa/>. Acesso em
10.abr.2014.
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Terceira estrofe
Temos nesta estrofe a única intertextualidade
explícita, pois trata-se de um fragmento inserido
entre aspas: “A minha esperança é um sol que brilha
mais/Este sol iluminará nossos passos/Pela harmonia
universal dos infernos/Chegaremos a uma
civilização”. O trecho corresponde à fala do
personagem D. Porfírio Diaz, do filme “Terra em
transe”, do cineasta baiano Glauber Rocha, de 1967.
25
Terceira
estrofe
Ocorrências
intertextuais:
- explícita
"A minha esperança é um sol que brilha
mais
Este sol iluminará nossos passos
Pela harmonia universal dos infernos
Chegaremos a uma civilização"
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
“Terra em Transe” é um drama que se passa na fictícia República de
Eldorado. O filme pode ser lido como uma grande parábola da história
do Brasil no período 1960 e 1966, no qual o autor faz uma crítica de
todos aqueles que participaram desse momento das tensões políticas
entre as orientações de esquerda e direita, e uma alusão ao quadro
político do pré-golpe que se deu com a tomada de por João Goulart,
em 1961.
26
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
A presença de Glauber na música vem reforçar o título “República da Bananas”
e manifestar uma crítica de cunho político social ao país em que samba e
carnaval se misturam numa dicotomia paraíso e inferno.
Em meio à festa e à alegria, o sol vem para “rasgar nossas retinas” e mostrar a
“nossa ruína”. A manipulação – existente no filme de Glauber – aparece em
“Bananas”, mostrando que as mesmas questões relatadas pelo filme, e
presentes em nosso processo histórico, são repetidas em nossa atual situação
política e social.
27
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Ao analisar a música em busca das ocorrência intertextuais, percebemos que a
intertextualidade implícita é a mais frequente, exigindo que o leitor/ouvinte
busque muitas referências históricas para melhor compreender o texto.
A intertextualidade implícita possui um valor subversivo de détournement,
palavra francesa que significa uma espécie de apropriação indevida de algo.
Para Ingidore Koch (2004) existe um détournement lúdico, um simples jogo
entre texto e intertexto, e um détournement militante – o qual
principalmente encontramos na canção analisada.
29
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
Este último, segundo Koch (2004, p. 148), tem como objetivo “levar o
interlocutor a ativar o texto original, para argumentar a partir dele, ou
então, ironizá-lo, ridicularizá-lo, contraditá-lo, adaptá-lo a novas
situações ou orientá-lo para um outro sentido, diferente do original”.
Este tipo de intertextualidade fornece – além das referências histórico-
político-sociais – o sentido humorístico da música.
30
Giselda Fernanda Pereira [email protected]
• BAKHTIN, Mikhail. Filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1992.
• BARROS, Diana L. P. de. Dialogismo, polifonia e enunciação. In: BARROS, Diana L. P. de e FIORIN, José Luiz. (orgs.). Dialogismo, polifonia e intertextualidade.São Paulo: Edusp, 1994, p. 1 a 9
• BRONCKART, Jean Paul. Atividade de linguagem, textos e discursos: por um interacionismo sócio-discursivo. São Paulo: EDUC, 1999
• CARO, Jorge Enrique Elías. La masacre obrera de 1928 en la zona bananera del Magdalena-Colombia. Una historia inconclusa. Argentina. UniversidadNacional de Salta. Andes, vol. 22, junio, 2011. Disponível em: < http://www.redalyc.org/pdf/127/12719967004.pdf>. Acesso em: 14 mar. 2014
• DA MATTA, Roberto. O que faz o brasil, Brasil?. Rio de Janeiro: Rocco, 1986
• GÂNDAVO, Pêro de Magalhães. História da Província de Santa Cruz. Disponível em: < http://www.nead.unama.br/site/bibdigital/pdf/oliteraria/159.pdf>. Acesso em: 14 mar.2013
• HENRY, O. Cabbages and kings. Capítulo VII. 2008. Disponível em: < http://www.gutenberg.org/files/2777/2777-8.txt>. Acesso em: 14 mar. 2014
• KOCH, Ingidore Villaça. Ler e compreender os sentidos do texto. São Paulo: Contexto, 2008
• __________________. Introdução à linguística textual.Martins Fontes, 2004
• TOURNIER, Michel. Pierrot ou les secrets de la nuit. In: Sept Contes. França: Gallimard, 1990
32