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MIHAEL MACHADO DE SOUZA
CARACTERIZAÇÃO DO TRANSPORTE SEDIMENTAR NA
DESEMBOCADURA SUL DO COMPLEXO ESTUARINO DE PARANAGUÁ
PONTAL DO PARANÁ
OUTUBRO DE 2012
ii
MIHAEL MACHADO DE SOUZA
CARACTERIZAÇÃO DO TRANSPORTE SEDIMENTAR NA
DESEMBOCADURA SUL DO COMPLEXO ESTUARINO DE PARANAGUÁ
Monografia apresentada como Trabalho de Conclusão
do Curso de Oceanografia, Universidade Federal do
Paraná, 2o semestre de 2012.
Orientador: Dr. Marcelo Renato Lamour
PONTAL DO PARANÁ
OUTUBRO DE 2012
iii
iv
v
Aquele que fala para um ouvido surdo,
é mudo.
- Stephen King
vi
AGRADECIMENTOS
Antes de tudo, gostaria de agradecer aos meus pais e meu irmão, que
me apoiaram e incentivaram durante esses cinco anos de graduação. Sem
vocês nada disso seria possível.
Ao meu orientador, Dr. Marcelo Lamour, que embarcou na minha ideia
maluca de trabalhar com armadilhas de sedimentos e dinâmica sedimentar na
desembocadura do estuário, e me deu todo o suporte para desenvolver este
trabalho, fica um agradecimento especial.
Agradeço a todos os professores que contribuíram durante minha
formação e compartilharam comigo o conhecimento necessário para seguir na
profissão. Em especial, ao Dr. Maurício Noernberg pelas inúmeras ajudas com
os dados de correntes e com as dúvidas quanto à hidrodinâmica da região, e ao
Dr. Maurício Camargo, pela ajuda com a estatística e com todas as dúvidas
sobre temas diversos que surgiram ao longo do caminho.
Aos amigos de laboratório, LOGeo, agradeço pelas conversas,
discussões, campos e cafés que tomamos todos os dias. Principalmente
aqueles que embarcaram na ideia de campos de 13 horas comigo, parados
num barquinho. Sei que não foi fácil nem divertido, mas o resultado valeu a
pena.
Aos amigos e ao pessoal do GRR2008, um muito obrigado por todas as
festas, churrascos e discussões. Com certeza não teria sido tão divertido sem
vocês.
E a Ana, por tudo que você fez por mim nestes últimos 5 anos. Te amo.
vii
SUMÁRIO
LISTA DE FIGURAS ......................................................................................................... ix
LISTA DE TABELAS ...................................................................................................... xiii
PREFÁCIO ................................................................................................................... xiiiii
CAPÍTULO I – A CARGA DE FUNDO ATRAVÉS DE EQUAÇÕES
DETERMINÍSTICAS NA DESEMBOCADURA SUL DO COMPLEXO ESTUARINO DE
PARANAGUÁ .................................................................................................................... 1
Resumo ..................................................................................................................... 1
Abstract ..................................................................................................................... 2
1. Introdução ....................................................................................................... 3
1.1 Área de Estudo ................................................................................................ 5
2. Metodologia .................................................................................................... 6
2.1 Série de Dados ................................................................................................ 6
2.2 Dados de Campo ............................................................................................. 7
2.3 Definição da Melhor Equação .......................................................................... 8
2.4 Estimativa do Transporte por Carga de Fundo ................................................ 8
3. Teoria .............................................................................................................. 9
4. Resultados .................................................................................................... 10
4.1 Séries de Dados e Dados de Campo ............................................................. 10
4.2 Definição da Melhor Equação ........................................................................ 14
4.3 Estimativa do Transporte por Carga de Fundo .............................................. 15
5. Discussão ..................................................................................................... 17
5.1 Dados Pretéritos e de Campo ........................................................................ 17
5.2 Definição da Melhor Equação ........................................................................ 18
5.3 Estimativa do Transporte por Carga de Fundo .............................................. 19
6. Conclusão ..................................................................................................... 22
Referências ............................................................................................................. 23
viii
CAPÍTULO II – O TRANSPORTE DE AREIAS EM SUSPENSÃO NA
DESEMBOCADURA SUL DO COMPLEXO ESTUARINO DE PARANAGUÁ: UMA
ABORDAGEM ATRAVÉS DE EQUAÇÕES PREDITIVAS E DADOS DE CAMPO ......... 27
Resumo ................................................................................................................... 27
Abstract ................................................................................................................... 28
1. Introdução ..................................................................................................... 29
1.1 Área de estudo .............................................................................................. 30
2. Materiais e Métodos ...................................................................................... 32
2.1 Séries de Dados ............................................................................................ 32
2.2 Dados de Campo ........................................................................................... 33
2.3 Definição do Melhor Formato do Perfil de Concentrações, da Ca e da za ....... 34
2.4 Volume Transportado por Ciclo de Maré ....................................................... 35
3. Teoria ............................................................................................................ 36
4. Resultados .................................................................................................... 38
4.1 Série de Dados .............................................................................................. 38
4.2 Definição do Melhor Formato do Perfil de Concentrações, da Ca e da za ....... 39
4.3 Volume Transportado por Ciclo de Maré ....................................................... 42
5. Discussão ..................................................................................................... 44
5.1 Definição do Melhor Formato do Perfil de Concentrações, da Ca e da za ....... 44
5.2 Volume Transportado por Ciclo de Maré ....................................................... 47
6. Conclusão ..................................................................................................... 49
Referências ............................................................................................................. 49
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 52
ix
LISTA DE FIGURAS
Figura 1.1 – Visão geral da desembocadura do Complexo Estuarino de
Paranaguá (CEP), com o detalhe da batimetria no transecto estudado no qual
foram obtidas as amostras de transporte por carga de fundo e os dados de
correntes.
Figura 1.2 – Curvas das marés de 2008 e 2012, mostrando uma variação
efetiva na amplitude de 0,2 m (acima). Abaixo, gráfico com a velocidade do
fluxo ao longo do ciclo de maré (em m.s-1), com a faixa de transporte nulo.
Figura 1.3 – Distribuição do tamanho do grão dos sedimentos coletados pela
armadilha nas três estações.
Figura 1.4 – Porcentagem de arredondamento dos sedimentos capturados pela
armadilha em cada uma das estações amostrais.
Figura 1.5 – Regressão tipo II entre as formulações teóricas (eixo x) e os dados
medidos in situ (eixo y). Em destaque, o índice de determinação (R²) e a
correlação entre as retas da regressão (linha pontilhada) e a reta ideal (linha
sólida).
Figura 1.6 – Razão entre taxas preditas e mensuradas em relação à velocidade
das correntes. Linha pontilhada marca o intervalo de um fator 0,5 a 3, com a
porcentagem dos dados dentro deste intervalo incluída.
Figura 1.7 – Quantidade de sedimentos transportados (kg.m-1.Ciclo de Maré-1) a
partir da equação de Meyer-Peter & Müller (1948) e Van Rijn (2007) para a
seção de estudo.
Figura 1.8 – Possíveis origens dos sedimentos sendo exportados pela
x
desembocadura sul do CEP (I a III) (Adaptado de Lamour et al., 2004).
Figura 2.1 – Visão geral da desembocadura do Complexo Estuarino de
Paranaguá (CEP), com o detalhe da batimetria no transecto estudado no qual
foram obtidas as amostras de transporte por carga de fundo e os dados de
correntes.
Figura 2.2 – Curva de calibração da turbidez (em NTU) a partir da concentração
de sólidos em suspensão (kg.m-3).
Figura 2.3 – Curvas das marés de 2008 e 2012, mostrando uma variação
efetiva na amplitude de 0,2 m (acima). Abaixo, gráfico com a velocidade do
fluxo ao longo do ciclo de maré (em m.s-1), com a faixa de transporte nulo.
Figura 2.4 – Perfil vertical de concentrações (em mg.l-1) ao longo do ciclo de
maré interpolados a partir dos perfis verticais com o CTD, utilizando a
profundidade adimensional para a comparação das estações.
Figura 2.5 – Razão entre taxas preditas e mensuradas usando os diferentes
perfis de concentração avaliados, utilizando como base o cálculo da
concentração e profundidade de referência segundo Van Rijn (1984).
Figura 2.6 – Razões entre as taxas preditas e mensuradas utilizando as
diferentes fórmulas de concentração e profundidade de referência. Perfil de
concentrações na coluna d’água utilizado foi o de Van Rijn (1984).
Figura 2.7 – Razões entre as taxas preditas e mensuradas utilizando as
fórmulas de Van Rijn (1984) e Van Rijn (1984) Modificado, para as
concentrações e profundidade de referência.
Figura 2.8 – Quantidade de sedimentos transportados (kg.Ciclo de Maré-1)
xi
calculada a partir do perfil de Van Rijn de concentrações para a coluna d’água,
e da concentração e profundidade de referência sugeridas pelo mesmo autor
com a modificação sugerida neste trabalho.
Figura 2.9 – Quantidade de sedimentos transportados (kg.Ciclo de Maré-1) a
partir do valor médio do transporte na coluna d’água obtido a partir dos perfis
com CTD.
xii
LISTA DE TABELAS
Tabela 1.1 – Resumo das taxas obtidas (em kg.m-1.s-1) com o amostrador físico
e das preditas a partir das velocidades de fluxo pelas equações. As amostras
com (*) foram removidas das análises estatísticas por serem consideradas
outliers.
xiii
PREFÁCIO
O objetivo geral deste trabalho foi avaliar a desembocadura sul do
Complexo Estuarino de Paranaguá quanto a seu comportamento sedimentar,
analisando o transporte de sedimentos na região. A abordagem utilizada foi a
de estimar taxas de transporte de sedimentos, de forma a elucidar a escala
provável em que estes processos ocorrem na região.
O trabalho foi dividido em dois capítulos, de forma a abordar os
processos de transporte por carga de fundo e em suspensão
independentemente, e cada capítulo corresponde a um artigo proposto para
publicação. Por esta razão, cada um deles apresenta uma estrutura fixa, e pode
ser lido de forma independente. Dessa forma, alguns pontos em ambos os
textos se sobrepõem, o que se estende a algumas figuras, ao passo que ambos
tratam da mesma área de estudo e necessitam da mesma avaliação do uso de
dados pretéritos.
Para a publicação, e consequente estruturação do documento, foi
adotada a padronização requerida pelo periódico: Continental Shelf Research.
Esta revista foi escolhida devido ao seu Qualis A2 nas duas áreas de interesse
à possíveis programas de pós-graduação (Biodiversidade e Engenharias), além
da sua abrangência e seu fator de impacto no meio acadêmico (2,088).
1
CAPÍTULO I
A CARGA DE FUNDO ATRAVÉS DE EQUAÇÕES DETERMINÍSTICAS NA
DESEMBOCADURA SUL DO COMPLEXO ESTUARINO DE PARANAGUÁ
Resumo
O atrito entre a massa de água e o fundo dos corpos aquosos produz a
movimentação de grãos de sedimentos, que são transportados e depositados em
regiões diferentes à sua fonte. O objetivo deste trabalho foi estimar a capacidade
de transporte de sedimentos a partir de correntes de maré, ao longo de uma seção
transversal na desembocadura sul do Complexo Estuarino de Paranaguá (CEP),
durante um ciclo de maré de sizígia. Os dados relativos às correntes de maré
foram obtidos de um banco de dados pré-existente. Foram coletados sedimentos
transportados por carga de fundo em três estações ao longo de uma seção
transversal na desembocadura, durante um ciclo de maré, utilizando um
amostrador físico do tipo Helley-Smith. As taxas preditas de transporte foram
calculadas a partir de metodologia descrita na literatura. Foram testadas nove
equações a partir de uma regressão linear tipo II e do teste de razões, para a
definição da formulação teórica mais adequada para a região. Dentre as equações
testadas, Meyer-Peter & Müller (MM) foi a que apresentou o melhor
comportamento segundo os dois testes realizados. Por outro lado, a equação de
van Rijn (VR) apresentou um bom comportamento, possuindo maior versatilidade.
Ambas as equações descrevem a desembocadura como uma exportadora de
sedimentos, com uma ordem de magnitude de 104 m3.ano-1. Estes sedimentos
exportados são, provavelmente, os responsáveis pelo assoreamento do canal
navegável dragado à sudeste do transecto estudado. A origem deste material não
ficou completamente evidente, mas três hipóteses são sugeridas para identificar a
área-fonte destes sedimentos.
2
Abstract
The shear between water masses and sedimentary bottoms produces friction,
which promotes sediment transport. These sediments move either as bed load or
suspended load, and are deposited in regions away from their sources. The
objective of this study was to assess the deterministic bed load equation in
literature that can best describe the ability of the tidal currents in the southern inlet
of Paranaguá Estuarine Complex (PEC) to transport sediments, during a spring
tidal cycle. The current data used was obtained from a previous study, with similar
meteorological conditions. Field data of sediment transport was obtained using a
modified Helley-Smith sampler along the extension of the inlet, during a semi-
diurnal tidal cycle, in three stations defined according to the bathymetric setting.
Predicted sediment transport was calculated following methodology described in
literature, and both sets of data were compared. Both a tendency test and the ratio
of predicted and measured transport were used to evaluate the best deterministic
equation. Of all equations tested, the Meyer-Peter & Müller (MM) had the best
overall performance, and the Van Rijn (VR) equation performed almost as good,
but has a broader applicability as it can account for wave action. Both equations
describe the inlet as exporting sediments, with an order of magnitude of 104
m3.year-1. These sediments are most likely responsible for the shoaling of the
navigable channel just southeast of the studied transect. The origin of this material
is not clear, and three hypotheses are suggested to evaluate the possible sources
of this sediments.
3
Notação
Uwcr – velocidade orbital crítica β – declividade do fundo
Uw – velocidade orbital – fator síltico (6 2 x 10
5
50
⁄ )
θcr
– parâmetro de Shields crítico – densidade da água
θ – parâmetro de Shields – densidade do grão (2650 kg.m-3)
′ - Estresse por correntes 50 – diâmetro mediano do grão
′
- Estresse crítico por correntes φ
i – ângulo de repouso dos
sedimentos (≈ 28º)
Φ – transporte por carga de fundo
adimensional 𝑔 - gravidade (9.81 m.s-2)
qb –transporte por carga de fundo b – declividade da reta de regressão
s – razão de densidades (
𝑠
⁄ ) R – coeficiente de correlação
𝐷 - diâmetro adimensional do grão R2 – coeficiente de determinação
1. Introdução
Na modalidade do transporte marinho e/ou aluvial, são reconhecidas três
formas principais: em suspensão (suspended load), por lavagem (wash load) e/ou
por carga de fundo (bed load) (Souslby, 1997). O transporte por carga de fundo é
o processo responsável pela conexão entre as condições hidráulicas e a
morfologia de canais (Gomez, 1991), gerando diversas possibilidades de
mudanças na morfologia de áreas costeiras.
A efetividade na ressuspensão e transporte de sedimentos apresenta um
caráter complexo devido à mistura entre diferentes diâmetros de partículas. A
mudança de granulometria entre siltes e areias pode marcar a diferença entre
sedimentos coesivos e não coesivos, de forma a influenciar na capacidade das
4
correntes de maré em efetuar o transporte (Soulsby, 1997). Amos et al. (2010)
identificaram que mesmo as areias muito finas podem ser transportadas por carga
de fundo, sendo que a partir desta fração, grãos menores tendem a entrar
diretamente em suspensão. Assim, de modo geral, o transporte de sedimentos é
dependente da rugosidade de fundo. A rugosidade total só é significante no caso
de fluxos combinados (ondas + correntes), não sendo importantes no caso de
correntes estuarinas (Van Rijn, 2007).
Diversas equações para predição do transporte sedimentar por carga de
fundo foram propostas na literatura (Meyer-Peter & Müller, 1948; Bagnold, 1963;
Yalin, 1963; Wilson, 1966; Ashida & Michiue, 1972; van Rijn, 1984; Madsen, 1991;
Nielsen, 1992; Cámenen & Larson, 2005; Van Rijn, 2007). No geral, o
conhecimento utilizado nas ponderações baseia-se nas forçantes hidrodinâmicas
associadas ao transporte (correntes, ondas ou uma combinação de ambas), e às
características sedimentares e batimétricas da região. Em um contexto geral, as
fórmulas foram idealizadas para fluxos fluviais, entretanto podem ser aplicadas
para correntes de maré em escalas instantâneas, pois apresentam um mesmo
comportamento que a vazão de um rio. Porém, é difícil estabelecer uma
correlação entre dados in situ e teóricos com uma acurácia menor que um fator 2
para rios, podendo chegar até um fator 5 no caso de ambientes marinhos
(Soulsby, 1997), devido a alta variabilidade inerente aos processos de transporte.
Por essa razão, não é realístico avaliar uma fórmula apenas com base em sua
capacidade de duplicar valores medidos, ou apenas de reproduzir uma tendência
(Gomez, 1991).
O objetivo deste trabalho foi avaliar dentre as diferentes equações
determinísticas para o transporte por carga de fundo propostas na literatura, a que
melhor descreve a capacidade da desembocadura sul do Complexo Estuarino de
Paranaguá (CEP) em transportar sedimentos por carga de fundo, identificando as
prováveis magnitudes em que este processo ocorre e as possíveis origens deste
material.
5
1.1 Área de Estudo
A desembocadura sul do Complexo Estuarino de Paranaguá (CEP),
localizada na porção centro-norte do litoral paranaense (Fig. 1.1), apresenta um
regime de marés predominantemente semi-diurno, com amplitudes inferiores a 2
m na desembocadura (Marone & Jamiyanaa, 1997). Com relação ao padrão de
circulação, Noernberg et al. (2007) verificaram que as correntes de maré
acompanham a via de navegação, com uma preponderância das correntes de
maré vazante sobre as de enchente em toda a coluna d’água. Essa
preponderância das correntes de vazante também foi reportada por Lana et al.
(2001) e Mantovanelli et al. (2004), este último indicando uma diferença de até
48% na intensidade média das correntes entre os momentos de maré.
Figura 1.1 – Visão geral da desembocadura do Complexo Estuarino de
Paranaguá (CEP), com o detalhe da batimetria no transecto estudado no qual
foram obtidas as amostras de transporte por carga de fundo e os dados de
6
correntes.
Segundo Lana et al. (2001) as ondas que adentram a desembocadura sul
do CEP provém preferencialmente do quadrante SE, com altura média de 0,5 m, e
períodos variando entre 3 e 7 s, atingindo uma altura máxima de 2 a 3 m nos
eventos de tempestade. Noernberg et al. (2007) salientaram que a turbulência
gerada por estas ondas atua amplificando o transporte por carga de fundo, e
promovendo o assoreamento do canal navegável aos portos costeiros do Paraná.
O diâmetro médio dos sedimentos de fundo distribuídos na região varia
entre as areias finas, na porção interna da desembocadura, às areias médias, na
sua região externa, onde a ação das ondas é mais efetiva. Os graus de seleção
variam entre bem e muito bem selecionados, com teores de carbonatos e de
matéria orgânica abaixo dos 5% e porcentagens de finos inferiores a 10% (Lamour
et al., 2004).
O contexto batimétrico da região mostra a ocorrência de um delta de maré
vazante na porção externa do CEP, e um hemi-delta de maré enchente na área
chamada Saco do Limoeiro, disposto junto a face oriental da Ilha do Mel (Angulo,
1999). Estes deltas evidenciam o ambiente sedimentar nas adjacências do CEP.
Além disso, dragagens periódicas são necessárias para manter as profundidades
desejáveis ao longo do canal (Lamour & Soares, 2008), o que demonstra a
efetividade do transporte sedimentar na região.
2. Metodologia
2.1 Série de Dados
Os dados de correntes foram obtidos a partir de levantamentos realizados
na região com o uso de um correntômetro acústico ADP-Sontek, no contexto do
projeto de cooperação Brasil-Alemanha DESPORT (Marone et al., em prep.), ao
longo de uma seção transversal entre a Ponta do Poço e a Ilha do Mel (Fig. 2.1).
7
Foram realizadas medições a cada hora, durante dois ciclos semi-diurnos
completos de sizígia (26 h) em Fevereiro de 2008.
Os dados relativos à altura significativa e período de ondas foram
consultados de Lana et al. (2001), com o intuito de verificar a influência desta
forçante na região, através do cálculo do limiar de transporte por ondas (Uwcr).
Uma análise prévia dos dados de batimetria indicou a necessidade de uma
divisão da seção transversal em três segmentos, devido a profundidade média,
para a análise do transporte, sendo denominados: Ponta do Poço (PP) – 24 m,
Canal Dragado (CD) – 14 m, e Ilha do Mel (IM) – 8 m (Fig. 1A).
2.2 Dados de Campo
Os dados de transporte por carga de fundo em campo foram obtidos com
um amostrador do tipo Helley-Smith (Helley & Smith, 1971), adaptado com uma
malha de 63 µm. A armadilha foi submergida a cada hora por 5 minutos, ao longo
de um ciclo de maré de sizígia (13 h) para as três estações, em Março de 2012. O
tempo de submersão foi adotado como forma de redução dos efeitos de
colmatação do ensacador, e na tentativa de evitar que mais que 40% da sua
capacidade fosse excedida (Emmet, 1981), o que pode reduzir a sua eficiência. As
amostras coletadas foram secas e pesadas em balança de precisão (10-4), e
analisadas em um granulômetro laser MICROTRAC Bluewave para verificar se o
tamanho médio dos grãos capturados correspondiam ao encontrado no fundo.
Posteriormente, foram analisadas também quanto ao seu grau de
arredondamento, utilizando um Analisador de Formas digital (SIA) acoplado ao
granulômetro.
Ainda, foram obtidas amostras de sedimentos de fundo de cada estação
utilizando uma draga busca-fundo do tipo Petite Ponar, para verificar sua
compatibilidade com os dados pretéritos descritos para a região e com os
sedimentos capturados pela armadilha. As amostras de sedimentos de fundo
foram processadas seguindo o mesmo método utilizado em Lamour et al. (2004)
para preservar o potencial de comparação dos resultados. Esta comparação de
8
dados serviu para verificar se houve mudanças significativas nos sedimentos de
fundo já relatado para a região, e se houve alguma seletividade nos sedimentos
capturados pela armadilha.
2.3 Definição da Melhor Equação
Tanto as taxas de transporte sedimentar por carga de fundo obtidas em
campo quanto as preditas pelas equações foram padronizadas em kg.m-1.s-1, e
comparadas utilizando uma regressão do tipo II (Sokal & Rohfl, 1995) no software
R 2.15, usando o pacote “smatr”. Este teste foi realizado para verificar a
capacidade das fórmulas de reproduzir a tendência de uma relação ideal entre
taxas preditas e medidas, representadas por b = 1. Neste teste, aceitar H0 significa
que as retas possuem relação entre si, e quanto menor o valor desta correlação
(R), melhor a relação (Warton et al., 2006).
Além disso, foram plotadas as razões entre as taxas preditas e medidas em
relação à velocidade dos fluxos, para avaliar a porcentagem de valores destas
razões que se encontram no intervalo de um fator 0,5 a 3, conforme descrito por
Soulsby (1997) para transporte por correntes. Dessa forma, espera-se que o uso
de ambos os testes satisfaça o questionamento de Gomez (1991) quanto à
validade da escolha de uma equação.
2.4 Estimativa do Transporte por Carga de Fundo
A partir das equações definidas como mais representativas da área de
estudo, foi calculado o volume transportado médio em cada momento do ciclo de
maré (enchente e vazante). Para isto, foi considerada a duração de cada momento
do ciclo de maré como proposto por Marone & Jamiyanaa (1997), de 6,8 h para a
enchente e 5,5 h para a vazante, e o volume médio transportado segundo cada
equação. Essa assimetria na duração das marés também é reforçada por
Mantovanelli et al. (2004), que indicou diferenças de até 3.6 h entre os dois
momentos do ciclo de maré.
9
Com base nos valores (kg.m-1.momento da maré-1) para cada estação foi
calculado o transporte residual líquido, e também uma média geral para toda a
seção. Por fim, com base no valor líquido transportado pela média da seção, e
considerando a seção com 3000 m de comprimento, obteve-se o volume líquido
(m³.ano-1) de sedimentos transportados segundo a conversão proposta por
Soulsby (1997). O valor foi dividido pela metade, para considerar apenas os
momentos de maré de sizígia ao longo do ano, e transformados de massa (kg)
para volume (m³) através da divisão pela densidade média do quartzo (2650
kg.m³).
3. Teoria
Para o cálculo das taxas preditas foi seguido o método proposto por
Soulsby (1997), modificando-se o limiar de transporte (Shields crítico - 𝜃𝑐𝑟
)
segundo van Rijn (2007) para fundos compostos por areias finas. Também foi
calculado o limiar de transporte por ondas (Uwcr), ainda segundo Soulsby (1997),
para as três regiões propostas, para verificar se há uma efetiva ação de ondas.
Foram utilizadas nove equações de transporte por carga de fundo, sete das
quais segundo a compilação de Soulsby (1997):
ϕ θ 𝜃𝑐𝑟
(1; Meyer-Peter & Müller, 1948 - MM)
ϕ 𝐹𝐵𝜃
𝜃 𝜃𝑐𝑟
(2; Bagnold, 1963 - BA)
com: 𝐵
𝐶𝐷
𝑡𝑎𝑛𝜑
𝑖 𝑡𝑎𝑛𝛽
𝜑𝑖 = ângulo de repouso dos sedimentos (areias submersas ≈ 28º).
𝛽 = declividade do fundo.
ϕ 𝐹𝑌𝜃
𝜃 𝜃
𝑐𝑟 (3; Yalin, 1963 - YA)
com: 𝐹𝑌
𝜃𝑐𝑟
𝑎𝑇 ( 𝑎𝑇)
𝑎 𝜃𝑐𝑟
𝑠
10
𝑇 𝜃 𝜃𝑐𝑟
𝜃𝑐𝑟
ϕ 𝐹𝑀 𝜃
𝜃
𝑐𝑟
𝜃 𝜃
𝑐𝑟 (4; Madsen, 1991 - MA)
com: 𝐹𝑀
𝑡𝑎𝑛𝜑𝑖 para grãos em rolamento.
𝐹𝑀
para grãos em saltação.
ϕ 𝜃
𝜃𝑐𝑟
𝜃 𝜃
𝑐𝑟 (5; Ashida & Michiue, 1972 - AM)
ϕ 𝜃
(6; Wilson, 1996 - WI)
ϕ 𝜃
𝜃 𝜃𝑐𝑟
(7; Nielsen, 1992 - NI)
Ainda, foram utilizadas as equações propostas por Cámenen & Larson
(2005; CL) e Van Rijn simplificada (2007; VR), considerando apenas dados de
correntes:
ϕ 𝜃
𝜃𝑐𝑟
𝜃 (8; Cámenen & Larson, 2005 - CL)
𝐷
⁄
⁄ (9; Van Rijn, 2007 – VR)
com: 1, para d50 > 62 µm.
Todas as equações, com exceção à de Van Rijn (2007), fornecem o valor
do transporte por carga de fundo adimensional. Assim, estes valores devem ser
convertidos em transporte por carga de fundo pela relação:
ϕ 𝑏
𝑔(𝑠 1) 50
3 1 2
(10)
4. Resultados
4.1 Séries de Dados e Dados de Campo
A análise da curva de maré para o período de 2008, quando os dados de
correntes foram obtidos, e a curva de maré de 2012, quando os dados de
transporte foram coletados, demonstra amplitudes e comportamento similares
(Fig. 1.2) entre os momentos. Porém, a variação da maré em 2008 foi cerca de 0,2
11
m superior à amplitude em 2012, o que pode indicar correntes de maré
ligeiramente mais intensas neste período. Para cada seção foi calculada a
velocidade média das correntes ao longo do ciclo de maré, obtendo-se valores de
até 0,9 m.s-1.
Figura 1.2 – Curvas das marés de 2008 e 2012, mostrando uma variação efetiva
na amplitude de 0,2 m (acima). Abaixo, gráfico com a velocidade do fluxo ao longo
do ciclo de maré (em m.s-1), com a faixa de transporte nulo.
De modo geral, as taxas obtidas a partir da captura pela armadilha foram
menores que as taxas preditas pelas equações (Tabela 1.1). A maior taxa obtida
em campo foi de 25,9 x 10-3 para a PP, 17,8 x 10-3 para o CD, e 2,42 x 10-3 para a
IM, todas em kg.m-1.s-1. Já para as equações, o maior valor obtido foi para MA,
70,2 x 10-3 kg.m-1.s-1.
Tabela 1.1 – Resumo das taxas obtidas (em kg.m-1.s-1) com o amostrador físico e
das preditas a partir das velocidades de fluxo pelas equações. As amostras com
(*) foram removidas das análises estatísticas por serem consideradas outliers.
Vel. Medido AM BA CL MA MM NI VR WI YA
12
m.s-
1
x 10-3 x
10-3
x
10-3
x
10-3
x
10-3
x
10-3
x
10-3
x
10-3
x
10-3
x
10-3
PP 0,61 9,69 1,46 0,81 0,74 3,40 2,19 3,69 1,94 7,68 0,51
PP 0,85 2,36 10,4 2,88 6,23 18,0 9,50 15,2 10,6 20,8 4,60
PP(*) 0,67 25,9 2,82 1,21 1,47 5,82 3,49 5,79 3,43 10,2 1,06
PP 0,51 0,50 0,25 0,29 0,16 0,85 0,71 1,15 0,38 4,49 0,07
PP 0,50 0,21 0,16 0,25 0,13 0,69 0,60 0,96 0,28 4,23 0,05
CD 0,65 1,97 3,83 1,67 2,04 7,55 4,30 7,24 3,76 11,9 1,52
CD 0,89 16,1 18,6 5,07 11,9 30,5 15,2 24,2 15,6 30,6 8,99
CD 0,80 17,8 11,4 3,52 6,92 19,7 10,2 16,5 10,1 22,2 5,21
CD 0,50 0,75 0,48 0,50 0,27 1,46 1,03 1,83 0,52 5,42 0,15
CD 0,47 1,12 0,21 0,32 0,15 0,82 0,64 1,12 0,21 4,50 0,06
CD 0,50 0,05 0,48 0,50 0,27 1,46 1,03 1,83 0,52 5,42 0,15
CD 0,44 0,71 0,06 0,17 0,08 0,35 0,34 0,53 0,03 3,70 0,02
IM 0,74 0,13 13,3 3,79 8,02 23,0 10,5 19,3 10,4 26,3 7,17
IM(*) 0,98 0,25 45,0 9,88 31,0 70,2 31,1 51,9 31,4 61,0 28,5
IM 0,72 0,81 11,7 3,45 6,91 20,5 9,34 17,5 9,26 24,2 6,17
IM 0,45 0,04 0,37 0,44 0,24 1,29 0,40 1,70 0,27 5,91 0,13
IM 0,49 2,42 0,97 0,74 0,51 2,59 1,01 3,04 0,83 7,63 0,36
IM 0,45 0,01 0,37 0,44 0,24 1,29 0,40 1,70 0,27 5,91 0,13
*Amostras removidas das análises estatísticas por serem consideradas outliers.
Quanto às amostras de sedimentos de fundo, verificou-se que não houve
alteração em relação aos resultados relatados por Lamour et al. (2004),
compreendidas na classe das areias finas. Ainda, uma análise granulométrica dos
sedimentos capturados na armadilha mostra que não existe diferença significativa
entre os sedimentos de fundo e os que se encontravam no ensacador. Este
padrão se estende também entre as estações (Fig. 1.3), já que os sedimentos
capturados estão na faixa das areias finas, bem selecionadas. Por fim, a análise
da forma dos sedimentos capturados revela que eles possuem alto grau de
arredondamento (Fig. 1.4), evidenciando o seu desgaste e consequente grau de
13
maturidade avançado.
Figura 1.3 – Distribuição do tamanho do grão dos sedimentos coletados pela
armadilha nas três estações.
Figura 1.4 – Porcentagem de arredondamento dos sedimentos capturados
pela armadilha em cada uma das estações amostrais.
Quanto ao Uwcr calculado para a região, o valor aproximado para as três
14
estações foi de 0,14 m.s-1 (± 7x10-3 m.s-1). Este limiar foi excedido apenas na IM,
onde teve uma ordem de magnitude acima dos demais compartimentos,
apresentando valor de 0,15 m.s-1, considerando os dados de onda de Lana et al.
(2001). Em condições de tempestade, nas quais se espera que as alturas de
ondas sejam maiores, é provável que haja uma maior influência deste parâmetro.
4.2 Definição da Melhor Equação
Em relação à comparação entre as formulações teóricas e os dados de
campo, observou-se que para todas as equações a regressão tipo II foi
significativa (Pvalor < 0,05), obtendo-se valores de R² de até 0,39 (equação de MM).
Em relação ao teste de tendência (Fig. 1.5), apenas quatro fórmulas aceitaram H0,
e possuem uma tendência próxima a ideal (MM, VR, AM e NI).
Figura 1.5 – Regressão tipo II entre as formulações teóricas (eixo x) e os
15
dados medidos in situ (eixo y). Em destaque, o índice de determinação (R²) e
a correlação entre as retas da regressão (linha pontilhada) e a reta ideal (linha
sólida).
No referente às razões (Fig. 1.6), a porcentagem de dados dentro do
intervalo de 0,5 a 3 mais alto foi de 50%, para a equação de MM, com apenas
outras 3 equações mantendo-se acima dos 40% (VR, MA e NI).
Figura 1.6 – Razão entre taxas preditas e mensuradas em relação à
velocidade das correntes. Linha pontilhada marca o intervalo de um fator 0,5 a
3, com a porcentagem dos dados dentro deste intervalo incluída.
4.3 Estimativa do Transporte por Carga de Fundo
A partir das equações de MM e VR, definidas como as mais representativas
16
para a região, a quantidade de sedimentos transportados foi calculada em cada
momento do ciclo de maré (Fig. 1.7). Como as duas equações se comportaram de
forma muito parecida, não houve grandes diferenças entre os volumes calculados
por cada uma delas.
Pôde-se verificar que houve uma grande diferença entre o volume
transportado na enchente e na vazante, com diferença de uma ordem de
magnitude entre estes momentos. De modo geral, o transporte na enchente
esteve abaixo dos 20 kg.m-1, enquanto o transporte na vazante chegou até 170
kg.m-1. Esta assimetria entre os volumes de sedimento entrando e saindo pela
desembocadura gera um transporte residual líquido de sedimentos com sentido
estuário afora, na ordem de 102 kg.m-1.
Figura 1.7 – Quantidade de sedimentos transportados (kg.m-1.Ciclo de Maré-1)
a partir da equação de Meyer-Peter & Müller (1948) e Van Rijn (2007) para a
seção de estudo.
Quando fazemos a conversão do volume transportado em um ciclo de maré
para a taxa transportada por ano obtemos um valor, para o transporte total da
seção, de 94.779 m3.ano-1 para a equação de VR e 93.807 m3.ano-1 para a
equação de MM, considerando apenas as marés de sizígia.
17
5. Discussão
5.1 Dados Pretéritos e de Campo
A diferença em amplitudes de maré entre 2008 e 2012 pode ter sido uma
das responsáveis por, de maneira geral, as taxas preditas terem sido maiores que
as taxas mensuradas. Apesar disso, essa diferença não parece ter impedido a
correlação entre os dois conjuntos de dados.
No caso das amostras removidas dos testes estatísticos por terem sido
consideradas outliers, à amostra da Ponta do Poço pode-se supor que o
amostrador tenha agido como uma draga no instante de sua recuperação para a
superfície. Este comportamento, descrito na literatura por Emmet (1981), pode ter
gerado uma taxa de captura mais elevada que aquela esperada pelo fluxo inferido
para aquele momento. Já para a amostra da Ilha do Mel, o fluxo inferido é muito
alto para uma taxa de transporte coletada tão baixa. Pode-se supor que tenha
havido perda de material durante a recuperação da armadilha.
Quanto à granulometria na região, a baixa porcentagem de finos e o alto
grau de seleção das amostras reduzem os possíveis erros associados a matrizes
sedimentares heterogêneas e a efeitos de coesividade, que segundo Soulsby
(1997) alteram o transporte sedimentar e diminuem a confiabilidade das equações
preditivas. Além disso, o fato dos sedimentos possuírem um alto grau de
arredondamento demonstra que esse material sofreu retrabalhamento,
encontrando-se, provavelmente, longe de sua área de origem.
A única estação onde o Uw calculado ultrapassou o Uwcr foi à IM. Estes
valores demonstraram que o potencial de transporte das ondas na região é
pequeno, mostrando uma redução na efetividade desta forçante em relação ao
encontrado por Noernberg et al. (2007) para a porção imediatamente à saída do
estuário (plataforma interna). Além disso, o fato da IM ser a única porção
aparentemente afetada por ondas pode explicar porque, para esta região, as taxas
obtidas foram não foram condizentes com as taxas preditas pelas equações,
devido às interações correntes-ondas.
18
5.2 Definição da Melhor Equação
Dentre todas as equações testadas neste trabalho, apenas três obtiveram
bons desempenhos em ambos os testes (VR, MM e NI).
Soulsby (1997) salienta que a equação de WI é indicada em condições de
fundo plano de fluxo superior (sheetflow), o que fica evidente no gráfico de razões
(Fig. 1.6), em que a maior parte dos valores encontra-se acima de um fator 3.
Villatoro et al. (2010), em um estudo similar, identificaram que a equação
de YA apresentou uma dispersão acentuada nos valores preditos, tal qual neste
estudo, como pode ser verificado no gráfico de razões (Fig. 1.6). Ainda,
verificaram que a equação de BA tendeu a superestimar o transporte. Neste
trabalho, esta equação apresentou uma reta de tendência quase sem inclinação,
não representando bem os dados medidos, já que seus valores não apresentaram
muita variabilidade temporal.
As equações de NI, AM, MA e CL apresentaram comportamentos parecidos
entre as razões, porem com tendências diferentes. A partir da análise de ambos
os gráficos, podemos supor que as constantes da equação de AM apresentaram o
melhor ajuste em relação aos dados testados neste trabalho. A sua tendência
esteve mais próxima à ideal dentre todas as equações, com uma porcentagem
razoável (37,5 %) de dados no intervalo de razões analisado.
As equações de VR e MM foram as que melhor representaram os dados
mensurados quando levados em conta os dois testes realizados. A equação de
VR possui uma ampla base de dados ao qual foi calibrada, mas tende a
subestimar o transporte em velocidades abaixo de 0,6 m.s-1, como ressaltado pelo
próprio autor (Van Rijn, 2007). Esta subestimação pode ser verificada pelo gráfico
de razões (Fig. 1.6), constituindo a principal diferença entre seu desempenho em
relação à equação de MM. A vantagem desta equação é sua possibilidade de ser
utilizada em fluxos combinados, no qual a ação de ondas e correntes é esperada,
já que ela inclui parâmetros de ondas na sua formulação.
A equação de MM apresentou o melhor resultado das razões, e uma boa
tendência em relação à reta ideal. Aparentemente, esta equação é a que melhor
19
descreveu os dados mensurados, e seria a mais adequada para representar o
transporte por carga de fundo na região da desembocadura sul do CEP. Além
disso, esta equação é frequentemente utilizada na literatura, como salientado por
Van Rijn (2007), indicando uma boa performance em uma variedade de
ambientes.
Porém, vale salientar que em ambos os gráficos as amostras referentes à
IM apresentaram-se fora do fator 0,5 a 3, e com um comportamento bem diferente
do esperado considerando uma tendência ideal (Fig. 1.2 e 1.3). Este fato
provavelmente está associado à influência de ondas nesta porção do transecto, já
que foi o único local em que a velocidade orbital das ondas excedeu o valor limite.
Como neste trabalho não foram mensurados dados referentes à ação das ondas,
decidiu-se não incluir este parâmetro nas formulações. Caso este parâmetro
estivesse disponível, seu uso na equação completa de VR poderia ter melhorado
os resultados, principalmente nas amostras referentes a essa região.
5.3 Estimativa do Transporte por Carga de Fundo
A partir do transporte de massa residual determinado de aproximadamente
102 kg.m-1.ciclo de maré-1 sentido estuário afora, pode-se verificar que a
desembocadura sul do CEP está atuando como uma exportadora de material para
o sistema costeiro adjacente. Mantovanelli et al. (2004) e Noernberg et al. (2007)
já haviam verificado a preponderância das correntes de vazante em relação as
correntes de enchente em porções distintas do estuário. Ainda segundo
Noernberg et al. (2007), além de maior intensidade, as correntes de vazante
possuem também uma menor variação na sua direção que as de enchente, o que
intensifica sua componente longitudinal. Esta preponderância das correntes de
vazantes também é corroborada por evidências geomorfológicas na região, a
partir do trabalho de Angulo (1999).
Este trabalho tratou um conjunto de dados correntográficos, obtidos num
momento específico do ano, o que dificulta precisar o volume absoluto
transportado na desembocadura sul do CEP. Porém, a partir dos valores médios
20
relativos à área de seção estudada, pode-se estimar o volume exportado líquido
pelo sistema em aproximadamente 94.000 m³.ano-1 segundo a equação de MM
para os momentos de sizígia. Conforme Noernberg et al. (2007), as correntes de
maré na quadratura são menos competentes no transporte sedimentar,
ultrapassando o limiar de movimento apenas durante os períodos de vazante.
Assim, a contribuição das correntes nas quadraturas para o volume final não deve
ser elevada. Apesar de não ser possível uma discussão em termos absolutos, há
a indicação que o CEP, através da desembocadura sul, exporta uma quantidade
de sedimentos na ordem de 104 m3.ano-1. Comparativamente, Villatoro et al.
(2010), para as desembocaduras de Chioggia e Lido na Laguna de Veneza (Itália),
quantificaram volumes de sedimentos exportados na ordem de 103 e 104 m3.ano-1,
respectivamente. Considerando que eles possuem um ambiente com condições
parecidas às encontradas neste estudo, a quantidade proposta neste trabalho
parece ser coerente.
Lamour et al. (2004) realizou um mapeamento granulométrico ao longo do
CEP, verificando que a porção central do estuário é dominada por lamas,
enquanto a desembocadura e a cabeceira do estuário apresentam areias
predominantemente. Dessa forma, é provável que não haja transferência de areias
em quantidades significativas entre a cabeceira e a desembocadura do sistema
(Fig. 1.8). Portanto, o material sendo exportado pela desembocadura sul teria que
ser gerado localmente, ou advindo da própria plataforma interna rasa.
Devido ao alto nível de retrabalhamento apresentado pelos sedimentos
capturados pela armadilha, a hipótese de produção local por intemperismo de
rochas parece menos provável. Podemos supor que parte destes sedimentos
exportados pode ser advinda do Saco do Limoeiro, na porção nordeste da
desembocadura sul, que segundo Angulo (1999) apresenta ondas de areia com
tendência de movimento orientada para o interior do estuário. Porém, a partir
deste estudo, verificou-se que os sedimentos importados pela desembocadura
apresentam uma magnitude pequena se comparada aos volumes exportados.
Dessa forma, parece pouco provável que a desembocadura sul esteja importando
sedimentos em quantidade significativa para balancear sua exportação apenas
21
com a contribuição do hemi-delta de enchente.
Sugerem-se três hipóteses para a origem deste material (Fig. 1.8):
I – Contribuição do eixo N-S do CEP através do aporte a partir dos rios
Itaqui e Benito, ou por erosão e transporte dos sedimentos de fundo deste eixo.
II – Importação de sedimentos a partir da desembocadura norte do CEP,
com o material realizando um movimento circular em torno da Ilha do Mel.
III – Erosão e transporte dos sedimentos de fundo que compõe o canal da
Cotinga, com uma contribuição a partir do rios que desembocam neste canal.
Figura 1.8 – Possíveis origens dos sedimentos sendo exportados pela
desembocadura sul do CEP (I a III) (Adaptado de Lamour et al., 2004).
A hipótese II pode ser inferida a partir dos dados de Angulo (1999), que
caracteriza a desembocadura norte como sendo mais rasa, e através de imagens
de satélite pôde verificar uma intensa quebra de ondas na região. As hipóteses I e
22
III não podem ser verificadas no momento, pois não há estudos da batimetria
destas áreas ou da contribuição de sedimentos dos rios nestas porções do
estuário.
Lamour et al. (2007) identificaram trechos críticos de assoreamento no
canal dragado navegável próximo a seção de estudo. Em um destes trechos, ao
sudeste do transecto avaliado, 93 x 105 m3 de sedimentos foram dragados para
aprofundar o canal. Infelizmente, a falta de levantamento sucessivos na região
após a dragagem impediu que estes autores calculassem a taxa de sedimentação
no canal. Considerando o argumento de Gomez (1991) que o transporte por carga
de fundo é o responsável pela conexão entre as forçantes hidrodinâmicas e a
morfologia dos canais, pode-se supor que a maior parte dos sedimentos que estão
assoreando esta porção do canal são exportados pela desembocadura. Essa
suposição é razoável quando consideramos que dragagens periódicas são
necessárias para manter as profundidades desejáveis ao longo do canal (Lamour
& Soares, 2008).
6. Conclusão
O uso de dois testes estatísticos, a análise de tendência e as razões entre
dados teóricos e mensurados, para a definição de uma equação mais adequada
para a área de estudo mostrou-se útil, principalmente ao separar equações que
apresentaram um bom desempenho apenas em algum dos testes (caso da
equação de AM, que apresentou uma reta de tendência quase perfeita), ao invés
de em ambos. Este resultado corrobora a afirmação de Gomez (1991) de que
apenas considerar a capacidade de reproduzir uma tendência ou um resultado de
uma equação é insuficiente.
Quando se deseja verificar o transporte por carga de fundo influenciado
apenas por correntes estuarinas, a equação de Meyer-Peter & Müller (1948)
mostrou ser a mais apropriada, além de ser mais simples (menor número de
parâmetros). Porém, quando há a ocorrência de ondas, a equação de Van Rijn
(2007) pode apresentar um resultado melhor, sendo a única capaz de incluir esta
23
forçante em consideração e, portanto, tornando-se mais indicada.
De modo geral, a desembocadura sul do Complexo Estuarino de
Paranaguá possui uma competência maior para exportar sedimentos que importa-
los para o sistema, devido à maior intensidade das correntes de vazante sobre as
de enchente. Estimando o volume líquido exportado de sedimentos por carga de
fundo a partir deste sistema, obtemos uma quantidade na ordem de 104 m3.ano-1.
A origem destes sedimentos exportados é incerta. Três hipóteses são
sugeridas como possíveis áreas-fonte, porém mais estudos são necessários para
identificar a origem deste material.
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27
CAPÍTULO II
TRANSPORTE DE AREIAS EM SUSPENSÃO NA DESEMBOCADURA SUL DO
COMPLEXO ESTUARINO DE PARANAGUÁ: UMA ABORDAGEM ATRAVÉS
DE EQUAÇÕES PREDITIVAS E DADOS DE CAMPO
Resumo
O transporte em suspensão é o modo predominante em rios, canais de maré e
praias arenosas, especialmente em altas velocidades de fluxo (acima do 1 m.s-1).
O objetivo deste trabalho foi definir o melhor perfil de concentrações na coluna
d’água, assim como a melhor equação para o cálculo da concentração de ordem
zero para a suspensão, e estimar o transporte nesta modalidade para a
desembocadura sul do Complexo Estuarino de Paranaguá (CEP). Para tanto,
foram obtidos perfis da coluna d’água utilizando um CTD com turbidímetro
acoplado, em três estações ao longo de uma seção transversal na
desembocadura durante um ciclo de maré semi-diurna (13 h). Os dados de
correntes utilizados foram obtidos de levantamento pretéritos na mesma seção,
para condições meteorológicas semelhantes. Dentre os perfis de concentração e
as equações avaliadas, as definições de Van Rijn (1984) foram as que se
mostraram mais adequadas. Devido às baixas velocidades (menores que 1 m.s-1),
ocorreu uma aparente subestimação dos dados para fluxos próximos ao limiar de
suspensão, o que sugere a necessidade de uma adaptação para a equação de
Van Rijn. O volume de sedimentos transportados estimado para a
desembocadura, através da suspensão, esta na ordem de 105 m3.ano-1 sentido
estuário afora. Porém, ocorre uma discrepância nos resultados obtidos com o CTD
em relação às equações e aos dados de fluxos. Acredita-se assim, que esta
diferença seja devido à presença de uma carga de lavagem.
28
Abstract
Suspended transport is the predominant mode of transportation in rivers, tidal
channels and sandy beaches, especially in high velocities (above 1 m.s-1). The
goal of this study was to define the best suspended sediment concentration profile
in the water column and the best equation for the zero order concentration of
suspension, and to estimate suspended transport in the Paranaguá Estuarine
Complex (PEC) southern inlet. Water column profiles of suspended sediments
were obtained with a turbidity sensor coupled to a CTD, in three stations along a
cross-section of the inlet, during a complete semi-diurnal tidal cycle (13 h). The
current data used was obtained from a previous study in the same cross-section,
with similar meteorological conditions. Among the profiles and the equations for the
reference concentration tested, Van Rijn’s (1984) formulae performed best.
However, in low velocities, close to the threshold for suspension, an
underestimation of the concentrations was verified. An adaptation for the equations
was made, which improved the results significantly. More tests, in a variety of
conditions, are necessary to assess this adaptation, but the results presented looks
promising. The volume of sediments estimated to be exported from the estuary in
suspension, through this inlet, was in the order of 105 m3.year-1, according to the
equations. The CTD data showed discrepancies regarding the equations and the
current data. It’s believed that the difference between the two is a consequence of
a significant wash load verified in suspension. This concentration of fine sediments
transported could have masked the turbidity response of sands in the area,
reducing the efficiency of the sensor. If this is the case, then the turbidity sensor is
not the best tool to assess suspended transport in the study site.
29
Notação
Uwcr – velocidade orbital crítica Ca – concentração de referência
Uw – velocidade orbital za – profundidade de referência
θsusp,cr – parâmetro de Shields crítico
para suspensão – densidade da água
θ – parâmetro de Shields total – densidade do grão (2650 kg.m-3)
θc’ – componente superficial do
parâmetro de Shields 50 – diâmetro mediano do grão
θc’’ – componente de forma do
parâmetro de Shields
s – razão de densidades (
𝑠
⁄ )
𝑢 - velocidade de cisalhamento 𝑔 - gravidade (9.81 m.s-2)
′
- Estresse crítico por correntes 𝐷 - diâmetro adimensional do grão
Ws – velocidade de decantação Ts – excesso do estresse ( ′
⁄ )
– altura das formas de fundo 𝜅 – constante de von Karman (0,41)
1. Introdução
O transporte em suspensão é o modo predominante em rios, canais de
maré e praias arenosas. O fator determinante para o transporte sedimentar nesta
modalidade é a velocidade do fluxo, sendo que este transporte torna-se mais
importante em altas velocidades (acima de 1 m.s-1). Para que os grãos
mantenham-se em suspensão, a turbulência gerada pelo fluxo deve ser maior que
a velocidade de decantação (Soulsby, 1997). Desta forma, a granulometria é outro
fator a ser considerado, principalmente em fluxos mais lentos que 1,4 m.s-1 (Van
Rijn, 2007).
No transporte em suspensão, uma carga significativa do material pode
encontrar-se transportada por lavagem. Van Rijn (1993) caracteriza esse
transporte como aquele em que os sedimentos menores que 50 µm são
mobilizados, e que não são encontrados em quantidades significativas no fundo.
30
Esta modalidade pode apresentar concentrações 2 a 3 vezes maiores que o
transporte em suspensão em altas velocidades, atingindo de 5 a 20 vezes em
velocidades baixas (Van Rijn, 2007).
No geral, um perfil vertical das concentrações de sedimentos em suspensão
revela uma gradação entre o fundo e a superfície, com as maiores concentrações
mais próximo ao fundo (Sternberg et al., 1988). Por esta razão, diversas equações
foram postuladas para descrever o seu comportamento na coluna d’água. A
estimativa do transporte em suspensão depende também da Concentração e da
Profundidade de Referência (Ca e za), que servem como uma estimativa de ordem
zero para o cálculo do transporte em suspensão (Bolaños et al., 2012).
Na desembocadura sul do Complexo Estuarino de Paranaguá, a presença
de diversas unidades de conservação e do canal navegável dragado, acesso aos
portos da região, demanda um conhecimento da dinâmica sedimentar deste
sistema, de forma que o impacto das intervenções realizadas possa ser
mensurado e mitigado de forma eficiente. Neste aspecto, o conhecimento dos
padrões de transporte de sedimentos na desembocadura representa uma
incógnita se considerado as relações entre erosão e deposição, assim como sua
contribuição ao sistema costeiro.
Assim, o objetivo deste trabalho foi definir o melhor perfil de concentrações
de sedimentos em suspensão na coluna d’água, assim como a melhor equação
para o cálculo da Concentração e da Profundidade de Referência para o
transporte em suspensão, na região da desembocadura sul do Complexo
Estuarino de Paranaguá (CEP), e estimar o volume de areias transportadas por
esta modalidade.
1.1 Área de estudo
A área de estudo compreende a desembocadura sul do Complexo
Estuarino de Paranaguá (CEP), localizada na porção centro-norte do litoral
paranaense (Fig. 2.1). Segundo Lana et al. (2001) o regime de maré na região é
predominantemente semi-diurno, com amplitudes inferiores a 2 m. Além disso, as
31
marés possuem uma assimetria em sua duração, como descrito por Marone &
Jamiyanna (1997), com a vazante (duração de 5,5 h) tendo uma duração menor
que a enchente (6,8 h).
Figura 2.1 – Visão geral da desembocadura do Complexo Estuarino de
Paranaguá (CEP), com o detalhe da batimetria no transecto estudado no qual
foram obtidas as amostras de transporte por carga de fundo e os dados de
correntes.
Com relação ao padrão de circulação, Noernberg et al (2007) verificaram
que as correntes de maré acompanham a via de navegação, com uma
preponderância das correntes de vazante sobre as de enchente em toda a coluna
d’água. Essa preponderância das correntes de vazante também é reportada por
Lana et al. (2001) e Mantovanelli et al. (2004), este último indicando aumento de
até 48% na intensidade média das correntes de vazante em relação às enchentes.
Quanto à vazão do estuário, Marone et al. (2007) estimaram a magnitude da
32
vazão em 104 m3.s-1, tanto para a porção central do estuário, em frente ao porto de
Paranaguá, quanto para a região da desembocadura sul.
Lana et al. (2001) reporta as ondas que adentram a desembocadura sul
como preferencialmente provindas do quadrante SE, com altura significativa de
0,5 m, e períodos variando dos 3 aos 7 s. A altura significativa de onda pode
chegar aos 2 a 3 m, em condições de tempestade. Noernberg et al. (2007)
salientaram que as ondas possuem alto poder de ressuspensão (turbulência) e
transporte de sedimentos, atuando principalmente no transporte por carga de
fundo e promovendo o assoreamento do canal navegável.
O diâmetro médio dos sedimentos de fundo na região varia entre as areias
finas a médias, enquanto que o grau de seleção varia entre bem a muito bem
selecionados, com teores de carbonatos e matéria orgânica abaixo dos 5% e
porcentagens de finos inferiores a 10% (Lamour et al., 2004).
Noernberg (2001) verificou o alcance da pluma estuarina em,
aproximadamente, 25 km além da desembocadura, denotando o transporte de
sólidos em suspensão da área.
Machado et al. (1997) mensuraram a concentração do material particulado
em suspensão (MPS), ao longo do segmento L-O do CEP durante um ano, entre
1,7 – 221 mg.l-1. Especificamente na região da desembocadura sul, os valores
estiveram entre 10 e 50 mg.l-1, com as maiores concentrações mais próximo ao
fundo, enquanto que Mantovanelli et al. (1999) mensuraram concentrações com
valores entre 0 – 30 mg.l-1, para a mesma área.
2. Materiais e Métodos
2.1 Séries de Dados
Os dados de correntes foram obtidos a partir de levantamentos realizados
na região com o uso de um correntômetro acústico ADP-Sontek, no contexto do
projeto de cooperação Brasil-Alemanha DESPORT (Marone et al., em prep.), ao
longo de uma seção transversal entre a Ponta do Poço e a Ilha do Mel (Fig. 2.1).
33
Foram realizadas medições a cada hora, durante dois ciclos semi-diurnos
completos de sizígia (26 h) em Fevereiro de 2008.
Os dados relativos à altura significativa e período de ondas foram
consultados de Lana et al. (2001), com o intuito de verificar a influência desta
forçante na região, através do cálculo do limiar de transporte por ondas (Uwcr).
Uma análise prévia dos dados de batimetria indicou a necessidade de uma
divisão da seção transversal em três segmentos pela profundidade média, sendo
denominados: Ponta do Poço (PP) – 24 m, Canal Dragado (CD) – 14 m, e Ilha do
Mel (IM) – 8 m (Fig. 1A).
2.2 Dados de Campo
Os dados de perfilagem da coluna d’água foram obtidos com um Compact-
CTD (JFE Advantech Co., Ltd.), com turbidímetro acoplado, durante um ciclo
semi-diurno completo de maré de sizígia, a cada hora em cada estação. Também
foram coletadas amostras de água em três profundidades diferentes (superfície,
meio e fundo) a cada duas horas. Este trabalho foi realizado com uma garrafa
coletora horizontal, mergulhada apenas na estação CD. Cada uma das amostras
foi guardada em recipiente plástico de 1 L, e resfriadas para posterior análise em
laboratório.
Essas amostras foram processadas segundo o método gravimétrico de
Strickland & Parsons (1971), utilizando filtros GF-3 de fibra de vidro, previamente
pesados. Os filtros foram secos em estufa por 2 horas, pesados em balança
analítica com precisão de 10-5 e, depois, calcinados em mufla, a 450 ºC, por 4
horas. Depois de calcinados e resfriados, os filtros foram novamente pesados,
com o intuito da obtenção da concentração dos sólidos em suspensão.
Então, foi realizada uma regressão linear entre o valor em unidades
nefelométricas (NTU) fornecido pelo turbidímetro e a concentração de sólidos em
suspensão (kg.m-3) para a calibração do CTD, com um R² = 0,76 (Fig. 2.2). Os
valores do transporte (kg.m-3) a partir dos dados do CTD na coluna d’água foram
integrados para se obter uma concentração média.
34
Figura 2.2 – Curva de calibração da turbidez (em NTU) a partir da concentração
de sólidos em suspensão (kg.m-3).
Além disso, foram obtidas amostras de sedimentos de fundo de cada
estação, para verificação da sua compatibilidade com os dados pretéritos para a
região. Em laboratório, as amostras foram secas em estufa e pesadas em balança
analítica com precisão de 10-4. As amostras de sedimentos de fundo foram
processadas seguindo o mesmo método utilizado em Lamour et al. (2004) para
preservar o potencial de comparação dos resultados. Esta comparação de dados
serviu para verificar se houveram mudanças significativas nos sedimentos de
fundo já relatado para a região, permitindo a utilização desses dados pretéritos
para efetuar generalizações.
2.3 Definição do Melhor Formato do Perfil de Concentrações, da Ca e da za
Os perfis de concentração de sedimentos em suspensão (em mg.l-1) para a
coluna d’água, obtidos com o turbidímetro, foram plotados utilizando a
profundidade adimensional, de forma que as três regiões pudessem ser
35
comparadas.
Tanto as taxas obtidas em campo quanto as preditas foram padronizadas
em kg.m-3, conforme as unidades no Sistema Internacional (S.I.). As suas razões
foram plotadas em relação à velocidade dos fluxos, para avaliar a porcentagem de
valores contidos no intervalo de um fator entre 0,5 e 3, conforme descrito por
Soulsby (1997) como uma faixa aceitável para o transporte de sedimentos por
correntes de maré. Primeiro foram plotados os formatos dos perfis de
concentração, para definir o que melhor representa a suspensão na coluna
d’água, utilizando Ca e za como descrito por Van Rijn (1984) para a avaliação dos
formatos.
Em seguida, com o perfil escolhido, foram plotadas as razões entre os
valores de transporte obtidos a partir de cada Ca e za avaliados, em relação à
velocidade das correntes.
2.4 Volume Transportado por Ciclo de Maré
Uma vez definido o formato do perfil de concentração de sedimentos em
suspensão na coluna d’água e a Ca e a za a serem utilizados para a estimativa de
ordem zero, a concentração em suspensão predita foi calculada para todo o
momento em que haveria transporte ativo (θc > θsusp,cr).
Utilizando-se a ordem de magnitude da vazão do estuário descrita por
Marone et al. (2007), e as concentrações de sedimentos ao longo da coluna
d’água preditas com as equações e obtidas com o CTD, foram calculadas as
médias integradas do transporte em suspensão ao longo do ciclo de maré, em
ambos os momentos (enchente e vazante), assim como o transporte residual (em
kg.ciclo de maré-1).
Para obter uma estimativa desta taxa como contribuição anual da
desembocadura em volume, dividiu-se o valor pela densidade média do quartzo
(2650 kg.m3) e considerou-se um período de meio ano (marés de sizígia) com
dois ciclos de maré diários.
36
3. Teoria
O limiar de transporte em suspensão (θsusp,cr) e o diâmetro médio em
suspensão na coluna d’água foram calculados segundo as equações de Van Rijn
(1993). O parâmetro de Shields a partir das correntes (θc) foi obtido pelo método
descrito por Soulsby (1997), assim como a velocidade de decantação dos
sedimentos (Ws).
Para o cálculo da Concentração de Referência (Ca), foi utilizada apenas a
componente superficial do estresse (θc’), já que Soulsby (1997) descreve que é a
ação das correntes sobre o grão que irão provocar o movimento, e gerar as
concentrações de ordem zero. Porém, uma vez em suspensão, a difusão de
sedimentos pela coluna d’água será uma função do estresse total (θc = θc’ + θc’’).
Dessa forma, o estresse gerado pela presença de feições de fundo (θc’’) deve ser
considerado para o estágio de transporte em suspensão (Soulsby, 1997; Bolaños
et al., 2012). Como não há informações precisas a respeito das dimensões das
formas de fundo na região, as equações de Van Rijn (1993) foram utilizadas para
a estimativa da altura e comprimento destas formas a partir das velocidades de
corrente e da granulometria de fundo. Uma vez calculados os valores de estresse
(θc), pressupõe-se que o transporte em suspensão ocorrerá quando este valor
ultrapassar o limiar de suspensão (θsusp,cr).
Foram testados três formatos do perfil de concentrações de sedimentos em
suspensão na coluna d’água, com o intuito de se verificar qual melhor se adequa
aos dados de campo:
𝐶(𝑧) 𝐶𝑎 𝑧
𝑧𝑎
⁄ 𝑏 (Perfil Power-Law)
𝐶 𝑧 𝐶
ℎ
ℎ (Perfil de Rouse)
𝐶(𝑧) 𝐶
ℎ
ℎ para za < z < h/2 (Perfil de Van Rijn, 1984)
𝐶(𝑧) 𝐶𝑎
𝑧𝑎
ℎ 𝑧𝑎
𝑏′exp 4𝑏′(
𝑧
ℎ
1
2) para h/2 < z < h
37
com: 𝑏′
𝑏
𝐵1
𝐵2
𝐵1
1 2 𝑊𝑠
𝑢
2 para 0,1 < Ws/u* < 1
𝐵1
2 para Ws/u* ≥ 1
𝐵2
2 5 𝑊𝑠
𝑢
0 8 𝐶𝑎
0 65 0 4 para 0,01 ≤ Ws/u* ≤ 1
𝐵2
0 para Ws > u* ou za > 0,1h
Para todas as equações, 𝑏 𝑊
𝑠
𝜅𝑢
⁄ , o que corresponde ao número de
Rouse.
Também foram testadas três fórmulas para o cálculo de Ca e za, sendo:
𝐶𝑎
0 00156𝑇
𝑠
1 0 0024𝑇𝑠
𝑧𝑎
𝑐𝑟𝑇𝑠
𝑔 𝑠
(Smith & McLean, 1977; SM)
𝐶 𝑇
𝑧 𝐷
𝑧
2, valor mínimo de za = 0,01h (Van Rijn, 1984; VR)
𝐶𝑎
𝐴 𝜃 𝑢
𝑊𝑠
𝐵 (Lee et al., 2007; LE)
onde: A = 2,58 ± 1,7
B = 1,45 ± 0,04
za = 0,01 m.
Dentre as três fórmulas, a única que não apresenta uma equação para za é
LE, a qual utiliza um valor fixo de 0,01 m. Os volumes em suspensão foram
integrados na coluna d’água e representados pelo valor médio, em kg.m-3, para
comparação posterior com os dados de campo.
38
4. Resultados
4.1 Série de Dados
A análise da curva de maré para o período de 2008, quando os dados de
correntes foram obtidos, e a curva de maré de 2012, quando os dados de
transporte foram coletados, demonstra amplitudes e comportamento muito
similares (Fig. 2.3) entre os momentos. Porém, a amplitude da maré em 2008 foi
um pouco superior à amplitude em 2012 (cerca de 0,2 m), o que pode indicar
correntes de maré um pouco mais intensas neste período. Para cada seção foi
calculada a velocidade média das correntes ao longo do ciclo de maré, obtendo-se
valores de até 0,9 m.s-1.
Quanto às amostras de sedimentos de fundo, verificou-se que todas estão
em acordo com os resultados obtidos por Lamour et al. (2004), o que nos permite
extrapolar os resultados obtidos neste trabalho como válidos para toda a região da
desembocadura, onde a predominância de areias finas foi identificada por estes
autores.
Figura 2.3 – Curvas das marés de 2008 e 2012, mostrando uma variação efetiva
39
na amplitude de 0,2 m (acima). Abaixo, gráfico com a velocidade do fluxo ao longo
do ciclo de maré (em m.s-1), com a faixa de transporte nulo.
Quanto ao Uwcr calculado para a região, o valor aproximado para as três
estações foi de 0,14 m.s-1 (± 7x10-3 m.s-1). A velocidade orbital (Uw) calculada para
as três estações excedeu este limiar apenas na IM, apresentando valor de 0,15
m.s-1, uma ordem de magnitude acima dos demais compartimentos. Estes valores
demonstraram que o potencial de transporte das ondas na região é pequeno.
Porém, em condições de tempestade, nas quais se espera que as alturas de
ondas sejam maiores, é provável que haja uma maior influência deste parâmetro.
4.2 Definição do Melhor Formato do Perfil de Concentrações, da Ca e da za
Analisando o perfil vertical de concentrações, e sua evolução ao longo do
ciclo de maré em cada estação (Fig. 2.4), vê-se que houve uma constância de
concentrações na casa dos 4 a 8 mg.l-1 ao longo do ciclo. Os picos de
concentrações, de até 30 mg.l-1, ocorreram em momentos específicos do ciclo de
maré, e sempre nos últimos 20 a 40% da coluna d’água (próximo ao fundo). A
exceção foi a estação Ilha do Mel, no qual a suspensão mostrou-se quase
homogênea ao longo da coluna d’água nos momentos mais intensos da maré.
Esses momentos de maiores concentrações coincidem com a redução das
velocidades abaixo do limiar de transporte em suspensão, indicando que esses
picos de concentração podem estar associados com a deposição de material
sedimentar a partir da coluna d’água.
40
Figura 2.4 – Perfil vertical de concentrações (em mg.l-1) ao longo do ciclo de maré
interpolados a partir dos perfis verticais com o CTD, utilizando a profundidade
adimensional para a comparação das estações.
Em relação ao formato dos perfis de concentração para as areias em
suspensão avaliados, tanto um perfil em Power Law quanto o perfil de Van Rijn
(1984) apresentaram um mesmo comportamento, com 33 % dos dados caindo na
faixa aceitável de 0,5 a 3 (Fig. 2.5). Porém o perfil de Van Rijn apresenta dados
mais próximos do limite desejado que o perfil Power Law, além de uma base física
mais robusta, sendo o mais indicado neste trabalho.
Com o formato do perfil de concentrações na coluna d’água escolhido,
foram plotadas as razões entre as taxas obtidas pela aplicação das diferentes
fórmulas para Ca e za (Fig. 2.6). No geral, a fórmula de VR foi a que melhor se
41
adequou aos dados obtidos em campo. As equações de LE e de SM
superestimaram os dados do CTD, com valores variáveis.
Figura 2.5 – Razão entre taxas preditas e mensuradas usando os diferentes perfis
de concentração avaliados, utilizando como base o cálculo da concentração e
profundidade de referência segundo Van Rijn (1984).
Figura 2.6 – Razões entre as taxas preditas e mensuradas utilizando as
42
diferentes fórmulas de concentração e profundidade de referência. Perfil de
concentrações na coluna d’água utilizado foi o de Van Rijn (1984).
Em baixas velocidades (menor que 0,7 m.s-1), a equação de VR subestimou
sistematicamente o transporte. Dessa forma, sugerimos o uso de uma
profundidade de referência fixa em 0,01 m para velocidades abaixo de 0,7 m.s-1, e
a equação proposta pelo autor acima desta velocidade. Esta adaptação parece ter
melhorado seu desempenho diante das condições avaliadas (Fig. 2.7), o que pode
indicar que a interface carga de fundo-suspensão encontra-se próxima ao fundo
no limiar de suspensão, intensificando este transporte em baixas velocidades.
Figura 2.7 – Razões entre as taxas preditas e mensuradas utilizando as fórmulas
de Van Rijn (1984) e Van Rijn (1984) Modificado, para as concentrações e
profundidade de referência.
4.3 Volume Transportado por Ciclo de Maré
A partir das taxas preditas com a equação de VR adaptada, foram obtidas
as taxas de areias transportadas em suspensão ao longo do ciclo de maré (Fig.
43
2.8). De modo geral, as concentrações foram maiores na maré vazante que na
enchente, com uma concentração residual exportada de, aproximadamente, 2x106
kg.ciclo de maré-1. Já utilizando as médias calculadas a partir dos dados do CTD
(Fig. 2.9), vemos uma predominância das marés enchente em relação às
vazantes, com uma concentração residual importada para o estuário de
aproximadamente 2 x 106 kg.ciclo de maré-1. Se compararmos os resultados para
a média da seção entre o medido com o CTD e o calculado, verifica-se que essa
razão para a vazante é 0,48; para a enchente é de 9,8; e para o residual, é de
1,07. Em ambos os casos, foi considerada a vazão do estuário como 104 m3.s-1,
como sugerido por Marone et al. (2007).
Figura 2.8 – Quantidade de sedimentos transportados (kg.Ciclo de Maré-1)
calculada a partir do perfil de Van Rijn de concentrações para a coluna d’água, e
da concentração e profundidade de referência sugeridas pelo mesmo autor com a
modificação sugerida neste trabalho.
44
Figura 2.9 – Quantidade de sedimentos transportados (kg.Ciclo de Maré-1) a partir
do valor médio do transporte na coluna d’água obtido a partir dos perfis com CTD.
A partir das considerações para a contribuição anual, a exportação de
material por suspensão seria da ordem de 105 m3.ano-1. A partir dos dados do
CTD obtêm-se uma mesma ordem de magnitude, porém com sentido oposto
(importação de material pelo estuário).
5. Discussão
5.1 Definição do Melhor Formato do Perfil de Concentrações, da Ca e da za
Os valores obtidos com o CTD (Fig. 2.4) estão um pouco abaixo dos
valores encontrados por Machado et al. (1997), mas se encontram de acordo com
os valores obtidos por Mantovanelli et al. (1999). Vale salientar que estes
trabalhos mensuraram a concentração de MPS na coluna d’água, enquanto este
trabalho avaliou a concentração dos sólidos em suspensão (CSS). Assim, é de se
esperar que a CSS seja menor que o MPS, pois os componentes orgânicos são
uma parte importante deste material.
45
Além disso, vemos que há a predominância de uma concentração de
material entre 4 e 8 mg.l-1 que independe do estágio da maré e da velocidade das
correntes. Este material apresenta uma suspensão uniforme na coluna d’água
que, de acordo com Van Rijn (2007), pode ser entendido como um transporte por
lavagem. Desta forma, este material deve ser predominantemente fino, e não
encontrado em quantidade no sedimento de fundo (Van Rijn, 1993).
Como na região há areias finas, muito bem a bem selecionadas (Lamour et
al., 2004), a presença de sedimentos finos no sedimento de fundo é muito
pequena, e o transporte em suspensão seria, predominantemente, de areias.
Provavelmente, estes sedimentos finos provem diretamente do interior do estuário,
e são transportados para a plataforma continental sem se depositar na região,
compondo a pluma de sedimentos analisada por Noernberg (2001).
Os perfis de concentração testados avaliam, basicamente, o formato da
curva de concentração de sedimentos em suspensão ao longo da coluna d’água.
O perfil de Rouse e o de Van Rijn (1984) apresentam um comportamento
parabólico ao longo da coluna d’água, enquanto a Power Law apresenta um
comportamento linear (Soulsby, 1997). A principal diferença entre o perfil de
Rouse e os demais é que ele possui valor zero na superfície, fato incomum de se
encontrar em condições marinhas. Bolaños et al. (2012) testaram tanto o perfil de
Rouse quanto o Power Law em seus dados, chegando a conclusão que o Power
Law representa melhor a distribuição da concentração de sedimentos em
suspensão. Sternberg et al. (1988), utilizando o perfil de Rouse, obteve 50% de
correlação entre dados teóricos e mensurados em campo. Soulsby (1997) salienta
que o uso do perfil de Rouse no mar não é adequado, devido à sua redução a
zero junto à superfície. O mesmo autor salienta que o perfil de Van Rijn (1984) é
mais indicado, pois utiliza o comportamento parabólico do perfil de Rouse, sem a
redução a zero.
Neste trabalho, ambos o perfil de Van Rijn (1984) quanto o Power Law
apresentaram o melhor desempenho dentre os avaliados, corroborando a
avaliação de Soulsby (1997) e Bolaños et al. (2012) quanto a indicação destes
formatos do perfil de concentrações. Além disso, como para a área de estudo a
46
suspensão encontra-se limitada ao último terço da coluna d’água, o desempenho
desses formatos não pôde ser bem avaliado, já que segundo Soulsby (1997) eles
se igualam no último quarto da coluna d’água. Sugere-se o uso do perfil de Van
Rijn (1984), pois este apresenta maior robustez física que o Power Law. A
simplicidade matemática do perfil Power Law pode ser uma vantagem em casos
em que se deseja reduzir o esforço computacional, desde que o aspecto físico
pode ser desconsiderado.
Dentre as três fórmulas para o cálculo da Ca e za, apenas VR apresentou
uma porcentagem de dados dentro da faixa desejada. Bolaños et al. (2012) ao
utilizarem a fórmula de LE obtiveram os melhores resultados na comparação entre
dados teóricos e mensurados. Porém, esta equação foi elaborada em regiões
onde a ação de ondas era significativa, o que naturalmente eleva os valores das
concentrações em suspensão através de um incremento no estresse (Soulsby,
1997). Como na área de estudo deste trabalho a presença de ondas não é efetiva,
isso pode explicar porque os valores obtidos a partir desta equação foram maiores
que os medidos em campo, já que suas constantes foram calibradas para
condições de fluxos combinados (correntes + ondas).
Soulsby (1997) apresenta as fórmulas de VR e SM como as melhores na
representação desses valores de referência para o transporte em suspensão.
Dentre elas, a que melhor representou os dados obtidos foi a de VR. Porém, para
velocidades baixas, a equação tendeu a fornecer valores menores que os
encontrados em campo. Este comportamento da equação já havia sido descrito
por Van Rijn (1984; 1993; 2007) para velocidades abaixo de 0,7 m/s, o que
coincide com a faixa subestimada pela equação neste trabalho.
Independente da fórmula escolhida, nenhuma delas apresentou um bom
resultado em relação aos dados obtidos em campo. A principal diferença entre as
três formulações, aparentemente, encontra-se na definição da profundidade de
referência. O mínimo aceito pela equação de VR é de 1% da profundidade,
enquanto para as duas outras equações, é de 0,01 m. Este valor seria referente a
pequenas ondulações (ripples) formadas em condições de fluxos menos intensas,
que geram pouca alteração na estrutura das correntes. Se considerarmos o
47
mesmo valor mínimo utilizado nas outras equações, para a equação de VR, temos
uma melhora de até 50% no desempenho desta fórmula para baixas velocidades.
Como, para a região, velocidades abaixo dos 0,7 m.s-1 são comuns ao
longo do ciclo de maré, o uso de uma profundidade de referência fixa em 0,01 m
para este intervalo parece ter melhorado significativamente o desempenho da
equação de VR para a concentração de referência e, consequentemente, para o
cálculo das taxas transportadas em suspensão. O uso desta profundidade mínima,
inclusive, coincide com a profundidade de referência para o transporte da equação
de Van Rijn (2007), e representa a concentração de referência sendo calculada na
interface carga de fundo – suspensão. Devido ao baixo número de amostras de
taxas de transporte em suspensão utilizada neste trabalho, esta adaptação requer
um estudo mais abrangente para testar sua eficiência, principalmente diante de
um quadro mais amplo de condições.
5.2 Volume Transportado por Ciclo de Maré
Como esperado, a partir da predominância das correntes de vazante sobre
as de enchente descrita por diversos autores para a região (Lana et al., 2001;
Mantovanelli et al., 2004; Noernberg et al., 2007), a concentração residual
calculada a partir da fórmula de VR foi estuário afora, com uma magnitude de 106
kg.ciclo de maré-1. Desta forma, pode-se estimar o transporte em suspensão das
areias em 105 m3.ano-1, segundo o calculado pela fórmula de Van Rijn (1984).
Ressalta-se que este valor deve ser encarado apenas como uma estimativa da
capacidade de transporte por suspensão deste sistema.
Allen & Castaing (1973) reportam concentrações em suspensão no estuário
de Gironde (França) entre 100 e 500 mg.l-1, com uma exportação de material pelo
estuário em torno de 109 ton.m-1. Estes autores estudaram um ambiente de macro-
marés, mais energético que a área de estudo em questão, e obtiveram
concentrações muito mais elevadas que as encontradas por este trabalho. Amos
et al. (2010) e Villatoro et al. (2010) reportam a exportação de sedimentos da
Laguna de Veneza, como um todo, na ordem de 106 m3.ano-1, com concentrações
48
em suspensão de até 103 mg.l-1 durante o ciclo de maré. A região possui contexto
semelhantes (granulométrico, batimétrico e dinâmico) ao encontrado neste estudo.
Diante deste quadro, a exportação sugerida neste trabalho parece coerente com a
literatura.
Já a concentração residual calculada a partir dos dados de CTD teve uma
mesma magnitude, porém sentido oposto (estuário adentro). De forma geral, o
CTD mede a turbidez presente na coluna d’água a partir da reflexão do sinal
infravermelho. Mantovanelli et al. (1999) realizaram um estudo do comportamento
do sensor de turbidez a mudanças no diâmetro médio. Eles concluíram que o
sensor apresenta uma resposta 54% maior para a presença de sedimentos finos
em relação às areias, e que a diferença entre a resposta para sedimentos finos e
areias é maior quanto menor a concentração do material na coluna d’água.
Além disso, Ludwig & Hanes (1990) salientam que a presença de partículas
finas pode mascarar a resposta do turbidímetro, reduzindo sua eficiência para
areias. Dessa forma, pode-se supor que a carga transportada por lavagem estaria
mascarando a resposta da concentração de areias em suspensão. Se
considerarmos apenas os momentos de enchente, quando o transporte de areias
é bem menos efetivo, vemos que a razão mensurado/calculado é
aproximadamente 10. Este valor esta de acordo com o descrito por Van Rijn
(2007) para a relação entre a suspensão e o transporte por lavagem em baixas
velocidades. Ainda, a constância destes valores ao longo do tempo em toda a
coluna d’água, associada a uma duração das marés enchentes (Marone &
Jamiyanaa, 1997) maior que as vazantes, pode ter sido a responsável por fazer
com que a média das concentrações fosse maior no sentido estuário adentro.
Como não foi possível separar a resposta do turbidímetro em relação à
granulometria presente em suspensão na coluna d’água, no momento da coleta de
dados com o CTD, a reposta em relação ao transporte por areias não pôde ser
confirmada. O fato do transporte calculado pelas fórmulas ter sido maior que o
obtido com o turbidímetro pode ser uma consequência do mascaramento das
concentrações de areia em suspensão em função dos sedimentos finos, como
descrito por Ludwig & Hanes (1990), ou um reflexo de uma diferença nas
49
velocidades dos fluxos entre os momentos de 2008 e 2012 devido à diferença na
amplitude das marés. Porém, a proximidade dos dados obtidos com as fórmulas
em relação ao obtido com o CTD para a vazante (razão de 0,5), momento no qual
espera-se que o transporte por areias seja mais efetivo pela maior velocidade dos
fluxos, permite supor que a avaliação das fórmulas realizada se mostre coerente.
6. Conclusão
Dentre todos os perfis testados, o de Van Rijn (1984) foi o que apresentou
melhor correlação com os dados obtidos e, portanto, é o mais indicado. Porém,
caso uma maior facilidade matemática seja desejada, o perfil através da Power
Law pode ser utilizado, sem uma perda significativa na resposta das
concentrações transportadas.
A fórmula para o cálculo da concentração e profundidade de referência
descrita por Van Rijn (1984; 1993) mostrou fornecer os resultados mais coerentes
com o encontrado em campo. Para baixas velocidades (< 0,7 m.s-1), o uso de uma
profundidade de referência fixa em 0,01 m parece ter melhorado o desempenho
das estimativas, apesar de que um teste com um maior conjunto de dados, numa
gama maior de condições, ser indicado.
Foi verificada a presença de um transporte por lavagem na região, com
concentrações entre 4 e 8 mg.l-1. Essa concentração parece ter afetado a resposta
do turbidímetro acoplado ao CTD quanto à concentração de areias em suspensão.
Dessa forma, o turbidímetro não parece o equipamento mais indicado para avaliar
o transporte em suspensão na região, sendo talvez preferível utilizar armadilhas.
Por fim, pôde-se estimar o transporte residual em suspensão na região
numa ordem de 105 m3.ano-1. Este valor deve ser tratado com cautela, mas
demonstra a capacidade de transporte do sistema.
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52
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho foi avaliado o transporte de sedimentos a partir das
correntes de marés, na desembocadura sul do Complexo Estuarino de Paranaguá.
Para tanto, foram estimadas as duas principais formas de transporte de
sedimentos arenosos: carga de fundo e suspensão.
De modo geral, o estuário, através da desembocadura sul, exporta material
para a plataforma continental adjacente. O transporte em suspensão demonstrou
ser mais importante que a carga de fundo para a região, devido aos maiores
volumes quantificados, estando uma ordem de magnitude acima. Dessa forma, do
ponto de vista da dinâmica sedimentar desta porção do sistema, o transporte em
suspensão pode ser considerado o processo predominante de transporte de
material.
Do ponto de vista das três estações avaliadas ao longo da seção
transversal, a Ilha do Mel foi a que apresentou a maior dinâmica, refletida tanto
nas maiores velocidades de fluxo quanto na maior suspensão e transporte de
material. Além disso, esta é a única porção da seção onde a ação de ondas pode
exercer uma influência efetiva no transporte de sedimentos. Do ponto de vista
batimétrico, pode-se supor então que apenas as porções mais rasas da
desembocadura (≈ 8 m) sofreriam a influência de ondas, quando consideramos os
dados publicados em Lana et al. (2001). Essa avaliação deve ser tratada com
cautela, devido ao recobrimento temporal restrito da avaliação de ondas. Por outro
lado, a estação do Canal Navegável se mostrou uma região característica para
avaliar a média das condições na área de estudo. Dessa forma, esta estação pode
ser utilizada como representativa para uma avaliação do transporte de sedimentos
na região, de forma estimada e sucinta, sem a necessidade de avaliar várias
verticais ao longo da seção.
Apesar do transporte em suspensão ser o mais efetivo, é de se esperar que
ele acabe transportando os materiais a maiores distâncias que o transporte por
carga de fundo. Dessa forma, o assoreamento de regiões críticas do canal
navegável, na região da desembocadura, provavelmente está mais associado ao
53
transporte por carga de fundo que a suspensão. O argumento de Gomez (1991)
de que a carga de fundo é o processo responsável pelo assoreamento de canais
suporta essa consideração. Por esta razão, o estudo do transporte por carga de
fundo na região também é muito importante, e pode auxiliar em um melhor
planejamento de futuras dragagens do canal.
Devido às limitações deste estudo, não foi possível avaliar o transporte em
diferentes momentos do ano, nem avaliar as taxas transportadas em relação a
velocidades de fluxo mensuradas concomitantemente. Essas limitações inserem
alguns erros nas medições, e impedem uma avaliação mais precisa dos processos
de transporte de sedimentos na região. Portanto, estima-se que o Complexo
Estuarino de Paranaguá, através da sua desembocadura sul, exporte uma
quantidade de sedimentos arenosos na ordem de 105 m3.ano-1, considerando
ambos os processos de carga de fundo e suspensão. Esta estimativa nos permite,
ao menos, comparar o sistema em estudo com outros sistemas no mundo, e
avaliar a quantidade de material disponibilizada para a plataforma continental
interna e costa adjacente através desta desembocadura.
Por fim, foi verificada a presença de uma carga de sedimentos muito finos
na região, sendo transportados por lavagem segundo a classificação de Van Rijn
(1993). Esses sedimentos não chegam a se depositar na região de estudo, visto
que não foram encontradas porcentagens significativas de lamas nos sedimentos
de fundo. Este material pode acabar mascarando a resposta do sensor de turbidez
para as concentrações de areias em suspensão, como descrito por vários autores
(Mantovanelli et al., 1999; Ludwig & Hanes, 1990). Dessa forma, sugere-se que a
avaliação do transporte em suspensão na região seja feita com o uso de
armadilhas físicas, evitando esta problemática. Ainda, novos estudos, com maior
recobrimento temporal e coleta concomitante de dados de correntes, podem
permitir uma avaliação precisa do transporte de sedimentos na desembocadura
sul do Complexo Estuarino de Paranaguá, e auxiliar nos estudos de dinâmica da
região.