casa aberta por uma aprendizagem significativa pelo rádio - mário matos

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UNIVERSIDADE FEDERL DO CEAR INSTITUTO DE CULTURA E ARTE CURSO DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA

CASa Aberta Por uma Aprendizagem Significativa pelo Rdio

MRIO CSAR MATOS DE FREITAS

FORTALEZA 2011

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MRIO CSAR MATOS DE FREITAS

A CASa Aberta Por uma Aprendizagem Significativa pelo RdioMonografia apresentada ao Curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Federal do Cear, como requisito para obteno do ttulo de bacharel em Publicidade e Propaganda, sob orientao da professora Andrea Pinheiro Paiva Cavalcante.

FORTALEZA 2011

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MRIO CSAR MATOS DE FREITAS

A CASa Aberta Por uma Aprendizagem Significativa pelo Rdio

Esta monografia foi submetida ao Curso de Publicidade e Propaganda da Universidade Federal do Cear como requisito para a obteno do titulo de Bacharel. A citao de qualquer trecho desta monografia e permitida desde que feita de acordo com as normas da tica cientifica.

Monografia apresentada Banca Examinadora:

_________________________________________________ Profa. Ms. Andrea Pinheiro Paiva Cavalcante (Orientadora) Universidade Federal do Cear

_________________________________________________ Prof. Dr. Francisco Silva Cavalcante Jnior (Membro) Universidade Federal do Cear

__________________________________________________ Prof. Dr. Luiz Tadeu Feitosa (Membro) Universidade Federal do Cear

FORTALEZA 2011

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AGRADECIMENTOSAgradeo primeiramente a Deus por todo o caminho que Ele me ajudou a trilhar, nunca me faltando em companhia e sempre me mostrando os trajetos seguros por onde seguir. Muitas so as pessoas que agora tenho o espao para demonstrar a devida gratido. Lembro ento de minha me, Maria Luci, forte, guerreira e incentivadora da carreira que escolhi para mim, presente em minhas conquistas e quedas, sempre me ajudando a olhar mais longe, mais alto e dando suporte as minhas decises. Meu pai, Raimundo, tambm recebe os votos pela pacincia, pela presena e pelo caminhar junto. Minha irm, Karol, por todos os momentos que foi expulsa do meu quarto para me deixar estudar ou se preocupou comigo, levando a comida tantas vezes esquecida. Minha tia e madrinha, Ana Maria, pelo apoio e crena em minhas capacidades. Meus primos, Joo Victor e Clarissa pelos risos partilhados, ensinamentos proporcionados na curiosidade e ingenuidade de criana. Elizabeth Rodrigues, minha segunda madrinha tambm recebe minha gratido por ser minha Mentora nos estudos, grande exemplo e estimuladora. Minha orientadora, professora, parceira de monitoria e amiga Andrea Pinheiro, por saber cobrar com um sorriso no rosto, entender os percalos e apoiar sempre minhas demandas. Aos amigos, ngelo dos Santos (Azul), Mariana de Queiroz e Manuela Moura pela parceria ao longo destes 4 anos de trabalhos, noites viradas, vitrias e prmios, confuses vezes por outra, mas uma nova famlia criada. Toda a turma de 2008.1 pelos risos em sala, pelos risos fora dela, pela ajuda mtua sem interesses, pelo desejo de ver cada um de ns sendo um grande profissional e uma grande pessoa. Ao projeto CASa pela abertura e receptividade ao meu estudo. Mesmo sendo um estranho no ninho, nunca me senti dessa forma. Foram meses de aprendizado significativo dos quais colho os reflexos em meu cotidiano e que um dia retornarei para participar como colega. Aos bolsistas do CASa, nas figuras de Caroline Brito e de Mrcio Moreira, pelo tempo que tomei e ajuda que me deram. Bem como a Maria Gislene (Gisa) pelos Brevirios encaminhados em meio ao trabalho acumulado. Muitos no couberam nessas linhas, mas cabem no meu corao e sempre faro parte das vitrias que conquistei e conquistarei.

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Casa ArrumadaCasa arrumada assim: Um lugar organizado, limpo, com espao livre pra circulao e uma boa entrada de luz. Mas casa, pra mim, tem que ser casa e no um centro cirrgico, um cenrio de novela. Tem gente que gasta muito tempo limpando, esterilizando, ajeitando os mveis, afofando as almofadas. No, eu prefiro viver numa casa onde eu bato o olho e percebo logo: Aqui tem vida. Casa com vida, pra mim, aquela em que os livros saem das prateleiras e os enfeites brincam de trocar de lugar. Casa com vida tem fogo gasto pelo uso, pelo abuso das refeies fartas, que chamam todo mundo pra mesa da cozinha. Sof sem mancha? Tapete sem fio puxado? Mesa sem marca de copo? T na cara que casa sem festa. E se o piso no tem arranho, porque ali ningum dana. Casa com vida, pra mim, tem banheiro com vapor perfumado no meio da tarde. Tem gaveta de entulho, daquelas que a gente guarda barbante, passaporte e vela de aniversrio, tudo junto. Casa com vida aquela em que a gente entra e se sente bem-vindo. A que est sempre pronta pros amigos, filhos, netos, pros vizinhos. E nos quartos, se possvel, tem lenis revirados por gente que brinca ou namora a qualquer hora do dia. Casa com vida aquela que a gente arruma pra ficar com a cara da gente. Arrume a sua casa todos os dias. Mas arrume de um jeito que lhe sobre tempo pra viver nela. E reconhecer nela o seu lugar. (Carlos Drummond de Andrade)

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RESUMODesde as caractersticas pioneiras do veculo radiofnico no Brasil at a atualidade percebem-se esforos em alinhar interesses comunicativos e educativos. Este trabalho visa, ento, estudar o programa radiofnico CASa Aberta, espao de comunicao do projeto CASa (Comunidade de Cooperao e Aprendizagem Significativa), o qual oferece uma perspectiva diferenciada de acolhimento e formao docente aos professores recm ingressos

Universidade Federal do Cear. Investimentos na rea comunicativa do projeto se fizeram necessrios, propiciando o surgimento em 15 de outubro de 2010 do que viria a ser o objeto de estudo desta monografia. Perpassando a interface entre comunicao e educao, onde o rdio poderia se encaixar desde sua chegada ao Brasil, alcanando-se as formas de se trabalhar com a preparao do docente para a sala de aula universitria, na figura da disciplina de Didtica do Ensino Superior, do programa Rede de Valorizao do Ensino Superior (REVES) e, mais recentemente, do CASa, o trabalho buscou apresentar um contexto geral de criao do projeto, no qual o CASa Aberta se insere, bem como conceitos basilares da iniciativa. Com uma abordagem multimetodolgica que faz uso de estratgias quantitativas, quando da aplicao de questionrios com os docentes participantes, visando mensurar as caractersticas do grupo e percepes das aes do projeto; e de outras qualitativas, quando da anlise da estrutura de contedos, temas, debatedores e trechos do programa CASa Aberta, analisados luz dos princpios da proposta da Comunidade de Aprendizagem a qual se vincula, esta monografia reflete o fazer comunicacional significativo possibilitado pelo CASa Aberta a seus envolvidos, tanto como ouvintes, quanto como produtores.

PALAVRAS CHAVE: Rdio; Formao Docente; Projeto CASa; Programa CASa Aberta; Educao.

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LISTA DE FIGURASFigura 1: Primeira logomarca do Projeto CASa leitura Reitoria ........................................... 82 Figura 2: Marca atual do Projeto CASa ................................................................................... 83 Figura 3: Marcas CASa de Filosofia, CASa de Artes, CASa de Religio e CASa de Cincias, respectivamente ........................................................................................................................ 84 Figura 4: Brevirio verso inicial 2010: layout e sua 2 edio ............................................... 86 Figura 5: Brevirio verso mais atual com banners de hiperlinks ........................................... 88 Figura 6: Tela inicial do Ambiente Scrates ............................................................................ 89 Figura 7: Tela inicial portal CASa............................................................................................ 91 Figura 8: Layout tela inicial portal CASa ................................................................................. 91 Figura 9: perfil do CASa no twitter .......................................................................................... 94 Figura 10: canal do CASa no youtube ...................................................................................... 95 Figura 11: Pgina de facebook do projeto CASa ...................................................................... 96 Figura 12: Logomarca Programa CASa Aberta ..................................................................... 103 Figura 13: Sinalizao de informao sobre o Programa CASa Aberta no Brevirio ........... 104 Figura 14: Ensaio de representao visual do programa ........................................................ 104 Figura 15: Brevirio inicial e exemplo (2010.1) .................................................................... 154 Figura 16: Brevirio verso 2 e exemplo (2010.2) ................................................................. 154 Figura 17: Brevirio verso 3 e exemplo (2010.2) ................................................................. 155 Figura 18: Brevirio verso 4 e exemplo (2011.1) ................................................................. 156 Figura 19: Brevirio verso 5 e exemplo (2011.1) ................................................................. 156 Figura 20: Brevirio verso 6 e exemplo (2011.2) ................................................................. 157

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LISTA DE GRFICOSGrfico 1: Idade ...................................................................................................................... 113 Grfico 2: Professores por ano de entrada no CASa .............................................................. 113 Grfico 3: Respostas por Campus da UFC ............................................................................. 114 Grfico 4: Respostas por rea de atuao ............................................................................... 115 Grfico 5: Frequncia de participao em eventos do CASa ................................................. 116 Grfico 6: Frequncia por Atividade do CASa ...................................................................... 116 Grfico 7: Qualificao Atividades CASa.............................................................................. 117 Grfico 8: Qualificao Brevirio .......................................................................................... 119 Grfico 9: Motivaes visita ao Portal do CASa.................................................................... 119 Grfico 10: Origem da escuta ................................................................................................. 121 Grfico 11: Perfil da escuta CASa Aberta - Idade.................................................................. 121 Grfico 12: Escuta do Programa CASa Aberta na amostra .................................................... 122 Grfico 13: Opo por usar o Rdio como veculo comunicativo ......................................... 123 Grfico 14: Iniciativa CASa Aberta na Tev ......................................................................... 123 Grfico 15: Forma de participao ......................................................................................... 124 Grfico 16: Avaliaes da estrutura ....................................................................................... 124 Grfico 17: Avaliao Projeto CASa: geral e por ano de ingresso ........................................ 128 Grfico 18: ndice de Avaliaes negativas sobre o Projeto CASa ....................................... 130

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LISTA DE TABELASTabela 1: Trabalhos apresentados por bolsistas do CASa nos Encontros Universitrios de 2010 .......................................................................................................................................... 54 Tabela 2: Trabalhos apresentados por bolsistas do CASa nos Encontros Universitrios de 2011 .......................................................................................................................................... 54 Tabela 3: Ambincias Temticas de Fortaleza e Quixad........................................................ 60 Tabela 4: Ambincias Temticas do Cariri .............................................................................. 61 Tabela 5: Ambincias Temticas de Sobral ............................................................................. 62 Tabela 6: Seminrios Temticos............................................................................................... 63 Tabela 7: Mentores de Docncia .............................................................................................. 66 Tabela 8: Rodas de Conversa ................................................................................................... 74 Tabela 9: DTIC Temtica 1: Espaos e Recursos Digitais de Aprendizagem ...................... 76 Tabela 10: DTIC Temtica 2: A Importncia da Utilizao da Internet na Formao do Profissional ............................................................................................................................... 76 Tabela 11: DTIC Temtica 3: Linguagens na Virtualidade .................................................. 76 Tabela 12: DTIC Temtica 4: Aprendizagem dos Alunos por Meio das Mdias .................. 77 Tabela 13: DTIC Temtica 5: Utilizao de Materiais Educacionais Digitais...................... 78 Tabela 14: DTIC Temtica 6: Preparao e aplicao de aulas utilizando os recursos das TIC ............................................................................................................................................ 78 Tabela 15: CASa de Filosofia ................................................................................................... 80 Tabela 16: Datas, temas e debatedores do CASa Aberta durante o primeiro ano de veiculao ................................................................................................................................................ 106

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SUMRIORESUMO ................................................................................................................................... 6 LISTA DE FIGURAS ................................................................................................................ 7 LISTA DE GRFICOS .............................................................................................................. 8 LISTA DE TABELAS ............................................................................................................... 9 1. INTRODUO ................................................................................................................ 11 2. RDIO E EDUCAO NO BRASIL: CAMINHOS DE UMA EDUCOMUNICAO . 15 2.1 Rdio e Educao, a edificao histrica da interao ................................................... 15 2.1.2 Incio da comercializao no rdio e criao do Servio de Radiodifuso Educativa (SRE) ................................................................................................................................ 18 2.1.3 Dcadas de 1940 a 1970 .......................................................................................... 21 2.1.4 Anos 1980 e atual situao ...................................................................................... 26 2.2 Comunicao e Educao ............................................................................................... 29 3. Formao Docente e CASa: conceituao e percursos ........................................................ 34 3.1 Caminhos da formao docente ...................................................................................... 34 3.2 Didtica do Ensino Superior e REVES .......................................................................... 36 3.3 A CASa de que falamos ................................................................................................. 40 3.3.1 CASa: espaos, pessoas e disposio ...................................................................... 48 4. Coordenao de Formao Docente: linha de aes ............................................................ 58 4.1 Ambincias Temticas (ATs) ......................................................................................... 59 4.2 Seminrios Temticos (STs)........................................................................................... 63 4.3 Mentores de Docncia .................................................................................................... 65 4.4 Didtica do Ensino Superior ........................................................................................... 68 4.5 Atelis de Ensino ............................................................................................................ 68 4.6 Perspectivas e resultados percebidos .............................................................................. 69 5. Coordenao de Comunicao e Aprendizagem Significativa............................................. 73 5.1 Rodas de Conversa ......................................................................................................... 73 5.2 Formao DTICs ............................................................................................................ 75 5.3 CASa de Filosofia ........................................................................................................... 79 5.4 CASa de Artes ................................................................................................................ 80 5.5 CASa de Religio e CASa de Cincias .......................................................................... 81 5.6 Linha Visual: a CASa e suas marcas .............................................................................. 82 5.7 Brevirio ......................................................................................................................... 85 5.8 Portal do CASa ............................................................................................................... 89 5.9 CASa nas redes sociais: Twitter, Youtube e Facebook................................................... 94 5.10 Uma proposta de programa de tev: o CASa na tev ................................................... 97 6. CASa Aberta: contexto, estrutura e anlise .......................................................................... 99 6.1 CASa Aberta: concepo ................................................................................................ 99 6.2 O programa, a tcnica e a estrutura .............................................................................. 102 6.3 Questionrios e resultados: perfil geral do universo amostral ...................................... 112 6.4 CASa Aberta e suas percepes pelo pblico .............................................................. 120 6.5 Reflexos da Comunidade de Cooperao e Aprendizagem Significativa em sua comunicao radiofnica .................................................................................................... 128 7. CONSIDERAES FINAIS ............................................................................................. 137 Referncias: ............................................................................................................................ 140 ANEXO I AMBINCIAS TEMTICAS ........................................................................... 145 ANEXO II CRONOLOGIA LAYOUTS BREVIRIO ....................................................... 154

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1. INTRODUOUm trabalho monogrfico no nasce de um dia para o outro. Ele fruto de um processo que se desencadeia atravs de experincias acadmicas, profissionais e pessoais. O ambiente universitrio permite ao graduando diversas possibilidades de atuao e experimentao entre cursos e metodologias. Foi dessa forma que, sem uma instigao prvia de pesquisa futura, entrei em contato com um projeto de extenso, do Departamento de Cincias da Informao, intitulado Biblioteca Comunitria do Benfica. Pude compreender, durante as aes e pesquisas desse projeto, como se d um espao de educao no formal, comeando assim as aproximaes com a rea da educomunicao. Num segundo momento, saindo da rea extensionista, atuei no Programa de Alfabetizao na Idade Certa (PAIC), projeto do Governo do Estado que vislumbra avanos na educao pblica estadual com a alfabetizao em perodo adequado das crianas envoltas nessa etapa. O contato proximal com a realidade educativa foi proporcionado nesse perodo de novos horizontes direcionados. Por fim, a atuao com o rdio aconteceu por meio da monitoria na disciplina de Produo Publicitria em Rdio, ministrada no Curso de Publicidade e Propaganda, que propiciou a tomada de conhecimento do programa radiofnico CASa Aberta, material primeiro de anlise deste trabalho e fruto de conversas com Andrea Pinheiro, ento produtora do programa. As partes do todo estavam dadas. Cabia apenas ao pesquisador dar o primeiro passo frente a seu tema e perceb-lo como um objeto de pesquisa que instigasse um aprofundamento. Uma reflexo. Um dilogo entre reas. Plural como a formao acadmica que constru ao longo dos quatro anos de curso, nas vrias atividades em diferentes departamentos e fora deles inclusive, a Comunidade de Cooperao e Aprendizagem Significativa (CASa) ps-se aos meus olhos como um motivo a se pensar. Mais especificamente, o rdio se apresentou como gancho comunicativo de estudo e reflexo do CASa. O projeto CASa uma iniciativa da Pr-Reitoria de Graduao da Universidade Federal do Cear que visa formao docente dos professores recm ingressos instituio. Em nveis de licenciatura, no h um preparo para a sala de aula do Ensino Superior e o CASa vem tentar assumir o papel de reunir a heterogeneidade dos diversos cursos, departamentos,

12 institutos e faculdades que compem a Universidade onde estudamos, para partilhar experincias e metodologias no trato universitrio. Com uma metodologia diferente do que se era acostumado a trabalhar, ele traz novos pontos de vista sobre como atuar com formao docente dos professores em Estgio Probatrio. Tal empreitada no poderia excluir o fator comunicacional de seu escopo, pois comunicao tambm educao, bem como o inverso tambm verdadeiro. Nesse mbito, o rdio, companheiro de monitoria, assume o lugar de estopim ao estudo que se desenvolveria. Iniciava-se a construo de um objeto: o programa CASa Aberta. Digo que se comeava porque o objeto sempre mutante e sua beleza reside em sua capacidade de surpreender. Acordar a cada dia ouvindo um mesmo trecho de entrevista e perceber novas abordagens, novas perspectivas, novas instigaes. Com o uso de uma estratgia multimetodolgica, na qual pontos fundamentais de algumas metodologias foram selecionados para comp-la, essa monografia se fez escrita. Em parte quantitativa, mensurando nmeros acerca dos docentes e sua relao com o objeto em estudo, noutra qualitativa, quando da anlise dos contedos dessa ferramenta comunicativa. Em uma fase exploratria, utilizou-se uma reviso de literatura para situar conceitos imprescindveis compreenso do projeto e do programa, alm de levantamento de dados secundrios disponveis em canais de informao do CASa, como o Brevirio e o portal, por exemplo. Depois, aprofundamentos foram necessrios e dados primrios gerados atravs de entrevistas pessoais com os responsveis diretos pela concepo e continuidade do CASa. Porm, no s de coordenadores e colaboradores se constri uma comunidade, assim, os professores que a compe tambm foram interpelados visando o entendimento de sua posio diante do objeto. Por fim, os trs primeiros meses de CASa Aberta foram escolhidos para anlise, julgando-se que os 11 programas seriam suficientes para a consolidao de seus formatos e diretrizes. Coube ao pesquisador reunir e analisar essas informaes, pautando as relaes entre teoria, projeto e escuta radiofnica para alcanar seus objetivos. Didaticamente dividido em cinco captulos, para alm da introduo e das consideraes finais, o trabalho buscou conduzir o leitor de uma viso geral da relao rdioeducao a uma particular na figura do objeto especificado anteriormente. Aps a introduo, no tpico 2 contextualizou-se a relao do rdio com a esfera educativa. O veculo j dava seus primeiros passos no Brasil como aliado perspectiva educacional nos pensamentos de Roquette-Pinto. Outros tantos projetos se seguiram ao pioneiro, dentre os quais se destacam o Movimento de Educao de Base (MEB), Minerva, a

13 difuso de rdios comunitrias e a introduo do rdio em novas tecnologias, como a internet, por exemplo. Autores como BLOIS (2003), FERRARETTO (2000), TAVARES (1997), PRADO PIMENTEL (2004) vo permitir a periodizao dessa linha histrica at a atualidade, evidenciando momentos marcantes nessa trajetria. Fica claro nesse primeiro ponto a proximidade dos usos comunicativos na educao, alcanando uma definio do que vem a ser esse carter educomunicativo que o rdio apresentava antes mesmo de surgir o termo. SOARES (2000), MELO & TOSTA (2008), SARTORI (2006) GADOTTI (2005) so autores que possibilitaram uma compreenso desse panorama de interface entre os conceitos. No tpico 3 foram apresentados os projetos de formao docente que antecederam o em estudo, identificando seus objetivos e formas de atuao. Os documentos obtidos atravs do portal da UFC foram fundamentais para esse retrospecto, bem como o pensamento de CARVALHO (2007), MARQUES (2000) e ALTHAUS (2004) sobre o processo de preparao de didtica Superior aos novos docentes. O CASa ento introduzido com a explanao de suas bases tericas e linhas de aes coordenativas. Sendo estas ltimas divididas em duas: coordenao de Formao Docente e coordenao de Comunicao e Aprendizagem. No que tange a compreenso da teoria basilar do projeto, autores como CAVALCANTE JR. (2005), GIS (2005), BAUMAN (2003), FRANTZ (2001), DEWEY (1978) e SMOLE (2002) deram suas contribuies. Alm das entrevistas com Cavalcante Jr., Bernadete Porto (coordenadores) e Custdio Almeida (Pr-Reitor de Graduao), indispensveis para um posicionamento mental sobre as prticas e objetivos do CASa e que rondaram toda a produo com direcionamentos e definies. No tpico 4 a coordenao de Formao Docente foi estruturada em suas formas de participao, desde Ambincias Temticas; Seminrios Temticos; Mentores de Docncia; Disciplina de Didtica de Ensino Superior; e projetos de Atelis de Ensino. Cada atividade foi descrita e apresentada em suas realizaes e temticas. FERENC & MIZUKAMI (2005), FREIRE (1967) e as entrevistas com coordenadores foram referncias nesse instante, com suas vises sobre a reflexo docente, pedagogias da libertao e autonomia, e atividades do CASa. No tpico 5 a coordenao de Comunicao e Aprendizagem Significativa foi estudada em suas ferramentas comunicativas de divulgao informacional e ideolgica do projeto. Analisaram-se os CASas de Filosofia, Artes, Religio e proposta do CASa de Cincias; a Formao de Docncia Integrada s Tecnologias da Informao e Comunicao (DTICs); as Rodas de Conversa; o Brevirio, o portal, as redes sociais, o projeto de se realizar o CASa Aberta na tev e deixou-se espao para o programa CASa Aberta no captulo

14 seguinte. WILLIAMS (2009) e RODRIGUES (2005) responderam pela anlise do design das ferramentas comunicativas, enquanto as entrevistas, j citadas, corroboraram para a apresentao dos veculos. No tpico 6 o CASa Aberta ganhou seu maior destaque. Por meio de sua anlise pdese estruturar suas partes constituintes, temas debatidos, debatedores. REIS (2008), as entrevistas e respostas dos questionrios pessoais aplicados com os professores foram as principais fontes de informao sobre o formato radiofnico do CASa Aberta e sua percepo dentro do projeto. Trechos do prprio programa foram usados como fonte de dados para a exemplificao das anlises realizadas. Completou-se um ciclo na verdade. Partiu-se da contextualizao do rdio em sua esfera educativa, passou-se pelos caminhos da educao e aprendizagem nos processos de formao docente, alcanando as atividades do CASa e do seu aparato comunicativo, de volta, portanto, ao rdio atuante na educao.

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2. RDIO E EDUCAO NO BRASIL: CAMINHOS DE UMA EDUCOMUNICAOA aproximao entre rdio e educao foi marcante desde a chegada do veculo em terras brasileiras. Nos anos de sua instalao no Brasil, na primeira metade da dcada de 1920, j se podiam vislumbrar esforos de pessoas, como o professor Edgard Roquette-Pinto, as quais defendiam sua utilizao no campo educacional pensando em proporcionar suporte s classes menos favorecidas. Desta maneira, a primeira parte deste texto se concentrar em explanar sobre o percurso do rdio educativo no Brasil, identificando fases de aproximao entre ambos.

2.1 Rdio e Educao, a edificao histrica da interaoBLOIS (2003) sugere uma classificao de seis fases para o rdio educativo onde este foi se integrando de caractersticas educativas no trato com seu pblico ouvinte, essa classificao foi decorrente de estudos realizados pela autora entre 1995 e 1996. Opto por adotar essa periodizao com vistas a alcanar um carter mais didtico ao texto. A primeira fase, identificada pela autora entre os anos de 1922 com a chegada oficial do rdio ao Brasil, estendendo-se at por volta de 1928, teve um carter pioneiro. Era o advento da radiodifuso, os primeiros contatos em terras brasileiras desse instrumento comunicativo e o surgimento de uma ideologia de implantao. Nesse perodo surgiriam iniciativas como a de Roquette-Pinto de uso do veculo para fins educativos. A definio de Rdio defendida pelo j citado professor ficou bastante conhecida e foi transcrita por FERRARETTO (2000) em seus estudos sobre a mdia radiofnica em sua histria e tcnica:O rdio o jornal de quem no sabe ler; o mestre de quem no pode ir escola; o divertimento gratuito do pobre; o animador de novas esperanas; o consolador do enfermo; o guia dos sos, desde que o realizem com esprito altrusta e elevado. (ROQUETTE-PINTO apud FERRARETTO, 2000, p.30).

Atravs dessa definio pode-se observar as funes primeiras que o rdio poderia desenvolver para esse visionrio: seu carter educativo, inclusivo, de entretenimento, de gerar mecanismos e apontar caminhos para novas realidades (no campo poltico possivelmente, o

16 que seria confirmado com a forte presena do meio durante a Revolta Tenentista de 1932 em So Paulo) e instrutor da moral e dos bons costumes entre os que dele fizessem uso. O professor Edgard Roquette-Pinto merece destaque por suas intensas contribuies para a consolidao radiofnica no Brasil. Esforos que se apoiavam no desejo de ensinar por meio das vias sonoras com o aparato recm chegado. Assim, visando entender melhor esse perodo, farei uma breve apresentao acerca da chegada do rdio ao Brasil e da presena marcante de Roquette-Pinto nesse processo. O ano era 1922; a cidade, Rio de Janeiro; o evento, Centenrio da Independncia; a empresa responsvel, Westinghouse Electric.No dia 7 de setembro de 1922, o discurso do ento Presidente da Repblica Dr.Epitcio da Silva Pessoa chegou ao grande pblico por intermdio de um sistema de Telefone Alto-falante, montado na praia vermelha, e de um transmissor montado no alto do Corcovado pela Westinghouse Electric; as irradiaes foram realizadas diretamente para os pavilhes onde as festividades aconteciam. (TAVARES, 1997, p.47).

O ano de 1922 foi repleto de acontecimentos que movimentaram a populao do centro intelectual e poltico do pas, eixo Rio - So Paulo, com reflexos para todo o restante do territrio nacional. Em fevereiro aberta a Semana de Arte Moderna; no dia 25 de maro criado o Partido Comunista Brasileiro; as campanhas eleitorais em plena agitao; em julho ocorre a marcha dos Dezoito do Forte em protesto dos militares descontentes com os caminhos e determinaes que o governo impunha ao exrcito. O clima de tenso se mantinha alto e o povo assistia s preparaes para as demonstraes do centenrio em clima de indiferena. Restava buscar meios que possibilitassem a desconstruo desse clima propcio a revoltas e a injrias populares. Dentre esses meios surgiu a oportunidade das comemoraes do Centenrio da Independncia, com a promessa de pessoas ilustres e demonstraes de novidades tecnolgicas em uma grande festa. O rdio ganhou espao de divulgao de suas funcionalidades durante a festividade com a transmisso do discurso presidencial em altofalantes espalhados na regio do entorno de onde se davam as exposies, palestras e discursos. O aparato chama a ateno de Roquette-Pinto, que vislumbra suas potencialidades educativas. Assim, ainda em 1923, foi inaugurada a Rdio Sociedade do Rio de Janeiro, que possua como slogan Trabalhar pela cultura dos que vivem em nossa terra e pelo progresso do Brasil, demonstrando claramente as intenes dos primeiros incentivadores do rdio no pas.

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O Rdio no Brasil nasceu educativo e cultural pela iniciativa do cientista e educador Roquette-Pinto, na sala de Fsica da Escola Politcnica, na cidade do Rio de Janeiro. A Rdio Sociedade inaugurada em 20 de abril de 1923 foi o laboratrio vivo da primeira manifestao, em nosso pas, da tecnologia sendo usada como meio de levar educao para muitos, rompendo os rumos da escola formal. (BLOIS, 2003, p.35).

BLOIS (2003) comenta sobre o papel de incentivador no uso do veculo para fins educativos desempenhado pelo professor e como a criao da Rdio Sociedade do Rio de Janeiro pde ser uma perspectiva de ampliao do acesso educao s classes menos favorecidas pela escola formal. TAVARES (1997) contextualiza a criao da emissora mencionada:A Sociedade Rdio do Rio de Janeiro foi constituda como entidade jurdica em abril de 1923; o Professor Edgard Roquette-Pinto, que era um homem de grande largueza empresarial, conseguiu sensibilizar o Presidente da Academia Brasileira de Cincias, Dr. Henrique Morize e seus companheiros, Laboriau, lvaro e Miguel Osrio, lvaro Alberto e outros, nascendo assim, no dia 20 de abril de 1923, a primeira estao de rdio no Brasil, a SPE, posteriormente PRA-2, Sociedade Rdio do Rio de Janeiro, que iniciou seu perodo regular de funcionamento em 1 de maio daquele ano. (TAVARES, 1997, p.51).

O mesmo autor traz, ainda, um trecho de depoimento de Roquette-Pinto contando como se deu a implantao do rdio na dcada de 1920 no Brasil, fica claro pelo depoimento que a novidade no despertou grande interesse de imediato devido baixa qualidade da primeira transmisso, nas festividades do centenrio da independncia,Muita pouca gente se interessou. Creio que a causa principal desse desinteresse foram os alto-falantes instalados na Exposio. Ouvindo discursos e msicas reproduzidos no meio de um barulho infernal, tudo roufenho, distorcido, arranhando os ouvidos; era uma curiosidade sem maiores conseqncias. (ROQUETTE-PINTO apud TAVARES, 1997, p.51).

Mesmo com as dificuldades preliminares, comuns nas mais diversas empreitadas, Roquette-Pinto convence o Dr. Henrique Morize, ento presidente da Academia Brasileira de Cincias, de assumir posio no empreendimento de se fazer rdio no pas. E assim o rdio brasileiro nasceu s sombras da cultura literria e permaneceu assim por bastante tempo, com transmisses voltadas cultura e literatura.O rdio, para as parcelas da elite responsveis por sua introduo no pas, constituise em elemento modernizante e civilizatrio. , entretanto, o primeiro movimento de longa trajetria do veculo em territrio brasileiro com uma programao marcada por conferncias literrias, artsticas e cientficas, nmeros infantis, poesia, msica vocal e instrumental, alm de umas poucas notcias de interesse geral. (FERRARETTO in MEDITSCH, 2008, p.30).

18 As primeiras rdios, identificadas por seus prefixos, tinham em comum seus objetivos de difundir a cultura e favorecer uma integrao nacional com um apanhado de caractersticas bem prximas poiseram empreendimentos no comerciais (no transmitiam anncios), de grupos aficionados do rdio, geralmente de classes mais abastadas e que se utilizavam dos mesmos, muito mais para a diverso dos membros daquelas sociedades ou clubes de rdio do que dos prprios ouvintes, uma vez que pagavam mensalidades para manter as estaes, cuidavam de fazer a programao (doando discos), escrevendo, tocando, cantando e ouvindo eles mesmos (afinal um aparelho receptor era bastante caro na poca) aquela programao, que por sinal era bastante elitista. (TAVARES, 1997, p.52).

Segundo dados de FERRERETTO (2000), um operrio recebia em torno de 200$000 (200 mil-ris, moeda brasileira da poca) enquanto que uma galena (tipo mais simples de receptor) de boa qualidade poderia chegar a 450$000, fora os gastos com fones de ouvido, indispensveis escuta do aparelho, com a instalao e a licena para utilizao dos equipamentos. Os elevados custos dificultaram de incio a difuso do veculo, mas, com o passar do tempo, as transformaes tecnolgicas e a entrada da esfera comercial na programao geraram uma popularizao do equipamento e programas. Voltando a periodizao de BLOIS (2003) tem-se que no final dessa primeira fase j era perceptvel o advento das rdio escolas. Em 1926, o fundador da Rdio Sociedade do Rio de Janeiro criou um Sistema Nacional de Rdio escolas e em 1928 duas j haviam sido criadas: uma no Distrito Federal (Estado da Guanabara) e outra em Recife, demonstrando o desejo de que essa empreitada educativa via ondas radiofnicas dessem resultados.

2.1.2 Incio da comercializao no rdio e criao do Servio de Radiodifuso Educativa (SRE)Na segunda fase, que BLOIS (2003) dispe didaticamente entre 1929 e 1940, so consolidadas as ideologias iniciais e implementadas as rdio escolas. Esse perodo tambm seria marcado pela criao das primeiras redes educativas e pela delineao da forma de atuao do rdio num caminho para mudanas significativas que ocorreriam a partir da. A apropriao do veculo para fins comerciais tambm comea a se desencadear nos anos 1930, o que gera mudanas de objetivos e focos de atuao. Com os crescentes investimentos pdese expandir a atuao do veculo para alm do eixo Rio - So Paulo, como estava ocorrendo, a custo de desvios no enfoque inicial puramente cultural e educativo.

19 Nos anos 1930, o governo passou a se preocupar mais com o rdio, que era definido como servio de interesse nacional e de finalidade educativa, implantando regras que o auxiliassem a se manter com recursos mais slidos. Em 1932 implantado o Decreto n. 21.111 que regularia a publicidade radiofnica. A partir desse ponto as premissas bsicas do rdio parecem ter se transformado. De erudito e instrutivo, passa a assumir um papel mais popular e de entretenimento com objetivos de lazer e diverso seguindo os direcionamentos que a nova realidade comercial impunha programao do veculo. Assim sendo, a regulamentao possibilitou a sistematizao do que vinha sendo feito ao mesmo tempo em que outras rdios no estavam interessadas nessa perspectiva educativa, fortalecendo, portanto, a perspectiva comercial na radiodifuso. Com as inovaes tecnolgicas grande sua expanso. A reduo de tamanho permite a portabilidade, o menor custo permite a popularizao, os anncios permitem verba para uma programao mais fixa e estruturada. O rdio populariza-se, sinnimo de informao e notcia na hora do acontecimento.Na dcada de 30, o rdio brasileiro j tomava um grande impulso, principalmente depois do Decreto-Lei n. 21.111, de 01 de maro de 1932, assinado pelo presidente Vargas, que regulamentava a propaganda comercial nas emissoras. A Rdio Sociedade, que no tinha fins comerciais, comeava a entrar em uma fase crtica, mas Roquette-Pinto no iria abrir mo das ideias iniciais de fazer um modelo de rdio voltado para a educao e a cultura. (PRADO PIMENTEL, 2004, p.25).

Prevendo as possveis perdas que a Rdio Sociedade do Rio de Janeiro sofreria com essa nova dinmica comercial, Roquette-Pinto decide realizar a doao da emissora para o Ministrio da Educao e Sade Pblica, assimo idealismo dos pioneiros vai cedendo lugar ao mercantilismo dos primeiros empresrios do setor. Ciente dessa nova realidade, resta a doao, efetivada em 7 de setembro de 1936, da emissora ao Ministrio da Educao e da Sade Pblica, graas tambm amizade de Roquette-Pinto com Gustavo Capanema, titular da pasta. Rebatizada de Rdio MEC, a estao d origem, desse modo, ao sistema de radiodifuso educativa, mantendo seu objetivo inicial. (FERRARETTO in MEDITSCH, 2008, p.31).

Menos de seis meses aps a transferncia da, agora, Rdio MEC (PRA-2) o governo criou o Servio de Radiodifuso Educativa (SRE), o qual tinha por finalidade promover de forma permanente a irradiao de programas educativos.Em fevereiro de 1943, o Regimento do SRE foi aprovado pelo Decreto n. 11.491, que, de acordo com a poltica de educao do pas, fixava a finalidade do Servio, a saber: a orientao da radiodifuso como auxlio educao e ao ensino, atravs da

20irradiao de programas cientficos, literrios e artsticos de carter educativo. (PRADO PIMENTEL, 2004, p.33).

Enquanto isso, ocorria uma reforma do ensino no Distrito Federal, guiada por Fernando de Azevedo, na qual entre suas determinaes existiam dois artigos que exigiam a instalao de aparelhos receptores de rdio nas escolas municipais e que se criasse uma rdio escola municipal, a qual deveria transmitir a todas as escolas e ao pblico em geral uma programao educativa por excelncia.Montada sob a direo de Roquette-Pinto, com o prefixo PRD-5, a rdio escola transmitiu pela primeira vez, experimentalmente, no dia 31 de dezembro de 1933. Inaugurada oficialmente em 6 de janeiro do ano seguinte, deu incio fase do contato direto entre emissora e ouvintes, que, mesmo tendo sido realizado de forma bastante desorganizada, foi responsvel pelo sucesso da Emissora e antecipou a possibilidade de uma recepo organizada. (PRADO PIMENTEL, 2004, p.30).

As aulas eram estruturadas num modelo de perguntas e respostas, nas quais as perguntas partiam em grande maioria dos alunos, deixando a transmisso mais prxima da demanda real do pblico pela informao.[...] preocupada em manter o contato com os alunos, a estao distribua folhetos e esquemas das lies que eram enviados antes das aulas radiofnicas, pelo correio, s pessoas inscritas. Os alunos, por sua vez, enviavam emissora trabalhos relacionados com os assuntos das aulas e mantinham contato com a emissora por carta, telefone e at mesmo visitas. (HORTA apud FERRARETTO, 2000, p.103).

Com a experincia da Rdio escola Municipal pde-se perceber a necessidade de uma didtica adequada de ensino pelo veculo e do contato entre emissora e ouvintes para se construir uma programao atrativa ao pblico. Prova do sucesso da iniciativa so os nmeros alcanados pela emissora: em seu primeiro ano de funcionamento a PRD-5 recebeu 10.800 trabalhos de seus alunos escritos, com crescimento considervel nos anos que decorreram, chegando a 20.400 em 1941. Tal crescimento, entretanto, no permitiu o atendimento de toda a demanda dos ouvintes. Sem infraestrutura adequada, a emissora teve de alterar sua proposta original sendo inclusive rebatizada de Rdio Difusora, o qual fazia referncia a seu novo papel de difusora educativa e cultural. Hoje, a rdio tem o nome de Roquette-Pinto, seu primeiro diretor, e pertence ao governo do Estado do Rio de Janeiro.

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2.1.3 Dcadas de 1940 a 1970Na dcada de 1940, periodizada na terceira fase de BLOIS (2003), a qual abrange de 1941 a 1966, o SRE entra em conflitos de interesses e de reas de atuao com o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) do governo getulista, prejudicando assim o alcance das aes do Servio de Radiodifuso Educativa. Mesmo assim o SRE desenvolve uma srie de atividades importantes para a consolidao de suas determinaes iniciais de difuso educativa atravs do rdio.Nos anos seguintes, o Servio de Radiodifuso Educativa realizaria uma srie de iniciativas importantes, como a criao de setores de educao e pesquisa e de documentao e intercmbio, [...] a criao de uma programao infantil, baseada em pesquisas e planejamento das necessidades deste pblico, e a produo de uma srie de cursos radiofnicos, conjugados com correspondncia, destacando a importncia de trs fatores primordiais para o desenvolvimento do rdio educativo: pesquisa, material de apoio e avaliao de resultados. (PRADO PIMENTEL, 2004, pp.34-35).

Nesse perodo, segundo BLOIS (2003), so consolidadas aes de expanso da atuao educativa do rdio para alm do eixo Rio So Paulo, abrangendo outras regies e possibilitando a diversificao e consolidao da ao educativa, criando novos estmulos a mudanas. O SRE tem grande papel nessa etapa como percebido anteriormente. Outras experincias foram se desenvolvendo nesse perodo, entre elas temos a da Rdio Nacional do Rio de Janeiro com a Universidade do Ar.O programa Universidade do Ar era voltado para os professores secundaristas de todo o pas, tendo como objetivo pedaggico oferecer aos professores uma nova metodologia de apresentao das disciplinas, possibilitando um maior interesse dos alunos pelas matrias, alm de oferecer bibliografia e formas mais eficientes de verificao de aproveitamento. A aula inaugural do programa foi transmitida no dia 19 de abril de 1941, e neste primeiro ano a Universidade do Ar j contava com quase 5.000 matrculas, divididas entre as disciplinas de Portugus, Histria da Civilizao, Cincias, Matemtica, Geografia, Histria do Brasil, Francs, Histria Natural, Ingls, Latim e Estatstica Educacional. (PRADO PIMENTEL, 2004, p.36)

O programa era uma comprovao que se podia fazer uma programao educativa mesmo em emissoras comerciais como a Rdio Nacional. Devido didtica diferente das aulas radiofnicas, o programa teve um decrscimo cada vez mais intenso de professores matriculados ao longo dos anos que se seguiram, sem desmerecer, contudo, a importncia da iniciativa em uma das maiores rdios brasileiras da poca. Houve tambm uma iniciativa paulista homnima. A Universidade do Ar de So Paulo, a qual iniciou suas atividades no final dos anos 1940 e perdurou at o incio dos anos 1960, tendo um carter mais organizado do que a iniciativa carioca, mas como diferencial

22 tinha a caracterstica de atuar junto s classes comerciarias do interior paulista, tendo em vista que a iniciativa proveio de uma ao conjunta do SESC e SENAC de So Paulo. A Universidade do Ar paulista comeou a decair aps a abertura das transmisses para livre recepo. Com a opo de ouvir as transmisses de suas casas os alunos tiveram um rendimento muito inferior ao dos que optaram por frequentar as recepes organizadas em turmas. O que pde contribuir para a percepo de que uma recepo organizada dessas transmisses gerava um retorno mais positivo se comparadas livre recepo. Em maio de 1950, Benjamin do Lago apresentou, no Jornal do Comrcio do Rio de Janeiro, o primeiro planejamento para uso do rdio na educao popular dando destaque a didtica a ser utilizada:As aulas, formuladas e apresentadas por professores experientes, deveriam ter entre 30 e 45 minutos de durao, apresentando os conceitos bsicos e esquemas de orientao para a recepo. Depois desta etapa, teria incio a vida escolar dos ncleos de recepo, dividida em duas fases: primeiro, com aulas dos professores assistentes, que utilizariam meios auxiliares para explicar melhor o contedo, durando em mdia 30 minutos; e, depois, com debates entre os alunos, coordenados pelos professores assistentes. Este plano consistia, basicamente, na articulao da escola tradicional com o rdio, sendo fundamental para isso a existncia dos ncleos de recepo, que uniriam os aspectos positivos da didtica escolar com a penetrao e a agilidade do meio radiofnico. (PRADO PIMENTEL, 2004, p.39).

Os professores assistentes funcionariam como monitores do processo, dando suporte aos mais experientes. No mesmo ano, em Valena, interior do Rio de Janeiro, o professor e tcnico em educao, Geraldo Januzzi iniciou um curso de alfabetizao pelo rdio na Rdio Clube, emissora local. A iniciativa foi estudada por Joo Ribas da Costa, tambm professor, que desenvolveu um trabalho propondo estruturar-se um ensino no Brasil usando os pontos fortes que o rdio poderia ofertar.Em 1957, Ribas da Costa foi convidado pelo Ministro da Educao para organizar um sistema de rdio educativo nacional, que seria oficialmente proposto pelo diretor do Departamento Nacional de Educao, Heli Menegale, em abril do mesmo ano. Em 20 de maio, Ribas da Costa apresentou o projeto do Sistema Rdio-Educativo Nacional, o SIRENA, que iniciaria suas atividades no ano seguinte, sendo oficialmente instalado em junho de 1958. As principais atividades do SIRENA seriam a produo, gravao e distribuio de Cursos Bsicos, irradiados pelas emissoras do Sistema, e o incentivo formao de Sistemas Rdio Educativos Regionais, oficiais ou particulares. (PRADO PIMENTEL, 2004, p.41).

No comeo, apenas 11 emissoras estavam em sintonia com o SIRENA, transmitindo seus cursos. Com apenas trs anos de atuao, o sistema contava com mais de 65 emissoras atuando juntas.

23 O Sistema Rdio-Educativo Nacional foi extinto, segundo dados da poca, por manter uma preocupao direcionada mais fortemente aos recursos materiais (produo de material em discos e instalaes das emissoras) do que com os recursos humanos e resultados. As intensas mudanas polticas do perodo tambm so fatores que no podem deixar de ser considerados para sua extino. Entretanto, o SIRENA teve destaque pelas influncias que gerou para a criao do Movimento de Educao de Base (MEB) no final da dcada de 1950.O Movimento de Educao de Base foi uma experincia no formal na rea de educao distncia, que obteve resultados bastante positivos, sendo desenvolvido pela Igreja Catlica atravs de dioceses da Regio Nordeste, a partir da criao de escolas radiofnicas. (PRADO PIMENTEL, 2004, p.43).

Utilizando a contextualizao de CONSANI (2007), o MEB consistia em utilizar a metodologia problematizadora de Paulo Freire para alfabetizar agricultores das regies Norte e Nordeste. Com a posterior ampliao de atuao para a regio Centro-Oeste. O rdio surgiria ento como mediador desse processo, resgatando a ideologia de Roquette-Pinto.A importncia do rdio no trabalho do MEB incorporou o potencial comunicativo desse instrumento, quando o tornou no apenas um transmissor de sons e vozes, mas lhe deu um novo significado, no qual a prpria voz humana recontextualizada assume explicitamente um papel educativo. (PEIXOTO FILHO in PRETTO e TOSTA, 2010, p.20).

O Movimento tinha como diretrizes gerais atender a adolescentes e adultos, das regies citadas, no mbito educacional usando dos meios de comunicao (rdio e televiso, principalmente) e de aes culturais visando uma educao no apenas formal, mas humana nos ditames defendidos por Paulo Freire.Este Movimento no buscava simplesmente uma educao formal, onde as pessoas atingidas recebessem uma srie de informaes que muitas vezes no se relacionavam em nada com o seu cotidiano. Os prprios documentos do MEB diziam que os objetivos especficos de cada escola radiofnica eram a conscientizao, a mudana de atitudes e a instrumentao das comunidades, indo ao encontro de outros projetos de educao, como o idealizado por Paulo Freire que viria a influenciar em muito estes projetos de educao distncia. Atravs destes processos, haveria uma humanizao das pessoas, e estas ficariam aptas a uma ao consciente e livre, usando para isso anlises de situaes concretas. Com isso, elas teriam condies no s de ler e escrever, ou de realizar operaes matemticas, como de conhecer tcnicas de trabalho em grupo ou noes de higiene e sade. (PRADO PIMENTEL, 2004, pp. 44-45).

Nas prticas desenvolvidas, entre instrumentos e meios, utilizava-se muito da histria comum de seus participantes e de suas experincias de vida. O trabalho, a religio, a tradio oral, todos serviam de motivo facilitao da aprendizagem pelos ouvintes, os quais se

24 sentiam mais inseridos nas dinmicas empregadas e eram mais rapidamente conquistados pelo empreendimento filantrpico e sem fins lucrativos. Metodologicamente, havia encontros onde se planejavam e revisavam em conjunto as atividades. Eles permitiam um contato mais direto com a comunidade, movimentando e ampliando as relaes entre os disseminadores locais e o sistema nacional, bem como complementavam as aes radiofnicas.Como atividade centralizadora de todos os trabalhos do MEB, os Encontros passaram a representar papel fundamental na elaborao pedaggica desenvolvida pelo movimento nas camadas populares. Eles foram o ncleo da Animao Popular, com a Equipe Central atuando de forma contnua e ativa, dando uma assessoria constante comunidade, fornecendo elementos para a reflexo sobre os problemas levantados, para os quais a comunidade no possua as informaes necessrias. (PEIXOTO FILHO in PRETTO e TOSTA, 2010, p.26).

Ao final das atividades de estudo havia um momento de confraternizao, uma Animao Cultural, no qual os participantes estendiam as discusses iniciadas a partir da escuta dos programas e trocavam seus saberes em um ambiente no formal de relacionamento. No fim da dcada de 1960, o MEB comeou a dar maior nfase s prticas de Animao Cultural em relao aos programas radiofnicos e com a presso do governo militar, que considerava a iniciativa perigosa para o sistema poltico da poca, o movimento foi perdendo fora. Retornando classificao de BLOIS (2003), entra-se na quarta fase que abrange de 1967 a 1979. Nesse momento de intensas reviravoltas polticas houve uma centralizao da utilizao do rdio para fins educativos pelo Estado com a presena de centros produtores regionais, sempre com uma postura cientifica norteando o processo, desde o diagnstico, passando ao planejamento, produo, veiculao e recepo. O desejo era de equiparar o sistema brasileiro de educao por vias comunicativas teleducao empregada em pases mais avanados. O governo percebia nas vias educativas uma forma de consolidar o regime militar em sua ideologia. Contudo, incrementar o ensino em nvel de pas era bastante difcil dado extenso do territrio brasileiro, deste modo a radiodifuso era uma alternativa bastante interessante para se alcanar o maior nmero de indivduos. Depois de 1964, a transmisso de um programa governamental educativo tornou-se obrigatrio a todas as emissoras, tendo suas diretrizes determinadas atravs de portarias, como a 408/70, as quais determinavam a durao do programa, faixa de horrio quando seriam veiculados e responsabilidades pela produo.

25No dia 1 de setembro de 1970, o SRE criou o Projeto Minerva nome dado em homenagem deusa grega da sabedoria que teve seu programa inaugural transmitido no dia 04 de outubro do mesmo ano. [...] O objetivo geral do Projeto Minerva era transmitir, atravs do rdio, programas educativos e culturais, aperfeioando o homem dentro da sua prpria comunidade, e permitindo o seu desenvolvimento individual e coletivo. (PRADO PIMENTEL, 2004, pp. 63-64).

O Projeto Minerva tinha um carter de suplncia do Ensino Fundamental buscando alcanar pessoas com idade superior a 17 anos que no tivessem concludo os estudos fundamentais ou alunos que ainda estivessem estudando, mas fora da faixa etria prevista para a srie. Entre seus objetivos especficos destacavam-se cinco pontos:

1) a renovao e o desenvolvimento do sistema oficial de ensino e a difuso cultural; 2) o planejamento e a utilizao dos horrios reservados pela Portaria 408/70 para a programao educativa; 3) a complementao das atividades regulares do sistema oficial de ensino brasileiro; 4) a possibilidade de uma educao continuada; 5) a divulgao de programao cultural do interesse das comunidades atingidas. (PRADO PIMENTEL, 2004, pp. 63-64).

Quanto recepo tm-se duas formas de se dar: a recepo aberta e a organizada. Na primeira, os ouvintes podiam entrar em contato com os programas do projeto sem vnculos com o sistema ou ouvir individualmente as transmisses e ter acesso ao material de apoio, monitores, exerccios e testes de aprendizagem. Na segunda, os alunos se dirigiam a radiopostos a fim de realizar a escuta em ambiente sob a orientao de monitores, com a simultnea consulta em casos de questionamentos e no entendimentos. Na recepo organizada a estruturao dos radiopostos era semelhante a de uma sala de aula, com a diferena de que quem ministrava a aula era a voz proveniente do rdio. Pblicos para as transmisses no faltavam, segundo PRADO PIMENTEL (2004), na poca grande parte da populao brasileira se encaixava no perfil do ouvinte.Mesmo assim, considerando a pequena quantidade de pessoas atingidas pelas primeiras transmisses dos cursos realizadas at 1973 e ouvidas por cerca de 18.000 alunos , pode-se afirmar que houve uma evoluo do alcance do Projeto Minerva, durante a dcada de 70. No entanto, analisando as possibilidades de um projeto com todo o apoio governamental, tanto financeiro como profissional, e com toda a rede de emissoras de rdio do pas disponibilizada para as transmisses, vemos que o resultado ficou muito abaixo do que realmente se esperava. (PRADO PIMENTEL, 2004, p. 72).

26 Na dcada de 1980, com o fim da ditadura militar, o Projeto Minerva perdeu foras pois, a desistncia dos alunos era grande e a presena televisiva de cursos com carter semelhante aos radiofnicos assumiu seu papel frente aos interessados pela suplncia no ensino.

2.1.4 Anos 1980 e atual situaoA partir dessa dcada entramos na quinta fase de BLOIS (2003), nessa etapa temos a conjugao de meios massivos Educao com a presena da televiso nessa empreitada, por exemplo. Tambm ocorrem inauguraes de FMs educativas, bem como a construo e declnio Sistema Nacional de Radiodifuso Educativa (SINRED). O SINRED buscava em sua programao divulgar as principais manifestaes culturais de cada regio do Brasil, almejando a troca de informaes culturais das tradies, sotaques e novidades de cada parte do vasto territrio nacional.As primeiras atividades do SINRED foram realizadas no ms de junho de 1982, com a co-produo de duas sries educativas e culturais, Coisas da Provncia e Meu Brasil Brasileiro. [...] Oficialmente, o Sistema Nacional de Rdio Educativo foi criado pela Portaria n. 344 do MEC, de 9 de agosto de 1983. Durante a fase inicial do SINRED foram realizadas poucas produes, destacando-se duas sries: Perfis Brasileiros, divulgando a vida e a obra de personalidades brasileiras e Esses Moos, dando oportunidade a novos talentos ainda sem espao nos meios de comunicao da poca. (PRADO PIMENTEL, 2004, p. 79).

O sistema foi desativado no final dos anos 1980 e s retornou a funcionar em 1994 com um reposicionamento de enfoques: realizar coberturas jornalsticas de eventos com respaldo nacional, manter uma difuso de informaes culturais e educativas, assim como divulgar matrias jornalsticas locais de interesse para todo pas.[...] em 1995, foi criado um Programa de Apoio ao SINRED, o PROSINRED, a cargo da direo da Fundao Roquette-Pinto, visando a obteno de recursos financeiros para a aquisio de equipamentos, atravs de projetos conjuntos das emissoras afiliadas. Em 1996, comeou a vigorar uma grade de programao experimental que iria se manter at 1998, quando o Sistema encerraria suas atividades. A maioria dos programas desta grade era produzida na Rdio MEC do Rio de Janeiro, sendo alguns poucos de outras rdios, o que dificultou o intercmbio entre as diversas emissoras. (PRADO PIMENTEL, 2004, p. 81).

O SINRED acaba se distanciando das expectativas iniciais de educao distncia por conta do vis jornalstico que ganhou com o passar do tempo, mas a ideia de integrao

27 nacional de divulgao das aes educativas locais foi um salto em relao centralizao no plo Rio So Paulo que se dava at ento, com poucos casos de exceo nessa integrao. nesse ponto que se chega ao ltimo perodo da distribuio temporal de BLOIS (2003). A sexta fase abrange, segundo a autora, de 1995 em diante e contaria com o compromisso dos radialistas com a Educao, uma ampliao das possibilidades educativas com as rdios comunitrias e o acompanhamento das tecnologias com a insero de rdios educativas na internet. Em 1995, segundo FRANCO (2009), ocorre uma mudana significativa na configurao legislativa sobre a radiodifuso quando no Encontro Nacional de Rdios Livres foi regulamentado o que at ento era considerado rdio pirata. Surge ento a classificao de rdio comunitria, a qual deveria seguir alguns requisitos: ter gesto pblica, funcionar sem fins lucrativos, ter programao plural e educativa. A autora traz ainda a definio de radiodifuso comunitria, obtida atravs dos estudos da Associao Gacha das Emissoras de Radiodifuso (AGERT):O Servio de Radiodifuso Comunitria foi criado pela Lei 9.612, de 1998, regulamentada pelo Decreto 2.615 do mesmo ano. Trata-se de radiodifuso sonora, em frequncia modulada (FM), de baixa potncia (25 Watts) e cobertura restrita a um raio de 1 km a partir da antena transmissora. Podem explorar esse servio somente associaes e fundaes comunitrias sem fins lucrativos, com sede na localidade da prestao do servio. As estaes de rdio comunitrias devem ter uma programao pluralista, sem qualquer tipo de censura, e devem ser abertas expresso de todos os habitantes da regio atendida. (FRANCO, 2009, p.72).

COGO (1998) reflete sobre o tema e cita Vigil quando este autor demonstra a pluralidade da definio comunitria de rdio:

Rdios livres no Brasil, comunitrias na Argentina, participativas na Nicargua, populares no Equador e Peru [...] mas quando dizemos rdio comunitria a que definio estamos nos referindo? Chamar comunitrio pela potncia de sua antena seria uma reduo perigosa porque uma rdio comunitria quando crescesse perderia sua prpria definio. Se considerarmos a propriedade, tambm teremos problemas. Na Amrica Latina, h excelentes experincias de construo democrtica em rdios das igrejas progressistas, rdios privadas que passam anncios comerciais e se mantm como empresas, rdios de propriedade mais comum e rdios do Estado. O que define uma rdio comunitria so os objetivos que persegue: democratizar a palavra que est concentrada em poucas bocas e em pouqussimas mos para que nossa sociedade seja mais democrtica. (VIGIL apud COGO, 1998, pp.17-18).

Assim, suas classificaes como populares, cidads, livres, rurais, associativas, participativas, alternativas ou comunitrias, teriam apenas essa diferenciao de termos, mas o centro democrtico de comunicao se manteria como objetivo principal. Importante destacar

28 que o fato de ser comunitria no sinnimo de amadorismo na produo, baixa qualidade na transmisso ou tamanho da emissora, o carter democrtico o que pauta a distino frente s demais. Todas as pessoas da comunidade onde a emissora estiver inserida tm o direito de ter voz na rdio, expressando seus pensamentos e crticas, desde que no firam a tica e moral. A programao deve ser plural e atender s demandas da comunidade sem discriminao de gnero, raa, crena religiosa, opo poltico-partidria ou condio social; buscando, ainda, atentar para os interesses da pessoa humana, famlia e prestar servios de utilidade pblica. COSTA (2001) desenvolveu estudos acerca das rdios comunitrias do Rio de Janeiro e chegou a seguinte assertiva sobre as emissoras:As autenticamente comunitrias so centros culturais populares, com intensa circulao de moradores, sendo, muitas vezes, o nico meio de comunicao social de que dispem. Operadas pela comunidade, utilizam uma linguagem com a qual a comunidade se identifica. (COSTA, 2001, p.2).

O mesmo autor destaca que existem as que representam associaes de moradores, tendo um carter de solidariedade entre vizinhos e conscientizao poltica; as que se unem a Organizaes No-Governamentais (ONGs) que trabalham com um enfoque especfico; e as que integram as duas vertentes. Mas tendo o aspecto comunitrio como norteador de suas aes. Com o advento da Internet, os meios de comunicao sofrem mudanas perceptveis em sua forma de interagir com o receptor. Com o rdio no foi diferente.Com o advento da web, empresas em geral comearam a colocar suas pginas na rede para uma interface com o consumidor. O rdio viveu o mesmo processo e muitas emissoras passaram a ter um site na internet, com informaes diversas. Aos poucos, as emissoras tambm comearam a ofertar a transmisso on-line, isto , um nico produto miditico podendo ser acessado simultaneamente no aparelho de rdio e no computador. (PRATA in FERRARETTO e KLCKNER, 2010, p.613).

Atravs da web as emissoras podiam mesclar ao sonoro, imagens e textos. Modificando a forma tradicional de se fazer radiofonia. Contudo, a verdadeira revoluo, segundo PRATA (2010), configura-se quando se comea a transmitir apenas atravs do suporte online, criando as webrdios. No mbito educativo, osprojetos de rdios nas escolas e particularmente de rdio web possibilitam construes de novas possibilidades formativas, centradas na participao ativa e na produo, em vez de no mero consumo de informaes. Podemos pensar em diversas possibilidades, tais como o uso de emisses j estabelecidas a partir dos

29prprios meios comerciais, educativos ou populares e tambm os projetos de implantao de rdios nas escolas, com uso de softwares livres. (PRETTO; BONILLA; SARDEIRO. In PRETTO e TOSTA, 2010, p.75).

E nesse cenrio de radiodifuso participativa e com anseios formadores que se contextualiza o rdio educativo atual, utilizando dos novos recursos, como a Internet, sem deixar de lado as aspiraes formadoras, recorrentes em sua construo histrica. Percebe-se assim que o uso de tecnologias para a educao no so recentes, mas ganham novos contornos medida que se desenvolvem e se enxergam novas possibilidades para elas. A aproximao entre educao e comunicao acabou resultando no conceito de Educomunicao, facilmente aplicado ao rdio desde seus primeiros passos, mesmo sendo definido muitos anos depois da iniciativa de pioneiros como Roquette-Pinto. Para entender melhor essa interao entre conceitos, desenvolvo o tpico a seguir.

2.2 Comunicao e EducaoA interface entre comunicao e educao proporcionou o surgimento de um novo campo de interveno social, o qual se pode nomear de educomunicativo. O advento das tecnologias, bem como sua presena recorrente no cotidiano, gerou uma intrnseca ligao entre as esferas tecnolgica e social. A adaptao de tecnologias para essa nova realidade de trato entre pessoas e suas formas de manter contato com o ambiente circundante prova disso. Os livros so convertidos em cpias virtuais que podem ser baixadas em aplicativos mveis e lidos em qualquer local, os lbuns de fotografia so transformados em pixels de informao e disponibilizados em pginas de redes sociais com a possibilidade de receber comentrios de pessoas que esto muito longe e poderiam no ter um acesso to fcil a essas imagens. Vrios seriam os exemplos que ilustrariam essa situao, como os mencionados anteriormente, mas mesmo as tecnologias tidas como mais antigas cumpriam esse papel a seu modo e com as possibilidades de seu contexto histrico. O rdio exemplo disso, bem como a televiso ou mesmo a imprensa em suas origens. O importante notar as adaptaes que os meios vo ganhando ao longo do tempo e suas novas implicaes, ficando clara a presena cotidiana desses aparatos conduzidos para grande parte das esferas de convvio social. O campo educomunicativo surge como alternativa de atrao ao pblico da era da informao, buscando mesclar novas formas de se fazer educao em meio ao horizonte

30 informativo e de transmisso dessa informao. SOARES (2000) traz uma definio de Educomunicao:Definimos, assim, Educomicao como o conjunto das aes inerentes ao planejamento, implementao e avaliao de processos, programas e produtos destinados a criar e a fortalecer ecossistemas comunicativos em espaos educativos presenciais ou virtuais (tais como escolas, centros culturais, emissoras de TV e rdio educativos, centros produtores de materiais educativos analgicos e digitais, centros coordenadores de educao a distncia ou e-learning, e outros...), assim como a melhorar o coeficiente comunicativo das aes educativas, incluindo as relacionadas ao uso dos recursos da informao no processo de aprendizagem. (SOARES, 2000, p.63).

A rea buscaria, ento, possibilitar a produo e a transmisso da informao atravs de um incremento interativo do processo de ensino-aprendizagem. Bem como promover metodologias e referenciais tericos indispensveis para a formao adequada de profissionais que saibam dialogar a prtica educativa com os meios de comunicao massivos to recorrentes no dia a dia. Segundo MELO & TOSTA (2008), a escola surgiu com o objetivo de transmitir, de maneira sistemtica, o conhecimento acumulado pela humanidade ao longo das geraes, tendo na figura do professor o responsvel por organizar esse processo de ensinoaprendizagem, transmitindo seu conhecimento cultural aos estudantes.Para cumprir com esse objetivo, as escolas foram organizadas em classes, cada uma contando com um professor expondo as lies que os alunos deveriam seguir atentamente e aplicando os exerccios que estes deveriam realizar disciplinadamente. A esse modelo de educao deu-se o nome de Pedagogia Tradicional. (MELO & TOSTA, 2008, p.16).

Entretanto, a igualdade que se pretendia com a escola no se consolidou a partir desse modelo. A educao, que deveria tirar o homem da ignorncia e da opresso, acabou por no se dar na Pedagogia Tradicional por no serem considerados fatores estruturais (polticos, econmicos, por exemplo) para alm dos culturais. Surge ento um novo modelo: a Escola Nova.A Escola Nova vista por estudiosos da educao brasileira como um divisor de guas na Histria da Educao. Buscou mudar o eixo de preocupao do ensino, que era centrado no professor, para focalizar o aluno e sua aprendizagem. (MELO & TOSTA, 2008, p.17).

A partir desse novo modelo, o dilogo ganha espao na metodologia de sala de aula, retirando da figura centrada no professor o papel primordial de detentor do conhecimento. Outras fontes, como os meios de comunicao de massa, ganham espao nesse processo antes

31 pautado nas esferas da famlia, escola e igreja. Com a expanso da mdia h uma quebra desses padres. As informaes se tornam mais velozes em sua difuso e acesso cada vez mais facilitado. A comunicao cresce em atuao no convvio social e a educao v em suas ferramentas as possibilidades de ampliar esse dilogo em sala de aula. A escola se refaz hoje, visto que seu papel no se resume mais apenas a transmisso de contedos, busca se consolidar como espao colaborativo de estmulo a relao entre pessoas, sejam estudantes, professores ou gestores. Assim a educao ganha novos contornos e acompanha o caminhar tecnolgico e comunicativo. O pensamento de SARTORI (2006) vai ao encontro desse pensamento, para a autora a escola no assume mais o papel de nica fonte informativa num ambiente aonde a mdia e o desenvolvimento das tecnologias eletrnicas vo ganhando destaque no processo de produo e socializao da cultura. Essas fontes permitiriam interaes simblicas e socializaes privilegiadas frente ao horizonte educativo formalizado de sala de aula. Ainda segundo a autora,A aproximao Comunicao-Educao exige um novo pensar que re-elabore modelos pedaggicos e novas estratgias de interveno na sociedade que consigam responder aos processos mediticos e educacionais contemporneos. Esta exigncia se coloca na medida em que tanto o desenvolvimento tecnolgico, quanto as mudanas econmicas e sociais, como produtores de novos padres culturais, tem colocado em pauta para a escola um re-posicionamento diante do que dela se exige: encaminhamentos intencionais que preparam as pessoas para a insero crtica na sociedade. (SARTORI, 2006, pp. 1-2).

A escola como espao formal de educao, no qual se podem encontrar organizao, sistematizao e hierarquizao a nvel nacional, passa por uma renovao de seu modelo de transmisso de contedos numa esfera mais dialgica atravs da interao entre Educao e Comunicao quando pensamos no modelo educomunicativo, bem como na relao entre docente e discente, entre outros fatores de cunho poltico, econmico e social. Interessante aqui destacar o que se entende como educao formal e educao noformal, assim segundo GADOTTI (2005):A educao formal tem objetivos claros e especficos e representada principalmente pelas escolas e universidades. Ela depende de uma diretriz educacional centralizada como o currculo, com estruturas hierrquicas e burocrticas, determinadas em nvel nacional, com rgos fiscalizadores dos ministrios da educao. A educao no-formal mais difusa, menos hierrquica e menos burocrtica. Os programas de educao no-formal no precisam necessariamente seguir um sistema seqencial e hierrquico de progresso. Podem ter durao varivel, e podem, ou no, conceder certificados de aprendizagem. (GADOTTI, 2005, p.2).

32 Por ser intencional a educao assume um carter formal, segundo o autor, tendo como modelo diferenciador entre ambos os modelos o ambiente que propiciar esse aprendizado, o qual no necessariamente precisa ser o de sala de aula, estendendo-se por espaos da cidade, teatros, museus, conversas. A informalidade e a no necessidade de uma continuidade linear marcam um carter de educao no-formal. Vygotsky j destacava a interao do sujeito com o meio como importante fator do processo de aprendizagem,Ele construiu sua teoria tendo por base o desenvolvimento do individuo como resultado de um processo scio-histrico, enfatizando o papel da linguagem e da aprendizagem. A questo central abordada pelo autor era a aquisio de conhecimentos pela interao do sujeito com o meio. (MELO & TOSTA, 2008, p.18).

A relao entre experincia de vida proporcionada pelo meio circundante e a aprendizagem, tida como significativa, ser melhor enfocada no captulo seguinte quando os conceitos de base do projeto em estudo forem explicitados e correlacionados com a identificao da estruturao e diretrizes dele. Pensando na funcionalidade do rdio nesse espao, percebe-se que o veculo j abrigou iniciativas que buscavam mesclar as caractersticas metodolgicas de ensino sistematizado e progressivo da sala de aula com a distncia e novos ambientes que o aparelho comunicativo propiciava. SARTORI (2006) tambm v a inter-relao entre ambos os espaos educativos:Inter-relaes Comunicao-Educao esto presentes tanto em situaes educativas, formais ou no formais, quanto em aes comunicacionais especficas das mdias, o que vale dizer que situaes educativas so tambm comunicativas e situaes comunicativas so tambm educacionais. Configurando-se, assim, um campo terico-prtico a partir do processo de interlocuo originrio em ambas as reas. (SARTORI, 2006, p. 2).

Em Paulo Freire, quando este define comunicao, h a clara compreenso da proximidade entre as esferas comunicativa e educativa, para o autor:Comunicao () a co-participao dos sujeitos no ato de pensar... implica numa reciprocidade que no pode ser rompida. O que caracteriza a comunicao enquanto este comunicar comunicando-se, que ela dilogo, assim como o dilogo comunicativo. A educao comunicao, e dilogo, na medida em que no transferncia de saber, mas um encontro de sujeitos interlocutores que buscam a significao dos significados. (FREIRE apud LIMA, 1981, p.39).

33 O rdio , pois, representante das ambincias comunicativa e tecnolgica, h muito sendo usado como ferramenta educativa no processo de aprendizagem. A comunho entre veculo e dilogo para a gerao ou ampliao de significados frente ao contexto circundante notria desde sua chegada ao Brasil, como citado no incio do captulo. A partir do captulo seguinte, o enfoque dado ser no projeto que abriga a iniciativa radiofnica de formao docente, o projeto CASa (Comunidade de Cooperao e Aprendizagem Significativa), suas diretrizes e principais conceitos norteadores.

Compreendidos seu contexto e conceitos fundadores, passar-se- ao entendimento de suas linhas de aes e se alcanar a perspectiva radiofnica nos captulos subsequentes.

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3. Formao Docente e CASa: conceituao e percursosA partir deste ponto ser apresentado o projeto CASa, Comunidade de Cooperao e Aprendizagem Significativa. Para tanto, sero identificados o percurso de formao docente universitria antes de sua idealizao, as diretrizes conceituais de base do projeto, bem como a sua organizao e diviso de atividades entre gestores e participantes. Aps essas construes, ter-se- uma contextualizao do panorama sob o qual o programa CASa Aberta pde se consolidar.

3.1 Caminhos da formao docenteO projeto CASa surgiu de uma iniciativa da Pr-Reitoria de Graduao da Universidade Federal do Cear (Prograd-UFC) como um programa de formao docente para os professores em Estgio Probatrio da instituio. Programas com esse carter formativo destinados aos professores recm-ingressos j eram utilizados, sendo, inclusive, uma exigncia da legislao federal que regula a admisso desses profissionais. Este foi o caso da disciplina de Didtica do Ensino Superior e posteriormente do Programa Rede de Valorizao do Ensino Superior (REVES), ambos difundidos a nvel nacional e sobre os quais se discorrer frente. Segundo a regulamentao citada acima:Ao entrar em exerccio, o servidor nomeado para cargo de provimento efetivo ficar sujeito a estgio probatrio por perodo de 3 (trs) anos, durante o qual sua aptido e capacidade sero objeto de avaliao para o desempenho do cargo. O servidor em estgio probatrio poder exercer quaisquer cargos de provimento em comisso ou funes de direo, chefia ou assessoramento no rgo ou entidade de lotao, e somente poder ser cedido a outro rgo ou entidade para ocupar cargos de natureza especial, cargos de provimento em comisso do Grupo-Direo e Assessoramento Superiores DAS, de nveis 6,5 e 4 ou equivalentes. Neste estgio, ao servidor ainda podero ser concedidos as licenas e os afastamentos previstos nos arts. 81, incisos I a IV, 94, 95 e 96 - Regimento Geral. (BRASIL, UFC: PROGRAD).

O professor recm-ingresso deve cumprir um perodo de 64 (sessenta e quatro) horas de formao docente. Entretanto, a legislao no especifica de que forma essa carga horria deve ser cumprida, possibilitando a autonomia de cada instituio de Ensino Superior (IES) organizar seus programas de preparo para a sala de aula universitria.

35 Muito embora o corriqueiro fosse aplicao de cursos ou palestras de preparo aos novos profissionais, a UFC optou por uma forma distinta do que se vinha desenvolvendo nas outras universidades brasileiras. Tendo em vista acompanhar as mudanas que se deram na constituio dos quadros estudantil e professoral proporcionados pelo Reuni, a ser caracterizado a posteriori, e que tiveram reflexos na quantidade e nas formas de interao entre os atores do processo educativo, fazia-se necessrio uma maneira diferenciada de recepo e formao desses docentes. Foram estes fatores os responsveis pelos primeiros pensamentos de se construir uma comunidade de cooperao e aprendizagem significativa. Discutindo o preparo dos profissionais para a sala de aula, CARVALHO (2007) aponta que no Ensino Superior h uma clara preocupao em formar o profissional, durante a graduao, para exercer seu papel dentro de uma rea especfica de conhecimento. Quando da formao de professores, estas graduaes em licenciatura so voltadas para os ensinos Infantil, Fundamental e Mdio. A didtica de sala de aula para o nvel superior no se d numa formao discente, ou seja, durante a graduao no se preparam professores para o nvel superior. Lucarelli, citado pela autora, coloca queNos nveis fundamental e mdio, a profisso docente identifica e confere um panorama comum para o desenvolvimento de prticas diversas dos professores [...] o campo da prtica docente que define a profisso [...] O docente universitrio reconhece a si mesmo por sua profisso de origem, e identifica-se com o ttulo que lhe foi conferido pela unidade acadmica que lhe graduou [...] Poder e prestgio no provm da docncia universitria como saber pedaggico, mas do domnio de um campo especfico, tecnolgico ou humanstico determinado. (LUCARELLI apud CARVALHO, 2007, p.64).

Em entrevista concedida para este estudo monogrfico em 19 de setembro de 2011, o professor Custdio Lus Silva de Almeida, Pr-Reitor de graduao da UFC, reconhece esse pensamento do preparo universitrio para uma rea especfica e no para a docncia no Ensino Superior. O Pr-Reitor argumenta que o professor de Medicina, por exemplo, um profissional da rea que passou pelo crivo de um concurso pblico, foi aprovado e agora se tornou docente da rea, sem ter acesso na graduao a um preparo para o exerccio de tal funo. Deste fato se construiria a necessidade de preparao docente para a realidade universitria. Reafirmando essa posio, CARVALHO (2007) traz que

36Enquanto os professores de Ensino Fundamental e Mdio tm na sua formao especfica uma preocupao com a prtica pedaggica, os da Educao Superior, na sua maioria, no tm contato na formao acadmica com contedos ou prticas relacionadas didtica ou metodologia do Ensino Superior. (CARVALHO, 2007, p.64).

Resqucios ainda de 1931 quando as universidades brasileiras foram formalizadas em estatuto. Segundo MARQUES (2000), o provimento no cargo de professor catedrtico se fazia por concurso com base no diploma profissional ou cientfico que se correlacionasse com a rea da disciplina a ser ministrada. A Universidade se configurava como uma aglomerao de ctedras soberanas, onde cada uma possua seu catedrtico e este seus colaboradores, todos escolhidos sem uma exigncia formal e sistemtica de preparao para a atividade professoral.Somente com a Reforma Universitria outorgada em 1968 e com os planos governamentais de desenvolvimento nacional surge uma poltica de formao e aperfeioamento do corpo docente das universidades, com o 1 Plano Nacional de Ps-Graduao (I PNPg), suporte de programas no mbito de um sistema nacional e regional definido pelo Conselho Federal de Educao e implementado pela Comisso de Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES), com o apoio de outros rgos financiadores. (MARQUES, 2000, p.190).

ALTHAUS (2004) acrescenta ainda que frente aos desafios postos para o ensinar, o domnio especfico de uma rea cientfica do conhecimento no suficiente. O professor universitrio deve desenvolver tambm outros saberes: pedaggico e poltico. Dessa forma fica clara a insuficincia de uma formao acadmica em uma rea especifica de atuao profissional sem uma preparao didtica para o trato estudantil universitrio. Visando tornar esses docentes aptos a esta realidade, a UFC oferecia uma disciplina de Didtica do Ensino Superior, obrigatria durante o perodo de Estgio Probatrio para os professores recm-ingressos e que depois foi agregada ao REVES, ambos anteriores concepo do projeto CASa. No tpico seguinte sero apresentadas as duas estratgias.

3.2 Didtica do Ensino Superior e REVESAntes da idealizao do CASa, a UFC mantinha outras estratgias de formao docente representadas pela disciplina de Didtica do Ensino Superior e o Programa Rede de Valorizao do Ensino Superior. Destaca-se que a referida disciplina no foi extinta com a chegada do REVES e tampouco com a do CASa. Sua presena ganhou apenas novos contornos dentro dos projetos, saindo do cunho obrigatrio, quando de sua incluso no

37 perodo de Estgio Probatrio, para uma ferramenta do REVES e alcanando a dimenso opcional no CASa. J o REVES, agregado posteriormente, teve muitas de suas ideias aplicadas ao CASa, mesmo com sua desarticulao aps a chegada do novo projeto. Assim, as duas experincias anteriores no foram abandonadas para a criao de uma estratgia absolutamente nova, mas sim fizeram parte do processo contnuo de construo da Comunidade de Cooperao e Aprendizagem Significativa. Todavia, antes de discorrer acerca das duas iniciativas que antecederam o projeto em estudo, faz-se importante entender de que se trata didtica. Ainda segundo ALTHAUS (2004), didtica concebida como reflexo sistemtica sobre o processo ensino-aprendizagem, tendo sempre como ponto de partida a discusso da prtica docente de cada professor. Assim, ao longo da disciplina homnima aplicada ao nvel Superior, seriam fornecidos subsdios terico-metodolgicos para a prtica docente. Os profissionais de reas especficas se deparariam, ento, com as questes de ordem prtica da atividade docente como, por exemplo, a organizao de contedos, o preparo de material para aulas etc.. Afinal, seu conhecimento tcnico insuficiente para os desafios propostos pela docncia. A partir de dados obtidos no plano de ensino da disciplina de Didtica do Ensino Superior, ofertado pela Faculdade de Educao no perodo letivo de 2009.2, possvel inferir que ela tinha como objetivos gerais a reflexo e a anlise da realidade, do contexto histrico e scio-poltico do ensino nas Universidades e demais IES, tanto em nvel nacional como em estadual. Importante esclarecer que este plano foi desenvolvido para os alunos de psgraduao da FACED, mas possui estrutura semelhante destinada aos profissionais recmingressos, segundo Bernadete Porto, coordenadora de formao docente do projeto CASa e professora responsvel por ministrar a referida disciplina nas duas instncias (ps-graduao e CASa). Ainda tendo como base o documento citado anteriormente, a um nvel mais especfico, residiam entre os objetivos: O aprofundamento dos estudos sobre o processo de construo do conhecimento e mediao do professor; A anlise da prtica docente, o que proporcionaria um embasamento tericoprtico visando superao de obstculos e dificuldades; A compreenso do projeto pedaggico nas IES, assim como o desenvolvimento de atividades interdisciplinares e a no separao entre ensino, pesquisa e extenso;

38 A reflexo sobre a funcionalidade das tecnologias de informao e de comunicao na Educao Superior; A anlise do contexto educacional contemporneo e da prtica educativa, atravs do estudo das correntes pedaggicas mais significativas; O diagnstico do contexto educativo e da prtica pedaggica desenvolvida na ao como docente; A compreenso crtica do processo de planejamento de ensino, levando em considerao as suas dimenses e componentes didticos; A identificao das etapas do plano de ensino como no-dissociveis no processo de reflexo/ao/reflexo, correspondendo, assim, dinmica que caracteriza a prtica pedaggica enquanto prxis; E a elaborao de planos de ensino (disciplina, unidade e aula). Ao todo eram 64 (sessenta e quatro) horas/aula distribudas por temticas. Sendo 16 (dezesseis) horas destinadas ao entendimento da Universidade, no mbito de seu histrico, trajetrias, funes, legislao, problemas e perspectivas, bem como a situao do Ensino Superior em nvel nacional e de seus sistemas de avaliao; outras 20 (vinte) horas eram direcionadas para a discusso dos fundamentos epistemolgicos dos processos de ensino e aprendizagem, com o estudo de teorias do conhecimento e da aprendizagem, tendncias pedaggicas, atuao na sala de aula, assim como projetos poltico-pedaggicos, aes interdisciplinares e uso das novas tecnologias da informao e comunicao; as demais 28 (vinte e oito) horas eram dedicadas didtica propriamente dita, atravs de sua conceituao e importncia na formao do professor, e do planejamento de ensino, com a anlise crtica dos elementos envolvidos no processo e sua elaborao. Todas essas atividades eram desenvolvidas a partir de aulas expositivas dialogadas, leituras, estudo de textos, desenvolvimento de projetos individuais e grupais, bem como pesquisas orientadas e dinmicas de grupo. Ao final, o professor estaria mais inserido nas questes da docncia superior, podendo desenvolver suas habilidades na academia em comunho com a prtica de sala de aula, que ocorria ao mesmo tempo do caminhar da disciplina Outra modalidade de formao docente que antecedeu a iniciativa do CASa foi o programa Rede de Valorizao do Ensino Superior (REVES). Segundo informaes do portal da UFC, ele possua como atividades a realizao de cursos e palestras, seguindo uma linha

39 tradicional de preparo para a sala de aula universitria, onde havia um professor mediador frente a uma plateia espectadora com uma programao prvia.O REVES tem como objetivos favorecer a implementao de uma sistemtica de apoio didtico-pedaggico ao docente, reestruturar o espao e as aes das coordenaes de curso de graduao e estimular a articulao entre as unidades curriculares, como canal de dilogo entre as instncias acadmicas. Compreende a realizao de cursos e palestras para professores e tambm para funcionrios tcnico-administrativos de coordenaes de curso de graduao. (BRASIL: UFC, 2008).

O programa procurava possibilitar uma reflexo sobre as polticas pblicas numa esfera interinstitucional, pensando criticamente acerca das diferentes concepes e estratgias de ensino-aprendizagem e compreendendo os fundamentos da ao docente como profisso. Ele visava no apenas identificar problemas e lacunas da atuao professoral, mas socializar experincias que fossem desenvolvidas nos diferentes campi. O REVES tinha como objetivos, segundo dados obtidos em seu material de divulgao de aes dos anos de 2006 e 2007: Contribuir para que a docncia no ensino superior seja percebida, compreendida e efetivada como profisso, motivo pelo qual os professores necessitam de saberes e competncias especficas para suas aes; Favorecer condies para a construo e reconstruo, contnua, de concepo pessoal de ensino e de aprendizagem em contexto universitrio articulando o saber experiencial ao saber da formao acadmica; Identificar e criar diferentes concepes de aprendizagem mediadas pela dialogicidade e pelas tecnologias de informao e comunicao; Ressignificar o papel da avaliao como instrumento de acompanhamento do processo de ensino-aprendizagem, no sentido da superao das dificuldades encontradas por professores e alunos; Reconhecer a dimenso tica do trabalho docente em contexto universitrio; Oferecer aos tutores do PET (Programa de Educao Tutorial), aos docentes orientadores e discentes em formao vinculados ao Programa de Iniciao Docncia (PID) oportunidades de formao continuada em articulao com os pressupostos explicitados nos Projetos Pedaggicos de Curso; Apoiar a implementao de uma cultura de valorizao da docncia universitria nos cursos de graduao do Cariri e Sobral, participantes do processo de expanso/interiorizao da UFC;

40 Promover articulao entre Pr-