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Neste contexto é que foi pensado o Pla-
nejamento Nacional para Gestão de Riscos
(PNGR), fruto da cooperação técnica entre o
Ministério da Integração Nacional, pela Se-
cretaria Nacional de Defesa Civil, e o Centro
Universitário de Estudos e Pesquisas sobre
Desastres da Universidade Federal de Santa
Catarina (CEPED UFSC). O projeto tem
como objetivo gerar informações por meio da
caracterização do cenário nacional de áreas de
risco, proporcionando então ferramentas que
direcionarão tomadas de decisão que visem à
minimização de desastres em âmbito nacional.
Compreendido em três etapas, o projeto
teve início em outubro de 2010 com a execu-
ção da Etapa 1 denominada “Levantamento
e Diagnóstico”. As etapas seguintes estão
vinculadas aos resultados da primeira.
Há, no território nacional, uma enor-
me diversidade de ambientes vulneráveis
caracterizados por diferentes formações
geológicas, geomorfológicas e hidrológicas.
Há também diferentes níveis de desenvol-
vimento econômico, social e turístico em
áreas rurais e urbanas; além de variados
processos migratórios, fluxos turísticos,
e ritmos de urbanização em pequenas,
médias e grandes cidades.
Em paralelo a isso, a tendência global de
aumento dos desastres associados ao clima
e a inexistência de informações organizadas
que proporcionem a tomada de ações efetivas
para a gestão de riscos de desastres potencia-
lizam danos humanos, econômicos e sociais
oriundos de eventos adversos. Foi neste con-
texto que, em 2005, a Conferência Mundial
para a Redução de Desastres em Kobe (UN,
2005)1 chamou a atenção à necessidade de se
desenvolver sistemas de indicadores de risco
e vulnerabilidade em nível nacional.
Dada a complexidade das diferentes di-
mensões da vulnerabilidade, mensurá-la re-
quer a integração de um grande número de
informações relacionadas a uma pluralidade
de disciplinas e áreas de conhecimento.
Atualmente, não existe em âmbito na-
cional nenhum tipo de fonte de informações
organizada e disponível nas instituições e
órgãos relacionados ao assunto. Os esforços
e pesquisas são, usualmente, realizados
regionalmente, não tendo, em sua maioria,
sinergia com outros trabalhos em desenvol-
vimento ou compatibilidade com a Política
Nacional de Defesa Civil.
Tendo em vista esse cenário que ano
a ano expõe a fragilidade da população e
o despreparo da administração pública no
tocante em lidar com situações extremas é
que surge a necessidade de realizar a gestão
para redução de riscos de desastres. Significa
buscar, por meio de estudos e pesquisas,
a extinção ou redução dos impactos de fe-
nômenos adversos sobre um determinado
ambiente. Para que isso ocorra, a carência
hoje é de informações sobre desastres que
embasem estudos de diversas instituições,
tais como de institutos de pesquisa, de órgãos
governamentais e de centros universitários.
Planejamento Nacional para Gestão de Riscos - PNGR
Antonio Edesio Jungles
Rafael Schadeck
Bruna Alinne Clasen
DE SANTA CATARINA
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CADERNO ESPECIAL
ETAPA 1 ETAPA 3ETAPA 2
LEVANTAMENTOE DIAGNóSTICO
DESENVOLVIMENTOE CAPACITAÇÃO
MÉTODO E TRABALHO DE CAMPO
Etapa 1 - Levantamento e Diagnóstico
O foco de trabalho nesta etapa consiste na caracterização dos vários tipos de riscos de de-
sastres, incluindo ameaças e vulnerabilidades que os compõem, de maneira que seja possível
identificar metodologicamente os riscos de desastres naturais de maior prevalência no Brasil,
obtidos por região. Trata-se de mapear todos os tipos de desastres naturais e mistos, objetivando
a construção de informações sistematizadas que proporcionem a elaboração de um diagnóstico
de utilidade e aplicabilidade à gestão de riscos de desastres em território brasileiro.
Como produtos esperados ao término da etapa de Levantamento e Diagnóstico têm-se:
•Mapeamento dos desastres relevantes em âmbito nacional;
•Definição dos fatores relevantes (Relevância x Viabilidade) para consideração da ava-
liação de risco;
•Mapeamento dos principais fatores sócio-estruturais;
•Zoneamento das áreas de risco em função da vulnerabilidade versus suscetibilidade a eventos;
•Estudo das ferramentas de informação;
•Diagnóstico e hierarquização em função do zoneamento e viabilidade do mapeamento.
Para obtenção das informações que comporão tais produtos, a metodologia de pesquisa
segue diretrizes específicas, elaboradas pelos pesquisadores do PNGR, tendo em vista, princi-
palmente, que a execução das etapas seguintes está vinculada aos produtos desta. Assim sendo,
constituem-se em ações da Etapa 1:1 UN. World Conference on Disaster Reduction. Kobe: UNGA; janeiro de 2005.
Levantamento da documentação relativa à ocorrência de desastres
Consolidação de um histórico dos desastres associados a fenô-
menos naturais ocorridos, no mínimo, nos últimos 10 anos. Para
tanto, são realizadas digitalizações de todos os documentos
referentes ao registro de ocorrências: AVADAM (Avaliação de
Danos Municipais), NOPRED (Notificação Preliminar de
Danos), e documentações anteriores tais como relatórios de
danos e decretos. Para complementação dos dados utilizam-
-se documentos disponíveis na Secretaria Nacional de Defesa
Civil e Diário Oficial.
Uma equipe de 16 pesquisadores realiza as digitalizações
nos órgãos estaduais de Defesa Civil, utilizando-se de aparelhos
portáteis de digitalização. Divididos em duplas, parte dos pes-
quisadores viaja para as capitais brasileiras e outra parte trabalha
com o tratamento dos dados, em escritório.
Conversão em planilhas eletrônicas e tabulação
Os documentos digitalizados são convertidos em planilhas
eletrônicas e posteriormente formatados de maneira a adequar
os dados para a tabulação. A tabulação permite a quantificação
das informações de forma padronizada. Os dados contidos nos
documentos, por sua vez, são transformados em atributos a serem
utilizados na construção de banco de dados.
Construção de banco de dados
Todos os dados referentes aos desastres, coletados no decor-
rer da fase de levantamento, constituem-se em um sistema de
informações que permite a obtenção de elementos relevantes ao
desenvolvimento de estudos e políticas públicas. O desenvol-
vimento deste banco de dados ocorre em software apropriado,
definido de acordo com a melhor adequação às necessidades da
Secretaria Nacional de Defesa Civil.
Sistema Integrado de Informações
A sistematização de informações baseia-se na intersecção dos
locais onde ocorreram os desastres e seu código ou tipo. Esse
cruzamento de informações possibilita que a busca referente
aos desastres ocorridos se dê por indicação de local ou tipo.
Como produto do PNGR, a consulta ao banco de dados pode
ocorrer por acesso online, gerando mapas temáticos estaduais,
regionais e municipais.
Indexação dos documentos
É estabelecida por meio de um software para gerenciamento
do banco de dados da documentação levantada, proporcio-
nando uma pesquisa detalhada segundo atributos, descrição
e palavras-chaves.
Aplicativo SIG
Aplicativo destinado à espacialização das informações,
gerando mapas temáticos relacionados às informações tabula-
das – ocorrências de desastres, histórico de danos humanos e
materiais, dentre outros.
Panorama atual da Etapa 1
As ações de digitalização e tabulação de dados, realizadas
em todas as regiões brasileiras, constituem hoje a base de dados
do PNGR, ferramenta que permitirá a constituição das séries
históricas de desastres no Brasil.
A base de dados conta hoje com quase 41.000 documentos
oriundos principalmente dos arquivos das Coordenadorias Esta-
duais de Defesa Civil, e de fontes secundárias, como imprensa,
órgãos de meio ambiente e demais instituições públicas e pri-
vadas correlatas. Deste número, estima-se que 10% referem-se
a desastres repetidos, o que significa que já foram identificados
cerca de 36.900 desastres, com registros desde 1978.
CADERNO ESPECIAL
302Com Ciência Ambiental
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CIÊNCIA NA AMAZÔNIA
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NOExemplo de Mapa de Suscetibilidade – Inundações
O gráfico abaixo ilustra a quantidade
de documentos levantados por região brasi-
leira. Importante ressaltar que os números
não indicam a quantidade de desastres por
região, mas sim a quantidade de registros
identificados na Etapa de Levantamento e
Diagnóstico, até o momento processados.
Ressalta-se também que este é um panora-
ma parcial, pois as regiões se encaixam em
diferentes fases do trabalho.
O trabalho de campo, que se constitui das
digitalizações, encontra-se em fase final, com
a equipe encerrando os levantamentos nos
arquivos federais de Brasília, com o objetivo
de sanar as lacunas das informações que não
foram obtidas nos Estados. No escritório do
CEPED UFSC em Florianópolis, uma equipe
de 14 pesquisadores dá continuidade ao traba-
lho de tratamento de dados, com a conversão
dos documentos em planilhas eletrônicas e
tabulação dos dados, para posterior geração de
informações – séries históricas, mapas temáti-
cos, histórico de danos e prejuízos.
A coordenação do projeto assumiu junto
ao Ministério da Integração Nacional a con-
clusão dos produtos da Etapa 1 para junho de
2011, com a entrega do Atlas de Desastres por
Região. Em paralelo, os pesquisadores adian-
tam as ações das etapas seguintes, principal-
mente no desenvolvimento do software que
irá permitir o registro online de desastres e
atualização simultânea do Atlas.
O sistema permitirá a geração de diferentes
mapas temáticos a partir de uma série de crité-
rios e de cruzamento de informações de fontes
diversas como IBGE, por exemplo. Ao lado,
exemplificamos alguns mapas já trabalhados em
outros projetos pelo CEPED UFSC junto a pes-
quisadores da universidade e que exemplificam
superficialmente o novo Sistema Informatizado.
Fonte: HERRMANN, M. L. P. (ORG.) Atlas de Desastres Naturais do Estado de Santa Catarina, Florianópolis, 2007, 148p.
Exemplo de Mapa de Suscetibilidade – Escorregamento
Fonte: HERRMANN, M. L. P. (ORG.) Atlas de Desastres Naturais do Estado de Santa Catarina, Florianópolis, 2007, 148p.
306Com Ciência Ambiental
CIÊNCIA NA AMAZÔNIACADERNO ESPECIAL
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NO
Sobre os autoresAntonio Edesio Jungles, Dr. é Engenheiro Civil pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Tem
especialização em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz e pós-doutorado pela University of Alberta
(2000). É diretor geral do CEPED UFSC e coordenador do projeto PNGR.
Rafael Schadeck, Msc. é Engenheiro Civil e doutorando em Engenharia Civil pela Universidade Federal de Santa
Catarina. No CEPED UFSC exerce a função de Gerente de Projetos e atualmente é o pesquisador sênior do
projeto PNGR.
Bruna Alinne Clasen é graduanda em Engenharia Sanitária Ambiental pela Universidade Federal de Santa
Catarina (UFSC) e estagiária do CEPED UFSC para o projeto PNGR.
Etapa 2 - Método e trabalho de campo
A partir do diagnóstico realizado na Etapa 1 serão identificadas, com base em critérios
desenvolvidos conjuntamente com o Ministério da Integração Nacional, as áreas prioritárias
para a execução do Mapeamento de Risco. As áreas devem abranger a maior diversidade de
tipos de desastres e abarcar o maior número de Estados possíveis. O intuito é construir mo-
delos e processos que contemplem as heterogeneidades regionais e as características técnicas
relacionadas às tipologias de desastres.
Como produto concreto da segunda etapa (que está em aguardo de aprovação), oriundo
do trabalho de campo, consta o mapeamento de risco de áreas elencadas, a partir do qual são
esperados os seguintes resultados:
•Desenvolvimento de metodologia para gestão de risco direcionada em função do tipo
de desastre mapeado e características locais;
• Identificação das principais vulnerabilidades relacionadas à infraestrutura pública (ro-
dovias, pontes, hospitais, escolas etc.);
•Elaboração de materiais didáticos e diretrizes para capacitação de agentes de Defesa
Civil e profissionais técnicos;
•Construção de canais de informação, consolidação de ferramentas e desenvolvimento
de indicadores que subsidiem o trabalho de gestão de risco;
• Plano de ação com diretrizes para o mapeamento das áreas de risco em território nacional
e plano de manutenção dos sistemas de informações construídos.
Etapa 3 - Desenvolvimento e capacitação
Os riscos e as vulnerabilidades são elementos relacionados às características locais, princi-
palmente quando originados ou potencializados por ações antrópicas. Desta forma, entende-se
que a percepção e a gestão dos riscos devem ser realizadas de forma tão regional quanto possível.
Embora a padronização de processos para elaboração de ferramentas de gestão de riscos
seja responsabilidade de autoridades públicas e de estudiosos de ampla visão, a tarefa de gerir
recursos com objetivo de minimização da vulnerabilidade a eventos adversos deve ser atribuída
a órgãos locais ou regionais. Isto porque a execução deste trabalho por uma única instituição,
considerados a diversidade, a dimensão do território brasileiro e o alcance local de ação de um
órgão centralizador, é praticamente impossível.
O mapeamento das áreas de risco,
por exemplo, é possivelmente a fer-
ramenta mais importante para a sua
gestão e minimização. Objetiva-se que
ao término das duas primeiras eta-
pas deste projeto, além de já se haver
concretizado o mapeamento de áreas
significativas, tenha-se gerado conheci-
mento para a multiplicação de agentes
capazes de construir este mapeamento
e, consequentemente, elaborar planos
para redução de risco em nível regional.
Ao término da identificação dos
principais riscos, mapeadas as vulne-
rabilidades mais importantes, o pro-
jeto visa à consolidação do conheci-
mento gerado, a fim de defini-lo como
alicerce para futuras capacitações e
processos de conscientização que se
fazem necessários.
Enfim, sabe-se que o Brasil é atingi-
do por desastres recorrentes, que usual-
mente não são de alta magnitude, mas
que somados causam danos humanos e
materiais significativos. Sua grande di-
mensão territorial e as grandes diferen-
ças sociais e culturais entre suas regiões
são desafios para uma política nacional
eficaz de gerenciamento de risco.
Somado ao baixo nível de cultura de
risco da população e de grande parte da
administração pública, o resultado é a
escassez de investimentos em preven-
ção e que, quando existem, usualmente
não são eficazes.
Desta forma, a discussão em torno
da elaboração de um plano de ação,
com metas bem definidas, que visem ao
incremento da cultura de prevenção de
desastres, redução de risco e diminuição
das vulnerabilidades das comunidades
brasileiras, torna-se fundamental para a
aplicação eficaz dos recursos humanos
e financeiros disponíveis.
Essas ações passam obrigatoriamen-
te pelo diagnóstico do cenário nacional,
identificação e avaliação das áreas mais
suscetíveis a desastres e preparação e
conscientização dos profissionais, go-
vernantes e população quanto à redução
de riscos, os quais são objetos do plane-
jamento apresentado neste.