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Revista Brasileira de Ensino de F´ ısica, vol. 38, nº 4, e4201 (2016) www.scielo.br/rbef DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2016-0191 Sec ¸˜ ao Especial - Ondas Gravitacionais cbnd Licenc ¸a Creative Commons Cem anos de buracos negros: o centen´ ario da solu¸ ao de Schwarzschild One hundred years of black holes: the centenary of the Schwarschild solution Alberto Saa *1 1 Departamento de Matem´ atica Aplicada, Universidade Estadual de Campinas, 13083-859, Campinas, SP, Brasil Recebido em 27 de Agosto, 2016. Aceito em 28 de Agosto, 2016. No in´ ıcio deste ano de 2016, o cons´ orcio formado pelas colabora¸ oes LIGO e Virgo anunciou a primeira detec¸c˜ao direta de ondas gravitacionais. Exatamente 100 anos antes, Karl Schwarzschild, um f´ ısico e astrˆ onomo alem˜ ao de refinada forma¸ ao matem´ atica, surpreendia Einstein e toda a comunidade cient´ ıfica com uma solu¸c˜ao exata das complicadas equa¸c˜oes da Teoria da Relatividade Geral. As condi¸c˜oes nas quais desenvolveu este seu trabalho foram dram´ aticas e ficaram famosas: lutando com o ex´ ercito alem˜ ao na frente russa da Primeira Guerra Mundial. ´ E not´ avel tamb´ em que seu trabalho tenha sido praticamente simultˆaneo aos de Einstein que levaram `a consolida¸c˜ao da Relatividade Geral, a tempo ainda de ter sua solu¸c˜ao reconhecida e citada na formula¸c˜ao definitiva da Teoria, publicada por Einstein no mesmo ano de 1916. A desde ent˜ao chamada solu¸c˜ao de Schwarzschild foi o ponto de partida para uma das mais interessantes sagas da F´ ısica do S´ eculo XX: a descoberta dos buracos negros e suas fascinantes propriedades f´ ısicas, que est˜ao por tr´as, tamb´ em, dos fenˆomenos de ondas gravitacionais detectados diretamente este ano. Apresentaremos aqui um pouco dos contextos hist´orico e epistemol´ogico destas not´ aveis descobertas e alguns de seus principais protagonistas. Palavras-chave: Relatividade Geral, Buracos Negros, Ondas Gravitacionais, Karl Schwarzschild Early this year, 2016, the consortium formed by LIGO and Virgo collaborations announced the first direct detection of gravitational waves. Exactly 100 years earlier, Karl Schwarzschild, a German physicist and astronomer with a refined mathematical background, surprised Einstein and the entire scientific community with an exact solution for the complicated equations of General Relativity. The conditions under which he worked on the problem were quite dramatic and became famous: fighting with the German army on the Russian front of the First World War. It is remarkable also that his work was almost simultaneous to Einstein’s that led to the consolidation of General Relativity, just in time to have his solution recognized and cited in the final formulation of the Theory, published by Einstein in the same year of 1916. Since then called the Schwarzschild solution, it was the starting point for one of the most interesting sagas of the twentieth century Physics: the discovery of black holes and their fascinating physical properties, which are also behind the gravitational waves phenomena directly detected this year. We present here a bit of the historical and epistemological contexts of these remarkable discoveries and some of their main protagonists. Keywords: General Relativity, Black Holes, Gravitational Waves, Karl Schwarzschild 1. Introdu¸ ao Em fevereiro de 2016, o cons´orcio formado pelas colabora¸c˜oes LIGO [1] e Virgo [2] anunciou, com grande interesse e cobertura dos principais meios de comunica¸c˜ao,aprimeiradetec¸c˜aodiretadeondas * Endere¸ co de correspondˆ encia: [email protected]. gravitacionais [36], culminando assim de maneira esplˆ endida mais de meio s´ eculo de esfor¸ cos te´ oricos e tecnol´ ogicos fundamentais para esta fa¸ canha obser- vacional, considerada por muitos o embri˜ ao de uma nova e fascinante era na observa¸ ao astronˆ omica [4]. Detec¸c˜oes mais frequentes s˜ao esperadas no futuro (de fato, um outro evento semelhante ao primeiro j´ a Copyright by Sociedade Brasileira de F´ ısica. Printed in Brazil.

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Revista Brasileira de Ensino de Fısica, vol. 38, nº 4, e4201 (2016)www.scielo.br/rbefDOI: http://dx.doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2016-0191

Secao Especial - Ondas Gravitacionaiscbnd

Licenca Creative Commons

Cem anos de buracos negros:o centenario da solucao de Schwarzschild

One hundred years of black holes: the centenary of the Schwarschild solution

Alberto Saa∗1

1Departamento de Matematica Aplicada, Universidade Estadual de Campinas, 13083-859, Campinas, SP, Brasil

Recebido em 27 de Agosto, 2016. Aceito em 28 de Agosto, 2016.

No inıcio deste ano de 2016, o consorcio formado pelas colaboracoes LIGO e Virgo anunciou a primeiradeteccao direta de ondas gravitacionais. Exatamente 100 anos antes, Karl Schwarzschild, um fısico eastronomo alemao de refinada formacao matematica, surpreendia Einstein e toda a comunidade cientıficacom uma solucao exata das complicadas equacoes da Teoria da Relatividade Geral. As condicoes nasquais desenvolveu este seu trabalho foram dramaticas e ficaram famosas: lutando com o exercito alemaona frente russa da Primeira Guerra Mundial. E notavel tambem que seu trabalho tenha sido praticamentesimultaneo aos de Einstein que levaram a consolidacao da Relatividade Geral, a tempo ainda de tersua solucao reconhecida e citada na formulacao definitiva da Teoria, publicada por Einstein no mesmoano de 1916. A desde entao chamada solucao de Schwarzschild foi o ponto de partida para uma dasmais interessantes sagas da Fısica do Seculo XX: a descoberta dos buracos negros e suas fascinantespropriedades fısicas, que estao por tras, tambem, dos fenomenos de ondas gravitacionais detectadosdiretamente este ano. Apresentaremos aqui um pouco dos contextos historico e epistemologico destasnotaveis descobertas e alguns de seus principais protagonistas.Palavras-chave: Relatividade Geral, Buracos Negros, Ondas Gravitacionais, Karl Schwarzschild

Early this year, 2016, the consortium formed by LIGO and Virgo collaborations announced the firstdirect detection of gravitational waves. Exactly 100 years earlier, Karl Schwarzschild, a German physicistand astronomer with a refined mathematical background, surprised Einstein and the entire scientificcommunity with an exact solution for the complicated equations of General Relativity. The conditionsunder which he worked on the problem were quite dramatic and became famous: fighting with theGerman army on the Russian front of the First World War. It is remarkable also that his work wasalmost simultaneous to Einstein’s that led to the consolidation of General Relativity, just in time to havehis solution recognized and cited in the final formulation of the Theory, published by Einstein in thesame year of 1916. Since then called the Schwarzschild solution, it was the starting point for one of themost interesting sagas of the twentieth century Physics: the discovery of black holes and their fascinatingphysical properties, which are also behind the gravitational waves phenomena directly detected this year.We present here a bit of the historical and epistemological contexts of these remarkable discoveries andsome of their main protagonists.Keywords: General Relativity, Black Holes, Gravitational Waves, Karl Schwarzschild

1. Introducao

Em fevereiro de 2016, o consorcio formado pelascolaboracoes LIGO [1] e Virgo [2] anunciou, comgrande interesse e cobertura dos principais meios decomunicacao, a primeira deteccao direta de ondas

∗Endereco de correspondencia: [email protected].

gravitacionais [3–6], culminando assim de maneiraesplendida mais de meio seculo de esforcos teoricos etecnologicos fundamentais para esta facanha obser-vacional, considerada por muitos o embriao de umanova e fascinante era na observacao astronomica [4].Deteccoes mais frequentes sao esperadas no futuro(de fato, um outro evento semelhante ao primeiro ja

Copyright by Sociedade Brasileira de Fısica. Printed in Brazil.

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e4201-2 Cem anos de buracos negros: o centenario da solucao de Schwarzschild

foi detectado [7]1) e, com isso, dados observacionaisfundamentais para o entendimento dos fenomenosfısicos envolvidos passarao a ser acumulados em bomritmo, permitindo desta maneira um cuidadoso es-crutınio das teorias fısicas pertinentes, levando aoeventual descarte de algumas hipoteses e o aprimora-mento de outras, como de fato se espera da dinamicado Metodo Cientıfico nas Ciencias Experimentais.Ha grande expectativa na comunidade cientıfica so-bre estas novas massas de dados e a natureza doseventos e fenomenos fısicos que poderao ajudar aelucidar.

Os fenomenos fısicos por tras das emissoes de on-das gravitacionais de deteccao mais provavel como,em particular, e justamente o caso dos dois eventosja observados, envolvem buracos negros, mais espe-cificamente situacoes de fusao entre dois buracosnegros. Sao fenomenos tipicamente de energias gi-gantescas, sao de fato os mais energeticos, depois doBig Bang, conhecidos na Fısica, nos quais massas demesma ordem de magnitude que a do sol sao conver-tidas e irradiadas como ondas, com predominanciadas gravitacionais. Tanto os buracos negros quantoas ondas gravitacionais sao previsoes originais daTeoria da Relatividade Geral, construıda tambem haum seculo por Albert Einstein2 para a descricao dosfenomenos gravitacionais, substituindo, ate agoracom absoluto sucesso, o paradigma da GravitacaoUniversal de Newton. Nao havia, ate este ano, ne-nhuma observacao direta de ondas gravitacionais,mas tambem e certo que ja havia sido acumuladoum consideravel conjunto de evidencias convincentesa favor de sua existencia. Por exemplo, o premioNobel de 1993 [10] foi concedido a R. Hulse e J.Taylor precisamente pelas observacoes realizadasnos anos 70 sobre um sistema binario formados porum pulsar e uma estrela de neutrons [11]. Das on-das de radio emitidas por este sistema binario, eevidente que ele vem perdendo energia, com umataxa de decrescimo perfeitamente compatıvel comas previsoes da Relatividade Geral sobre a emissao

1 Os dois eventos detectados foram denominados GW150914e GW151226. GW denota o tipo do evento (gravitatio-nal wave), e o numero seguinte a data da deteccao: ano,mes e dia. O anuncio da deteccao e sempre posterior, al-guns meses sao necessarios para a completa analise do si-nal capturado. Os dados dos sinais sao publicos. Os do pri-meiro evento, por exemplo, podem ser obtidos no enderecohttps://losc.ligo.org/events/GW150914/2 Para uma biografia de Einstein, recomenda-se [8]. Comotexto de divulgacao sobre a Relatividade Geral e sua ricahistoria, recomenda-se [9].

de ondas gravitacionais por sistemas dessa natu-reza. Sobre os buracos negros especificamente, aindanao ha observacao direta, mas a deteccao das on-das gravitacionais possivelmente oriundas da fusaode buracos negros e, incontestavelmente, mais umaforte evidencia indireta de sua existencia na Natu-reza. Retornaremos a este ponto mais adiante.

Uma efemeride notavel nos remete precisamentea origem dos buracos negros, objetos astrofısicosde propriedades surpreendentes e historia rica emcontroversias, polemicas e curiosidades. Exatos 100anos antes do anuncio da primeira deteccao diretade ondas gravitacionais, em fevereiro de 1916, erapublicado nos Anais da Academia Real de Cienciasda Prussia um artigo, correspondente a uma apre-sentacao oral feita por Einstein em 13 de janeirodesse mesmo ano, contendo um resultado surpreen-dente obtido por um fısico e astronomo alemao derefinada formacao matematica: Karl Schwarzschild.Neste trabalho [12]3, intitulado “Sobre o campo gra-vitacional de uma massa puntual de acordo coma teoria de Einstein”, Schwarzschild apresenta asolucao que viria a ser imortalizada com o seu nomepara as equacoes da Relatividade Geral de Einstein,e que levara nao so a descoberta dos buracos negros,mas como tambem a boa parte da Fısica que hojeesta sendo desvendada com as observacoes das on-das gravitacionais. Nos seus 100 anos de historia, asolucao de Schwarzschild foi intensamente debatidafısica e matematicamente, caiu no esquecimento, re-nasceu, foi completamente dissecada e generalizada,ate chegarmos no entendimento atual de que eladescreve o tipo mais simples de uma nova classe deobjetos da Natureza: os buracos negros. Serao apre-sentados a seguir um pouco dos contextos historico eepistemologico nos quais se desenvolveu esta que cer-tamente e uma das grandes sagas da Fısica do seculoXX: a descoberta dos buracos negros e suas fasci-nantes propriedades fısicas. Iniciaremos com umabreve biografia cientıfica do principal personagemda efemeride.

2. Karl Schwarzschild

Karl Schwarzschild nasceu em uma famılia judaicade alto estrato socio-cultural da cidade de Frank-furt, Alemanha, em 9 de outubro de 1873, sendo

3Varios dos trabalhos ja classicos em lıngua alema citadosaqui podem ser encontrados em versao original no projetoWikisource http://de.wikisource.org/

Revista Brasileira de Ensino de Fısica, vol. 38, nº 4, e4201, 2016 DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2016-0191

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o primogenito de seis irmaos [13, 14]. Foi um es-tudante brilhante e demonstrou precocemente seutalento para a Matematica e as Ciencias Naturais.Seus dois primeiros trabalhos cientıficos [15, 16], so-bre mecanica celeste, foram publicados antes deseu decimo setimo aniversario, enquanto ainda eraum estudante pre-universitario em sua cidade natal.Nessa epoca, aventurava-se como auto-didata juntoa um amigo dois anos mais velho, Paul Epstein, queviria posteriormente a se consagrar como um grandematematico, em diversos topicos de Matematica su-perior e astronomia, incluindo a observacao do ceucom telescopios.

Schwarzschild frequentou entre 1891 e 1893 a Uni-versidade de Estrasburgo, entao uma Universidadealema geografica e culturalmente, onde teve umaformacao solida em astronomia, incluindo tecnicasobservacionais modernas e pioneiras na epoca. Emseguida, muda-se a Munique, onde realiza um ano deservico militar em um corpo de artilharia do exercitoalemao. Sob orientacao do eminente astronomo Hugovon Seeliger, obtem em 1896, na Universidade deMunique, seu doutorado [17], explorando alguns dostrabalhos matematicos de Poincare e suas possıveisaplicacoes a dinamica e origem do sistema solar.Sua refinada formacao matematica e evidente emseus trabalhos dessa epoca. Seu doutorado, porexemplo, envolve ideias matematicas introduzidase desenvolvidas por H. Poincare poucos anos antes,acerca de estabilidade de fluidos auto-gravitantesem rotacao. Logo apos obter seu doutorado, assumiuuma posicao de astronomo no Observatorio Kuffner,de Viena, onde ficou ate 1899, ano em que regressa aMunique com uma tradicional posicao academica daepoca na Alemanha: a de Privatdozent. Seu examede Habilitacao, necessario pelas regras das universi-dades alemas para se ter acesso a essa posicao, seraimportante, como veremos, para entendermos seugrau de familiaridade, anos depois, com a Relativi-dade Geral. De seu perıodo em Viena, destacam-seseus trabalhos teoricos sobre o Problema de TresCorpos e, principalmente, seus trabalhos sobre foto-metria, tecnica pioneira na epoca e que provou serfundamental para o desenvolvimento da astronomiamoderna.

Schwarzschild deixa Munique em 1901, ano emque assume uma posicao de Professor na universi-dade que provavelmente era a de maior prestıgio emFısica e Matematica da Alemanha na epoca: Gottin-gen, onde fica ate 1909, sendo o responsavel pelo

Figura 1: Karl Schwarzschild, 9 de Outubro de 1873 (Frank-furt) – 11 de Maio de 1916 (Potsdam), em seus anos na Uni-versidade de Gottingen (1901 – 1909). Imagem de domıniopublico, https://commons.wikimedia.org/

Observatorio Astronomico da Universidade. Tevecomo colegas e colaboradores nesse perıodo a FelixKlein, David Hilbert e Hermann Minkowski, o quecertamente foi importante para mante-lo atualizadoconstantemente sobre os avancos na Matematica e odesenvolvimento da Teoria da Relatividade Geral deEinstein. Em Gottingen, continua trabalhando emFısica Teorica e tambem realiza diversas observacoesastronomicas, produzindo um extenso catalogo deestrelas: o Gottinger Aktinometrie. Em 1909, muda-se para Potsdam, onde assume a posicao de maiordestaque na Alemanha da epoca para um astronomo:a de Diretor do Observatorio Astrofısico da cidade.E durante esse perıodo que forma sua famılia. Casa-se com Else Posenbach em seus ultimos meses emGottingen, vindo a ter tres filhos, ja em Potsdam:Agathe, Martin e Alfred. Seu filho Martin Schwarz-child deixara a Alemanha durante a perseguicaonazista, e desenvolvera sua carreira de grande su-cesso como astronomo na Universidade de Princeton,nos Estados Unidos.

Em Potsdam, Schwarzchild prossegue com seustrabalhos astronomicos de primeira classe. Conti-nuou a contribuir para o grande catalogo de es-trelas iniciado em Gottingen. Visitou os EstadosUnidos em 1910, participando no (decimo primeiro)Congresso da AAS (American Astronomical Soci-ety), em Cambridge, Massachusetts, e na (quarta)Conferencia da International Union for Solar Rese-arch, em Mount Wilson, California. Ainda em 1910,

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2016-0191 Revista Brasileira de Ensino de Fısica, vol. 38, nº 4, e4201, 2016

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participa da expedicao alema a Tenerife, nas IlhasCanarias, para a observacao da passagem do cometaHalley, registrando o evento com suas tecnicas fo-tograficas pioneiras na epoca. Contudo, sua carreirabrilhante na astronomia foi bruscamente interrom-pida em 1914, com a eclosao da Primeira GuerraMundial. Schwarzchild, que estaria dispensado dese unir as filas militares por sua idade, se apresentacomo voluntario, trabalhando ativamente no esforcode guerra alemao, primeiro como oficial de meteoro-logia e, posteriormente, de artilharia. Chega, inclu-sive, a produzir trabalhos cientıficos de carater emi-nentemente belico, como, por exemplo, um estudosobre a influencia da resistencia do ar na trajetoriade projeteis balısticos [18], o qual devido a guerra soveio a ser publicado em 1920. Ha uma vasta e ricaliteratura4 sobre essa conturbada e extremamentetragica epoca da sociedade alema, na qual inumeroscientistas de primeira magnitude eram verdadeirosentusiastas da guerra [20]. Muitos viriam a pagar omais alto preco por essas escolhas. Ha de se destacar,sempre, que um dos raros cientistas alemaes que semanifestaram enfaticamente contra a guerra foi Al-bert Einstein [8]. Schwarzschild serviu inicialmenteem Namur, Belgica, como oficial de meteorologia,a partir de setembro de 1914 (a guerra se iniciaraem 28 de julho). Depois, passou rapidamente pelaregiao de Argonne, Franca, e finalmente, ja comooficial de artilharia, foi para a temida e perigosafrente russa. O grande fısico indiano SubrahmanyanChandrasekhar, do qual em breve falaremos, ga-nhador do Premio Nobel de 1983 por seus estudosfundamentais sobre estrutura e evolucao estelar, re-lata uma conversa nos anos 30 com o matematicoalemao Richard Courant, que viria a se estabelecernos Estados Unidos apos a perseguicao nazista, naqual ele dizia ter, com muita surpresa, encontradoSchwarzschild a caminho da frente russa, enquantoele proprio a abandonava. Nas proprias palavras deChandrasekhar: [14]

Richard Courant told me in the latethirties that he had met Karl Schwarzs-child proceeding to the Eastern front whilehe, as a member of the general staff, waswith a party retreating from the samefront; and Courant said that he was sur-prised that someone as distinguished asKarl Schwarzschild would be proceeding

4 Ver, por exemplo, [19] e referencias la contidas.

towards a front that was considered toodangerous for the general staff!

Durante a campanha russa, Schwarzschild con-traiu penfigo, uma debilitante doenca auto-imuneque causa bolhas e erupcoes extremamente doloro-sas na pele, completamente incuravel na epoca. Foidesmobilizado em marco de 1916, vindo a morrerdois meses depois. Nao chegou a completar 43 anosde idade.

2.1. A solucao e seu contexto

Schwarzschild tambem se dedicou a Ciencia Basicaenquanto esteve mobilizado no exercito alemao. Foiprovavelmente no verao de 1915, ja na frente russa,quando desenvolveu os trabalhos que deram origema seus dois artigos sobre relatividade. Alem do pri-meiro ja comentado anteriormente [12], houve umsegundo [21] sobre o campo gravitacional de umadistribuicao esferica e homogenea de materia. Eneste segundo artigo que aparece, pela primeira vez,a quantidade rS , que passaria a ser chamada “raiode Schwarzschild”. O ano de 1915 foi tambem parti-cularmente intenso para Einstein. Publicou quatroartigos em novembro [22–25], os quais viriam a sera base da sua Teoria da Relatividade Geral. Curio-samente, o artigo final, consolidando a teoria, so foipublicado em marco de 1916 [26], apos o primeirotrabalho de Schwarzschild, o qual e de fato citado, eportanto inequivocamente reconhecido como validoe pertinente, por Einstein. Em um de seus quatrotrabalhos de Novembro [24], Einstein propoe, comose infere literalmente do tıtulo, uma “explicacaopara o movimento do perielio de Mercurio a partirda Teoria da Relatividade Geral”. Trata-se de umdos testes classicos da Relatividade Geral. Sabe-se,das Leis de Kepler, que a orbita dos planetas euma elipse com o Sol situado em um de seus focos.Os nomes de perielio e afelio sao dados, respecti-vamente, aos pontos da orbita de menor e maiordistancia ao sol. Sao, obviamente, os pontos extre-mos do eixo maior da elipse correspondente a orbitaem questao. A Teoria da Relatividade Geral preveum pequeno movimento, um avanco, do perielio deMercurio, que provou ser perfeitamente compatıvelcom as observacoes.5 A orbita de Mercurio e, por-tanto, uma elipse que precessa em torno do sol, e5 Rigorosamente, a previsao da Relatividade Geral que foiconfirmada nas observacoes foi de um excesso de precessao,ja que o a precessao em si tambem e prevista no contextonewtoniano, a partir da perturbacao da orbita de Mercurio

Revista Brasileira de Ensino de Fısica, vol. 38, nº 4, e4201, 2016 DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2016-0191

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este movimento pode ser detectado registrando-se aposicao do perielio a cada volta completa (ano) doplaneta em torno do sol. O planeta Mercurio e parti-cularmente util para este estudo por dois principaismotivos [27]: e o planeta com maior velocidade detranslacao em torno do Sol, com um ano que corres-ponde aproximadamente a 88 dias do planeta Terra,sendo possıvel portanto registrar a posicao de seuperielio a cada tres meses terrestres; e tambem porser o planeta com a orbita de maior excentricidade(0.206) do sistema solar, depois de Plutao (0.248),que de fato nao e mais considerado um planeta. Aexcentricidade da orbita da Terra, por exemplo, naochega a um decimo da de Mercurio.

Para a derivacao de sua previsao para o avancodo perielio de Mercurio, Einstein deveria descrever oequivalente em sua Teoria da Relatividade Geral docampo gravitacional do Sol. Suas equacoes, porem,se mostravam muito mais complicadas que as daGravitacao Universal de Newton, e Einstein entaooptou por uma abordagem perturbativa. Nao obtevea solucao exata que corresponderia na RelatividadeGeral ao campo gravitacional de um corpo esferico,mas descreveu as correcoes oriundas da RelatividadeGeral ao potencial Newtoniano, o qual, para o casode um corpo esferico e homogeneo de massa M situ-ado na origem das coordenadas cartesianas (x, y, z)e dado pela simples expressao

Φ(x, y, z) = − GM√x2 + y2 + z2 , (1)

sendo G a constante universal de Newton. O poten-cial newtoniano (1) e valido para a regiao externaao corpo. No entanto, essa expressao nao envolveo tamanho do corpo. Em outras palavras, e validapara corpos esfericos e homogeneos de qualquer raio,inclusive os arbitrariamente pequenos, i.e., corpospuntuais6.

Em seu primeiro artigo de 1916 [12], Schwarzschildencontra a solucao exata das equacoes de Einstein

devido a presenca de outros planetas, notadamente Jupiter.Para se ter uma ideia, as previsoes Newtonianas sao da ordemde 530 segundos de arco por seculo, enquanto as da Teoriada Relatividade Geral nao atingem 1/10 disso (43”/seculo).6De fato, este e o conteudo da 71ª Proposicao da Secao 12 doPrincipia de Newton [28], provado como o Teorema 31. Naspalavras de Newton (na versao inglesa):

...a corpuscle placed with out the sphaericalsuperficies is attracted towards the centre of thesphere with a force reciprocally proportional tothe square of its distance from that centre.

que corresponderia ao campo gravitacional de umamassa puntual. Eu outras palavras, o equivalente naRelatividade Geral ao potencial (1) na GravitacaoUniversal de Newton. Sua solucao confirmou que asaproximacoes feitas por Einstein em seu trabalhosobre o perielio de Mercurio estavam de fato corretas.Schwarzschild enviou o resultado a Einstein em umafamosa carta, em dezembro de 20157. A reacao deEinstein foi de entusiasmo. Em sua resposta, escritaem um cartao postal em 29 de Dezembro, escreveu

Ich hatte nicht gedacht, dass die strengeBehandlung des Punktproblems so ein-fach ware.8

Einstein tambem prometeu uma publicacao rapidado resultado. Em janeiro de 1916, faz a comunicacaono encontro da Academia Real de Ciencias da Prussia,e o artigo e de fato publicado nos Anais de fevereiro.

A Relatividade Geral e uma teoria radicalmentediferente da Gravitacao Universal de Newton. Emparticular, a interacao gravitacional nao e mediadapor um potencial como (1), mas pelas propriedadesgeometricas do Espaco-Tempo, conceito fundamen-tal que havia sido introduzido em 1908 pelo colega deSchwarzschild em Gottingen H. Minkowski [30]. Aspropriedades geometricas em questao sao as descri-tas pelo chamado tensor metrico, com o qual pode-seescrever o equivalente de uma nocao infinitesimal decomprimento para o Espaco-Tempo, o chamado ele-mento de linha. Curiosamente, Schwarzschild escrevesua solucao ja na forma “moderna” em coordenadasespaco-temporais esfericas (t, r, θ, φ), nas quais oelemento de linha da solucao e dado por

ds2 =(

1− rS

r

)dt2− dr

1− rSr

−r2(dθ2 + sen2 θdφ2

),

(2)mas sua interpretacao correta ainda tardaria. Emseu segundo trabalho [21], publicado em abril de1916, no qual Schwarzschild considera nao o caso deum massa puntual, mas uma distribuicao esferica ehomogenea de materia, sua constante rS e finalmenteidentificada como

rS = 2GMc2 , (3)

sendo c a velocidade da luz no vacuo. Desse tra-balho, pode-se ja inferir que nao sera possıvel um7 A carta original e sua resposta estao reproduzidas em [14].Ver tambem: [29]8 Nao imaginei que a solucao exata para o problema puntualfosse tao simples – traducao livre do autor.

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2016-0191 Revista Brasileira de Ensino de Fısica, vol. 38, nº 4, e4201, 2016

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e4201-6 Cem anos de buracos negros: o centenario da solucao de Schwarzschild

equilıbrio hidrostatico se a distribuicao de materiativer um raio inferior a 9

8rS . Este ponto, que de fatoe o embriao da ideia dos buracos negros, nao foicompletamente percebido e portanto explorado porSchwarzschild. Esta questao sera melhor exposta aseguir.

E bastante surpreendente que Schwarzschild tenhaenviado a Einstein sua solucao em 22 de dezembro de1915, pouco mais de um mes apos a publicacao dosquatro artigos preliminares de Einstein sobre a Re-latividade Geral [22–25], principalmente levando-seem conta que Schwarzschild estava em pleno campode batalha na Russia. Seria uma facanha virtual-mente impossıvel para alguem sem uma notavelfamiliaridade com a Matematica de ponta na epocae com as ideias da Relatividade Geral. Ocorre queSchwarzschild tinha a formacao necessaria para con-tribuir em pe de igualdade com Einstein para aRelatividade Geral. Nao se trata de um exageroretorico. Em seus anos de Gottingen, teve comocolegas e colaborou com Klein, Hilbert e Minkowski,tres matematicos de fundamental importancia parao desenvolvimento da Fısica e da Matematica dosfenomenos gravitacionais. Minkowski, em particu-lar, fora o responsavel anos antes pela introducaoda ideia de Espaco-Tempo [30]. Hilbert trabalhouativamente nos fundamentos matematicos que possi-bilitaram a derivacao das equacoes da RelatividadeGeral. E importante destacar que Einstein, muitofamoso pela economia em suas citacoes cientıficas,inclui apenas duas referencias em seu trabalho de-finitivo sobre a Relatividade Geral [26]: o primeiroartigo de Schwarzschild e um de Hilbert. Felix Kleinfoi fundamental no desenvolvimento das chamadasgeometrias nao-euclidianas, conceitos fundamentaisno desenvolvimento da Fısica e da Matematica doSeculo XX, sendo, em particular, um dos pilares daRelatividade Geral.

A ideia de que outras geometrias alem da milenareuclidiana poderiam fazer sentido foi elaborada emsua forma moderna por Bernhard Riemann, queeste ano tem o sesquicentenario de sua morte re-lembrado [31]. Assim como Schwarzschild (e Min-kowski), teve uma vida breve, menos de 40 anos,mas fundamental para o desenvolvimento da Ma-tematica e da Fısica. Schwarzschild tinha intimidadecom a obra de Riemann antes mesmo de seus diasde Professor em Gottingen, antes de ser colega deKlein, Hilbert e Minkowski. Em seu exame de Habi-litacao, no ano de 1899, em Munique, Schwarzschild

apresenta uma monografia sobre suas contribuicoesa fotometria e suas aplicacoes a astronomia, a quale aprovada. Porem, dentre os temas que haviamsido considerados para sua dissertacao, estava umaproposta de verificacao, a partir de observacoes as-tronomicas, da natureza geometrica do espaco [14].Trata-se de uma proposta de um arrojo intelectualincrıvel: a de que as geometrias nao-euclidianas quefaziam sentido matematicamente poderiam existirde fato na Natureza, e Schwarzschild apresenta umaproposta cientıfica para verificar esta possibilidade!Incentivado por Seeliger, apresenta este trabalho [32]no encontro anual da Sociedade Astronomica Alemaem Heidelberg, em 1900, cinco anos antes do “anomiraculoso” em que Einstein apresenta a teoria daRelatividade Especial, e 15 anos antes da Teoriada Relatividade Geral! Nesse fantastico trabalho,Schwarzschild mostra que os dados astronomicosdisponıveis na epoca limitariam os possıveis raiosde curvatura para o espaco tri-dimensional. Seriam,no mınimo, o equivalente a 4 milhoes de unidadesastronomicas9 se o espaco fosse do tipo hiperbolico,ou 100 milhoes se o espaco fosse esferico. Muito maisimportante que esses numeros, que nao sao de todoprecisos, era a ideia de testar experimentalmentea geometria realizada na Natureza. Ha uma amplaliteratura, na fronteira com a Filosofia, sobre este as-sunto, cobrindo grande parte da tradicao academicaalema, notadamente os trabalhos de Gauss [33] e asreferencias aos ideais kantianos [34]. Nao ha duvidasque Schwarzschild esteve na fronteira do conheci-mento humano em seus dias.

2.2. Johannes Droste

Antes de passarmos a uma discussao sobre o conteudofısico da solucao de Schwarzschild (2), e interessantecomentar um caso emblematico sobre o surgimentode novas ideias na Fısica e na Matematica, e o me-canismo de atribuicao dos devidos creditos. Trata-sedo caso do fısico e matematico holandes JohannesDroste [35]. O notavel neste caso e que Droste obtema mesma solucao de Schwarzschild, quase que simul-taneamente! Seu artigo [36], intitulado “O campo deum centro unico na Teoria de Einstein da Gravitacao,e o movimento de uma partıcula nesse campo” apre-senta exatamente a solucao de Schwarzschild (2).Este trabalho foi apresentado pelo entao orientador

9Distancia media entre o Sol e a Terra, cerca de 150 milhoesde km.

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de Droste, Hendrik Lorentz, no encontro da Acade-mia Holandesa de Ciencias em 27 de maio de 1916.Neste trabalho, publicado paralelamente ao originalholandes tambem em lıngua inglesa, le-se a seguintenota de rodape:

After the communication to the Aca-demy of my calculations, I discoveredthat also K. Schwarzschild has calcula-ted the field. Vid: Sitzungsberichte derKon. Preuss. Akad. der Wiss. 1916, page189, Equation (7) agrees with (14) there,if R is read instead of r.

Pouco se sabe sobre Johannes Droste [37]. Nas-ceu em Grave, Holanda, em 28 de maio de 1986e faleceu em Leiden, em 16 de setembro de 1963.Obteve seu doutorado em Leiden em 1916, com umatese exatamente sobre campos gravitacionais na Te-oria da Relatividade Geral [38]. Aparentemente, foia unica tese em Relatividade Geral orientada porLorentz. De seu trabalho [36], infere-se que vinhatrabalhando com Relatividade Geral desde 1913,ano em que Einstein publica alguns artigos bastantepreliminares sobre a teoria. Assim como no casode Schwarzschild, e evidente que Droste tinha umbom domınio dos aspectos matematicos e fısicos daRelatividade Geral para obter esses resultados origi-nais. Muito provavelmente, tinha tambem condicoesde contribuir em pe de igualdade com os outrospioneiros da Relatividade Geral. Sua derivacao dasolucao em [36] e mais clara que a de Schwarzs-child. Sua analise do movimento de partıculas deteste nesse campo gravitacional, alem de ser maiscompleta que a de Schwarzschild, e de grande ori-ginalidade, chegando a adiantar em quase 50 anosas chamadas “coordenadas tartarugas”, essenciaispara o entendimento da Fısica dos buracos negros.Chega tambem a identificar corretamente algumasdas propriedades das orbitas circulares com raior = 3rS , chamadas atualmente de Innermost sta-ble circular orbit10. Em varios aspectos, o traba-lho de Droste e mais profundo que o de Schwarzs-child. Apesar disso, seu trabalho caiu no completoesquecimento, mesmo com os esforcos dos que ad-vogam [35, 37] a favor da utilizacao da expressaoSchwarzschild-Droste para denotar a solucao (2).Os motivos pelos quais Droste nao teve o merecidoreconhecimento sao, infelizmente, mais comuns do

10ISCO, normalmente traduzida em portugues como “ultimaorbita circular estavel”.

que gostarıamos no mundo cientıfico. O resultadode Schwarzschild, entao diretor do mais importanteobservatorio alemao, ainda que afastado pela guerra,fora comunicado por ninguem menos que AlbertEinstein, num encontro da mais prestigiosa acade-mia da epoca. Droste era entao um estudante dedoutorado pouco conhecido. Ainda que seu orien-tador era um renomado fısico e que a academiaholandesa de ciencias gozava de grande prestıgio,nao eram pareo para Einstein e para a AcademiaPrussiana. O trabalho de Schwarzschild e imediata-mente reconhecido e passa a ser citado, sendo a suaprimeira citacao nada mais nada menos do que umadas duas unicas referencias no trabalho definitivo deEinstein sobre a Relatividade Geral [26], enquantoo trabalho holandes cai no ostracismo. A partir de1916, Droste se dedicou mais a Matematica, tendoocupado uma posicao de Professor na Universidadede Leiden por muitos anos. Nao ha registro de ne-nhum outro trabalho seu posterior em RelatividadeGeral.

3. Buracos negros

A elucidacao completa do significado da solucao (2)demoraria decadas. Nos anos seguintes a morte deSchwarzschild, ate mais ou menos o final da decadade 20, as principais analises concentravam-se nas im-plicacoes observacionais de (2). Destacam-se, nesteperıodo, os trabalhos do grande astronomo britanicoArthur Eddington, famoso por ser o responsavel pelaexpedicao de 1919 que observou um eclipse solarno hemisferio sul, mais precisamente no arquipelagode Sao Tome e Prıncipe, na costa africana, e nacidade de Sobral11, no Ceara, que confirmou umaprevisao da Relatividade Geral que pode ser obtidaa partir da solucao de Schwarzschild: o desvio da luzpela acao gravitacional de corpos massivos. Foi essaexpedicao, a primeira envolvendo conjuntamente ci-entistas britanicos e alemaes apos a Primeira Guerra,que deu fama mundial a Einstein [8].

Eddington talvez tenha sido o primeiro a questio-nar consistentemente a natureza da “singularidade”presente para r = rS na solucao (2). O proprioSchwarzschild, aparentemente, nao dera muita im-portancia a singularidade, afinal a solucao Newtoni-ana (1) tambem possui uma singularidade em r = 0,mas isso nao vem a ser um problema para sua in-

11Sobre a historia e alguns impactos no Brasil desta expedicao,ver [39–41]

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e4201-8 Cem anos de buracos negros: o centenario da solucao de Schwarzschild

terpretacao e utilizacao para qualquer r > 0. Ha,porem, uma diferenca fundamental entre os doiscasos. Enquanto no caso Newtoniano essa singula-ridade pode ser envolta numa superfıcie de areaarbitrariamente pequena, isso nao ocorre na solucaode Schwarzschild. A singularidade r = rS na Re-latividade Geral nao corresponde, como no casonewtoniano, a um ponto no espaco, mas a umaesfera de area

A = 4πr2S = 16πG

2M2

c4 . (4)

Ao contrario do caso newtoniano, a solucao de Schwarzs-child nao nos permite confinar a singularidade numaregiao espacial arbitrariamente pequena e, portanto,e muito mais difıcil evitar sua incorporacao nasanalises fısicas. Deve-se, obrigatoriamente, levar emconta essas singularidades nos problemas, por exem-plo, do movimento dos corpos sob a acao gravitacio-nal de (2). Algumas destas analises foram adiantadaspor Droste em seu artigo de 1916 [36]. Por outrolado, o raio de Schwarzschild e tipicamente muitopequeno. Para o caso do sol, por exemplo, que pos-sui uma massa de aproximadamente 2 × 1030 kg,seu raio de Schwarzschild e de aproximadamente 3km. O raio de Schwarzschild da Terra nao chega a1 cm. Em outras palavras, o raio de Schwarzschilde tipicamente minusculo se comparado a corpos as-trofısicos usuais, estando, nesses casos, localizadosempre no interior desses corpos, onde nao se es-pera que as solucoes (1) e (2) sejam mais validas.A elucidacao da natureza da singularidade r = rS

iria requerer um estudo mais aprofundado dos de-talhes internos e de formacao dos corpos esfericoshomogeneos que originam os campos gravitacionaisem questao. Nesse contexto, um estudante brilhantede Eddington na Universidade de Cambridge, o in-diano Subrahmanyan Chandrasekhar – Chandra12

como era conhecido – tem um papel fundamental.Cabe aqui um comentario acerca desses dois per-sonagens. Terminariam em uma encarnicada dis-puta publica, precisamente sobre a interpretacao dasolucao de Schwarzschild como buracos negros e seupapel na evolucao de uma estrela [42], que, comoquase sempre ocorre nessas situacoes, terminou emdesvantagem para o estudante, mesmo ele tendorazao neste caso em particular.

12Em sua homenagem, assim foi batizado o mais importantetelescopio de raios X da NASA em orbita atualmente, verhttp://chandra.harvard.edu/

Uma contribuicao fundamental ao entendimentoda natureza da singularidade r = rS foi dada por R.Openheimer e seus colaboradores nos anos imedia-tamente anteriores a Segunda Guerra Mundial [43].Estes estudos deram forma ao entendimento mo-derno do colapso gravitacional, que fora, de fato,inicialmente proposto por Chandra e refutado comcerta violencia por seu orientador, Eddington. Aideia e que determinadas configuracoes fisicamenterazoaveis de materia auto-gravitante poderiam co-lapsar, implodir devido a propria atracao gravitaci-onal. E exatamente o que ocorre, por exemplo, parao caso tratado por Schwarzschild em seu segundoartigo [21], o caso de um corpo esferico homogeneode raio externo inferior a 9

8rS . Nesta situacao, astensoes no centro da distribuicao de materia di-vergem, e nenhuma forca de reacao fısica sera ca-paz de sustentar a distribuicao, que acabara co-lapsando sobre acao do proprio peso, literalmenteimplodindo, concentrando-se em regioes cada vezmais pequenas e acabando finalmente em um unicoponto, r = 0. Este colapso total da materia, quenunca foi aceito por Eddington e se transformouno principal motivo das polemicas e brigas publicascom Chandra, deixara inexoravelmente o raio deSchwarzschild exposto, e portanto passıvel de serexplorado fisicamente. Openheimer identificou cor-retamente a superfıcie r = rS como uma superfıciede redshift (desvio para o vermelho) maximo [44,45].Por um efeito semelhante ao efeito Doppler13, naRelatividade Geral a frequencia de uma onda deluz pode variar de acordo com o potencial gravita-cional local. A luz emitida na superfıcie r = rS dasolucao de Schwarzschild sofre um desvio maximopara o vermelho, quer dizer, sua frequencia, qual-quer que seja, e reduzida a valores arbitrariamentebaixos. Na pratica, isto significa que nenhum sinalluminoso emitido da superfıcie r = rS conseguira,por exemplo, chegar a observadores distantes, emr � rS . Estas configuracoes foram denominadasfrozen stars por Openheimer. Seriam corpos frios,de certa forma “mortos”, e nao seria possıvel detec-tar nenhuma emissao eletromagnetica oriunda deles(por isso mesmo, em particular, serao corpos frios

13Efeito ondulatorio classico, no qual a frequencia da ondase altera devido ao movimento relativo entre a fonte e oobservador, perfeitamente ilustrado pela situacao em que asirene de uma ambulancia em movimento soa mais agudaquando ela se aproxima de um observador em repouso, etorna-se mais grave ao se afastar.

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para os observadores distantes, ja que o calor seirradia efetivamente como ondas eletromagneticas).

Situacoes que envolvem um raio de Schwarzschildexposto, fora da distribuicao de materia que originao campo gravitacional, necessariamente envolvemcorpos de densidades muito altas. Seria como colo-car a massa do sol em um corpo de 3 km de raio,ou a massa da Terra em um corpo com menos de 1cm de raio. Decididamente, sao situacoes que fogemda nossa experiencia cotidiana. Porem, e muito inte-ressante notar que a possibilidade de que um corposeja tao denso que sua atracao gravitacional superfi-cial seja tao intensa que nao permitiria que sequersinais luminosos fossem emitidos de sua superfıcie,ja havia sido considerada no contexto newtoniano.

Ha aqui tambem um pequeno conflito na atri-buicao dos creditos pelas ideias originais [46]. Apossibilidade de existencia no contexto newtonianodestes corpos escuros, que nao emitiriam nenhumaluz devido a intensa atracao gravitacional em suassuperfıcies, e normalmente atribuıda a Pierre-SimonLaplace [47], genio cientıfico frances, que viria ase tornar marques com a restauracao da dinastiados Bourbons apos a queda de Napoleao. Porem,ha pelo menos um antecessor que considerou – epublicou – estudos dessa mesma natureza. Trata-sede John Michell, naturalista ingles que considerou omesmo problema no mınimo 20 anos antes que La-place [48]. As ideias aqui sao relativamente simples,e podem ser perfeitamente entendidas a partir dasbases elementares da mecanica newtoniana [49].

Consideremos, por exemplo, um planeta de massaM e raio R, e um corpo de teste de massa m muitomenor que M , inicialmente sobre a superfıcie doplaneta. Suponhamos, por simplicidade, que estecorpo seja arremessado radialmente, para fora doplaneta, com uma velocidade inicial v. A energiatotal E do corpo teste, dada por

E = mv2

2 − GMm

r, (5)

e conservada em todos os instantes do movimento. Aquestao fundamental aqui e que a energia potencialgravitacional newtoniana U , o segundo termo dolado direito de (5), e uma quantidade nao positiva.Seu mınimo, Umin = −GMm

R , corresponde ao valorde U na superfıcie do planeta, r = R, e seu maximosera Umax = 0, que corresponde ao corpo de testeinfinitamente afastado, r → ∞. Se a velocidade vcom que o corpo e lancado radialmente a partir der = R e tal que a energia total (5) ainda e negativa,

em outras palavras, a energia cinetica inicial T =mv2

2 nao e suficiente para “vencer” o potencial deatracao GMm

R , o corpo de afastara ate um r = rmax eentao retornara a superfıcie, a qual por certo chegaracom a mesma velocidade em modulo com a que foilancado, ja que E deve ser conservada. Quanto maiorv, enquanto E for negativa, maior sera r = rmax.Ocorre que para v ≥ vc, com

v2c = 2GM

R, (6)

esse corpo nao retornara nunca mais ao planeta, poissua velocidade v e superior a velocidade de escapevc, permitindo que ele se livre completamente daatracao gravitacional do planeta. Esta e a velocidadecom que um foguete deve ser lancado desde a Terrapara atingir uma trajetoria balıstica que nao retor-nara (trajetoria nao elıptica). Como e caracterısticodos fenomenos gravitacionais, esta velocidade limitenao depende da massa m do corpo de teste, dependeapenas da massa M da fonte do campo gravitacional(o planeta).

Sabe-se desde o seculo XVII [27], notadamentedas observacoes astronomicas do astronomo dina-marques Ole Rømer, que a luz se propaga a uma velo-cidade de aproximadamente 300.000 km/s. Denotando-se por c a velocidade da luz, temos de (6) que umcorpo de massa M e raio R inferior, precisamente,ao raio de Schwarzschild (3), tera uma velocidadede escape na sua superfıcie superior a c. Em ou-tras palavras, o corpo sera tao denso que a luz naoseria capaz de vencer a atracao gravitacional emsua superfıcie. Nenhuma luz seria emitida por umcorpo dessa natureza14. O raio de Schwarzschild, por-tanto, tem um precedente newtoniano. O conceitode um objeto frio e negro, no sentido que nao emi-tira nenhuma radiacao eletromagnetica, introduzidopor Openheimer, tem um equivalente newtoniano.Esta ideia ainda primitiva de “buraco negro no ceu”nao foi bem aceita. Contou, em particular, com aoposicao do proprio Einstein, que em 1939 publicouum artigo [50] no qual argumentava que o colapsogravitacional nao terminaria inexoravelmente na ex-posicao do raio de Schwarzschild e, portanto, naformacao de buracos negros. Einstein estava tao

14Obviamente, temos aqui um pequeno problema que nao podeser resolvido satisfatoriamente no contexto newtoniano: separa a luz valeria a expressao (5) como energia total con-servada. Esta analise necessariamente requer conceitos rela-tivısticos, mas estes argumentos newtonianos simples apontamna direcao correta.

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2016-0191 Revista Brasileira de Ensino de Fısica, vol. 38, nº 4, e4201, 2016

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e4201-10 Cem anos de buracos negros: o centenario da solucao de Schwarzschild

seguro de seu argumento, o qual com o passar dotempo se mostraria equivocado, que conclui esteartigo declarando:

The essential result of this investiga-tion is a clear understanding as to whythe “Schwarzschild singularities” do notexist in physical reality.

Nao houve consenso a epoca sobre a possibilidadefısica real de existencia desses objetos, e essa situacaoperdurou por quase duas decadas.

A Segunda Guerra Mundial afetou, obviamente, odesenvolvimento das ciencias nao diretamente li-gadas aos esforcos belicos dos paıses envolvidos.Openheimer, por exemplo, dedicou-se ao ProjetoManhattan, que culminaria na construcao das pri-meiras bombas atomicas, e muito provavelmentenao teve mais tempo para prosseguir com seus es-tudos de Relatividade Geral. Varios outros fısicostiveram experiencias semelhantes. Com o final daSegunda Guerra, a vida cientıfica tende a voltar aonormal nos paıses centrais envolvidos nos conflitos,mas e evidente que ha um certo desinteresse pelaRelatividade Geral, que acaba relegada a um se-gundo plano quando comparada, por exemplo, asflorescentes Eletrodinamica Quantica e Fısica doEstado Solido. A Relatividade Geral no pos-guerrase transforma numa teoria altamente especulativa,nem sempre bem formulada matematicamente e umtanto vazia de conteudo fısico, e por isso pouco atra-ente do ponto de vista cientıfico. Essa fase um tantoobscura, de esquecimento, foi registrada sarcastica-mente em uma carta que o celebre fısico americanoRichard Feynman escreveu a sua esposa Gweneth,enquanto assistia a uma conferencia de RelatividadeGeral em Varsovia, em 1962. Dizia a sua esposa,textualmente [51]:

... I am learning nothing. Because there areno experiments this field is not an active one,so few of the best men are doing work in it (...)whenever anyone asks me a question or starts totell me about his “work”. The “work” is always:

1. completely un-understandable,2. vague and indefinite,3. something correct that is obvious and self

evident ...4. claim based on the stupidity of the author

...5. an attempt to do something probably im-

possible, but certainly of no utility,6. just plain wrong.

... Remind me not to come to any more gravityconferences!

O curioso e que e justamente nessa epoca, em queFeynman registra essas suas pessimas impressoes,que a Relatividade Geral comeca a renascer comoteoria fısica.

3.1. O renascimento: os buracos negroscomo objetos reais da Natureza

O interesse cientıfico na area renasce basicamenteno final dos anos 50. Uma contribuicao seminal foidada por David Finkelstein em 1958 [52], resolvendode maneira definitiva o impasse que reinava desde osanos 30 sobre a possıvel realizacao fısica do raio deSchwarzschild rS . Seu trabalho possibilita a inter-pretacao correta da esfera de raio r = rS como umaespecie de membrana unidirecional que so permitirao cruzamento de trajetorias fısicas, incluindo as daluz, de fora para dentro. Quer dizer, a esfera de raiorS funciona como uma especie de fronteira entreduas regioes, sendo a regiao externa completamentedesconectada da interior, sem qualquer possibilidadede comunicacao de dentro para fora. Nascia assim oconceito de “horizonte de eventos”, que de fato e oque distingue e define um buraco negro.

Contudo, a atividade retorna de maneira maisvigorosa com os estudos das implicacoes astrofısicasdessas novas estruturas espaco-temporais recem-descobertas. Como estamos em plena Guerra Fria,e claro que havia uma enorme polarizacao na co-munidade cientıfica, e as principais atividades sedavam em torno das escolas sovietica, liderada pelobrilhante fısico Yakov Borisovich Zel’dovich, e daamericana, sob orientacao de John Archibald Whee-ler [43]. Lev Landau, um dos grandes do Seculo XX,e seu grupo, tambem dedicou varios estudos a Relati-vidade Geral nessa epoca. Wheeler e um personagema parte [53]. Teve uma longa e produtiva carreira,tendo contribuıdo de maneira profunda a diferentesareas da Fısica ao longo do Seculo XX. Conhecidopor suas claras e divertidas analogias e por ser umgrande frasista, foi considerado por muito tempocomo o responsavel por ter cunhado a expressao“buraco negro” para a solucao de Schwarzschild. Efe-tivamente, Wheeler difundiu essa denominacao mas,contudo, a verdadeira responsavel pela introducaodo termo na literatura foi uma jornalista, Ann E.Ewing [54], que ouvira em um congresso da Socie-dade Americana para o Avanco da Ciencia, em 1964,a expressao black holes in space e a reproduziu emum artigo de divulgacao [55] sem, porem, identificara fonte [56].

Revista Brasileira de Ensino de Fısica, vol. 38, nº 4, e4201, 2016 DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2016-0191

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Wheeler e seus colaboradores, quase todos seusalunos em Princeton, foram fundamentais para or-ganizar os estudos modernos sobre buracos negros,dando origem a uma escola que ate hoje perdura.Alem de compilarem uma vasta gama de possıveisprevisoes experimentais e observacionais dos bura-cos negros, como as que foram comprovadas esteano com as ondas gravitacionais, tambem sistema-tizaram todo o conhecimento teorico acerca des-ses objetos fascinantes. Desses estudos, em parti-cular, infere-se que os buracos negros sao objetosde extrema simplicidade. Analisando a solucao deSchwarzschild (2), vemos que ela depende apenas deum unico parametro, rS , que por sua vez dependeunicamente da massa totalM do buraco negro (alem,obviamente, da constante G de Newton e da velo-cidade da luz c). Sabemos, hoje, que a solucao deSchwarzschild e o elemento mais simples de umaclasse mais ampla, mas mesmo assim muito simples.O buraco negro mais geral que pode existir na teoriada Relatividade Geral e caracterizado por outrosdois parametros alem de sua massa: seu momentoangular total J e sua eventual carga eletrica Q.Na Natureza, a materia apresenta-se predominante-mente como neutra eletricamente, isto e, tipicamentecomposta a partir de cargas elementares negativase positivas em numeros mais ou menos iguais. Istosignifica que nao se espera, em situacoes astrofısicas,buracos negros com carga eletrica apreciavel, pois amateria que o originou muito provavelmente era neu-tra. Do ponto de vista matematico, porem, existe apossibilidade de um buraco negro carregado eletrica-mente. Ja o caso do momento angular e diferente. Osmecanismos fısicos mais comuns para a criacao deum buraco negro envolvem distribuicoes de materiaque giram e, portanto, tem momento angular naonulo, e parte deste momento angular certamentesera transferido ao buraco negro que eventualmentesurja apos um colapso gravitacional. Em outras pa-lavras, em um colapso gravitacional, nao importaque tipo de distribuicao de materia esteve envolvida,o estagio final sera um buraco negro completamentecaracterizado por so tres parametros: massa M , mo-mento angular J e, possivelmente, uma pequenacarga eletrica Q. Visto de fora, para observadoresexternos ao horizonte de eventos r = rS , todos osburacos negros sao iguais, nao possuirao nenhum ou-tro adereco que os possa identificar alem desses tresparametros fısicos. Wheeler deu o nome de “cabelos”a estes possıveis aderecos e, por exemplo, em seu

conhecido e bastante completo livro texto sobre Re-latividade Geral [57], descreve, ja na introducao, osfortes vınculos impostos pelas equacoes de campo naTeoria da Relatividade Geral da seguinte maneira:

The field equation (...) governs thecollapse of a star to form a black hole; itdetermines uniquely the external space-time geometry of a black hole (“a blackhole has no hair”)...

Os black hole hairs tornaram-se um fertil campo depesquisa. A possibilidade de que objetos astrofısicosde tamanho apreciavel, de varias massas solares, porexemplo, possam ser completamente caracterizadospor apenas tres parametros, como se tratassem departıculas elementares, e fascinante e tem diversasimplicacoes teoricas e observacionais. Neste caso,porem, estamos nos aproximando muito das pesqui-sas atuais, sem o tempo necessario para que os fatose ideias se assentem completamente e nos permitamuma analise minimamente isenta do ponto de vistahistorico.

3.2. Buracos negros e ondas gravitacionais

Como ja foi dito, a Teoria da Relatividade Geralde Einstein preve a existencia de ondas gravitacio-nais. De fato, esta deve ser uma previsao de qual-quer teoria que rejeite interacoes instantaneas adistancia, como as presentes na Gravitacao Univer-sal de Newton. Se uma interacao da Natureza naoe instantanea, a primeira pergunta e como ela sepropaga. Na Relatividade Geral, a interacao gravi-tacional se propaga com a mesma velocidade quea luz, algo que por certo tambem foi confirmadopelas recentes deteccoes. As estimativas iniciais, fei-tas pelo proprio Einstein, apontavam corretamenteque as amplitudes tıpicas das ondas gravitacionaisseriam minusculas, talvez nao detectaveis na pratica.Porem, havia uma outra disputa: se estas ondas exis-tiriam efetivamente na Natureza, mesmo que comamplitudes mınimas, ou se seriam uma mera cons-trucao matematica, sem realidade fısica. Eddingtonera um dos que duvidavam do conteudo fısico dasondas gravitacionais. Sua posicao a respeito foi eter-nizada por sua frase jocosa acerca da propagacaodas ondas gravitacionais [58]

Gravitational waves propagate at thespeed of thought.

DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2016-0191 Revista Brasileira de Ensino de Fısica, vol. 38, nº 4, e4201, 2016

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e4201-12 Cem anos de buracos negros: o centenario da solucao de Schwarzschild

Em 1918, Einstein [59] publica o primeiro artigo in-teiramente dedicado as ondas gravitacionais. Variosoutros se sucederam, alguns ja na sua epoca emPrinceton (ver tambem [6]). Seu ja famoso desenten-dimento com o editor do Physical Review da epoca,John T. Tate, se deu exatamente por problemas, naotica de Einstein, no tratamento editorial dado a al-guns de seus trabalhos sobre ondas gravitacionais. Olevantamento do sigilo editorial do Physical Review,apos passados 70 anos e sem nenhum dos prota-gonistas ainda vivos, esclareceu este impasse [60],e a conclusao nao foi das mais edificantes para aimagem de Einstein.

O ponto fundamental aqui e que o entendimentomais profundo das ondas gravitacionais, que deixouabsolutamente claro que elas tem efetivamente umconteudo fısico, envolve precisamente a solucao deSchwarzschild. Da mesma maneira que uma ondae criada quando perturbamos o equilıbrio da su-perfıcie da agua em um tanque, ondas gravitacio-nais surgirao e se propagarao quando perturbamosa solucao de Schwarzschild. As ondas gravitacionaissao, portanto, pequenos desvios no campo gravi-tacional esfericamente simetrico correspondente asolucao (2), que de acordo com a Relatividade Ge-ral devem se propagar com a velocidade da luz.A solucao de Schwarzschild (2) tem propriedadesmatematicas (especificamente, o fato de ser assin-toticamente plana) que permitem a identificacaoe interpretacao de propriedades fısicas como mo-mento e energia transportados pelas ondas gravitaci-onais, resolvendo de maneira inequıvoca as questoesacerca da realidade fısica destas ondas. Sao taofısicas como qualquer outro fenomeno ondulatorioencontrado na Natureza, sendo caracterizadas pe-los mesmas quantidades como frequencia, compri-mento de onda e velocidade de propagacao. Sendoassim, sao passıveis de serem detectadas experimen-talmente, uma vez vencido o desafio de lidar comquantidades de amplitudes mınimas, como fez oconsorcio LIGO-Virgo [1,2]15. Alem de permitir ainterpretacao fısica definitiva das ondas gravitacio-nais, a solucao de Schwarzschild tambem tem papelimportante na descricao dos eventos que geram ossinais gravitacionais que podem ser detectados commaior frequencia na Terra: os fenomenos envolvendofusao de buracos negros.

A solucao de Schwarzschild, assim como suas ge-neralizacoes contendo momento angular (solucao

15Para uma exposicao mais tecnica, ver [61]

de Kerr) ou carga eletrica (Reissner-Nordstrom ouKerr-Newman), corresponde a uma solucao da Re-latividade Geral para o problema de um corpo. Naoexiste solucao exata explıcita para o problema dedois corpos em Relatividade Geral. Assim, se qui-sermos descrever, na Relatividade Geral, uma confi-guracao que corresponda, por exemplo, a um sistemabinario, onde dois corpos de massas comparaveisse movem sob acao gravitacional mutua, necessari-amente temos que utilizar aproximacoes ou algumtipo de solucao computacional para as equacoes deEinstein. A fusao de buracos negros que originou ossinais detectados este ano correspondem a um sis-tema binario de buracos negros que gradativamenteperdem energia, emitida como ondas gravitacionais,e com isso vao se aproximando, seguindo orbitas queespiralam e, finalmente, coalescem e dao origem a umunico buraco negro. No caso do primeiro evento de-tectado este ano [3], por exemplo, o sistema binariooriginal era composto por dois buracos negros demassas iguais a 29 e 36 massas solares. O buraconegro final tem 62 massas solares. As 3 massas sola-res faltantes foram irradiadas, quase que totalmente,em ondas gravitacionais! E como se 3 sois de re-pente desaparecessem, e suas energias de repouso (agigantesca quantidade dada pela formula E = mc2)se dissipassem no universo como ondas gravitacio-nais. A descricao realista desse sistema envolve umconsideravel esforco computacional, algo que seriaimpossıvel algumas decadas atras. O estado-da-artena area envolve sofisticados recursos de hardware esoftware, mas as origens dos conceitos centrais ine-quivocamente remontam a solucao de Schwarzschild(2), que encantou Einstein por sua simplicidade 100anos atras.

4. Comentarios Finais

Apos a deteccao direta das ondas gravitacionais,e natural que se pergunte, neste contexto que en-volve buracos negros, se ha alguma possibilidade deobervacao direta destes objetos. Isto corresponde-ria, de fato, a observacao de um horizonte de even-tos, a estrutura espaco-temporal que funciona comouma membrana unidirecional. Claramente, nao seespera sinais detectaveis do interior do buraco ne-gro16 Pode-se, porem, detectar o sinal da materia

16Isto, efetivamente, nao e completamente certo. Curiosamente,descobriu-se nos anos 70 que os buracos negros, afinal, naosao negros de fato, mas emitem um pequeno brilho, a cha-

Revista Brasileira de Ensino de Fısica, vol. 38, nº 4, e4201, 2016 DOI: http://dx.doi.org/10.1590/1806-9126-RBEF-2016-0191

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que cruza o horizonte. E ha, justamente em nossagalaxia, uma possibilidade dessas. Trata-se de umburaco negro gigantesco, com cerca de 4 milhoesde massas solares, no centro de nossa galaxia, naregiao do ceu conhecida como Sagitario A∗. A possi-bilidade de existencia de buracos negros gigantes nocentro ativo de galaxias vem sendo aventada desdeo final dos anos 60 [62]. Ha uma grande quantidadede galaxias com nucleos ativos, porem, devido a pro-ximidade, Sagitario A∗ e considerada como a maispromissora possibilidade de observacao direta deum buraco negro, e diversos telescopios atualmentevarrem essa regiao do ceu, e varias estrelas com tra-jetorias proximas ao provavel buraco negro ja foramidentificadas e estao sendo constantemente seguidas.O cruzamento do horizonte por uma dessas estre-las ou qualquer material que eventualmente emanedelas deixara um sinal que podera ser inequivoca-mente identificado, e ha intensos trabalhos teoricose observacionais nessa campo atualmente. A saga,que se iniciou ha um seculo com Schwarzschild, estaainda longe do seu final.

Apesar de sua vida ter sido bastante breve, Schwarzs-child pode receber diversos premios e distincoese desfrutar do reconhecimento de seus pares [14].Postumamente, foi homenageado tambem em diver-sas situacoes. Destacam-se o nome dado nos anos60 para o maior observatorio astronomico da Ale-manha, Karl-Schwarzschild-Observatorium, atual-mente Thuringer Landessternwarte Karl Schwarzs-child Tautenburg, localizado em Tautenburg, proximoa Jena, e a instituicao da Medalha Karl Schwarzs-child, premiacao anual da Sociedade AstronomicaAlema para eminentes astronomos e astrofısicos. Seufilho Martin Schwarzschild foi o primeiro a recebe-la,em 1959.

Agradecimentos

O autor reconhece e agradece o contınuo suportefinanceiro recebido do Conselho Nacional de Desen-volvimento Cientıfico e Tecnologico – CNPq (proces-sos 304378/2014-3 e 441349/2014-5) e da Fundacaode Amparo a Pesquisa do Estado de Sao Paulo – FA-PESP (processo 2013/09357-9). Agradece tambem,muito especialmente, os organizadores e participan-tes da serie de coloquios “Convite a Fısica”, do

mada radiacao de Hawking, chamada assim devido ao celebrefısico ingles que a propos. Contudo, para buracos negrosde dimensoes astrofısicas, este brilho seria completamenteimperceptıvel.

Departamento de Fısica Matematica do Institutode Fısica da USP. Este texto foi a base do coloquiola apresentado, em abril de 2016, como celebracaoaos 100 anos dos buracos negros.

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