cap 22 - glomerulonefrites primárias

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Capítulo 22 Glomerulonefrites Primárias Maria Fernanda C. Carvalho, Marcello F. de Franco e Vitor A. Soares (In Memoriam) FISIOPATOLOGIA DOS SINAIS E SINTOMAS DAS GLOMERULONEFRITES Proteinúria Queda da filtração glomerular Hematúria Retenção de sódio Alterações metabólicas Tratamento inespecífico Diagnóstico da glomerulonefrite GLOMERULONEFRITE PÓS-ESTREPTOCÓCICA Anatomia patológica Etiopatogenia Tratamento GLOMERULONEFRITE CRESCÊNTICA Anatomia patológica Etiopatogenia Tratamento Glomerulonefrite crescêntica e transplante NEFROPATIA POR IgA Anatomia patológica Etiopatogenia Tratamento Nefropatia por IgA e transplante GLOMERULONEFRITE MEMBRANOPROLIFERATIVA (GNMP) Anatomia patológica Etiopatogenia Tratamento Glomerulonefrite membranoproliferativa e transplante renal GLOMERULONEFRITE POR LESÕES MÍNIMAS Anatomia patológica Etiopatogenia Tratamento GLOMERULOSCLEROSE FOCAL E SEGMENTAR Anatomia patológica Etiopatogenia Tratamento Glomerulosclerose focal e segmentar e transplante GLOMERULONEFRITE MEMBRANOSA Anatomia patológica Etiopatogenia Tratamento Glomerulonefrite membranosa e transplante DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL BIBLIOGRAFIA SELECIONADA ENDEREÇOS RELEVANTES NA INTERNET As glomerulonefrites são classificadas de acordo com a presença ou ausência de doença sistêmica, com a apre- sentação clínica e quanto ao seu modo de instalação e pro- gressão. Quando as glomerulopatias aparecem isoladamente, são classificadas como primárias, e quando estão associ- adas a doenças sistêmicas, tais como lúpus eritematoso sistêmico, diabetes etc., são classificadas como secundá- rias. Neste capítulo trataremos apenas das glomerulone- frites primárias. As conseqüências da agressão glomerular são basica- mente: proteinúria, hematúria, queda de filtração glome- rular e retenção de sódio. Dependendo principalmente da intensidade e do tipo da agressão, pode haver predomínio de um sinal sobre outro, dando origem a diferentes apre- sentações clínicas: síndrome nefrítica, síndrome nefrótica, e não-nefrítica e não-nefrótica. Síndrome nefrítica é descrita como o aparecimento sú- bito de edema, hipertensão arterial e hematúria geralmente macroscópica.

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  • Captulo

    22Glomerulonefrites Primrias

    Maria Fernanda C. Carvalho, Marcello F. de Franco e Vitor A. Soares (In Memoriam)

    FISIOPATOLOGIA DOS SINAIS E SINTOMAS DASGLOMERULONEFRITES

    ProteinriaQueda da filtrao glomerularHematriaReteno de sdioAlteraes metablicasTratamento inespecficoDiagnstico da glomerulonefrite

    GLOMERULONEFRITE PS-ESTREPTOCCICAAnatomia patolgicaEtiopatogeniaTratamento

    GLOMERULONEFRITE CRESCNTICAAnatomia patolgicaEtiopatogeniaTratamentoGlomerulonefrite crescntica e transplante

    NEFROPATIA POR IgAAnatomia patolgicaEtiopatogeniaTratamentoNefropatia por IgA e transplante

    GLOMERULONEFRITE MEMBRANOPROLIFERATIVA (GNMP)Anatomia patolgicaEtiopatogeniaTratamentoGlomerulonefrite membranoproliferativa e transplante renal

    GLOMERULONEFRITE POR LESES MNIMASAnatomia patolgicaEtiopatogeniaTratamento

    GLOMERULOSCLEROSE FOCAL E SEGMENTARAnatomia patolgicaEtiopatogeniaTratamentoGlomerulosclerose focal e segmentar e transplante

    GLOMERULONEFRITE MEMBRANOSAAnatomia patolgicaEtiopatogeniaTratamentoGlomerulonefrite membranosa e transplante

    DIAGNSTICO DIFERENCIALBIBLIOGRAFIA SELECIONADAENDEREOS RELEVANTES NA INTERNET

    As glomerulonefrites so classificadas de acordo coma presena ou ausncia de doena sistmica, com a apre-sentao clnica e quanto ao seu modo de instalao e pro-gresso.

    Quando as glomerulopatias aparecem isoladamente,so classificadas como primrias, e quando esto associ-adas a doenas sistmicas, tais como lpus eritematososistmico, diabetes etc., so classificadas como secund-rias. Neste captulo trataremos apenas das glomerulone-frites primrias.

    As conseqncias da agresso glomerular so basica-mente: proteinria, hematria, queda de filtrao glome-rular e reteno de sdio. Dependendo principalmente daintensidade e do tipo da agresso, pode haver predomniode um sinal sobre outro, dando origem a diferentes apre-sentaes clnicas: sndrome nefrtica, sndrome nefrtica,e no-nefrtica e no-nefrtica.

    Sndrome nefrtica descrita como o aparecimento s-bito de edema, hipertenso arterial e hematria geralmentemacroscpica.

  • captulo 22 403

    Sndrome nefrtica foi originariamente definida comoproteinria de 24 horas acima de 3,5 g, acompanhada dehipoalbuminemia, hipercolesterolemia e edema. O enten-dimento de que as trs ltimas alteraes so apenas con-seqncia da intensidade da proteinria levou definiomais recente de sndrome nefrtica, que : proteinriamacia, com tendncia a edema, hipoalbuminemia e hiper-colesterolemia.

    Na apresentao no-nefrtica e no-nefrtica so clas-sificados aqueles casos de glomerulonefrites que no seencaixam nas classificaes anteriores.

    Como ser visto posteriormente, uma mesma glomeru-lonefrite pode ter diversas apresentaes clnicas em dife-rentes indivduos, ou at um mesmo indivduo pode ma-nifestar durante a sua evoluo vrias apresentaes cl-nicas.

    Raramente as glomerulonefrites podem evoluir parainsuficincia renal terminal em questo de semanas oumeses, e quando isto ocorre, elas so classificadas comoglomerulonefrite rapidamente progressiva, independente-mente do tipo histolgico. Inicialmente, este termo foi uti-lizado como sinnimo de glomerulonefrite crescntica,porm, o reconhecimento de que esta nem sempre apre-senta deteriorao rpida da funo renal e de que outrasglomerulonefrites podem evoluir rapidamente para insu-ficincia renal terminal fez com que este uso fosse aban-donado.

    Estas classificaes tm objetivo apenas didtico e ser-vem somente como orientao, quando se est frente a umportador de glomerulonefrite.

    FISIOPATOLOGIA DOS SINAISE SINTOMAS DAS

    GLOMERULONEFRITES

    ProteinriaA membrana basal glomerular um gel com carga el-

    trica negativa, que apresenta grande quantidade de porospequenos, denominados poros discriminantes, e baixa den-sidade de poros grandes, denominados poros no-discrimi-nantes. Essas caractersticas fazem com que ela seja altamen-te permevel gua e pequenas molculas, tais como uria,creatinina, glicose etc., e praticamente impermevel a ma-cromolculas, como por exemplo imunoglobulinas.

    Em molculas com tamanho intermedirio, a carga el-trica outro fator que influencia na permeabilidade damembrana basal glomerular. A albumina plasmtica, porexemplo, apresenta raio molecular de 33 e, quando emsoluo no plasma, apresenta carga negativa. Pelo seu ta-manho ela poderia atravessar a membrana basal, porm ofato de ela apresentar carga negativa faz com que a suapassagem atravs desta membrana seja desprezvel.

    Nas glomerulopatias tem sido demonstrado que existeperda de cargas aninicas e aumento da densidade deporos no-discriminantes da membrana basal glomerular,o que leva ao aumento da sua permeabilidade com conse-qente proteinria. Nas glomerulopatias onde ocorre ape-nas perda de carga (glomerulonefrite por leses mnimas),as protenas encontradas na urina so basicamente albu-mina e transferrina, enquanto naquelas onde ocorre au-mento da densidade de poros no-discriminantes (glome-rulonefrite membranosa, glomerulonefrite membranopro-liferativa, glomerulosclerose focal e segmentar), alm dealbumina e transferrina, encontram-se tambm protenasde maior peso molecular, como por exemplo imunoglobu-linas.

    A maior parte das glomerulonefrites so mediadas pelosistema imune, quer pela deposio de imunocomplexoscirculantes, quer pela reao antgeno-anticorpo in situ.Essas reaes ativam o sistema complemento, o que, dire-ta ou indiretamente, leva ao aumento de permeabilidadeda membrana basal glomerular, resultando em protein-ria (v. Cap. 21).

    Tem sido demonstrado que nas diferentes glomerulo-nefrites experimentais existe aumento da presso hidros-ttica dentro do capilar glomerular e que esse aumento outro fator importante na gnese da proteinria.

    Queda da Filtrao GlomerularA filtrao glomerular depende basicamente de dois

    fatores: a presso intraglomerular e o coeficiente de per-meabilidade da membrana glomerular (v. Cap. 3). Nasglomerulonefrites experimentais, onde esses parmetrospodem ser quantificados, tem sido demonstrado que exis-te aumento da presso hidrosttica e queda do coeficientede ultrafiltrao. Estudos realizados em seres humanos,onde esses parmetros so deduzidos, tm sido compat-veis com esses achados.

    Vrios fatores, tais como a retrao dos podcitos (queocorre em pacientes com sndrome nefrtica, independen-temente do tipo histolgico), a infiltrao de neutrfilosocluindo as fenestraes do endotlio e a diminuio darea filtrante da membrana basal ocasionada pela esclero-se glomerular, tm sido propostos para explicar a quedado coeficiente de permeabilidade da membrana basal.

    HematriaO mecanismo de hematria nas glomerulopatias muito

    pouco estudado. O que se aceita hoje que no curso daagresso renal acabam ocorrendo solues de continuida-de na membrana basal glomerular, atravs das quais ocorrea passagem de hemcias para o espao de Bowman. Estase faz atravs de diapedese, o que provoca intensa altera-o da sua forma, e, por isso, a maior parte dos eritrcitos

  • 404 Glomerulonefrites Primrias

    encontrados na urina de pacientes com glomerulopatiasapresenta alteraes quanto sua morfologia (hemciasdismrficas).

    Reteno de Sdio (v. Cap. 10)Outra alterao muito freqente nas glomerulopatias

    a reteno de sdio, que se manifesta clinicamente poredema e hipertenso arterial.

    O edema presente nos pacientes portadores de nefropa-tia tem sido explicado por dois mecanismos diferentes. Nospacientes portadores de nefropatia sem hipoalbuminemia,ele tem sido imputado reteno primria de sdio pelorim lesado, com aumento da volemia, aumento da pressohidrosttica intravascular e extravasamento de lquidopara o interstcio, com conseqente aparecimento de ede-ma. Nos pacientes onde ocorre hipoalbuminemia esta temsido responsabilizada pela formao do edema. Assim,nestes casos ocorreria perda de protenas pelo rim, comconseqente hipoalbuminemia, e diminuio da pressoonctica do plasma; essa diminuio levaria a extravasa-mento de lquido para o interstcio com formao de ede-ma, levando hipovolemia, o que ativaria diferentes sis-temas de reteno de sdio (ativao do sistema renina-angiotensina, do sistema simptico e diminuio do fatornatriurtico), agravando o edema.

    Nos ltimos anos tm surgido evidncias de que a hipo-albuminemia como principal causa do edema na sndromenefrtica deve ser questionada. Assim, menos de 50% depacientes portadores de analbuminemia congnita apresen-tam edema; a volemia de pacientes com sndrome nefrticaest normal ou aumentada em 70% dos casos; a concentra-o intersticial de albumina nos pacientes nefrticos encon-tra-se em nveis semelhantes concentrao plasmtica e,portanto, no existe a diferena de presso onctica entre ointravascular e o interstcio; nos pacientes que apresentamremisso da sndrome nefrtica a excreo urinria de s-dio antecede o aumento da albumina plasmtica. A expan-so da volemia de pacientes nefrticos resulta em discretoaumento da natriurese. Alm do mais, tem sido demonstra-do que animais de experimentao com nefropatia unilate-ral apenas retm sdio no rim lesado. Por estes motivos, hojese acredita que, mesmo nos pacientes com hipoalbuminemia,a origem do edema a maior reteno de sdio provocadapela leso renal e no conseqente s alteraes sistmicas.

    Alteraes MetablicasO nvel de albumina srica do paciente com sndrome

    nefrtica resultado de um balano onde os fatores maisimportantes so: a intensidade e a durao da perda uri-nria e a sntese heptica aumentada.

    Outro fator que influencia este balano o aumento docatabolismo protico. Normalmente a pequena quantida-

    de de albumina filtrada reabsorvida pelos tbulos pro-ximais. Nas situaes onde existe aumento dessa filtraoocorre aumento da reabsoro tubular. A albumina reab-sorvida catabolizada, o que contribui para hipoalbumi-nemia.

    As alteraes lipdicas encontradas na sndrome nefr-tica relacionam-se diretamente com os nveis de albuminaplasmtica. A hipoalbuminemia um estmulo para o au-mento da sntese protica pelo fgado, o que leva maiorsntese de lipoprotenas de baixa densidade e de muitobaixa densidade; como as primeiras so carreadoras decolesterol e as segundas de triglicrides, ocorre hipercoles-terolemia e hipertrigliceridemia. Acresce-se a isso o fato deque hipoalbuminemias muito intensas inibem a liplise.

    O encontro de hipocalcemia no incomum na sndro-me nefrtica. Como parte do clcio plasmtico est ligada albumina, esta pode ser explicada parcialmente pelaqueda da concentrao plasmtica desta protena. Pode-seobservar tambm queda do clcio inico, que explicadapela perda urinria de protenas ligadas ao metabolismodesse on [1,25(OH)2 colecalciferol e 24,25(OH)2 colecalci-ferol].

    Outras complicaes relativamente comuns na sndro-me nefrtica, como tromboses ou infeces repetidas, sodecorrentes, pelo menos parcialmente, da perda urinriade fatores antitrombticos e de imunoglobulinas, respec-tivamente.

    Tratamento InespecficoO tratamento especfico de cada glomerulopatia ser

    discutido separadamente, porm algumas medidas toma-das, independentemente do tipo histolgico, sero discu-tidas neste item.

    Como foi dito anteriormente, um dos possveis meca-nismos que contribuem na gnese da proteinria o au-mento da presso intraglomerular. Esta depende basica-mente do fluxo sanguneo glomerular e da resistncia queo glomrulo ope a esse fluxo. O primeiro depende dire-tamente da presso arterial sistmica e inversamente daresistncia da arterola aferente.

    Os antiinflamatrios no-hormonais inibem a sntese deprostaglandinas, que so vasodilatadores da arterola afe-rente, promovendo vasoconstrio desta arterola, comconseqente diminuio da presso intraglomerular e daproteinria.

    Nos glomrulos, a angiotensina II induz vasoconstrioda arterola eferente e das clulas mesangiais, levando aoaumento da presso intraglomerular; portanto, quando asua sntese inibida, ocorre diminuio desta presso. Poresse motivo, os inibidores da enzima de converso da an-giotensina I tm sido utilizados como droga antiprotein-rica, com bons resultados.

    Ambos os grupos de drogas citadas podem induzirqueda de filtrao glomerular, que reversvel com a sua

  • captulo 22 405

    retirada. Em pacientes nos quais a filtrao glomerular nose apresenta muito comprometida, essa piora da filtraono deve ser motivo para a suspenso da droga.

    Outro modo de se tentar diminuir a presso intraglome-rular, e com isso a proteinria, o uso de dietas hipoproti-cas, uma vez que essa dieta promove a vasoconstrio daarterola aferente. A sua eficcia na reduo da proteinriaa longo prazo, em seres humanos, ainda discutvel.

    O tratamento do edema deve ser feito preferencialmentecom diurticos de ala. Estes so substncias catinicas, depequeno peso molecular, que aps atingirem a correntesangunea se ligam albumina. No rim eles so captadospelas clulas do tbulo proximal e secretados para a luztubular, onde vo agir. Na sndrome nefrtica, devido hipoalbuminemia, parte do diurtico que atinge a corren-te circulatria no se liga albumina e se difunde para ointerstcio, diminuindo assim a sua concentrao plasm-tica. Alm disso, na luz tubular ele se liga albumina apresente, inibindo a sua ao.

    Por esses motivos, essas substncias tm menor ao nopaciente com sndrome nefrtica. Assim, prefervel quese administrem altas doses de diurtico de uma s vez, doque pequenas doses vrias vezes ao dia. O fracionamentodas doses s deve ser feito quando a dose total a ser usadanas 24 horas for muito alta. Outro meio para se tentar au-mentar a ao do diurtico administr-lo associado apequenas quantidades de albumina humana. Expansoresde volume tipo albumina, plasma humano ou dextran ra-ramente induzem natriurese nestes pacientes, podendoinduzir hipervolemia; assim, o seu uso deve ser avaliadocautelosamente.

    Outra alterao importante a presena de hipertensoarterial. Na maior parte, seno em todas as glomerulopa-tias, demonstrou-se que o controle da hipertenso arterialexerce influncia positiva na evoluo da nefropatia, inde-pendentemente do anti-hipertensivo utilizado. Assim, ocontrole pressrico rigoroso deve ser um dos objetivos dotratamento.

    A hipertrigliceridemia e a hipercolesterolemia so fato-res de risco para doena cardiovascular em indivduosnormais. Pacientes com sndrome nefrtica apresentammaior risco de infarto agudo do miocrdio ou bito devi-do a evento coronariano, quando comparados a indivdu-os no-nefrticos, do mesmo sexo e idade. O uso de dro-gas antilipmicas nestes casos pode ser benfico, emboraainda discutvel.

    Apesar do tratamento, uma certa percentagem dos pa-cientes portadora de glomerulonefrite evolui para insufi-cincia renal crnica terminal. Nestes casos a principal te-raputica preconizada o transplante renal.

    Recorrncia da glomerulopatia de base ou desenvolvi-mento de uma nova glomerulonefrite (glomerulonefrite denovo) pode ocorrer em 1 a 2% dos pacientes transplanta-dos. Raramente, em cerca de 1 a 5% dos casos, estas glo-merulopatias podem levar perda do enxerto.

    Diagnstico da GlomerulonefriteA suspeita clnica de glomerulonefrite geralmente

    bastante fcil. A principal queixa do paciente de edemaacompanhado ou no de hipertenso arterial e hematria.Sinais e sintomas de insuficincia cardaca secundria ahipervolemia (dispnia, hepatomegalia, estase jugular) ede uremia (perda de peso, fraqueza, anorexia, anemia,nuseas, vmitos etc.) podem estar presentes.

    O diagnstico de leso glomerular se faz principalmen-te atravs do exame de urina. Assim, proteinria umaalterao praticamente obrigatria em todo paciente comglomerulopatia. Cilindros hemticos e hemcias dismr-ficas, quando presentes, so altamente sugestivos de lesoglomerular. A presena de leuccitos e cilindros leucoci-trios comum, principalmente nos pacientes que apresen-tam reao exsudativa nos glomrulos.

    O diagnstico diferencial entre as diferentes glomeru-lopatias ser discutido no final do captulo.

    GLOMERULONEFRITE PS-ESTREPTOCCICA

    A glomerulonefrite ps-estreptoccica pode ocorrer es-poradicamente na forma epidmica, porm, mais fre-qente em casos isolados. Acomete mais pacientes do sexomasculino, com idade variando entre 2 e 6 anos, podendono entanto incidir em qualquer faixa etria.

    Usualmente o aparecimento do quadro clnico prece-dido em 7 a 21 dias por escarlatina, ou infeco de viasareas superiores ou por piodermite provocada por estrep-tococos, principalmente alguns tipos do grupo A deLancefield e mais raramente do grupo C.

    A apresentao clnica bastante varivel, sendo des-critos desde quadros totalmente assintomticos com dis-cretas alteraes urinrias, at pacientes com insuficinciarenal grave.

    Em estudos epidemiolgicos tem sido demonstrado quepara cada caso sintomtico existem pelo menos quatro ca-sos assintomticos. Comumente o paciente apresenta apa-recimento sbito de edema, hematria macroscpica e hi-pertenso arterial, e eventualmente dor lombar referida.O edema geralmente pr-tibial e/ou palpebral e de peque-na intensidade. A hipertenso arterial geralmente leve.Quando a hematria intensa, o paciente pode apresentarqueixa de disria. Raramente, dependendo do tempo emque o paciente procura atendimento mdico e da gravida-de da glomerulonefrite, o paciente pode apresentar sinaisde hipervolemia grave, tais como crise hipertensiva, convul-ses e edema agudo de pulmo. A funo renal, quandoavaliada pela creatinina plasmtica, geralmente se apresentanormal ou discretamente alterada. Pacientes com insufici-ncia renal grave freqentemente apresentam formao decrescentes e/ou necrose tubular aguda associada.

  • 406 Glomerulonefrites Primrias

    Laboratorialmente observa-se o aparecimento de marca-dores de infeco pregressa por estreptococos, tais como an-tiestreptolisina O, anti-hialuronidase, antiestreptoquinase etc.Esses marcadores esto presentes em pacientes que tiveraminfeco estreptoccica, tenham eles glomerulonefrite ou no.O exame de urina revela hematria, com hemcias dismrfi-cas, cilindros hemticos, leucocitria e cilindros leucocitri-os. A proteinria de 24 horas em 90% dos casos menor que3 g. O consumo de complemento pode ser evidenciado peladiminuio de CH50 e C3 em praticamente 100% dos casos.Essa reduo transitria e normalmente desaparece entrequatro semanas e trs meses aps o incio do quadro.

    A maior parte dos pacientes apresenta remisso dos si-nais e sintomas duas a trs semanas aps o incio do qua-dro, porm, hematria microscpica mais freqentemen-te, e proteinria discreta, mais raramente, podem levarvrios meses para desaparecer, sem que isso tenha algumsignificado prognstico.

    Estudos de longo prazo tm demonstrado que a glome-rulonefrite ps-estreptoccica raramente deixa seqelas.Porm, em pequena percentagem de pacientes, principal-mente adultos, tem sido observada a presena de discre-tos sinais de acometimento renal 10 a 15 anos aps o surtoinicial. Insuficincia renal grave como seqela tem sidodescrita muito raramente.

    Anatomia Patolgica microscopia tica (MO), a leso glomerular difusa,

    com todos os glomrulos atingidos igualmente. Estes sograndes, hipercelulares e isqumicos; a luz capilar apresen-ta-se estreitada e s vezes at completamente obstruda(Fig. 22.1). Existe aumento de celularidade, devido princi-palmente infiltrao de polimorfonucleares, nos casosonde a bipsia realizada precocemente; porm, na mai-or parte das vezes, a hipercelularidade mesngio-endo-telial, devido proliferao das clulas residentes e infil-trao de clulas mononucleares, provavelmente monci-tos circulantes. Alm destes achados, nos casos onde exis-te oligria intensa ou anria, ou ainda importante quedada filtrao glomerular, podem ser observados crescentescelulares e/ou necrose tubular aguda associada. micros-copia eletrnica (ME), observa-se expanso e hipercelulari-dade mesangiais. O achado mais caracterstico a presenade depsitos subepiteliais de tamanho varivel chamadosde corcovas (humps) (Fig. 22.2). Depsitos eltron-densos sub-endoteliais e mesangiais so vistos freqentemente.

    Na microscopia de imunofluorescncia (MIF) observam-sedepsitos de IgG e/ou C3 em praticamente todos os casos.Depsitos de IgM e IgA so encontrados mais raramente. Opadro dos depsitos varivel. Nas bipsias realizadas maisprecocemente, IgG e C3 localizam-se tanto ao longo das alascapilares como no mesngio (Fig. 22.3); em casos onde a bip-sia realizada mais tardiamente, observa-se que os depsitosse localizam no mesngio. Outro aspecto descrito o de de-

    psitos granulares contnuos ao longo da membrana basal,acompanhado de poucos depsitos mesangiais. Este ltimoaspecto parece estar relacionado com mau prognstico.

    EtiopatogeniaO estudo da etiopatogenia da glomerulonefrite ps-es-

    treptoccica tem-se baseado nas seguintes observaes: 1)apenas algumas cepas dos estreptococos so nefritognicase 2) nem todos os indivduos infectados por estas cepasdesenvolvem a doena, e portanto podemos deduzir que,

    Fig. 22.1 Glomerulonefrite ps-estreptoccica: Glomrulo volu-moso, hipercelular, com infiltrado neutroflico. (Microscopia ti-ca, aumento original 400.)

    Fig. 22.2 Grande depsito subepitelial em forma de corcova(hump) em paciente com glomerulonefrite ps-estreptoccica.(Microscopia eletrnica, aumento original 27.500.)

  • captulo 22 407

    para o aparecimento desta nefrite, so necessrios tanto apresena de cepa nefritognica como de resposta imuneespecfica do paciente.

    O tempo de latncia entre a infeco e a doena, a associ-ao com a infeco estreptoccica, a presena de imuno-complexos circulantes, de depsitos imunes no mesngio ena regio subepitelial sugerem que a glomerulonefrite ps-estreptoccica seja decorrente da interao de anticorposantiestreptococos com antgenos deste germe. Apesar deintensa procura, o antgeno ou antgenos componentes doimunocomplexo ainda no foram identificados.

    Ainda no est estabelecido se a leso renal resultadode deposio de imunocomplexo circulante ou da ligaode antgenos estreptoccicos ao rim com subseqente for-mao de imunocomplexo in situ.

    Alguns estudos que tm procurado confirmar a teoriaauto-imune propem a existncia de reatividade cruzadaentre anticorpos contra antgenos da cpsula do estrepto-coco, os quais se ligariam aos antgenos normalmente pre-sentes nas estruturas glomerulares.

    Outra teoria recente sugere que uma IgG sofreria mo-dificaes, tornando-se imunognica e desenvolvendo umaafinidade pelo glomrulo normal, onde se depositaria, ser-vindo como um antgeno plantado.

    Seja qual for o mecanismo envolvido na formao dosdepsitos glomerulares na glomerulonefrite ps-estrepto-ccica, a resposta inflamatria responsvel pela instalaoda leso nefrtica conseqncia da ativao do comple-mento, da liberao de fatores quimiotticos e do recruta-mento de neutrfilos.

    TratamentoO tratamento basicamente sintomtico, visando dimi-

    nuir a sobrecarga hidrossalina. Neste sentido, o uso de

    dieta hipossdica e de diurticos de ala geralmente su-ficiente. Raramente se faz necessrio o uso de anti-hiper-tensivos, uma vez que normalmente a presso arterial senormaliza com o uso das medidas acima. Quando o com-prometimento da funo renal intenso, ou o pacienteapresenta complicaes de hipervolemia tais como edemaagudo de pulmo e convulses, a dilise deve ser indica-da, desde que os diurticos no tenham sido eficazes. O tra-tamento da estreptococcia deve ser feito quando ela aindaestiver presente. Como a incidncia de recidiva pequenae como um novo surto de glomerulonefrite no piora o prog-nstico, o uso de tratamento profiltico no est indicado.

    Pontos-chave:

    Glomerulonefrite ps-estreptoccica

    Incio abrupto Acomete geralmente crianas Secundria a cepas nefritognicas do

    estreptococo Apresentao: Edema, hematria e

    hipertenso arterial Leso glomerular homogeneamente difusa,

    com exsudao leucocitria ehipercelularidade, e presena de depsitossubepiteliais (humps) e mesangiais

    Tratamento sintomtico, no sendoindicada teraputica profilticaposteriormente

    GLOMERULONEFRITECRESCNTICA

    Sinonmia: Glomerulonefrite proliferativa extracapilar ou glome-rulonefrite rapidamente progressiva.

    Dependendo do mecanismo etiopatognico, a glomeru-lonefrite crescntica (GNCresc) pode ser dividida em trstipos. No tipo I a leso glomerular mediada por anticor-po antimembrana basal; no tipo II, por deposio de imu-nocomplexo circulante; e no tipo III (pauciimune) aagresso conseqente a uma reao de hipersensibilida-de celular.

    A apresentao clnica semelhante nos trs tipos. Ge-ralmente o paciente apresenta quadro de instalao agu-da, com edema e hematria macro- ou microscpica. Hi-pertenso arterial quando presente leve. Em alguns pa-cientes a presena de sndrome nefrtica a nica mani-festao clnica. Sinais gerais como febre, dor musculardiscreta e dor articular no so incomuns. Oligria acen-tuada ou anria, e aumento rpido da creatinina, so si-nais que sugerem o diagnstico de GNCresc.

    Fig. 22.3 Deposio de complemento (C3) em ala capilar e emmesngio, em padro granular, em paciente com glomerulone-frite ps-estreptoccica. (Microscopia de imunofluorescncia,aumento original 400.)

  • 408 Glomerulonefrites Primrias

    Hematria com cilindros hemticos e proteinria inten-sa so achados freqentes. Apesar da possvel ocorrnciade proteinria macia, hipoalbuminemia e hipercolestero-lemia so raras, provavelmente devido curta durao dadoena.

    A creatinina plasmtica geralmente se apresenta eleva-da j na primeira consulta, podendo, no entanto, estar nor-mal. A evoluo da funo renal depende do nmero etamanho dos crescentes observados (v. Anatomia patol-gica). Pacientes com crescentes circulares em 80 a 100% dosglomrulos geralmente evoluem em poucas semanas oumeses para insuficincia renal terminal. Pacientes com le-ses menos intensas podem levar alguns anos para neces-sitar de tratamento dialtico.

    Embora as manifestaes renais sejam semelhantes nostrs tipos, alguns dados podem ajudar no diagnstico di-ferencial. No tipo I os pacientes so jovens, no tipo II ouIII os pacientes so de meia idade ou mais velhos. Em re-lao ao sexo, na GNCresc tipo III existe predomnio dosexo masculino, enquanto nas outras duas no existe di-ferena.

    Na GNCresc tipo I alguns pacientes referem inalao devapor de hidrocarbonetos, ou infeco inespecfica de viasareas superiores antecedendo o aparecimento da nefro-patia, o que no acontece nos outros dois tipos.

    A presena de anticorpo circulante antimembrana ba-sal glomerular sugere tipo I, diminuio de C3 e CH50 eimunocomplexos circulantes so mais freqentes no tipoII, e anticorpos antiantgenos citoplasmticos de neutrfilos(ANCA) ocorrem em aproximadamente 80% dos pacientes comGNCresc tipo III.

    Anatomia PatolgicaA GNCresc caracteriza-se pela presena de vrias cama-

    das de clulas, que preenchem o espao de Bowman assu-mindo forma de meia-lua (crescentes celulares) (Fig. 22.4).Nos casos onde a bipsia realizada mais tardiamente, asclulas so progressivamente substitudas por tecido co-lgeno, o que d ao crescente aspecto fibrocelular e final-mente fibroso. Experimentalmente tem sido demonstra-do que a sntese de tecido colgeno tem incio j nas pri-meiras 24 horas aps a induo da nefropatia, o que expli-ca a presena, em uma mesma bipsia, de crescentes comgraus variveis de fibrose.

    A presena de crescentes, embora caracterstica, no patognomnica. Crescentes tm sido descritos em pratica-mente todas as glomerulopatias. Dentre estas, alm daGNCresc, as glomerulonefrites ps-estreptoccica, mem-branoproliferativa tipo II e por IgA so as que mais fre-qentemente podem apresent-los.

    O crescente resultado da proliferao das clulas epi-teliais da cpsula de Bowman e da infiltrao de clulascirculantes como macrfagos e linfcitos T. Quando existeruptura da cpsula de Bowman, existe predomnio das

    clulas infiltrantes (macrfagos, linfcitos T e fibroblastos)sobre as clulas epiteliais.

    Rupturas da membrana basal do glomrulo e da cpsulade Bowman e compresso do tufo capilar pelos crescentes sooutras alteraes encontradas microscopia tica. A presen-a de fenmenos exsudativos faz suspeitar do diagnstico deglomerulonefrite ps-estreptoccica. Em casos mais avana-dos, podem-se encontrar glomrulos obsolescentes.

    Ao microscpio eletrnico, observam-se solues decontinuidade da membrana basal tanto do glomrulo comoda cpsula de Bowman e deposio de fibrina no espaode Bowman. No tipo II observa-se presena de depsitoseltron-densos mesangiais e no espao subendotelial. NasGNCresc tipos I e III os depsitos esto ausentes.

    A diferenciao entre os trs tipos de GNCresc se faz,basicamente, atravs da microscopia de imunofluorescn-cia. O aspecto tpico da GNCresc tipo I a deposio line-ar de IgG (raramente IgA) e complemento ao longo damembrana basal glomerular. Na GNCresc tipo II observa-se deposio de IgG e/ou IgM comumente associada a C3,em padro granular ao longo da membrana basal glome-rular e no mesngio. A imunofluorescncia do tipo III negativa ou apresenta apenas traos de imunoglobulinase complemento. A presena de fibrina no espao deBowman comum aos trs tipos.

    EtiopatogeniaA formao dos crescentes pode ser mediada por trs

    mecanismos diferentes: reao antgeno-anticorpo in situ(anticorpo antimembrana basal glomerular, GNCresc tipoI), deposio de imunocomplexos circulantes (GNCresctipo II) e alteraes da imunidade celular (GNCresc tipoIII ou glomerulonefrite pauciimune).

    Fig. 22.4 Crescente celular, em forma de semilua, em pacienteportador de glomerulonefrite crescntica. (Microscopia tica,aumento original 400.)

  • captulo 22 409

    No tipo I foi demonstrada a presena de anticorpos con-tra antgenos da membrana basal glomerular. Estes anti-corpos geralmente reagem tambm contra membrana ba-sal alveolar. Como alguns casos apresentam associaocom aspirao de vapores de hidrocarbonetos, tem sidoproposto que a leso pulmonar liberaria antgenos damembrana basal alveolar, que ao entrarem em contato comas clulas imunocompetentes dariam origem produode anticorpos que iriam se ligar membrana basal glome-rular provocando a glomerulonefrite.

    A membrana basal glomerular recoberta por endot-lio fenestrado, enquanto o endotlio pulmonar no apre-senta essas fenestraes. Isto facilita o contato dos anticor-pos circulantes com os antgenos presentes na membranabasal glomerular, o que explica por que a leso renal ocor-re na ausncia de leso pulmonar. A existncia de lesopulmonar associada leso glomerular caracteriza a sn-drome de Goodpasture.

    No tipo II a presena de imunocomplexo no plasma ena membrana basal glomerular sugere que esta leso sejamediada pela deposio de imunocomplexos circulantes,embora o(s) antgeno(s) no tenha(m) sido identificado(s).

    A ocorrncia de anticorpos anticitoplasma de leucci-tos (ANCA) e a imunofluorescncia glomerular negativa,levou alguns autores a proporem que a GNCresc tipo IIIpoderia ser na verdade uma arterite sistmica (principal-mente a granulomatose de Wegener), que por algum mo-tivo desconhecido ficaria restrita ao rim.

    Apesar de os mecanismos de leso da membrana basalglomerular serem diferentes nos trs tipos, a patognesedos crescentes no difere entre eles.

    Inicialmente ocorre ruptura da membrana basal glo-merular, o que permite a passagem de fibrinognio parao espao de Bowman. O fibrinognio a localizado sepolimeriza e d origem fibrina, e esta vai estimular a pro-liferao das clulas epiteliais da cpsula de Bowman e ainfiltrao de clulas sanguneas (linfcito T, macrfagose fibroblastos). Alm disso, a fibrina serve como arcabouo paraa formao do crescente. Posteriormente os fibroblastos presen-tes nos crescentes passam a sintetizar colgeno, o que vaitransformar o crescente celular em crescente fibroso.

    TratamentoO tratamento das glomerulonefrites crescnticas difere

    de grupo para grupo, porm nos trs grupos o tempo quese demora em instituir o tratamento fator primordial naresposta teraputica, o que torna o diagnstico da GNCrescum procedimento de urgncia.

    Nos pacientes com GNCresc tipo I o uso de plasmaf-rese associado a drogas citotxicas (ciclofosfamida ou aza-tioprina) e corticide tem dado bons resultados, desde queinstitudo precocemente. No tipo II vrios esquemas tera-puticos tm sido propostos, sendo que o uso de trs aquatro pulsos de metilprednisolona (1 g intravenosa, du-

    rante trs ou quatro dias consecutivos), seguido de pred-nisona oral, parece apresentar resultados efetivos, pormo nmero de trabalhos controlados muito pequeno. O usode imunossupresso mais intensa no parece associar-secom melhora de funo renal, mas aumenta em muito amorbidade.

    Na GNCresc tipo III tanto o pulso de metilprednisolo-na como a ciclofosfamida por via oral tm sido propostos.A tendncia atual de se usar ciclofosfamida, porm a viaa ser utilizada ainda discutvel.

    Glomerulonefrite Crescntica eTransplante

    A recorrncia de glomerulonefrite antimembrana basalglomerular (tipo I) em rins transplantados de aproxima-damente 2%, sendo na maioria dos casos apenas histol-gica, e a perda do enxerto secundria a esta glomerulopa-tia rara. Quanto s GNCresc tipos II e III, existem poucosdados na literatura, porm a recorrncia parece ser rara.

    Pacientes portadores de sndrome de Alport, quandotransplantados, podem raramente desenvolver GNCresctipo I no enxerto. Estes indivduos apresentam deficinciada cadeia 3 do colgeno tipo IV, o antgeno contra o qualos anticorpos antimembrana basal glomerular respons-veis pelo desencadeamento da GNCresc tipo I so dirigi-dos. Quando estes pacientes entram em contato com estasubstncia, presente no enxerto, reconhecem-na como no-prpria e produzem anticorpos, desenvolvendo assim aglomerulonefrite crescntica tipo I de novo.

    Pontos-chave:

    Instalao aguda Idade: Tipo I, jovens; II e III, meia idade Sexo: Tipo III, predominncia no sexo

    masculino Clnica: Edema, hematria e sinais gerais

    inespecficos Dados laboratoriais: Aumento rpido da

    creatinina plasmtica, hematria eproteinria

    MO: Presena de crescentes celulares noespao de Bowman

    MIF: Padro linear (tipo I); padro granular(tipo II) ou ausncia de depsitosfluorescentes (tipo III)

    Tratamento: Tipo I, plasmafrese,corticide e drogas citotxicas; Tipo II,pulso de metilprednisolona seguido deprednisona oral; Tipo III, pulso deciclofosfamida

  • 410 Glomerulonefrites Primrias

    NEFROPATIA POR IgASinonmia: Nefropatia de Berger

    A nefropatia de Berger apresenta incidncia varivelatravs do mundo, sendo a nefropatia mais comum na siae Europa. Nos Estados Unidos ela apresenta menor pre-valncia. Se essa diferena reflete apenas diferenas quan-to indicao de bipsia ou real, no est ainda estabele-cido. Ela ocorre em qualquer faixa etria, sendo incomumem pacientes com idade inferior a 10 anos e superior a 50anos; a idade mdia gira em torno dos 20 a 30 anos. Existepredomnio do sexo masculino de aproximadamente 3:1. incomum na raa negra.

    A apresentao clnica mais comum a de surtos de he-matria macroscpica, ou microscpica associada a infec-es inespecficas de vias areas superiores ou ao exercciofsico. Freqentemente o paciente apresenta quadro de mal-estar generalizado, com dores musculares discretas, acom-panhado de disria. Mais raramente, pode apresentar sn-drome nefrtica. Hipertenso arterial ocorre em torno de10% dos casos. A funo renal, quando avaliada pela creati-nina plasmtica, apresenta-se normal. Laboratorialmenteobservam-se hematria, caracterizada por hemcias dismr-ficas e/ou cilindros hemticos, e proteinria em torno de 1a 2 g nas 24 horas. Elevao da IgA plasmtica ocorre em50% dos casos. Bipsia de pele do antebrao revela que 25 a50% dos pacientes apresentam deposio de IgA, C3 e fibri-na nos capilares da derme.

    No seguimento observam-se surtos de hematria ma-croscpica e nos perodos entre surtos comum o pacien-te apresentar proteinria discreta e hematria microscpi-ca. Insuficincia renal aguda transitria, associada a hema-tria macroscpica, tem sido descrita raramente.

    O comprometimento da funo renal nestes pacientes muito varivel. Na maior parte a funo renal se mantmnormal. Outros podem apresentar queda lenta e progres-siva da filtrao glomerular. Aps 20 anos de seguimentoobserva-se que entre 20 e 30% dos casos desenvolvem in-suficincia renal crnica. Pacientes com surtos de hemat-ria macroscpica costumam apresentar funo renal est-vel, enquanto aqueles com sndrome nefrtica persisten-te, ou glomrulos esclerosados vistos bipsia renal, evo-luem mais freqentemente para insuficincia renal.

    Anatomia PatolgicaO aspecto microscopia tica bastante varivel. O mais

    comumente descrito o de proliferao de clulas mesan-giais com expanso da matriz. Estas alteraes tanto po-dem ser difusas como focais. Algumas vezes observa-seacentuao focal e segmentar da proliferao celular. Emcasos mais avanados, pode-se observar a presena de es-clerose glomerular focal e segmentar. Raramente crescen-

    tes celulares podem ser observados. Alguns pacientes apre-sentam glomrulos normais. A anlise ao microscpio ele-trnico revela a existncia de depsitos eltron-densosprincipalmente no mesngio e regio paramesangial. De-psitos subendoteliais tambm podem ser encontrados.Nos casos onde a bipsia foi realizada aps surto de hema-tria macroscpica, possvel encontrar depsitos subepi-teliais com aspecto semelhante a corcovas (humps), iguais aosobservados na glomerulonefrite ps-estreptoccica.

    Por definio, encontra-se na microscopia de fluorescn-cia deposio mesangial de IgA, de padro granular, que sempre a imunoglobulina predominante (Fig. 22.5). Esta podeestar isolada ou, mais freqentemente, associada com dep-sitos de IgG e C3. IgM, C1q e C4 raramente so encontradas.

    EtiopatogeniaPacientes portadores de nefropatia por IgA apresentam

    aumento dos nveis sricos desta imunoglobulina, quepoderia ser conseqente quer do aumento de sua sntesepor linfcitos presentes nas mucosas ou circulantes, querpela diminuio de sua depurao heptica e/ou esplni-ca. Outra alterao freqentemente descrita a presenade imunocomplexos circulantes.

    A hiptese mais aceita atualmente a de que esta ne-fropatia decorrente da deposio renal dos imunocom-plexos circulantes. A demonstrao de que animais imu-nizados por via oral, com diferentes antgenos, desenvol-vem deposio mesangial de IgA, e a presena de antge-nos dietticos nos imunocomplexos circulantes, levanta apossibilidade de que os antgenos poderiam ser originri-os da dieta. Outras possveis fontes de antgenos sugeri-das tm sido as infeces virais, como por exemplo a in-feco por citomegalovrus.

    Outro mecanismo aventado que esta nefropatia depen-da da deposio mesangial de agregados de IgA, sem in-

    Fig. 22.5 Deposio de mesangial de IgA, em padro granular,em paciente portador de nefropatia por IgA. (Microscopia deimunofluorescncia, aumento original 400.)

  • captulo 22 411

    terao com antgenos. Esta hiptese reforada pela de-monstrao de que agregados de IgA so capazes de fixarcomplemento, o que explicaria a presena de C3 no tecidorenal. No entanto, no explicaria a deposio de outrasimunoglobulinas que so normalmente encontradas.

    Frente sua semelhana histolgica com a nefropatia ob-servada na prpura de Henoch-Schnlein, vrios autores tmproposto que ambas seriam a mesma doena. Na viso des-tes, a prpura de Henoch-Schnlein poderia manifestar-seclinicamente de diferentes modos, sendo um deles apenascom leso renal, o que corresponderia nefropatia por IgA.

    TratamentoNa maior parte das vezes o tratamento apenas sintom-

    tico. Vrios esquemas com drogas citotxicas ou corticoste-rides tm sido utilizados sem resultados positivos. O usode fenitona foi capaz de diminuir o nvel srico da IgA,porm no alterou a histria natural da nefropatia. Em pa-cientes que apresentam proteinria macia, com o rim nor-mal microscopia tica, o uso de corticosterides tem-seassociado com remisso da sndrome nefrtica.

    O uso de dietas com pequena quantidade de antgenos outro enfoque teraputico que vem sendo tentado. Empacientes com rpido declnio de funo renal, o uso dealtas doses de IgG humana tem sido proposto.

    Mais recentemente tem-se preconizada a utilizao deleo de peixe, rico em cidos graxos mega-3 eicosapenta-enico e decosaexaenico, no tratamento desta nefropatiaassociada a dficit de funo renal e/ou sndrome nefrti-ca, com resultados promissores mas ainda no conclusivos.

    Nefropatia por IgA e TransplanteA recorrncia da nefropatia por IgA em rins transplan-

    tados varia nas diversas sries entre 25 e 50% dos casos. Aapresentao clnica da recidiva, na maioria das vezes,

    manifesta-se com hematria macro- ou microscpica, sen-do que a presena de sndrome nefrtica rara. O diagns-tico feito geralmente no primeiro ano ps-transplante, eperda do enxerto devido recorrncia ocorre em menosde 10% dos casos.

    GLOMERULONEFRITEMEMBRANOPROLIFERATIVA

    (GNMP)Sinonmia: Glomerulonefrite hipocomplementmica, glomerulo-nefrite lobular, glomerulonefrite mesangial crnica, glomerulo-nefrite parietoproliferativa, glomerulonefrite mesangiocapilar.Termos mais utilizados: GNMP ou glomerulonefrite mesngio-capilar.

    A glomerulonefrite membranoproliferativa predomi-nantemente doena de indivduos jovens, podendo ocorrer,no entanto, em qualquer faixa etria, sendo que em tornode 70% dos pacientes apresentam idade inferior a 30 anoscom discreta predominncia do sexo feminino (52 a 58%).

    A presena de infeces de vias areas superiores ante-cedendo o aparecimento da GNMP, segundo relatos, va-ria em torno de 40%.

    Sndrome nefrtica na primeira consulta ocorre entre 40e 70% dos pacientes; em torno de 20% apresentam sndro-me nefrtica aguda; hematria e proteinria assintomti-ca outro modo de essa nefropatia apresentar-se, com fre-qncia variando entre 15 e 30% dos casos. Entre 5 e 10%dos pacientes procuram atendimento mdico devido a he-matria macroscpica recorrente. A sndrome nefrticaaguda ocorre com maior freqncia em indivduos maisjovens.

    A freqncia de hipertenso arterial, conforme algunsestudos, varia entre 40 e 75%, porm os diferentes autorestm definido hipertenso arterial como presso arterialdiastlica superior a 95 ou 100 mm Hg. Como a hiperten-so arterial presente nesta nefropatia geralmente leve, asua freqncia provavelmente est subestimada. Quandose define hipertenso arterial como presso arterial dias-tlica maior que 90 mm Hg como o preconizado, observa-se que 95% dos pacientes so hipertensos.

    Diminuio da filtrao glomerular na primeira consultaocorre entre 40 e 60% dos casos, sendo que entre 10 e 25%apresentam depurao da creatinina endgena inferior a40 ml/min ou creatinina srica superior a 5 mg/dl. Paci-entes com insuficincia renal grave na primeira consultadevem ser estudados no sentido de excluir outras causas,que no a leso glomerular, como responsvel pela quedada filtrao glomerular, como por exemplo necrose tubu-lar aguda associada.

    Insuficincia renal na primeira consulta ocorre mais fre-qentemente em pacientes com idade superior a 15 anos,

    Pontos-chave:

    Nefropatia por IgA

    Maior prevalncia na sia e Europa Acomete pacientes jovens, geralmente do

    sexo masculino Secundria deposio renal de

    imunocomplexos circulantes Apresentao: Surtos de hematria macro-

    ou microscpica associados a infeces viraisdo trato respiratrio ou a exerccio fsico

    MO: Varivel, com deposio predominantede IgA em mesngio imunoflorescncia

    Tratamento: leo de peixe (?), corticide (?)

  • 412 Glomerulonefrites Primrias

    associa-se a hipertenso arterial e no tem relao com apresena de sndrome nefrtica ou com o tipo da GNMP.Correlaciona-se com as alteraes do interstcio e no comas glomerulares.

    Uma das caractersticas mais importantes dessa leso a hipocomplementemia, principalmente devido queda deC3. A freqncia com que ocorre esta hipocomplemente-mia varivel de acordo com o tipo histolgico. Quandose analisa a GNMP como um todo se observa queda do C3srico em torno de 40 a 60% dos casos. Na GNMP tipo II,hipocomplementemia ocorre em torno de 70 a 90% dospacientes. Este achado importante para o diagnstico,porque as outras patologias que cursam com sndromenefrtica geralmente apresentam nvel srico de C3 normal.

    A histria natural dessa doena varivel, porm a mai-or parte dos pacientes apresenta queda progressiva da fun-o renal. Remisso completa da sndrome nefrtica ocor-re, segundo relatos, entre 2 e 10% dos casos, e remisso par-cial e transitria, em torno de um tero dos pacientes.

    A sobrevida renal cinco anos aps o diagnstico temvariado entre 51 e 75% e em 10 anos, entre 36 e 65%. Emcrianas, McEnery observou sobrevida renal de 80% aps10 anos de seguimento. Este melhor prognstico para cri-anas, no entanto, no tem sido observado por outros au-tores.

    As principais alteraes que, quando presentes na pri-meira consulta, indicam mau prognstico so: insuficin-cia renal, hipertenso arterial, sndrome nefrtica, presen-a de crescentes e de leso tbulo-intersticial. Recentemen-te, foi relatado que pacientes com sndrome nefrtica apre-sentam pior prognstico apenas nos primeiros anos deseguimento, porm, aps um seguimento mdio de 12anos, o prognstico semelhante, quer o indivduo apre-sente ou no sndrome nefrtica.

    A atividade da doena, assim como a evoluo do paci-ente para insuficincia renal, no influenciada pela pre-sena de hipocomplementemia ou pelo tipo da GNMP.

    Anatomia PatolgicaDe acordo com o achado anatomopatolgico, a GNMP

    pode ser classificada em GNMP tipos I, II ou III; o tipo IIItem sido considerado, por alguns autores, como variantedo tipo I.

    microscopia tica, a GNMP tipo I caracteriza-se pelapresena de hipercelularidade glomerular, expanso damatriz mesangial e duplicao da membrana basal glome-rular. A hipercelularidade devida principalmente pro-liferao mesngio-endotelial, porm, em alguns casos,pode ser encontrada tambm infiltrao glomerular depolimorfonucleares. Quando a proliferao celular e a ex-panso da matriz mesangial so muito intensas, ocorreacentuao do carter lobular dos glomrulos, que assu-mem o aspecto da assim chamada glomerulonefrite lobu-lar (Fig. 22.6).

    Quando os glomrulos so corados por sais de prata,observa-se que a membrana basal glomerular apresenta-se como duas linhas pretas, separadas por zona clara, o qued aspecto de duplicao (Fig. 22.7), que geralmente fo-cal e, freqentemente, envolve apenas segmentos das al-as capilares. Esta duplicao decorrente da presena dedepsitos imunes subendoteliais, que afastam o endotlioda membrana basal capilar; o endotlio neoforma umaoutra membrana basal, assim como o mesngio se inter-pe neste espao para fagocitar os depsitos.

    Crescentes pequenos podem ser vistos com certa fre-qncia; crescentes circunferenciais podem estar presen-tes em torno de 10 a 20% dos casos.

    Fig. 22.6 Acentuao da lobulao glomerular, aumento de celu-laridade e espessamento de membrana basal glomerular em pa-ciente com glomerulonefrite membranoproliferativa. (Microsco-pia tica, aumento original 400.)

    Fig. 22.7 Focos de duplicao da membrana basal glomerular empaciente portador de glomerulonefrite membranoproliferativatipo I. (Microscopia tica, impregnao pela prata, aumento ori-ginal 400.)

  • captulo 22 413

    Ao microscpio eletrnico, observa-se que a imagem deduplicao da membrana basal glomerular decorrente daexistncia de membrana basal glomerular normal e de umanova membrana basal formada imediatamente abaixo dasclulas endoteliais. Entre essas duas membranas existemprolongamentos da clula mesangial, citoplasma da clu-la endotelial e depsitos eltron-densos. Estes geralmenteso pequenos ou intermedirios e se localizam no espaosubendotelial; pequenos depsitos mesangiais podem tam-bm ser vistos, principalmente na fase inicial da doena(Fig. 22.8). Outras alteraes observadas so a presena deexpanso da matriz mesangial e aumento da celularidade,principalmente custa de clulas mesangiais. Alm des-sas alteraes, alguns pacientes apresentam depsitossubepiteliais e espculas da membrana basal. Estas altera-es so vistas na GNMP tipo III. Em alguns pacientes comGNMP tipo I observam-se tambm ruptura e replicao dalmina densa e presena de grandes depsitos ocupandotoda a membrana basal. imunofluorescncia observa-sedeposio de imunoglobulinas, principalmente IgG e IgM.Deposio de C3 se encontra praticamente em 100% doscasos, C1q e C4 so encontrados menos freqentemente.Estes depsitos localizam-se na membrana basal glomeru-lar e no mesngio (Fig. 22.9).

    As leses observadas ao microscpio tico, na GNMPtipo II, so muito semelhantes s observadas no tipo I,porm a duplicao da membrana basal glomerular maisrara, e crescentes circunferenciais podem ser observadosmais freqentemente. O aspecto da microscopia eletrni-ca caracterstica desta leso a deposio linear, na lmi-na densa, de uma substncia com eltron-densidade vri-as vezes maior que os componentes normais da membra-

    na basal glomerular (Fig. 22.10). Algumas vezes, a maiorparte da lmina densa pode estar envolvida, outras vezesexiste alternncia de segmentos normais com segmentosalterados. Devido a tais depsitos na membrana basalglomerular, este tipo de GNMP tambm denominado deDoena dos Depsitos Densos (DDD). Depsitos idnticostm sido vistos tanto na cpsula de Bowman como na mem-brana basal tubular. Alm dos depsitos, expanso da ma-triz mesangial e hipercelularidade tambm esto presentes.

    Deposio de complemento ocorre em praticamente100% dos casos e de imunoglobulinas ocorre menos fre-qentemente, tanto na membrana basal glomerular como

    Fig. 22.8 Interposio de clula mesangial (M), duplicao demembrana basal e depsitos subendoteliais (seta) em pacienteportador de glomerulonefrite membranoproliferativa tipo I. (Mi-croscopia eletrnica, aumento original 8.000.)

    Fig. 22.9 Deposio granular de IgG ao longo da membrana ba-sal glomerular e na regio mesangial em paciente portador deglomerulonefrite membranoproliferativa. (Microscopia de imu-nofluorescncia, aumento original 400.)

    Fig. 22.10 Deposio linear de material eltron-denso ao longo damembrana basal glomerular em paciente portador de glomeru-lonefrite membranoproliferativa tipo II. (Microscopia eletrnica,aumento original 10.000.)

  • 414 Glomerulonefrites Primrias

    no mesngio. Na membrana basal, os depsitos tm aspec-to varivel, como granular, linear, pseudolinear, rugoso enodular. No mesngio, ocorre deposio sob a forma degrnulos esparsos que podem ou no ser confluentes. Den-tre os vrios componentes do sistema complemento, dep-sitos de C3 ocorrem em praticamente 100% dos casos, omesmo acontecendo com a properdina; os componentesiniciais do sistema complemento (C1q e C4) raramenteesto presentes.

    EtiopatogeniaA patogenia da GNMP ainda obscura, principalmen-

    te a da GNMP tipo II.A presena de depsitos de imunoglobulinas e comple-

    mento no espao subendotelial e no mesngio, as alteraesdo sistema complemento e o relato de que pacientes porta-dores de infeces crnicas, neoplasias e colagenoses apresen-tam leso histolgica semelhante so observaes que suge-rem que a GNMP tipo I poderia ser mediada pelo sistemaimune, provavelmente pela deposio renal de imunocom-plexos circulantes. Esta hiptese reforada pela demonstra-o de que coelhos tratados com inoculaes repetidas deovoalbumina podem desenvolver este tipo de nefrite.

    No entanto, na GNMP tipo II a participao do sistemaimune na sua gnese bastante controvertida. Os depsi-tos observados neste tipo tm aspecto peculiar, no sendoobservado em outras glomerulopatias humanas aceitascomo mediadas pelo sistema imune. Experimentalmenteno se conseguiu at hoje reproduzir este tipo de depsi-tos com vrias manipulaes do sistema imune.

    Diferentes estudos tm demonstrado que os depsitoseltron-densos no so componentes normais da membra-na basal glomerular nem imunoglobulinas, no so com-plemento e no apresentam tecido colgeno na sua estru-tura. Alguns autores tm proposto que esses depsitosseriam conseqncia de alteraes bioqumicas da mem-brana basal. Se os depsitos no so tpicos de imunocom-plexos, e portanto argumentam contra a participao dosistema imune na gnese da GNMP tipo II, a deposio deimunoglobulinas e complemento no parnquima renal eas alteraes do complemento sugerem a participao destesistema. Uma possibilidade que os depsitos densos se-riam imunocomplexos modificados por alguma respostado hospedeiro.

    Uma das caractersticas da GNMP a presena de hipo-complementemia, que pode ser contnua ou alternar comperodos de normocomplementemia. Nos pacientes comGNMP tipo II, a hipocomplementemia mais freqente e conseqncia principalmente da ativao da via alternati-va. Pacientes portadores de GNMP tipo II apresentam auto-anticorpos circulantes (fator nefrtico-C3) que so capazesde ativar a via alternativa do sistema complemento.

    A importncia destas alteraes na gnese e evoluoda nefropatia no est ainda definida. As observaes de

    que no existe relao entre a hipocomplementemia e aatividade ou prognstico da nefropatia, que a nefrectomiabilateral no altera os nveis sricos dos componentes dosistema complemento e que alguns pacientes apresentamfator nefrtico-C3 e hipocomplementemia sem apresentarnefropatia sugerem no existir relao direta entre as alte-raes do sistema complemento e a GNMP. Alm disso,tem sido demonstrado experimentalmente que a ativaocrnica do sistema complemento no promove nefropatia.

    O sistema complemento participa da defesa do organis-mo contra infeces e tambm importante na solubiliza-o e clareamento de imunocomplexos circulantes. Assimsendo, outra possibilidade que pacientes hipocomple-mentmicos apresentem maior freqncia de infeces oumaior dificuldade de clareamento de imunocomplexos, ouambos, o que facilitaria a deposio de imunocomplexosnos glomrulos, dando origem GNMP. A descrio deque pacientes ou carneiros deficientes em componentes dosistema complemento apresentam maior freqncia deGNMP refora esta hiptese.

    TratamentoVrios tm sido os esquemas propostos para o tratamen-

    to da GNMP, porm a maior parte dos estudos tm sidoretrospectivos, sem grupo controle, o que torna difcil aanlise dos resultados. Estudos no controlados analisan-do a ao dos corticosterides tm apresentado resultadoscontraditrios. Em estudo controlado em que se avaliou aao da corticoterapia sobre a histria natural da GNMPtipo I, no se observaram diferenas entre o grupo que re-cebeu placebo e o grupo tratado.

    Inicialmente, foi proposto que o uso da associao he-parina, corticosterides, ciclofosfamida e dipiridamol di-minua a progresso para insuficincia renal; porm, pos-teriormente foi demonstrado em estudo controlado queesse esquema teraputico, alm de no alterar a evoluonatural, ainda apresentou grande nmero de efeitos cola-terais, obrigando a suspenso do tratamento.

    Estudo prospectivo controlado demonstrou que o usode dipiridamol associado ao uso de aspirina, em pacien-tes adultos com sndrome nefrtica e dficit da funo re-nal, levaram reduo dos nveis de proteinria, porm,o trabalho teve durao muito curta, impedindo a avalia-o da teraputica frente funo renal.

    GlomerulonefriteMembranoproliferativa

    e Transplante RenalA prevalncia de recidiva na GNMP varia de 20 a 30%

    no tipo I e de 70% a 100% dos casos no tipo II, dependen-do da poltica de bipsia de cada servio.

  • captulo 22 415

    O diagnstico de recorrncia feito em mdia 10 a 30meses aps o transplante na GNMP tipo I, e na GNMP tipoII imediato, do ponto de vista histolgico, ocorrendo sn-drome nefrtica em 1/3 dos casos.

    A concentrao do nvel srico de complemento noparece predizer a recorrncia; j a rpida evoluo parainsuficincia renal e a presena de extensos crescentes nosrins primitivos tm-se associado maior freqncia de re-corrncia.

    Pontos-chave:

    Glomerulonefrite membranoproliferativa

    Acomete pacientes jovens GNMP tipos I e III secundria deposio

    renal de imunocomplexos circulantes; tipoII (?)

    Apresentao: Proteinria e hipertensoarterial

    Dados laboratoriais: Queda de C3,hematria microscpica e queda da filtrao

    MO: Hipercelularidade, expanso da matrizmesangial e duplicao da MBG

    A perda do enxerto devido recidiva varia de 10 a 40%na GNMP tipo I e de 10 a 20% na tipo II, ocorrendo princi-palmente nos pacientes com sndrome nefrtica.

    GLOMERULONEFRITE PORLESES MNIMAS

    Sinonmia: Nefrose lipodica ou doena dos processos podlicos.

    A glomerulonefrite por leses mnimas a causa maiscomum de sndrome nefrtica em crianas (80 a 95%) e,em adultos, responde por aproximadamente 25% das ne-fropatias primrias que cursam com sndrome nefrtica.Ocorre principalmente na faixa etria entre 1 e 6 anos,tendo porm sido descrita em todas as idades. Em tornode 70% das crianas acometidas so do sexo masculino.A apresentao clnica clssica a de sndrome nefrticasem hipertenso arterial ou hematria, com funo renalconservada, podendo ser precedida por infeco inespe-cfica de vias areas ou por infeco viral. Hipertensoarterial diastlica pode estar presente em torno de 10%das crianas e 30% dos adultos; a freqncia de hemat-ria microscpica oscila em torno de 30%. A existncia dehematria macroscpica praticamente exclui o diagns-tico de leses mnimas. Geralmente a proteinria maci-a e custa de albumina (proteinria seletiva), acompa-nhada por reduzido nvel srico de albumina e hiperlipi-demia. Na primeira consulta, tem sido relatado que ocorre

    elevao discreta da creatinina, em torno de 25 a 30% doscasos.

    Na evoluo desta nefropatia tem sido descrito raramen-te o aparecimento de surtos de insuficincia renal aguda, queusualmente revertem apenas com uso de diurtico. O meca-nismo dessa insuficincia no claro, porm tem sido pro-posto que ela seria conseqncia da obstruo intratubularpor cilindros proticos ou devido presena de edema intra-renal. Remisso espontnea da sndrome nefrtica tem sidodescrita, porm usualmente a remisso obtida com uso decorticosterides ou drogas citotxicas (v. Tratamento).

    Em torno de 30% dos pacientes apresentam recidiva dasndrome nefrtica, que pode ser desencadeada por infec-o viral, principalmente parotidite epidmica.

    Anatomia Patolgica microscopia tica, observa-se que os glomrulos so

    praticamente normais, podendo, no entanto, apresentardiscreta hipercelularidade mesangial e hipertrofia dospodcitos. Presena de gotculas de lipdios nas clulas dostbulos proximais um achado freqente. microscopiaeletrnica observa-se apenas retrao dos prolongamentosdos podcitos, no se detectando depsitos eltron-densos. microscopia de fluorescncia, no se encontram depsi-tos de imunoglobulinas e/ou complemento.

    As alteraes descritas acima so encontradas em qual-quer situao onde exista proteinria intensa, no sendoem absoluto critrio diagnstico para essa patologia. Odiagnstico anatomopatolgico feito pela ausncia deoutras leses glomerulares, sendo, portanto, um diagns-tico de excluso.

    EtiopatogeniaO desaparecimento da proteinria associada ao uso de

    corticosteride, a associao de recidiva com infeces vi-rais e as alteraes dos linfcitos circulantes encontradas empacientes portadores de glomerulonefrite por leses mni-mas sugerem que esta nefropatia seja decorrente de alteraesdo sistema imune, principalmente da imunidade celular.Como a proteinria nessa leso decorrente somente da per-da de carga eltrica da membrana basal, tem sido propostoque estes pacientes, frente a um estmulo ainda no determi-nado, poderiam produzir linfocinas com cargas positivas, quese ligariam s cargas negativas da membrana basal glomeru-lar, neutralizando-as e dando origem a proteinria.

    Essa hiptese, apesar de atraente, no foi ainda confir-mada.

    TratamentoA resposta teraputica ao corticosteride caracterstica

    da glomerulonefrite por leses mnimas, ocorrendo remis-

  • 416 Glomerulonefrites Primrias

    so completa da sndrome nefrtica em aproximadamente80% dos pacientes e parcial em torno de 10%. Recidiva daglomerulopatia ocorre freqentemente (40 a 50% das vezes).

    O esquema teraputico clssico o de prednisona nadose de 1 a 2 mg/kg/dia durante oito semanas com reti-rada progressiva. Quando durante a reduo da medica-o se observa recorrncia da sndrome nefrtica, deve-seaumentar a posologia para a dose mnima com a qual opaciente se mantm livre de proteinria, com posteriordiminuio da droga. Recorrncias espordicas devem sertratadas do mesmo modo.

    Pontos-chave:

    Glomerulonefrite de leses mnimas

    Acomete principalmente crianas pr-escolares do sexo masculino

    Apresentao: Sndrome nefrtica Dados laboratoriais: Albuminria,

    hipoalbuminemia e hiperlipidemia MO: Normal; MIF: Negativa; ME: Retrao

    dos prolongamentos dos podcitos Tratamento: 1. escolha corticoterapia

    Quando o paciente no responde ao uso de corticoste-rides ou quando as recidivas so muito freqentes, a as-sociao de ciclofosfamida na dose de 2 a 3 mg/kg/dia aoscorticosterides costuma induzir remisses nos pacientesresistentes ou diminuir a freqncia de recidiva. Ciclospo-rina na dose inicial de 4 a 5 mg/kg/dia pode ser tentadaquando houver falhas nas teraputicas anteriores.

    GLOMERULOSCLEROSE FOCALE SEGMENTAR

    A glomerulosclerose focal e segmentar responsvel poraproximadamente 10 a 15% das sndromes nefrticas queocorrem em crianas e em torno de 15 a 20% dos pacientesadultos. Quando se analisa apenas a populao peditri-ca, observa-se que a grande maioria dos casos ocorre empacientes com idade inferior a cinco anos, enquanto napopulao adulta a maior parte dos pacientes apresentasndrome nefrtica antes dos 40 anos de idade. Casos depacientes com idade mais avanada (60-70 anos) tambmtm sido descritos. A maior parte dos trabalhos descrevediscreta predominncia do sexo masculino e da cor negra.

    A apresentao clnica mais comum a de sndrome ne-frtica, porm, em torno de 30% dos pacientes se apresen-tam com hematria e proteinria assintomtica. Hemat-ria macroscpica pode ocorrer principalmente nos casosonde existe proliferao mesangial mais intensa. A insufi-

    cincia renal na primeira consulta ocorre raramente. Hiper-tenso arterial mais freqente em pacientes adultos, prin-cipalmente naqueles com queda de filtrao glomerular.Hematria microscpica ocorre em torno de 30 a 40% dospacientes. Glicosria, aminoacidria, refletindo leso tu-bular, podem ser vistas mais freqentemente do que emoutros quadros de sndrome nefrtica.

    A maioria dos pacientes apresenta queda progressiva defiltrao glomerular e persistncia da sndrome nefrtica.Remisso espontnea da sndrome nefrtica ocorre entre10 e 20%. Pacientes que na primeira consulta apresentamproteinria discreta, via de regra, evoluem para a sndro-me nefrtica. A mortalidade renal em cinco anos oscila emtorno de 30% e em dez anos, em torno de 60%. Quando asndrome nefrtica remite ou nunca esteve presente, ob-serva-se melhor sobrevida renal (90% em 10 anos) do quequando a sndrome nefrtica persistente (45% em 10anos). Em pacientes com proteinria muito intensa ( 10 g)tem sido descrito um curso rapidamente progressivo comevoluo para insuficincia renal em meses ou 1 a 2 anos.

    Anatomia PatolgicaA maior parte dos glomrulos apresenta-se histologica-

    mente normal ou com discreta hipercelularidade mesangial.A doena focal e segmentar porque somente alguns glom-rulos esto alterados (focal), com leses apenas localizadas(segmentar). Assim, em alguns glomrulos, observa-se demaneira segmentar aumento da matriz mesangial, com co-lapso de ala capilar (Fig. 22.11). Estas leses segmentares somais comumente observadas junto ao plo vascular dos glo-mrulos. Em casos mais avanados pode-se observar presenade glomrulos totalmente hialinizados. Acredita-se que os

    Fig. 22.11 Colapso segmentar de alas capilares com expanso dematriz e sinquia com a cpsula de Bowman em paciente porta-dor de glomerulosclerose focal e segmentar. (Microscopia tica;tricmico de Masson; aumento original 400.)

  • captulo 22 417

    glomrulos justamedulares so os mais precocemente atin-gidos. Leses tbulo-intersticiais como dilatao e atrofiatubular e fibrose intersticial, usualmente desproporcionais leso glomerular, podem ser encontradas. A microscopia ele-trnica dos glomrulos normais demonstra podcitos volu-mosos e degenerados, com retrao dos processos podlicos,e usualmente com grandes vacolos intracitoplasmticos.Podcitos desgarrados da membrana basal glomerular sovistos freqentemente, o que leva ao colapso das alas capi-lares glomerulares. A membrana basal apresenta aspectonormal. Nos glomrulos lesados, observa-se aumento dematriz mesangial e colapso capilar. Clulas xantomatosas namatriz mesangial tambm podem ser vistas.

    Os glomrulos normais usualmente so negativos imunofluorescncia, mas ocasionalmente apresentam pe-quena deposio de IgM e C3. Nas reas onde existem le-ses segmentares, observa-se deposio de IgM, C1q e C3,que apresentam aspecto nodular; estes depsitos so inter-pretados como aprisionamento (trapping) de imunorrea-gentes em reas cicatriciais.

    Como leses do tipo esclerose glomerular podem serconseqncia da evoluo de praticamente todas as glome-rulopatias, o achado de glomerulosclerose focal e segmen-tar por si s no suficiente para firmar o diagnstico.

    EtiopatogeniaA deposio de imunoglobulinas e complemento tem

    sido interpretada como inespecfica porque ocorre apenasem reas esclerosadas onde sabidamente existe deposiode macromolculas de maneira inespecfica, portanto, atu-almente no se acredita que esta nefropatia seja mediadapelo sistema imune. A rpida recorrncia desta nefropatiaem rins transplantados sugere que deva haver algum fatorcirculante responsvel pela gnese desta leso. Em mode-los experimentais que mimetizam essa nefropatia, tem sidoobservado que as leses tbulo-intersticiais so bastanteintensas e antecedem a leso glomerular, o que tem levan-tado a suspeita de que as leses glomerulares poderiam sersecundrias s leses tbulo-intersticiais. Outros fatores etio-lgicos, como hiperplasia da clula epitelial, hiperfluxo glo-merular, leso endotelial do capilar glomerular com conse-qente adeso plaquetria e formao de microtrombos, tmsido sugeridos como possveis fatores etiolgicos.

    TratamentoVrios esquemas teraputicos utilizando-se diferentes

    drogas tm sido relatados, porm, como a maior parte dosestudos no controlada, difcil chegar concluso dequal tratamento deve ser utilizado, uma vez que remissoespontnea desta nefropatia pode ocorrer.

    Nos pacientes com sndrome nefrtica o uso de corticos-terides, segundo relatos, tem induzido remisso em torno

    de 20 a 30%. Outros 20 a 40% apresentam diminuio da pro-teinria, sem entretanto ocorrer desaparecimento da sndro-me nefrtica. Os resultados obtidos com drogas citotxicas(ciclofosfamida, clorambucil) no so conclusivos e forampreconizados para os pacientes aos quais contra-indicam-se doses altas de corticides, ou aqueles corticodependen-tes ou com recidivas freqentes. Recentemente tem sido de-monstrado que a ciclosporina capaz de induzir remissoda sndrome nefrtica, porm, geralmente ocorre recidivaaps a suspenso da droga, sendo que ela est contra-indi-cada em casos de insuficincia renal, hipertenso arterialgrave e de leso tubulointersticial na bipsia.

    Glomerulosclerose Focal e Segmentar eTransplante

    A recorrncia da glomerulosclerose focal e segmentar de 20 a 40%. A recidiva na grande maioria dos casos ocorreno primeiro ms ps-transplante, com apresentao clnicade sndrome nefrtica. Os fatores de risco para a recorrn-cia so idade inferior a 15 anos, rpida evoluo (menor quetrs anos) para insuficincia renal crnica terminal e presen-a de proliferao mesangial nos rins primitivos.

    A freqncia de perda do enxerto devido recidivavaria na literatura de 10 a 50%, sendo que uma vez perdi-do o primeiro enxerto por recorrncia a freqncia de re-corrncia, em um segundo transplante de 80%.

    Pontos-chave:

    Glomerulosclerose segmentar e focal

    Acomete pacientes jovens, com maiorprevalncia do sexo masculino e da cor negra

    Apresentao: Edema e hipertenso Dados laboratoriais: Proteinria e

    hematria microscpica MO: Leses esclerosantes segmentares e

    focais; MIF: Ausncia de depsitos imunes;ME: Leses degenerativas dos podcitos

    Tratamento: 1. escolha corticoterapia Evoluo lenta e progressiva para

    insuficincia renal crnica terminal

    GLOMERULONEFRITEMEMBRANOSA

    Sinonmia: Glomerulopatia membranosa, nefropatia membrano-sa, glomerulonefrite epimembranosa, glomerulonefrite perimem-branosa.Termo mais utilizado: Glomerulonefrite membranosa (GNM).

  • 418 Glomerulonefrites Primrias

    A GNM doena de instalao insidiosa que ocorreprincipalmente em pacientes do sexo masculino (60 a 70%),com idade mdia oscilando entre 45 e 50 anos, tendo sidodescrita no entanto em qualquer faixa etria. Parece haverpredomnio da raa branca.

    A apresentao clnica destes pacientes a de sndro-me nefrtica, com proteinria variando entre 5 e 10 g nas24 horas. Uma pequena percentagem destes indivduos(20-30%) pode inicialmente apresentar-se com proteinriaassintomtica. Hematria microscpica est presente emmais ou menos 30% dos adultos, porm, em crianas suafreqncia est prxima de 100%. Hematria macroscpi-ca caracteristicamente est ausente. Os nveis sricos decreatinina costumam ser normais, e hipertenso arterialocorre em torno de 70% dos pacientes.

    Na evoluo observa-se que existe remisso espontneada sndrome nefrtica em 40 a 60% dos casos, dependen-do do tempo de seguimento avaliado. A funo renal per-manece estvel na maior parte dos pacientes, enquanto umpequeno grupo (25-30%) evolui para insuficincia renalaps 10 a 20 anos, porm progresso mais rpida tambmtem sido descrita. Os dados que se associam com pior prog-nstico so: idade mais avanada, sexo masculino, sndro-me nefrtica persistente, hipertenso arterial, queda de fil-trao glomerular na primeira consulta e presena de le-so tbulo-intersticial bipsia renal.

    Uma complicao comum a ocorrncia de trombose deveia renal. O diagnstico geralmente feito devido ao apa-recimento de embolia pulmonar. A influncia desta compli-cao na evoluo da funo renal no est ainda definida.

    Anatomia PatolgicaNa GNM, a leso basicamente da membrana basal glo-

    merular, atingindo igualmente todos os glomrulos, no seobservando hipercelularidade. Leses inespecficas tbulo-intersticiais podem ser observadas nos casos mais avanados.

    O aspecto dos glomrulos microscopia tica bastantevarivel na dependncia da durao da doena poca dabipsia. Inicialmente os glomrulos podem estar normais(estdio I), mas posteriormente observa-se na coloraopelos sais de prata a presena de espculas da membranabasal glomerular, o que confere a essa membrana o aspectode pente (estdio II) ou de elo de corrente (estdio III); fi-nalmente observa-se a presena de espessamento global damembrana basal glomerular (estdio IV). Estas leses podemcoexistir na mesma bipsia (Fig. 22.12 e Fig. 22.13).

    microscopia eletrnica, a leso caracterstica a pre-sena de depsitos eltron-densos na regio subepitelial ouintramembranosa. A membrana basal glomerular podeapresentar-se normal (estdio I) ou apresentar espculasque contornam o depsito (estdio II) (Fig. 22.14). Os de-psitos podem ser integrados membrana basal e final-mente serem reabsorvidos, vistos ento como halos eltron-lucentes (estdio IV).

    microscopia de imunofluorescncia, observa-se a de-posio de imunoglobulinas, principalmente IgG e comple-mento ao longo da membrana basal glomerular com aspec-to finamente granular, homogneo (Fig. 22.15). Este padro constante, independentemente dos achados microsco-pia tica ou eletrnica.

    EtiopatogeniaInicialmente se acreditava que a glomerulonefrite mem-

    branosa fosse conseqncia da deposio renal de imu-nocomplexos circulantes. Essa hiptese teve origem naobservao de que tanto animais de experimentao, comopacientes com esta glomerulonefrite, alm de apresentar

    Fig. 22.12 Espessamento difuso, homogneo de membrana basalglomerular em paciente com glomerulonefrite membranosa.(Microscopia tica, aumento original 400.)

    Fig. 22.13 Espessamento difuso da membrana basal capilar, compresena de espculas. (Microscopia tica, impregnao pela pra-ta, aumento original 400.)

  • captulo 22 419

    deposio de imunoglobulina e complemento nos glom-rulos, apresentavam tambm imunocomplexos circulantes.

    Observaes posteriores, no entanto, no confirmaramesta hiptese. Como j descrito, os depsitos na glomeru-lonefrite membranosa se localizam na regio subepitelial;quando se inoculam imunocomplexos pr-formados, estesse localizam principalmente na regio mesangial e suben-dotelial, e no na subepitelial. Em seres humanos foi ob-servado que no existe correlao entre a presena de imu-nocomplexo circulante e a atividade da doena.

    Nas duas ltimas dcadas foram descritos dois modelosexperimentais de glomerulonefrite membranosa que depen-dem basicamente da reao antgeno-anticorpo realizada insitu. No primeiro foi demonstrado que a inoculao de an-ticorpos contra determinantes antignicos presentes nospodcitos capaz de provocar o aparecimento de glomeru-lonefrite membranosa em animais de experimentao. Ou-tro modo de se provocar o aparecimento dessa nefropatia a inoculao de protenas estranhas catinicas. Neste segun-do modelo a protena se fixa, atravs de interao eletrost-tica, membrana basal glomerular. Como esta protena no reconhecida como prpria, o organismo comea a produ-zir anticorpos contra ela, dando origem reao antgeno-anticorpo, com conseqente glomerulonefrite.

    Com base nesses dados experimentais, tem sido propos-to que pacientes portadores de glomerulonefrite membra-nosa poderiam produzir anticorpos contra determinantesantignicos existentes normalmente nas clulas epiteliaisviscerais (podcitos), ou contra protenas estranhas liga-das membrana basal glomerular.

    TratamentoComo a glomerulonefrite membranosa apresenta remis-

    ses espontneas e funo renal estvel, ou deterioraomuito lenta, difcil analisar o resultado do tratamento.

    O uso de corticosterides tem sido defendido por vriosautores. Em estudo controlado demonstrou-se que esta dro-ga diminui o ritmo de progresso para insuficincia renal,o que, porm, no foi confirmado por outros estudos. Vri-as drogas citotxicas, tais como a ciclofosfamida ou o clo-rambucil, tm sido propostas como alternativa teraputica.Recentemente Ponticelli e cols. demonstraram que o usoalternado de prednisona e clorambucil aumentou significa-tivamente a freqncia de remisso da sndrome nefrticae diminuiu o ritmo de queda da filtrao glomerular.

    Frente ao carter relativamente benigno desta nefropa-tia e toxicidade dos esquemas teraputicos, uma das con-dutas preconizadas na literatura que os pacientes devemser tratados apenas sintomaticamente.

    No nosso servio, pacientes que se apresentam com fun-o renal estvel so tratados apenas sintomaticamente;quando ocorre queda de funo renal, a teraputica esco-lhida com metilprednisolona IV associada a ciclofosfa-mida VO ou ento ciclosporina por 6 meses a 1 ano.

    Glomerulonefrite Membranosa eTransplante

    A recidiva da glomerulonefrite membranosa varia emtorno de 20%. A apresentao clnica se caracteriza pelapresena de sndrome nefrtica que se manifesta 10 mesesem mdia aps o transplante. A perda do enxerto devido recorrncia rara.

    Fig. 22.14 Depsitos subepiteliais de material eltron-denso empaciente portador de glomerulonefrite membranosa, estdio II.(Microscopia eletrnica, aumento original 26.500.)

    Fig. 22.15 Depsitos granulares de IgG ao longo da membranabasal glomerular em paciente portador de glomerulonefrite mem-branosa. (Microscopia de imunofluorescncia, aumento origi-nal 400.)

  • 420 Glomerulonefrites Primrias

    Pontos-chave:

    Glomerulonefrite membranosa

    Instalao insidiosa Acomete principalmente adultos entre 45 e

    50 anos e do sexo masculino Apresentao: Sndrome nefrtica e

    hipertenso arterial Dados laboratoriais: Proteinria,

    hipoalbuminemia, micro-hematria ecreatinina normal

    MO: Espessamento global da membranabasal glomerular. Presena de espculas ouelo de corrente (prata); MIF: Deposio deIgG e C3 em alas capilares; ME: Depsitoseltron-densos subepiteliais

    Sinais de mau prognstico: Idade avanada,sexo masculino, sndrome nefrticapersistente, hipertenso arterial, queda defiltrao glomerular na primeira consulta epresena de leso tbulo-intersticial bipsia renal

    Tratamento: S se devem tratar os pacientescom dficit da funo renal com corticide, ciclofosfamida ou ciclosporina

    A GNM muitas vezes se manifesta no rim transplanta-do como glomerulonefrite de novo. A sua incidncia varia

    entre 1 e 2%. A apresentao clnica mais freqente apresena de proteinria, que se manifesta em mdia 16meses aps o transplante, sendo que mais de 70% dos ca-sos cursam com sndrome nefrtica. A perda do enxerto,decorrente da GNM de novo, ocorre em torno de 30 a 40%dos casos, 3 a 4 anos aps o diagnstico.

    DIAGNSTICO DIFERENCIALO diagnstico diferencial entre as vrias glomerulone-

    frites freqentemente s possvel atravs do estudo ana-tomopatolgico completo (microscopia tica, de imunoflu-orescncia e eletrnica), porm em alguns casos possvelaproximar-se bastante do diagnstico baseando-se apenasnos dados clnicos.

    Nos casos onde a apresentao clnica a de sndromenefrtica aguda, as principais suspeitas clnicas a seremlevantadas so: glomerulonefrite ps-estreptoccica, glo-merulonefrite membranoproliferativa, glomerulonefritecrescntica em seus trs tipos. Nos casos onde a creatininaplasmtica est normal ou discretamente alterada ( 2 mg/dl), a proteinria em torno de 1 a 2 g nas 24 horas e C3 estbaixo, o primeiro diagnstico a ser feito o de glomerulo-nefrite ps-estreptoccica, mesmo que o paciente no contehistria de estreptococcia anterior, pois, em 50% das vezes,ela no detectada. A confirmao desse diagnstico serfeita na evoluo quando, 7 a 10 dias aps, os sinais clni-cos comeam a desaparecer, e o C3 srico normalizar den-tro de 30 a 45 dias aps o incio do quadro. Caso o pacien-te no apresente normalizao dos sintomas rapidamentee o C3 no se normalize no perodo esperado, o diagnsti-

    Quadro 22.1 Comparao entre os dados clnicos e laboratoriais das diferentes glomerulonefrites que seapresentam com sndrome nefrtica

    Faixa Gnero Hematria Funo C3 IgAEtria M:F Macro Renal Srico Srica

    GNLM crianas 2.5:1 ausente

    GNM > 50 anos 2:1 ausente GNMP 25-40 anos 1:1.2 ++ ou GNCresc-I < 40 anos 1:1 ++ GNCresc-II > 40 anos 1:1 ++ GNNCresc-III > 40 anos 2:1 ++ IgA 25-40 anos 3:1 ++++

    GEFS < 40 anos 1.2:1 + ou GNLM = glomerulonefrite por leses mnimas, GNM = glomerulonefrite membranosa, GNMP = glomerulonefrite membranoproliferativa, GNCresc= glomerulonefrite crescntica, IgA = glomerulonefrite por IgA, GEFS = glomerulosclerose focal e segmentar, M:F = proporo masculino: feminino,hematria macro = hematria macroscpica, funo renal = = estvel, = piora lenta, = piora com velocidade moderada, = piora rpida.C3 srico ou IgA srica = normal, = diminudo, = aumentado.

  • captulo 22 421

    co de GNMP deve ser lembrado, e a bipsia renal deverser realizada.

    Se o paciente se apresentar com insuficincia renal j naprimeira consulta ou apresentar queda rpida da filtraoglomerular, devem-se levantar as seguintes possibilidadesdiagnsticas: glomerulonefrite ps-estreptoccica comcrescentes e/ou necrose tubular aguda associada; glome-rulonefrite membranoproliferativa com crescentes ouGNCresc propriamente dita em qualquer de seus tiposhistolgicos. O diagnstico diferencial entre essas glome-rulonefrites s pode ser feito atravs da bipsia renal.

    Nos casos onde a apresentao clnica se constitui dehematria recorrente e h indcios da presena de glome-rulonefrites, os dois principais diagnsticos diferenciais sonefropatia por IgA e GNMP. Nesses casos o aumento de IgAsrica sugere nefropatia por IgA, e C3 diminudo sugere GNMP,principalmente tipo II.

    Em crianas, como a glomerulonefrite por leses mni-mas a causa mais freqente de sndrome nefrtica, co-mum utilizar teste teraputico e s realizar a bipsia renalse o paciente no responder ao uso de corticosterides.

    No Quadro 22.1 esto resumidos os achados clnicos elaboratoriais mais comuns nas diferentes glomerulonefri-tes que podem cursar com sndrome nefrtica. O conheci-mento desses dados pode auxiliar a levantar uma hipte-se diagnstica, porm, a sua confirmao s ser feita porbipsia renal.

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