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CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-QUÍMICA DE LAGOAS DA PLANÍCIE DE
ALAGAMENTO DO ALTO RIO PARAGUAI, SEPOTUBA E CABAÇAL, EM
CÁCERES, MATO GROSSO
FÁBIO C. GARCIA1 e BRUCE RIDER FORSBERG2
RESUMO: Para caracterizar, nos aspectos físico-químicos, lagoas do Pantanal Mato-
Grossense, na região de Cáceres, MT, foram amostradas, em novembro e dezembro de
1999 e janeiro e abril de 2000, 30 lagoas associadas aos rios Sepotuba, Cabaçal e
Paraguai. Foram analisados nitrogênio total (NT) e fósforo total (PT). A profundidade
máxima (Zmax), disco de Secchi (DS), pH, condutividade e temperatura foram medidos
in situ. As médias anuais de PT e NT encontradas nas lagoas dos rios Sepotuba, Cabaçal
e Paraguai foram de 1,26; 2,74 e 1,68 µM (PT) e de 26,28; 39,36 e 31,53 µM (NT),
respectivamente. As médias anuais de condutividade elétrica foram de 19,68; 64,15 e
72,20 µScm-1, respectivamente. Correlações para as médias anuais de condutividade,
NT e PT entre lagos e rios mostraram a influência da geoquímica dos rios sobre a
química das lagoas. Os valores médios anuais de DS para as lagoas citadas foram de
0,93 m; 1,01 m e 0,72 m, respectivamente. Maiores concentrações de PT e NT
encontradas na seca foram atribuídas a processos internos, como a ressuspensão de
particulados, fixação de nitrogênio e decomposição de plantas aquáticas. Menores níveis
de DS, na seca (valores), indicaram maior presença de material em suspensão,
provavelmente pela ressuspensão do sedimento.
1 Biólogo, Mestre em Ecologia – Universidade do Estado de Mato Grosso – Departamento de CiênciasBiológicas. Av. Sete de Setembro, s/n, DNER – CEP 78200-000 Cáceres, MT. Correio eletrônico:[email protected] Biólogo, Ph.D. em Ecologia – Instituto Nacional de Pesquisa da Amazônia – Departamento de Ecologia.Caixa Postal 478, CEP 69083-000, Manaus, AM. Correio eletrônico: [email protected]
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PHYSICAL - CHEMICAL CHARACTERISTICS OF LAKES ON THE
FLOODING PLAINS OF THE UPPER PARAGUAY, SEPOTUBA AND
CABAÇAL RIVERS IN CÁCERES, MATO GROSSO
ABSTRACT: The physical and chemical aspects of lakes of the Pantanal Mato-
Grossense in Cáceres – MT, were stufied. In November and December of 1999 and
January and April of 2000, a total of 30 lakes associated with the Sepotuba, Cabaçal
and Paraguay rivers were sampled. The following parameters were analysed: total
nitrogen (TN) and total phosphorus (TP). The maximum depth (Zmax), Secchi Disk (SD),
pH, conductivity and temperature were measured in situ. The annual means of TP and
TN found in lakes associated with the Cabaçal and Sepotuba rivers were 1,26; 2,74;
1,68 µM (TP) and 26,28; 39,36, 31,53 µM (NT), respectively. The annual means of
conductivity for the same lakes were 19,68; 64,15 and 72,20 µScm-1, respectively. The
correlation of annual mean levels of conductivity, TN and TP between lakes and rivers
demonstrated influence of the parent river geochemistry on lake geochemistry. The
annual means of SD for the above cited were 0,63; 1,01 and 0,72 m, respectively. The
high concentration of TP and TN found in most lakes during the low water period were
attributed to internal processes including particulate ressuspension, nitrogen fixation,
and plant decomposition and leaching. Lower levels of SD at low water indicated an
increased potential for light limitation during this period.
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INTRODUÇÃO
O Pantanal Mato-Grossense é um ecossistema com uma diversidade de
condições geomorfológicas, fazendo com que ocorram vários “pantanais” (Silva, 1986),
cada qual apresentando aspectos diferenciados na hidrologia, nos processos
biogeoquímicos e na biota.
Os estudos enfocando a caracterização física e química dos corpos de água do
Pantanal Mato-Grossense ainda não abrangeram todas as regiões do Pantanal (Calheiros
e Ferreira, 1996; Hamilton et al., 1997, 1999; Heckman, 1999; Da Silva, 1995; Da Silva
et al., 1998; Pinto et al., 1999). Na região de Cáceres, esses estudos são praticamente
inexistentes e as caracterizações que existem foram feitas, principalmente, pela
Fundação Estadual do Meio Ambiente (FEMA), que realiza monitoramentos periódicos
nos rios do Estado de Mato Grosso (FEMA, 1997). Estudos sobre o status de nutrientes
e das demais características físicas e químicas dos corpos de água de uma região são a
base para o entendimento dos processos biogeoquímicos que ali ocorrem. Nesse sentido,
foram realizados, nos anos de 1999 e 2000, pesquisas em lagoas da planície de
alagamento do rio Paraguai e dos seus afluentes, Sepotuba e Cabaçal, na região de
Cáceres, MT, durante o desenvolvimento do Mestrado Interinstitucional em Ecologia,
do convênio (UNEMAT/INPA/CAPES).
Vários são os fatores que afetam a disponibilidade de nutrientes em um lago.
Segundo Sakamoto (1966), a quantidade de nutrientes nesse corpo d'água é controlada
pelo balanço entre: a) o suplemento de nutrientes vindos de áreas que rodeiam o lago; b)
perda de nutrientes tanto pela absorção na região litoral quanto por sedimentação; c)
liberação de nutrientes a partir do plâncton morto e sedimentos por meio de processos
microbiológicos e d) perda pela saída de substâncias planctônicas autóctones e
nutrientes contidos na água do lago. Segundo o mesmo autor, a entrada de sedimento da
área de drenagem é muito importante e o status de nutrientes dessas águas depende das
características geográficas e geoquímicas da área.
De acordo com Forsbeg et al. (1988), nos lagos da Amazônia a concentração de
nitrogênio total e fósforo total depende, fortemente, das características geoquímicas do
rio associado e da bacia de drenagem local. Segundo Schmidt (1973), na Amazônia
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Central, a entrada de material mineral a partir do rio constitui a principal fonte de
nutrientes para o fitoplâncton durante as cheias. Na seca, no entanto, a ressuspensão de
sedimento e a mineralização da matéria orgânica, oriunda da morte de macrófitas
aquáticas, são as principais fontes de nutrientes para o fitoplâncton. Grobbelaar (1983,
1984, 1985 e 1992) considera os sedimentos do fundo dos lagos como importante fonte
de nutrientes. Todavia, os sólidos em suspensão influenciam diretamente as
propriedades de transmissão de luz na água e dessa maneira o regime de luz
subaquática.
No Pantanal Mato-Grossense, assim como na Amazônia, as lagoas da planície de
alagamento são predominantemente de origem fluvial. De acordo com Hamilton et al.
(1996), as concentrações de C, N, e P total no rio Paraguai são baixas quando
comparadas com outros rios, o que ele atribui às baixas concentrações de formas
particuladas desses elementos. Nas baías, a química das águas varia em função da
composição geológica da bacia de drenagem (Da Silva, 1995), do tempo e duração da
conexão com os rios que as alimentam, da variação na inundação superficial e também
da entrada de matéria orgânica, tanto a partir de material vegetal de origem autóctone,
como a decomposição de macrófitas aquáticas, quanto alóctone, como a entrada de
fezes dos "ninhais" (Da Silva, 1995). Considerando a baixa concentração de nutrientes
no sistema, Junk e Da Silva (1995) esperaram, para a comunidade aquática da planície
de alagamento do Pantanal, níveis de produção primária iguais ou menores que as
encontradas na planície de alagamento da Amazônia, e que essa baixa produção
primária pode refletir em uma produção de peixes menor na bacia do Pantanal.
Os fatores influenciando a penetração e a disponibilidade de luz nas lagoas do
Pantanal também são poucos conhecidos. De acordo com Hamilton et al. (1997), são
encontradas baixas concentrações de sólidos totais em suspensão, quando comparados
com outros rios. Pinto et al. (1999) encontraram baixas concentrações de sólidos em
estudos na Baía Sinhá Maria, provavelmente como conseqüência das baixas
concentrações nos rios e também pela sedimentação e retenção do material particulado
na planície de alagamento (Hamilton et al., 1997).
Pela escassez de dados relativos à físico-química de lagoas do Pantanal Mato-
Grossense, principalmente na região estudada, foi realizado este estudo, com o objetivo
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de caracterizar, sob os aspectos físico-químicos, lagoas da planície de alagamento do
Pantanal Mato-Grossense, na região de Cáceres, MT.
MATERIAIS E MÉTODOS
A Bacia Hidrográfica do Alto Paraguai (BAP) está localizada na porção central
da América do Sul, com uma extensão de aproximadamente 496.000 km². Na porção
localizada no Brasil, 207.249km² pertencem ao Estado de Mato Grosso do Sul e,
189.551 km² ao Estado de Mato Grosso, estando essa área localizada entre 14º00’ e
22º00’S e 53º00’ e 59º00’W (FIG. 1) (Brasil, 1997).
O comportamento hidrológico da Bacia do Alto Paraguai, tanto no Planalto
como no Pantanal, é fator determinante na dinâmica do meio ambiente regional. Esse
comportamento produz importantes modificações na física do sistema fluvial e nas
bacias (Brasil, 1997). No Pantanal, o pulso de inundação corresponde a um ciclo
hidrológico anual (Junk e Da Silva, 1999).
A precipitação média anual na Bacia do Alto Paraguai varia de 800 mm a 1.600
mm e um total de 800 mm a 1.200 mm na parte mais baixa da BAP, que engloba toda a
área do Pantanal Mato-Grossense. O regime da precipitação é tipicamente tropical, com
dois períodos distintos: um chuvoso, de outubro até março, quando ocorre cerca de 80%
do total anual de chuvas, e, outro seco, entre abril e setembro. Os picos de chuva tendem
a ocorrer de novembro a março na maioria das regiões e 90% a 95% da área do
Pantanal está sujeita a inundações (Hamilton et al., 1996). O clima da Bacia do Alto
Paraguai pode ser descrito como clima tropical de Savana (AW), mas podendo ocorrer,
na área do Pantanal, limites entre um clima úmido e clima semi-árido (Brasil, 1997).
A área de estudo específica está localizada a montante da cidade de Cáceres,
Mato Grosso, e abrange uma parte do alto curso do rio Paraguai e seus afluentes
Sepotuba e Cabaçal, estando compreendida entre os paralelos de latitude 15º49’ e
16º2’S e de longitude 57º35’ e 57º45’W (FIG. 1).
6
FIG. 1. Ba
on
est
Co
ÁREA DEESTUDO
cia do Alto Paraguai (BAP) e sub-regiões do Panta
de foi desenvolvido o estudo, no extremo norte da
á indicada com a seta. Fonte: Silva e Abdon (n
nservação da Bacia do Alto Paraguai (1997).
ESCALA
nal brasileiro. A região
sub-região de Cáceres,
o prelo). In Plano de
7
O rio Paraguai nasce nas encostas da serra dos Parecis, no norte do Estado.
Recebe águas de inúmeros afluentes que o alcançam com pouca velocidade e uma
grande carga de sedimentos que vão depositar na planície do Pantanal. As inundações
encarregam-se de espalhar parte do sedimento para fora das calhas fluviais. A alta bacia
do rio Paraguai acima de Cáceres, com uma área de 33.860 km², é coberta por uma
floresta de transição, com uma área de 11.000 km², abaixo da curva de 200 m, que o rio
nas enchentes inunda, principalmente os meandros abandonados. Essa planície de
inundação vai desde um pouco acima da foz do Sepotuba, com uma faixa de 2 km de
largura, e vai se alargando até vários quilômetros. Depois vai se estreitando até 4 km na
foz do Jauru. Muitos meandros abandonados, fechados por areia numa extremidade ou
em ambas, enchem quando o rio sobe (Carvalho, 1986).
Os rios Sepotuba e Cabaçal também nascem na serra dos Parecis, drenam áreas
de 11.460 km² e de 6.040 km², respectivamente. No rio Cabaçal, as planícies de
inundação são limitadas, mesmo no baixo vale. Já próximo à foz, a planície apresenta
uma faixa maior de inundação, com meandros abandonados. O rio Sepotuba tem na sua
foz uma bacia hidrográfica com quatro sub-bacias principais, íngremes e cobertas por
vegetação densa. O baixo curso, com floresta ciliar de 3 km de largura, apresenta velhos
meandros abandonados, sendo uma área que se inunda na época de cheias. Tanto o
Sepotuba quanto o Cabaçal atravessam regiões com grandes coberturas vegetais e solos
pouco erodíveis, sendo de águas límpidas (Carvalho, op. cit.).
Para o desenvolvimento deste trabalho, foram amostradas 30 lagoas nessa
região, sendo dez associadas a cada rio (Paraguai, Sepotuba e Cabaçal). São lagoas com
profundidades variando de 1 m a 6,25 m (lagoas do rio Sepotuba), de 1,10 m a 4,75 m
(lagoas do rio Cabaçal) e de 0,95 m a 6,60 m (lagoas do rio Paraguai). Já se observam
atividades antrópicas nas proximidades de algumas lagoas, como pastagens para
pecuária e monocultura de teca (Tectona grandis), mas não é observada em nenhuma
das lagoas a entrada de qualquer forma de esgoto.
Para o desenvolvimento do trabalho, o ciclo hidrológico do rio Paraguai foi
dividido em período seco (junho a novembro) e período cheio (dezembro a maio) (FIG.
2). Foram feitas duas coletas em cada período; as do período de seca, nos meses de
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novembro e dezembro de 1999 e, as do período de cheia, nos meses de fevereiro/março
a abril de 2000.
Meses
Nív
el d
o rio
(m)
0,0
0,5
1,0
1,5
2,0
2,5
3,0
3,5
4,0
4,5
5,0
5,5
Mai. Jun. Julh. Ag. Set. Out. Nov. Dez. Jan. Fev. Mar. Abr
FIG. 2. Nível do rio Paraguai entre os meses de maio de 1999 e abril de 2000. As
coletas foram realizadas nos meses indicados pela seta. Fonte: Ministério da
Marinha – Agência Fluvial de Cáceres, MT.
Em cada lagoa foram medidas a profundidade máxima (Zmax) e disco de Secchi
(DS). As amostragens de água foram feitas na região limnética das lagoas, na zona
eufótica – a partir dos valores de DS –, de acordo com Dillon e Rigler (1974). Para a
determinação de nitrogênio total e fósforo total, foram subamostrados 20 ml da amostra
coletada (medidos com uma proveta graduada) e colocados em frascos de polipropileno
com tampa de rosca, previamente acondicionados com ácido clorídrico (HCl) 10% e
enxaguados na hora da coleta com a própria amostra. Tais amostras foram armazenadas
a –4ºC até as análises químicas, realizadas no Laboratório de Ecologia Aquática do
INPA, Manaus, AM. Para cada rio parente também foram feitas amostragens para a
determinação da concentração de NT e PT. As concentrações desses elementos foram
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determinadas simultaneamente, após digestão alcalina e ácida com persulfato de
potássio, seguindo método proposto por Valderrama (1981).
Neste trabalho assumiu-se a condutividade elétrica como um parâmetro
relativamente conservativo, apropriado para investigar a influência da geoquímica dos
rios e de outras fontes na água das lagoas (Furch e Junk, 1997). O pH, também para
verificar essas influências, foi medido por meio de um pHmetro digital CORNING e, a
condutividade elétrica, por um condutivímetro também digital CORNING. As
temperaturas do ar e da água foram medidas com de um termômetro de mercúrio
manual.
Para investigar a influência dos períodos hidrológicos do sistema fluvial nas
concentrações de PT e NT e nos parâmetros físicos Zmax e DS, utilizou-se a análise de
variância (ANOVA) de dois fatores. Foram feitas análises de regressão linear para
investigar a influência das variáveis físicas Zmax e DS na concentração de PT e NT, as
relações entre as variáveis físicas Zmax e DS e a interação entre as concentrações de PT e
NT. Para as análises de regressão, foram usados os valores médios, para todas as coletas
individuais e por período. Para as análises de variância foram utilizados os valores para
todas as coletas individuais. As análises estatísticas foram feitas de acordo com Zar
(1974) e, para o desenvolvimento das análises, utilizou-se o programa STATISTIC para
Windows, versão 5.1 (Statsoft, 1997).
RESULTADOS
A temperatura média da água variou de 30oC a 31,5ºC nas lagoas associadas ao
rio Sepotuba; de 30,75 oC a 31,5ºC, nas associadas ao rio Cabaçal e, de 29,63oC a
31,5ºC, nas associadas ao rio Paraguai. O pH variou de 6,25 a 7,42 nas lagoas
associadas ao rio Sepotuba e, de 6,72 a 7,44, no rio Sepotuba; de 6,81 a 7,90 nas
associadas ao rio Cabaçal e, de 6,98 a 7,41, no rio Cabaçal e, de 6,65 a 8,42 nas
associadas ao rio Paraguai e, de 7,18 a 7,48, no rio Paraguai. A profundidade máxima
nas lagoas variou entre 0,95 m e 6,60 m e a profundidade média anual do disco de
Secchi variou entre 0,20 m e 2,0 m.
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As análises de variância de dois fatores, para investigar a variação nos
parâmetros físicos Zmax e DS, nas lagoas, entre os períodos e entre os sistemas fluviais
(Tabela 1), mostraram haver variações significativas nos parâmetros Zmax (entre
períodos e entre os sistemas fluviais, sem interação) e DS (entre períodos e entre os
sistemas fluviais, com interação). Os valores médios de Zmax e DS foram maiores no
período de cheia do que na seca. As lagoas associadas ao rio Paraguai apresentaram o
maior valor médio de Zmax e menores de DS e, as do rio Cabaçal, apresentaram o maior
valor médio de DS e o menor de Zmax. No entanto, para todos os parâmetros, o efeito da
variação nos períodos foi mais forte que as diferenças entre sistemas fluviais.
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TABELA 1. Médias, por sistema fluvial e período hidrológico, das concentrações de
fósforo total (PT) e nitrogênio total (NT), da condutividade elétrica (cond.),
profundidade máxima (Zmax) e disco de Secchi (DS) em lagoas associadas aos
rios Sepotuba, Cabaçal e Paraguai, MT.
Sistemafluvial
Períodohidrológico
PT(µM)
NT(µM)
Cond.(µScm-1)
ZMAX
(M)DS(M)
Sepotuba Seca Média 1,13 27,97 13,90 2,54 0,73DP 0,39 14,91 21,70 1,19 0,27N 20 20 10 20 20
Cheia Média 1,39 24,60 25,50 3,92 1,13DP 0,24 8,17 5,83 1,13 0,58N 20 20 10 20 20
Anual Média 1,26 26,28 19,68 3,23 0,93DP 0,35 11,99 3,21 1,34 0,49N 40 40 10 40 40
Cabaçal Seca Média 3,44 53,58 60,10 2,02 0,37DP 1,33 17,21 5,46 0,84 0,25N 20 20 10 20 20
Cheia Média 2,04 25,68 62,10 2,98 1,6DP 0,47 5,25 1,01 0,63 0,57N 20 20 10 20 20
Anual Média 2,74 39,63 64,15 2,50 1,01DP 1,11 18,90 4,31 0,88 0,79N 40 40 20 40 40
Paraguai Seca Média 1,56 37,63 98,60/53* 2,36 0,37DP 0,43 10,72 98,05 1,05 0,13N 20 20 10 20 20
Cheia Média 1,80 31,43 45,8 4,24 1,03DP 0,44 8,21 6,92 1,12 0,30N 20 20 10 20 20
Anual Média 1,68 34,53 72,20/49* 3,30 0,72DP 0,45 9,94 51,13 0,95 0,45N 40 40 10 40 40
F1, 114 7,57 35,30 58,19 121,13Entre períodoshidrológicoS P = 0,007 < 0,001 NS < 0,001 < 0,001
F2, 114 67,28 13,69 17,98 7,71 5,93Entre sistemasfluviais P < 0,001 < 0,001 < 0,001 < 0,001 = 0,004
F2, 114 26,02 13,59 6,33 12,92
ANOVAde dois
fatores**
Interação entrefatores P < 0,001 < 0,001 = 0.002 NS < 0,001
Os valores subscritos juntos ao F representam os graus de liberdade na ANOVA. DP = desvio-padrão, N = número amostral, NS = não significativo.**Médias obtidas quando não considerados os valores para os pontos 26 e 27 no período deseca.
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Os valores médios de condutividade elétrica nas lagoas variou entre 45,80 e
72,20 µScm-1. A concentração média de PT nas lagoas variou entre 0,50 e 5,72 µM e a
de NT entre 11,33 e 90,61 µM. Parte da variação encontrada para essas variáveis pode
ser explicada pelas diferenças entre sistemas fluviais e também pelas diferenças
temporais, associadas ao ciclo hidrológico ou pulso de inundação. As influências desses
dois fatores é evidente na Tabela 1, que mostra os valores médios anuais e por período
hidrológico de PT e NT, encontrados em lagoas dos três sistemas fluviais. Os efeitos de
ambos os fatores, sistema fluvial e período hidrológico, nos níveis de PT, NT e
condutividade elétrica, foram significativos, havendo também uma interação entre eles.
Somente o efeito do fator sistema fluvial nos valores de condutividade elétrica foi
significativo, mas apresentando interação (Tabela 1). Os valores médios anuais de PT e
NT foram maiores nas lagoas do rio Cabaçal e menores nas do rio Sepotuba. A
concentração média de PT no período de seca foi maior nas lagoas do rio Cabaçal e
menor nas dos rios Sepotuba e Paraguai. A concentração média do NT foi maior em
todas as lagoas no período de seca, independente do sistema fluvial. Os valores médios
de condutividade elétrica foram maiores no período de cheia nas lagoas dos rios
Sepotuba e Cabaçal, sendo, no entanto, maior no período de seca nas lagoas do rio
Paraguai. Os elevados valores de condutividade encontrados nas lagoas (26 e 27),
associadas ao rio Paraguai, no período de seca, influíram diretamente na média anual
encontrada para todas as lagoas, provavelmente sendo as causas dos altos valores de
desvio-padrão, encontrados para as médias do período de seca e para a média anual.
Quando retirando os valores dos pontos 26 e 27, para o período de seca, foram
encontrados valores menores para as médias de seca e, principalmente, anual. As
diferenças observadas nos níveis de PT e NT nas lagoas, entre sistemas fluviais,
refletem diferenças nos níveis dessas mesmas variáveis nos rios principais que as
alimentam. Os valores médios de PT, NT e outros parâmetros físico-químicos nos rios
Sepotuba, Cabaçal e Paraguai são apresentados na Tabela 2. Foram encontradas
diferenças nos níveis de PT e NT assim como da condutividade elétrica entre esses rios
(Tabela 1).
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TABELA 2. Valores médios de variáveis físico-químicas, para os rios Sepotuba,
Cabaçal e Paraguai, MT.
Sistema fluvial Valores Temperatura água(ºC)
Condutividade(µScm-1)
PT(µM)
NT(µM)
Sepotuba Média 30,25 16 1,14 17,95DP 5,89 0,45 5,63N 4 4 4
Cabaçal Média 30,25 54,25 3,62 45,39DP 15,22 1,08 13,34N 4 3 3
Paraguai Média 30,50 44,50 2,30 35,30DP 6,81 0,74 7,35N 4 3 3
ANOVA F2, 7 16,09 9,23 8,49P NS < 0,001 0,01 0,01
Os valores subscritos juntos ao F representam os graus de liberdade na ANOVA.DP= desvio-padrão; N = número amostral e NS = não significativo.PT = fósforo totalNT = nitrogênio total
A condutividade elétrica é um parâmetro relativamente conservativo que pode
ser usado como traçador de fontes de água para as lagoas quando essas fontes possuem
condutividade distintas. Quando os valores médios anuais de condutividade dos três rios
foram plotados contra os valores médios anuais de condutividade encontradas nas
lagoas associadas a cada sistema fluvial, os pontos caíram próximos à linha de
eqüivalência (FIG. 3), indicando que o rio é a fonte dominante de água nesses sistemas.
Quando os valores médios de condutividade para cada lagoa nos dois períodos
hidrológicos foram plotados na mesma figura (FIG. 3), alguns desvios da relação de
eqüivalência ficaram evidentes, o que podem refletir: a) a entrada de água de fontes com
condutividade diferente da observada no rio, ou b) processos internos nas lagoas que
resultam no aumento ou redução da condutividade. Existe uma tendência nas lagoas do
rios Paraguai e Cabaçal de terem condutividades maiores na seca, o que pode refletir a
entrada de águas de córregos salobres ou a geração de condutividade por processos
internos nesse período. A tendência contrária foi evidenciada nas lagoas do rio
Sepotuba, provavelmente refletindo a entrada de águas mais diluídas na seca.
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Condutividade elétrica média nos rios ( uScm-1)
Con
dutiv
idad
e el
étric
a m
édia
nas
lago
as (
uScm
-1)
0
10
20
30
40
50
60
70
80
0 10 20 30 40 50 60 70 80
seca cheia
Sepotuba
Paraguai
Cabaçal
FIG. 3. Relação entre a condutividade elétrica nos rios (média anual) e lagoas
associadas (médias por período). A linha tracejada representa a linha de
eqüivalência 1:1 e as setas representam as médias anuais para as lagoas de
cada sistema fluvial.
A influência dominante do rio nas concentrações de PT e NT nas lagoas foi
demonstrada nas análises de regressão feitas entre as concentrações médias anuais de
PT e NT nos rios e lagoas associadas. Em ambos os casos foram encontradas fortes
relações positivas (regressão linear; PT: R²= 0,77, p<0,001; NT: R²=0,56, p<0,001). Os
efeitos de outras fontes nos níveis de PT e NT nas lagoas podem ser investigados
também plotando as concentrações médias encontradas nas lagoas, para cada período,
contra as concentrações médias anuais encontradas nos rios. Como mostra as FIGs. 4 e
5, há um efeito dominante do rio sobre os níveis de nutrientes nas lagoas. Ficam
evidentes alguns desvios sistemáticos da relação de eqüivalência, indicando influências
de outras fontes de nutrientes ou a ocorrência de outros processos internos. Os níveis
dos dois nutrientes foram menores nas lagoas associadas aos rios Cabaçal e Paraguai, no
período de cheia. Os níveis de NT tenderam a ser maiores em todas as lagoas no período
de seca. Os níveis de PT também foram maiores na seca nas lagoas do rio Cabaçal,
porém foram menores no mesmo período nas lagoas do rio Sepotuba.
15
Fósforo total médio nos rios ( uM)
Fósf
oro
tota
l méd
io n
as la
goas
( uM
)
0,0
0,5
1,0
1,5
2,0
2,5
3,0
3,5
4,0
4,5
0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5
seca cheia
Sepotuba
Paraguai
Cabaçal
FIG. 4. Relação entre a concentração de fósforo total nos rios (média anual) e nas
lagoas associadas (médias por período). A linha tracejada representa a linha
de eqüivalência 1:1 e as setas indicam as médias anuais encontradas para as
lagoas de cada sistema fluvial.
Nitrogênio total médio nos rios ( uM)
Nitr
ogên
io to
tal m
édio
nas
lago
as (
uM)
0
10
20
30
40
50
60
70
80
0 10 20 30 40 50 60 70 80
secacheia
SepotubaParaguai
Cabaçal
FIG. 5. Relação entre a concentração de nitrogênio total nos rios (média anual) e nas
lagoas associadas (médias por período). A linha tracejada representa a linha de
eqüivalência 1:1 e as setas indicam as médias anuais encontradas para as
lagoas de cada sistema fluvial.
16
Outro fator que pode influenciar nos níveis de PT e NT nas lagoas é a
profundidade máxima (Zmax). Essa profundidade influi nos níveis de PT e NT de duas
maneiras: a) pelo efeito na dinâmica de sedimentação e ressuspensão de formas
particuladas de PT e NT, e b) pelo efeito no volume do lago, que determina a
capacidade de diluição dos nutrientes entrando no sistema. Em geral, quanto menor Zmax
mais nutrientes particulados são ressuspensos, menor é o nível de luz na coluna de água
e maior é a concentração de PT e NT esperada. Utilizando os valores médios anuais
para todas as lagoas estudadas, foram encontradas relações negativas significativas entre
PT e Zmax (regressão linear: R2=0,19, p=0,02) e NT e Zmax (regressão linear R2=0,14,
p=0.04). Entretanto, fazendo regressões separadas, por sistema fluvial e período
hidrológico, só foi encontrada a relação negativa significativa entre PT e Zmax para as
lagoas do rio Sepotuba, tanto para as médias anuais (regressão linear: R²=0,62, p=0,007)
(FIG. 6), quanto para as médias para o período de seca (regressão linear: R²=0,62,
p=0,007).
Apesar das diferenças encontradas nas concentrações de PT e NT entre os rios e
lagoas deste estudo, é possível que esses nutrientes venham de um substrato geológico
comum e esperaria-se, assim, uma forte correlação entre esses dois parâmetros nas
lagoas. Tal relação foi de fato encontrada, usando as médias anuais de PT e NT,
determinados neste estudo (regressão linear: R2=0,65, p<0,001; FIG. 7).
Profundidade máxima média (m)
Fósf
oro
tota
l méd
io (
uM)
0,00
0,25
0,50
0,75
1,00
1,25
1,50
1,75
2,00
0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5 5,0 5,5
R2= 0.62p= 0.007
FIG. 6. Relação entre as médias anuais da concentração de fósforo total e da
profundidade máxima, em lagoas associadas ao rio Sepotuba, MT.
17
Fósforo total médio ( uM)
Nitr
ogên
io to
tal m
édio
( uM
)
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
0,0 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 4,5
R2= 0.65p< 0.001
FIG. 7. Relação entre as médias anuais das concentrações de nitrogênio total e fósfoto
total, para todas as lagoas.
DISCUSSÃO
Ficou evidente a influência predominante da geoquímica dos rios na química das
lagoas, quando analisadas as relações entre as médias anuais da condutividade elétrica,
PT e NT nos rios e nas lagoas (FIGs. 3, 4 e 5). Um padrão similar foi observado por
Forsberg et al. (1988), em estudos na Amazônia, para o período de cheia. De acordo
com esse autor, desvios nesses pontos refletem efeitos adicionais que ocorrem durante a
estocagem da água nas lagoas. A distribuição dos pontos fora da linha de equivalência,
nas lagoas consideradas neste estudo, provavelmente reflete influências sazonais
externas e internas. Schmidt (1973) descreveu mudanças similares na composição
química das águas do Lago Castanho e, Furch et al. (1983), no Lago Camaleão, ambos
na Amazônia. Pinto et al. (1999) também descreveram variações similares para a Baía
Sinhá Mariana, no Pantanal Mato-Grossense. Em lagoas de várzea, esses processos
18
tendem a se alterar em função das variações hidrológicas que ocorrem nos períodos de
seca e cheia, como descrito por Junk et al. (1989), no conceito do pulso de inundação.
As características geoquímicas dos rios considerados neste estudo podem ser
atribuídas a vários fatores. Putzer (1968) apud Heckman (1999) coloca que a área de
influência do Pantanal está localizada no Escudo Central do Brasil, uma formação
continental antiga na qual os minerais solúveis têm sido sujeitos a processos de
lixiviação por milhões de anos. Hamilton et al. (1997) colocam que as concentrações de
N e P no rio Paraguai são baixas quando comparadas às de outros rios, por causa das
baixas concentrações particuladas desses elementos, e que a biogeoquímica do Alto rio
Paraguai é, fortemente, influenciada pelo contato com a planície de alagamento do
Pantanal que, por possuir uma alta capacidade de estocagem, retém a descarga hídrica
do rio e promove mudanças de curta duração na sua hidroquímica, como a retenção no
sedimento de material orgânico particulado, além de transformações e perdas de
nutrientes inorgânicos. Segundo esses autores, o nitrogênio presente no rio está,
principalmente, nas formas dissolvida e orgânica, mas o fósforo encontra-se,
primariamente, na forma particulada.
Os maiores valores médios anuais de condutividade, PT e NT, encontrados nas
lagoas do rio Cabaçal, e os menores, encontrados nas lagoas do rio Sepotuba (Tabela 3),
provavelmente, podem estar refletindo as diferenças geoquímicas entre as bacias de
drenagem que ocorrem entre os rios da Bacia do Alto Paraguai (Hamilton et al., 1997;
Da Silva et al., 1998) e diferenças nos níveis de erosão nessas bacias.
De acordo com Forsberg et al. (1988), durante o período de seca, a influência do
rio parente nos lagos da planície de alagamento é fortemente reduzida e as
características químicas das lagoas dependem mais da influência de córregos locais e
processos biogeoquímicos internos. Os maiores valores médios anuais de NT
encontrados no período de seca para todas as lagoas e de PT para as lagoas associadas
aos rios Cabaçal e Paraguai, provavelmente, refletem processos internos que geram
condutividade e nutrientes. A ressuspensão de nutrientes particulados do fundo das
lagoas pode ser um importante fator promovendo o enriquecimento da coluna de água
no período de seca (Schmidt, 1973; Forsberg et al., 1988) e está relacionado com a
profundidade das lagoas. De acordo com Tundisi et al., (1984) durante a seca, quando a
19
profundidade é menor que 4 m a 5 m, como as encontradas nas lagoas estudadas,
“misturas noturnas” atingem o fundo das lagoas, promovendo assim o enriquecimento
da coluna de água por nutrientes. A relação encontrada aqui entre as médias anuais de
PT e profundidade máxima nas lagoas do rio Sepotuba (FIG. 6) sugere que o mesmo
processo esteja ocorrendo nesse sistema.
Além da profundidade, processos internos contribuem para a liberação de
nutrientes na coluna de água, no período de seca, como a decomposição de macrófitas
aquáticas mortas, que promove a liberação de nutrientes para a coluna de água nesse
período (Schmidt, 1973; Furch et al., 1983; Heckman, 1999), a fixação de nitrogênio
atmosférico por algas cianofícias (Schindler, 1977) e também por macrófitas aquáticas,
como Azzola sp. e a predação do fitoplâncton pelo zooplâncton com posterior excreção
de minerais (Fisher e Parsley, 1979). A evaporação também pode contribuir para um
aumento na concentração de sais minerais nesse período (Da Silva et al., 1998).
Não ocorreu, como observado para PT e NT, uma variação significativa nos
níveis de condutividade elétrica nas lagoas, entre períodos hidrológicos (Tabela 1). A
variação significativa encontrada nesse parâmetro entre sistemas fluviais,
aparentemente, indica um influência predominante da geoquímica do rio parente sobre
tais sistemas.
Os menores valores médios de PT e NT encontrados nas lagoas associadas aos
rios Cabaçal e Paraguai e de PT nas lagoas do Sepotuba, no período de cheia,
aparentemente, refletem a ação de processos internos, como perdas por sedimentação de
formas particulados para o fundo da lagoa (Forsberg et al., 1988). De acordo com
Tundisi et al. (1984), com o aumento da profundidade máxima no período de cheia, a
ação do vento pode não ser suficiente para promover a mistura completa da coluna de
água e assim ressuspender os sedimentos depositados no fundo, como acontece no
período de seca. Dessa forma, o material particulado que sedimenta até o fundo não é
ressuspenso, permanecendo indisponível. Outro fator também é a rápida absorção de
nutrientes pelas macrófitas aquáticas, como demonstrado por Calheiros e Ferreira
(1996), em estudos no Pantanal, e por Junk e Piedade (1997), em pesquisas com plantas
herbáceas na planície de alagamento da Amazônia. De acordo com Pinto et al. (1999),
durante a inundação na região do Pantanal, ocorre uma entrada de matéria orgânica nas
20
lagoas, provocando aumentos abruptos de nutrientes no início da estação de chuva. Os
níveis permanecem constantes durante a cheia e caem novamente quando as chuvas
param e o nível do rio novamente se reduz.
A menor concentração média de PT no período de seca, encontrada nas lagoas
do rio Sepotuba, provavelmente, reflete a entrada de outras fontes externas de água (por
exemplo, pequenos córregos), pobres em nutrientes (Forsberg et al., 1988), promovendo
a diluição dos minerais ali presentes. Chuvas localizadas também podem ser um fator
contribuindo para esse menor valor no período de seca. Os menores valores de
condutividade elétrica encontrados no período de seca indicam que esteja ocorrendo
uma diluição na concentração de sais nessas lagoas.
Fontes secundárias de água, como pequenos córregos, podem contribuir para
alterar o status de minerais, durante o período de seca. Nas lagoas 26 e 27, associadas
ao rio Paraguai, foram observados, no período de seca, valores de condutividade elétrica
muito acima dos médios registrados para as demais lagoas (entre 150 e 368µScm-1).
Esse aumento, provavelmente, é resultado da entrada nessas lagoas de um riacho que
drena uma região calcária, onde são encontrados corpos de águas que apresentam, na
sua maioria, condutividade alta, como demonstrado por Lima et al. (1999). No entanto,
não foi observada a mesma tendência de aumento nos valores de PT e NT nessas lagoas,
indicando que esses corpos de água são similares ao rio Paraguai em relação a esses
nutrientes.
Foram levantadas duas hipóteses para tentar explicar as correlações positivas
entre as médias anuais de PT e NT (FIG. 7). A primeira, seria o de haver uma fonte
geológica comum para esses nutrientes na região; hipótese difícil de explicar, uma vez
que o nitrogênio geralmente deriva de processos biológicos e não geológicos. Uma
segunda hipótese, a mais provável, seria que a correlação reflete a ação reguladora de
algas cianofícias fixadoras de nitrogênio, que compensariam as deficiências naturais de
nitrogênio, mantendo uma razão N:P relativamente constante (Schindler, 1977). No
entanto, a maior parte dos valores médios anuais da razão NT:PT está abaixo do valor
ótimo para o crescimento de algas, indicando uma limitação por nitrogênio em todas as
lagoas. Além disso, não existem estudos sobre a composição em espécie do fitoplâncton
21
na região e a presença dessas algas fixadoras de nitrogênio atmosférico, informação essa
que poderia sustentar essa hipótese.
As diferenças observadas entre os sistemas fluviais para as variáveis físicas,
apesar de significativas, foram pequenas. As menores médias anuais para DS,
encontradas nas lagoas associadas ao rio Paraguai, podem ser reflexo de altas
concentrações de sedimento em suspensão nas suas águas.3
As fortes variações observadas nos parâmetros físicos, entre períodos
hidrológicos, refletem a ação de processos internos nas lagoas. As menores médias de
DS no período de seca, provavelmente, indicam uma maior presença de sedimentos em
suspensão na coluna de água, por causa das menores Zmax, também observadas nesse
período (Da Silva, 1995; Pinto et al., 1999). No período de seca, como as lagoas
estavam mais rasas, provavelmente ocorreu uma mistura mais eficiente da coluna de
água pela ação do vento, promovendo uma maior ressuspensão de sedimentos do fundo
e uma redução na penetração de luz na coluna de água. O contrário foi observado para o
período de cheia quando, por causa das maiores profundidades das lagoas, a mistura não
atingiu toda a coluna de água e o material particulado que entrou com as águas dos rios
durante a enchente sedimentou e precipitou para o fundo das lagoas.
Em suma, os resultados obtidos mostram que o rio Cabaçal apresenta um status
maior de nitrogênio total e fósforo total e maiores valores de condutividade elétrica. O
contrário é observado para o rio Sepotuba, que apresentou os menores valores para essas
variáveis. Já o rio Paraguai ficou em um nível intermediário. Como já colocadas essas
diferenças, provavelmente, refletem formas diferentes de uso do solo nas planícies de
drenagens desses rios, que apresentaram os mesmos padrões nos valores de NT, PT e
condutividade elétrica.
Estudos mais abrangentes nas lagoas da região são necessários, tanto no aspecto
do número de variáveis quanto temporal e espacial, além de pesquisas que contemplem
as taxas de oxigênio dissolvido, não realizados neste trabalho por problemas logísticos,
sólidos em suspensão, entre outros. A partir da obtenção desses dados básicos será
possível a realização de programas de conservação desse ecossistema, que, por se
3 Observação pessoal.
22
localizar no início da Bacia do Alto Paraguai, é de suma importância para toda a Bacia e
que já apresenta os impactos da ocupação humana na região.
23
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